O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2948 I SÉRIE - NÚMERO 74

Comemoram-se as transformações sócio-económicas profundas e os direitos e garantias alcançadas pelos trabalhadores e as suas organizações representativas.
Comemora-se o fim da guerra colonial, a condenação do colonialismo e do belicismo e a paz estabelecida com os povos das ex-colónias.
Comemora-se a esperança no ressurgimento da Pátria portuguesa e da salvaguarda da independência nacional.
Há por aí, nos meios governamentais oficiais, quem não queira estas comemorações e se sinta incomodado com elas. Houve quem aqui na Assembleia da República se pronunciasse contra esta sessão comemorativa. Há também os que gostariam que as comemorações do 25 de Abril se reduzissem a actos formais, solenes e silenciosos.
Apesar da evolução ruinosa verificada nos últimos 9 anos da vida nacional, o 25 de Abril comemora-se não como uma memória ténue, mas como uma realização viva, como uma promessa a cobrar e uma mensagem a concretizar.
Os atentados contra o espírito e as conquistas do 25 de Abril não impedem que o nosso povo celebre, em clima de luta e de festa, a arrancada libertadora dos capitães de Abril, o que deve ser entendido como uma afirmação de confiança, de que as suas realizações, objectivos e esperanças serão retomados e que existem as bases social e política para que isto aconteça.
A vida mostra com inequívoca clareza que o País se perde porque se perderam os caminhos de Abril.
Não seria nada difícil demonstrar que a situação do País em todas as áreas fundamentais - económica, financeira e social - é pior este ano do que era há 1 ano atrás e que são maiores os perigos que agora pairam sobre o regime democrático e a independência nacional. Não seria mais difícil demonstrar que assim acontecia o ano passado em relação ao anterior e assim sucessivamente, com algumas curtas pausas e retrocessos, no período dos últimos 9 anos.
Esta degradação da situação nacional, que sem exageros temos designado de marcha para o abismo, é o resultado da política dos sucessivos governos desde 1976, cuja linha essencial tem consistido na ofensiva (a princípio disfarçada e mais tarde aberta e brutal) para anular as transformações das estruturas económicas e sociais realizadas com o 25 de Abril (e o processo revolucionário que se lhe seguiu) e depois consagradas na Constituição da República, visando a recuperação para o grande capital dos seus perdidos poderes e privilégios. É hoje uma evidência para quantos queiram examinar a nossa realidade com rigor e desapaixonadamente que quanto mais se agrava esta ofensiva mais desastrosos são os resultados. Entretanto o que se ouve da parte das classes mais favorecidas e dos seus representantes governamentais e partidários é que se destrua o que resta de Abril: tudo raso na realidade e na lei, clamam.
É oportuno recordar, 11 anos depois, que os capitães de Abril preconizaram desde a primeira hora em documentos básicos unanimemente aprovados «uma nova política económica, posta ao serviço do povo português, em particular das camadas da população até agora mais desfavorecidas».
A que é que assistimos hoje em Portugal?
Assistimos a uma política económica posta completamente ao serviço das classes mais favorecidas, a quem tudo se dá e a quem tudo se perdoa. Dão-se-lhes isenções fiscais verdadeiramente majestáticas, créditos vultosíssimos, subsídios de centenas de milhares de contos por unanimidade, às vezes a fundo perdido, dão-se-lhes indemnizações, concessões e transferências, facilidades e opções, uma autêntica cruzada de espoliações de bens e capitais feitas a seu favor. Perdoa-se-lhes a falta de pagamento de salários, a falta de pagamento de impostos, a falta de pagamento à Previdência, a falta de pagamento às alfândegas, a falta de pagamento à banca nacionalizada. Raramente na história nacional se terá assistido a tamanho regabofe.
Os capitães de Abril preconizaram desde a primeira hora «uma nova política social que, em todos os domínios, terá essencialmente como objectivo a defesa dos interesses das classes trabalhadoras».
A que assistimos hoje em Portugal?
Assistimos a uma política social abertamente contrária aos interesses dos trabalhadores da cidade e do campo a quem tudo se tira e tudo se nega. Tira-se-lhes o poder de compra através da degradação dos salários reais, tira-se-lhes os postos de trabalho e agrava-se o desemprego, tira-se-lhes o próprio salário, permitindo-se que se mantenha e alastre o flagelo dos salários em atraso, exemplo vivo da injustiça social mais hedionda. Nega-se-lhes o direito ao controle de gestão, nega-se-lhes o direito de reclamar junto do Primeiro-Ministro e outras autoridades, procura-se tirar-se-lhes as garantias contra os despedimentos, o direito à greve e o próprio direito à contratação colectiva.
Da mesma forma que os trabalhadores, as classes e camadas médias sofrem os efeitos desta política social e em especial da inflação e da carga fiscal. A todos atingem duramente os cortes de verbas na saúde, no ensino, na Segurança Social e a ameaça da nova lei das rendas de habitação. Piores do que todos estão os reformados e pensionistas que vêem os seus magros rendimentos minguar todos os anos em termos reais.
Os capitães de Abril definiram desde a primeira hora uma «estratégia antimonopolista» no desenvolvimento da qual se liquidaram os monopólios e os latifúndios e se realizaram as nacionalizações e a Reforma Agrária. Hoje assistimos não apenas a uma estratégia pró-monopolista, mas a uma impudente política de restauração dos monopólios e dos latifúndios, o que quer dizer o restabelecimento do domínio e do poder económico e político sobre o País de um punhado de famílias como acontecia durante a ditadura fascista.
A vozearia que se levanta de novo pela revisão da Constituição, menos de 3 anos depois da que foi feita em 1982, constitui um álibi para disfarçar o malogro da política de direita seguida nestes últimos 9 anos, mas traduz também a sofreguidão do grande capital e das forças políticas que o representam para consumar, num momento que julgam propício, um golpe mortal contra o 25 de Abril e a sua herança.
A acção permanentemente desestabilizadora dos sectores anticonstitucionais tem como objectivo profundo não quaisquer ajustamentos da Constituição actual mas a reposição das concepções e dos métodos da Constituição de 1933.
A intolerância política e o vezo antidemocrático destes sectores reaparece cada vez mais na vida nacional em manifestações tão inconfundíveis como a proposta de lei de segurança interna, nos planos de severo condicionamento da propaganda política e partidária, na revisão da legislação eleitoral e noutros projectos de carácter inequivocamente totalitários.