O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

0086 | I Série - Número 007 | 16 de Outubro de 2001

 

pelos cidadãos que criam riqueza pela via dos impostos que pagam, no quadro de um sistema fiscal e tributário justo.
Ao lado da intervenção predominante do Estado, deve haver lugar para iniciativas descentralizadas dos cidadãos e de instituições privadas sem fins lucrativos como, por exemplo, as misericórdias e as fundações com objectivo beneficiente.
O valor que se pretende atingir é o do melhor estado de saúde para todos os cidadãos e os princípios éticos invocáveis são os da beneficência, solidariedade, equidade no acesso e não discriminação.
A Base II, o n.º 5 da Base III a Base III dão corpo aos princípios éticos acima referidos, enfatizando a sua contribuição para o valor principal que é o de promoção do melhor estado de saúde dos cidadãos.
Na Secção III a Base VIII define o conceito de sistema de saúde e logo no n.º 2 da Base IX se afirma, como um dos objectivos, "a protecção e garantia de dignidade e integridade da pessoa humana, devendo a lei regular a existência de comissões de ética nos estabelecimentos prestadores" e, no n.º 3, afirma-se garantir "a identidade genética de cada indivíduo".
A Base X define sete princípios éticos que são propostos não apenas para o que chamei actividades a jusante da prestação individual mas na totalidade das intervenções possíveis de um sistema de saúde como é evidente no primeiro princípio: "a) Universalidade, garantindo que todos estejam cobertos por esquemas de promoção e prestação da saúde e por serviços prestadores".
Os princípios enunciados e sucintamente descritos - universalidade, generalidade, solidariedade, equidade, qualidade, integração, continuidade - configuram um sistema de saúde com uma fundamentação ética correcta.
3 - No nível da prestação de cuidados de saúde a pessoas que os procuram por entenderem que deles têm necessidade, há lugar para enunciar outros valores que são valores de personalidade e não valores sociais, como os que foram apontados para o sistema quando age no primeiro nível.
Porque o adoecer e a consequente necessidade dos cuidados é, sempre, um acontecimento individual (só as grandes epidemias, hoje raras, justificam uma intervenção estatal do tipo saúde pública), a procura de cuidados é uma decisão pessoal.
Como decisão pessoal, ela deve ser livre, pelo que o sistema de saúde deve respeitar o princípio da autonomia, ou seja, cada pessoa deverá poder escolher livremente os cuidados de saúde que pretende obter para a sua doença.
Em todos os sistemas de saúde europeus esta liberdade e esta autonomia só são respeitadas quando a pessoa paga do seu bolso os cuidados de saúde que pretende obter, em Portugal ou num país estrangeiro.
Dados os custos dos cuidados, que, no terceiro nível, o dos cuidados hospitalares e especializados, são muitas vezes catastróficos, e porque, nas sociedades democráticas actuais após o fim da 2.ª Guerra Mundial, é eticamente inaceitável que uma pessoa não tenha acesso a cuidados de saúde necessários, porque os não pode pagar, os cidadãos contribuintes aceitam que uma parte dos impostos que pagam, além de serem gastos em actividades de promoção e defesa da saúde, das quais são potencialmente beneficiários todos os cidadãos, sejam também despendidos para o benefício individual de um cidadão que decide procurar os cuidados para a sua saúde que ele, cidadão, considera necessários.
Se ninguém duvida que os custos das intervenções em saúde pública devem ser pagos, solidariamente, por todos os contribuintes, porque se procura um benefício que, sendo para todos, não é, especificamente, para ninguém, os eticistas dividem-se quando a situação é todos serem obrigados a ser solidários pagando os custos provocados por alguns que adoecem (por vezes em consequência de decisões livremente assumidas, com conhecimento dos riscos de adoecer, como é o caso do cancro do pulmão nos fumadores) e que recebem um benefício individual.
A literatura sobre este debate ético é muito extensa. Direi, em resumo, que numa extremidade do debate situam-se os que pensam que a saúde é uma comodidade individual, um bem pessoal com valor económico, pelo que cabe à pessoa protegê-lo e conservá-lo com os seus meios próprios.
Na outra extremidade ficam os que defendem que o acesso a cuidados de saúde necessários é um direito social, pelo que é obrigação do Estado, pela via dos impostos, pagar tudo a todos em matéria de prestação de cuidados de saúde. Nesta posição a lógica é: um bom estado de saúde de todos os cidadãos é um benefício social e não apenas individual, pelo que os custos devem ser assumidos, solidariamente, por todos os cidadãos contribuintes que alimentam as finanças públicas.
A doutrina ética intermédia, apoiada em teorias económicas de justiça como equidade, próximas de John Rawls, afirma que o direito de acesso a cuidados de saúde deve ser garantido a todos os cidadãos; o encargo irá de 0 a 100%, de acordo com os rendimentos da pessoa física. Porque o consumo de cuidados de saúde não é uma obrigação mas um acidente, o pagamento individual deve estar protegido por um sistema de seguro que pode ser público, privado ou misto. O sistema misto, que vigora em muitos países e de que é exemplo a Holanda, é considerado o mais equitativo em termos de ética económica. O custo por cidadão é calculado por processos actuariais, fixado anualmente e pago pelos cidadãos, no todo ou em parte, de acordo com a declaração de rendimentos para efeitos fiscais; no caso de rendimentos abaixo de um valor, também fixado anualmente, a Tesouraria do Estado paga a diferença à entidade seguradora em nome do cidadão. O instituto segurador pode ser público, como na Suécia, ou privado, como na Holanda, mas não é, nunca, um prestador de cuidados médicos; o que faz é adquirir estes cuidados, com rigorosos critérios de qualidade e de preço, procurando obter o máximo valor para o dinheiro dos cidadãos. A separação total entre os prestadores de cuidados e o pagador, que é uma entidade especializada na gestão de recursos financeiros, torna o financiamento transparente e verificável (accountable) para os cidadãos que pagam.
O cidadão, em qualquer uma destas modalidades de financiamento por solidariedade, mesmo no sistema totalmente estatizado no qual o pagamento e a prestação são exclusivamente públicos, são titulares de direitos e deveres, que tem de ser eticamente enquadrados. Este é o objectivo do Capítulo II - Secção I.
A Base XIV e a Base XVI estão eticamente correctas e a Base XVII também; nelas são fixados, para além do relevo dado à investigação científica em saúde, os grandes princípios da liberdade de escolha, do consentimento informado, da não discriminação e do direito a receber todas as informações.
A Base XVIII consagra deveres éticos dos cidadãos quando usam o sistema de saúde ou mesmo antes, como no n.º 1, alínea a), que diz que é dever do utente (melhor seria do cidadão) "Defender ou promover a própria saúde e a de todos os que dele para esse efeito dependam".

Páginas Relacionadas
Página 0081:
0081 | I Série - Número 007 | 16 de Outubro de 2001   PROJECTO DE LEI 407/VII
Pág.Página 81