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DIARIO DA CAMAEA DOS DIGNOS PARES DO REINO 59

se dos conselhos da corÕa, e o sr. bispo de Vizeu foi encarregado de formar a nova administração. S. exa. disse-nos, que ha a escriptura sagrada, o que já suppunhamos de tão virtuoso prelado, e que achára n'ella que os humildes se exaltavam. Por isso, movido nas profanidades da politica pelas rasões piedosas que inspiram de certo os seus actos episcopaes, cedera o primeiro logar ao sr. marquez de Sá em 1868, e o deferira em 1870 ao sr. marquez d'Avila. É louvavel. A modestia agrada sempre, e conhecer-se é a primeira qualidade do homem, e mais que tudo do homem publico. Só o delirio da fatuidade imaginára deprimir os outros, cuidando elevar-se a si. Não eleva, acanha-se, e o ridiculo quasi sempre o acaba. Bem faz o illustre prelado em se abraçar com a modestia, mas abrace-a em tudo, que não ha de arrepender-se.

As circumstancias actuaes são graves, e não sei se acrescente que perigosas. Assustam-me menos as urgencias da fazenda, do que as nuvens tempestuosas da politica externa n'este momento de instabilidade e de arriscada transição, momento talvez grávido de longas e terriveis complicações futuras. Inquieta-me o estado do paiz, esta especie de anarchia mansa, em que certo amor da patria acende uma e outra vez as suas fogueiras com os livros das matrizes e das recebedorias. Estes perigos existem, e seria prudente preve-los e acautelar-lhes a acção a tempo. Para os afastar entendia eu em agosto de 1870, e entendo ainda hoje, que não seria de mais a união dos homens distinctos do paiz. Os srs. marquezes de Sá e d'Avila sustentaram a mesma opinião. A imprensa quasi toda applaudiu-a. Mas o sr. bispo de Vizeu julgou, que bastava elle só e e seu partido. É verdade que depois, modificando um pouco os primeiros raptos d'estes brios, achou conveniente recorrer ao apoio e auctoridade do meu nobre amigo o sr. marquez d'Avila. Um dia terá o sr. bispo de responder perante a nação e perante os factos pela recusa, que oppoz ao programma da conciliação, recusa que reputo um mau serviço ao paiz. Estimarei que hoje concorra para que seja sincera e fiel a adhesão, promettida ao ministerio, mesmo depois de s. exa. convencido, como ha de estar, de que elle não representa, nem podia representar a politica da administração de s. exa. em 1868. É preciso que esse apoio, como o de todos, seja explicito e limpo de enigmas. O do partido historico, que tenho a honra de representar, ha de ser tão verdadeiro como desinteressado e puro de calculos intencionaes. O governo sabe até aonde póde contar com elle nas questões de fazenda e administração.

Convem fallarmos ao paiz como se deve fallar, e como a occasião e a responsabilidade de todos o exigem, depondo vaidades pueris, arrogancias posthumas, reservas mentaes e ambições incidiosas. A questão tributaria entrou na tela. Aggrava-la, tentando explorar a aversão natural aos sacrificios, seria um crime de lesa patriotismo, alem de um acto de insania politica. Quem subisse por taes meios cairia logo depois lapidado pelo desprezo e pela indignação geral. Procuremos facilitar e aperfeiçoar as propostas do governo e ajudemos a execução d'ellas depois de votadas, provando a sua necessidade. Sejamos do paiz primeiro, e dos interesses partidarios depois. Não especulemos com idéas falsas, nem aventemos promessas impossiveis. As economias são precisas, são uteis, mas não dispensam o imposto. Digamos esta verdade á nação, visto que na pratica a temos confessado todos. A idéa das economias não pertence exclusivamente a nenhum partido. É uma regra elementar de administração. Não queiramos converte-la em arma politica de demolição, ou em escada articulada para escalarmos o poder (apoiados).

O illustre prelado de Vizeu disse, que em 1868 viera pôr um prego na roda dos disperdicios, e substituir ao moto da bandeira regeneradora "o paiz póde e deve pagar mais", a nova lenda da sua escola "o governo póde e deve gastar menos". Traçando-nos o seu programma n'aquella epocha cifrou-o em tres pontos capitaes, economias e reformas profundas, extincção da divida fluctuanie, e creação de receita. Estes tres pontos estavam achados, porém, havia muito, e só pasmo da humildade excessiva, com que s. exa. os apontou como invenção sua Economias? Tinha-as feito e grandes o gabinete do sr. Fontes, continuou-as o ministerio a que tive a honra de pertencer, intentou realisar algumas o do sr. duque de Saldanha, e propõe-se realisar outras o do sr. marquez d'Avila. Todos hão de proseguir no mesmo caminho. Já se apuram milhares de contos de economias, e mais se irão verificando, porque, mesmo depois de extincto o deficit., os gastos inuteis, ou superfluos supprimem-se para alliviar o imposto. É o exemplo que nos está dando a Inglaterra.

A divida fluctuante?! Quem a engrossou, quem elevou excessivamente os seus encargos, e saíu do governo deixando o paiz á beira da bancarota? Creação de receita? Em 1869 s. exa. retirou-se ficando estranguladas na commissão de fazenda da casa electiva todas as propostas do sr. conde de Samodães, e o proprio ministro não escapou á sorte dos seus projectos, caindo com elles. Em 1870 votou-se receita, e entre ella a lei sobre o consumo, prova de coherencia entre as promessas e os actos por parte de s. exa.; mas essa receita não existiria sem a presença do sr. marquez d'Avila no gabinete, e sem o apoio patriotico dos partidos, que s. exa. veiu hontem aqui exautorar, para lhes agradecer do certo a lealdade.

O sr. marquez d'Avila foi sempre economico. O sr. Carlos Bento e os seus collegas não são esbanjadores. Promettem as economias compativeis com a boa organisação dos serviços. A que proposito vem, pois, o recrescente clamor pelas economias, quando o sr. bispo em 1869 dava por feitas em duas dictaduras as essenciaes, e appellava já para o imposto? Desviemos a especulação, e sirvamos o paiz, que esse é o nosso dever.

O sr. bispo de Vizeu não inventou nada. Invoca para titulo de gloria as redacções de 1868 e 1869, e a sua iniciativa n'ellas? Feriu os empregados publicos em holocausto á falsa popularidade com 10 e 15 por cento e effeitos retroativos. Demoliu serviços, e não soube reconstrui-los. Dispensou no papel verbas de despeza, que a realidade não dispensa. Não tocou na administração militar e na dotação episcopal (o que seria um nobre exemplo). Desorganisou a instrucção primaria e secundaria, reformou a contadoria e a botica do hospital de S. José, creou a junta de saude, e avelumou as fileiras dos barões, viscondes, e commendadores desta terra democratica por excellencia. Eis em resumo o compendio abreviado dos trabalhos de s. exa., e parece-me que não requeriam para os celebrar a tuba epica do seu auctor. Esquecia-me!.. S. exa. resuscitou em 1869 ao nono dia entre bandas marciaes e foguetes, e para attestar o seu odio ás dictaduras, exerceu uma das mais estereis de que ha noticia, e das mais temerarias tambem, porque ousou pôr mãos violentas na lei eleitoral, e influir directamente na escolha dos seus juizes. A sedicção militar é pessima, mas apotheoses de archotadas, tambores, e bumbos como prologo da invasão e usurpação do poder legislativo serão melhores acaso? (Muitos apoiados).

Façamos economias, mas não façamos das economias arma politica. O illustre prelado, chefe de partido, deve ter pensamento seu, e desde que insta por novas e profundas reformas, que não fez, nem propoz em dois ministerios, tem o dever restricto de as indicar aos seus successores e ao paiz. Diga quaes! Aponte-as! Sendo possiveis e rasoaveis esteja certo, de que serão aceitas.

Note as economias por uma vez, mão acabe tambem por uma vez este ramo de especulação politica.

O de que mais precisâmos é de governo. Não temos tempo para ociosidades n'este ponto, e quem impedir que se aproveite a occasião assume graves responsabilidade". Adular a falsa popularidade, arrastar airaz d'ella os homens é as opiniões, e não poucas vezes requestar até contra a consciencia os seus caprichos, é mau, e produz tristes resultados