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II Série — 2.º Suplemento ao número 38

Quarta-feira, 13 de Janeiro de 1982

DIÁRIO

da Assembleia da República

II LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1981-1982)

SUMÁRIO

Comissão eventual para a Revisão Constitucional:

Acta da reunião do dia II de Novembro de 1981.

Nota. — A'í esta data, sobre a reunião constitucional, além do presente suplemento, foi publicado mais o seguinte:

Suplemento ao n.° 36, de 8 de Janeiro de 1982 (e mais o suplemento que nele se indica).

COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL

Reunião de 11 de Novembro de 1981

O Sr. Presidente: [Fernando Condesso (PSD)]: — Está aberta a sessão. Creio que estamos no artigo 155.°: Não. Parece que, afinal, é o artigo 156.°:

Voz não identificada: — O artigo 155.°-A, da Frente, foi aprovado.

O Sr. Presidente: — O do MDP/CDE, duração do mandato?

Creio que há uma disposição a seguir sobre esta matéria, que não foi apreciada.

Mas o 155.°-A, do MDP/CDE, corresponde ao n.° 156.°, quer do PCP, quer da FRS.

O Sr. Nunes de Almeida: (PS): — Na sessão do último dia ficou-se no debate do artigo 152.°

O Sr. Presidente: — Tinha recebido a informação de que tinha sido o artigo 155.°, não estive cá na parte final.

Vozes: — Mas foi o artigo 155.°

O Sr. Presidente: — Portanto, vamos para o artigo 156.°, e aqui terá cabimento a discussão do artigo 155.°-A, cujo conteúdo é igual aos n.° 1 das propostas do PCP e da FRS.

Iria ler primeiro o relatório.

Pedia à imprensa, o Sr. Deputado Borges de Carvalho deve estar a chegar e, se quisessem tirar alguma...

Bom, em relação ao artigo 156.°, a FRS e o PCP propõem a alteração da epigrafe deste artigo, para "início e termo do mandato".

A AD propõe a eliminação do artigo, mas ficou na subcomissão de ponderar se manterá, ou não, essa proposta de eliminação.

Quanto às propostas da FRS e do PCP, ambas visando o mesmo objectivo, foi concretamente preferido o texto proposto pela FRS, embora tenha sido ressalvada a necessidade de harmonização com on.M do artigo 176.° Está em debate; algum Sr. Deputado pretende intervir?

Sr. Deputado Nunes de Almeida, faça favor.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Posteriormente à análise do artigo 176.°, a subcomissão verificou (suponho que a Sr.8 Deputada Margarida Salema poderá explicar melhor, na medida em que foi ela quem chamou a atenção para esse facto) que essa harmonização com o artigo 176.° implicava também alteração de redacção do próprio artigo 156.° da Constituição. E, nessa medida, verificou-se consenso na subcomissão, no sentido de neste n.° 1 do artigo 156.° se passar a referir o início e o termo do mandato dos deputados, com preferência à primeira reunião, após eleições. Isto é, que o início do mandato se verificaria na primeira reunião após eleições, de acordo com o artigo 176.° (depois se dirá o dia exacto em que essa reunião se verifica), e termina com a primeira reunião após eleições da Assembleia eleita subsequentemente.

As razões, penso que poderão ser melhor expressas pela Sr.a Deputada Margarida Salema.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: — Sr.a Deputada Margarida Salema, quer corresponder ao apelo do nosso colega Nunes de Almeida?

A Sr.a Margarida Salema (PSD): — Exacto.

O Sr. Presidente: — Faço só registar, para efeitos de gravação, que tomei a presidência agora e pedia desculpa aos Srs. Deputados do atraso, mas havia uma reunião da Comissão dos Negócios Estrangeiros, cujo presidente não está, e eu, como vice-presidente, tive que lá ir. Portanto, as minhas desculpas.

Tem a palavra a Sr." Deputada Margarida Salema.

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A Sr.a Margarida Salema (PSD): — De facto, verificou-se relativamente ao n.° 1 proposto pela FRS, que poderia haver um desfasamento entre o disposto no n.° 1 do actual artigo 176.°, relativamente ao qual nenhum partido propõe alterações, e o início e termo do mandato dos deputados. Em conformidade, e por poder verificar-se um lapso de tempo durante o qual os deputados, efectivamente, ainda não estão em efectividade de funções, ainda não têm os seus mandatos verificados e porque pode haver esse desfasamento entre o n.° 1 do 176.° e o próprio J56.°, n.° 1, tal como está proposto pela FRS, entendeu-se avançar com uma nova redacção para o n.° 1 do artigo 156.° Não sei se a redacção que eu tenho aqui é, exactamente, a correcta, mas formulava já esta nova redacção.

Ficaria mais ou menos da seguinte forma:

O mandato dos deputados inicia-se com a primeira reunião da Assembleia da República após eleições e cessa com a primeira reunião após as eleições subsequentes ou com o termo da legislatura, se este for posterior [...]

Vozes imperceptíveis na gravação.

A Sr.a Margarida Salema (PSD): — Sem prejuízo, claro, da suspensão ou cessação individual do mandato. Manter-se-ia, portanto, esta parte final.

Penso que, quando chegarmos ao artigo 176.°, n.° 1, se fará a correspondente e necessária adaptação resultante desta fórmula, embora tenhamos tido dificuldade em acertar numa redacção.

O Sr. Deputado Vital Moreira ficou de ponderar esta questão. Não sei se deixamos isto para a discussão do artigo 176.°

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — A única dificuldade que encontrámos não foi quanto a acertar esta solução — chegámos a acordo sobre ela —, mas quanto à melhor formulação para ela.

Não acho feliz a expressão "o mandato dos deputados inicia-se com a primeira reunião da Assembleia da República após eleições e termina com a primeira reunião após novas eleições", mas, de facto, não encontramos formulação mais exacta. Por mim, preferiria dizer "termina com primeira reunião da Assembleia subsequente". Também acharam que não era feliz, de maneira que ficámos de ponderar um nova redacção.

Há uma parte da redacção que a Deputada Margarida Salema referiu que não faz parte da redacção que se acordou. É um lapso. Deixa de ter qualquer sentido referir o termo, a cessação da legislatura. O critério da primeira reunião subsequente a novas eleições vale quer para o termo de legislatura, quer para as eleições por efeitos da dissolução.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Vital Moreira, se me permite uma sugestão, não se poderia, para não se estar a repetir duas vezes a "primeira reunião", dizer "o mandanto dos deputados inicia-se com a primeira reunião da Assembleia da República após eleições, cessando no mesmo momento o mandato dos deputados anteriormente eleitos", ou qualquer coisa deste género?

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Creio que esta é uma das tais questões onde a comissão de redacção se justifica e, portanto, não valia a pena perder muito mais tempo.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Amândio de Azevedo, tem a palavra.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — É, exactamente, a proposta que ia fazer. O que importa é que haja consenso quanto à ideia que deve ficar expressa neste artigo, ou seja, que o mandato se inicia e cessa no dia em que se verificam os poderes da nova Assembleia. Se essa é a ideia e se quanto a ela todos estamos de acordo, o resto é um problema de redacção. Por exemplo, adianto que se pode jogar com o facto da verificação dos poderes como se pode jogar com outras coisas.

Mas é um problema de redacção que não devia ser discutido aqui.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): — Só para dizer o seguinte: sem pôr em causa que esta questão pode ser tratada com mais proveito na comissão de redacção, chamo a atenção para o facto de continuar a haver uma hipótese não resolvida na redacção proposta. Efectivamente, pode haver uma primeira reunião da Assembleia da República depois das eleições, sem que tenham sido apurados os resultados eleitorais. Nessa altura, não podem começar os mandatos dos novos deputados, já que os resultados não foram sequer apurados.

Portanto, esta fórmula ainda não resolve os problemas que havia. Mas estamos todos de acordo em saber a solução que queremos. É, depois, uma questão de redacção.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nunes de Almeida, tem a palavra.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Peço desculpas, mas gostaria de dizer que o Sr. Deputado Veiga de Oliveira não tem razão. Esta reunião a que se refere o artigo 156.° é, necessariamente, a reunião prevista no n.° 1 do artigo 176.° E é aí, no n.° 1 do artigo 176.° respeitante à primeira reunião após eleições, que se tem de dizer quando é que ela se verifica. O nosso acordo é no sentido de que essa reunião se verificará no décimo dia após o apuramento dos resultados definitivos.

Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): — Sr. Deputado Nunes de Almeida, tem de dizer que é essa a reunião a que se está a referir. Na redacção, tal como está, afirma-se — e só estou a ler o que me disseram:

O mandato dos deputados inicia-se com a primeira reunião da Assembleia da República após eleições.

Ora, pode haver uma reunião, sendo a primeira após as eleições, da Assembleia da República, ainda em vigor, porque não foram ainda apurados os resultados eleitorais. Imagine o seguinte...

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O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Já imaginei e já vou esclarecê-lo.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): — As eleições são no domingo. Na terça-feira há necessidade de reunir a Assembleia da República, por um facto importante que obriga à sua reunião. Obviamente, na terça-feira, aquela que se reúne é a anterior. E é uma primeira reunião depois de eleições. Portanto, o Sr. Deputado terá de dizer o que quer, mas não assim.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Já percebi. A ideia que aqui temos é que esta reunião é a reunião a que se refere o artigo 176.° Então talvez seja melhor referir-se aqui, expressamente, com a reunião a que se refere o artigo 176.°

Vozes.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — É. Esta é a reunião prevista no artigo 176.° A ideia é essa.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Costa Andrade, ainda queria usar da palavra sobre este assunto? Prescinde.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Convinha fazer a conclusão.

O Sr. Presidente: — Em relação ao artigo 156.°, há consenso geral quanto à necessidade de definição precisa do início e do termo do mandato dos deputados, ficando a sua formulação...

Sr. Deputado.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Se me permitisse, diria que há consenso quanto a que seja a primeira reunião da nova Assembleia da República o facto que determina o início e a cessação dos mandatos, havendo, apenas, dificuldades quanto à fórmula que traduza fielmente esta ideia.

O Sr. Presidente: — A comissão adopta a conclusão agora expressa pelo Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

Artigo 157.°: Há apenas uma proposta de alteração, apresentada pelo MDP/CDE, que não obteve acolhimento de nenhum dos outros partidos, ficando, no entanto, todos eles de reponderar o sistema de incompatibilidade previsto.

Srs. Deputados, em discussão.

Srs. Deputados, se nenhum dos partidos fez, até ao momento, essa reponderação, mantendo-se as posições...

Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Presidente, o problema que se levantou na subcomissão, sem haver qualquer proposta particular nesse sentido, nem qualquer compromisso de quem falou nessa questão, foi a possibilidade de retomar o problema de saber se hoje tem sentido manter a incompatibilidade geral entre o exercício da função de deputado e o exercício de funções públicas.

Como o problema foi levantado sem prévio alerta na subcomissão, ficou cada um dos seus membros de ponderar esse tema.

Pela minha parte, creio que vale a pena pensarmos um bocado sobre se tem sentido esta incompatibili-

dade geral e repensar todo o problema das incompatibilidades de exercício de função entre a função de deputado e outras funções públicas.

Estaríamos, pois, abertos a pensar o problema em termos completamente diversos daqueles que hoje estão na Constituição, mas, como não houve, até agora, proposta nenhuma nesse sentido e o MDP/CDE não reformulou a sua neste sentido, não seremos nós a levantar o problema, se não houver uma prévia discussão descomprometida sobre este tema.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): — Também para, fundamentalmente, corroborar as palavras do Sr. Deputado Vital Moreira. Aliás, não tenho ideia clara com que constitucionalidade é que a actual lei dos deputados permite, por exemplo, que os professores universitários dêem aulas gratuitamente. Tenho para mim que a solução é boa. Num país onde a qualidade e o número de professores universitários não abundam, é de toda a conveniência —não vejo que seja minimamente incompatível, até em termos políticos — que possam dar aulas, exercendo a função científica ou investigar (investigação que está ressalvada na actual lei dos deputados) e exercer o mandato dos deputados.

Penso que a actual lei dos deputados é um bocado clandestina do ponto de vista da constitucionalidade. Parece-me, pelo menos até melhor estudo, que é materialmente inconstitucional, uma vez que os deputados podem ser professores universitários. A lei diz que podem e o problema que coloco é o de saber em que medida é que é compatível com o texto da Constituição vigente.

Quanto à solução de os professores poderem leccionar e investigar, ela parece-me boa, tanto mais que, ao contrário do que acontece com outros casos análogos, como da Comissão Constitucional, onde os professores universitários vencem efectivamente pelos dois lados...

Voz não perceptível do Sr. Jorge Miranda (ASDI).

O Sr. Costa Andrade (PSD): — Sr. Deputado Jorge Miranda, esse é o caso concreto do Sr. Deputado, mas não é por acaso que a ici da Comissão Constitucional, quando refere as incompatibilidades, adoptou um texto igual ao dos deputados e tirou a palavrinha "gratuito". Essa palavra não está na lei da Comissão Constitucional. Os membros da Comissão Constitucional, legalmente, vencem, e não estou a revelar ilegalidade nenhuma. Há professores que estão a vencer (pelo menos em Coimbra) em termos perfeitamente abertos e normais, pagos pela contabilidade pública.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nunes de Almeida, é para uma interrupção?

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Sr. Deputado Costa Andrade, peço desculpa, mas gostaria de fazer um esclarecimento, para não haver dúvidas. A Lei Orgânica da Comissão Constitucional insere uma norma idêntica à da Constituição, na qual se proíbe o exercício de qualquer função pública ou privada remunerada. Pública ou privada, repito. Vai mais longe do que a Constituição, pois é idêntica à que existe para os juízes.

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Depois existe um decreto regulamentar que veio permitir o exercício da função docente universitária. Nomeadamente em todas as escolas de Lisboa, a interpretação que foi feita doi no sentido de que isso não alterava a proibição do exercício remunerado. Portanto, ninguém recebeu, nem o Dr. Jorge Miranda, nem eu, enquanto lá estivemos. Enquanto que, em Coimbra, a interpretação foi dada de forma diversa, e recebem. Mas, também aí, há um problema duvidoso da compatibilidade, não já com a Constituição, mas da compatibilidade do decreto regulamentar com a própria lei. É idêntico ao que hoje existe entre a Constituição e a lei para os deputados. Note que o problema é idêntico.

O Sr. Costa Andrade (PSD). — Sr. Deputado Nunes de Almeida, compreenderá que não estou aqui a fazer acusações, estou a expor o direito, tanto o que está na lei como o que se regista na prática. Fiquei a saber que interpretação, em Lisboa, é diferente. Mas isso não vem ao caso.

Tenho para mim que a solução de os professores universitários continuarem a trabalhar e a fazer investigação científica, sobretudo estando cobertos por essa exigência da gratuidade, se deve fazer. Portanto, retomando a observação do Sr. Deputado Vital Moreira, devíamos ponderar, ligeiramente, o problema das incompatibilidades.

Mas não será da nossa parte que serão levantados problemas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, esta figura das incompatibilidades é tradicional no direito constitucional dos mais diversos países.

Costuma distinguir-se entre incompatibilidades de interesses e incompatibilidades de cargos. Quer num caso, quer noutro trata-se de fixar um determinado conjunto de condições, sob a forma positiva ou sob forma negativa, destinadas a garantir a independência dos deputados relativamente ao exercício do cargo em que ficam investidos. A garantir a independência dos deputados e, portanto, através dela, a independência do Parlamento.

A Constituição de 1976, ao contrário das constituições anteriores, não previu incompatibilidades de interesses, mas ainda previu incompatibilidades de cargos — as que constam do artigo 157.°, no entanto, segundo um modo que, quer a experiência quer a leitura do próprio preceito do artigo 157.°, mostram não ser perfeito è carecer de melhoria.

Basta ver que, quanto ao n.° 1, surgiram bastantes dificuldades de ordem prática, no respeitante ao exercício de funções docentes e outras funções (por exemplo, de investigação científica) e logo a Lei n.° 5/76, o Estatuto dos Deputados, teve de o derrotar ou, então, noutra interpretação, teve de criar as bases para o aparecimento de um costume constitucional contra legem. Por outro lado, a mesma Lei n.° 5/76, a respeito do n.° 2, teve de acrescentar numerosas outras incompatibilidades. O exercício do cargo de deputado é incompatível não apenas com o cargo de ministro mas também côm o de membro da Comissão Constitucional, com o de Provedor de Justiça, com o de Presidente da República, etc, etc...

Para não me alongar demasiado, tendo em conta essa experiência e tendo também em conta os problemas que aqui já foram postos, eu formularia, a título puramente pessoal, uma proposta para o artigo 157.°: o n.° 1 seria, pura e simplesmente, eliminado; o n.° 2 passaria a n.° 1, não porque as incompatibilidades a respeito das funções do Governo sejam as únicas, mas porque importa consagrá-las explicitamente na Constituição, por contenderem com o sistema de governo, por serem uma nota característica da natureza não parlamentar do sistema de governo português. E finalmente, haveria um n.° 2 em que se diria: "A lei determina as demais incompatibilidades." Haveria uma cláusula aberta em matéria de fixação de incompatibilidades.

Deve dizer-se que é este o regime que aparece numa série das constituições estrangeiras que estive a percorrer. Por exemplo, na Constituição Italiana de 1947, na Constituição Alemã de 1949, na Constituição Francesa de 1958 e na Constituição Espanhola de 1978.

Haveria uma fixação, desde já, em relação aos membros do Governo, não por se querer esgotar a matéria das incompatibilidades, mas por ser matéria definidora do sistema de governo e, depois, haveria uma remissão para a lei, que seria, naturalmente, o Estatuto dos Deputados.

Era isto que sugeriria.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, estamos perante uma proposta concreta do Sr. Deputado Jorge Miranda. Creio haver o acordo da parte dos partidos da AD. O PCP também estaria de acordo?

Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Como resultou da minha primeira intervenção, seria nesse sentido que apontaria uma eventual proposta nossa. Creio que, sem prejuízo de uma consideração ulterior, pode, também da nossa parte, considerar-se a aprovação de uma proposta deste tipo.

O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados do PS manifestam também o seu acordo.

Srs. Deputados, há ainda 4 inscrições sobre este artigo.

Sr. Deputado Almeida Santos, temos ainda 4 inscrições.

O Sr. Almeida Saníos (PS): — Sr. Presidente, não abdicaremos de sermos nós a dizer em que sentido nos manifestamos.

O Sr. PiísídenJe: — Sr. Deputado, peço desculpa, mas foi uma informação dada pelo seu colega Nunes de Almeida.

Faz favor, Sr. Deputado

O Sr. ACmsJda Saníos (PS): — É uma simples precisão. Vai no sentido de que, em princípio, estamos de acordo. Simplesmente não quereríamos, neste momento, abdicar da possibilidade de uma manifestação posterior, já que gostaríamos de repensar o problema.

O caso é este: ou vamos para uma proibição genérica de acumulação de funções, que é uma solução clara, ou caímos numa solução que tem muito de casuístico e em que parece que só a lei ordinária poderá contemplar as dificuldades do problema.

Estamos abertos à solução, mas gostaríamos de reservar a nossa posição para um momento ulterior.

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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Amândio de Azevedo, tem a palavra.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — A proposta do Sr. Deputado Jorge Miranda não anda longe daquilo que quereria propor, só com uma diferença. Tenho dúvidas sobre se será útil eliminar o n.° 1 e este princípio que é tradicional e que me parece, geralmente, correcto. As únicas dificuldades que levanta o n.° 1 residem no campo do ensino, em que se reconhece que os professores podem continuar a exercer a sua função. Portanto, podia resolver-se o problema ou através de uma excepção ao n.° 1, limitada a esse campo. Também queria propor que se previsse o alargamento, nomeadamente por lei, das incompatibilidades previstas no n.° 2 a embaixadores, governadores civis, etc.

Estou de acordo em que é preferível reservar para a lei essa matéria. Tenho, porém, dúvidas de que baste a Constituição referir-se a um caso particular, aos membros do Governo, e no resto ser a lei a regular. A técnica não me parece perfeita.

Todavia, este aspecto não impede que esteja inteiramente de acordo quanto ao fundo e o sentido da proposta, só não tomando já uma posição definitiva, na medida em que ela é inútil depois de o PS ter anunciado que pretendia repensar esta matéria. Nos faremos o mesmo, uma vez que não há qualquer utilidade em emitir desde já uma posição vinculativa, mas com indicação de que estamos muito abertos à ideia que está na base da proposta do Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. Artíónio Monteiro Taborda (MDP/CDE): — Como se verifica da proposta de alteração do MDP/CDE, a ideia era de alargar o sentido das incompatibilidades dos deputados, para além de outras pessoas colectivas públicas, a outras entidades de natureza pública, para abranger as empresas nacionalizadas, etc.

Quanto ao problema de fundo e à nova proposta apresentada pelo Sr. Deputado Jorge Miranda, também entendemos que era preferível que essas incompatibilidades fossem, desde já, definidas na lei constitucional. Admitimos, porém, que elas possam vir a ser reguladas na lei geral sempre com a reserva de se ver uma outra posição, mas, fundamentalmente, com esta precisão: seria sempre da matéria exclusiva da Assembleia da República, e nunca matéria delegável.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — O CDS dá o seu acordo à formulação feita pelo Sr. Deputado Jorge Miranda. Parece-me importante que o n.° 2 actual passe a n.° 1, porque isso tem, de facto, a ver com o sistema de governo e com a natureza não parlamentar do sistema consagrado na Constituição. Quanto aos restantes casos de incompatibilidade, parece-me que qualquer sistema que quiséssemos formular ou seria muito genérico, como dizia o Sr. Deputado Almeida Santos ou, então, seria impossível que a previsão da norma abrangesse todas as hipóteses. Sendo assim, o melhor é fazer uma reserva aberta para a lei.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não há mais inscrições sobre este assunto.

Verifica-se quanto ao artigo 157.° uma nova proposta alternativa do Sr. Deputado Jorge Miranda, no sentido da eliminação do n.° 1, passando o n.° 2 a n.° 1 e acrescentando-se um n.° 2, remetendo as incompatibilidades para lei geral.

Esta proposta obtém o acordo do CDS, o acordo, na generalidade, do PSD, que coloca a dúvida se será, ou não, de eliminar o n.° 1, reservando a sua posição para momento posterior.

O PS, o PCP e o MDP/CDE, manifestando também o seu acordo de princípio, reservam a sua posição após reflexão que venha a fazer sobre o assunto.

Srs. Deputados, quanto ao artigo 158.°, não há propostas de alteração.

No artigo 159.° a AD propõe uma alteração à alínea a), a qual não mereceu oposição de nenhum dos outros partidos, embora os representantes do PCP e do MDP/CDE não lhe tenham reconhecido utilidade.

Quanto à alínea c), há o aditamento da palavra "obter", proposta pela AD e pela FRS. Mereceu consenso geral. Dá-se, portanto, como adquirido, se não houver alteração de posições.

A AD acrescenta ainda uma referência ao "segredo de Estado", na alínea c), que mereceu a oposição de todos os outros partidos. Não vem aqui referido o MDP/CDE, mas creio que devia estar.

Srs. Deputados, quanto a este primeiro ponto controverso, algum dos Srs. Deputados quer usar da palavra?

O Sr. Deputado Luís Beiroco, tem a palavra.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — Proporia uma apreciação global do artigo. O meu partido está perfeitamente disposto a deixar cair o inciso "sem prejuízo da salvaguarda do segredo de Estado, nos termos da lei", e a aceitar a alínea d) proposta, no n.° 2, pela FRS. Se estas duas propostas pudessem ser aceites pelas outras forças políticas, consideraríamos este artigo definitivamente encerrado.

O Sr. Presidente: — Portanto, o CDS deixa cair a proposta relativa ao segredo de Estado e adopta a alínea d) da FRS. É isto Sr. Deputado?

Sr. Deputado Amândio de Azevedo, faz favor.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Para facilitar, estou de acordo com a proposta do Sr. Deputado Luís Beiroco, com a observação de que o aditamento final à alínea c), embora considere evidente que haveria vantagem que ele cá estivesse, se não estiver, é mais que evidente que há realidades que se sobrepõem a quaisquer fórmulas. É uma evidência que estes valores têm de ser sempre salvaguardados. Penso que não seria errado cá ficar, mas também não haverá problema se não ficar.

A minha dúvida a este respeito é a de saber se a alínea d) proposta pela FRS deve figurar no elenco dos poderes dos deputados, se no elenco dos poderes dos grupos parlamentares. À partida parece-me que seria preferível que as comissões parlamentares de inquérito, pela relevância de que se revestem, constituíssem poderes de grupos parlamentares e não de deputados isolados. E essa a única dúvida que tenho.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Carrapato.

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O Sr. Almeida Carrapato (PS): — Sobre a alínea a), não compreendo uma referência específica a projectos de lei de revisão constitucional. Porquê uma referência expressa a estes projectos de lei de revisão constitucional, se a referência genérica que já cá está abrange esses mesmos projectos de lei? Afigura-se-me, portanto, que essa referência expressa, se não é inútil, é, pelo menos, excrescente.

No entanto, claro, isto não é uma questão de fundo.

O Sr. Presidente: — Se faz favor, Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Apenas queria fazer um aditamento à minha intervenção. Tal como supunha, a alínea e) do artigo 183.° enumera nos poderes dos grupos parlamentares exactamente "requerer a constituição de comissões parlamentares de inquérito". Pela minha parte, penso que se não deve alterar esta disposição e, nessa medida, não concordaria com a alínea d) proposta pela FRS.

Penso que também a FRS concordará que talvez não haja vantagem.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Dois pontos, Sr. Presidente. O primeiro também é em relação à alínea a) e sobre a mesma questão que foi suscitada pelo meu camarada Almeida Carrapato. Suponho que, a fazer-se expressa referência aos projectos de revisão constitucional, nunca se poderá falar em projectos de lei de revisão constitucional. Há projectos de revisão constitucional, o que é completamente diferente, já que os projectos de revisão constitucional são o somatório de alterações à Constituição. Não se vota uma lei de revisão constitucional. Nessa medida, a terminologia aqui utilizada é tecnicamente incorrecta. Portanto, a ficar uma expressa referência — cuja utilidade coloco em dúvida, na medida em que a propósito da revisão constitucional há uma expressa referência —, nunca se poderá falar em projectos de lei de revisão constitucional, mas sim em projectos de revisão constitucional.

Quanto à questão da alínea d), Sr. Deputado Amândio de Azevedo, não é nossa intenção que através dela qualquer deputado individualmente considerado possa requerer a constituição de comissões parlamentares de inquérito. Esta alínea d), que nós aqui temos, está conjugada com uma proposta de alteração que vem mais adiante, onde se prevê que seja um certo número (no nosso caso, um quinto dos deputados em efectividade de funções) que possa requerer a constituição de comissões parlamentares de inquérito, até com certos efeitos. Portanto, o que existe é um regime distinto para as comissões parlamentares de inquérito requeridas por grupos parlamentares, que seguem uma fórmula diferente das comissões parlamentares de inquérito requeridas por grupos de deputados.

Faz favor, Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Estive aqui a ver as propostas da FRS ao artigo 183.° e não vejo a proposta de eliminação da alínea é). Pergunto se não terá havido aqui, ou, melhor, se a FRS terá tido em conta que este poder está no elenco dos poderes dos grupos parlamentares. Isto porque a questão que põe também tenho consciência dela, até porque já a tra-

támos na subcomissão. Portanto, o problema consiste no seguinte: há razões para passar a competência dos grupos parlamentares para a competência dos deputados, para depois vir exigir requisitos que vão muito para além, até, dos grupos parlamentares? É a pergunta que eu faço.

O Sr. Numas de Almeida (PS) — Sr. Deputado, não sei se será este o momento adequado para avançarmos na discussão que foi travada em subcomissão sobre esta matéria. Mas a questão que nessa altura se discutiu é que haveria dois tipos de requerimentos para a constituição de comissões parlamentares de inquérito: as requeridas pelos grupos parlamentares, que implicariam sempre uma deliberação da Assembleia da República por maioria, para que elas se pudessem constituir, e as comissões parlamentares de inquérito requeridas por um mínimo de deputados, (um quinto na nossa proposta, se bem me recordo, dois quintos na proposta do PCP), que implicariam, automaticamente, a constituição dessa comissão. Se bem me lembro, a posição da AD na subcomissão era de reservar a sua posição sobre esta matéria, admitindo, eventualmente, o princípio de vir a aceitar uma solução deste tipo, desde que existissem outros limites a esta capacidade de requerer comissões parlamentares de inquérito. Mas, se isso é assim, tem que ficar aqui uma alínea d), que dê abertura, depois, à regulamentação deste processo, independentemente de saber qual ele é.

Faz favor, Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Aunando de Azevedo (PSD): — Se não estou em erro, no artigo 159.° estão poderes dos deputados que são todos eles susceptíveis de ser exercidos individualmente, parecendo-me que isso é importante. Portanto, penso que não deveriam pôr-se aqui outros poderes, e o facto de se dizer que são poderes dos grupos parlamentares requerer comissões parlamentares, de inquérito não impede que na norma sobre as mesmas comissões se preveja a possibilidade de elas serem requeridas por um número X de deputados. É que isso já não constitui poderes de deputados, mas poderes já, de um conjunto de deputados. Preferia talvez não incluir aqui a alínea d). Todavia, não é uma questão que considere ...

O Oracor: — Sr. Deputado, por exemplo, as*moções a que a AD faz referência na alínea a) abrangem, nomeadamente, as moções de censura. E estas tèm de, em certos casos, ser requeridas por um determinado número mínimo de deputados.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso.

O Sr. Fernando Condesso (PSD): — Sr. Presidente, gostaria de me referir a esta questão das comissões parlamentares, mas, antes, gostaria também de dizer o seguinte: em relação à alínea c), parece, de facto, que a ressalva feita no fim, na proposta da AD, será óbvia. De qualquer maneira, esta proposta da AD era uma proposta de coinjunto, no sentido de obrigar o Executivo a responder. Mas, por isso mesmo, se teve a preocupação de ressalvar o inciso final "às matérias de segredo de Estado". Ao não se aceitar este inciso final, no fundo toda a redacção está em causa.

Mas, ultrapassando isto, gostaria de dizer, em relação às comissões parlamentares de inquérito, que, efectivamente, o PS constrói, um sistema duplo. Um sis-

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tema segundo o qual os grupos parlamentares podem requerer a constituição de comissão parlamentar de inquérito e, conforme disse o deputado Nunes de Almeida, esse requerimento, feito pelos grupos parlamentares, para passar, terá realmente que ser votado, tomando aí a maioria uma posição decisiva. Mas, depois, há um outro esquema, segundo o qual (sendo isso também usual noutras constituições, por exemplo a Constituição Alemã fala em um quarto e aqui, pois, seria um quinto), desde que o requerimento de constituição seja feito por um número x de deputados — por parte da oposição —, a constituição seria obrigatória. Para já, diria que este sistema dual, este sistema duplo, no fundo, tira interesse ao esquema do requerimento através dos grupos parlamentares, na medida em que costumam ser (e é lógico que assim seja) as oposições a requerer as constituições dos grupos parlamentares de inquérito, e, efectivamente, se têm à sua disposição um esquema que faz com que essa mesma constituição fuja, numa deliberação da maioria, nunca vão servir-se daquele esquema. Parece-me, assim, que, no fundo, este esquema duplo não terá razão de ser.

De qualquer maneira, gostaria ainda de dizer que o esquema usado actualmente, que é o esquema de dar a requerer estas comissões parlamentares, passando, depois, por uma deliberação da maioria, tem funcionado. Parece-me que, realmente, não deveria consagrar-se agora aqui, este esquema duplo, pretendido pela FRS.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Quanto à alínea a), nós mantemos a posição que tínhamos na subcomissão de que, na verdade, não tem qualquer utilidade a alteração. Mas não é pelo nosso lado que ela deixa de fazer-se, independentemente da questão das leis de revisão constitucional (na verdade, elas são o resultado de um conjunto de propostas de alteração, sendo, portanto, uma lei especial, nesse sentido); independentemente disso, a questão de alteração da alinea a) não nos parece susceptível de grande argumentação, nem a favor, nem, do nosso lado, contra.

Já é mais importante a questão da alínea d), e creio que aqui há uma confusão enorme, porque uma coisa é saber quem toma a iniciativa dos inquéritos parlamentares e outra é saber qual é o seu regime de desencadeamento. Já hoje é assim: os inquéritos parlamentares, segundo a lei, podem ser pedidos por grupos parlamentares ou por conjuntos de deputados. Já hoje é assim. Isto não está nada ligado nem à proposta nová da FRS, nem à nossa proposta, que é idêntica nesse sentido.

Segundo a lei actual, os inquéritos parlamentares podem ser requeridos seja por grupos parlamentares, seja por conjuntos de deputados, sendo depois deliberados pela Assembleia.

O novo regime proposto pela FRS, e também por nós, segundo o qual possa haver inquéritos parlamentares automáticos, uma vez preenchidas certas condições, nada tem a ver com este poder que aqui está em causa, que é apenas o de saber quem é que o pode requerer. O facto de os grupos parlamentares o poderem fazer não impede (não sendo a lei nesse aspecto inconstitucional) que também os deputados possam requerer. Já hoje existe esse poder e trata-se apenas de explicitar, ou não, constitucionalmente esse poder.

Aliás, o facto de os grupos parlamentares o terem não impede, de modo algum, que os deputados o pudessem ter também. Já hoje a Constituição atribui cumulatiamente poderes como o das moções de censura a grupos parlamentares, por um lado, e a conjuntos de deputados, por outro. Compreende-se porquê. E então, nos grupos parlamentares compreende-se ainda, por maioria de razão, que, além destes, possam também conjuntos de deputados requerer os inquéritos parlamentares. Às vezes nestes, está mesmo em causa a honorabilidade das pessoas, tendo havido até já um inquérito que tinha por fundamento a defesa da dignidade de uma pessoa que, por acumulação, era deputado. E compreende-se perfeitamente que aí, inclusivamente nesses casos, sejam os deputados como tais, e não os respectivos grupos parlamentares, a requerer.

Portanto, gostaria de dizer duas coisas: primeiro, que isto não tem nada a ver com um novo regime proposto pela FRS e pelo PCP. Mesmo que ele não venha a ser aprovado, a questão de saber quem é que pode iniciar inquéritos parlamentares continua a ter interesse, sendo independente e autónoma desta outra questão. Em segundo lugar, da nossa parte, deve cons-titucicnalizar-se o actua) regime legal (que não precisa expressamente de ser constitucionalizado, mas seria conveniente que o fosse), até porque nos inquéritos parlamentares se justifica, muitas vezes, que sejam os deputados como tais, e não os respectivos grupos parlamentares, a tomar essa iniciativa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): — A intervenção do deputado Condesso, do PSD, tirou conteúdo útil à intervenção que desejava fazer, fundamentalmente sobre a expressão "e obter", que a proposta da AD incluía. Como o deputado Condesso acaba de dizer, em nome do PSD, da nossa parte tudo isto fazia um sentido. O último inciso "sem prejuízo da salvaguarda dos segredos de Estado, nos termos da lei", fazia sentido conjugado com o "requerer e obter". Deixado cair o inciso final, também não tem sentido, do nosso ponto de vista, a manutenção do "obter", e, por isso, da parte do PSD, a queda da proposta em relação à alínea c) é integrá-la, como o deputado Condesso já afirmou.

Quanto à iniciativa da revisão constitucional, o que o Sr. Deputado Carrapato disse é inteiramente correcto, não é necessário. É uma questão, no fundo, puramente emblemática, no elenco dos direitos dos deputados, com esta formulação, ou com a correcção feita pelo deputado Nunes de Almeida. A verdade é que já é assim, por força do artigo 288.°, segundo o qual, a iniciativa da revisão compete aos deputados. Portanto, não vale a pena arranjar questões e o melhor é deixar isso para a Comissão de Redacção.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Luís Beiroco, está inscrito, quer usar da palavra?

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — Quanto à questão da alínea c), considero que o "obter" não está necessariamente ligado, ao inciso final "sem prejuízo da salvaguarda do segredo de Estado, nos termos da lei". Considero que no actual texto constitucional fica, de certo modo, na disponibilidade do Governo responder, ou não, aos pedidos que lhe são formulados pelos deputados. E entendo que isto devia ser corrigido,

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porque o Governo deve responder. É evidente que a questão final é outra. E aí o que penso que está em causa é saber se deve, ou não, consagrar-se na Constituição a salvaguarda do segredo de Estado, que creio que já existe — e que ninguém tem dúvidas que existe —, mesmo que não esteja aqui expressamente consagrada. Mas isso não tem nada a ver com o dever que o Governo tem de responder às solicitações que lhe são feitas pelos deputados. Portanto, penso, pela minha parte, que se pode manter o "obter" sem se consagrar o inciso final da salvaguarda do segredo de Estado.

Quanto à questão da faculdade de os deputados poderem requerer os inquéritos parlamentares, penso que o Sr. Deputado Vital Moreira tem razão quando diz que uma coisa é consagrar-se a faculdade de requerer, outra coisa é, depois, ver as consequências que decorrem desse requerimento e os regimes, que podem ser diversos, para os requerimentos feitos por grupos parlamentares ou por deputados, questão que será adiante discutida. Em todo o caso, quero deixar já aqui, apenas como reflexão, que sendo, de facto, o instituto dos inquéritos parlamentares um instituto típico dos poderes de fiscalização do Parlamento, é evidente que se deixarmos este instituto apenas na disponibilidade, da maioria, obrigando a que para que o inquérito se realize haja uma deliberação da Assembleia, é evidente que ele perde muito da sua eficácia prática, como, aliás, tem sucedido, de certo modo, em Portugal. Penso que é preciso encontrar uma fórmula que, permitindo a existência de inquéritos sem necessidade de deliberação da Assembleia da República, simultaneamente crie condições para que não haja uma proliferação de inquéritos, o que, evidentemente, conduziria a que a sua relevância politica desaparecesse, com o resultado de que aquilo que se quer consagrar, que são os poderes de fiscalização do Parlamento, esse intento, acabasse, em suma, por ser frustrado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Algumas notas, bastante breves, a respeito destas várias alíneas.

A primeira reporta-se à proposta da AD, da referência, aqui, dos projectos de revisão constitucional. Julgo que se justifica amplamente a consideração, em sede de poderes fincionais dos deputados, da iniciativa da revisão. Essa iniciativa é reservada aos deputados pelo artigo 288.°, não havendo nenhum projecto de revisão que modifique essa iniciativa. Se há poder importante dos deputados, o mais importante deles é, naturalmente, o poder de propor modificações da Constituição. Portanto, estou de acordo, inteiramente, com a referência à iniciativa de revisão, no artigo 159.°, que iria mesmo mais longe, ao ponto de sugerir que fosse uma alínea, apenas, para a iniciativa da revisão.

Estou também de acordo com o deputado Nunes de Almeida e com o deputado Vital Moreira quanto à necessidade de se dizer "projectos de revisão" e não "projectos de lei de revisão", pelos motivos que apontaram. Mas chamo a atenção, já agora, para a necessidade de, mais para a frente, modificarmos o artigo \69.°, em que, a respeito da forma dos actos da Assembleia da República, se fala em "lei constitucional" para designar o aglomerado das alterações à Constituição, resultantes de votação da revisão constitucio-

nal. Aí à frente julgo que não deveria falar-se, propriamente, em lei constitucional.

Quanto à alínea c), acerca do pedido ao Governo de informações, julgo, ao contrário do que disse o deputado Luis Beiroco, que há hoje a fórmula, ao falar "em requerer", postula, necessariamente, o direito de obter. Não teria sentido os deputados terem o poder de requerer, se não tivessem, também, o poder de obter. Um qualquer governo que não forneça aos deputados aqueles elementos úteis para o desempenho do seu mandato, que eles requeiram, está a violar a Constituição. No entanto, o frisar-se, como acontece nos projectos da AD e da FRS, que há o direito de obter é útil, exactamente, para tirar essas dúvidas e para tornar patente que os governos estão vinculados a fornecer esses elementos de que os deputados carecem.

Quanto à alínea d) proposta pela FRS, nada mais tinha a acrescentar àquilo que disse o Sr. Deputado Luís Beiroco. As suas observações foram inteiramente pertinentes. Para que os inquéritos parlamentares possam ter utilidade, hão-de poder, em certos casos, sem banalização, ser realizados independentemente da votação. Mas também há inquéritos, como sugeriu o Sr. Deputado Vital Moreira, em que pode justificar-se amplamente que a sua iniciativa pertença a deputados e não a grupos parlamentares. Pode haver inquéritos que digam respeito a comportamentos, a situações, a factos atinentes a certos e determinados deputados, em que é a sua honra que os leva a pedirem inquéritos. E são eles, deputados, e não os grupos parlamentares, os interessados na sua concretização. Portanto, como disse o deputado Vital Moreira, uma coisa é requerer, outra coisa é obter inquéritos. O facto de aqui se consagrar um poder dos deputados de requererem inquéritos não prejudica a outra questão, que é a de saber em que condições certos inquéritos podem ser obtidos, independentemente da votação por maioria no Parlamento.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Almeida Santos, tem a palavra.

O Sr. Ateeida Santos (PS): — Estou basicamente de acordo com as últimas intervenções. Penso, quanto à alínea a), que talvez tivesse dignidade, de facto, que se pudesse autonomizar o direito de apresentar projectos de revisão constitucional, o que me parece que será adquirido, uma vez que a referência à lei não é correcta. Quanto ao resto deixaria a fórmula actual. Parece-me que, na verdade, é uma fórmula bastante económica. Tem tudo o que está aqui e não esqueçamos que no corpo do artigo se diz "além cfos que foram consignados no Regimento". Portanto, a moção, as alterações, e, então, por que não, as substituições e não sei mais quê?

A referência à deliberação interna não a entendo. Parece-me que todas as deliberações ou são todas intensas ou são todas para ter eficácia externa. Não vejo, também, a necessidade de qualificativo aqui.

Quanto ao "obter", parece-me uma precisão útil. Vou no sentido do Dr. Luís Beiroco e do Dr. Jorge Miranda, no sentido de que a faculdade de requerer sem a garantia de obter coisa nenhuma não é nada. Ê estar a falar no ar. Também me parece não ser necessário pôr aqui a salvaguarda do segredo de Estado. Ela está, obviamente, implícita. Aliás, nem se pode definir o que é segredo de Estado. Teríamos de o definir, e, se fossemos por essa via, nunca mais che-

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gávamos a acordo. De modo que o melhor é não pormos cá nada.

Quanto à alínea d) proposta pela FRS, tenho a impressão que tem de ficar um pouco para depois de assentarmos agulhas em matéria de quem tem direito de requerer e qual a votação necessária para uma comissão parlamentar.

Se concordassem, dávamos agora por assente que os deputados, em princípio, teriam este direito. Depois se veria em que termos é que podia ser exercido.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo,

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Começo por dizer que estou de acordo com o Sr. Deputado Almeida Santos. Tudo ponderado, talvez não haja necessidade de alterar uma virgula sequer do artigo 159.° Quando muito, penso que, pela dignidade de que se reveste, se pode inserir aqui — aceito, neste caso, que o Sr. Deputado Jorge Miranda consiga ver a sua proposta aprovada — uma nova alínea para as leis de revisão constitucional.

Queria aproveitar a oportunidade para fazer 2 comentários muito breves. Quanto aos inquéritos, tem de ser tudo ligado e, a propósito da norma que há--de prever as possibilidades de se requererem inquéritos e as condições em que eles possam, eventualmente, ser obrigatórios, tudo deverá ser considerado na norma constitucional que se refere a este problema. Queria, porém, dizer, desde já, que não acompanho as considerações do Sr. Deputado Luís Beiroco quando diz que os inquéritos perdem muita força se estiverem na disponibilidade da maioria. Até sou capaz de concordar com isto, mas tenho de dizer, logo a seguir, que também pode haver graves inconvenientes para a hipótese em que os inquéritos estejam na disponibilidade das minorias.

Tudo isto tem de ser objecto de grande reflexão, que, naturalmente, terá melhor lugar — como, aliás, já teve na subcomissão — na norma que estipular as condições em que os inquéritos parlamentares podem ser requeridos.

Muito obrigado.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não há mais inscrições. Vou tentar resumir: quanto à alínea a), • ficou adquirido que seria de referir os projectos de revisão constitucional, e não projectos lei, em alínea própria, a deliberar pela Comissão de Redacção.

Quanto à referência ao segredo de Estado, a AD deixou cair esta proposta, estando, portanto, este problema ultrapassado.

Quanto à referência à palavra "obter", na alínea c), tanto a ASDI como o PS se manifestaram a favor. O PCP também não vê inconveniente em que seja acrescentada a expressão "obter" a seguir a "requerer".

Quanto à alínea d) proposta pela FRS, há acordo em que este assunto venha a ser estudado mais em profundidade quando se referirem as condições em que os inquéritos parlamentares podem ser requeridos e obtidos. Há, porém, desde já abertura da parte das diversas forças políticas no sentido da aceitação do princípio contido na alínea d) proposta pela FRS.

Se não há nenhuma observação a esta tentativa de resumo ...

Faz favor, Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, suponho que da parte do CDS houve claro acordo em

que ficasse consagrado este poder, independentemente de tudo o resto.

O Sr. Presidente: — Da parte do CDS houve total acordo. Da parte do PSD o acordo não foi expresso, embora haja abertura para a consideração do problema.

Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

' O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Se rrie permite, vou esclarecer. A nossa última posição é a de que, tudo ponderado, estamos de acordo com o deputado Almeida Santos. Portanto, o artigo fica como está. Retiramos as nossas propostas e não apoiamos nenhuma proposta de alteração, a não ser a introdução de uma alínea sobre os projectos de revisão constitucional.

Intervenção inaudível do Sr. Deputado Almeida Santos (PS).

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, estava-me a referir à alínea d): «Requerer a constituição de comissões parlamentares de inquérito.»

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Essa questão deixamo-la para o artigo que versa esta matéria.

O Sr. Presidente: — Foi exactamente isso que disse. O Sr. Deputado Veiga de Oliveira chamou a atenção para que havia uma nuance entre a posição do CDS e do PSD. Enquanto a posição do CDS é de aceitar a proposta da FRS, embora em sede posterior a possa vir a sujeitar a alterações, a posição do PSD é de considerar o problema em bloco nessa ocasião e não fazer nenhuma aceitação de princípio. E exactamente a mesma posição em relação à expressão "obter".

Srs. Deputados, artigo 160.° Há uma proposta da AD, de ordem meramente sistemática, que consiste em fundir o artigo 160.° com os actuais artigos 161.° e 162.° Além disso, propõe uma alteração no artigo 161.°, consistente na substituição do termo "serviço cívico" por "serviço nacional".

A subcomissão não fez qualquer comentário a estas alterações. Portanto, Srs. Deputados, se ninguém quer acrescentar nada, passaríamos ao artigo 161.°

Voz não audível.

Sr. Deputado, como as alterações propostas são de ordem sistemática e se referem à integração dos artigos 161.° e 162.° neste, parece que...

Sr. Deputado Almeida Santos, tem a palavra.

O Sr. Almeida Santos (PS): — Só para dizer o seguinte: os problemas sistemáticos ficam para depois, embora, em princípio, sejamos desfavoráveis à criação de buracos na Constituição. Ora, uma eliminação sistemática de artigos desfigurava a Constituição.

Mas queria também dizer que não estaríamos de acordo quanto à substituição de "serviço cívico" por "serviço nacional". Poderemos encontrar outra expressão qualquer, mas até achamos que "serviço cívico" é uma expressão que tem uma certa dignidade e tradição. Não vemos razão nenhuma para a substituir por uma expressão tão insignificativa como "serviço nacional". Nacional é tudo aquilo que não é estrangeiro, julgo eü. Deste modo, não poderíamos, em princípio, estar de acordo com isto.

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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — O que ia dizer já está praticamente dito. Vou tentar encontrar outras palavras para o afirmar. Já dissemos várias vezes que nos opomos à concentração de artigos. Se é esse o meio para reduzir o tamanho da Constituição, acho que é incorrecto, pois não reduz o tamanho da Constituição, apenas reduz o tamanho de artigos. Não vejo vantagem nenhuma em criar buracos, em alterar desnecessariamente a numeração e a ordenação dos artigos.

Quanto à questão do serviço nacional, de facto, não compreendemos qual o sentido da alteração. O serviço militar não é serviço nacional? Não percebemos, pura e simplesmente! Como tal, não há qualquer possibilidade de uma tal alteração obter o mesmo apoio.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Almeida Carrapato, tem a palavra.

O Sr. Almeida Carrapato (PS): — É para dizer algo sobre esta alteração sistemática proposta pela AD, ou seja, a fusão dos artigos 160.°, 161.° e 162.° Para falar com a maior franqueza, não vejo razão para haver uma aglutinação ou uma fusão destes 3 artigos. O artigo 160.°, o artigo 161.° e o artigo 162.°, tal como estão, prevêem realidades completamente distintas. Portanto, não há razão para as aglutinar num único preceito. O artigo 160.° trata de imunidade, o artigo 161.° trata de direitos e regalias e o artigo 162.° trata de deveres.

Ora bem: imunidades não se confundem com direitos e regalias; direitos e regalias... Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Sr. Deputado, queria-lhe dizer apenas o seguinte: nunca discutimos aqui, na Comissão, as propostas de alteração sistemática. É um problema que se considera que não é de fundo e, portanto, nunca se discutiu aqui. Assim, penso que a intervenção do Sr. Deputado, sem prejuízo da razoabilidade, neste momento, não será útil.

Por outro lado, queria acrescentar que para simplificar, nós em atenção àquilo que já foi dito, retiramos a nossa proposta de alteração à alínea a).

O Orador: — Agradeço a sua intervenção, Sr. Dr. Amândio de Azevedo, mas queria dizer-lhe que também não considero que seja uma questão de fundo. Simplesmente, por uma questão de arranjo sistemático, por uma questão formal, não via razoabilidade. Mas, uma vez que é retirada a proposta, fica prejudicado o que iria dizer.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, antes de dar a palavra aos Srs. Deputados que estão inscritos a seguir, queria perguntar aos partidos da AD se retiram a proposta só da sistemática ou também a do serviço nacional?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — ó Sr. Presidente, não retiro a proposta da sistemática, porque, senão, teria de retirar as outras todas. O que temos combinado aqui nos nossos trabalhos é que não se discutem problemas de sistemática...

O Sr. Presidente: —ó Sr. Deputado, apenas quis que o Sr. Deputado fizesse a precisão daquilo que retiram. É, portanto, só a respeito do serviço nacional, não é verdade?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Claro.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Luís Beiroco, a mesma posição do CDS? Portanto, ultrapassada a proposta de alteração à alínea a). O Sr. Deputado Amândio de Azevedo estava inscrito. Entretanto, falou na interrupção e prescinde.

Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Muitíssimo brevemente, para salientar que, ao contrário do que disse o Sr. Deputado Amândio de Azevedo, a aglutinação de 3 artigos num só não é uma mera questão de sistemática. É também uma questão de fundo, uma questão de ordenação constitucional. Se no plano técnico pode aparecer como de sistemática, no plano político tem relevância autónoma. Significaria abrir clareiras na Constituição, desfigurá-la, tornar o texto constitucional vulnerável e, portanto, pôr em causa indirectamente, a ordem constitucional.

Relativamente a este ponto, como a todos, para poupar futuras intervenções, quero dizer que da nossa parte há uma oposição total a propostas idênticas a esta, tendentes a uma redução aparente da Constituição, e que, no fundo, seriam propostas de degradação do articulado constitucional.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Amândio dc Azevedo, tem V. Ex.a a palavra.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Sr. Deputado Jorge Miranda, penso que pretende introduzir uma questão que não é útil ao prosseguimento dos nossos trabalhos e admira-me que V. Ex.a o tenha feito, tão preocupado se tem mostrado com o andamento dos trabalhos. Nós não queremos discutir esse problema. Isto é realmente uma alteração sistemática, e, embora estas possam ter importância política, entendemos que está correcta a regra de na Comissão não se discutirem essas questões, até porque elas só podem ter lugar depois das alterações introduzidas no texto constitucional. Só no fim é que a sistemática tem de ser considerada, e nessa altura poderá dizer, em conjunto, se aceita ou não aceita.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra ao Sr. Deputado Adérito Campos.

O Sr. Adérito Campos (PSD): — Numa composição meramente pessoal e não prejudicial em relação à posição que o meu partido já tomou, parece-me que retirar o termo "serviço nacional" e continuar com o termo "serviço cívico" é negativo por dois pontos fundamentais: o primeiro é que o serviço nacional, contrariamente àquilo que disse o Sr. Deputado Vital Moreira, não significa, de maneira nenhuma, que o serviço militar não seja também nacional. E, por outro lado, dá uma dimensão muito profunda a este dever fundamental dos cidadãos da participação nas tarefas da defesa nacional.

O segundo ponto que gostaria de salientar era no sentido de que se eliminasse qualquer tipo de confusão em relação a um serviço cívico com dimensão e conteúdo completamente diferentes que existiu num

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passado próximo. Mantendo na actual Constituição o termo "serviço cívico", poder-se-á inculcar no espírito das pessoas, e até da juventude, um determinado sentido negativo que teve em passado próximo, pelo que, pessoalmente, advogo que se substitua "serviço cívico" por "serviço nacional".

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado António Vitorino, faz favor.

O Sr. António Vitorino (UEDS): — É uma interrupção para tentar perceber uma afirmação do Sr. Deputado. Não percebi qual é a relevância ou qual é a ligação que faz entre esta alínea a) e aquilo que disse: "a participação dos cidadãos na defesa nacional". Qual é a ligação entre uma coisa e outra? Em que medida é que o serviço nacional, que vem aqui referido e que se presume ser substitutivo da expressão actual "serviço cívico", tem relevância para efeitos de defesa nacional?

O Sr. Adérito Campos (PSD): — É que a proposta da AD parece-me que globalmente contém, no próprio artigo 276.°, n.° 3, a referência também a serviço nacional, como elemento importante para o contexto global da defesa nacional. Por isso, parece-me que, ao referir-se aqui serviço militar, serviço nacional, mobilização civil, no artigo 160.° e nesta alínea a) proposta pela AD, estará globalmente em acordo com uma proposta que a própria AD faz em relação ao artigo 276.°, para que fale, também aí, em serviço nacional, relativamente às tarefas da defesa da Pátria. Por isso é que me parece que têm o mínimo de ligação estas duas matérias.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Era para o artigo 161.°, mas, se ainda se esta na discussão do artigo 160.°, não vale a pena.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): — Era só para fazer uma precisão em relação à introdução aqui da expressão "serviço nacional" porque me parece, e aliás foi a ideia com que fiquei depois das palavras do Sr. Deputado do PSD, que há o objectivo, por parte da AD, de institucionalizar a moção de um serviço nacional para defesa, do qual o serviço militar poderia ser um dos vectores de concretização, anulando a noção de serviço militar obrigatório, completada, por um serviço cívico alternativo. Ora, esse ponto de vista, que tem sido, aliás, expendido de uma maneira bastante mais radical pela Juventude Social-Democrata, por exemplo, é, em nosso entender, inaceitável e representa uma alteração substancial da noção de exército nacional, de exército republicano e de exército democrático ou de umas forças armadas nacionais e republicanas, na tradição de todo o nosso regime constitucional desde o liberalismo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — É só para dizer o seguinte: quando disse que estava disposto a

retirar a proposta, era só por simplificação. No fundo, começámos a verificar que havia uma oposição da FRS, isto é, dos partidos que poderiam permitir que ela vingasse, e era apenas para simplificar. Devo dizer que talvez o devesse ter feito, e, em atenção à intervenção do meu colega da Juventude Social-Democrata, parece que, afinal de contas, a proposta tem o seu interesse e, nessa medida, não sei se vale a pena modificar a nossa posição. Na realidade, não deixamos de considerar que ela teria interesse, mas, de qualquer maneira, queria fazer esta precisão e estava inteiramente de acordo com as palavras que disse o meu colega da Juventude Social-Democrata. Preferíamos que se quebrasse o sentido do serviço cívico e que se arranjasse uma outra expressão. Aliás, o Dr. Almeida Santos mostrou-se aberto até em arranjar outra expressão qualquer, sendo talvez preferível não arrumar já o assunto e deixar a matéria em suspenso, tentando encontrar uma forma qualquer que pudesse satisfazer ambas as partes. Portanto, nessa medida, e se não houvesse oposição, retirava a minha afirmação de que retirávamos a proposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — Sr. Presidente. Srs. Deputados: era para uma breve intervenção suscitada pelas palavras do Sr. Deputado Jaime Gama. Compreendo a preocupação que o Sr. Deputado Jaime Gama manifestou. Mas creio que, de facto, a proposta da AD, nesta matéria, é muito clara. A AD não alterou substancialmente nada ao actual n.° 3 do artigo 276.° da Constituição. Apenas mudou o qualificativo de "serviço cívico" para "serviço nacional" e acrescentou um pequeno inciso, em que, para além dos declarados "inaptos" para o serviço militar armado e dos objectores de consciência, considera também a situação dos "aptos excedentes". E, portanto, não há nenhuma alteração substancial do regime, que já estava consagrado na Constituição, nesta matéria, pelo que creio que isto foi, de facto, mais uma questão de terminologia e que não tem outra intenção.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): — Sr. Deputado, o projecto da Constituição da AD, nesta como em outras partes, tem uma sobreposição de projectos. E nessa sobreposição de projectos e matéria, neste caso, visto que, por um lado, se pretende salvaguardar aquilo que o Sr. Deputado disse, e que é exactamente em relação ao serviço militar obrigatório, mas, por outro lado, certamente para satisfazer pontos de vista divergentes, se procura utilizar uma terminologia, ainda esses sectores se vejam, em certa medida, protagonizados e reconhecidos. O que me parece é que a AD, neste ponto, devia estruturar os seus pontos de vista de forma inteiramente lógica e coerente.

E, para ser coerente, com a defesa do princípio do serviço militar obrigatório, teria de limar o seu texto e as suas próprias noções em relação à articulação desse serviço com os serviços alternativos, bem como à inclusão de todas essas questões, com a própria noção de defesa nacional e com as forças armadas. Ou seja, que o texto da AD, neste ponto, tem uma conciliação de posições que beneficiará em ser tornada sistemática.

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De qualquer modo, registo que no texto que a AD apresentou sobre este ponto específico da revisão constitucional não fizeram vencimento, e ainda bem, os pontos mais radicais e, quanto a mim, mais condena-nos, que, constantemente, são retomados, por exemplo, pela Juventude Social-Democrata contra o serviço militar obrigatório.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — Sr. Deputado Jaime Gama, não tenho de me pronunciar, como é evidente, sobre tomadas de posição da Juventude Social-Democrata. O que quero afirmar é que não houve no projecto da AD, quanto a esta matéria, qualquer alteração ao sistema que já constava da Constituição, e se houve alguns propósitos de que esse projecto fosse outro — o que ignoro —, é evidente que, olhando para o texto que foi aprovado, se constata que esses pontos não fizeram vencimento.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Presidente, nós não queremos antecipar a discussão. Aqui, tínhamos apenas em conta a substituição da expressão "serviço cívico" por "serviço nacional". Não compreendemos o alcance dela e, portanto, não vemos qualquer justificação para a sua alteração.

Em todo o caso, e sem antecipar a discussão que haverá de ser feita em matéria da questão de serviço militar e de serviço cívico, importa desde já dizer que a proposta da AD é bastante mais do que aquilo que o Sr. Deputado Beiroco tentou dizer. Na verdade, ao alterar os principais conceitos e ao introduzir a moção de aptos excedentes, a proposta da AD introduziu uma brecha de dimensão bastante sensível no actual sistema constitucional, por onde o serviço militar obrigatório influirá rapidamente. É, por conseguinte, uma proposta que — desde já o declaramos — não pode ter o nosso acordo. Mas creio que não vale a pena agora produzir argumentos num tema que haverá de reter, em momento oportuno, alguma da nossa atenção e do nosso tempo.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Adérito Campos.

O Sr. Adérito Campos (PSD): — Sem pretender também antecipar a discussão desta matéria, e pretendendo relegá-la para o sítio próprio, que é o artigo 276.° da Constituição, queria, todavia, muito rapidamente, dizer apenas ao Sr. Deputado Jaime Gama que a Juventude Social-Democrata nunca defendeu a abolição do serviço militar obrigatório. Apenas defende, e continua a defender, no plano de princípios, a des-constitucionalização da obrigatoriedade do serviço militar.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Sousa Tavares, tem V. Ex.a a palavra.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Peço desculpa, mas nós estamos aqui a discutir sobre um projecto de intenção. É claro que no projecto da AD se mantém o n.° 2 do artigo 276.°, que é perfeitamente peremptório: o serviço militar é obrigatório. Daqui para diante, toda esta discussão é de uma inutilidade total. O emprego da expressão "serviço nacional", em vez de "serviço cívicos", é simplesmente o emprego de uma expressão mais ampla.

O serviço nacional é mais amplo do que o serviço cfvico, até porque este tem determinadas ligações a uma ideia já preconcebida e, por exemplo, não abrange o serviço militar não armado, não abrange serviços na defesa civil e uma série de coisas que podem ser utilizadas, por exemplo, para os objectores de consciência, para as pessoas consideradas inaptas para o serviço militar. Bem sei que serviço cívico também pode abranger isso tudo, mas a expressão "serviço nacional" é uma expressão mais ampla do que "serviço cívico", parecendo-me, portanto, que toda esta discussão é de uma inutilidade transcendente. Aliás, tanto me faz que fique uma palavra como que fique outra.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, resumindo as posições aqui expressas em relação às alterações propostas pela AD ao artigo 160.°, teremos de, em relação à alteração considerada'por uns de ordem meramente sistemática e por outros não tanto, da inclusão neste artigo dos artigos 161.° e 162.°, não foi obtido qualquer consenso por parte de nenhum dos partidos. Em relação à alteração da expressão "serviço cívico" por "serviço nacional" também não foi obtido qualquer consenso. Nenhum dos outros partidos concordou com a proposta de alteração da AD. Os Srs. Deputados da AD manifestam-se abertos, tal como, de certa forma, o PS, a que seja procurada outra expressão que não "serviço cívico" e "serviço nacional", independentemente da oposição do PS a esta última expressão.

Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): — Não foi por um caso de abertura. Eu disse que poderia pensar-se noutra. Mas, enquanto não se encontrar, nós mantemo--nos fiéis à actual.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, eu disse que os senhores mantinham a oposição à expressão "serviço nacional". Caso fosse encontrada uma terceira expressão que possa dar cobertura à ideia que o PS tem a este respeito, o PS poderia, eventualmente, vir a concordar com ela. Caso contrário, evidentemente que não.

Artigo 161.°

Em relação a este artigo há uma proposta de aditamento de uma alínea, ao n.° 2, apresentada pela FRS, com o apoio do PCP e do MDP/CDE e reserva de posição da AD.

Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — A única coisa que acho é que, evidentemente todos nós estamos de acordo com esta alínea.

Agora não me parece que possa ser uma alínea da Constituição. É evidente que, se há deputados que têm de dispor de instalações e pessoal de apoio, como todos os serviços do Estado, então teríamos de fazer o mesmo em relação ao Presidente da República, ao Presidente do Conselho, em relação aos Ministros, em relação a tudo. Acho perfeitamente único a introdução desta alínea! Desculpem, percebo o bem-intencionado dela, mas não me parece que tenha dignidade para figurar numa Constituição que "os deputados devem dispor de instalações e de pessoal de apoio adequado ao eficaz exercício das suas funções"! É uma coisa perfeitamente circunstanciai. Todos nós sabemos que estamos a trabalhar em condições deficientes, mas não pode ficar consagrado numa Constituição da República Portuguesa, que os deputados

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não tèm os meios suficientes ao seu alcance para trabalharem!

Neste ponto, pedi à FRS para reponderar e retirar a proposta desta alínea, porque não tem cabimento constitucional. Não é uma norma constitucional. É uma norma de serviço!

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Almeida Santos, tem a palavra.

O Sr. Almeida Santos (PS): — ó Sr. Deputado Sousa Tavares, cómicas são as condições em que trabalhamos! É claro que não se trata de qualquer serviço do Estado. Trata-se de um órgão de soberania e de fazermos as leis bem sentados ou mal sentados, em condições de raciocinio defeituoso, e não acho que, na verdade, não tenha dignidade para estar aqui!

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — O Sr. Deputado Almeida Santos lembra-se de um tribunal que houve em Lisboa que funcionava numa cozinha? Advoguei lá várias vezes. Os tribunais são também órgãos de soberania. E, assim, teríamos de dizer, em relação a todos os órgãos de soberania, que têm de dispor de pessoal, de instalações condignas, etc. Acho que isso é uma coisa do outro mundo. Já trabalhei num tribunal que era numa cozinha, que era ali no Príncipe Real (já não me lembro que juízo era, parece-me que o 10.° ou o 11.° Juízo Cível).

O Sr. Almeida Santos (PS): — De qualquer modo, são condições! São coisas diferentes. Temos centenas de tribunais, se não milhares. Temos só uma Assembleia da República! Por outro lado, se vamos ver o que é que tem dignidade ou o que não tem dignidade, pergunto-lhe se tem dignidade o livre trânsito; por exemplo, se tem dignidade o livre trânsito que está aqui no direito dos deputados.

Vozes.

O caso é que, se nós não pusermos aqui, continuaremos durante toda a nossa vida sentados ali, uns em cima dos outros, sem condições acústicas, sem climatização, sem telefone, sem pessoal, sem apoio nenhum.

Se cá ficar, talvez seja o melhor caminho para nós termos brevemente a solução deste problema.

E a intenção é manifestamente essa.

Uma vez que já estamos aqui há 7 anos depois de Abril, sem que se tenha feito praticamente nada neste sentido, talvez seja necessária uma norma destas para que tal se faça. E a culpa não é apenas do governo actual, é de todos os que já lá estiveram, incluindo aqueles a que pertenci.

Por isso, acho que esta norma era uma norma responsabilizante. A redacção não é tão importante como isso. Talvez se pudesse dispensar a referência às instalações, mas devíamos referir as condições de apoio e as condições de trabalho. Penso, assim, que é de se manter como forma de responsabilização dos executivos para resolver esse problema.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Vale a pena recordar a história do preceito correspondente a este na Constituição da República Portuguesa.

Durante os trabalhos da Assembleia Constituinte, não apenas se verificava o facto de não existirem condições de trabalho, mas eram negadas aos deputados pelo Governo, de uma forma directa ou indirecta, as condições mínimas de funcionamento, nomeadamente a sua própria remuneração, ou subsídio, como quiserem chamar-lhe.

Portanto, nessa altura foi importante que a Constituição, de uma maneira muito clara, tivesse aqui uma norma nesse sentido. Essas circunstâncias estão manifestamente alteradas e hoje penso que é negativo pôr na Constituição uma norma desta natureza, porque ninguém recusa aos deputados o direito de terem aquilo que está aqui expresso.

Apesar de as instalações serem muito más neste momento e os serviços de apoio, etc, não nos podemos queixar de ninguém senão de nós próprios, e neste aspecto, até estou muito à vontade, porque considero que houve responsabilidade do PS, quando foi maioria e teve o Presidente da Assembleia da República, e considero que também já há responsabilidades da parte da AD, no período em que teve também a Presidência da Assembleia da República, por não ter sido feito aquilo que podia ter sido feito para melhorar a situação. Há, não o duvido, circunstâncias que nos '.imitam de algum modo e estou a lembrar-me agora do problema do Estatuto dos Deputados.

De qualquer forma, não penso que na actual situação seja realmente defensável que se introduza uma norma desta natureza, que não tem manifestamente dignidade constitucional e pode até sugerir que alguém põe em dúvida estes direitos. Por isso, a nossa posição, que era de reservas à proposta da alínea da FRS, continua com as mesmas reservas, com propensão para a negativa. Mas não é questão em que, se a FRS se mostrar muito empenhada — tendo naturalmente uma visão diferente da nossa —, tenhamos de nos declarar imediatamente e desde já completamente fechados. Em suma: nós propendemos para a negativa, mas não queríamos também fechar já todas as portas.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nunes de Almeida, tem a palavra.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Suponho que há aqui alguma confusão em torno desta alínea e). O Sr. Deputado Sousa Tavares e, posteriormente, o Sr. Deputado Amândio de Azevedo referiram-se que, a haver esta alínea aqui, deveria haver idêntica para os restantes órgãos de soberania. Ora, o que está aqui em causa não é o órgão de soberania Assembleia da República. O que está em causa na alínea e) são os deputados, como tal, e mais do que isso, o que está em causa fundamentalmente quando se fala em instalações e pessoal de apoio adequado ao eficaz exercício das suas funções é que está a fazer-se a expressa referência e ligação ao indispensável contacto com os cidadãos eleitores.

Isto tem um significado mais vasto e diferente daquele que tem sido posto nas intervenções, nomeadamente, de alguns deputados da AD. O que está em causa é saber se o deputado tem de ter condições para contactar com os eleitores, nomeadamente na área do seu círculo eleitoral. É uma questão bastante diversa das instalações próprias da Assembleia da República. É uma questão que tem a ver, por exemplo, com a cedência de instalações em edifícios públicos para o deputado contactar com os eleitores, seja onde for;

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quem tem a ver com a disponibilidade de pessoal para poder assegurar esse contacto com os cidadãos eleitores na área do seu próprio círculo e abrange, aqui, matérias que são radicalmente distintas daquelas que são abrangidas depois, mais adiante, relativamente aos próprios serviços da Assembleia. É, em suma, uma questão que tem a ver com coisas radicalmente distintas, e admiro-me de que uma disposição deste tipo, a sua importância e a sua relevância neste aspecto, seja posta em causa, nomeadamente por deputados que têm sistematicamente suscitado a questão e os problemas que resultam da incapacidade de contacto e de ligação entre o deputado e o eleitor, como é o caso do Sr. Deputado Sousa Tavares, que tem sido particularmente sensível a este problema. Ao longo dos últimos anos, tenho acompanhado alguma coisa do que ele tem escrito sobre isto, e esta é uma forma que não tem nada a ver até com os serviços internos da Assembleia. Tem muito a ver com obrigações de outras entidades, nomeadamente, por exemplo, das próprias autarquias. Chamava a atenção para isto porque a questão não se resume em problemas que a Assembleia da República pode, por ela só, resolver.

A Assembleia da República não pode resolver esta questão de dizer, por exemplo, às câmaras municipais ou às juntas de freguesia que têm de permitir aos deputados a utilização das suas instalações para contacto com os seus eleitores.

Não é uma questão só da Assembleia, da organização interna da Assembleia. É uma questão que tem a ver com muitas outras entidades.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, não terei muito a acrescentar ao que acaba de dizer o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

Como ele frisou, com este artigo 161.°, e particularmente com a alínea e) proposta pela FRS, o que está em causa é o estatuto individual dos deputados. O que está em causa é o desenvolvimento das condições necessárias a que os deputados possam exercer o seu mandato. Lembraria ao Sr. Deputado Amândio de Azevedo o seguinte: ele disse, e bem, que algumas das alíneas do n.° 2 do artigo 161.° apareceram na Constituição para necessidade de defesa ou de afirmação depois daquilo que tinha sucedido no Verão de 1975, altura em que os deputados à Assembleia Constituinte durante meses não receberam qualquer vencimento. Era uma forma com que o Governo de então (ou o poder político-militar de então) contava para dominar ou amordaçar, a Assembleia Constituinte. Hoje, felizmente, essas condições não se verificam. Na lógica do pensamento do Sr. Deputado Amândio de Azevedo, então o n.° 2 do artigo 161° deveria ser completamente banido, uma vez que hoje ninguém neste país contesta os direitos inseridos nas 4 alíneas que aí aparecem.

Mas o problema não é esse. Não é o de hoje ninguém contestar o problema! É o de se fixar definitivamente na Constituição as condições do exercício do mandato. E, como já foi dito, algo do que aparece na alínea e) da proposta da FRS até tem muito mais dignidade...

Faz favor, Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Ó Sr. Dr. Jorge Miranda, faça uma distinção entre aquilo que é um

pressuposto normal do exerício de certas funções, que são instalações, serviços de apoio, etc, e as regalias. Aquilo não é preciso que ninguém o diga, pois é uma coisa que decorre das funções que são atribuídas aos funcionários e aos deputados. Outra coisa são regalias que são estabelecidas, como adiamento de serviço militar, livre trânsito, cartão especial, etc. Isso é que, se não for aqui dito, não está cá.

Não me queria referir propriamente a estes preceitos que foram incluídos, mas sim ao n.° 3 do artigo 183.° e ao artigo 184.°, que versam especialmente sobre matérias desta natureza.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Deputado, a sua interrupção leva-me a que, reforçando ainda mais o sentido da proposta da FRS, eu considere que aqui não se trataria propriamente de direitos, mas sim de condições para o exercício de poderes funcionais e a que na sua lógica, a alínea e) do n.° 2 do artigo 161.°, segundo a forma da FRS, devesse ser transplantada para o artigo atinente aos poderes funcionais como condição para o exercício desses mesmos poderes. Tão importante é esta alínea e) no tocante ao exercício dos poderes funcionais dos deputados, tanto tem ela a ver com o estatuto funcional, e não apenas com o estatuto pessoal dos deputados, que então esta alínea e) deveria ser transplantada, como nova alínea, para o preceito relativo aos poderes funcionais em vez de caber aqui. Seja, porém, como foi, esta alínea tem inteira justificação, sobretudo na perspectiva, que o Sr. Deputado Nunes de Almeida salientou, da comunicação entre os deputados e os cidadãos eleitores. Tem sentido, cada vez mais, na perspectiva da democraticidade do mandato, da comunicação, da transparência, da participação democrática na vida política.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Monteiro Taborda, tem V. Ex.a a palavra.

O Sr. Monteiro Taborda (MDP/CDE): — Muito brevemente, só para dizer que, de facto, esta alínea da FRS, que merece o total apoio do MDP/CDE tem de facto duas partes: Uma parte, referente a instalações e pessoal de apoio e que tem o nosso apoio, como tem o apoio, suponho dos pequenos partidos, que têm mais dificuldades que os grandes partidos na Assembleia de disporem de instalações e principalmente de pessoal de apoio às suas funções. Quanto à segunda parte, é indispensável o contacto com os cidadãos eleitores. Lembrava aos Srs. Deputados, dois casos extremamente recentes: o caso do deputado Mário Tomé, há 2 dias, e o caso do deputado Lopes Cardoso, que levantou problemas, ontem, no Plenário. É só isso.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Este problema levantado agora pelo Sr. Deputado Monteiro Taborda penso que não tem nada a ver com o que nós agora aqui dizemos; quer dizer, isso é uma preservação dos direitos dos exercícios dos advogados e do respeito das forças públicas para eles. É um problema totalmente diferente. Quanto a este número continuamos a manter a nossa oposição, mais que não seja por uma razão — é uma razão platónica, mas é uma razão — de lógica e entendimento do que deve ser uma constituição. Entendemos que a Constituição deve ser integralmente cumprida, em todas as circunstâncias, e que

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para uma lei constitucional ser cumprida é absolutamente necessário que ela seja simples e tenha, tanto quanto possível, preceitos claros e exactos. Este género de preceito é aquele que constitui base para uma inconstitucionalidade passiva, porque é evidente que todos sabemos que primeiro que os deputados venham a ter instalações, pessoal de apoio, os meios necessários para o indispensável contacto, é preciso haver dinheiro disponível, são questões camarárias, etc. São uma data de questões que conduzem a situações de inconstitucionalidade passiva.

E, portanto, entendemos que se estão a constitucionalizar coisas que são problemas da Administração Pública, que são problemas de organização de serviços, que não têm, realmente, nada a ver com o direito constitucional. E desculpe o Sr. Dr. Miranda, mas a sua argumentação não me convenceu.

Foi brilhante, como sempre, mas na realidade o que aqui está é que há obrigação de criar aos deputados meios para o exercício das suas funções.

Penso que a própria definição da função de deputado já contém essa obrigação, e, portanto, que estar a especificar instalações e pessoal de apoio!? Ainda por cima a redacção estaria mal feita, porque a única argumentação que me impressionou um pouco foi a do deputado Nunes de Almeida, e essa é a que menos transparece deste texto. Aparece muito mais uma espécie de obrigação constitucional de reforma do edifício da Assembleia da República, das suas instalações, do seu pessoal de apoio, de uma data de coisas assim nesse género, do que propriamente criar aos deputados nos seus círculos eleitorais, meios para o exercício das suas funções e recordo que esse princípio viola um pouco aquele princípio de que o deputado não representa nenhum círculo mas sim a Nação inteira (e parece que os Srs. Deputados defendem a minha tese, o que é perfeitamente contraditório com as posições, aqui, tomadas). E estaria à vontade para discutir tal matéria.

De maneira que, penso, este princípio não se deve manter.

Aliás, na lógica disto mesmo propomos a supressão da alinea d) do n.° 3 do artigo 183.°, porque é mais ou menos da mesma natureza.

Sei que, naturalmente, não teremos seguimento, aí. Mas há uma coisa que não vamos com certeza consentir; a introdução de novas normas da mesma natureza.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Lopes.

O Sr. Armando Lopes (PS): — Só queria acrescentar um outro argumento a tudo o que já brilhantemente foi dito e que me parece, também relevante. Foi referido que este preceito do n.° 2 do artigo 161° surgiu em 1975 como forma de reacção contra as exigências não satisfeitas na altura e que se impunha que fossem satisfeitas. Só que este argumento leva a que se aceite a alínea e), na medida em que, se já foram satisfeitas as exigências constantes das 4 primeiras alíneas do n.° 2 do artigo 161.°, não foi satisfeita a exigência da alínea é) que nós propomos. Parece-me, portanto, que pela mesma razão de ser que impôs que se escrevesse na Constituição as 4 primeiras alíneas do n.° 2 do artigo 161.°, tem de se escrever, também, hoje, esta alínea. É a nossa "justa luta", como se diria em linguagem revolucionária, que temos de continuar.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, só para responder ao Sr. Deputado Sousa Tavares, que veio sugerir que esta alínea e) proposta pela FRS é, de certa maneira, contraditória com o princípio da representação política, como representação de todo o País e não apenas dos círculos.

Lembraria que nesta alínea é) se inclui, nomeadamente, a prestação aos deputados de um eficaz serviço de correspondência com os cidadãos eleitores de todo o País, e não apenas dos círculos por que são eleitos. Em parlamentos estrangeiros, o serviço de correspondência tem uma enorme importância. Suponho que todos nós, nesta Assembleia da República, recebemos diariamente numerosas cargas de cidadãos eleitores de todo o País e muitas vezes não estamos em condições de responder. A alínea é) proposta pela FRS vem ao encontro dessa preocupação, e não é de modo algum contraditória com o princípio da representação política.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nunes de Almeida, tem a palavra.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — É apenas um ligeiro acrescento em relação ao que foi dito pelo Sr. Deputado Sousa Tavares. Não é verdade que o que esteja aqui em causa — volto a repetir isto — seja o problema de edifícios na Assembleia da República. Há uma manifesta ligação entre a primeira parte da frase e a segunda. Não são duas coisas distintas. O que está fundamentalmente em causa nesta alínea é) é a capacidade de ligação e contacto entre o deputado e os cidadãos eleitores. E isso, quer se queira quer não, tem de passar pela existência e pela disponibilidade de instalações de pessoal de apoio. Senão não pode existir essa ligação. Não tem nada a ver com as cadeiras do Plenário serem mais ou menos estofadas nem com as instalações, mas sim com a capacidade de utilização de instalações e de pessoal para as ligações lá fora.

E este o essencial da alínea e), e não aquele que há pouco o Sr. Deputado Sousa Tavares referiu.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Queria da nossa parte insistir no apoio que demos a esta proposta do PS, independentemente da sua formulação. Ela refere um ponto que ninguém está em condições de contestar e que é um dos aspectos mais negativos da actual situação do Estatuto dos Deputados. A sua constituciona-lização é justa e adequada. Não cria as situações que o Sr. Deputado Sousa Tavares um tanto caricaturalmente indicou, mas vai no sentido de permitir transformar um direito, uma pretensão que hoje apenas tem a cobertura do interesse.

Por isso mesmo queríamos reinsistir no apoio que demos à proposta e dizer que não compreendemos a razão de ser da oposição, um pouco brava, que lhe está a ser movida pelos deputados da AD.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Almeida Santos, tem a palavra.

O Sr. Almeida Santos (PS): — Creio que o problema está suficientemente discutido. Mas há aqui um elemento novo sobre o qual me queria pronunciar.

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Não posso deixar de reconhecer à AD alguma coerência quando propõe a eliminação do n.° 3 do artigo 183.°, que reconhece a cada grupo parlamentar o "direito de dispor de locais de trabalho na sede da Assembleia, bem como de pessoal técnico e administrativo de sua confiança, nos termos que a lei determinar", bem como a eliminação do artigo 184.° "os trabalhos da Assembleia e os das suas sessões serão coadjuvados por um corpo permamente de funcionários", etc. Há perfeita coerência entre as duas atitudes. Só que eu pretendia criar à AD um problema de consciência que é o seguinte: antecipando desde já a nossa recusa formal em concordar com a eliminação do n.° 3 do artigo 183.° e do artigo 184.°, queria saber se, sendo assim, não estariam dispostos a rever a vossa posição em relação à alínea e) do artigo 161.° que propomos, porque se não parece que só os grupos parlamentares é que se poderiam instalar e os deputados não, só os grupos parlamentares é que têm, enquanto tais, apoio e os deputados não! E sobretudo reconheçam que, depois de ca terem estado esses direitos (o passaporte, o livre trânsito, etc), se os retirássemos, parecia claramente que colocávamos em segundo plano a necessidade de instalarmos devidamente e darmos apoio conveniente aos deputados.

Era este o problema de consciência que vos queria criar e dizer que o melhor é, na verdade, vermos novamente este problema quando debatemos o artigo 184.°, e o n.° 3 do artigo 183.°

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Oh, Sr. Deputado Almeida Santos, com a sua recusa frontal e total não nos cria problemas de consciência. Pelo contrário, alivia-nos porque estamos mais à vontade para terminantemente recusar. Mas nós não vamos para aí. Continuamos a dizer que não concordamos mas não queremos fechar, já, todas as portas, e se o PS se mostrar muito interessado nessa norma até é possível que venhamos a concordar com ela. Mas, para já, a nossa atitude é de tendência para a negativa.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): — Penso que os meus colegas que falaram antes esclareceram devidamente as coisas, designadamente o deputado Sousa Tavares. Penso que quando deputados, como o Sr. Deputado Vital Moreira, falam em oposição não é disso que se trata, mas sim de entendermos ser mais do que duvidosa e dignidade constitucional da matéria. Nós continuamos a entender que não há equiparação entre pressupostos do exercício das funções, sob pena de também devermos dizer isto em relação ao Presidente da República. Eu não me lembro já do que aprovámos em relação a este, mas também me parece que em relação a ele, cuja dignidade e importância ninguém aqui duvida, não fizemos igual proposta. Da mesma maneira, também não fizemos igual proposta em relação ao Conselho de Estado nem em relação aos outros órgãos de soberania ...

Vozes ininteligíveis na gravação.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados!!!

O Sr. Cosia Andrade (PSD): — Eu terminava já! Não há oposição da nossa parte. Há uma séria dúvida

quanto à dignidade constitucional disso, mas de resto, o problema de consciência que o Sr. Deputado Almeida Santos pôs, é perfeitamente reversível, dada a nossa falta de disponibilidade para aceitar isto. Eu penso que criámos um gravíssimo problema de consciência ao PS e o levámos a votar conncosco a proposta relativa ao artigo 183.°, porque quando votarmos está já dado como adquirido o facto de que este não vingou, não havendo, assim, consonância. Assim, a partir de agora, o PS fica com um gravíssimo problema de consciência!!!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, julgo que este assunto já está mais do que discutido.

O Sr. Deputado Sousa Tavares está inscrito, quer usar da palavra?

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Dentro de um determinado espírito de tolerância, atendendo às razões do Dr. Almeida Santos, como posição puramente pessoal talvez pudesse aceitar uma fórmula neste género: "A lei deve estabelecer as condições necessárias ao eficaz exercício das funções de cada deputado, incluindo o contacto com os eleitores." Não dá tanto o aspecto arquitectural ou a instalações, serviços de apoio, a um problema de lei orgânica.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, em relação ao artigo 161.° verifica-se que a AD tem, em princípio, uma posição negativa em relação à aceitação de uma alínea e) proposta pela FRS. Essa posição negativa não impede que possa haver uma reconsideração posterior, numa renegociação que venha a fazer-se.

Vozes.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o artigo 162.° não tem propostas de alteração. No artigo 163.° há duas propostas de alteração da AD. A primeira refere-se à perda do mandato de deputados, pelo abandono do partido pelo qual foi eleito, sendo, por conseguinte, esta primeira alteração que poria imediatamente à discussão.

Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Penso que a única abertura que se verificou na subcomissão foi da parte da FRS, no sentido de ponderar a hipótese de perda de mandato, por saída voluntária do partido a que se pertença.

Eu não considero esta solução aceitável. Não creio que resolva o problema, mas também não tenho a mínima ilusão de que não vai ser possível a cada uma das forças políticas abandonar a posição que tem. Portanto, a minha proposta é esta: nós mantemos a nossa proposta, e com certeza que tanto o PCP como a FRS continuarão a opor-se a ela. Se pudéssemos poupar uma longa discussão sobre este preceito, penso que, ao menos, haveria essa utilidade.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está inscrito o Sr. Deputado António Vitorino. Prescinde. Portanto é aceite a sugestão do Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

Quanto à segunda parte da proposta de alteração da AD a este artigo consiste na eliminação da alínea d). Foi aceite pela ASDI e recusada pelos restantes partidos.

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Em discussão Srs. Deputados.

Trata-se da alínea d) que diz: "Perdem o mandato os Deputados que [...] sejam judicialmente condenados por participação em organizações de ideologia fascista."

Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Considero esta disposição uma disposição piedosa. Até aqui, o fascismo! Fascismo que já começa a ser uma saudade, graças a Deus, e ainda não conheço nenhuma condenação por este facto. Por mim acho indiferente. Mas vamos arrastar eternamente com isto na Constituição? O fascismo começa a ser um facto histórico, embora possam dizer que desde o princípio da Humanidade há fascismo e que, de certa maneira, o Caim foi um fascista em relação ao Abel! O adjectivo epocal começa a desaparecer e, portanto, não faz sentido que se perpetue para o futuro. Se é um determinado conceito de ideologia política, nesse caso será preciso ir à lei do adjectivo!

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Vital Moreira tinha pedido uma interrupção. Entretanto o Sr. Deputado Sousa Tavares acabou a sua intervenção. Julgo que foi por não dar por isso.

O Sr. Deputado Sousa Tavares continua, assim, no uso da palavra e vai ser interrompido pelo Sr. Deputado Vital Moreira.

Faz favor.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Deputado Sousa Tavares, admiro as piadas e acho que não é mal nenhum fazer uma boa piada. Em todo o caso há uma coisa que não fica no escrito, que é o tom com que se dizem as coisas. E as coisas escritas, não reproduzindo o tom com que são ditas, podem assumir uma gravidade espantosa. Só assim é que pode admitir-se a reprodução das palavras de uma expressão que lhe foi ouvida. Gostaria que, para efeito de gravação, ficasse muito claro que o Sr. Deputado Sousa Tavares ironizou, da maneira que o fez, e nós percebemos pelo tom ao dizer que o fascismo é uma saudade.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Penso que posso dizer, quanto a isso "graças a Deus"! Isto é, penso que o fascismo se aplica a um determinado fenómeno político ou social, que se verificou no século xx, motivado por variadíssimas razões, com várias raízes, mas que, historicamente, morreu. Embora, como eu disse, aquilo que está implícito no fascismo é uma determinada filosofia do poder e do domínio do homem pelo homem, que é permanente na História da Humanidade. Portanto, não se pode condensar, exclusivamente, nesse adjectivo. Foi o que disse! Ou se alarga o conceito do adjectivo, ou o fascismo, como tal, o fenómeno fascista, desapareceu. Isto embora de me perguntarem se a situação da Guatemala é de índole fascista a resposta ser: Evidentemente que é! Mas isso corresponde a determinadas formas de poder político, que se reproduzem ao longo de toda a História da Humanidade, não sendo, por conseguinte, só abrangidas, nem esgotadas, no adjectivo fascista, que tem um significado puramente histórico e limitado.

O Sr. Presidente: — Oh, Sr. Deputado desculpe interromper, mas isso está um bocado fora do âmbito

da nossa discussão e tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: é só para explicar o motivo por que a ASDI apoia a proposta apresentada pela AD, relativamente a esta alínea. Trata-se de uma atitude coerente com a ideia, que já numa anterior reunião aqui expus, de que um Estado democrático pluralista não deve banir nenhuma ideologia. Uma democracia que acredita em si própria não deve proscrever nenhuma corrente de opinião fascista ou outra, e, portanto, nessa ordem de ideias, não deve haver perda de mandato de deputados por virtude da condenação por participação em organizações de ideologia fascista. À partida, estas, como quaisquer outras organizações, desde que se submetam à ordem constitucional e à lei penal, não devem ser proibidas. Apenas isso.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Eu prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: a UDP não tem intervindo nestes debates por uma questão de posição politica, à partida assumida, contra qualquer revisão da Constituição e, também, em coerência com a posição de não ter apresentado quaisquer alteração. Dado que aqui, como já tem sido dito, se põem em causa, apenas, as alterações que estão em confronto, a nossa participação tem sido quase nula. No entanto, em relação a este ponto, e possivelmente a outros que poderão aparecer, não quero deixar de dizer qualquer coisa.

Nós opomo-nos frontalmente à eliminação da alínea d), por razões óbvias e, também, por razões históricas, mesmo de história actual. É que, por um lado, nós consideramos que não há organizações fascistas que se conformem com a ordem democrática! Ela.» existem, exactamente, para liquidar de uma forma total a democracia e, portanto, a capacidade de luta dos trabalhadores e de imporem a sua vontade. Por outro lado, porque também não está ultrapassado o fascismo, Sr. Deputado Sousa Tavares, na medida em que basta olhar para o que acontece hoje, na medida em que na Europa, em que países como a Alemanha, a França, a Itália, as organizações fascistas e neonazis crescem, alargam-se, armam-se e atentam contra a vida dos cidadãos, com atentados de que todos nós já ouvimos falar e lemos nos jornais. Portanto, o fascismo é uma ameaça que hoje, mais do que nunca, depois da 2.8 Guerra Mundial, pesa sobre a Europa e os povos europeus. Ele está em recuperação, assente, aliás, naquilo que se está a passar, da necessidade que o capitalismo monopolista tem de reforçar o seu poder e o seu dominio sobre o povo, os instrumentos de repressão. Isto é uma realidade à qual não podemos fugir e não podemos escamotear a necessidade de impedir que entrem neste Parlamento, pelo menos, aqueles que tenham sido judicialmente condenados por participação em organizações de ideologia fascista.

Muito obrigado.

O Sr. Presidente: — Vamos entrar no debate do artigo 164.° Vozes.

Sr. Dr. Almeida Santos, faz favor.

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O Sr. Almeida Santos (PS): — Eu tinha pedido a palavra porque me pareceu que ainda não se tinha chegado à conclusão final e só para dizer o seguinte: o verdadeiro problema não se põe em relação à proposta da alínea d) do artigo 163.°, mas sim a propósito do artigo 46.°, uma vez que nós, neste artigo, mantivemos a proibição das organizações que perfilhem a ideologia fascista e rotulámos como crimes o facto de se pertencer a essas organizações. Mal parecia que agora consentíssemos que um deputado filiado nessa tal organização e, portanto, condenado por esse facto, pudesse continuar a pertencer à Assembleia da República, ou seja a um organismo em que ele, através de uma organização em que se inseriu, procuraria destruir. É um contra-senso, e penso que a solução desse problema ficou encontrada através da manutenção da proibição das organizações que perfilhem a ideologia fascista e da rotulação como crime pelo facto de se pertencer a uma dessas organizações. Era só isso.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em discussão o artigo 164.°

Quanto a este artigo, a proposta de alteração da AD em relação à alínea c) mereceu oposição das outras forças políticas. E creio que é tudo. Aliás, não só a alínea c) mas também a eliminação da alínea d).

O Sr. Deputado Veiga de Oliveira queria intervir já? Faz favor.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, antes de dar início à discussão queria fazer uma redi-ficação ao relatório. De facto, diz-se aí, no quarto parágrafo, que em relação à alínea j), a proposta da FRS, é apoiada pelo MDP/CDE, é recusada pelo PCP. Há aqui um lapso, substantivo ou adjectivo, mas há um lapso. De facto, nós não recusamos a proposta da FRS e cremos até ser a proposta aprovável e aconselhável. Talvez este lapso resulte de qualquer observação que na altura tenha sido feita ao facto de tal proposta só ter cabimento no pressuposto da eliminação do Conselho da Revolução, porque as duas coisas se ligam. Por isso talvez tenha aparecido aqui esta aparente recusa do PCP sem toda a lógica.

De facto, não recusamos isto. Pelo contrário, apoiamos, no caso, obviamente, de o Conselho da Revolução vir a ser eliminado.

O Sr. Presidente: — Este artigo 164.° é objecto de propostas de alteração por parte da AD, PCP, FRS e MDP/CDE.

A AD propõe, desde logo, a alteração da epígrafe, que passaria a ser "competência". A AD propõe a fusão dos artigos 164.°, 165^° e 166.° Não propõe alteração às alíneas a) e b). Em relação à alínea c), propõe apenas o acrescentamento de um inciso orgânico. Não propõe alteração às alíneas e), J), g), h) e j) do actual artigo 164.°

A alteração em relação à alínea d) ficou na subcomissão para apreciação posterior. A alteração sugerida para a actual alínea i) foi aceite pelo PS, pela ASDI, pela UEDS, MDP/CDE e pelo PCP.

Em relação à alínea j), proposta pela FRS, esta mereceu apoio do MDP/CDE e do PCP, no pressuposto da extinção do Conselho da Revolução, enquanto a AD reservou a sua posição. A proposta das alí-

neas q), k) e /), mereceram apoio dos representantes das restantes forças políticas.

Quanto às propostas do PCP em relação ao actual artigo 164.°, no que concerne à alínea d), a AD, o PS e a UEDS reservaram a sua posição, enquanto a ASDI e o MDP/CDE a aceitaram.

Quanto à alínea j), a AD, o PS, a UEDS e a ASDI formularam reservas. Em relação à alínea m) a AD exprimiu a sua oposição, enquanto o PS, a ASDI e a UEDS reservaram a sua posição para momento posterior, dizendo o PS que aceita que seja feita uma distinção entre o estacionamento e o trânsito de tropas estrangeiras.

Sr. Deputado, Nunes de Almeida quer corrigir de imediato?

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — A posição que nós tomámos na subcomissão acerca desta matéria foi a seguinte: Relativamente ao estacionamento, a nossa posição era de oposição imediata. Quanto ao trânsito reservámos a nossa posição. Foi esta a distinção que fizemos.

O Sr. Presidente: — Quanto à proposta da alínea /), da FRS, a AD e o PCP, reservaram a sua posição. O MDP/CDE, na subcomissão, ficou de esclarecer as razões da sua proposta em relação à alínea j) do artigo 164.°

Srs. Deputados, está em debate.

Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Presidente, talvez seja de introduzir alguma disciplina na discussão, pois de outro modo creio que nós nos embrenhamos aqui num labirinto.

Primeiro, as alíneas por alíneas, tomando como ponto de referência o artigo 164.°, e depois tratar dos aditamentos de novas alíneas.

O Sr. Presidente: — Muito bem. Portanto, iríamos em relação à alínea c) do artigo 164.°

Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — A única alteração proposta foi pela AD com o acrescento do inciso orgânico relativamente ao estatuto do território de Macau, que não consta do relatório da subcomissão, mas nos meus apontamentos, tenho aqui que a AD retirou esta proposta na subcomissão.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Almeida Carrapato.

O Sr. Almeida Carrapato (PS): — É sobre a alínea r).

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): — É só para confirmar que a minha colega Margarida Salema disse-me — e é verdade — que nós na subcomissão deixámos cair isso e parece que o mantemos.

Voz ininteligível.

O Sr. Aimeida Carrapato (PS): — Pois, mas de todo i o modo, qualquer que seja a decisão tomada na subcomissão, nós aqui, relevamos esse deixar cair e, portanto, jnão vale a pena criar algum problema por causa disso.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, alínea d). Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Bom, aqui há 2 propostas: uma é a proposta da AD, que propõe o aditamento da expressão: "fazer leis, sobre todas as matérias, salvo as reservadas pela Constituição ao Governo que venham a ser revogadas". Creio que isso mereceu, digamos, abertura por parte das outras forças políticas já não sei bem qual foi a solução final. E há a proposta de eliminação do PCP.

Não há uma proposta de substituição, mas, na verdade, há uma proposta de eliminação por um lado e uma proposta de aditamento por outro. Eu deixaria, para já, o aditamento que fazemos e consideraria a eliminação.

Há uns problemas quanto à eliminação da alínea d), porque, na verdade, propusemos uma alteração do estatuto deste artigo. Este artigo, actualmente, tem por epígrafe "competência política e legislativa". A legislativa está claramente concentrada na alínea d) e nós propusemos reduzir esse artigo a uma competência política, entendida em termos hábeis, e transferir toda a competência legislativa para o artigo 167.° Por isso, retirámos, daqui, a alínea d) té esse o sentido da nossa proposta de eliminação.

Não fazemos grande questão dessa proposta. Em todo o caso achamos que isso daria maior clareza a esta distinção entre 3 ou 4 artigos da competência da Assembleia da República. Daria, portanto, maior transparência e entendimento a esse texto. Mas, o único significado de eliminação da alínea d) é esse e não, obviamente, retirar à Assembleia da República competência legislativa que não podia estar nos nossos propósitos.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Jorge Miranda (AS DI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta do PCP, no sentido de se retirar a alínea d) do artigo 164.°, não deixa de oferecer algum interesse. Poderia justificar-se distinguir entre uma competência essencialmente legislativa e uma competência política com faculdades legislativas conexas. E a técnica constante da proposta do PCP, de concentração num único artigo daquilo que é a competência legislativa da Assembleia da República, não deixa de ser uma técnica clara.

No entanto, nós, neste momento, não estamos a fazer uma nova Constituição, estamos diante de um artigo 164.°, que provocou algumas dúvidas de interpretação, dúvidas essas, que foram já resolvidas no essencial pela doutrina e pela jurisprudência. Por outro lado, como reconhece o próprio deputado Vital Moreira na sua intervenção, mesmo retirando a alínea d) do artigo 164.°, ainda ficaria no artigo 164.° muita competência legislativa, como as alíneas respeitantes aos estatutos das regiões autónomas, a concessão de amnistias, a Lei do Plano, a Lei do Orçamento, a autorização de empréstimos, a definição de limites das águas territoriais, etc. Por isso, na minha opinião, não há justificação para, em sede de revisão, se alterar aquilo que consta hoje do texto constitucional.

O texto constitucional, entendido tal como a doutrina e a jurisprudência o têm entendido, ao cabo e ao resto, não levanta hoje dificuldades de monta.

Há 3 artigos a definirem 3 tipos de competência da Assembleia da República: a competência política e a legislativa (competências essas estreitamente conexas), a competência de fiscalização no artigo 165.° e a compe-

tência relativamente a outros órgãos, no artigo 166.° No artigo 167.°, em desenvolvimento da alínea d) deste artigo 164.°, explicita-se a reserva de competência legislativa da Assembleia da República. Em suma: não tenho objecção de fundo contra a proposta do PCP, mas julgo que, neste momento, ao fim de 5 anos e meio de prática constitucional, a modificação não viria contribuir para a resolução de nenhum problema que não tenha sido resolvido, pela doutrina e pela jurisprudência e poderia revelar-se perturbadora de eventualmente suscitar novas questões.

O Sr. Presidente: — Sr.a Deputada MargaridaSalema.

A Sr." Margarida Salema (PSD): — Relativamente a este artigo 164.°, e na sequência das intervenções que foram feitas, penso que os critérios utilizados na Constituição para a distribuição dos diversos tipos de competência na Assembleia da República não são os mais correctos. Por isso, a AD também propõe uma nova reformulação relativamente à competência genérica da Assembleia da República, incluída nos artigos 164.°, 165.° e no próprio 166.° Consequentemente, este critério é um critério possível. O proposto pelo PCP é outro também possível, mas como disse o deputado Jorge Miranda não estamos aqui a fazer uma nova Constituição. Daí que, no respeitante aos diversos tipos de competências e aos critérios a utilizar nesta delimitação, a AD preferiria, neste momento, discutir o conteúdo, os poderes efectivos da Assembleia da República e as alterações em termos substanciais e, talvez, numa segunda apreciação, se for caso disso, rever esses critérios. No entanto, não fizemos uma questão fechada.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS). — Sr. Presidente, a minha intervenção era, um pouco, na linha daquela que agora foi exposta pela Sr." Deputada Margarida Salema. Suponho que não valerá muito a pena, neste momento, insistirmos muito na arrumação, independentemente de sermos contra os buracos na Constituição, tal como há pouco já referiu o meu camarada Almeida Santos, e também o Dr. Jorge Miranda.

Quanto ao ponto concreto, nomeadamente esta alínea d), considero que a arrumação proposta pelo PCP é a mais correcta. Porém, suponho que deveríamos deixar este assunto para a subcomissão de redacção, onde, de uma melhor forma, se poderá discutir esta questão. Agora, ater-nos-íamos, apenas, ao conteúdo das diversas propostas, independentemente da sua sistematização.

A Sr.a Margarida Salema (PSD): — Só um pequeno pedido de informação. Efectivamente, estávamos a discutir o conteúdo da alínea d). Não sei qual a posição da subcomissão em relação a esta proposta da AD, sobretudo na parte final.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: — Não oposição, embora se tenham manifestado no sentido da sua não utilidade.

Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Estou de acordo quanto à questão da nossa proposta. Em relação à proposta da AD, nós não nos opusemos, mas também não apoiamos e continuamos a considerar desnecessários este tipo de aditamentos. Podia ter um elemento perturbador. Podia dar a entender que este "interpretar, sus-

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pender ou revogar" podia ser feito por outra maneira que não fosse uma lei. Ora bem, a Assembleia da República ao interpretar leis, ao suspendè-las ou ao revogadas tem de o fazer por leis e, portanto, é uma tautologia. Fazer leis e suspendê-las por via de lei acaba por ser uma tautologia perturbadora.

Por isso, creio que nunca ninguém pôs em dúvida que a Assembleia da República pudesse fazer isto por via de lei. Creio que, talvez, fosse evitar um elemento perturbador, o aditamento.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, esta proposta, pelo menos tal como está, não pode ser aceite.

Em primeiro lugar, a competência para fazer leis compreende tanto o poder de as editar originariamente como o de as interpretar, suspender, modificar e revogar.

Em segundo lugar, porque só o dizer a respeito de competência legislativa do Parlamento e na também a respeito da competência legislativa de assembleias das regiões autónomas ou a respeito da competência legislativa e regulamentar do Governo?

Em terceiro lugar, o dizer-se, aqui, que compete à Assembleia da República fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las, poderia ter o sentido de impedir que o Governo, em matéria não reservada à Assembleia da República, não pudesse modificar ou revogar leis da mesma Assembleia da República. Ora isso, certamente não está nas intenções dos autores.

É preferível manter o texto constitucional como está.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jorge Miranda, como está mas excluindo-se a referência ao Conselho da Revolução: "fazer leis sobre as matérias salvo as reservadas ao Governo", não é?

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Com certeza.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — O Sr. Deputado Jorge Miranda admite a competência do Governo em matéria de leis?

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Desculpe, não percebi.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Interpretativa do Governo em matéria de leis?

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Deputado Sousa Tavares: o Governo é um órgão legislativo e, como tal, pode fazer leis interpretativas à semelhança de qualquer outro órgão legislativo, desde que não sejam matérias reservadas à Assembleia da República.

O Sr. Presidente: — Prestado o esclarecimento pelo Sr. Deputado Jorge Miranda, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): — Era para dizer, fundamentalmente o que acaba de afirmar o Sr. Deputado Jorge Miranda. Pessoalmente também entendo que não se ganha com o acrescentamento deste inciso. É evidente que o Governo pode perfeitamente interpretar autenticamente uma lei da Assembleia da República, desde que não se trate de matéria de competência reservada. Se o Governo pode legislar, revogar e modificar as leis da Assembleia da República, a posteriori pode, natural-

mente, interpretá-las. O Governo pode, portanto, declarar qual o que passa, a partir de determinado momento, a ser um determinado dispositivo legal. Se isto vale como interpretação ou vale como modificação da lei, é questão que não tem grande relevo. Mas o Governo tem, no exercício do seu poder legislativo, a plena possibilidade de a fazer.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Creio que o Deputado Jorge Miranda tem razão quando invoca o paralelismo com outros órgãos legislativos. Se se entendesse que a proposta da AD tem algum sentido, então o seu lugar poderia ser o artigo da proposta da FRS relativo aos actos legislativos. Aí poderia haver vantagem numa norma genérica, dizendo que os órgãos legislativos têm o poder, de igual forma, de interpretar ou suspender os próprios actos legislativos. É uma solução que pode ser pensada, já que estou apenas a raciocinar alto neste momento.

No respeitante às relações entre os actos legislativos, há uma proposta nossa — que na altura será discutida — que tem a ver com uma coisa que o deputado Jorge Miranda disse, porque nós propomos, efectivamente, a prevalência das leis sobre os decretos-leis em tais termos que os decretos-leis não pudessem revogar leis, senão quando autorizados para isso. Mas isto tem apenas a ver com uma intervenção do Sr. Deputado Jorge Miranda. A seu tempo discutiremos esta proposta. Não queria levantar agora problemas, mas apenas, já, lembrar que esse problema existe. Sugiro, no entanto, que pensássemos na ideia de, no artigo proposto pela FRS, que me parece feliz, em geral sobre actos legislativos, se pudesse pensar numa norma destas, que se aplicasse, então, a todos os órgãos e a todos os actos legislativos.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Sousa Tavares era para!

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Era para dizer que não fazemos questão sobre a manutenção desta parte final, "bem assim interpretá-las, suspendê-las ou revogá--las". Deixamos cair isto e seguimos para a frente.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Sr. Presidente, era só para dois pontos: o primeiro para dizer que, em princípio, me parece uma boa sugestão, que não deve cair cm "saco-roto", a que agora foi feita pelo Sr. Deputado Vital Moreira de, no artigo 115.°, se repegar esta proposta da AD em matéria de suspensão, revogação ou interpretação de leis e, em segundo lugar, a propósito de uma intervenção do Sr. Deputado Jorge Miranda, dizer que, apesar de nós no artigo 115.° expressamente admitirmos aquilo que já hoje acontece relativamente à possibilidade de o Governo por decreto-lei alterar leis da Assembleia da República que não tenham sido aprovadas no exercício da sua competência exclusiva, reservamos a nossa posição relativamente a uma proposta do PCP que vai em sentido contrário, de se admitir a prevalência das leis da Assembleia da República sobre os decretos-leis do Governo. Quer nós, quer na subcomissão, também a própria AD, reservámos a posição sobre essa matéria e nós continuamos a meditar nessa questão, pois supomos que tem alguma potencialidade.

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O Sr. Presidente: — Portanto, Srs. Deputados, em relação à alinea d), a AD deixa cair a expressão final "e bem assim, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las", pelo que esta alínea, a existir, teria a seguinte redacção: "fazer lei sobre todas as matérias, salvo as reservadas pela Constituição ao Governo". Isto independentemente de no artigo 115.° se arranjar uma redacção que tomasse em consideração aquilo que foi dito em relação a esta matéria da interpretação, suspensão ou revogação de leis.

Em relação à actual alínea e) do artigo 164.° não há nenhuma proposta de alteração.

Alínea J) Sr. Deputado Almeida Carrapato, se faz favor.

O Sr. Almeida Carrapato (PS) — Entendo, e sempre entendi, designadamente, quando da última publicação da lei da amnistia — Lei n.° 3/81, de 13 de Março —, que talvez fosse conveniente darmos uma relação mais ampla à alínea /), ao conceito que, presentemente, verte da redacção actual.

Assim, diz-se na alínea J): "Conceder amnistias." Já se tem discutido — nomeadamente a propósito da última lei da amnistia — que estas leis envolvem uma parte que não são de amnistia stricto sensu, quer dizer, de amnistia em sentido técnico-jurídico. Este tipo de amnistia dirige-se ao crime, apaga o crime, extingue-o. O perdão não se dirige ao crime. O perdão actua sempre relativamente ao crime a posteriori, o perdão actua depois, não extingue o procedimento criminal que já se consumou, perdão que tem por efeito uma redução quantitativa da pena já aplicada.

Por vezes em tribunais — e posso dizer que isso ocorre num tribunal do Algarve — discuti e discutiu-se a aplicação da última lei da amnistia na parte concernente ao perdão. Entendo que a melhor doutrina, presentemente, segundo o direito constituído, é, efectivamente, de abranger, na concessão da amnistia, também o perdão genérico. Mas para evitar dúvidas e discussões e se a concessão de amnistias tem dignidade constitucional e está expressamente prevista na Constituição, entendo que a redacção da alínea J) deve ser mais ampla no sentido de abranger, também, o perdão das penas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): — É também a título puramente pessoal. Por enquanto e até ulterior reflexão — estou a trocar impressões com uns colegas e talvez cheguemos a uma posição mais avançada —, parece-me de saudar esta proposta. De resto, todas as pessoas que trabalham com estas questões têm consciência da dificuldade da questão. Portanto, julgo que esta proposta é de saudar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): — É só para dizer que estamos de acordo. Aliás já havíamos dado o nosso acordo anteriormente. De qualquer modo, isto elimina dúvidas para sempre. Penso que a distinção entre perdão específico que é o indulto que compete ao Presidente da República e o genérico que compete à Assembleia deve ser clarificado de uma vez para sempre.

A redacção poderia ficar para a respectiva Comissão.

O Sr. Presidente: — Em relação a esta matéria a AD concorda. A FRS concorda.

O Sr. Deputado Vital Moreira queria intervir? Faça favor.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Nós estamos de acordo. Aliás conhece-se a intervenção que tive na discussão de um problema dessa natureza na Assembleia. Parece-me que é de aplaudir a sugestão de clarificação nestes termos. Há a dificuldade de não haver nenhuma proposta em relação a esta alínea. Mas não será pelo nosso lado que deixará de haver consenso no sentido de se fazer uma disposição em relação à qual não havia proposta de alteração.

Portanto, pelo nosso lado também estamos de acordo.

O Sr. Presidente: — O MDP/CDE também está de acordo. Fica registado.

Em relação à matéria constante na alínea g) há uma proposta de alteração por parte da FRS que pretende que a redacção seja a seguinte: "Aprovar a Lei do Plano e o Orçamento Geral do Estado." Está dependente de um artigo que já foi debatido anteriormente e que é o artigo 107." Portanto, creio que não vale a pena, neste momento, entrar no debate desta matéria.

Em relação à matéria constante da alínea h) que se refere às autorizações ao Governo para realizar empréstimos a outras operações de crédito, há uma proposta de alteração por parte da FRS que pretende acrescentar a expressão "autorizar o Governo a conceder avales e realizar empréstimos a outras operações de crédito", mantendo-se no restante a redacção actual.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Sr. Presidente, no relatório da subcomissão faz-se referência ás alíneas k) e /)» quando se deveria fazer referência às alíneas h) e /). Efectivamente, esta proposta da FRS mereceu o apoio das restantes forças políticas na subcomissão.

Suponho que não valerá a pena fazer, aqui, uma explicitação do sentido. Isto hoje acontece através de uma autorização genérica do limite dos avales. Não faz sentido reservar à Assembleia da República a autorização para conceder empréstimos, se nela não estiver, também, a possibilidade e o poder de fixar o limite máximo, pelo menos, dos avales a conceder pelo Governo, sob pena de o endividamento do Estado não se fazer pela via directa do empréstimo, mas fazer-se pela via indirecta do aval.

O entendimento tem sido este e parece que existe uma unanimidade no sentido da nossa proposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Nós demos o nosso acordo e continuamos a dá-lo. Sugerimos, no entanto, que, para que a alteração não fique aquém da medida que importa alterar, porque, de facto, o tipo de intervenção da Assembleia nos empréstimos e nos avales é completamente distinto. Se os pusséssemos no mesmo plano, então iríamos suscitar a questão de saber se a intervenção em relação aos empréstimos não poderia ser também global, no género: "ficou o Governo autorizado a realizar empréstimos até ao limite de 200 milhões de contos no decorrer deste ano". .

Portanto, creio que deve manter-se o regime em relação aos empréstimos: autorização um a um e que deve constitucionalizar-se a prática decorrente de uma interpretação correcta da Constituição, a meu ver. Assim, em vez da redacção proposta pela FRS, manter-se-ia a actual redacção e acrescentar-se-ia "bem como autorizar

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o limite dos avales", para se estabelecer uma distinção clara entre o tipo de intervenção da Assembleia em relação aos empréstimos —que deve continuar a ser intervenção individual e concreta — e o tipo de intervenção em relação aos avales.

Sugeria aos proponentes esta alteração de redacção, de modo a tornar claro que não se pretende qualquer alteração do regime vigente em relação aos empréstimos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): — A correcção que o deputado Vital Moreira acaba de fazer elimina algumas das reservas que nós podíamos ter em relação à proposta da FRS. Mas mesmo assim (confesso que não sou perito em técnica financeira), não sei se esta restrição não irá causar graves dificuldades...

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): — Sr. Deputado, se me dá licença, esclareço que há uma lei pré-constitu-cional, que continua em vigor e que é justamente isto que a FRS pretende agora constitucionalizar. Portanto, não se vai cercear, nem aumentar rigorosamente nada o poder da Assembleia, nem o poder delegado. Era só para dar sede constitucional a uma situação que só certamente por inadvertência dos constituintes não ficou, logo, constitucionalizada.

O Sr. Costa Andrade (PSD): — Obrigado, Sr. Deputado, por esse esclarecimento. Sendo assim, e feita a correcção que o seu colega deputado Vital Moreira fez, talvez possamos dar o assentimento.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Esta questão de concessão de avales pode ser vista de duas maneiras: ou o consentimento da Assembleia a que o Governo conceda avales é tomado no sentido global e, portanto, ano a ano, o Governo é autorizado a conceder avales até ao montante de x e se fixa um plafond máximo ou o problema é o de o Governo ter de pedir autorização à Assembleia por cada aval que pede. É isto que ainda não vi bem definido, aqui, no problema. A minha opinião é que se deve autorizar o Governo a conceder avales até um determinado montante, devendo a redacção ser cuidada nesse ponto, — nisso estamos de acordo —, para que não possa ser interpretado de modo que o Governo por cada aval que dá tem que pedir autorização à Assembleia da República.

O Sr. Presidente: — Sr. deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): — Sem discordar deste "aparte", que me parece interessante, não vejo, em todo o caso, grande razão para distinguir o aval e o empréstimo em matéria de limites. Compreendo mal que o Governo para conceder um aval de pequeno montante precise de pedir autorização (um aval que esteja abaixo de certo limite) e que para conceder um empréstimo não precise. Mas a razão por que pedi a palavra não é essa.

Vozes ininteligíveis na gravação.

O Sr. Almeida Santos (PS). — Não é assim tão diferente. Quando se quer, um aval equivale a um empréstimo e pode ser até mais oneroso do que aquele porque

diz a AD que é só o "aval", mas se o aval for mal dado será, na verdade, um empréstimo seguramente pago.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Em todo o caso, dá-me licença que interrompa?

O Sr. Almeida Santos (PS): — Mas não foi por isso que pedi a palavra. Não faço questão, mas percebo mal a distinção!

O que queria dizer era o seguinte: é que talvez valha a pena reflectirmos um minuto sobre a expressão "realizar empréstimos". Um empréstimo pode ser concedido como operação activa ou como operação passiva. O que está aqui, seguramente, é que o Governo não pode pedir empréstimos porque isso, no fundo, é uma forma de contrair dívidas. Mas poderá concedê-los? Realizar, tanto é conceder como contrair e gostaria de vos ouvir sobre isso.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Pois é, o Sr. Almeida Santos acaba de pôr uma questão pertinente e acerca da qual me irei pronunciar. Sem pretender ter conhecimentos profundos nesta matéria, creio que a interpretação que tem sido dada sempre à alínea h) do artigo 164.° é a de que, efectivamente, o Governo necessita de autorização para contrair empréstimos, não precisando dela para os conceder. Salvo erro, já concedeu à Guiné e não creio que tivesse solicitado autorização à Assembleia da República. Os avales são, exactamente, uma forma de o Estado assumir responsabilidades por certas operações, que se equiparam muito mais à concessão de empréstimos do que à contracção de dívidas. Ou, pelo menos, têm as duas naturezas, porque o aval pode vir a acartar responsabilidades para o Estado no caso de, efectivamente, o devedor não cumprir a sua obrigação. Por isso mesmo nós mantemos uma certa abertura, que já foi manifestada, no que respeita à fixação de um montante global, tecto máximo dos avales que o Governo poderá realizar, durante um determinado ano

económico, na medida em que isso é um controle legítimo da Assembleia da República e não entrava, de maneira nenhuma, a actuação que o Governo é chamado a fazer ao longo da sua actividade. Mas, só nesta interpretação, sem ir mais longe, isto é, sem aceitar que se considere que realizar é tanto contrair como conceder empréstimos e que, para avales, o Governo tenha de vir à Assembleia da República pedir autorização. Dentro desta linha e, portanto, ficando em causa exclusivamente um problema de redacção, nós aceitamos a proposta da FRS.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — O problema levantado pelo Sr. Deputado Almeida Santos é pertinente, tendo-o eu próprio já levantado noutra sede, noutra oportunidade. E creio que ele é relevante, sobretudo em sede de empréstimos externos, isto é, em empréstimos do Estado Português a outros Estados. Na verdade, a importância ; inclusivamente política, desses actos pode suscitar a questão levantada e, pela nossa parte, estamos dispostos a participar numa reflexão, numa proposta de solução para essa questão. Mas na verdade, e desde já, independentemente da solução que se vier a adoptar, importa

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clarificar o texto da Constituição, para que numa ou noutra solução não houvesse dúvidas quanto a ela.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Desta parte final da discussão resultou a impropriedade da utilização do verbo "realizar". Porque "realizar", até no seu sentido literal, parece ter o significado contrário àquele que lhe é dado, como interpretação normal. É mais o "conceder", o "dar" empréstimos, do que o "contrair". Ora como disse o Sr. Deputado Amândio de Azevedo, com uma certa razão: isto tem sido sempre interpretado no sentido de que o Governo para contrair empréstimos precisa de autorização da Assembleia da República. Mas para dar empréstimos ou para os fazer, já não precisa. O que é preciso fixarmos é o que nós queremos e depois, utilizar as expressões linguísticas adequadas com a nossa vontade. Se nós queremos que o Governo seja limitado no contrair e no dar, nas duas opções activa e passiva, não pode ser este verbo que aqui está. Têm de ser os verbos "contrair" e "conceder". É uma questão linguística, porque este verbo, que aqui está, é perfeitamente confuso. "Realizar empréstimos" não se sabe bem o que seja! Parece-me que aquilo que reúne a generalidade das opiniões é que o Governo, em matéria de empréstimos, deve ser limitado, não só na contracção como na concessão, pelo menos ao nível externo. E que em relação a avales, o Governo deve ser limitado, ano a ano, no montante de avales que possa conceder. Tenho a impressão de que é isto que tem reunido a generalidade das opiniões.

De maneira que limitar-me-ia a chamar a atenção da Comissão de Redacção para que a vontade, mais ou menos genericamente expressa por consenso na Comissão, tanto quanto eu a possa interpretar, é a de que o Governo deve ser limitado em operações de crédito, VATrto na concessão como na contracção, isto é, tanto no acto activo como no acto passivo. É que em matéria de concessão de avales, que representa uma assunção de responsabilidades por parte do Governo, deve ter essa matéria limitada a um determinado montante, que é anualmente fixado pela Assembleia da República.

Será isto que reúne o consenso? É uma pergunta que faço à Comissão. Agora, o que não podemos é deixar, por imprecisões linguísticas, impreciso aquilo que se quer legislar.

O Sr. Presidente: — Antes de dar a palavra aos Srs. Deputados que estão inscritos a seguir queria dizer o seguinte, em ordem a estas posições se esclareçam: o que até aqui estava a merecer consenso era que se aditasse a esta alínea uma expressão que fizesse referência à concessão de avales, em termos e com umâ redacção a estudar. Em relação ao conteúdo da alínea, a redacção é tida como não sendo boa. No fundo, fala em "realizar empréstimos" com o sentido de contrair empréstimos. Portanto, haveria abertura dos diferentes partidos para precisar o sentido do que já está legislado, em ordem a que ficasse esclarecido que se trataria de contracção de empréstimos.

A intervenção do Sr. Deputado Sousa Tavares parece-me que foi num sentido diferente. Gostaria que as pessoas se pronunciassem. Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): — Penso que se introduziu aqui uma questão sobre a qual não reflectimos sufi-

cientemente. Temos que reconhecer que raciocinámos sempre em termos de operações passivas.

Agora, na medida em que se reconhece conveniência em condicionar a concessão de avales, lembro que o aval tem quase uma dupla natureza, de operação activa e de operação passiva. Pode traduzir-se numa dívida, mas na origem é sempre uma forma de concessão de crédito.

Não há dúvida nenhuma de que estar a fazer uma distinção muito subtil entre emprestar dinheiro e garantir o seu pagamento é, na verdade, querer enganar-mo-nos a nós próprios. Penso que deveríamos deixar neste momento esta matéria para uma reflexão ulterior, em que teríamos de ouvir ps economistas. Para já, estamos de acordo em que a expressão "realizar" é infeliz, a menos que queiramos, com isso, significar quer as operações activas quer as passivas de contracção de empréstimos, do modo de efectivação de empréstimos. Mas penso que, de qualquer maneira, também não podemos amarrar o Governo à situação de, para qualquer empréstimo, ter de ir pedir autorização à Assembleia. Às tantas, isso, paralisa a vida do Governo. Mas uma vez que em relação aos avales nos estávamos a inclinar para a fixação de um limite, que a prática já consagrou — e sempre que nos podermos encostar a uma prática não ficamos mal encostados —, penso que, também, seria isso, em principio, a minha inclinação de efectivação de empréstimos com operações activas. O Governo tem um limite para conceder empréstimos. Também concebo mal que, sendo a Assembleia que aprova a lei do orçamento e que, segundo a nossa proposta, apoiaria o próprio orçamento, que o Governo possa, apesar disso, fazer os empréstimos que quiser, sem nenhuma espécie de autorização da Assembleia. Seria uma forma, na verdade, de quase defraudar o equilíbrio orçamental e efectuar empréstimos que não estivessem previstos no orçamento ou empréstimos que não tivessem a devida garantia de reembolso. É um problema muito sério. Penso que não estamos, agora, em condições de o resolver e ficávamos por aqui. Tomámos consciência dele e iríamos consultar os nossos economistas, sobretudo os nossos macroeconomistas e financeiros, para sabermos até que ponto iremos, ou não, criar problemas a um governo, seja ele qual for.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, sem prejuízo de algumas doutas considerações que ouvimos agora ao Sr. Deputado Almeida Santos, queria dizer que, se é bom considerar os especialistas em todas as matérias, também o será nesta. Convém, apesar de tudo, não encarecer problemas onde eles não existem.

Em primeiro lugar, para nós é muito claro que em relação aos avales vigora um regime, que é pré-consti-tucional, e que estabelece, que, anualmente, o Governo carece de uma autorização para o montante global de avales a conceder. E é isso que se pretende, quanto a nós, constitucionalizar. Até aí é que estaremos de acorde. Qualquer outra restrição poderia ser incómoda e não veríamos nenhuma vantagem no aspecto de fiscalização dos actos do Governo.

Em relação aos empréstimos, é bom recordar-mo-nos todos que eles figuram, obrigatoriamente, na Lei do Orçamento Geral do Estado ou no Orçamento Geral do Estado. Qualquer que seja o caso, figuram. E têm uma autorização genérica, quaisquer que sejam as formas desses emrpéstimos. Depois, o que a Constituição diz é

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que, um a um, vêm à Assembleia da República. Suponho que devemos enquadrar neste sentido, nesta interpretação, a questão das leis do plano e do orçamento. E, obrigatoriamente, na lei do orçamento figura tudo aquilo que sejam empréstimos, no montante global ou em montantes parcelares, caso já estejam divididos. Por poder aparecer só o montante global, na altura da discussão do orçamento, é que a Constituição estabelece que depois, um a um, sejam aprovados. Parece-me que o que cá está basta. Tem bastado, aliás, e tem resolvido todos os problemas. Não vejo, assim, grandes vantagens em estarmos a complicar o texto da Constituição, até porque podemos cair no oposto, isto é, em vez de tornarmos mais fácil a compreensão virmos a complicá-la. Em todo o caso, estou de acordo com o Sr. Deputado Almeida Santos na sugestão que ele faz de, apesar de tudo, e quaisquer que sejam as opiniões que nós tenhamos aqui, consultarmos os especialistas na matéria.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Brevemente, Sr. Presidente, para chamar a atenção para um ponto, já referido pelo Sr. Deputado Veiga de Oliveira: é que, quanto à contracção de empréstimos, o montante global resulta, necessariamente, da lei do orçamento e que, portanto, o que está aqui na alínea h) é obrigar um a um, a autorização da Assembleia. Não tanto pelo montante global dos empréstimos mas para que a Assembleia possa controlar as condições e, até, o próprio credor. E também, por razões que, a meu ver, e em relação aos empréstimos externos, têm que ver com certa concepção de que é à Assembleia da República que compete definir, nomeadamente, um problema dessa importância. Quanto ao problema dos avales e ao problema dos empréstimos a conceder, não pode, necessariamente, nem num caso nem noutro, aplicar-se um regime idêntico. Quanto aos avales tem, necessariamente, de se entender que a autorização é genérica, assim como aos empréstimos a conceder. Também não poderá aplicar-se o que está hoje na alínea h), na medida em que é impensável que, caso por caso, o Governo venha a pedir autorização à Assembleia da República para fazer, por exemplo, um empréstimo a uma empresa pública, para conceder um aval, na medida em que muitas vezes se trata de operações de mínima importância ou de pequena quantidade e, até, múltiplas. Por exemplo, os avales às pequenas e médias empresas que são concedidos pelo Estado são múltiplos, havendo, até, um instituto da Administração Pública ...

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP). — Sr. Deputado de acordo! Mas até acrescentando mais: é que tudo isso está previsto no Orçamento Geral do Estado e na Lei do Orçamento Geral do Estado.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Exacto!

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): — Portanto não há, de facto, já hoje, para isso uma posição genérica.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Exacto! Há em geral. Para os avales não existe. Estes é através de exigência da Lei n.° 1/72, se bem me recordo. Tem que haver, porque os avales constituem, em termos de orçamento, uma espécie de conta de ordem, sendo exactamente por isto que ao votar-se o orçamento não há uma votação imediata, relativamente ao limite daqueles,

tendo sido necessário uma lei especial, que obrigou a que o Governo solicitasse à Assembleia da República a fixação de um montante. O acrescento que pretendemos era, apenas, neste preciso limite, ou seja constitucionalizar aquilo que, a nosso ver, já resultava necessariamente da alínea h), bem como de lei ordinária, de o Governo ter de solicitar à Assembleia da República a fixação de um limite máximo para os avales a conceder. E isso, parece que não estava em causa.

Suponho que o resto poderá ser posteriormente resolvido, depois de se acertarem pequenos pormenores.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não temos mais inscrições sobre este ponto.

Confesso-me incapaz de fazer o resumo, porque não assisti a toda a discussão desta alínea. Não sei se o Sr. Deputado Nunes de Almeida ou o Sr. Deputado Fernando Condesso estão aptos a fazê-lo.

Sr. Deputado Amândio de Azevedo, tem a palavra.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — É para manifestar a minha concordância com a proposta do Sr. Deputado Almeida Santos.

Esta matéria necessitaria de uma melhor reflexão e, portanto, não assumiríamos nenhum compromisso imediato. Iríamos estudá-la e depois poderíamos definir a nossa posição.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, alínea í).

Na alínea í) há propostas de alteração da AD e do MDP/CDE, que foram aceites pelos restantes partidos. Portanto, há consenso quanto à nova redacção desta alínea i), que ficará assim: "Definir os limites das águas territoriais e os direitos de Portugal aos fundos marinhos contíguos, e à zona económica exclusiva".

Quanto à alínea j), há uma proposta da FRS, apoiada pelo MDP/CDE e pelo PCP, para a qual a AD reservou a sua posição.

A alínea consagra: "Aprovar os tratados que versem matéria da sua competência legislativa exclusiva, os tratados de participação de Portugal em organizações internacionais, os tratados de amizade, de paz, de defesa e de rectificação de fronteiras — e aqui entraria o inciso da FRS — bem como os respeitantes a assuntos militares — e seguiria depois — e ainda quaisquer outros que o Governo entenda submeter-lhe."

Em discussão Srs. Deputados. Parece que só a AD reservou posição em relação a esta alteração. Tem a palavra o Sr. Deputado Amâncio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Mantém-se a nossa posição de, em princípio, aceitar esta proposta, mas com reservas que nos permitirão ponderá-la majs demoradamente, a seu tempo diremos a nossa posição definitiva.

O Sr. Presidente: — Portanto, em relação à alínea f) há uma reserva de posição da AD que será, a seu tempo, discutida.

O Sr. Deputado Monteiro Taborda queria falar sobre alínea ffi Faça favor.

O Sr. Monteiro Taborda (MDP/CDE). — Era por causa da proposta do MDP/CDE de eliminação da palavra "exclusiva", quando se consagra "aprovar os tratados que versem matéria da sua competência legislativa exclusiva". Pareceu que não tinha razão de ser aqui, embora, normalmente, a aprovação dos tratados

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seja da competência só da Assembleia. É para a hipótese de poderem ser aprovados primeiro pelo Governo e depois ratificados, ou não pela Assembleia, que nós propúnhamos a eliminação da palavra "exclusiva".

Quanto à proposta da FRS, estamos de acordo na medida em que, partindo do princípio que não vai haver Conselho da Revolução, toda essa matéria legislativa passaria para a competência da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, alguém quer pronunciar-se sobre esta sugestão do MDP/CDE? O Sr. Deputado Sousa Tavares, tem a palavra.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Esta observação do Sr. Deputado Monteiro Taborda tem toda a razão de ser.

Se entendemos que todos os tratados são da competência legislativa da Assembleia da República, a expressão "exclusiva" não faz sentido. Se não entendemos, estamos a fazer uma restrição aos poderes da Assembleia, em vez de os ampliar estamos a restringi-los. Quer dizer, pode haver um tratado que não seja da competência da Assembleia da República e que ela não tenha obrigação de aprovar, ou que ela não tenha competência para aprovar. Estamos aqui a admitir, com o adjectivo "exclusiva", a possibilidade de haver um tratado internacional feito por Portugal sem que a Assembleia o aprove, o que me parece um bocado estranho.

Portanto, considero que a observação do Sr. Deputado Monteiro Taborda tem toda a razão de ser.

Vozes.

Desculpe, Sr. Deputado Jorge Miranda, mas pense bem no que aqui está escrito: "Aprovar os tratados que versem matéria da sua competência legislativa exclusiva." Quer dizer, só estes é que são, obrigatoriamente, referendados pela Assembleia. Portanto, nós admitimos que possa haver tratados que não são referendados pela Assembleia. É isso que se quer? Óptimo, podia ser um lapso.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PC?): — Sr. Presidente, a questão posta pela proposta do MDP/CDE é saber se deve, ou não, ser alterado o regime actual, segundo o qual nem todos os tratados têm de ser aprovados pela Assembleia.

Hoje só têm de ser aprovados pela Assembleia, além daqueles que o Governo entender submeter-lhe, independentemente de ser ou não obrigatório, aqueles que versem as matérias que estão aí indicadas e aqueles que versem as matérias que fazem parte, hoje, da competência reservada da Assembleia da República.

Admito perfeitamente que se possa propor uma doutrina completamente diversa: a de que à Assembleia da República compete aprovar todos os tratados, ficando o Governo apenas com a competência para aprovar as convenções internacionais que não sejam tratados.

É uma sugestão que não consideramos difícil justificar e que, da nossa parte, provavelmente, podia colher apoio. Mas a proposta do MDP/CDE, digamos, fica a meio caminho. Quer dizer, dá um passo à frente, mas fica aquém, porque, na verdade, hoje, tirar o "exclusivo" é dizer que todos os tratados que tenham

efeito sobre a ordem jurídica interna portuguesa e, portanto, pudessem ser objecto de leis, passam a ser da competência da Assembleia da República.

É um alargamento sensível, sem dúvida. Da nossa parte, se é esse o propósito da proposta do MDP/CDE, é óbvio que estamos dispostos a considerá-la positivamente, mas creio que a justificação que foi dada não é bem aquela que, em nosso ver, resultava imediatamente da retirada da palavra "exclusiva".

Não fizemos essa proposta, mas estamos dispostos a acolher favoravelmente qualquer proposta que alargue a intervenção da Assembleia da República no que respeita à aprovação de tratados. Nessa altura é óbvio que a parte final — que hoje se refere aos tratados que o Governo entenda submeter à Assembleia da República, na medida em que haja uma norma genérica segundo a qual todos os tratados são aprovados pela Assembleia — da disposição deixaria de ter sentido.

Se é este o propósito do MDP/CDE, ou seja de alargar a intervenção da Assembleia da República na aprovação de, praticamente, todos os tratados — ou mesmo de todos —, então que o diga especialmente. E, assim, nós estamos dispostos a considerar positivamente tal proposta.

Em todo o caso, mesmo que não venha a ser acolhida esta proposta de alteração, há uma ideia que tem de ser alterada, se vier a ser alterada a ideia da distinção, dentro da competência reservada à Assembleia, entre uma esfera de competência exclusiva e uma esfera de competência relativamente reservada, porque, hoje, o exclusivo refere-se a tudo aquilo que está no artigo 167.°

Se no artigo 167.° formos estabelecer uma área de competência exclusiva não delegável numa área de reserva relativa que continua a ser delegável, então este exclusivo passaria a referir-se à tal área não delegável, o que implicaria uma diminuição do seu actual alcance. Nessa altura a palavra "exclusiva", para manter o seu actual alcance, teria de ser substituída pela palavra "reservada".

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, tentarei ser o mais breve possível.

Não há uma necessária coincidência entre a competência legislativa e a competência para a aprovação de tratados internacionais, conforme o mostra a nossa própria experiência constitucional.

A Constituição de 1976 procurou alargar o mais possível a competência de aprovação de tratados por parte da Assembleia da República, mas teve consciência de que havia limites de razoabilidade e limites de ordem prática que dificilmente poderiam ser ultrapassados. Por isso, na alínea j) do artigo 164.° distinguiu três tipos de tratados: os que podemos chamar legislativos (em que hâ uma correspondência com as matérias do artigo 167.° e, também, com as matérias legislativas previstas no artigo 164.°, estas já hoje consideradas pela doutrina como integrantes de uma reserva de competência absoluta), os tratados sobre matérias políticas — tratados de paz, de amizade, de rectificação de fronteiras, etc, finalmente, em termos residuais, os tratados que o Governo possa submeter à Assembleia, ficando, então, precludida a sua competência de aprovação.

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Este sistema tem provado bem, e tem garantido uma esfera de intervenção da Assembleia sem precedentes no direito anterior. Deverá, portanto, a meu ver, ser mantido, até porque a proposta do MDP/CDE — com a qual simpatizaria, no entendimento que lhe foi dado pelo deputado Vital Moreira, poderia ser de difícil execução.

O Sr. Deputado Vital Moreira chama, no entanto, e muito bem, a atenção para a necessidade de, no caso de ser aprovada a proposta da FRS (e também as propostas do PCP e do MDP/CDE) em vez de competência legislativa exclusiva se dizer competência legislativa reservada, para efeito de se atender à distinção, constante das propostas da FRS, do PCP e do MDP/CDE, entre competência legislativa com reserva absoluta e competência legislativa com reserva relativa. A ficar, aqui, na alínea f) competência legislativa exclusiva e a ser aprovado um artigo sobre reserva de competência absoluta, acabaria por dar-se uma restrição da competência de aprovação dos tratados, coisa essa que ninguém deseja.

Quanto à proposta da FRS, de aditamento de referência a tratados que versem sobre assuntos militares, ela vem na linha lógica da extinção do Conselho da Revolução.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Ê só para dizer que relativamente à proposta do MDP/CDE o PSD não a aceita. Estamos contra essa proposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Monteiro Taborda.

O Sr. Monteiro Taborda (MDP/CDE): — Efectivamente repito que a ideia do MDP/CDE era, fundamentalmente, de não limitar a competência da Assembleia da República quanto à aprovação de tratados que versassem sobre uma competência legislativa não exclusiva, como é óbvio.

Mas, dadas as intervenções dos deputados Jorge Miranda e Vital Moreira, parece que seria, talvez, de ficar em suspenso e remeter para quando se tratasse das propostas da FRS e do MDP/CDE quanto à competência não delegável da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): — Tudo visto, pela nossa parte, inclinamo-nos a que as coisas fiquem como estão. Resta-me, agora, dizer porquê. Parece-me que há um certo equilíbrio na solução que está consagrada na Constituição. Se a proposta se referir não à competência específica ou reservada da Assembleia mas à sua competência genérica, a norma não tem sentido. O que houve, aqui, foi a disposição de haver uma repartição de competências em matéria de aprovação de tratados. Aqueles que se consideram fundamentais, quer porque fazem parte de uma competência reservada da Assembleia e, portanto, o Governo viria por via indirecta intrometer-se no domínio dessa competência, o que não estaria correcto, quer porque se trata de assuntos especiais que se entendeu que, pela sua importância, deveriam ser reservados à Assembleia, como nós entendemos que deve ser, agora, o

caso dos acordos militares, uma vez que há que substituir o Conselho da Revolução.

Mas, para além disso, não nos devemos esquecer que o Governo é o órgão geral de condução da política do País e que a política externa é a política do País.

A própria AD veio fazer uma proposta no sentido de que quando se diz política geral se diga política interna e externa. Julgamos que isso não é necessário, que já está explícito na política geral.

Mas, sem dúvida, o Governo é o órgão normal de condução da política externa, sem prejuízo de, no nosso entender, o Presidente da República passar a dever ter — coisa que também já tinha — a mais alta representação no domínio externo.

O que considero é que não se deve tocar neste equilíbrio, tirando a transferência do Conselho da Revolução para a Assembleia da República, porque os assuntos militares, a meu ver, merecem que assim seja. Penso que não devemos mexer neste equilíbrio e, sem prejuízo de estarmos dispostos a considerar as propostas que queiram apresentar, inclinar-nos-íamos para não concordar com qualquer repartição de competências que não fosse a que está em vigor e que funcionou normalmente.

Vozes.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (?SD): — Não tenho mais nada a dizer depois do que foi dito pelos deputados Amândio de Azevedo e Almeida Santos.

De facto, a única coisa que desejava dizer é que ...

Vozes.

O Sr. Almeida Santos (PS): — Só mais um esclarecimento, que é o seguinte: é que isso não quer dizer que o Governo não possa submeter, se o entender, à Assembleia da República um tratado que entenda que tem uma especial importância. Conjugado tudo com esta facilidade, acho que o actual equilíbrio é um equilíbrio a manter.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — O Dr. Almeida Santos disse grande parte daquilo que eu queria dizer, que é que a actuação política, hoje em dia, passa por actos constantes de acordos internacionais, sejam aspectos clturais, comerciais, etc, que não podem, de maneira nenhuma, estar, fundamentalmente, sujeitos à aprovação da Assembleia da República. Seria atribuir poderes de executivo à Assembleia da República, o que excede a sua faculdade de fiscalização e de órgão de soberania legislativo. Todos os acordos de comércio, que podem ser dezenas, ou até centenas por ano, os acordos culturais, de rios, de energia, de pesca, toda a imensidade de actos que, hoje em dia, envolvem acordos internacionais e que são, praticamente, mais do que normais, teriam de ir à Assembleia da República! Ora isto impossibilitaria qualquer Governo de governar e, portanto, parece-nos que o que está, está certo e devemos passar à frente.

O Sr. presidente: — Srs. Deputados, quanto à alínea j) do artigo 164.°, verifica-se que, após discussão, o MDP/CDE retirou a sua proposta. A FRS manifesta-se pela necessidade de manter o actual equilíbrio no que respeita à aprovação dos tratados, podendo vir a

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admitir, em sede de Comissão de Redacção, uma redacção que melhore a actual, prevendo, nomeadamente, a hipótese de substituir o adjectivo "exclusiva" por "reservada", ou outro qualquer que venha a ser achado justo pela Comissão de Redacção. Há consenso das restantes forças políticas no sentido da manutenção deste equilíbrio.

Há, ainda, o aditamento, a seguir a "fronteiras", da expressão "bem como respeitantes a assuntos militares", proposto pela FRS.

Srs. Deputados, há consenso em relação ao aditamento desta expressão?

Há abertura por parte da AD para a discussão deste ponto, com algumas reservas.

Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP). — Sr. Presidente, as alíneas k) e í) da proposta da AD não dizem respeito, já, ao artigo 164.°, mas sim ao artigo 165.° Propunha, portanto, que essas alíneas fossem tratadas na respectiva sede. E propunha, também, que se discutissem as propostas do PCP e da FRS de aditamento de novas alíneas a este artigo 164.°, designadamente as alíneas d), J) e m) da proposta do PCP e a alínea f) da proposta da FRS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, em relação a esta proposta, feita pelo Sr. Deputado Vital Moreira ... Sr. Deputado Vital Moreira, faz favor.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Verifico agora que também a FRS inclui no artigo 164.° uma norma semelhante à proposta pela AD, no que respeita à autorização, pela Assembleia da República, dos actos do Presidente da República relativos à guerra e à paz. Portanto, e corrigindo aquilo que disse, será de tratar, também, a alínea k) da proposta da AD e a alínea i) da proposta da FRS.

O Sr. Presidente: — Portanto, em debate as alíneas k) e /) da proposta da AD e 0 da proposta da FRS. É isso Sr. Deputado? E a d) do PCP?

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Todas as novas alíneas.

O Sr. Presidente: — Em discussão ao mesmo tempo, é a sua proposta?

Creio que em relação à guerra e paz há consenso, ou seja, a alínea í) da FRS e a y) da AD. Pelo menos é o que consta do relatório da subcomissão, não é?

Portanto, estas alíneas estão aceites por consenso geral.

Em relação à alínea l) da AD parece também estar aceite por todos os partidos. Pelo menos é o que consta do relatório da subcomissão.

Sr. Deputado, a proposta das alíneas k) e l), creio que da AD mereceu o apoio dos representantes das restantes forças políticas. Portanto, não há alteração a esta posição, independentemente da sua sistematização.

Em relação à alínea d) proposta pelo PCP ...

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Está a seguir-se uma técnica diferente da adoptada até agora.

O Sr. Presidente: — Não, não, Sr. Deputado! Estou a seguir rigorosamente o esquema da subcomissão.

A seguir à alínea J) da FRS vêm as alíneas k) e f) da AD. Depois vêm logo a seguir, quanto às propostas do PCP em relação ao artigo 164.°, a alínea d),

em que a AD, o PS e a UEDS reservam a sua posição e a ASDI e o MDP/CDE aceitam.

A alínea d) do PCP: "aprovar os estatutos político--administrativos das regiões autónomas ou suas alterações".

Sr. Deputado Jorge Miranda, faça favor.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Há momentos, tinha ficado definido um determinado critério para tratamento destas matérias, que era, por referência aos actuais artigos da Constituição, considerar as diferentes matérias.

Agora o Sr. Presidente estaria a considerar uma ordem diferente.

Por outro lado, aproveitaria, ainda, para dizer que a AD tem uma alínea k), sendo certo que no alfabeto português não existe a letra k.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jorge Miranda, esse último problema será, naturalmente, um problema da Comissão de Redacção.

Em relação ao ponto de ordem que fez o Sr. Deputado Jorge Miranda ...

Oh, Sr. Deputado Veiga de Oliveira, ainda por cima a citar Salazar!

Risos.

Vozes.

Risos.

Bom, Srs. Deputados, passado este momento de boa disposição, que é sempre bem vindo, voltaríamos à questão do ponto de ordem posto pelo Sr. Deputado Jorge Miranda em relação ao qual fui induzido por desconhecimento desse acordo prévio, a seguir e ordem do relatório da subcomissão.

Por outro lado houve uma proposta do Sr. Deputado Vital Moreira no sentido de discutir as alíneas k) e l) da AD e a seguir a alínea d) do PCP.

Por isso, como não estou bem dentro do critério que foi estabelecido previamente, as alíneas k) e /) da AD não oferecem quaisquer dúvidas. Quanto à alínea d) do PCP, que se refere à criação das regiões administrativas e dos municípios, bem como os tribunais, há aceitação da parte da ASDI e do MDP/CDE e reserva de posição dos outros partidos.

Em discussão Srs. Deputados.

Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Na subcomissão admitimos que pode ser nitidamente excessivo exigir uma decisão da Assembleia para criar cada tribunal e, portanto, admitimos, ou deixar cair a proposta nessa parte ou reformá-la em tais termos que ela se referisse não ao tribunal em si mesmo, mas à criação, por exemplo, das ordens de tribunais, etc. Mas admitimos, portanto, ser excessiva a própria referência aos tribunais e que seja difícil reformular, com sentido útil, a questão.

Portanto, pela nossa parte, centraríamos a proposta naquilo que se refere à criação e à extinção das regiões administrativas e dos municípios. A ideia é dar à Assembleia a própria competência para o acto de criação em tais termos que cada criação, ou extinção, de nova região ou de novo município exija uma decisão própria da Assembleia da República, dado não só a relevância política, mas, também, a dignidade de lei da Assembleia que se daria à criação de novas entidades autárquicas da República.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — É só para dizer que nós mantemos as nossas reservas a esta alínea porque pretendemos ligá-la com aquilo que vai ser discutido adiante na parte respeitante, exactamente, às regiões administrativas e aos municípios, etc.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): — É só para dizer que também não vemos bem — de resto o Sr. Deputado Vital Moreira acaba de reconhecer — como é que seja defensável a necessidade de uma lei para criar um tribunal, por exemplo, um determinado tipo de tribunal. Por que é que há-de vir a Assembleia da República decidir sobre isso?

Mas, uma vez que já está retirada a proposta no que a isto concerne, não há problemas.

O Sr. Presidente: — Não sei se o Sr. Deputado Vital Moreira retirou essa parte da proposta ou se propôs reformulá-la?

O Sr. Vita! Moreira (PCP): — Fica de remissa, para já, até nova consideração. Para já admitimos que no estado em que está, não é susceptível de ser mantida. Fica de remissa a possibilidade de reformulá-la no sentido de lhe dar um conteúdo útil e com sentido.

O Sr. Presidente: — Portanto, toma-se nota dessa precisão. Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para dizer que diferentemente do que consta do relatório da subcomissão, a ASDI não deu acordo à proposta do PCP na parte respeitante aos tribunais.

Deu apoio, sim, à proposta respeitante às regiões administrativas e aos municípios.

Todavia, gostaria de aditar duas considerações.

A primeira é a de que também deveria ser prevista a criação das freguesias.

Por outro lado, esta matéria deveria ser tratada em sede de reserva de competência legislativa da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso.

O Sr. Fernando Condesso (PSD): — Já não direi muito, mas de qualquer maneira queria dizer que em relação a esta matéria de criação de regiões e municípios, e a matéria referente aos tribunais, a própria AD a apresentou no seu projecto, no artigo 167.°, n.° 2, alíneas b) e c), e apresentou a sua maneira como, efectivamente, perspectiva esta matéria, refere-se, aí, que competiria à Assembleia da República a aprovação de bases gerais sobre divisão territorial, incluindo a criação, etc, etc, organização e competência dos tribunais e do Ministério Público, estatuto dos respectivos magistrados, o que quer dizer que, também nesta matéria, tem a sua posição e que, realmente, não coincide, propriamente, com a do PCP.

Depois mais tarde se verá.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Almeida Santos, tem a palavra.

O Sr. Almeida Santos (PS): — Ê só para dizer, também, que nos parece excessiva a exigência de uma lei para criar tribunal a tribunal.

Quanto ao mais parece-nos que já está abrangido noutras propostas das várias formações políticas.

Quanto às regiões administrativas considero que seria cedo para estarmos a consagrar, aqui, esta competência que incluímos numa referência genérica à organização das autarquias locais, dado que, neste momento, as regiões administrativas estão ainda definidas na Constituição como uma autarquia local. Bem sei que aqui fala em criação e nós falamos em organização! É um problema a ver, mas de, qualquer modo, entendemos que não deveríamos, neste momento, assumir uma posição sobre isto sem definitivamente nos termos pronunciado na parte relativa às regiões administrativas. É um domínio em que há propostas de alteração bastante substanciais e penso que, neste momento, não poderíamos ir muito além, não poderíamos, mesmo, deixar de manter a nossa própria formulação. Posteriormente se verá.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. VilaS Moreira (PCP): — A questão dos tribunais está ultrapassada, portanto, a não ser que retomemos a questão com nova formulação. Assim, considera-se retirada a proposta nessa parte.

Em relação às regiões administrativas e municípios importa distinguir duas coisas.

Uma, é o regime das autarquias locais.

Outra, é o acto pelo qual se cria.

O que propomos é que haja uma medida, uma lei acto da Assembleia a criar cada região e cada município. Portanto, isso é independente, ou pode ser independente, embora já hoje sustente que essa é a solução constitucional, de cada criação de municípios já implicar uma decisão mediante lei — uma lei medida — da Assembleia da República. Assim, nessa parte nem temos a nossa proposta por inovatória, mas sim como explicitação de um sentido constitucional que nos parece ser a melhor solução. Portanto, é de exigir que cada município tenha atrás de si uma lei da Assembleia da República. Se quiserem, é uma espécie de recuperação da ideia de exigir que a representação nacional dê um foral de criação de um município e da região administrativa. É este mentido da proposta e importa que ele fique totalmente clarificado nesse sentido.

É óbvio que se se for para a ideia de que a região administrativa ou o município exige um referendo local, mesmo assim há-de haver uma decisão prévia de alguém que submeta e mesmo nessa altura nós mantemos a ideia de que uma decisão mediante a lei da Assembleia da República para essa matéria tem toda a sua virtualidade e toda a sua correcção.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Sr. Presidente, nós manifestámos objecções na subcomissão e, agora, aproveitaria, a propósito desta intervenção do Sr. Deputado Vital Moreira, para esclarecer que a proposta do PCP é, em parte, inovatória.

Efectivamente sempre partilhei da opinião expressa pelo Sr. Deputado Vital Moreira no sentido de que hoje é já matéria da exclusiva competência da Assem-

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bleia da República, quer a criação das regiões, quer a criação dos municípios.

Aliás, existe um parecer da Comissão Constitucional, recentemente publicado, onde por unanimidade a Comissão Constitucional se pronunciou no sentido de que a criação de autarquias é da exclusiva competência da Assembleia da República, nos termos do artigo 167.°

A proposta do PCP é inovatória na medida em que retira e em que diminui a competência da Assembleia da República, pois a criação de freguesias deixa de ser abrangida na proposta do PCP.

O Sr, Vital Moreira (PCP): — Nós não fazemos qualquer questão em reformular a proposta, onde se diz «regiões e municípios» pôr «criação e extinção de autarquias locais».

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Bom, é que, de facto, este é que é o alcance útil, a nosso ver, da proposta. Assim retiravam as freguesias. Foi por isso que manifestámos as nossas reservas.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — O alcance útil da nossa proposta é tornar fixo aquilo que hoje é apenas um entendimento, correcto embora, da Constituição. É este o alcance útil da nossa proposta.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Certo, com a correcção agora introduzida.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Exactamente o que queria dizer é que a proposta do PCP me parecia restritiva. Parecia-me bem restritiva, porque, de facto, parece-me que a competência para criar freguesias é um bocado de mais que seja extensiva à Assembleia da República.

O que acontece é que há por aí pelo País fora dezenas de questões de freguesias adiadas há anos, porque a Assembleia da República não tem tempo para se ocupar do problema e são questões, algumas, graves.

Não represento nenhum distrito. Represento o País, já sei, mas na medida em que sou eleito por um distrito, há nesse distrito uma velha questão, que é quase sangrenta, entre a ex-freguesia de Jeromenha e a freguesia que absorve Jeromenha, em que há uma luta de anciãos, que roubaram os selos e que não os devolvem, e uma data de coisas, e há 3 anos que está a promessa feita de que a Assembleia da República há-de examinar o problema e a Assembleia da República nunca o examinará, quer dizer, não terá tempo!

De maneira que penso que esta proposta do PCP, que, no fundo, restringe a competência da Assembleia da República à criação das regiões e dos municípios, tem razão de ser e que a criação de freguesias deve ter outra sede que não seja a da Assembleia da República. Não sei se seria essa a intenção do PCP, mas realmente considero vantajoso, porque são imensos os problemas que existem em relação à criação de freguesias. O PCP sabe isso, porque ele próprio também tem imensas reivindicações em relação à criação de freguesias. Todos os partidos têm e, inclusivamente, acaba por se transformar a criação de freguesias num comércio que é: tu agora crias 4, eu agora crio 5! Tu crias 10, nós criamos 20, e não sabemos até que ponto irá a multiplicação de freguesias!

Tenho a impressão que o problema da criação de freguesias, é um problema que, se fosse afastado da Assembleia da República, talvez tivesse vantagem.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (UEDS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: As razões que nos levaram a colocar algumas objecções à proposta do PCP na subcomissão estão neste momento ultrapassadas, perante a disponibilidade, manifestada pelo Sr. Deputado Vital Moreira, em reformular a proposta no sentido de incluir a criação das freguesias na competência da Assembleia da República, na medida em que a proposta que o PCP apresentava originariamente era uma proposta que restringia aquilo que já é o nosso entendimento da alínea h) do artigo 167.° da Constituição. Quando se fala em "organização das autarquias locais" pressupõe-se, também, a sua própria criação.

Neste contexto pensamos que a proposta do PCP tem vantagem, na medida em que esclarece, uma vez por todas, o entendimento de que a organização das autarquias é da competência da Assembleia da República, tal como a sua própria criação.

Dentro desta lógica de raciocínio, discordaria da opinião do Sr. Deputado Sousa Tavares. Penso que é de manter, na competência da Assembleia da República, a criação das freguesias. Aquilo que o Sr. Deputado Sousa Tavares diz é perfeitamente verídico, corresponde à verdade. Um terço dos projectos de lei da autoria dos deputados desta Câmara é para criação de freguesias. Isso é verdade. Esse um terço está a aguardar entrada na agenda do Plenário há muito tempo.

Simplesmente, não me parece que a solução para uma questão desse género seja remeter para o Governo a criação das freguesias, porque isso seria colocar nas mãos de juízos de oportunidade e de conjuntura política do Governo, a criação e a modificação das freguesias, que nos parece que deve competir à Assembleia da República por implicar opções estruturais e definitivas.

Diria, ainda, que nesse sentido a questão pode solucionar-se através da definição de uma lei quadro de criação de autarquias locais, mas que deve manter-se no quadro da competência da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Srs. Deputados, penso que todas as considerações que foram feitas são úteis nesta matéria, mas continua a afigu-rar-se-me que talvez não seja mau deixar uma posição definitiva sobre esta proposta para depois da discussão das normas sobre as autarquias locais.

Penso, efectivamente, que o que disse o Sr. Deputado Sousa Tavares tem de ser ponderado e requeiro, até, ao Sr. Presidente da Comissão que requisite nos serviços uma informação sobre todos os projectos que estão pendentes na Assembleia da República sobre a criação de freguesias e de concelhos, com a data da entrada, etc.

Julgo que, sem esclarecer muito a matéria, porque nunca estive nessa Comissão, a Assembleia se orienta no seguinte sentido: não é possível tomar posição sobre nenhum desses projectos antes de fixarem critérios

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objectivos e gerais. Talvez esteja aqui a chave do problema. Talvez a Assembleia da República deva fixar critérios objectivos e gerais e, depois, o Governo poderá aplicá-los e resolver, rapidamente, problemas que nunca mais se resolvem.

Tenho conhecimento de pedidos instantes dos interessados e a Assembleia da República não lhes dá resposta, sendo esta uma situação que não é, a meu ver, positiva.

Portanto, renovo a minha proposta, se assim se lhe pode chamar, no sentido de não demorarmos mais a discussão sobre esta matéria e de a encararmos depois de termos analisado as normas relativas ao poder local.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o Sr. Deputado Amândio de Azevedo acaba de fazer uma proposta que julgo não valer a pena repetir, mas que agradecia que a tivessem em atenção nas intervenções que se vão seguir.

Tem a palavra o Sr. Deputado Jaime Gama.

O Sr. Jaime Gama (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de dar a minha opinião sobre esta matéria, independentemente das propostas que estão em discussão.

Parece-me que é inequívoco que a Constituição deve conter alguma matéria sobre esta temática e que uma lei necessariamente da Assembleia da República deve regular toda a temática do poder local, de acordo com os princípios constitucionais, isto é, o sistema de órgãos, as atribuições e as competências de cada um deles e também o sistema eleitoral respectivo.

Mas já tenho algumas questões quanto à problemática, por um lado, da delimitação territorial das autarquias e, por outro lado, do próprio acto da respectiva criação.

Aqui há uma problemática que tem a ver, não apenas com a Administração, tal como ela está constitucionalmente elaborada, mas também com a existência de regiões autónomas. Parece-me que seria da máxima vantagem que a Assembleia da República, através de lei, pudesse decidir, de uma vez por todas, sobre os critérios objectivos da constituição de autarquias locais. Pomos, regra geral, esta questão em relação às freguesias, mas ela também se pode colocar em relação aos municípios.

A definição de critérios objectivos, nesta matéria, é, essencialmente, para regular, de um ponto de vista estável, este assunto.

Há, também, que assegurar, por um lado, a vontade dos cidadãos, isto é, dos autarcas constituintes neste campo e, por outro lado, o ponto de vista da autarquia de grau superior.

É para mim evidente que a administração central, seja o Governo da República, sejam os governos regionais, têm, obviamente, uma palavra a dizer nesta matéria, designadamente na elaboração dos respectivos processos nos termos da lei, independentemente da decisão final que possa vir a caber às assembleias regionais ou à Assembleia da República quanto a uma tomada de decisão definitiva sobre este tema.

Agora o que me parece é que em sede de revisão constitucional este assunto deveria ser contemplado, tendo em vista uma perspectiva genérica sobre o assunto. Não me parece que à Assembleia da República deva ser concedido o poder de decidir, casuisticamente, sobre a criação de autarquias locais. A Assembleia da

República, como órgão legislativo, tem é de definir através de normas enquadradoras genéricas esta problemática e o poder executivo tem, necessariamente, de encaminhar a resolução destes problemas.

Se à Assembleia da República é concedido um poder normativo casuístico sobre a criação de freguesias, vamos assistir a uma verdadeira distorção da realidade administrativa do País, flutuando ao sabor das conveniências eleitorais. Isso, evidentemente, invadirá o espaço de decisão de todos os partidos políticos e submeterá a organização administrativa do País à pior das demagogias e à maior das flutuações, não sendo a forma mais correcta de tratar estes assuntos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para esclarecer o mais rapidamente possível, alguns aspectos.

Em primeiro lugar, para repetir, evitando que "se bata mais no ceguinho" — perdoe-se-me a expressão —, que a nova proposta visava só, e tão-só, tornar claro e explícito aquilo que nós supomos estar implícito na actual disposição do artigo 167.° a este respeito. O que significa que, para nós, é à Assembleia da República que já actualmente, pela Constituição, compete este poder concernente à criação de novas autarquias, \nc\uindo as freguesias.

O facto de aqui estar referido as regiões administrativas e os municípios, peço desculpa mas tenho de eu próprio afirmar que só pode ter sido um lapso. Neste caso, talvez um lapso de máquina. Portanto, falta de verificação suficiente do texto que foi apresentado. Neste caso é evidente, porque nós temos sempre defendido isto que acabo de dizer.

Isto dito, convém esclarecer também, para que não fiquem no ar certas afirmações que aqui foram feitas, que os atrasos no funcionamento regular da criação de freguesias e municípios, mas sobretudo de freguesias, se deve, fundamentalmente, aos atrasos sucessivos—de que nós não somos responsáveis, vale a pena dizê--lo — em relação a dois projectos e a uma proposta de lei que estão, nesta altura, suponho, na iminência de subirem finalmente ao Plenário por uma última vez, para serem aprovados em definitivo. Já em texto de substituição da Comissão competente, e aí aprovado, globalmente, que justamente estabeleceu as normas objectivas, os critérios objectivos que hão-de presidir à criação das diversas autarquias, neste caso das freguesias, de que estávamos a falar.

Portanto, isso já existe, só que não está pronto! Mas não está pronto, insisto, não por nossa culpa. E não acenem com a cabeça, porque digo de quem é a culpa! Não quero agora estar a dizer, visto que nós estamos a discutir a Constituição, e não quero estar a chamar para aqui outra política. Não é da nossa responsabilidade! Nós temos insistido e íemo-nos batido para que isto fosse aprovado já antes, há duas sessões legislativas ou mais. Já na 1 Legislativa o fizemos!

De qualquer maneira, vale a pena registar que está na iminência a aprovação de uma lei quadro que permitirá definir critérios objectivos para a criação de autarquias.

Em todo o caso, vale a pena também lembrar que não se pode, tão simplesmente, acusar a Assembleia da República e os partidos que nela estão representados de ficarem sujeitos à tentação da pior das demagogias se a Assembleia da República ficar com esta competência, como se a competência passasse para o Governo, não

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fosse este e os partidos que na altura dominem o Governo que ficassem tentados à pior, e digo muito pior, das demagogias.

Parece-me que fica muito mais resguardada esta questão se ficar na competência da Assembleia da República do que na competência do Executivo.

Isto não invalida o facto de que para a criação, por exemplo, de freguesias haja uma interferência necessária do Governo, e essa interferência necessária é condicionante em muitas matérias, até porque é ao Governo que cabe verificar, por exemplo, o preenchimento dos mínimos da tal lei quadro, dos tais requisitos, etc, etc.

Portanto, não se retira competência ao Governo nesta matéria. Ao contrário, define-se completamente a sua competência através da lei quadro.

Mas, segundo já o nosso critério de interpretação da Constituição e pela nossa proposta, ficaria como acto da própria Assembleia a criação das autarquias locais.

Era esta a nossa intenção, é este o nosso objectivo, e que fique claro, portanto, do que se trata. E quando aqui desapareceu a expressão "freguesias", é, de certo um lapso de máquina!

Muito obrigado, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Queria dizer a este respeito que nós ou nos decidimos a ter uma Constituição de um. Estado democrático, ou temos de nos decidir a ter uma Constituição de um Estado desconfiado, o que não é bem a mesma coisa! A permanente desconfiança perante o Executivo não é própria de um Estado democrático. Ou nós acreditamos que o Executivo é democrático, ou nós partimos do princípio de que o Executivo é um "sacana" que está no poder para lixar permanentemente, a vida democrática da Nação! Isso não é, propriamente, uma mentalidade possível para a construção de um Estado democrático.

O Estado democrático constrói-se partindo do princípio de que o Executivo é democrático! Se partimos do princípio de que o Executivo não é democrático, não há possibilidade de construir um Estado democrático. Pode construir-se um Estado desconfiado, mas não pode construir-se um Estado democrático.

Ora bem, recordo aqui o que acabou de ser dito pelo Sr. Deputado Jaime Gama, e tem toda a razão de ser. É perfeitamente inverosímil que se dê competência à Assembleia da República para a criação de freguesias. O resultado é o aspecto lamentável a que nós assistimos, de estarem processos de criação de freguesias pendentes há 4 anos. amontoados! Realmente convinha ver esses elementos. Alguns têm justificação, outros não têm justificação. A Assembleia acaba por aprovar, ou por não aprovar, sem o menor exame do problema. Acaba por fazer, no fundo, um acordo entre partidos, que é: agora aprovamos 7 deste, 10 daquele, 4 daquele, 3 daquele, e é assim que se tem feito!

O Sr. Vilal Moreira (PCP): — Não se tem feito nada.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): — Sr. Deputado, dá-me licença? É que isso vai constar da acta e isso não é verdade.

Sr. Deputado, não se tem feito nada disso, porque a Assembleia, justamente, e todos os partidos recusaram que isso se fizesse! Entenderam que não se criaria nenhuma sem que houvesse uma lei quadro que res-

peitasse a todos. Por isso, Sr. Deputado, para que fique na acta, afirmo que não fizeram nada disso. Os partidos gregos e troianos foram muito mais respeitadores da legalidade e muito menos demagógicos do que o Sr. Deputado está a fazer crer.

De facto, o que a Assembleia da República e todos os partidos decidiram foi que não seria criada sem que uma lei quadro, que valesse para todos igualmente, fosse primeiro publicada.

O Orador: — Tenho a impressão de que a criação dessa lei quadro, que deve ser feita com todas as condições para a criação de freguesias, deve evitar que o processo de criação de freguesias passe pela Assembleia da República. Entendo que a Assembleia da República deve ter muito mais matérias a que se dedicar do que, propriamente, à criação das freguesias.

A criação das freguesias deve obedecer a uma lei quadro, a um determinado número de condições, que é fixado e : rgislado pela Assembleia da República, e essa é a competência própria que deriva da leitura atenta do artigo 167.° da actual Constituição, ou seja, a fixação dos poderes, da competência, das atribuições, da forma como devem ser criadas as autarquias. Agora que por cada freguesia do País tenha de haver uma deliberação da Assembleia da República com dicussão e exame do problema, com votação para saber se a freguesia é aprovada ou não, desculpem mas não faz sentido. Que isso ainda se possa aplicar aos municípios, concedo. Por isso digo que a proposta do PCP não deve ter sido por lapso, mas deve ter sido, de facto, meditada e ponderada, porque faz sentido que a Assembleia da República crie as regiões e os municípios, mas não faz sentido que o acto de criação de freguesias seja da competência da Assembleia da República. Deve ser da competência do Ministro da Administração Interna, do Governo, segundo as normas legisladas pela Assembleia da República.

A Assembleia da República deve criar uma lei quadro e o Governo aplica essa lei quadro. Ou nós acreditamos que temos governos democráticos, ou, como digo, então vamos construir a Constituição do Estado desconfiado, que será uma Constituição inédita no Mundo. Mas então, talvez valha a pena dizer que a Constituição do Estado Português é a de um Estado que não é democrático, é um Estado desconfiado!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, esta discussão já vai longa e creio que pouco se avançará. Entretanto, há aqui um pormenor processual que é o seguinte: estamos, julgo, a discutir de há um bocado a esta parte uma proposta que, de facto, não existe. Quer dizer, englobar as freguesias na competência política da Assembleia da República não consta de nenhuma proposta.

O PCP apresenta uma proposta alternativa, ou há consenso para que se entenda como lapso e acrescenta-se nesta vossa proposta a criação de freguesias, Sr. Deputado Vital Moreira?

Faça favor, Sr. Deputado Vita) Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Esta discussão prova que a questão não é inútil e, portanto ...

O Sr. Presidente: — Eu não estou a dizer que é inútil, Sr. Deputado! Só estou a perguntar qual é a forma processual de introduzirmos aquilo que os senhores pretendem.

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O Sr. Vital Moreira (PCP): — Quando eu disse que não teria qualquer problema em reformular a proposta, era para, exactamente, dar um passo no sentido de o fazer. Portanto, nós reformulamos a proposta no sentido de criar e extinguir as autarquias locais.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Num Estado democrático — que é sempre um Estado desconfiado, porque receia que o Poder, quando atribuído a uma única força, a um único centro, possa ser exercido abusivamente — cabe distinguir quatro momentos no processo de criação de autarquias locais.

O primeiro momento é o de definição normativa. O segundo, o de participação dos interessados. O terceiro, o da verificação de requisitos de criação. O quarto e último momento, o de opção política, de decisão política, quanto à criação.

Julgo que estamos todos de acordo quanto aos dois primeiros momentos.

Já em sede de subcomissão se aprovou, ou pelo menos se formou um certo consenso, quanto a ficar em reserva de competência legislativa absoluta da Assembleia da República o regime de criação, extinção e modificação territorial das autarquias locais. Esse o primeiro momento. Logo aí e em relação a todas e quaisquer autarquias locais deve intervir a Assembleia da República.

Depois deve haver um momento de participação dos interessados, de participação popular, que pode ser, designadamente, feita por via de referendo a nível local.

O terceiro momento é o da verificação de requisitos. Julgo que aí também poderá haver consenso quanto a que seja o órgão superior da Administração Pública, o Governo, ou, a nivel de regiões autónomas, o governo regional, a verificar esses requisitos de criação. Requisitos previstos na lei de bases de criação, requisitos que o Governo, ou, no respeitante às regiões autónomas, os respectivos governos regionais, devem verificar se existem ou não.

Resta o quarto e último momento, o momento de decisão politica. Se estivermos todos de acordo quanto aos três primeiros momentos, não deverá haver grandes dúvidas em que o último momento deve ser um momento extremamente breve e deve ser um momento em que também, de novo, deve intervir o Parlamento.

As autarquias locais têm, no âmbito do Estado democrático, uma dignidade tal, todas as autarquias de todos os graus, que apenas por causa disso (mas também, se for necessário acrescentar, por se desconfiar que um qualquer Governo, por motivos eleitorais, designadamente, cometa abusos) se justifica que seja a Assembleia representativa de todos os cidadãos a tomar a decisão final acerca da sua criação.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): — Não pensava intervir nesta discussão, se não tivesse escutado a intervenção do Sr. Deputado Sousa Tavares.

Ela leva-me a dizer o seguinte: se a Assembleia da República, pela prática destes anos, pode ser culpada de alguma coisa em matéria de criação de novas autarquias, não é, seguramente, por ter sido irreflectida ou

psecipitada, mas talvez, por ter sido excessivamente prudente. Creio que neste sentido os diferentes partidos, por razões que serão diferenciadas, com certeza, deram prova de um alto sentido de responsabilidade e do que isto significa para o País e para o futuro do nosso povo.

Naturalmente que para alguns partidos, e particularmente nestes últimos anos, tem pesado muito a ideia de que esta atribuição deve passar para o Governo. Mas esse é um aspecto que, quanto a nós, tem emperrado o processo. Mas tem havido sentido de responsabilidade!

Desde logo se considerou que deveria haver uma lei quadro à luz da qual, e aplicada a todas as situações, as freguesias deveriam ser criadas. Também se viu desde logo que o Governo não deveria ser arredado do processo de criação das novas autarquias. Creio que, neste sentido, as críticas do Sr. Deputado Sousa Tavares não têm nenhuma razão de ser, tanto mais quanto a realidade é esta: a Assembleia da República não criou ainda, salvo o caso excepcional do Município da Amadora, nenhuma dessas novas freguesias que têm sido propostas.

Aliás, se formos ver atentamente as propostas de criação mesmo de novas freguesias, há-de verificar-se que da parte dos partidos também tem havido alguma prudência.

Geralmente os processos vêm enformados de propostas das próprias autarquias e, muitas vezes até, com larga cópia de apoios de comissões de moradores ou de outras estruturas populares ou das populações, que, portanto, se manifestam dessa maneira.

Assim, creio que tudo isto deve ser tomado em consideração para que, na ignorância do que é a Assembleia da República, na ignorância do que tem sido o processo legislativo a este propósito, se não venha para aqui, digamos, fazer uma série de afirmações, essas, sim, irreflectidas, essas, sim, precipitadas, e que podem dar do trabalho parlamentar uma imagem que, na verdade, não é de maneira nenhuma justa.

Nós somos responsáveis pela proposta de um projecto de lei quadro que retomámos posteriormente e nesse projecto, efectivamente, considerávamos a participação e a intervenção do Governo em certo momento, poque colocámos critérios gerais.

Portanto, isto tem sido objecto de discussão. Tem havido aqui um trabalho responsável.

Creio que o que se tem passado na Assembleia da República é uma boa demonstração de que é na Assembleia da República que csui atribuição deve ficar e que não deve ser transferida para o Governo.

Aliás, já foi dito por outros Srs. Deputados que exactamente as Constituições existem para garantir que não há abusos de poder e que o regime democrático é mesmo um regime desconfiado.

Eu até, a propósito, perguntaria, se a Assembleia da República tivesse mais poderes sobre a política orçamental, se a situação financeira do País seria aquela em que nos encontramos. Isto é, se a Assembleia da República tivesse maior poder de intervenção sobre a política orçamental, se a situação de descalabro que aí está se teria verificado. Temos a opinião de que não. Esta situação financeira que aí está é consequência, em larga medida, da demagogia dos governos, do elei-toralismo dos governos. Ora, esse perigo ...

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, isto está completamente fora da discussão. Está completamente fora, segundo o critério da Mesa.

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O Orador: — Sr. Presidente, olhe que não está fora! É um critério muito fechado, muito estreito, muito dogmático, do Sr. Presidente.

Estamos a ver se os executivos são, ou não são, atreitos à demagogia, ao eleitoralismo. Creio que, se a experiência portuguesa mostra, com evidência, alguma coisa, e se estes últimos anos da experiência portuguesa mostram, com evidência, alguma coisa, é isso precisamente que mostram! Mostram que, na verdade, os governos são mais do que as assembleias atreitos ao eleitoralismo. É isso que nós aqui temos verificado.

Portanto, esta atribuição fica muito bem na Assembleia da República e ficará muito mal no Governo. Mas o Governo deve ser chamado à criação de novas autarquias.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Sousa Tavares, agradecia-lhe que não prolongasse esta discussão.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — É apenas uma pequena observação.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — É que o eleitoralismo dos governos deriva, evidentemente, de não ser respeitada a Constituição, porque mal um governo começa a governar, começa-se a pedir novas eleições gerais!

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, quanto à proposta da alínea d), do PCP,...

Sr. Deputado Carlos Brito, faça favor.

O Sr. Carlos Brito (PCP): — Para registar na acta, Sr. Deputado Sousa Tavares, o mais eleitoralista de todos os governos não foi acossado por essa ameaça de eleições gerais. Ele tinha eleições gerais à vista e realizou a mais demagógica, a mais eleitoralista, de todas as políticas, que está na origem da situação financeira em que agora nos encontramos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, em relação à nova alínea d) proposta pelo PCP, não há qualquer modificação das posições, a não ser do próprio PCP, que altera a sua proposta no sentido de criar e extinguir autarquias locais. Não sei se expressei, exactamente, a formulação pedida.

Entretanto, os partidos da AD mantêm a sua posição de rejeição de princípio desta proposta, preferindo discutir o assunto em sede de autarquias locais, quando se tratar desse assunto na Constituição.

Não sei se algum dos partidos quer acrescentar alguma coisa a este resumo ou se chega como está.

Srs. Deputados, passamos à alínea j) proposta pelo PCP: "Determinar as remunerações do Presidente da República, dos deputados, dos membros do Governo, dos juízes e dos magistrados do Ministério Público e dos titulares dos cargos remunerados do poder local."

A AD, o PS, a UEDS e a ASDI formularam reservas a esta alínea j).

Em discussão.

Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — A nossa proposta implica duas alterações.

Uma, que, aliás, transparece na mudança de colocação desta norma, que actualmente consta no que lhe

corresponde do artigo 167.° da Constituição, na medida em que hoje, segundo certa interpretação, provavelmente correcta, entende-se que à Assembleia da República compete não fixar remunerações, mas sim legislar sobre as remunerações, o que pode implicar, portanto, a fixação de critérios das remunerações.

Nós entendemos que o sentido da intervenção da Assembleia da República deve ser no sentido de determinar as remunerações.

A segunda alteração é a de alargar essa fixação de remunerações não apenas às entidades actualmente abrangidas na alínea ri) do artigo 167.°, ou seja, Presidente da República, deputados, membros do Governo e juízes dos tribunais superiores, mas de modo a passar a abranger também os juízes de todos os tribunais, isto é, todos os juízes, os magistrados do Ministério Público, por identidade de razões, e os titulares dos cargos remunerados do poder local. É este o sentido da proposta, e creio que este esclarecimento pode facilitar a discussão e a tomada de posições.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, quanto à alínea J) da proposta do PCP, ia usar da palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

Faça favor.

O Sr. António Vitorino (UEDS): — Sr. Presidente, nós pensamos que esta questão é uma questão delicada e complexa, como nós já vimos pela experiência política recente que atravessámos. Nesse sentido, a precisão que o Sr. Deputado Vital Moreira fez em relação ao entendimento da proposta do PCP foi útil, porque nos permite dizer qual é o nosso sobre esta matéria.

Nós pensamos que a Assembleia da República não deve fixar a remuneração em concreto. O que a Assembleia da República deve é fixar critérios de determinação da remuneração dos titulares dos cargos políticos.

É por isso que nós, no nosso projecto, no artigo 167.°, alínea /), na reserva absoluta de competência legislativa, atribuímos à Assembleia da República a exclusividade de legislar sobre o estatuto dos titulares dos cargos políticos.

No nosso entendimento, este estatuto dos titulares dos cargos políticos deve ter como uma das suas partes componentes essenciais a definição de um critério objectivo de apuramento das remunerações e da respectiva actualização, para colocar ao abrigo de considerações de conjuntura, e de grande melindre, a determinação das remunerações desses titulares e para ter em linha de conta um critério que seja aplicável, tendo uma visão global do conjunto dos titulares dos cargos políticos, atendendo, portanto, quer à posição relativa dos titulares dos diversos cargos políticos, quer em relação à situação económica e social do País em termos médios, digamos assim.

Portanto, nesse sentido, nós, naturalmente, opomo-nos à proposta do PCP no entendimento que lhe foi dado, e mantemos a proposta do artigo 167.°, alínea l). A questão das remunerações deve ser encarada através da definição de um critério objectivo integrado na definição do estatuto dos titulares dos cargos políticos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Sr. Presidente, é para secundar o que foi agora afirmado pelo Sr. Depu-

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tado António Vitorino. Apenas para esclarecer que a precisão que foi feita pelo Sr. Deputado Vital Moreira quanto ao sentido exacto da transferência do artigo 167.° para o artigo 164.° desta matéria, nós tínhamos reservado a nossa posição na subcomissão, mas depois da justificação que foi agora apresentada pelo Sr. Deputado Vital Moreira, que clarificou o sentido desta transferência, opomo-nos à proposta do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Nós também tínhamos manifestado reservas. A nossa evolução vai no sentido da FRS; portanto, cada vez encaramos como menos possível a hipótese de apoiar esta proposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, a matéria das remunerações deve competir à Assembleia da República em termos normativos e não em termos individuais e concretos, até porque isso, como a experiência tem demonstrado, poderia ser extremamente grave e desprestigiante para o funcionamento das instituições. Portanto, nós também nos opomos à proposta do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Nós, naturalmente, não poderemos deixar de lamentar o não acolhimento da nossa proposta por parte dos partidos da AD e da FRS. Em todo o caso, não consideramos, de modo algum, convincentes os argumentos invocados.

O que julgamos que pode ser desprestigiante para a Assembleia não é o facto dela fixar, mas é o facto de fixar em tais termos que seja desprestigiante. Não cremos que seja, de modo algum, desprestigiante ser a Assembleia a fixar as remunerações dos titulares dos cargos políticos. Pelo contrário, o que pode ser e foi desprestigiante, como se viu, foi fixá-los em determinados termos, para além daquilo que a moral política impunha.

Na verdade, creio que a experiência que até agora existiu só confirma a vantagem de ser a Assembleia a fazê-lo em relação aos juízes, em relação ao Presidente da República, em relação aos deputados, e cremos que se justificava um alargamento do critério de fixação da Assembleia.

Em questões em que tradicionalmente em Portugal a opinião pública é tão sensível, não se compreende que nesta matéria deixe de ser a Assembleia da República, como órgão representativo, a tomar a responsabilidade de tomar as decisões políticas.

Em todo o caso, desde já anunciamos que nós não concordamos com a eliminação da alínea u) do artigo 167.°

Portanto, entendemos que a proposta da FRS, que fala, pura e simplesmente, em estatuto dos titulares dos cargos políticos, não é, a nosso ver, de modo algum satisfatória, porque ela pode deixar em aberto a questão de saber se o estatuto inclui ou não as regras dc remuneração dos titulares dos cargos políticos. Assim, insistiremos, a propósito da alínea u) do

artigo 167.°, em reformulá-la de modo a abranger uma parte daquilo que pretendíamos com esta proposta, lamentando, insisto, que não tenha havido acolhimento por parte de mais nenhuma força política. As razões que foram aduzidas não são de modo algum convincentes, e a própria sumariedade com que foram apresentadas apenas indica, a nosso ver, a dificuldade que há por parte das restantes forças políticas em aduzir argumentos concludentes nesta matéria.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Sr. Presidente, é para esclarecer uma posição e não ficar a dúvida a pairar sobre a nossa posição, porque o Sr. Deputado Vital Moreira, segundo suponho, na sua última intervenção, de certa forma, distorceu aquilo que é a nossa opinião sobre esta matéria.

Nós estamos perfeitamente de acordo em que tem de ser a Assembleia da República a decidir esta matéria. O Sr. Deputado Vital Moreira sabe perfeitamente que não propomos coisa diversa.

Entendemos que deve ser alargado o âmbito dos carpos relativamente aos quais deve ser a Assembleia a definir as remunerações e já dissemos na subcomissão que estamos de acordo com isso. Quando falamos em estatuto dos titulares de cargos políticos, há, evidentemente, um alargamento relativamente àquilo que hoje consta do artigo 167.°

Não é isso que está em causa, e é distorcer aquilo que foi afirmado pretender que a nossa proposta vai em sentido contrário.

O que nós entendemos — volto a repetir aquilo que já foi aqui dito pelo Sr. Deputado António Vitorino e dispensar-me-ia de o repetir, porque suponho que não vale a pena estarmos aqui todos a dizer a mesma coisa — é que a explicação inicialmente dada pelo Sr. Deputado Vital Moreira para a transferência do artigo 167.° para o artigo 164.° foi clara e teve sentido.

Hoje, no artigo 167.°, competindo à Assembleia legislar sobre matéria de remunerações, admite-se que, o legislar sobre essa matéria, a Assembleia defina critérios, nomeadamente critérios relativos, estabelecendo uma proporcionalidade entre diversos cargos e uma relação entre o nível de remuneração, designadamente os titulares de cargos políticos e outros, o que implica, portanto, uma definição de critérios gerais e de uma proporcionalidade entre eles, e que resulta uma atribuição automática de um determinado grau de remuneração.

A transferência para o artigo 164.° foi expressamente dito pelo Sr. Deputado Vital Moreira, implicava que a Assembleia da República não pudesse fixar critérios e tivesse, para cada caso concreto e cada vez que decidisse actualizar ou alterar a remuneração, de fixar um valor em termos absolutos. Foi isto que o Sr. Deputado Vital Moreira disse há pouco.

Faça favor, Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Não disse isso! É que competiria em tais termos que directamente resultasse, sem qualquer acto da Assembleia da República, a determinação das remunerações. Mas não disse que isso implicasse um acto anual.

Eu até sou partidário pessoal, embora essa proposta não conste, de que as remunerações e outras coisas deste género, sei lá multas e outras coisas, devem ser

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indexadas ao salário mínimo nacional, por exemplo. Portanto, é uma determinação.

Imagino que nós fixamos que a remuneração dos deputados é x vezes o salário mínimo nacional. Fica determinada ad eternum a remuneração do deputado. Portanto, a Assembleia não tem de vir anualmente, nem nunca mais, fixar a remuneração dos deputados. Isto, a meu ver, cabe no artigo 164.° Portanto, comporta quer a fixação anual ou não anual, como hoje se está a fazer em relação aos deputados, em que se diz os juízes vencem x ou a outra hipótese que estou a-colocar.

O Orador: — Sr. Deputado, desculpe, mas, então, o que é que o Sr. Deputado queria dizer na sua intervenção inicial, por que cabia hoje no artigo 167.° e passa a não caber no artigo 164.°?

O Sr. Vital Moreira (PCP): — O que cabe hoje no artigo 167.° é, inclusivamente, não resultar de um acto da Assembleia a fixação concreta do montante das remunerações. Isso já foi defendido e tem pés para andar. Posso contra-argumentar, e sempre contra-argu-mentei, até sempre defendi que aquilo que hoje nós defendemos aqui já está no artigo 167.° Agora admito perfeitamente que se possa defender, à face do artigo 167.°, que aquilo que este artigo exige é apenas que a Assembleia estabeleça regras sobre a fixação, mas não exige que seja a Assembleia a fixar ou a determinar.

É esta a diferença.

O Orador: — A nossa ideia é que a Assembleia tem de definir uma proporcionalidade. Tem de definir critérios dos quais resulte exactamente o valor das remunerações em cada momento, mas que isso não implica uma definição concreta também em cada momento. E é apenas nessa medida que nós preferimos a nossa redacção.

Estamos dispostos, quando se chegar ao artigo 167.°, e onde falamos em estatuto dos titulares dos cargos políticos, a acrescentar "incluindo as respectivas remunerações", para dar satisfação à preocupação do Sr. Deputado Vital Moreira. Já o tínhamos aceite na subcomissão e não retiramos essa nossa aceitação.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Mas creio que é importante que isso fique gravado e, por isso, se a minha questão pode suscitar a repetição dessa declaração, estou satisfeito, porque era isso que pretendia.

O Orador: — Quando lá chegássemos, já se sabia que era isso que ia acontecer, porque já o tínhamos aceite na subcomissão, Sr. Deputado.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Creio que era bom antecipar, imediatamente...

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos de evitar este tipo de diálogo, que não é propriamente a forma mais correcta de trabalharmos.

Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Só para dizer ao Sr. Deputado Vital Moreira que nem ele nem ninguém podem tirar outras ilações do carácter sumário das minhas intervenções, outra conclusão que não seja a de que isso se traduz na minha preocupação cons-

tante de que os trabalhos da Comissão avancem o mais rapidamente possível. Portanto, o meu critério é de poupar, ao máximo, as minhas palavras. Só esse, mais nenhum.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, muito obrigado pela sua intenção.

Em relação à alínea j) da proposta de alteração do PCP ao artigo 164.°, esta não foi aceite por nenhuma das forças políticas presentes, sendo preferido pela AD a sua discussão aquando da discussão do artigo 167.° Portanto, que este assunto passe para essa sede.

Alínea m) da proposta do PCP, que se refere à autorização para o estabelecimento ou trâsito de tropas estrangeiras, no âmbito de operações militares, em território português. A AD exprimiu a sua recusa na subcomissão. O PS, a ASDI e a UEDS reservaram posição, sendo que o PS se opõe ao estabelecimento, reservando posição quanto ao trânsito de forças militares de tropas estrangeiras no território português.

Em discussão, Srs. Deputados.

Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Esta proposta, compreensivelmente, já suscitou alguma discussão na subcomissão. Importa, para efeitos de registo e de sumário, dizer que o sentido da proposta é concretamente aquele que resulta da letra com as especificações, talvez desnecessárias, mas que podem evitar interpretações não cabidas nela.

Portanto, o que aí se exige é que para o estacionamento de tropas estrangeiras em Portugal seja necessária a autorização da Assembleia da República e que a mesma autorização seja necessária para o trânsito de tropas estrangeiras no âmbito de operações militares.

Quer dizer, o puro e simples estacionamento exige autorização. O trânsito, obviamente, apenas no âmbito de operações militares. O que é que isto abrange? Abrange exactamente isso! Não abrange, sei lá, as visitas, não abrange as manobras, os exercícios. Abrange casos, sei lá, como o trânsito de tropas estrangeiras para intervenção noutro lado, o trânsito pelas Lages ou outro sítio qualquer, casos que exigiriam, portanto, a autorização da Assembleia da República.

A importância dessa proposta vale por si mesma, e a sua justificação creio que não carece de grande fundamentação.

Nós não compreendemos que, no contexto actual, em que a permanência de tropas estrangeiras num território ou o trânsito delas para operações noutro país tem a dimensão política que tem e possa implicar com interesses vitais da República, possa ser feita por simples decisão governamental, sem que a Assembleia da República seja chamada a intervir, sendo que, noutros ordenamentos constitucionais, regras destas têm precedentes e que, num caso como o do nosso país, esses fenómenos assumem ainda maior delicadeza, maior importância e maior significado do que em outros.

Por isso, insistimos na nossa proposta, reafirmamos a sua importância e gostaríamos que das outras forças políticas houvesse, na sua discussão, o reconhecimento da sua importância.

O Sr. Presidente: — O PS solicitou um esclarecimento em relação à minha introdução deste tema. Portanto, Sr. Deputado Nunes de Almeida, queira esclarecer.

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O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Suponho que as notas do Sr. Presidente correspondem à correcção que eu fiz ao relatório da subcomissão, que nesta matéria não era exacto quanto à nossa posição. Tenho receio de que tenha sido eu próprio quem tenha há pouco, e erradamentem referido. Nós opusémo-nos na subcomissão a que a Assembleia tivesse de autorizar o trânsito e reservámos a nossa posição quanto à necessidade de ela ter de autorizar o estacionamento, e não o contrário, como é óbvio.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — É só dizer que o PSD mantém a oposição que já tinha afirmado na reunião da subcomissão e não avança já com as razões desta sua posição porque não acredita que o PCP, de acordo, aliás, com as afirmações que acaba de fazer, venha a retirar a sua proposta. Portanto, há--de haver uma outra oportunidade para nós apresentarmos essas razões.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Acho muito estranha esta declaração do Sr. Deputado Amândio de Azevedo, que toma uma posição sem a justificar e afirma que tem argumentos, mas não os diz. É lá com ele! Nós tiramos as conclusões que quisermos.

A minha intervenção destinava-se a solicitar ao deputado Nunes de Almeida a clarificação de um ponto: no entendimento do PS, não carece de intervenção da Assembleia da República o trânsito de tropas estrangeiras pelo nosso território para operações militares noutro território, seja do pais a que as tropas pertencem, seja de outro país.

É este o entendimento exacto? Assim, por exemplo, se o país A pretender intervir no país B ou no próprio país A e pretender passar também pelo nosso território, não carece de autorização da Assembleia da República?

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Nunes de Almeida quer esclarecer o Sr. Deputado Vital Moreira?

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — O esclarecimento é o reguinte: nós opomo-nos à constitucionalização desta matéria.

Quanto à questão de fundo, parece-me não ser este o momento para a discutir. Ao que nos opomos é que fique constitucionalizada a autorização da Assembleia da República relativamente ao trânsito e reservamos a nossa posição quanto ao estacionamento.

Quanto à questão de fundo — saber a quem compete autorizar —, reservaremos a nossa posição em matéria de lei ordinária.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Já hoje, segundo o texto da Constituição, compete à Assembleia da República aprovar tratados de defesa e, segundo a proposta da FRS, competirá à Assembleia da República também aprovar tratados respeitantes a assuntos militares.

Ora, a matéria do trânsito ou estacionamento de forças militares só pode ser vista na base de tratados internacionais. Uma vez que a Assembleia da República tem de aprovar tratados com repercussão nessas matérias, já por essa via se encontra garantida a intervenção da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado José Luís Nunes, tem a palavra.

O Sr. José Luís Nunes (PS): — Gostaria de dizer que o Sr. Deputado Jorge Miranda me tirou a palavra da boca. É exactamente isto, mas ao contrário, porque o estacionamento e o trânsito de tropas estrangeiras, no âmbito de operações militares, em território português não é admissível fora de um tratado internacional.

O PCP, com a sua proposta, admite que em território português possam estacionar ou transitar tropas estrangeiras, sem que um tratado previamente o preveja. Nós não admitimos isso!

Portanto, o que penso é que a Assembleia da República não tem de se pronunciar sobre esta matéria, a não ser em termos de tratado internacional. Nesta medida, penso que esta alínea não pode ser aceite, com a> reservas que, evidentemente, foram postas pelos Srs. Deputados Luís Nunes de Almeida e Almeida Santos.

Só em termos de tratados internacionais é que esta matéria deve ser decidida. ?az-se em tratado, a Assembleia da República aprova e, a partir desse momento, tudo está resolvido, a não ser que se pretenda, com esta alínea, que, para além do tratado internacional, a Assembleia da República ainda vá fiscalizar a aplicação do tratado, ainda venha dizer se, aprovado que foi o tratado, Portugal deve ou não cumprir as obrigações emergentes desse tratado. Evidentemente que é um entendimento que, por absoluto, se repudia.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Monteiro Taborda.

O Sr. Monleiro Taborda (MDP/CDE): — Não constando da acta da subcomissão a posição do MDP/CDE quanto a esta proposta do PCP, irei divulgá-la neste momento: entendemos que, apesar das afirmações dos Deputados José Luís Nunes e Jorge Miranda quanto à submissão do estacionamento e trânsito das forças militares estrangeira» a um tratado internacional, para além ou contra um tratado, pode haver uma posição de estacionamento forçado de forças militares estrangeiras no território e que a Assembleia da República deveria tomar uma atitude quanto a isso.

A nossa posição quanto ao estacionamento é a de dar o nosso acordo à proposta. Temos fundadas dúvidas quanto ao trânsito de forças militares estrangeiras, que pode, muitas vezes, ter de ser regido por critérios de oportunidade política. Não devemos esquecer, no entanto, problemas de certo modo graves que têm acontecido na prática quando se trata de trânsito de determinadas forças de um país para atacarem outro país.

Desta maneira, temos reservas quanto ao trânsito.

O Sr. Presidente : — Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeiáa Santos (PS): — Se alguma coisa não vai ficar na minha crónica pessoal, é o aprumo com

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que fui militar, há uns 30 anos atrás — fui um paisano terrível! Enfim, não deixo de ter opiniões sobre as coisas. E gostaria de ver esclarecida esta expressão "no âmbito de operações militares". Que são "operações militares"? Exercícios navais são "operações militares"? Bom, segundo o meu conceito, até podem ser. É um estacionamento, ainda que provisório, de 8 ou 10 dias, de tropas estrangeiras que passam por aqui. É, pois, muito vaga esta expressão.

Por outro lado, concebo que amanhã a Assembleia da República se pronuncie favoravelmente, no sentido de autorizar a guerra ou a paz. Depois ainda tem de se pronunciar sobre estacionamento de tropas estrangeiras! Há coisas que têm de ficar um pouco fora de uma autorização explícita e expressa da Assembleia da República, que até pode estar em condições de reunir em certas circunstâncias.

Portanto, tenderia a não espartilhar tanto este problema, embora me pareça que deva ser previsto pela lei ordinária. Na Constituição, tenho as minhas dúvidas, mas não tenho a certeza da razão. Gostaria, pois, de reservar a minha posição quer quanto ao estacionamento, quer quanto às tropas estrangeiras, e de ter a possibilidade de ouvir o meu partido.

O Sr. Presidente : — Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Gostaria de não deixar a ideia de que, invocando a questão dos tratados, as pessoas tranquilizam a necessidade de arranjar argumentos convincentes para rejeitar isto. É óbvio que não há relação nenhuma entre dizer que a Assembleia da República tem de aprovar tratados militares e dizer que isso consome isto! Não consome! Não está em lado nenhum da Constituição que para haver estacionamento ou trânsito de tropas estrangeiras em Portugal seja necessário um prévio tratado. Se isso se disser, nós proporemos desde já. Estamos dispostos a propor, se houver oportunidade para isso. Mas, se a FRS propuser, nós aprovamos imediatamente. Mas isso não resolve o nosso problema. Resolve apenas uma parte. É que, para já, não há! Portanto, pode haver trânsito sem tratado. Não consta em lado nenhum que o Governo não possa autorizar o trânsito que vá para o estrangeiro na ausência de um tratado militar expresso que preveja a possibilidade de trânsito de tropas estrangeiras desse país pelo território português. Não há! Portanto, a nossa proposta mantém toda a autonomia, independentemente da questão dos tratados.

Em segundo lugar, o tratado pode dizer duas coisas: ou dizer que "fica o país B autorizado, sempre que necessitar, a fazer transitar tropas estrangeiras pelo território da República Portuguesa", e, nessa altura, já não há nenhuma questão de autorização, porque, automaticamente, sempre que queira, faz passar as tropas (não há que autorizar, porque autorizado está). Outra coisa é o tratado dizer que "é aberta a possibilidade de o país B poder fazer passar as suas tropas pelo território português, mediante a autorização, para cada caso, das autoridades portuguesas". E, neste caso, implica um juízo de valor. Implica um juízo político sobre cada caso. O problema é saber quem o deve tomar: o Governo ou a Assembleia da República? Entendemos que deve ser a Assembleia da República, e não o Governo.

Isto não tem nada a ver com o cumprimento dos tratados. Os tratados cumprem-se. Sempre dissemos — e ninguém, penso, dirá o contrário — que os trata-

dos se devem cumprir. Agora, o problema reside em cumprir os seus termos. Um tratado pode dizer que "está automaticamente autorizado a fazer passar" ou pode dizer, pura e simplesmente, que "está aberta a possibilidade de fazer passar ou estacionar tropas estrangeiras no território nacional".

Portanto, na questão dos tratados, invocar que a Assembleia da República tem de aprovar os tratados nada resolve nem justifica, só por si, a rejeição desta proposta.

Sempre se mantém aberta a possibilidade de estas situações se verificarem mesmo sem tratados e, sobretudo, de elas se verificarem, de ser necessário uma autorização, mesmo havendo um tratado.

Outras questões: Que são operações militares? Bom, comecei por dizer que pensámos "operações militares" exactamente para excluir os casos de visitas e os casos de exercícios ou das chamadas "manobras". Mas, se o problema é esse, não temos a mínima objecção em clarificar ainda mais e dizer, expressamente, que só estão a "operações bélicas". Esta expressão, escrita, achámos que não ficava bem. Também tivemos "operações de guerra". Mas guerra podia implicar a prévia declaração de guerra. Hoje sabemos que a guerra não se declara, faz-se sem declaração. Por isso, retirámos esta expressão. Mas não temos qualquer objecção a explicitar, expressamente, que é no âmbito das "operações bélicas", implicando, portanto, a utilização das armas no âmbito da guerra.

Insistimos, pois, neste ponto: não se invoque a questão da necessidade da aprovação de tratados para justificar a desnecessidade desta proposta. Ela mantém-se, com ou sem a necessidade de aprovação dos tratados de defesa ou militares pela Assembleia da República.

A questão que está é esta e apenas esta: nestes casos, o juízo político que deve ser feito, quando haja que fazê-lo (quando haja que dar autorização), deve ser feito pelo Governo ou pela Assembleia da República? É isto apenas. Nós entendemos que deve ser pela Assembleia da República. Portanto, gostaríamos que aqueles que se opõem a esta proposta digam se entendem que não deve ser a Assembleia da República ou se, achando que deve ser esta, isso não deva ser dito na Constituição e porquê.

Por isso, insisto em suscitar o problema e em põr nos seus contornos precisos o alcance e a dimensão da proposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: Evidentemente que reservamos a nossa opinião sobre esta matéria. No entanto, gostaria de dizer que isto implica uma definição de operações militares. Uma simples guarda é uma operação militar? Uma parada é uma operação militar?

É evidente que essas coisas só podem ser feitas ...

O Sr. Vital Moreira (PCP): — O Sr. Deputado dá--me licença? Para lhe poupar uma soma de argumentos, reformulo a expressão dizendo "no âmbito de operações bélicas".

O Sr. José Luís Nunes (PS): — Pior ainda! Uma parada é uma operação bélica, como o demonstrou agora o assassínio do Presidente Sadateü!

Risos.

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Um exercício é uma operação bélica e o Sr. Deputado Vital Moreira só se limita a substituir uma coisa por um sinónimo. Onde tinha "operações militares" pôs "operações bélicas", utilizando em vez de "militares" uma expressão de raiz mais greco-latina, que fica muitíssimo bem, mas que não vem ao caso.

O que é necessário dizer-se é que, politicamente, esta afirmação se filia numa posição neutralista. Diz somente respeito àqueles casos em que um país tem de examinar, em cada caso concreto, aquilo que deve fazer. É, por exemplo, o caso de um país que não tenha tratados internacionais, que seja equidistante em relação às grandes potências e que, em cada caso concreto, decida se vai ou não autorizar isto, aquilo e aqueloutro.

Ora isto significa que, em cada caso concreto, se liquidava qualquer ideia de tratado ou do que quer que fosse, e a Assembleia da República ia dizer, fazendo funções de estado-maior: "Não, não, acho inconveniente que as forças tais e tais estacionem ou transitem em Portugal!"

Há um caso muito curioso — o único que conheço, embora talvez haja mais —, que é o precedente histórico da Suécia, Estado neutral na 2.a Guerra Mundial, que autorizou, creio que através do Parlamento, as tropas nazis a atravessarem o seu território para atacarem a Noruega. Isto é que é exemplo desta norma que os Srs. Deputados propõem para a Constituição. Simplesmente, ela é uma norma que, das duas uma: ou interfere, directamente, com definições estratégicas, que não competem ao Parlamento executar (compete--Ihe tão-só definir), ou, pura e simplesmente, implicam que Portugal é um Estado neutral e casuisticamente vai apreciar o estacionamento ou o trânsito de tropas estrangeiras. É isto que está aqui.

É evidente que se podem também pensar outras coisas. Mas essas coisas, como, por exemplo, seria a Base dos Açores, estão concretamente definidos num tratado, cuja aplicação deverá ser controlada pelo Governo Português.

Vamos apreciar este assunto, como ele merece, mas há uma coisa que é fundamental: não se trata de um simples debate para saber se uma companhia de fuzileiros ingleses deve ou não ir ficar a Santa Margarida. É preciso pensar-se que, em face destes assuntos, não temos a consciência exacta da gravidade destes problemas. E que estes não se reduzem a um simples conjunto de conversas em que, pura e simplesmente, se dizia: "Vamos alargar o âmbito de competências da Assembleia da República." Não! Isto não é alargar o âmbito de competência da Assembleia da República. É definir Portugal, como diria alguém —Almeida Garrett, concretamente—, "na balança da Europa e do Mundo". E temos uma exacta consciência do assunto. Percebemos, perfeitamente, o que aqui está e vamos examiná-lo de acordo com os conceitos que acabam de ser expostos.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em resposta à intervenção do Sr. Deputado Vital Moreira, e muito brevemente gostaria de frisar algumas notas. Em primeiro lugar, para mim, a matéria de estacionamento e de trânsito das tropas estrangeiras em Portugal é, deve ser, matéria de tratado internacional.

Em segundo lugar, e como consequência, deve haver sempre uma intervenção da Assembleia da República.

Estaria mesmo aberto a uma definição material de tratados de defesa ou de tratados respeitantes a assuntos militares para abranger essa matéria; e tal é o meu entendimento, ainda que não venha a ser feita tal definição.

Em terceiro lugar, quando a Assembleia da República vier a aprovar um qualquer tratado que preveja o estacionamento ou o trânsito de tropas estrangeiras, nessa altura, e em concreto, a Assembleia da República ponderará as condições de tal estacionamento e de tal trânsito fazendo dependê-lo, ou não, de uma autorização da própria Assembleia ou do Governo.

Em regra, na minha opinião, a autorização deve competir ao Governo —órgão de condução da política geral do País— e não à Assembleia, mas, em princípio, admitiria que, em certos casos, pudesse haver uma autorização da Assembleia; somente isso não deveria ficar, de uma vez para sempre, estabelecido no texto constitucional.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, em relação à alínea m) da proposta do PCP... O Sr. Deputado Vital Moreira ainda se inscreve? Faz favor.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Creio que há argumentos e intervenções que não podem deixar de merecer uma referência. Considero que a intervenção do Sr. Deputado José Luis Nunes —não queria ser duro— não tem nada a ver com a discussão que aqui se desenrola. É um espanto como podem ser invocadas questões de neutralismo, ou não neutralismo, em relação a este ponto! Trata-se apenas de saber se a definição da posição deve ser feita pelo Governo ou pela Assembleia da República! É apenas isto. Se é neutral ou não, se é "natista" ou não, são coisas que nada têm a ver. Ou tem-se medo de que a Assembleia da República, se for chamada a isso, não seja "natista"? É isso que se quer dizer? Se é isso, que se diga. Nós não pomos aqui nenhuma definição da posição do País. Apenas dizemos, e exigimos, que nos casos em que para o trânsito ou estacionamento de tropas seja necessária autorização das autoridades portuguesas, que essa autorização seja da Assembleia da República. £ isso que dizemos! Nem mais, nem menos!

Ora o que é que isso tem a ver com posições neu-tralistas, o que é que tem a ver com uma série de fantasmas que o Sr. Deputado José Luís Nunes aqui trouxe?

Se faz favor, Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): — O problema compete à Assembleia da República na definição do tratado. Aquilo que o Sr. Deputado propõe não é isso. É que, em cada caso concreto, mesmo num tratado, a Assembleia da República deverá ver se é conveniente, ou não, que estacionem tropas.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Deputado José Luís Nunes, se puser, sem prejuízo dos tratados p*erti-nentes, que compete à Assembleia da República, o Sr. Deputado aprova a proposta?

O Sr. José Luís Nunes (PS): — Não, Sr. Deputado!

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Já sabia que não aprovava, e, portanto, só se prova que não é esse o argumento que o leva a votar contra a proposta.

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0 Sr. José Luís Nunes (PS): — Dá-me licença? Nessa altura o Sr. Deputado entra no delírio, que é o de admitir que, sem prejuízo dos Chefes de Estado existentes, possam estacionar ou entrar tropas em território português, na base de uma apreciação puramente casuística. Isso implica um ataque fundamental ao interesse nacional, ou seja, a entrada de tropas em Portugal, sem haver um tratado que as preveja.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Bom, eu não trato de delírios, mas de disparates trato. E a questão é que, enquanto não estiver fixado na Constituição, não há nenhum lugar que proíba o Governo Português de autorizar o estacionamento de tropas estrangeiras, mesmo sem o tratado militar. Esta é que é a questão!

Se isso vier a ser proposto —e considero bem-vinda a sugestão do Sr. Deputado Jorge Miranda— terá o nosso apoio. Agora não se confundam as duas coisas. Não tem nada a ver uma coisa com outra. A questão é, mesmo havendo um tratado e podendo este exigir autorização casuística, caso por caso, para o estacionamento de tropas, saber quem é que deve dar essa autorização. O Sr. Deputado Jorge Miranda entende, e para isso produziu argumentos, que deve ser o Governo. Nós entendemos que deve ser a Assembleia da República.

Mas o Sr. Deputado José Luís Nunes, até agora, sempre tentou deslocar a questão para um terreno que não é o dele. Este não tem nada a ver com as questões que foram levantadas.

A questão é tão simplesmente esta: quando, com ou sem tratado, seja necessária a autorização para o trânsito de tropas estrangeiras, quem a deve dar? O Governo ou a Assembleia? Nós achamos que deve ser a Assembleia da República.

Se faz favor, Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): — O Sr. Deputado disse que era só sem tratado. Agora coloca o problema de com ou sem tratado.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Não é verdadeira a imputação que me faz.

O Sr. José Luís Nunes (PS): — Peço imensa desculpa, mas é exacto. Na resposta à segunda pergunta que lhe formulei o Sr. Deputado, talvez por uma questão ...

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Não é verdade.

O Sr. José Luís Nunes (PS): — Não ponho em dúvida que foi sua intenção utilizar um método de discussão de maiêutica. O facto é que o disse. Mas não ponho em dúvida o que estava no seu espírito.

Agora a questão que se põe, em relação a este ponto muito simples, é a seguinte: Conhece o Sr. Deputado algum caso concreto de instalação de tropas em território estrangeiro, que não seja de simples agressão, sem tratado? O Sr. Deputado conhece? Eu conheço um, de que já dei exemplo. Mas um único, que é um exemplo típico dos estados neutralis-tas. Conhece o Sr. Deputado outro caso?

Posso-lhe citar vários casos de instalação sem tratado de tropas estrangeiras em território nacional. Mas não interessa agora discuti-los. Interessa-me só este que é um caso de um estado neutralista, que é a Suécia, durante a guerra, exemplo que os historiadores dão. Conhece o Sr. Deputado mais algum?

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Nós podemos fazer ...

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — A instalação de tropas aliadas nos Açores durante a guerra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Presidente, tenho ou não a palavra?

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, agradeço que não estebeleçam diálogo.

Sr. Deputado José Luís Nunes, V. Ex.a não estava no uso da palavra. O Sr. Deputado Vital Moreira já tinha acabado. Está a gerar-se um diálogo que não pode ser consentido pela Mesa.

O Sr. Deputado Vital Moreira parece que ainda quer dizer algo. Agradecia-lhe que fosse o mais breve possível.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Não! Acho que foram extremamente concludentes as interrupções que permiti ao Sr. Deputado José Luís Nunes. Creio que seria interessantíssimo fazer-vos aqui um pequeno discurso sobre a história militar europeia recente, e sobre a história europeia, mas isso nada ajuntaria à solução que temos para o problema em análise. O problema está suficientemente limitado, as soluções também e as alternativas também.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Tomé.

O Sr. Mário Tomé (UDP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: Só queria dizer que me faz confusão como é que uma norma como esta apresentada pelo PCP, e ainda por cima com o esclarecimento que seria acrescentado o facto de não estar em qualquer tratado, já que, com efeito, estes passam pela Assembleia da República, como é que esta proposta não é aceitável para algumas forças políticas? Efectivamente, isto pode levar a casos aberrantes e, nomeadamente, à agressão sem sentido de agressão. Pode conduzir até, indo a um caso extremo, que possivelmente não seria novidade, a que um governo isolado em determinado momento em relação às forças políticas e sociais do Pais, até da própria Assembleia da República, pudesse facilitar a presença de tropas estrangeiras. Por exemplo, um governo com os americanos — não me custa nada a acreditar—, em que as suas tropas impusessem, no nosso país, uma determinada situação ao contrário da dinâmica natural que estaria a ser prosseguida. Aliás, há factos recentes de que, embora não fossem de forma ostensiva, a NATO e as suas tropas tentaram ter uma certa influência no próprio curso dos acontecimentos no nosso país.

Portanto, a UDP concorda com esta proposta do PCP.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, concluindo o debate da alínea m) do artigo 164.°, proposta pelo PCP, as posições são as seguintes:

O MDP/CDE e a UDP subscrevem esta proposta ou aceitam-na.

Os restantes partidos não a aceitam, embora o PS considere que poderá vir a repensar este assunto.

Vozes.

O Sr. Presidente: — Englobei a ASDI nos partidos que não a aceitam e, tanto quanto sei, não vai recon-

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siderar o problema. Portanto, a posição da ASDI é diferente da do PS, neste particular.

Finalmente, temos a alínea l) da proposta da FRS: "Formular o conceito estratégico de Defesa Nacional." Tanto a AD como o PCP reservaram a sua posição quanto a este assunto.

Em discussão, Srs. Deputados.

Sr. Deputado Amândio de Azevedo, tem a palavra.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Mantemos as nossas reservas e deixamos para o momento ulterior a posição definitiva sobre essa matéria.

O Sr. Presidente: — O PCP quer adiantar alguma coisa ou mantém a posição da subcomissão? Sr. Deputado Vital Moreira, faz favor.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Uma das razões que nos levou a não tomar posição foi o facto de não ter sido esclarecido o alcance desta regra proposta pela FRS. Aqui sim, seria conveniente que houvesse um esclarecimento sobre: primeiro, qual o seu cerne, o que é isso de conceito estratégico de defesa nacional? E, depois, em que é que se traduziria, por parte da Assembleia da República, essa formulação? Seria feita através de que actos? Formolizada como? Através de resoluções, tomadas de posição? Digamos que queríamos ver reduzida a labilidade da norma que agora é proposta. Isso é um ponto importante para podermos tomar uma posição em relação à proposta.

O Sr. Presidente: — Julgo que, para esse esclarecimento, pediu a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos. Tenha a bondade.

O Sr. Almeida Santos (PS): — Bom, sem ser um esclarecimento de um especialista nestes assuntos, que, já agora faço questão em não ser, quero dizer que a ideia que presidiu à elaboração desta alínea foi a de que competisse à Assembleia da República a definição, por via legal, dos fins e dos objectivos da defesa nacional.

Reconheço que a expressão "conceito estratégico" é indefinida, vaga, ou lábil, como lhe queira chamar o Dr. Vital Moreira, mas não está em causa, evidentemente, uma expressão que não possa ser substituída por outra. Se se entendesse que a alínea seria aceitável, com uma referência expressa a fins e objectivos, nós até julgaríamos que enriqueceria a definição de conceito.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, perante este esclarecimento, o Sr. Deputado Vital Moreira deseja acrescentar mais alguma coisa, ou passaremos adiante?

Tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Creio que haveria vantagem, na perspectiva da eventual inclusão de tal norma na Constituição, em substituir essa críptica expressão "conceito estratégico", por algo daquilo que o Sr. Deputado Almeida Santos agora sugeriu.

É, pois, na base desse esclarecimento que vamos então tomar uma posição, em momento ulterior, acerca da proposta.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, em relação à alínea I) proposta pela FRS, para o artigo 164.°, mantêm-se as posições da subcomissão. Posições de reserva tanto da AD como do PCP.

Quanto às alíneas c), d) e e) do projecto do MDP/CDE, elas são do seguinte teor:

Alínea c): "aprovar alterações à Constituição";

Alínea d): "aprovar os estatutos político-administrativos das regiões autónomas, bem como as suas alterações";

Alínea é): "aprovar o estatuto do território de Macau e suas alterações".

Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Sr. Presidente, suponho que quanto à alínea a) não vemos nenhuma vantagem na eliminação do inciso final quanto à forma de alteração à Constituição.

Relativamente ao acrescento dos incisos "ou suas alterações", quanto aos estatutos das regiões autónomas e de Macau, também não vemos essa vantagem. Supomos que está implícito. E, na medida em que ficou decidido não se incluir a matéria respeitante ao fazer leis, interpretá-las, suspendê-las, revogá-las, e, poder-se-ia dizer, modificá-las também, é evidente que não supomos que, paralelamente, se deva receber esta modificação proposta pelo MDP/CDE.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Monteiro Taborda.

O Sr. Monteiro Taborda (MDP/CDE): — Quanto à alínea c), o MDP/CDE retira a proposta, já que a actual alínea a) está mais bem elaborada.

Quanto às considerações feitas pelo Sr. Deputado Nunes de Almeida, relativamente à alínea é) proposta, dentro do critério que já foi anteriormente definido, também não vemos qualquer interesse em continuar com as alterações, uma vez que também nos outros domínios (interpretação, revogação, etc.) se chegou à conclusão de que quem tem competência para aprovar tem competência para alterar ou suspender.

Quanto os estatutos político-administrativos das regiões autónomas e as suas alterações, parece-me que houve consenso para que esta matéria seja sentida para um capítulo em que tratássemos propriamente das regiões autónomas.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Sousa Tavares, se faz favor. Prescinde. E o Sr. Deputado Amândio de Azevedo? Se faz favor.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — É só para definir a nossa posição. Com toda a brevidade, quero dizer que estamos perfeitamente de acordo com as considerações feitas pelo Sr. Deputado Nunes de Almeida. Portanto, estamos contra estas alterações, já que as consideramos inúteis.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, em relação às alíneas c), d) e e) do projecto do MPD/CDE quanto ao artigo 164.°, este partido retira as alíneas c) e é) e remete o assunto da alínea d) para quando se discutir o capítulo das regiões autónomas.

Não foi isto, Sr. Deputado Monteiro Taborda?.

O Sr. Monteiro Taborda (MDP/CDE): — Foi.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Ininteligível.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Amândio de Azevedo, não referi as posições da AD e da FRS porque o proponente da proposta a retirava. Não há

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que haver, neste momento, posições a não ser na parte relativa às regiões autónomas, que serão discuti-, das na altura própria, para o que, julgo, todos estarão de acordo.

Diga, Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Peço desculpa, Sr. Presidente, mas sem prejuízo de opinião em contrário do Sr. Deputado do MDP/CDE, a nossa posição não está nada dependente do que se vier a passar lá adiante. Temos já os elementos suficientes para dizer que não estamos de acordo com estas alterações.

O Sr. Presidente: — A AD manifesta o seu desacordo em relação à alínea d), que é a única alínea proposta que continua de pé, por parte do partido proponente.

O Sr. Monteiro Taborda (MDP/CDE): — Quanto à alínea d), o Sr. Deputado Sousa Tavares estava a dizer, e com razão, que já ficou aprovada, por consenso, a actual alínea b) do artigo 164.° O único acrescento era "e suas alterações". Ora, de facto, para aqui continuam a ser válidas as considerações que fiz quanto à alínea e) da minha proposta. Portanto, também retiro.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, também é essa a minha opinião. Simplesmente, limito-me a procurar reproduzir a sua posição, que nesta altura teve a sua modificação. No entanto, na altura não podia ir além do que o Sr. Deputado tinha dito.

Artigo 165.°: Quanto à proposta da alínea ri) do artigo 164.° do projecto da AD e à proposta da FRS quanto à alínea b) do actual artigo 16J.°, elas ficaram dependentes do regime geral a consagrar nessa matéria. Faltava, penso, redigir. Será um assunto que poderá ficar para a Comissão de Redacção, se estiverem de acordo.

Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Sr. Presidente, efectivamente, quanto à alínea ri), estou de acordo. Todavia, a nossa alínea b) vai um pouco mais longe e é relativamente independente do regime a consagrar quanto à declaração do estado de sítio. Nós, na alínea b), propomos qualquer coisa mais, que é atribuir à Assembleia da República competência de fiscalização para apreciar a aplicação do estado de sítio ou de emergência, ou seja, apreciar a posteriori a forma como o estado de sítio ou de emergência foram aplicados.

Supomos que tem um alcance útil, dado que ratificar a declaração de estado de sítio já está regulada. Nós substituímos esta alínea por esta outra, que tem, de facto, um conteúdo substancial. Por ela, findo o estado de sítio ou o estado de emergência, o Governo deve apresentar um relatório sobre a forma como foi aplicado o regime de estado de sítio e a Assembleia da República deve apreciar um relatório.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Jorge Miranda, tem a palavra.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente e Srs. Deputados: São efectivamente duas coisas distintas: uma coisa é, num momento inicial, um acto de

autorização ou, não tendo havido autorização do Plenário mas da Comissão Permanente, um acto de confirmação da declaração do estado de sítio. Essa é uma competência eminentemente política e legislativa que, a meu ver, deve ficar integrada no artigo 164.°

Outra coisa distinta é, no momento final, a Assembleia da República apreciar o modo como o estado de sítio ou o estado de emergência foram aplicados. Eles envolvem, por definição, a suspensão de direitos, liberdades e garantias. Envolvem medidas restritivas dos direitos das pessoas. É importante, para garantia desses direitos, que a Assembleia da República venha a tomar ... Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Só depois ou durante?

O S. Jorge Miranda (ASDI): — Julgo, Sr. Deputado Sousa Tavares, que deve ser depois, até porque uma intervenção da Assembleia da República, durante o estado de sítio ou de emergência, poderia ser perturbadora, ou tornar ineficazes as próprias medidas contidas na declaração do estado de sítio ou do estado de emergência. Isto não põe em causa, naturalmente, a intervenção por parte dos tribunais. Mas a intervenção política da Assembleia da República, a meu ver, deve ser no fim.

Noto, no entanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que na fórmula da FRS nem sequer se distingue. O que se diz na alínea b) é "apreciar a aplicação da declaração do estado de sítio ou do estado de emergência".

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Inintelegivel.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Na minha opinião pessoal essa intervenção é posterior, é sempre depois da declaração. A meu ver, deveria ser no fim. Na fórmula da FRS, não fica prejudicado que a intervenção seja durante.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Presidente, as várias alterações propostas, respeitantes à questão do estado de sítio, dividem-se em dois tipos: um, a proposta da AD e também a nossa (que não é mencionada no relatório), têm a ver com o modo de declarar o estado de sítio. Essa matéria já foi decidida noutra altura, não vale a pena retomá-la, uma vez que está aberto um caminho para o consenso.

Outra questão é a que é levantada pela proposta da FRS, como o Sr. Deputado Jorge Miranda invocou, e bem. Trata-se de, uma vez declarado o estado de sítio, a Assembleia da República, especificamente, se pronunciar sobre a aplicação da declaração do estado de sítio ou do estado de emergência.

Esta proposta da FRS colheu, na subcomissão, o nosso apoio, mas não com o sentido que o deputado Jorge Miranda agora lhe deu. A nossa ideia é de que durante a aplicação do estado de sítio, e nos termos normais, a Assembleia da República, se estiver em funcionamento, ou reunir para tal efeito, pode, e deve, apreciar a aplicação de estado de sítio, como todo e qualquer facto político.

O que julgávamos que estava nesta proposta da alínea b) era a ideia de que deve haver uma medida par-

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lamentar específica de apreciação de aplicação do estado de sítio, semelhante à apreciação, por exemplo, das contas públicas, o que pressupõe a existência de um relatório das autoridades do estado de sítio, que sirva de base a uma apreciação da Assembleia da República em relação a essa aplicação.

Portanto, uma coisa é uma figura específica, chamada "apreciação da aplicação do estado de sítio", outra coisa é a possibilidade, ou não, da Assembleia da República, nos termos normais que tem, poder, durante a aplicação, ou após, pronunciasse sobre o modo como está a ser aplicado. Obviamente que a Assembleia da República não poderá ser alvo de qualquer restrição sobre esta matéria.

Com este entendimento ...

Sr. Deputado Jorge Miranda, faz favor.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Deputado, na minha intervenção não pus em causa a possibilidade de a Assembleia da República, se estiver em funcionamento, apreciar a aplicação do estado de sítio. Mas o sentido útil da proposta da FRS é de autonomizar uma competência de apreciação, que pressupõe, designadamente, um envio de relatórios por parte do Governo à Assembleia da República. E na minha interpretação pessoal, esses relatórios deverão ser enviados no final do estado de sitio ou do estado de emergência.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Obrigado pelo esclarecimento. Creio que é uma contribuição importante. Estamos de acordo em que o que aqui está é a criação de uma figura autónoma parlamentar nova, chamada "apreciação do estado de sítio", e obviamente, é a posteriori.

Quanto à questão do modo como ela é feita, estou de acordo em que se deixe suficiente abertura para poder vir a determinar-se o modo como essa figura virá a ser recortada; por exemplo, se pressupõe, ou não, relatórios. Mas a ideia fundamental —e foi isso que se procedeu na subcomissão, e é isso que é, aqui, reafirmado e é isso que nos leva a apoiar esta ideia — é a criação de uma figura parlamentar como parentesco com a apreciação das contas públicas, chamada "apreciação da aplicação do estado de sítio" e tem de ser posterior à respectiva aplicação.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Estou esclarecido. É que, realmente, a expressão levantava-me dúvidas sobre o que se queria dizer "apreciar o estado de sítio", mas não gosto de leis que precisam de ser interpretadas e muito menos na Constituição!

Vozes imperceptíveis.

Não! Não! Tanto quanto possível que sejam claras. Portanto, acho que essa figura da apreciação final do estado de sítio não está bem expressa nesta disposição. É claro que é uma interpretação inteligente do Sr. Deputado Vital Moreira. Eu próprio já tinha levantado a dúvida de saber se a apreciação era durante ou depois. Mas não é perfeitamente explícita que seja essa a ideia que aparece no texto, de maneira que entendo que a FRS devia explicitar melhor a sua proposta.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jorge Miranda, tem a palavra. O Sr. Deputado não vai interferir a título de interrupção, uma vez que o Sr. Deputado Sousa Tavares já tinha falado. Mas, de qualquer maneira, se deseja inscrever-se tem a palavra imediatamente a seguir, uma vez que não há oradores inscritos. Peço desculpa, Sr. Deputado Almeida Santos, tem a palavra.

O Sr. Almeida Santos (PS): — Coloco-me, ao contrário, nos antípodas do Sousa Tavares. A virtude desta formulação é não ser demasiado clara porque a aplcação da declaração é óbvio que é sempre a posteriori. Mas a posteriori de quê?

De todo o estado de emergência? De parte dele? Do dia-a-dia? Ora, deixemos isto em aberto. Se a Assembleia da República, cujo funcionamento é pressuposto, até para ratificações que, atrás, decidimos deixar em aberto, está reunida, porque é que não há-de apreciar, como está a decorrer o estado de emergência? Pelo contrário deve fazê-lo. Só que é sempre a posteriori em relação ao estado de emergência, mas não à globalidade do estado de emergência. Esta redacção, "apreciar a aplicação", é válida para o todo e válida para a parte. Dizer mais do que isto é entrarmos em pormenorizações que, na verdade, criarão mais problemas do que aqueles que eliminam.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Recordaria que há uma competência genérica da Assembleia da República de vigiar pelo cumprimento da Constituição e das leis. Nessa competência abrange-se, necessariamente, a vigilância respeitante à aplicação do estado de sítio e do estado de emergência.

A figura que queremos introduzir na alinea b) do artigo 1§5.°, como figura autónoma, poderia traduzir-se em relatórios de aplicação do estado de sítio e do estado de emergência por paralelismo com o que hoje acontece na alínea e) relativamente aos relatórios de execução do Plano.

Na minha opinião esses relatórios deveriam ser, obrigatoriamente, enviados pelo Governo à Assembleia no final da declaração do estado de sítio ou do estado de emergência.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Amândio de Azevedo, faz favor.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Mantemos as nossas reservas a esta proposta. E essas reservas aumentaram com a discussão que se está a verificar. Não pensamos que seja, efectivamente, um bom método enveredar pela prática cos relatórios relativamente a actuações do Governo. A Assembleia da República se estiver reunida pode, manifestamente, marcar uma sessão de perguntas ao Governo sobre o desenvolvimento do estado de sítio, durante o mesmo se, até, depois, e pode fazer uma interpelação ao Governo através dos diversos partidos ... Com certeza.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Creio que tem razão naquilo que está a dizer. Fui eu que falei em relatórios, mas como um modo possível de dar conteúdo à proposta. Aqui não se fala em relatórios. Outro dos

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meios pode ser um dos que está a citar que não me tinham ocorrido, mas que considero uma fórmula possível. Portanto, creio que, nesse aspecto, a fórmula embora apontando, a meu ver —e aí, compartilho da interpretação do Sr. Deputado Jorge Miranda—, para uma figura parlamentar autónoma não diz em que é que ela consiste. Aí estou de acordo com o deputado Almeida Santos quanto a essa vantagem.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Pode ter essa vantagem, é verdade, mas em outra perspectiva pode ser uma desvantagem. Em suma, penso que, pelo menos para já, não seja útil, criar aqui uma nova figura parlamentar, porque a figura existente dá total e plena possibilidade à Assembleia da República de fiscalizar durante e após a aplicação do estado de sítio toda a actuação do Governo através das medidas que já invoquei e através de outras, como requerimentos, intervenções políticas.

A Assembleia, assim, se estiver reunida tem todos esses meios à disposição e se não estiver reunida há mecanismos para promover a sua reunião.

As reais capacidades da Assembleia para fiscalizar a

aplicação do estado de sítio não aumentam com esta nova figura e como procuro ser económico nas palavras também o procuro ser nos meios. Portanto, e em princípio, continuo com reservas à introdução desta nova figura.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, sem menosprezo por nenhuma das opiniões expressas, julgo que isto se está a transformar numa discussão um tanto ou quanto bizantina. Chamo a atenção disso aos Srs. Deputados, fundamentalmente, aos Srs. Deputados proponentes e, entretanto, dou a palavra ao Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): — Não demoraria muito. Serei breve.

A questão é que na epígrafe do artigo 165.° está escrito "competência de fiscalização". Isto é uma definição da competência de fiscalização da Assembleia. E porque é que se põe aqui esta definição de competência? Porque o estado de sítio ou o estado de emergência é uma situação excepcional!

Vozes.

Estava a falar para todos os Srs. Deputados e especialmente para o Sr. Amândio de Azevedo. Assim não ganho nada com este discurso.

Dizia eu, que isto obriga que, a seguir ao estado de sítio ou ao estado de emergência, a Assembleia vai ter de os apreciar.

Enquanto se isto aqui não estiver a Assembleia não aprecia literalmente nada, ou pode apreciar.

O Sr. Deputado Amândio de Azevedo tem razão num ponto: se isto não estiver aqui nada impede que a Assembleia da República o faça. A Assembleia da República fá-lo-á, ou não o fará. Se isto estiver aqui a Assembleia tem de o fazer.

E agora pergunta-se: há vantagens ou não há? Peço imensas desculpas ao Sr. Deputado Amândio de Azevedo, mas há imensas vantagens. Há imensas vantagens ou não em que a Assembleia o faça? Fala-se nos tribunais. É evidente que os tribunais vão apreciar os factos concretos violados da lei e geradores de responsabilidades ou de ilícitos penais, cíveis, contratuais ou extracontratuais, conforme os casos. Mas o que é que

a Assembleia vai fazer? A Assembleia vai fazer a apreciação política global deste caso. E o que é que acontece? E que um juízo político não é um juízo sobre os fundamentos da declaração do estado de sítio. É um juízo sobre a execução e a Assembleia vai cortar cerce a todas as especulações que sobre esta matéria sejam feitas.

Devo dizer que, se pertencesse a uma maioria parlamentar que declarasse este estado de sítio, teria todo o interesse em que, obrigatoriamente, a seguir, a Assembleia se debruçasse sobre ele, mutatis muiandis, estabelecendo uma comparação que os Srs. Deputados da AD consideram certamente do mais alto requinte, é como o que se passa com o Orçamento Geral do Estado e com a Conta. Apresenta-se o Orçamento Geral do Estado e depois a Assembleia vai também ver a Conta. Ora bem, é, no fundo, o que se pretende com isto.

O Sr. Amândio de Azevedo diz: "deixemos à Assembleia o encargo de fazer ou não fazer isso". Nós dizemos: em face de casos como estado de sítio e como o estado de emergência não deixemos essa possibilidade da Assembleia fazer ou não fazer isso. É esta a diferença. É por isto que penso que este nosso ponto de vista acerca desta norma deve ficar na Constituição da República Portuguesa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): — Não se esqueçam que lá para trás previmos que a Assembleia fosse chamada a prorrogar o prazo de duração do estado de sítio e do estado de emergência. Se nós vincularmos a Assembleia a uma obrigação de fazer, ou seja, de controlar, passo a passo, a forma como está a ser aplicado, ela fica habilitada a poder prorrogar, ou não prorrogar, por um período e não por outro. Este argumento parece-me muito importante e pedia à AD para o tomar em conta, sendo possível.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Nós estamos numa posição de reserva, não estamos numa posição de oposição. Devo dizer que — isto é uma posição pessoal — à partida não me custa nada prever situações, em que, mesmo tendo terminado o estado de sítio, não há vantagem nenhuma em fazer um debate sobre ele na Assembleia da República. E, portanto, desde que está aberta sempre essa possibilidade de ser feito o debate, é só a Assembleia querê-lo. Não vejo à partida, sinceramente, que haja vantagem em obrigar a Assembleia a fazê-lo.

O Sr. José Luís Nunes (PS): — Só uma nota, Sr. Deputado Amândio de Azevedo. É que isso deixa ficar ao arbítrio de uma maioria da Assembleia da República fazê-lo ou não o fazer. É que o Sr. Deputado confunde e é o ponto fundamental, interpelações, perguntas ao Governo que são direitos dos deputados, com uma competência legal da Assembleia.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Era uma interrupção ao Sr. Deputado Amândio de Azevedo. Só duas notas!

Primeira, há limites às interpelações e às perguntas. Limites constitucionais e regimentais. Podem ter sido

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ultrapassados esses limites e, portanto, já não poderem ser utilizados por partidos da oposição.

Segunda, a fórmula da FRS tem em vista estabelecer um poder vinculado à Assembleia. Tão graves são os efeitos da declaração do estado de sítio e do estado de emergência sobre os direitos dos cidadãos que, publicamente, num órgão como é a Assembleia da República deve haver uma apreciação desses efeitos.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Amândio de Azevedo, agradeço-lhe que seja breve.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Eu sou sempre breve.

É só para dizer que este problema tem de ser considerado no quadro da declaração do estado de sítio, acerca do qual já chegámos a um consenso bastante alargado, mas que ainda não rematámos, digamos assim.

Portanto, nós mantemos as nossas reservas, mas estamos, naturalmente, abertos a considerar o problema, sobretudo na medida em que a FRS mostra por ele um brando interesse.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, portanto, quanto a esta alínea o resumo é simples: uma vez que os partidos da AD, continuando a manifestar reservas, estão abertos à discussão deste assunto em altura própria.

Quanto à alínea c) da FRS ficou remetida para aquando da discussão do artigo que, directamente, trata da matéria da ratificação de decretos-leis.

Quanto à alínea d), a FRS reserva posição sobre a proposta da AD, cujo conteúdo é previsto na alínea p) do artigo 164.° do seu projecto. O PCP e o MDP/CDE opõem-se à proposta da AD.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Sr. Presidente, na altura também nos opusemos a esta alteração. O relatório não é exacto. Mas a oposição partia do princípio de que a AD, ao integrar esta matéria no artigo 164.° como alínea p), eliminava a obrigatoriedade da apresentação até 31 de Dezembro do ano subsequente da Conta Geral do Estado, com o relatório do Tribunal de Contas, isto é, a obrigação de o Governo apresentar a Conta desaparecia. Na subcomissão, em momento posterior, já verificámos que a AD não fazia essa malfeitoria à Constituição. Apenas transferia esta obrigação para o título respeitante ao Governo, isto é, essa obrigação do Governo mantém-se sistematizada nas competências do Governo. Tendo em vista essa constatação entendemos, na altura, já na subcomissão, que essa alteração sistemática — é o que se verifica — se justifica. Efectivamente aqui estamos a tratar das competências da Assembleia. No caso vertente, a parte final é uma competência do Governo e, nessa medida, damos o nosso acordo a que essa transferência se verifique para o título respectivo.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, quanto à alínea d) que é transferida pela ADpara a alínea p) do artigo 164.°, mantém-se a oposição do PCP e do MDP/CDE. Pelo menos não inflectiram a posição que manifesta o relatório da subcomissão. Já agora peço desculpa de que esta reunião está a ser conduzida um pouco atabalhoadamente, mas, de facto, este relatório ê um quebra-cabeças para quem tem de se orientar por ele.

Não houve aqui qualquer manifestação em contrário, qualquer evolução assim, tenho de sumariar que essa posição se mantém. Não sei se os partidos em causa querem acrescentar alguma coisa?

Sr. Deputado Vital Moreira, tenha a bondade.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — De facto este relatório causa alguma dificuldade de leitura, mas a posição que era imputada ao PCP era a posição no pressuposto inicial de que isto era, efectivamente, uma eliminação. Não é uma eliminação, é uma transferência de local, e por isso reservamos para ulterior momento o saber das vantagens de tal transferência. Deixa de haver uma oposição nos termos em que ela tinha sido expendida.

O Sr. Presidente; — Sr. Deputado Monteiro Taborda, faz favor.

O Sr. Monteiro Taborda (MDP/CDE): — Depois da explicação dada pelo Sr. Deputado Nunes de Almeida, e como se trata de uma transposição para outra sede, reservamos para momento posterior a posição.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jorge Miranda, faz favor.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há, para além das diferenças de sistematização, uma diferença importantíssima que suponho não ter sido ainda salientada entre o texto actual da Constituição e o texto da proposta da AD. No texto actual da Constituição diz-se na alínea d), "tomar as contas do Estado e das demais .entidades públicas que a lei determinar". Saliento as contas do Estado e das demais entidades públicas que a lei determinar. Na proposta da AD diz-se "tomar as contas do Estado e das demais entidades públicas nos termos da lei".

Na minha interpelação a proposta da AD vem impor que as contas de todas as entidades públicas sejam submetidas à apreciação da Assembleia. Pela minha parte, e à partida, não sou contra, mas gostaria de saber se é esse o sentido que a AD pretende que venha a ser introduzido na Constituição.

Vozes.

O Sr. Presidente: — Sr.a Deputada Margarida Salema quer esclarecer este ponto?

A Sr.a Margarida Salema (PSD): — Da alínea [) do artigo 200.° proposto pela AD resulta essa interpretação. Mesmo que conjugado com a proposta de alteração da AD ao artigo 164.°, na alínea p), a interpretação que resulta é, de facto, aquela que foi apontada pelo Sr. Deputado Jorge Miranda. Penso, portanto, que a AD ponderará o inciso relativo às demais entidades públicas nos termos em que está previsto no actual artigo 165.°

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nunes de "Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Suponho que a AD foi além do que pretendia. É óbvio, por exemplo, que não vai apresentar as contas das autarquias que

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são apresentadas às assembleias municipais. Não vai apresentar as contas das regiões autónomas que hão--de ser apresentadas, segundo a nossa proposta, às assembleias regionais. Vozes imperceptíveis.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Talvez seja de manter a fórmula actual da Constituição na primeira parte, ou seja, tomar as contas do Estado e das demais entidades públicas que a lei determinar e a parte final passar para a competência do Governo. Não será a solução?

O Sr. Presidente: — A AD concorda com esta sugestão do Sr. Deputado Jorge Miranda?

Entretanto o Sr. Deputado Vital Moreira pediu a palavra. Tem a bondade.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — A proposta da AD tem dois sentidos. Um viu-se, agora que é, nitidamente, excessivo e tem de ser corrigido, dado que abrangia todas as entidades públicas. Mas tem outro sentido a expressão "nos termos da lei". É que passa a dizer-se aquilo que não se dizia. Hoje diz-se "tomar as contas do Estado". É tomar as contas do Estado, pura e simplesmente. Agora passar-se-á a dizer: "Tomar as contas do Estado, nos termos da lei." Não sei se há vantagem em fazer, a propósito disto, uma reserva de lei: mas o problema que aqui está é o seguinte: é que "tomar as contas do Estado" é uma das mais espantosas expressões da Constituição (que, aliás, vem da Constituição anterior) cujo sentido último — estou convencido — que, até agora, não obteve ainda uma sedimentação suficiente para sabermos, exactamente, o que é. Talvez seja por isso mesmo que ela se mantém. Gostaria também que os Srs. Deputados se pronunciassem sobre a questão da reunião para os termos da lei, do modo como hão-de ser tomadas as contas públicas. Não estou, para já, a manifestar, qualquer objecção, estou apenas a suscitar o problema e a solicitar e a solia opinião da Comissão.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — É evidente que a ideia da AD não é a de que as contas do Estado passem a ser tomadas nos termos da lei, isto é, que possam ser tomadas de qualquer maneira. É tomar as contas do Estado! Não considero, realmente, esta expressão muito adequada, até porque, como disse o Sr. Deputado Nunes de Almeida — e com uma certa razão —, parece-me que ela vai além daquilo que se pretenderia. Quer dizer, pensou-se que se dizia a mesma coisa e não se diz exactamente a mesma coisa. Parece--me que a forma "tomar as contas do Estado" passaria a ser condicionada pela lei.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegou-se a consenso quanto a esta alínea d), que ficaria: "Tomar as contas do Estado e das demais entidades públicas que a lei determinar", tendo a FRS aceite que a referência a prazo seja tratada noutra sede e o PCP considerado essa hipótese com alguma abertura, ainda que não tenha dado um acordo definitivo quanto a essa matéria.

Srs. Deputados, finalmente neste artigo temos: quanto à sugestão de novo n.° 2 do PCP, a FRS apoiou-a,

salientando que é- convergente com a sua proposta relativa ao artigo 181.°, tendo a AD manifestado fortes reservas.

Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Peço desculpa, mas o que apoiámos foi o princípio constante da proposta do PCP com a ressalva de que preferíamos a nossa própria proposta nesta matéria, que não é inteiramente coincidente com a do PCP.

O Sr. Presidente: — Teremos, apenas, que saber se a AD, de alguma forma, evoluiu a sua posição, ou se quer comentar as reservas manifestadas.

Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Presidente, na verdade esta proposta visa colocar, em sede de competência de fiscalização da Assembleia, o problema dos inquéritos parlamentares que a FRS também coloca, em termos em boa parte convergentes, no n.° 4 do artigo 181.° Há duas diferenças: uma é que a FRS ajunta que as comissões parlamentares de inquérito gozam dos poderes de investigação próprios das autoridades judiciais. É um aditamento que nos parece conveniente, mais, necessário e que colhe o nosso apoio. A outra diferença respeita à exigência do mínimo de deputados necessários para desencadear, isto é, com poder potestativo de desencadear inquéritos parlamentares. Da FRS é menos exigente, em certo sentido, do que a proposta do PCP, que fala em dois quintos dos deputados ou 3 grupos parlamentares. A proposta da FRS fala em um quinto dos deputados em efectividade de funções. Mas o problema fundamental que está em causa não é o que decorre destas divergências. O problema fundamental é o que decorre do idêntico propósito das propostas que é o seguinte: os inquéritos parlamentares, ao contrário do que acontece hoje, poderiam — a serem aprovadas o essencial das propostas — vir a ser desencadeados, independentemente de deliberação parlamentar, desde que requeridos por um determinado número de forças parlamentares, sejam deputados, sejam grupos parlamentares. Isto já deu alguma discussão na subcomissão. A justificação fundamental é de que, na verdade, a figura do inquérito parlamentar — como foi dito na subcomissão por um deputado — só faz sentido quando a minoria a ele tiver acesso, isto é, quando não depender da maioria a existência de inquéritos parlamentares.

Houve um argumento fundamental contra na subcomissão, que importa desde já considerar. O único praticamente que foi aduzido foi o de que devia haver, também, qualquer limitação quanto ao objecto dos inquéritos parlamentares, mas não houve qualquer contraproposta nesse sentido. Pela nossa parte não fechámos a porta a considerar tal contraproposta, mas, de facto, insistimos depois da discussão na subcomissão em que esta matéria é de importância bastante grande e que, na verdade, se queremos transformar os os inquéritos parlamentares naquilo que eles são, e bem, noutros sistemas constitucionais, ou seja, em instrumento activo e relevante de vida política parlamentar portuguesa, então teremos de consagrar uma disposição do tipo daquela que é proposta nos projectos do PCP e da FRS.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Sousa Tavares.

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O Sr. Sousa Tavares (PSD): — O PSD tem, aqui, uma posição que enunciou na subcomissão e que se traduz em reservar esta matéria para a discussão do artigo 181.° De qualquer maneira, há uma abertura a que os inquéritos parlamentares se tornem algo não dependente, apenas, da vontade da maioria. De qualquer forma não aceitamos, a priori, a fórmula proposta pelo PCP, porque, embora pudéssemos, por exemplo, concordar com os dois quintos dos deputados já na mais difícil concordámos com os 3 grupos parlamentares. E 3 grupos parlamentares hoje em dia podem ser 9 deputados ...

Vozes.

10! Poderíamos, assim, fazer uma sintese das 2 exigências. Um certo número de deputados e 3 grupos parlamentares que representem o mínimo de x deputados. De qualquer maneira estamos abertos, mas reservamos a posição para o artigo 181.° Simplesmente dar o direito de pedir o inquérito a 3 grupos parlamentares, não concordamos, e mesmo, não estamos abertos, porque eles podem representar muito pouco no parlamento. Como foi dito, já hoje, na parte da manhã, pelo Sr. Deputado Amândio de Azevedo de reconhecermos, por um lado, que o inquérito parlamentar, como figura constitucional, só tem sentido se não for reservado à discricionalidade da maioria, por outro lado, não queremos fazer do inquérito parlamentar o "pão nosso de cada dia" que paralise, praticamente, todos os trabalhos parlamentares. Com certeza.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Deputado Sousa Tavares, obrigado pela interrupção. O problema que quero colocar é o seguinte: é que nós cremos que a exigência de 3 grupos parlamentares pode ser bastante mais significativa do que o número de deputados. Imaginemos um caso concreto: creio que teria mais significado político o inquérito parlamentar reunir no seu requerimento, por exemplo, a menor combinação possível de deputados — MDP/CDE, ASDI e UEDS — do que falar em 20 ou 30 deputados que podem ser os do PCP ou do PS ou do CDS. O facto de serem 3 forças políticas, com a sua autonomia específica, que se reúnem para exigir um inquérito parlamentar pode ter muito mais significado do que o simples número de deputados que ele óonsegue mobilizar entre si. E, portanto, desejaria juntar este elemento de discussão, porque me parece que estava a desconsiderar a possibilidade de perspectivar deste ângulo o problema.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Não estou. E levo em consideração as suas palavras que, evidentemente, têm um certo fundamento. O Sr. Deputado Vital Moreira também deve reconhecer que não somos senhores do futuro. Não sabemos o que o futuro nos pode reservar em matéria de grupos parlamentares. Amanhã pode haver uma proliferação, podem haver vários grupos parlamentares de poucos deputados que podem, inclusivamente, representar posições muito homogéneas, e não estando os 4 grandes partidos que actualmente constituem o sistema partidário português — e que, provavelmente, constituirão durante muito tempo —, e aqueles grupos parlamentares podem, assim, impor um inquérito parlamentar.

É, realmente, uma consideração a ter em conta. Penso que, em suma, a síntese entre um número mí-

nimo de deputados e uma expressão de grupos parlamentares poderá ...

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Deputado Sousa Tavares, aceitaria uma fórmula como esta ...

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Estou a falar a título pessoal. A posição oficialmente tomada pelo partido é a de reservar a discussão para o artigo 181°, embora, desde já, exista uma certa abertura para facilitar a figura do inquérito parlamentar.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Agradeço a sua interrupção e congratulo-me com a abertura que manifesta. Hoje na alínea b) do n.° 2 do PCP diz-se: "A Assembleia pode efectuar inquéritos, os quais terão lugar quando sejam requeridos conjuntamente por dois quintos dos deputados ou por 3 grupos parlamentares." Pergunto: aceitaria esta fórmula de substituição: "Que se efectuarão quando requeridos, conjuntamente, por dois e quintos dos deputados ou 3 grupos parlamentares que representam um quinto do número total de deputados"?

O Sr. Sousa Tavares (PSD). — Seria perfeitamente de ponderar. Estaria aí a tal conjunção de que falei, ou seja, da síntese entre as suas posições.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Muito obrigado.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados. Só uma precisão. O PCP não se opõe a que esta matéria seja discutida no âmbito do artigo 181.° independentemente da sistematização que venha a ser adoptada?

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Nós consideramos a questão do local de importância secundária embora, a nosso ver, a melhor localização seja aqui. Mas quanto ao momento da discussão não opomos nada à dilação.

O Sr. Presidente: — Não se opõem, então!

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Mesmo a dilação poderá alargar a possibilidade de se encontrar uma solução e talvez, assim, seja bem-vinda.

O Sr. Presidente: — Com certeza. De parte de todas as forças políticas há uma abertura muito grande à consagração destes princípios propostos pelo PCP no n.° 2 do artigo 165.° Há consenso também em que este assunto seja tratado aquando da discussão do artigo 181.°, independentemente da sistematização que venha a ser adoptada. Antes de nos irmos embora há assuntos a ponderar. Sr. Deputado Taborda, tenha a bondade.

O Sr. Monteiro Taborda (MDP/CDE): — Havia uma proposta de eliminação da alínea b) do artigo 165.° do MDP/CDE e queria dizer que, como foi tudo remetido para a discussão global do estado de sítio, reservava, para esse momento, a posição. Por outro lado, corroborava as palavras do Sr. Presidente, da preferência do MDP/CDE de discutir este caso concreto do n.° 2 da proposta do PCP e também da FRS aquando da discussão do artigo 181.°

O Sr. Presidente: — Peço desculpa, Sr. Deputado, em não ter referido a proposta de eliminação do

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MDP/CDE, mas, de facto, não consta do relatório da subcomissão e, mais uma vez, passou.

Havia dois assuntos de ordem processual que queria ficassem equacionados, para que, amanhã de manhã, se tivessem já uma opinião, a expendissem.

A primeira questão é quanto ao Diário: sugeria, já que tem havido algum atraso na publicação do Diário, em virtude de os grupos parlamentares, por um motivo ou outro, demorarem a sua apreciação, que o Diário fosse para publicação automática 3 dias após a sua distribuição. Caso viesse a haver alguma discordância após a publicação seria incluída no Diário na altura própria. Mas era bom que tivéssemos um prazo fixo para a apreciação. Há consenso, neste aspecto?

Outro assunto também respeitante ao Diário: para a celeridade de comunicação dos nossos trabalhos a imprensa sugeriria que a Comissão autorizasse que fosse entregue um exemplar, mesmo dactilografado, à agência noticiosa ou aos órgãos de comunicação que o solicitassem na mesma altura em que fosse distribuído, ou 3 dias após a sua distribuição se acharem

melhor. É uma sugestão e agradecia que, amanhã, me dessem a vossa opinião.

Entretanto, tem-me sido sugerido que falasse aqui na eventual necessidade de se pensar num regimento especial da Assembleia da República para a discussão, no Plenário, da revisão constitucional. Creio que é, de facto, necessário pensar em tal regimento. Não sei se considerarão que é mister desta Comissão fazê-lo. Julgo que sim, uma vez que os membros desta Comissão estão dentro do assunto, e, assim, poderão, com mais validade, imaginar um regimento adequado a essa discussão no Plenário.

Se esta sugestão tivesse acolhimento, teríamos de pensar a melhor maneira de pôr este processo em movimento, uma vez que esse regimento teria de ser proposto pela Comissão à Conferência dos Presidentes e conviria quanto antes pensar neste assunto.

Deixo estas 2 questões para a vossa apreciação e para termos, amanhã, antes dos trabalhos, uma troca de impressões a este respeito.

Muito obrigado. Está encerrada a reunião.

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