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nome collectivo, incluir o seu nome, ou firma, na firma social, ficará sujeito á responsabilidade solidaria, imposta n'este artigo alem da criminal em que possa incorrer.
§ 3.° A faculdade de administrar importará sempre o exclusivo do uso da firma social, e, só, por expressa delegação da sociedade, póde outro qualquer socio, que não o administrador, usar d'ella, em actos que na respectiva procuração lhe houverem sido, especialmente, commettidos.
Art. 164.° Os socios, encarregados da administração de uma sociedade, em nome collectivo, terão as mesmas faculdades que o codigo civil concede, nos artigos 1268.° a. 1270.°, aos administradores das sociedades civis.
Art. 165.° A administração social concedida a um socio, por clausula especial do contrato, não póde ser revogada, em quanto durar a sociedade em nome collectivo.
§ unico. Se, perém, o socio administrador fizer mau uso da faculdade que lhe foi dada no contrato, nos termos d'este artigo, e da sua gestão resultar perigo manifesto ao fundo commum, os mais socios poderão nomear um administrador que intervenha em todos os actos sociaes, ou promover, judicialmente, a rescisão do contrato.
Art. 166.° Se a faculdade de administrar houver sido concedida por acto posterior ao primordial contrato de sociedade em nome collectivo, será revogavel, como simples mandato, a arbitrio dos socios.
§ unico. Para que a revogação haja logar, basta que seja resolvida pela maioria dos socios não administradores.
Art. 167.° Os socios de uma sociedade em nome collectivo, para a qual se não haja determinado especie alguma de negocio, não poderão praticar actos commerciaes, sem previo consentimento da sociedade, sob pena de perderem para esta os beneficios realisados, e responderem, individualmente, pelos prejuizos soffridos.
Art. 168.° Se, a sociedade em nome collectivo, tiver sido constituida, para determinada especie de commercio, poderão os socios fazer, livremente, quaesquer operações commerciaes, que não sejam da mesma especie, salva estipulação contraria.
Art. 169.° Nenhum socio de uma sociedade em nome collectivo, poderá retirar ou distrahir do fundo commum quantia superior á que houver sido designada para os seus gastos pessoaes; sob pena do ter do reintegrar o excedo retirado ou distrahido, como se não houvesse completado a sua entrada social, e de responder por perdas e damnos.
Art. 170.º Todo o socio de uma sociedade em nome collectivo tem direito a ser indemnisado:
1.º Pela sociedade, - por quaesquer quantias desembolsadas, em proveito d'ella, alem do capital a que se obrigou, e respectivos juros, pelas obrigações contrahidas em boa fé para vantagem commum social, pelas perdas e damnos que houver soffrido no exercicio de actos, praticados como socio, e pelos gastos de viagem, sustento, e outros resultantes de operação social;
2.º Contra os seus consocios, - salvas as convenções em contrario, pelas quantias com que por virtude da sua responsabilidade solidaria haja conmcorrido para as perdas da sociedade, superiores ás que, guardadas as devidas proporções, lhe competiria satisfazer.
Art. 171.º Para que um socio possa ceder a outrem a sua parte na sociedade em nome collectivo, é necessario que todos os demais socios o auctorisem a isso.

CAPITULO III

Das sociedades anonymas

SECÇÃO I

Da constituição das sociedades anonymas

Art. 172.º As sociedades anonymas só se poderão constituir, definitivamente, quando se achem verificadas as seguintes condições:
1.ª Ser de dez, pelo menos, o numero dos associados;
2.ª Estar o capital social, integralmente, subscripto;
3.ª Ter cada um dos subscriptores pago dez por cento, em dinheiro, do capital por elles subscripto, e achar-se depositada a importancia total na caixa geral de depósitos, á ordem da administração que for eleita.
4.ª ha ver adoptado denominação social que não seja identica á de outra já existente, ou por tal fórma similhante que possa induzir em erro.
§ 1.º As sociedades anonymas de seguros, e todas aquellas cujo capital não for destinado, immediata e directamente, á realisação do seu objecto, mas servir unicamente de caução subsidiaria das operações sociaes podem constituir-se com o deposito de cinco por cento do capital subscripto.
§ 2.º As sociedades que tiverem por objecto adquirir mobiliarios, para os conservar em seu dominio e posse por mais de dez annos, só se poderão constituir com especial auctorisação dos poderes executivo e legislativo, segundo as leis vigentes.
§ 3.º Pará a mais facil verificação da condição constante do n.º 4, d'este artigo, continuará a haver no ministerio das obras publicas, commercio, e industria, o registo especial das denominações das sociedades anonymas.
Art. 173.º Se os que pretenderem fundar uma sociedade anonyma, houveram subcripto o capital inteiro, poderão, logo que se achem verificadas as condições, exigidas no artigo antecedente, constituir, definitivamente, a sociedade, outhorgando a respectiva escriptura.
Art. 174.º Quando para a constituição definitiva das sociedades anonymas se houver de recorrer a subscripções publicas, devem os fundadores constituir, provisoriamente a sociedade, outhorgando a respectiva escriptura.
§ 1.º A escriptura, celebrada nos termos d'este artigo, será publicada, e registada, provisoriamente, na secretariado competente tribunal do commercio.
§ 2.° Satisfeitos os requisitos, exigidos no paragrapho anterior, poderão formular-se os programmas para a subscripção, que devem indicar:
1.° A data da constituição provisoria feita pelos fundadores, e onde a respectiva escriptura foi outhorgada, publicada, e registada;
2.° O objecto da sociedade, o capital social, e o numero de acções;
3.º As entradas, e as condições em que devem realisar-se;
4.° As vantagens particulares attribuidas aos fundadores;
5.° Os nomes e domicilios dos directores que, porventura, se achem nomeados para a primeira administração da sociedade;
6.° Convocação dos subscriptores para uma assembléa, que terá logar dentro de tres mezes, para a constituição definitiva da sociedade;
7.° Indicação da pessoa que ha de presidir á assembléa referida no numero anterior.
§ 3.° É absolutamente prohibido que os fundadores se reservem, acções ou obrigações beneficiarias, sendo lhes só permitiido reservarem uma percentagem não superior a um decimo dos lucros liquides da sociedade, por tempo não excedente ao do um terço do periodo da duração social, e nunca superior a dez annos, a qual nunca será paga sem se achar approvado o balanço annual.
§ 4.° Recolhidas as subscripções, os fundadores apresentarão, no dia fixado, á assembléa, os documentos justificativos de haver satisfeito ás condições exigidas no artigo 172.°
§ 5.º N'esta assembléa cada subscriptor terá direito a um voto seja qual for o numero das a acções subscriptas.
§ 6.º Se a maioria dos subscriptos presentes, exceptuando os fundadores, concordar na constituição definitiva da sociedade, haver-se-ha esta por constituida, proceder-se-

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ha á eleição da direcção, se ella não tiver sido designada na respectiva escriptura, e lavrar-se-ha, a acta respectiva.
§7.º A sociedade archivará, no seu cartorio, as subscripções, com todos os demais documentos necessarios á justificação a que se refere o artigo 172.°. devidamente legalisados.
§ 8.º O registo provisorio do contrato social, tornar-se-ha definitivo, pela apresentação da acta lavrada nos termos do § 6.°, e dos documentos comprovativos de se acharem satisfeitas as condições exigidas no artigo 172.º
Art. 175. ° Os fundadores de qualquer sociedade anonyma são responsaveis, solidaria e illimitadamente, pelos actos praticados até á constituição definitiva da sociedade, salvo o regresso contra ella, se houver logar.
§ unico. Se a sociedade se não constitua- definitivamente, nos termos do § 6.° do artigo 174.º, as consequencias e as despezas dos actos para tal fim praticados, pelos fundadores, são a seu cargo, sem regresso contra os simples subscriptores.

SECÇÃO II

Das acções

Art. 176.º O capital das sociedades anonymas, constituido em dinheiro, ou em valores de qualquer natureza, é sempre representado, e dividido, em acções, de um valor igual, podendo comtudo o mesmo titulo representar mais de uma acção.
§ 1.º As acções são sempre nominativas emquanto o seu valor nominal não estiver, integralmente, pago.
§ 2.º Depois do integral pagamento das acções, os interessados podem exigir que se lhes pascem titulos ao portador, quando nos estatutos não houver expressa estipulação em contrario.
Art. 177.º As acções serão assignadas por um ou mais directores, e devem conter:
1.º A denominação da sociedade;
2.º A data da sua constituição, e a da sua publicação;
3.º A indicação do capitai social, o numero das acções, e a somma que todas representam;
4.º O valor nominal do titulo.
Art. 178.º Haverá na séde da sociedade um livro de registo, de que todo o accionista poderá tomar conhecimento, e d'onde constarão:
1.º Os nomes de todos os subscriptores, e os numeros das acções que subscreveram;
2.º Os pagamentos por elles effectuados;
3.º A transmissão das acções nominativas, com a indicação da sua data;
4.º A especificação das acções que se convenceram ao portador, e dos respectivos titulos que, por ellas, se passaram;
5º O numero das acções consignadas em caução ao bom desempenho dos cargos da sociedade.
§ 1.º A propriedade, e transmissão, das acções nominativas, não produzirá effeitos, para com a sociedade, e para com terceiros, senão desde a data do respectivo registo no livro de que trata este artigo.
§ 2.º Quando differentes individuos vierem a ser comproprietarios de uma acção, ou do um titulo ao portador a sociedade não será obrigada a registar e a reconhecer a respectiva transferencia, emquanto não elegerem um de entre si, que os represente para com a sociedade quanto ao exercicio dos direitos, e cumprimento das obrigações, que lhes pertencerem.
Art. 179.º As acções não são negociaveis senão depois da constituição definitiva da sociedade, e tendo-se realisado o pagamento de cincoenta por cento do seu valor nominal.
Art. 180.º Emquanto as acções não estão, integralmente, pagas os accionistas subscriptores são responsaveis pela importancia da subscripção.
§ 1.º Os pagamentos em atrazo podem ser exigidos aos subscriptores primitivos, e a todos aquelles para quem as acções houverem sido, successivamente, transferidas.
§ 2.º Aquelle que, por virtude da obrigação imposta n'este artigo, houver de realisar algum pagamento, por conta de uma acção de que já não seja proprietario, ficará tendo compropriedade n'ella, pela importancia que houver satisfeito.
§ 3.º Os estatutos podem estabelecer as penalidades em que os accionistas e subscriptores retardatarios incorrerão, salvos, porém, sempre os direitos d'estes á importancia dos pagamentos effectuados, e os dos credores consignados no artigo 157.º

SECÇÃO III

Da administração fiscalisação

Art. 181.º A administração das sociedades anonymas é confiada a uma direcção, e a fiscalização d'esta, a um conselho fiscal, eleitos pela assembléa geral.
§ unico. A primeira direcção, póde ser designada, no instrumento de constituição da sociedade, não podendo comtudo durar mais de tres annos, e sem prejuizo do direito de revogação.
Art. 182.º A eleição dos directores será feita, d'entre os socios, por tempo certo e determinado, sem prejuizo da revogabilidade do mandato.
§ 1.° Os estatutos determinarão-se, findo o praso do mandato, poderá haver reeleição, e, não o determinando, entender-se-ha esta prohibida.
§ 2.° Os estatutos, tambem, indicarão o modo de supprir as faltas temporaes de qualquer dos directores, e, não o indicando, competirá ao conselho fiscal, ou, na falta d'este, á mesa da assembléa geral, nomear os directores, até á reunião da assembléa geral.
Art. 183.° Os directores das sociedades anonymas não contrahem obrigação alguma pessoal, ou solidaria, pelas operações de sociedade; respondem, porém, pessoal e solidariamente, para com ella, e para com terceiros, pela inexecução do mandato, e pela violação dos estatutos e preceitos da lei.
§ 1.º D'esta responsabilidade são isentos os directores, que não tiverem tomado parte na respectiva resolução ou tiverem as proptestado contra as deliberações da maioria, antes de lhes ser exigidas a respectiva responsabilidade.
§ 2.º Os directores de qualquer sociedade anonyma não podem fazer, por conta da sociedade, operações alheias ao seu objecto ou fim, sendo os factos contrarios a este preceito considerados violação expressa do mandato.
§ 3.º É, expressamente, prohibido, aos directores d'estas sociedades negociar por conta propria, directa ou indirectamente; com a sociedade, cuja gerencia lhes estiver confiada.
Art. 184.º Os directores, caucionarão, sempre, a sua gerencia, na fórma estabelecida nos estatutos, e, no silencio d'estes, pela, que for determinada, em assembléa geral, no acto da eleição.
Art. 185.º O conselho fiscal, será composto, pelo menos, de tres socios, eleitos pela assembléa geral nos periodos marcados nos estatutos, da mesma fórma que são os directores, e podendo ser exonerados em qualquer tempo.
Art. 186.° São attribuições do conselho fiscal:
1.° Examinar, sempre que julgo conveniente, e pelo menos de tres em tres mezes, a escripturação da sociedade:
2.º Convocar a assembléa geral extraordinariamente, quando o julgar necessario, exigindo-se, n'este caso, o voto unanime do conselho quando for composto de tres membros, e de dois terços dos vogaes, quando for composto do maior numero;
3.º Assistir, com voto consultivo, ás sessões da direcção, sempre que assim o julgo conveniente;
4.º Fiscalisar a administração da sociedade, verificando,

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frequentemente, o estado da caixa, e a existencia dos titulos, ou valores, de toda a especie, depositados sem penhor ou caução, e confiados á guarda da sociedade;
5.° Verificar o cumprimento dos estatutos relativamente ás condições estabelecidas para a intervenção dos socios nas assembléas;
6.° Vigiar pelas operações da liquidação da sociedade;
7.° Dar parecer sobre o balanço, inventario, e relatorio, apresentados pela direcção;
8.° E, geralmente, vigiar por que as disposições da lei e dos estatutos sejam observadas pela direcção.
Art. 187.° As funcções dos membros da direcção e do conselho fiscal são remuneradas, salva disposição dos estatutos em contrario.
§ unico. Se a remuneração não se achar fixada no titulo social, sel-o-ha pela assembléa geral.
Art. 188.° As sociedades anonymas, que explorarem concessões, feitas pelo estado ou por qualquer corporação administrativa, ou tiverem constituido em seu favor qualquer privilegio ou exclusivo, poderão ser, segundo o caso, tambem fiscalisadas por agentes do governo, e da respectiva corporação administrativa, remunerados pelas sociedades.
§ 1.° Esta fiscalisação limita-se á do cumprimento da lei e dos estatutos, e, especialmente, ao modo como são satisfeitas as condições exaradas nos diplomas das concessões e cumpridas as obrigações estipuladas em favor do publico.
§ 2.° Os agentes especiaes, de que trata este artigo poderão assistir a todas as sessões da direcção e da assembléa geral, e fazer inserir, nas actas, as suas reclamações, para os effeitos convenientes.
§ 3.° Os agentes especiaes informarão, sempre, o governo, ou a corporação administrativa competente, de qualquer falta praticada pelas sociedades, e, no fim de cada anno, enviar-lhe-hão um relatório circumstanciado.

SECÇÃO IV

Das assembléas geraes

Art. 189.° As assembléas geraes dos accionistas são ordinarias e extraordinarias.
§ unico. A assembléa ordinaria reune-se, ao menos, uma vez cada anno, nos primeiros quatro mezes depois de findo o exercicio anterior, e deverá:
1.° Discutir, approvar, ou modificar o balanço, e o relatório do conselho fiscal;
2.° Substituir os directores, e os vogaes do conselho fiscal, que houverem terminado o seu serviço;
3.° Tratar de qualquer outro assumpto para que tenha sido convocada.
Art. 190.° As assembléas geraes extraordinarias serão convocadas sempre que a direcção, ou o conselho fiscal, as julguem necessárias, ou quando sejam requeridas por accionistas que representem a vigessima parte do capital subscripto, salvo exigindo os estatutos maior representação de capital.
§ unico. Se n'esta ultima hypothese a convocação se não effectuar dentro de oito dias, será ordenada pelo juiz do competente tribunal do commercio, e funccionará logo que se achem satisfeitas as condições dos estatutos.
Art. 191.° A convocação das assembléas geraes será feita por meio de annuncios publicados com quinze dias de antecipação, pelo menos, e com as demais condições prescriptas nos estatutos, devendo mencionar-se sempre o objecto da ordem do dia.
§ unico. É nulla toda a deliberação tomada sobre matéria estranha áquella para que a assembléa geral houver sido convocada.
Art. 192.° A assembléa geral elegerá, biennalmente, salva convenção contraria, de entre os accionistas, um presidente, um vice-presidente, dois secretarios e dois vice-secretarios.
§ 1.° É permittida a reeleição para estes cargos.
§ 2.° Na falta, ou impedimento, do presidente e vice-presidente, servirá o maior accionista, ou quando este não quem ou não possa acceitar esse cargo, o immediato era acções, e assim successivamente, preferindo o mais velho, em igualdade de circumstancias.
§ 3.° Na falta ou impedimento dos secretarios e vice-secretarios, convidará o presidente dois accionistas, que julgar mais idoneos, pura esses cargos.
Art. 193.° A assembléa geral será convocada e dirigida pelo presidente ou quem suas vezes fizer.
§ 1.° Aos secretarios incumbe toda a escripturação relativa á assembléa geral.
§ 2.° As deliberações serão sempre tomadas por maioria absoluta de votos, excepto nos casos em que os estatutos exigirem maior numero.
§ 3 ° Se a cada acção corresponder um voto, nenhum accionista, qualquer que seja o numero das suas acções, poderá representar mais da quinta parte dos votos conferidos por todas as acções emittidas, nem mais das duas quintas partes dos votos que se apurarem na assembléa geral.
§ 4.° As actas das differentes sessões serão assignadas pelo respectivo presidente e seus secretarios, e lavradas no livro das actas.
Art. 194.° Quando uma assembléa geral, regularmente, convocada segundo as regras prescriptas nos estatutos, não possa funccionar por falta de numero de accionistas, ou por falta de sufficiente representação de capital, os interessados serão, immediatamente, convocados para uma nova reunião, que se effectuará dentro de trinta dias, mas não antes de quinze, considerando-se como validas as deliberações, tornadas n'esta segunda reunião, qualquer que seja o numero de accionistas presentes e o quantum do capital representado.
Art. 195.° Os accionistas que não tiverem voto nas assembléas geraes, e os portadores das obrigações, poderão assistir ás assembléas geraes e discutir os assumptos dados para ordem do dia, posto que sem tornarem parte na deliberação, se os estatutos não determinarem o contrario.
Art. 196.° Todo o accionista tem direito de protestar contra as deliberações tomadas em opposição ás disposições expressas na lei e nos estatutos, e poderá requerer ao respectivo juiz presidente do tribunal do commercio a suspensão da sua execução, com previa notificação dos directores.
§ 1.° As deliberações das assembléas geraes, tomadas contra os preceitos da lei e dos estatutos, tornam, de responsabilidade illimitada, a sociedade, excepto com relação aos accionistas que tiverem protestado contra taes deliberações, antes de lhes ser exigida a competente responsabilidade.
§ 2.° As resoluções tomadas, e os actos praticados, pela direcção contra os preceitos da lei ou dos estatutos, ou contra as deliberações das assembléas geraes, não obrigam a sociedade, e todos os que tomarem parte em taes actos ou deliberações, ficam pelos seus effeitos, pessoal e solidariamente, responsaveis, salvo o caso de protesto, nos termos d'este artigo.
Art. 197 ° Quando n'uma sociedade anonyma, haja accionistas residentes em paiz estrangeiro, que representem pelo menos vinte e cinco por cento do capital subscripto, poderão reunir-se em conferencia com os fins seguintes:
1.° Para o exame e discussão, do relatorio e contas annuaes, apresentadas pela direcção, e do parecer sobre estes documentos, emittido pelo conselho fiscal;
2.º Para, de entre si, nomearem, um ou mais accionistas, que venham, á séde da sociedade, represental-os na assembléa geral ordinaria, em que for discutido aquelle parecer.
§ 1.° Os accionistas, escolhidos em virtude do n.° 2.° d'este artigo, são admittidos na assembléa geral, apresentando a acta da conferencia, devidamente legalisada, contendo:

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1.° Indicação nominal dos accionistas que só reuniram;
2.° Declaração de que tiveram conhecimento dos documentos a que se refere o n.° 1.° d'este artigo;
3.° Indicação dos representantes nomeados e dos poderes que lhes foram conferidos.
§ 2.° Estes representantes têem, na assembléa geral, tantos votos quantos pelos estatutos pertençam aos accionistas committentes.
§ 3.º Para levar a effeito o disposto n'este artigo, seus numeros, e paragraphos, os accionistas, residentes em paiz estrangeiro, a que st refere a primeira parte d'este artigo, nomearão, de entre si, um, que, da administração central, receba os exemplares do relatorio, contas, e parecer, proceda á sua distribuição, convoque a conferencia, e se corresponda com o presidente da direcção.
§ 4.º A direcção, logo que o relatorio e documentos a que se refere esse artigo tenham sido examinados pelo conselho fiscal, é obrigada a remetter uma copia d'elles ao accionista que tenha sido nomeado, nos termos e para os fins expressos, no paragrapho antecedente.
§ 5.º As disposições anteriores não prejudicam o direito que pelos estatutos tenham os accionistas, de que se trata, de virem, pessoalmeate, tomar parte nos trabalhos da assembléa geral, ou de mandarem procurador especial que os represente, quando não tenham querido aproveitar-se das concessões d'este artigo e seus paragraphos.
§ 6.° Quando se dê o caso previsto e regulado n'este artigo o praso entre a apresentação do parecer do conselho fiscal e a sua discussão, será fixado por fórma que possam inteiramente ser cumpridas as suas disposições.
§ 7.º Salvo o caso a que este artigo se refere, os accionistas residentes em paiz estrangeiro são sempre equiparados em tudo, e para todos os effeitos, aos accionistas que residam em Portugal.

SECÇÃO V

Dos inventarios, balanços, contas, fundos de reserva, e dividendos

Art. 198.º Em todos os semestres os directores das sociedades anonymas apresentarão ao conselho fiscal um recurso do balanço da sociedade.
Ari. 199.º No fim de cada anno a direcção apresentará ao conselho fiscal:
1.º Inventario desenvolvido do activo e passivo da sociedade;
2.º Conta de perdas e ganhos;
3.° Relatorio da secção commercial, financeira e economica, de sociedade, com a indicação succinta das operações realisadas, ou em via de realisação;
4.º Proposta de dividendo, e da percentagem destinada a constituir o fundo de reserva.
§ 1.º Nos quinze dias, subsequentes á apresentação dos documontos referidos n'este artigo, ao conselho fiscal, deverá este formular sobre elles o seu parecer, escripto e fundamentado.
§ 2.º Findo este praso, estarão patentes, por outros quinze dias, todos os documentos a que se refere este artigo, bem como a lista dos accionistas, que nos termos dos estatutos deverem constituir a assembléa geral, no escriptorio da sociedade para poderem ser examinados por todos os interessados.
§ 3.º O balanço, com o parecer do conselho fiscal, será enviado a cada um accionista, portador de titulos nominativos, quinze dias, pelo menos, antes do praso fixado para a reunião da assembléa geral.
§ 4.º Só depois de findos os prasos fixados n'este artigo e nos paragraphos e de satisfeitos os termos n'elles prescriptos serão os mesmos documentos submettidos á deliberação da assembléa geral.
Art. 200.º A approvação dada pela assembléa geral ao balanço e contas de gerencia da administração liberta os directores, e membros do conselho fiscal, da sua responsabilidade para com a sociedade, salvo o caso de reserva, em contrario, feita na mesma assembléa geral, ou provando-se que nos inventarios e balanços houve omissões ou indicações falsas, com o fim de dissimular a verdadeira situação da sociedade.
Art. 201,° Dos lucros liquides da sociedade uma precentagem, não inferior á vigessima parte d'elles, é destinada á formação de um fundo de reserva, até que este represente, pelo menos, a quinta parte do capital social.
§ unico. O fundo de reserva será reintegrado todas as vezes que por qualquer rasão se achar reduzido.
Art. 202.° É, expressamente, prohibido que nos estatutos se estipulem juros certos e determinados para os accionistas, os quaes unicamente têem direito á parte proporcional que lhes caiba nos lucros liquidos, que, effectivamente, resultem das operações da sociedade, comprovados pelos balanços.
§ 1.° A distribuição de dividendos ficticios considera-se violação do mandato por parte dos directores, que a tiverem consentido.
§ 2.º Podem comtudo os estatutos, por excepção á disposição anterior, quando as sociedades necessitem de immobilisar, em construcções, grandes capitães, conceder aos accionistas um juro determinado sobre o capital, por elles subscripto, e, efectivamente, pago, por um tempo não superior a tres annos e em uma media que não exceda cinco por cento.
§ 3.° No caso previsto no paragrapho anterior, porém, os juros consideram-se despezas de administração, e ficam a cargo dos balanços futuros, que accusarem dividendos reaes.

SECÇÃO VI

Das publicações obrigatorias

Art. 203.° Logo que a sociedade esteja constituida, serão os seus estatutos publicados.
§ 1.° Quaesquer alterações que se venham a fazer nos estatutos serão igualmente publicadas.
§ 2.° No caso de dissolução da sociedade os seus representantes farão logo publicar a acta da dissolução.
§ 3.º Todos estes documentos estarão patentes no escriptorio da sociedade para quem os quizer examinar.
Art. 204.° Os balanços das sociedades anonymas, depois de apresentados e discutidos em assembléa geral, serão publicados com os relatorios da administração, parecer do conselho fiscal, e a lista geral dos accionistas, com indicação das entradas effectuadas e das que ha direito a exigir, por conta da sociedade.
§ unico. Uma copia de topos estes documentos será depositada na secretaria do tribunal do commercio da sede da sociedade, onde qualquer individuo poderá requerer certidão.

SECÇÃO VII

Da emissão de obrigações

Art. 205.° As sociedades anonymas podem emittir obrigações, nominativas ou ao portador, até á importancia do capital já realisado, e existente nos termos do ultimo balanço approvado.
Art. 200.° A emissão de obrigações, embora prevenida rio titulo constitutivo, só se poderá realisar com voto affirmativo da assembléa geral.
Art. 207.° Se para a emissão das obrigações se houver de recorrer a subscripção publica, indicar-se-ha nos programmas:
1.° O nome, objecto, e séde, da sociedade;
2.° O capital social, segundo o ultimo balanço approvado:
3.º As datas da constituição da sociedade e as de quaes-

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quer actos que lhe tenham produzido alteração, e bem assim as datas da sua publicação;
4.° A importancia total das obrigações que se pretenderem emittir, e das já emitidas, com declaração do modo de pagamento, dos juros que ellas devem produzir, e se são ao portador ou nominativas;
5.° O fim a que é destinado o capital emprestado;
6.° A data e jornal da publicação da deliberação da assembléa geral que approvou a emissão.
§ unico. Quando houver mais de uma emissão, deve declarar-se, tambem, o numero das emissões precedentes, o capital realisado por cada uma e o estado em que se acham.
Art. 208.° Os titulos das obrigações deverão conter as enunciações prescriptas para a subscripção, e o quadro dos pagamentos em capital o juro.
Art. 209.° As sociedades que emittirem as obrigações de que tratam os artigos antecedentes, publicarão, mensalmente, na folha official os balancetes do seu activo e passivo.

CAPITULO IV

Das sociedades em commandita

Art. 210.° A sociedade em commandita póde ser constituida em commandita simples, quando não ha representação do capital por acções, e em commandita por acções que representem o capital social, abrangendo assim as entradas dos socios em nome collectivo, e os fundos prestados pelos socios commanditarios.
Art. 211.° Na associação em commandita, são elementos distinctos: a sociedade em nome collectivo, e a commandita de fundos.
Art. 212.º Em tudo, quanto não se achar especialmente preceituado n'este capitulo, as sociedades em commandita são, respectivamente, reguladas pelas disposições applicaveis do capitulo II, e do capitulo III, d'este titulo.
Art. 213.º O socio commanditario, que consentir que o seu nome figure na firma, social, e os que assim fizerem uso d'ella, serão pessoal, illimitada, e solidariamente, responsaveis pelos actos em que essa firma intervier.
Art. 214.° Só podem ser gerentes effectivos os socios em nome collectivo que o contrato designar.
§ 1.° Os actos de administração praticados por socios, commanditarios, sem expressa delegação dos gerentes, auctorisada pela assembléa, geral, não obrigam a sociedade, e envolvem a responsabilidade, exclusiva e pessoal, de quem os praticar.
§ 2.° Salva estipulação contraria, poderá o conselho fiscal, dado o impedimento temporario dos gerentes effectivos, designar, de entre os socios commanditarios, os que os devam substituir, nos actos urgentes ou de mero expediente, pedindo, immediatamente, a convocação da assembléa geral a um de os confirmar na gerencia provisoria, ou nomear outros.
§ 3.° Os gerentes provisorios só respondem pela execução do seu mandato, sem assumir responsabilidade illimitada.
Art. 215.° A responsabilidade dos socios commanditarios é restricta ao valor dos fundos por que se obrigaram, e só, em caso de dolo ou fraude, podem ser compellidos a repor os dividendo;; que hajam recebido.
Art. 216.º Nas sociedades em commandita por acções o gerente póde ser exonerado, por deliberação da assembléa geral, em que se achem, representados tres quartos do capital social, e com voto favoravel de metade d'esse capital.
§ 1.° Os socios vencidos n'esta deliberação poderão apartar-se da sociedade, obtendo o reembolso do seu capital na proporção do ultimo balanço approvado.
§ 2.° Se a revogação não for justificada o gerente tem direito a perdas e damnos.
Art. 217.° A assembléa geral da sociedade em commandita, por acções, póde, pela fórma prescripta no artigo antecedente, substituir o gerente, exonerado, fallecido ou interdicto, mas sendo muitos os gerentes, essa subrogoção tem de ser approvada por estes.
§ unico. O gerente que vier substituir o destituido considera-se socio de responsabilidade illimitada.

CAPITULO V

Disposições especiaes ás sociedades cooperativas

Art. 218.° As sociedades cooperativas são especialisadas pela variabilidade do capital social, e pela illimitação do numero de socios.
§ 1.º As sociedades cooperativas deverão adoptar para a sua constituição uma das fórmas preceituadas no artigo 111.º, e regular-se-hão pelas disposições que regeram a especie de sociedade, cuja fórma hajam, adoptado, com as modificações constantes do presente capitulo.
§ 2.° Qualquer, porém, que seja a fórma social que uma sociedade cooperativa haja adoptado, ficará sujeita ás disposições respectivas ás sociedades anonymas, no tocante á publicação do titulo constitutivo, e ás alterações que n'este
se fizerem, bem como ás obrigações e responsabilidades dos administradores.
§ 3.º As sociedades cooperativas devem senpre fazer preceder ou seguir a sua firma ou dominação social das palavras: Sociedade cooperativa, de responsabilidade limitada, ou illimitada, conforme esta for.
Art. 219.º As sociedades cooperativas não podem constituir com menos de dez socios.
Art. 220.º O titulo constitutivo, deverá, alem das indicações exigisdas, no artigo 124.º, conforme a especie da sociedade, especificar mais:
1.º As condições para a admissão, demissão, ou exclusão de socios, e, as em que, estes, poderão retirar suas quotas;
2.º O minino do capital social, e a fórma, por que este acha, ou tem de ser, constituido:
§ unico. O registo, e a publicação dos actos d'estas sociedades na folha official do governo, serão gratuitas.
Art. 221.º Não são applicaveis, ás sociedades cooperativas, as disposições da parte final do n.º 5 do artigo 130.º, do n.º 2 do artigo 172.º, e no n.º 3.º do artigo 177.º
Art. 222.º É licito estipular que o pagamento do capital se faça por quotas semanaes, mensaes, ou annuaes, e que, alem d'estas, satisfaça o socio, um direito de admissão, ou joia, destinado a constituir o fundo de reserva.
Art. 223.º Nenhum socio póde ter, n'uma sociedade cooperativa, interesse por mais de quinhentos mil réis.
Art. 224.° As acções não póde, ao ser, cada uma, do mais de cem mil réis; serão nominativas, e só transmissiveis por averbamento no livro do registo, com auctorisação da sociedade.
§ unico. O contrato social poderá conferir á direcção o direito de approvar as transferencias de acções.
Art. 225.º Cada socio terá um só voto, qualquer que seja o numero das suas acções, e não poderá representar mais da quinta parte dos votos presentes na assembléa geral.
Art. 226.º Se a responsabilidade do socio for limitada nunca será, comtudo, inferior á sua subscripção, ainda que por virtude da sua demissão ou exclusão, não checasse a tornal-a effectiva.
Art. 227.º Haverá na séde da sociedade um livro de registo, que estará sempre patente, e d'onde constará:
1.° Os nomes, profissões, e domicilios, de todos os socios;
2.° As datas da sua admissão, demissão, ou exclusão;
3.º A conta corrente, em relação a cada socio, das quantias, por elle, entregues ou retiradas,

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Art. 228.° A admissão dos socios verifica-se mediante a sua assignatura no livro de registo.
Art. 229.° Os socios receberão titulos nominativos, que, alem do contrato social, conterão as declarações a que se refere o artigo 227.°, na parte que disser respeito a cada um, e que deverão ser assignados por elles, e pelos representantes da sociedade.
§ unico. As indicações das quantias pagas, ou retiradas pelos socios, serão, successivamente, feitas e assignadas por ordem de suas datas, valendo a assignatura dos representantes da sociedade no primeiro caso, ou do respectivo socio, no segundo, por quitação d'essas quantias.
Art. 230.º Os socios admittidos, depois de constituida a sociedade, respondem por todas as operações sociaes, anteriores á sua admissão, na conformidade do contrato social.
Art. 231.º Salva expressa estipulação em contrario, têem os socios o direito de se exonerar da sociedade nas epochas para isso convencionadas, ou em falta de convenção, no fim de cada anno social, participando-o oito dias antes.
Art. 232.º A exclusão dos socios só póde ser resolvida em assembléa geral, dadas as condições, para isso, exigidas nos contrato social.
Art. 233.° A exoneração e a exclusão de um socio, far-se-hão por averbamento lançado no livro do registo, e por elle assignado, ou por notificação judicial, feita, no primeiro caso, á sociedade, e, no segundo, ao socio.
§ 1.º O socio exonerado tem direito a retirar as quotas, com que haja contribuido para o capital social, e, no caso do pagamento d'este se não haver effectuado por quotas, a parte que n'esse capital lhe caiba, segundo o ultimo balanço e a sua conta corrente, salva a sua responsabilidade social.
§ 2.º O socio excluido perde o direito ás quotas do capital, salva convenção em contrario.
Art. 234.° As sociedades cooperativas são isentas de imposto de sêllo e de qualquer contribuição sobre os lucros que realisarem.

TITULO III

Da conta em participação

Art. 235.° Dá-se conta em participação quando um commerciante, ou uma sociedade commercial, dá, a uma ou mais pessoas ou sociedades, uma parte nos seus ganhos e perdas, trabalhando um, alguns, ou todos, em seu nome individual sómente.
§ unico. A conta em participação, póde ser momentanea, relativa e determinadamente a um ou mais actos de commercio, e successiva, abrangendo até todo o commercio que exercer o que dá participação.
Art. 236.° A conta em participação, póde formar-se entre um commerciante, ou outra pessoa não commerciante, não podendo, porém, esta celebrar as transacções sociaes.
Art. 237 ° A conta em participação não representa, para com terceiros, individualidade juridica, differente da dos que n'ella intervem, e carece de firma ou denominação social, patrimonio colectivo, e domicilio.
Art. 238.° As contas em participação regulam-se, salvo o disposto n'este titulo, pelas convenções das partes.
Art. 239.° A formação, modificação, dissolução, e liquidação, das contas em participação, podem ser estabelecidas pelos livros de escripturação, respectiva correspondencia, e testemunhas.
Art. 240.º Por os actos da conta em participação é unicamente responsavel, para com terceiros, aquelle que os praticar.

TITULO IV

Das emprezas

Art. 241.° Haver-se-hão por commerciaes as emprezas, singulares ou collectivas, que se propozerem:
1.° Fabricar, ou manufacturar, materias primas para as transformar em productos novos, empregando para isso, ou só operarios, ou operarios e machinas;
2.° Fornecer, em epochas differentes, generos, quer a particulares quer ao estado, mediante preço convencionado;
3.º Agenciar, negocios ou leilões, por conta de outrem, em escriptorio aberto ao publico, e mediante salario estipulado;
4.° Explorar quaesquer espectaculos publicos;
5.° Editar, publicar, ou vender, obras scientificas, litterarias ou artisticas;
6.° Edificar, ou construir, casas para outrem, com materiaes subministrados pelo emprezario;
7.° Transportar, regular e permanentemente, por agua ou por terra, quaesquer pessoas, animaes, alfaias, ou mercadorias, de outrem.
§ 1.° Não se haverá como comprehendido no n.° 1.° d'este artigo o proprietario ou o explorador rural que apenas fabrica ou manufactura os productos do terreno que agriculta, accessoriamente á sua exploração agricola.
§ 2.° Não se haverá como comprehendido no n.° 2.° d'este artigo o proprietario ou explorador rural que fizer fornecimentos de productos da respectiva propriedade.
§ 3.° Não se haverá como comprehendido no n.° 5.º, o proprio auctor que editar, publicar, ou vender, as suas obras.

TITULO V

Do mandato

CAPITULO I

Disposições geraes

Art. 242.° Dá-se mandato commercial, quando alguma pessoa se encarrega de praticar, um, ou mais, actos de commercio por mandado de outrem.
Art. 243.º O mandato commercial não se presume gratuito, tendo todo o mandatario direito a uma remuneração, pelo seu trabalho.
§ 1.° A remuneração será regulada por estipulação previa, e, não a havendo, pelos usos da praça onde for executado o mandato.
§ 2.° Se o mandatario não quizer acceitar o mandato, mas tiver, apesar d'isso, de praticar as diligencias, mencionadas no artigo 246.°, terá ainda assim direito a uma remuneração proporcional ao trabalho que tiver tido.
Art. 244.° O mandato commercial, embora contenha poderes geraes, não auctorisa actos não mercantis, salva declaração expressa em contrario.
Art. 245.° O mandato commercial, que contiver instrucções especiaes para certas particularidades do negocio, presume-se amplo para todas as outras: e aquelle, que só tiver poderes para um negocio determinado, comprehende todos os actos necessarios á sua execução, posto que não, expressamente, indicados.
Art. 246.° O commerciante que quizer recusar o mandato commercial, que lhe é conferido, deve, assim communical-o ao mandante, pelo modo mais rapido que lhe for possivel: sendo, todavia, obrigado a praticar todas as diligencias de indispensavel necessidade para a conservação de quaesquer mercadorias que lhe hajam sido remettidas, até que o mandante proveja.
§ 1.° Se o mandante nada fizer, depois de recebido o aviso, o mandatario recorrerá ao juizo respectivo, para que se ordene o deposito e segurança das mercadorias, por conta de quem pertencer, e a venda das necessarias, quando a sua conservação não seja possivel, ou para satisfação das despezas incursas.
§ 2.° A falta de cumprimento de qualquer das obrigações constantes d'este artigo, e seu paragrapho, sujeita o commerciante á indenmisação de perdas e damnos.

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Art. 247.° Se as mercadorias que o mandatario receber por conta do mandante, apresentarem signaes visiveis de damnificações, soffridas durante o transporte, deve aquelle praticar os actos necessarios á salvaguarda, dos direitos d'este, contra, quem for de direito, sob pena de ficar responsavel pelas mercadorias recebidas, taes quaes constarem dos respectivos documentos.
§ unico, Se as deteriorações forem taes que exijam providencias urgentes, o mandatario poderá fazel-as vender por corretor, ou judicialmente.
Art. 248.° O mandatario é responsavel, durante a guarda e conservação das mercadorias do mandante, pelos prejuizos não resultantes de decurso do tempo, caso fortuito, força maior, ou vicio inherente á natureza da cousa.
§ unico. O mandatario deverá segurar as mercadorias do mandante, contra qualquer risco, ficando este, obrigado a satisfazer, o respectivo premio, com as mais despezas, deixando, sómente, de ser responsavel pela falta, e continuação, do seguro, tendo recebido ordem formal do mandante para não o effectuar.
Art. 249.° Seja, qual for, a causa dos prejuizos em mercadorias, que o mandatario tenha em si, de conta do mandante, o mandatario é obrigado a fazer verificar, em fórma legal, a alteração prejudicial occorrente, e avisar o mandante.
Art. 250.° O mandatario que não cumprir o mandato, em conformidade com as instrucções recebidas, e, na falta ou insufficiencia d'ellas, com os usos do commercio, responde por perdas e damnos.
Art. 251.° O mandatario é obrigado a participar ao mandante todos os factos que possam leval-o a modificar, ou a revogar, o mandato.
Art. 252.° O mandatario, deve, sem demora, avisar o mandante, da execução do mandato.
§ unico. Toda a delonga do mandante em responder, excedente ao tempo exigido pela natureza do negocio, eu concedido pelos usos do commercio, fará presumir ratificação por parte do mandante, ainda tendo o mandatario excedido os poderes do mandato.
Art. 253.° O mandatario é obrigado a pagar juros das quantias pertencentes ao mandante, a contar do dia em que as devia ter entregue ou expedido.
§ unico. Se o mandatario distrahir, do destino ordenado, as quantias remettidas, empregando-as em negocio proprio, responde, a datar do dia em que as receber, pelos respectivos juros, e pelos prejuizos resultantes do não cumprimento da ordem, sem prejuizo da competente acção criminal, se a ella houver logar.
Art. 254.° O mandatario deve, sendo-lhe exigido, exhibir o mandato escripto, aos terceiros, com quem contratar, e não poderá oppor-lhes quaesquer instrucções que houvesse recebido, em separado, do mandante, salvo provando que estes tinham, d'ellas, conhecimento ao tempo do contrato.
Art. 255.° O mandante é obrigado a fornecer ao mandatario os meios necessarios á execução do mandato, salva convenção em contrario
§ 1.° Não será obrigatorio o desempenho de mandato que exija provisão de fundos, embora haja sido acceito, emquanto o mandante não pozer á disposição do mandatario as importancias que lhe forem necessarias.
§ 2.° Ainda depois de recebidos os fundos, para a execução do mandato, se o mandatario os despender, e o mandante recusar nova remessa, póde o mandatario suspender as suas diligencias.
§ 3.° Estipulada a antecipação de fundos, por parte do mandatario, fica este obrigado a suppril-os, excepto no caso de suspensão de pagamentos, ou fallencia, do mandante.
Art. 256.° Sendo varias pessoas encarregadas do mesmo mandato, sem declaração de deverem obrar conjunctamente, presumir-se-ha deverem obrar uma na falta de outra, pela ordem da nomeação.
§ unico. Se houver declaração de deverem obrar conjunctamente, e se o mandato não for acceito por todas, os que receitarem, se constituirem maioria, ficam obrigados a cumpril-o.
Ar:. 257.° A revogação, e a renuncia, do mandato, não justificadas, tão causa á indemnisação de perdas e damnos.
Art. 258.º Terminando o mandato por morte ou interdicção de um dos contrahentes, o mandatario, seus herdeiros ou representantes, terão direito a uma compensação proporcional ao que teriam de receber, no caso de execução completa.
Art. 259.° O mandatario commercial gosa dos seguintes privilégios mobiliarios especiaes:
1.° Pelos adiantamentos e despezas que houver feito, pelos juros das quantias desembolsadas, e pela sua remuneração, nas mercadorias a elle remettidas, de praça divresa, para serem vendidas por conta do mandante, que estiverem á sua disposição em seus armazens ou em deposito publico, e n'aquellas, que provar, com a guia de transporte haverem-se-lhe sido expedidas, e a que taes creditos respeitarem;
2.° Pelo preço das mercadorias compradas por conta do mandante, nas mesmas mercadorias emquanto se acharem á sua disposição nos seus armazens, ou em deposito publico:
3.° Pelos creditos, constantes dos numeros antecedentes, preço das mercadorias pertencentes ao mandante, quando estas hajam sido vencidas.
§ unico Os creditos referidos no n.° 1.º preferem a todos os creditos sobre o mandante, salvo sendo provenientes de despezas de transporte ou seguro, quer hajam sido constituidos antes, quer depois, das mercadorias haverem chegado á posse do mandatario.

CAPITULO II

Dos gerentes, auxiliares, e caixeiros

Art. 260.° É gerente de commercio todo aquelle, que, sob qualquer denominação, consoante os usos commerciaes, se, acha proposto para tratar do commercio de outrem, no logar onde este o exerce, ou n'outro qualquer.
Art. 261.° O mandato, conferido ao gerente, verbalmente, ou sendo por escripto em quanto não registado, presume-se geral, e comprehensivo de todos os actos pertencentes e necessarios ao exercicio do commercio para que houvesse sido dado, sem que o proponente possa oppôr a terceiros limitação alguma dos respectivos poderes, salvo provando terem estes tido conhecimento d'ella ao tempo em que contrataram.
Art. 262.° Os gerentes tratam e negoceiam em nome de seus proponentes: nos documentos, que, nos negocios d'elles, assignarem, devem declarar que firmam com poder da pessoa, ou sociedade, que representam.
Art. 263.° Procedendo os gerentes nos termos do artigo precedente, todas as obrigações por elles contrahidas recáem sobre os proponentes.
§ 1.° Se os proponentes forem muitos, cada um d'elles será, solidariamente, responsavel.
§ 2.° Se o proponente for uma sociedade commercial a responsabilidade dos associados será regula-la conforme á natureza d'ella.
Art. 264.° Fóra do caso prevenido no artigo precedente, todo o contrato celebrado por um gerente, em seu nome, obriga-o, directamente, para com a pessoa com quem contratar.
§ unico. Se porém a negociação fosse feita por conta do proponente, e o contratante o provar, terá opção de accionar o gerente, ou o proponente, mas não poderá demandar ambos.
Ari. 265.° Nenhum gerente poderá negociar por conta propria, nem tomar interesse, debaixo do seu nome, ou alheio, em negociação do mesmo genero ou especie, da de

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que se acha incumbido, salvo com expressa auctorisação do proponente.
§ unico. Se o gerente contrariar a disposição d'este artigo, ficará obrigado a indemnisar de perdas e damnos o proponente, podendo este reclamar, para si, como feita em seu nome, a respectiva operação.
Art. 266.° O gerente póde accionar, e ser accionado, em juizo, em nome do proponente, pelas obrigações resultantes do commercio que lhe foi confiado.
Art. 267.º As disposições precedentes são applicaveis aos representantes de casas commerciaes, ou sociedades, estrangeiras, que tratarem, habitualmente, no reino, em nome d'ellas, de negocios do seu commercio.
Art. 268.º Os commerciantes podem encarregar outras pessoas, alem dos seus gerentes, do desempenho constante, em seu nome, e por sua conta, de algum, ou alguns, dos ramos do trafico a que se dedicam, devendo as companhias consignal-o nos seus estatutos, e os particulares participal-o aos seus correspondentes.
Art. 269.° O commerciante póde, igualmente, enviar, a localidade diversa d'aquella em que tiver o seu domicilio, um dos seus empregados, auctorisando o por meio de cartas, avisos, circulares, ou quaesquer documentos analogos, e fazer operações do seu commercio.
Art. 270.° Os actos dos mandatarios singulares, mencionados nos dois artigos antecedentes, não obrigam o mandante senão com respeito ás obrigações proprias do ramo de commercio de que houverem sido encarregados.
Art. 271.° Os caixeiros encarregados de vender, por miudo, em lojas publicas, reputam-se auctorisados para cobrar o producto das vendas que fazem: os seus recibos são validos sendo passados em nome do proponente.
§ unico. A mesma faculdade têem os caixeiros que vendem em armazem por grosso, sendo as vendas a dinheiro de contado, e verificando se o pagamento no mesmo armazem; quando, porém, as cobranças se fazem fóra ou precedem de vendas, feitas a praso, os recibos serão, necessariamente, assignados pelo proponente, seu gerente, ou procurador, legitimamente, constituido para cobrar.
Art. 272.° Quando um commerciante encarregar um caixeiro do recebimento de fazendas compradas, ou, que, por qualquer outro titulo devam entrar em seu poder, e o caixeiro as receber sem objecção ou protesto, a entrega será tida por boa em prejuizo do proponente; e não serão admittidas reclamações algumas que não podes sem haver logar, se o proponente, pessoalmente, as tivesse recebido.
Art. 273.° A morte do proponente não põe termo ao mandato conferido ao gerente.
Art. 274.° A revogação do mandato, conferida ao gerante, entender-se-ha sempre sem prejuizo de quaesquer direitos que possam resultar-lhe do contrato de prestação de serviços.
Art. 275.° Não se achando accordado o praso do ajuste, celebrado entre o patrão, e o caixeiro, qualquer dos contrahentes póde dal-o por acabado, avisando o outro contrahente da sua resolução com um mez de antecedencia.
§ unico. O caixeiro, despedido, terá o direito ao salario correspondente a esse mez, e o patrão não será obrigado a conserval-o no estabelecimento, nem no exercicio das suas funcções.
Art. 276.º Tendo o ajuste entre o patrão, e o caixeiro, um termo estipulado, nenhuma das partes poderá, arbitrariamente, desligar-se da convenção, sob pena de indemnisar a outra de perdas e damnos.
§ 1.° Julga-se arbitraria a inobservancia do contrate, uma vez que se não fundar em injuria feita por um á honra, dignidade, ou interesses, do outro, cabendo ao juizo qualificar, prudentemente, o facto, tendo em consideração o caracter das relações de inferior para superior.
§ 2.° Para os effeitos do paragrapho antecedente, são consideradas como injuriosas:
I. Com respeito aos patrões-qualquer fraude ou abuso de confiança, na gestão encarregada ao caixeiro, bem como qualquer acto de negociação feito por este, por conta propria ou alheia, que não do patrão, sem conhecimento e permissão d'este.
II. Com respeito aos caixeiros a falta do pagamento pontual do respectivo salario ou estipendio, o não cumprimento do qualquer clausula do contrato estipulada em favor d'elles, e os maus tratamentos.
Art. 277.° Os accidentes imprevistos, ou inculpados, que impedirem as funcções dos caixeiros, não interrompem a adquirição do salario competente, salva convenção em contrario, e uma vez que a inhabilidade não exceda a tres mezes continuos.
§ unico. Se por effeito immediato e directo do serviço acontecer ao caixeiro, algum damno extraordinario ou perda, não havendo pacto expresso a esse respeito, o patrão será obrigado a indemnisal-o, no que justo for.

CAPITULO III

Da commissão

Art. 278.° Dá-se contrato de commissão quando o mandatario executa o mandato mercantil sem menção ou allusão alguma ao mandante, contratando por si, e em seu nome, como principal e unico contrahente.
Art. 279.° Entre o committente e commissario dão-se os mesmos direitos e obrigações, que entre mandante e mandatario, com as modificações constantes d'este capitulo.
Art. 280.° O commissario fica, directamente, obrigado com as pessoas com quem contrata, como se o negocio fosse seu, não tendo estas acção contra o committente, nem este contra ellas, ficando, porem, sempre, salvas as que possam competir, entre si, ao comittente e ao commissario.
Art. 281.° O commissario não responde pelo cumprimento das obrigações contrahidas pela pessoa com quem contratou, salvo pacto ou uso contrarios.
§ 1.° O commissario sujeito a tal responsabilidade, fica, pessoalmente, obrigado para com o committente pelo cumprimento das obrigações provenientes do contrato.
§ 2.° No caso especial, previsto no paragrapho antecedente, o commissario tem direito a carregar, alem da remuneração ordinaria, a commissão del credere, que será determinada pelos usos da praça onde a commissão for executada.
Art. 282.° Todas as consequencias prejudiciaes, derivadas de um contrato, feito com violação ou excesso dos poderes da commissão, serão, embora o contrato surta os seus effeitos, por conta do commissario, nos termos seguintes:
1.° O commissario que fizer alheação por conta de outrem, a preço menor do que lhe fôra marcado, ou na falta de fixação de preço, menor do que o corrente, abonará ao committente a differença de preço, salva a prova da impossibilidade da venda por outro preço e que, por elle, evitou prejuiso ao committente.
2.° Se o commissario, encarregado de fazer uma compra exceder o preço que lhe fora fixado, será do arbitrio do committente, acceitar o contrato, ou deixal-o de conta do commissario, salvo se este se conformar com receber, somente, o preço marcado.
3.° Consistindo o excesso do commissario em não ser a cousa comprada, da qualidade encommendada, o committente não é obrigado a recebel-a.
Art. 283.° O commissario, que sem auctorisação do committente, fizer emprestimos, adiantamentos, ou vendas a praso, corre o risco da cobrança e pagamento das quantias emprestadas, adiantadas, ou fiadas, podendo o committente exigil-as á vista, cedendo no commissario todo o interesse, vantagem, ou beneficio, que resultar do credito por este concedido e pelo committente desapprovado.
§ unico. Exceptua-se o uso das praças em contrario, no caso de não haver ordem expressa para não fazer adiantamentos, nem conceder prasos.

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Art. 284.° Ainda que o commissario tenha auctorisação para vender a praso, não o poderá fazer a pessoas conhecidamente insolventes, nem expor os interesses do committente a risco manifesto e notorio, sob pena de responsabilidade pessoal.
Art. 285.° O commissario, que vender a praso, deve, salvo o caso de haver del credere, expressar nas contas é avisos os nomes dos compradores, de contrario é entendido que a venda só fizera a dinheiro de contado.
§ unico. O mesmo praticará o commissario em toda a especie de contratos que fizer, de conta alheia, uma vez que os interessados assim o exijam.
Art. 286.° Nas commissões de compra e venda de letras de cambio, fundos publicos, e titulos de credito, que tenham curso em commercio, eu de quaesquer mercadorias e generos, que tenham preço de bolsa ou de mercado, póde o commissario, salva estipulação contraria, fornecer como vendedor, as cousas que tinha de comprar, ou adquirir, para si, como comprador, as cousas que tinha de vender, salvo sempre o seu direito á remuneração.
§ unico. Se o commissario, quando participar ao committente a execução da commissão, em algum dos casos referidos n'este artigo, não indicar o nome da pessoa com quem contratou, o commiitente terá direito de julgar que elle fez a venda ou a compra, por conta propria, e de lhe exigir o cumprimento do contrato.
Art. 287.° Os commissarios não podem ter mercadorias de uma mesma especie, pertencentes, a distinctos donos, debaixo de uma mesma marca, sem distinguil-os por uma contra-marca, que designe a propriedade respectiva.
Art. 288.° Quando debaixo de uma mesma negociação se coonprehendem mercadorias de committentes diversos, ou do mesmo commissario com os de algum committente, deverá fazer-se, nas facturas, a devida distincção com a indicação das marcas e contra-marcas, que designem a procedencia de cada volume, e notar-se nos livros, em artigos separados, o que, a cada proprietario, respeita.
Art. 289.º O commissario que tiver creditos contra uma mesma pessoa, procedentes de operações feiras por conta de committentes distinctos, ou por conta propria e alheia; notará em todas as entregas que o devedor fizer, o nome do interessado, por cuja conta receber, e; o mesmo fará, na quitação que passar.
§ unico. Quando nos recibos e livros, se omittir o expressar a applicação da entrega feita pelo devedor de operações a proprietarios distincios, far-se-ha a applicação pro rata do que importar cada credito.

TITULO VI

Das letras de cambio, livranças, e cheques

CAPITULO I

Das letras de cambio

SECÇÃO I

Da natureza e fórma das letras de cambio

Art. 290.° A letra de cambio deve conter:
1.° A indicação da quantia a satisfazer;
2.° O nome ou firma d'aquelle que a deve pagar;
3.° A indicação da pessoa ou da firma, a quem, ou á ordem de quem, deve ser paga;
4.° A assignatura do sacador.
Art. 291.° Quando a indicação da quantia a satisfazer se achar feita por extenso e em algarismos, e houver divergencia entre uma e outra, prevalecerá a que estiver feita por extenso.
§ unico. Se a indicação da quantia, a satisfazer, se achar feita, por mais de uma vez, por extenso, ou, por mais de uma vez, em algarismos ,e houver divergencias entre as diversas indicações, prevalecerá a que se achar feita pela quantia inferior.
Art. 292.° A simples denominação de letra, implica o ser ella á ordem, salva declaração em contrario.
Art. 293.° O escripto, em que faltar algum dos requisitos exigidos no artigo 290.°, não produzirá effeito como letra de cambio.
Art. 294.° A letra de cambio será datada, e indicará a epocha, e o logar do pagamento.
§ 1.° No caso da letra de cambio não ser datada, incumbirá, ao portador, havendo contestação, a prova da data.
§ 2.° Se a letra não anunciar a epocha do pagamento será pagavel á vista.
3.° Se a letra não indicar o logar do pagamento, será pagavel no domicilio do sacado.

SECÇÃO II

Do saque

Art. 295.º O sacador é, pessoalmente, garante para com o portador pela acceitação e pagamento da letra que sacar.
Art. 296.° Entre commerciantes, e por dividas provenientes de actos commerciaes, o credor, salva convenção em contrario, tem direito, de sacar sobre o seu devedor, até á importancia do seu credito.
§ unico. O acceite feito peio sacado exonera-o de uma importancia igual a devida por elle ao sacador.
Art. 297.° A letra de cambio póde ser sacada:
1.º Á ordem do proprio sacador;
2.° Sobre um individuo, e a pagar no domicilio de um outro;
3.° Por ordem e por conta de um terceiro.
§ unico. A letra de cambio pagavel á ordem do sacador, só se torna perfeita, pelo acceite, ou pelo indosso.
Art. 298.º A letra de cambio póde ser sacada, por uma, ou mais vias.
§ 1.º Só a letra for sacada a mais de uma via, deve cada exemplar fazer menção do numero ciado, sob pena do sacador responder por perdas e damnos.
§ 2.° No caso, previsto no paragrapho anterior, cada exemplar da letra vale por todas, quantas formam O jogo das que houverem sido sacadas.

SECÇÃO III

Do acceite

SUB-SECÇÃO I

Do acceite pelo sacado

Art. 299.° A apresentação ao acceite só é obrigatória, para as letras de cambio pagaveis a certo termo de vista.
§ unico. O portador de uma letra de cambio, pagavel a certo termo de vista, deve, sob pena de perder o seu direito de regresso, apresental-a ao acceite, no praso, indicado na letra, e, na falta de indicação, d'outro de oito dias a contar d'aquelle em que a houver recebido.
Art. 300.° O acceite de uma letra deve ser escripto na propria letra, e assignado pelo acceitante, valendo, porém, como acceite, a simples assignatura do sacado apposta, na parte anterior.
§ 1.° O acceite de uma letra de cambio deve ser feito dentro das vinte e quatro horas da apresentação, não podendo ser condicional, posto que possa ser restricto quanto á importancia sacada.
§ 2.° Se a letra for sacada a certo termo de vista, deverá o acceite ser datado, sob pena de se tornar a letra exigivel, no termo, n'ella, declarado, a contar da data do saque, e, achando-se vencida, de ser cobravel no dia seguinte ao da apresentação.

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§ 3.° O sacado póde, se houver retido a letra, annullar ou riscar o seu acceite, emquanto o praso das vinte e quatro horas, concedido n'este artigo, não houver expirado.
§ 4.° Aquelle que retiver a letra apresentada, alem do termo fixado n'este artigo, é responsavel, para com o portador, por perdas e daninos.
Art. 301.° Se a letra de cambio for pagavel em logar diverso, do domicilio do sacado, este deve, na falta de indicação da letra, designar, no acto do acceite, a pessoa que a deve pagar, sob pena de ficar elle mesmo obrigado a effectuar, pessoalmente, o pagamento, no logar indicado.
Art. 302.° O acceitante de uma letra de cambio, contrahe, pelo acceite, a obrigação de pagar a importancia d'ella.
§ unico. A obrigação do acceitante subsiste ainda tendo o sacador fallido, antes do acceite, se elle o não soubesse.
Art. 303.° A falta de acceite, total ou parcial, eleve ser comprovada, no domicilio do sacado, por um termo de protesto.
Art. 301.° Notificado o protesto, os indossados, o sacador, e o dador de aval, são, respectiva e solidariamente, obrigados a prestar caução, ao pagamento da letra de cambio no seu vencimento, ou a effectuar o reembolso d'ella, despezas de protesto, e mais que legitimas forem.
§ unico. Esta caução só assegura as obrigações d'aquelle que a prestou.
Art. 305.° Se o portador da letra de cambio, a certo termo de vista, não a apresentar para o acceite, nos prasos marcados, ou não a protestar, perderá todo o direito a exigir dos indossantes a caução ou o deposito, ou o pagamento, e só conservará o seu direito, contra o sacador, salvo caso de força maior.

SUB-SECÇÃO 2.ª

Do acceite por intervenção

Art. 306.° A letra de cambio, que não for acceita pelo sacado, podel-o-ha ser por um terceiro que intervenha pelo sacador ou por um dos indossantes, ao tempo de protestar se de não acceita, por virtude de incumbencia feita na propria letra por algum d'aquelles.
Art. 307.° Se a letra de cambio não for acceita, nem pelo sacado, nem pelas pessoas n'ella incumbidas de intervirem, podel-o-ha ser por um terceiro, ainda que para tal não tenha incumbencia.
Art. 308.° Apresentando-se muitas pessoas para acceitar por intervenção uma letra de cambio não acceita serão preferidas na ordem seguinte:
1.° As que forem incumbidas de intervir;
2.° As que se apresentarem, sem incumbencia, a intervir.
§ 1.° A preferencia entre as pessoas que se apresentarem a preferir por incumbencia, e entre as que, sem incumbencia, se apresentarem, será dada á que desonerar maior numero de obrigados;
§. 2.° Apresentando-se muitas pessoas em igualdade de circumstancias o portador escolherá entre ellas a que dever fazer o acceite.
§ 3.° Se o portador deixar de escolher a pessoa que desonerar maior numero de obrigados, perde o direito e acção contra aquelles que ficariam desonerados.
§ 4.° Poderão intervir, como terceiros para acceitarem, o proprio sacado, e o incumbido de intervir, posto houvesse n'esta qualidade recusado o acceite.
Art. 309.º Na falta de acceite pelo sacado, o portador conserva todos os seus direitos contra o sacador e indossantes, sem embargo de qualquer acceite por intervenção, se não se conhecer do protesto que consentiu na intervenção.
Art. 310.° A intervenção será mencionada no instrumento do protesto de não acceite e assignada pelo interveniente.
§ unico. Não se declarando por honra de quem se fez a intervenção, entender-se-ha ser por honra do sacador.
Art. 311.° Todo o interveniente é obrigado a participar a sua intervenção á pessoa por quem interveiu, pena de responder por perdas e damnos a haverem logar.
§ unico. Esta participação dever-se ha fazer, pelo menos, por correspondencia registada, lançada ao correio, nas quarenta e oito horas seguintes ao evento.

SECÇÃO IV

Do indosso

Art. 312.º O indosso deve sor escripto na letra de cambio, ou quando necessario, sobre uma, folha annexa á letra, e na qual esta será integralmente transcripta.
§ 1.º Para o indosso ser valido, basta que o indossante haja assignado o seu nome, ou a sua firma, no verso da letra do cambio, ou da folha annexa.
§ 2.° O portador póde preencher o indosso feito nos termos do paragrapho anterior ou transmittil-a sem o fazer.
§ 3.º O indosso será datado: se o não for, incumbo ao portador, havendo contestação, fixar a data.
Art. 313.° O indosso transfere a propriedade da letra de cambio com todas as garantias, pessoaes ou reaes, que a asseguram.
§ unico. As clausulas restrictivas que um indossante acrescente ao indosso aproveitam a todos os indossantes posteriores.
Art. 314.° O indosso de letras de cambio já vencidas tem o simples effeito de cessão ordinaria de creditos, salvas as convenções entre o cedente e o cessionario, mas sem prejuizo de terceiros.
Art. 315.° Se a letra tiver sido indossada ao sacador, ou a qualquer dos indossantes anteriores, e se houver sido, de novo, por elles indossada, antes do vencimento, todos os indossantes, ficam, não obstante, obrigados para com
Portador.

SECÇÃO V

Do aval

Art. 316.° Independentemente do acceite e do indosso, o pagamento da letra de cambio póde ser garantido por aval.
Art. 317.° O aval podo ser escripto na propria letra, ou em instrumento separado, e até prestado por carta.
§ unico. A simples assignatura apposta, por um terceiro, no verso da letra de cambio, imporia prestação de aval.
Art. 318.° O dador de aval é, solidariamente, adstricto ás mesmas obrigações, e fica sujeito ás mesmas acções que incumbem á pessoa que afiançou.
§ unico. A obrigação do dador de aval subsiste ainda no caso de não ser valida a obrigação por incapacidade da pessoa que a contrahiu, salva a excepção prevista no § 2.° do artigo 822.° do codigo civil.
Ari. 319.° Se não se achar declarada a pessoa por quem se dá o aval, entender-se-ha, estando a letra acceite, ser pelo acceitante, e, não o estando, ser pelo sacador.
Art. 320.° O dador de aval, que paga a letra de cambio vencida, fica subrogado nos direitos que competiam ao portador, contra a pessoa a favor de quem foi dado o aval, e contra os obrigados anteriores.

SECÇÃO VI

Do vencimento

321.° Se a letra de cambio, indicar o dia do pagamento, será vencivel n'esse mesmo dia; - se indicar o meado de um mez, será vencivel no dia quinze d'esse mez; - se indicar o principio ou o fim de um mez ou de um anno, será vencivel no primeiro ou no ultimo dia d'elles.

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Art. 322.° O vencimento de uma letra de cambio é vista, será no dia da sua apresentação.
Art. 323.° O vencimento de uma letra de cambio a termo de vista fixa-se pela data do acceite, ou pela do protesto, na falta de acceite.
§ 1.° Entender-se-ha por dia o espaço de vinte e quatro horas, começando-se a contar da primeira hora depois da meia noite, os annos serão os que se acham fixados pelo kalendario gregoriano, e os mezes serão computados em trinta dias.
§ 2.° No termo de determinado numero de dias não se conta no praso o dia em que elle começar, mas conta-se aquelle em que findar.
Art. 324.° O vencimento da letra de cambio, sacada a pagar em feira, determina-se e fixa-se nos termos do artigo 97.°
Art. 325.° A letra de cambio julga-se vencida, desde o momento que quebra aquelle contra quem foi sacada, podendo o portador desde logo protestal-a.
§ unico. No caso previsto n'este artigo o sacador ou indossados podem, prestando fiança, differir o pagamento até o dia do vencimento ordinario da letra.

SECÇÃO VII

Do pagamento

SUB-SECÇÃO I

Disposições geraes

Art. 326.° O portador de uma letra de cambio deve apresental-a a pagamento no dia do vencimento.
§ 1.° A letra de cambio será pagavel no dia do vencimento, dentro das horas da balsa, onde a houver, e até ao pôr do sol, onde a não houver.
§ 2.° Recaindo o dia de vencimento em um domingo ou dia santo, o pagamento deve ser feito no primeiro dia seguinte, que não seja santificado.
§ 3.° Se a letra for pagavel á vista deve, na falta de indicação especial, ser apresentada ao sacado dentro dos prasos marcados no artigo 299.°
§ 4.° Se a letra contiver a indicação de uma pessoa, para satisfazer, em caso de necessidade, só deverá ser-lhe apresentada, se tal pessoa tiver domicilio na mesma localidade em que o sacado.
§ 4.° Se a letra não for paga no seu vencimento será o portador obrigado a fazel-a protestar.
Art. 327.° A letra de cambio deve ser paga na moeda que indica: se esta não tem curso legal, no reino, a importancia da letra será reduzida á moeda nacional pelo curso medio do cambio á vista, na vespera do vencimento, sobre a praça mais vizinha, do logar do pagamento, a não ser que o sacador tenha prescripto, expressamente, o pagamento em moeda estrangeira.
Art. 328.° Augmentado ou diminuido o valor politico da moeda por ordem do governo, entre o tempo do saque e o do vencimento, observar-se-hão as disposições dos artigos 724.° a 726.° do codigo civil.
Art. 329.° O portador de uma letra de cambio não póde ser obrigado a receber o pagamento d'ella antes do vencimento.
Art. 330.° Se aquelle sobre quem a letra de cambio é sacada, a paga ou desconta antes do vencimento, responde pela validade do pagamento.
Art. 331.° Aquelle que paga uma letra de cambio no vencimento e sem opposição de terceiro, presume-se validamente desobrigado.
§ unico. A opposição mencionada neste artigo só é admissivel nos casos de perda da letra ou incapacidade do portador.
Art. 332.° O devedor, que pagou a leira, tem o direito de exigir que o portador lh'a entregue com a respectiva quitação.
§ 1.º Sacada uma letra de cambio por mais de uma sacado só fica desonerado para com o portador, para letra em que se acha o seu acceite, tendo-o havido.
§ 2.° No caso de não ter havido acceite, o sacado exonera-se pagando o primeiro exemplar da letra que lhe for, regularmente, apresesentado.
Art. 333.° O portador da letra de cambio não póde recusar qualquer pagamento parcial por conta da mesma, embora o acceite haja sido pelo total d'ella.
§ 1.° No caso, previsto n'este artigo, o portador receberá a parte da importancia da letra em descarga do sacador e indomados, devendo protestar pelo resto.
§ 2.° O acceitante podo exigir do portador que lhe declare, na letra, o acontecido, e lhe dê recibo da quantia paga em separado, mas não tem direito a exigir que a letra de cambio lhe seja entregue.
Art. 334.° O simples detentor de uma letra de cambio póde protestal-a, nos casos em que a lei requer o protesto, e pedir o pagamento, prestando fiança, uma vez que prove, por escripto, que a letra lhe fora remettida para ser cobrada por elle.

SUB-SECÇÃO 2.ª

Do pagamento por intervenção

Art. 335.° A letra de cambio protestada póde ser paga por qualquer terceiro interveniente, por conta e honra de um dos signatarios, nos mesmos termos em que póde ser acceita por intervenção.
§ 1.° Se aquelle sobre quem a letra de cambio foi sacada, e contra o qual se tirou o protesto por falta de acceite, se apresentar a pagal-a será preferido a todos.
§ 2.° A intervenção e o pagamento serão mencionados no instrumento do protesto.
Art. 336.° O que paga uma letra de cambio por intervenção fica subrogado nos direitos do portador, independentemente de acto algum de cessão, e é obrigado a todas as formalidades que incumbem ao portador.
Art. 337.° Se o pagamento por intervenção é feito por conta e honra do sacador todos os indossados subsequentes ficam livres; se é feito por conta e honra de um dos indossados os seguintes na ordem dos indossos ficam desonerados.

SECÇÃO VIII

Do protesto

Art. 338.° A letra de cambio devo ser protestada no domicilio do sacado, indicado na letra, e, na sua falta no que elle tiver ao tempo do protesto.
§ 1.° Se o acceitante for desconhecido, ou não podér descobrir-se o seu domicilio, far-se-ha o protesto no escriptorio do tabellião ou escrivão que o lavrar.
§ 2.° Se houver indicação de pessoa para acceitar em caso de necessidade, ou acceitantes por intervenção, o protesto será feito nos seus domicilios.
Art. 339.° O protesto deve ser feito no dia seguinte ao do vencimento, ou no immediato a este.
§ unico. Os dias feriados não se contam n'este praso.
Art. 340.° Os protestos por falta de acceite e de pagamento devem ser feitos, pessoalmente, perante um tabellião, ou escrivão do tribunal do commercio.
§ 1.° O instrumento do protesto deve conter:
1.° Copia litteral da letra de cambio, acceite, indossos, aval, e indicações que tiver;
2.° Declaração das pessoas que foram intimadas, pelo official, para que acceitassem ou pagassem a letra de cambio, e do logar onde o foram;
3.º Declaração da presença ou da ausencia da pessoa que deve pagar e as rasões dadas, se algumas se apresentaram, para não acceitar ou não pagar;
4.° Interpellação para que assignassem o auto e os motivos por que recusaram fazel-o;

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5.° Declaração de que o official fez o protesto, por falta de acceite ou pagamento, a requerimento de quem, e contra quem, e com que fundamento;
6.º Assignatura do official, data e hora em que o protesto é feito.
§ 2.° Todos os lermos constantes d'este artigo e seu § 1.°, serão feitos debaixo da pena de insufficiencia do protesto e de responsabilidade do official, por perdas e damnos, alem das penas impostas pela lei a erro de officio, a haverem logar.
Art. 341 ° O official que fizer o protesto deve lançal-o, por copia, n'um registo especial, por ordem de datas, continuado sem lacunas, raspaduras, nem emendas, e legalisado como os do registo commercial, pena de responder por perdas e damnos, alem da pena criminal que lhe couber, por erro de officio.
§ unico. D'este registo dará aos interessados as certidões que lhe forem requeridas.
Art. 342.° A morte, ou a fallencia do sacador, e o protesto por falta de acceite, não eximem o portador da letra de cambio da obrigação de fazer certificar a falta de pagamento pela forma estabelecida nos artigos precedentes.
Art. 343.° A clausula sem protejo, ou sem despezas tem por effeito, com relação áquelle que a appoz, e aos indossantes posteriores, dispensar o portador da obrigação de protestar a letra, mas não o priva do direito de o fazer lavrar e de exigir o reembolso das custas.

SECÇÃO IX

Do resaque

Art. 344.° O portador da letra de cambio, protestada, de não paga, póde haver o embolso d'ella, resacando uma nova letra de cambio, á vista, sobre o sacador ou sobre qualquer dos co-obrigados, pelo principal d'ella, e despezas occorridas pelo curso do cambio, ao tempo do ressaque.
§ 1.° Aquelle que pagou a letra de recambio póde embolsar-se resacando do mesmo modo sobre qualquer dos co-obrigados anteriores.
§ 2.° Aquelle que pagar a letra de cambio tem o direito de anuullar ou riscar o seu indosso e os subsequentes.
Art. 345.° O resaque será acompanhado da letra de cambio original, do protesto, e de uma conta de retorno.
§ unico. A conta de retomo deve conter:
1.° O principal da letra de cambio protestada, juros, despezas do protesto, e outras legitimas, taes como commissão de banco, corretagem, sêllo, e portes de cartas;
2.° O nome d'aquelle sobre quem se resaca;
3.° O preço do recambio certificado pelo corretor respectivo, ou em falta d'elle por dois negociantes.
Art. 346.° O recambio, ou preço do cambio por que se negoceia o resaque, será regulado nos termos seguintes:
1.° O devido ao portador, pelo curso do cambio da praça onde a letra era pagavel, sobre a praça do domicilio da pessoa sobre quem se resaca;
2.° O devido ao indossado, que pagou a letra, pelo curso do cambio da praça d'onde se resaca, sobre a praça do domicilio da pessoa sobre quem se resaca.
§ 1.° Não havendo curso de cambio entro as differentes praças, o recambio será regulado pelo curso do cambio das duas praças mais vizinhas.
§ 2.° Os recambies não podem accumular-se, devendo cada um dos co-obrigados, bem como o sacador, supportar só um.

SECÇÃO X

Das obrigações e acções

Art. 347.° Todos aquelles que assignam uma letra de cambio, são, para com o portador, solidariamente, garantes d'ella.
§ unico. Esta obrigação comprehende a importancia da letra, juros, despezas do protesto, e outras quaesquer legitimas.
Art. 348.° Toda a assinatura, aposta n'uma letra de cambio, sujeita o signatario a obrigação que ella implica, sem embargo da nullidade de qualquer outra obrigação, ou da falsidade de qualquer outra assignatura.
Art. 349.° O portador da letra de cambio, protestada de não acceite ou de não paga, é obrigado a participar o accidente occorrido ao seu respectivo cedente, acompanhando o aviso com certidão do protesto, pena de responder por perdas e damnos.
§ 1.° Cada um dos indomados desde o cedente do portador é obrigado na mesma dilação e com a mesma responsabilidade a transmittir o protesto recebido ao seu respectivo indossante até ao sacador.
§ 2.° As participações exigidas n'este artigo poderão effectuar-se nos termos do § unico do artigo 311.°
Art. 350.° O portador de uma letra de cambio, protestada por falta de pagamento, póde pedir o seu embolso, a todos os signatarios da letra, collectiva, ou, separadamente.
§ unico. O mesmo direito tem qualquer dos indossados, contra os indossantes anteriores e o sacador.

SECÇÃO XI

Da perda das letras de cambio

Art. 351.° O proprietario de uma letra de cambio perdida, póde fazel-a declarar sem effeito, justificando o seu direito de propriedade, e a perda d'aquella, no tribunal da localidade, onde era pagavel.
§ unico. Distribuida a acção, póde o auctor exercer todos os meios para a conservação dos seus direitos, e, até, exigir o pagamento, prestando caução, ou pedir o deposito judicial da importancia devida pelo sacado.
Art. 352.° O proprietario da letra de cambio perdida deve, para obter um novo exemplar, dirigir se ao seu immediato indossante, o qual é obrigado a prestar-lhe o seu nome e os seus serviços para com o seu proprio indossante, e assim, successivamente, de indossado em indossado, até ao sacador.
§ 1.° Logo que o sacador haja fornecido uma nova letra cada indossante será obrigado a repetir o seu indosso.
§ 2.° O sacado, que houver acceitado, não é obrigado a repetir o acceite, e o pagamento, por parte d'elle só poderá ser exigido nos termos do artigo 351.°
§ 3.° As custas d'estes incidentes são á conta do proprietario da letra perdida.

SECÇÃO XII

Da prescripção

Art. 353.° Todas as acções, relativas a letras de cambio, prescrevem em cinco annos, a contar do ultimo dia util para o protesto, ou do dia do ultimo acto judicial, se não houve sentença condemnatoria, ou se a divida não foi reconhecida por instrumento separado.
§ unico. Os pretensos devedores são comtudo obrigados, sendo-lhes exigido, a prestar juramento de que não devem, e os seus socios, herdeiros, e representantes, de que julgam, em boa fé, nada dever.
Art. 354.° A prescripção, quanto ás letras á vista ou a um certo termo de vista, e cujo vencimento não foi fixado pela apresentação, começa a correr da expiração do termo fixado no artigo 299.° para a apresentação ao sacado.

CAPITULO II

Das livranças e cheques

Art. 355.° A livrança é um simples escripto particular de divida que deve conter:
1.° A indicação da importancia a pagar;

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2.° O nome d'aquelle a quem o pagamento deve ser feito;
3.° A epocha do pagamento;
4.° A assignatura d'aquelle que se obriga;
5.° A data.
Art. 356.° Toda a pessoa que tiver qualquer importancia disponivel num estabelecimento bancario, ou em poder de commerciante, póde dispor d'ella, em seu favor ou de um terceiro, por meio de um cheque.
§ 1.° O cheque será datado e assignado pelo passador, e indicará a importancia a pagar.
§ 2.° O cheque póde ser passado ao portador, á vista, ou a praso, não devendo este exceder dez dias contados do da apresentação.
Art. 357.° O portador que não apresentar o cheque nos prasos fixados no artigo anterior, ou não pedir o pagamento ao vencimento, deixa de ter acção contra o indossante, e perdel-a-ha contra o passador, se, depois de decorridos os prasos referidos, não estiver disponivel a importancia a pagar, por falta d'aquelle que a devia satisfazer.
Art. 358.º Todas as disposições respectivas á letras de cambio, que não forem contrarias á natureza das livranças e á dos cheques, ser-lhes-hão applicaveis.

TITULO VII

Da conta corrente

Art. 359.° Dá-se contrato de conta corrente todas as vezes que duas pessoas, tendo de entregar valores, uma á outra, se obrigam a transformar os seus creditos, em artigos de deve e ha de haver,, de sorte que só o saldo final, resultante de sua liquidação, seja exigivel.
Art. 360.° Todas as negociações entre pessoas domiciliadas, ou não, na mesma praça, e todos os valores transmissiveis em propriedade, podem ser objecto de conta corrente.
Art. 361.° São effeitos do contrato de conta corrente:
1.° A transferencia da propriedade do credito, indicado em conta corrente, para aquelle que o recebeu e por elle se debita;
2.° A novação entre o creditado e o debitado da obrigação anterior, de que resultou o credito em conta corrente;
3.° A compensação reciproca entre os contrahentes, até á concorrencia dos respectivos credito e debito, ao termo do encerramento da conta corrente;
4.° A exigibilidade só do saldo resultante da conta corrente;
5.° O vencimento de juros das sommas creditadas em conta corrente, a cargo do debitado, desde o dia do effectivo recebimento.
§ unico. O lançamento, em conta corrente, de mercadorias, ou titulos de credito, presume-se, sempre, feito com a clausula «salva cobrança.»
Art. 362.° A existencia de um contrato de conta cor rente não exclue o direito a qualquer remuneração e o reembolso das despezas das negociações que lhe dizem respeito.
Art. 363.° O encerramento da conta corrente, e a liquidação do saldo, haverão logar no fim do praso fixado pelo contrato, ou pelos usos commerciaes, e na sua falta, no fim de cada anno civil.
§ unico. Os juros do saldo correm a contar da data da liquidação.
Art. 364.° O contrato de conta corrente, termina na falta de convenção, pelo decesso ou interdição de uma das partes.
Art. 365.° Antes do encerramento da conta corrente nenhum dos interessados será considerado como credor ou devedor do outro.
Art. 366.° O encerramento definitivo da conta corrente fixa, invariavelmente, o estado das relações juridicas das partes, produz, de pleno direito, a compensação do debito com o credito concorrente, e determina a pessoa do credor e do devedor.

TITULO VIII

Das operações de bolsa

Art. 367.° São objecto especial de contratos, nas bolsas:
1.° Os fundos publicos, nacionaes, ou estrangeiros;
2.° As letras de cambio, livranças, cheques, letras de risco maritimo, acções de sociedades legalmente constituidas, e toda a espécie de valores commerciaes procedentes de pessoas, que tenham capacidade legal para contratar;
3.° A venda de metaes amoedados, ou em barra;
4.° A venda de qualquer especie de mercadoria;
5.° Os seguros de qualquer natureza que sejam;
6.° O preço dos transportes por terra, canaes, rios, ou mar;
7.° O fretamento, afretamento, venda, e hypotheca, de navios;
8.° A venda de bem immoveis, e de direitos a elles inherentes;
9.° Os leilões feitos por intervenção de corretor.
§ unico. São considerados fundos publicos para os effeitos do n.° 1. d'este artigo:
1.° Os que representarem creditos contra o estado, districto, ou concelho;
2.° Os emittidos com garantia do governo, ou com responsabilidade subsidiaria do estado, districto, ou concelho, por estabelecimentos publicos, ou emprezas particulares;
3.° Os emittidos por governos, ou corporações publicas, estrangeiros.
Art. 368.° Os fundos publicos serão admittidos á cotação logo que se achem, legalmente, reconhecidos como negociaveis:, os outros titulos, por deliberação da respectiva camara dos corretores, que só a concederá, se entender, acharem se legalmente emittidos, e sufficientemente garantidos.
Art. 369.° A cotação feita pela camara dos corretores determina o curso publico e legal, o unico que será reconhecido em juizo.
Art. 370.º Todas as operações de bolsa podem ser feitas porá se realisarem, na occasião em que forem ajustadas, ou, a praso.
§ unico. O praso, nas operações sobre fundos publicos, não poderá exceder o fim do mez seguinte áquelle em que houverem sido ajustadas.
Art. 371.° Nas negociações, a praso, sobre fundos publicos, o comprador é sempre obrigado ao pagamento, integral do preço, e o vendedor á entrega dos titulos, ou do seu valor, segundo a cotação do dia, em que a negociação devia concluir-se.
§ unico. Na falta de cumprimento do contrato, o damno, que d'ahi resultarão vendedor ou ao comprador, não poderá ser compensado pelo pagamento da differença na cotação.
Art. 372.° As operações, a praso, sobre fundos publicos, não produzirão aceno em juizo, a favor do vendedor, se no acto, em que ellas deverem concluir-se, não existirem em seu poder os tiulos que tiver vendido, e a favor do comprador, se este, no acto em que ellas deverem concluir-se, se não mostrar habilitado a satisfazer o preço da compra.
Art. 373.° Todas as negociações sobre fundos publicos, serão annunciadas por um pregoeiro, que haverá em cada bolsa, para o que, o corretor, encarregado da negociação, lhe entregará uma nota por elle assignada, em que se declare se a operação é, ou não, a praso.
§ unico. A nota, de que trata este artigo, será depois entregue ao syndico da cansara dos corretores, o qual deverá conserval-a até que se conclua a negociação.
Art. 374.° As negociações sobre fundos publicos, que se

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houverem de verificar na loisa, só podem ser feitas por intervenção de corretor.
Art. 375.° As negociações a praso, serão publicadas nu loisa, e registadas em um livro para isso destinado, sendo a publicação e registo feitos pelo corretor que tiver intervindo na negociação.
§ unico. O corretor que faltar ao cumprimento da disposição deste artigo será condemnado nas penas que o seu regimento lhe impozer, e responderá pela indemnisação dos prejuizos, que pela sua omissão tiver causado aos seus committentes, ou a quaesquer interessados na negociação.
Art. 376.º Não haverá acção em juizo para exigir o cumprimento de obrigações contratadas nas negociações a praso feitas por intervenção de corretor, se não estiverem publicadas e registadas nos termos do artigo antecedente, exceptuado o caso da acção dever ser dirigida, directamente, contra o corretor pela sua responsabilidade, nos termos d'este codigo.
Art. 377.° Os emprestimos, com garantia de fundos publicos, que houverem de ser contratados nas bolsas, só o podem ser por intervenção de corretor.

TITULO IX

Das operações de banco

Art. 378.° São commerciaes todas as operações de banco tendentes a realisar beneficios sobre numerario, fundos publicos, ou titulos negociaveis, e em especial as de cambio, arbitrios, descontos, cobranças, aberturas e cartas de creditos, emissão e circulação de notas e titulos fiduciarios pagaveis á vista e ao portador.
Art. 379.° As operações de banco regular-se-hão pelas disposições especiaes respectivas aos contratos que representarem, ou, em que, a final, se resolverem.
Art. 380.° A creação, organisação, e funccionamento, de estabelecimentos bancarios com a faculdade de emittir titulos fiduciarios, pagáveis á vista e ao portador, são regulados por legislação especial.
Art. 381.° O banqueiro que cessa pagamentos presume-se em quebra culposa, salva defeza legitima.

TITULO X

Do transporte

Art. 382.° O contrato de transporte, por terra, cana es, ou rios, considerar-se ha mercantil quando os conductores tiverem constituido empreza ou companhia, regular e permanente.
§ 1.° Haver-se-ha por constituida empreza, para os effeitos deste artigo, logo, que, qualquer ou quaesquer pessoas, se proponham exercer a industria de fazer transportar, por terra, canaes, ou rios, pessoas, ou animaes, alfaias ou mercadorias de outrem.
§ 2.° As companhias de transportes constituir-se-hão pela fórma prescripta n'este codigo, para as sociedades commerciaes, ou pela que lhes for estabelecida na lei da sua creação.
§ 3.° As emprezas e companhias mencionadas n'este artigo, serão designadas, no presente codigo, pela denominação de transportador.
§ 4.° Os transportes maritimos e os de passageiros, serão regulados pelas disposições applicaveis do livro III d'este codigo.
Art. 383.° O transportador póde fazer effectuar o transporte, directamente por si, seus empregados e instrumentos, ou por empreza, companhia, ou pessoas diversas.
§ unico. No caso previsto na parte final deste artigo, o transportador que, primitivamente, contratou com o expedidor, conserva para com este a sua originaria posição, e assume para com a empreza, companhia, ou pessoa, com quem depois ajustou o transporte, a qualidade de expedidor.
Art. 384.° O transportador é obrigado a ter, e a arrumar, livros de registos, em que lançará, por ordem progressiva de numeros e datas, a resenha de todos os transportes de que se encarregar, com expressão da sua qualidade, da pessoa que os expedir, do destino que levara, do nome e domicilio do destinatario, do modo de transporte, e, finalmente, da importancia do frete.
Art. 385.° O transportador deve entregar ao expedidor, que assim o exigir, uma guia de transporte, datada, e por elle assignada.
§ 1.° O expedidor deve entregar ao transportador, que assim o exigir, um duplicado da guia de transporte assignado por elle.
§ 2.° A guia de transporte poderá ser á ordem, ou ao portador.
Art. 386.° A guia de transporte deverá conter:
1.º Nomes e domicilios do expedidor, do transportador, e do destinatario;
2.° Designação da natureza, peso, medida, ou numero, dos objectos a transportar, ou, achando-se estes enfardados ou emmalados, da qualidade, dos fardos ou malas, e do numero, signaes, ou marcas dos involucros;
3.° Indicação do logar em que deve fazer-se a entrega;
4.° Enunciação da importancia do frete, com declaração de se achar, ou não, satisfeito, bem como de quaesquer verbas de adiantamentos, a que o transportador se houver obrigado;
5.° Determinação do praso dentro do qual deve effectar-se a entrega; ou, havendo o transporte de fazer-se por caminho de ferro, declaração de dever ser pela grande, ou pela pequena, velocidade;
6.° Fixação da indemnisação por que responde o transportador, se a tal respeito tiver havido convenção;
7.° Tudo o mais que se houver ajustado entre o expedidor e o transportador.
Art. 387.° O expedidor póde designar-se, a si proprio, como destinatario.
Art. 388.° O expedidor entregará ao transportador as facturas e mais documentos necessarios ao despacho nas alfandegas, e ao pagamento de quaesquer direitos fiscaes, pela exactidão dos quaes ficará, em todo caso, responsavel.
Art. 389.° Todas as questões ácerca do transporte se decidirão pela guia de transporta, não sendo, contra a mesma, admissiveis excepções algumas, salvo de falsidade ou erro involuntario de redacção.
§ unico. Na falta de guia, ou na de algumas das condições exigidas no artigo 386.°, as questões, ácerca do transporte, serão resolvidas pelos usos do commercio, e, na falta d'estes, nos termos geraes de direito.
Art. 390.° Se a guia for á ordem ou ao portador, o indosso, ou a tradição, d'ella, transferirá a propriedade dos objectos transportados.
Art. 391.° Quaesquer estipulações, não constantes da guia de transporte, serão de nenhum effeito, para com o destinatario, e para com aquelles a quem a mesma houver sido, nos termos do artigo antecedente, transferida.
Art. 392.° Se o transportador acceitar, sem reservas, os objectos a transportar, presumir-se-ha não terem os mesmos vicios apparentes.
Art. 393.° O transportador responderá pelos seus empregados, pelas mais pessoas que occupar no transporte dos objectos, e pelos transportadores subsequentes a quem for encarregando do transporte.
§ l.° Os transportadores subsequentes terão direito de fazer declarar no duplicado da guia de transporte o estado em que se acharem os objectos a transportar, ao tempo em que lhes forem entregues; presumindo-se, na falta de qualquer declaração, que os receberam em bom estado, na conformidade das indicações do duplicado.

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§ 2.° Os transportadores subsequentes ficam subrogados nos direitos e obrigações do transportador primitivo.
Art. 394.° O transportador expedirá os objectos a transportar pela ordem per que os receber, a qual só poderá alterar, se a convenção, natureza, ou destino dos objectos, a isso o obrigarem, ou quando, caso fortuito ou de forca maior, o impeçam de a observar.
Art. 395.° Se o transporte não podér effectuar-se, ou se achar extraordinariamente demorado, por caso fortuito ou de força, maior, deve o transportador avisar immediatamente o expedidor, ao qual competirá o direito de resilir o contrato, reembolsando aquelle das despezas incursas.
§ 1.° Sobrevindo o accidente durante o transporte, o transportador terá direito a mais uma parte da importancia do frete, proporcional ao caminho percorrido.
§ 2.º No caso previsto neste artigo, deverá sor restituido ao transportador a gaia de transporte, á ordem ou ao portador, por elle assignada.
Art. 396.° O expedidor póde variar a consignação dos objectos em caminho, e o transportador deve cumprir nova ordem; mas se a execução d'esta exigir mudança de caminho, ou que se passe alem do logar designado guia, fixar-se-ha a alteração do frete, e não se accordando as partes, o transportador só é obrigado a fazer a entrega no logar convencionado no primeiro contrato.
§ 1.º Esta obrigação do transportador cessa desde o momento em que, tendo chegado os objectos ao seu destino, e, sendo o destinatario o portador da guia de transporte exige a entrega dos objectos.
§ 2.° Se a guia for á ordem ou ao portador, o direito indicado n'este artigo, compete ao portador d'ella, que a deve entregar ao transportador, ao qual será permittido, no caso de mudança do destino dos objectos, exigir nova guia.
Art. 397.° Havendo pacto expresso ácerca do caminho a seguir no transporte, não poderá o transportador varial-o, pena de responder por qualquer damno que aconteça ás fazendas, e de pagar, alem d'isso, qualquer indemnisação convencionada.
§ unico. Na falta de convenção póde o transportador seguir o caminho que mais lhe convenha.
Art. 398.° O transportador é obrigado a fazer a entrega dos objectos, no praso lixado por convenção, eu pelos regulamentos especias de transportador, e na sua falta pelos usos commerciaes, sob pena de pagar a competente indemnisação.
§ 1.° Excedendo a demora o dobro do tempo, marcado n'este artigo, pagará o transportador, alem da indemnização, as perdas e damnos, resultantes da demora.
§ 2.° O transportador não responderá pela demora no transporte, resultante de caso fortuito ou do força maior, culpa do expedidor ou do destinatario.
§ 3.° A falta de meios de transporte sufficientes não releva o transportador da responsabilidade pela demora.
Art. 399.° O transportador, desde que receber até que entregar os objectos, responderá pela perda ou deterioração que venham a soffrer, salvo quando proveniente de caso fortuito, força maior, vicio do objecto, culpa do expedidor ou do destinatario.
Art. 400.° O transportador póde, com respeito a objectos sujeitos, por natureza, a diminuição de peso ou medida, durante o transporte, imitar a sua responsabilidade a um tanto por cento por volume.
§ unico. A limitação ficará tem effeito, provando, o expedidor ou o destinatario, não ter a diminuição sido causada pela natureza dos objectos, ou não poder esta, nas circumstancias occorrentes, ter attingido o limite estabelecido.
Art. 401.° As deteriorações acontecidas desde a entrega dos objectos ao transportador, serão comprovadas e avaliadas nos termos geraes de direito, tomando-se como base o preço corrente no logar e tempo da entrega; podendo, porém, durante o processo da sua averiguação e avaliação, fazer-se entrega dos objectos a quem pertencerem, com prévia ordem judicial, e, com, ou sem, caução.
§ 1.° Igual base se tomará para o calculo do indemnisação no caso de perda de objectos.
§ 2.° A indemnisação no caso de perda de bagagens de um passageiro, entregues sem declaração do conteudo, será fixada segundo as circumstancias especiaes do caso.
§ 3.º Ao expedidor não é admissivel prova de que, entre os generos designados, se contenham outros de maior valor ou dinheiro metallico.
Art. 402.° O destinatario tem o direito de fazer verificar, a expensas suas, o estado dos objectos transportados, ainda quando não apresentem signaes exteriores de deterioração.
§ 1.° As duvidas que occorrerem, entre o destinatario e o transportador, sobre o estado dos objectos, serão resolvidas por arbitradores.
§ 2.° Não se accordando os interessados, proceder-se-ha a deposito dos objectos, em armazem seguro, e as partes seguirão seu direito conforme a justiça.
§ 3.° A reclamação por deterioração que se encontrar nas fazendas, ao abrir os volumes, só haverá logar contra o transportador, dentro das vinte e quatro horas seguintes á abertura, e nunca depois de passadas do recebimento d'ellas.
§ 4.° Passado o termo, fixado n'este artigo, não ha logar a reclamação alguma contra o transportador, ácerca do estado da fazenda conduzida.
Art. 403.° Se as fazendas expedidas, ficarem inutilisadas em consequencia de deteriorações, o destinatario não será obrigado a recebel-as, e poderá exigir do transportador o seu valor pelo preço corrente n'esse dia.
§ 1.°. Havendo entre os generos deteriorados alguma porção em bom estado, e sem defeito, o destinatario receberá esta, se forem porções distinctas, e que não soffram prejuizo com a separação.
§ 2.° Se o effeito da deterioração for sómente diminuição no valor do genero, o transportador pagará a diminuição avaliada por arbitradores.
Art. 404.° O transportador é responsavel por quanto resultar de omissão sua no cumprimento das leis fiscaes, em todo o curso da viagem, e na entrada do logar do destino.
Art. 405.º O transportador não tem direito a investigar o titulo por que o destinatario recebe os objectos transportados, devendo entregal-os, logo e sem estorvo, sob pena de responder pelos prejuizos resultantes da demora, logo que lhe apresentem a guia de transporte em termos regulares.
Art. 406.° Não se achando o destinatario no domicilio indicado no duplicado da guia, ou recusando receber os objectos, o transportador requererá o deposito judicial d'elles, á disposição do expedidor, ou de quem o representar, sem prejuizo de direito de terceiro.
Art. 407.° Expirado o termo em que os objectos transportados deviam ser entregues ao destinatario, fica este com todos os direitos resultantes do contrato de transporte, podendo exigir a entrega dos objectos e da guia de transporte.
Art. 408.° O transportador não é obrigado a fazer entrega dos objectos transportados ao destinatario emquanto este não cumprir com aquillo a que for obrigado.
§ 1.° No caso de contestação, se o destinatario satisfizer ao transportador o que julgar dever-lhe e depositar o resto da quantia exibida, não poderá este recusar a entrega.
§ 2.º Sendo a guia á ordem ou ao portador, o transportador póde recusar a entrega emquanto ella lhe não for restituida.
§ 3.° Não convindo ao transportador reter os objectos transportados até que o destinatario cumpra aquillo a que for obrigado, poderá requerer o deposito, e a venda de untos quantos forem necessarios para o seu pagamento.

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§ 4.° A venda será feita, por intermedio de corretor, ou judicialmente.
Art. 409.° O transportador tem privilegio pelos creditos resultantes do contrato de transporte sobre os objectos transportados.
§ 1.° Este privilegio cessa pela entrega dos objectos ao destinatario.
§ 2.° Sendo muitos os transportadores o ultimo exercerá o direito de privilegio por todos os outros.
Art. 410.º O expedidor tem privilegio pela importancia dos objectos transportados, sobre os instrumentos, principaes e accessorios, que o conductor empregar no transporte.
Art. 411.° Os transportes por caminhos de ferro serão regulados pelas regras geraes d'este codigo, e pelas disposições especiaes das respectivas conceições ou contratos, sendo porém nullos e sem effeito quaesquer regulamentos das administrações competentes, em que estas excluam, ou limitem, as obrigações e respoensabilidades impostas n'este titulo, a não ser que, a tal exclusão ou limitação, corresponda uma diminuição, no preço dos transportes, estabelecido nas tarifas ordinarias, proporcionada em tarifas especiaes.

TITULO XI

Do emprestimo

Art. 412.° Para que o contrato de emprestimo seja havido por commercial é mister que a cousa cedida seja destinada a qualquer acto mercantil.
§ unico. O emprestimo, assegurado por titulos cotisaveis, haver-se ha sempre por commercial.
Art. 413.° O emprestimo mercantil é sempre retribuido.
§ unico. A retribuição será, na falta de convenção, a taxa legal do juro calculado sobre o valor da cousa cedida.
Art. 414.° O emprestimo mercantil entre commerciantes admitte, seja qual for o seu valor, todo o genero de prova.

TITULO XII

Do penhor

Art. 415.º Para que o penhor seja considerado mercantil é mister que a divida que se segara proceda de acto commercial.
Art. 416.° Póde convencionar-se a entrega do penhor mercantil a uma terceira pessoa.
§ unico. A entrega do penhor mercantil podo ser symbolica a qual se effectuará:
1.° Por declarações, ou verbas, nos livros de quaesquer estações publicas onde se acharem as cousas empenhadas;
2.° Pela tradição da guia de transporte ou do conhecimento da carga dos objectes transportados;
3.° Pelo indosso da cautela de penhor, dos generos e mercadorias depositadas nos armazens geraes.
Art. 417.° O penhor, de letras de cambio e de titulos á ordem, póde ser constituido por indosso com a correspondente declaração, segundo os usos da praça, o de acções, obrigações ou de outros titulos nominativos, pela respectiva declaração nos competentes registos.
Art. 418.° Para que o contrato de penhor, por quantia excedente a duzentos mil réis, produza effeitos com relação a terceiros, é mister que se prove por escripto.
Art. 419.° Devendo proceder-se á venda de penhor mercantil, por falta de pagamento, poderá esta effectuar-se por meio de corretor, com citação do devedor.
Art. 420.° Ficam salvas as disposições especiaes que regulam os adiantamentos, e os emprestimos sobre penhores, dos bancos e outros institutos, para elles, auctorisados.

TITULO XIII

Do deposito

Art. 421.° Para que o deposito seja considerado mercantil é necessario que seja de mercadorias ou generos destinados a qualquer acto de commercio.
Art. 422.º O depositario terá direito a uma gratificação pelo deposito, salva convenção expressa em contrario.
§ unico. Se a quota da gratificação não houver sido, previamente, accordada, regular-se-ha pelos usos da praça era que o deposito houver sido constituido, e na falta d'estes, por arbitramento.
Art. 423.° Consistindo o deposito em certa qualidade especifica de moedas para ser volvida a especie effectivamente depositada, serão por conta do depositante os augmentos ou as que as moedas tiverem.
Art. 424.º Consistindo o deposito, em papeis de credito com vencimento de juros, o depositario é obrigado á cobrança e a todas as mais diligencias necessarias para a conservação do seu valor e effeitos legaes; sob pena de responsabilidade pessoal.
Art. 425.° Havendo permissão expressa do depositante, para o depositario se servir da cousa, já para si ou seus negocios, já para operações recommendadas por aquelle, cessarão os direitos e obrigações próprias de depositante e depositario, e observar-se-hão as regras applicaveis do emprestimo mercantil, de commissão, ou do contrato, que, em substituição do deposito, se houver celebrado, qual no caso couber.
Art. 426.° Os depositos feitos em bancos, ou sociedades, reger-se-hão em primeiro logar pelos respectivos estatutos, em tudo quanto se não achar prevenido n'este titulo, e na sua falta ou insufficiencia, pelas disposições applicaveis d'este codigo.

TITULO XIV

Do deposito de mercadorias e generos nos armazens geraes

Art. 427.° O conhecimento do deposito dos géneros e mercadorias, feitos em armazens geraes, ennunciará:
1.° O nome, estado, e domicilio, do depositante;
2.° O logar do deposito;
3.° A natureza e quantidade da cousa depositada, com todas as circumstancias necessarias á sua identificação, e avaliação;
4.° A declaração de haverem, ou não, sido, satisfeitos quaesquer impostos devidos, e de se ter ou não, feito, o seguro dos objectos depositados.
§ 1.° Ao conhecimento de deposito, será annexa uma cautela de penhor em que se repetirão as mesmas indicações.
§ 2.° O titulo referido será extraindo de um livro com talão archivado no competente estabelecimento.
Art. 428.° O conhecimento de deposito e a cautela de penhor podem ser passados em nome do depositante, ou de um terceiro.
Art. 429.° O portador do conhecimemo de deposito, e da cautela de penhor, tem o direito de pedir, á sua custa, a divisão da cousa depositada, e que, por cada uma das respectivas fracções, se lhe dêem titulos parciaes, em substituição do titulo unico e total, que será annullado.
Art. 430.° O conhecimento de deposito e a cautela de penhor são transmissiveis, juntos ou separados, por indosso com a data do dia era que houver sido feito.
§ unico. O indosso produzirá os seguintes effeitos:
1.° Sendo dos dois titulos, transferirá a propriedade das mercadorias, ou generos depositados;
2.º Sendo só da cautela de penhor, confirá ao indossado o direito de penhor sobre as mercadorias ou generos depositados;

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3.° Sendo só do conhecimento de deposito, transmittirá a propriedade, com resalva dos direitos do portador da cautela de penhor.
Art. 431.° O primeiro indosso da cautela de penhor ennunciará a importancia do credito a cuja segurança fui feito, a taxa dos juros, e a epocha do vencimento.
§ unico. Este indosso deve ser transcripto no conhecimento de deposito, e a transcripção assignada pelo indossado.
Art. 432.° O conhecimento de deposito e a cautela de penhor, podem ser conjunctamente indossados em branco, conferindo, tal indosso, ao portador os mesmos direitos do indossante.
Art. 433.° As mercadorias e generos, depositados nos armazens geraes, não podem ser penhorados, arrestados, dados em penhor, ou por outra fórma obrigados, a não ser nos casos de perda do conhecimento de deposito, e da cautela de penhor, de contestação sobre direitos de successão, e de quebra.
§ unico. Os indossos dos titulos referidos não ficam sujeitos a nullidade alguma com fundamento na insolvencia do indossante, salvo provando se que o indossado tinha conhecimento d'esse estado, ou presumindo-se que o tinha nos termos das disposições especiaes á fallencia.
Art. 434.° O portador de um conhecimento de deposito, separado da cautela de penhor, póde retirar a mercadoria depositada, ainda antes do vencimento do credito assegurado pela cautela, depositando, no respectivo estabelecimento o principal e os juros do credito, calculados até ao dia do vencimento.
§ unico. A importancia depositada será satisfeita ao portador da cautela de penhor, mediante a restituição d'esta.
Art. 435.° Tratando-se de mercadorias ou generos homogeneos, o portador do respectivo conhecimento de deposito, separado da cautela de penhor póde, sob responsabilidade do competente estabelecimento, retirar uma parte só das mercadorias ou generos, mediante deposito de quantia porporcional ao credito total, assegurado pela cautela de penhor, e á quantidade das mercadorias a retirar.
Art. 436.° O portador de uma cautela da penhor não paga, na epocha do seu vencimento, póde fazel-a protestar, como as letras de cambio, e, dez dias depois, proceder á venda do penhor, nos termos geraes de direito.
§ unico. O indossante que pagar ao portador fica subrogado nos direitos d'este, e poderá fazer proceder á venda do penhor, nos termos referidos.
Art. 437.° A venda por falta de pagamento não se suspende nos casos do artigo 433.°, sendo porém depositado o respectivo preço até decisão final.
Art. 438.° O portador da cautela de penhor tem direito a pagar-se, no caso de sinistro, pela importancia do seguro.
Art. 439 ° Os direitos de alfandega, impostos, e quaesquer contribuições sobre a veada, despezas de deposito, do salvamento, a conservação e guarda, preferem ao credito pelo penhor.
Art. 440.° Satisfeitas as despezas indicadas no artigo antecedente, e pago o credito pignoraticio, o resto ficará á disposição do portador do conhecimento de deposito.
Art. 441.° O portador da cautela de penhor não póde executar os bens do devedor, ou dos indossantes, sem se achar exhausta a importancia do penhor.
Art. 442.° A prescripção de acções contra os indossantes começará a correr no dia da venda das mercadorias ou generos depositados.
Art. 443.° O portador da cautela de penhor perde todo o direito contra os indossantes, não tendo feito o devido protesto, ou não tendo feito proceder, á venda das mercadorias no prazo legal, mas conserva acção contra o de vedor.
Art. 444.° O que perder um conhecimento de deposito ou uma cautela de penhor, póde, mediante caução e prova de propriedade do titulo perdido, obter a sua reforma, do tribunal commercial em cuja jurisdição se achar o armazem onde o deposito fôra feito.

TITULO XV

Dos seguros

CAPITULO I

Disposições geraes

Art. 445.º Todos os seguros, com excepção dos mutuos, serão commerciaes com respeito ao segurador, qualquer que seja o seu objecto; e com respeito aos outros contratos, quando disserem respeito a acto mercantil.
§ 1.° Os seguros mutuos serão, comtudo, regulados pelas disposições d'este codigo, quanto a quaesquer actos de commercio estranhos á mutualidade.
§ 2.° Os seguros maritimos, serão regulados pelas disposições applicaveis do livro III d'este codigo.
Art. 440.° O contrato de seguro, deve ser reduzido a escripto, num instrumento que constituirá a apolice de seguro.
§ unico. A apolice de seguro deve ser datada, assignada pelo segurador, e enunciar:
1.° O nome, ou firma, residencia, ou domicilio do segurador;
2.° O nome, ou firma, qualidade, residencia ou domicilio do que faz segurar;
3.° O objecto do seguro e a sua natureza e valor;
4.° Os riscos contra que se faz o seguro;
5.° O tempo em que começam e acabam os riscos;
6.° A quantia segurada;
7.° O premio do seguro;
8.° E, em geral, todas as circumstancias cujo conhecimento possa interessar o segurador; bem como todas as condições estipuladas pelas partes.
Art. 447.° O contrato de seguro regular-se-ha pelas estipulações da respectiva apolice, não contrarias ás disposições d'este codigo, e, na sua falta ou insufficiencia, por estas.
Art. 448.° O seguro póde ser contratado por conta propria ou por conta de outrem.
§ 1.° Se aquelle por quem, ou em nome de quem, o seguro é feito não tem interesse na cousa segurada, o seguro é nullo.
§ 2.° Se não se declarar na apolice que o seguro é contratado por conta de outro, ou por conta de quem tiver interesse, considera-se contratado por conta de quem fez o seguro.
§ 3.° Se o interesse do segurado for limitado a uma parte da cousa segura na sua totalidade, ou do direito a ella respeitante, considera-se feito o seguro por conta de todos os interessados, salvo áquelle o direito a haver a parte proporcional do premio.
Art. 449.° Toda a declaração, inexacta, assim como reticencia de factos e circumstancias Conhecidas pelo segurado, que teriam podido influir, sobre a existencia ou condições do contrato, tornam o seguro nullo.
§ unico. Se da parte de quem fez o seguro tiver havido má fé, o segurador terá direito ao premio.
Art. 450 ° O segurador póde resegurar, por outros, o objecto que segurou; e o segurado póde segurar, por outros, o prémio do seguro.
Art. 451.° Mudando o objecto segurado de proprietario, durante o tempo do contrato, o seguro passa para o novo dono pelo facto da transferencia do objecto seguro, salvo se entre o segurador e o originario segurado, ou entre o transmittente e o adquirente outra cousa for ajustada.
§ unico. O transmittente póde reservar o seu direito ao seguro o qual, n'este caso continuará em proveito seu, emquanto tiver interesse na cousa segura pelo não pagamento do preço da transferencia.

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CAPITULO II

Dos seguros contra riscos

Art. 452.° O seguro contra riscos, póde ser feito:
1.º Sobre a totalidade, conjunta de muitos objectos;
2.° Sobre a totalidade individual de cada objecto;
3.° Sobre parte de cada objecto, conjunta ou separadamente;
4.º Sobre o lucro esperado;
5.° Sobre os fructos pendentes.
Art. 453.º Se o seguro contra riscos for inferior ao valor do objecto, o segurado responderá salva convenção em contrario, por uma parte proporcional das perdas e damnos.
§ 1.° Se o seguro for inferior ao valor do objecto segurado, póde a differença ser segurada, e o segurador d'essa differença só responderá pelo excedente, observando se a ordem da data dos contratos.
§ 2.° Se todos os seguros tiverem a mesma data, terno effeito ate á concorrencia do valor total em proporção da quantia segura em cada contrato.
Art. 454.º O segurado não póde, sob pena de nullidade, fazer segurar segunda vez, pelo mesmo tempo e riscos, objecto já seguro pelo seu inteiro valor, excepto nos seguintes casos:
1.° Quando o segundo seguro houver sido subordinado á nullidade ou insolvencia, total ou parcial, do seguro precedente;
2.° Quando se fez cessão dos direitos do primeiro seguro ao segundo segurador, ou quando, houve renuncia d'aquelle.
Art. 455.° Excedendo o seguro o valor do objecto segurado, só é valido até á concorrencia d'esse valor.
Art. 456.º O seguro é nullo, se o segurador tinha conhecimento, quando se concluiu o contrato, de haver cessado o risco, ou se o segurado o tinha da existencia do sinistro.
§ 1.° Se havia cessado o risco, o segurador não tem direito ao premio e deve restituil-o.
§ 2.º Se o segurado sabia da existencia do sinistro, o segurador não e obrigado a indemnisal-o, mas tem direito a receber o premio.
Art. 457.º O seguro considera-se como não existente, se a cousa segura não correu risco.
§ unico. No caso previsto n'este artigo o segurador tem direito á metade do premio, a qual nunca excederá a meio por cento da quantia segurada.
Art. 458.º Se quebrar o segurado antes de acabarem os riscos, e se dever o premio, o segurador póde exigir caução, e quando se não preste, a annullação do contrato.
§ unico. Ao segurado assiste o mesmo direito, se o segurador quebrar ou liquidar.
Art. 459.º São a cargo do segurador todas as perdas e damnos que soffra o objecto seguado, devidas a caso fortuito ou força maior, e de que tiver assumido os riscos.
§ unico. O segurador não é responsavel por perdas ou damnos, resultantes de vicio proprio do objecto, que lhe não haja sido denunciado pelo segurado, causados por facto d'este, dos seus agentes ou commissarios, ou occasionados por motivo de guerra ou tumultos, salva, n'este ultimo caso, convenção em contrario.
Art. 460.º A indemnisação devida pelo segurador, é regulada em rasão do valor do objecto ao tempo do sinistro.
§ 1.° Se o valor foi fixado por arbitradores nomeados pelas partes, o segurador não o póde contestar.
§ 2.º Se o não foi, póde ser verificado por todos os meios de prova admittidos em direito.
§ 3.° O segurado, salvo nos seguros de transportes, não tem direito de abandonar ao segurador os objectos salvos do sinistro, e o valor d'estes deduz-se da quanta devida pelo segurador.
Art. 461.° O segurado é obrigado, sob pena de responder por perdas e damnos, a participar ao segurador o sinistro, dentro dos tres dias immediatos áquelle em que o sinistro occorreu, ou áquelle em que teve do mesmo conhecimento.
Art. 462.° Ao segurado cumpre fazer todas as diligencias para evitar e attenuar as perdas.
§ unico. São a cargo do segurador as despezas feitas para o fim previno n'este artigo, ainda que, a sua importancia junta á do prejuizo exceda a quantia segurada, e que as diligencias fossem infructiferas, salvo provando-se que todas, ou parte d'ellas, foram feitas, imprudentemente, e que eram escusadas.
Art. 403.° O segurador que pagou a deterioração ou perda dos objectos segurados fica subrogado em todos os direitos do segurado contra terceiro causador do sinistro; respondendo o segurado por todo o acto que possa prejudicar esses direitos.
§ unico. Se a indemnisação só recaír sobre a parte do damno ou perda, o segurador e segurado concorrerão a fazer valer esses direitos em proporção á somma que a cada um for devida.

SECÇÃO I

Do seguro contra fogo

Art. 464.° As apolices de seguro contra fogo devem, alem do prescripto no artigo 445.° precisar:
1.° O nome, qualidade, situação e confrontação dos predios;
2.° O seu destino e uso;
3.° A natureza e uso dos edificios adjacentes, sempre que estas circunstancias poderem influir no contrato;
4.° O logar em que os objectos mobiliarios segurados contra o incendio se acham colocados ou armazenados.
Art. 465.° O seguro contra fogo comprehende:
1.° Os damnos causados pela acção do incendio, ainda que este haja sido produzido por facto do segurado, ou de pessoa por quem seja civilmente responsavel, salvo tendo havido crime;
2.° As perdas e damnos resultantes immediatamente do incendio, como as causadas pelo calor, fumo ou vapor, pelos meios empregados para extinguir ou combater o incendio, pelas remoções dos moveis, e pelas demolições executadas em virtude de ordens da auctoridade Competente;
3.° As perdas e damnos que resultarem de vicio proprio do edificio seguro, ainda que não denunciado, não se provando que o segurado tinha conhecimento d'elle quando celebrou o contrato;
4.° Os damnos soffridos pela acção do raio, explosões, e outros accidentes similhantes, quer sejam ou não acompanhados de incendio.
Art. 466.° Ao segurado incumbe a prova do prejuizo soffrido justificando a existencia dos objectos segurados ao tempo do incendio.
Art. 467.º Se o segurado se atrazar no pagamento do premio do seguro, poderá o segurador rescindir o contrato nos primeiros trinta dias seguintes, communicando, immediatamente, a sua resolução ao segurado.
§ unico. Se o segurador não usar da faculdade concedida n'este artigo considerar-se-ha subsistente o contrato, ficando-lhe direito salvo ao premio em atrazo e juros da mora.
Art. 468.° O seguro contra fogo caduca logo que o edificio segurado tiver outro destino, que o torne mais exposto ao risco, por fórma que o segurador não o teria segurado, ou exigiria outras condições se tivesse tido esse destino antes de se effectuar o seguro.
§ unico. A mesma disposição haverá logar com respeito ao seguro de moveis, toda a vez que o segurado, sem annuencia do segurador, os remova do logar onde se achavam, ao tempo do contrato, para outro diverso.

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SECÇÃO II

Do seguro de colheitas

Art. 469.° No contrato de seguro contra os riscos a que estão sujeitos os productos da terra, a apolice deverá, alem do prescripto no artigo 445.°, enunciar:
1.° A situação, extensão, e confrontações, do terreno cujo producto se segura;
2.° A designação d'esse producto, e a epocha ordinaria da sua colheita;
3 ° Se a sementeira, ou plantação, que ha de dar o producto já se acha feita, ou não;
4.° O logar do deposito, se o seguro for de fructos já recolhidos;
5.° O valer medio dos fructos seguros.
Art. 470.° Nos seguros de que trata esta secção a indemnisação, é regulada pelo valor que os fructos de uma producção regular teriam ao tempo da sua maturação ou ao tempo em que deviam colher-se, se não tivesse succedido o sinistro.
Art. 471.° O segurador de productos da terra responde pelas perdas ou damnos dos fructos, mas não pela producção e quantidade d'esta.

SECÇÃO III

Do seguro de transportes por terra, canaes ou rios

Art. 472.° O seguro dos objectos transportados por terra, canaes, ou rios, póde ter por objecto o seu valor com as despias até ao logar do destino, e o lucro esperado.
§ unico. Se o lucro esperado não for avaliado separadamente na apolice, não se comprehenderá no seguro.
Art. 473.° A apolice, alem do prescripto no artigo 440.º deve enunciar:
1.° O tempo em que a viagem se deverá effectuar, se não estiver fixado na guia de transporte;
2.° Se a viagem ha de ser feita sem interrupção;
3 ° O nome do transportador que se encarregou do transporte;
4.° O caminho que se deve seguir.
5.° A indicação dos pontos onde devem ser recebidos e entregues os objectos transportados;
6.° A fórma de transporte.
Art. 474.° Os riscos do segurador começam e acabam nos termos previstos no art. 399.°
Art. 475.° O segurador responde pelas perdas e damnos causados por falta ou fraude aos encarregados de fazer expedir, transportar, eu entregar, os objectos segurados, salvo o seu regresso contra os causadores.
Art. 476.° O segurador é obrigado a pagar o que dever da quantia segurada, no praso de quinze dias, a contar da liquidação da perda ou damno, ou da notificação do abandono.
Art. 477.° N'este contrato é admissivel o abandono, e, com respeito a este, e a tudo o mais que não for incompativel com as disposições da presente secção, serão observadas em geral, e conforme as circumstancias, as disposições respeitantes aos seguros maritimos.

CAPITULO III

Do seguro de vidas

Art. 478.° Os seguros de vidas comprehenderão todas as combinações que se possam fazer, pactuando entregas de prestações, ou capitaes, em troca da constituição de uma renda vitalia, o vi desde certa idade, ou do pagamento de certa quantia, desde o fallecimento de uma pessoa, ao segurado, seus herdeiros ou representantes, ou a um terceiro, e outras quaesquer combinações, similhantes, ou analogas.
§ unico. O segurador, póde, nos termos d'este artigo, tomar sobre si o risco da morte do segurado dentro de certo tempo, ou o de prolongação da vida d'elle, além de um termo prefixado.
Art. 479.° A vida de uma pessoa póde ser segura por ella propria, ou por um terceiro, que tenha interesse na conservação d'aquella.
§ unico. No ultimo caso previsto n'este artigo o segurado é o terceiro em beneficio de quem se estipula o seguro, e que paga o premio.
Art. 480.° No seguro de vidas, alem das indicações applicaveis do artigo 445.°, a apolice mencionará a idade, profissão, estado de sarde da pessoa, cuja vida se segura.
Art. 481.° O segurador não é obrigado a pagar a quantia segura:
1.° Se a morte da pessoa de quem se segurou é resultado de duello, condemnação judicial, suicidio voluntario, crime ou delicto commettido pelo segurado, ou se este foi morto pelos seus herdeiros;
2.° Se aquelle que reclama a indemnisação foi auctor ou cumplice da morte da pessoa cuja vida se segurou.
§ unico A disposição do n.° 1.° d'este artigo não é applicavel ao seguro de vida contratado por terceiro.
Art. 482.° As mudanças de occupação, de estado, de modo de vida, da parte da pessoa de quem se segurou a vida, não fazem cessar os effeitos do seguro, uma vez que não transformem, ou aggravem, os riscos, pela alteração de alguma circumstancia essencial, por fórma tal, que se o novo estado de cousas existisse ao tempo do contrato, o segurador não teria convindo no segui-o, ou exigiria outras condições; ou que o segurador, depois de ter conhecimento d'essas mudanças, não requeira a annullação do contrato.
§ unico. No caso de annullação, o segurador restituirá metade do premio recebido.
Art. 483 ° No caso de morte, ou quebra, d'aquelle que segurou sobre a sua propria vida, ou sobre a de um terceiro, uma quantia paia ser paga a uma outra pessoa, que lhe haja de succeder, as vantagens do seguro subsistem em beneficio exclusivo da pessoa designada no contrato, salvo porém, em relação ás quantias recebidas pelo segurador, as disposições do codigo civil, relativas a collações, inofficiosidade nas successões, e revogação dos actos praticados em prejuizo dos credores.
Art. 484.° Se a pessoa cuja vida se segura, já estiver morta ao tempo da celebração do contrato, este não subsiste, ainda que o segurado ignorasse o fallecimento, salvo havendo convenção em contrario.
Art. 485.° A ausencia da pessoa, cuja vida se segurou do logar do seu domicilio ou residencia, sem que d'ella se saiba parte, só constituirá, salva convenção contraria, o segurador na obrigação de pagar a indemnisação, no caso em que por direito a curadoria definitiva deveria terminar.

TITULO XVI

Da compra e venda

Art. 486.° São consideradas commerciaes:
1 ° As compras de cousas inoveis para revender, em bruto ou trabalhadas, ou simplesmente para lhes alugar o uso;
2.° As compras, para revenda, de fundos publicos, ou de quaesquer titulos de credito negociaveis;
3.° As vendas de cousas moveis, em bruto ou trabalhadas, e as de fundos publicos, e de quaesquer titulos de credito, negociaveis, quando a acquisição houvesse sido leita, no intuito de as revender;
4.º As compras e revendas de bens immoveis, ou de direitos a elles inherentes, quando aquellas, para estas, houverem sido feitas;
5.° As compras e vendas de partes ou de acções de sociedades commerciaes.
Art. 487.° Não são consideradas commerciaes:

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1.° As compras de quaesquer cousas moveis destinadas ao uso ou consumo do comprador ou da sua familia; e as revendas que, por ventura, d'esses objectos se venham a fazer;
2.° As vendas que o proprietario, ou o explorador rural, faça dos productos de propriedade sua, ou por elle explorada; e dos generos em que lhes houverem sido pagas quaesquer rendas;
3.° As vendas que os artistas e industriaes fizerem, directamente, dos objectos que houverem composto ou aperfeiçoado nos seus estabelecimentos;
4.° As vendas de animaes, feitas pelos creadores, ou engordadores.
Art. 488.° O contrato de compra e venda mercantil póde ser feito, ainda que directamente, para pessoas que depois hajam de nomear-se.
Art. 489.° Póde convencionar-se que o preço da cousa venha a tornar se certo, por qualquer meio que, desde logo, ficará estabelecido, ou que fique dependente do arbitrio de terceiro, indicado no contrato.
§ unico. Quando o preço houver de ser fixado por terceiro, e este não quizer ou não poder fazel-o, ficará o contrato sem effeito, se outra cousa não for accordada.
Art. 490.° Em commercio são permittidas:
1.° A compra e venda de cousas incertas, ou de esperanças, salvo sempre o disposto nos artigos 1:556.° e 1:557.° do codigo civil;
2.° A venda de cousa que for propriedade de outrem.
§ unico. No caso do n.° 2.° d'este artigo, o vendedor ficará obrigado a adquirir, por titulo legitimo, a propriedade da cousa vendida, e a fazer, a entrega ao comprador, sob pena de responder por perdas e damnos.
Art. 491.° O vendedor que se obrigar a entregar a cousa vendida, antes de lhe ser pago o preço, considerar-se-ha exonerado de tal obrigação, se o comprador fallar antes da entrega, salvo prestando se caução ao respectivo pagamento.
Art. 492.° As vendas feitas sobre amostra da fazenda, ou determinando-se só a uma qualidade conhecida no commercio, consideram-se sempre como feitas debaixo da condição da cousa ser conforme á amostra, ou á qualidade convencionada.
Art. 493.° As compras de cousas que se não tenham á vista, nem possam determinar se por uma qualidade conhecida em commercio consideram-se sempre como feitas debaixo da condição do comprador poder distratar o contrato, caso, examiando-as, não lhes convenham.
Art. 494 ° As condições referidas nos dois artigos antecedentes, haver-se-hão por verificadas e os contratos como perfeitos, se o comprador examinar as cousas compradas no acto da entrega, e não reclamar contra as sua qualidade, ou, não as examinando, não reclamar dentro de oito dias.
§ unico. O vendedor póde exigir que o comprador proceda ao exame das fazendas no acto da entrega, salvo caso de impossibilidade sob pena de se haver, para todos os effeitos como verificado.
Art. 495.° As cousas, não vendidas a esmo ou por partida inteira, mas por conta, peso ou medida, são a risco do vendedor até que sejam contadas, pesadas ou medidas, salvo se a numeração, a pesagem, ou a medição, se não fez por culpa do comprador.
§ 1.° Haver-se-ha por feita a venda a esmo, ou por partida inteira, quando as cousas forem vendidas por um só preço determinado, sem attenção á conta, peso, ou medida, dos objectos, ou quando se attender a qualquer d'estes elementos, unicamente, para determinar a quantia do preço.
§ 2.º Quando a venda é feita, por couta, peso, ou por medida, e a fazenda se entrega, sem se contar, pesar ou medir, a tradicção verdadeira para o comprador, suppre a conta, o peso, ou a medida.
Art. 496.° Se o praso para a entrega das cousas vendidas não se achar convencionado, deve o vendedor pol-as á disposição do comprador dentro das vinte e quatro horas seguintes ao contrato, se ellas houverem sido compradas á vista.
§ unico. Se a venda das cousas se não fez á vista, e o praso para a entrega não foi convencionado, poderá o comprador fazel-o judicialmente, segundo fixar, as circumstancias.
Art. 497.° A deterioração, soffrida em viagem, resolve o contrato, se tal for, que a cousa não possa servir ao uso a que era destinada.
§ unico. O comprador, fóra d'estes casos, deve sempre receber a fazenda no estado em que estava, mediante proporcional diminuição no preço.
Art. 498.° Se o comprador de cousa movel não cumprir com aquillo a que for obrigado, poderá o vendedor depositar a cousa nos termos de direito por conta do comprador, ou fazel-a revender.
§ 1.° A revenda effectuar-se-ha em hasta publica, ou pelo preço corrente, se a cousa tiver preço cotado na bolsa ou rio mercado, por intermédio de corretor, ficando salvo ao vendedor o direito ao pagamento da differença entre o preço obtido, e o estipulado, e ás perdas e damnos.
§ 2.° O vendedor que usar da faculdade concedida n'este artigo, fica, em todo o caso, obrigado a participar ao comprador o evento.
Art. 499.° O vendedor não póde recusar ao comprador a factura das cousas vendidas e entregues, com o recibo junto do preço, ou da parte do preço, que houver embolçado.

TITULO XVII

Do reporte

Art. 500.° O reporte é constituido pela compra, a dinheiro de contado, de titulos de credito, negociaveis, e pela revenda simultanea, a termo, mas por preço determinado, feita á mesma pessoa, de titulos da mesma especie.
§ unico. É condição essencial á validade do reporte a entrega real dos titulos.
Art. 501.° A propriedade dos titulos, que fizerem objecto do reporte, transmitte-se para o comprador, revendedor sendo, porém, licito, ás partes estipular que os premios, amortisações, e juros, que couberem aos titulos, durante o praso da convenção, corram a favor do primitivo vendedor.
Art. 502.° As partes, poderão prorogar o praso do reporte, por um, ou mais, termos successivos.
§ unico. Se, expirado o praso do reporte, as partes liquidarem as differenças, para d'ellas effectuarem pagamentos separados, e renovarem o reporte com respeito a titulos de quantidade ou especies differentes, ou por diverso preço, haver-se-ha este como um novo contrato.

TITULO XVIII

Do escambo ou troca

Art. 503.° O escambo ou troca será mercantil, nos mesmos casos, em que o é, a compra e venda, e, regular-se-ha, pelas mesmas regras, estabelecidas para esta, em tudo quanto forem applicaveis ás circumstancias ou condições d'aquelle contrato.

TITULO XIX

Do aluguer

Art. 504.° O aluguer será mercantil quando a cousa tiver sido comprada para se lhe alugar o uso.
Art. 505.° O contrato de aluguer commercial será regulado, em geral, pelas disposições applicaveis do presente

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codigo, e, em especial, pelas do codigo civil que regem o contrato de aluguer, salvos os usos em contrario, e as prescripções respectivas aos fretamentos de navios.

TITULO XX

Da cessão de creditos mercantis

Art. 506.° A cessão, dos titulos á ordem, far-se-ha por meio de indosso, a dos titulos ao portador, pela entrega real, a dos titulos publicos negociáveis, na fórma determinada pela lei de sua creação, ou pelo decreto que auctorisar a respectiva emissão, e a dos não indossaveis, nem ao portador, nos termos prescriptos no codigo civil.

LIVRO TERCEIRO

Do commercio maritimo

TITULO I

Dos navios

CAPITULO I

Disposições geraes

Art. 507.° Os navios são reputados bens moveis, para todos os effeitos juridicos, salvas as modificações ou restricções d'este codigo.
§ unico. Fazem parte do navio os botes, lanchas, escolares, aprestes, apparelhos, armas, provisões e mais objectos destinados ao seu uso; e, se o navio é movido a vapor, a sua machina e os accessorios d'ella.
Art. 508.° Serão havidos como nacionaes, para os effeitos d'este codigo, os navios que como taes, se acharem matriculados nos termos do acto especial de navegação.
Art. 509.° A posse de um navio, sem titulo de acquisição, não importa propriedade.
Art. 510.° As questões sobre propriedade do navio, privilegios e hypothecas, que o onerem, são reguladas pela lei da nacionalidade, que o navio tiver ao tempo em que o direito, que for objecto da contestação, tiver sido adquirido.
§ 1.° O mesmo se observará nas contestações relativas a privilegios sobre o frete ou carga do navio.
§ 2.° A mudança de nacionalidade não prejudicará, salvos os tratados internacionaes, os direitos anteriores sobre o navio.
Art. 511.° Os contratos, que tiverem por objecto a construcção, de um navio, devem ser reduzidos a escripto.
§ 1.° O dono do navio em construcção póde resilir o contrato, com o constructor ou empreiteiro, por motivo de impericia, ou de fraude, manifestadas na construcção.
§ 2.° O titulo de construcção de um navio indicará o preço em divida total, ou parcial.
§ 3.° São applicaveis as disposições, d'este artigo e paragraphos, aos contratos de grande reparação de navios, e a todos os que modificarem, alterarem, substituirem, ou revogarem, os de construcção e os de grande reparação.
§ 4.° Haver se ha por contrato de grande reparação de navio todo aquelle cuja importancia for superior a metade do valor do navio.
Art. 512.° Todo o contrato de transmissão do navio, deve ser celebrado por escriptura publica ou acto judicial.
§ 1.° É applicavel a estes contratos a disposição do § 2.° do artigo antecedente.
§ 2.° Se a transmissão, haver logar em paiz estrangeiro, o titulo será registado no consulado da circumscripção, aonde se achar o navio na occasião do contrato, ou no do primeiro porto, aonde elle entrar, se o contrato foi feito aonde não havia consulado portuguez.
§ 3.° O consul portuguez deve remetter, pelo primeiro correio, á secretaria do tribunal do commercio, em que se achar matriculado o navio, uma copia do registo feito no consulado.
§ 4.° O contrato de transmissão do navio será immediatamente averbado no respectivo passaporte real.
Art. 513.° O navio despachado para viagem, não póde ser arrestado ou penhorado, a não ser por divida contratada para o aprovisionamento d'essa mesma viagem.
§ unico. O arresto ou penhora sobre generos ou mercadorias, já carregadas em navio, que se achar nas circumstancias previstas n'este artigo, não auctorisa a sua descarga, senão nos termos, em que, o proprio carregador, teria, ainda, o direito de a exigir, pagando, o interessado, o frete, as despezas de carga, descarga, desarumação, e prestando caução ao valor da fazenda.

CAPITULO II

Do proprietario

Art. 514.° O proprietario de um navio, é civilmente, responsavel:
1.° Pelos actos e ommissões do capitão e da tripulação;
2.° Pelas obrigações, contrahidas pelo capitão, relativas ao navio e sua expedição;
3.° Pelos prejuizos occorridos durante o tempo, e por occasião, de qualquer reboque;
4.° Pelas faltas de pilotos, ou praticos, tomados a bordo.
§ 1.° Cessa a responsabilidade, imposta no n.° 2.° d'este artigo, pelo abandono do navio o do frete ganho ou a vencer, excepto no caso de obrigações contrahidas para pagamento de moldadas á tripulação.
§ 2.° Cessa a responsabilidade imposta no n.° 3.° d'este artigo, quando, pela propria natureza do reboque, a direcção do navio pertencer, exclusivamente, ao capitão do rebocador, pois que, neste caso, o proprietario só é responsavel pelas faltas do capitão, e tripulação, do seu navio.
§ 3.° Cessa a responsabilidade imposta no n.° 4.° d'este artigo quando a admissão do piloto, ou pratico, for ordenada pela respectiva lei local.
Art. 515.º O proprietario póde despedir o capitão, antes de começada a viagem, não lhe sendo, devida indemnisação alguma, a não ser que, por contrato, se tenha resalvado o direito do a exigir.
§ unico. Se o capitão é co-proprietario do navio, pôde, em caso de despedida, renunciar á sua parte, e exigir o reembolso do capital, que a representa.
Art. 516.° Os diversos, interessados, em qualquer especulação maritima, poderão reunir-se sob a denominação de pareceria.
§ 1.° Podem formar esta reunião os armadores; estes com a tripulação; uns e outros com os carregadores.
§ 2.° São armadores os co-proprietários do navio, e os que, afretando-o, fizerem esquipal-o.
Art. 517.º É applicavel á parceria maritima o que fica disposto quanto ás sociedades em commandita, e ás contas em participação, consoante a fórma por que aquella for constituida, em tudo o que não se oppozer á sua natureza, e salvas as disposições dos paragraptios seguintes:
§ 1.° Em falta de nomeação, é caixa da parceria o capitão, se a parceria é feita entre os armadores e a tripulação; se o for tambem com os carregadores, o maior interessado que estiver a bordo, ou o seu commissario; e na falta de ambos, o capitão.
§ 2 ° Os lucros e perdas, na parceria maritima, devem distribuir-se, não havendo convenção em contrario, na proporção do interesse, que tiver cada armador, sendo co-proprietario, no valor da embarcação ao tempo do contrato, e sendo afretador, na epocha da esquipação; do valor, que pelo preço corrente ao tempo, e no logar do contrato, ti-

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ver a carga respectiva a cada carregador; e dos vencimentos e salarios de cada indivíduo da tripularão.
§ 3 ° O caixa não podo, sem consentimento da maioria dos compartes, empreender viagens, contratar novo freta mento do navio, segurar este e fizer concertos ou outras despezas, donde resultar obrigarão pessoal da parceria.
§ 4.° A caixa tem, entre outras attribuições, as seguintes:
1.° Ajustar o capitão, ou despedil-o, ainda que este seja comparte:,
2.° Regular as despezas com a esquipação e abastecimento, e custeio da embarcarão, durante a viagem, e as condições do tratamento;
3.° Segurar as despezas do concerto feito durante a viagem, e o tratamento a vencer;
3.° Dar aos compartes, no fim de cada viagem, conta do estado da parceria, e fazer a distribuição dos lucros ou perdas.
§ 5.° A parceria responde, para com os credores, e lesados nas occorrencias da viagem, pelos factos do caixa, do capitão, e da tripulação, com recurso contra estes.
§ 6.º Esta responsabilidade effectiva nos respectivos quinhões dos que forem compartes, e nos vencimentos e soldadas dos que o não forem.

CAPITULO III

Do capitão

Art 518.° O capitão é a pessoa encarregada do governo e expedição do navio, e, n'esta qualidade, responsável pelas faltas, que, commetter no exercicio das suas funcções.
§ único. Cessa a responsabilidade do capitão por motivo de caso fortuito ou força maior.
Art 519.º. O capitão responde, para com os carregadores, pelas fazendas
carregadas, que, constam do respectivo conhecimento, pelo damno supportado por as que deixar Carregar no tombadilho do navio, sem consentimento escripto do carregador; mas não por objectos preciosos, dinheiro, e titulos de credito, não declarados no conhecimento.
Art. 520.º Pertence ao capitão formar e ajustar a tripulação, ouvidos os armadores ou proprietários do navio, te estiverem presentes, ou os consignatários, havendo os.
§ único. O capitão não póde ser obriga-lo a tomar, contra sua vontade, ao serviço do navio, tripulante algum.
Art. 521.° O capitão deve ter a bordo os seguintes livros:
1.º Livro de passageiros e carga;
2.° Livro do contas;
3.° Diario da navegação;
4.º Inventario de bordo.
Art. 522.° Os livros de bordo serão numerados e rubricados pela auctoridade marítima do porto, em que o navio se achar matriculado.
§ único. Sendo preciso renovar algum dos livros, achando-se o navio em viagem, ou em algum porto de carga differente do da matricula, póde a numeração e a rubrica ser feita pela auctoridade d'esse porto, ou pelo cônsul portuguez.
Art. 523.° O livro de passageiros e carga deve conter: os nomes, procedência e destino dos passageiros, o preço e condições das passagens, e a relação das suas bagagens; a qualidade e quantidade dos objectos carregados, designados os volumes pelos seus números e marcas, os portos, da sua carga e desça ga, os nomes dos carregadores e dos destinatários ou consignatarios, os fretes ajuntados, e quaesquer declarações, que o capitão julgar necessárias ácerca das pessoas, ou cousas, a bordo.
Art. 524.° O livro de contas deve conter a receita e despeza relativa ao navio, comprehendendo: as soldadas da tripulação, as despezas com arribadas, o levantamento de dinheiro a risco, e todas as mais verbas de credito e debito
da responsabilidade do capitão.
Art. 525.° O diário dt navegação deve conter: a indicação do porto de saída, as manobras feitas, o caminho percorrido, as observações geograficas, metereologicas, e astronómicas, as occorrencias da viagem, as avarias soffridas, a designação dos objectos perdidos ou abandonados, o assento dos nascimentos e óbitos a bordo, as resoluções tomadas em concelho, e quaesquer outros acontecimentos ordinários e extraordinários da derrota e navegação.
Art. 526.° O inventario de bordo deve conter: a relação dos aprestes, moveis, instrumentos, e mais objectos, de que for provido o navio, em a indicação das alterações, que forem occorrendo.
Art 527.° O capitão deve proceder a vistoria do navio, antes de emprehender qualquer viagem, a fim de conhecer do seu estado de navigabilidade, salvo se a precedente vistoria houver sido feita ha menos de seis mezes.
§ 1.º A disposição d'este artigo comprehende os navios estrangeiros surtos nos portos do remo e seus domingos.
§ 2.º Nas vistorias, a que, nos termos deste, artigo se houver de proceder, será sempre apresentado o inventario de bordo, para se verificar que existem os subrecellentes n'elle indicadas.
§ 3.º A vistoria será presidida pelo juiz do tribunal do commercio, e, na sua falta, pela auctoridade marítima do porto.
§ 4.° A vistoria estabelece presumpção de boa navigabilidade do navio, e, a falta d'ella, torna responsável o capitão para com os interessados no navio e carga.
§ 5.° A Vistoria não isenta de responsabilidade o fretador, se os interessados provarem ter saído innavegavel o navio por effeito de vicios occultos.
Art. 528.º O capitão deve, dentro de quarenta e oito horas da sua chegada ao porto do destino, apresentar, o seu diario de navegação, á auctoridade encarregada de o legalisar, para ser visado; e, no caso de arribada, naufrágio, ou evento extraordinário, de que proviesse demora da viagem ou avaria causada ao navio, carga, ou passageiros, deverá fazer o seu relatorio de mar, perante a dita auctoridade, o qual será completado com a informação summaria, prestada peia tripulação e passageiros, se houver occasião de interrogar estes.
§ 1 ° Os interessados, ou quem os represente, independentemente de procurarão, e como gestores de negocio, serão admittidos a assistir.
§ 2.º Os relatorios de mar, confirmados pela informação summaria, que dita fica, fazem fé em juízo, salva prova em contrario.
§ 3 ° Será sufficiente o interrogatório do capitão, para produzir igual effeito o seu relatório, ou protesto de mar, sendo elle, o único salvo de naufrágio, a apresentar se no logar aonde faz o relatório.
§ 4.° O relatório deve declarar o porto e o dia da saída do navio, a derrota percorrida, os perigos supportados, os damnos acontecidos ao navio ou á carga, e, em geral, todas as circumstancias importantes da viagem.
Art. 529.º O capitão não póde, salvos casos de urgência ou de forca maior, começar a descarga do navio, emquanto o seu relatório não estiver feito e confirmado.
Art. 530.° São obrigações do capitão:
1.° Fazer boa estiva, arrumação, guarda, e entrega da carga;
2 ° Levantar ferro no primeiro ensejo favorável, logo que tiver a bordo tudo o que for preciso para a viagem;
3 ° Levar o navio ao seu destino;
4.° Conservar-se a bordo por todo o tempo da viagem, qualquer que for o perigo;
5.º Tomar piloto pratico em todas as barras, costas, e paragens, onde a lei, o costume, ou a prudência, o exigir, observando os regulamentos do porto;
6.° Chamar a conselho os officiaes, armadores, caixas, e

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carregadores, que estiverem a bordo, ou seus representantes, em qualquer evento importante, donde puder vir prejuízo á embarcação ou á carga:
7.° Empregar toda a diligencia por salvar, e ter, em boa guarda, o dinheiro, mercadorias, e objectos de valor, e os despachos, e papeis de bordo, sempre que tiver de abandonar o navio;
8.º Sacrificar, no alijamento, de preferencia, os objectos de menos valor, os menos necesarios á embarcação,, os mais pesados, e os que pejarem a Coberta;
9.° Observar nas arribadas forçadas o disposto no a titulo IV d'este livro;
10.° Tomar as necessárias cautelas para a conservação da embarcação, ou da carga, apresadas, embargadas, ou detidas;
11.° Aproveitar, durante a viagem, todas as occasiões de dar aos armadores, ou caixas, ou aos seus representantes, nos portos de entrada ou de arribada, noticia dos acontecimentos da viagem, das despezas extraordinárias em beneficio da embarcação, e de quaesquer fundos para esse fim levantados;
12.° Exhibir os livros de bordo aos interessados, que pretenderem examinal-os. consentindo que d'elles tirem copias ou extractos.
Art. 531.º O capitão é pessoa competente para, em qualquer nação, representar em juízo, os proprietários ou armadores do navio, quer como auctor, quer como réu.
§ 1.° É tambem o seu mandatário em tudo o que diz respeito á gerencia e expedição do navio, podendo proceder, livremente, durante a viagem e nos paizes estrangeiros.
§ 2.° Estando, porém, presente algum dos proprietários ou armadores do navio, ou qualquer seu representante, não póde o capitão, sem a sua auctorisação, mandar fazer reparos, comprar velas, cabos, e outros aprestes, ajustar fretamentos, e levantar dinheiro por conta da carga.
Art. 532.° Durante a viagem, se for preciso ao capitão servir se, para uso do navio, dos objectos que estiverem a bordo, podel-o ha fazer, ouvidos os principaes da tripulação.
Art. 533.º Se, no decurso da viagem, o capitão tiver necessidade de dinheiro para obras de reparação, compra de vitualhas, ou outra urgência do navio, dará aviso immediato aos armadores, afretadores, e destinatários, para o habilitarem a estas despezas; e, não podendo fazer aquelle aviso, ou não havendo tempo para esperar a resposta e as providencias dos interessados, pedirá auctorisação para taes despezas, e para levantar o dinheiro preciso a effectual-as, ao juiz presidente do tribunal do commercio, e não o havendo, ao magistrado judicial do porto.
§ 1.° Tendo logar esta occorrencia em paiz estrangeiro, a auctorisação será pedida ao cônsul portuguez, e, na sua falta, á auctoridade judicial do paiz.
§ 2.° Estes encargos serão lançados no diário da navegação, fazendo-se ali circumstanciada menção d'elles, bem como dos títulos de obrigação.
§ 3.º O capitão, antes de partir do porto, onde precisou fazer despezas extraordinárias, e contrahir obrigações sem a intervenção directa dos proprietários ou armadores do navio, enviará a estes uma couta corrente de taes despezas, com indicação dos documentos justificativos dellas e dos encargos contrahidos, comprehendendo, quanto a estes, o nome e a residência dos credores.
Art. 534.° A responsabilidade para com os carregado rés, a respeito das fazendas vendidas, comprehende os valores que ellas teriam, no logar, e na epocha, da descarga do navio.
Art. 535.º O capitão não póde vender o navio, sem auctorisação especial do seu proprietário, salvo o caso único de innavigabilidade.
§ 1.° A innavigabilidade e a venda serão decretadas pelo presidente do tribunal do commercio; se a occorrencia succeder em paiz estrangeiro, pelo cônsul de Portugal, e, na sua falta, pela auctoridade, judicial do paiz.
§ 2.° Se o navio for julgado innavegavel, incumbe ao capitão procurar um outro navio para levar a carga a seu destino.
§ 3.° Cessa esta obrigação se lhe for exigido maior frete do que o que vencia o seu navio, a não ser que os interessados na carga convenham no augmento do frete, o qual, em tal caso, será de conta delles.
Art. 536.° O capitão póde exigir o pagamento dos seus vencimentos e o reembolso das despezas que tiver pago, logo que der conta.
§ único. Havendo duvida na liquidação das contas, o pagamento do saldo será feito mediante caução.
Art. 537.° Ao piloto, e a quem fizer as suas vezes, competem os direitos e os deveres do capitão, quando o substituirem.

CAPITULO IV

Da tripulação

Art. 538.º Constituem a tripulação de um navio: o capitão ou mestre, o piloto de bordo, o contra mestre, os marinheiros, e os marujos ou creados, que fazem parte do rol da equipagem, organisado conforme os regulamentos, e tambem os machinistas, fogueiros, e mais pessoas ao serviço dos navios a vapor.
§ 1.° O rol da equipagem deve indicar o nome, qualidade, e domicilio, de cada um dos contratados, o seu vencimento e as mais condições do contrato.
& 2.° Este contrato deve ser feito, por escripto, perante o competente chefe maritimo ou seus delegados, e nos paizes estrangeiros, perante o agente consular de Portugal, procedendo se em seguida á matricula da tripulação.
§ 3.° Sendo feito o contrato em logar, onde não haja agente consular portuguez, será escripto e assignado no diário da navegação.
Art. 539.° Os marinheiros, e as mais pessoas da tripulação, são obrigados a servir no navio, ainda que tenha expirado o termo do seu ajuste, por todo o tempo que for preciso para elle regressar ao porto donde saiu, uma vez que o regresso haja logar, directamente, e feitas, somente, as escalas indispensáveis.
§ 1.° No caso previsto neste artigo, a tripulação tem direito ao acréscimo de salário correspondente ao maior tempo de serviço.
§ 2.° O contrato, porém, considera-se terminado, ainda antes de expirado o prazo convencionado, se o navio regressa ao porto da saída, tendo concluído a viagem antes d'aquelle praso.
Art. 540.º Se o contrato com a tripulação é por tempo indeterminado ou comprehendendo todas as viagens que o navio haja de emprehender, fica livre, ao tripulante, despedir se depois dos primeiros três annos de serviço, salva a disposição do artigo antecedente.
§ 1.º Se, a esse tempo, o navio se achar em paiz estrangeiro, sem ainda estar principiada ou determinada a viagem de regresso, o tripulante tem direito, alem, dos salários vencidos, a que lhe sejam pagas as despezas do regresso ao porto da matricula, a não ser que o capitão lhe obtenha meio de embarque.
§ 2.° A despedida, porém, não poderá effectuar-se em porto de escala ou de arribada, mas, unicamente, no porto da terminação da viagem.
Art. 541.º Terminado o contrato, ou havido por terminado, com a despedida do tripulante, o capitão entregará, a este o seu titulo de obrigação, indicando n'elle o nome e a qualidade do navio, e o tempo de embarque, ficando registado este titulo no diário da navegação.
Art. 542.º O capitão, e a gente da tripulação, não podem carregar fazenda, por sua conta, sem consentimento dos

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proprietarios ou armadores, e sem pagar frete, salvo se J hospital ou casa de saúde, mediante o adiantamento que for outra cousa foi estipulada em seu contrato.
Art. 543.° Os direitos, e os deveres, entre o capitão e a tripulação começam desde a assignatura do contrato.
Art. 544.° Se a viagem deixa de se verificar por facto do proptietario, capitão, ou afretadores, a tripulação reterá, como indemnisação, o adiantamento feito por conta dos seus salários.
§ único. Se não tiver havido adiantamento, a tripulação, contratada ao mez, recebe, como indemnisação, o salário de um mez; se o contrato é por viagem, recebe a importância correspondente a um mez da duração provável da viagem; e, se a duração provável for interior a um mez, em tal caso, todo o salário estipulado.
Art. 545.° Se a viagem se rompe depois da saída do navio, a tripulação, contratada pela viagem inteira, é paga como se esta se concluísse; seu ajuste foi ao mez, são pagos os mezes vencidos, com uma indemnisação proporcional ao tempo provável da viagem; e, num e noutro caso, serio tambem pagas as despezas de regresso ao porto de matricula, a não ser que o capitão lhe obtenha algum meio de embarque.
Art. 546.° Se o commercio com o porto do destino do navio foi prohibido por virtude de providencia sanitária ou de policia, ou se o navio é embargado por ordem do governo antes de começada a viagem, sómente são pagos os dias empregados pela tripulação em esquipar o navio.
Art. 547.° Se a prohibição do commercio, ou o embargo do navio occorrerem durante a viagem, a tripulação tem direito, no primeiro caso, aos salários em proporção do tempo de serviço, e, no segundo caso, á metade do salário durante o tempo do embargo, se o salário é ao mez, e, a todo o salario ajustado, se o contrato foi por viagem.
Art. 548.° Tendo-se alongado a viagem no interesse dos afretadores, elevado,
assim, o navio a porto diverso do seu destino, o salário, ajustado por viagem, será augmentado em proporção do prolongamento da viagem.
§ único. Se a descarga se fizer em um logar mais próximo do que aquelle para que fora contratada, não soffrerão, por este motivo, abatimento os vencimentos da tripulação.
Art. 549.° Se a tripulação se contratou a partes, deixa de haver direito a indemnisação por qualquer evento da viagem, salvos os direitos da parceria.
Art. 550.° No caso de apresamento ou naufrágio, com perda inteira do navio e carga, não são devidos salários á tripulação, salvo havendo frete adiantado; se, porém, esta tiver recebido qualquer adiantamento, este não é restituído.
§ 1.° Se póde salvar se alguma parte do navio, os salários, que estiverem vencidos, serão pagos, de preferencia, pelos destroços do navio naufragado, ou pelo que se poder recobrar do aprisionamento; mas se os objectos salvos ou recobrados, não forem sufficientes, ou havendo, somente, fazendas salvas, a tripulação será paga, subsidiariamente, pelo frete.
§ 2.° Qualquer que seja a natureza do contrato, á tripulação será pago o salário pelos dias empregados na salvação do navio e carga.
Art. 551.° O tripulante que adoece durante a viagem, ou que é ferido e maltratado, desempenhando serviço do navio, será pago dos seus salários por todo o tempo que durar o seu impedimento, e obterá, alem disso, curativo por conta do navio.
§ 1.° Se a doença foi contrahida em desempenho de trabalhos para salvação do navio, as despezas do tratamento serão á conta deste e da carga.
§ 2.° Se o tratamento tiver de ser feito em terra, o capitão entregará ao agente consular a quantia precisa para esse tratamento e para o regresso do tripulante ao porto de matricula: não havendo cônsul ou agente consular, o capitão proverá a que o tripulante seja admittido em algum hospital ou casa de saude, mediante o aditamento que for necessario para o seu curativo.
3.º Este tratamento e o pagamento das soldadas, tendo desembarcado o tripulante, não se estenderão a mais do que quatro mezes.
Art. 552.° Se o tripulante se fere, maltrata, ou adquire doença, por sua culpa, ou achando-se em terra sem auctorização do capitão, sei ao á sua custa as despezas do tratamento; sendo, porém, o capitão obrigado, a adiantar essas
despezas, se o tripulante o exigir; e devendo aquelle, quando este tenha de desembarcar para se tratar, proceder pela forma, determinada no artigo precedente, salvo o direito ao reembolso.
§ único. No caso de ferimento, ou doença, adquiridos por culpa do tripulante, a soldada será devida sómente pelo tempo em que elle tiver feito serviço.
Art. 553.° Fallecendo algum tripulante durante a viagem, os seus herdeiros têem direito aos respectivos salários até ao dia do fallecimento, se o contrato foi ao mez; á metade dos salarios, se o contrato foi por viagem, e o fallecimento occorreu em caminho, ou no porto da chegada; á totalidade dos salários, se, no caso do contrato por viagem, o fallecimento occorreu no regresso do navio.
§ 1.° Tendo o contrato sido a partes, é devido, aos herdeiros do tripulante fallecido, o quinhão deste, se o fallecimento occorreu depois da viagem começada.
§ 2.º Se o tripulante foi morto em defeza do navio, o salário é devido por inteiro e por toda a viagem, uma vez que o navio tenha chegado a bom porto.
Art. 554.° Aprisionado o navio, os salários são devidos até ao dia do aprisionamento.
§ 1.° Se a prisão dos tripulantes se effectuou, tendo elles saído do navio em serviço, d'este, são devidos os salários pelo tempo que tiver durado esse serviço.
§ 2.° A carga contribuo para este pagamento, se a saída do tripulante foi no interesse d'ella.
Art. 555.° Se o navio for vendido na vigência do contrato com a tripulação, esta tem direito a ser transportada ao porto da sua matricula, á custa do navio, e a receber os interesses estipulados.
Art. 556.° O capitão pode despedir o tripulante, antes do termo do contrato, sem que precise provar a causa da despedida, devendo, porém, entregar-lhe o seu titulo de desobrigação, e fornecer-lhe os meios de se transportar ao porto da matricula, ou procurar lhe embarque em navio com aquelle destino.
§ 1.° O tripulante que for despedido sem motivo attendivel, pode reclamar indemnisação.
§ 2.º Se a despedida for feita no porto da matricula, e antes da saída do navio, a indemnisação consistirá em um mez de soldada.
§ 3.° Se for feita em alguns dos portos da Europa, ou dos da bacia do Mediterrâneo, ou dos da África, banhados pelo Atlântico, desde Tanger ao trigésimo grau de latitude norte, ou dos das ilhas de Cabo Verde, a indemnisação será de dois mezes, se occorreu em alguns dos portos da África occidental, será de três mezes, e em quaesquer outros portos de quatro mezes.
§ 4.° Não pode o capitão, em qualquer destes casos, fazer-se reembolsar pelos proprietários ou armadores do navio, da importância da indemnisação que tiver pago, se a despedida não for de accordo com elles.
§ 5.° Não ha logar a indemnisação se o tripulante é despedido antes de encerrado o rol da equipagem.
Art. 557.° Os tripulantes têem direito a ser sustentados abordo, emquanto não forem, integralmente, pagos dos seus vencimentos, ou da parte dos interesses que lhes forem devidos pelo seu contrato.
§ único. Ainda, depois de findo o termo do contrato, têem obrigação de continuar a fazer o serviço do navio, até que este seja posto em segurança, admittido a livre pratica e descarregado, continuando tambem o sustento a

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bordo e o pagamento dos seus salários por este acréscimo de trabalho.
Art. 558.° Se, estando em quarentena, o navio tiver de partir para outra viagem, o tripulante que não quizer contratar-se para essa nova viagem, tem direito a ser desembarcado no lazareto, sendo á conta do navio as despezas que elle ahi tiver de fazer, e os salários por todo o tempo que se demorar.
Art. 559.° Os salários e interesses dos tripulantes não podem ser concedidos e arrestados, ou penhorados, a não ser por motivo de alimentos devidos por lei, ou por dividas dos tripulantes ao navio.
§ único. No caso de divida por alimentos, a cedência, arrasto, ou penhora, só póde comprehender a terça parte dos vencimentos, sem que ao tripulante seja licito estipular o contrario.

CAPITULO V

Do conhecimento

Art 569.° O conhecimento deverá conter:
1.° Nomes e domicilies do carregador, do capitão, ou afretador, e do destinatário, quando pessoa certa;
2.° O nome, a nacionalidade, e tonelagem do navio;
3.° Designação da natureza, qualidade e quantidade dos objectos carregados, suas marcas, contra marcas, e nu meros;
4.° O porto, de partida, os de escalla, e o do destino;
5. ° O frete;
6.° A data em que o conhecimento for assignado;
7.° O numero de exemplares.
§ 1.° O conhecimento póde ser á ordem, ao portador, ou a pessoa certa.
§ 2.° O capitão deve dar tantos exemplares do conhecimento quantos exigir o acrregador, não podendo o numero ser inferior a quatro: um para o carregador outro par o destinatario, outro para o capitão, e outro para o armador.

§ 3.° Cada um dos conhecimentos deve indicar a qual dos interessados é destinado.
§ 4.° O capitão assignará todos os conhecimentos, excepto os que não forem destinados, que serão assignados pelo carregador.
Art. 561.° As fazendas serão entregues pelo capitão, no logar do destino, á pessoa que apresentar um dos conhecimentos, não lhe tendo sido notificada opposição alguma.
§ único. Se mais de que um portador se apresentar a reclamar as fazendas, ou em caso de opposição, o capitão fará depositar, judicialmente, as fazendas, e promover, tambem judicialmente, a venda das que forem necessárias para pagamento do frete.
Art. 562.° O conhecimento regular faz fé entre os interessados no carregamento, e entre estes e os seguradores e o carregador, salvo provando se dolo.
& 1.° Ao terceiro portador não póde ser opposto o dolo do carregador.
§ 2 ° Os terceiros, estranhos ao contrato de fretamento, e, designadamente, os seguradores, podem provar a falsidade do conhecimento por qualquer meio de prova.

CAPITULO VI

Do fretamento

Art. 563.° O contrato de fretamento deve ser reduzido a escripto, n'um instrumento, que constituirá a carta partida, ou de fretamento, devendo,
n'elle, enunciar-se:
1.° O nome, nacionalidade, e tonelagem do navio;
2.° O nome do capitão;
3.° Os nomes do fretador e do afretador ou carregador;
4.° O logar e tempo convencionados para carga e dês carga;
5.° O preço do frete;
6.° Se o fretamento é total ou parcial;
7.° A indemnisação convencionada no caso de retardamento.
Art. 564 ° O contrato de fretamento póde ser:
1.° Redondo, ou por todo o navio;
2.° Por uma parte do navio;
3.° Por uma ou mais viagens;
4.° Á carga, á colheita, ou á prancha, quando o capitão recebe de todos quantos se lhe apresentam, as fazendas que bem lhe parece, para serem carregadas, transportadas, ao porto do destino;
5.° Por objectos determinados, ou designados, somente, pelo seu numero, peso e volume.
§ 1.° Na falta de declaração o contrato presume-se ser de fretamento redondo.
& 2.° Declarando o fretador ser o navio de lotação superior ou inferior á sua lotação real, se a differença exceder a vigésima parte desta, o fretador tem direito a indemnisação por peidas e damnos.
Art. 565.° O afretador deve entregar ao capitão, dentro de quarenta e oito horas depois de carregado o navio, os papeis respeitantes ao carregamento.
Art. 566.° A mudança de capitão não impede que subsista o contrato de tratamento, salva convenção em contrario.
Art. 567.° Não se estipulando na carta de fretamento o tempo para a carga e descarga do navio, calcular-se-ha a estadia, se o navio for a vapor, na rasa o de cem toneladas métricas por dia, e se for de vela na de cincoenta.
§ único. Havendo sobre-demoras, serão estas pagas na rasão de cem réis por cada tonelada de navio a vapor, e na de cincoenta réis por cada uma dos de vela.
Art. 568.° Se o contrato do fretamento é, ao mez, ou por período de tempo determinado, a sua duração se contará do dia em que se achar prompto a carregar até ao dia em que, terminar a descarga.
Art. 569.° Se a saida do navio para o porto do seu destino é embaraçada por motivo de força maior, guerra, bloqueio, ou interdicção de commercio, ha logar á rescisão do fretamento.
§ único. Nos casos previstos neste artigo não tem o fretador direito a indemnisação, e são, por conta do afretador, as despezas da descarga.
Art. 570.° Se o impedimento occorrer, durante a viagem, ha direito ao frete pelo caminho andado.
§ único. Sendo temporário o impedimento, póde o afretador descarregar as fazendas, fazendo-o á sua custa, e com a condição de as tornar a carregar ou de indemnisar o capitão, prestando, num e noutro caso, caução, quando exigida.
Art. 571.° Estando bloqueado o porto do destino do navio, ou dando-se algum caso de força maior, que embarace a entrada do navio n'esse porto, o capitão aportará a outro porto, ou retrocederá áquelle donde saiu, conforme entender que é mais proveitoso ao afretador.
§ 1.° No caso de voltar o navio ao porto donde saiu, vencerá o frete da ida, e mais um terço d'elle pelo regresso.
§ 2.° Se o navio aportar a outro porto, vencerá alem do frete da ida, tambem um terço por aquelle excesso de caminho.
§ 3.° O capitão poderá tambem fazer expedir, noutro navio, as fazendas ao seu destino, sendo, n'este caso, o frete, a cargo dos afretadores.
§ 4.° O disposto, neste artigo e seus paragraphos, entender-se ha na falta de ordens recebidas, ou sendo estas inexequíveis
Art. 572. São Jogares reservados, para o effeito de se não considerarem comprehendidos no fretamento, a camara do capitão e os compartimentos de accommodação do pessoal e material do navio.
Art. 573.° Não estando designada na caria de fretamento

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a epocha, em que o navio deve estar prompto a metter carga, é permittido ao fretador fixal-a.
§ único. O fretador que não apresentar prompto o navio na epocha determinada, responde por perdas e damnos.
Art. 574.° Se o navio for fretado na totalidade e o afretador deixar de concluir o carregamento, não póde o capitão carregar quaesquer fazendas sem conhecimento do afretador.
§ único. Ao afretador pertence o frete das fazendas que completarem o carregamento.
Art 575.° O afretador que renunciar ao contrato antes de começar a carregar o navio, deve pagar metade do frete.
§ 1.° Carregando menos do que o convencionado, paga o frete por inteiro.
§ 2.° Se carregar alem do convencionado, paga frete pelo excesso carregado.
Art. 576.° Póde o afretador retirar de bordo quaesquer dos objectos carregados, se pagar o frete por inteiro, e as despezas da entrada a bordo, estiva, e descarga, e restituir os conhecimentos.
Art. 577.° O frete das fazendas, sacrificadas para salvação do navio e carga, será pago, integralmente, na conta de avaria grossa.
§ 1.° Também se pagará por inteiro o frete das fazendas, que perecerem na viagem por vicio próprio, ou que forem vendidas em seu único beneficio, salva a deducção das despezas, que, por motivo deste evento, o capitão ficar dispensado de effectuar.
§ 2.° Será, igualmente pago por inteiro o frete das fazendas applicadas, para as necessidades do navio, se este chegou a bom porto, salva a obrigarão de pagar, o navio, aos donos das fazendas, o valor, que ellas teriam, no porto da descarga.
Art. 578.° Se o capitão é obrigado, por motivo de caso fortuito, ou de força maior, a concertar o navio durante a viagem, e o afretador, por não querer esperar pela conclusão do concerto, fizer descarregar as fazendas, pagará o frete por inteiro, prestando, porém, caução pela quota de avaria grossa, a que as fazendas possam estar obrigadas.
§ 1.° Se o navio não poder ser concertado, o frete é devido na proporção do caminho andado.
§ 2.° Tendo o capitão de afretar um outro navio, para conduzir as fazendas ao seu destino, o frete é por conta do carregador.
Art. 579.° Não é devido frete, se o afretador provar que o navio era innavegavel na occasião de emprehender a viagem, para que fora afretado.
§ único. É admittida prova em contrario da vistoria, de que trata o artigo 527.°
Art. 580.° Não é devido frete pelo tempo que durarem os concertos do navio, se este foi afretado ao mez ou por período determinado, nem augmento de frete, se o fretamento foi por viagem.
§ único. Também não é devido frete ou augmento de frete, se o navio é demorado por bloqueio do porto, ou por outro caso de força maior.
Art. 581.° Se o destinatário ou o consignatário das fazendas recusa tomar entrega dellas, deve o capitão requerer, ao juiz presidente do tribunal do commercio, que nomeie um consignatário, o qual tomará conta das fazendas, promovendo a venda judicial das que forem necessárias para pagamento do frete, avarias, e despezas, a que estiverem sujeitas.
§ 1.° Se as fazendas forem susceptíveis, de deterioração, promoverá, o dito consignatário, a venda de todas, consignando o seu producto em deposito, á ordem do juizo, e dando, perante elle, a sua conta.
§ 2.º N'esta conta carregará a commissão de venda segundo o estylo da praça.
Art. 582.º Só as fazendas forem, carregadas a entregar á ordem, deve o capitão, chamar por annuncios, publicados em três jornaes successivos, a pessoa ou pessoas, a quem ellas são destinadas, fazendo tambem affixar um annuncio na bolsa, se a houver.
§ único. Se ninguém se apresentar a reclamar as fazendas deve o capitão proceder nos termos do artigo precedente.
Art. 583 ° Não póde o capitão, para segurança do frete, avarias, e despezas, reter as fazendas a bordo, sendo-lhe, unicamente, licito, durante a descarga, pedir o deposito das que forem sufficientes para aquelle pagamento.
Art. 584.° O afretador não póde pedir a reducção do frete, nem abandonar ao frete as fazendas, por motivo de retardamento na chegada, diminuição de valor, ou deterioração.
§ único. No caso das vasilhas que contiverem líquidos, se esvasiarem por mais de metade, podem, essas vasilhas, e o seu conteúdo, ser abandonadas ao frete.

CAPITULO VII

Dos passageiros

Art. 585.° O transporte de passageiros será regulado, na falta de convenção especial, pelas disposições deste capitulo.
Art. 586.º Se o passageiro não se apresenta a bordo, em tempo competente, é devida a passagem por inteiro.
§ 1.° Se a falta de apresentação foi por motivo de óbito, doença, ou outro caso de força maior, que impeça o interessado de seguir viagem, ou se este declara que renuncia a ella, é devida meia passagem.
§ 2.º Se, por facto do capitão, o passageiro não póde seguir viagem, tem este direito a perdas e damnos.
§ 3.° Se o impedimento provem de caso fortuito ou força maior a respeito do navio, ha logar á restituição da passagem, ficando rescindido o contrato, e sem direito a indemnisação de parte a parte.
Art. 587.° Se, durante a viagem, o passageiro preferiu desembarcar em um porto, que não seja o do seu destino, a passagem e devida por inteiro.
§ 1.º Se o desembarque em porto, que não seja o do destino, é motivado por acto ou culpa do capitão, ha logar a perdas e damnos.
§ 2.° Se o desembarque for proveniente de caso fortuito ou força maior, que diga respeito ao navio ou ao passageiro, a passagem é devida na proporção do caminho andado.
Art. 588.° Fallecendo o passageiro em naufrágio, não é restituída aos herdeiros a passagem, se tiver sido paga; se estiver por pagar, não póde ser exigida.
Art. 589.° Se por outro motivo, que o de caso fortuito ou força maior, o navio se demorar em sair, o passageiro tem direito a permanecer a bordo, e, também, a ser alimentado, ali, durante todo o tempo da demora, alem da indemnisação por perdas e damnos.
Art. 590.° Se a demora exceder a dez dias, póde o passageiro resilir o contrato, sendo-lhe restituída a passagem, se a tiver pago.
§ único. Se porém a demora provem de mau tempo, a restituição comprehenderá sómente dois terços.
Art. 591.° O navio que tiver sido afretado, exclusivamente, para o transporte de passageiros, deve conduzil-os ao porto do seu destino, sem outras escalas alem das annunciadas, ou das que são de uso commum.
Art. 592.° Se o navio se desvia da derrrota por acto ou culpa do capitão, os passageiros serão alojados e alimentados, por todo o tempo desse desvio, á custa do navio, com direito a perdas e damnos, e podendo resilir o contrato.
Art. 593.° Se, alem dos passageiros, o navio conduzir fazendas, póde o capitão entrar em qualquer porto, como preciso lhe for para a descarga.
Art. 594.° Sendo demorado o navio, pela necessidade de

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concerto, póde o passageiro resilir o contrato, pagando a passagem em proporção do caminho andado.
§ único. Se preferir esperar que o navio, prosiga na derrota, não paga maior passagem, mas o sustento será á sua custa durante o tempo da demora.
Art. 595.° O sustento do passageiro durante a viagem presume-se comprehendido no frete.
§ 1.° Se o sustento foi excluído, compete ao capitão fornecel-o por justo preço ao passageiro, que tiver necessidade d'elle.
§ 2.° Nas viagens para fora do continente de Portugal e os passageiros têem direito a ficar a bordo, e de serem sustentados durante vinte e quatro horas, depois da chegada do navio ao porto do seu destino, salvo se o navio é forçado a partir immediatamente.

CAPITULO VIII

Dos privilégios creditorios e das hypothecas

SECÇÃO I

Dos privilégios creditorios

Art. 596.° Os créditos designados nesta secção preferem a qualquer privilegio geral ou especial sobre moveis, estabelecido no código civil.
Art. 597.° Dado o caso de se deteriorar, ou de diminuir de valor, o navio, ou qualquer dos objectos, em que recáe o privilegio, este subsiste quanto ao que sobejar, ou poder ser salvo e posto em segurança.
Art. 598.° Se o producto do navio, ou dos objectos sujeitos ao privilegio, não for sufficiente para embolsar os credores privilegiados de uma ordem, se fará entre elles rateio.
Art. 599.º O indosso de um titulo de credito, que tem privilegio, comprehende tambem a transmissão do privilegio.
Art. 600.° As dividas, que têem privilegio sobre o navio, são graduadas pela ordem seguinte:
1.° As custas e despezas judiciaes feitas no interesse commum dos credores;
2.° Os salários devidos por assistência e por salvados;
3.° As despezas de pilotagem e reboque da entrada no porto;
4.° Os direitos de tonelagem, pharoes, ancoradouro, saúde publica e os mais direitos de porto;
5.° As despezas com a guarda do navio e com a armazenagem dos seus pertences;
6.° As soldadas do capitão e tripulantes;
7.° As despezas de custeio e concerto do navio, e dos seus apreces e apparelhos;
8.° O embolso do preço de fazendas do carregamento, que o capitão precisou vender;
9.° As quantias dadas a risco com igual applicação;
10.° Os prémios do seguro;
11.° O preço da ultima acquisição do navio, que estiver em divida;
12.° As despezas com o concerto do navio, e seus aprestes e apparelhos, nos últimos três annos anteriores á viagem, e a contar do dia em que o concerto terminou;
13.° As dividas provenientes de contratos para a construcção do navio;
14.° Os prémios dos seguros feitos sobre o navio, se todo foi segurado, ou sobre a parte e accessorios que o foram, não comprehendidos no n.° 10.°;
15 ° A indemnisação devida aos carregadores por falta de entrega das fazendas, ou por avarias, que estas soffressem.
§ único. As dividas mencionadas nos n.ºs 1.° a 10.° são as contrahidas durante a ultima viagem, e por motivo d'ella.
Art. 601.° Os privilégios dos credores sobre o navio extinguem-se:
1.° Pelo modo por que, geralmente, se extinguem as obrigações;
2.° Pela venda judicial do navio, depois que o seu preço é posto em deposito, transferindo-se para esse preço, o privilegio e acção dos credores;
3.° Pela venda voluntária, feita com citação dos credores privilegiados, e se houverem passado seis mezes, sem que estes tenham feito valer os seus privilégios, ou feito opposição ao preço da venda.
Art. 602.° As dividas que têem privilegio sobre a carga do navio, são graduadas pela ordem seguinte:
1.° As despezas judiciaes feitas no interesse commum dos credores;
2.° Os salários devidos por salvados;
3.° Os direitos fiscaes, que forem devidos no porto da descarga;
4.° As despezas de transporte e de descarga;
5.° As despezas de armazenagem;
6.° As quotas de contribuição para as avarias communs;
7.° Os prémios do seguro.
Art. 603.° Cessam os privilégios sobre a carga se os credores os não fizerem valer antes de effectuada a descarga, ou nos dez dias immediatos, e emquanto, durante este praso, os objectos carregados não passarem a poder de terceiros.
Art. 604.° As dividas, que têem privilegio sobre o frete, são graduadas pela ordem seguinte:
1.° As despezas judiciaes feitas no interesse commum dos credores;
2.° As soldadas do capitão e tripulação;
3.° As quotas de contribuição para as avarias communs;
4.° Os prémios fio seguro;
5.° A importância da indemnisação, que for devida por falta de entrega das fazendas carregadas.
Art. 605.° Cessam os privilégios sobre o frete, logo que o frete for pago salvo o caso do artigo 545.° em que só se extingue se, passados seis mezes, não ha reclamação.

SECÇÃO II

Das hypothecas

Art. 606.° Podem constituir-se hypothecas sobre navios, mas só por convenção das partes.
Art. 607.° As hypothecas sobre navios produzirão os mesmos effeitos, e
reger-se-hão pelas mesmas disposições que as hypothecas sobre prédios, em tudo quanto for compativel com a sua especial natureza, e salvas as modificações da presente seeção.
Art. 608.° A hypotheca sobre navios só póde ser constituída pelo respectivo proprietário, por si, ou por procurador especial.
§ 1.° Quando o navio pertencer a mais do que um proprietário, poderá ser hypothecado na totalidade, para despezas de armamento e navegação, por consentimento expresso de maioria, representando mais de metade do valor do navio.
§ 2.° O coproprietario de um navio não póde hypothecar, separadamente, a sua parte no navio, sem assentimento da maioria definida no paragrapho antecedente.
Art. 609.° E tambem permittida a hypotheca sobre navios em construcção, ou a construir para pagamento das respectivas despezas de construcção, comtanto que, pelo menos, no respectivo instrumento se especifique o comprimento da quilha do navio, e, approximadamente, as suas principaes dimensões, assim como a sua tonelagem provável, e o estaleiro em que se acha a construir, ou tem de ser construido.
Art. 610.° A hypotheca sobre navios será constituída por instrumento publico, salva a hypothese do § 2.° do artigo 613.°

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Art. 611.º A hypotheca sobre navios relativa a créditos que vençam j urus, abrange, alem do capital, os juros de cinco annos.
Art. 612.° As hypothecas sobre navios serão inscriptas na secretaria do tribunal do commercio do porto da matricula do navio.
§ 1.º No caso da hvpotheca ser constituída sobre navio em construcção, ou a construir, a secretaria competente será a do lugar onde se achar o estaleiro.
§ 2.º Na matricula dos navios que se houver de fazer em secretaria differente d'aquella a que pertencia a do logar onde o navio foi construído,
apresentar-se-ha certidão, passada nesta, de haver, ou não hypotheca sobre o navio, e, no caso affirmativo, serão as respectivas hypothecas transcriptas tambem com respeito á matricula do navio.
Art. 613.º O proprietário de navio que queira reservar-se a faculdade de o hypothecar, durante qualquer viagem, poderá fazer registo provisorio da hypotheca, declarando o máximo até que pretende constituil-a, e dar os necessários poderes especiaes ao capitão, se elle próprio não for de viagem.
§ 1.º A escriptura de hypotheca será feira, quando fora do reino pelo respectivo cônsul portuguez.
§ 2.º Não havendo cônsul portuguez no local em que se queira constituir a hypotheca, poderá esta ser constituída por escripto, feito a bordo, entre os respectivos outorgantes, com duas testemunhas e lançado no respectivo livro.
§ 3.° O regato provisório tornar-se-ha definitivo pela apresentação de qualquer dos títulos lavrados nos termos d'este artigo.
Art. 614.° Oa credores hypothecarios serão pagos dos seus créditos, depois de satisfeitos os privilégios creditorios sobre o navio, pela, ordem da prioridade do regi-to do commercio.
§ único. Concorrendo diversas inscripções hypothecarias da mesma data, o pagamento será feito pro rata.
Art. 615.° As hypothecas sobre navios serão sujeitas a expurgação nos termos de direito.
Art. 616.º No caso de perda ou inavigabilidade do navio os direitos dos credores hypothecarios exercem-se no que restar do navio, e em caso de seguro, sobre a respectiva indemnisação devida pelos seguradores.

TITULO II

Do seguro contra riscos de mar

Art. 617.°- Ao contrato do seguro contra riscos de mar são applicaveis as regras estabelecidas nos capítulos I e II do titulo XV do livro II que não forem incompativeis com a natureza especial dos seguros maritimos, ou alteradas pelas disposições d'este titulo.
Art. 618.º A apolice do seguro maritimo, alem do que se acha prescrito no artigo 446.º deve ennunciar:
1.º O nome, especie, classificação, nacionalidade, e tonelagem do navio;
2.º O nome do capitão;
3.º O logar em que as fazendas foram, ou devem, ser carregadas;
4.° O porto donde o navio partiu, ou deveu ter partido;
5.º Os portos em que o navio deve carregar, descarregar, ou entrar.
& único. Se não poderem fazer-se as enunciações prescriptas n'este artigo, ou porque o segurado as ignore, ou pela qualidade especial do seguro, devem substituir-se por outras que bem determinem o objecto d'este.
Art. 619.º O seguro contra risco do mar, póde Ter objecto:
1.º O navio a vapor ou de véla, em lastro ou carregado armado ou desarmado, navegando só, em comboio, ou em conserva;
2.º As machinas, aprestes, apparelhos, armamentos, e victualhas;
3.° A carga;
4.º O frete dos passageiros e da carga, vencido ou a vencer
5.º O lucro esperado;
6.° As quantias dadas de empréstimo a risco, e o prémio desse contrato;

.° As quantias pagas, ou devidas, por avarias communs, e as despezas (citas, ou devidas, por avarias particulares, logo que não estejam cobertas por um contrato de risco;
8.° E, em geral, todas as mais cousas e valores estimáveis a dinheiro, expostas aos riscos de mar.
Art. 620.º O seguro contra riscos de mar, póde fazer-se, em tempo de paz ou de guerra, antes ou durante a viagem no navio, por viagem inteira, ou por tempo determinado, por ida e volta, ou sómente por uma d'estas.
Art. 621.° Da carga que segurar o capitão ou o dono do navio, só poderão segurar-se nove décimos do seu justo valor.
Art. 622.° É nullo o seguro, tendo por objecto:
1.° As soldadas da tripularão, e a primagem, ou chapéu do capitão;
2.º As fazendas obrigadas ao contrato de risco por seu inteiro valor, e sem excepção de riscos;
3.° As cousas cujo trafico é prohibido pelas leis do reino, e os navios nacionaes ou estrangeiros empregados no seu transporte.
Art. 623.° As fazendas carregadas podem segurar-se pelo seu inteiro valor, segundo o preço do custo, com as despezas de carga e de frete, eu segundo o preço corrente, no logar do destino, á sua chegada, sem avaria.
§ único. A avaliação, feita na apólice sem mais declaração, podará ser referida a qualquer dos casos, prescriptos n'este artigo, e não haverá logar a applicar o artigo 455.° e não exceder o preço mais elevado.
Art 624 ° Não se expressando na apólice o tempo durante o qual hajam do correr os riscos por conta do segurador, começarão estes, quanto ao navio, e seus pertences no momento em que o navio levanta ferro para sair do porto, até ao momento em que está ancorado e amarrado no porto do seu destino, e quanto á carga desde o momento em que é transportada do caes para ser embarcada e e a I regada no navio, e termina depois da entrega no logar do seu destino.
§ 1.º Se o seguro se faz depois do começo da viagem, os riscos correm da data da apólice.
§ 2.º Se a descarga for demorada por culpa do destinatário os riscos acabam para o segurador trinta dias depois da chegada do navio ao seu destino.
Art. 625.° A obrigação do segurador limita-se á quantia segurada.
§ único. Se os objectos segurados soffrem durante o tempo dos sinistros, muitos sinistros successivos, o segurado imputará sempre, ainda lendo legar o abandono, as quantias que lhe forem pagas ou forem devidas pelos sinistros anteriores.
Art. 626.° São a cargo do segurador, salva estipulação contraria, todas as perdas e damnos que acontecerem, durante o tempo dos riscos, aos objectos segurados, por borrasco, naufrágio, varação, abalroação, mudança forçada de rota, de viagem ou de navio, por alijamento, incêndio, violência injusta, explosão, inundação, pilhagem, quarentena superveniente, e geralmente, por todas as demais fortunas de mar, salvos os casos em que o segurador deixa de ser responsável, pela natureza da cousa, pela lei, ou por clausulo expressa na apolice.
1.° O segurador não responde pela barateria do capitão salva convenção em contrario, a qual comtudo será sem effeito, se, sendo o capitão nominalmente designado, foi depois mudado sem audiencia e consentimento do segurador.

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& 2.º O segurador que convencionou , expressamente, segurar os riscos de guerra , sem determinação precisa, responde pelas perdas e damnos, causadas aos objectos segurados por hostilidade represalia, embargo por ordem de potencia, presa e violencia de qualquer especie, feita por governo amigo ou inimigo de direito ou de facto reconhecido ou não reconhecido e em geral por todos os factos e accidentes de guerra.
& 3.º O augmento do premio, estipulado em tempo de paz para o caso de uma guerra eventual, ou outro evento, cuja quota não for determinada no contrato regula-se a juizo de arbitros, tenho em consideração os riscos circunstancias, e estipulações da apolice.
O Art. 627.º No caso de duvida sobre a causa da perda dos objectos segurados, presume-se haverem perecido por fortuna do mar e o segurador é responsavel.
Art. 628.º O julgamento de boa presa, proferido em tribunal estrangeiro, importa a mera presumpção da validade em questões relativas a seguros.
Art. 629.º Não são a cargo dos segurados, as despezas de navegação, pilotagem, invernagem, quarentena e outras feitas por entrada e saida do navio nem os direitos de licença, visita tonelagem, marcas, ancoragem e outras similhantes, impostas sobre o navio e carga, salvo, quando entrarem na classe de avarias grossas.
Art. 630.º Toda a mudança voluntaria de rota, de viagem, ou de navio, por parte do segurado, em caso de seguro sobre navio, ou sobre frete, faz cessar a obrigação do segurador.
& 1.º Observar-se-ha a disposição d'este artigo, com repeito ao seguro da carga, havendo consentimento do segurado.
& 2.º O segurador nas casas previstas n'este artigo e seu & 1.º tem direito ao premio por inteiro, se começou a correr os riscos.
Art. 631.º Se o seguro é feito sobre fazendas, por ida e volta, se o navio tenho chegado ao primeiro destino não carregou fazendas na volta, ou não completou o carregamento, o segurador só receberá dois terços do premio salva convenção em contrario.
Art. 632.º Tendo se effectuado, devidamente, o seguro por fazendas que devem ser carregadas em diversos navios navios designados, com meação da quanta quantia segurada em cada um se todas as fazendas são carregadas em cada um só navio ou em menor numero dos navios designados no contrato, o segurador só responde pela quantia que segurou no navio ou navios que receberam a carga.
& único. O segurador, porém, no caso previsto n'este artigo receberá, no maximo, meio por cento ou metade do premio das quantias cujos seguros se entornaram.
Art. 633.º Se o capitão tem a liberdade de fazer escala, para completar ou tomar a sua carga, o segurador não corre risco dos objectos segurados, senão emquanto estiverem a bordo, salva convenção em contrario.
Art. 634.º Se o segurado envia o navio a um logar mais distante do que o designado no contrato, o segurador não responde pelos riscos ulteriores.
& único. Se, porém a viagem se encurtar, aportando a um porto onde podia fazer escala, o seguro surte pleno effeito.
Art. 635.º A clausula - livre de avaria - liberta os seguradores de toda e qualquer avaria, exepto nos casos que dão logar ao abandono.
Ar. 636.º Recaíndo o seguro sobre liquidos ou sobre generos sujeitos a derramamento, e liquificção, o segurador não responde pelas perdas, salvo sendo causadas por embates, naufragio ou varação, do navio, e tendo as fazendas sido descarregadas, ou recarregadas, n'um porto de arribada forçada.
& único. No caso de ser o segurador obrigado a pagar os damnos referidos n'este artigo deve fazer-se a redacção do desfalque ordinario, a voto de expertos.
Art. 637.º O segurado deve communicar ao segurador, no praso de cinco dias immediatos á recepção, os documentos justificativos, de que as fazendas seguradas correm os riscos e se perderam.
& 1.º O segurador poderá contestar os factos contantes dos documentos apresentados pelo segurado mas essa contestação não suspenderá a condemnação provisória do segurador no pagamento da quantia segurada, que o segurado receberá, quando preste caução idonea.
& 2.º A caução exigida no paragrapho anterior, extinguir-se-ha passados cinco annos, se antes não for instaurada acção pelo segurador.
& 3.º O segurado, communicando ao segurador os documentos justificativos do sinistro, póde reservar-se para, em separado reclamar a indemnisação a que tiver direito.
Art. 638.º Não fixando o contrato ephoca de pagamento, o segurador é obrigado a pagar as quantias devidas, no praso de dis mezes a contar da data em que lhe for notificada a liquidação definitiva de avaria simples, ou não insinuado o abandono, considerando-se desde então constituido em mora.
& 1.º O segurado pela sua parte é obrigado a provar no mesmo praso , a existencia do sinistro, que der logar á acção de avaria ou abandono.
& 2.º Havendo opposição ao pagamento, tanto os oppoentes como o segurado, poderem requerer o deposito da quantia devida.

TITULO III

Do abandono

Art. 639.º Póde fazer-se abandono dos objectos segurados nos casos:
1.º De pesa;
2.º De embargo por ordem de pertencia estrangeira;
3.º De embargo, por ordem do governo depois de começada a viagem;
4.º No caso de perda total dos objectos segurados;
5.º Nos mais casos em que as partes o convencionarem.
& único. O navio não susceptivel de ser reparado e equiparado ao navio totalmente perdido.
Art. 640.º O segurado póde fazer abandono ao segurador, sem ser obrigado a provar a perda do navio, se a contar do dia da partida do navio ou do dia a que se retirem os ultimos avisos d'elle não há noticia, a saber: depois de seis mezes da sua saida, para viagens na Europa, e depois de um anno para viagens mais dilatadas.
& 1.º Fazendo-se o seguro por tempo limitado, depois de terminaram os prasos estabelecidos n'este artigo, a perda do navio presume-se dentro do tempo do seguro.
& 2.º Havendo muitos seguros successivos, a perda presume-se acontecida no dia seguinte áquelle em que se derem as noticias.
& 3.º Se porém, depois, se provar que a perda acontecera fóra do tempo do seguro a indemnisação paga deve ser restituida com juros legaes.
Art. 641.º Verificada a perda total do navio, póde fazer-se o abandono dos objectos seguros n'elle carregados, se no praso de tres mezes a contar do evento, não se encontrou outro navio para os conduzir ao seu destino.
& único. No caso previsto no presente artigo, se os objectos segurados se carregam em outro navio, segurador responde pelos damnos soffridos despezas de carga e recarga, do posto de guarda nos armazens augmento de freta, e mais despezas de salvação, até á concorrencia da quantia segurada, e em quanto esta se não achar esgotada continuará a correr os riscos pelo resto.
Art. 642.º O abandono dos objectos segurados, apresentados, ou embargados, só póde fazer-se passados tres mezes

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depois da notificação da preza ou do embargo, se o foram nos mares da Europa, e passados seis mezes se o foram em outro logar.
§ único. Para as fazendas sujeitas a deterioração rápida os prasos mencionados neste artigo, serão reduzidos a metade.
Art. 643.° O abandono será intimado aos seguradores no praso de três mezes a contar do dia em que houve conhecimento do sinistro, se este aconteceu nos mares da Europa; de seis mezes se succedeu nos mares de África, nos mares occidentaes e meridionaes da Ásia e nos orientaes da America, e de um anno se o sinistro occorreu em em outros mares.
§ 1.° Nos casos de presa ou de embargo por ordem de potência estes prasos só correm do dia em que terminarem os estabelecidos no artigo 642.°
§ 2 ° O segurado não será admittido a fazer abandono, expirados os prados fixados n'este artigo, ficando-lhe salvo o direito para a acção de avaria.
Art. 644.° O segurado, nos casos em que póde fazer abandono, é obrigado a participar ao segurador as noticias que receber, dentro em cinco dias da sua recepção.
Art. 645.° O segurado, participando ao segurador, os avisos recebidos, póde fazer o abandono, intimando o segurador para pagar a quantia segurada no praso estabelecido pelo contrato ou pela lei, e póde reservar-se para o fazer depois dentro dos prasos legaes.
§ 1.° Fazendo o abandono é obrigado a declarar todos os seguros feitos ou ordenados, e as quantias tomadas a
mas se, por virtude de repreza, os objectos passarem a terceiro possuidor podei á o segurado fazer delles abandono.
§ 2.º Em caso de declaração fraudulenta o segurado ficará privado de todos os effeitos do seguro.
Art. 646.° O abandono dos objectos segurados não póde ser parcial nem condicional.
Art. 647.° O abandono comprehende sómente as cousas que são objecto do seguro e do risco.
Art. 648.° Os objectos segurados ficam pertencendo ao segurador desde o dia em que o abandono e intimado e acceite pelo segurador, ou julgado valido.
§ único. O segurado deverá entregar, ao segurador, todos os documentos concernentes aos objectos segurados.
Art. 649.° O segurador não póde libertar-se do pagamento da quantia segurada, sob pretexto de que o navio, ou fazendas seguradas, foram relaxadas ou restituídas depois do abandono.
Art. 650.° No caso de presa, se o segurado não póde avisar o segurador, terá a faculdade de resgatar os objectos apresados, sem esperar ordem do segurador; ficando, porém, nesse caso. obrigado a dar conhecimento ao segurador da composição que tiver feito, logo que se lhe proporcionar occasião para o fazer.
§ 1 ° O segurador tem a escolha de tomar á sua conta a composição, ou rejeitai a, e da escolha que fizer dará conhecimento ao segurado, no praso de vinte e quatro horas, depois de ter recebido a communicação.
§ 2.° Se acceitar a composição, contribuirá sem demora para ser pago o resgate nos termos da convenção e em proporção do seu interesse, e continuará a correr os riscos da viagem, conforme o contrato de seguro.
§ 3.° Se rejeitar a composição, ficará obrigado ao pagamento da quantia segurada e sem direito de reclamar cousa alguma cios objectos resgatados.
§ 4.° Quando o segurador deixa de dar conhecimento da sua escolha no praso mencionado, entende-se que rejeita a composição.
§ 5.º Resgatado o navio, se o segurado entra na posse dos seus objectos, reputar-se-hão avarias as deteriorações soffridas, ficando a indemnisação de conta do segurador, mas se, por virtude de repreza, os objectos passarem a terceiro possuidor poderá o segurado fazer d'elles abandono.

TITULO IV

Do contrato de risco

Art. 651.° O contrato de risco deve ser feito por escrito, e enunciar:
1.° A quantia emprestada;
2.° O prémio ajustado;
3.° Os objectos sobre que recáe o empréstimo;
4.° O nome, qualidade, tonelagem e nacionalidade do navio:
5.° O nome do capitão;
6.° Os nomes e domicílios do dador o tomador;
7.° A enumeração particular e especifica dos riscos tomados;
8.° Se o empréstimo tem logar por uma ou mais viagens, e por que tempo;
9.° A epocha e o logar ao pagamento.
§ 1 ° O escripto será datado do dia e logar em que o empréstimo se fizer, e será assignado pelos contratantes, declarando a qualidade em que o fazem.
§ 2.° O contrato de risco que não for reduzido a escripto, nos termos d este artigo, converter-se-ha em simples empréstimo, e obrigará, pessoalmente, o tomador, ao pagamento de capital e juros.
Art. 652.º O titulo do contrato de risco, exarado á ordem é negociavel por indosso, nos termos e com os mesmo direitos e acções em garantia, que as letras de comboio.

or-do contrario, a dilação do pagamento será suspensa até j dem, é negociável por indosso, nos termos e com os mesmos ao dia em que apresentar a dita declaração, sem que dahi j direitos e acções-cm garantia, que as letras de cambio.
§ único. O indossado toma o logar do indossante, tanto a respeito do prémio, como das perdas; mas a garantia da solvabilidade do devedor é restricta ao capital, sem comprehender o prémio, salva convenção em contrario.
Art. 653.° O contrato de risco só póde ser celebrado pelo capitão do navio, e recair, conjuncta ou separadamente, sobre toda a carga, sobre parte delia, ou sobre o frete vencido, no decurso da viagem, quando não haja outro meio de prover ao que for indispensável para continuar a mesma viagem.
Art. 654.º O dador terá privilegio creditorio no objecto especial sobre que emprestou a risco.
Art. 655.° O empréstimo a risco, feito por quantia excedente ao valor real dos objectos sobre que recáe, é valido até á concorrência d'esse valor, e pelo excedente da quantia emprestada responde, pessoalmente, o tomador sem prémio e só com os juros legaes.
§ 1.° Se da parte do tomador tiver havido fraude, póde o dador requerer que se annulle o contrato e lhe seja paga a quantia emprestada com os juros legaes.
§ 2.° O lucro esperado sobre fazendas carregadas não se considera como excesso de valor, se for avaliado separadamente no titulo.
§ 3.° Para o contrato surtir effeito basta que exista sempre no navio, e, principalmente ao tempo do sinistro, quantidade de fazendas equivalente á quantia dada de empréstimo a risco.
Art. 656.° Perdendo-se, por caso fortuito ou força maior, no tempo, logar, e pelos riscos, tomados pelo dador, os objectos sobre que recaiu o empréstimo a risco, o tomador liberta se.
§ 1.° Se a perda for parcial, o pagamento da quantia emprestada reduz-se ao valor dos objectos obrigados que se salvarem, deduzidas as despezas da salvação e o pagamento dos créditos que tiverem preferencia.
§ 2.° Se o empréstimo recaiu sobre o frete, o pagamento reduz-se á quantia devida pelos afretadores, deduzidas as soldadas da tripulação, relativas á ultima viagem, e a contribuição para as despezas de salvação.
§ 3,° Se o objecto, obrigado ao empréstimo a risco, estiver

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tambem segurado, o producto, do que for salvo será repartido entre o dador pelo seu capital, e o segurador pela quantia segurada em proporção dos seus respectivos interesses.
§ 4.° Se, no tempo do sinistro, parte dos objectos obrigados, já estiverem em terra, a perda do dador será limitada aos que ficarem no navio, continuando a correr os riscos sobre os objectos salvos, que forem transportados em outro navio.
§ 5.° Se a totalidade dos objectos obrigados estiver descarregada antes do sinistro, o tomador pagará a quantia total do empréstimo e seu prémio.
Art. 657.° O dador contribue para as avarias communs em beneficio do tomador, sendo nulla qualquer convenção em contrario.
§ único. As avarias particulares não são a cargo do dador, salva convenção contraria; mas se por effeito de uma avaria particular, os objectos obrigados não chegarem, para o completo pagamento da quantia emprestada e seu prémio, o dador supportará o prejuízo resultante dessas avarias.
Art. 658.° Havendo muitos empréstimos contrahidos no curso da mesma viagem, o ultimo prefere sempre ao precedente.
§ único. Os empréstimos a risco, contrahidos na mesma viagem e no mesmo porto de arribada forçada, durante a mesma estada, entrarão em concurso.
Art. 659.° As disposições deste código ácerca de seguros marítimos e de avarias, serão applicaveis ao contrato de risco, quando não oppostas á sua essência, e não alteradas por as deste titulo.

TITULO V

Das avarias

Art. 660.° São reputadas avarias, todas as despezas extraordinárias feitas com o navio ou sua carga, conjuncta ou separadamente, e todos os damnos que acontecem ao navio e carga, desde que começam os riscos de mar até que acabam.
§ 1.° Não são reputadas avarias, mas simples despezas a cargo do navio, as que, ordinariamente, se- fazem com a sua saída e entrada, assim como com o pagamento de direitos e outras taxas de navegação.
§ 2.° As avarias regulam-se por convenção das partes, e, na sua falta ou insufficiencia, pelas disposições deste código.
Art. 661.° As avarias são de duas espécies: avarias grossas ou communs, e avarias simples ou particulares.
§ 1.° São avarias, grossas ou communs, todas as despezas extraordinárias, e os sacrifícios feitos, voluntariamente, com o fim de evitar um perigo, pelo capitão ou por sua ordem, para a segurança commum do navio e da carga, desde o seu carregamento e partida até ao seu retorno e descarga.
§ 2.° São avarias, simples ou particulares, as despezas causadas, e o damno soffrido só pelo navio, ou só pelas fazendas.
Art. 662.° As avarias communs. são repartidas, porporcionalmente, entre a carga e a metade do valor do navio e do frete.
Art. 663.° As avarias simples são supportadas e pagas, ou só pelo navio, ou só pela cousa que soffreu o damno, ou occasionou a despeza.
Art. 664.° O exame e estimação da avaria na carga, sendo o damno visível por fora, serão feitos antes da entrega: em caso contrario, o exame poderá fazer-se depois, comtanto que se verifique no praso de quarenta e oito horas da entrega, isto sem prejuízo de outra prova.
§ único. Na estimação a que se refere este artigo determinar-se-ha qual teria, sido o valor da carga, se tivesse chegado sem avaria, e qual é o seu valor actual, tudo isto independentemente da estimação do lucro esperado, sem que em caso algum se possa obrigar o damno da carga a vendei a para se lhe fixar o valor.
Art. 665.º Haverá repartição de avaria grossa por contribuição, sempre que o navio e a carga forem salvos no todo ou em parte.
§ único. O capital contribuinte compõe se:
1.° Do valor liquido integral que as cousas sacrificadas teriam ao tempo no logar da descarga:
2.° Do valor-liquido integral que tiverem no mesmo logar e tempo as cousas salvas, e tambem da importância do prejuízo que soffreram para a salvação commum.
3.° Do frete a vencer, deduzidas as despezas que teriam deixado de se fazer se o navio e a carga fé perdessem na occasião em que se deu a avaria.
§ único. Os objectos do uso e o fato. as soldadas dos marinheiros, as bagagens dos passageiros, e as munições de guerra e de boca na quantidade necessária para a viagem, posto que pagas por contribuição, não fazem parte do capital contribuinte.
Art. 666.° A carga, de que não houver conhecimento ou declaração do capitão, ou que se não achar na lista ou manifesto, não se paga, se for alijada, mas contribue na avaria grossa, salvando-se.
Art. 667.° Os objectos, carregados sobre a coberta, contribuem na avaria grossa, salvando-se.
§ único. Sendo alijados, oudammricados pelo alijamento, não são contemplados na contribuição, e só dão logar á acção de indemnisação contra o capitão, navio, e frete, se foram carregados na coberta sem consentimento do dono; mas, tendo-o havido, haverá logar a uma contribuição especial entre o navio, frete, e outros objectos, carregados nas mesmas circumstancias, sem prejuízo da contribuição geral, para as avarias communs, de todo o carregamento.
Art. 668.° Se não obstante o alijamento, ou corte de apparelhos, o navio se não salva, não ha logar a contribuição alguma, e, os objectos salvos, não respondem em por pagamento algum em contribuição de avaria dos objectos alijados avariados, ou cortados.
§ 1.° Se, pelo alijamento ou corte de apparelhos, o navio se salva, e, continuando a viagem, perece, os objectos salvos contribuem, só por si, no alijamento, no pé do seu valor no estado em que se acham, deduzidas as despezas de salvação.
§ 2.° Os objectos alijados não contribuem, em caso algum, para o pagamento dos damnos soffridos, depois do alijamento pelos objectos salvos.
§ 3.° A carga não coutribue para o pagamento do navio perdido ou declarado innavegavel.
Art. 669.° As disposições ácerca de avarias grossas e de avarias simples, são igualmente applicaveis às barcas e aos objectos carregados n'ellas, que forem empregadas em aliviar o navio.
§ 1.° Perdendo se, a bordo das barcas, fazendas descarregadas para aliviar o navio, a repartição da sua perda será feita entre o navio e o seu inteiro carregamento.
§ 2.° Se o navio se perde com o rosto do carregamento, as fazendas descarregadas nas barcas, ainda que cheguem ao seu destino, não contribuem.
Art. 670.° Não contribuem nas perdas acontecidas a navio, para cuja carga eram destinadas, as fazendas que estiverem em terra.
Art. 671.° Se acontecer, durante o trajecto, quer às barcas, quer às fazendas, n'ellas carregadas, damno reputado avaria grossa, este damno será supportado um terço pelas barcas, e, dois terços, pelas fazendas carregadas a seu bordo.
Art. 672.° Se depois de feita a repartição, os objectos alijados forem recobrados pelos donos, estes reporão, ao capitão e interessados, a contribuição recebida, deduzindo o

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damno causado pelo alijamento e despezas da recuperação, repartindo-se, proporcionalmente, entre os interessados que contribuíram, a reposição recebida.
§ único. Se o dono dos objectos alijados os recuperar sem reclamar indemnisação alguma, estes objectos não contribuirão nas avarias sobrevindas ao restante da carga depois do alijamento.
Art. 673.° O navio contribuo, pelo seu valor, no lugar da descarga, ou pelo preço da sua venda, deduzida a importância das avarias particulares, ainda que sejam posteriores á avaria commum.
Art. 674.° As fazendas, e mais objectos, que devem contribuir, assim como os objectos, alijados ou sacrificados, serão estimados segundo o seu valor, deduzindo o frete, direitos de entrada e outros de descarga, tendo-se em consideração os conhecimentos, facturas, e, na sua falta, outros quaesquer meios de prova.
§ 1.° Estando designados, no conhecimento a qualidade e valor das fazendas, se, valerem mais, cuntribuirão pelo seu valor real, sendo salvas, e serão pagas por esse valor, mas em caso de alijamento ou avaria, regulará o valor dado no conhecimento.
§ 2.° Valendo as fazendas menos, contribuirão segundo o valor indicado, se forem salvas, mas attender-se-ha ao valor real, se forem alijadas ou estiverem avariadas.
Art. 676.° As fazendas carregadas serão estimadas, segundo seu valor, no logar da descarga, deduzidos o frete, direitos de entrada, e outros de descarga.
§ 1.° Se a repartição dever fazer-se no logar do reino, donde o navio partir ou deveria partir, o valor dos objectos carregados será determinado segundo o preço da compra com as despezas até bordo, não comprehendido o prémio do seguro.
§ 2.° Se os objectos estiverem avariados, serão estimados pelo seu valor real.
§ 3.° Se a viagem se rompeu, ou as fazendas se venderam fora do reino e a avaria não póde lá regular-se, tomar-se-ha por capital contribuinte o valor das fazendas no logar do rompimento, ou o producto liquido, que se tiver obtido no logar da venda.
Art. 676.° As avarias grossas ou communs serão reguladas e repartidas segundo a lei do logar onde a carga for entregue.
Art. 677.° Todas as avarias grossas successivas repartem-se, simultaneamente, no fim da viagem, como se formassem uma só e mesma avaria.
§ único. Não se applica a regra deste artigo às fazendas embarcadas ou desembarcadas em um porto de escala, e, tão sómente, a respeito destas fazendas.
Art. 678.° A regulação e repartição das avarias grossas fazem-se a diligencia do capitão, e, deixando elle de a promover, a diligencia dos proprietários do navio ou da carga, sem prejuizo da responsabilidade d'aquelle.
§ único. O capitão apresentará, junto com o seu relatório e protesto devido, todos os livros de bordo e mais documentos concernentes ao sinistro, ao navio, e á carga.
Art. 679.° Não haverá logar a acção por avarias contra o afretador e recebedor da carga, se o capitão recebeu o frete, e entregou as fazendas sem protesto, ainda que o pagamento do frete fosse antecipado.

TITULO VI

Das arribadas forçadas

Art. 680.° São justas causas de arribada forçada:
1.º A falta de viveres, aguada, ou combustível;
2.° O temor fundado de inimigos;
3.° Qualquer accidente que inhabilite o navio de continuar a navegação.
Art. 681.° Em qualquer dos casos previstos no artigo precedente, ouvidos os principaes da tripulação, e lançada e assignada a resolução no diário da navegação, o capitão poderá proceder á arribada.
§ 1.° Os interessados na carga que estiverem a bordo, podem protestar contra a deliberação tomada de proceder á arribada.
§ 2.° Dentro de quarenta e oito horas, depois da entrada no porto da arribada, deve o capitão fazer o seu relatório perante a auctoridade competente.
Art. 682.º São por conta do armador, ou fretador, as despezas occasionadas pela arribada forçada.
Art. 683.° Considera-se legitima a arribada que não proceder de dolo, negligencia, ou culpa do dono, do capitão ou da tripulação.
Art. 684.° Considera-se illegitima a arribada:
1.° Se a falta de viveres, aguada, ou combustível, proceder de se não ter feito o necessario fornecimento, ou de se haver perdido por má arrumação ou descuido;
2.° Se o temor de inimigos ou piratas não for fundado em factos positivos e justificáveis;
3.° Nascendo a ruina do navio da falta de bom concerto, apercebimento, equipação, e má arrumação;
4.° Resultando de disposição desacertada do capitão ou de falta de precaução sua.
Art. 685.° Sendo a arribada legitima, nem o dono nem o capitão respondem pelos prejuízos, que, da mesma, possam resultar aos carregadores ou proprietários da carga.
§ único. Sendo illegitima o capitão e o dono serão, conjunctamente, responsáveis até á concorrência do valor do navio e frete.
Art. 686.° Só póde auctorisar-se descarga, no porto da arribada, sendo indispensável para concerto do navio ou reparo de avaria na carga, devendo, nestes casos, preceder, no reino e seus domínios, auctorisação do juiz competente, e, no estrangeiro, auctorisação do agente consular, havendo-o, e, em sua falta, da auctoridade local.
Art. 687.° O capitão responde pela guarda e conservação da carga descarregada, salvos os accidentes de força maior.
Art. 688.° A carga avariada será, reparada ou vendida, segundo as circumstancias, precedendo a auctorisação mencionada no artigo 679.°, sendo o capitão obrigado a comprovar, ao carregador ou consignatário, a legitimidade do seu procedimento, sob pena de responder pelo preço que teria como boa no logar do destino.
Art. 689.° O capitão responderá pelos prejuízos resultantes de toda a demora injustificada no porto da arribada; mas tendo esta procedido de temor de inimigos, a saída será deliberada, em conselho dos principaes da equipagem, e interessados na carga que estiverem a bordo, nos mesmos termos legislados para determinar a arribada.

TITULO VII

Da abalroação

Art. 690.° Occorrendo abalroação de navios por accidente, puramente, fortuito, ou devido a força maior, o damno é supportado pelo navio que o soffreu.
Art. 691.° Havendo duvida sobre a causa da abalroação cada navio soffre o seu damno, mas responde, solidariamente, pelos damnos causados á respectiva carga, e indemnisações devidas às pessoas.
Art. 692.° Dando-se culpa da parte de ambos os navios, fórma-se um capital dos prejuízos soffridos, que será supportado pelos respectivos navios em proporção á gravidade da, culpa de cada um.
Art. 693.° Sendo a abalroação devida á culpa de um dos navios, o damno inteiro soffrido pelo navio abalroado, assim como a indemnisação devida às pessoas, será supportada pelo navio abalroador.

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Art. 694.° A abalroação presume-se fortuita, salvo:
1.° Quando o navio está mal amarrado, ou sem guarda de bordo;
2.° Estando mal collocado num porto ou ancoradouro, ou não guardando as distancias marcadas nos respectivos regulamentos, ou estabelecidas pelo uso;
3.° Levantando-se de noite sem se ter posto em franquia, ou navegando a todo o panno, ou a toda a força da machina, junto de outro navio fundeado;
4.° Tomando, na entrada de um porto, a dianteira de outro navio que entrou primeiro, não se desviando, á saída, de outro que venha entrando, ou não se acautelando para não ir sobre o navio saído pouco antes d'elle;
5.° Quando, navegando, não tomou a direcção devida para evitar a abalroação de outro que, pairando, não: póde desviar-se, ou que esteja fundeado;
6.° Quando navegar com os pharoes regulamentares apagados;
7.° E, em geral, quando não observar os regulamentos geraes de navegação e os especiaes do porto.
Art. 695.° Quando a abalroação é motivada por falta de um terceiro navio, e não póde prevenir-se, é este que responde.
Art. 696.° Se um navio, avariado por abalroação, se perde, quando busca porto de arribada, para se concertar, deve presumir-se a perda como resultante de abalroação.
Art. 697.° A responsabilidade dos navios, estabelecida nos artigos antecedentes, não isenta os auctores da culpa para com os prejudicados e proprietários dos navios.
Art. 698.° Em qualquer caso em que a responsabilidade recáe sobre o capitão, se o navio ao tempo da abalroação, e em observância dos regulamentos, estiver sob a direcção do piloto do porto, ou pratico da costa, o capitão tem direito a ser indemnizado pelo piloto, ou corporação de pilotos, havendo-a.
Art. 699.° A reclamação por perdas e damnos resultantes da abalroação de navios será apresentada no praso de três dias á auctoridade do logar em que succedeu, ou do primeiro a que, aportar sob pena de que deixando de se fazer, não será admittida a acção de indemnisação.
§ único. A falta de reclamação, quanto aos damnos causados às pessoas e mercadorias, não prejudica os interessados, que não estavam a bordo, e que estavam impedidos de manifestar a sua vontade.
Art. 700.° As questões sobre abalroações regulam-se:
1.° Nos portos e aguas territoriaes, pela respectiva lei local;
2.° No mar alto, entre navios da mesma nacionalidade, pela lei da sua nação;
3.° No mar alto, e, entre navios de nacionalidade differente, cada um é obrigado nos limites da lei do pavilhão, não podendo receber mais do que esta lhe conceder.
Art. 701.° A acção por perdas e damnos, resultantes da abalroação, póde instaurar se no tribunal do logar onde se deu a abalroação, no do logar onde for encontrado o navio abalroador, e, finalmente, no tribunal a que pertencer porto do ancoradouro do navio abalroador ou abalroado.

TITULO VIII.

Da salvação e assistência

Art. 702.° Não é licito a qualquer apropriar-se pela occupação, de embarcações naufragadas, ou seus (fragmentos, da sua carga, ou de quaesquer fazendas, ou objectos, do domínio particular que o mar arrojar às praias, ou se apprehenderem no alto mar.
Art. 703.° O que salvar um navio ou fazendas naufragadas, e não fizer, immediatamente, entrega ao dono ou quem o representar, sendo-lhe pedida, e, dando, este, caução bastante às despezas de salvação, perderá todo o direito a qualquer salário de assistência ou salvação, respondendo pelos damnos causados pela retenção, sem prejuízo da acção criminal, se a esta houver logar.
Art. 704.° Aquelle que salvar ou arrecadar um navio ou fazendas, no mar ou nas costas, na ausência do dono ou seu representante, não sendo este conhecido, transportará e entregará, immediatamente, á auctoridade do logar mais próximo da salvação, os objectos salvos; e não o fazendo, perderá o direito que tiver a qualquer salário de assistência ou salvação, e responderá por perdas e damnos, sem prejuízo da acção criminal, se a esta houver logar.
Art. 705.° O salvamento dos navios encalhados em perigo, e naufragados, e das fazendas arrojadas á costa, quer o capitão esteja presente, quer ausente, só poderá haver logar sob a direcção exclusiva da auctoridade a quem competir.
§ único. Incumbe á auctoridade que presidir ao salvamento:
1.° Inventariar os objectos salvos, provendo á sua arrecadação.
2.° Ordenar, não havendo reclamação, a venda publica, das fazendas sujeitas a perda immediata, ou cuja conservação e guarda for, evidentemente prejudicial, aos interesses do proprietário;
3.° Annunciar, dentro dos oito dias seguintes á salvação, em um dos periódicos da localidade, ou da mais próxima que houver, todas as circumstancias do. sinistro, com designação das marcas e números das fazendas, e convidar os interessados a fazer as suas reclamações;
4.° Dar superiormente conta do evento, e das providencias tomadas;
5.° Praticar tudo mais que os regulamentos especiaes prescreverem.
Art. 706.° Apresentando se o dono, ou seu legitimo representante, a reclamar, ser-lhe hão entregues, provado o seu direito, os objectos salvos, ou o seu producto, pago o salário devido e mais despezas, ou prestada caução idónea.
§ 1.° Havendo duvida sobre o direito do reclamante, opposicão de terceiros, ou contestação sobre a salvação, serão as partes remettidas para juízo.
§ 2.° Não apparecendo reclamantes, depois dos annuncios mencionados no n.° 3 do artigo antecedente, os objectos salvos serão vendidos, em almoeda, e o seu producto, deduzidas as despezas de salvação, será consignado no deposito judicial.
Art. 707.° Deve-se salário de salvação:
1.° Quando os navios, ou fazendas, encontrados sem direcção no mar alto ou nas praias, são salvos e recuperados;
2.° Salvando se fazendas de um navio dado á costa ou varado sobre penedos em perigo tal, que não possa offerecer, segurança á carga, e asylo á tripulação;
3.° Retirando-se fazendas de um navio, effectivamente, partido;
4.° Quando o navio em perigo imminente, e sem segurança, abandonado pela tripulação, ou tendo-se esta ausentado, é occupado pelos que querem salvai-o, e conduzido ao porto com toda ou parte, da carga;
5.° Quando o navio e carga conjuncta ou separadamente, são repostos no mar, ou conduzidos a bom porto, com ajuda de terceiro.
§ único. Não têem direito a salário de salvação ou assistência:
1.° Ás pessoas que pertencem á tripulação do navio;
2.° Aquelles ,que impozeram os seus serviços.
Art. 708.° Todos os contratos feitos em quanto dura o perigo, podem ser reclamados por exageração, e reduzidos pelo juiz competente.

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Art. 709.° Na falta de convenção, ou, sendo esta contestada, o salário de salvação ou assistência é fixado pelo juiz competente, regulando-se segundo as regras da equidade, e tendo principalmente em consideração as circumstancias seguintes:
1.ª A natureza do serviço;
2.ª O zelo havido;
3.ª O tempo empregado;
4.ª Os serviços prestados ao navio, às pessoas e às cousas;
5.ª As despezas feitas;
6.ª As perdas soffridas pelos salvadores ou assistentes;
7.ª O numero de pessoas que intervieram activamente;
8.ª O perigo a que essas pessoas se expozeram;
9.ª O perigo que ameaçava o navio, as pessoas e as cousas salvas;
10.ª E o valor actual dos objectos salvos, deduzidas as despezas.
Art. 710.° O salário de salvação ou assistência comprehende todas as despezas feitas pelos salvadores ou assistentes; mas não comprehende os honorários, custas, direitos e impostos, e as despezas de guarda, conservação, avaliação e venda, feitas com os objectos salvos.

1.° O salário de assistência deve ser fixado em menos do que o de salvação.
§ 2.° O valor dos objectos salvos não deve exercer mais de que uma influencia secundaria para se fixar o salário.
Art. 711.° Quando muitos tomarem parte nos serviços prestados ao navio ou á sua carga, o salário devido reparte-se em proporção ao serviço das pessoas, e ao fornecimento de objectos empregados n'aquelles serviços.
§ 1.° Em caso de duvida divide se por cabeça.
§ 2.° Os que se expozeram ao perigo para salvamento de pessoas, serão admittidos á partilha do salário nas condições referidas.
Art. 712.° Sendo o serviço de salvação ou assistência prestado por outro navio, pertence metade do salário ao armador,, um quarto ao capitão, e uai quarto á tripulação na proporção das respectivas soldadas, salva convenção em contrario.
Art. 713.° O navio, seus fragmentos, e fazendas, salvos do naufrágio ou varação, ficam, especialmente, obrigados por privilegio ao pagamento dos salários de salvação ou assistência, e mais despezas que occasionarem.
§ 1.° O privilegio de que trata este artigo é subrogado no preço, producto da venda dos objectos salvados.
§ 2.° O referido privilegio dará direito á retenção dos objectos obrigados.
§ 3.° O capitão responderá, pessoalmente, pelos salários e despezas devidas, se entregarmos objectos salvos, sem que fique garantido o referido privilegio.
Art. 714.° O dono dos objectos salvos não responde, pessoalmente, pelo salário de salvação ou assistência.
§ único. O destinatário, que tinha conhecimento da divida responde, pessoalmente, por ella, até onde as fazendas que lhe forem entregues, chegarem.
Art. 715.° A salvação ou assistência, nos portos, rios e aguas interiores será regulada pela lei do logar onde se der, e no mar alto, pela lei da nacionalidade do salvador ou assistente.
§ unico. No caso de contestação sobre os effeitos, dos créditos procedentes de salário de salvação ou assistência, observar-se-ha a lei do pavilhão.
Art. 716.° A reclamação sobre salários devidos por salvação ou assistência será intentada no tribunal em cuja jurisdicção se verificar o evento, em qualquer tribunal em cuja jurisdicção seja encontrado o navio salvo ou assistido, e j finalmente no tribunal do ancoradouro do navio, ou do domicilio dos donos dos objectos salvos.

LIVRO QUARTO

Das fallencias

TITULO I

Da quebra e sua declaração

Art. 717.° O commerciante, que cessa pagamentos de suas obrigações commerciaes, presume-se em estado de quebra, que deve ser, judicialmente, declarada.
Art. 718.° A quebra póde ser declarada até um anno depois da cessação dos pagamentos, a que se refira, não obstante ter, entretanto, fallecido o negociante, ou deixado de exercer o commercio por outro motivo.
Art. 719.° Antes da cessação de pagamentos, póde declarar-se a quebra, verificada que seja a insufficiencia do activo para satisfação do passivo e consequente desigualdade por pagamento a uns credores, em prejuizo de outros.
Art. 720.° Para decretar a abertura da quebra é competente tanto o tribunal do logar onde é domiciliado o negociante ou tem sede a sociedade, como aquelle onde exista o principal estabelecimento.
Art. 721.° O tribunal que primeiro decretar a abertura da quebra fica sendo o único competente para a exigência de quaesquer créditos contra o fallido.
§ único. Se algum credor tiver execução pendente contra o fallido, não poderá esta proseguir, devendo o respectivo processo appensar-se ao da fallencia, para serem attendidos os direitos que o exequente, ao tempo, tiver.
Art. 722.° O tribunal póde decretar a abertura da quebra:
1.° Por declaração do fallido;
2.° A requerimento de um ou mais credores ;
3.° Sob promoção do ministerio publico.
§ único. Não serão admittidos a requerer a abertura da fallencia, os descendentes, ascendentes, e o cônjuge do devedor.
Art. 723.° A apresentação do estado de quebra pelo próprio fallido é obrigatória, para este, nos dez dias seguintes á suspensão de pagamentos, sob pena de se presumir culpa na quebra.
Art. 724.° Os credores, que requererem a abertura da quebra devem, desde logo,. justificar a existência dos seus créditos, e que estes são provenientes de acto commercial, e declarar, especificadamente, os fundamentos do pedido, e da conveniência, se a houver, de ser declaradda, sem audiência, do arguido
Art. 725.° O ministerio publico só poderá promover a declaração da quebra, quando esta for notória, ou quando recear dissipação ou occultação de bens, abandono d'estes, ou análoga circumstancia, que augmente a insolvência.
Art. 726.° O tribunal, a requerimento dos credores ou sob promoção do ministerio publico, póde declarar a abertura da quebra, sem mandar ouvir o arguido, ou fazer citar este para responder, querendo, em vinte e quatro horas.
§ 1.° A falta de resposta no praso fixado pelo tribunal, equivale á confirmação do estado de quebra.
§ 2.° Os credores, que requererem a abertura da quebra, sem audiência do fallido, respondem, para com elle, por perdas e damnos, sendo convencidos de falta de fundamento para a quebra, e salva, sempre, a acção criminal, se a ella houver logar.
Art. 727.° A declaração da quebra opera immediatamente a interdicção civil do fallido.
§ 1.° A incapacidade do fallido é supprida pelo administrador e curadores fiscaes, que o ficam representando em juizo, e, fora delle, para todos os effeitos legaes.
§ 2.° Conjunctamente com o administrador e curadores deverá ser demandado o fallido, o qual tem direito a ser ouvido em todas as alienações voluntárias, transacções, e accordos, que hajam de ser feitos.

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§ 3.° O administrador, póde praticar todos os actos de administração geral, ficando, porém, sempre dependente de expressa resolução do tribunal a concessão de quaesquer poderes especiaes.
Art. 728.° Da administração dos bens do fallido, e da liquidação e gerencia do seu commercio, deverá o tribunal encarregar pessoa idónea, logo que declare a quebra.
§ 1.° O administrador será escolhido entre pessoas, estranhas aos credores, e não parentes até ao quarto grau do fallido, e remunerado na quantia que o tribunal fixar.
§ 2.° O tribunal do commercio pôde, se o entender conveniente, formar uma lista das pessoas mais idóneas para exercerem o officio de administrador nas fallencias, a qual será renovada em todos os sexennios.
§ 3.° Onde existir a lista mencionada no § 2.°, o administrador deve ser escolhido entre as pessoas nella comprehendidas, salvo se o tribunal, em decisão fundamentada, reputar conveniente a nomeação de outra pessoa.
§ 4.º As pessoas inscriptas na lista de que trata o § 2.°, podem ser incluídas na dos sexennios seguintes.
§ 5.° O administrador de qualquer fallencia não cessa as funcções que lhe foram encarregadas ainda que, findo o sexenhio, não seja incluído na nova lista.
Art. 729.° O administrador da massa fallida deve entrar, immediatamente, no exercício de suas funcções, assignando o respectivo termo, praticando, quanto for conveniente, á conservação dos bens e direitos do fallido, no interesse delle e dos seus legítimos credores, e averiguar com o maior escrúpulo o estado da massa fallida, condições em que foi exercido o commercio pelo fallido,- e causas determinantes da quebra.
§ 1.° O administrador, nomeado ao fallido, póde receber delle, particularmente, os bens e valores, ou exigir a entrega official, por inventario, com intervenção do juizo da quebra.
§ 2.° O tribunal, para segurança dos bens da massa fallida, póde, a requerimento de dois ou mais credores ou sob promoção do ministerio publico, ordenar que a entrega se faça officialmente.
§.3.° A imposição de sellos no escriptorio, estabelecimento, e casa do fallido, sómente é obrigatória quando a entrega tiver de ser feita, officialmente, por inventario.
§ 4.° Da apprehensão e posse dos bens do fallido pela administração são excluídos os bens, que a lei isenta de penhora.
Art. 730.° A escripturação do fallido será, por elle, e, na sua falta, pelo administrador, apresentada na secretaria do tribunal, para ali ser encerrada e rubricada pelo juiz presidente, sendo, depois, entregue ao administrador que deve deixal-a examinar aos interessados e seus representantes.
Art. 731.° O fallido, a requerimento seu, e com annuencia do administrador da massa fallida; póde ficar encarregado de auxiliar a administração, e de praticar designados actos de gerencia d'ella, com o vencimento e pelo praso, que o tribunal determinar, ouvidos os curadores fiscaes.
§ único. Não existindo presumpção de fraude ou culpa na quebra, o fallido, sendo commerciante matriculado, terá direito a alimentos pela massa fallida.
Art. 732.° O tribunal, na sentença de declaração da quebra, nomeará, alem do .-administrador da massa fallida, dois, ou mais, curadores fiscaes, dentre os credores do fallido, e assignará o praso para a reclamação dos créditos.
§ único. O praso referido neste artigo não poderá ser inferior a trinta dias, nem superior a noventa.
Art. 733.° Aos curadores fiscaes incumbe:
§ 1.° Consultar, com o seu parecer, sobre os assumptos relativos á quebra, em que o tribunal queira ouvil-os;
§ 2.° Aconselhar o administrador da massa fallida;
§ 3.° Vigiar pelo rigoroso cumprimento das obrigações do administrador, devendo informar o tribunal de quaesquer irregularidades, que, entendam, elle haja praticado;
§ 4.° Requerer a destituição, e substituição do administrador.
Art. 734.° Declarada a quebra, o fallido que não tiver requerido ou impugnado a sua abertura, pôde, dentro de dez dias da publicação da respectiva sentença, oppor-lhe embargos.
§ único. Só podem servir de fundamento aos embargos:
1.° Estar o arguido, concordado, ou em moratória legal;
2.° Não ter suspendido pagamentos de obrigações commerciaes vencidas, ou havidas como taes;
3.° Ter justo e legal motivo para recusar, ou para fazer, os pagamentos, a que se tiver referido a declaração da quebra.
§ 1.° Fundando se os embargos em justificação do facto, ou da recusa de pagamentos, deverá allegar-se e provar-se haver sufficiencia de bens, para integral e opportuno pagamento a todos os credores.
§ 2.° Allegando os embargos concordata ou moratória, não homologada, será a final proferida uma só decisão sobre os dois incidentes.
§ 3.° Os embargos não suspendem o andamento do processo da fallencia até á graduação dos credores.
Art. 735.° O tribuual, antes de declarar aberta a quebra e de julgar os embargosa ella oppostos, póde auctorisar a producção das provas que tiverem sido offerecidas, e outras diligencias judiciaes, que entenda necessárias á decisão da causa.
§ único. Julgando o tribunal desnecessária, ou impertinente, qualquer prova pretendida pelos interessados, assim o declarará, cabendo dessa decisão recurso, conjunctamente com o da decisão final.
Art. 736.° A declaração da quebra produz o immediato vencimento de todos os créditos, e a suspensão de juros contra o fallido, e auctorisa a mulher a requerer a separação de bens, sem prejuízo da responsabilidade, em que esteja para com os credores.
§ 1.° Revogada a declaração da quebra, ficam nullos quaesquer effeitos d'ella.
§ 2.° Dos créditos não vencidos, que só por effeito de fallencia ficam exigíveis, serão descontados os juros, que n'elles se achem accumulados ou capitalisados relativos ao praso, que faltava para seu regular vencimento.
Art. 737.° O administrador e os curadores fiscaes nomeados podem ser, livremente, substituídos pelo tribunal a requerimento delles, do fallido, e do qualquer numero de credores, ou sob promoção do ministerio publico, e devem ser removidos sempre que o exigirem dois terços do numero total conhecido de credores, ou menos, representando, neste caso, dois terços do passivo da ma«sa fallida.
§ 1.° Antes de resolvida a substituição ou remoção do administrador ou dos curadores, serão elles ouvidos e devem continuar no exercício e cumprimento dos seus deveres até á investidura e posse dos novamente nomeados.
§ 2.° A entrega de bens e valores ao novo administrador pelo anterior é applicavel o disposto no artigo 729.°
Art. 738.° Na sentença de abertura da quebra, ou depois della, em qualquer estado do processo, póde o tribunal ordenar a prisão do fallido e dos seus co-réus, auctores, ou cúmplices, se reconhecer que procederam com culpa ou fraude, sem prejuízo dos ulteriores termos para definitiva classificação da quebra.
§ único. O disposto neste artigo não altera as regras de admissibilidade de fiança ou, termo de identidade e residência, para evitar a prisão preventiva, que, aliás, sem essas garantias, os réus soffrerão até final julgamento e cumprimento da pena, em que forem condemnados.

TITULO II

Da verificação do passivo

Art. 739.° O fallido, com a apresentação do seu estado de quebra, ou o administrador da massa, na falta d'elle, e

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antes de findar metade do praso fixado para a reclamação dos créditos, deve juntar ao processo um balanço circumstanciado do activo e passivo, acompanhado documentos, esclarecimentos, observações, e explicações, que melhor sirvam a mostrar e comprovar, as circumstancias da massa fallida,
Art. 740.° Os credores do fallido, publicada que seja a sentença declaratoria da quebra, e dentro do praso marcado pelo tribunal, reclamarão, independentemente de qualquer outra citação ou aviso, a verificação e classificação dos seus créditos, comprovando, em devida forma, a existência, natureza, e circumstancias d'elles.
§ 1.° A prova documental deve ser junta com o requerimento de reclamação dos créditos, e as outras provas de testemunhas, ou exame, serão tambem indicadas para serem, opportunamente, produzidas, se não forem dispensadas por desnecessárias para a verificação.
§ 2.° Os documentos, que não forem logo juntos ao requerimento, e a mais prova, por que não se protestar com a designação necessária á sua producção, não serão admittidos.
Art. 741.° Findo o praso designado para a reclamação dos créditos, poderão os credores impugnar, por escripto, a verificação ou classificação de quaesquer dos créditos reclamados, comtanto que o façam dentro dos dez dias seguintes.
§ único. E applicavel a esta impugnação o disposto nos paragraphos do artigo antecedente.
Art. 742.° Nos dez dias seguintes ao praso, facultado para a impugnação dos créditos ou da natureza d'elles, o administrador da massa fallida dará parecer breve, mas fundamentado, sobre cada um dos créditos reclamados declarando, especificadamente, o que, a respeito d'elles, constar da escripturação e documentos do fallido, e prestando, ao tribunal, os esclarecimentos, que forem convenientes á boa decisão sobre o assumpto, e sobre a data, desde quando considera existente a quebra.
§ 1.° O administrador da massa fallida pode exigir, de qualquer credor, as informações e provas, que entender necessárias, ao seu parecer sobre o passivo reclamado.
§ 2.° Constando ao administrador a existência de créditos, não reclamados, e que lhe pareçam reaes e verdadeiros, d'elles fará. menção, em separado, interpondo, também, sobre elles, o seu parecer.
Art. 743.° O processo da verificação de créditos é, igualmente, applicavel á entrega a seus legítimos donos, de fazendas, ou outros bens, de terceiros, que existam na massa fallida, e de que fosse consignatário, commissario, ou, por outro titulo, mero detentor, o fallido.
Art. 744.° Reclamados os créditos e a entrega de bens, deduzidas as impugnações, e dado parecer pelo administrador da massa fallida, ou decorridos os respectivos prados legaes, será o processo continuado, logo, com vista por cinco dias, ao ministerio publico, para dizer, o que se lhe offerecer no interesse, geral dos credores, e especial, da fazenda nacional, e promover a apresentação, em audiência, para julgamento sobre os créditos, entrega de bens, e determinação da data da quebra.
§ 1.º Consideram-se verificados todos os créditos reclamados, e o direito á entrega de bens, que não forem impugnados, e, sobre os outros, resolverá o tribunal em uma só audiência.
§ 2.º As testemunhas serão inquiridas na audiência do julgamento, mas se houver de proceder-se a exame, ou outra qualquer diligencia, que tenha sido requerida, e que o tribunal não declare impertinente, sobrestará este no julgamento pelo tempo para isso indispensável.
§ 3.º A louvação para o exame é commum a todos os credores, a que elle respeitar.
§ 4.° Este julgamento abrangerá todos os créditos, havendo por confessados os que não tiverem sido impugnados, e resolvendo as impugnações e reclamações feitas pelo administrador.
Art. 745.º O tribunal, antes ou depois da producção da prova indicada, póde declarar dependente de alta indagação o julgamento da reclamação, abstendo-se de a julgar, e deixando ao interessado direito salvo para acção separada,
§ único. Esta acção póde ser proposta contra os administradores e curadores, que representarão todos os credores, sem prejuízo do direito destes a intervirem na causa, querendo.
Art. 746.° O direito salvo para acção separada, e a pendência conhecida de outra causa, tem o effeito de protesto em concurso de preferencias, se for, aquella, instaurada dentro de trinta dias, e se, se tanto no caso de instauração, como no de pendência, de acção, não houver perempção de instancia.
Art. 747.° Feita a verificação, e transitada a respectiva sentença, ou expedido o recurso, serão os autos da fallencia conclusos, immediatamente, ao juiz, para determinar a graduação na forma legal.
§ 1.° A decisão do concurso será regulada pelos preceitos do código civil, e disposições especiaes deste código de commercio.
§ 2.° A graduação dos credores será geral para os bens da massa fallida, e, ao mesmo tempo, particular para certos bens, a que respeitarem os privilégios ou cauções, de que se tratar e sobre que houver de se resolver.
Art. 748.° A determinação da data da quebra estabelece presumpção legal, de insolvência contra terceiros, alheios ao processo da quebra, e faz prova plena, desse facto, contra os credores, que a elle tiverem concorrido.
§ único. As alienações e pagamentos effectuados, depois da insolvência,, e bem assim as preferencias, indevidamente, obtidas desde essa epocha, e quaesquer outros actos prejudiciaes aos credores, serão nullos, de direito, sem distinguir entre boa e má fé, quanto aos praticados num praso inferior a sessenta dias, anterior á data da publicação da sentença que determina a quebra.
Art. 749.° As obrigações, débitos, e responsabilidades, contrahidas pelo administrador da massa fallida, são alheias á verificação do passivo, e têem preferencia sobre os direitos e créditos contra o fallido.
Art. 750.° Da sentença, que fixar a data da quebra, e decidir a verificação e a entrega dos bens, e da que determinar a graduação dos créditos, cabe appellação sem effeito suspensivo.
§ único. Este recurso pode ser interposto pela parte vencida, quer seja credor, administrador, ou o ministerio publico, ou ainda o fallido por si.

TITULO III

Da valorisação e liquidação do activo

Art. 751.° O balanço do fallido, quer seja apresentado por elle, quer pelo administrador, será acompanhado do inventario circumstanciado do activo.
§ único. A falta, ou insuficiência do inventario, feito pelo fallido, será supprida pelo administrador, antes de concluída a verificação do passivo.
Art. 752.° O administrador, que discordar do valor attribuido, pelo fallido, a qualquer parte do activo, deverá informar o tribunal, podendo promover a avaliação judicial por exame dos bens, para que entender necessária tal diligencia.
§ único. O tribunal pode igualmente decretar a requerimento, de credores, ou do ministério publico, que se proceda às avaliações por exame.
Art. 753.° Os créditos do fallido deverão ser, solicitamente, cobrados pelo administrador, á medida do venci-

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mento, procedendo elle, particular ou judicialmente, segundo as circumstancias, e podendo o tribunal auctorisar, porá o pagamento, a concessão, aos devedores, dos prasos, que forem convenientes para mais segura liquidação.
§ único. A concessão de prasos, suas condições e garantias, depende de requerimento do administrador, sem o que não póde ser decretada.
Art. 754.° O administrador da massa fallida poderá continuar o giro commercial do fallido, se o entender conveniente á melhor valorisação do activo, e, para o mesmo, fim póde requerer, e o tribunal auctorisar, a venda immediata de quaesquer bens do fallido, que não convenha demorar.
Art. 755.° Finda a verificação do passivo, e não havendo suspensão da quebra, promoverá o administrador a venda e liquidação de todo o activo, até completa extincção da massa fallida.
§ 1.° A venda dos bens e direitos da massa fallida são applicaveis as disposições do código de processo civil relativas às execuções, nos termos posteriores á avaliação.
§ 2.° O tribunal, no interesse dos credores e a requerimento do administrador, pude auctorisar a suspensão da venda de quaesquer bens ou direitos, por tempo não superior a um anno.
Art. 756.° O producto de toda a liquidação entrará na caixa geral de depositos, ou suas delegações, e será levantado pelos credores, nos precisos termos da graduação.
§ 1.° Emquanto houver recursos pendentes ou acções com effeito de protesto de preferencias, nenhum credor, a que a decisão possa interessar, póde effectuar qualquer levantamento sem prestar caução.
§ 2.° Os precatórios de levantamentos, para pagamento integral ou em rateio, a qualquer credor, deverão ser feitos com a maior brevidade, mas nunca em proporção inferior a cinco por cento, salvo o caso de ser a ultima distribuição geral da massa fallida, ou particular dos bens, especialmente obrigados a determinados pagamentos.
Art. 757.° Os bens próprios do conjuge do fallido e os separados como taes da meação, e bem assim quaesquer outros bens de terceiros, serão entregues a seus donos, pelo administrador, em execução contra elle movida por appenso ao processo da quebra.
§ único. Do mesmo modo se procederá quanto á execução das sentenças proferidas fora do processo da quebra.

TITULO IV

Da suspenão da fallencia

Art. 758.° Antes da declaração da quebra, ou depois, e em qualquer estado d'ella, podem, conceder moratória-ou fazer outra qualquer concordata com o devedor, os legítimos credores d'elle, em numero não inferior a dois terços, e representando dois terços tambem pelo menos da totalidade dos créditos.
§ 1.° A moratória não póde exceder a um anno nem ser prorogada por mais de outro periodo igual e por uma vez sómente.
§ 2.° A concordata não póde ser acceita em percentagem inferior a cincoenta por cento, pagas em praso não excedente a dois annos e sob caução idonea.
§ 3.° Os credores que acceitarem a moratória ou concordata perdem todo o direito a qualquer preferencia ou privilegio de graduação, a que tivessem direito.
Art. 759.° A moratoria e concordata só podem ser estipuladas em titulo authentico ou authenticado, e deverão ser submettidas á homologação do tribunal, para verificar as condições legaes da sua concessão.
§ único. A acceitação da concordata, ou moratória, pelos credores; residentes, fora do juízo da quebra, prova-se por qualquer meio de prova escripta, com tanto que seja expressa e anterior á authenticação do respectivo titulo, no qual o official publico, que n'elle intervier, deverá fazer espacial menção d'esse facto.
Art. 760.° Os credores, certos e incertos, que não tenham acceitado a moratória ou concordata, serão chamados por éditos de trinta dias a opporem, o que considerarem ser de seu direito.
§ 1.° O ministerio publico, no interesse geral dos credores, e como fiscal do cumprimento da lei, será ouvido sobre a concordata ou moratória, ainda que a fazenda nacional não seja credora, e, para isso, terá vista do processo por cinco dias, findo que seja o praso dos editos.
§ 2.° A homologação, ou rejeição, da moratória, ou da concordata será proferida pelo tribunal dentro dos dez dias posteriores aos éditos.
Art. 761.° Havendo questão sobre o numero dos legítimos credores, importancia do seus créditos, legalidade das clausulas da moratória ou concordata, percentagem desta, o tribunal decidirá.

TITULO V

Da classificação da quebra

Art. 762.° Suspenso, que seja, o processo da quebra, por moratoria ou concordata, ou logo que tenha começado o rateio e principio de pagamento aos credores na liquidação do activo da massa fallida, devem o ministerio publico e o administrador, e póde qualquer credor, deduzir artigos de classificação da quebra.
Art. 763.° A quebra será classificada, segundo a sua causa determinante, em casual, culposa ou fraudulenta.
Art. 764.° A quebra é casual, quando o negociante fallido, tendo procedido na gerencia do seu commercio com honrada solicitude, foi forcado a suspender pagamentos pôr causa independente da sua vontade.
§ único. A quebra ainda que occasionada, próxima e directamente, por caso fortuito e força maior, não tendo esta exclusiva causa, deve ser classificada como culposa, se o negociante fallido, pelo seu maior zelo, actividade e prudencia, podesse obstar ao prejuizo de seus credores ou attenuar esses effeitos.
Art. 765.° A quebra é culposa quando o negociante fallido, podendo, pelo emprego de maior zelo, actividade ou prudência, evitar, ou attenuar, os prejuízos de seus legítimos credores, tiver deixado de o fazer; e bem assim quando tiver faltado ao cumprimento dos preceitos legaes sobre uso de firma, arrumação- de seus livros de escripturação; apresentação de documentos a registo, ou, por outra falta ou omissão, tiver dado causa, a que, elle próprio, ou seus legítimos credores, ignorem o estado precário de seus negocios.
§ único. A presumpção de culpa, resultante da falta de apresentação voluntária no tribunal no decendio posterior á suspensão dos pagamentos ou ao reconhecimento da insolvabilidade, só póde ser iludida por prova innequivoca de legitimo e ininterrompido impedimento, claramente, allegado e, concludentemente, demonstrado.
Art. 766.° A quebra é fraudulenta, sempre que o negociante fallido, conhecendo a insufficiencia do seu activo para solução de suas responsabilidades, pagar a quaesquer credores ou lhes facultar meio de obterem preferencia sobre outros.
§ único. É sempre elemento constituitivo de fraude na quebra, e não de mera culpa, a celebração de qualquer acto ou contrato simulado ou feito em prejuizo de terceiro, ou criminoso por algum outro motivo, como são o levantamento de capitães por letras ditas de favor, a compra para revenda immediata com prejuizo antes de pago o preço, e outras abusivas praticas contrarias á boa fé própria e indispensável ao commercio.
Art. 767.° Deduzida a classificação por qualquer das pessoas, para isso, legitimas, que primeiro o fizer, serão intimadas as outras a quem é imposta essa obrigação para,

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662 DIARIO DA CAMABA DOS SENHORES DEPUTADOS

igualmente, deduzirem seus artigos até á primeira audiencia.
§ unico. Até ao fim do praso fixado neste artigo serão recebidos aquelles artigos e quaesquer outros deduzidos pelos credores.
Art. 768.° Decorrido o praso para a deducção de artigos de classificação da quebra será citado o fallido para contestar até á terceira audiência, seguindo o processo seus termos ordinários sem mais articulados.

TITULO VI

Do fim da interdicção e da rehabilitação do fallido

Art. 769.° A interdicção do fallido será levantada a requerimento d'elle, quando tenha obtido concessão de moratória, ou approvação definitiva de concordata, e a sua rehabilitação será, igualmente, decretada em consequência da classificação da quebra como casual, ou do facto de ter cumprido, ou ter-lhe sido perdoada, a pena, em que tiver incorrido por ser culposa ou fraudulenta a fallencia.
§ unico. Annullados os effeitos da moratoria ou da concordata fica, novamente, interdicto o fallido.
Art. 770.° O levantamento da interdicção do fallido, fóra dos casos mencionados na primeira parte do artigo antecedente, sómente póde ser concedido ao fallido nos casos seguintes:
1.° Estado elle quite para com todos os credores que tenham reclamado pagamento por integral pagamento ou perdão d'elles;
2.° Tendo decorrido mais de dez annos e mostrando se extincta a massa fallida, falta completa de bens e pagamento de cincoenta por cento ao menos a todos os seus credores que tenham reclamado pagamento;
3.° Tendo decorrido o dobro deste tempo e mostrando-se pagos vinte e cinco por cento dos créditos e verificadas as outras circumstancias do numero precedente.
Art. 771.° A sentença da classificação da fallencia, fará applicação das penas, que couberem ao caso, segundo o respectivo codigo penal e mais leis vigentes, sendo executoria como criminal, que igualmente fica sendo.
§ 1.° Ao julgamento deve sempre comparecer pessoalmente o fallido para o que será novamente citado.
§ 2.° O julgamento póde ser adiado por espaço não superior a trinta dias para obter a prisão do fallido se elle faltar á respectiva audiencia.
§ 3.° Não se podendo fazer a captara do fallido, será julgado á revelia, sendo previamente citado por éditos de trinta dias com essa comminação.
Art. 772.º Verificando-se do processo da quebra e seus incidentes, que, na culpa ou fraude, ha terceiros co-réus alem do fallido, sejam auctores ou cumplices, deve a sentença de classificação indicial-os para serem, criminalmente, accusados e julgados.
§ 1.° A sentença da classificação da quebra tem para com os terceiros, que indicie, os effeitos de despacho de pronuncia.
§ 2.° A acção criminal contra terceiros seguirá por appenso ao processo da quebra no mesmo tribunal, que appropriará a si a legislação do processo criminal.
§ 3.° Não indiciando a sentença da classificação os coauctores ou cúmplices da quebra culposa ou fraudulenta, podem os credores ou o ministerio publico proceder contra elles separadamente.

TITULO VII

Disposições especiaes às fallencias das sociedades

Art. 773.° A sentença que declarar a quebra de uma sociedade em nome collectivo, ou em commandita declarará, igualmente, a de todos os sócios de responsabilidade illimitada.
§ 1.° No caso previsto neste artigo haverá uma só administração, mas os bens da sociedade serão inventariados e conservados, separadamente, dos dos socios.
§ 2.° Os credores da sociedade serão ouvidos com respeito ao património social, e elles, o os credores pessoaes dos sócios, com respeito aos bens d'estes.
Art. 774.° Nas fallencias de sociedades anonymas, ou em commandita por acções, as respectivas direcções serão ouvidas, sempre que a lei exige audiencia do fallido.
Art. 775.° Os portadores de obrigações de uma sociedade fallida concorrerão á respectiva massa pelo valor da emissão das obrigações, deduzido d'elle tudo quanto se achar amortisado.
Art. 776.° Se os sócios de responsabilidade limitada não houverem, ao tempo da declaração da fallencia, concorrido com tudo a quanto se obrigaram, deve a administração da massa fallida, compellil-os a isso.
Art. 777.° Nas sociedades em nome collectivo e em commandita, podem os credores conceder concordata só a um ou mais dos sócios, de responsabilidade illimitada.
§ 1.° No caso previsto neste artigo os bens particulares do sócio concordado saem do activo social, mas este não responde pelas obrigações da concordata.
§ 2.° O socio concordado fica liberto da responsabilidade solidaria para com os credores da sociedade, mas só se poderá rehabilitar provando pagamento completo das dividas sociaes.
Secretaria d'estado dos negócios ecclesiasticos e de justiça, 17 de maio de 1887. = Francisco António da Veiga Beirão.

Redactor = Rodrigues Cordeiro.

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