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Ultimamente direi (e eu já propuz isto em outra assembléa, e foi muito bem recebido), devia estar alli uma ampulheta, e taxar-se a cada Deputado o tempo que devia fallar. Isso tinha muitas conveniencias (Apoiado, apoiado). Porque, permitta-me V. Exca. que eu diga, ha muitos Srs. Deputados que tem uma grande facilidade para fallar, e podem só com uma idéa faze-lo por meia hora; e ha outros cujo estilo é cerrado, e conciso, e com essa idéa não consomem senão o tempo que ella gasta a expor; porém ha uma especie de capricho, em que um discurso appareça muito extenso; que se diga fallou uma hora, fallou tres quartos de hora. Tudo isto se evitava optimamente cpm a taxa do tempo; faziam-se mais concisos, mais fortes, mais comprehensiveis os argumentos; economisava-se o tempo, decidia-se maior numero de questões, e poupava-se, o que era sobre tudo mais attendivel, o capricho dos nobres Oradores, a nenhum ficando desairoso não fallar mais tempo; porque a lei lho prohibia. Vou finalmente a encarar o ultimo argumento, com que se terá querido sustentar a necessidade das leis da dictadura. A anarchia, a incerteza, o estado provisorio, em que se acha tudo por ellas não estarem regularmente postas em execução. Como se ha de remediar a situação lamentavel, em que se acha o reino, se senão sabe a lei que regula? Os magistrados em um julgado julgam por uma, em outros por outras; elles mesmos incertos, do seu destino, e da sua futura promoção, não tem o zelo, que devem; subtrahem-se ao seu dever. Ora, Sr. Presidente, este estado é terrivel; mas quem o promoveu-? Mas, permitta-me V. Exca., em quanto a anarchia, que eu faça uma distincção. De que anarchia se falla da anarchia no direito, ou da anarchia no facto? Da anarchia nas leis, ou da anarchia nas pessoas? Qualifiquemos, qualifiquemos, Sr. Presidente, estas duas anarchias: ahi que vastissimo campo para fallar em ambas ellas? Que espantoso quadro desenharia eu agora, se trouxesse aqui apintura fatal da minha, adorada patria? Poucas palavras direi;* nem a dor me deixa dizer muitas, da anarchia de sangue que cahiu sobre este malfadado paiz.

Sr. Presidente, eu vi Portugal feliz, e hoje vejo-a desgraçado: que contentamento, que docilidade de costumes; e hoje que tristeza, que barbaridade de conducta! Vi Portugal, quando era rico; e vejo-o agora quando é pobre: vi Portugal quando era respeitado, e agora abatido; tenho idade bastante para ter assistido a todas estas épocas. Eu vi um inimigo estrangeiro, orgulhoso com o seu immenso podér, innundar as nossas provincias, a destruição ía na sua vanguarda, parecia que o nome portuguez tinha para sempre descido ao tumulo. Mas que aconteceu! os portuguezes eram então todos filhos de um só pai; unimo-nos, e este poder que tinha aterrado a Europa, foi vencido. A união nos salvou; éramos uma familia só; quem nos resistiria? Ah! e o estado de hoje! Os cidadãos inimigos encarniçados dos cidadãos! assassinando-se sem medida, sem dó!

Muitas vozes: - E' verdade, é verdade.

O Orador: - Mil vezes, Sr. Presidente, mil vezes faço estas considerações; o meu coração não as póde supportar, e na maior desconsolação repito comigo mesmo aquelle bellissimo verso do meu Virgilio:

En que perduxit miseros discordia cives!

Agora se ha, ou não anarchia nas leis, e se uma tem relação com a outra, eu vou sobre isto fazer uma breve analyse. Ainda peço um instante mais a esta nobre assembléa. Eu não sou jurista, sou medico, e ninguem póde esperar de mim uma analyse juridica destas leis. Nem eu quero mostrar senão a incoherencia, antinomia, em fim a anarchia dellas. Comecemos peja reforma judiciaria. Nós tinhamos as nossas leis, ou boas, ou más, ellas iam governando-nos. Eis que apparece a primeira reforma judiciaria trazida no decreto n.º 24 de 16 de Maio de 1832. Apenas, elle começou a pôr-se em execução, entrou a descobrir-se o antagonismo com os nossos antigos costumes, e logo o desgosto geral, não póde resistir á vontade publica, cahiu. Querem as Côrtes de 35 remediar isto, e apresenta-se a segunda reforma judiciaria na lei de 30 d'Abril de 1835 das mesmas Côrtes; bem. Mas apenas esta se ía estabelecendo, e, mal começando a dar á execução, eis que a dictadura actual nos manda terceira reforma judiciaria nos decretos de 29 de Setembro, e 30 de Janeiro ultimo; e contra esta, que mal vai a começar ater execução, já ha infinitas reclamações dos póvos, e que lhe parece? Em pouco virá quarta reforma judiciaria. Mas deixemos a reforma judiciaria, e vamos ás administrativas. Temos a primeira no notavel, e de máo agouro decreto n.º 23 de 16 de Maio de 1832. Era horrivel, cabia; eis apparece outra feita pelas Côrtes, e publicada na lei de 25 d'Abril de 1835. Torna esta mesma lei a gerar outra reforma administrativa no decreto de 18 de Julho de 1835, e ultimamente, como se estas tres não bastassem dentro de tres annos, a actual dictadura nos dá quarta reforma administrativa no seu decreto de 31 de Dezembro de 1836. Ora. Srs., já que estamos neste objecto notemos de passagem esta, idéa, que agora me lembra, e desejo me não esqueça. Era todos estes codigos administrativos, em todos elles ha esta muito recommendavel expressão, este artigo vergonhoso. «Junto de cada provedor (ou como quer que este se chame) haverá uma Camara municipal.» Frase infame! e verdadeiramente injuriosa a estas respeitaveis corporações; corporações veneradas, por nossos antigos monarchas, pais dos povos. Sem duvida estes corpos municipaes respeitados em todas as épocas da nossa historia, que viram nascer a monarchia nos seus braços, ficaram espantados hoje com as suas barbas brancas, quando chegaram á humiliação de serem dominado; por uns tarellos sem talento, e sem consideração. (Riso, e applauso.) Junto a cada provedor uma Camara Municipal!!! Qual é aqui o principal, qual o accessorio? As vezes as frazes são mais injuriosas, que a materia. Segundo os decretos os provedores são a substancia, e as Camaras os adjuntos. Ah, Srs., permitti á minha indignação, esta expressão impropria deste logar: as velhas costumão atar o trambolho á gallinha, e os decretos ataram a gallinha ao trambolho. (Applausos, risadas.) Eis-ahi está o que são estas leis de administração.

Mas, vamos adiante na nossa analyse. Entremos nas divisões do territorio; além dessa incerta do Decreto n.° 24.°, temos na lei de 28 de Fevereiro de 1835 a divisão era ( 120, a 130 julgados: vem o decreto de 7 de Agosto do mesmo anno divide em 133 ditos; e ultimamente o decreto ultimo da dictadura reparte em 351 julgados, e 48 Comarcas; mas que formidavel opposição entram já a mostrar os povos contra tal arranjo? Ora aqui temos em 3, ou 4 annos, 3 ou 4 divisões do territorio. Não tem razão os povo? para dizer: d'aqui a um anno outra? (Apoiado.)

Ora vamos a outro artigo: no- Decreto n.º 24 são admittidos os juizes ordinarios. Depois de uma terrivel batalha nas Côrtes de 35, sahem na lei de 30 de Abril excluidos os juizes ordinarios; e ha muitas portarias a atarracar isto, a esmagar os pobres juizes ordinarios. Louvam-se as Camaras que representaram contra elles, e quem, visse isto, julgava-os mortos para sempre. Eis apparecem na ultima reforma judiciaria de 29 de Novembro, e 30 de Janeiro, ressucitados os juizes ordinarios; parece com tudo que devia haver mais alguma contemplação com a lei feita nas Côrtes. Ora, como Deputado, se esta questão se tornar a tractar, talvez eu concorra com o meu contingente. Eu sei, que as nossas antigas instituições não admittiam outros juizes senão os ordinarios; sei que elles quasi por tres seculos julgaram a nossa patria; mas é porque as leis, que então havia, eram simplicissimas, particulares, quasi municipaes; era com estas leis muito facil administrar-se a justiça com os juizes ordinarios: Elles julgavam com effeito os casos mais simplices, sem soccorro