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1822 II SÉRIE - NÚMERO 57-RC

a uma perda de tempo, que, provavelmente, é uma das principais entrelinhas.

O Sr. Presidente: - Quer dizer, era um ganho de transparências explicitando o implícito.

Srs. Deputados, explicitados ou implícitos, poderíamos - suponho - passar à segunda questão prévia que o Sr. Deputado José Magalhães quer colocar. Quer V. Exa. aqui desenvolver os seus pontos de vista?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muito obrigado, Sr. Presidente, Srs. Deputados, creio que não seria razoável nem correcto politicamente que a Comissão de Revisão Constitucional encetasse os seus trabalhos, depois de os ter interrompido no mês de Julho, sem que, minimamente, reflectíssemos aqui, colectivamente, sobre as implicações e as consequências do acordo político de revisão da Constituição celebrado pelo PSD e pelo PS no passado dia 14 de Outubro.

Longamente anunciado, longamente aguardado, objecto de intensas especulações, celebrado como uma vitória e celebrado como uma derrota, considerado um "serviço inestimável" para a resolução de candentes problemas nacionais e como um perigo para alguns dos aspectos que são mais caros a muitos sectores da sociedade portuguesa e que decorrem do actual regime constitucional, o chamado acordo político de revisão da Constituição é, sem dúvida, um facto inédito na nossa história política.

Acordos políticos entre partidos já houve e haverá - o PS, de resto, foi inspirador, autor e também vítima de alguns desse acordos celebrizados na nossa história política recente. A experiência histórica portuguesa não impediu, todavia, que o PS celebrasse este novo acordo, com todas as suas implicações. Destacarei três aspectos: a metodologia, o conteúdo e as implicações. Quanto à metodologia, devo sublinhar que, para quem tenha participado nos trabalhos da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, que decorreram ao longo de meses, até Julho, os primeiros indícios da gestação de um texto como aquele que agora foi publicamente revelado e anunciado ao longo de meses constitui um factor seguramente preocupante. Como o Sr. Deputado Almeida Santos há pouco pôde sublinhar, a leitura das actas da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional revelará, porventura, a preocupação de aprofundar e de detalhar as apreciações e a preocupação de fundamentar propostas e também os pontos de aproximação e de afastamento dos partidos em relação a muitos dos textos que terão de ser submetidos a debate oportunamente no Plenário da Assembleia da República não revela, porém, ao leitor posicionamentos definitivos e envolve mesmo dificuldades de apreciação substanciais.

O lugar para dirimir as dúvidas e pontos de divergência é, seguramente, este em que estamos e, evidentemente, o Plenário da Assembleia da República, a quem cabe decidir em definitivo. É metodologicamente questionável e politicamente criticável a forma como o acordo foi celebrado, a latere do trabalho da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, ainda que, piedosamente, os dois partidos celebrantes refiram que o acordo que celebraram "teve em consideração e tomou em referência os debates levados a cabo na mesma Comissão Eventual para a Revisão Constitucional entre Março e Julho do corrente ano". É que, antes de concluído o próprio processo da primeira leitura e no momento em que essa primeira leitura inconclusa revelava dificuldades de apreciação substanciais, o PSD e o PS fecharam um texto, através do qual dois partidos - o que acontece pela primeira vez na história portuguesa - se comprometem a projectar no terreno da revisão constitucional a materialização de determinados conteúdos políticos, a que chamaram "princípios" (no que vejo alguma ironia e interpreto a palavra como uma alusão a "orientações gerais", a "tradução geral" despida de sentido político). Trata-se de uma condicionante, um constrangimento, assemelha-se demasiado a um acordo de partilha e, lido o texto do acordo, mais se firma esta noção.

Quanto às questões do conteúdo, já disse o PCP aquilo que é público e aqui dou por reproduzido. Tal qual nos é dado lê-lo, por exemplo, na edição do Diário de Notícias do passado dia 15 - uma vez que não temos conhecimento oficial do texto e que este não foi transmitido sequer à Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, pois os dois partidos assim entenderam celebrá-lo, anunciá-lo, transcrevê-lo, publicá-lo - o acordo é tudo o que parece, mas não parece tudo o que é. O acordo, ele próprio, sublinha que não se comprometem o PSD e o PS senão àquilo que dele consta. E mais: "a apreciarem em conjunto outras propostas constantes dos respectivos projectos de revisão constitucional não directamente abrangidas pelo acordo em causa, tendo em vista facilitar consensos nessas outras áreas que viabilizem a maioria de dois terços necessários à revisão da Constituição".

Eis o que se afirma, o que significa que se deixa por afirmar todo um conjunto de questões ou todo um conjunto de asserções, que são, obviamente, do maior interesse, sabendo-se que o acordo contempla, nos seus três pontos e na sua, de resto, pouco escorreita organização, três grupos de questões que ele próprio detalha. Deixam-se em aberto todas as demais. A questão que se coloca - e essa é a questão fundamental - é a de saber se, verdadeiramente, se deixa em aberto ou se o acordo não sugere, ele próprio, determinadas soluções, uma vez que o PSD tem propostas e o PS as suas propostas tem: não resta senão ao PS votar as propostas do PSD ou ao PSD votar as propostas do PS ou, forjarem, em conjunto, propostas alternativas que ambos subscrevam (pois, embora o acordo não diga que o farão, podem eventualmente fazê-lo, uma vez que o texto não é suficientemente claro quanto à metodologia a adoptar pelos dois partidos).

E eis, pois, que navegamos num mar de indefinições! Nem o acordo delimita rigorosamente o seu âmbito, nem diz tudo aquilo que pode ser, nem, quanto àquilo que, não estando dito, pode vir a sê-lo, os dois partidos são específicos, deixando em aberto como hão-de efectivar os compromissos futuros que de imediato se comprometem a assumir. Eis, portanto, que tanto na questão das formas de materialização do acordo como dos outros pontos que podem ser objecto de entendimentos, mas que não são objecto imediato do acordo, o PS e o PSD são mudos e não específicos.

Devo dizer ainda, muito sumariamente, três coisas.

A primeira é que entendemos que se trata de um prémio gravíssimo para o PSD, de um prémio à sua estratégia de antecipação de revisão constitucional e de consumição, através de pacotes, de conteúdos relevantes e úteis em termos de constituicionalidade. Através