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Discurso que devia ser transcripto a pag. 838, col. 2.ª, lin. 62.º do Diario do Lisboa, na sessão de 28 de março

O sr. J. T. Lobo d'Avila: — Pedi a palavra sobre a ordem, e obedecendo ás prescripções do regimento, vou ler a moção que tenciono mandar para a mesa, e que fundamentarei em poucas palavras.

A minha moção é concebida nos seguintes termos:

«A camara, reservando-se para apreciar o orçamento da receita e despeza do estado na occasião em que elle se discutir, passa á ordem do dia. = Lobo d'Avila.»

Parece-me que a camara não póde discutir conveniente e regularmente esta questão do modo por que ella tem sido tratada.

Discute-se incidentemente o orçamento da receita o despeza do estado e a questão de fazenda, que é uma questão gravissima, a proposito de uma declaração feita pelo sr. ministro da fazenda; mas esta questão vae tomando proporções que me parecem ser já demasiadas (apoiados).

Não reconheço que d'esta discussão resulte alguma utilidade alem de esclarecer sobre certos pontos a camara, como já tive occasião de dizer; mas não a póde conduzir a uma resolução definitiva, por isso que uma resolução a respeito de assumpto tão grave só póde ter logar depois de um parecer da commissão de fazenda, e de examinados todos os documentos attinentes a esta questão.

E por esta occasião pedirei ao sr. ministro da fazenda, que queira mandar apressar a publicação de todos os documentos que acompanharam o meu relatorio sobre o estado da fazenda publica e sobre ouso que fiz das diversas auctorisações que me foram concedidas pelo parlamento, porque a collecção d'esses documentos é muito importante e elucida muito a questão de que nos occupâmos. Espero que s. ex.ª se não descuidará de apressar a conclusão d'esses trabalhos, e de remetter quanto antes á camara o relatorio com os documentos, ou antes os documentos, porque o relatorio já foi publicado no Diario de Lisboa. Permitta-me v. ex.ª e a camara que eu n'esta occasião, depois de justificar a minha proposta, faça algumas reflexões sobre o que hontem disse o sr. ministro da fazenda.

Não usarei de termos asperos; não aproveitarei o desforço a que tinha direito em presença das insinuações pessoaes que s. ex.ª me dirigiu e das provocações que a camara presenciou. Insisto em acreditar que s. ex.ª é inexperiente e não avalia ainda bem a gravidade da sua posição; deixou-se levar por suggestões, quer de alguns amigos indiscretos, quer

mesmo da sua vaidade, e demonstrou mais de uma vez no seu procedimento que realmente era homem inexperiente e pouco habituado á pratica dos negocios (apoiados).

S. ex.ª escandalisou-se muito, porque lhe disse que é inexperiente. Parece-me que era muito menos delicado dizer lhe por outro modo que s. ex.ª ignora certas questões, que, só com o tempo póde aprender.

É alguma offensa ser inexperiente? Pois um homem póde adquirir experiencia sem tempo, sem pratica? Quem nasce ensinado? S. ex.ª nasceu hontem para a vida publica, e por isso não se deve escandalisar de lhe chamarem inexperiente.

Aonde está a carreira parlamentar de s. ex.ª? Quaes foram os trabalhos importantes que tem apresentado sobre a administração publica? Quaes são os seus precedentes que abonam a sua competencia? Quaes são as indicações constitucionaes que o levaram aquelle logar? S. ex.ª sabe que todos o ignoram (apoiados); portanto s. ex.ª, não tendo uma carreira publica, não tendo pratica dos negocios, é inexperiente; e não admira que o seja. Com o tempo, se ahi durar, de certo ha de adquirir alguma experiencia; e estou persuadido que ha de mudar muito das idéas que hoje apresenta, porque a experiencia é a mestra da vida; e ha conhecer quando saír d'esses logares o que significam certos apoios (apoiados).

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Apoiadissimo.

Como disse, não empregarei expressões offensivas para com s. ex.ª; não retaliarei, como tinha direito de fazer, as insinuações que impensadamente me dirigiu, porque tenho pena da situação de s. ex.ª e não lh'a quero aggravar senão até ao ponto em que foi necessario restabelecer a verdade dos factos, e desviar de mim inconsideradas e irreflectidas accusações que s. ex.ª me quiz arremessar para tentar de algum modo firmar a sua posição vacilante.

Se s. ex.ª se apresentasse modestamente, isso não lhe fazia mal nenhum. Se dissesse — eu aceito o orçamento, salvas as alterações que os factos occorridos e o exame d'elle mostrar que se devem fazer, como é costume sempre; hei de estudar esta questão; hei de apresentar as propostas que as necessidades publicas reclamarem: não tomaria a palavra, aguardava os actos de s. ex.ª, e tinha-se evitado completamente esta questão.

Foi isto o que disse da primeira vez que fallei n'esta questão, provocado por s. ex.ª, quando o sr. Carlos Bento lhe offereceu uma tangente, permitta-me a expressão, por onde s. ex.ª podia muito bem saír da falsa posição em que se tinha collocado.

Disso que se s. ex.ª aceitasse esta tangente que habilmente lhe offereceu o sr. Carlos Bento, não se prolongaria esta questão.

S. ex.ª não adoptou este systema; pelo contrario apresentou-se com certo entono, com certo desassombro, com certa desembaraço um pouco exagerado; e como a sua competencia não foi geralmente reconhecida no publico, nem pela imprensa, e surprehendeu um pouco a sua ascenção repentina ao poder, causou estranheza o entono, o sobrecenho financeiro com que s. ex.ª se apresentou para fazer acreditar a sua competencia (apoiados).

Não é com o entono com que se falla, nem com os ademanes que se empregam, que se impõe á opinião illustrada. Isso não serve para formar a reputação de ninguem, principalmente de quem ainda não a adquiriu n'estas lides. Convença-se s. ex.ª d'isto, e recorra antes ao systema da argumentação placida, tranquilla e ao exame dos factos, do que a essa especie de mise en scène, permitta-me a expressão, que n'este tempo não illude ninguem.

N'estas questões de finanças ha uma cousa que desconsola quem se dedica a ellas: não é porque eu queira fazer injustiça á intelligencia de todas as pessoas que me escutam; mas geralmente estas questões de cifras não são as mais sympathicas, as mais amenas, e portanto não são aquellas que se estudam de preferencia. Ha pouca gente que tenha a paciencia de se dedicar ao estudo profundo d'estas questões, e portanto quando se levanta um individuo qualquer a fallar em uma questão de cifras d'esta ordem, apresentando cifras com uma grande rapidez, com uma certa entonação de voz, com um certo a plomb, fica-se hesitando sobre qual será a cifra verdadeira; diz-se — este homem que apresenta cifras com tanto desembaraço, com tanto entono, é impossivel que ellas não sejam verdadeiras; e como nem todos podem examinar as questões, ou não têem paciencia para isso, ficam em estado de duvida os que são mais imparciaes; e aquelles que, pelo instincto de apoiar, ou de quererem conservar uma situação, estão sempre propensos a achar rasão em quem é poder, esses apoiam estrepitosamente (riso e apoiados).

Eu não estranho que se apoie nem que se sympathise, nem que se sacrifique um pouco ao principio da conservação, ao serva te ipsum; mas o que me parece é que este principio da conservação não deve ir tão longe, que se vá condemnar hoje o que se approvou hontem, e se vá approvar ámanhã o que se condemnou hoje (apoiados), porque tudo n'este mundo tem um certo limite (apoiados), e as melhores tendencias desvirtuam-se se vão alem d'elle; fazendo eu completa justiça ás intenções de todos os que procedem assim, que de certo são animados pelo seu entranhado amor do bem publico (riso), porque isto de certas pretensões, que ha no systema constitucional, de collocar individuos por empenhos, foi uma historia, uma cousa que eu inventei (riso).

(Áparte do sr. Pinto Coelho.)

A este proposito direi que eu nunca me referi a individuo nenhum, nem á maioria, como pareceu entender o sr. Pinto Coelho; referi me a todas as maiorias e a todos os individuos; referi-me ao systema, e no systema antigo era peior (riso — apoiados), porque havia a venda dos logares,