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N.° 5.

SESSÃO DE 6 DE FEVEREIRO DE 1858.

PRESIDENCIA DO Sr. JOAQUIM Filippe DE SOURE.

Secretarios os srs.

Miguel Osorio Cabral.

Antonio Pequito Seixas de Andrade.

Chamada, — presentes 54 srs. deputados.

Entraram durante a sessão— os srs. Affonso de Castro, Bettencourt, Alexandre de Santo Thomás, Thedim, Sá Nogueira, Serzedello, Fontes Pereira de Mello, Breyner, Antonio de Serpa, Costa Veiga, Rodrigues Cordeiro, Xavier da Silva, Darão das Lages, Pereira Garcez, Carlos Bento, Possolo, Cesario, Garcia Peres, Cunha Pessoa, Faustino" da Gama, Rezende, Polido, Sena Fernandes, Frederico Guilherme, Sant’Anna e Vasconcellos, Dias Grande, Sepulveda Teixeira, Honorato Ferreira, Benevides, Sousa Pinto Basto, José Guedes, Luciano de Castro, Sá Vargas, J. M. d'Abreu, Casal Ribeiro, Latino Coelho, Pinto Soares, Aboim, Brown, Paredes, Garcia da Rosa, Miguel do Canto, Sebastião José de Carvalho, Rodrigues Leal e Thomas de Carvalho.

Não compareceram — os srs. Braamcamp, Abilio Costa, Castro e Abreu, Azevedo e Cunha, Mello e Carvalho, Geão, Correia Caldeira. Heredia, Antonio Emilio Brandão, Geão, Gouveia Osorio, Duarte de Campos, Barros e Sá, Lousada, Seabra, Barão d'Almeirim, Dias e Sousa, Bento de Castro, B. C. do Amaral, B. F. da Costa, Seixas e Vasconcellos, Barata, Vivião Pessanha, Bivar, Barroso, F. C. do Amaral, Nazareth, Zuzarte, Fonseca Coutinho, Alves de Sá, Almeida Pessanha, Pinto Tavares, Judice Samora, Ferreira Pinto Basto (José), Ferreira de Castro, J. J. de Matos, Delorme Collaço, Oliveira Baptista, Ferreira Pinto Basto (Justino), Matoso, Sousa Cabral, Rebello da Silva, Tenreiro, Passos (Manuel), Sousa Feio, Paulo Romeiro, Balthasar de Campos, Placido ú"Abreu e Coelho de Carvalho.

Abertura — um quarto depois do meio dia.

Acta. — (sobre ella)

O sr. José Estevão: — Sr. presidente, eu não sei como vem consignado na acta o encerramento da sessão de hontem; e eu peço a v. ex.ª que me consinta, sem desejar dar ás minhas reflexões grande desenvolvimento e effeito parlamentar, que lhe recorde que não foram bem fechados os trabalhos da camara de hontem, nem bem clara e terminante a resolução que foi provocada no fim da sessão, e attribuida á camara.

Eu, sr. presidente, levantei-me á voz de v. ex.ª para ser contado como deputado, no intuito de se verificar se havia na camara numero bastante de deputados para se poder deliberar; mas depois, um pouco mais attento, conheci que linha sido contado como voto, quando não tinha votado.

E observo mais que estas minhas reflexões tendem a dar ao fim das sessões um termo regular, para que outra vez se não dê por feito o que não estava feito, e válido o que não estava válido.

Tratava-se de que o dia que o regimento determina que seja para trabalhos em commissões, fosse destinado para se continuar n'um debate pendente. Eu linha alguma repugnancia em que assim se vencesse, e era de boa intenção, era por interesse publico, maximo interesse, o de poder reunir alguns deputados que tinha convidado para serem ouvidos sobre uma questão importante e grave, tal 6 a questão da emigração; e para d'este modo poder se apresentar á camara um trabalho que satisfizesse á santidade da moral publica tão interessada n'esta questão; mas não me opponho a qualquer que fosse a resolução, nem me opponho á continuação da discussão pendente na sessão de hoje. Ao que me opponho e opporei sempre, é a que mandando-se-me levantar para me contarem como numero, me contem como voto. Portanto qualquer que fosse a resolução que se tomou hontem, e sirva isso de aviso para o futuro, não contem o meu voto. Eu declaro que não votei, porque quando me levantei, foi só para se saber se havia na casa o numero sufficiente de deputados para deliberar. Para isso é que me levantei, mas disseram-me =o senhor votou =, e eu declaro que não votei.

Peço por consequencia a v. ex.ª, que de hoje por diante se fique entendendo que se não deve contar o meu voto senão quando voto. Eu não posso consentir que me fosse attribuido voto que não effectuei; não me levantei para isso, levantei-me para me contarem como pessoa e não como voto, e não permitto que se faça de mim este uso. Voto quando voto.

V. ex.ª sabe perfeitamente qual é o espirito e as tendencias das minhas observações e não as levarei até ao ponto, porque emfim o que esta passado esta passado, o que está sanccionado esta sanccionado, digo, não as levarei até ao ponto de averiguar se effectivamente havia numero na casa. V. ex.ª viu o numero: foi realmente uma vista de alcance singular. Para mim viu mais que o numero na casa; e é tanta a fé que tenho em todos os sentidos e potencias de alma de v. ex.ª, que desde que v. ex.ª declarou que viu numero, digo que o viu. N'este ponto não ha duvida, viu numero, viu que havia 54 ou mais de 54 deputados; outros dirão porém que o não havia. Não o direi eu que tenho confiança em v. ex.ª Mas em cousas d’esta ordem, não pelo caso presente que é pequeno, mas por causa do precedente que é terrivel, digo, em cousas d'estas é melhor andar sempre de modo que se dê inteira segurança a quem tiver duvidas de que ha numero, quando se conta ou quando se vota, a fim do que não

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fique nunca certa duvida sobre se havia ou não havia numero para votar e numero legal na votação.

Portanto eu hontem não votei. Muitas vezes posso estar levantado, e o estou, o que é devido aos meus habitos militares, mas nem sempre quando estou levantado é para votar prò ou contra qualquer proposição que se submette á solução da camara. Eu hontem estava prompto á voz de v. ex.ª para me contar, mas não para votar, que não votei, Eu só voto quando digo que voto, eu não quero que quando estou em pé como pessoa me contem como voto.

Eu não sei se a acta fez mensão d'este incidente, senão o faz, o silencio da acta e estas minhas palavras servirão de aviso para nós fecharmos a sessão melhor que a fechámos hontem.

O sr. Presidente: — A acta vae ler-se, mas antes d'isso a camara vê que eu devo tambem explicar singelamente o que se passou, como eu o vi, e como o viram muitos srs. deputados.

O sr. Alves Vicente propoz á camara que em logar de hoje haver trabalhos em commissões, que eu não podia deixar de dar na fórma do regimento, continuasse a materia que estava em discussão; eu perguntei a camara se ella approvava este requerimento assim formulado, quero dizer, de continuar a discussão pendente e não haver trabalhos em commissões, e levantaram-se quasi todos os srs. deputados. (Apoiados.) Não sei com que intenção o sr. deputado se levantou nem me cumpre indaga-lo; (Apoiados.) o sr. deputado estava em pé quando se tratava da votação, logo havia ser necessariamente contado juntamente com os mais senhores levantados pelos srs. primeiro e segundo secretarios que ambos elles contaram, (Apoiados.) que não fui eu. (Apoiados.) Isto é singelo, e tão singelo como é sincero. (Apoiados repetidos.)

Eu não podia de maneira alguma n'uma questão Ião pequena e insignificante empregar uma parcialidade que em nenhum caso tenho mostrado. (Apoiados geraes) Tenho fugido sempre de exercer n'esta casa a menor parcialidade para com os srs. deputados da opposição (Apoiados.) tenho tido sempre em vista querer antes ser laxado de rigoroso para com a parcialidade politica a que pertenço, isto é, para com a maioria a que tenho lido a honra de pertencer, porque sou inteiramente estranho a partidos. (Apoiados.) Portanto eu naquella occasião disse: « Vae votar-se sobre o requerimento do sr. Alves Vicente, para ámanhã em logar de commissões continuar a discussão pendente»; levantaram-se quasi todos os srs. deputados ficando apenas tres ou quatro sentados. (Apoiados.) Não sei com que intenções, já o disse; o facto é que se levantaram, e depois da votação feita houve uma voz que disse: « Não ha numero »; os srs. deputados secretarios contaram outra vez e acharam cincoenta e quatro deputados; houve então reclamação da votação, e eu vi, os srs. secretarios viram e não sei se mais alguem viu que saiu n'esta occasião um sr. deputado; (Vozes: — Apoiado — É verdade.) a consequencia de ler saido um sr. deputado era então não haver numero; mas que o tinha havido quando houve a votação, isso é que não tem duvida alguma (Vozes: — Apoiado —É exacto) Por consequencia a votação é legal porque foi feita na conformidade do regimento, é legal porque apenas dos presentes tres ou quatro srs. deputados é que ficaram sentados (Vozes: — Apoiado — É verdade.) e portanto os dois terços que o regimento exige para se poder dispensar o regimento deu-se n'esta votação. Era pois fóra de duvida que a votação estava legal, se se quizesse fazer outra depois de ler saido um sr. deputado, digo, se se quizesse fazer outra pela reclamação que tinham feito alguns srs. deputados, era impossivel porque a saída de algum ou alguns tinham feito variar as condições da assembléa, porque então já havia numero. E havia eu annullar uma votação cujo resultado estava contado pelos dois srs. secretarios? Não tão as minhas potencias d'alma que fizeram com que a votação désse esse resultado, foi a realidade e realidade verificada pelos dois srs. secretarios e não por mim que não costumo contar. Ora este é singelamente o facto. Não duvido que houvesse quem não entendesse a minha proposta, mas então o que me resta e pedir aos srs. deputados que estejam mais attentos (Apoiados.) e que n'essa occasião digam que não percebem, que eu tornarei a propor á volação; mas nas circumstancias que se deram hontem era absolutamente impossivel faze-lo e eu não linha remedio senão aceitar a votação da camara como ella se linha verificado, e fechar a sessão como fechei. (Apoiados.)

O sr. Pinto d'Almeida: — Sr. presidente, eu podia dispensar-me de fallar depois da explicação franca, leal, sincera e verdadeira que v. ex.ª fez do que aqui se passou hontem, mas como fui testemunha occular do que se passou, declaro á camara que e verdade tudo quanto v. ex.ª disse, e tanto verdade que antes do sr. Alves Vicente fazer o seu requerimento estava para me ir embora, mas disseram-me que ficasse porque havia um requerimento e não havia numero na sala. Depois todos vimos que, o sr. secretario o sr. Miguel Osorio contou o numero que estava na sala e n'essa occasião estavam cincoenta e quatro deputados, e quando v. ex.ª propoz o requerimento do sr. Alves Vicente disse alto e bom som: «Os senhores que approvam o requerimento queiram levantar-se »; levantaram-se todos os srs. deputados excepto tres. Esta é a verdade que o sr. deputado não póde negar, e se o sr. deputado quer que não se conte o seu voto quando esta de pé, isso é que não póde ser, porque como as votações se fazem por sentados e levantados, aquelles que estão levantados votam por aquillo que se propõe. É por consequencia verdade tudo quanto v. ex.ª disse. É tambem verdade que quando alguem reclamou contar a votarão já não havia numero, porque um sr. deputado tinha saído n'essa occasião; portanto eu não posso deixar de dizer, que v. ex.ª andou perfeitissimamente bem na maneira por que propoz á votação o requerimento do sr. Alves Vicente, porque os srs. secretarios Miguel Osorio e Pequito contaram duas vezes e verificaram que só tres deputados na esquerda é que ficaram sentados, os mais todos estavam de pé. Ora, estando todos de pé, como queria o sr. deputado que não se contassem? Tinham algum escripto nas costas para se saber os que votavam pelo requerimento? Por consequencia nem a mesa nem v. ex.ª especialmente merecem censura alguma, ninguem a póde nem deve fazer por este motivo.

O sr. José Estevão: — Sr. presidente, eu não respondo á monitoria do meu illustrissimo amigo; (Riso.) visto que me permitti fazer alguns reparos não quero que elles sejam totalmente inuteis e sem pôr grande ponto de honra em que fique mais crida e mais sanccionada a versão que eu fiz dos acontecimentos, ou aquella que s. ex.ª fez, comtudo rogo a v. ex.ª que mande ler a acta uma segunda vez a respeito d'este caso a que me refiro, porque desejo saber principalmente se na acta está consignado, que lendo-se duvidado se na sala havia o numero legal para proceder a votação, se verificara este facto e se reconheceu que o numero existia.

O sr. Secretario Pequito: — Não esta isso lá...

O Orador: — Então não póde ser...

O sr. Secretario Pequito—Eu leio a acta. (Leu.)

Eu entendi que não devia mencionar na acta esse acontecimento, porque não houve votação alguma ácerca d'elle, e segundo o regimento, o secretario que faz a acta não tem obrigarão de mencionar senão as propostas e moções sobre que recáe votação. Não houve mesmo ninguem que pedisse a palavra no sentido de se verificar o que se tinha feito; simplesmente de alguns bancos saíram essas indicações. Estou certo que quando depois da votação houve alguem que disse que talvez na casa não houvesse numero, eu e o sr. Miguel Osorio contámos segunda vez, vimos que estavam na sala 58 srs. deputados, mas o sr. presidente e o meu collega o sr. Miguel Osorio disseram-me que n'essa occasião tinham, visto saír um sr. deputado, o que eu não observei, porque quando o sr. Alves Vicente fez o seu requerimento eu curvei a cabeça para tomar nota d'elle e por consequencia não pude ver o que n'esse momento se passou.

O sr. José Estevão: — Singeleza por singeleza. V. ex.ª propoz essa moção á deliberação da camara, eu fiquei sentado e muitos dos meus collegas tambem ficaram sentados.

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Mas após isto alguem disse dos bancos: «Não ha numero, não podemos deliberar», e eu não sabia de que se tratava. Então da mesa saíu uma voz: «Tenham a bondade de se levantar para se verificar se ha numero ou não.» Eu levan-tei-me para facilitar a contagem da mesa, e desde que me levantei para este fim, na mesa contaram-me como um voto a favor de uma moção contra a qual eu queria votar, ou da qual não linha conhecimento. Este é que é o facto. Por consequencia a votação da camara não se fez porque houvesse maioria a favor d'ella; fez-se n'esse sentido porque os deputados que se levantaram em obediencia á ordem de s. ex.ª, cuidando que se levantavam para serem contados como individuos, foram contados como votos.

Agora quanto ao numero, desde que se duvidou se havia na casa o numero sufficiente para tomar deliberação, eu não posso conceber como um facto d'esta ordem que invalida, ou não invalida as resoluções que se tomaram não seja consignado na acta, e que possa passar em silencio uma circumstancia que torna absolutamente irregulares todas as votações que se tomaram. Então a acta não é a historia do que se passa na assembléa, então a acta é um apontamento das votações que se tomam n'um, sentido ou n'outro; mas esta não é a idéa que eu tenho do que deve ser uma acta. O que me parece é que lendo-se duvidado em qualquer das phases da sessão se havia ou não numero legal, não é possivel deixar de consignar esta duvida, e ao mesmo tempo que ella se desfez por meio das verificações nominaes. Em todo o caso eu não tomo mais a palavra sobre este assumpto, mas desejava sempre, que quando houvesse duvidas sobre as resoluções da camara, essas duvidas se esclarecessem, e que não fosse necessario que v. ex.ª interpozesse a sua auctoridade, que aliás é respeitavel, não para esclarecer as duvidas, mas para obstar a que ellas se proponham e esclareçam. Eu hontem não votei, obedeci a v. ex.ª, agora d'aqui por diante não hei de mais obedecer e hei de perguntar: para que é isso? Para que me mandam levantar?

O sr. Conde de Samodães: — Sr. presidente, visto que se trata d'este objecto tambem quero dar uma explicação á camara.

Eu estava fóra da sala, estava nos corredores para me ir embora, quando um continuo da casa me disse que v. ex.ª mandava convidar os deputados que estavam fóra a entrar para se votar um requerimento. Foi n'essa occasião que entrei na sala. Não sei se havia ou não numero, mas o que posso dizer é que entendi perfeitamente o que v. ex.ª propoz á votação. Estava sentado na extrema esquerda, vi que era cousa pequena de que se tratava, demorei-me ali e rejeitei o requerimento do sr. Alves Vicente, porque nunca voto que se despenso o regimento; mas já se vê que assim como eu rejeitei, todos podiam rejeitar, e por consequencia não ha motivo algum para os reparos que vejo.

O sr. Moraes Carvalho: — Sr. presidente, a questão, na hypothese, a meu ver é de pequena entidade, mas para se consignar como principio, póde ser de funestas consequencias. Eu não entro na avaliação de saber se um requerimento feito depois de dada a hora podia ser posto á votação; é uma questão de que prescindo, entretanto o que é certo é, que quando v. ex.ª poz á votação o requerimento do sr. Alves Vicente, houve quem dissesse, na casa não ha numero, a mesa devia verifica lo e alguns srs. deputados julgando que se tratava da verificação estavam em pé, e tambem eu estava. Eu digo a v. ex.ª que se se tratasse de votar o requerimento eu tambem votava por elle. (Vozes: — Todos, todos nós.) porque julgo que interessámos mais em continuar na discussão d'este projecto do que em ficar adiada, (Apoiados.) mas não se póde duvidar de que a acta está muito irregular. O artigo 155.° § 2.° do regimento diz positivamente que um dos secretarios conta os levantados, e o outro os sentados, declarando cada um o numero dos que contou.

Pergunto, consta isto da acta? Quantos se levantaram? Quantos ficaram sentados? Se nada d'isto consta, como é que havemos de approvar a acta, sem se fazer menção d'esta votação, e principalmente n'uma questão que envolvia dispensa do regimento, em que eram precisos que votassem dois terços do numero de deputados, e mais de 41, porque são necessarias essas circumstancias para se verificar se tem ou não logar a dispensa do regimento? Alem de que ha outro artigo no regimento que diz que todas as vezes que ha duvida sobre a votação, deve proceder-se a contraprova, é o artigo 166.° A questão não era sómente de duvida sobre a natureza e objecto da votação; duvidou-se sobre o numero dos deputados que estavam na sala, e isto é que devia verificar-se, e não era rasoavel que v. ex.ª levantasse a sessão sem que se verificasse se sim ou não existia na sala numero sufficiente para se decidir sobre o requerimento que se propunha. Mas nada d'isto consta da acta e por consequencia não esta bem redigida; e digo isto porque eu quero que fique bem assentado o que deve regular sobre este ponto, para que de futuro não aconteça o mesmo a respeito de alguma questão importante. É necessario que nós estejamos acautelados para não se dar por decidido aquillo que não o está. E eu declaro outra vez a v. ex.ª que votava pela proposta do nobre deputado o sr. Alves Vicente, mas tambem declaro que me conservei em pé julgando que se tratava de verificar se havia numero na sala.

O sr. Presidente: — O requerimento do sr. Alves Vicente propu-lo á votação, porque o nobre deputado ha de estar lembrado que sempre assim tem acontecido em outras vezes, quando se pede a palavra para um requerimento; antes de haver dado a hora tem-se entendido que ha o direito de o fazer depois, e por isso mesmo é que o submetti á decisão da camara tendo os srs. secretarios verificado que havia numero na sala. Em quanto á prova ou contraprova, se a rasão por que se diz que era necessario a contraprova é por que se suppunha que não havia numero, então desnecessario era a contraprova porque haviam saído algum ou alguns senhores da sala. Mas, pergunto eu acamara, quer por isso reputar inutil uma resolução anterior em virtude de uma votação, em que tiveram parte 54 srs. deputados que estavam na camara? Se quer, então fique isso consignado para o futuro. Em quanto á contagem d'esses votos, só se costuma observar esse systema a respeito das questões importantes, mas não se observa nas questões insignificantes, que muitas vezes aqui se apresentam antes da ordem do dia, e mesmo nas questões importantes se não observa vendo-se que se levantam todos ou quasi lodosos srs. deputados, e que apenas faltam tres ou quatro que ficam sentados. Mas então declarou-se que havia numero, e eu não propuz o requerimento á votação em quanto senão contaram os srs. deputados e me disseram que havia 54 senhores na sala. Effectivamente estavam tres ou quatro sentados vendo-se claramente que não podia deixar de haver mais de dois terços levantados.

O sr. Pequito: — Eu peço acamara que me faça a justiça de crer que como secretario não sou nem da maioria nem da opposição. (Apoiados.) Sou simplesmente secretario da camara. (Apoiados.) Todo o meu procedimento tem-se encaminhado para convencer a camara d'esta minha asserção.

Effectivamente não se consignou na acta o numero de votos que houve nem a favor nem contra o requerimento, porque lai pratica observa-se simplesmente quando pela simples intuição se não conhece que a materia sobre que se vota está vencida, de outro modo não se verifica qual o numero dos que votam contra ou a favor, e eu invoco o testemunho do meu illustre collega o sr. secretario Mamede, que não póde ser suspeito ao nobre deputado o sr. Moraes de Carvalho. Isto mesmo tem-se feito muitas vezes, todas as vezes que, correndo os olhos pela sala, se conhece pela simples intuição, que o numero de levantados ou sentados é de tal maneira indicativo que é escusado consignar o numero de votos a favor ou contra.

Por consequencia eu não consignei na acta que tantos srs. deputados votaram a favor do requerimento e tantos contra, porque não reputei isso necessario; e não havia de consignar uma cousa que não estava assentada nem pelo regimento nem pela pratica que devia consignar-se na acta.

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Todavia logo que o sr. Alves Vicente propoz o requerimento, v. ex.ª consultou a camara sobre o requerimento, isto 6, se o approvava ou rejeitava, porque então havia numero na casa, porque estavam 54 srs. deputados na sala. Eu e v. ex.ª vimos que apenas quatro ou cinco senhores ficaram sentados, porque quasi todos estavam levantados, e por consequencia partimos do principio de que o requerimento do sr. Alves Vicente tinha sido votado. Depois algum dos srs. deputados disse que não havia numero, e eu verifiquei fazendo a contagem, e contei 53. Foi então que v. ex.ª disse que havia numero quando se votou, e levantou a sessão. A rasão porque não esta consignado na acta o numero dos que votaram a favor e contra o requerimento, foi porque ninguem houve que pedisse a palavra e requeresse em lermos que se verificasse se havia numero ou não. Simplesmente daquelles bancos é que partiram algumas vozes dizendo que não havia numero. Apesar d'isso verificou-se, mas como não se reclamou que se consignasse na acta, e como o secretario só tem obrigação de consignar na acta o resultado das votações pró ou contra, por isso se não consignou.

O sr. Moraes Carvalho: — Sr. presidente, eu quando me refiro a qualquer omissão ou deficiencia na acta, estou muito longe de entrar nas intenções dos illustres secretarios, em quem reconheço probidade e inteireza; (Apoiados.) e por isso em tudo quanto disser, as intenções d'elles ficam sempre resalvadas.

Eu julgo que não se póde justificar a mesa se acaso tomou alguma vez sobre si a faculdade de alterar o regimento sem deliberação da camara. Não direi que se não tenha feito; mas estou certo que muitas vezes em que se tem pedido a dispensa do regimento, lêem se contado os votos pró ou contra para se fazer a contagem. Alem d'isto direi, se lai tem sido o systema da mesa, é necessario arripiar carreira, seguir outro systema, ao menos em todas as questões em que se tratar da dispensa do regimento, porque e indispensavel que conste quantos votaram a favor e quantos contra. Ponho de parte a questão do numero de sentados e levantados na votação passada, porque effectivamente eu mesmo dou testemunho de que sentados ficaram muito poucos deputados. Mas v. ex.ª não póde desconhecer que sobreveiu a idéa de falla de numero, e v. ex.ª disse: «vae verificar-se» e por consequencia alguns dos srs. deputados, assim como eu, conservaram-se de pé, porque julgaram que era isso de que se tratava, e não de votar-se sobre o requerimento do sr. Alves Vicente, que eu já disse e repito que votaria por elle. Agora o que não póde duvidar-se é que depois de se dar este facto, depois de se dizer que não havia numero sufficiente para se votar era necessario verificar esse facto, mas não aconteceu assim, e qual deveria ser o resultado? Ficar reservada a votação para o dia seguinte: nada d'isto consta da acta, que por isso mesmo continuo a classificar como deficiente, não contendo tudo quanto aqui se passou; assim como me persuado que se andou com alguma precipitação.

O sr. Sá Nogueira: — Sr. presidente, eu levanto-me simplesmente para confirmar o que v. ex.ª disse. Quando foi posto á votação o requerimento do sr. Alves Vicente viu-se n'essa occasião que muito poucos deputados ficaram sentados, apenas ao pé do sr. D. Antonio da Gosta se viram tres ou quatro senhores sentados; por consequencia a verificação que o sr. Moraes Carvalho exigia era inutil, era superflua, porque o caso estava em haver numero na casa. Uma vez que houvesse numero na casa,.havia os quarenta e dois ou quarenta e tres que o regimento exige; de sorte que essa exigencia do illustre deputado é... eu sei... uma superfluidade. Não sei para que isso sirva; porque estava verificado que com effeito havia numero para dispensar o regimento, havia mais que numero, porque uma vez que havia numero na casa, que havia os cincoenta e quatro, ainda que se não levantassem dois ou tres, os restantes faziam numero legal para se tomar essa resolução.

Ora, v. ex.ª poz a questão muito clara: a reclamação appareceu depois de ter já o sr. secretario declarado que tinha saído um deputado para fóra, e por consequencia v. ex.ª fechando a sessão, fez muito bem. V. ex.ª e o sr. secretario observaram o regimento, fizeram o que deviam, e entendo que a mesa merece louvores pelo que fez.

O sr. Presidente: — Vou submetter a questão á camara. O que é preciso é ver se se ha de lançar na acta o que quer o sr. José Estevão: pedir-lhe-ia até que mandasse uma nota do que quer que se lance.

O sr. José Estevão: — Eu não mando nada; reservo-me para declarar nos jornaes que me tomaram na camara dos deputados um voto que não dei.

O sr. Presidente: — Vae ler-se a ultima parte da acta; se a acta for approvada como esta, não ha mais votação a fazer; se a acta não for approvada, então ha de se decidir alguma cousa, e veremos o que ha de ser.

Leu-se, e levantaram se approvando a acta 44 srs. deputados, e quando o sr. presidente mandou levantar os que voltaram contra, para se contarem, disse

O sr. José Estevão: — É para me contarem, ou é para eu votar?... É o que me aconteceu hontem; mandaram-me levantar para ver se havia numero, e contaram-me como approvando. (Vozes: — Não é exacto.) É exacto. (Susurro.)

O sr. Presidente: — Eu disse agora: os srs. deputados que approvam a acta lai qual esta, queiram ler a bondade de se levantarem. Levantaram-se, e contaram-se 44 votos approvando. Depois disse: os que ficaram sentados queiram levantar se. É para se contarem aquelles que não querem que a acta se approve lai e qual, e que querem que se insira n'ella mais alguma cousa.

Verificada a votação, foi approvada a acta por 44 votos contra 28.

CORRESPONDENCIA.

Declarações.

1.ª — Do sr. Trindade Sardinha, de que faltou á sessão de hontem por incommodo de saude.

A camara ficou inteirada.

2.ª — Do sr, Garcia da Rosa, dç que fallou á sessão de hontem por incommodo de saude.

A camara ficou inteirada.

3.ª — Do sr. J. J. da Cunha, de que o sr. Ferreira de Castro o encarregára de participar á camara que lhe não tem sido possivel vir tomar parte nos trabalhos parlamentares por motivo de molestia, mas que virá logo que cesse aquelle incommodo.

A camara ficou inteirada.

Officios.

1.° —Do sr. Judice Samora, participando que por incommodo de saude foi impedido de comparecer nas sessões de hontem e de hoje, o que provavelmente lerá de succeder por mais alguns dias.

A camara ficou inteirada.

2.° — Do ministerio da justiça, acompanhando duas relações dos processos intentados nos districtos judiciaes das relações de Lisboa e Porto por contravenções eleitoraes nos seis mezes que decorreram até 9 de abril do anno findo; satisfazendo-se assim a um requerimento do sr. conde de Samodães.

Para a secretaria.

EXPEDIENTE

A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA. Nota de Interpellação.

Pretendo tomar parte na interpellação feita ao sr. ministro da marinha e ultramar, ácerca da falla de tribunaes de justiça na provincia de Angola, interpellação que foi annunciada pelo sr. Pinto de Almeida. = Soares Franco.

Mandou-se fazer a communicação.

O sr. Pitta de Castro: — Mando para a mesa um parecer da commissão ecclesiastica.

Aproveito a occasião para fazer o seguinte requerimento... (Leu.)

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O sr. Pegado: — Pedi a palavra para rectificar uma cousa que disse antes de hontem. Eu disse antes de hontem que era mil o numero de exemplares que se tirava do Diario da Camara, mas os que se tiram vem a ser mil e setecentos.

O sr. Cyrillo Machado: — Mando para a mesa dois requerimentos, pedindo esclarecimentos ao governo... (Leu-os.) e mando tambem a seguinte

Nota de Interpellação.

Pretendo interpellar o sr. ministro das obras publicas acerca do estado da companhia Viação Portuense, e da execução que tem tido a lei de 13 de agosto de 1836. == Cyrillo Machado.

Mandou-se fazer a communicação.

O sr. Mendes Leite: — Mando para a mesa a nota dos requerimentos que durante esta semana deram entrada na commissão de petições.

O sr. Gaspar Pereira: — Pedi a palavra unicamente para declarar a v. ex.ª e á camara que faltei á sessão de quinta feira porque me achei doente de cama; hontem estava melhor, mas não me foi ainda possivel comparecer; não tive tempo para isso. E aproveito tambem a occasião para declarar que por isso mesmo que hontem não vim, na votação que teve ha pouco logar não votei, nem podia votar sobre um objecto que se passou estando eu ausente.

O sr. Luciano de Castro: — Sr. presidente, eu pedi a palavra para renovar uma nola de interpellação ao sr. ministro das obras publicas, nota que hei de mandar para a mesa para se lhe dar o destino competente; mas como esta presente o sr. ministro da fazenda, póde s. ex.ª participar ao sr. ministro de obras publicas o objecto d'ella, que é de interesse publico.

Sr. presidente, o sr. ministro das obras publicas fez agora uma viagem aos districtos do norte por motivos de interesse publico. É de crer que s. ex.ª inspeccionasse competentemente as estradas que foi examinar; e desejava perguntar-lhe se linha inspeccionado alguma cousa em relação á estrada que vae de Ovar ao Porto pela Feira; desejava saber as intenções do ministerio a este respeito, e desejava estimular s. ex.ª, para que désse todo o andamento necessario a esta obra, que é de maxima utilidade para aquelles districtos. Por isso peço ao sr. ministro da fazenda que tenha a bondade de communicar ao sr. ministro das obras publicas a minha interpellação, para elle se habilitar a responder sobre o estado da estrada de Ovar ao Porto pela Feira, que é objecto de maxima utilidade e de grande importancia para dois districtos. Não posso deixar de instar constantemente por esta interpellação, não como opposição, mas unicamente por fazer com que se realise uma obra de grande importancia para aquelles districtos. Era isto que linha a pedir a s. ex.ª, e remetto para a mesa a nota de interpellação, pedindo a v. ex.ª que lhe de o andamento necessario, a fim de se poder conseguir alguma cousa n'esta parte, que é unicamente o meu fim.

Nota de Interpellação.

Renovo a interpellação que annunciei ao sr. ministro das obras publicas sobre a construcção da estrada de Ovar ao Porto pela Feira. = Luciano de Castro.

Mandou-se fazer a communicação.

O sr. Conde de Samodães: — Mando para a mesa um parecer da commissão de organisação o administração militar.

ORDEM DO DIA.

Continuação da discussão do projecto de lei n.º 16.

O sr. Mártens Ferrão: — Pedi a palavra sobre a ordem, para rectificar uma idéa que apresentei aqui hontem, quando alludi ao emprestimo de 600:000$000 réis. A apreciação que fiz a respeito d'esse emprestimo não teve a clareza que eu desejava dar-lhe. A minha idéa é que, tendo sido auctorisado o governo para o contrahir com a amortisação de vinte annos e com o juro correspondente, linha sido votada para isto pela camara uma dotação, que estava justamente no orçamento do ministerio das obras publicas, e que por consequencia era uma dotação especial, e por esta parte o emprestimo não ía sobrecarregar o deficit, porque a dotação dos 15 por cento para estradas era justamente uma dotação que entrava no orçamento das obras publicas, e era uma consignarão especial para aquelle objecto; mas que tendo o emprestimo sido contratado a letras a seis mezes, o encargo resultante d'essa diminuição de praso ficava a descoberto para a fazenda publica, e portanto que a dotação especial que linha sido consignada pela lei não era sufficiente para o encargo no semestre futuro; que o encargo havia de recaír sobre a fazenda publica, porque o que havia de ser pago em vinte annos pela amortisação, tendo o juro correspondente, não encontrava dotação sufficiente na que se lhe tinha consignado, lendo sido levantado por essa operarão de thesouraria. Esta era a minha idéa, que hontem não apresentei de uma maneira clara e satisfatoria.

Em segundo logar queria rectificar tambem que em relação ao emprestimo de 57:000$000 réis já realisado para as obras da barra do Douro, considerei que a dotação que lhe linha sido consignada estava no orçamento geral do estado, quero dizer, pertencia á dotação geral do estado na receita ordinaria; mas verificando os orçamentos do anno passado encontro que essa verba de 9:000$000 réis pertencia á dotação das obras publicas. Por consequencia já se vê que n'esta parte aquelle emprestimo de 57:000$000 réis, que o sr. ministro já realisou, tem uma dotação especial; o que o outro dos 600:000$000 réis linha dotação especial e sufficiente, se se tivesse seguido a marcha estipulada na lei que o auctorisou; mas que tendo este emprestimo de ser amortisado em seis mezes, fica a descoberto o encargo d'elle resultante.

Eram estas as minhas idéas que linha a rectificar; entendi que devia usar de toda a franqueza o lealdade perante a camara, e por isso fiz estas rectificações para se conhecerem, e mesmo para não poder ser julgado em erro por uma cousa que n'uma parte foi falta de explicarão minha, e na outra menos exame feito por mini sobre o orçamento das obras publicas.

O sr. Ministro da Fazenda (Antonio José d'Avila): — Sr. presidente, eu estimo que o illustre deputado viesse hoje rectificar uma parte das inexactidões que proferiu hontem no tom da mais profunda convicção. Eu ouvi hontem ao illustre deputado por muitas vezes insistir em que o emprestimo dos 600:000$000 réis para estradas era amortisavel em vinte e cinco annos.

O sr. Mártens Ferrão: — Vinte annos.

O Orador: — Peço perdão. Eu ouvi ao illustre deputado repetir muitas vezes que esse emprestimo havia de ser amortisado em vinte e cinco annos; foi necessario que eu, n'um momento de impaciencia por ouvir o illustre deputado insistir n'um erro d'esta importancia, lhe dissesse d'este lado, desprendendo-me das vantagens que me dava esse mesmo erro, que era em vinte annos, então o nobre deputado reconheceu logo que assim era. Mas o nobre deputado continuou a insistir em que esse emprestimo não tinha dotação especial, porque o imposto das estradas entrava nos cofres do thesouro; o nobre deputado disse isto tambem umas poucas de vezes, e eu quero tirar partido d'estas rectificações, sentindo só que o illustre deputado não viesse fazer outras em erros mais graves do que estes, e que me obrigaram a pedir a palavra hoje, apesar de não m'o permittir o meu estado de saude, por um sentimento de profundo desalento pelo futuro d'este paiz.

Sr. presidente, a mim não me incommodam os argumentos mais ou menos fortes que se podem apresentar contra os projectos que eu apresento á camara; mas confesso a v. ex.ª que é sempre com a mais dolorosa impressão que eu vejo homens do merito do nobre deputado, e do merito do illustre cavalheiro que fallou depois de mim, apresentarem n'esta camara factos que parece impossivel que elles estejam convencidos de que se passaram da fórma por que os descreveram. Suppunha eu que estava já muito longe de nós a epo-

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cha dos sophistas, que se encarregavam de sustentar o pró e o contra conforme lhes convinha. (Apoiados.)

O sr. José Estevão: — Peço a v. ex.ª que tome nota d'estas expressões. Factos de que os deputados não podan estar convencidos, que quer dizer isto?

O sr. Presidente: — Eu peço ao sr. ministro que explique o sentido das suas palavras para evitar questões.

O Orador: — Sr. presidente, eu estou muito a sangue frio, e não tenho nada que explicar: unicamente vou repelir o que disse, e peço aos illustres deputados que tenham a bondade de me ouvir com alguma attenção, não só em proveito d'elles que hão de poupar se a estas irritações, que não têem fundamento algum, mas ainda em proveito da discussão, a fim de não repelirem os argumentos que eu já tinha destruido na primeira vez que fallei. (Apoiados.)

Eu disse que era sempre com um sentimento doloroso que eu via homens de merito como o illustre deputado que fallou hontem, e o cavalheiro que fallou depois de mim, apresentarem factos que parecia impossivel, note-se bem, que estivessem d'elles convencidos.

O José Estevão: — Que não podiam estar convencidos é que foi.

O Orador: — Não foi assim que o eu disse, mas quando o tivesse dito, desde o momento em que eu substituir essa phrase por esta, o illustre deputado não tem direito de insistir mais sobre isto. (Apoiados)

Eu estou em um terreno que me dá taes vantagens que qualquer irritação da minha parte era um desatino; (Apoiados.) não preciso irritar-me; porque o campo em que me collocaram os meus adversarios dá-me, como disse, taes vantagens que basta que eu tire d'ellas o partido que me offerecem, (Apoiados.) para não ficar vencido n’este debate.

Sr. presidente, o sr. Casal Ribeiro, que parecia Ião offendido da phrase que julgava ler eu pronunciado, ha de permittir-me que lhe diga, que se alguem devia estar offendido era eu pela insistencia com que o illustre deputado me attribue aqui constantemente expressões que eu nunca proferi, e contra as quaes sempre protestei. Os illustres deputados que são de uma tal susceptibilidade como a camara acaba de ver, julgam que eu não tenho igual direito.

O illustre deputado disse que eu tinha no projecto que apresentei á camara privado o meu collega o sr. ministro das obras publicas de todos os meios necessarios para poder continuar este anno os melhoramentos materiaes do paiz, e que isto estava em harmonia com as minhas idéas antigas, porque eu linha sustentado n'esta casa que votava ao meu antecessor o sr. Fontes Pereira de Mello tudo o que quizesse para as despezas correntes, mas nem um real para obras publicas... não disse isto o illustre deputado? (Pausa.)

Pois aqui esta o que eu disse n'essa occasião, e tanto mais doloroso é isto para mim quanto que o illustre deputado o tem dito muitas vezes, e que eu o tenho sempre repellido. Aqui está o Diario d'esta camara. Quando as opposições recorrem a estes meios, muito má deve ser a causa que sustentam. Disse eu n'essa memoravel discussão, a que se referiu o illustre deputado, quando eu procurava formular precisamente os lermos da opposição que fazia ás medidas que foram apresentadas então, disse eu o seguinte:

«A companhia do caminho de ferro, como diz uma auctoridade, a que dou peso, tem meios para acabar o caminho; pois continue o seu contrato. Carece a companhia de algum soccorro? Venha o ella pedir, e eu serei o primeiro a ajudar o governo para que se lhe conceda esse soccorro.»

Estão presentes muitos cavalheiros que fizeram parte d'essa camara, e que se hão de recordar se foi ou não precisamente isto o que eu disse, e que está no Diario da Camara. (Apoiados.) Continuando esse mesmo discurso, disse eu mais:

«Quer o governo meios para viver até março do anno que vem? Quer meios para as despezas publicas? Quer meios para as eiras indispensaveis que é necessario fazer. Conte com o meu fraco concurso pata que esses meios sejam levados á execução.»

Onde viu pois o illustre deputado o que me attribue? Por que não apresenta as provas d'essa proposição que constantemente me lança em rosto, proposição que é alem d'isto desmentida por todos os actos da minha vida publica. (Apoiados.) Mas já n'esse debate se me tinha attribuido essa mesma proposição, contra a qual eu desde logo protestei. Desejava pois que o illustre deputado, que é tão susceptivel, me dissesse se está sinceramente convencido de que eu disse aqui similhante cousa? Examinou s. ex.ª os documentos em vista dos quaes podia justificar essa imputação que me está constantemente a fazer? O illustre deputado responderá.

Foi com a mesma exactidão que outra proposição foi aqui apresentada hontem pelo illustre deputado que fallou era ultimo logar. Disse o illustre deputado para justificar não sei o que, nem sei a que proposito vieram os actos da minha administração em 1851 para a questão que nos occupa hoje. Isto mostra que os illustres deputados estão tão cheios de rasão que precisam recorrer a todos estes meios pequeninos para sustentar a sua opinião. (Apoiados.) Disse o illustre deputado: «Em 1851 pagaram-se cinco mezes aos servidores do estado, e tres mezes ás classes inactivas...»

O sr. Mártens Ferrão: — Eu fallei de epocha anterior; não me referi á administração de que s. ex.ª fez parte, fallei de epochas anteriores a 1851; houve epocha em que os servidores do estado receberam cinco mezes no anno e as classes inactivas tres mezes.

O Orador: — Mas a que epocha se referiu então o illustre deputado?

O sr. Mártens Ferrão: — Desde 1848 até 1851; o facto é que nunca se pagaram doze mezes em cada anno,

O Orador: — Eu espero obrigar o illustre deputado a fazer mais correcções d'estas, e a camara e o paiz as apreciarão.

Eu não sei então a que proposito viesse esse facto! Parecia-me que o illustre deputado tinha querido comparar a situação que começou em maio de 1851 com a precedente, que na n’este intuito que disse, que até 1851 se pagavam cinco mezes em cada anno aos servidores do estado, e tres mezes ás classes inactivas.

Eu tenho aqui a nota dos pagamentos que se fizeram n'essa epocha, sendo eu ministro, e posso asseverar ao illustre deputado que em tempo nenhum, mesmo antes da minha entrada no ministerio, se pagaram só cinco mezes, e se o illustre deputado se tivesse dado ao trabalho de consultar os documentos officiaes, porque assim é que se póde argumentar, veria que em 1851, sendo eu ministro, o pagamento era feito na rasão de dez mezes por anno ás classes activas e inactivas. No Diario do Governo d'essa epocha acha o illustre deputado as datas em que começavam esses pagamentos; ahi estão essas datas e os relatorios que eu apresentei á camara, que apesar de muito imperfeitos como são, comtudo deviam merecer ao illustre deputado o trabalho de os examinar para ver o que elles contêem; porque eu tenho tido o mau costume de dar conta á camara de tudo quanto faço, embora esses documentos só sirvam para dar armas para os meus adversarios me combaterem; do que comtudo me não arrependo, porque esses documentos ficam e servirão para um dia se me fazer justiça.

No relatorio de 1851, que apresentei ao parlamento e que está nos archivos d'esta casa, diz-se expressamente o seguinte... (Leu.)

Vez mezes neste anno ás classes activas e inactivas. Mas aqui estão os annuncios feitos no Diario do Governo d'essa epocha da abertura d'esses pagamentos; e alem d'isto póde o illustre deputado consultar os seus amigos politicos, no numero dos quaes ha empregados d'esse tempo, e elles lhe dirão se effectivamente no anno de 1850-1851 se pagaram só cinco mezes aos empregados, e tres ás classes inactivas.

Os annuncios no Diario do Governo provam que o primeiro pagamento no anno economico de 1850 a 1851 começou a 6 de julho, o segundo a 10 de agosto, o terceiro a 23 de setembro, o quarto a 28 de outubro, o quinto a 6 de dezembro, o sexto a 15 de janeiro, o setimo a 22 de fevereiro e o oitavo a 1 de abril. Sobreveiu o movimento de

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abril que me fez saír do ministerio, não posso pois responder pelo que aconteceu depois. A camara vê comtudo que esses pagamentos eram feitos em ordem a poderem ser satisfeitos dez mezes n'esse anno economico.

Portanto, sr. presidente, o facto que o illustre deputado apresentou, e que agora quer retractar, retratação que eu aceito, este facto é altamente inexacto. (Apoiados.)

Mas o illustre deputado tanto se referia a essa epocha, que apreciando o estado da fazenda publica n'esse anno, foi procurar o preço das inscripções de 3 por cento n'esse tempo, e disse que estavam a 38 em fevereiro de 1851, quando em maio de 1856 estavam a 42; até n'isso foi inexacto. Visto que o illustre deputado se referia á minha administração, por quanto eu estava no ministerio n'esse mez de fevereiro, podia procurar uma epocha mais proxima á minha saída do ministerio, e encontraria que no dia 31 de março d'esse anno estavam as inscripções de 3 por cento a 39 1/2, e que mesmo em fevereiro estiveram sempre a 38 1/2 (O sr. Mártens Ferrão: — A 38 1/4.) tenha paciencia; estavam a 38 I: eu não costumo fallar de cor sobre estes assumptos, e sobretudo quando nos factos que eu possa apresentar, possa apparecer censura a alguem.

Preço das inscripções de 5 por cento segundo a cotação publicada no Diario do Governo.

[Ver Diário Original]

Compare pois o illustre deputado estes preços e verá que as inscripções que estavam a 31 de março de 1851 a 39, estavam a 26 de maio de 1856 não a 42, como disse o illustre deputado, mas a 41. Calcule o illustre deputado por aqui o grande incremento que houve no credito das inscripções n'esses cinco annos.

Mas o illustre deputado disse ainda: « Levantava-se dinheiro a 9 e a 10 por cento »; examinou o illustre deputado a natureza d'estes emprestimos? De certo que não. Esses emprestimos não eram sobre penhores, era uma mera promessa do governo de pagar; eram letras que só tinham por garantia a palavra do governo. Compare o illustre deputado operações d'esta natureza com as que depois se fizeram, e aonde não corria o menor risco o prestamista; e diga-me se operações, como as primeiras, a 9 ou a 10 por cento não eram mais baratas do que as que se fizeram depois a 7 por cento. (Apoiados.) Nas primeiras operações não correu tambem nenhum risco o prestamista: felizmente o governo cumpriu rigorosamente as suas promessas. (Apoiados.)

N'estas materias, quando se quer fallar, é preciso examinar os factos todos; não basta examinar uma circumstancia isolada, porque fazendo-se assim, ha de se inevitavelmente caír nos erros que o illustre deputado commetteu. (Apoiados.)

O nobre deputado foi sincero, quando sustentando que no documento n.° 37 do meu relatorio havia uma deducção repetida duas vezes, disse que não tinha verificado essa repetição, mas que fallava d'ella, porque o sr. Casal Ribeiro asseverava que a tinha encontrado: o illustre deputado não fallou pois por auctoridade propria, referiu-se á do sr. Casal Ribeiro. Ora eu convido o illustre deputado o sr. Casal Ribeiro, e o illustre deputado, a mandarem para estes bancos, ou para a mesa a demonstração d'esse erro, a fim de que eu lhes possa responder.

O sr. Mártens Ferrão passou depois á analyse do meu relatorio e considerou-o como uma conta completa da receita e despeza do estado no anno de 1856 a 1857: eu não lhe tinha dado essas proporções; eu entendia que fazia um serviço á camara apresentando lhe um documento que não estava acostumada ha muito tempo a receber; mas o illustre deputado só achou faltas n'esses documentos, muitas das quaes estavam comtudo preenchidas no outro relatorio que apresentei á camara, como o illustre deputado teria verificado se se tivesse dado ao trabalho de o examinar. (Apoiados) O illustre deputado disse umas poucas de vezes: « Prova-se por este relatorio que houve desvios em março de 1857», mas não se diz que desvios eram esses; ora se o illustre deputado tivesse examinado todos os documentos d'esse mappa, lá os encontraria. Primeiramente eu não sei para que se fazem perguntas a um ministro, quando elle já respondeu, (Apoiados.) e eu respondi no meu relatorio a essas perguntas; mostra quaes eram as inscripções e bonds que estavam creadas, e a que se refere o artigo 2.º do projecto, as datas em que entrou no thesouro o producto dos diversos emprestimos, e as datas em que esse producto foi posto á disposição do ministerio das obras publicas.

Aqui tem portanto o illustre deputado a base para todos os esclarecimentos que quizer.

Quanto ás perguntas que se estão fazendo sobre se o governo está disposto a repor as sommas que tirou, direi ainda outra vez que essas sommas estão sendo entregues todos os dias ao ministerio competente, á medida que elle as requisita; hoje já é necessario alterar o mappa que apresentei aqui hontem. É por isso que o governo vem pedir ás côrtes que lhe votem os meios precisos para preencher o risco que esses artigos estão fazendo na receita corrente. A que está o pensamento do projecto, o illustre deputado o sr. José Estevão ficou muito afflicto porque o sr. Casal Ribeiro me quiz dar diploma de poeta, não tenho com effeito essa fortuna; mas ha uma cousa em que eu capricho que é em ser claro rias minhas demonstrações.

Sr. presidente, eu quando pedi a palavra era minha intenção repor o debate nos lermos em que eu o linha collocado: era explicar o pensamento do projecto, o que vou fazer muito depressa, porque persuada-se a camara de uma cousa, e é que nós não viemos agora aqui só para votar este projecto. (Apoiados.) O paiz esta reclamando de nós medidas urgentissimas, (Muitos apoiados.) e em que toda a demora é prejudicial; e, se estivermos por conseguinte a dar a este debate as proporções que se lhe tem dado, podem os illustres deputados ter a certeza de que nós faltámos ás nossas obrigações. Eu, sr. presidente, não hei de cooperar para isso: tenho respondido a discursos estiradissimos, e os illustres deputados não podem dizer que eu lenha feito discursos que tenham levado uma sessão inteira 011 duas sessões; mas não podia deixar de responder a estes argumentos, assim como tambem não posso ainda deixar de responder a duas ou tres cousas que ouvi e que me penalisaram.

Os dois illustres deputados disseram que a rasão das difficuldades em que nós estavamos era porque o governo contrariava todos os bons principios de administração e de finanças, e que estava todos os dias fazendo despezas sem crear os meios para lhe fazer frente, e que tinha despresado os conselhos da opposição a este respeito. Ora, sr. presidente, quando a opposição ainda ha pouco era governo, vir ella em publico apresentar considerações d'esta natureza é contar muito com a nossa benignidade. Pois porque não desteis a vós mesmos esses conselhos quando ereis governo e quando votáveis despezas novas? Que mais votasteis quando se approvou o contrato do caminho de ferro de leste? Qual a receita que votasteis para fazer face ao minimo do juro que o governo tinha obrigação de pagar aos empreiteiros d'esse caminho? Ora o imposto das notas onde estava elle? Responda o sr. Mártens Ferrão. Oude estava o imposto das notas quando foi aqui votado o projecto que serviu de base á lei de 18 de agosto de 1853? Onde estava o imposto das notas? Eslava todo entregue nos cofres do thesouro para as despezas publicas, menos 108:000$000 réis para amortisação das mesmas notas. E era com esta quantia que se havia de pagar o minimo do juro garantido aos empreiteiros d'este caminho? Quando veiu pedir-se a creação de 1.280:000$

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réis de inscripções para pagar o caminho de ferro do Carreiro ás Vendas Novas qual foi a receita que se creou para os juros d'essas inscripções? Foi o rendimento do fundo de amortisação? Onde estava então o fundo de amortisação? Absorvido pelas despezas publicas. Portanto, os illustres deputados estão-me hoje censurando por aquillo que fizeram durante cinco annos. Que outros nos viessem dizer isto, bem; mas que os homens mais estrenuos defensores daquella situação, que a sustentavam mais valentemente venham dizer-nos que nós pozessemos de parte todos os bons principios de administrarão, que despresámos os seus conselhos, elles que nos deixaram 2 500:000$000 réis de divida fluctuante, que declaravam ler extincto; elles, que tantas vezes nos declararam que tinham morto o deficit, e que deixaram um deficit de 500 e tantos contos, é na realidade para admirar. Vós quereis que nós façamos em um anno aquillo que não fizesteis em cinco annos. Quereis que vos mostre um documento em que se declarava que estava morto o deficit? (Riso.) Ouço rir: parece-me que não deviam provocar o riso estas considerações. Aqui está o relatorio do decreto de 3 de dezembro de 1851, e eu peço á camara que queira ouvir o que se diz n'esse relatorio. (Leu.)

«O governo de Vossa Magestade "fica plenamente habilitado para occorrer ás despezas legaes do serviço publico leu,! do ainda um pequeno excedente com o qual se propõe ir approximando successivamente os prets do exercito e as soldadas da marinhagem, que aliás nunca serão pagos com maior intervallo que o de quinze dias.»

De maneira que veiu dizer-se ao paiz inteiro que com a medida do decreto de 3 de dezembro não só ficava extincto o deficit, mas havia excedente. (Apoiados.) Um anno depois já tornava a haver deficit, e promulgava-se a medida do decreto de 18 de dezembro. Que dizia esse relatorio? (Leu.)

«Senhora! A reducção na despeza publica de quasi réis 350:000$000, que em tanto importa approximadamente a economia resultante da conversão que temos a honra do propor, extingue o deficit que ainda resta, e habilita o thesouro a satisfazer pontualmente os seus encargos dentro de cada anno.»

Pois os illustres deputados que adoptaram medidas Ião violentas como estas para acabar o deficit, que sustentaram que o deficit linha acaba lo, que pediram meios para acabar com as antecipações, e que nos deixaram 2.500:000$000 réis de antecipações e um deficit de 500:000$000 réis, têem direito a accusar-nos? (Apoiados.) Nós estamos soffrendo as consequencias da situação que nos deixaram.

O sr. Casal Ribeiro disse uma grande verdade, e era == que não eram os encargos resultantes da febre amarella que tinham produzido os embaraços com que lutâmos =. Eu não o linha dito, e o illustre deputado não comprehendeu a generosidade do meu proceder... (Rino.) a generosidade, repito. Pois, sr. presidente, se não houvesse uma divida fluctuante na importancia de 2 500:000$000 reis eram réis 400:000$000 réis de despeza extraordinaria que vinham incommodar o governo?

Este é que é o facto: é verdade que senão tivesse havido o deficit de 500:000$000 réis, que o governo actual recebeu, é evidente se não houvesse uma divida fluctuante de 2.500:000$000 réis, e se a esta divida não estivessem hypothecadas as inscripções do fundo de amortisação 300, 400 ou 500:000$000 réis que fossem gastos por virtude da febre amarella, não incomodavam nenhum governo.

O sr. Casal Ribeiro disse tambem que eu estava dando acepipes aos possuidores das inscripções, mandando pagar os seus juros nas capitaes do districto; fazendo passar leis em que permittia o pagamento das contribuições directas por encontro nos juros das mesmas inscripções, e procurando converter em inscripções as propriedades administradas pelos corpos de mão morta, que eu estava porém enganado se julgava que taes medidas tendiam a augmentar o valor das inscripções. Pois o nobre deputado disse isso sèriamente? Pois o nobre deputado póde negar que estas medidas hão de infallivelmente melhorar o»valor da nossa divida fundada? Póde negar isso? (Apoiados.) Não me posso demorar n'esta demonstração um minuto; porque seria offender a intelligencia da camara. Mas perguntaria ainda ao nobre deputado: se não entende, que se porventura os nossos titulos da divida fundada vierem a um preço muito mais elevado do que têem hoje, se os nossos embaraços financeiros não hão de diminuir consideravelmente, resultando d'ahi uma grande economia para o thesouro, que póde e deve ser applicada para os melhoramentos de que tanto carece este paiz? (Apoiados.) Portanto as medidas que o governo tem adoptado n'este sentido, em logar de merecerem desfavor deviam merecer da parte dos nobres deputados mais consideração. Nós podemos ler errado nas medidas que lemos tomado para melhorar o preço dos titulos da divida fundada; mas as medidas adoptadas pela situação que o nobre deputado sustentou, não o melhoraram por certo; porque 1 ou 2 por cento no valor das inscripções no espaço de cinco annos, não é melhoramento, é o contrario: (Apoiados.) e é sinceramente que o nobre deputado julga que o accordo de Londres fez subir as inscripções em Lisboa? Pois os nossos fundos não estão mais baixos na praça de Londres do que em Lisboa?

O sr. Casal Ribeiro: — Por isso é que não creio nos acepipes.

O Orador: — Pois acepipe foi esse accordo, que nada produziu! (Apoiados.) Tão acepipe que os fundos comprehendidos no accordo estão mais baixos do que aquelles que não estão comprehendidos n'esse mesmo accordo: (Apoiados.) eu, sr. presidente, descreio na presença d’estes factos no futuro d'este paiz, quando vejo que os homens que hão succeder-nos, como o nobre deputado...

O sr. Casal Ribeiro: — Obrigado.

O Orador: — Não é favor que lhe faço, como o nobre deputado; digo que ha de ser chama lo pelo seu talento a vir representar um papel importante no estado violentando a sua intelligencia para vir combater as considerações que apresento, que são por forra aquellas que lhe dieta o seu elevado talento.

O sr. José Estevão: — Isso é muito improprio.

O Orador: — Posso todos os dias receber lições, mas da propriedade parlamentar, nunca as receberei do sr. José Estevão.

O sr. José Estevão: — Reclamo contra as phrases proferidas pelo sr. ministro, que sahe perfeitamente o que é um áparte.,

O Orador: — O illustre deputado disse que era improprio o que eu estava dizendo, e eu respondi á phrase que o nobre deputado pronunciou em voz muito alta para ser ouvida per todos, porque um áparte em voz alta tem mais valor que qualquer expressão que possa ser proferida no calor da discussão.

O sr. José Estevão: — Ha o direito de interrupção, ha o direito da resposta; mas o illustre ministro não conhece esses direitos, porque não conhece as regras de educação parlamentar.

O Orador: —Peço á camara que compare as expressões amáveis do illustre deputado com o que eu linha dito.

O sr. Presidente: — Peco ao sr. ministro que continue, e ao illustre deputado que não interrompa.

O Orador: — Repito, pois o nobre deputado o sr. Casal Ribeiro não comprehende porque os nossos fundos de 3 por cento, que têem direito a 1 por cento mais na praça de Londres, e que estão a um preço mais abaixo do que as nossas inscripções hão de dar logar a que se vendam inscripções em Lisboa para sr comprarem fundos em Inglaterra. Aqui está a rasão porque estando os nossos fundos de igual juro a um preço mais baixo na praça de Londres ha de provocar uma venda na praça de Lisboa, e por consequencia uma diminuirão no seu preço. Era o que eu tinha dito, e que o nobre deputado recebeu com um sorriso,

O sr. Casal Ribeiro: — Apoiado.

O Orador: — Estimo muito que nos tivessemos comprehendido, e por isso dizia, que era impossivel que a alta in-

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telligencia do nobre deputado não o levasse ás considerações que estou repelindo. O nobre deputado, tambem no seu espirituoso discurso fez espirito com a denominação de progressista dada a este ministerio; disse que se este ministerio era progressista, era nos disperdicios: ora parece-me que toda e qualquer qualificação poderia compelir a este ministerio, menos a de ministerio desperdiçador. (Muitos apoiados.) Sr. presidente, as operações que nós fizemos demonstram precisamente o contrario d'isso. (Apoiados.) Nós fizemos operações mais baratas daquellas que se faziam antes de nós entrarmos para o ministerio, e ajustámos contas por um preço mais vantajoso do que aquelle porque deviam ser ajustadas antes de nós.

Sr. presidente, a conta dos empreiteiros, nós ajustamo-la mais economicamente do que se ajustaria em vista do accordo que se tinha feito antes de nós. A conta da compra do caminho de ferro esta no mesmo caso, só n'estas duas operações a economia que houve anda por 1.000:000$000 réis em inscripções. (Vozes: — Ouçam, ouçam.) Aqui leiu a camara como este ministerio merece a denominação de ministerio «progressista em disperdicios» pelo contrario a este respeito somos eminentemente retrogrados. (Apoiados.)

O illustre deputado o sr, Mártens Ferrão, querendo, como disse já, dar a este relatorio as proporções de uma conta geral de receita e despeza do estado, perguntou-me quaes eram as quantias que estavam em cofre naquellas diversas epochas. Eu posso satisfazer os desejos do nobre deputado, e provo-lhe com isso que se porventura esse documento não tinha vindo no relatorio, era porque realmente eu não lhe queria dar as proporções a que o nobre deputado o quiz levar; mas verá por esse mesmo documento que não havia vantagem alguma da minha parte em não trazer ao parlamento esse documento, sobretudo em relação á epocha que decorreu de 30 de junho de 1856 a 30 de junho de 1857. Mostro ao nobre deputado que os saldos que havia em cofre em 30 de junho de 1856 montavam a 118:000$000 réis, cifra redonda, em quanto que em 30 de junho de 1857 montavam a 195:000$000 réis. Já vê o nobre deputado que se eu tivesse querido fazer uso d'este documento, o deficit que descrevi no anno economico de 1856-1857, em relação ao deficit anterior, era muito menor; porque o illustre deputado consente de certo que d'estas duas sommas tire a differença, e como os saldos existentes em 30 de junho de 1857 excediam em 77:000$000 réis os saidos existentes era 1856, essa somma devia deduzir-se do deficit. Queria o nobre deputado saber quaes eram as sommas que existiam quando acabou a situação que o nobre deputado sustentou, não posso responder com a mesma precisão, em relação ás provincias, porque essas contas só existem em relação a cada mez. Mas em relação a 31 de maio, posso informar que importavam em 103:000$000. Em 6 de junho, que foi quando se organisou o ministerio presidido pelo sr. marquez de Loulé, nos cofres de Lisboa existiam 22:000$000 réis. Eu pensava que o nobre deputado linha visto n'esse documento uma demonstração de que não havia sommas consideraveis n'esse cofre. Não faço, nem farei censura por isso a nenhum ministro: mas o facto é que o ministerio presidido pelo sr. marquez de Loulé apenas entrou a funccionar teve logo de recorrer a operações que até então não se tinham feito n'este paiz, para fazer frente ás despezas publicas.

O nobre deputado ha de ver n'esse documento a menção que se faz de um emprestimo, que foi devido á generosidade de uma alta personagem. Essa operação foi feita a 7 de junho. O nobre deputado por consequencia devia comprehender que o meu silencio a este respeito não podia ler a explicação que se podia inferir das observações do nobre deputado. Mas, sr. presidente, eu mandei organisar um outro documento, que vae dar o seu devido valor a todas as accusações feitas ti esta administração, de não ler melhorado a receita publica, e de que nós estâmos todos os dias onerando o thesouro com despezas sem melhorar a receita. Aqui esta esse documento que vae responder cabalmente ao nobre deputado. Mandei fazer este trabalho em relação aos impostos directos e indirectos, porque é sobre elles que se exercita mais a acção do governo. Estes impostos em 1851-1852, quando começou a situação que o nobre deputado defendeu, montavam a 10 394:000$000; em 1852-1853, desceram a 9.973:000$000 réis; em 1833-1854, desceram ainda mais a 9.575:000$000 réis, e 1854-1855. foram de 9.818:000$000 réis; em 1855-1856, foram de 10.066:000$000 réis; quer dizer que nos cinco annos que durou essa situação, houve uma diminuição na cobrança d'esses impostos em logar de augmento; o que não era de esperar em vista das medidas fomentadoras que se dizem adoptadas então, e dos melhoramentos que se dizem feitos na cobrança das contribuições. E v. ex.ª sahe que n'um paiz bem organisado, bem governado, a receita publica augmenta todos os dias, pela acção inevitavel das cousas. Quer v. ex.ª saber qual foi a receita que se cobrou no anno que se seguiu a essa administração? Foi de 10.542:000$000 réis, houve um augmento de receita perto de 500:000$000 réis em relação ao anno precedente. Aqui está como esta situação leiu constantemente empregado os meios para fazer desapparecer o deficit, e como aquella situação linha empregado todos os meios para o fazer tambem desapparecer. Torno a dizer, que assumptos d'esta ordem não se podem tratar senão na presença dos documentos, e eu pela minha parte creio que demonstrei á camara que tinha vontade em que ella procedesse com pleno conhecimento de causa, porque descrevi todas as operações que fiz, e ajuntei ao relatorio todos os documentos que pude, e não se póde dizer agora, que ha falla de documentos.

Acabo com esta digressão a que fui obrigado, e vou preencher exactamente o fim para que tinha pedido a palavra que é repor, como disse, a questão no estado em que a deixei, quando fallei a primeira vez.

Sr. presidente, eu entendi que a discussão devia ter acabado depois das explicações que dei á camara, porque o illustre cavalheiro que tinha aberto o debate nem combateu o bill de indemnidade nem declarou que não queria dar ao governo os meios, o que disso é que queria saber o que o governo queria, e que não queria o vago, que dizia haver no projecto. Manifestei claramente o pensamento do projecto, e o que ganhei com isso foi que, os nobres deputados que me seguiram disseram que o projecto estava em completa debandada, que eu ao primeiro ataque da opposição o tinha declarado em terra, e que linha pedido á opposição que nos désse meios de governo. O que eu disse foi, que se havia escrupulos em relação ás disposições do projecto, se se julgava que essas disposições conduzem ao que ellas não conduzem, áquillo que nunca foi da mente do governo, nem da illustre commissão de fazenda, que se dissesse quaes eram as declarações que se desejavam, e que o governo aceitaria todas as que não contrariassem o pensamento do projecto.

Isto tem-se feito por mais de uma vez, e o cavalheiro a quem eu respondo, por mais de uma vez me fez a honra de aceitar propostas minhas n'este sentido: isto é uma troca de actos de cortezia entre um ministerio e uma opposição que é sincera nas declarações que faz de que quer ajudar o governo, mas não lhe quer dar auctorisações indefinidas.

Eu disse que o objecto d'este projecto era dar ao governo os meios que elle linha perdido por circumstancias extraordinarias e imprevistas que tinham occorrido n'este paiz nos dois annos economicos de 1856-1857 e de 1857-1858, que essas circumstancias eram a cholera morbus que linha invadido este reino, a crise das subsistencias que linha obrigado o governo a abrir creditos supplementares, por uma somma excedente a 300:000$000 réis, a febre amarella e a diminuição do rendimento das alfandegas. Os nobres deputados o que podiam fazer era entrar na apreciação destas sommas, e fizeram-o tambem; mas não se limitaram a isso, e a este respeito direi que o argumento apresentado pelo sr. Casal Ribeiro, não é justo, porque diz s. ex.ª a respeito do rendimento das alfandegas em relação ao orçamento, a diminuição é só de tanto. Não ha justiça n'esta apreciação,

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torno a dizer outra vez; porque quando foi aqui approvado o orçamento, reconheci que havia um deficit e declarei que esperava que esse deficit fosse attenuado pelo augmento dos rendimentos das alfandegas á similhança do que tinha havido no anno economico antecedente: logo a comparação ha de ser feita não com o orçamento, mas será com o rendimento do anno anterior.

Disse o sr. Mártens Ferrão: «Mas não houve tambem calamidades nos cinco annos anteriores?» Eu não sei se as houve, o que sei é que os creditos supplementares e extraordinarios que o governo d'essa epocha levantou, de que deu conhecimento ao publico pelo Diario do Governo, montam - a uma somma muito pequena comparativamente com esta.

Procurando no Diario do Governo, publicado em todos esses cinco annos, em relação a essas calamidades, eis aqui o que eu acho:

[Ver Diário Original]

É isto o que encontro, e essas despezas extraordinarias lá estão comprehendidas na divida fluctuante; por isso é que ha 2.500:000$000 réis de divida fluctuante, quando os orçamentos de 1851 a 1856 não podem justificar estes encargos. Pergunto se o nobre ministro da fazenda d'esse tempo não tivesse as inscripções do fundo de amortisação em perfeita liberdade, que foi empenhar, como se havia de haver? Vinha á camara pedir novos meios, é o que eu faço, eu que não tenho esses fundos á minha disposição. Este é que é o facto.

O artigo 1.° do projecto é unicamente um pedido á camara de um credito pela somma de 444:000$000 réis, e mais nada. Aqui está o que diz o artigo 1.°, e não tenho difficuldade nenhuma em que se lhe dê esta redacção. Se a illustre commissão de fazenda quer redigir este artigo por esta fórma, conformo-me com isso. E aqui está respondida a pergunta repetida, que se me tem feito, «se o governo pretende entregar estas sommas ao ministerio respectivo para os fins a que estão destinadas». É este previamente o fim que o governo tem em vista apresentando este projecto, como se vê dos artigos 1.° e 3.°

O artigo 2.° é uma demonstração de lealdade da minha parte para com é parlamento, e por consequencia se os illustres deputados lhe dão uma interpretação diversa da que eu lhe dou, retire-se porque não me faz falta. Na occasião em que foi apresentado este projecto o governo tinha empenhado ao banco de Portugal 1.000:000$000 réis em inscripções, que tinham sido destinados ao emprestimo com que n'este anno economico se devia pagar a primeira prestação para a construcção dos navios de guerra, e alem d'isso tiraram-se das sommas que se haviam levantado para pagar aos empreiteiros uma parte para as despezas publicas; o governo vem pedir a approvação d'este acto que praticou. Se o parlamento entende que d'aqui resulta uma auctorisação illimitada para empenhar mesmo os titulos de divida fundada, que o governo esta auctorisado a levantar para o contrato Petto, elimine-se o artigo, porque repito, não me faz falta.

O artigo 3.° dá ao artigo 1.º a redacção que propuz, deve limitar-se ao seguinte: e é que logo que a governo tenha entregado ao ministerio das obras publicas, e não tarda que chegue essa epocha, todo o producto do emprestimo dos 1.500:000$000 réis possa levantar as sommas necessarias para continuar a construcção do caminho de ferro de Lisboa ao Porto. Eis-aqui o que é o artigo 3.º

O artigo 4.° é um pedido á camara para crear um penhor que o governo se comprometteu a dar ao banco de Portugal pelo emprestimo dos 600:000$000 réis para obras publicas. Este penhor fica nos cofres do banco, não obriga o governo a nenhumas despezas, porque no momento em que estas inscripções se crearem tem que dotar a junta do credito publico, mas ha de receber d'ella esses mesmos juros; e pois uma somma que o governo dá á junta porque não se podem crear inscripções sem a dotar (Apoiados.)

O artigo 5.° é uma auctorisação para extinguir a divida sobre penhores com tanto que os encargos resultantes d'esta operação não excedam a 7 por cento. Esta auctorisação já foi concedida ao governo pelos mesmos srs. deputados que hoje a combalem, com a differença de não podérem ir os encargos alem de 6 por cento. Os factos têem infelizmente mostrado que não se deve contar com a possibilidade de extinguir esta divida por aquelle preço, e é por isso que se pede que os 6 por cento se elevem a 7 por cento.

Os nobres deputados fallaram d'esta auctorisação em lermos que parece deduzir-se dos seus argumentos que ella daria origem á creação de novas inscripções; não é assim, e eu declaro aos nobres deputados que as inscripções com que eu contava extinguir esta divida são as mesmas que lhe servem de penhor. Uma grande divida fluctuante é um grande perigo. Se durante a febre amarella e a crise commercial os prestamistas viessem todos pedir os seus capitaes quem lh'os havia de pagar? Dir-se-ía que se vendessem os penhores, e quem os comprava? Se escapámos então a uma grande crise deve-se esse resultado ao bom senso dos capitalistas da capital e do banco de Portugal.

É preciso pois que o governo esteja auctorisado para extinguir esta divida a fim de usar d'esta auctorisação quando e como as circumstancias lhe aconselharem que o faça da maneira a mais vantajosa para o thesouro. (Apoiados.) O governo armado com esta auctorisação póde evitar grandes transtornos que sem ella não sei como se possam atalhar. Esta divida é uma divida consideravel, escuso de entrar agora na sua origem, pois que é de todos bem conhecida; são capitaes que custam ao thesouro o juro de 7 por cento, que é o encargo que tambem se pede ao projecto. Por consequencia que fazemos nós? Convertemos uma divida exageravel n'um capital cujo juro uma vez que seja por nós pago temos satisfeito a todas as nossas obrigações.

Eu espero que a camara me honrará com a approvação d'este artigo, de que não resulta augmento e póde resultar diminuição de despeza.

Eu peço aos nobres deputados que vejam seriamente a situação em que nos achâmos, esta questão não é hoje só d'esse ministerio, é tambem do que lhe succeder; os illustres deputados da opposição que para aqui Vierem hão de pedir isto mesmo ou mais, infallivelmente. Pois os illustres deputados podem, com a mão na sua consciencia, dizer que alem do deficit ordinario do thesouro o governo póde fazer

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frente ás despezas extraordinarias occasionadas pela epidemia e á diminuição de receita a que ella mesma deu origem? Não podem. (Apoiados.) E de passagem direi, que esses melhoramentos que hoje se estão fazendo na capital são feitos á custa do thesouro; (Vozes: — Ouçam, ouçam.) ás ferias aos operarios que se empregam hoje na limpeza da capital são pagas com o dinheiro do thesouro, o governo esta fornecendo todas as semanas as sommas precisas para isso, porque de doutra fórma a camara municipal declarou que suspendia as obras. Pergunto, querem os illustres deputados embaraçar o governo para continuar estes melhoramentos não só na escala em que estão começados, porém ainda naquella em que é absolutamente indispensavel effectuados? Eu chamo a attenção dos illustres deputados para este ponto, e sobretudo para que queiram considerar esta questão debaixo do ponto de vista que indiquei; porque a grande questão de fazenda ha de vir a Seu tempo, e a respeito d'ella podem os illustres deputados estar seguros que lhe hei de dar todas as explicações de que carecerem. Agora realmente não me parece conveniente á causa publica que alonguemos muito este debate, porque é indispensavel votar ainda outras medidas de que o paiz muito carece; mas que o não podem ser em quanto esta que esta em discussão não for approvada. (Apoiados.)

O sr. Mamede: —...............................

O sr. Sena Fernandes: — Pedi a palavra para um requerimento, para que v. ex.ª consulte a camara, se a materia do projecto que tem estado em discussão na sua generalidade, esta ou não discutida.

Julgou-se discutida.

O sr. Pinto d'Almeida: — Peço que a votação sobre a generalidade do projecto seja nominal. Assim se resolveu.

O sr. Presidente: — Os senhores que approvam o projecto na generalidade, dizem approvo; os outros senhores dizem rejeito.

Feita a chamada, disseram = approvo = os srs. Albino de Figueiredo, Alexandre de S. Thomás, Rodrigues Vidal, Sá Nogueira, D. Antonio da Costa, Avila, Serzedello, Henriques Secco, Pinto d'Albuquerque, Antonio de Serpa, Costa Veiga, Rodrigues Cordeiro, Aristides Abranches, Xavier da Silva, Bernardo de Serpa, Pereira Garcez, Cesario, Conde de Samodães, Conde de Valle de Reis, Rebello de Carvalho, Garcia Peres, Cunha Pessoa, Faustino da Gama, Francisco de Carvalho, Alves Vicente, Polido, Sena Fernandes, Soares Franco, Gaspar Pereira, Sant’Anna e Vasconcellos, Mello Soares, Pinto Tavares, Rebello Cabral, Sepulveda Teixeira, Moraes Carneiro, Bernardino Cardoso, Honorato Ferreira, Benevides, Sousa Pinto Basyo, Amaral Banha, J. J. da Cunha, Sá Vargas, Carvalhal, Pinto d'Almeida, Pinto Soares, Passos (José), L. A. Nogueira, Vellez Caldeira, Brown, Paredes, Paes de Figueiredo, Maximiano Osorio, Rebocho, Menezes Pitta, Fernandes Thomás, S. J. de Carvalho, Rodrigues Leal, Sena Bello, Thomás de Carvalho, Visconde de Porto Carrero, Soure, Miguel Osorio e Pequito.

Disseram = rejeito = os srs. Affonso de Castro, Bettencourt, Moraes Carvalho, Thedim, Cunha e Sá, Fontes Pereira de Mello, Pereira Menezes, Sampaio, Castro Guedes, Barão das Lages, Cyrillo Machado, Rezende, Frederico Guilherme, Pegado, Dias Grande, Mártens Ferrão, Roboredo, Sousa Machado, Mamede, Pinto de Magalhães, José Estevão, Ferreira Pinto Basto, José Guedes, Luciano de Castro, J. M. d'Abreu, Casal Ribeiro, Latino Coelho, Queiroz, Aboim, Trindade Sardinha, Garcia da Rosa, Mendes Leite, Miguel do Canto, Jacome Correia, Nogueira Soares e Victorino de Barros.

Ficou portanto approvado por 63 votos contra 36.

Entrou em discussão o artigo 1.°

O sr. Fontes Pereira de Mello: — Sr. presidente, eu sinto que a maioria da camara encerrasse um debate tão importante, ena altura em que se tinha collocado, quando havia ainda alguns oradores inscriptos, e eu por dever deposição e pelas observações que o nobre ministro da fazenda ainda hoje tinha feito a actos da minha administração, tinha necessidade e precisão de responder. Pareceu-me, com todo o respeito á maioria da camara, pouca generosa senão pouco justa, para com rim homem que não costuma ser faccioso nos debates, e que tem o desejo constante de apreciar a verdade no meio da discussão, impedindo-o de se explicar na discussão da generalidade, que é onde cabia a resposta ás censuras e observações que por parte do governo tinham sido feitas a actos da minha administração. (Apoiados.)

Sinto ainda, sr. presidente, pondo de parte a minha pessoa, que vale pouco ou nada, que n'um assumpto destes se impozesse o silencio, quando se trata de uma medida, que eu classifiquei, e o sr. ministro da fazenda declarou que era nada mais nada menos que uma lei de meios, e a maioria entendesse na sua sabedoria que devia impor silencio á opposição, e obriga-la a votar e a votar principalmente antes de ter distinguido as diversas especies que se comprehendem n'este projecto. Nós não queremos negar ao governo o bill de indemnidade nem os meios de que carece, mas queremos encaminhar as nossas idéas de maneira que possamos apresentar um voto que esteja de accordo com as nossas opiniões manifestadas no debate, e que não seja a prolongação continua de um systema absurdo e inqualificavel que não póde continuar e que desacredita acamara. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu sei que nós podemos na discussão especial dos diversos artigos do projecto emittirmos as nossas opiniões, porque espero que a camara ha de ser bastante justa comnosco, e que não nos ha de ahi tolher tambem a palavra; mas não era na discussão especial dos diversos artigos, mas sim na discussão da generalidade que cabia respondermos ás observações que se tinham feito do banco dos srs. ministros, e por parte de um cavalheiro que respeito e estimo, o illustre relator da commissão de fazenda.

Sr. presidente, dizia um grande homem da tribuna franceza que a publicidade e a discussão eram a alma das finanças. Mal vae para o governo e para as situações que pretendem impor silencio ás opposições, por meio do voto, não as deixando emittir ampla e tão desenvolvidamente como o negocio reclama, as suas idéas sobre assumptos tão graves e de interesse publico. Ainda não vae longe a epocha em que um governo que se sentava naquellas cadeiras (as dos srs. ministros) ouviu discutir semanas e meses estando então á frente da opposição o actual sr. ministro da fazenda, medidas importantes sobre finanças, sem se lembrar nunca de impor silencio á opposição. (Muitos e repelidos apoiados.) (O sr. José Estevão: — Isto é que é situação progressista.)

Sr. presidente, a camara não póde estranhar que faça estas observações. Eu reconheço primeiro que ninguem o direito da maioria, a maioria póde pôr termo ao debate, quando o julgue conveniente para a causa publica, mas eu posso tambem declarar que precisâmos redarguir ou responder ás arguições que nos fizeram, e isto não a podemos fazer senão na discussão da generalidade. Posso asseverar, como homem governamental, apresentar epocha a epocha, combale a combate, parlamento a parlamento, e dizer que n'esse tempo que tanto se condemna não se procedeu assim com a opposição d'esta casa. (Muitos apoiados.)

Este projecto contém duas partes distinctas: uma resume-se no artigo 1.° pelo qual se concede um bill de indemnidade ao governo pelos desvios de fundos que fez, e contém depois diversos artigos com providencias especiaes para habilitar o governo a satisfazer aos seus encargos, e por conseguinte ao deficit que pésa sobre o thesouro publico.

Se acaso nós nos compenetrássemos de que o pensamento que no projecto se tinha lido era dar meios ao governo, eu tinha-o votado, porque não negava ao governo os meios indispensaveis para poder gerir a fazenda publica até ao fim do anno economico corrente, em quanto a camara não podesse discutir e votar o orçamento. Mas poderá alguem sustentar que um pensamento que vem no projecto é dar meios ao governo? Póde-se dar meios ao governo sem ser preciso ver uma idéa que lá apparece. O pensamento do projecto é dar meios ao governo, mas pela fórma, modo e segundo os

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principios consignados nos seus diversos artigos, e é este pensamento que não approvo, e foi contra isto que clamámos, eu e os meus amigos, e votámos. Não era nossa intenção negar o bill de indemnidade, porque até não lhe quero dar só este, mas hei de dar-lhe mais tres ou quatro, como provarei que ainda continua a necessitar d'elles; entretanto se se podesse ter feito distincção na votação da generalidade, talvez que a opposição se não separasse da maioria.

O bill de indemnidade de que trata o artigo 1.° diz respeito ao desvio de 44:000$000 réis que o governo despendeu nas urgencias do serviço, e que deviam ser applicados para obras publicas, caminhos de ferro e estradas, em conformidade da carta de lei de 25 de julho do anno passado que auctorisou o emprestimo de 1.500:000$000 réis.

Pouco tempo depois o governo d’essa epocha veiu apresentar aqui um projecto de lei no qual se marcava o destino que se havia de dar a essa somma dos 1.500:000$000 réis, e essa tabella foi apresentada á camara e depois convertida em lei; mas o governo por circumstancias que nos cumpre examinar, e que é esta discussão em que se acha empenhada a maioria e a opposição, julgou indispensavel distrair uma parte d'essa receita para as despezas correntes. Essa parte monta a 444:000$000 réis, e o governo veiu pedir que fosse legalisada a applicação d'esta somma ás despezas correntes; a commissão de fazenda propoz que o governo fosse relevado pelo desvio que tinha feito daquelles dinheiros em virtude das disposiçoes legaes. Já disse que n'esta parte a commissão de fazenda linha andado constitucionalmente, porque uma vez que se convenceu de que o governo carecia de applicar estes dinheiros ás despezas correntes, não havia outra cousa a fazer senão votar o bill de indemnidade. Mas qual será a rasão porque a illustre commissão indicou o bill de indemnidade para este desvio que o governo declara que não se recusa a aceitar este bill, e se não ha de propor igual providencia para um desvio que o governo igualmente fez nos fundos auctorisados pela caria de lei de 29 de julho, e que deviam ser destinados para a construcção da estrada marginal do Douro? O governo fez o emprestimo dos 100:000$000 réis, e esse emprestimo devia ser todo applicado ás estradas do caminho vinhateiro, como emprestimo dos 1.500:000$000 réis ás estradas e caminhos de ferro na conformidade da tabella a que me referi; e se acaso se conhece que o governo carece d'este bill, como é que se póde entender que o governo não precisa de outro bill pelo desvio que praticou nos fundos que eram destinados para as estradas do paiz vinhateiro do Douro? Creio eu que se não póde de maneira alguma deixar de dar um bill de indemnidade por esse desvio; porém o illustre relator da commissão, quando fallou n'esta questão, declarou acamara que a commissão não tinha tratado esta questão do bill de indemnidade em relação á carta de lei de 29 de julho, porque se offereceria occasião em que a camara e a commissão se pronunciassem a respeito do procedimento legal do governo ácerca d'esta questão.

Mas, sr. presidente, se o nobre deputado entende, que se deve preterir esta occasião, para que mais tarde, a proposito não sei de que, se conceda outro bill, não será mais regular, mais justo e mais conveniente á indole d'este projecto, e d'este artigo sobretudo, que sanccionemos um acto, quando sanccionarmos outro, ou outros do mesmo caracter e alcance? Por consequencia não me parece que possa haver fundamento algum para que a illustre commissão não o incluísse n'este artigo 1.°

Mas, sr. presidente, se a illustre commissão, pelo que me felicito a mim proprio, estava realmente para relevar o governo da illegalidade com que mandou depositar no banco de Portugal a quantia de 1.000:000$000 réis em inscripções, mandadas crear pela carta de lei de 30 de junho de 1857, para levantar sommas por conta do emprestimo de 600:000$000 réis, que era destinado para estradas, ouvi comtudo o nobre ministro da fazenda, e não sei se o illustre relator disse alguma cousa a este respeito, declarar, que não se tratava aqui de dispor de diversas sommas para fins diversos dos que estavam estabelecidos na lei, mas simplesmente de haver uma certa somma de titulos de divida fundada para servirem de penhor ou caução. Mas perguntarei, será indifferente que o governo possa, quando julgar que lhe convem, mandar depositar em um certo estabelecimento, mandar dar um certo destino, a titulos que a lei creou para outro fim? O parlamento, que votou esta lei, que é obrigado a examinar escrupulosamente a sua applicação, entende conveniente relevar o governo por essa falla, por ler mandado depositar no banco de Portugal 1.000:000$000 réis, que a lei destinou para outro fim? Parece-me que sim; nem eu creio que a illustre commissão possa ter fundamento algum plausivel para assim não proceder.

Sr. presidente, ouço dizer que deu a hora, e como tenho largas considerações a fazer, porque a camara ha de ler a benignidade de me ouvir a proposito do artigo 1.°, o que eu ainda poderia dizer na generalidade, porque preciso justificar-me, por isso peço a v. ex.ª que me reserve a palavra para a sessão seguinte.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para segunda feira é a continuação da que vinha para hoje. Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

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