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210 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

O poder moderador, esse poder do estado irresponsavel perante a lei, mas que não póde deixar de se conformar com a logica, precisa que lhe sejam ministradas as indicações constitucionaes, para que possa exercer as suas altas funcções, e nós todos que temos voz nos negocios publicos, devemos procurar dar-lhe essas indicações com verdade e lealdade.

Creio, pois, que esta discussão póde ser proveitosa.

Sr. presidente, notarei em seguida, e notarei com admiração, a delicadeza com que a illustre commissão, logo no segundo periodo do projecto, indica á corôa, que as eleições não foram feitas livremente, como se assevera no discurso lido pelo chefe do estado.

Diz se n’esse documento de responsabilidade ministerial:

(Leu.)

E o projecto de resposta, paraphraseando este periodo do discurso, diz:

(Leu.)

O adverbio livremente desappareceu! Não se póde mais delicadamente fazer sentir á corôa de que não houve essa liberdade no acto eleitoral, que os ministros responsaveis pretendiam fazer acreditar. A suppressão d’este adverbio é altamente significativa.

Entendo, pois, que, de accordo com essa indicação apresentada pela illustre commissão, devemos procurar esclarecer o assumpto, e prestaremos bom serviço se habilitarmos, por esse modo, o poder moderador a julgar superiormente.

Procurarei, pois, aproveitar alguns factos, pelos quaes se mostra que o governo interveiu nas eleições, e fal-o-hei do modo por que o posso fazer n’esta casa, sem entrar na apreciação das eleições em especial, respeitando, como é nosso dever, as attribuições da outra casa do parlamento, que é tão independente como esta a que tenho a honra de pertencer.

Ha factos que, segundo me parece, mostram evidentemente a intervenção do governo nos actos eleitoraes.

Desejaria antes expor esses factos, e as considerações que tenho a fazer sobre elles, na presença do sr. presidente do conselho, e talvez nesse caso, estando s. exa. presente, eu me referisse primeiro a algumas palavras do seu notavel discurso.

Mas, não estando presentes nem o sr. presidente do conselho, nem o sr. ministro da fazenda, a quem tambem tenho de dirigir me, nem o sr. ministro do reino, que julgo estar doente, o que deveras lamento, e sendo d’esses ministros os actos principaes que tenho a discutir, é para mim na verdade penoso continuar a usar da palavra; no entanto, a responsabilidade collectiva está representada, e por isso continuarei, tendo a esperança que o sr. presidente do conselho ainda compareça.

Sr. presidente, é publico e notorio que em Lisboa, e em alguns outros circulos, houve candidaturas officiaes, protegidas por todos os meios ao alcance do governo, sendo um dos candidatos conhecido como francamente republicano, e outro como socialista.

Poderá o governo declinar essa responsabilidade?

Tambem é publico o notorio que em alguns dos circulos da capital, e em Belem, se compraram votos, factos estes de que ninguem duvida, porque o mercado foi bem pouco recatado.

Eu não posso asseverar que o dinheiro, ou parte delle, saísse dos cofres publicos, nem tenho meios de averiguar, se a intervenção official tambem veiu acompanhada d’esse facto criminoso; se o perguntar ao governo, de certo que não me esclarecerá a este respeito, e ignoro qual o modo de pedir esclarecimentos, por onde se possa conhecer se dos cofres publicos saíu dinheiro para esse fim.

Mas fosse qual fosse a proveniencia das quantias dispendidas com as eleições, a verdade é que houve compra de votos quasi publica, senão publica, e que as auctoridades que tambem publicamente protegiam uma candidatura não procederam contra os criminosos, pondo cobro a tal immoralidade.

Tambem se chama a isto tolerancia? A tolerancia no crime e conivencia.

O sr. Vaz Preto: — Apoiado.

O Orador: — Sr. presidente, o governo não cohibiu a venda de votos, não fez processar os que publicamente mercadejavam com as consciencias, e foi por tolerancia? Parece-me foi antes por empregar os mesmos meios.

Com a apresentação de candidatos republicanos não 6 que se fortalecem as instituições; permittindo a compra de votos, senão comprando tambem, não se moralisa.

(Entra o sr. presidente ao conselho.}

Vou apontar alguns factos que mostram a intervenção illegal do governo nas ultimas eleições.

No concelho de Belem começou a lucta eleitoral nas eleições municipaes, como em quasi toda a parte onde houve lucta.

N’aquelle concelho as auctoridades trabalhavam claramente nas eleições, e eram substituidas quando pareciam afrouxar.

Foi transferido um administrador e o substituto, e depois outro, porque não conseguiu vencer a eleição municipal.

O caso era vencer o presidente da antiga camara, que tambem ora o candidato a deputado, e contra quem eram todas as iras do governo, bem como contra o partido a que pertence.

Eu não venho aqui advogar a causa desse cidadão, o que venho é censurar com toda a vehemencia os actos altamente condemnaveis que ali se praticaram por occasião das eleições.

O sr. presidente do conselho, na ausencia do sr. ministro do reino, mandou suspender a eleição municipal d’aquelle concelho, contra o que dispõe o codigo administrativo, que manda proceder ás eleições municipaes em todo o reino num dia certo e determinado.

No decreto em que se ordenou a suspensão do acto eleitoral, fundava-se s. exa. em que a commissão do recenseamento não tinha querido dar as copias que lhe tinham sido pedidas por alguns cidadãos, nem mesmo tinha dado essas copias quando intimada pela auctoridade.

O que é certo, porém, é que na epocha marcada pela lei, tinham estado publicos os cadernos do recenseamento; e tanto assim que a auctoridade tinha reclamado perante o poder judicial para que alguns cidadãos fossem recenseados e a outros fosse dada baixa no mesmo recenseamento; tinha tido, portanto, a auctoridade conhecimento do recenseamento eleitoral.

Póde ser que a commissão andasse mais avisadamente dando as copias pedidas, mas não me parece essa falta fundamento bastante para se suspender o acto eleitoral n’aquelle concelho.

O que se pretendia era ganhar tempo e preparar terreno.

Pouco depois, dias antes da eleição, publicou se uma portaria, mandando ao sr. procurador geral da corôa que conhecesse daquelle assumpto, da falta da entrega dos cadernos, e procedesse como fosse de direito. Tudo, sr. presidente, para intimidar, tudo para fazer julgar aos municipes que os homens que se propunham exercer os cargos municipaes iam entrar em processo, e não poderia vingar a sua eleição.

Ora, sr. presidente, eu não sei se o sr. procurador geral da corôa conheceu que tinha havido crime; o que eu sei é que não procedeu. É, portanto, natural que o sr. procurador geral da corôa não achasse crime porque, achando-o, a commissão de recenseamento estaria, de certo, em processo.

Sr. presidente, continuou o governo a sua obra, mandando fazer uma syndicancia repentina, e tornando de as-