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dissimo Senhor Bispo da Vizeu, Par do Reino - ( Assignado) Francisco Barroso Pereira.

SESSÃO DE 30 DE JANEIRO.

Ás 9 horas e 45 minutos da manhã, pela chamada, que fez o Sr. Deputado Secretario Ribeiro da Costa, se acharão presentes 88 Srs. Deputados, faltando, alem dos que ainda se não apresentarão 13; a saber: os Srs. Lima Leitão - Marciano d'Azevedo - Leite Pereira - Fortunato Leite - Bettencourt - Trigoso - Isidoro José das Sonetos - Ferreira de Moura - Costa Sampaio - Mouzinho da Silveira - Rebello da Silva - Luiz José Ribeiro - e Gonçalves Ferreira - todos com causa motivada.

Disse o Sr. Presidente que estava aberta a Sessão; e, sendo lida a Acta da Sessão precedente, foi approvada.

Pedio o Sr. Deputado Serpa Machado se lançasse na Act a o seu Voto em separado, que diz = Declaro que na Sessão de hontem fui de voto contrario a todos os Artigos do Projecto de Lei N.° 100, que se discutirão.

Déo conta o Sr. Deputado Secretario Ribeiro da Costa do offerecimento, que á Camara faz Marino Miguel Franzini de 100 Exemplares de uma Memoria com o seguinte Titulo = Ensaio sobre o Orçamento da Divida Publica, Receita, e Despeza do Thesouro do Reino de Portugal no anno de 1836, e Reflexões sobre o deficit, e a Divida existente comparada á d'outras Nações, com o resumo do Estado Pessoal do Exercito, e Marinha, e algumas Considerações sobre objectos de Economia. Mandárão-se repartir.

Ordem do Dia.

O Sr. Presidente: - O objecto da Ordem do Dia he o Artigo 17 do Projecto N.º 100 sobre as Eleições das Camaras, que vai lêr-se. ( Lêo-se ).

O Sr. Gerardo de Sampayo: - Sr. Presidente, eu tive a honra de pertencer á primeira Commissão Central, a que foi apresentado este Projecto de Lei das Camaras; e então na discussão conheci que todos os Illustres Membros, de que ella se compoz, reconhecido que principiavamos por onde deviamos acabar, isto he, que depois da Lei da Divisão dos Territorios, e das outras de Economia Política, e Administrativa deveria ter lugar a sobredicta das Camaras; que por isso na presente tarefa haviamos encontrar immensos embaraços, como de facto tem apparecido; porem que era mais imperiosa a razão de tomarmos uma medida decisiva sobre substituir nos Governos Municipaes pessoas a pessoas, visto que algumas, das que actualmente servem, despejadamente se oppunhão ao progresso do Systema Constitucional; e por isso que se prescindisse daquellas razões, e que se tomasse o expediente de fazer uma Lei de Camaras, que provisoriamente nos regesse a este respeito. Tem apparecido, como ponderei, alguns obstaculos, que produzirão anomalias, e irregularidades, em que tem sido forçoso convir, por nascerem, não da nossa vontade, e falta de applicação de meios, mas sim da natureza das cousas; e com muito sentimento meu me parece que temos um novo entrave neste § 17, que passo a ler (léo). As Camaras continuão provisoriamente a ter as mesmas Attribuições: quer isto dizer que a de Lisboa continuará da mesma maneira, e neste caso temos a seguinte monstruosidade.

Todas as Camaras do Reino ficão administrando, com exclusão das outras Authoridades, o seu Patrimonio Municipal, e a de Lisboa fica privada desta regalia, porque lhe resista o Alvará de 23 de Dezembro de 1773, e o de 3 de Janeiro de 1816, que o confirmou. Ajunta da Fazenda, toda fora da competencia do Senado, e que he composta do Presidente do mesmo, de tres Deputados, tirados, ou dos Ministros Vereadores da Camara, ou dos Procuradores da Cidade, ou de Ministros de outras differentes Corporações, tendo na Mesa assento com voto o Thesoureiro Geral, o Escrivão da Fazenda, e o Contador Geral, e presentemente mais um Deputado extraordinario, creado por Decreto mui posterior a esta Lei. Aclaremos mais esta irregularidade, com o que se observou na execução da Lei das extinctas Cortes de 1822, e então veremos que o Presidente da Camara Constitucional era o Presidente da Junta da Fazenda, e que a Mesa era composta dos tres Vereadores passados, e mais individuos que mencionei, todos alheios dos Membros da citada Camara Constitucional; que o Patrimonio Municipal era administrado por pessoas não Electivas, e em tudo distinctas das que havião sido nomeados para a Municipalidade; finalmente, que esta medida foi reconhecida como irregular, e até irrisoria. Ora: quem na presença desta expozição deixará de reconhecer na doutrina do Artigo, que se está discutindo, uma perfeita anomalia, assim como de que, segundo o ponderado, não estão substituidas pessoas a pessoas, porque por um lado acabão os Vereadores da Camara passada, e por outro vem renascer na Junta da Fazenda, que tracta de attribuições pertencentes á Camara Electiva, para cuja creação organisâmos a presente Lei? Srs., o remedio está em se mandar o Artigo á Commissão, para que o emende no seguinte sentido: = Ficão de nenhum effeito os citados Alvarás de 1773, e 1816: a Junta da Fazenda será regida pela Camara Constitucional; o Thesoureiro Geral, o Escrivão, e Contador Geral conservarão os seus Empregos, e Ordenados, e deixarão de ter voto em Mesa; e o Deputado extraordinario, creado por Decreto posterior, ficará aposentado, conservados os seus Ordenados. De outra maneira terá, a meu ver, a Lei mais um defeito entre muitos, que nella apparecem.

O Sr. Cordeiro: - Eu creio que este Artigo não deve ir á Commissão para ser redigido de outra maneira, nem tão pouco deve ser approvado: julgo que; deve ser supprimido, porque está destacado do seu lugar competente. Nós já temos um Projecto de Regulamento Interno das Camaras; e nelle se ha de determinar quaes são suas Attribuições.

Na conformidade da Carta pertence ás Camaras o Governo Economico, e Municipal, e não podemos duvidar que pertence á Economia das Camaras a Administração de seus Fundos: por conseguinte digo que no Regimento das mesmos he que pertence tractar este Negocio; e he natural que este Projecto de Regimento não tarde a ser discutido nesta Camara, e então troctaremos de desenvolver aquella disposição da Carta.

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Sou por tanto de parecer que se supprima este Artigo.

O Sr. Soares Franco: - Eu sou de opinião differente á do Illustre Deputado. Um dos Principios mais principaes, e mais sabios, estabelecidos pelo Supremo Legislador da Carta, he esta grande base de separar o administrar do julgar; uma cousa he administrar, outra cousa he julgar, são cousas absolutamente distinctas; e um dos maiores males de Portugal tem sido o andarem accumulados, e confundidos até agora nas mesmas pessoas. O contencioso não pode competir daqui em diante ás Camaras. Conhecião até aqui dos injurias verbaes; destruião por uma simples vistoria quaesquer Obras, que os Particulares fizessem, quando se persuadião que se usurpavão terrenos do Concelho. Depois da Carta he impossivel que tenhão taes attribuições.- A questão seria, se deve já declarar-se nesta Lei que as não tem, ou esperar-se para quando se fizer o seu Regimento. Estou que se faça já, porque em quanto mais Artigos podermos executar a Carta, tanto melhor. Demais: segundo o Artigo 134, o Vereador, que tiver maior numero de votos, he o Presidente. Aqui temos já os Juizos de Fora excluidos da Presidencia das Camaras; para irmos coherentes convem que separemos tambem delles o que fôr contencioso. Approvo em consequencia o Artigo.

O Sr. F. J. Maya: - Eu sigo a opinião do meu honrado Collega o Sr. Cordeiro, repelindo que o Projecto em discussão tem só em vista o determinado no Artigo 134 da Carta, e não o Regimento, ou a Lei Regulamentar, que exige o Artigo 135. A nossa intenção he dar ás Camaras já a sua natureza primitiva de serem electivas; natureza, que a Carta Constitucional manda guardar: o Corpo Legislativo, não podendo fazer as Leis simultaneamente, he forçoso que faça umas depois das outras; e não se pode entender que, deixando as Camaras, quanto ás suas attribuições, no mesmo estado, em que actualmente se achão, se offende a Carta, ou se obra contra ella, pois isso nasce somente da impossibilidade absoluta de se providenciar este objecto agora. Se quizessemos tractar delle ficaria nulla a urgencia, que se dêo a esta Lei. Voto portanto que o Artigo se supprima, pois que, não dizendo a Lei nada a respeito das attribuições das Camaras, mesmo da de Lisboa, segue-se que ficão inteiramente nesta parte como estão, até que saia o Regimento respectivo.

O Sr. Magalhães: - Todos os Illustres Deputados, que tem fallado contra este Projecto de Lei, não se esquecem de dizer que elle he um Monstro, cheio de anomalias, e contradicções; mas, por uma fatal contradicção, dizem que o que já está sanccionado não deve assim caracterisar-se, porque em fim a Camara resolvêo. Eu respeito muito as decisões da Camara: sempre na maioria supponho o maior saber; porem não he quando a mesma Assembléa confessa que a sua decisão não he exacta, como acontecéo quando se sanccionou que em umas terras se procedeste a novo methodo de Eleição, e em outras continuassem as Camaras a ser eleitas, como até aqui. Isto posto, concluo eu que os Senhores, que pertendem que se supprima o Artigo, o que desejão he que a Lei vá de anomalia em anomalia, de monstruosidade em monstruosidade; porque assim mais facil será conseguirem o seu primeiro fim. Mas não he isto mesmo uma contradicção?

Se se supprimir o Artigo, segue-se que as Camaras continuarão a reger-se pelo actual Regimento; e como expressamente se lhes não tira a parte contenciosa, que ficarão exercendo, podem ellas fazê-lo sem o Presidente Letrado, e sem os elementos, que anteriormente tinhão? Isto he o cumulo das anomalias: e então se lhes tirarmos a parte Judicial, segue-se que já tem uma anomalia de menos; e qual he melhor, diminuir-lhas, ou augmentar-lhas? Era forçoso collocar este Artigo depois de se ler já approvado o modo, por que os Vereadores hão de votar. Convinha dizer-lhes os objectos, sobre que devem exercitar este direito. O Artigo nada tem com a parte administrativa: e para isso bastará ler o seu primeiro enunciado, que diz = as mesmas Attribuições, que actualmente tem, á excepção.... = e então segue-se que o Senado de Lisboa continuará a conservar a sua Junta de Fazenda, em quanto providencias ulteriores não ultimarem esta obra. - Senhores, tudo tem principio; e este não he tão monstruoso, como o querem suppôr. O Sr. Soares Franco expoz tão judiciosamente o que pode dizer-se, que era vista das suas razões, e das que eu mesmo acabei de referir, voto pelo Artigo tal, como está redigido.

O Sr. Cordeiro: - O que disse o Sr. Gerardo de Sampayo he muito exacto: o Alvará de 23 de Dezembro de 1773 creou uma Junta para a arrecadação, e administração da Fazenda do Senado; ficando assim separada a administração, arrecadação, e distribuição da Fazenda da Cidade da Mesa da Vereação; e dão a esta Junta umas Instrucções. Desta Junta era Presidente o do Senado; tinha tres Deputados, porem havião ser nomeados por ElRei = quaes Eu Houver por bem nomear, ou dos Vereadores, ou dos Procuradores da Cidade, ou Ministros de outras Corporações: = alem destes havião tres Deputados natos; o Thesoureiro; o Escrivão da Fazenda; e o Contador. Por tanto esta Junta formava uma Repartição distincta do Senado.
O Alvará de 3 de Janeiro de 1816 instaurou aquella Junta, e nomeou dous Deputados dos Vereadores, fazendo nomeação determinada de pessoas; e para terceiro Deputado nomeou o Contador da Contadoria das Provincias, e Ilhas, e encarregou á mesma pessoa a Inspecção da Contadoria. Temos por tanto uma Junta composta dos referidos Deputados, e dos tres natos; temos uma Contadoria, e o seu respectivo Inspector; e nestes termos já se vê quantos embaraços se levantão para poder passar um Artigo, que não attendéo a nada disto, nem podia attender, porque este Projecto he das Eleições. Em conclusão: a materia, que ponderou o Sr. Gerardo de Sampaio, e que fica exposta, vem toda em auxilio da minha opinião, que não se deve aqui tractar de Attribuições das Camaras, e principalmente do Senado de Lisboa, e que tudo se deve reservar para o Regimento Interno das Camaras.

O Sr. Serpa Machado: - Eu approvo a primeira parte do Artigo, por ser conforme á Carta; que as Camaras não tenhão Attribuições Judiciarias; mas não me posso accommodar o que os Municipalidades fiquem com o mesmo: Regimento, que he o que se deduz do Artigo nesta Lei, de que ora tractâmos. No-

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tão-se nelle duas grandes irregularidades; a primeira, que hajão Camaras organisadas como a Carta manda, e outras formadas pelo modo antigo; (mas a Assembléa sanccionou este principio, agora deve sustenta-lo): e a segunda he continuarem as novas Camaras a ser governadas por esta Legislação, que existe, de que se segue a anomalia apontada, isto he, o ficar a Camara de Lisboa sem poder administrar, os seus Fundos, o que he contradictorio com a disposição da Carta, pela qual todas as Attribuições Economicas devem pertencer ás Camaras. Em consequencia: a minha opinião he que, em conformidade da mesma Carta, se faça o Regimento das Camaras, do qual hão de resultar as suas Attribuições, attendendo a que sempre nos havemos de ver embaraçados sem esta antecipada providencia, e talvez obrigados a fazermos novas Leis declaratorias; pois não he possivel, por assim dizer, que um Navio ande bem sem velas, nem uma Carroagem com rodas de Carro; e continuará, este Projecto a ser o symbolo do Monstro de Horacio.

O Sr. Girão: - Sr. Presidente he um principio admittido hoje em todas as Sciencias, que um simples facto bem observado destroe perfeitamente as mais brilhantes theorias. Ora: applicando isto á questão presente, digo que existe o facto de ter já havido Camaras Constitucionaes: o ensaio foi pequeno; mas a pezar de faltar o Regimento á Camara, que então houve nesta Capital; a pezar dos grandes embaraços ponderados nesta discussão, ella se portou tão bem, que merece eternos elogios; nunca a Cidade andou tão bem policiada como no seu tempo; nunca se tomarão melhores providencias para a Saude Publica; nunca se vio tanto desinteresse, e tanto Amor da Patria. Em fim; foi esta Camara, que em 1923 salvou da anarchia esta Capital. Este facto he verdadeiro; e á vista delle cahem par terra as theorias em contrario. A mim, não me seduzem, nem seduzirão a quem o tomar em consideração. Voto pois pelo Artigo como está.

O Sr. Serpa Machado: - Pode-se comparar a organisação das Camaras actuaes com a organisação das Camaras, que se fizerão em outro tempo? Não de certo. As actuaes devem ser organisadas conforme o regimen da Carta; e poderão estas parecer-se com as de outro tempo, em que se lhes podião dar todas as Attribuições, que parecessem convenientes? Apesar disto o Illustre Preopinonte fez só menção da Camara de Lisboa, para exemplo; quando se tracta em geral não pode ser admittido para argumento um caso particular: eu falto de todas, em todas as partes houve grandes irregularidades; se a de Lisboa, foi boa, houve outras, d'onde não surtirão bons effeitos, especialmente pela parte que pertence a Recrutamento: a factos responde-se tambem com fatos. Portanto parece-me que não podemos esperar grandes melhoramentos, sem mudar primeiro de Regimento. Que resultou da mudança das Attribuições dos Capitães Moves para as Camaras? Que resultado houve? Foi cometterem-se ainda maiores irregularidades do que comettião os mesmos Capitães Mores.

Julgada a materia suficientemente discutida, propoz o Sr. Presidente - 1.º Se deveria Supprimir-se o Artigo, ficando reservada a sua materia para se tractar no respectivo Regimento das Camaras? E se vencêo negativamente. - 2.° Se se approvava a materia do Artigo, salva a Emenda, ou a excepção proposta pelo Sr. Gerardo de Sampaio, a respeito do Senado de Lisboa? E foi approvada. - 3.° Se se approva que se faça, alguma declaração a respeito da Camara de Lisboa? E se vencêo que não.

Passou-se ao Artigo 18.

O Sr. Pedra Paulo: - A primeira parte do Artigo 18 se comprehende nestas palavras (lêo). Esta primeira parte tem uma regra, e uma limitação. A regra he = Os actuaes Vereadores da Camara de Lisboa continuarão a vencer os seus Ordenados, marcados por Lei =. Limitação = até serem competentemente empregados, ou aposentados = Approvo a regra, supprimindo-se as palavras = marcados por Lei = porque estas palavras, ou se hão de referir á Lei presente, ou a uma Lei futura: se se referem á Lei presente são inuteis, e he certo que as Leia não devem contei uma só palavra inutil: se se referem a uma Lei futura, não as posso admittir, porque sou de opinião que, se houvesse de estabelecer-se uma Lei sobre este objecto, não devia consignar aos actuaes Vereadores de Lisboa nem maior, nem menor Ordenado que o que actualmente tem. Não maior, porque formadas as Camaras Constitucionaes não servem os seus Empregos: não menor, porque o Cidadão, que occupa um Emprego vitalicio, deve por toda a vida conservar o Ordenado, que lhe foi assignado, uma vez que delle se não faz indigno, ainda que o Bem público peça que o Emprego se supprima, ou que se lhe dê uma nova forma, em razão da qual fique deste privado, porisso que parece ter adquirido Direito ao Ordenado: trabalhou, e quer continuar a promover o bem do Estado com os seus serviços.

Em quanto á limitação, acho alguma obscuridade nestas palavras = competentemente empregados = Se os Illustres Membros da Commissão quizerão dar a entender pelas dietas palavras que os actuaes Vereadores de Lisboa devem vencer os seus Ordenados até occuparem algum Emprego com Ordenado igual, sou da mesma opinião: mas he necessario que isto seja explicitamente declarado: se tiverão porem em vista cousa differente, opponho-me pelas razões, que deixa expostas. Não approva tambem a palavra = aposentados = sem se lhe fazer algum accrescentamento, porque os Empregados Publicos podem ser aposentados com a metade do Ordenado. A vista do exposto sou de parecer que a primeira parte do Artigo deve ser emendada do seguinte modo = Os actuaes Vereadores da Camara de Lisboa continuarão a vencer seus Ordenados até serem empregados, ou aposentados com Ordenado igual ao que actualmente tem.

Ainda insisto na Emenda, que fiz ao Artigo, de se deveram supprimir as palavras = marcados por Lei = E tem razão diz o Sr. Tavares que esta minha Emenda pode dar occasião a abusos; e que para os evitar be que a Commissão poz no Artigo as palavras = marcadas por Lei = Isto não he assim; porque se os Ordenados dos actuaes Vereadores de Lisboa estão marcados por Lei, como poderá haver abusos, como poderá haver arbitrariedades? Eu disse que se supprimão por serem superfluas, ou se refirão á Lei presente, ou a uma Lei futura. Agora para o Sr. Tavares entrar nas minhas intenções he necessario faltar com mais clareza. Se eu propuz que se supprimão as palavras = marcados por Lei = isto foi por me lembear, ou recear que para o futuro se poderia consi-

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gnar por Lei aos actuaes Vereadores de Lisboa menor Ordenado, que o que agora tem. Estou persuadido, Senhores, torno a repetir, que o Cidadão, que uma vez occupou um Emprego vitalício, adquirio Direito ao Ordenado do mesmo Emprego estabelecido por Lei. Se a utilidade pública pede que se supprima, elle deve supprimir-se, mas o que o occupou deve vencer o Ordenado. Reconheço que esta doutrina não he fundada nos princípios de rigorosa Justiça, mas ninguem poderá duvidar que he muito conforme á equidade, e ás deliberações desta Camara; devem sim ser dictadas pela Justiça, mas temperadas pela equidade. A Senhora Infanta Regente antes de se reunirem as Côrtes se conformou com estes princípios de equidade. Os Ministros da extincta Inquisição requerérão os seus Ordenados: mandou consultar o Conselho da Fazenda, e conformando-se com á Consulta resolvêo que se lhes pagassem por inteiro os seus Ordenados.

O Sr. Cordeiro: - Os Vereadores pelas ultimas Leis do Reino tem ordenados vitalicios; o Presidente da Camara de Lisboa tambem; o Thesoureiro he um rigoroso Officio, igualmente que o de Procurador. Alguns desses Officios vem de sua remotíssima posteridade, á qual forão concedidos em remuneração de serviços feitos á Patria, e esta materia tem sido sempre objecto de grande discussão. A doutrina do Sr. Gerardo de Sampaio he plenamente verdadeira; além destes ordenados, tem estes Empregados ordinarias, e propinas certas que tem a consideração de ordenados, porque de tudo pagão Novos Direitos. A Lei he que ninguem seja mettido em folha, sem ter Carta, e ninguem possa ter Carta, sem ter pago os Novos Direitos. Por consequencia: a melhor regra de Justiça, que se póde dar, he que lhes sejão conservados; e direi até que he uma Lei de rigorosa obrigação, por que assim como pagárão o Direito á Fazenda Publica, assim esta tem obrigação de garantir-lhes aquelle pagamento; de outro modo ficarão estas partes muito prejudicadas. Já aqui passou o Projecto para se darem aos Creados da Casa Real, que ficarem fóra dos seus lugares, os ordenados que vencião; e não sendo estes uns Proprietarios, como aquelles. Sobre a Propriedade dos Officios ha muitas reflexões a fazer. A Lei de 22 de Dezembro de 1761, fallando dos Officios de Fazenda diz: = deverão reputar-se meras serventias triennaes, ou vitalícias, sempre amovíveis ao Meu Real Arbítrio = Porém seja-me licito fazer esta reflexão: seria esta disposição verdadeiramente justa, ou seria filha do pleno poder? Se eu entrasse na analyse da Ordenação a este respeito, acharia que se fundou em princípios de justiça, pois a Ordenação no Livro 1.°, Titulo 99, expressamente declara, que os Empregados poderião ser removidos = quando em nossa consciencia nos constar, que abusarão do seu exercício, distrahindo nossa fazenda etc.; e conclúe dizendo = sem por isso lhe sermos obrigados no fôro da consciencia, como no da justiça. A Ordenação por tanto faz uma disposição de Justiça, e a das Leis posteriores, fazendo depender o exercício do Empregado do Real Arbitrio, he puramente effeito do Pleno Poder. Devendo portanto dizer francamente a minha opinião, digo que prefiro a disposição da Ordenação, pois de outra forma a independencia dos Empregados, a certeza de que não hão de ser removidos por arbitrio, se não que hão de ser conservados, em quanto servirem bem, he a causa principal do seu bom serviço, porque contão com uma subsistencia para si, e para suas famílias. Pelo contrario as Leis fundadas no arbítrio nesta parte fazem que os Empregados pensem na sua sorte futura, e que tractem de ficar independentes, se algum dia são removidos. Applicando isto no caso presente digo, que não só devemos conservar a estes Empregados seus ordenados, se não tambem as outras ordinarias, e mais rendimentos, que constituião sua subsistencia, porque tudo constituía a totalidade do Officio. Estes Officios forão concedidos como remunerações, e estas remunerações estão garantidas na Carta. Não se diga, Senhores, que desta Camara sahe uma disposição menos conforme com os princípios de Justiça, ou que possa produzir descontentamento. Minha opinião he, que aos Empregados que são Proprietarios de Officios encartados se lhe conserve o mesmo pagamento que actualmente tem: deste modo poderão ficar contentes, porem mal se pode conceber que fique contente aquelle a quem, tendo 600$ reis de renda, se lhe conservão só 200$. A primeira regra de Justiça he conservar a estes Empregados, que são Proprietarios dos Officios, todo o rendimento que tinhão, seja fixo, seja eventual, conforme as Leis; e quando esta não seja a opinião da Camara, então conserve-se-lhes pelo menos o ordenado, e ordinarias de que tiverem pago Novos Direitos, e nesta conformidade mandarei a minha emenda para a Mesa.

O Sr. Miranda: - Eu approvo o Parecer da Commissão tal qual está; e não posso admittir que se concedão aos Empregados Publicos, quando ficão sem os seus Empregos, aquellas propinas, e emolumentos, que recebião pelo trabalho, e exercício dos mesmos Empregos. He esta a primeira occasião em que se tracta de Reformas d'esta natureza; e, se agora se estabelecer o principio proposto, a Camara ha de necessariamente vêr-se embaraçada para o futuro. He necessario não perdermos de vista os princípios de Justiça, mas tambem he necessario attendermos ao estado da Fazenda. Nós temos um deficit de seis milhões; e se uma vez admittirmos este, e outros taes princípios de dilapidação, será impossível fazer face aos gastos públicos.

Disse-se, que isto produzirá um grande descontentamento na Nação; eu julgo o contrario. O modo de contentar a Nação he pagar pontualmente aos Empregados, o que não será possível se a Administração se não regular pelas regras de mais bem entendida economia. Os abusos do tempo do Governo absoluto he o que tem conduzido a Nação ao abysmo, em que se acha, e o que nos põem na necessidade de procedermos a algumas Reformas; porém se continuassemos seguindo as maximas arbitrarias de um Governo essencialmente dilapidador, concedendo aos desempregados não só os seus ordenados por inteiro, sem attenção á grandeza d'elles, e ao tempo de serviço, mas tambem uma addição equivalente ás propinas, emolumentos e precalços, que por seu exercício recebião, chamar-se-ha Reforma justa e necessaria um tal modo de proceder? Não será antes um novo abuso involvido em especiosas apparencias de equidade? Por mim o digo, eu já mais concordarei em taes principias. Voltando porém ao caso particular, que se acha em questão, declaro que eu não me acho informado ácerca dos Ordenados propriamente dictos dos Mem-

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bros da Camara desta Cidade, persuado-me que muitos dos meus Collegas estão no mesmo caso, e que em geral a Camara não tem n'esta materia os dados necessarios para decidir com conhecimento de causa; quizera portanto que, antes de tomar decisão alguma, se pedissem ao Governo as Informações necessarias. Em fim eu voto plenamente pelo Artigo tal qual está redigido; mas, torno a repetir, desejaria que para tomar a Camara uma resolução acertada se pedissem ao Governo as informações necessarias, tanto a respeito dos Ordenados, que por Lei competem aos Membros do Senado da Camara desta Cidade, como da qualidade, e quantidade das propinas e emolumentos, que por costume ou por Leis, e Resoluções particulares se achão estabelecidas.

O Sr. Leomil: - O Sr. Cordeiro segundo os princípios da nossa Legislação não só quer a continuação de Ordenados, senão a dos emolumentos, e foi buscar a razão em não produzir descontentamento. Eu bem sei que as melhores Leis serião aquellas, que contentassem a todos, mas he impossível que a Lei deixe de descontentar a alguns, para contentar a maior parte; porem o que deve fazer-se, he o que seja justo e agrade, ou não agrade. Debaixo d'estes princípios, vejo que a Carta, que he uma Lei superior a todas as Leis, fazendo effectivo este emprego de Vereador, não fez senão mudar a forma do emprego, dizendo que d'esde agora fosse feito por Eleição. A Carta diz (lêo ). Ninguem combinou melhor os princípios de Justiça, do que a Carta, a qual garantio não só a Propriedade, mas até o Direito de recompensas pelos serviços feitos ao Estado, Pela Carta he forçoso que estes lugares, que até agora erão vitalicios, passem a ser electivos; mas he tambem, forçoso que estes Empregados a quem a Lei tinha dado os seus Empregos, talvez em recompensa de serviços, continuem a ter os Ordenados dos mesmos Empregos no emtanto que estes durarem!! Eu não sei, Sr. Presidente, como possa separar-se o Ordenado do Emprego. Só se admittirmos que o Ordenado foi creado para as pessoas, e não para os Empregos, mas p Ordenado he dado ao Emprego. Nós havemos de conservar este Direito, quando a causa acabou? Uma, cousa he Direito de recompensar, e outra cousa he o Direito a receber Ordenado pelo Emprego, que se teve. O Ordenado acabou com o Emprego, o que fica ao Empregado he o Direito á recompensa pelos serviços, que fez se acaso, os fez, o que se ignora; mas seria materia de outra discussão o saber-se qual recompensa se lhes devia dar. Quanto ao mais, ninguem negará que os Empregos por sua mesma natureza não constituem Propriedade. Para o mais sou da opinião do Sr. Miranda, que temos de precisar esclarecimento do Governo, porque, não sabemos como, isso foi concedido, e deixemo-nos de ter em vista, só o contentar alguns. A Justiça universal he, a base do Legislador. Não vamos sobrecarregar o Thesouro com Impostos, e Ordenados, porque então, nem quantos Emprestimos se facão bastarão.

O Sr. Tavares de Carvalho: - Para nós, sermos, justos, he necessario que sejamos iguaes, pois não sei que possa haver justiça sem igualdade. Pelos mesmos principios de justiça, que se sustenta o Ordenado do Procurador, e Vereadores, se deve sustentar o do presidente, e Thesoureiro; se os Vereadores, e Procurador fica o Ordenado por serem vitalicioe, e ser necessario respeitar os direitos adquiridos, a mesma razão procede para com o Presidente, e Thesoureiro; e por isso seriamos injustos, se igualmente os não oomprehendessemos no Artigo. Eu não posso apoiar a opinião do Sr. Deputado Pedro Paulo que quiz se eliminassem do Artigo as palavras: - Ordenados marcados na Lei; - porque Ordenados, sem estarem designados na Lei, não entendo eu senão os que se recebem por corrupção, e inveterados abusos, em que desgraçadamente está montada uma grande parte de nossa administração. Se o Sr. Pedro Paulo não entende isto assim, não posso perceber onde vai o afinco em querer supprimir no Artigo as palavras = Ordenados marcados na Lei. =

O Sr. Serpa Machado: - Eu tenho muito presentes as idéas de um Sabio Escriptor do nosso Seculo muito conhecido: diz elle, e diz a verdade: que quando se supprime um Emprego, quando o Empregado he privado de um Ordenado, a reforma pesa toda sobre elle, e o bem que recebe a Sociedade, repartindo-se entre todos os que a compõem, não tem comparação alguma com o mal, que áquelle resulta; e estabelece solidamente pela mesma razão, que o Legislador deve indemnisar neste caso ao Empregado. Estes princípios são tão exactos, que he impossível deixar de convir n'elles. Mas não he este o ponto da dúvida; a dúvida he se a estes Empregados se deve conservar o Ordenado, ou tudo aquillo que constitue seu rendimento? Porem se o principio he justo para uma cousa, não pode deixar de o ser para o resto. Se estabelecemos como regra, que he necessaria uma indemnisação completa, precisamos ter consideração não só com o Ordenado, mas com tudo o que constituía os rendimentos que percebião estes Empregados. A unica, reforma, que se pode fazer a bem da Fazenda, he que estas Empregos que erão perpetuos, e que, por dize-lo assim, estavão consignados nas famílias, cessem, quando morrerem estes Empregados. A minha opinião, e talvez venha a ser a desta Camara, ha que quando se tracte de indemnisações devem ser completas. O calcular donde devem subir estas indemniisações he objecto de mais vagar. Na verdade: em materia tão ponderosa eu tambem quereria que se pedissem ao Governo esclarecimentos sobre este objecto, assim como em todas aquellas de igual gravidade; mas já que a Camara, pela urgencia desta Lei, os não pedio, o meu voto he o que deixo emittido. Reprovo por tanto a doutrina do Artigo, como insufficiente, e acho que alem dos Ordenados se deve dar aos Empregados tudo. quanto elles recebião.

O Sr. Camello Fortes: - Não fazia tenção de fallar sobre este Artigo do Projecto em questão; mas tem-se pertendido dar tanta extensão á doutrina nelle conteuda, que julguei, do meu dever expôr os meus sentimentos. A Commissão no Projecto conservou os Ordenados, aos Empregados cujos Lugares se supprimem; e alguns Srs. Deputados tem querido extender mais esta medida, pertendendo que fiquem tambem vencendo os Emolumentos, Propinas, e Ordinarias. Eu bem quereria que as nossas circunstancias fossem taes, que a tudo o mencionado se podesssem extender as medidas de equidade; não sendo porem isto possivel, he forçoso seguir um meio termo, e sou de parecer que ha de toda a equidade que se lhes conservem os Ordenados, mas não os Emolumentos, etc.

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Não tractarei, para sustentar a minha opinião, dos differentes lugares da Ordenação, a que se tem recorrido; pois esta Legislação doi posteriormente alterada por um aLei do Sr. D. José, que determina que os Officios são propriedade da Corôa; e que abolio o chamado Direito Consuetudinario, pelo qual os Officios de Propriedade passavão dos Filhos; e declarou que, se o Rei por bem do Estado os supprimisse, não era a Corôa obrigada a remineração alguma, d'onde se segue que a conservação dos Ordenados aos Empregados dos Officios extinctos não he de rigorosa justiça, mas he de toda a equidade que não morrão talvez de fome, deixando de os servir involuntariamente. He verdade que aquella Lei manda indemnisar os Filhos dos Proprietarios, que ficão privados dos Officios de seus Pais; mas isto he só de preterito, e não de futuro, o que prova que tal indemnisação não he de rigorosa justiça. Accresce que as Cartas, pelas quaes se confere algum Officio, trazem a clausula = em quanto Eu o Houver por bem. = ou outra semelhante; acceitárão-os pois com esta condição; faltando esta, não tem de que se queixar.

Não pode porem esta equidade extender-se aos Emolumentos, por quanto para se perceberem esses Emolumentos, he necessario servir o Officio; tanto assim que, se o Desembargador, por exemplo, estiver impedido por doença para servir, não os percebe, e os adquire o Serventuario; se fôr aposentado percebe o Ordenado, mas não os Emolumentos: se os Empregados extinctos os Empregos, os não servem, como hão de receber os Emolumentos? Recebendo ss Ordenados tem a sua subsistencia salva; logo, que mais he necessario? Accresce que, extinctos os Officios, é Empregos, ficão desembaraçados os Empregados para se applicarem a outro genero de Vida lucrativo, que talvez equivalha, ou exceda os Emolumentos. De mais: a liquidação destes Emolumentos he muito incerta; e he provavel que, admittida ella, se faça por um modo mui lesivo á Fazenda Nacional. Ultimamente não me parece razoavel dar por este modo um exemplo tão prejudicial, é oneroso, que em regra nunca houve. Allega-se que os Empregados pagárão novos Direitos; porem isso nada obsta, por quanto os pagarão em relação ao Ordenado, e1" não aos Emolumentos; ficão assás compensados com os licros do tempo, que servirão, e não lhes dão a perpeuidade do Emprego.

O Sr. Cordeiro: - Tenho de responder aos Srs. Deputados, que combatêrão a minha opinião. O Sr. Miranda recorrêo a argumentos de economias, e faltas de meios para supprir mais estas despezas, trazendo á lembrança o deficit do thesouro; porem deve attender-se que as despezas do Senado são pagas de seus proprios fundos, e não pelo thesouro Publico. Os abusos do poder absoluto, de que elle fallou, não vem para o caso; abusos tem havido em todos os tempos, e quando menos se podião esperar; e abusos hão de haver mais, ou menos em quanto houverem homens; o seu argumento foi tão vago a este respeito, que eu não entendo a applicação, e relação, que elle tinha ao objecto, de que se tracta. Pelo que respeita ao fundamento politico, que eu adoptei, o Sr. Miranda não o refutou; porem eu convido a sua attenção para o quadro de uma epoca, em que por acontecimentos analogos se suscitou na Nação uma grande desconfiança, de que ainda hoje se aproveitão os inimigos das Instituições, que felizmente nos regem, para illudirem os menos apercebidos. Não se olhe a questão com referencia a estes Empregados, olhemos para longe, e attenda-se que todos os Empregados da Nação estão á lerta para vêr a sorte das primeiras reformas. Não façâmos portanto descontentes, que bastantes se tem apartado da justa Causam, que abraçamos, e muitos tem sido enganados com as idêas de incerteza, e desconfiança. Concordo com o Sr. Miranda que se peção esclarecimentos sobre os Vencimentos dos Empregados do Senado; deste modo se obterá um conhecimento de causa, e sobre elle he que pode fazer-se Justiça; então verá a Camara que um dos procuradores da Cidade paga de seu officio uma pensão de dous terços do seu ordenado; então se conhecerá a causa, e origem desta Pensão, e d'ahi resultará que a differença de causas deve produzir differença de effeitos. O Sr. Leomil principiou, segundo eu entendo, a produzir reflexões, que vinhão em meu auxilio; porem depois divagou, de sorte que não me foi possivel seguir o fio da sua demonstração; entendi somente que elle argui os argumentos, que eu ponderei pela Propriedade dos officios.

Convenho que os Officios não são Propriedade do cada um, do mesmo modo que os bens foi mão aquella differença na Sociedade do meu, e do teu. Quando me expliquei pela palavra Propriedade, e todas as vezes que d'ella me servir deve entender-se que a tomo no meu sentido legal, em contraposição de serventia temporaria. Depois das Leis, que declararão extincta a chamada Propriedade dos Officios, ainda se continuou à denominar Propriedade o exercício delles, porem no verdadeiro sentido de Serventias Vitalícias: nestas ha uma Carta, e nas Serventias temporarias ha somente um Provimento por tempo certo, que se reforma.

A vista desta explicação já se vê que não procedem os argumentos, que o Sr. Leomil expendêo, se he a idèa, que se lhe apresentou, do sentido, em que eu tomei a palavra Propriedade. - O Sr. Leomil concluio que aos Empregados do Senado não se lhes deve Continuar vencimento algum, porque elles tem unicamente o direito de pedir recompensa; confundio portanto a indemnisação, de que já temos exemplo na Lei, que passou nesta Camara, com as recompensas de Serviços feitos ao Estado, de que tracta o §. 11 do Artigo 75. Esta conclusão he tão desagradavel, que eu me julgo dispensado de a combatem.

O Sr. Tavares de Carvalho, segundo entendi, argue-me de que pela minha opinião se consagrarão os abusos á sombra dos Ordenados; parece-me que não me fez justiça. A minha Proposição, e Emenda tracta dos rendimentos legaes, e não se pode chamar abuso áquíllo, que fôr legal.

O Sr. Camello Fortes confudio emolumentos com aquelles rendimentos , que eu igualei aos Ordenados, e nãó advertio que emolumentos são pagos pelas Partes, e os Ordenados, é mais vencimentos dos Empregados do Senado são pagos pelo Cofre dos seus proprios fundos. A Lei, de que fallou o Sr. Camello, he o de 23 de Novembro de 1770, que extinguio o Direito dhamado Consuetudinario, que se fundava na supposta Propriedade, que fazia transmissível aos filhos ipso jure os Officios, que tinhão servido os Pais;

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potrm esta Lei faz a differença de Officios Vitalícios, e portento aquelles Officios, que são vitalicios, correspondem ao sentido de uma Propriedade bem entendida, como já expliquei, quando respondi aos argumentos ao Sr. Leomil
A mesma Lei, que estinguio esse Direito Consuetudinario, estabelecêo a regra de serem consultados os filhos dos chamados Proprietarios, uma vez que tenhâo os requisitos de idoneidade pessoal. A mesma Lei mandou contemplar os filhos daquelles, que tenhão Officios comprados, attendendo ao justo motivo da boa fé, com que forão praticadas essas compras. Esta mesma Lei, finalmente, no § ultimo veio aclarar aquella disposição da Lei de 22 de Dezembro de 1761 sobre a remoção, ao Real Arbítrio, declarando que consistia em remover os Empregados independente de Processos ordinarios, e só pelo Real Arbitrio, em caso de prevaricarem nos seus exercícios: e neste sentido me parece que, não prevaricando estes, he de Justiça conservar-lhes o rendimento dos Officios, de que tem Serventia Vitalícia, porque esta mercê constitue um Direito adquirido.
O Sr. Cammello Fortes distingue a Equidade da Justiça. Este distincção academica pouco influe para o exito dos meus argumentos. A Justiça rigorosamente tal refere-se ao exercício das obrigações, que interessão os Direitos perfeitos dos outros; e a equidade aos imperfeitos; aquella chama-se obrigação, e esta virtude, se a virtude não he obrigação de Justiça rigorosa, pelo menos. Praza a Deos que, quando nós não podermos ser rigorosamente justos, sejamos verdadeiramente virtuosos, desempenhando a prática da equidade. Resta-me porem ainda um escrupulo na distincção de Virtude, ou Equidade, e Justiça, e vem a ser: suppondo que um dos Officios do Senado foi concedido em remuneração de Serviços, e sendo esta recompensa determinada, e graduada no seu rendimento vitalício, e garantindo a Carta estas recompensas, se será Justiça agora conservar a totalidade do rendimento, que constituía a recompensa, ou será Equidade deixar-lhe uma terça parte somente? As theorias de Direito stricto, e de Equidade, que se aprendem na Universidade, nem sempre suo applicaveis nas differentes occorrencias da Vida Social; e ás vezes aquillo, que os DD. chamão Equidade, e Virtude, a Política, e o Bem do Estado chama-lhe Justiça, e necessidade imperiosa. Estou portanto firme na minha opinião, e insto pelos esclarecimentos.

O Sr. Serpa Machado: - Pouco tenho que accrescentar ao que acabou de expôr o Sr. Cordeiro; direi com tudo, que eu não confundo as indemnisações, que proponho, com as indemnizações perpetuas, ou as que forão concedidas por titulo oneroso. Não se trata desta questão: a questão he das indemnisações vitalícias daquelles Empregados, cujos empregos seja necessario supprimir-se. Disse-se: mas as reformas então não são uteis, porque vão onerar as rendas publicas. Isto he huma equivocação; o meio de as tornar uteis he collocar a esses mesmos Empregados em outros empregos, huma vez que elles sejão capazes de os desempenhar, e assim cessa esse onus do Thesouro; além desta economia ha outra, e he que, logo que a natureza os priva da Sociedade, vem a lucrar o Thesouro o que tinha de tirar-se d'elle para o pagamento dos ditos Empregados. Portanto a minha opinião he que,
se he justa a indemnisação a respeito dos ordenados, o deve ser tambem a respeito de tudo o que constitua a subsistencia dos mesmos Empregados, e isto tanto mais necessario se torna, quanto ha empregos, cujo unico rendimento he a braçagem. Portanto he necessario contemplação com huma e outra cousa.

O Sr. Gerardo de Sampaio - Sr. Presidente. Está em discussão o Artigo 18: elle, a meu ver, não pode passar como está. Exclue o Presidente do Senado, e o Thesoureiro da Cidade; e he principio sabido que, aonde ha a mesma razão, deve haver a mesma disposição: de mais este Artigo, explicando-se simplesmente pela palavra ordenados, marcados por Lei, não tem preenchido as indicações, a que se propõe a Commissão, de conservar aos Empregados demittidos aquillo que lhes pertence; porque não declara que fiquem vencendo as ordinarias, isto he o Procurador de cada milhar das rendas onze, e o Thesoureiro dez, ordinarias de que pagárão Novos Direitos, e em que estão encartados, e finalmente em que ha pensões estabelecidas por Lei. Chamo por outro lado a sabia attenção desta Camara, para que tracte agora de evitar os effeitos, que se seguirião das irregularidades praticadas a este respeito pela Lei de 1833 das extinctas Cortes vendo-se estas obrigadas a deferir a reclamações, que posteriormente se lhe fizerão, e a emendar os erros, que deixo apontados; por cuja razão sou de parecer que o Artigo volte á Commissão para que o redija nesta conformidade.

O Sr. Tavares de Carvalho: - O Sr. Deputado Cordeiro laborou em manifesto equivoco em tudo quanto me attribue: por certo que me não ouvio, ou me não entendeo; porque se me ou visse, e me entendesse, conheceria que eu não só não disse o que elle acaba de relatar, mas pelo Contrario sustentei a sua opinião relativamente ao ordenado do Presidente, e Thesoureiro nem eu tão pouco disse que o Sr. Cordeiro queria ordenados sustentados por abusos; muito expressamente nomeei o Sr. Pedro Paulo para dizer que ordenados por abuso era a consequencia, que se tirava da suppressão, que elle queria fazer, da parte do Artigo que restringe os ordenados só marcados na Lei.

O Sr. Miranda: - Continua-se em sustentar o principio de que todos os Empregados Publicos, que pela suppressão de seus Empregos ficão sem exercício, devem continuar a vencer, não só os seus Ordenados, mas tambem uma Gratificação equivalente a todos os Emolumentos, Propinas, e Precalços, que pelo exercício de seus Empregos lhes competião. Tem-se pertendido mostrar que esta regra geral se acha adoptada pela Camara, e que em consequencia não deve agora desviar-se della, estabelecendo uma doutrina contraria. Não sei que semelhante regra geral se tenha estabelecido ha Camara, nem em que Sessão, nem a respeito de que materia. Seria impossível que uma Camara tão illustrada, e justa, confundindo, e subvertendo as verdadeiras, e exactas noções da equidade, da justiça universal, e da bua administração, e economia pública, adoptasse semelhante opinião, que pela minha parte rejeito com todos os Illustres Deputados, que a tem tão eminentemente combatido. Já exuberantemente se tem mostrado que mesmo por costume antigo neste Reino, e pela propria letra dos Decretos, Cartas, e Alvarás de Mercê, ou Nomeação, sempre os Reis de Portugal concedêrão, e nomeárão

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para os Cargos, Empregados as pessoas de sua escolha,com a clausula de = em quanto mee aprouver = ou = em quanto eu não fôr servido, determinar o contrato = Por outra parte he evidente que os Empregos Publicos não são a Propriedade, ou Patrimonio de alguem, nem por conseguinte os Ordenados, que lhes correspondem: se assim fosse elles passarião de pais, a filhos, e de filhos a natos, vinculados, nas, famílias como bens emphiteuticos. Não he portanto de rigorosa justiça que os Empregados, pela, suppressão dos seus Empregos devem, ficar vencendo os Ordenados por inteiro, e muito menos ainda as Propinas, e Emolumentos annexos ao exercício dos meamos Empregos. Disse um Illustre Deputado, o Sr. Serpa Machado, que a boa política assim o pedia, e corroborou a sua opinião com a authoridade de alguns Escriptores Políticos, que não nomeou. O celebre Jurisconsulto Jeremias Bentham he desta mesma, opinião; porem não advertio, o Illustre Deputado que aquelles Escriptores, a que se refere, a que em particular Jeremias Bentham, considerão este principio em um sentido geral, sem attenção alguma a circumstancias particulares. Que este principio se adaptasse, naquelles Estados, aonde, como em França, e Inglaterra, a despeza se acha, quando muito, ao par da receita, conveniente, e muito político; seria; porque de certo nenhum descontentamento haveria aonde, recahindo as reformas sobre os Empregos, e abusos, continuassem os Empregados a gozar sem trabalho as, mesmas vantagens, que por abuso tinhão, durante o exercício dos seus Empregos. Assim mesmo nem a França, nem a Inglaterra adaptárão este principio, quando reduzirão a meia paga o grande número de Officiaes Militares, que ficárão desempregados quando, em consequencia da Paz de 1814, fizerão uma consideravel reducção nos seus Exercitos, No mesma caso se acha o Grão Ducado de Toscana, a que alludio o Illustre Deputado, porque todos sabem quão bem administrado anda aquelle Estado, qual tem sido a boa gerencia do Grão Duque, e a pontualidade, com que alli são pagos os Empregados Publicos, e os seis mil homens, que o Grão Duque tem ao seu serviço. Porem iremos applicar este principio ao nosso Portugal? A Portugal pobre, e definhado com a guerra passada, com abusos peiores cem vezes do que as guerras, e sobrecarregado, não só por abusos, mas tambem pela força irresistível dos acontecimentos? Com um número de Empregados tão excessivo, que mui bem podemos dizer que são tantos os que administrão, e governão, quantos são os administrados? A Portugal, em que a Renda Publica não chega para costear as despezas ordinarias, havendo annualmente um deficit de cinco, ou seis milhões? Em taes circumstancias, e mais aggravadas ainda pelos estragos, que nas Províncias tem feito os Godos do seculo 19, como será justo, não digo bem, como será possível adoptar-se aquella regra de política? As regras da convehiencia, é da politica são muito boas, geralmente fallando, mas quando ellas contrarião as regras da justiça, e as da boa administração, não devem adoptar-se, sem que se modifiquem, e acommodem ás circunstancias.

Convenho em que, se não he de rigorosa justiça, pede a humanidade, a equidade pede, que um Empregado, pela extincção do seu Emprego, fique com o seu Ordenado, se elle não he excessivo, na posição a que fica reduzido? Longe do recinto desta Camara, longe de mim, a idéa de que, por principio de economia, deve ficar um só desempregado com sua Família entregue á fome, e á miseria, e aos horrores de uma existencia:, que torna, ainda mais desgraçada a lembrança de uma vida feliz! Porém tambem longe de nós, longe de mim a idéa, de que, pondo de parte o estado actual da Nação, deve em regra conceder-se aos desempregados, o seu Ordenado por inteiro quando este he excessivo para o Emprego, ou quando, não o sendo para o Emprego, o he todavia quando o Empregado fica sem exercício. E que diremos; nós a respeito dos emolumentos e propinas? Será por ventura justo que o homem que por seu trabalho tem uma gratificação, além do seu Ordenado, continue a vence-las, ou um equivalente, quando nenhum trabalho nem exercicio tem, e pode viver com, o Ordenado, e applicar-se a qualquer modo de vida ou industria? Seria equidade, quando se não tracta de recompensas, dar um maior salario ao descanço. que ao trabalho, pois, como muito bem observou o Sr. Camello Fortes, o equivalente das propinas e emolumentos sempre regulará em mais do que effectivamente importão? Se estas idéas se adoptassem nenhuma Reforma haveria, que reduzisse as despezas, antes pelo contrario augmentarião, e por conseguinte, com o fim de dar muito a poucos, se não pagaria a muitos aquelle pouco que o Estado lhes deve, e de que para sua sustentação carecem. Isto não pode conseguir-se sem que os pagamentos se ponhão em dia, o que não be possível em quanto, a receita se não achar ao par da despeza. Tem-se tambem observado que adoptando-se esta idéa o Estado nada, perde, porque aquelles que ficão sem exercício podem e devem ser Empregados em outros lugares, logo que elles vagarem, ou nos que de nova se crearem.

Porém esta observação não tem lugar, porque he pôr o Governo, por principios de economia, na necessidade de empregar pessoas que podem, ou não ser de sua confiança, ou não terem a aptidão necessaria para outros empregos.
Por outra parte a Justiça pede que para todos os Empregados se observe uma regra geral, porque a Lei deve ser igual para todos, e que não se estabeleça a favor doa Membros da Camara desta Cidade, o que a respeito de outros Empregados nunca se praticou.

Os Lentes da Universidade de Coimbra tem um Ordenado, e tem tambem algumas propinas pagas pelo Cofre da Universidade. Quando são Jubilados fição com o seu Ordenado; e ficão tambem com as suas; propinas? Não. Os Desembargadores quando são qposentados ficão vencendo o seu Ordenado; vencem tambem um equivalente aos emolumentos, e propinai que vencião? Não. Os Officiaes Militares quando são demittidos por não terem o tempo da Reforma ficão vencendo algum soldo? Nenhum. Aquelles que são Reformados com menos de vinte e cinco annos de serviço ficão com o soldo por inteiro?. Não. E aquelles Officiaes, que pelo serviço effectivo em Posto de Commando tem gratificações, conservão estas quando deixão de ser effectivos n'aquelles Postos? Não conservão. Pois se a respeito destes Empregos se observa esta regra, porque razão, e porque princípios de Justiça quer agora estabelecer-se para os Membros do

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Senado da Camara de Lisboa? Talvez queira sustentar-se que os Serviços destes Empregados são mais importantes, e transcendentes que os do Lente que consummo as suas noites sobre os Livros, e os dias na Regencia da sua Cadeira; que os do Magistrado que gastou a sua vida lendo Feitos, e administrando imparcial justiça; ou que os do Militar coberto de feridas, e que nos combates arriscou a vida em defeza da Patria. Talvez se dirá que, para não descontentar a Nação, convem que os Camaristas de Lisboa sem exercício venção por anno cinco ou seis mil cruzados, ainda que os Credores do Cofre da Camara esperem mais alguns pelas sommas de que são Credores!! Todos estes argumentos estão victoriosamente refutados; por isso approvo o Artigo, salvo pedirem-se ao Governo as Informações necessarias, como requeri quando pela primeira vez fallei sobre esta materia.

O Sr. Camello Fortes: - Torno a insistir na minha opinião: be uma equidade bem entindida, que aquelles que tem Ordenados marcados por Lei continuem a tê-los. O Alvará que ha pouco citei estabeleceo uma regra geral, e vem a ser, que todos os Empregos Publicos são da Corôa; que sendo da Corôa ao Rei tocava extingui-los quando o exigissem as circumstancias, sem ficar obrigado a alguma remuneração. Outra disposição foi a respeito daquelles, que tinhão comprado Officios, e esta foi só applicada ao preterito, e não he applicavel ao presente caso: tambem estabeleceo que fosse preferido o Filho do Proprietario, que bem tiveste servido; mas isto não está extincto, e ainda hoje o Governo o pode fazer; por consequencia, conservar os Ordenados estabelecidos por Lei he muito bem entendido; não assim a respeito dos Emolumentos, e Propinas, ainda as estabelecidas por Lei, o que confirmo com o meu proprio exemplo: tenho tirado quatro Cartas de Lente na Universidade de Coimbra, de todas tenho pago Novos Direitos; apezar disso, se for jubilado, percebo sim o Ordenado, mas não os Emolumentos, e Propinas legaes, e não tenho de que me queixar, pois quando segui aquella já o sabia, e assim a acceitei. Apparecem algumas jubilações com o vencimento de Emolumentos, e Propinas, mas isto he graça especial, que não serve de exemplo, mui extraordinaria, e gravosa para um cofre assaz exhausto.
Não obsta o dizer-se, que o que acabo de expôr he segundo o Direito antigo, e que nós tractâmos de fazer uma Lei nova. He verdade que fazemos uma Lei, mas esta não deve ter effeito retroactivo, mas deve regular os direitos, e indemnisações, que competem a cada um dos Empregados pela Legislação antiga, segundo a qual acceitárão, e servirão seus Empregos.

O Sr. Pedro Paulo: - Ainda insisto na Emenda que fiz ao Artigo, de que se devem supprimir as palavras = marcados por Lei. = E sem razão diz o Sr. Tavares que isto he favorecer abusos; não he tal, porque se elles já estão marcados por uma Lei, como he abuso? Eu digo, que se supprimão, porque he superfluo. Agora, para que o Sr. Tavares me entenda, he necessario fallar com mais clareza: se eu estabeleci isto, he porque receio que venção menos do que vencião até agora; estou persuadido que os actuaes Vereadores de Lisboa devem continuar a vencer o Ordenado, que até agora vencião, pois que a todo o Empregado Publico, que serve bem, deve ser-lhe conservado o Ordenado. A Senhora Infanta Regente, antes de se reunirem as Côrtes, segui o estes princípios, porque os Empregados da extincta Inquisição requerêrão os seus Ordenados; mandou Consultar o Concelho da Fazenda, e em consequencia da Consulta decidio, que se lhe pagassem todos os Ordenados.

O Sr. Leomil: - He cousa para mim bem estranha o ouvir sustentar que as ordinarias, propinas, e mais pitanças, que actualmente estão recebendo os Vereadores e Mesteres do Senado de Lisboa, sejão consideradas como ordenado, para o fim de se lhes continuarem a conservar, ainda depois de subirem do emprego! Quando eu pensava que esta Camara teria de occupar-se um dia na reducção dos ordenados, que tanto devorão a substancia da Nação, vejo bem a meu pezar já d'antemão canonisar o principio, = que não só os ordenados, mas tambem as propinas se devem conservar aos Vereadores e Membros do Senado; = e por conseguinte aqui temos já um aresto para todos os mais Empregados Publicos, que no futuro se reformarem. Com effeito para isto não pensava, eu que estivesse guardado. Já o Sr. Camello Fortes mui judiciosamente mostrou com exemplos a pratica em contrario, e eu accrescento entre outros o exemplo do um Lente ( R. S. M.) que tendo 200$ réis de ordenado foi reformado com 40$ réis, ainda menos da quarta parte, e mais ainda até hoje se não queixou, nem alguem disputou a justiça ou injustiça da reforma do Empregado. Muito embora pois se guarde essa equidade de contentar os Empregados Publicos, mis não venha ella a converter-se em iniquidade, se nós aqui já sem conhecimento de causa, e sem os dados precisos para a boa decisão, resolvermos a continuação dos ordenados, ordinarias, propinas, etc.

Cançou-se o Sr. Cordeiro em combater os meus argumentos e dos que opinão como eu; porém não vejo senão que elle produzio uns poucos de sofismas, quando diz: = "que os fundos e rendas do Senado,» são muito differentes das do Thesouro Publico, e, »que não são as Partes as que pagão etc. etc.» = Eis-aqui hum verdadeiro sofisma, ou questão de nome, porque a differença por elle imaginada não existe se não in nomine ; mas in re nenhuma ha. por isso que as rendas do Senado são publicas, como as do Thesouro, supposto tenhão diversas applicações; e se o cofre daquelle estiver superior ás despezas, preenchem-se os fins da sua applicação, e lá vem a refundir-se na utilidade e bem do público; pelo contrario se estiver inferior, ou houver deficit, deixão de fazer-se Obras Publicas, no que vem a prejudicar-se o Público, e deixa de pagar-se aos credores, como de facto acontece, pois não se paga a estes já ha uns poucos de annos; e a final quem vem a pagar tudo, se não são as Partes, são os Cidadãos de Lisboa, do Termo, e de fora do Termo, que ficão privados de se fazerem essas Obras Publicas, para que se derão aquelles dinheiros.

E o que se pode então esperar da continuação dos ordenados, ordinarias, propinas etc. A continuação doa mesmos e novos abusos, além de uma manifesta e escandalosa desigualdade, por isso que se conservão aos que sahem, ao passo que os que entrão nenhum ordenado vencem.

He além disto em certo modo um privilegio e distincção do commum de todos os Empregados Publi-

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cos, que de ordinario costumão reformar-se com meio ordenado; e porque não acontecerá outro tanto com os Membros do Senado?? Ficão sem o grande trabalho do exercício do Cargo: que cousa mais conforme á equidade do que ficarem tambem só com ametade do Ordenado?... Ou eu não entendo o que seja equidade, ou, se entendo, digo que o contrario será sumiu a iniquidade.

O Sr. Sousa Castello Branco: - Diz o Artigo (lêo): as minhas reflexões limitão-se a esta parte do Artigo. Já alguns Srs. disserão que Empregos ha, em que aqui se não falla, e que tambem devem ser considerados como o são os Vereadores. Para emendar a lacuna, que tem o Artigo, porque na verdade existe a mesma razão para se conservarem a uns, e outros os seus vencimentos, eu o emendaria dizendo = os actuaes Membros da Camara de Lisboa, = em lugar de dizer, como se lê no Artigo, = os actuaes Vereadores da Camara de Lisboa. Alguns Srs. Deputados tem opinado que devem vencer não só os Ordenados, como se determina no Artigo, mas tambem as Ordinarias marcadas por Lei; e tem querido que isto se extenda até aos emolumentos, proes, e precalços: outros Srs. tem pertendido que venção somente os Ordenados: eu sou da opinião dos primeiros, e he que não só se lhes conservem os Ordenados, e Ordinarias marcadas por Lei, mas que ainda se lhes dê uma indemnisação pelos proes, e precalços dos seus Empregos, e de que pagarão novos Direitos. As razões, que tenho para isto, não são razões de rigorosa justiça, visto que o Governo não be obrigado a conceder indemnisações, porque muito expressamente diz = que, quando por seu Serviço houver de tirar, ou extinguir os Officios, de que faz mercê, a Fazenda não ficará. porisso obrigada a satisfação alguma ás pessoas, a quem os tirar; = porem, ainda que não ha um rigoroso principio de justiça a favor da inteira indemnisação, de que fallo, ha um principio de política. He preciso não fazer descontentes: devemos lembrar-nos primeiramente que alguns Empregos haverá entre estes, assim como muitos outros, em que o Ordenado he o menos; os proes, e precalços são quasi tudo: devemos tambem observar que os interesses, e representação annexa destes Empregos, estando affiançados pela Lei, apresentavão a face de um estabelecimento sólido, e importante, em vista do qual se contrahirão allianças de famílias, que se acharão illudidas pela disposição da Lei, que discutimos, se não se conservar a estes Empregados, até que possão ser accommodados em outros Lugares, os interesses, com que até agora contavão, e de que viviâo. Tudo isto deve entrar na consideração do Legislador. Devemos deixar ao tempo o cuidado de concluir a Reforma do pessoal dos Empregados, entretendo-nos da Reforma dos Estabelecimentos somente. Não convenho na Emenda do Sr. Pedro Paulo, que propõe a suppressão das palavras = marcados por Lei, = porque por estas palavras estremou muito bem o Artigo os Ordenados devidos dos Ordenados indevidos, e abusivos, de que talvez haverá exemplo, e que em todo ocaso não prejudicará sejão especificados daquella forma, para que não se dê ansa á continuação do abuso, se o ha.

O Sr. F. A. Campos: - Tem-se ponderado todas os razões, que ha, pro, e contra, sobre a materia; mas, apezar disso, eu a acho tão pouco ilucidada, que não sei como hei de votar, e talvez que grande parte dos Membros da Camara tenhão tambem receio de arriscarem o seu voto.

He verdade que os Officios não são Propriedade de ninguem; que os podêmos abolir, e tira-los a quem os exerce; mas devêmos nós faze-lo, ou permitti-lo-ba a equidade, a politica, e talvez mesmo a justiça? Eu não o penso. Nas Reformas a compensação deve ser completa, como ponderou o Sr. Serpa Machado, repetindo o bello Capitulo do Illustre Jeremias Bentham sobre esta materia. Poderia aquelle Sr. Deputado servir-se ainda, para provar a sua opinião, de outro principio do mesmo Sabio Juris-Consulto, o da - Esperança enganada, = pelo qual não se deve privar um Cidadão, sua Mulher, e seus Filhos da subsistencia certa, com que contava, fundado na estabilidade das Leis, princípios, que eu acho de grande peso, e que devem tornar-nos muito circumspectos. Assim: eu pedi a palavra unicamente para propor á Camara que o Artigo volte á Commissão; e que ella, indagando o rendimento destes Empregados, proponha um justo arbítrio, em que nem se lhes tire tudo, nem se lhes deixe tudo: a intenção da Camara não he fazer ninguem desgraçado.

O Sr. Moraes Sarmento: - Se os Ordenados dos Vereadores da Camara de Lisboa são de tres mil cruzados cada anno, parece-me que he bastante, considerando os Ordenados pertencentes aos Tribunaes do Reino. Porem peço aos Illustres Membros da Commissão que me dêm a esse respeito alguma informação, para se votar com conhecimento. He conveniente declarar que, em geral, para estes Empregos são tirados Desembargadores da Casa da Supplicação, e até creio que se desceo já á Relação do Porto. Mostra-se por tanto que estes Magistrados não servirão os lugares, nem tiverão os trabalhos, por que passão mesmo aquelles, que vão para a Mesa da Consciencia, não fallando dos que são elevados ao Conselho da Fazenda, e Desembargo do Paço, os quaes se consomem, e arruinão a sua saude nas Casas de Aggravos, talvez o mais enfadonho, e arduo Emprego de todos os das nossas Repartições. Pelo contrario, os Conselheiros Vereadores, sem os incommodos da Mesa de Aggravos, e das Varas do Crime, passão para um Emprego de muito descanço, de facil expediente, e não he coherente que elles sejão aposentados com maiores Ordenados do que são os Magistrados do maior Tribunal, como os Desembargadores do Paço, e como os da Mesa da Consciencia, pois raras vezes se aposentão os Conselheiros da Fazenda com todo o seu Ordenado, por se reputar mui consideravel. Sendo por tanto os Conselheiros Vereadores aposentados a par dos Ministros dos primeiros Tribunaes do Reino, quando não estão elevados á mesma consideração de Magistratura, persuado-me que se lhes não faz injustiça, pois ficão recebendo um Ordenado decente, para subsistirem com dignidade. Torno todavia a pedir os esclarecimentos, que propus, a fim de se verificar a importancia destes Ordenados.

O Sr. Macedo: - Sr. Presidente: A votação, que ha pouco houve a respeito do Artigo 17, dá occasião a uma dúvida, que he de alguma importancia, e a que he necessario dar attenção. Approvou-se o doutrina do Artigo, segundo a qual as novas Camaras deverão ter provisoriamente as mesmas Attribuições,

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que tem as actuaes, á excepção da jurisdicção contenciosa depois disso propos V. Exca. se deveria fazer-se alguma declaração a respeito da Camara de Lisboa, em Quanto á Administração das suas Rendas, e decidio-se que não. Ora: todos sabem que o Senado de Lisboa actualmente não administra as suas Rendas, e que esta Administração está a cargo da Junta da Fazenda; logo, a subsistir a doutrina do Artigo sem delaração alguma, parece que a nova Camara desta Cidade ficará tambem inhibida da referida Administração. Por outra parte: parece incrível que os Srs. Deputados quizessem privar a Camara Constitucional da Capital do Reino de uma das principaes Fimcções da sua competencia, qual be a Administração dos Bens Municipaes. Vê-se pois, que o resultado das votações mencionadas he realmente duvidoso, e que necessita de ser trazido a maior clareza: para este fim offereço a seguinte Proposta (lêo-a).

O Sr. Presidente propôz: se as Emendas deverão ser remettidas á Commissão para as attender, assim, como as mau considerações expendidas na discussão, e offerecer nova redacção nesta conformidade? Se vencêo que sim. E igualmente se mandou remetter á mesma Commissão um Additamento do Sr. Macedo, para que explicitamente se declare, se em Lisboa ha de continuar a subsistir a Junta da Fazenda do Senado.

O Sr. Cordeiro: - Como o Artigo 18 volta á Commissão, seria muito conveniente que se pedissem esclarecimentos ao Governo, para que munida a Commissão de conhecimentos exactos sobre a materia de factos possa com maior segurança propor á Camara as providencias adequadas ás differentes circumstancias. Os esclarecimentos, que eu julgo indispensaveis, são para saber quaes são os Ordenados; Ordinarias, e mais rendimentos pagos pelo Cofre do Senado, e authorisados por Lei: se os Procuradores da Cidade são Proprietarios Encartados, e que Pensões tem os seus Officios; e porque titulo, e fundamento forão impostas. Então teremos um conhecimento das diffirenças, que se devem attender, e poderemos resolver o que for de justiça, com conhecimento de causa.

O Sr. Presidente: - Parece que, se a Commissão assentar que necessita destes esclarecimentos, proporá á Camará para se pedirem.

O Sr. Cordeiro: - Estou satisfeito, e não insto, porque á Commissão pertence pedir os esclarecimentos, que necessitar, para desenvolver a materia da discussão.

O Sr. Soares Franco: - Eu creio que isso não he só da Commissão, qualquer dos Srs. Deputados o pode pedir; e creio que a Mesa mesma estaria authorisada para o fazer.

O Sr. Presidente: - He necessario que a Camara diga quaes são os esclarecimentos, que necessita.

Entrou em discussão o Artigo 19.

O Sr. Queiroga: - Diz o Artigo que os Escrivães, que actualmente servem , etc.
Ha Camaras, em que são igualmente Proprietarios os Thesoureiros, e nomeadamente na Camara de Santarem, cuja data pertence a ElRei, e tem Carta passada pela Chancellaria , etc. Parecia-me portanto que se devia accrescentar aqui a palavra Thesoureiro adiante da palavra Escrivão, e dizer = os Escrivães, e Thesoureiros, etc. = Julgo necessario fazer esta Emenda para salvar aquelles Thesoureiros, que são Proprietarios.

O Sr. Cordeiro; - Primeiramente parece-me que esta disposição = na forma da Lei = não tem lugar aqui, porque já está determinado por Lei o que o Serventuario deve pagar ao Proprietario; e em consequencia esta disposição he inteiramente fugitiva á materia, de que se tracta agora, que be das Eleições, e não das Obrigações dos Proprietarios, e Serventuarios. Pelo que pertence á ultima disposição = que os Escrivães serão nomeados pelas Camaras = he aqui que eu tenho difficuldade. Em todas as Camaras os Empregos de Escrivães são Officios, ao menos em todas aquellas, aonde eu servi, e em outras muitas, de que tenho noticia. A questão he se os Escrivães das Camaras hão de ser electivos: já está decidido que não tenhão voto, e por consequencia não he necessario que sejão electivos. Elles são os que fazem o expediente da Camara, lanção as deliberações della, os votos dos Vereadores, e não são mais que meros Officiaes para escreverem dentro da Camara, e o seu expediente; e por consequencia não ha dúvida nenhuma em que sejão conservados os mesmos; e isto parece-me digno da consideração da Camara: o meu voto he que os Escrivães sejão sempre conservados como Officios.

O Sr. Leite Lobo: - Pelas mesmas razões do Sr. Deputado Cordeiro, e por haver algumas Camaras, em que os Escrivães já são electivos, he porisso que a este Artigo eu formo uma Emenda, querendo a sua suppressão nesta conformidade (lêo); e a providencia he que elles fiquem electivos, porque ha uns, que o são, e outros não.

O Sr. Cordeiro: - Um Escrivão precisa, alem da probidade, e mais virtudes, ter conhecimento dos objectos do Officio, que exercita. Não basta probidade, não basta virtude, he necessario o saber desempenhar as suas Funcções, e muito mais nas Camaras electivas, em que não tem lugar a Presidencia do Juiz de Fora, que podia supprir a falta de prática de um Escrivão, dirigindo-o, e instruindo-o nos seus expedientes. Ora: se este Emprego fosse electivo, podia entrar na Camara um homem, que vinha com os olhos fechados. (O Sr. Presidente pedio a attenção da Camara, e o Sr. Deputado continuou).

O objecto já eu disse que era de muita transcendencia, e importancia, e o resultado legitimará o fundamento, com que insto para que se tome na consideração, que merece. Os Srs. Deputados não querem prestar attenção, eu apezar disso julgo que faço e minha obrigação, e não he da minha delicadeza calar-me, e por tanto continuarei a faltar. O Escrivão, como eu ia dizendo, sendo electivo vem todos os annos com os olhos fechados; pede-se-lhe uma resolução do anno passado, uma Postura, etc., e elle não sabe aonde está, e paralisa os Negocios. Um Escrivão habil, que já tem a prática, e os conhecimentos proprios, apresenta nos Vereadoras tudo quanto se necessita; por consequencia requerem-se, alem da probidade, e virtudes, conhecimentos proprios para aquelle Cargo.

O Sr. Carvalho e Sousa: - Apezar de ter sido na Commissão de opinião contraria á doutrina do Artigo, como nenhum dos Membros da Commissão, que o approvárão, se levanta, eu direi, como explicação

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ao Sr. Deputado Cordeiro, o que alli se expendêo a favôr do Artigo. A Commissão não quiz dizer neste Artigo que os Escrivães sejão electivos, mas como muitos dos Escrivães são Serventuarios, e tirão Provimento dos Corregedores das Comarcas de tres em, tres mezes, e estes muitas vezes fazem mudanças, que vão fazer a confusão, que receia o Sr. Cordeiro, por isso, para evitar isto, he que a Commissão diz aqui que, findos os Provimentos, com que servião, se acaso a Camara julgasse que estava bem servida com aquelle Escrivão, nomeava-o para continuar a servir; e foi para desligar as Camaras da dependencia, em que estão os Escrivães de irem tirar Provimentos aos Corregedores das Comarcas, ou Tribunaes, e dar-lhes assim a qualidade de permanentes, ou inamovíveis, em quanto por erros de Officio, ou culpas não forem legalmente suspensos. Estas for ao as considerações, que na Commissão se fizerão, e que refiro, apezar de, como já disse, ter sido de voto contrario.

O Sr. Cordeiro: - Sr. Presidente, V. Exca. permitte-me que eu tenha a palavra pela terceira vez para uma explicação? (O Sr. Presidente a concedêo.) - Os Escrivães das Comaras não tem Provimentos passados todos ou tres mezes pelos Corregedores. Nem estes podem nomeá-los a sou arbítrio de tres em tres mezes, tomando-se isto por fundamento para justificar o Projecto, que concede á Camara a faculdade de nomear o seu Escrivão. Tudo quanto disse o Auctor do Projecto a este respeito he menos exacto. O Corregedor, quando vaga este Officio por morte, ou impedimento do Proprietario, etc. etc., passa somente o primeiro Provimento de tres mezes, e a Lei não lhe faculta, mais que o primeiro Provimento; quando está para se acabar requer o Serventuario ao Desembargo do Paço, ou aos Tribunaes dos altos Donatarios, e então se manda informar o Corregedor; em consequencia da informação passa-lhe o Provimento, que depois he reformado no Tribunal respectivo, sem mais dependencia do Corregedor; esta he a marcha, o mais não he exacto; e depois de ter aquelle Provimento já ninguem o pode despedir.

O Sr. Gerardo de Sampayo: - Sr. Presidente. Os Srs. Deputados da Noção Portugueza, que tem canonisado productor de abusos o principio, que estabeleci, e que mui expendida, e sabiamente apoiou o Sr. Cordeiro, alem de offenderem de alguma maneira a boa fé, que sempre caracterisou as minhas acções, e palavras, não são, a meu ver, demasiadamente coherentes com os seus mesmos princípios. Aquelles Senhores, a propria Commissão, e uma grande parte da Assemblèa, tem reconhecido que certos Empregados do Senado, que o não ficão sendo desta Lei em diante, continuem a vencer os seus Ordenados, estabelecidos por Lei: eu avalio ns Ordinarias, de que fallei, e que marca o Alvará de 23 de Março de 1754, e mais Diplomas a este respeito, não braçagens, como erradamente se tem dicto, porque estas são satisfeitas pelas Partes, mas sim como uma mui sagrada addição, que entra nos referidos Ordenados, e que faz parte dos mesmos, e de que se tirou Provimentos, e se pagarão novos Direitos, e em que estão por Lei estabelecidas Pensões, e finalmente a que ha todo o jus; isto he como um meio de pagar por certo lado o que deixou de se satisfazer por outro: por exemplo, quiz o Legislador estabelecer ao Thesoureiro Da Cidade no citado Alvará 600$000 reis de Ordenado; prefixou claramente 240$000 reis, considerando que 360$000 reis tem de sahir dos 10 por milhar de todas as rendas do Senado, e assim á proporção em todos os mais casos. Logo, vou acorde com o principio reconhecido a respeito dos Ordenados, fundado, segundo os mesmos Senhores tem confessado, nas bases da equidade, no espirito, e letra da Carta Constitucional, e, por ultimo, no respeitavel principio de dar a cada um o que he seu, e distribuir justiça de forma, que faça ganhar amor ás Instituições, e não perdê-lo, não se podendo portanto chamar abuso o que expuz; e, a merecer este nome, nasce isto da medida geral, que se tomou a respeito dos Ordenados, sobre o que eu em these não invectivei, por assim me parecer conveniente. Torno a repetir: ninguem pode chamar abuso do principio, que reconhecêo, o uso regular deste mesmo principio.

O Sr. Tavares d'Almeida Pombo: - Apoio tudo quanto acaba de dizer o Sr. Cordeiro porque he exactamente o que se pratica. Suppondo que os Escrivães das Camaras sejão Electivos he contra a Carta, porque as Camaras são Electivas mas não o Escrivão dellas.

O Sr. Presidente: - Sendo Officio, está claro que nos não compete, mas eu creio que ha algumas Camaras, em que são Electivos.

O Sr. Cordeiro: - Ha algumas Camaras; essa foi a razão porque eu disse que este Negocio era de muita transcendencia, e por isso he necessario declararmos se hão de ser Electivos.

O Sr. Moraes Sarmento: - Seja qual fôr o systema, que se adopte a respeito dos Escrivães das Camaras, devem, como Empregados Publicos, para exercerem Officios, ser Nomeados por ElRei. He verdade, e eu o vi, pela experiencia, que tive de ter sido. Corregedor de Comarca; em; alguns Districtos erão os Escrivães Eleitos, e tambem os Alcaides.

Porem o motivo dessa Eleição era por serem os Empregos de tão insignificante rendimento que, a não ser como onus publico, ninguem podia ser obrigado a servir taes Empregos, e por isso são Eleitos por um anno. Faz muita differença os Officios considerados como Empregos: nesse respeito ternos na Carta marcados os Poderes Politicos, e he da attribuição, e prerogativa Real a Nomeação.

O Sr. Miranda: - Acabo de ouvir mencionar um principio, que pela minha parte não posso admittir, e vem a ser que os Escrivães das Camaras não são Electivos, e devem ser da Nomeação do Rei. Ora, vamos a ver se este principio se acha estabelecido na Carta: diz a Carta que «as Camaras serão Electivas» e nada mais accrescenta. E porque não falla no Escrivão, ou para melhor dizer no Secretario da Camara, podemos por ventura concluir que o Escrivão não he, nem deve ser Electivo? Se assim discorressemos devíamos tambem concluir que o Procurador da Camara tambem não devia ser Electivo, e que, assim como o Escrivão, deveria ser nomeado pelo Rei. Porém o Procurador da Camara be um Membro della, e o Escrivão, não o he. Convenho em que o Procurador he Membro da Camara; mas porque não será como tal considerado o Escrivão ou Secretario? Antes he passar mais avante he necessario advertir que ficando as Camaras, como se tem determinado sem

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Attribuições ou Jurisdicção contenciosa, os Escrivães ficão reduzidos a simples Secretarios; as suas Funcções reduzem-se á correspondencia da Camara, á redacção dos seus Autos, e ao cuidado do Archivo; e não sei que por si, e sem dependencia dos Vereadores, tenha authoridade alguma. Isto supposto, claro he que elle he um Membro da Camara; porque uma Camara sem Secretario não poderia ter acção; elle he o orgão da sua correspondencia; por via delle transmitte as suas ordens; elle he o que toma assento de suas deliberações, cuida em o arranho do seu Achivo; em uma palavra, he Membro da Camara assim como qualquer dos Srs. Secretarios desta Camara he Membro d'ellas, e seguramente elle poderia ter acto, assim como o Procurador, se não se attendesse a que ainda he necessario acatar de algum modo os antigos projectos a respeito deste Cargo. Ora: se o Escrivão he um Membro integrante da Camara, e sem questão alguma o orgão d'ella, como se pertende agora que elle deve ser Nomeado pelo Rei, na conformidade da Carta?
Os Escrivãos sempre forão em Portugal Eleitos pelos Povos, assim como os Vereadores e Procuradores; he o que se acha determinado no Titulo 67 do Livro 1.º da Ordenação; e não posso comprehender porque razão agora se quer estabelecer o contrario, quando na Carta nada se diz a este respeito. He verdade que em algumas partes os Escrivães são nomeados pelo Governo; porém essa violação dos antigos Foros, e Liberdades Patrias foi em consequencia de Provisões, que para esse effeito se passárão. Tem-se dicto que o Escrivão precisa de outras qualidades, que não são indispensaveis para os Vereadores, assim he; porém ninguem poderá dizer que o Governo conhece os sujeitos dotados de taes qualidades melhor, nem tão bem como os Eleitores. Quanto ao tempo porque devem servir, he claro que, tendo muito trabalho, e não tendo ordenado, não devem ser vitalicios, e quando muito não devem ser obrigados a servir por mais de dous annos, salvo querendo, por que a sua reeleição deve ser permittida.

O Sr Tavares de Carvalho: - Quem deve responder ao Sr. Miranda, he o Artigo da Carta (lêo-o.)

O Sr. Henriques do Couto: - Sr. Presidente, os Escrivães das Camaras são os seus Secretarios, e escrevem todos os Acordãos das Camaras; e nesta conformidade podem ser muito prejudiciaes aos Vereadores, e ao Publico; aos Vereadores, porque publicão os segredos da Camara, e até mudão, e riscão muitas Coimas, que tem sido julgadas; e, cuidando os Vereadores que tem feito dinheiro para as despezas da Cambra, vem por fim a ficar alcançados, e nisto perdem os Vereadores, e perde o Thesouro Publico, que tem a terça destas Coimas em alguns Concelhos. Tambem são prejudiciaes ao Publico quando não guardão o devido segredo nas Eleições, e outros Acordãos, que faz a Camara particularmente: por tanto sou de parecer que se obviarão estes inconvenientes, sendo os
Escrivães Electivos.

O Sr. Serpa Machado: - Está bem visto que tudo aquillo que o Auctor da Carta quiz reservar para si, nós não podêmos limitar. A Carta bem claro falla; com tudo, uma cousa he ser Official da Camara, outra cousa he ser Membro da Camaras por ser Official da Camara não se segue que seja uma parte integrante d'ella. Os Escrivães são considerados como Subaltermnos; e seria uma anomalia e dizer-se que as Camaras não são subordinados ao Governo; sempre o forão, e a Carta ainda assim o determina: n'uma palavra, a Carta marca claramente o que se deve fazer. Em quanto á incoherencia do Artigo, que tracta dos Procuradores, digo que nós he que fômos incoherentes, porque o approvámos: demais, não devêmos accrescentar o número dos Membros da Camara, aggregando-lhe o Escrivão como Membro, porque na realidade o não he: por tanto, a minha opinião he que se não deve considerar como Membro da Camara, e que o Artigo deve voltar á Commissão.

O Sr. Leomil: - Parece-me não podêr ter já lugar a questão = se o Escrivão deve ser nomeado pelo Governo, ou pelas Camaras, = uma vez que no Artigo 1.º do Projecto se vencêo que as Camaras sejão compostas de Vereadores, Escrivão, etc. Seria por tanto uma irregularidade o serem os Membros das Camaras Electivos, e o seu Escrivão não. Nem isto se oppõe á letra da Carta, que, supposto falle só dos Vereadores, entende-se tambem do mais, que disser respeito a estes, em ordem á boa organisação das Camaras. O ser o Escrivão um individuo estranho, ou do número dos Vereadores, e o dar-se-lhe a denominação de Escrivão, ou Secretario, isso só importa distincções nominaes; e o que vem a determinar sua natureza são as Attribuições, que se lhe marcarem na Lei; e, quaesquer que elles forem, nunca poderá deixar de considerar-se Emprego Publico, assim como o he o de Vereador, e como taes sempre sujeitos ao Poder Executivo, não obstante o serem Electivos.

O Sr. Leite Lobo: - O dizer-se que os Escrivães estão sujeitos ao Governo, não admitte duvida, porque sempre estiverão, assim como estão os Vereadores em Membros das Camaras, e não tenho difficuldade nenhuma em que seja d'uma ou d'outra sorte, mas parece-me que seria melhor o serem electivos; e, seja qual for a decisão, nenhuma d'ellas me parece que seja contra a Carta.

O Sr. Cupertino: - A questão, Sr. Presidente, tem tomado uma face, que facilmente não feria prevista, olhando-se sómente para a materia do Artigo 19. Com razão pois Vossa Excellencia observou que nem todos nos acharemos preparados para fallar sobre ella, e de mim o digo que o não estou para dar um parecer definitivo. Entretanto vendo que esta Camara parece inclinada a adoptar a opinião de que o emprego de Escrivão das Comarcas he hum Officio publico, cuja nomeação segundo a regra geral pertence ao Poder Executivo, julgo dever expor as razões, que se me offerecem em contrario para provocar hum exame, a uma discussão mais profunda, e reflectida neste assumpto, que tem mais importancia do que á primeira vista se representa.

Senhores, as Camaras no sentido da Carta, e redusidas ás attribuições economicas, e municipaes, que dia sómente lhes concede, precisão de ter Secretario, mas não Escrivão. Até afora era mui differente o caso. As Camaras gozavão de jurisdicção contenciosa, e por isso precisavão de Escrivães para escreverem nos feitos das injurias verbaes, nas vistorias, nas appellações dos Almotacés, execuções de colmas, e mais negocios da sua competencia como Authoridades Judiciaes; mas agora que tudo isto cessa, e que as

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Camaras não tem mais que o governo economico, e municipal das terras, um Empregado nellas com o nome e funcções de Escrivão he uma entidade, escusada, e ellas não precisão senão de um Secretario com as attribuições, que este nome indica, e para os objectos interiores. Eis-aqui porque eu já na Sessão Extraordinaria, quando pela primeira vez entrou em discussão a materia do Artigo 1.º, lembrei que em lugar de Escrivão se dissesse Secretario.

Não se diga que a Caria não diz que as Camaras serão compostas de Secretarios, e que por isso os não deve crear a Lei. Tambem ella não diz que ellas hão de constar de um Procurador, e entretanto esta Camara já resolvêo que um dos Membros della se ha de chamar Procurador; também ella não diz que a Camara dos Deputados da Nação Portuguesa ha de ter um Presidente, e tantos Secretarios, e sómente no Artigo 21 falla de Presidenta e Secretarios como de empregos, que naturalmente haverá, e simplesmente para declarar a quem pertença a sua nomeação. O que se pode dizer he que o Secretario das Camaras deve ser um dos Vereadores, um dos Membros d'ella, e que a Carta deixou a sua nomeação, e regulação do que lhe respeito ao Regimento interno, ou, se se quizer, á Lei. Diz-se que ellas precisão de um Official, que tenha fé, publica. E porque a não ha de, ter aquelle dos seus Membros, que for Secretario? Quem a dêo aos Secretarios desta Casa, que certamente a tem quando assignão uma copia, e affirmão que está conforme; quando redigem as Actas, e geralmente em todos os objectos da sua competencia? Torno a dizer que não enuncio uma opinião decidida e assentada; não tenho feito mais do que exprimir idéas, que obviamente me vierão, e que ainda não pesei com a reflexão necessaria; mas levantei-me sómente para mostrar que o caso não he tão liquido como se tem representado, e que deve ser maduramente considerado.

O Sr. Henriques do Couto: - Sr. Presidente, se não adoptarmos que os Escrivães das Camaras sejão electivos, vamos a dar aos grandes Donatarios toda a ingerencia nas Camaras, porque elles são quem nomêa os Escrivães nos Concelhos do seu Domínio; e, logo que tenhão noticia desta decisão, terão cuidado em provêr todos os Officios desta natureza que estiverem vagos; e eis-aqui uns partidistas, que elles vão constituir nas Camaras, e de quem indagarão tudo quanto alli se tractar; e muitas vezes também os mencionados Escrivãos servirão para alliciar as Camaras propondo-lhes argumentos estudados, e que as mesmas Camaras (principalmente nas Aldêas) não saberão desenvolver; queira Vossa Excellencia convidar esta Camara para fazer sobre esta materia muito seriasreflexões.

O Sr. Magalhães: - Eu estou bem persuadido que não he da essencia das Camaras o terem Escrivães, aliás quando se designou a sua formação serião indicados; e tambem estou persuadido que lhe não são precisos, estando nesta parte mui conforme com o parecer do meu honrado Collega o Sr. Cupertino.

A Carta diz que as Camaras serão compostas do número de Vereadores, que a Lei designar: então depois de eleita uma Camara que resta? Dar forma a esse Corpo, mette-lo em ordem.

Esta consiste naturalmente em tomar um Presidente, e um Secretario, o qual basta sem dúvida para lançar na Livro competente as resoluções das mesmas Camaras.
Todo o contencioso fica no Poder Judicial; todo o administrativo público passa á Publica Administração: assim, diminui o número das obrigações do Escrivão, para que he elle preciso? Essas fés, de que alguns Srs. fallão, serão competentemente dadas pelos respectivos Escrivães, pois mesmo, quando se tractar da arrecadação dos rendimentos dos Concelhos, as execuções hão de ser intentadas perante as devidas Authoridades; as citações, e diligencias feitas pelos Officiaes destas.
He preciso não julgar da futura organização social pelos elementos, que presentemente entrão nella; e menos pela confusão reciproca, em que elles se achão. Senhores, este he o cultos; convem coordenar as partes componentes, e reduzir a Sociedade a ordem.

Porem, como se vencêo que hajão Escrivães, já esta questão he ociosa; e deve só tractar-se do ponto de vista, com que este Emprego deve ser olhado. Será um Encargo, ou um Officio?

A solução destas duas questões resolverá o problema; porque se for um Encargo Municipal, he certo que deve seguir a marcha traçada aos outros; se for um Officio, então certa he a opinião dos Srs., que dizem ser a sua nomeação do Poder Executivo. Em quanto a mim parece-me que he um Encargo do Concelho, a que todos estão obrigados, bem como ao de Jurados, Vereadores, etc. ele.
Procuremos a organização social nos seus primeiros elementos, e encontraremos que o Escrivão da Vintena he um Encargo Municipal. A sua eleição he o mais popular possível. Subamos um pouco mais, e veremos que n'uma grande parte das Villas, que tem Camaras, os Escrivães do Concelho são nomeados quando os Vereadores. Vejamos a Historia das nossas antigas Côrtes, encontraremos reclamações dos Povos por se lhes haverem mandado Escrivães para as Camaras sem previa Eleição popular; reclamações, com que sempre se contemporisou. Então concluir-se-ha que sempre os Povos tiverão como uma prerogativa sua a nomeação dos Officiaes, que devem servir na Vereança, prerogativa, que eu chamo um verdadeiro encargo para aquelle, que he nomeado para semelhantes Empregos. Se isto acontecia quando ns Escrivães erão indistinctamente tomados da massa bruta do Povo, quando tinhão a exercer mais dilatadas obrigações, porque não ha de ser o mesmo quando o modo da escolha se apurou, e as obrigações diminuirão! A Ord. do L. I. T. 67 falla da Eleição dos Juizes, Vereadores, Almotacés, e outros Officiaes: e, seguindo-se os Regimentos de cada um desses Officiaes, encontra-se o de Escrivão da Camara.

Se pois tal era a ordem das cousas, quando todos os Poderes do Estado estavão reunidos em um só Chefe, como poderá alterar-se depois da sua divisão devida á Bondade Paternal, e á Sabedoria do Sr. D. Pedro IV?

A Administração Municipal foi entregue a massa da communhão municipal; como queremos nós levar á sua organisação elementos d'outro Poder com outras relações, outros interesses?

Concluo pois que he o exercício d'uma Funcção Municipal a qualidade de Escrivão da Camara; e

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então já está prevenida a resposta da segunda questão; isto he, por quem deve ser nomeado? Pelos Eleitores em concorrencia com os Vereadores; e nesta porte he que eu reprovo o Artigo, quando dá ás Camaras o direito da Eleição.

Tem menos inconvenientes o período annual do Escrivão, do que a sua perpetuidade dentro de um Corpo annual. O resultado he que o Escrivão sabe tudo, e só dá a saber o que lhe convem aos Vereadores; mas tendo elle de sahir no fim do anno já não pode ousar desse artificio; particularmente sendo o Cargo oneroso, e não lucroso.

Porem, se se quizer considerar este Emprego como um Officio, então he preciso estabelecer-lhe um Ordenado, d'onde o Empregado tire a sua sustenção; porquanto, á excepção de alguma Cidade, ou Villa mais notavel, e isto por graça especial, em nenhuma Camara os Escrivães tem Ordenado sabido: os seus interesses legaes provem das Attribuições, que se lhes tirão, e dahi tambem os seus abusos.
Convem que os Ordenados sejão taes, que não afujentem a virtude, quando a necessidade entrar. Só assim se conseguirá uma provavel independencia; e então he preciso vèr quantas Camaras hão de haver, e se o Thesouro tem as forças para esse fim.

Debaixo destas considerações he que a Camara deve proceder.

O Sr. F. A. Campos: - Sr. Presidente: tracta-se de saber, se o Escrivão da Camara he Empregado Publico. Eu sou desta opinião. As minhas razões são as seguintes, até hoje tem-se considerado como tal, e isto basta para assim o continuarmos a reconhecer; se decidirmos o contrario, parecerá que tentêmos invadir as prerogativas Reaes. O Escrivão da Camara tem fé pública; a Camara não lha pode dar, da-lba a Lei, por tanto he um Emprego Publico. O Escrivão da Camara não he Electivo, porque a Carta o não diz; e ainda que o Sr. Miranda julga que este argumento não procede, porque tambem a Carta não falla do Procurador, e entretanto nós o fizemos Electivo; com tudo a Camara podia não achar o menor inconveniente em assim o Decidir a respeito do Procurador, e achar gravíssimos inconvenientes a respeito do Escrivão. Com effeito: se o Escrivão fôr vitalicio, não he uma incoherencia que um corpo annual faça uma nomeação vitalícia? Se fôr annual, não haverá intrigas, subornos na Eleição, extravio nos Papeis do Archivo, com as frequentes mudanças, e outras muitas desordens7 Estes inconvenientes he que se devem evitar, e por elles, e pelas razões apontadas, he que julgo que o Cargo de Escrivão da Camara he um Emprego Publico.

O Sr. Barreto Feio: - Apoio a opinião do Sr. Miranda, e do Sr. Magalhães. Nós não podemos affastar-nos do que está determinado na Carta: nella se determina que as Camaras sejão Electivas; logo, todos os Membros, de que estes Corpos se compõem, devem ser Electivos: agora pergunto, se os Escrivães são, ou não partes integrantes desses mesmos Corpos? Não pode haver dúvida que o são, porque sem elles ficarião as Camaras imperfeitas, e as suas decisões senão perdidas por falta a de quem as escrevesse: logo os Escrivães devem ser Electivos; e isto me parece tão evidente, que não admitte dúvida alguma.

O Sr. Serpa Machado: - Todos nós queremos a observancia da Carta, mas todos a entendemos de differente modo; a Carta falla nos Vereadores, e não nos Escrivães. As palavras, e a mente do Artigo da Carta inculcão que só os Vereadores formão parte integrante da Camara. Em quanto ao que se disse das antigas Camaras, he confundir cousas muito differentes na sua origem, nos seus fundamentos, e na sua historia. A Carta estabelece differente forma para a creação das Camaras daquella, com que antigamente erão formadas, porque não só fazião Leis Municipaes, mas até criminaes.

O Sr. F. A. Campos: - Pedi segunda vez a palavra para responder ao Sr. Deputado Cupertino. Diz elle que, por ter o Escrivão da Camara fé pública, não se segue que o seu Emprego seja um Emprego Publico, porque lambem os Srs. Secretarios desta Camara tem fé nos objectos do seu expediente, e nem por isso se pode dizer que exerção um Emprego Publico. A razão de paridade não procede, porque os Srs. Secretarios são Membros desta Camara, e a fé da-lha a mesma Camara, como Corpo Político. Se o Escrivão da Camara fosse um dos seus Membros, então poderia ter fé por essa causa, assim como os Secretarios de algumas Corporações; mas sendo pessoas absolutamente estranhas ás Camaras, e de fora dellas, a fé não lhes pode provir senão da Lei.

Tambem não julgo attendivel o argumento do Sr. Magalhães, tirado dos Juizes da Ventena. Estes Juizes não tem nada com as Camaras; a sua authoridade não provem dellas, que lha não podem conferir, mas da Lei, que he quem lha dá.

O Sr. Cupertino: - Parece-me que o Sr. Campos não respondeu cabalmente ao meu argumento, que chamou de paridade. Disse que o meu argumento de analogia entre o Escrivão, ou Secretario das Camaras Municipaes, e os Secretarios desta Camara Legislativa não procedia, porque aquelle era individuo externo, e estes erão tirados d'entre os Membros desta Casa: isto porem he confundir as cousas, e dar por certo o que está em questão. O que eu disse foi que as Camaras Municipaes não precisavão de Escrivão, precisavão de Secretario, e que este podia sahir do seu proprio seio; e, debaixo deste supposto, parece-me que o meu argumento de analogia procede. Se ha alguma cousa, que se pareça com a Camara dos Deputados, são as Camaras Municipaes; estas são para os Municípios o que aquella he para a Nação; e por isso não be impropriedade compara-las em certas cousas, que parece lhes são communs. Acho bastante incongruencia em admittir nas Comaras Electivas a participar dos seus trabalhos, escrever as Actas das Conferencias, centrar nos Negocios da competencia das Camaras, um indivíduo estranho, que não foi eleito pelo Município, nem nomeado pela Camara. Concluo que cada vez acho a materia mais duvidosa, e que a minha opinião he que o Artigo fique adiado, ou seja remettido á Commissão para o considerar de novo, e o propor com relação á questão, que se tem agitado.

O Sr. Soares de Azevedo: - Sr. Presidente, se nós não respeitâmos as decisões tomadas por esta Camara, e a cada, momento estâmos contrastando materia, que já se acha vencida, de certo não poremos nunca fim a semelhante Projecto, já bastante enfadonho. No Artigo 1.° deste Projecta já se decidio que nas Ca-

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maras haverião Vereadores, Procuradores, e Escrivão; e no Artigo, 2.º decidio-se que as Camaras fossem unicamente compostas de Vereadores, e Procuradores: logo, está já decidido que ha de haver Escrivão; que este não pode ser Membro, nem ter voto na Camara; e que ha de ser uma pessoa estanha, e fora dos Membros, que hão de compôr a Camara; e conseguintemente he visivel que não pode ter lugar a opinião dos Illustres Deputados, os Srs., Cupertino, e Magalhães, em quanto pertendem que ao nome de Escrivão se substitua: o de Secretario, e seja exercido este Cargo por um dos Membros da mesma Camara. Não he só por estar vencido que haja nas Camaras um Escrivão, e que a pessoa, que exercer este Officio, seja fora dos Membros da Camara quee eu sou de opinião que deve ser assim mesma, he porque o interesse publico, o bom regimen das Camaras, e o comprimento de seus deveres assim o exigem. O Escrivão da Camara não só he destinado para escrever os Acordãos das Vereações da Camara, e tudo quanto ella determinar, mas tambem para executar os seus Mandatos: tem por consequencia o Escrivão a fazer diligencias, que só podem ser feitas por um homem, que tenha Fe Publica, e a que se chama Official de Justiça, e não só pela circumstancia de ser necessario que o Escrivão tenha Fe Publica he necessario que seja Escrivão, mas mesmo porque não seria muito decente a um Membro da Camara o andar a fazer Avisos, ou, para melhor dizer, Citações, como he indispensavel para ter effeito as determinações da Camara: eu penso que não he da mente desta Camara que um Membro do Senado vá citar a um testante de uma estrada para apurumar a sua testada, ou reedificar a parte do caminho, que lhe pertence, ou citar qualquer indivíduo para vir ver-se coimar á primeira audiencia da Camara, etc., etc.: he por consequencia necessario que haja um Escrivão, e um Escrivão, que tenha Fe Publica; e basta esta circunstancia para que o Escrivão se considere como Empregado Publico; que não sendo daquelles, a quem a Carta faz Electivos, e da escolha dos Povos, he indispensavel que seja eleito pelo Governo, porque he das suas Attribuições; nem se diga que, assim como qualquer Commissão pode eleger um Secretario, que escreva, e tenha Fe Publica o que elle escrever, assim como succede nesta Camara aonde os Secretarios nomeados pela Camara tem Fe Publica, assim a Camara pode nomear um homem para servir de Secretario, e que tenha Fe Publica, porque, como muito bem disse o Illustre Deputado o Sr. Campos, isso só tem lugar quando essa Commissão elege para Secretario algum Membro «d'entre si, porque nesse caso a mesma Lei, que authorizou essa Commissão, a mesma Lei authorizou a cada um de seus Membros; mas no nosso caso não he assim, porque está decidido que o Escrivão seja um homem, alem dos Membros da Camara; como he necessario que tenha Fé Publica, fica sendo Empregado, e Official Publico, e só ao Poder Executivo compete o nomeá-lo, e authoriza-lo. He tambem necessario que este Escrivão não seja da nomeação da Camaara, porque de certo teríamos tantas nomeações quantas as Camaras, e he de interesse público que os Escrivães das Camaras sejão vitalicios, e sirvão em quanto bem servirem.

As obrigações dos Escrivães das Camaras são muitas, e não são tão faceis de executar, que não seja necessario, bastante prática para o bom, e prompto andamento dos negocios economicos. As Camaras, como já se decidio, hão de ser annuaes, por consequencia, quando entra a nova Camara vai, totalmente ignorante não só do modo prático de exercer aquelle cargo, mas até das Posturas, dos Acordãos, e Autos de Vereações passadas, une se estão observando, ou por assim dizer, das Leis Economicas, por onde se está regendo aquelle Districto; he por tanto do interesse das novas Camaras, e do bem dos Povos que haja um empregado naquelle estabelecimento que seja duradouro, que esteja ao facto de tudo o que ha áquelle respeito, e que possa informar do que for necessario. He além disso necessario que seja duradouro semelhante empregado, porque tendo a seu cargo a guarda do Cartorio e a responsabilidade d'elle, e havendo, nos Cartorios das Camaras papeis de circunstancia, he necessário que não haja descaminho destes papeis, e não sendo permanente o Escvivão, a quem incumbe a guarda e responsabilidade do Cartorio, mas sim annual como os Membros das Camaras, nem poderia haver essa responsabilidade, nem, a segurança do Cartorio, porque todos sahem que nas passagens, que se fazem de semelhantes Cartorios, he quando acontece o maior descaminho de papeis: he por tanto o meu voto que seja vitalicio, que sirva em quanto bem servir, e até que tenha um ordenado competente, porque em fim; deixemos fallar os Estoicos, o interesse he a mola real do homem, sem interesse ninguem trabalha com vontade, sem interesse não faz interesse a conservação de qualquer emprego, nem be penoso, a sua perda ou privação; para pois bem se desempenhar este Officio, he necessario que elle se faça appetecivel, assim como sentida a sua perda; e para se sentir a perda he necessario que a perda do Officio traga comsigo perda de interesse, He por tanto o meu voto que haja Escrivães das Camaras; que estes sejão vitalicios, e sirvão em quanto bem servirem; que tenhão um ordenado, ou emolumento; e que, determinado que exista este Officio, fique ao arbitrio do Governo a nomeação do indivíduo, que o deve exercer, por ser das suas attribuições, e não da Camara: e que por tanto deve voltar o Artigo á Commissão para o redigir novamente neste sentido.

Julgada a materia sufficientemente discutida, propoz o Sr. Presidente - se deveria o Artigo voltar á Commissão para nova redacção, em conformidade das idéas expendidas na discussão? - E se vencêo que sim: remettendo-se igualmente a Emenda offerecida ao mesmo Artigo pelo Sr. Deputado Leite Lobo.

Entrou em discussão o Artigo 20.

O Sr. Presidente: - Deve riscar-se a palavra - Juiz ' como já se venceo no Artigo 2.º.

O Sr. Novaes: - Offereço a seguinte emenda que me parece ser util para se pôr no fim do Artigo como additamento, e he a seguinte (lêo).

O Sr. Cupertino: - Acho muito sensata a Emenda, ou antes additamento do Sr. Novaes, e a apoio com todas as minhas forças. O Juramento de todas as Authoridades precedeo sempre o seu exercicio; nós mesmos nos não assentamos aqui sem o prestarmos, e até agora os Membros das Camaras já o davão quando tomavão posse. Deve porém estabelecer-se uma nova fórmula conforme ás actuaes Instituições.

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Vamos porem a outra couta. Diz o Artigo que os Vereadores e Procurador, que ficarem eleitos, entrarão logo no exercício de seus cargos. Este logo não pode referir-se senão ás primeiras Eleições, que se pertende se facão ainda para este armo; e á vista disto pareceria que esta era uma Lei transitoria, e feita sómente para estas primeiras Eleições. Mas nem ha necessidade alguma de fazer uma Lei de Eleições, que não possa servir para todas as futuras, e accommodar-se a qualquer divisão do territorio, nem das partes anteriores do Projecto se infere que tal fosse a mente de seus auctores. Bastará para conhecer isto olhar para as primeiras palavras do Artigo 5.° = Logo que esta Lei for recebida nas Camaras, e para o futuro no 1.º de Dezembro de cada anno etc. =

Se pois esta Lei he (e deve ser) feita para regular de futuro as Eleições das Camaras, já se vê que este Artigo 20 está imperfeito, porque sómente diz quando hão entrar no exercício dos cargos os Vereadores, que agora se elegerem para este anno: eu encheria esta lacuna accrescentando-lhe as seguintes palavras: = E nos annos futuros no dia 2 de Janeiro.

O Sr. Macedo: - Diz o Artigo 20 que os Vereadores, e Procurador, que ficarem eleitos, entrarão logo no exercido de seus Cargos. Parece-me que o termo = logo - he mais indeterminado ainda neste Artigo, do que em alguns lugares da Ordenação. Por ventura no mesmo dia, no mesmo momento, em que se findar a Eleição, hão de immediatamente os Eleitos entrar em exercicio? Cuido que não. Pois quando ha de ser? Não sei. O que me parece mais regular he que haja uma Authoridade incumbida de convocar os novos Membros da Camara para tomarem posse, e de designar o dia para esse Acto: portanto he necessario que se tome isto em consideração, e que se declare qual haja de ser essa Authoridade. Em quanto á Emenda peço que se lêa, porque não sei se a percebi bem.

Sendo satisfeito continuou: - Eu approvo a Emenda, mas parece-me que se deve addicionar a fórmula do Juramento, fazendo-se n'ella menção expressa da Carta Constitucional.

O Sr. Tavares de Carvalho: - Eu tambem approvo a Emenda, mas alem della ainda falta a parte penal para aquelles, que não quizerem acceitar os Cargos, para que forão nomeados. O Artigo diz (léo); e se elles não quizerem acceitar? Isto he o que me parece que a Camara deve considerar, e remediar; para o que volte o

Artigo á Commissão, á imitação do que acontecêo aos dous antecedentes.

O Sr. Novaes: - Quando propuz a Emenda no fim deste Artigo a respeito do Juramento, que devem dar os Officiaes da Camara antes de entrarem em exercício, fallei na Carta Constitucional: esta foi sempre a minha intenção; e se esta palavra faltou na redacção da Emenda, foi pela brevidade, com que foi redigida.

O Sr. Campos Barreio: - Eu levanto-me para notar tambem um defeito muito grande desta Lei. Acho que, se esta Lei passar com tal defeito, ha de acontecer em algumas Villas mais pequenas haver um abandono, ou interrupção no Governo economico, e municipal. Taes Villas haverá, aonde não poderão as Eleições ter effeito immediato, ou seja por não haver então pessoas elegiveis, e desembaraçadas, quero dizer, por não haver sufficiente número de Membros promptos, que tomem conta de seus respectivos Lugares, ou porque, quando os haja, estes não queimo exercer aquelles Lugares. Este caso he tanto mais facil de acontecer, quanto a Camara já rejeitou a idéa de cominação de penas, offerecida por alguns dos honrados Membros; e quando elle acontecer he visto que o Governo Municipal fica abandonado, pois já se vencêo que as Funcções de Vereadores só durem um anno, acabado o qual acaba a Jurisdicção sem haver substituição. Digo pois que isto se deve ter em muita consideração para se fazer um Additamento, no qual se declare que, no caso de não estar prompta no fim do anno a Camara ultimamente eleita, a que exercer então as suas Funcções continue por todo o tempo, até que seja rendida, dando parte á Secretaria d'Estado respectiva, para se darem as ordem necessarias.

O Sr. Van-Zeller: - Lembro a V. Exca. que em toda a Lei se não falla em Thesoureiros.

O Sr. Cupertino: - Como o Projecto reverte á Commissão sobre varios objectos será a proposito lembrar algumas cousas, que me parece faltarem n'elle, e que a Commissão poderá agora supprir. As Rendas dos Concelhos, e as Terças devem ser recebidas, como até agora, por Thesoureiros: destes não se falla em todo o Projecto; mas a Lei deve declarar, ou que ás Camaras pertence elege-los, ou que os Procuradores exercitarão este Encargo, onde até agora o tinhão, que era na maior parte das Terras.

Tambem julgo que a Lei ficará imperfeita se não contiver a abolição dos Almotacés. Estes Funccionarios exercem Attribuições Judiciarias, e Attribuições Economicas; as primeiras, quando desembargão as Coimas, e quando, dentro da Cidade, ou Villa, e seus arrabaldes, conhecem das Demandas sobre edifícios, e servidões; as segundas, quando inspeccionão sobre limpeza, provimento, ou abastecimento da Terra, quando fiscalisão a exactidão dos pesos, e medidas, etc. etc. Como Juizes ha muito que devião ter acabado, porque taes Juizes, ordinariamente Leigos, e onde os ha muitas vezes Letrados para conhecerem sómente de certas Causas, e dentro de um pequeno recinto, são uma verdadeira anomalia, e não servem senão para confundir jurisdicções, e entorpecer a marcha da justiça; e agora não podem mais subsistir, porque Juizes contenciosos electivos, e ligados com as Camaras he Magistratura, que a Carta não admitte. Por outra parte, ficando reduzidos ás suas Funcções economicas, não só são inuteis, porque as suas Attribuições competem eminentemente ás Camaras, mas prejudiciaes pela confusão, conflictos, e desordem, a que pode dar occasião a existencia de duas Authoridades independentes sobre o mesmo objecto. Permittâo-me os Sabios Membros da Commissão que chame a sua attenção a este assumpto.

O S. Presidente: - Parece-me que este Artigo deve voltar á Commissão, visto que as Emendas illustrárão em tudo a Commissão, se a Camara julgar conveniente. (Apoiado, Apoiado).

Julgada a materia sufficientemente discutida, propoz o Sr. Presidente = Se todas as Emendas deverião ser remettidas á Commissão novamente, para as tomar em
consideração? = Se vencêo que sim; e que igualmente se lhe remettesse o

Additamento offereci-

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do pelo Sr. Cupertino na Sessão de 25, e que havia ficado reservado para depois de finda a discussão dos Artigos do Projecto.

Dêo o Sr. Presidente para Ordem do Dia da Sessão do 1.º de Fevereiro o Projecto N.° 101. E para Ordem do Dia das Secções Geraes, em que a Camara tem de dividir-se na Sessão seguinte, os Projectos N.º 104, 105, e 106, e Pareceres das Commissões Centraes.

E, sendo 8 horas e 20 minutos, disse que eslava fechada a Sessão.

SESSÃO DE 31 DE JANEIRO.

Ás 9 horas, e 50 minutos da manhã, pela chamada, que fez o Sr. Deputado Secretario Ribeiro Costa, se achárão presentes 86 Srs. Deputados, faltando, alem dos que ainda se não apresentárão, 15; a saber: os Srs. - Lima Leitão - Barão de Quintella - Leite Pereira - Fortunato Leite - Bettencourt - Trigoso - Isidoro José dos Sanctos - Ferreira de Moura - Costa Sampaio - Mouzinho da Silveira - Rebello da Silva - Luiz José Ribeiro - Gonçalves Ferreira - Alvares Diniz - e Sousa Machado - todos com causa motivada.

Disse o Sr. Presidente que estava aberta a Sessão. E, sendo lida a Acta da

Sessão precedente, foi approvada.

Dêo conta o Sr. Deputado Secretario Ribeiro Costa de um Officio do Ministro dos Negocios da Justiça, remettendo as informações, e esclarecimentos, que lhe forão pedidos em Officio com data de 16 do corrente, relativos ao Requerimento de D. Maria Ignez d'Almeida.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: - Requeiro que se lêào os Documentos, que acompanhão esse Officio.

O Sr. Deputado Secretario lêo os Documentos, que consistião na Portaria expedida pelo Ministro dos Negocios Estrangeiros para o Intendente Geral da Policia fazer embarcar em um Navio Inglez o Marido da Supplicante, João Candido Baptista; e as informações, que dá o mesmo Intendente, e o Juiz do Crime do Bairro de Sancta Izabel sobre o modo, por que procedêo á diligencia.

O Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros: - Ha muitos dias que se me imputa uma accusação vaga de infracção de Constituição. A Camara dos Dignos Pares, a quem de modo algum pertence accusar-me, pedio-me esclarecimentos deste facto; e esta Camara, em lugar de remetter-me o Requerimento, de que se tracta, o remettèo ao Sr. Ministro das Justiças, o qual de modo algum pode conhecer do meu procedimento, como Ministro; pois que os meus Actos Ministeriaes são independente, em quanto não forem julgados por esta Camara. O Sr. Ministro das Justiças envia agora os papeis, que dizem respeito á accusação, de que se tracta sem me participar cousa alguma.

Vamos agora a ver qual he a accusação que se me faz: ha duas cousas no Requerimento Ordem, e execução de Ordem; o que se passou com João Candido, e a Ordem que eu dei de modo algum são infracções de Constituição. Que ordenei eu?

Que João Candido Baptista fizesse aquillo, a que se tinha obrigado, e para que já tinha recebido uma somma de dinheiro, e que depois duvidou: isto era um contracto, não o cumprio, eu julguei tinha todo o direito de o fazer cumprir.
Eu creio que a Camara acaba de decidir que este Negocio volte a uma Commissão: peço ser ouvido, para que a Camara decrete a minha accusação, e eu seja castigado se o merecer, e que se dê em mim um exemplo, e um exemplo forte dos que violão a Constituição. Eu tenho todo o direito a pertender que por mais tempo não carregue sobre mim uma accusação vaga; tenho toda a esperança que a Camara me fará justiça; e quando m'a não faça appellarei para a Opinião Publica, publicando todos os Documentos, para salvar a minha conducta.

O Sr. Cordeiro: - A Commissão concorda exactamente com os princípios que S. Exca. o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros acaba de expender sobre a necessidade de dar os esclarecimentos convenientes: ao examinar o Requerimento da Supplicante, reconhecêo a transcendencia da materia; e porque não tinha sufficientes dados expoz a esta Camara que se pedissem ao Governo os necessarios esclarecimentos: a Camara assim o decidia; o Sr. Secretario entendêo que devia ser por aquella Repartição, talvez porque a queixa dizia respeito ao Intendente Geral da Policia, e Juiz do Crime do Bairro de Santa Isabel, e com isso nada tem a Commissão. Agora vê-se que o Excellentissimo Ministro da Justiça remette as Informações do Intendente Geral da Policia, mas isso não he bastante para a Commissão formar o seu Juizo: he indispensavel que S. Exca. o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros dê os devidos esclarecimentos. Julgo portanto que se lhe devem remetter directamente todos os papeis antes de voltar outra vez á Commissão, a fim de dar sobre elles as clarezas, que a Commissão requerêo.
Resolvêo-se que fosse tudo remettido ao Ministro dos Negocios Estrangeiros para enviar á Camara as informações, e esclarecimentos, que julgar convenientes.

Dêo mais conta o Sr. Secretario de um Officio do Sr. Duque do Cadaval, Presidente da Camara dos Dignos Pares do Reino, remettendo por cópia a Proposta por ella approvada, para dirigir a Sua Magestade o Senhor D. Pedro IV respeitosas súpplicas, a fim de se Dignar Haver por bem que a Rainha Fidelíssima, a Senhora D. Maria II venha entre nós receber, quanto antes, aquelle tributo de amor, respeito, e submissão, com que os Portuguezes em nenhum, tempo faltarão nos seus Soberanos, e convidando esta Camara para da sua parte dirigir ao Throno semelhantes súpplicas.

Resolvêo-se que se remettesse a uma Commissão Especial, que seria immediatamente nomeada pelas Secções Geraes, e á qual se uniria o Sr. Deputado D. Francisco de Almeida, como Ministro dos Negocios Estrangeiros, visto que se tractava de objecto, que pode ter intimas relações com a Politica externa.

Pedio, e obteve a palavra o Sr. Deputado João Alexandrino de Sousa Queiroga, como Secretario da Commissão Administrativa, que servio na antecedente Sessão Extraordinaria de 1826, para dar conta do Relotorio da sua gerencia na mencionada épo-

VOL. I. LEGISLAT. I. 29

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