O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 359

SESSÃO DE 10 DE FEVEREIRO DE 1874

Presidencia do ex.mo sr. José Marcellino de Sá Vargas

Secretarios, os srs.

Francisco Joaquim da Costa

Silva Ricardo de Mello Gouveia

SUMMARIO

É approvada uma proposta do sr. deputado Adriano Machado, para ser eleita uma commissão que dê parecer sobre o tempo em que termina a actual legislatura — E tambem approvada uma proposta do sr. Luciano de Castro, ácerca da publicação das representações transcriptas na pagina 329 do Diario da camara dos senhores deputados — Ordem do dia: conclue a discussão do projecto de lei n.º 72, na generalidade; é approvado — Entra em discussão o artigo 1.°, de que é proposto o adiamento. Tratando-se de votar este nominalmente, verifica-se não haver numero.

Chamada — 44 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Adriano Machado, Adriano Sampaio, Albino Geraldes, Cerqueira Velloso, Cardoso Avelino, A. J. Boavida, A. J. Teixeira, Pinto de Magalhães, Telles de Vasconcellos, Falcão da Fonseca, Zeferino Rodrigues, Barão do Rio Zezere, Carlos Ribeiro, E. Tavares, Gonçalves Cardoso, Francisco Costa, F. M. da Cunha, Franco Frazão, Barros e Cunha, J. J. de Alcantara, Vasco Leão, Matos Correia, J. A. Maia, Bandeira Coelho, Cardoso Klerck, Figueiredo de Faria, Rodrigues de Freitas, Moraes Rego, Sá Vargas, Menezes Toste, Nogueira, Mexia Salema, Teixeira de Queiroz, Lourenço de Carvalho, Luiz de Campos, Camara Leme, Pires de Lima, Mariano de Carvalho, Cunha Monteiro, Ricardo de Mello, Visconde da Arriaga, Visconde de Montariol, Visconde de Moreira de Rey, Visconde dos Olivaes.

Entraram durante a sessão — os srs.: Agostinho de Ornellas, Osorio de Vasconcellos, Rocha Peixoto (Alfredo), Braamcamp, Pereira de Miranda, Barros e Sá, Arrobas, Sampaio, Sousa Lobo, Saraiva de Carvalho, Carlos Bento, Pinheiro Borges, Fortunato das Neves, Francisco Mendes, Lampreia, Pinto Bessa, Silveira Vianna, Guilherme de Abreu, Quintino de Macedo, Palma, Silveira da Mota, Perdigão, Candido de Moraes, Assis Pereira de Mello, Mamede, Dias de Oliveira, Luciano de Castro, Lobo d'Avila (José), Mello Gouveia, Pinheiro Chagas, Paes Villas Boas, D. Miguel Coutinho, Pedro Jacome, Pedro Roberto.

Não compareceram á sessão — Os srs. A. da Rocha, T. de Vasconcellos, Soares e Lencastre, Correia Caldeira, Barjona de Freitas, Augusto Godinho, Claudio Nunes, Conde de Villa Real, Francisco de Albuquerque, Correia de Mendonça, Bicudo Correia, Van-Zeller, Jayme Moniz, Santos e Silva, Melicio, Ribeiro dos Santos, Lobo d'Avila (Joaquim), Baptista de Andrade, Dias Ferreira, José Guilherme, Costa e Silva, J. M. dos Santos, José Tiberio, Affonseca, Rocha Peixoto (Manuel), Alves Passos, Placido de Abreu, Thomás de Carvalho, Visconde de Valmór, Visconde de Villa Nova da Rainha.

Abertura — A uma hora da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

a que se deu destino pela mesa

Officio

Do ministerio dos negocios da fazenda, satisfazendo ao requerimento do sr. deputado Eduardo Tavares com a remessa da copia do officio circular que da direcção geral das contribuições directas foi expedido em 10 de janeiro do corrente anno aos delegados do thesouro nos districtos em que foram extinctos alguns julgados.

Para a secretaria.

Representações

1.ª Da camara municipal de Silves, pedindo que seja approvado o projecto de lei apresentado pelo sr. deputado Barros e Cunha, sobre a via ferrea do Algarve. 23

2.ª Da camara municipal de Pedrogão Grande, pedindo que seja approvado o projecto de lei apresentado pelo sr. deputado José Luciano, que proroga por mais dois annos o praso estabelecido no artigo 1.° do decreto de 28 de dezembro de 1869.

3.ª Dos empregados da camara municipal de Lisboa, sobre a proposta apresentada pelo sr. ministro da fazenda, ácerca das deducções nos seus vencimentos.

4.ª Dos amanuenses de 1.ª classe do ministerio da fazenda, no mesmo sentido.

5.ª Dos thesoureiros de bancos e companhias anonymas da cidade do Porto contra a lei de 14 de maio de 1872 e regulamento de 28 de agosto do mesmo anno.

6.ª Da camara municipal do concelho de Alandroal contra o decreto de 23 de dezembro de 1873, ácerca da extincção dos julgados.

7.ª Da associação dos artistas de Coimbra, ácerca do traçado do caminho de ferro da Beira.

Foram enviadas ás commissões respectivas.

Requerimentos

1.° Requeiro que pela secretaria da fazenda sejam com urgencia remettidos a esta camara os seguintes documentos:

I Copia da portaria, ou officio pelo qual á alfandega de Lisboa foi ordenado que verificasse pelos typos hollandezes uma porção de assucar das Maurícias.

II Copia das instrucções posteriormente dadas á alfandega de Lisboa para que continuasse a usar dos antigos typos officiaes e dos hollandezes.

III Copia de quaesquer instrucções a este respeito expedidas para a alfandega do Porto.

Sala das sessões da camara, 9 de fevereiro de 1874. = Rodrigues de Freitas.

2.° Requeiro que pelo ministerio da guerra seja enviada uma nota dos fornecimentos de salitre no anno de 1873 para a fabrica da polvora, qual o preço e quaes as licitações abertas.

Sala das sessões, 9 de fevereiro de 1874. — A. Osorio de Vasconcellos, deputado por Trancoso.

3.° Requeiro que pelo ministerio da marinha seja mandada a esta camara uma nota das compras feitas no arsenal da marinha durante o anno de 1873, sem ser por licitação.

Sala das sessões, 9 de fevereiro de 1874. = A. Osorio de Vasconcellos, deputado por Trancoso.

4.° Requeiro que novamente sejam pedidos ao ministerio da marinha os documentos que solicitei em 8 de janeiro d'este anno, e a que se refere o requerimento publicado no Diario da camara d'aquelle dia. = 0 deputado, Pereira de Miranda.

Mandaram-se expedir para o governo.

Declarações

1.ª Declaro que por motivo justificado deixei de comparecer a algumas sessões. = João José de Alcantara.

2.ª Tenho a honra de participar a V. ex.ª e á camara que por falta de saude tenho faltado ás sessões desde o dia 3 (inclusive) do corrente mez de fevereiro. = Augusto Maria da Costa e Sousa Lobo.

3.ª Declaro que faltei ás sessões de 6 e 7 do corrente por motivo de serviço publico. = F. M. da Cunha.

Inteirada.

Nota de interpellação Requeiro que seja convidado o sr. ministro da marinha a responder a uma interpellação que tenciono dirigir-lhe sobre ser modificado o artigo 1:315.° do codigo commer

Página 360

360

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ciai, no que diz respeito á navegação a vapor entre as costas de Portugal e as das provincias ultramarinas da costa oriental e occidental da Africa. = 0 deputado, Carlos Bento da Silva.

Mandou-se communicar ao governo.

SEGUNDAS LEITURAS

Renovo a iniciativa do projecto de lei, que da commissão de guerra passou para a de fazenda em 1867, no qual se manda pagar ás filhas do fallecido brigadeiro José Pereira da Silva Leite de Berredo, o monte pio do tempo em que seu pae esteve expatriado por ser um dos regeneradores de 1820; advertindo, que actualmente só existo uma filha do dito brigadeiro, que é D. Maria Máxima de Brito Berredo de Mello.

Sala das sessões, 9 de fevereiro de 1874. = Adriano Carneiro Sampaio.

Leu-se na mesa o projecto, e foi admittido e enviado á commissão respectiva.

Proposta

Proponho que seja com urgencia eleita uma commissão especial de cinco membros, para dar parecer sobre o tempo em que termina a presente legislatura.

Sala das sessões, 9 de fevereiro de 1874. = Adriano de A. C. Machado.

O sr. Presidente: — Consulto a camara sobre se admitte á discussão esta proposta.

Foi admittida.

O sr. Presidente: — Está em discussão. (Pausa.)

O sr. Presidente: — Como ninguem pede a palavra, vou po-la á votação. Foi approvada.

O sr. Presidente: — Hei de dar para ordem do dia de ámanhã a eleição d'esta commissão. Vae ter segunda leitura outra proposta. F a seguinte

Proposta

Proponho que as nossas sessões passem a ser nocturnas. = Augusto Cesar Falcão da Fonseca.

O sr. Presidente: — Os srs. deputados que admittem á discussão esta proposta queiram ter a bondade de se levantar.

(Pausa.)

O sr. Secretario (Francisco Costa): — Não ha vencimento.

O sr. Presidente: — Fica para ser novamente proposta á admissão.

Foi-me enviado um officio da camara municipal de Valle Passos, acompanhando cinco representações das freguezias de Barreiros, Bouçoaes, Lebução, Padrella e Sonim, de que se compõe aquelle concelho, tendentes a mostrar que o administrador do concelho de Valle Passos não teve parte no attentado contra o juiz de direito.

Ficam sobre a mesa para poderem ser examinadas.

O sr. Mariano de Carvalho: — Mando para a mesa um projecto de lei (leu).

O sr. Presidente: — -Terá segunda leitura ámanhã.

O sr. Braamcamp: — Fiz ha dias um requerimento pedindo, pelo ministerio das obras publicas, alguns esclarecimentos a respeito das despezas realisadas com a construcção do caminho de ferro do Minho. Esses esclarecimentos ainda não vieram; pedia pois a V. ex.ª que houvesse por bem mandar instar novamente com o ministerio competente a fim de que elles me sejam remettidos.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Cardoso Avelino): — Os esclarecimentos pedidos pelo illustre deputado o sr. Braamcamp ao ministerio das obras publicas chegaram ha poucos dias.

Já dei as ordens necessarias para serem quanto antes mandados a esta camara.

O sr. Falcão da Fonseca: — Mando para a mesa uma representação de João Lourenço, escrevente da repartição de contabilidade industrial do arsenal da marinha, pedindo, em seu nome e no de outros empregados da mesma repartição, de igual cathegoria, que esta camara attenda á precaria situação em que se encontram em vista dos mesquinhos ordenados que recebem.

Não é occasião opportuna para fazer considerações a este respeito, e por isso reservo-me para depois dizer mais alguma cousa.

Peço licença para fazer uma pergunta a V. ex.ª. Ainda agora teve V. ex.ª a bondade de submetter á deliberação da camara uma proposta que eu tive a honra de mandar para a mesa, e creio que não houve vencimento.

Perguntava a V. ex.ª se ainda hoje, antes de se entrar na ordem do dia, tencionava submette-la á deliberação da camara ou ficava para ámanhã.

Devo declarar a V. ex.ª que, conformando-me sempre com as resoluções da camara, perante as quaes me curvo com submisso respeito, estimaria bastante que esta proposta não entrasse hoje em discussão, porquanto, embora seja um negocio que pertence unicamente á economia d'esta casa, acho acertado e conveniente que seja ouvido o governo a seu respeito.

Como elle não estava então presente, e talvez possa estar ámanhã, peço a V ex.ª que reserve para a seguinte sessão a admissão d'esta proposta.

O sr. Presidente: — Fica para ámanhã.

O sr. Barros e Cunha: — Hontem tive a honra de perguntar a V. ex.ª se por acaso já estava eleita ou nomeada, porque não me recordo qual das cousas foi que a camara deliberou, a commissão que deve dar parecer ácerca do meu projecto para ser revogado o decreto dictatorial ácerca das eleições, e posta novamente em vigor a legislação existente antes de 1869.

Desejava que V. ex.ª me informasse a este respeito.

O sr. Presidente: — Hei de da-la para ordem do dia de ámanhã.

O Orador: — A eleição ou a nomeação?

O sr. Presidente: — A eleição.

O sr. Barros e Cunha: — Bem. Estou satisfeito.

O sr. Assis Pereira de Mello: — Participo a V. ex.ª e á camara que o sr. deputado José Tiberio não póde comparecer á sessão de hoje por motivo justificado.

O sr. Candido de Moraes: — Peço a v. ex.ª que me reserve a palavra para quando estiver presente o sr. ministro do reino.

O sr. Pinto Bessa: — Mando para a mesa um requerimento do escrivão technico da estação de saude da cidade do Porto, pedindo á camara dos senhores deputados para ser equiparado o seu vencimento ao dos seus collegas de igual categoria das estações de Belem, Funchal e Ponta Delgada.

Peço a V. ex.ª que se digne mandar remetter este requerimento á commissão respectiva, a fim de ser tomado na consideração que merecer.

O sr. Presidente: — Vae entrar-se na ordem do dia.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.º 72 na generalidade

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. ministro das obras publicas.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Não tenciono abusar por muito tempo da attenção da camara, que está, no meu entender, sufficientemente esclarecida pelos discursos que têem sido proferidos n'esta casa, a proposito do projecto de lei em discussão, por deputados todos elles muito mais competentes do que eu para discorrer sobre a materia, e demonstrar, debaixo de um ponto de vista, as proposições que mais conformes são com o seu systema.

Mas, como o governo foi convidado a dar a sua opinião

Página 361

361

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

na commissão de obras publicas, sobre a vantagem ou desvantagem d'este projecto, e aceitou o pensamento ou o principio fundamental d'elle, tenho necessidade e obrigação de dizer á camara resumidamente as rasões que me determinaram a approvar o projecto, isto é, a extincção da engenheria districtal.

N'esta tarefa quasi que tenho sido prevenido pelos illustres deputados que combateram o projecto, porque me parece que, sem excepção de um só, todos reconheceram que a engenheria districtal, para produzir todos os effeitos uteis que ella devo produzir, precisa de uma reforma completa ou quasi total.

Desde o momento em que os illustres deputados confessam e reconhecem que a engenheria districtal, comquanto tenha em si um pensamento util, que é o da descentralisação ou o primeiro passo dado para ella, não foi organisada para produzir, debaixo d'este ponto de vista, todos os effeitos uteis que devia produzir nos municipios e districtos, quasi que posso dispensar-me da demonstração de que este projecto no seu principio fundamental é util e merece a approvação d'esta camara.

Alem d'este defeito que os illustres deputados reconheceram que havia no decreto de 30 de outubro de 1868, que creou a engenheria districtal, tenho outras rasões para não concordar completamente com aquelle decreto.

Faço justiça ás intenções do cavalheiro que referendou o decreto de 30 de outubro de 1868. Servi com elle, mereci-lhe muita estima, e tive sempre o prazer de merecer-lhe tambem completa confiança nas relações officiaes que eu, como empregado no ministerio das obras publicas, tinha com s. ex.ª

Entendo entretanto que o governo d'aquella epocha não foi completamente feliz no modo por que organisou a engenheria districtal debaixo do ponto de vista a que queria attender.

O primeiro defeito que para mira tem áquella engenheria é a dependencia absoluta em que está dos governadores civis e magistrados administrativos, que muitas vezes são levados na determinação dos seus actos e nas resoluções que tomára, com relação aos serviços technicos do seu districto, por considerações que podem não estar completamente em harmonia com os principios que determinaram os engenheiros e com os interesses a que attenderam estes funccionarios.

O illustre deputado, o sr. Bandeira Coelho, querendo attenuar este inconveniente da engenheria districtal, disse que não se podia negar que os engenheiros de districto estavam dependentes do governador civil que os nomeia e demitte, mas que havia na lei uma garantia, a favor do engenheiro, e essa garantia era que a demissão não podia ser levada a effeito sem ser ouvido o engenheiro demittido, e sem a commissão de viação dar o seu parecer sobre a defeza d'esse mesmo engenheiro.

Comquanto isto seja definitivamente uma restricção posta ao arbitrio do governador civil, peço ao illustre deputado e á camara que pondere bem como é que isto se torna exequivel e os inconvenientes que podem resultar d'este mesmo preceito.

O governador civil nomeia e destitue; mas a destituição não póde ser levada a effeito sem que o engenheiro destituido diga por que rasão o governador civil o destitue, e sobre essa exposição ha de ser ouvida a commissão de viação municipal.

Supponha o illustre deputado que isso póde acontecer, que o governador civil, levado de maus motivos, demitte sem fundamento, que a commissão inspirada pela verdadeira justiça entende que a rasão está da parte do engenheiro de districto e que dá um parecer contra o governador civil, temos um conflicto entre a commissão de viação municipal e o governador civil; conflicto que a lei não diz como ha de ser resolvido, mas que alguns jurisconsultos que ha n'esta casa dirão que se póde resolver pelas regras geraes que estão no codigo administrativo por isso que se trata de actos que são do contencioso administrativo.

São do contencioso administrativo todos os actos que ferem direitos estabelecidos.

Se nós entrarmos n'este caminho, o que acontece é que o engenheiro destituido, que tenha em seu favor o parecer da commissão de viação municipal, ha de recorrer para o conselho de districto, e tem recurso para o supremo tribunal administrativo.

Pondere bem a camara os inconvenientes que resultam d'este methodo.

O engenheiro não póde continuar a exercer o seu logar porque o governador civil o destituiu, e entretanto elle não está destituido porque a destituição não tem produzido todos os seus effeitos suppor isso que o acto do governador civil depende das deliberações do conselho de districto que como conselho inferior tem jurisdicção n'esta causa.

Mas alem d'este inconveniente no processo ha ainda o recurso para o contencioso administrativo.

Ha ainda outro inconveniente, que o illustre deputado o sr. Bandeira Coelho e toda a camara facilmente reconhecem. Ainda que a commissão de viação municipal no seu parecer fosse favoravel ao engenheiro, o governador civil já tinha manifestado por um acto publico a sua opinião a respeito da pouca confiança que linha no primeiro empregado technico do districto; e é claro que este engenheiro podia continuar a exercer as suas funcções, mas as suas relações officiaes com o governador civil não continuavam boas, e haviam de continuar cada vez mais difficeis. O governador civil havia de procurar todos os dias motivos para desviar aquelle engenheiro que não era da sua confiança; e, ou o engenheiro havia de tornar-se subserviente para conquistar-lhe as suas graças, ou então estar sempre da parte da commissão districtal ou de certas influencias do districto para combater, quanto possivel, o governador civil (apoiados). De modo que esta disposição, que o sr. Bandeira Coelho apresentou como um preceito que até certo ponto attenuava ou diminuía os inconvenientes da influencia do governador civil, afigura-se-me que não dá os resultados que s. ex.ª imagina, e que não póde, pelo contrario, senão produzir inconvenientes (apoiados). (Interrupção do sr. Bandeira Coelho.) Eu ouvi essa declaração do sr. deputado, e declaro que não a tenho em esquecimento; tanto que me hei de aproveitar d'ella.

O segundo inconveniente, e inconveniente muito grave e importante, que eu acho na organisação da engenheria districtal, como a estabeleceu o decreto de 30 do outubro de 1868, é a falta de preceitos que estabeleçam as habilitações que devem ter os differentes individuos que hão de exercer essa engenheria.

Como é que o governador civil se ha de regular na escolha e nomeação do seu pessoal?

Para a primeira nomeação o decreto providenciou, e providenciou com toda a segurança. Como aquelle decreto foi consequencia do outro que organisou a engenheria militar, como essa organisação encontrou no ministerio das obras publicas um pessoal maior do que aquelle que os seus quadros comportavam, e como o auctor da organisação da engenheria militar não quiz augmentar o numero dos empregados addidos ao ministerio das obras publicas, deu-se ao governo e aos governadores civis, com a creação da engenheria districtal e municipal, toda a facilidade n'esta primeira nomeação, porque se mandaram para os districtos individuos que estavam considerados e classificados como engenheiros do ministerio das obras publicas.

Portanto, a primeira nomeação deu em resultado a escolha de pessoas que tinham já provado, não só pelos seus titulos litterarios, mas tambem pelos serviços prestados no ministerio das obras publicas, as habilitações que possuiam

Página 362

362

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

para exercerem convenientemente as funcções de engenheiros dos districtos e dos concelhos.

Mas as nomeações successivas? Qual é a. classe onde os governadores civis hão de ir buscar as pessoas que devem exercer as funcções da engenheria districtal e municipal?

O decreto não diz cousa alguma a esse respeito; e, ainda que em boa rasão se deve entender que um governador civil não póde nem deve escolher para engenheiro pessoa que não o seja, isto é, que não tenha as habilitações correspondentes, a camara sabe muito bem que, sendo essencialmente legislativas todas as disposições que estabelecem as condições que devem reunir-se em qualquer individuo para exercer um cargo publico (apoiados), não se póde deixar a apreciação da aptidão e da sciencia de quem ha de exercer funcções publicas, especialmente quando são importantes como aquellas de que se trata, ao arbitrio e ao modo de ver de um governador civil que é hoje, e de outro governador civil que é ámanhã (apoiados).

Vem aqui a proposito ponderar o que o sr. Bandeira Coelho disse hontem no seu discurso, e me lembrou ha pouco.

O sr. Bandeira Coelho, reconhecendo, como não póde deixar de reconhecer, pelo muito que sabe e pela muita experiencia que tem d'este serviço, que a engenheria districtal não está convenientemente organisada, disse, entre outras cousas, que era absolutamente indispensavel que a lei regulasse as relações entre o governador civil e os empregados technicos do districto; e disse mais, creio eu, que tanto s. ex.ª como outros collegas da camara, para obviar ao inconveniente de que este pessoal não tem futuro, entendiam tambem que devia na lei dar-se-lhe accesso á engenheria do governo.

Não sei se esta indicação foi do illustre deputado ou do algum dos seus collegas. Eu não inventei, ouvi.

A camara vê bem que, desde o momento em que os defensores do projecto que está em discussão e os impugna-dores d'elle encontram na organisação da engenheria de-feitas d'esta ordem, a consequencia logica não é reformar o decreto, 6 extinguir a engenheria districtal, embora depois ella reappareça organisada pelo modo por que a camara entender que deve ser organisada para prestar ás localidades os serviços que deve prestar. É não merece ser reformado, porque é um decreto que não marca as condições que deve reunir cada um dos individuos que póde ser nomeado engenheiro de districto; que deixa estes engenheiros sem futuro; que não define, não estabelece nem declara positivamente as relações que deve haver entre este pessoal e o chefe superior do districto. E um decreto que se tem executado, mas que tem sido executado com grandes inconvenientes.

E n'esta parte eu não estou sendo senão o ecco do illustre deputado e de todos aquelles que têem combatido o projecto.

O sr. Bandeira Coelho: — Eu disse relativamente aos engenheiros districtaes que tinham pertencido ao antigo corpo de engenheria, que entendia que era de maxima justiça que se reparasse o mal que se lhes fez, reti-rando-os da situação em que estavam, e collocando-os em outra com futuro.

Agora, quanto aos outros engenheiros que depois desses tinham vindo para o serviço de engenheria districtal, sujeitando-se ás condições em que estava creada, não havia motivo nenhum para que se lhes garautisse melhor o seu futuro.

Creio que foram estas as minhas idéas.

O Orador: — O illustre deputado bem vê que disposições d'essas não podem deixar de estar escriptas n'uma lei, porque são direitos importantissimos.

O illustre deputado vê diante de si duas classes de engenheiros: primeiramente a classe dos que foram enviados do ministerio das obras publicas que tinham um futuro e passaram a outro serviço, onde conservaram essa posição, mas perderam o futuro; e depois outra classe de engenheiros, dos que tinham sido nomeados engenheiros districtaes depois de creada a instituição; e que essa classe fica reduzida aos mesmos termos em que estão os engenheiros districtaes.

Isso é uma disposição que influe tão poderosamente no modo do ser dos funccionarios publicos que não póde Bcr posta em pratica só pelos nossos desejos: é interpretação doutrinal do decreto; e é precisa uma disposição de lei.

E alem d'essa necessidade de disposição de lei ha outras que os illustres deputados que têem tomado parte n'e3ta discussão apontaram, e muito bem, e muito fundamentadamente.

Mas o melhor é approvar-se o projecto e a camara tomará sobre este ponto a deliberação que entender organisando a engenheria civil, mas organisando-a em condições que seja não só uma instituição util, mas que ao mesmo tempo dê garantia a todos.

Ainda acho outro defeito na engenheria districtal, e vem a ser a sua insufficiencia.

Um quadro composto de um primeiro engenheiro, de um segundo engenheiro e de um conductor, encarregado de estudar, de construir e de conservar todas as estradas districtaes e municipaes, ha de concordar o» illustre deputado que é defficiente. E d'esta defSciencia resultam os inconvenientes de que se queixam as camaras municipaes, clamando que estão pagando para a engenheria sem terem sempre á sua disposição engenheiros que lhes façam o serviço de que carecem (apoiados).

O illustre deputado dirá, e todos podem dizer, eleve-se o quadro. Mas isso é contra disposição legal. E portanto um decreto que tem todos estes defeitos na sua essencia póde ser defendido, mas não me parece que deva ser sustentado (apoiados). &

E os illustres deputados, que têem sustentado a conveniencia de haver uma só engenheria, estão defendendo uma verdadeira engenheria civil nos districtos e nos municipios.

A engenheria districtal é uma verdadeira engenheria civil (apoiados). Regras para a promoção não as ha como na engenheria militar. Os ordenados não são determinados pelas mesmas regras por que o são os ordenados da engenheria militar. Alem de que o governador civil tem a respeito de fixação dos vencimentos eventuaes d'estes empregados uma faculdade que o governo não tem a respeito dos vencimentos eventuaes dos engenheiros militares. O governador civil póde ir alem de quinze dias por mez a respeito de concessão da ajuda de custo; o governo não póde ir alem de cento e oitenta dias por anno.

Estas foram as rasões que me determinaram, em nome do governo, a aceitar o pensamento do projecto que extinguia a engenheria districtal, o n'esta parte limito-me ás considerações que tenho feito.

Não acompanho os illustres deputados na discussão, aliás imporlantis8Íma, que tem havido sobre a conveniencia ou inconveniencia de haver no paiz duas engenherias, a engenheria civil e a militar. Não entro n'essa questão. Aproveito esta occasião para declarar isto, muito francamente á camara, e para lhe declarar tambem, que me parece, posso mesmo dizer com certeza, que o projecto que se discute e que estabelece a extincção da engenheria districtal não foi elaborado nem approvado pela commissão com o pensamento reservado de restabelecera engenheria civil (apoiados).

Não foi esse, creio eu, o pensamento do illustre deputado que apresentou esse projecto, não foi esse o pensamento da commissão que o approvou (apoiados), e posso asseverar á camara que não é esse o meu pensamento, (apoiados — Vozes: — Muito bem.)

Os illustres deputados comprehendem perfeitamente que eu ministro das obras publicas não posso apresentar á camara um projecto de organisação do pessoal necessario para satisfazer os serviços technicos do ministerio das obras pu-

Página 363

363

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

blicas, senão de accordo com o meu collega da guerra, e que essa organisação ha de ser feita de acordo entre os dois ministros, attendendo cada um ás necessidades do serviço do seu ministerio.

A camara conhece as successivas organisações que tem tido o corpo technico do ministerio das obras publicas. Quando elle foi creado, a sua organisação foi militar: entrava-se para lá n'um certo posto, simplesmente para o effeito de determinar os vencimentos e ajudas de custo. Depois o sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa entendeu que devia organisar a engenheria civil, o teve motivos para isso (apoiados); faço justiça ás intenções de s. ex.ª e ás rasões que o determinaram a adoptar aquella organisação. Depois o sr. Calheiros revogou o decreto que organisava a engenheria civil e substituiu-a pela engenheria militar como está hoje. E houve um decreto do sr. Lobo d'Avila, que não teve tempo de ser executado, que destruiu a engenheria militar e fez outra organisação.

Não só por isto, mas porque differentes deputados de todos os lados da camara, que têem tomado parte n'esta discussão, e que têem promiscuamente defendido, e alguns do mesmo grupo, uns contra os outros, differentes systemas, a camara comprehende bem e eu estou intimamente convencido, que n'este ponto não ha nenhuma questão politica (apoiados); e não a deveria haver n'um ponto que é mais scientifico do que administrativo.

Digo francamente á camara, os illustres deputados sabem isto ha muito tempo, e eu disse-o ao auctor do decreto que extinguiu a engenheria civil e a substituiu pela engenheria militar, que não gosto do systema da engenheria militar como elle está, e entendo que não satisfaz ás conveniencias e necessidades do ministerio das obras publicas (apoiados). Tem para mim um defeito capital, alem de outros, e vera a ser que a lei não remunera os individuos pela importancia das funcções que elles exercem e desempenham; remunera os individuos pelo posto que elles têem!

O sr. Bandeira Coelho: — Peço a palavra.

O Orador: — Isto não quer dizer, que os differentes engenheiros de qualquer posto não tenham todas as habilitações para exercerem as funcções de engenheria, as funcções technicas do ministerio das obras publicas. Mas isto dá praticamente o seguinte resultado; e não imagino, são factos que a camara conhece. Por exemplo, quando entrei para o ministerio, exercia o cargo de director geral dos telegraphos e pharoes do reino um distincto engenheiro, um funceionario honrado como aquelles que o são, o sr. José Diogo Mousinho...

O sr. Pedro Roberto: — Apoiado.

O Orador: — Que era major, e recebia por consequencia o soldo de major, a gratificação de major, o dados os casos previstos na lei, a ajuda de custo de major. O estado perdeu aquelle grande funceionario e não tinha para o substituir senão um funceionario dignissimo, cheio de sciencia e de zêlo, mas que era e é tenente, e eu, em vista da lei, não posso remunera-lo senão dando-lhe o soldo e a gratificação de tenente, e nos casos mencionados, a ajuda de custo de tenente!

Pondere a camara se isto é justo, se é logico: um mesmo logar com a mesma importancia, com a mesma responsabilidade, com o mesmo trabalho differentemente retribuido; e tão differentemente retribuido, porque um dos funccionarios teve fortuna ou idade para adquirir um posto superior no exercito e o outro não teve fortuna ou idade para chegar a essa altura na cathegoria militar!! (Apoiados.)

Eu posso ter, e tenho tido directores de obras publicas no mesmo districto, mas uns retribuidos como majores, se têem essa patente, outros retribuidos como capitães se tambem têem essa patente, e entretanto o districto tema mesma importancia, as obras têem as mesmas difficuldades, a responsabilidade da fiscalisação é exactamente a mesma. E porque é a retribuição desigual? Porque um está mais adiantado na carreira militar do que o outro.

Tenho á disposição do ministerio das obras publicas empregados, que pelas suas habilitações, pelo seu zêlo e probidade, dão ao governo todas as garantias de que podem com vantagem do serviço ser empregados das inspecções extraordinarias que a lei auctorisa; entretanto, quando por queixas ou por suspeitas de qualquer facto menos regular que se pratica no serviço publico, a cargo do ministerio das obras publicas, n'este ou n'.aquelle districto, tenho necessidade de mandar inspeccionar esse districto, a primeira cousa de que trato, é de me informar de qual a patente do director das obras publicas d'esse districto, para escolher um engenheiro que seja official de patente superior ou da mesma patente, mas mais antigo.

Se por acaso acontecesse, o que acontece muitas vezes no ministerio da guerra, que essas inspecções se fizessem por commissões, como hontem aqui advertiu um illustre deputado, essas commissões poderiam ser compostas de officiaes de patentes inferiores; mas os chefes d'essas commissões haviam de por força ser officiaes de patentes superiores aquelles que fossem inspeccionados.

Ora, isto é uma difficuldade, porque o ministerio das obras publicas não tem um pessoal militar de tal modo abundante que possa ter engenheiros militares, que correspondam a estas condições que sou obrigado a aceitar, e que não posso deixar de observar, porque aliás ía ferir a disciplina e o pundonor de cada um dos differentes empregados que se julgariam desairados, se fossem inspeccionados por individuos de patente inferior ou igual, mas mais modernos.

Sou indifferente, declaro-o á camara, a qualquer systema de organisação; para mim o essencial para o ministerio das obras publicas é ter pessoal que desempenhe as differentes funcções technicas que forem precisas.

Eu quero que a remuneração seja proporcionada á importancia das funcções e á categoria determinada por ellas. Isto é que me parece justo e logico.

Desde que o individuo tenha conhecimento das funcções technicas e necessarias para os negocios do ministerio das obras publicas, passam a ser-lhe confiadas funcções consultivas, funcções de inspecção, funcções de direcção, e funcções de fiscalisação para as differentes companhias que têem contratos com o governo. É d'isso precisamente o que o governo carece.

Do que o governo precisa, repito, é de ter pessoal competentemente habilitado para desempenhar cada uma destas funcções nas differentes categorias, sendo as categorias determinadas pela importancia das funcções, e sendo a remuneração proporcionada ás funcções.

Desde o momento em que o governo tenha á sua disposição um pessoal que possa empregar convenientemente no desempenho d'estes serviços pelo modo por que o entendo, as categorias desapparecem, e os membros da junta consultiva hão de ser de categoria superior aos inspectores, os inspectores de uma categoria superior aos directores, os directores de uma categoria superior aos engenheiros subalternos que estiverem ás suas ordens para chefes de secção, e a remuneração ha de ser determinada pela importancia das funcções, tendo tambem em vista as difficuldades d'ellas.

Assim não ha nem coroneis, nem tenentes coroneis, nem majores; podem ser tudo isso, podem não perder os seus postos, e entretanto vem para o ministerio das obras publicas desempenhar umas certas funcções, e da importancia d'essas funcções deduz-se qual a sua categoria. E se não quizerem não lhe dêem categoria nenhuma, porque reconheço que hoje a cousa mais difficil que ha é a classificação.

Não basta que cada um esteja classificado pela importancia das funcções que desempenha; o que é justo é que cada um receba a remuneração pelos serviços que faz (apoiados).

Se por acaso o decreto de 30 de outubro, que extinguiu a engenheria civil, e estabeleceu a engenheria militar, desse

Página 364

304

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ao ministerio das obras publicas um quadro que fosse suficiente para a distribuição d'esse pessoal por todas as categorias, o inconveniente tinha desapparecido, e eu estava contente; mas não deu, e esta falta torna-se mais sensivel desde que por muito tempo se não auctorisa no orçamento o preenchimento do quadro legal da engenheria com o fim de conseguir rapidamente o equilibrio do mesmo orçamento.

Ha outro inconveniente que quero ponderar á camara, e não abusarei por mais tempo da sua paciencia.

Todos os membros que compõem a junta consultiva do ministerio das obras publicas devem ter o mesmo trabalho, e todos têem as mesmas habilitações; entretanto a junta consultiva e composta de coroneis, de tenentes coroneis e de majores, e por consequencia os membros da junta recebem a retribuição que o determinada pelo seu posto, e não pelas funcções que exercem.

Como a camara sabe, houve sempre, desde o principio, na engenheria um elemento militar e outro civil.

O ministerio das obras publicas tem hoje o quadro legal do decreto de 30 de outubro, tem addidos em consequencia das faltas que não têem sido preenchidas, e tem engenheiros civis com graduação militar, que são officiaes que faziam parte da engenheria civil, e que emquanto não chega a occasião de serem promovidos nas suas respectivas armas, estão a fazer serviço no ministerio das obras publicas. De modo que o ministerio das obras publicas tem hoje tres especies differentes de pessoal technico; o pessoal legal, o pessoal addido e o pessoal que espera por uma colocação superior. Isto é bom para o serviço? Declaro francamente á camara que não (apoiados).

Precisa-se de uma organisação, é absolutamente indispensavel, mas essa organisação não a póde o governo fazer senão combinando as necessidades do ministerio das obras publicas com as do ministerio da guerra.

Nas considerações que acabo de fazer á camara parece me que disse clara e francamente as rasões que tinha para approvar o pensamento do projecto. Tambem me parece que expuz a minha opinião sobre o estado actual da organisação do ministerio das obras publicas com relação ao seu pessoal technico, e as rasões que tinha para não julgar sufficiente para o serviço a organisação actual. E disse as rasões por que o governo não tem apresentado a reforma d'aquelle serviço.

Mas ainda ha outra rasão. Eu declaro á camara que não quero conquistar do paiz a gloria de reformador. Estou intimamente convencido, pela experiencia de homem publico, de que o serviço publico não aproveita com as successivas reformas (apoiados). Havia uma reforma fundamental em 1868. Quando eu entrei no ministerio foi em 1871, entendi que era preciso que essa reforma demonstrasse pela sua execução sincera e pela pratica todas as suas vantagens, ou demonstrasse tambem pela sua execução sincera e pela pratica todos os seus defeitos, ou, emfim, demonstrasse uma e outra cousa para em resultado d'isso o parlamento, a que compete soberanamente a resolução de taes assumptos, decidir se ha de conservar, se ha de substituir, ou se deve reformar.

Concluindo, peço á camara me desculpe o tempo que lhe tomei.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

O sr. Carlos Ribeiro: — A redacção dos artigos 5.° e 7.° do projecto tal qual está tem suscitado algumas duvidas por não se ficar sabendo se continua ou não a subsistir a disposição do § 2.° do artigo 10.° da carta de lei de 6 do junho de 1864.

Devo informar a camara que não foi intenção da commissão prejudicar ou fazer revogar com o projecto que se discute as disposições das cartas de lei de 15 de julho de 1862 e 6 de junho de 1864, relativas á viação municipal. Foi para tirar todas as duvidas que a commissão resolveu mandar para a mesa uma substituição nos seguintes termos (leu).

Leu-se na mesa a seguinte

Substituição ao artigo 7.º Continuam em vigor todas as disposições das leis de 15 de julho de 1862 e 6 de junho de 1864, relativas á viação municipal, ficando revogada toda a mais legislação em contrario.

Sala das sessões, 10 de fevereiro de 1874. = Carlos Ribeiro, relator]

Foi admittida, e ficou conjunctamente em discussão. O sr. Presidente: — Peço a attenção da camara. Hontem, no fim da sessão, leu-se a ultima redacção do projecto relativo aos julgados, mas não chegou a approvar-se, porque já não havia numero na casa.

Portanto vae ler-se novamente para depois ser submettido á deliberação da camara. Leu-se na mesa.

O sr. Presidente: — Vou consultar a camara sobre se approva esta ultima redacção.

O sr. Saraiva de Carvalho: — Peço a palavra para um requerimento.

O sr. Presidente: — Tem a palavra. O sr. Saraiva de Carvalho: — Este projecto é importante (apoiados).

A leitura da sua ultima redacção feita na mesa não póde ser ouvida por muitos srs. deputados, que portanto não poderam, como eu não pude, aprecia-la e saber se estava conforme' o pensamento da camara que approvou o projecto e differentes emendas a elle offerecidas.

N'estes termos pedia a V. ex.ª que tivesse a bondade de consultar a camara sobre se queria que fosse impressa a ultima redacção do projecto, e distribuida pelos srs. deputados, para depois de examinada ser votada (apoiados).

Isto não e duvidar de que a illustre commissão de redacção não tivesse procedido conforme as votações da camara. Os dignos membros d'essa commissão são bastante illustrados, e merecem a todos nós a maior confiança. Mas póde acontecer que haja uma transformação da nomenclatura juridica que altere completamente o nosso pensamento. É, em ultima analyse, a camara é que é o tribunal competente para a final decidir se a redacção está conforme com o que se venceu.

O sr. Presidente: — Vou submetter á votação da camara ò requerimento do sr. deputado.

A camara decidiu que fosse impressa e distribuida a ultima redacção do projecto.

O sr. Presidente: — Peço a attenção da camara. Alguém me fez ver umas representações que vem publicadas no Diario da camara, a fl. 328, representações que eu aqui apresentei por me haverem sido remettidas na qualidade de presidente da camara, e que não li, nem examinei, e declaro francamente que se as tivesse lido e examinado nem as teria apresentado, e muito menos consentido que fossem impressas no Diario da camara, porque trazem expressões offensivas a dois dos nossos collegas da camara, e que por nenhum modo se podem admittir. Dou esta satisfação á camara, satisfação do erro que houve.

O sr. Mariano de Carvalho: — Podia ter-me visto collocado em embaraços para discutir este projecto, se não fóra o discurso do illustre ministro das obras publicas que a camara acaba de ouvir com a attenção que sempre lhe merecem as palavras de s. ex.ª A difficuldade proviria bastante do muito que o projecto tem sido discutido, e mais ainda, de que o projecto já não existe, nem sabe ninguem o que se discute.

No projecto havia um artigo 4.° que tinha por fim obrigar as camaras municipaes ao pagamento do pessoal da engenheria districtal, ainda depois de extincta essa engenheria. Este pensamento luminoso foi substituido por outra cousa que não posso n'este momento apreciar, nem sei o que seja (apoiados).

Página 365

365

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Havia uma disposição que, revogando a legislação de 1864, impedia as camaras municipaes de escolherem pessoal da sua confiança para fazer o serviço das estradas municipaes. Esta disposição, porém, foi substituida por outra que tambem não posso discutir n'este momento, porque acaba de ser apresentada na mesa e ignoro em que consista. Por consequencia não conheço as vantagens ou inconvenientes d'esta nova disposição (apoiados).

Deve pois dizer-se em abono da verda, que o projecto primitivo não existe já, que discutimos o incógnito e o confuso, cousa pouco propria da seriedade do parlamento. N'estas circumstancias ninguem negará a conveniencia do projecto voltar á commissão para ser estudado de novo e com madureza.

(O sr. Carlos Ribeiro dá explicações.)

As palavras do illustre relator da commissão mais me confirmam na idéa de que este projecto não se póde votar sem ir de novo á commissão.

Ninguém na camara tinha ainda dito que o artigo 4.º a que o illustre relator se referiu tinha inconvenientes na sua redacção: foi a illustre commissão quem começou a suspeitar de que a sua obra não era boa, e tal peso fez no seu animo esta suspeita, que a obrigou a pôr no projecto um novo artigo. Succedeu outro tanto com o artigo 5.° Ambos julgava a commissão excellentes, ambos começou a suspeitar que eram detestaveis. Assim temos a commissão todos os dias mortificada com duvidas e suspeitas novas. Quem nos diz que não offerecerão ámanhã novas suspeitas? Quem me diz que a nova redacção não será tambem defeituosa, e que finalmente o projecto não será todo um projecto de suspeitas? Por mim suspeito d'elle.

Por consequencia, das palavras do illustre relator deduz-se unicamente que o projecto deve voltar á commissão para desvanecer todas as suspeitas e apprehensões que tenha e ainda possa ter, e para que nós possamos votar com perfeito conhecimento de causa (apoiados).

O nobre ministro das obras publicas terminou o seu discurso, dizendo que não queria as glorias de reformador. Quer esta abnegação de s. ex.ª proviesse de modestia, de jesuitismo ou de corrupção, s. ex.ª não quer de modo nenhum similhantes glorias.

Não precisava s. ex.ª dize-lo. Effectivamente o estado em que se acha o serviço technico do ministerio das obras publicas, quando á frente d'esse ministerio se acha um cavalheiro tão competente como s. ex.ª, prova a verdade do que o illustre ministro affirma. Temos um serviço de engenheria anarchico e insufficiente para as necessidades do serviço (apoiados), mas conserva-se e mantem-se.

Temos no poder um ministro que reconhece este facto, mas que o deixa continuar. Se o nobre ministro não receiasse que lhe enflorassem a cabeça os lauréis de reformador, de certo não se teria abstido de reformar o que ha de defeituoso no seu ministerio, de pôr termo na anarchia, e de nos dar um serviço technico de obras publicas como elle é em outros paizes e como deve ser entre nós!

E verdade que s. ex.ª allegou outra rasão igualmente ponderosa para desculpar o governo, quando nos disse que não podia apresentar um plano de organisação do serviço de engenheria, porque não chegára a nenhum accordo com o seu collega da guerra.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — O que eu disse foi, que não podia apresentar um plano de organisação sem ir de accordo com o meu collega da guerra; mas não disse a s. ex.ª nem á camara que eu não estava de accordo com elle; nem o podia dizer porque isso significaria um facto que não era verdadeiro. Preciso do accordo do meu collega da guerra para apresentar esse plano.

O Orador: — Quer dizer, s. ex.ª ainda não teve tempo para estar de accordo com o seu collega da guerra ácerca da reforma do serviço da engenheria, e ao mesmo tempo reconhece que o serviço das obras publicas não se póde fazer convenientemente com a actual organisação.

Quando se reconhece um facto d'estes, por muitos receios que haja de incorrer no crime de merecer as glorias de reformador, parecia-me que devia haver alguma pressa em se concordar com o ministerio da guerra. Não é toleravel que o sr. ministro das obras publicas todos os dias proclame e lamente os vicios e defeitos da organisação da engenheria, e que em dois annos e meio de governo não tenha disposto de um momento para concordar com o seu collega da guerra de modo que cessem as calamidades que o magoam.

Nem comprehendo as difficuldades e demora do accordo n'um ministerio solidario; em face das doutrinas da solidariedade o sr. ministro das obras publicas tem apenas que pôr-se de accordo comsigo proprio. De modo que a falta de accordo não é, nem póde ser desculpa.

Não é difficil descobrir o motivo por que o nobre ministro não quiz as glorias de reformador, nem precisámos recorrer á ingenuidade, ao jesuitismo, ou á corrupção. O nobre ministro pelo que diz respeito á engenheria districtal quiz as glorias de destruidor; pelo que respeita á engenheria civil pretende a de creador.

A engenheria districtal, diz o sr. ministro, tem varios defeitos. Estamos de accordo. Tambem eu digo que a engenheria districtal tem defeitos.

Parecia, porém, que o meio de remediar esses defeitos seria reformar a engenheria districtal. Mas o sr. ministro, que por modo nenhum quer as glorias de reformador quando mesmo esteja de accordo com o sr. ministro da guerra, protesta que as cousas defeituosas não se corrigem, mas se destroem. Seja assim.

Se applicarmos o argumento á engenheria do ministerio das obras publicas, que s. ex.ª confessa ser defeituosissima, deve propor-se de accordo com as palavras de s. ex.ª, que, em logar de se reformar esse serviço, se destrua tudo para depois se organisar de novo.

D'esta maneira fica com as glorias de destruidor e sem aquellas palmas de reformador, que tanto o assombram e assustam. É commodo e simples.

O nobre ministro, depois de compendiar algumas rasões apresentadas por outros oradores para combater o decreto de 30 de outubro de 1868 que organisou a engenheria districtal, descobriu novos defeitos que apresentou á camara. O primeiro defeito foi a dependencia absoluta entre o engenheiro de districto e o governador civil, dando origem a formidaveis conflictos. O nobre ministro apresentou os governadores civis como creaturas uzeiras e vezeiras de praticarem desacertos, desprezando os interesses publicos, para só attenderem a interesses facciosos.

Realmente o conceito que o sr. ministro das obras publicas faz dos governadores civis do continente e ilhas adjacentes é o mais lisonjeiro que se póde fazer. Empregados que dispendem o tempo em atropellar os interesses publicos para servir a politica facciosa.

Parece-me que n'este ponto o sr. ministro das obras publicas tambem não teve tempo de estar de accordo com o seu collega do reino. O sr. Sampaio tem tal confiança nos seus governadores civis que, apesar das queixas que contra elles se tem apresentado, ainda não demittiu nenhum (apoiados). O sr. Avelino faz dos governadores civis passados, presentes e futuros, o juizo lisonjeiro que a camara ouviu.

Nem eu sei mesmo como um ministro da corôa possa combater este defeito da dependencia absoluta em que o engenhero está do governador civil. Os governadores civis são as creaturas, são as auctoridades que exercem a acção mais directa do governo, que representam mais este, que são a [sua mais directa emanação. Desde o momento em que o governador civil proceder abusivamente a respeito da engenheria districtal, o unico responsavel é o governo. Pois o governo queixa-se de que a engenheria districtal dependa d'elle por intermedio do governador civil seu agente,

Página 366

366

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

e julga excellente que dependa d'elle por intermedio doutros quaesquer agentes.

Tirar a engenheria districtal da dependencia dos governadores civis para a collocar na dependencia absoluta do governo, é collocal-a nas mesmas circumstancias visto que nao posso distinguir o governador civil do governo, de quem este é agente de confiança.

O nobre ministro das obras publicas figurou um conflicto que imaginou poder dar-se entro o engenheiro do districto e o governador civil. O caso é o seguinte: o governador civil demitte o engenheiro, mas este não póde ser demittido sem voto da commissão de viação. Supponhamos que esta commissão deu um voto contrario á demissão; n'este caso o engenheiro não está completamente demittido, mas não póde lazer serviço e a commissão fica em conflicto com o governador civil. Não percebo bem este argumento, peço licença para dizêl-o.

O artigo 4.° do decreto de outubro de 1808 diz que o engenheiro de districto não póde ser demittido sem o voto affirmativo da commissão de viação municipal. Se o voto for contrario á demissão o engenheiro não fica demittido, nem completa nem incompletamente e portanto continua a fazer serviço. O districto não fica sem engenheiro. E o conflicto entre a commissão e o governador civil não me preoccupa porque é similhante aos que podem dar-se e se dão effectivamente entre o governador civil e a junta geral ou o conselho de districto.

O segundo defeito apontado pelo sr. ministro das obras publicas foi que o decreto do 30 de outubro de 1868 nada prescreve ácerca das habilitações exigiveis aos engenheiros districtaes a nomear, nem determina o modo da nomeação.

O sr. ministro das obras publicas parece que se esqueceu completamente do decreto de 30 de outubro de 1868, aliás não teria argumentado de similhante maneira. Eis o que diz o artigo 2.°:

«Os engenheiros das repartições de obras publicas do districto deverão ser habilitados com um curso de engenheria professado em escola official e conhecida.»

Já ficámos sabendo que o pessoal ha de ser nomeado de entre os engenheiros que tiverem carta de curso scientifico. Alem d'isso s. ex.ª reconhece de certo que se o decreto de 30 de outubro fosse lealmente cumprido, até as formalidades mais minuciosas da nomeação do pessoal estariam todas prescriptas e reguladas. Com effeito o artigo 11.° do decreto manda que o governo faça os regulamentos necessarios para a execução da lei. Ora n'esses regulamentos é que se haviam de estabelecer as condições e formalidades, com que o pessoal devia ser nomeado

Se o governo não quiz fazer regulamento, a culpa é só d'elle, porque não sympathisa com aquelle decreto. Quem assim procede não póde combater o decreto que não. cumpre. Parece-me ter mostrado que os gravissimos defeitos que o sr. ministro tinha descoberto não existem, ou se alguma defficiencia ha, tem d'ella responsabilidade o ministro censor que não cumpre lealmente o decreto.

Cumpra-se a lei lealmente, e se por ventura na pratica se reconhecer este ou aquelle defeito, emende-se. Assim procedem os governos prudentes e sensatos, que sem pretenderem honras de destruidores ou creadores, se limitam modestamente a reformar.

O sr. ministro das obras publicas não comprehende este systema. Em vendo defeito n'alguma cousa, deita mão d'ella e trata de destrui-la. Lembra o medico, que, sendo chamado para tratar de um doente, começasse por mata-lo para o curar depois. Seria como se, precisando o exercito reformas, o ministro da guerra começasse por extinguil-o para depois crear novo exercito.

Assim igualmente, como dizem que o serviço da engenheria districtal tem alguns defeitos na sua organisação, determinam que morra essa instituição para depois se tirar do nada uma nova engenheria (apoiados).

Devo lembrar n'este momento, que o sr. ministro das

obras publicas nunca se quiz prestar a defender as diversas disposições do projecto que têem sido combatidas. S. ex.ª persiste sempre em declarar que só approva o pensamento do projecto, e quando a phrase lhe trahe a idéa tem logo o cuidado de dizer, que se refere simplesmente ao pensamento do projecto.

S. ex.ª declarou, pois, que approvava o pensamento do projecto pelas conveniencias do serviço publico e por interesse dos funccionarios. Pelas conveniencias do serviço publico, visto que a engenheria districtal não chega para as necessidades do serviço. Como não chega, o melhor é supprimir a engenheria districtal. Temos aqui um milagre igual ao dos pães e dos peixes: supprimida a engenheria districtal, cada engenheiro se torna em dois e chegam para o serviço. E muito engenhoso e ainda mais milagroso.

Pois não seria melhor obrigar o governo os engenheiros districtaes a irem para os seus logares desempenhar as suas funcções? N'esse caso faltaria menos pessoal.

Se ha falta de pessoal o sr. ministro é o culpado por ter tirado os engenheiros districtaes para o serviço do estado (apoiados).

Se ha falta de pessoal proveniente da organisação, o remedio é reformar a organisação, augmentando o mesmo pessoal; se a falta é do governo por ter tirado os funccionarios á engenheria districtal, restitua-lh'os que é a sua obrigação. O que não podia era tirar-lh'os, dando a esses individuos arbitrariamente collocações e vencimentos illegaes e excessivos.

O decreto de 30 de outubro de 1868, como não revogou a legislação de 1862 a 1864, deu mais pessoal para o serviço municipal e districtal do que davam aquellas leis.

Esta legislação permittia que fossem empregados na viação municipal os engenheiros do estado; o decreto de 1868 dá aos conselhos e aos districtos a engenheria districtal e todos os individuos que as camaras queiram ajustar para o mesmo serviço. Portanto não é pelo lado do bom serviço que o projecto póde ser defendido; não é para dar mais engenheiros ao serviço municipal, porque lh'os tira; é para outros fins que já foram apontados por alguns illustres deputados. Os engenheiros ficam sendo os mesmos antes e depois. Antes serviam só os concelhos e os districtos; agora servem estas circumscripções e tambem o estado.

Pelo lado do interesse do pessoal tambem o projecto não é defensável. Com effeito o artigo 3.° diz:

«O pessoal das repartições extinctas terá no ministerio das obras publicas a collocação e remuneração, que pelas suas habilitações lhe couber ou pertencer conforme a legislação actualmente em vigor. »

Qual collocação? Qual cathegoria? Qual remuneração? Responde o projecto que são as que constam das leis em vigor. Quaes são as leis em vigor? São as de 1868. Quaes são os vencimentos a que têem direito os engenheiros da viação districtal? Os vencimentos dos engenheiros districtaes e nenhuns outros.

O sr. Carlos Ribeiro: — E minha opinião que da parte do governo se procederia com estes empregados do mesmo modo que se procedeu com os engenheiros civis.

O Orador: — Ahi confessa V. ex.ª que o seu fim, o fim d'este projecto, é unicamente restaurar a engenheria civil. Diversos deputados o disseram, V. ex.ª o negou e agora o confessa. Muito bem.

Mas a opinião do sr. deputado, por muito respeitavel que seja, não é a lei. A lei que estamos discutindo, manda que os engenheiros districtaes tenham no ministerio das obras publicas a situação, a collocação e os vencimentos que determina a legislação em vigor. A situação é a de addidos, a collocação é a de addidos, o presente é de terem a remuneração de engenheiros districtaes, unica legal, o futuro é o de ficarem privados de accesso. De modo que os engenheiros districtaes, feridos em direitos que julgo legitimos, em vez de receberem a justiça que lhe é devi-

Página 367

367

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

da, ficam na pessima situação actual. O projecto passa por cima d'elles, não lhes faz justiça; não lhes dá vantagens; unicamente cuida de fundar uma engenheria civil anarchica, cahotica, sujeita meramente ao arbitrio ministerial.

Esta situação detestavel resulta da má redacção do projecto, que seguramente não tinha similhante intuito.

A proposito notarei ainda uma omissão do projecto.

O decreto de 30 de outubro de 1868 incumbia á engenheria districtal o serviço de afilamento e verificação dos pesos e medidas. O projecto em discussão não diz quem haja de substitui-la n'este ramo importante do serviço publico. Pois é preciso que o diga.

De quanto levo dito dos muitos argumentos adduzidos pelos oradores que me precederam, conclue-se que este projecto não preenche os fins que os seus auctores tinham em vista, é omisso e confuso.

Estude-o de novo a commissão de obras publicas, examine-o a commissão de administração publica porque o assumpto é importante para ella, discuta-o a commissão de fazenda porque se faz augmento de despeza e, corridos todos estes tramites e bem redigido o projecto, poderemos organisar melhor um serviço essencialissimo para os progressos da civilisação.

Disse o illustre relator da commissão em uma das ultimas sessões que o decreto de 30 de outubro de 1868 nem se quer era o primeiro passo no caminho da descentralisação, porque a verdadeira descentralisação estava nos decretos de 1862 e 1864.

Vejo que se falla muito em Portugal na descentralisação sem se saber verdadeiramente o que ella é.

Eu não comprehendo a descentralisação senão como a administração autonómica de cada uma das localidades pelos interessados n'essas localidades. Julga-o necessaria porque não é possivel impor á provincia do Alemtejo as mesmas regras de administração que se impõem á provincia do Minho.

Não é possivel que uma cidade, como Lisboa ou Porto, seja administrada como o burgo mais pobre e obscuro. Julgo-a necessaria porque sem ella não ha liberdade, em boa, administração, porque é a escola politica por essencia.

É verdade que as leis de 1862 a 1864 prestaram grandes serviços aos melhoramentos publicos, mas não são leis descentralisadoras. A descentralisação é a harmonia na diversidade, a centralisaçâo, a uniformidade levada até a unidade. Ora as leis citadas decretam a uniformidade e coarctam a iniciativa local.

Cada camara municipal ha de reservar uniforme e necessariamente uma parte determinada da sua receita para viação municipal e obriga-se assim um concelho, que não póde construir estradas municipaes, a metter no cofre da viação districtal um terço da sua receita. Outra camara não póde construir as sufficientes, porque a lei não lh'o permitte.

As leis de 1862 a 1864 o que fizeram foi estabelecer a melhor organisação de obras publicas, que era compativel com a legislação existente.

O decreto de 30 de outubro de 1868 é mais descentralisador que as leis de 1862 e 1864, mas ficou incompleto, porque não lhe correspondeu a reforma administrativa correlativa.

Se o governador civil fosse o representante e o administrador dos interesses locaes, em vez de mero agente politico do governo central, não haveria inconveniente nenhum em lhe ficar subordinada a engenheria districtal.

Vou concluir.

Este projecto é omisso, confuso e não preenche os fins que os seus auctores tinham em vista, que era melhorar o serviço publico. Não o melhora porque não dá mais engenheiros, nem aperfeiçôa os meios de os pôr em acção. Não aproveita aos engenheiros districtaes porque não lhes dá melhor situação, nem maiores vencimentos, nem accesso. Por 23*

consequencia, parece-me que a questão devo de novo ser estudada e depois resolveremos aquillo que for mais conveniente e mais justo (apoiados). Vozes: — Muito bem.

Leu-se na mesa a seguinte proposta de adiamento: Proponho que seja adiada a discussão do projecto de lei n.º 72 até que dêem parecer sobre elle as commissões de administração publica e de fazenda. = Mariano de Carvalho.

Foi apoiado o adiamento.

O sr. Klerk: — Requeiro a V. ex.ª que consulte a camara sobre se a generalidade do projecto está sufficientemente discutida.

Julgou-se discutida a generalidade do projecto.

O sr. Presidente: — A camara sabe que ha cinco moções de adiamento; vão ler-se pela ordem da sua apresentação.

O sr. Pinheiro Borges: — Requeiro para retirar a minha proposta de adiamento, e aceito a do sr. Mariano de Carvalho.

O sr. Secretario (Francisco Costa): — V. ex.ª tem duas propostas de adiamento.

O sr. Pinheiro Borges: — Uma não é de adiamento; mas retiro a primeira que apresentei com relação a ser convidado o sr. ministro das obras publicas a apresentar um projecto de reforma.

Consultada a camara, resolveu que o sr. deputado podesse retirar a sua proposta.

O sr. Candido de Moraes: — Tambem requeiro a V. ex.ª que consulte a camara sobre se permitte que eu retire a minha proposta de adiamento.

A camara annuiu.

(Leu-se a proposta de adiamento do sr. Osorio de Vasconcellos.)

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Eu desejava ouvir a opinião do illustre ministro das obras publicas sobre esta proposta. Desejava que s. ex.ª me dissesse se estava ou não resolvido a apresentar uma reforma do pessoal technico de engenheria, e se por ventura já tem fallado com o seu collega da guerra ácerca d'este assumpto.

O sr. Presidente: — A materia já está julgada discutida.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Não discuto; é uma simples pergunta que faço ao sr. ministro das obras publicas. Se s. ex.ª entende que não póde apresentar essa reforma, então desisto da minha proposta.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Para satisfazer o illustre deputado direi que n'esta sessão não a apresento.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Bem; então peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre se permitte que retire a minha proposta de adiamento.

A camara conveio em que o sr. deputado retirasse a sua proposta de adiamento.

O sr. Presidente: — Restam unicamente duas propostas de adiamento; a do sr. Mariano de Carvalho e a do sr. Pinheiro Borges. Vae ler-se esta que é mais antiga.

Leu-se e foi rejeitada.

Leu-se a proposta do sr. Mariano de Carvalho.

O sr. Mariano de Carvalho: — Requeiro a V. ex.ª que consulte a camara sobre se quer que seja nominal a votação ácerca d'essa proposta.

A camara resolveu que a votação fosse nominal.

Feita a chamada:

Disseram approvo os srs.: Adriano Machado, Osorio de Vasconcellos, Braamcamp, Cerqueira Velloso, Pereira de Miranda, Saraiva de Carvalho, Pinheiro Borges, Francisco Mendes, Lampreia, Pinto Bessa, Silveira Vianna, Candido de Moraes, Assis Pereira de Mello, Barros e Cunha, Bandeira Coelho, Rodrigues de Freitas, José Luciano, Teixeira de Queiroz, Luiz de Campos, Pires de Lima, Paes Villas Boas, Mariano do Carvalho, D. Miguel Coutinho.

Página 368

368

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Disseram rejeito os srs.: Adriano Sampaio, Agostinho de Ornellas, Albino Geraldes, Rocha Peixoto (Alfredo), Cardoso Avelino, Barros e Sá, A. J. Boavida, Pinto Magalhães, Sampaio, Telles de Vasconcellos, Falcão da Fonseca, Sousa Lobo, Zeferino Rodrigues, Barão do Rio Zezere, Carlos Ribeiro, E. Tavares, Vieira das Neves, Gonçalves Cardoso, Guilherme de Abreu, Palma, Perdigão, Franco Frazão, Vasco Leão, Mamede, J. A. Maia, Cardoso Klerk, Dias de Oliveira, Lobo d'Avila (José), Nogueira, Lourenço de Carvalho, Camara Leme, Cunha Monteiro, Pinheiro Chagas, Pedro Jacome, Pedro Roberto, Visconde da Arriaga, Visconde de Montariol, Visconde de Moreira de Rey, Visconde dos Olivaes, Sá Vargas, Ricardo de Mello, Francisco Costa.

Foi, portanto, rejeitada a proposta por 44 votos contra 23.

Seguidamente foi approvado o projecto na generalidade. O sr. Presidente: — Passa-se á especialidade. Está em discussão p artigo 1.° (Leu-se.)

O sr. Bandeira Coelho: — O illustre ministro das obras publicas declarou que aceitava unicamente o pensamento do projecto; e apesar de se ter affirmado que a questão não era politica, a maioria d'esta casa, pelo facto, creio eu, da declaração do sr. ministro, de que concordava com o pensamento do projecto, rejeitou o adiamento e approvou-o na generalidade.

Mas o que eu creio que se não póde deixar de tomar em consideração é a declaração do illustre ministro, de que não approvava senão o pensamento do projecto. Logo, se s. ex.ª achou o projecto mal confeccionado, se as suas disposições não estão bem organisadas, é indispensavel que volte á commissão, para que ella considere as substituições que durante a discussão têem sido mandadas para a mesa, substituições importantissimas, que alteram a essencia do projecto nos seus artigos.

Emfim creio que a maioria está satisfeita com a votação que acaba de ter logar, e não se opporá agora a que a commissão de obras publicas, estudando este assumpto com mais vagar, coordene e modifique os artigos do projecto, visto que esta deliberação já não contraria o pensamento dos illustres deputados que desejam a extincção da engenheria districtal.

O sr. Pinheiro Borges: — A minha indicação é quasi no mesmo sentido da do meu illustre amigo o sr. Bandeira Coelho. Eu estimei muito que tenha havido larga discussão sobre este assumpto e a camara teve occasião de reconhecer que ella não foi perdida, visto que o sr. relator da, commissão já por duas ou tres vezes mandou para a mesa substituições aos pontos mais importantes do projecto. A discussão não tem sido portanto inutil nem perdida, porque foram attendidas as reclamações das camaras municipaes, que servindo de pretexto ao projecto eram comtudo por elle desconsideradas (apoiados), e porque julgo reconhecido que o projecto tal qual se apresentou não póde ser approvado na especialidade, porque não diz quem fica encarregado do serviço e não diz quaes são os vencimentos com que fica o pessoal technico que passa para o ministerio das obras publicas, nem regula o que faltava regular na lei de 1864, isto é, a epocha das reuniões das commissões de viação para determinar os trabalhos e estudos que se hão de fazer cada anno.

Para obviar a estes inconvenientes é que eu mandei para a mesa a minha substituição. Bem sabia qual era o resultado que esperava a minha proposta de adiamento, bem sabia que o projecto saía approvado na generalidade, e por isso mesmo que o considero omisso e obscuro desejo que na discussão da especialidade fique completo e offereça os esclarecimentos que acima referi.

A substituição diz quem é que ha de fazer o serviço, e n'este ponto não me' quero afastar do projecto do illustre deputado, adoptei a sua propria redacção (leu):

Com relação á collocação do pessoal me cingi quanto pude á redacção do projecto que se discuta para satisfazer o meu espirito, e para corresponder aos desejos da camara, que julgo não quererá approvar o arbitrio, entendi que era necessario estabelecer quaes eram os vencimentos, e preencher por este modo uma omissão do projecto.

Alem d'isso, como se tratava de um dos meios necessarios para o desenvolvimento tanto da viação geral como da viação municipal, julguei conveniente estabelecer regras para que não falte o pessoal absolutamente aos municipios que d'elle necessitem, isto é, para que pela extincção da engenheria districtal não resulta a extincção da viação municipal.

Limito-me por agora a estas observações, ratificando todos os argumentos que apresentei quando discuti a generalidade do projecto para mostrar que da minha parte, dando rasão ás representações das camaras municipaes quando estas julgavam injusto pagar a um pessoal, quando este lho não prestava serviço, não lh'a dou quando para remedio do mal indicam a extincção do elemento que ámanhã lhes póde ser necessario. O remedio indicado seria o mesmo que cortar o pescoço ao doente, para que lhe não dôa a cabeça. Insisto novamente para que o projecto volte á commissão de obras publicas para, esta apreciar não só a substituição, que offereci, como as propostas do seu relator, que alteram algumas das partes mais importantes do projecto. Mando portanto para a mesa a seguinte proposta (leu).

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta de adiamento

Proponho que o projecto volte á commissão, para fazer na especialidade as alterações que o ex.mo relator indicou que podiam ser adoptadas. = Pinheiro Borges.

Foi apoiado o adiamento e entrou em discussão.

O sr. Luciano de Castro (para um requerimento): —

Peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre se permitte que eu use da palavra para tratar de um incidente pessoal, por causa de umas representações que foram publicadas no Diario da camara.

A camara annuiu.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Luciano de Castro.

O sr. Luciano de Castro: — V. ex.ª ha de estar certo de que ha poucos dias dei á camara conta de um acontecimento de que fui informado por uma carta de Valle Passos, assignada por um cavalheiro que me merece toda a consideração. Refiro-me ao attentado que se tinha praticado n'aquella terra contra o juiz de direito, o sr. Guilherme da Costa Lira. Li á camara um periodo d'essa carta, no qual se insinuava que o administrador do concelho era cumplice no mesmo attentado. Não tomava nem podia tomar sobre mim a responsabilidade que provinha d'aquella informação. Limitei-me a ler a carta e a pedir ao sr. ministro do reino que tomasse as informações necessarias para ser punido quem o merecesse. Longe estava eu de pensar que o administrador do concelho, ou quem o patrocina e apadrinha a sua causa, tomasse das minhas pobres e inoffensivas palavras a desforra de que vou dar conhecimento á camara.

V. ex.ª apresentou ha poucos dias umas representações que lhe foram enviadas d'aquella localidade, nas quaes differentes individuos, vereadores ou não vereadores, membros da junta de parochia, e até regedores, protestaram contra as palavras que eu e o meu amigo, o sr. Barros e Sá, tinhamos proferido n'esta casa quando se alludiu ás informações que davam o administrador do concelho como cumplice n'aquelle attentado. V. ex.ª apresentou essas representações sem as ler, porque já ha pouco, para dar cabal satisfação á camara, V. ex.ª teve a bondade de declarar do alto d'essa cadeira, que não tinha lido taes representações e que as apresentou na idéa de que ellas não continham palavras offensivas, nem para esta camara em geral, nem para qualquer dos seus membros em particular.

Página 369

369

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Eu confesso a V. ex.ª que tambem as não li; mas um amigo meu observou-me hoje que essas representações continham palavras offensivas, grosseiras e indignas da publicidade official (muitos apoiados) que se lhes deu.

Vou lê-las e peço á camara a sua attenção (leu).

Chamo a attenção do sr. ministro do reino para este ponto (leu).

Parece que foi a mesma mão que redigiu estes documentos (apoiados).

Entre os signatarios figuram varios regedores, que assignam n'essa qualidade.

Eu declaro que não daria a menor consideração a estes nojentos e asquerosos papeis se tivessem sido publicados em outra parte. Mas foram publicados na folha official das nossas sessões, de certo sem auctorisação de V. ex.ª, sem V. ex.ª ter conhecimento do que n'elles se continha. Apareceram com o caracter e auctoridade que têem todas as publicações feitas no Diario da camara. E esta circumstancia que me obriga a vir protestar bem alto contra aquellas injurias grosseiras, improvocadas, e indignas de todo o homem, que se présa (apoiados), contra estas indelicadíssimas aggressões que se fazem a um deputado, que no exercicio das suas funcções viera a esta camara denunciar um facto, de que o tinham informado, mas era boa fé e sem a intenção de attribuir a outrem cumplicidades que não lhe pertencessem.

Eu não daria a menor importancia a estes papeis, a estes desabafos de mal contidos despeitos, se não tivessem sido publicados na folha official das nossas sessões; mas, desde que foram ahi publicado, e desde que eu e a camara temos a certeza de que V. ex.ª ou não auctorisou essa publicação, ou, se tivesse lido estes papeis, a não teria auctorisado, não posso deixar de pedir á camara que proteste e affirme ella, por uma solemne manifestação, os seus sentimentos de reprovação contra palavras improprias de (quem se dirige a esta camara (muitos apoiados).

E necessario que protestemos contra este procedimento, e que se tique sabendo que nós somos um por todos e todos por um quando se trata de defender as nossas prerogativas, de manter os nossos direitos, de zelar a nossa honra e o nosso credito (muitos apoiados).

Não é licito a qualquer cidadão ou auctoridade, sob colôr de se defender de cumplicidades, que ninguem lhe imputou, inserir na nossa folha expressões grosseiras e phrases injuriosas, contra as quaes todos, sem excepção de um só, devemos protestar.

Se estas palavras, em logar de se referirem a mim e ao sr. Barros e Sá, se referissem a qualquer outro sr. deputado, em qualquer campo era que estivesse alistado, a minha voz havia de levantar se aqui igualmente indignada para fulminar a impropriedade de phrases e as demasias de linguagem contidas nas palavras que li ha pouco e que a minha consciencia repelle, porque as não mereço.

O administrador do concelho, que não conheço, esse recommendo eu ao sr. ministro do reino, porque a mão, que escreveu estas representações, está-se claramente denunciando atravez de tudo isto (apoiados).

Tenho a consciencia de que a minha dignidade e o meu decoro, como homem e como deputado, estão muito acima d'estas offensas que não chegam a offender-me (apoiados); mas o que eu queria era que se não deduzisse da circumstancia de terem sido publicados na nossa folha official similhantes papeis e a asserções tão grosseiras e tão injustas como estas, que a camara por qualquer modo presta o seu assentimento a taes phrases, a taes aggressões e a tão immerecidas injurias.

Por isso peço á camara que por meio de uma votação decline de si qualquer responsabilidade no conteudo das representações a que me tenho referido. N'esse sentido é que mando para a mesa a seguinte moção de que peço a urgencia (leu).

Leu-se na mesa á seguinte

Proposta

A camara deplora que no diario das suas sessões, de 3 do corrente, se tivessem "publicado duas representações de alguns cidadãos do concelho de Valle Passos, em que se contêem palavras grosseiramente injuriosas contra dois membros da mesma camara, e resolve que esta declaração seja lançada nas suas actas, e que se providenceie de modo que se evite a repetição de analogas publicações. = José Luciano de Castro = Barros e Sá.

Foi considerada urgente e admittida á discussão.

O sr. Barros e Sá: — Eu associo-me completamente ás reflexões que n'este momento acaba de fazer o meu illustre amigo, o sr. José Luciano de Castro, e apenas me cumpre declarar, para que fique bem consignado, que nem eu nem s. ex.ª fizemos a mais pequena imputação ao administrador do concelho de Valle Passos.

O sr. José Luciano de Castro, quando tratou d'este assumpto, limitou-se a ler uma carta em que se dizia que havia uns indicios de que o administrador do concelho do Valle Passos tinha cumplicidade no attentado de que se tratava; mas nem s. ex.ª nem eu, quando me referi ao mesmo objecto, dissemos quem era o administrador do concelho de Valle Passos. Não dissemos o seu nome, e não fizemos a mais pequena referencia que não fosse unicamente ao acontecimento (apoiados).

Devo agora acrescentar que, dizendo as representações que o sr. José Luciano de Castro e eu fizemos insinuações indiscretas e malevolas, a indiscrição e a malevolencia estão da parte de quem escreveu estas representações, porque nós não fizemos cousa alguma das que nos imputara (apoiados).

Preciso tambem dizer que não conheço o administrador do concelho de Valle Passos, que não tenho relações algumas pessoaes com elle, que não sei se é bom ou menos bom, mas o que sei é que o sr. juiz de direito de Valle Passos é um homem honrado e dignissimo como juiz (apoiados).

O sr. Mariano de Carvalho: — Eu desejo simplesmente acrescentar á moção do sr. José Luciano de Castro alguma cousa que s. ex.ª não podia escrever n'ella.

Como desejo que todo o paiz saiba que eu entendo que os deputados, como representantes da nação, devem ser respeitados por todos, quer sejam, quer não sejam funccionarios publicos, por isso proponho que á moção do sr. José Luciano de Castro se acrescente o seguinte (leu).

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

A camara tambem aponta á attenção do governo os funccionarios publicos que assignam as representações. = Mariano Cerillo de Carvalho.

Foi admittida.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Eu sou o primeiro a reprovar os termos em que se acham ridigidas as representações que foram publicadas no Diario da camara, e a sentir que alguns individuos, de certo menos por proposito offensivo do que por paixão de momento, se dirigissem era termos inconvenientes e menos aceitaveis a dois membros d'esta camara, igualmente dignos, igualmente respeitaveis. Sentiria, porém, ainda mais que á falta alheia á imprudencia dos signatarios d'essas representações, correspondesse outra falta maior, qualquer precipitação ou imprudencia da nossa parte.

Se eu comprehendi bem a moção que foi mandada para a mesa, ella tende nem mais nem menos que a restringir a liberdade de expressão aos peticionarios que se nos dirijam, estabelecendo uma especie de censura previa para transformar os deputados em poder superior e intangível que se imponha não só ao respeito, mas tambem ao silencio do publico.

Se a camara quer votar a proposta como disposição em virtude da qual se julgue no direito de regular as palavras

Página 370

370

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

com que os nossos eleitores podem apreciar o nosso procedimento, eu declaro, que reprovando os termos inconvenientes das representações e dando todos os testemunhos de sincera consideração tanto ao sr. Luciano de Castro como ao sr. Barros e Sá, não posso associar-me a tal pensamento.

Não tenho perfeito conhecimento dos precedentes ou dos factos que levaram os signatarios a representar, e creio até que nunca estive na camara em occasião em que se tratasse dos negocios de Valle Passos, mas pelo que acabei de ouvir ao sr. Barros e Sá, parece que na sessão em que se denunciou o attentado contra o juiz de direito, lendo-se uma carta ou por outro qualquer meio, alguem declarou aqui a cumplicidade do administrador do concelho de Valle Passos no attentado de que se tratava.

O sr. Barros e Sá acaba de dizer que pela sua parte não fez allusão nem referencia alguma e que o sr. Luciano de Castro leu uma carta, na qual se dizia que havia indicios.

(Interrupção que se não ouviu).

Suspeitas ou indicios é o mesmo ou para este caso é ainda peior. Leu-se a carta e disse-se ou dizia a carta que havia suspeitas de que o administrador do concelho não era estranho ao attentado.

Não basta uma carta particular apreciando quaesquer factos, nem para mim a sua leitura é documento admissivel para que n'esta casa qualquer de nós possa affirmar ou insinuar a existencia de suspeitas contra um funceionario ou contra um cidadão qualquer. Mas, procedendo nós assim, não devemos estranhar, ou não estranhe muito quem assim procede, que a uma suspeita que se lança sobre qualquer funceionario se responda em phrases inconvenientes ou menos comedidas, escriptas em uma representação, que se nos dirige como desforço ou defeza de quem se queixa de injustiça. Eu pelo menos declaro francamente, que taes expressões, se me fossem dirigidas, nada me incommodariara. Se, tendo referido a cumplicidade, esta se provasse, teria cumprido o meu dever. Se a prova fosse contraria, não sentiria o desforço nem o acharia exagerado.

Restringindo as minhas observações, direi que não concorrerei nunca para que se restrinja a liberdade da palavra e de expressão a qualquer cidadão que se queira queixar de mim como deputado, representando perante a camara de que faço parte.

Se ha injuria, se ha offensa n'essas phrases, temos tribunaes no paiz, temos agentes do ministerio publico, e é ali, não é aqui, que se tratam estes assumptos.

Tenho dito.

O sr. Cunha Monteiro: — O que vou dizer, nada se refere á questão que deu origem a este deploravel conflicto. Ponho-a de parte e lamento que ella o produzisse.

Vou referir-me só e exclusivamente ao facto que agora se ventila, e que eu julgo inteiramente alheio á questão de Valle Passos que o motivou.

Como a camara sabe, eu fui quem requeri a publicação d'essas representações no Diario da camara. Mas faça-me a camara a justiça de que sou incapaz de pedir-lhe uma votação que importasse um insulto a nenhum dos membros d'ella. V. ex.ª sabe que eu não li essas representações; ellas foram dirigidas a V. ex.ª e eu não pude ler o seu conteudo. Para isso peço o testemunho de V. ex.ª sr. presidente, tão insuspeito como honroso.

Peço a V. ex.ª, á camara, ao sr. José Luciano de Castro e ao sr. Barros e Sá, meus respeitados amigos, que acreditem piamente que se eu tivesse lido similhantes representações, não teria dito as poucas palavras que preferi em defeza d'ellas, porque na verdade seria isso fazer de mim proprio um instrumento traiçoeiramente offensivo e baixo (apoiados. — Vozes: — Muito bem.)

Nunca a maior vindicta me ajoujaria a collocar-me cegamente em tal condição, quanto mais quando eu não tenho no coração senão sentimentos de gratidão para com todos os membros d'esta casa, e muito especialmente pelos meus amigos os srs. José Luciano de Castro e Barros e

Sá, de quem tenho recebido provas inequivocas de consideração. — (Vozes: — Muito bem.)

Muito bem tambem eu digo, porque vejo que a camara está disposta a acreditar as minhas palavras que são sentidas.

Concluo pedindo que acreditem que tenho toda a consideração pelos membros d'esta camara, e muito especialmente pelo sr. José Luciano, que é uma summidade de um partido e um ornamento da tribuna parlamentar.

Quando digo o que sinto, não posso dar melhor conta de mim.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

O sr. Luciano de Castro: — Declaro que não quero tolher a ninguem o direito de fallar ou de exprimir o seu pensamento por escripto.

Não só quero livre o direito de apreciar, mas até o de injuriar, porque contra as injurias ha recursos nos tribunaes.

Eu protesto apenas contra a publicação de duas representações, nas quaes se dirigem a dois membros d'esta camara phrases taes que ninguem aqui quer tomar a responsabilidade d'ellas.

V. ex.ª já me deu á mais cabal satisfação. Declaro que com a minha proposta não pretendo irrogar censura alguma á mesa. Quero só, visto que a publicação se fez, e já não podamos evita-la, que a camara complete a reparação que por V. ex.ª nos foi já dada, declarando por sua parte que deplora aquella publicação.

Eu não tenho senão a lamentar que se hajam publicado na nossa folha official umas representações em que são menoscabados e offendidos dois deputados. Esta é que é a questão. A lei é igual para todos, e não hei de ser eu, membro d'esta camara, que tenho tantas vezes sido injuriado, que hei de estranhar agora que qualquer individuo se insurja contra algumas palavras que aqui proferi. Não tem pois esse sentido a minha proposta.

Não quero tambem censurar ninguem; quero que se manifeste por uma votação que a camara não approva, nem presta assentimento a essas representações que injuriam dois dos seus membros.

E o que pretendo.

O sr. Ministro do Reino (Rodrigues Sampaio): — Quero simplesmente dizer que me associo de todo o coração ás demonstrações de consideração que se queiram dar aos illustres deputados que se julgam offendidos, e folgo com esta moção, que é uma especie de penitencia. Somos nós os mesmos que nos vamos censurar; censuramo-nos a nós mesmos, porque a publicação das representações foi obra nossa.

Houve alguns cidadãos que julgavam usar de um direito, e usaram mal d'elle; e se eu podesse condemnar as suas palavras condemnava-as; mas lembremo-nos tambem de que nós nem sempre temos dado os exemplos de cordura que pedimos para todos os cidadãos, e parece-me que isto deve levar-nos a ser mais circumspectos.

Agora o que não posso aceitar é uma indicação que fez o sr. Mariano de Carvalho. Eu não vou castigar os meus empregados, porque elles não exerceram acto algum de funccionarios publicos n'esta occasião, exerceram um direito, embora mal exercido; mas eu declaro que os não vou castigar por isso. Não tomo conhecimento dos escriptos; se infringiram as leis, usem contra elles dos meios que ellas facultam, mas eu não tomo nota de similhante indicação.

O sr. Mariano de Carvalho: — Desde que o sr. ministro do reino não aceita a minha proposta, eu retiro-a; mas não admitto que um agente da administração civil, um administrador de concelho ou um regedor, injurie a representação nacional, e digo um administrador de concelho e um regedor, porque ao lado da assignatura na representação vem escripto o cargo que occupa. Não se trata de um particular que injuria a camara ou um dos seus membros, é uma auctoridade ou são auctoridades, e o go-

Página 371

371

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

verno não póde consentir que os agentes da administração injuriem os membros da representação nacional. Mas o sr. ministro quer tolerar que os seus regedores insultem os membros do parlamento, e como eu não posso obrigar o sr. ministro a proceder de outra maneira, retiro a minha proposta.

Foi retirada a proposta.

O sr. Luciano de Castro: — Parece-me que o sr. ministro do reino nas palavras que ha pouco proferiu se quiz referir a mim, quando disse que deviamos ter mais cordura quando fallamos n'esta camara! E possivel que muitas vezes não tenha cumprido o meu dever, quando uso da palavra n'esta casa. Todos nós temos peccados; mas na questão, de que se trata, não me argue a consciencia de ter faltado aos deveres parlamentares (apoiados), nem de ter deixado de cumprir rigorosamente todas as prescripções, que as consciencias mais escrupulosas podem exigir de qualquer deputado.

Referi-me a um facto affirmado n'uma carta de um cavalheiro respeitavel de Valle Passos, na qual se dizia que havia desconfiança de que o administrador d'aquelle concelho era cumplice no attentado de que se tratava. Onde está aqui a falta de moderação e de cordura?!

O sr. Ministro do Reino: — Não tinha intenção de me referir ao facto de que se trata: referia-me a nós todos.

O Orador:: — Pelo que digo e pelo que faço, respondo não só n'esta casa, mas fóra della e nos tribunaes. Escusa, pois, o illustre ministro de nos aconselhar moderação e cordura, porque sabemos perfeitamente cumprir os nossos deveres (apoiados).

Mas essa não é a questão. Eu não me queixo das injurias nem dos excessos das representações. A minha intenção é reclamar unicamente contra a publicidade, que se deu a esses documentos, que julgo indignos de serem publicados na folha official d'esta casa (apoiados).

Nada mais. É assim; é n'este terreno que colloco a questão.

O sr. Barros e Sá: — Desejo que a questão se não afaste dos termos em que foi collocada pela moção do sr. Luciano de Castro, á qual me associei.

Nós não vimos tirar desaggravo contra crimes de injuria praticados contra nós em qualquer jornal; nós não queremos discutir se as injurias foram ou deixaram de ser irrogadas, nem pedimos juizes á camara. O nosso unico fim é protestar contra a publicação d'essa representação no Diario das sessões, e pedir á camara que declare — que lamenta que a publicação tenha sido feita n'este Diario (apoiados) — estando eu certo de que a camara não teria certamente consentido a sua publicação se soubesse os termos em que a representação vinha redigida (apoiados).

Este é o terreno da questão: fóra d'elle, a questão é de quem a quizer pôr e não nos associamos a ella. Tenho dito.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Fui á mesa ver a proposta, e depois de a ler com attenção, permitta-me o illustre deputado que a considere inteiramente" inutil.

Se os illustres deputados se queixam só da publicação no Diario das sessões, essa publicação foi já explicada como tendo tido logar por equivoco, e essa explicação deu-a V. ex.ª, como digno presidente d'esta camara! A proposta depois d'isto insistindo em sentir que se fizesse a publicação e pedindo providencias para que este facto se não repita, é, seja qual for a intenção dos illustres deputados, um voto de censura á mesa, porque...

Vozes: — Não, senhor...

O Orador: — Não, senhor! As cousas são o que são (apoiados).

- Uma voz: — E censura á camara.

O Orador: — Se é censura á camara, então releve-me

o illustre deputado que eu me dispense de me censurar a mim por um facto em que não tive a menor parte.

Creio que os dois illustres deputados a quem se refere este incidente, seja qual for a sua susceptibilidade, não podem exigir mais, e devem estar satisfeitos com a manifestação unanime dos membros d'esta casa, que têem censurado a publicação, e que têem feito justiça a s. ex.ªs

Se a moção do sr. José Luciano é uma censura á mesa, não me associo a ella; se é um voto de censura a nós ou á camara, muito menos me censuro a mim.

O sr. Presidente: — Peço attenção. Antes de dar a palavra ao sr. Camara Leme para um requerimento peço á camara que me releve dizer duas palavras, que não tinha dito até agora para não interromper a discussão, que deixei correr livremente, reservando-me para no fim do debate dizer alguma cousa.

A mesa não toma a proposta do sr. José Luciano de Castro como uma censura (apoiados).

O sr. Luciano de Castro teve a bondade de vir á mesa entender-se com ella a respeito d'este objecto depois de eu ter dito d'este logar como o facto se tinha passado.

Declarei que fui eu que recebi estas representações da camara municipal de Valle Passos e de algumas freguezias, acompanhadas de um officio da camara. Foi por esse officio que me dirigi para fazer a apresentação. No officio, que sinto não ter aqui presente, dizia-se que aquellas representações tinham por fim mostrar que o administrador do concelho não tinha tomado parte no grave attentado que ali tinha sido commettido contra o juiz de direito. Foi isto o que eu disse quando apresentei as representações.

Declaro franca e sinceramente que não as li, porque não tive tempo para isso. Apresentei-as e declarei que ficavam sobre a mesa para serem examinadas pelos srs. deputados e depois archivadas. O sr. secretario não deu ordem para se publicarem.

E a nota que consta na mesa. Mas appareceram impressas. Deploro que o fossem.

Uno-me completamente á indicação do sr. Luciano de Castro e voto por ella.

Não tenho tenho mais nada a dizer.

O sr. Luciano de Castro: — Pedi a palavra para declarar que na minha proposta não ha a minima intenção de censurar a V. ex.ª

O sr. Camara Leme: — Requeiro a V. ex.ª que consulte a camara sobre se julga este incidente sufficientemente discutido.

Posto á votação este requerimento, foi approvado, e em seguida approvada unanimemente a proposta do sr. Luciano de Castro.

O sr. Presidente: — Esqueceu-me dizer que já estão dadas as providencias para que não torne a acontecer outro caso igual, porque não podendo eu revêr todas as representações' dei ordem para que quando em alguma representação vier alguma cousa que seja inconveniente para a camara, para o governo, n'uma palavra para alguem, me darem parte na mesa para então se poder providenciar.

O sr. Luciano de Castro: — Agradeço aos illustres deputados, que acabaram de fallar, as palavras benevolas de que usaram para commigo e o sr. Barros e Sá, e á camara o testemunho de consideração que acaba de me dar.

O sr. Barros e Sá: — Associo-me á declaração do sr. Luciano de Castro. *

O sr. Presidente. — Continua-se na ordem do dia e tem a palavra o sr. Carlos Ribeiro.

O sr. Carlos Ribeiro: — As duas substituições a dois artigos que a commissão mandou para a mesa não importam uma alteração profunda no projecto, como parece inferir-se das observações dos illustres deputados que me precederam. A substituição ao artigo 5.° é que importa uma alteração importante á materia do artigo, porque transfere as

Página 372

372

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

despezas com os vencimentos ordinarios dos engenheiros destacados para o serviço technico das localidades para o cofre do ministerio das obras publicas, emquanto que pela redacção primitiva do parecer eram estas que ficavam com o encargo de satisfazer as despezas com os estudos e mais serviços technicos das estradas districtaes e municipaes.

Esta substituição, que a commissão teve a honra de mandar para a mesa, creio eu que era objecto que os illustres deputados deviam louvar, porque importa nada menos do que aliviar as localidades de uma despeza que fazem e continuariam a fazer, podendo assim converter a importancia d'esses honorarios do pessoal technico em mais alguns kilometros de estradas.

Portanto Os illustres deputados deviam louvar em vez de censurar a substituição ao artigo 5.°, que a commissão teve a honra de mandar para a mesa.

A substituição ao artigo 7.° é apenas uma questão de redacção do mesmo artigo. E uma declaração, o acaso é necessaria, de que as disposições do projecto que se discute não invalidam, ou não importam a revogação de qualquer das disposições das cartas de lei de 15 de julho de 1862 e 6 de junho de 1864 respectivas á viação municipal. Este foi sempre o pensamento da commissão quando redigiu, assignou e apresentou n'esta casa o projecto. Entretanto, para prevenir ou desvanecer qualquer duvida que houvesse no animo de algum sr. deputado a similhante respeito, a commissão resolveu alterar a redacção do artigo 7.° no sentido já referido.

Portanto as substituições offerecidas pela commissão não importam alteração no parecer original da commissão senão na parte referente ao cofre que tem de pagar os vencimentos ordinarios do pessoal que for requisitado ao governo pelos municipios ou pelos districtos.

Tambem se disse que o pessoal da engenheria districtal, quando transferido para o ministerio das obras publicas, conforme dispõe o projecto, não havia legislação nem auctorisação legal para lhe dar collocação e vencimento, por isso que, qualquer que fosse a collocação ou vencimento que o governo arbitrasse a esse pessoal depois d'este incorporado no ministerio das obras publicas, estaria era contradicção com todas as mais disposições do decreto de 30 de outubro do 1868, por isso que estas disposições além do artigo 1.º não são revogadas no projecto da commissão.

Parece-me que este argumento não colhe. Desde que o artigo 1.° do projecto em discussão diz — são extinctas as repartições technicas districtaes das obras publicas, creadas por decreto de 30 de outubro de 1868, e se deroga a legislação em contrario, derogado fica todo o decreto (2.°) de 30 de outubro de 1868, que creou as referidas repartições..

E na verdade, se se confrontar o artigo 1.° do projecto com os differentes artigos do decreto que acabei de citar, não me parece que deva haver a mais pequena duvida. D'este confronto resulta immediatamente que não só o artigo 1.°, mas os seus derivados, ou que d'elle nascem, artigos 2.°, 3.°, 4.°, 5.º, 6.°, 7.°, 8.º, 9.°, 10.° e 11.°, ficam sem effeito, porque não têem rasão de ser. Por outras palavras, as disposições contidas n'aquelles artigos não têem objectos, porque pelo artigo 1.º do projecto da commissão desapparecem as cousas (repartições districtaes) e as pessoas (pessoal technico districtal), sobre quem tinham reflexão, ou sobre quem recaía a acção das disposições dos artigos do mencionado decreto de 30 de outubro de 1868. Portanto não me parece que sejam procedentes as observações do illustre deputado, o sr. Mariano de Carvalho, a respeito d'este ponto.

Ponderou mais o sr. Mariano de Carvalho, que o projecto da commissão tambem foi mal pensado e, é omisso na parte que respeita a outro serviço que estava a cargo das repartições districtaes, e que extinctas estas fica aquelle serviço, aliás importante, sem ter. quem q desempenhe nos districtos, ao menos com auctorisação legal.

Pedia ao illustre deputado, e peço á camara, que attendam ao que dispõe o n.º 5.° do artigo 6.° do decreto de 31 de dezembro de 1863, promulgado pelo sr. Calheiros; diz este artigo que fica a cargo das divisões das obras publicas a administração, fiscalisação e policia do serviço dos pesos e medidas; e o decreto de 18 de agosto de 1870, assignado pelo sr. Camara Leme quando ministro das obras publicas na dictadura d'aquelle anno, e que ainda está em vigor, estabelece no seu artigo 4.°, que ás actuaes direcções das obras publicas competem serviços diversos, e entre estes a administração e fiscalisação dos pesos e medidas; e no artigo 6.° do mesmo decreto sujeita á fiscalisação e instrucções das mesmas direcções das obras publicas o serviço technico dos pesos e medidas nos districtos e municipios. Portanto já V. ex.ª e a camara vêem, que não ficam ao desamparo estes serviços, e por conseguinte não ha rasão para se consignar no projecto que se discute disposição alguma a similhante respeito, como sem fundamento pretendia o sr. deputado a que me refiro.

O sr. Telles de Vasconcellos: — Mando para a mesa um parecer da commissão de administração publica comi relação á approvação do contrato feito entre a camara municipal do Porto e a empreza de illuminação da mesma cidade.

A imprimir.

O sr. Pinheiro Borges: — Tenho notado que esta discussão se resente das muitas interrupções que tem tido, e que por isso nem sempre os defensores do projecto têem considerado pelo mesmo modo a mesma face da questão.

O illustre relator da commissão deu agora tal intrepretação aos argumentos que se têem apresentado, que começo a desconfiar que. chegamos a ponto de nos não entendermos uns aos outros.

Diz o illustre deputado que censurámos a substituição que a commissão apresentou ao artigo 4.°!!!

Isso é inverter o sentido das cousas e a ordem dos factos; pela minha parte tendo observado que o artigo 4.° não attendia ao fim principal das representações das camaras reprovei este artigo, e não a substituição, que tem alcance absolutamente contrario (apoiados).

Eu julgava que a emenda era uma consequencia da discussão (apoiados), mas parece-me que me enganei; pelo menos assim o diz agora o sr. relator.

Não sei que duvida possa oppor-se para que o projecto volte de novo á commissão.

A commissão de obras publicas póde reunir-se hoje e trazer ámanhã um parecer sobre as differentes propostas que foram apresentadas. E os illustres deputados não podem de maneira nenhuma julgar que insistimos n'esta proposta para interromper a marcha d'este projecto, porque se o quizessemos fazer tinhamos outro meio muito mais efficaz. S. ex.ª concede-me de certo que, áparte a minha pessoa, em todos os deputados que têem entrado n'esta discussão ha o cabedal sufficiente de intelligencia e conhecimentos especiaes, para poderem fallar durante tres ou quatro dias a respeito de cada artigo do projecto.

Portanto, o melhor é que a commissão estude novamente o assumpto, e traga ámanhã um parecer sobre todas as propostas. Embora s. ex.ªs affirmem que o projecto está completo, a verdade é que o não está.

Diz o artigo 1.° (leu).

Mas quem é que as substitue? Aceita a commissão a minha indicação ou a que faz o sr. Falcão da Fonseca? Creio que não póde deixar de aceitar a rainha.

(Áparte.)

O projecto não diz que o director das obras publicas fica membro nato da commissão de viação. (Interrupção.)

O illustre deputado affirmou ainda ha pouco o contrario, asseverando que fica inteiramente revogado o decreto de 30 de outubro do 1868.

(Aparte.)

Página 373

373

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Mas então diga-me o illustre deputado ques são os vencimentos do pessoal?

(Aparte do sr. Carlos Ribeiro.)

Diz o illustre deputado que serve de guia o decreto de 6 do outubro de 1868!!

Este decreto, sr. presidente, prohibe exactamente que seja attendida uma parte, e nada providenceia a respeito da outra, e a camara das proprias explicações, que se tem pretendido dar ás minhas duvidas, tem de certo concluido, que querem fazer substituir pelo provisorio e arbitrario, o que está definido e regular, embora possa admittir melhor organisação (apoiados).

O projecto, alem de confuso com relação á determinação do serviço e pessoal que deve occupar-se da viação municipal e districtal, é completamente omisso a respeito de outros serviços que estão a cargo da engenheria districtal, como por exemplo o serviço relativo aos pesos e medidas.

(Interrupção do sr. Carlos Ribeiro).

Conheço muito bem a lei que s. ex.ª acaba de ler; essa lei é relativa á superintendencia, mas não á fiscalisação immediata e local. E se s. ex.ª já reconheceu a conveniencia do fazer uma referencia ao decreto de 6 de junho de 1864, não será tambem conveniente fazer outra com relação a este serviço especial?!

Veja V. ex.ª, sr. presidente, e veja a camara, a quantas leis se tem soccorrido o illustre relator, sem que ao menos haja uma palavra no projecto que estabeleça esta relação; eu sinto que a camara não lenha dado a este assumpto a. importancia que elle merece, porque a discussão tem exuberantemente mostrado o que é preciso fazer...

O sr. Falcão da Fonseca: — Para discutir ha sempre numero.

O Orador: — Sr. presidente, eu vejo a camara pouco numerosa, nem mesmo ha numero.

O sr. Presidente: — Para discutir ha numero.

O Orador: — Mas não ha numero para votar, e n'esse caso vou fazer um requerimento, que não se poderá votar por falta de numero. 0 meu requerimento é este:

«Proponho que V. ex.ª consulte a camara sobre se quer que continue esta discussão sem haver numero legal na casa.»

O sr. Presidente: — Uma vez que não ha numero, não o posso propôr á votação; mas para discutir não é preciso numero.

O Orador: — Requeiro tambem a V. ex.ª que suspenda a sessão ato haver numero legal.

O sr. Presidente: — Repito: para discutir não é preciso haver numero, póde discutir mesmo tres horas, se quizer, sem estar numero legal na sala.

O Orador: — Mas, segundo o regimento, V. ex.ª deve pôr á votação qualquer requerimento que um deputado faça.

O sr. Presidente: — Não havendo numero, não o posso propôr.

O Orador: — A discussão, estando a sala deserta, de pouco serve; não foi porém este o motivo pelo qual pedi a interrupção da sessão, eu só quiz mostrar que a observação do sr. Falcão da Fonseca não tem cabimento, e que provocando uma votação a sessão não podia continuar; e vou concluir para que se encerre, porque, acabada a inscripção, tem de parar a discussão por não haver o numero preciso para votar.

A questão de que se trata é de grande importancia, e realmente sinto que na sua discussão tenha havido um certo abandono, e que ella comece quasi sempre a hora adiantada, e havendo já na camara poucos deputados.

Eu, pela minha parte, parece-me ter demonstrado até á saciedade que tenho entrado n'esta discussão só com o fim de alcançar que o serviço da engenheria do meu paiz seja bem organisado, e que desejo principalmente que não soffra o desenvolvimento da viação districtal e municipal, de que tão grandes vantagens ha a esperar para o augmento da industria principal do nosso paiz.

Tenho insistido pela melhor organisação do serviço da engenheria, tenho-me pronunciado por que haja uma só engenheria, por me parecer esta organisação a mais economica, e mais conveniente, o não porque queira tomar parte na briga de interesses que a discussão tem revelado e a que eu mesmo me referi; e posso manifestar com tanta mais franqueza esta opinião, que não advogo os meus interesses pessoaes, pelo contrario, porque no dia em que se restabelecer a engenheria civil tenho vacatura para um posto de accesso. Combato hoje este projecto, como combati o decreto de 1860 do sr. Thiago Horta, como combati tambem em 1864 a organisação do sr. João Chrysostomo de Abreu, que me promoveu a capitão.

Dito isto, devo agora rectificar uma asserção do sr. relator da commissão, que affirmou que se tinha atacado a organisação de 186-1, depois de ser publicada a classificação. Eu combati áquella organisação no dia: immediato ao que appareceu publicada, e não depois (apoiados).

Desejo tambem que fique bem determinado e assente que nenhum dos oradores, que tem tomado a palavra contra o parecer da commissão, censurou a substituição apresentada ao artigo 4.º que, remediando um dos inconvenientes do projecto combatido, dá rasão á opposição; e visto que a generalidade do projecto está votada, declaro que lhe opponho a minha substituição na especialidade, para que o serviço proprio da viação districtal e municipal continue a ser regularmente desempenhado, e na qual estabeleço que as camaras não devem pagar ao pessoal quando o não aproveitem.

Parece-me que em tudo quanto disse durante esta discussão não censurei ninguem (apoiados). Apresentei as minhas idéas como sei, mas guardando todas as attenções com os meus collegas; e tratando de impugnar o projecto, fiz todos os esforços para conservar a questão na altura em que deve ser tratada, que é principalmente o desenvolvimento da viação municipal, que tão bons resultados tem dado para os interesses materiaes do paiz (apoiados).

Vou terminar por agora, e como aí firmei, creio, que se V. ex.ª quizer pôr este artigo á votação não terá numero, e por consequencia a discussão ha de continuar ámanhã, teria adiantado por certo mais, se tivessem approvado a indicação de que voltasse o projecto á commissão (apoiados).

Disse.

O sr. Carlos Ribeiro: — Apenas duas observações.

Ha pouco disse eu n'um áparte ao sr. Pinheiro Borges, que vou reproduzir para esclarecimento de s. ex.ª e da camara, e vem a ser que o artigo 6.º do decreto de 30 de outubro de 1868 diz (leu).

Não quero agora contestar a asserção do sr. Pinheiro Borges que a apresentação da substituição que mandei para a mesa ao artigo 5.° fosse resultado da discussão. Podia faze-lo, recorrendo á data em que a mandei para a mesa, que me parece ter sido no primeiro dia em que se abriu a discussão sobre este projecto.

Em todo o caso a lealdade pede que eu declare a V. ex.ª e á camara que foi em consequencia de considerações offerecidas por alguns dos illustres membros d'esta camara, a respeito da conveniencia de transferir as despezas ordinarias do pessoal das localidades para o thesouro. Foi isto que deu causa á redacção da substituição do artigo 5.°, não partiu de mim, não foi lembrança minha; no entretanto, approvo e apoio com muito prazer. Quer-me porém parecer que não foi resultado da discussão, nem das exigencias doa illustres deputados que lêem combatido o parecer.

O sr. Presidente: — Vae votar-se; peço aos illustres deputados que tomem os seus logares.

O sr. Mariano de Carvalho: — Peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre se quer votação nominal sobre este artigo.

Assim se resolveu.

O sr. Mariano de Carvalho: — Peço a V. ex.ª tenha

Página 374

374

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

a bondade de dizer-me quantos srs. deputados estão na sala?

O sr. Secretario: — Estão 38 srs. deputados presentes.

O sr. Presidente: — Vae votar-se o adiamento.

O sr. Falcão da Fonseca: — V. ex.ª sabe que, quando se tratou da votação na generalidade d'este projecto, todos os adiamentos, foram rejeitados, para que o projecto voltasse á commissão e parece-me que esse adiamento sobre que se vae votar, não é mais do que o que já foi rejeitado por esta camara.

O sr. Presidente: — Permitta-me o illustre deputado que lhe diga que não é assim; este adiamento foi agora apresentado em relação ao artigo 1.°

O sr. Falcão da Fonseca: — Não faço questão; mas parecia-me que, quando se tratou d'esses adiamentos, referiam-se elles á generalidade e especialidade do projecto, e foram rejeitados.

A questão estava terminada, e não havia mais que votar sobre propostas de adiamento. No entretanto nao faço questão, repito.

O sr. Presidente: — Vae votar-se.

Feita a chamada:

Disseram approvo — os srs.: Adriano Machado, Pinheiro Borges, Pinto Bessa, José Luciano, Teixeira de Queiroz, Paes Villas Boas, Mariano de Carvalho.

Disseram rejeito — os srs.: Cardoso Avelino, A. J. Boavida, Pinto de Magalhães, Arrobas, Telles de Vasconcellos, Falcão da Fonseca, Sousa Lobo, Zeferino Rodrigues, Carlos Ribeiro, Vieira das Neves, Perdigão, Franco Frazão, Mamede, Matos Correia, J. A. Maia, Cardoso Klerck, Dias de Oliveira, Lobo d'Avila (José), Nogueira, Lourenço de Carvalho, Camara Leme, Pinheiro Chagas, Cunha Monteiro, Pedro Roberto, Visconde da Arriaga, Visconde de Moreira de Rey, Sá Vargas, Ricardo de Mello, Francisco Costa.

O sr. Presidente: — Quando se começou a votação, estavam dentro da sala 38 srs. deputados. Saíram durante a votação alguns srs. deputados, e agora não votaram senão 36. Não ha portanto votação, porque não ha o numero indispensavel.

A ordem do dia para ámanhã é a continuação da mesma e a eleição de duas commissões. Está levantada a sessão. Eram quasi cinco horas da tarde.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×