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SESSÃO DE 6 DE MARÇO DE 1884

Presidencia do ex.mo sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios- os ex.mos srs.

Francisco Augusto Florido de Monta e Vasconcellos

Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

Dá-se conta de officios: do ministerio da marinha, devolvendo informado o requerimento de D. Thereza da Silva Pessanha; de D. Maria Augusta do Carmo Simões, agradecendo o voto de sentimento pela morte de seu irmão o dr. Augusto Filippe Simões; do ministerio da fazenda, devolvendo informado o projecto de lei n.° 2-E. - Dá-se tambem conta de um telegramma do sr. Pedro Franco ao sr. presidente, declarando que, por motivo de doença, não lhe fôra possivel acompanhar a deputação para que fora nomeado. - Mandou uma nota de interpellação para a mesa o sr. Teixeira de Sampaio. - O sr. Guedes Bacellar requereu para tomar parte n'esta interpellação.-Mandaram representações os srs. Figueiredo Mascarenhas Sousa Cavalheiro e Fonseca Coutinho.- Apresentaram requerimentos de interesse publico os srs. Gonçalves de Freitas e Mariano de Carvalho, e de interesse particular os srs. Custodio Borja e Barbosa Centeno.-- Enviaram pareceres: o sr. Antonio José d'Avila, por parte da commissão de guerra; o sr. Avellar Machado, por parte da commissão de obras publicas; o sr. Carrilho, por parte da commissão de fazenda; o sr. Luiz Lencastre, por parte da commissão de administração. - Instaram pela remessa de informações que tinham requerido, os srs. Santos Viegas e Agostinho Lucio.- Justificaram faltas os srs. Francisco de Campos, Pedro Guedes, Affonso Pequito, Ferreira de Mesquita, Mariano de Carvalho, Teixeira de Sampaio, Gomes Barbosa, por si, e por parte do sr. Borges de Faria; Fontes Ganhado, por parte do sr. Manuel Pedro Guedes; Agostinho Lucio por parte do sr. Firmino Lopes; D. Luiz da Camara por parte do sr. Côrte Real.
Na ordem do dia continuou a discutir se a generalidade do projecto n.º 9, reforma eleitoral, occupando a tribuna, e fallando durante as tres horas da sessão, respondendo aos differentes oradores, o sr. Augusto Fuschini, relator, que já, tinha ficado com a palavra da sessão antecedente.

Abertura- Ás duas horas da tarde.

Presentes á chamada - 51 srs. deputados.

São os seguintes: - Abilio Lobo, Lopes Vieira, Agostinho Lucio, Agostinho Fevereiro, Alberto Pimentel, Sousa e Silva, Azevedo Castello Branco, A. J. d'Avila, Santos Viegas, Neves Carneiro, Trajano, Zeferino Rodrigues, Barão de Ramalho, Sanches de Castro, Conde de Thomar, Custodio Borja, Mouta e Vasconcellos, Francisco de Campos, Gomes Barbosa, Guilherme de Abreu, Freitas Oliveira, Jeronymo Osorio, J. A. Pinto, Brandão e Albuquerque, Scarnichia, Gualberto da Fonseca, Ribeiro dos Santos, Sousa Machado. J. J. Alves, Teixeira de Sampaio, Novaes, Elias Garcia, José Frederico, Figueiredo Mascarenhas, Brandão de Mello, Sousa Monteiro, José de Saldanha (D.), Pereira de Mello, Pinto Leite, Luciano Cordeiro, Luiz de Lencastre, Gonçalves de Freitas, Luiz de Bivar, Luiz da Camara (D.), Manuel de. Arriaga, Correia de Oliveira, Silva e Matta, Bacellar, Miguel Dantas, Barbosa Centeno e Baracho.

Entraram durante a sessão os srs.: - Sousa Cavalheiro, Moraes Carvalho, A. J. Teixeira, Cunha Bellem, A. M. de Carvalho, Fontes Ganhado, Pereira Carrilho, Sousa Pinto de Magalhães, Sieuve de Seguier, Ferreira de Mesquita, Fuschini, Fonseca Coutinho, Castro e Solla, Bernardino Machado, Cypriano Jardim, Emygdio Navarro, Filippe de Carvalho, Wanzeller, Illidio do Valle, Rodrigues da Costa, João Ferrão, Ponces de Carvalho, Avellar Machado, Dias Ferreira, Gonçalves dos Santos, Rosa Araujo, José Luciano, Manuel d'Assumpção, Mariano de Carvalho, Miguel Candido, Pedro Correia, Pedro Roberto, Pedro Martins, Rodrigo Pequito, Tito de Carvalho, Visconde de Balsemão, Visconde de Porto Formoso, Visconde de Reguengos e Visconde do Rio Sado.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adolpho Pimentel, Sarrea Prado, Pereira Côrte Real, A. L da Fonseca, Potsch, Pereira Leite, Castilho, Caetano de Carvalho, Brito Côrte Real, Conde da Foz, Conde do Sobral, Diogo de Macedo, Sousa Pinto Basto, Hintze Ribeiro, Estevão de Oliveira, Severim de Azevedo, Firmino João Lopes, Fortunato das Neves, Gomes Teixeira, Francisco Patricio, Correia Arouca, Palma, Silveira da Motta, Costa Pinto, Franco Frazão, Ferreira Braga, J. A. Gonçalves, J. A. Neves, José Bernardino, Borges Pacheco, Ferreira Freire, Teixeira de Queiroz, J. M. Borges, J. M. doa Santos, Vaz Monteiro, Julio de Vilhena, Lourenço Malheiro, Luiz Palmeirim, Rocha Peixoto, M. J. Vieira, Aralla e Costa, Pedro Guedes, Graça, Marçal Pacheco, Guimarães Camões, Miguel Tudella, Pedro Franco, Pedro Diniz, Visconde de Alentem, Visconde da Ribeira Brava e Wenceslau Pereira Lima.

Acta. - Approvada sem reclamação.

EXPEDIENTE

Officios

1.º Do ministerio da fazenda, devolvendo informado o projecto de lei n.° 2-E.
Á commissão de fazenda.

2.° Do ministerio da marinha, devolvendo informado o requerimento de D. Thereza da Silva Pessanha, viuva do capitão tenente, João Francisco de Mello Breyner.
Enviado á commissão de marinha, ouvida a de fazenda.

3.° De D. Maria Augusta do Carmo Simões, agradecendo á camara o voto de sentimento mandado lançar na acta das suas sessões pela morte de seu irmão, o dr. Augusto Filippe Simões.
Inteirada.

Telegramma

Ex.mo presidente da camara dos deputados.-Rua da Escola Polytechnica, 19, Lisboa. - Por motivo de doença não me é possivel acompanhar a deputação para que tive a honra de ser nomeado. = Pedro Franco.

REPRESENTAÇÕES

l.ª Da camara municipal do concelho de Monchique, districto de Faro, pedindo auctorisação para applicar réis 6:000$000 dos fundos de viação municipal á construcção de edificios adequados para escolas, de instrucção primaria nas tres freguezias do concelho.
Apresentada pelo sr. deputado Figueiredo Mascarenhas.

2.ª Da camara municipal do concelho de Arronches, districto de Portalegre, pedindo para applicar 400$000 réis dos fundos de viação municipal á compra de candeeiros para a illuminação publica.
Apresentada pelo sr. deputado Fonseca Coutinho e enviada á commissão de obras publicas.

3.ª Dos escrivães do juizo de direito da comarca de Serpa, sobre o modo pouco regular por que no ministerio da fazenda se procede á lotação dos seus officios.
Apresentada pelo sr. deputado Sousa Cavaleiro, e enviada á commissão de fazenda, ouvida a de legislação civil.
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REQUERIMENTOS BE INTERESSE PUBLICO

1.° Requeiro a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que no Diario das nossas sessões sejam impressas as duas representações das camaras municipaes de Calheta e de Camara de Lobos, que na sessão de l de março tive a honra de mandar para a mesa. = Luiz Antonio Gonçalves de Freitas, deputado pela Ponta do Sol.

2.° Sequeiro que, pelo ministerio da fazenda, sejam enviados com urgencia a esta camara, os seguintes esclarecimentos: Relação de todos os recursos extraordinarios sobre contribuição industrial, sumptuaria e de renda de casas, que diversos contribuintes do concelho de Figueira da Foz fizeram subir á direcção geral das contribuições directas nos annos de 1882 o 1883, indicando-se o estado actual de cada reclamação. =Mariano de Carvalho.
Mandaram-se expedir.

REQUERIMENTOS DE INTERESSE PARTICULAR

1.° De Guilherme Augusto Ribeiro de Carvalho, alferes do regimento de cavallaria n.° 3, pedindo para ser reintegrado no posto de tenente do exercito de Africa occidental, tornando-se-lhe extensiva a doutrina do aviso do ministerio da guerra de 14 de abril de 1855.
Apresentado pelo sr. deputado Custodio de Borja e enviado á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

2.° De José Maria Alvares Quintino, coronel de infanteria, pedindo que o artigo 72.° da carta de lei de 23 de junho de 1864 seja eliminado da legislação militar, ou que o § unico do mesmo artigo seja applicado aos generaes de brigada.
Apresentado pelo sr. deputado Barbosa Centena e enviado á commissão de guerra, ouvida a de fazenda.

JUSTIFICAÇÃO DE FALTAS

l.ª O sr. deputado José Borges de Faria, encarrega-me de participar a v. exa. e á camara ter faltado á ultima sessão e que faltará a mais algumas por motivo justificado. = Gomes Barbosa.

2.ª Declaro ter faltado á ultima sessão por motivo justificado. = Gomes Barbosa.

3.ª Declaro ter faltado ás duas anteriores sessões por motivo justificado. = Francisco de Campos.

4.ª Participo a v. exa. e á camara que o sr. deputado Carlos Candido Côrte Real não tem comparecido a algumas sessões e faltará a mais algumas por motivo justificado. = D. Luiz da Camara.

5.ª Participo a v. exa. e á camara que por incommodo de saude deixei de comparecer á ultima sessão d'esta camara. = Custodio de Borja.

6.ª Declaro que o sr. deputado por, Penafiel, Manuel Pedro Guedes, não tem comparecido ás sessões por motivo justificado. = Fontes Ganhado.

7.ª Declaro que o sr. deputado Firmino João Lopes, não tem comparecido ás ultimas sessões por motivo de doença. = Agostinho Lucio.

8.ª Declaro que faltei á sessão de 4 do corrente por motivo de serviço publico urgente. =Rodrigo Afonso Pequito.

9.ª Declaro que compareci tarde na camara nos dias 4 e 6 do corrente por estar em serviço publico, como membro da commissão do recenseamento do bairro occidentel. = Mariano de Carvalho.

10.° Declaro que não compareci na camara em 4 do corrente mez, por ter licença da mesma camara para ir como testemunha depor em uma causa affecta ao tribunal do commercio. = Ferreira de Mesquita, deputado secretario.
Mandaram-se lançar na acta.

O sr. A. J. d'Avila: - Por parte da commissão de guerra, mando para a mesa o parecer relativo ao requerimento do major reformado Antonio Maria do Brito, que se julga preterido.
Mandou-se expedir.
O sr. Santos Viagas: - Pedia a v. exa. que tivesse a bondade de me informar, como secretario da commissão dos negocios ecclesiasticos e de justiça, se á mesa já vieram as informações que pedi pelo ministerio da justiça com respeito a um requerimento que tinha sido sujeito á mesma commissão.
O sr. Secretario (Mouta o Vasconcellos): -Na mesa nada consta a esse respeito.
O sr. Gomes Barbosa: - Mando para a mesa justificações de faltas minhas e do sr. deputado José Borges de Faria.
O sr. Teixeira de Sampaio: - Vou dizer o motivo por que faltei no ultimo dia em que não houve sessão, por falta de numero.
O sr. ministro das obras publicas fez o favor de me dizer, que n'esse dia conversaria commigo ácerca do caminho de ferro da Foz do Tua a Mirandella: fui ás onze horas fallar com s. exa. e quando saí era hora e meia. Vim para aqui e quando cheguei á camara, já v. exa. tinha declarado que não podia haver sessão por falta de numero. Eis aqui o motivo por que faltei. Estou aqui desde 17 de dezembro e não me recordo de ter faltado já outra vez.
Agora vou mandar para a mesa a seguinte nota de interpellação.
(Leu.)
Devo dizer a v. exa., que mandando para a mesa esta nota de interpellação não tenho nada absolutamente com os engenheiros os srs. Sousa Brandão e Almeida Pinheiro; ao governo é que hei de pedir contas dos actos particulares a este respeito.
V. exa. deve estar lembrado, que em 29 de novembro do anno passado pedi que pelo ministerio das obras publicas se enviasse a nota do documento que não tinha; mas o sr. ministro das obras publicas teve a bondade de me dizer que na sua secretaria havia muito serviço, que a copia d'esses documentos demoraria muito tempo e que dava muito trabalho, mas que podia ir á secretaria tirar todos os apontamentos do processo original. Aproveitando-me d'essa concessão fui eu mesmo em pessoa tirar uma parto d'essas notas, e a outra parte teve um amigo meu a bondade de as tirar.
São essas notas que acompanham a nota de interpellação. Não têem já se vê a força de uma copia authentica, mas em todo o caso, se houver alguma discrepancia, estão no ministerio das obras publicas os documentos originaes e poderão tirar qualquer duvida que haja a este respeito.
Eu, sr. presidente, esgotei todos os meios ao meu alcance tanto para com o sr. Hintze Ribeiro como para com o sr. Antonio Augusto de Aguiar, a fim de fazer valer os direitos dos povos da margem direita do Douro, e para fazer valer os interesses do estado ácerca da directriz que devia seguir este caminho de ferro. Depois que esgotei todos esses meios, só me resta como representante da nação o tratar aqui a questão com o ministro actual das obras publicas e com o seu antecessor. É o que faço.
Sou muito pequeno, muito insignificante, e faltam-me os recursos precisos para tratar d'esta questão, mas convencido da justiça que assiste aos povos que represento, e em beneficio do thesouro, hei de empenhar todos os meus es-

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forços, se não para vencer, pelo menos pôr bera patente esta justiça e os intereses do estado.
Desejo que o sr. ministro se dê quanto antes por habilitado para responder a esta interpellação a fim de quanto antes liquidar o que ha com respeito ao assumpto.

Nota de interpellação

Declaro que pretendo interpellar o ex.mo ministro das obras publicas a respeito do caminho de ferro de Foz Tua a Mirandella, sobre os pontos seguintes:
1.° Quando, como e por quem foi o engenheiro Almeida Pinheiro auctorisado a fazer o reconhecimento para a construcção do caminho de ferro de Foz Tua a Mirandella pela margem esquerda do Tua, pondo de parte completamente as ordens que lhe foram dadas pela portaria de 11 do janeiro de 1883, elaborada sob as indicações da junta consultiva de obras publicas, exaradas no seu parecer sobre o projecto definitivo, feito pelo engenheiro Sousa Brandão, para a construcção do mesmo caminho de ferro pela margem direita d'aquelle rio?
2.° Em que dia começou o engenheiro Almeida Pinheiro os trabalhos de campo?
3.° Por que motivo só lhe enviara para a Regua só em 29 de agosto, isto é, exactamente no mesmo dia em que elle d'aquella villa remettia para o ministerio das obras publicas os seus trabalhos concluidos, as representações das camaras do Alijó e Murça, em que pediam que o caminho de ferro seguisse a margem direita e não a esquerda do Tua?
4.° Considerado sob os pontos do vista economico e financeiro, qual das margens é preferivel para a sua construcção, a direita ou esquerda do Tua?
5.° Por qual d'ellas é menos oneroso para o thesouro?
6.º Estiveram patentes, na fórma do respectivo annuncio, até á conclusão do acto do concurso, o projecto definitivo do Sousa Brandão, e o reconhecimento de Almeida Pinheiro, ou qual d'elles?
7.° O governo tem, em vista da lei de 19 de fevereiro do anno passado, annuncios para o concurso e contrato provisorio, a faculdade de impor ao concessionario qualquer das margens do Tua para a construcção do caminho de ferro, no todo ou em parte, ou pertence a escolha ao concessionario?
Juntam-se por copia particular:
1.° O parecer da junta consultiva de obras publicas e minas sobre o projecto definitivo do engenheiro Sousa Brandão;
2.° Parecer da mesma junta ácerca do reconhecimento feito pelo engenheiro Almeida Pinheiro;
3.º A citada portaria de 11 de janeiro de 1883;
4.° Finalmente, copia do acto do concurso que teve logar em 14 de dezembro findo. = O deputado por Alijó, Joaquim Teixeira de Sampaio.

Copias a que se refere a nota de interpellação

N.° l

Senhor.-Pela portaria de 12 de junho de 1870, foi ordenado ao coronel do corpo de estado maior do exercito, Francisco Maria de Sousa Brandão, que procedesse ao conhecimento das directrizes de diversas vias ferreas ao norte do rio Douro, na mesma portaria assignadas. Em cumprimento d'esta ordem foram apresentados pelo mencionado engenheiro os seguintes estudos:

Projecto definitivo:

Extensão
-
Metros

1.° Do caminho de ferro de Foz Tua a Mirandella 53:263

Ante-projecto:

2.° Do caminho de ferro de Mirandella a Bragança 67:967
3.° Do caminho do ferro de Mirandella a Vinhaes 46:670
4.° Do caminho de ferro do Focinho á fronteira de Zamora 118:924
5.° Caminho de ferro de Marco de Canavezes a Chaves 104:938
6.° Do caminho de ferro de Braga a Montalegre 82:854
Somma 421:353

Reconhecimentos auxiliares:
7.° Do caminho de forro de Mirandella a Foz Tua 54:500
8.° Do caminho de ferro de Mirandella ao Cobro 19:668
9.° Do caminho de ferro do Valle da Villariça a Castellães 49:000
10.° Do caminho de ferro de Foz Douro a Chaves 20:270
11.° Do caminho de ferro de Morgado a Chaves 48:335
- Somma 189:773

O mesmo engenheiro menciona mais, como linhas estudadas ao norte do Douro, pela companhia do caminho de ferro do Porto á Povoa de Varzim, as seguintes:

12.° Caminho de ferro do Famalicão ao Cavez 94:220
13.° Caminho de ferro da Regua por Villa Real ao Seixo 75:472

Havendo portanto reconhecidos n'esta região:

Pelo estado 664:339
Pela companhia da Povoa de Varzim 169:692
Total 834:031

O exame d'estes estudos mostra que nos respectivos projectos poderão ser adoptadas curvas com o raio minimo de 200,0 em geral, e rampas com a inclinação maxima de 25 millimetros, se se exceptuarem algumas curvas de raio de 150 metros na 2.ª secção do caminho de ferro de Mirandella a Vinhaes, as quaes poderão certamente ser melhoradas, e a forte inclinação de 31 metros da rampa contitínua em 17 kilometros da 4.ª secção do caminho de ferro de Braga a Montalegre, a qual só parece poder ser evitada, mudando o traçado, ou subindo mais fortemente de distancia conveniente.
O seguinte quadro mostra os custos totaes e kilometricos d'estas linhas:

[Ver tabela na imagem]

Estas importancias referem-se todas a vias de largura de l metro entre os carris, segundo mostra o perfil transversal typo.

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Como se vê pelos pontos a que se obrigou o traçado das vias ferreas que ficam mencionadas, constituem ellas outros tantos meios de ligação directa da antiga provincia do Traz os Montes com os caminhos de que se trata, tem a denominação de Foz Tua a Mirandella. Attendendo á grande importancia d'esta linha, e a que o estudo a que a ella se refere tem a denominação de projecto definitivo, vae esta junta occupar-se desde já e especialmente, do seu exame.
Foi este estudo dividido cm quatro secções a partir de Mirandella para Foz Tua, a saber:

l.ª secção de Mirandella á Longra 19:595,60
2.ª secção do Longra ao Rio Tinhella 14:037,90
3.ª secção de Tinhella á Ribeira de Figueira 14:686,80
4.ª secção de Ribeira de Figueira a Foz Tua 4:942,50

Extensão total da linha 53:262,80

Cada uma d'estas secções tem estudo especial, comprehendendo: peças escriptas, memoria, medição, seus preços e orçamento, desenhos, plantas na escala de 1/500, perfil longitudinal nas escalas de 1/5000 e 1/500. Alem d'estas peças ha mais uma memoria descriptiva, um orçamento, uma planta, e um perfil longitudinal na escala de 1/20000, referidos á generalidade da linha, bem como um caderno de desenhos dos typos das obras de arte, e outros dos edificios de passageiros, das estações o das casas de guarda, e do perfil transversal typo.
Os terrenos a expropriar estão orçados em:
O volume das terraplanagens é na:

Metro cubico Metro linear

1.ª Secção 151,970 30,70
2.ª » 358,019 24,30
3.ª » 274,039 19,50
4.ª » 240,372 12,20
Somma 1:024,760 19,22

As respectivas importancias estão orçadas nas:

Metro cubico

1.ª Secção 71:456$940 470
2.ª » 190:321$168 531
3.ª » 132:310$060 482
4.ª » 105:665$585 436

Somma 499:758$759 487

Os terrenos a expropriar estão orçados na:

l.ª secção 3:668$150
2.ª » 6:352$975
3.ª » 11:156$485
4.ª » 12:660$745

Somma 33:843$355

Por kilometro 636$153

As obras de arte correntes importam nas quatro secções em 75:297$385 réis, ou por kilometro 1:422$883 réis.
As grandes obras do arte consistem nos seguintes viaductos de Carlão, do alvenaria metade, metade em curva de 250 metros de raio formado de quatro arcos plenos de 12 metros de abertura, com 4m,60 de largara entre as testas, e 79 metros de comprimento orçado em 20:171$173 réis.
Ponte do Pinhella formada por dois pilares e dois encontros de alvenaria, que supportam um taboleiro metallico em tres tramos de 22 metros, tendo de largura entre as testas 3m,60, e 91 metros de comprimento orçado em réis 18:172$295. Onze tuneis com o comprimento total de l:375m,4, tendo a maior 344 metros, orçados em réis 196:110$000, resultando o preço medio por metro linear 144$500 réis, todos revestidos, tendo de largura nas impostas 5 metros ao nivel dos carris 4m,30, e de altura sobre estes 5m,40.
As obras accessorias consistem em, alem dos tuneis que se acham classificados como taes, 67 passagens de nivel orçadas em 1:9475632 réis, ou por cada uma 29$000 réis, 137:220 metros de muros de supporte orçados, alem das guardas e excavações, em 136:142$500 réis, ou por metro cubico 992 réis.
Finalmente, o orçamento geral das quatro secções eleva a importancia total da sua construcção á quantia do réis 1.336:000$000, á qual corresponde o custo kilometrico de 25:088$710 réis.
Pelo que fica exposto se vê que se trata de fazer uma primeira applicação das vias ferreas de largura reduzida á linha a construir sob a iniciativa e por conta do estado, e sobre tão importante assumpto entende a junta consultiva de obras publicas e minas dever apresentar as seguintes considerações.
Debatidas têem sido as vantagens attribuidas á via deduzida, relativamente ás de via normal de mais largura, mas é certo que se por meu lado esta apresenta as vantagens de maior capacidade de transporte e de admittir maiores velocidades de marcha, e se, tratando-se de ramificações de outras vias de largura normal, terá a de conservar a uniformidade de largura da rede geral, e, portanto, a do material fixo e circulante que d'este modo poderá passar de umas para outras linhas, sem transbordo nem perda de tempo, por outro lado a via de largura reduzida é de mais economica construcção e de mais facil applicação aos terrenos accidentados.
Cada um dos dois systemas gosa, pois, de vantagens que lhe são particulares, e poderão ser adoptados segunde as circumstancias economicas da região que tenham de servir, e a fórma orographica do terreno, no qual tenham do ser construidos.
A linha de Foz Tua a Mirandella, ramificando-se da de via normal do Douro, conviria que conservasse a mesma largura, a fim de gosar das correspondentes vantagens, mas attendendo a que, comquanto a região que ella terá de servir seja bastante populosa e productiva, não parece indispensavel a maior capacidade de via larga, para effectuar o seu trafego, e a que, como esta linha, terá alem d'isto de assentar sobre um terreno fortemente accidentado, circumstancia que em geral continuará a dar-se nas outras linhas da mesma provincia, que com ella poderiam ligar-se, parece que será a largura reduzida que convirá adoptar-se.
Tratando do projecto e orçamento datado de 13 de março de 1880 relativo á linha ferrea de Foz Tua a Mirandella, a junta entende que o limite de 200 metros adoptado n'este estudo para os raios das curvas é sensivelmente superior ao que importam convenientemente linhas d'esta natureza, e que o mesmo limite poderá ser reduzido a 150 metros acceitavel ainda para comboios de 100 metros de extensão e velocidades de 25 kilometros a hora, o quanto ás rampas de 0,m015 que são as mais fortes que se encontram no mesmo não podem ellas deixar de ser consideradas assas moderadas, sendo iguaes as que se admittem nas linhas principaes.
O orçamento geral d'esta linha importando em réis 1.330:300$000 que corresponde a 25:088$000 réis por kilometro, parece bastante elevada para linhas de largura reduzidas, mesmo attendendo á fórma accidentada do terreno de que se trata, sendo certo que em um grande numero de linhas construidas em diversos paizes, o preço kilometrico varia de 5:400$000 réis a 18:023$040 réis, attingindo apenas os preços mais elevados de 21:600$000 réis na de Winkelm a Appencell na Suissa, que tem 24,5 kilometros de extensão, e a largura de l melro, e que portanto o preço orçado poderá ser consideravelmente ré-

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duzido, se for adoptado, nos estudos de detalhe que houverem de ser feitos, o limite de 150 metros para os raios das curvas, como foi estipulado nas condições de construcção do caminho de ferro do Bougado a Guimarães prescriptas pelo decreto de 5 de agosto de 1880, podendo d'este modo o preço kilometrico d'esta linha descer a réis 20:000$000.
O encargo annual d'esta quantia do juro de 5 por cento, seria de 1:000$000 réis, convindo prever até que ponto poderá elle ser supprido pelo rendimento liquido da exploração.
Em uma linha nas condições da de Foz Tua a Mirandella bastarão provavelmente quatro comboios diarios ordinarios para satisfazer ao seu trafego, e supondo de 0,33 por dia o numero de comboios extraordinarios ou facultativos, como na linha da Povoa de Varzim, e nas do Douro e Minho, haverá a contar com 4,33 por dia.
O preço de comboios kilometricos da linha da Povoa foi de 406 em 1881, o qual applicado ao numero de 1,581 comboios kilometricos que haverá na linha de Mirandella daria para a despeza kilometrica annual d'esta linha ferrea 64l$678 réis, mas como n'esta linha o numero de comboios diarios e portanto o dos comboios kilometricos é menor, e por outro lado as despezas de consumo tenham de ser maiores em rasão dos transportes que tem de soffrer para obrigarem ao local do seu emprego, o preço kilometrico deverá ser elevado por anno a 700$000 réis, que corresponde ao preço de 460 réis que parece rasoavel, comparado com o da linha da Povoa que é de 406, o com o dos caminhos de ferro do Minho e Douro que é de 534;18 no anno de 1880.
Nas linhas estrangeiras de 1,0 o preço medio é o de 4:000 francos. Como serviço correspondente a esta despeza poderá obter-se um rendimento bruto de 1:400$000 réis correspondente á 63:158 toneladas percorrendo a distancia completa, ou 40 toneladas uteis por cada comboio nas mesmas condições de percurso; correspondendo a este rendimento bruto total a percentagem relativamente ás despezas de exploração de 50 por cento que nada tem de excessiva, comparada com as de outros caminhos de ferro similhantes.
Em todo o caso para as despezas kilometricas annuaes da exploração deve ser fixado um maximo, que poderá ser de 1:200$000 réis, o que equivale a considerar como um maximo o rendimento bruto de exploração de 2:400$000 réis por anno e kilometro.
Em conclusão a junta consultiva de obras publicas e minas é de parecer:
1.° Que a via reduzida de l metro de largura convirá que seja adoptada na linha ferrea de Foz Tua a Mirandella, attendendo á fórma accidentada do terreno, e ao consideravel augmento de despeza a que daria logar a via larga de lm,67, que tem a linha do Douro, com a qual a primeira se liga.
2.° Que poderá ser approvado em geral o projecto datado de 13 demarco de 1880 relativo á linha ferrea de Foz Tua a Mirandella, parecendo porém que o seu custo kilometrico não excederá a importancia de 20:000$000 réis, pois adoptando-o teremos como minimo dos raios das curvas 150 metros na via directa, e de 100 nas de resguardo.
3.° Que as despezas de exploração, por anno e kilometro, poderão ser fixadas no minimo de 700$000 réis até que o producto bruto attinja a importancia de 1:400$000 réis por anno o kilometro, sendo calculadas para rendimentos bruto superiores, na rasão de 50 por cento dos mesmos productos não devendo porém a importancia assim calculado, exceder a 1:200$000 réis.
Vossa Magestade porém resolverá como melhor julgar.
Sala da junta consultiva das obras publicas e minas, 8 de janeiro de 1883.

N.º 2

Senhor.- Em consulta datada de 8 de janeiro do corrente anno na qual esta junta consultiva do obras publicas e ruinas expoz a Vossa Magestade o que se lhe offereceu sobre o projecto de via ferrea, que partindo da linha do Douro, junto á Foz do Tua, vae até Mirandella, seguindo a margem direita do mesmo rio, foi a final de parecer que, o mesmo, projecto, que tem a data de 13 de março de 1880, poderia ser approvado em geral, e que o seu custo kilometrico não excederia a 20:000$000 réis, adoptando-se para limite dos raios das curvas, 150 metros na via directa, e 100 metros nas de resguardo, convindo adoptar a via reduzida, attendendo á fórma do terreno, e consideravel augmento de despezas a que daria logar a via larga.
Esta consulta teve um parecer separado apresentado pelo vogal d'esta junta o general João Chrysostomo de Abreu e Sousa, que conhece quanto ao projecto, que o caminho de ferro de Foz do Tua a Mirandella, convem que seja construido de via larga se o seu custo não for superior a réis 34:000$000 por kilometro, o que cumpriria assignar com toda a exactidão, podendo admittir-se os limites de declividades e de raios de curvas adoptados no ante-projecto, submettido ao exame da junta, e que quando o governo decida que o caminho seja de via estreita, e que o seu custo para o calculo da garantia de juro, seja computado em 25:000$000 ou 27:000$000 réis por kilometro, é conveniente, que subsistam as condições technicas do mesmo ante-projecto, e que se deixe á empreza concessionaria a liberdade de construir este caminho com via larga sem augmento de encargos para o thesouro. Pela portaria de 11 de janeiro ultimo, foi encarregado o engenheiro Antonio Xavier de Almeida Pinheiro, de proceder á revisão e modificação do referido projecto e respectivo orçamento, devendo os estudos ser feitos com a mesma largura de via, de l metro, empregando-se raios de curvas até ao limite de l00 metros na linha directa, e de 100 metros nas de resguardo, elevando-se as inclinações até 18 centimetros e adoptando-se no delineamento das obras, sem prejuizo do seu bom aspecto e segurança, a maxima economia, por fórma que o custo kilometrico se approxime do limite de réis 20:000$000.
Em cumprimento d'estas ordens, elaborou o engenheiro Almeida Pinheiro um reconhecimento da via ferrea de Foz do Tua a Mirandella, que foi presente a esta junta datada de 29 de agosto proximo passado, e consta das seguintes peças:
N.° l Planta geral.
N.° 2 Perfil longitudinal.
N.° 3 Estação de Foz do Tua.
N.° 4 Ligação com o antigo traçado para Bragança.
N.° 5 Memoria pelo conductor chefe de serviço dos estudos.
N.° 6 Typos do perfil transversal da linha.
N.° 7 Quadros dos alinhamentos das curvas.
N.° 8 Dos aqueductos e pontões dos tuneis.
N.° 9 Das passagens de nivel, dos desvios das estações e casas de guarda.
N.° 10 Memoria justificativa pelo engenheiro director dos estudos.
N.° 11 Orçamento geral da linha e material circulante.

Segundo este projecto, o ramal partirá de um ponto situado na margem esquerda do Tua a uns 400 metros alem da povoação do Foz Tua, extensão em que se projecta a estação quasi parallelamente a uns 14 metros á esquerda da linha do Douro.
Sobre aquella povoação, o traçado volta á direita e ganha a margem esquerda do Tua que segue constantemente com excepção da parte entre 43,5 e 44,2 kilometros, na qual se afasta do rio para fugir de terrenos inundados pelas cheias, e para não cortar a parte mais importante da

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povoação de Frechas, passando pelas povoações de Caldas de S. Lourenço ao kilometro 15,3, Ribeirinha, kilometro 33,7, e Frechas, terminando proximo do Mirandella, na margem esquerda da Ribeira do Moura, tendo um desenvolvimento total de 53:953 metros.
Nas curvas de concordancia adoptou-se para os raios o limite de 150 metros, havendo cincoenta e seis curvas com raios inferiores a 200 metros e na extensão de 7.596m,36.
O desenvolvimento total das curvas mede 17.069m,46 e a extensão dos alinhamentos rectos 36.883m,54, sendo a relação entre o desenvolvimento das curvas e a extensão total de Om,31.
Em perfil longitudinal o limite das inclinações dos traineis é de Om,018 por metro, havendo inclinações superiores a Om,15 em 7.341m,58.
A extensão dos patamares de nivel é de 29.933m,02.
As terraplenagens medem 484.364 metros na totalidade, ou 8m,97 por kilometro.
Haverá a construir um consideravel numero de muros de supporte, cujo volume total está calculado em 124.044m,ll.
Os aqueductos serão em numero do cento e setenta e tres dos quatro typos usuaes, e os pontos serão sete, sendo seis de 3 metros e um de 5 metros de vão.
Haverá a construir cinco pontes com taboleiros de ferro e pilares, e encontros de alvenaria.
Projecta-se nove tunneis com a extensão total de 520 metros, sendo o mais extenso o da Falcoeira, perfil 349, que tem 135 metros.
As passagens de nivel serão dezenove e os desvios de caminhos dez.
As estações projectadas são:

[Ver tabela na imagem]

classe Kilometros

A situação de Foz-Tua tem uma plantam e perfil especiaes, a sua extensão, que é de 578m,77, não se comprehendo na do 53.953 metros, acima indicada, vindo assim a extensão total da linha ferrea a ser de 54.531m,77.

Orçamento do ramal

Infra-structura e material fixo 1.025:714$520
Material circulante 95:000$000
Cadastro da linha 5:395$000
Direcção fiscalisação em tres annos 18:000$000
Imprevistos 5:890$180

Somma............ 1.150:000$000

Juro do capital a 5 por cento e em anno e meio 86:250$000
Total -Réis 1.236:250$000

O auctor d'este reconhecimento declara optar franca e abertamente pela margem esquerda do Tua, para sobre ella assentar a directriz do ramal, o que implica a necessidade de construir a estacão de partida na mesma margem, solucção que o mesmo engenheiro prefere pelas seguintes rasões:
l.ª Ser a estação de Foz Tua do caminho de ferro do Douro a ultima da margem direita d'este rio.
2.ª Entre esta estação e a de Pinhão havei1 ainda a de Cottas.
3.ª A barca de passagem no Douro a montante da Foz do Tua funccionar durante todo o anno sem difficuldade alguma, seja qual for o estado do rio, ao passo que a barca existente a juzante da mesma foz não póde funccionar desde que a altura da agua no rio chegar a este ponto, estando por isso sem poder dar passagem durante boa parto do anno.
O mesmo engenheiro observa que no proprio Tua existo uma ponte em frente de Abreiro e boas barcas do passagem em frente de todas as estações projectadas, o que diz convencer do que o traçado pela margem esquerda não só em nada prejudica as povoações da outra margem, algumas das quaes terão sempre vantagem em ir directamente ao caminho de ferro do Douro, entrando em Cottas ou Pinhão, sempre que só trate das suas relações com o Porto, mas tambem serve as povoações marginaes ao Douro entre Tua e Sabor, que ficariam de outro modo privadas de communicações directas com a estação de Foz Tua, a não se fazer uma ponte sobre este rio junto á linha do Douro, alem de durante todo o anno poder pela barca proxima de passagem do Douro dar accesso facil ao movimento importante que existe entre as Beiras e Traz os Montes, e que ha de haver para a estação de Foz Tua, quer pela linha do Douro, quer para a de Mirandella.
Em 28 de abril do corrente anno representa a camara municipal do concelho de Murça para que o ramal de Foz Tua a Mirandella seja feito na margem direita do Tua, e não pela margem esquerda, allegando que os povos de Murça, Alijó, Valle Passos e Villa Pouca ficariam muito prejudicados não proseguindo o caminho de ferro pela margem direita do Tua, que é mais popular, mais rica e se presta melhor á construcção como diz ser affirmado por engenheiros que estudaram este caminho; que o custo kilometrico d'esta via ferrea será sempre menor pela margem direita do Tua do que pela margem esquerda, que já está dotada com a estrada real n.° 39, de Villa Real a Freixo de Espada á Cinta, e que ficaria inutilisada a estação de Foz Tua se esta via ferrea não proseguisse pela margem direita.
A camara municipal do Alijó representa tambem em 3 de julho ultimo no mesmo sentido, allegando quo a margem esquerda não contem povoações tão importantes como a margem direita, e que nem o terreno d'aquella póde comparar-se ao d'esta em fertilidade e variedade de productos.
Em officio, datado de 3 do corrente mez, informa o engenheiro ultimamente encarregado dos estudos d'esta linha declarando que, como já tinha feito entrega do trabalho que com estas representações se relaciona, nada póde dizer sobre assumpto, senão que lhe parecem inteiramente destituidas de fundamento as pretenções dos supplicantes, com relação ao traçado da margem esquerda.
Pelo que fica exposto se vê que o modo por que o engenheiro Almeida Pinheiro julgou mais conveniente dar execução ao que lhe foi ordenado pela portaria de 11 do janeiro ultimo, foi adoptar uma directriz nova pela margem esquerda do Tua para a construcção de via ferrea da Foz d'este rio até Mirandella.
D'este modo existem, pois, dois traçados para esta via ferrea, a saber:
1.° O da margem direita cujo projecto foi esta junta de opinião que poderia ser approvado em geral, admittindo-se o limite de 150 metros para os raios das curvas, procurando-se approximar o custo kilometrico do limite de réis 20:000$000, não tendo sido excedido nas rampas o limite de Om,015;
2.° O da margem esquerda, agora apresentado, no qual o limite dos raios das curvas foi reduzido a 150 metros, segundo a auctorisação dada pela citada portaria, sendo o das inclinações dos traineis elevado a 0,018 por metro.

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Os orçamentos, segundo os traçados das duas margens, são os seguintes:

Margem esquerda:
Infra-estructura, material fixo, edificios 1.025:714$520
Material circulante 95:000$000
Cadastro da linha 5:395$300
Direcção e administração em tres annos 18:000$000
Imprevistos 5:890$180
1.150:000$000

juro do capital a 5 por cento em anno e meio 86:250$000
1.233:250$000
Custo Kilometrico 22:913$462

Margem direita:
Infra-estructura, material fixo e circulante e edificios 1.336:369$000
Cadastro da linha 5:395$300
Direcção e administração em tres annos 18:000$000
Imprevistos 5:304$700
Juro do capital a 5 por cento em anno e meio 102:375$000
1.467:375$000
custo kilometrico 27:549$000

D'estas verbas a de 1.336:300$000 réis é a somma dos orçamentos das quatro secções de Foz Tua a Mirandella, que comprehende sómente a infra-estructura, material fixo e circulante o edificios; e para tornar o orçamento da linha segundo, este traçado comparavel com o da margem esquerda, acrescentou-se-lhe as verbas do cadastro, direcção, imprevistos e juro do capital do primeiro estabelecimento, e d'este modo se chega a conhecer que o custo kilometrico do traçado da margem direita é de 4:635$533 réis mais caro que o da esquerda, havendo para a totalidade das duas linhas uma differença de 231:125$000 réis contra a da margem direita.
Sob o ponto de vista das conveniencias economicas da região que esta via ferrea tem de atravessar, o traçado da margem direita serve melhor os concelhos de Alijó e Murça, parte dos quaes póde vir ás estações de Cottas e do Pinhão no caminho de ferro do Douro, e o da margem esquerda, os de Alfandega da Fé, Carrazeda de Anciães, Villa Flor e outras povoações, que prefiram as estações da linha do Tua a transpor o Douro para irem ás estações da margem esquerda do mesmo rio não se fazendo estação n'esta margem, entre Tua e o ponto em que a linha do Douro atravessa o rio do mesmo nome.
Ambos os traçados prestam importantes serviços aos povos das respectivas margens, advertindo, porém, que o da margem esquerda do Tua servirá a região ao nascente d'este rio que sem este traçado ficaria muito desfavorecido quanto ao accesso ás vias ferreas.
Comparando os dois traçados, em relação aos percursos vê-se que pela margem direita a extensão a percorrer até ligar com a linha do Douro será de 53.262m,8, emquanto quo pela margem esquerda a extensão a percorrer em via
estreita será de 53.953,00 e ajuntando mais a distancia até ao meio da estacão de Foz Tua 290,00
54.243,00

Se o percurso for no sentido do Porto, haverá mais a acrescentar a extensão a percorrer na via larga até chegar ao ponto em que o traçado da margem esquerda encontra a linha do Douro, que se póde admittir ser de 54243,00
A monte do Tua 800,0
A juzante idem 300,0 1.100,00
55.345,00
Differença a favor da margem direita 1.390,00

A favor da margem esquerda milita uma rasão importante que é a de não ser necessario construir uma ponto sobre o Tua para seguir com a linha para Bragança, ponto que, sua extensão seria superior a 200 metros, e não custaria talvez menos de 60:000$000 réis.
São estas as considerações que a junta consultiva de obras publicas e minas julga dever fazer sobre as vantagens relativas dos dois traçados estudados para a linha ferrea do valle do Tua, etc.
Considerando que os dois traçados são sensivelmente da mesma extensão;
Considerando que o traçado da margem esquerda tem a importante vantagem de não obrigar á construcção de uma ponte sobre o Tua proximo de Mirandella;
Considerando que a estação a montante da foz do Tua tem a vantagem de servir os povos situados ao nascente do valle do mesmo rio na margem direita do Douro, que de outro modo teriam de atravessar este rio para chegarem a algumas das estações da margem esquerda;
Considerando que no percurso no sentido do Porto só haverá um augmento de 1.390 metros em consequencia da direcção em que a linha do Tua tem de ser posta em communicação com a do Douro;
Considerando que é só na margem esquerda do Tua junto á sua foz que se encontra terreno que mais facilmente se preste a admittir o estabelecimento de uma estação de entroncamento;
Considerando que a despeza kilometrica orçada de réis 24:247$000 incluindo a estação do Tua, poderá ser reduzuda, no estudo do projecto definitivo segundo o traçado da margem esquerda, simplificando-se o plano d'aquella estação;
Considerando, finalmente, que mesmo segundo os orçamentos actuaes, a linha ferrea pela margem esquerda do Tua custará menos por kilometro 4:635$538 réis e na totalidade a importante quantia de 231:125$000 réis: É a junta consultiva de obras publicas e minas de parecer, que poderá ser approvado o reconhecimento datado de 29 de agosto proximo passado, elaborado sob a direcção do engenheiro Antonio Xavier de Almeida Pinheiro para a construcção da via ferrea da largura de l metro de Foz Tua a Mirandella, seguindo a margem esquerda do mesmo rio, simplificando-se quanto for conveniente o plano geral da estação do entroncamento com a linha do Douro em Foz Tua.
Vossa Magestade, porém, mandará o que for servido.
Sala da junta consultiva de obras publicas e minas, em 10 de setembro de 1883.

N.º 3

Ministerio das obras publicas, commercio e industria.- Sua Magestade El-Rei, a quem foi presente o parecer de 8 do corrente mez da junta consultiva de obras publicas e minas, relativo ao projecto datado de 8 de março de 1880, do caminho de ferro de via estreita de Foz Tua a Mirandella, elaborado pelo engenheiro Francisco Maria de Sousa Brandão: ha por bem encarregar o engenheiro Antonio Xavier de Almeida Pinheiro de proceder á revisão e modificação do referido projecto e respectivo orçamento, devendo os estudos ser feitos para a mesma largura de via de l metro, empregando-se raios de curva até ao limite de 150 metros na linha directa e de 100 metros nas de resguardo,

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elevando-se as inclinações até Om,18 e adoptando-se no delineamento das obras, sem prejuizo do seu bom aspecto e segurança, a maxima economia, por fórma que o custo kilometrico se approxime do limite de 20:000$000 réis, que a junta consultiva julga suficiente para este caminho de ferro nas condições indicadas.
Paço, 11 de janeiro de l883.=Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.-Para o engenheiro Antonio Xavier de Almeida Pinheiro.
Está conforme. Repartição das obras publicas, em 13 de fevereiro de 1884. = José Victor da Costa Sequeira, chefe da quarta secção.

N.°4

No dia 14 de dezembro de 1883, ás onze horas da manhã, em uma sala do ministerio das obras publicas, commercio e industria se reuniram: o director geral das obras publicas e minas, Joaquim Simões Margiochi, o vogal effectivo da junta consultiva de obras publicas e minas, João Joaquim de Matos, o engenheiro civil ao serviço d'este ministerio, Antonio Xavier de Almeida Pinheiro, comigo, Viriato Luiz Nogueira, secretario do mesmo ministerio, todos membros da commissão nomeada pela portaria de 11 do corrente mez para dirigir, sob a presidencia do referido director geral, os actos do concurso aberto para a construcção e exploração de um caminho de ferro, que partindo da linha do Douro e seguindo pelo Valle do Tua termine em Mirandella, nos termos do decreto de 22 de novembro de 1883, e das condições que o acompanham publicadas no Diario do governo n.° 268 da presente serie, com uma rectificação, no Diario n.° 269, da errata encontrada no artigo 6.° do citado decreto de 22 de novembro ultimo.
E constituida a mencionada commissão da qual, por escolha de seus outros vogaes, eu Viriato Luiz Nogueira sirvo de secretario, achando-se tambem presente o ajudante do procurador geral da corôa e fazenda, o conselheiro Antonio Cardoso Avelino, se deu logo começo aos actos do concurso, sendo por mim lidos em voz alta o citado decreto de 22 de novembro ultimo, e as instrucções de 19 de março de 1861.

inda esta leitura declarou o sr. presidente da commissão que estava aberto concurso, e que, nos termos do artigo 8.° d'aquellas instrucções, aberto se conservaria por espaço de meia hora para a recepção do propostas em carta fechada para a construcção e exploração do mencionado caminho de ferro - o que foi annunciado pelo servente Silvano Fernandes, nomeado para servir de pregoeiro n'este concurso.
Antes de findo o referido praso de meia hora, se apresentou o sr. conde da Foz entregando uma carta fechada, no sobrescripto da qual lancei o numero um, entregando ao apresentante uma cedula com o mesmo numero por mim rubricada.
No sobrescripto se declarava ser uma proposta feita pelo mesmo sr. conde da Foz.
Em seguida o sr. commendador Edmond Bartissol apresentou uma carta fechada, que foi numerada com o numero dois, recebendo o apresentante a competente cedula.
Declarava o sobrescripto d'esta carta ser uma proposta feita pelo mesmo sr. Bartissol.
Em terceiro logar o sr. José Nogueira Pinto apresentou uma carta fechada, que foi numerada com o numero tres, recebendo o apresentante uma cedula com igual numero.
Pelo sobrescripto d'esta carta se via conter uma proposta feita por Henry Burnay.
Findo, às onze horas e quarenta minutos, o praso de meia hora sem que se apresentasse mais proposta alguma, declarou o sr. presidente da commissão fechado o concurso, acrescentando que, nos termos do artigo 10.° das citadas instrucções, poderiam os concorrentes apresentar agora, quaesquer duvidas, ou pedir quaesquer explicações, que julgassem necessarias.
E não se tendo offerecido duvida, nem pedido explicações algumas, passou-se logo a effectuar a abertura da proposta n.° l do sr. conde da Foz, a qual continha:
O recibo de 36:000$000 réis effectivos, passado em 13 de dezembro d'este anno pelo thesoureiro da caixa geral de depositos, com uma declaração do mesmo thesoureiro e na mesma data de ter recebido mais em inscripções de assentamento da junta do credito publico 9:300$000 réis, valor nominal.
Uma carta fechada sem declaração alguma no sobrescripto.
A proposta n.° 2 do sr. commendador Edmond Bartissol continha:
Um recibo de 20:100$000 réis em metal, o mais uns papeis de credito, constantes da guia assignada pelo mesmo sr. Bartissol, aonde o recibo está passado pelo thesoureiro da caixa geral de depósitos em data de 14 de dezembro corrente.
Uma carta fechada sem declaração alguma no sobrescripto.
A proposta n.° 3, feita pelo sr. Henry Burnay, continha:
Um recibo de um escripto do thesouro na importância de 40:000$000 réis, e mais 600$000 réis em metal, passado em 14 de dezembro corrente pelo thesoureiro da caixa geral de depositos.
Uma carta sem declaração alguma no sobrescripto.
Todas as tres cartas, encontradas dentro das propostas, estavam fechadas e foram, numeradas competentemente.
Terminada a operação da abertura das propostas, foi lido por mim, secretario, em voz alta o presente auto até o ponto em que dá conta dos documentos encontrados dentro das propostas, a respeito do qual nenhuma reclamação se apresentou.
Então o presidente declarou que a commissão passava a constituir-se cm sessão secreta, nos termos do artigo 12.° das instrucções do 19 de março de 1861.
Na dita sessão secreta julgou a commissão que os tres proponentes estavam habilitados para entrar n'este concurso.
Sendo novamente aberta a sessão publica, foi annunciada a deliberação da commissão, tendo eu, secretario, em voz alta lido a lista dos proponentes admittidos.
Nenhuma reclamação se offereceu contra a deliberação da commissão e lista por ella formada dos proponentes admittidos ao concurso, a qual lista fica junta a este auto.
Passou-se logo á abertura da carta fechada encontrada dentro da proposta n.° l, e verificando-se que era uma proposta devidamente formulada, pela qual o sr. conde da Foz declarava fixar as despezas kilometricas de construcção para os fins indicados no programma d'este concurso em 19:692$300 réis.
A carta fechada, encontrada dentro da proposta n.° 2, era uma proposta devidamente formulada, e por ella o sr. Edmond Bartissol declarava fixar, para os fins indicados no programma d'este concurso, as despezas kilometricas de construcção em 21:490$000 réis.
A carta fechada, encontrada dentro da proposta n.° 3, era uma proposta devidamente formulada, e por ella o proponente Henry Burnay declarava fixar, para os fins indicados no programma d'este concurso, as desprezas kilometricas de construcção em 21:000$000 réis.
E tendo-se concluído por esta fórma os actos da recepção e abertura das propostas apresentadas, declarou a commissão que as mesmas propostas e o presente auto iam ser presentes ao governo de Sua Magestade, para sobre ellas deliberar.
De tudo o que lavrei, eu Viriato Luiz Nogueira, secretario da commissão, o presente auto que vou assignar com os outros vogaes da commissão e com o ajudante do pro-

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curador geral da corôa e fazenda, depois de lhes ser por mim lido.
O sr. Presidente: - A nota de interpellação vae ser expedida.
O sr. Figueiredo Mascarenhas: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal do concelho de Monchique, em que pede auctorisação para distrahir do cofre da viação municipal a quantia de 6:000$000 réis para applical-a á construcção de escolas de instrucção primaria nas tres freguezias do concelho.
Mando tambem para a mesa um projecto de lei no mesmo sentido.
O sr. Sousa Cavalheiro: - Mando para a mesa uma representação dos escrivães do juizo de direito da comarca de Serpa, queixando-se do modo pouco regular por que no ministerio da fazenda se tem procedido e se está procedendo á lotação dos seus officios e pedindo que se approve o projecto de lei em que se estabelece que, em vez da contribuição industrial, passem a pagar o imposto do rendimento sobre uma base verdadeira, como pagam os mais funccionarios do estado.
O sr. Agostinho Lucio: - Mando para a mesa uma declaração.
Aproveito estar com a palavra para pela segunda vez perguntar á mesa se já vieram os documentos que pedi pelo ministerio do reino, ácerca dos estabelecimentos incommodos, insalubres e perigosos na cidade de Lisboa.
Esta requisição foi feita na sessão passada e renovada este anno.
O sr. Secretario (Mouta e Vasconcellos): - O requerimento foi expedido ao governo em officio de 11 de janeiro, mas ainda não veiu resposta.-
O Orador: - Permitia-me v. exa. que eu renove pela terceira vez as minhas instancias e que estranhe que passados doze mezes não tenha sido satisfeita esta nota.
Bem sei que não é por culpa do ministerio do reino que este serviço não está organisado, d'onde resulta não poder ser satisfeita uma nota como aquella que eu pedi. Isto é um grande inconveniente.
Supponhamos que o sr. ministro do reino organisa uma inspecção nos estabelecimentos insalubres, incommodos e perigosos. Essa inspecção não podia, ser feita ignorando-se quaes são os estabelecimentos que estão n'essas condições.
Isto é gravemente serio, sobretudo nas condições em que estamos com respeito ao cholera, havendo probabilidade, que se repita, o que se deu no anno passado, e bom é que estejamos preparados para adoptar providencias bem pensadas, no caso de nos vermos obrigados a tomal-as; o que oxalá não succeda.
O sr. Fontes Ganhado: - Mando para a mesa uma declaração.
O sr. Custodio Borja: - Mando para a mesa um requerimento de Guilherme Augusto Ribeiro de Carvalho, alferes do regimento de cavallaria n.° 3, em que póde para ser reintregado no posto de tenente do exercito de Africa Occidental.
Mando tambem uma declaração.
O sr. Gonçalves de Freitas: - Poço a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que no Diario das nossas sessões sejam publicadas duas representações que tive a honra de mandar para a mesa.
Consultada a camara, resolveu affirmativamente.
O sr. Centeno: - Mando para a mesa um requerimento de José Maria Alvares Quintino, coronel de infanteria n.° 17, contra o disposto no artigo 72.° § unico da carta de lei de 23 de junho de 1864.
Peço a v. exa. que mande dar a este requerimento o devido destino.
O sr. Fonseca Coutinho: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Arronches, pedindo para desviar a quantia de 400$000 réis do fundo da viação municipal, para occorrer á despeza com alguns melhoramentos no concelho.
São tão poderosos os fundamentos que se allegam n'esta representação que eu espero que o seu pedido será deferido favoravelmente.
O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Alberto Pimentel.
O sr. Alberto Pimentel: - Desejava usar da palavra quando estivessem presentes os srs. ministros do reino e das obras publicas; como não estão presentes estes srs. ministros, peço que v. exa. me reserve a palavra para outra occasião.
O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. D. José de Saldanha,
O sr. D. José de Saldanha: - Desejava dirigir duas perguntas ao sr. ministro da marinha, e como s. exa. não está presente, peço, se é possivel, que v. exa. não reserve a palavra para quando o illustre ministro estiver presente.
O sr. Guedes Bacellar: - Poucas palavras direi.
Tendo o meu illustre collega o sr. Teixeira de Sampaio fallado na questão do caminho de ferro da Foz do Tua a Mirandella, e defendido a directriz que vae pela margem direita do Douro, eu não posso deixar de fallar tambem n'esta questão.
O meu collega allegou que os povos tinham rasão em pedir que a directriz fosse pela margem direita; e eu digo que ha mais que sufficiente rasão, para que a construcção vá pela margem esquerda. As rasões que se dão em favor d'esta directriz são quanto a mim preferiveis.
As povoações da margem esquerda são mais importantes do que as da margem direita ; e basta uma simples inspecção para se conhecer que o caminho ou a directriz mais conveniente a seguir é a da margem esquerda. (Apoiados.) Mas nem eu nem o illustre deputado, é que havemos de decidir a questão.
Está feito o estudo pelo sr. Almeida Pinheiro quanto á margem esquerda, e está feito o estudo pelo sr. Brandão quanto á margem direita; ao governo compete resolver.
Mas nós não podemos deixar de attender á economia para o thesouro, e no proprio relatorio do sr. Almeida Pinheiro se diz que ha uma economia de 180:000$000 a 200:000$000 réis, indo a directriz pela margem esquerda. A directriz pela margem direita tem grandes obras de arte, grandes viaductos affluentes e que demandam graves e importantes despezas. Emquanto que na esquerda póde dizer-se não ha obras muito despendiosas a fazer. (Apoiados.)
Portanto, eu, deputado por aquella provincia, não posso deixar de pugnar pelos seus interesses e de pedir que a directriz siga a margem esquerda.
Ha ainda outra rasão.
Na margem direita está em construcção um grande numero de estradas, e as povoações estão já beneficiadas com este grande melhoramento de viação, emquanto que na margem esquerda póde-se dizer que os povos não têem uma unica estrada. (Apoiados.)
Termino, portanto, por aqui as minhas observações, e quando se tratar da interpellação do illustre deputado eu procurarei tratar mais largamente da questão e defender os interesses dos povos da margem esquerda do Douro.
Vozes: - Muito bem.

ORDEM DO DIA

Continua a discussão do projecto n.º 9 (reforma da lei eleitoral)

O sr. Presidente: - Tem a palavra para continuar o seu discurso o sr. relator da commissão.
O sr. Fuschini: - Sr. presidente, reatando o fio da minha exposição e sem fazer a synthese do que disse na sessão passada, continuo a apresentar algumas idéas e opiniões ácerca da lei eleitoral, e ao mesmo tempo a apreciar

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e combater alguns argumentos apresentados contra o projecto.
Não quero deixar de apresentar n'esta camara uma opinião muito sensata que foi desenvolvida na commissão pelo sr. Fonseca Coutinho; tanto mais eu penso n'ella, tanto mais a acho justa e conveniente para os interesses do paiz. Chamo a attenção da camara para este assumpto, porque é uma idéa perfeitamente nova; eu pelo menos não a conhecia.
O sr. Fonseca Coutinho disse na com missão eleitoral que era conveniente dar uma representação especial n'esta camara ás grandes colonias portuguesas, que existem em paizes estranhos, principalmente no Brazil e nas ilhas de Sandwich. A primeira vista parece isto um pouco extraordinario; mas pensando mais no assumpto vamos achal-a justa e conveniente para o paiz. É justa, porque aqui na camara devem estar representadas as nossas colonias, não só em relação a territorios onde exercemos soberania, mas principalmente em relação aos individuos que as compõem. O que nós temos a representar e representâmos são as fracções da nação, são os individuos; e aquelles que vivem alem mar são tão filhos do paiz, têem tanto interesse em relação ao paiz em que nasceram, como aquelles que vivem nas nossas colonias de Africa ou da India. Esta idéa é conveniente para os interesses do paiz, porque conserva anima, vivifica as relações, que têem as colonias portuguezas no estrangeiro com a mãe patria: é conveniente para os interesses do paiz, porque os representantes d'essas colonias serão uns fiscaes que entrarão n'esta camara para nos dizer o que fazem as nossas legações e os nossos consules; é conveniente para os interesses do paiz, porque esses representantes serão membros activos e conhecedores dos interesses coloniaes, que virão aqui esclarecer-nos sobre o que nós podemos fazer directamente em favor d'ellas, melhorando as nossas relações commerciaes, desenvolvendo o nosso commercio e indirectamente negociando diplomaticamente com as nações, onde ellas existem, a fim de obtermos vantagens decisivas e protecção condigna para essas fracções da grande familia portugueza, que longe da patria trabalham, alargando o nosso commercio metropolitano, e cujos membros enriquecidos voltam um dia para enriquecer a patria.
O sr. Dantas: - Apoiado.
O Orador: - Não desejo alongar este debate, e por isso não aponto algumas idéas minhas sobre o problema da emigração.
Não desejo, certamente, que a emigração portugueza procure o Brazil e as ilhas Sandwich, porque entendo que infelizmente as forças vivas do paiz, que nós perdemos annualmente, ha trinta annos a esta parte principalmente, dariam, applicadas na metropole, uma riqueza superior aos capitães que nos vem de lá, já directamente pelos emigrantes que regressam ao paiz, já indirectamente pelo augmento de movimento commercial. Mas como sei que não é facil derivar uma corrente de emigração, muito embora seja conveniente tental-o, lembro que n'uma reforma eleitoral seria conveniente attender ao principio justo, sensato e muito exequivel de proporcionar ás nossas maiores colonias a representação no parlamento nacional.
O sr. Dantas: - Apoiado.
O Orador: - Dito isto, desejo chamar a attenção da camara para o methodo de estudo que vou seguir. Subordinarei a minha exposição e a minha argumentação ao methodo historico; e escusado é definir em que consiste este methodo, porque a palavra o define. Vou procurar os meus melhores argumentos aos factos de historia e contemporanea, d'esses factos ................ Muito positivamente as leis e as consequencias.
É este o processo de investigação da moderna sociologia; é este o caminho que vou seguir. É possivel que tenha de me alongar um pouco, mas a camara comprehende perfeitamente que na minha posição, não posso deixar de empregar o tempo e os raciocinios necessarios para apreciar as doutrinas expostas pelos deputados, que discutiram o projecto eleitoral.
Peço desculpa de ser longo, mas não posso deixar de o ser.
Tratarei em primeiro logar da restricção do voto.
A restricção do voto foi apresentada pelos srs. D. José de Saldanha e Franco Frazão. Restringir o direito de votar, diminuir o collegio eleitoral!
Ha sempre uma resposta certa, quando se faz uma proposta d'esta ordem; a reducção de suffragio é um erro politico; vou proval-o.
Não me consta que uma só restricção do direito de votar, em paizes onde effectivamente este direito corresponde na justa proporção no seu estado de civilisação, não me consta, digo, que em um unico paiz, essa restricção não correspondesse a grandes transformações politicas; e vou citar aos illustres deputados dois exemplos, para não citar tres porque mais tarde tenho de referir-me a este terceiro.
Observarei em primeiro logar, que esta foi uma das causas principaes da transformação dos governos em França, da passagem da restauração bourbonica para a monarchia de julho, da monarchia de julho para a republica de 1848 e da republica de 1848 para o nefasto imperio. . .
(Interrupção do sr. Licinio Pinto Leite.)
Sim, nefasto e triste imperio que teve por epilogo Sedan, a derrota da França, a perda de enormes capitais e de centenas de milhares de homens, a esmagadora indemnisação de guerra á Prussia, o que poderia ler-se evitado se um governo ....... Presidisse aos destinos da França; tristissimo imperio, porque não considero principalmente util para uma nação, abrir grandes boulevards...
Mas, sr. presidente, ia-me afastando um pouco do meu proposito; em todo o caso, as opiniões que apresento aqui, são perfeitamente individuaes.
NO anno de 1817 a restauração bourbonica, governando Luiz XVIII, apresentou e fez votar no parlamento francez uma lei eleitoral, em que os direitos eleitoraes eram muitissimo restrictos.
Todos sabem que esta lei exigia um censo de 300 francos de imposto directo e trinta annos de idade para os eleitores e 500 francos para os elegiveis; todavia o systema liberal podia conservar-se em Franca, ainda mesmo com esta lei tão temida e recciosa, que aliás tinha sido acceita e votada pelos liberaes, se em 1820 se não tivesse commetido o erro de se querer restringir o direito de votar, já tão diminuto e restricto, que apenas dava para a França uns 100:00000 eleitores.
As exigencias immoderadas dos reaccionarios, dos ultras, como então se lhes chamava, levaram em 1820 o ministerio presidido pelo duque de Richelieu a fazer vingar o principio de ser concedido ao quarto dos eleitores maiores contribuintes o voto duplo.
Por esta fórma ficava alterada a proporção da força entre os grandes proprietarios, quasi todos ainda pertencentes a antiga aristocracia e portanto partidarios do antigo regimen, e os menores contribuintes, em que o partido liberal encontrava as melhores adhesões.
Dar o voto duplo a ................ Eleitores, deixando os restantes 30:000 com o voto simples, era o mesmo que conservar o voto simples, mas reduzir a metade a votação liberal.
A restricção era indirecta, mas não deixava de ser uma restricção evidente.
Sabe v. exa. o que aconteceu?
D'aqui nasceu a grande lucta, que terminou em 1830, com a queda da monarchia bourbonica.
Erro politico, porque a França, desejando conservar o regimen liberal e parlamentar, causada das agitações da republica e das guerras do imperio, via no governo da restauração uma garantia de ordem e de paz.
A França era liberal, e quiz salvar os seus princi-

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pios com a dynastia bourbonica; fez os maiores esforços para salvar-se com ella. A intransigencia do direito divino devia porém obcecar Carlos X. O exilio devia-lhe amargamente indicar a verdade, mas era tarde.
Os bourbons tinham descido os degraus do throno da França para jamais os subirem novamente.
Aqui tom v. exa. o primeiro erro da restricção do voto.
O segundo erro commettido por Luiz Filippe, occasionou a revolução de 1848.
Não houve restricção do direito eleitoral d'esta vez, é certo, mas Luiz Filippe não quiz teimosamente obtemperar com a opinião publica, que impunha a reforma eleitoral, o alargamento do suffragio.
Não fallarei n'esta questão; mas referir-me-hei á queda da republica de 1848, e ao segundo imperio, que hei de considerar sempre como nefasto para a França.
O governo provisorio que se formou logo apoz a victoria da revolução do 1848, decretou pouco tempo depois o suffragio universal.
A assembléa legislativa, eleita em 1849, entendeu- que devia restringir o voto; recciando atacar directamente o suffragio universal, lançou mão, como outr'ora o fizera o governo da restauração, de um sophisma, de uma restricção indirecta, emfim, da celebre lei do domicilio. Todos sabem o que é esta lei do domicilio.
Estabelecia ella que nenhum cidadão podesse ser eleitor sem ter sido domiciliado durante tres annos. Era um modo certeiro de atacar o suffragio universal; por esta fórma, como facilmente se comprehende, se conseguiria uma restricção e importante.
Para se provar o domicilio exigia-se, ou a existencia na matriz de certos impostos do nome do interessado, ou a declaração dos pães, amos ou patrões; isto é, na maioria dos casos transformava se o suffragio universal em suffragio censitico.
Os resultados da lei comprovaram os raciocinios, o corpo eleitoral que era de 9.000:000 eleitores desceu a cerca de 6.000:000.
A lei fôra publicada em maio de 1831, e o resultado foi o completo desprestigio da camara na opinião publica.
Na manhã, de 2 de dezembro de 1851 apparecia affixado nas esquinas das ruas de Paris o seguinte decreto:
Em nome do povo francez o presidente da republica declara:
Artigo 1.° É dissolvida a assembléa nacional.
Art. 2.° É restabelecido o suffragio universal.
Art. 3.º E revogada a lei de 31 de maio de 1851.
Luiz Napoleão que vigilantemente expiara os erros da assembléa legislativa e apalpara o seu descredito, com as violencias que são conhecidas, precipitava-se na dictadura, da dictadura escalava o imperio e o imperio produziu os desastres da França.
Eis o que nos diz o passado.
Agora o que nos diz o presente?
O presente diz-nos que todas as nações europêas que caminham á testa do progresso alargam successivamente o seu eleitorado.
Começarei pela Inglaterra.
A Inglaterra, que ha cincoenta annos tinha 400:000 ou 500:000 eleitores, tem hoje 3.000:000, e terá amanha 5.000:000, porque, como todos sabem, Gladstone acaba de apresentar um bill alargando o suffragio em cerca de 2.000:000 de eleitores.
A Belgica desceu quanto póde o seu censo, igualando-o no minimo determinado na constituição.
A Grecia universalisou o suffragio.
A Italia, que ha tres annos, antes da lei de 1882, tinha cerca de 628:000 eleitores, tem hoje mais de 2.000:000.
Escusado era dizer o que fez a França; entretanto, se quizerem seguir a evolução do eleitorado em França, ficarão sabendo que desde 1815 a 1830 o numero dos eleitores era de 100:0000 a 150:0000; de 1830 a 1848 de 200:000 a 250:0000; e hoje esse numero é de perto de 10.000:000.
Entre nós tambem o eleitorado tem offerecido a mesma tendencia, como se deprehende dos dados que compendiei n'este pequeno quadro:
Eleitores Elegiveis
1871 426:553 85:516
1872 438:288 87:319
1873 440:438 88:766
1874 452:026 92:512
1875 455:286 94:255
1876 468:674 97:503
1877 478:509 97:530
1878 823:356 118:717
1879 827:234 116:413
1880 844:838 92:586
1881 841:511 89:507

Nós, que em 1871 tinhamos 426:553 eleitores, em 1877, ultimo anno que antecedeu a lei de 1878, tinhamos já 478:509. Differença 51:803 n'este intervallo, ou, em media, 7:422 de crescimento por anno.
Este descimento deve explicar-se pelo augmento de população, pela maior divisão da propriedade em virtude das leis da desamortisação, etc., e pela tendencia para o alargamento do voto.
Veiu a lei de 1878 e introduziu mais 344:847 eleitores no nosso corpo eleitoral, que foi assim elevado a 823:350 eleitores em 1878 e a 841:511 em 1881, isto é, que cresceu de 18:155 eleitores n'este periodo, ou 4:538 em media annual, e que ha de crescer ainda de anno para anno.
Em regra, as nações parlamentares tendem a alargar o seu eleitorado.
Só uma nação das mais importantes, porque só ás mais importantes me estou referindo, faz excepção a esta regra.
É a Hespanha.
Mas a Hespanha está em condições particulares.
Em 1869 a constituição deu á Hespanha o suffragio universal; depois a restauração monarchica retirou-lh'o, substituindo-lhe o censitico. Esta transformação politica auctorisou a restricção do suffragio.
De resto eu supponho que a Hespanha não estava preparada para o suffragio universal, para o estar tora previamente de passar pelas differentes gradações do suffragio restricto.
Dir-me-hão que o suffragio é um direito de todo o cidadão. Sim, senhores; mas para estabelecer os justos principios sociaes é necessario reformar as instituições, os costumes; educar as massas, esclarecel-as, e isto não se consegue com segurança e ordem nem por saltos, nem por precipitações.
Por isso em Hespanha por se fazer a reforma de repente, o resultado foi o que todos nós sabemos.
Em vista, portanto, do que acabo de expor, concluo eu muito positiva e naturalmente, como um principio experimental de sociologia que na historia do passado, sempre que honre uma restricção, essa restricção correspondeu a uma modificação politica; depois que, na historia do presente, uma tendencia pronunciada só manifesta na maior parte das nações para o alargamento do direito eleitoral.
Sr. presidente, nós vamos atravessar um periodo importante de transformação politica, passâmos de um estado que se póde chamar das oligarchias parlamentares para as democracias parlamentares; as nações que professam o suffragio universal já attingiram este termo, as restantes tendem, gravitam para elle com maior ou menor energia.
Eu realmente não encontro outro nome para designar uma sociedade, regida pela fórma representativa, que tem um minimo de eleitores, em relação á sua população e este minimo definido pelas presumpções do censo ou da capacidade, senão o de oligarchia parlamentar; assim como aquella que estende o seu suffragio até onde elle póde che-

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gar, considerando-o como um direito geral e não um privilegio se deve chamar uma verdadeira democracia parlamentar.
Nós assistimos n'este momento historico á passagem das oligarchias parlamentares para as democracias parlamentares.
N'estas condições, provada a tendencia pelo methodo historico, é impossivel impedil-a, sem os graves perigos do contrariar um phenomeno social na sua fundada e necessaria evolução. Quem pede a restricção do direito eleitoral ignora os errou do passado, e desconhece que as sociedades têem igualmente as suas leis naturaes e imprescriptiveis.
Em nome de que principio se ha de pedir a restricção do direito de votar?
Que vantagens traz ella?
Devemos correr o perigo manifesto de uma reacção, ou de uma revolução? Certamente que não.
A boa resolução do problema do eleitorado está no suffragio universal, como o propuz á camara em uma das passadas sessões, e a que peço licença para agora ligeiramente me referir.
Tenho sido acoimado, muito amigavelmente é verdade, mas fui acoimado de avançar certas proposições, sem as demonstrar, e por isso preciso referir-me a este ponto.
Para minha defeza, em primeiro logar devo dizer que muitas vezes, n'esta tribuna, deixo de dar maior desenvolvimento ás minhas doutrinas, porque não desejo por fórma alguma que a camara se convença de que estou aqui com o mero proposito de lhe roubar tempo e de abusar da sua paciencia.
Eu disso que me parecia preferivel ao eleitorado que resulta da nossa actual legislação, o que proviria de applicarmos ao paiz o suffragio universal pelo systema francez, muito embora elevassemos o minimo da idade, que em França é de vinte e um, a vinte e cinco annos, e estabelecessemos a clausula do domicilio por um anno, em vez de seis mezes.
N'estas condições, disse eu, não feriamos um collegio eleitoral superior ao actual, muito mais puro e escolhido e de igual numero de eleitores approximadamente.
Ora, peço licença á camara para lhe dizer como se de monstra isto facilmente.
Como todos sabem, o systema francez consiste principalmente, permitta-se-me a expressão, em acompanhar as penas ordinarias de um grande numero do crimes previstos no seu codigo penal com uma exclusão do voto, que é quasi sempre perpetua.
A lei franceza contém effectivamente cincoenta e oito cansas de exclusão das quaes quarenta e quatro perpetuas.
Nós temos, pelo recenseamento francez de 1876, que é um pouco atrasado, mas que para este caso nos dá a approximação necessaria:

Cidadãos de l a 20 annos 6:655:597
Cidadãos de 20 a 25 annos 1:556:823
Cidadãos de mais de 25 annos 10:161:219
18:373:639

O recenseamento não discrimina os cidadãos de vinte a vinte e um annos, mas suppondo, e a hypothese é rasoavel, que estes são o quinto da classe de vinte a vinte e cinco annos, teriamos em França 11:406:675 cidadãos maiores de vinte e um annos; no anno de 1877 a França tinha ...........70 eleitores, e este numero comparado com o anterior diz-nos que 87 por cento dos cidadãos de vinte e um annos para cima estavam recenseados, ficando fóra do eleitorado 13 por cento pelas differentes exclusões, e por não terem a condição de seis mezes de domicilio.
Se em Portugal, que tem segundo o censo de 1878

Cidadãos até 25 annos 1:100:980
Cidadãos de mais de 25 annos 1:074:849
2:175:829

applicarmos a relação encontrada ao grupo dos de mais de vinte e cinco annos obteremos um corpo eleitoral do 935:000 votantes, Um pouco superior ao nosso actual; mas se considerarmos que em França o domicilio é de seis mezes, emquanto que em Portugal poderia ser de um anno: a redacção será ainda de dezenas de milhares; e nós vamos cair n'um corpo eleitoral de numero approximado ao nosso e é muito mais escolhido.
O suffragio universal e o suffragio censitico e capacitario operam por processos totalmente oppostos.
O primeiro concede o direito a todos Os cidadãos, salva a idade, e depois; escolhe, por assim dizer, de entro elles os melhores e os mais dignos; emquanto que o segundo presuppõe a capacidade.
Suppõe-se que um homem que tem certo capital é assás intelligente, bom o consciente, para usar do sen voto; e, por maioria de rasão do que no caso precedente, que o homem que tem certa illustração, que è doutor, bacharel, que tem um curso, uma profissão, etc., etc., deve possuir em regra uma boa capacidade eleitoral; mas tudo isto em summa são supposições; o mais natural é o suffragio universal, que abrange todos, e depois escolho, e excluo successivamente os elementos viciosos, e exclue-os á franceza perpetuamente.
Assim deve apurar-se um melhor collegio eleitoral.
Não é certamente um raciocinio muito seguro aquelle que affirma que um individuo que paga dez tostões é mais digno de voto e melhor o comprehende do que aquelle que paga 990 réis.
Quer isto dizer porventura que a nossa legislação sobre o eleitorado não seja adiantadissima?
A esta pergunta não darei resposta com a minha opinião, mas com a opinião sempre sensata, e n'este caso valiosissima, do sr. Manuel de Arriaga. S. exa. disse: «o nosso eleitorado é quasi a universalisação do suffragio.»
E é, porque a lei de 1878, envolvendo, como envolve, nos capacitarios os chefes de familia e os que sabem ler e escrever consente crescimento continuo do eleitorado; não sendo muito natural que um homem case para ser eleitor, mas sendo perfeitamente rasoavel que aprenda a ler e a escrever para conseguir o direito eleitoral, está na mão de cada um obter esse direito com um pequeno esforço e com grande vantagem propria.
Se v. exa., sr. presidente, me perguntar qual foi o espirito do legislador, a idéa que presidiu á elaboração da lei do 1878, dir-lhe-hei que, segundo todas as probabilidades, o legislador de 1878 preparou uma lei essencialmente evolutiva o conducente ao suffragio universal.
Não sei se foi isto; mas se foi digo que o pensamento da lei de 1878 accusa uma habilidade rara e uma perspicacia, que definem os homens de estado.
Do resto, sr. presidente, facilmente se comprehende quo o ensino obrigatorio, e os esforços empregados pelo governo, e pelo paiz em geral, hão de necessariamente diminuir o numero dos analphabetos e portanto augmentar o dos eleitores.
Posto que a nossa estatistica eleitoral seja imperfeitissima, por alguns dados, mandados colligir pelo ministerio do reino, ainda que incompletos, podemos fazer uma idéa assaz exacta do nosso eleitorado.

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[Ver tabela na imagem]

Este pequeno mappa, que não traz os elementos de alguns districtos,, porque elles ainda os não forneceram, é já sufficiente para determinarmos as relações das tres originaes de eleitores da nossa legislação; assim teremos:

Anno de 1882, por 1:000 eleitores
Censo 497
Chefes de familia 447
Ler e escrever 56
1:000

Anno de 1883, por l:000 eleitores
Censo 512
Chefes de familia 433
Ler e escrever 55
1:000

resultados muito approximados.
Em numeros redondos teremos pois:

Por 100 eleitores
Censo 50
Chefes de familias 44
Ler e escrever 6
100

A segunda capacidade, que actualmente nos dá apenas 6 por cento do nosso corpo eleitoral, é, todavia, susceptivel de indefinido augmento; basta para isto que diminua o numero dos analphabetos, que actualmente se podem ainda computar em 75 a 78 por cento entre nós.
Pois a França ha annos, apenas tinha 50 por cento e 30 a 35 por cento a Belgica!
Attingido o primeiro limite teriamos nós 1.000:000 de eleitores.
Para rematar esta parte da minha exposição, citarei á camara uma opinião, e muito importante, a opinião de Gladstone, que em 1864 fazia parte do governo de que era primeiro lord da thesouraria, ou presidente, lord Palmerston. Cousa singular! Gladstone defendia o suffragio universal e o chefe do gabinete combatia-o, especialidade ingleza quasi incomprehensivel no nosso paiz, dada a nossa solidariedade ministerial.
Por signal que lord Palmerston apresentou durante essa discussão um argumento muito capcioso, mas extremamente fino e sophistico.
Respondendo a alguem que considerou o suffragio como um direito, o que levava ao universal, emquanto Palmerston o julgava uma funcção apenas, e por isso o queria restricto; dizia elle: pois se consideraes o suffragio um direita individual, porque tendes promulgado tantas leis sobre a bribery (venda de votos), como pretendeis castigar quem vende o que seu é.
Sem querer de fórma alguma desfazei este augumento, o que aliás me parece relativamente facil, se considerarmos a origem social do direito de suffragio e as conveniencias da collectividade, eu chamo a attenção do meu illustre amigo Manuel de Arriaga sobre este assumpto.
Em 1864 Gladstone defende no parlamento inglez o suffragio universal, vinte annos depois o illustre estadista, ministro e chefe de um partido forte em Inglaterra, não se atreveu a univeisalisar o suffragio, e apresenta á camara um simples alargamento do eleitorado censitico. Se me perguntarem se elle fez bem, digo, com a minha pequena auctoridade, que sim.
As grandes reformas sociaes não se intentam por outra fórma e Gladstone não merecia o nome de estadista, se não soubesse sacrificar a sua opinião á opportunidade do momento e aos interesses da sua patria.
N'este ponto cumpre-me protestar, quando o sr. Manuel de Arriaga diz que a escola positivista não acceita o suffragio universal. Acceita-o e define-o, como s. exa. com todo o seu talento não o poderá melhor definir.
Vae fallar Littré, que o sr. Manuel de Arriaga sabe ter sido depois da morte de Augusto Comte o chefe da escola positivista.
O sr. Manuel de Arriaga: - Eu disse que o descredito das instituições liberaes davam azo a que a escola socialista já apodasse essas instituições de menos proveitosas.
O Orador: - Eu ouvi dizer e tomei nota de que a escola positivista negava o suffragio universal, mas se outra cousa é, lerei o excepto de Littré para bem definir as idéas do positivismo. N'este ponto não quero confusões.
«O regimen monarchico parlamentar originou uma formula, que teve uma grande voga: o rei reina e não governa. Pois bem, esta formula, que tem sido sempre difficil de impor aos monarchas, parece ter sido expressamente creada para o suffragio universal. E n'elle que ella encontra a sua mais perfeita e salutar applicação. O suffragio universal reina mas não governa.»
Veja s. exa. como isto se affasta da sua theoria das

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mansas populares batendo ás portas d'esta casa para nos expulsar:
«A democracia ou o suffragio universal (duplo nome de uma mesma cousa) quando governa, rebaixa tudo, porque colloca as cousas e os homens ao seu nivel medio; quando reina, eleva tudo, porque dá o primado ás aristocracias das capacidades, dos talentos, dos espiritos que repousam no seu seio.
O suffragio universal reina, mas não governa. Sabe a camara quando o suffragio universal governa? Quando vae procurar em 1848 o principe Luiz Napoleão e o levanta á presidencia. Então encarna-se n'ella, o governa; mas não governa quando delega em uma assembléa popular os seus direitos e esta elege o presidente do estado, como actualmente em França.
Em duas phrases eu direi que, a meu ver, o suffragio universal reina quando elege os seus mandatarios parlamentares, governa quando se manifesta nus plebiscitos. D'estes pelo menos é que têem saido os seus mais singulares resultados.
Não quero o suffragio universal sáia o que sair.
Eu não me revolto contra as massas, porque saí do povo; mas ha povo, e povo.
Se s. exa. me falla do povo que trabalha, de cujo seio nascera os maiores homens, porque das massas populares têem saído n'este seculo os grandes talentos; se s. exa. me falla do povo que se resigna com a sua situação, porque emfim em todos é indispensavel que a religião ou a philosophia nos forneçam essa mansuetude de espirito; do povo que não inveja, do povo que sustenta os seus direitos sem invadir os de outrem, do povo, que solicita e pede, não com o chapéu na cabeça e altivo, mas com hombridade e delicadeza, dir-lhe-hei que, vendo esse povo, sinto-me filho d'elle, e de lá vieram os que me deram o ser. Quando vejo, porém, homens obscuros, invejosos, ignorantes e selvagens levantarem-se apenas cm nome da sua força bruta e quererem destruir tudo e destruir-me a mim, porque á custa do meu trabalho mo elevei um pouco acima do seu baixo nivel, desprezo-os, e quando essa massa bater a esta porta, encontrar-me-ha aqui para reagir contra ella. (Apoiados.}
Defensor do suffragio universal, não quero que elle governe, quero que elle reine.
Eu, que fui companheiro do sr. Manuel de Arriaga em Coimbra, que o conheço mais do que a mim proprio, por que passa por mui difficil o Nosce te ipsum, affirmo a v. exa. sr. presidente, que não são essas as suas idéas, expostas talvez por uma imposição partidaria ou ainda pela necessidade de rhetorica demagogica. Discuti muitas vezes com s. exa. ao nosso jantar academico para ignorar quaes sejam as suas opiniões e as suas tendencias. (Riso.)
A camara comprehende que em tudo quo em possa dizer do illustre deputado sou guiado pela mais sincera amisade e desculpado pela nossa intima confiança.
Nós vivemos, onde se vive apenas alguns poucos annos da vida, mas onde se geram os sentimentos que nos acompanham depois em toda ella. Fomos contemporaneos em Coimbra, vivemos fraternalmente na mesma casa, está tudo dito n'estas phrases singelas.
Os srs. D. José de Saldanha e Franco Frazão, em vez da restricção, offerecem-nos outro alvitre que eu acho singular, e que corresponde aos processos indirectos da camara de 1820 e da assembléa de 1849, o suffragio universal indirecto. É cousa bem difficil de comprehender a ligarão d'estes dois principios: suffragio universal o eleição indirecta. São para mim idéas perfeitamente antinomicas. S. ex.ªs poderão objectar-me que esse systema existe, mas eu poderei responder que ha muitas singularidades, que ainda se conservam na fórma social de alguns paizes.
Seguindo o meu systema positivo, vamos estudar as origens historicas da eleição indirecta.
A eleição indirecta veiu do antigo regimen. Mau presente, má origem.
N'esse regimen, como todos sabem, a assembléa dos tres estados era composta de clero, nobreza e povo. A nobreza, o alto clero elegiam directamente; o baixo e o povo elegiam indirectamente.
Assim o processo indirecto do antigo regimen entrou no moderno direito eleitoral; o por onde entrou? Chamo a attenção dos illustres deputados para este ponto. Não entrou pela Inglaterra porque esse paiz teve sempre o suffragio directo. Entrou pela França e pela constituinte de 1789. Esta constituinte, uma das assembléas mais illustradas, mais liberaes, mais trabalhadoras das que tem havido o ha do haver nos paizes parlamentares, acceitou e muito bem o voto indirecto, para não quebrar abruptamente com as tradições do antigo regimen. Não se quebra assim com um passado immenso e longo. As gerações que se succedem concatenam-se nas idéas, nos principios e nos interesses sociaes; são solidaria; umas das outras e o progresso gerai forma-se e alimenta-se do esforço de cada uma. Pretender arrancar urna instituição social do vez, é desconhecer a natureza das sociedades, é proceder por processos fulliveis, revolucionarios ou utopistas, erro em que não cáe uma assembléa illustrada, ou um verdadeiro estadista.
Assim, pois, o suffragio restricto, indirecto entrou no regimen moderno pela constituinte de 1789.
A França republicana teve depois o suffragio universal directo na constituição do 1793, obra da convenção; mas v. exa. sabe que os perigos terriveis, que de todos os lados assoberbavam a França, impediram que esta constituição vigorasse, sendo suspensa alguns mezes depois de ter sido proclamada.
A colligação das potencias despoticas da Europa contra a França impelliu a convenção a constituir-se em dictadura, da qual nasceram as celebres commissões de salvação publica e de salvação gera! e o celebre terror vermelho. A par de muitos horrores que praticou, a convenção fez grandes cousas e a França deve-lhe, pelo menos, a organição mais enérgica e enthusiastica das forças vivas do paiz contra a invasão estrangeira.
Sr. presidente, para factos d'aquella ordem oitenta annos não são sufficientes para fazer desapparecer a paixão e os interesses, sem os quaes não ha historia imparcial; mas ha de vir tempo em que só ha de reconhecer o que a convenção fez, e quando não tivesse organisado senão a defeza do paiz, e levantado a França para resistir á colligação reaccionaria mais energica e atrevida que adversa á liberdade e aos direitos de um povo se tem levantado, já tinha praticado um grande acto, já não tinha feito pouco. (Apoiados.)
Assim o suffragio universal foi posto de parte.
Veiu o directorio, e com elle o suffragio restricto, indirecto.
É para notar que sempre a republica nos apparece com o suffragio restricto indirecto, e mais tarde com a votação de lista.
A constituição directoral pouco durou.
O consulado funda o seu systema eleitoral nas eleições indirectas, mas agora em tres graus.
Esta tripla gradação da escolha dos candidatos devia ser muito sympathica para os defensores da eleição indirecta, porque em legar de um simples apuramento tinham tres. As communas de cada arrondissement elegiam a decima parte dos seus membros e constituiam a lista communal.
D'esta lista saíam por nomeação os empregados elegiveis da communa.
Os membros das listas communaes tornavam a eleger do entre si a decima parte, que constituia as listas departamentaes.
D'estas listas saíam os empregados elegiveis do departamento.
Finalmente, das ultimas listas saíam eleitos a decima

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parte dos membros, que formavam as listas nacionaes, onde o governo escolhia os membros do senado conservador, do tribunado e da assembléa legislativa, chamada dos mudos, porque os seus membros não tinham o direito de fallar e discutir, mas unicamente de resolver e votar, ouvidos os tribunos e oradores officiaes.
Eu não quero dizer que o governo consular saísse directamente do governo revolucionario; mas succedeu-lhe, e a França lançou-se nos braços de um general feliz, já farta de demagogos, de jacobinos e de tutti quanti.
Os demagogos foram sempre os que em toda a parte estragaram tudo. (Apoiados.)
Veiu depois o imperio, e para completar a sua obra, attribniu-se o direito de introduzir nos primeiros collegios communaes, um decimo de eleitores, estranhos á localidade e nomeados, sem condição alguma, pela auctoridade.
Um decimo dos eleitores n'estas condições, á vontade do imperador, e em resultado de tudo uma lista onde o senado conservador escolhia os legisladores, tambem sob as vistas paternaes do imperador.
Liberrimo!
Aqui tem v. exa. como a eleição indirecta, originaria do antigo regimen, entrou no moderno para desapparecer como Luiz Filippe.
Ora eu supponho que ha manifesta contradição entre suffragio universal e eleição indirecta.
Pergunto eu aos defensores d'este systema, o que é o direito de votar.
Será simplesmente a faculdade concedida ao cidadão, de levar a sua lista e introduzil-a na urna?
Não é, de certo. O direito de votar envolve o direito de escolher o candidato, se não é apenas este direito.
Esta especie de procuração, passada pelo eleitor primario ao secundario, annulla perfeitamente o seu direito de escolha directa, contraria a idéa fundamental do suffragio universal.
N'este caso antes o suffragio restricto directo, porque n'elle só póde suppor que a nação dá esta procuração ás suas classes mais illustradas, o que é mais logico e rasoavel.
Se quem escolhe é quem realmente vota, a eleição indirecta destróe a universalição do suffragio; a grande massa eleitoral é substituida por alguns milhares de verdadeiros eleitores, que são os secundarios.
Realmente a eleição directa contraria o suffragio universal.
Bem sei que póde apresentar-se uma rasão, que por ser mysteriosa, e portanto vasia de sentido, não deixa de ser apresentada algumas vezes - a conveniencia da ordem publica. Eu protesto contra essa rasão.
O antigo regimen conheceu a celebre rasão de estado, rasão que já em uma reunião da maioria classifiquei de rasão gothica.
Qualquer estadista de pulso e força dirigia a governação publica como e por onde entendia, em nome da rasão de estado.
Hoje já não ha rasão de estado, mas necessidade da ordem publica.
A phrase transformou-se mas não deixa de ser, a maioria das vezes, um instrumento de tyrannia e oppressão.
A politica liberal moderna exige processos claros, e necessidades demonstradas; os povos não querem salvadores, elles proprios se salvam.
Mas vejamos o valor dos argumentos produzidos n'esta casa em favor da eleição indirecta, argumentos que a final são os unicos conhecidos. Consiste o primeiro em affirmar que o eleitor por via de regra não póde conhecer tão facilmente o deputado, como conhece o seu eleitor secundario, que vive na sua parochia.
Ora o conhecimento que se exige para bera eleger, não é pessoal; não sei que haja necessidade de qualquer eleitor conhecer particularmente o deputado.
O conhecimento indispensavel é o da personalidade politica do candidato, das suas doutrinas politicas, da sua honestidade e do seu valor.
Demos de barato que o eleitor secundario é sempre o homem mais intelligente e probo da freguezia, o que póde ser contestado, porque geralmente é um mandão da localidade, esse homem illustrará directamente; a massa dos eleitores em vez do eleitor delegar n'elle por uma especie de procuração o seu direito de escolha, subordina a opinião do informador ao seu proprio criterio e acceita-a ou rejeita-a, mas conserva a sua liberdade e o seu direito eleitoral.
A eleição indirecta ou é um mandato imperativo e n'esse caso annulla as funcções dos collegios secundarios, ou não o é e n'esse caso annulla os primarios e restringe fortemente o voto.
De resto, sr. presidente, a eleição indirecta constituo afinal pequenissimos circulos uninominaes, em que se manifestam poderosamente os inconvenientes notados nos maiores.
Briga-se a candidatura secundaria, como se discute a parlamentar; porém com mais paixão local e com mais espirito de campanario.
Depois d'este argumento vem o outro, tambem conhecido, do apuramento dos collegios secundarios; d'onde directamente sáe a representação nacional.
A eleição indirecta apurará ou não o collegio secundario. Se o eleitor primario escolher sempre o cidadão mais intelligente e probo o collegio secundario não correspondera aos seus fins sociaes, mas será honesto; mas se, como em regra acontece, á probidade e á inteligencia se antepozerem a astucia e a força politica, então ........ e profundamente.
Realmente a boa logica mandava aos defensores d'este systema pedir a eleição em muitos graus, como praticava o imperio.
Vejamos agora a questão por outra face e enumeremos os argumentos contrarios ao systema; os que vou apresentar são do sr. de Bismark apresentados no parlamento prussiano, se bem me recordo, em 1867.
O conde de Bismark, hoje principe, combateu o systema prussiano de eleição indirecta e combateu-o com dois argumentos: primeiro porque falseava a representação; suppondo, dizia o illustre estadista, que os collegios eleitoraes secundarios representam metade e mais um dos eleitores primarios, e depois que a camara eleita representa metade e mais um dos collegios secundarios, é claro que a camara representa apenas um quarto dos eleitores primarios, que a final são o paiz.
Este raciocinio é fraco quando se admitte a simples representação por maiorias; mas quando, como o sr. D. José de Saldanha e o sr. Franco Frazão o manifestaram, só é partidario da representação proporcional, então o argumento tem valor
Pois se já é difficilimo encontrar processo para a proporcionalidade directa entre o corpo eleitoral e a camara, como querem s. exa. multiplicar as difficuldades interpondo entre o collegio primario e a representação nacional os collegios secundarios?
Comprehendo que este argumento não tenha grande força, quando se exigir simples representação de maioria e minoria, como no systema actual, mas é importante com a representação proporcional, e acho singular que n'este caso se queira adoptar a eleição indirecta.
O segundo argumento do illustre estadista prussiano refere-se a facilidade relativa da compra dos eleitores secundarios, ou da pressão exercida sobre elles pelo poder.
Não carece de grande explanação este argumento; tanto mais a acção de uma força se circumscreve, tanto mais energicamente ella actua.

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É o caso de se recordar o celebre proloquio politico de um estadista de um paiz qualquer: «casas e deputados compram depois de feitos».
Sr. presidente, se eu trouxe a auctoridade de Bismark para corroborar os argumentos apresentado, aliás conhecidos e por outros empregados, foi porque o grande estadista pertence a um paiz, que professa as eleições indirectas e portanto deve conhecer-lhe experimentalmente os vicios e os defeitos.
Aqui tem v. exa. como me parece, que pelo methodo historico e pelo raciocinio só consegue demonstrar que a eleição indirecta teve origem no antigo regimen, o que para todos os homens liberaes deve ser muito duvidoso. Se consultarmos a pratica, das nações modernas, não somos mais felizes; os paizes que têem eleições indirectas, são: em primeiro logar a Prussia, que póde constituir uma sociedade democratica, mas que não é inteiramente regida por uma fórma de governo liberal, parque cousa differente é o meio social e o governo que o dirige.
Têem eleição indirecta a Austria e a Roumania, as quaes offerecem ainda differentes classes de eleitores, atirando para a 4.ª e ultima classe com os eleitores mais pobres, a quem é concedido o favor da eleição indirecta!
Servem estes exemplos, e os argumentos historicos tirados das nações civilizadas provam que não deve acceitar similhante systema todo o que tenha principios democraticos.
Fecharei esta parte da minha exposição, que se refere ao eleitorado, lembrando que o sr. Antonio Maria de Carvalho - disse que tanto eu como o sr. Navarro tinhamos affirmado que este projecto de lei tornaria a nossa legislação eleitoral uma das mais liberaes da Europa, e que não nos tinhamos dado ao trabalho de demostrar esta proposição.
Em questões d'esta ordem demonstra-se com alguma difficuldade, mas vou tental-o.
É preciso, porém, que se comprehenda bem qual foi a minha idéa.
Comparei as leis na sua letra, não me referi ao medo por que socialmente funccionam.
Não posso affirmar de maneira alguma, que uma certa e determinada lei, que pareça para nós menos liberal, não funccione bem n'outro meio social.
Dos costumes depende o bom exito da melhor legislação, como disse o meu illustre amigo, o sr. Gonçalves de Freitas, tirando esta grave sentença do Espirito das Leis.
É uma phrase positiva. (Apoiados.) A lei eleitoral belga e a lei suissa é possivel que não funccionassem bem entre nós, como a nossa talvez não fosse applicavel aos meios sociaes d'aquelles povos.
N'estas comparações é necessario um pequeno esforço de abstracção e alguma fé politica, permitta-se-me a expressão.
Emquanto á Bulgaria já disse em outra parte que actualmente se achava sob o peso de uma dictadura.
As classes do eleitorado austriaco são:

Eleição directa:
1.° A grande propriedade predial.
2.° As cidades.
3.º AS camaras de commercio e industria.

Eleição indirecta:
4.° As communas ruraes.

Os da Roumania são:

Eleição directa:
1.° Os cidadãos que têem o rendimento predial de réis 648$000 pelo menos.
2.° Os cidadãos que têem o rendimento predial de réis 216$000 a 648$000 réis.
3.° Os cidadãos que paguem uma contribuição directa de 3$455 réis.

Eleição indirecta:
4.° Cidadãos que paguem uma contribuição qualquer.

Finalmente, offerecendo um singular exemplo, a Servia que tem uma camara unica formada por 130 membros electivos, e por mais 43 nomeados pelo rei.
Entre os nações de eleitorado restricto não ha a menor duvida de que o nosso paiz occupa a preeminencia.
Os unicos paizes onde ha suffragio universal é que podem competir comnosco e por este pequeno quadro, que infelizmente não consegui completar, onde vem compendiado alguns dados eleitoraes interessantes relativos a algumas das nações da Europa, concluiremos que somos a quarta ou quinta em relação ao eleitorado, se attendermos a Grecia, cujo numero de eleitores deve ser superior ao nosso.

[ Ver tabela na imagem]

Ora eu supponho que uma legislação, que tem este elemento por base, deve ter um certo valor para os homens que como s. exa. defendem o suffragio universal. Mais tarde discutirei os outros elementos do projecto de lei.
Releve-me v. exa. o a camara apresentar algarismos mas depois da declaração do sr. Manuel de Arriaga de que eu praticava um absurdo, quando dividia por tres, ninguem póde ter confiança na minha arithmetica. (Riso.)
Para os homens que, como s. exa., querem chegar ao suffragio universal, a questão da posição relativa, de um paiz entre os mais civilisados em relação ao eleitorado não é indifferente: não é pouco importante.
Vejamos em que ordem estamos.
Temos na Europa 19 estados, que, sendo classificados pela fórma do governo, dão 14 com a monarchia representativa, dois com a fórma republicana e tres com a fórma despotica, não contando as insignificantes republicas de São Marino e Andorra, o pequenissimo principado de Monaco e o grão-ducado do Luxemburgo.
Vejamos como se classificam estes differentes estados pelo seu eleitorado.

Suffragio universal:
França.
Suissa.
Dinamarca.
Grecia.
Allemanha.
Bulgaria.

Suffragio restricto:
Censitico e capacitario.....
Portugal.
Italia.
Hespanha.
Belgica.
Inglaterra.
Hungria.
Censitico.......
Hollanda.
Suecia:
Noruega.
Austria.
Classes..............
Roumania
Censitico e nomeação regia-Servia.

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Esta classificação não é perfeitamente rigorosa porque algumas nações, classificadas no eleitorado exclusivamente censitico, envolvem ainda assim algumas capacidades; a Inglaterra por exemplo attribuindo 9 deputados ás suas universidades; onde os eleitores são crentes do censo, offerece o principio das capacidades, mas em tão pequena proporção de eleitores, que não é erro classifical-a entre as de eleitorado censitico.
Entremos agora n'um assumpto, que, apesar de mais secundaria, tem todavia alguma importancia. Refiro-me á elegibilidade.
O sr. Franco Frasão e o sr. Teixeira de Sampaio aventaram a opinião de que era conveniente privar completamente os funccionarios publicos de terem assento n'esta casa, ou de reduzil-os pelo sorteio a um numero fixo, se o numero dos eleitos o excedesse, como se faz, por exemplo, na Italia.
Devo dizer a s. ex.ªs desde já que eu entendo que a restricção da elegibilidade constitue indirectamente uma restricção no eleitorado.
Sendo, como já disse, o primeiro o mais importante elemento do direito de votar a faculdade da escolha do candidato, claro me parece que, se se restringir a escolha, póde ser o voto perfeitamente annullado. (Apoiados.)
Ora, a nossa legislação n'este ponto é detestavel, como é facil de provar pela inspecção do mappa dos eleitores, que já apresentei a esta camara.
Por exemplo, em 1871 para 426:553 eleitores havia 85:516 elegiveis.
Em 1881 para 841:511 eleitores ha apenas 85:507 elegiveis, isto é, o numero dos eleitores duplicou emquanto que a differença dos elegiveis foi de cerca de 4:000!
Ora, isto parece-me absurdo.
Não posso admittir outra doutrina que não seja a elegibilidade de todo o eleitor, salvo um pequeno numero de inelegibilidade absolutas, de inelegibilidades limitadas e de incompatibilidades.
A doutrina de Stuart Mill, no trecho que hontem li á camara, tem perfeito cabimento n'este logar, contesta á sociedade o interesse e o direito de presumir que uma classe de cidadãos não póde servir para tal ou tal cargo electivo; antepondo-se assim á confiança dos eleitores, e lançando uma interdicção que só a experiencia poderia justificar.
E note v. exa. que eu não estou isolado na minha opinião. O legislador dinamarquez introduziu na sua lei uma singularidade. É eleitor na Dinamarca todo o cidadão que tem trinta annos de idade e um anno de domicilio; é elegivel o que tem vinte e cinco annos de idade, qualquer que seja a tempo de domicilio.
Esta disposição baseia-se em uma rasão que não é difficil de perceber. O que se deve suppor é que no eleitor ha competencia para escolher, e attribue-se-lhe toda a responsabilidade da escolha, libertando-o da tutella da restricção.
Se mal escolher, a responsabilidade é sua.
Na Dinamarca, portanto, o numero dos eleitores deve ser muito menor do que os dos elegiveis.
A tanto não chego eu; mas quero a elegibilidade para todos os eleitores, sob completa responsabilidade d'elles; e por isso não admitto restricção para os empregados publicos; e isto por outra rasão ainda.
É preciso não perder de vista que Portugal é um paiz pobre; em regra os individuos mais activos e intelligentes de cada classe vem procurar ao estado o complemento de um rendimento indispensavel para viver. São pequenos industriaes, pequenos proprietarios, pequenos portadores da nossa divida, etc., etc.
Os empregados publicos não formam, pois, uma classe mas são de todas, e diga-se em verdade o melhor, embora o mais pobre, de cada uma d'ellas.
Excluil-os da camara seria uma injustiça e um erro.
Póde praticar-se isto sem inconveniente, embora injusto me pareça, em paizes onde as classes, em que uma sociedade se divide, são ricas do elementos activos e intelligentes, como na Inglaterra, em França e mesmo na Italia, mas em Portugal não fallemos em similhante cousa.
Querem a incompatibilidade temporaria? Tambem eu. Comprehendo perfeitamente que o empregado publico superior, um chefe de repartição, por exemplo, não póde desempenhar cabalmente as suas funcções de empregado e de deputado, quando quizer desempenhar bem qualquer d'ellas, principalmente a de deputado. É verdade que n'este paiz passa por sinecura o logar de deputado. Eu pergunto, porém, aos meus collegas, quanto trabalho, quantas noites perdidas, quantas vigilias têem tido e soffrido para conseguirem fazer um trabalho qualquer, que a final o primeiro mal intencionado afasta com a indifferença de um genio, ou com a pretensão de uma ridicula vaidade! (Apoiados.)
Mas, dizia eu, tambem quero a incompatibilidade; mas, então o paiz ha de pagar aos seus legisladores durante todo o anno.
Deus me defenda do legislador gratuito, o que encheria a camara unicamente de homens ricos, excluindo brutalmente os individuos pobres; Deus defenda o meu paiz do legislador a quem não é garantida a independencia da vida, a justa remuneração do seu trabalho, e tantas vezes o santo pão da familia!
Não vale a pena computar a despeza com este serviço publico, o mais elevado, o primeiro de todos; mas tambem de todos o mais difficil; não vale a pena, digo-vos eu, e realmente, eis porque senti que um homem tão illustrado, como o sr. Illidio do Valle, n'uma oração parlamentar tão notavel, como a sua, viesse argumentar com uma despeza de 5:000$000 réis ou 6:000$000 réis.
Um projecto de lei bem estudado e meditado, uma medida de fomento bem apreciada, compensará largamente essa despeza!
Eu não tenho a pretensão de dizer nada que não esteja dito já pelos meus illustres collegas, que entraram na discussão; mas para esgotar o assumpto, recordarei uma opinião singular que ouvi ao sr. Antonio Maria de Carvalho; quando s. exa. disse que esta lei só seria completa quando a camara levasse a sua abnegação ao ponto de inserir um artigo, pelo qual se excluisse toda da futura constituinte. Eu direi ao illustre deputado, que até hoje apenas uma assembléa praticou um acto d'este genero, foi a celebre constituinte do 1789, que depois de fazer as cousas mais admiraveis e mais dignas, por uma lei especial se excluiu toda da assembléa legislativa, que se lhe seguiu.
Nós não podemos imaginar de fórma alguma que hoje, entre nós e no remanso da paz, nenhuma assembléa seja influenciada pelo enthusiasmo que acompanhava a de 1789.
Desde o dia 4 de agosto da 1789, em que foram proclamados os direitos do homem, até ao encerramento da convenção, a França esteve sob a acção de um patriotico enthusiasmo.
Com immensa espontaneidade praticaram-se n'aquelle periodo os maiores actos de abnegação e os maiores rasgos de valor!
Nós não atravessamos um periodo similhante, nem é provavel que tal acção se repita na historia.
Tanta abnegação não me parece exegivel, nem mesmo conveniente tel-a, porque torno a dizer excluam da camara os homens de todas as classes, que por não terem meios vão buscar ao estado o deficit constante que têem nos seus rendimentos, e lhe compensam o salario recebido com o seu trabalho, excluam d'esta camara, não sei em nome de que direito, esses homens, e verão o que fica. (Apoiados.)
Não venho para aqui attacar ninguem, não é esse o meu systema, e todos sabem que, quando subo á tribuna, faço quanto possivel, para discutir com urbanidade; (apoiados) mas as verdades dizem-se quando se devem dizer.
E n'este ponto, vou entrar no assumpto mais importante do projecto ,no circulo plurinominal e nas accumulações

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Se v. exa. e a camara me attenderam, e de envio me escutavam, na exposição que fiz na passada sessão, haviam de reparar, que tive a maxima cautella cm relacionar os deputados que tinham fallado, não só emquanto ás suas posições politicas, mas tambem quanto ás idéas que tinham manifestado ácerca do circulo plurinominal; e fiz isto exactamente para mostrar á camara, como as opiniões aqui estavam divididas, e tão divididas que oradores do todas as parcialidades politicas defendiam mis e atacavam outros o principio dos circulos plurinominaes.
O que quererá dizer esta divisão? Quer dizer, que este principio que se intenta implantar na nossa legislação, não se firma ainda n'aquella maioria decisiva de opiniões, em que se devem firmar os principios sociologicos para serem traduzidos na sua maxima generalidade.
Mais tarde hei de aproveitar-me d'este argumento para mostrar que não houve falta de logica, que não houve contradicção no modo como procedi; houvesse-a, porém, muito embora, e fosse util para o paiz o resultado; pouco importaria sacrificar o homem. Os homens passam e os bons resultados ficam. (Vozes: - Muito bem).
Não vou apreciar um a um os argumentos que se podem produzir em favor do escrutinio de lista, apresentaram-nos os deputados que me antecederam, e estão escriptos no relatorio da commissão; tratarei agora apenas de encarar a questão pelo methodo, que me impuz.
Questões d'esta ordem não podem ser estudadas a priori; por mais vasta e profunda que seja a intelligencia d'aquelle que se occupa d'ellas, impossivel é chegar ás conclusões e descobrir argumentos, que a experiencia tão sómente proporcionará.
Uma discussão d'esta ordem, que versa sobre principios, que a pratica social ha de confirmar, tratada por considerações subjectivas e geraes póde considerar-se indefinida.
Faiscam-se os argumentos de parte a parte, como boas laminas de Toledo cruzam-se as rasões favoraveis e contrarias, mas como tudo depende da experiencia e da observação de factos, que se tentam substituir pela previsão, ha sempre rasões pró e contra. Cada um tem opinião differente, todos exemplificam e todos têem rasão.
O melhor, portanto, o unico caminho seguro é procurar na historia e na experiencia das nações, os elementos positivos, que a rasão pura jamais nos fornecerá.
Pareceu-me que o sr. Antonio Maria de Carvalho tinha defendido o escrutinio de lista pelo resultado da eleição da assembléa legislativa de 1849, e n'este sentido tomei os meus apontamentos; mas quando em casa li o discurso de s. exa. vi que se referia á assembléa de 1847. Haverá engano da revisão?
O sr. Antonio Maria de Carvalho: - Não tenho bem presente no meu espirito, mas parece-me que era a de 1849.
O Orador: - Estou de accordo com s. exa. Da minha parte não ha nenhum ardil de guerra. Não tenho por systema ser ardiloso em cousa alguma da minha vida e muito menos o seria aqui.
Accusam o escrutinio de lista de ser um instrumento do poder, de esmagar as minorias.
Vejamos se assim é.

e nós encontrarmos camaras eleitas pelo escrutinio de lista, em que este tenha dado excellente resultado, já era relação á qualidade dos representantes, já em relação á representação de todas as fracções politicas teremos immediatamente de concluir que todas as nossas presumpções são completamente destituidas de fundamento.
Pelo menos a experiencia, que é a grande mestra da vida, aconselha-nos a que tenhamos mais cautela com os raciocinios á prior, e com os nossos causidicos argumentos.
Logo depois do proclamada a republica em 1848, o governo provisorio, saído da revolução, decretou para a Franca o suffragio universal nas bases, em que ainda actualmente repousa; mas introduzindo no seu systema eleitoral o escrutinio de lista.
N'este ponto chamo a attenção do sr. Manuel de Arriaga, porque, como s. exa. da outra vez me citou as opiniões de Sampaio, magnificas, e as opiniões de José Estevão, soberbas, em favor do circulo uninominal, eu vou citar ao meu illustre amigo as opiniões de homens, que por acaso são da parcialidade politica de s. exa.
Dá-se um caso muito singular n'esta discussão. Eu cito as opiniões da parcialidade de s. exa., e s. exa. cita as opiniões da minha parcialidade.
O sr. Manuel de Arriaga: - Era melhor limitar-se aos argumentos e não individualisar.
O Orador: - Aos argumentos me cinjo eu, porque s. exa. citou argumentos de auctoridade, o que eu aliás evito sempre.
E eu não individualiso o illustre deputado; eu tiro apenas as consequencias logicas das idéas que s. exa. apresentou.
O governo provisorio de 1848 era composto de homens, que, para o illustre deputado e para o sr. Elias Garcia, não podem ser suspeitos, chamavam-se Dupont de I'Eure, Lamartiue, Arago, Marie Garnier-Pagés, Ledru-Kollin,
Crémieux, Bethmont, Subervie, Goudchaux e Carnot, os quaes tinham como secretarios os seguintes, igualmente, insuspeitos para s. ex.ªs: Marrast, Flocon, Pagnerre, Luiz Blanc.
Era a nata.
(Riso.)
Ora diz Garnier-Pagés, na sua Historia da Revolução de 1848, e eu cito o sr. Garnier-Pagés, porque era membro do governo.
«Marrast propoz o escrutinio de lista por departamento. Expoz calorosamente todas as queixas accumuladas contra as eleições de campanario e submettidas a todas as influencias locaes.»
Em 1848 já o campanario repicava soffrivelmente.. .
Uma voz: - Em França.
O Orador: - Em França, é verdade; mas repica hoje por cá não menos soffrivelmente.
Continua o sr. Garnier Pagés:
«São interesses e não principios, diria Marrast, que formarão a representação do paiz. Uma assembléa de proprietarios apenas sairá do escrutinio uninominal, uma assembléa imbuida de idéas pessoaes, mesquinhas, sem arrrojo, sem iniciativa, sem grandeza, que vos ha de fazer uma republica á sua imagem, se vos não restaurar a monarchia.»
Isto dizia o sr. Marrast, citado pelo sr. Garnier Pagés.
Repito: quiz ir á pura origem, e por isso fui buscar o sr. Garnier Pagés, que era membro do governo provisorio e testemunha dos factos e das opiniões.
Se fosse preciso fazer outras citações, iria buscar, por exemplo, um historiador do suffragio universal em França.
«A preoccupação geral no seio d'este concelho (governo provisorio), era de subtrahir as classes pouco esclarecidas, e dependentes aos diversos generos de pressão que é muito facil de fazer operar sobre ellas. .. via-se n'isto um meio de quebrar os antigos limites administrativos, e de derrotar as influencias locaes. . . Para este fim, Armand Marrast fez prevalecer o systema de escrutinio de lista, especie de accordo entre o voto directo, que as circumstancias impunham, e o suffragio indirecto das nossas constituições republicanas. . . Os redactores do projecto da constituição republicana estavam, pois, preoccupados em subtrahir o eleitor fraco e ignorante ás influencias do campanario.»
É preciso que v. exa. saiba, sr. presidente, que n'este escrutinio de lista havia listas de 34 nomes.
900 deputados divididos por listas departamentaes, chegando a lista do departamento do Sena a attingir 34 nomes!
Se ha difficuldade, e esse é effectivamente um dos defeitos do escrutinio de lista, era escolher uma lista longa de

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candidatos, escolher 34 nomes para uma só lista, chegava a constituir quasi um impossivel.
Todavia os republicanos de 1848, não concordando com as idéas dos republicanos actuaes, a seu turno firmados na auctoridade dos monarchicos liberaes de 1859, acceitavam o escrutinio de lista, e que lista! como um principio justo, liberal e conveniente para o paiz.
O sr. Manuel de Arriaga: - N'essa epocha não tinha s. exa. o problema da representação proporcional dos differentes grupos.
O Orador: - Lá vamos ao proporcional. O proporcional ha de vir a seu tempo.
Pois o escrutinio de lista, em que havia até lista de trinta e quatro nomes, elegeu duas camaras magnificas, assim se póde dizer, não só em relação ao seu nivel intellectual, como á representação das fracções politicas em que se dividia o paiz.
Tanto na Camara constituinte de 1884 como na legislativa de 1859 estavam representados todos os partidos, em que se dividia a França.
Abra o illustre deputado as paginas do historiador Henry Martin, por exemplo, ou de qualquer outro que te occupar d'essa epocha e ahi verá corroborada a minha affirmação.
Eu irei buscar ainda a Garnier-Pagés a apreciação da constituinte, da de 1848!
"Assim em plena explosão revolucionaria a França chegou a formar a assembléa mais honesta, mais sincera, mais dedicada, a mais liberal de todas, que até então se tinham constituido. Por infelicidade a todas estas grandes qualidades faltava a experiencia."
Os erros commettidos pela constituinte foram devidos á falta de experiencia. A assembléa era boa e estavam n'ella representados todos os partidos.
Em 1849 quem governava a França era ainda a republica, sob a presidencia de Luiz Napoleão. Pois a legislativa não era favoravel, nem a uma nem a outro. A prova está em que tentava contra a republica a restricção do suffragio, com a lei sobre o domicilio; e que Napoleão, logo que pôde, a dissolveu lançando-se na dictadura. Todavia fôra sido eleita pelo escrutinio de lista, como o fôra a constituinte.
Já s. exa. vê que o escrutinio de lista simples deu resultados bem differentes d'aquelles, que pretendem assacar lhe. Se isto não são um argumento positivo, eu não conheço outros superiores.
O sr. Manuel de Arriaga: - Melhor a seria a historia do escrutinio de lista em Portugal.
O Orador: - Se s. exa. quer o resultado do escrutinio de lista em Portugal, lá chegaremos a seu tempo.
Nos tempos actuaes o escrutinio de lista simples tem produzido tambem excellentes resultados quer na Belgica, quer na Suissa.
E o sr. Manuel do Arriaga declara-se admirador das formulas sociaes da Suissa, mas para fugir á terrivel consequencia logica que o persegue, carece de um expediente para salvar o escrutinio de lista simples só na Suissa.
"São as liberdades locaes e communaes que tornam o circulo plurinominal appropriado para a Suissa".
Aqui está a habilidade dialectica de s. exa.
E eu vou mostrar o que é a communa suissa: se s. exa. la estivesse, ha muito tempo que se haveria expatriado, o que não quer dizer que o povo suisso não seja o mais democrata da Europa.
Diz s. exa., vós não tendes na base as mesmas franquias locaes. Vamos a ver. Eu peço á camara paciencia, mas isto não póde deixar de ser tratado assim, bem ou mal.
Eu tenho aqui um livro de que aconselho a s. exa. a leitura. É um estudo de historia contemporanea, que se intitula a Suissa contemporanea, escripta por um illustre escriptor inglez, Dixon, que foi já, segundo supponho, ministro em Inglaterra.
O sr. Arriaga: - Conheço.
O Orador: - Melhor. É um livro bem escripto, e o auctor um homem de criterio superior e de largos horisontes.
A communa suissa tem em regra um conselho electivo e um magistrado tambem electivo, que o preside.
Este maire, se me é permittida a comparação, equivale ao nosso administrador, se póde haver correspondencias em organisações administrativas tão differentes como a nossa e a suissa.
Deve observar-se que a communa na Suissa é muito menor que o nosso concelho, e mais se approximará da nossa parochia.
Vamos a ver como os maires funccionam nas communas:
"O maire e o conselho são os pais da communa, nada se póde fazer sem o seu consentimento."
Ora eis aqui, segundo penso, uma restricção das grandes liberdades locaes tão apregoadas pelo illustre deputado republicano, mas continuemos a arrancar trechos caracteristicos a este bello livro:
"Um garoto expulso da escola pela sua preguiça, ou pelo seu mau comportamento, não póde ser readmittido senão com a intenção do maire. Um pastor apaixonado por uma joven aldeã não póde esposal-a sem consentimento do maire."
Que diria s. exa. das liberdades locaes em Portugal se para casar fosse obrigado a pedir licença ao administrador ou ao regedor?
E com isto não quero affirmar que a Suissa não é um paiz livre e democratico; mas a origem da sua democracia é preciso ir buscal-a a outra causa social mais geral e mais profunda.
"Os maires e os conselhos communaes administram o fundo dos pobres e expulsam qualquer pessoa que se torna um membro oneroso para a communidade."
Ora diga-me o meu illustre amigo o effeito que faria com os nossos costumes este ostracismo da pobreza?
É certo que na Suissa a benificencia official é obrigatoria, mas ainda assim, como repugna ás nossas praticas liberaes o igualitarias esta expulsão da pobreza! Não acontece o mesmo na Suissa e o maire paternal, entregando ao desgraçado uns centos de francos tirados do cofre da communidade, convida os muito amavel e peremptoriamente a expatriar-se para França, para Italia, e melhor ainda para a America, por ser mais longe.
Que me diz s. exa. a estas suaves liberdades locaes? Qualquer suisso póde fixar a sua residencia e tornar-se cidadão de uma communa, perfeitamente; como nós temos tambem a plena liberdade de transito e de fixação de residencia; mas na Suissa ha algumas restricções a este direito: "Qualquer homem, quaesquer que sejam a sua profissão e a sua religião, póde pedir para ser considerado cidadão de uma communa em que fixou a sua residencia; mas esta communa tem o direito absoluto de acolher favoravelmente ou de repellir o pedido, e repellil-o sem dar explicação alguma."
Então manifesta-se o poder paternal da auctoridade communal, e de facto restringe o direito: "qualquer maire repelliria sem uma palavra de explicação um anão, um cretino, ou um coxo. Em muitos pontos a religião é um ponto principal".
E não é tudo ainda. A communa exige ao requerente um direito pecuniario de admissão, mais ou menos importante, conforme as suas condições particulares; se é casado e tem filhos, mais do que sendo casado, sem filhos, ou celibatario.
Agora vou ler á camara o que no nosso paiz produziria uma revolução immediata, e note-se que a Suissa não deixa de ser um paiz essencialmente democratico, como nós somos, felizmente.
Chamo a attenção da camara para o periodo que vou ler:

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530 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

«Quem na communa insinua que desejaria casar-se, é vigiado de perto. Mettem-se-lhe os possiveis pregos na roda. Em muitos cantões um homem não póde casar-se sem licença do maire. Ora este recusa-a, quando as circumstancias lhe permittem a mais ligeira rasão de escusa.
«O postulante é umas vozes muito joven, outras muito velho. Póde succeder que seja cego, coxo, surdo ou mudo.
«Objecta-se-lhe que está doido, e realmente aos olhos de um velho maire celibatario desejar alguem casar-se, não será uma prova evidente de loucura? (Riso.)
«É pobre. A joven que elle quer esposar não pertence ao mesmo cantão. A sua reputação não é immaculada.
«Emfim, qualquer rasão é boa.»
Ora, sr. presidente, tanto affecto paternal da parto do meu administrador, ou do meu regedor, seria intoleravel. (Riso.)
Mas o homem teima, e apesar do tudo casa; então o maire, á frente da população, conduz o ditoso par á estacão do caminho de ferro mais proxima, e mettendo-lhe na mão algumas centenas de francos, aconselha-lhe as florestas virgens do Novo Mundo.
Uma só phrase, e esta terrivel, manifesta a auctoridade de um maire: «A lei não define as funcções d'estes chefes de aldeia.»
Fazendo estas citações, e fallando da Suissa, não imagino a camara que eu deprecio as nações estrangeiras, nem mesmo deixo de conhecer o que ha de liberal na organisação suissa; o que eu quero provar, todavia, é que é necessario empregar as expressões com a verdade social, a que ellas correspondem.
E o que se passa na Belgica?
Porque não citou s. exa. esta nação, que professa o escrutinio de lista?
Aqui podem servir os similes, A Belgica e da nossa raça, a sua legislação administrativa é similhante á nossa, salvo em ser menos liberal.
Serão os nossos costumes menos democratas do que os da Belgica?
Estaremos nós mais atrazados do que a França em 1848, quando appellou para o escrutinio de lista?
E qual será a base da verdadeira democracia, o granito sobre que se funda a liberdade de um povo?
Não esqueçamos as phrases do sr. Gonçalves de Freitas, por cuja eloquencia o felicito, desejando ao mesmo tempo que s. exa. aproveite o seu bello talento para casar a eloquencia com um estudo positivo, o que ha de vir com a idade, porque, Deus me livre de homens, dizia alguem, que aos vinte annos não têem idéas muito avançadas, e aos vinte e cinco não são poetas.
S. exa. teve umas phrases verdadeiras, quando se referiu á differença caracteristica entre a liberdade moderna e a liberdade classica.
Eu direi que a liberdade moderna é perfeitamente differente da liberdade antiga, avançarei mesmo que esta jamais existiu, porque tinha na sua origem as mais terrives desigualdades, do cidadão para o escravo, das classes sociaes entre si, da propria nação para os estranhos, considerados como barbaros.
A liberdade moderna é de outra natureza, porque tem por base a igualdade dos individuos e das suas condições, sem a qual não ha liberdade. (Apoiados.}
Estude s. exa. a organisação dos povos modernos mais civisados, aprecie-os nas suas manifestações economicas, e concluirá que a verdadeira origem da sua liberdade e da democracia dimana do maior ou menor grau de igualdade dos cidadãos. A differença profunda das condições dos cidadãos dá apenas a liberdade de certas classes, para as outras haverá tolerancia nas leis, existirá nos codigos a liberdade e a igualdade civil, mas não existe para ellas liberdade social.
Sabe v. exa. porque a Suissa é um paiz essencialmente livre e democrata? E porque lá não existem accentuadas diferenças de condições sociaes, e não ha «como na Inglaterra um lord que possue quasi todo um condado, nem como na Russia, um boiardo proprietario de uma provinda inteira. Na Suissa, de cada dez habitantes, nove possuem o solo, que exploram e agricultam».
Aqui tom v. exa. a origem sã e verdadeira de toda a liberdade individual e de toda a democracia social.
Portugal é hoje um dos paizes onde a sociedade é mais democratica, porque ha bastante igualdade de condições entre os cidadãos e a maior tendencia para a conservar.
Nós temos tido o bom senso de atacar um a um todos os principios viciosos de uma legislação, que tendiam á grande accumulação de fortunas. (Apoiados.)
Os meus collegas não me attribuem de certo a idéa de communismo, ou da igualdade da repartição da propriedade o que é um absurdo; mas na divisão das riquezas póde admittir-se uma certa justiça equitativa, uns certos termos medios, que acho muito para desejar, pequenos proprietarios, pequenos industriaes, muitos remediados, poucos pobres e nenhum millionario.
Deus nos livres das grandes agglomerações de fortunas que não trazem senão o desequilibrio completo do bem estar das sociedades, a desconfiança de umas classes em face das outras, e uma reacção odienta da parte d'aquelles que soffrem, e que comparam as tristes desigualdades da fortuna, não tendo a força da resignação que a religião aconselha, e que a sã philosophia produz. (Vozes:-Muito bem).
Realmente não me parece que os argumentos produzidos contra o escrutinio ed lista, offereçam grande valor.
E a camara observará que eu tenho, quanto possivel, encarado O assumpto positiva e historicamente, unico processo por que é possivel, em problemas d'esta natureza, formar uma convicção sincera.
Chegámos ao fim da questão.
N'este ponto, referindo-me como sempre com a maior consideração e respeito ao meu amigo o sr. Guilherme de Abreu, que não vejo presente, dir-lhe-hei que foi impiedoso com migo, e não tenho para vingar-me senão uma phrase: que s. exa. foi um paladino dos circulos uninominaes e das boas influencias locaes.
Ninguem o chamára a terreno com torvo e fero aspecto, ninguem affimára que as influencias locaes eram pessimas.
Distinguia-se entre influentes e influentes locaes.
S. exa. não quiz comprehender as minhas palavras e as minhas idéas claramente escriptas, por isso me verei obrigado a contrapor á boa eloquencia de s. exa. a minha modesta prosa; á definição romantica de s. exa. a minha sêcca e realista.
Antes d'isso desejaria que s. exa. me explicasse um phenomeno social, que se manifesta entre as nações da Europa em relação aos circulos plurinominaes, isto é ao escrutinio de lista.
N'este pequeno resumo, compendiei as principaes nações europeas que usam do escrutinio de lista, e entre ellas figuram não só as mais adiantadas em civilisação, como as mais democraticas e liberaes:

1.ª- Belgica

Numero de circulos Total de deputado

Circulos de 14 deputados (Bruxellas) 1 14
» de 8 » 2 16
» de 7 » 2 14
» de 5 » 2 10
» de 4 » 5 20
» de 3 » 10 30
» de 2 » 9 18
» de 1 » 10 10
41 213

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SESSÃO DE 6 DE MARÇO DE 1884 531

2.ª -Suissa

Numero do circulo Total de deputados

Circulos de 5 deputados 5 25

» de 4 » 9 36
» de 3 » 14 42
» de 2 » 12 24
» de 1 » 8 8
58 135
3.ª -Italia

Circulos de 5 deputados 34 170
» de 4 » 38 152
» de 3 » 60 180
» de 2 » 3 6
135 508
136

4.ª - Hespanha

Circulos de 8 deputados (Madrid) 1 8
» de 5 » 2 10
» de 4 » 1 5
» de 3 » 22 66
» de 1 » 343 343
369 431

5.ª - Inglaterra

Circulos de 4 deputados (Londres, city) 1 4
» de 3 » 12 36
» de 2 » 210 420
» de 1 » 198 198
421 658

Já mostrei que na historia d'este seculo o governo republicano da França acceitou o principio do escrutinio de lista.
Duas nações professam o escrutinio de lista, a Suissa e Belgica. N'estes paizes tem havido uma pequenissima corrente contra o escrutinio de lista e a favor da circumscripção uninominal.
Alem d'estas nações a Inglaterra póde ser classificada tambem entre as do escrutinio de lista.
A sua camara, formada por 658 deputados (actualmente por 651, pela perda do direito de representação, imposta como pena a alguns circulos, onde se provou a venalidade dos collegios eleitoraes), tem 460 membros eleitos por circulos plurinominaes.
A Inglaterra, pela lei de 1867, alargou ainda o seu systema de escrutinio de lista, creando mais 13 circulos plurinominaes, o da city com a lista de 4 nomes e 1 para a representação das minorias, e 12 de lista de 3 nomes e 1 para a minoria.
A Hespanha inaugurou em 1878 o circulo plurinominal, creando 26 circulos.
O de Madrid com a lista de 8 nomes e os restantes a 5, 4 e 3 nomes, sendo no caso de 8 e 5 nomes, 2 para a minoria e nos de 5 e 4, 1 apenas.
A Italia estabeleceu o escrutinio em 1882, concedendo apenas um logar para a representação das minorias nos circulos de 5 deputados, que são 34.
Em França todos sabem a lucta enorme que tem havido para se estabelecer o escrutinio de lista, lucta que os anti-Gambetistas conseguiram vencer no senado, mas que parece novamente agitar se agora.
Nós, em Portugal, vamos inaugurar o escrutinio de lista com representação de minoria.
Seria occasião para perguntar ao illustre deputado se não vê em ......... isto um pronunciado movimento da opinião publica n'estas nações, movimento que corresponde necessariamente a positivas e profundas necessidades sociaes?
Serão apenas os manipuladores de systema, que impellem aquelles povos na direcção de uma certa corrente de idéas e opiniões?
Não sabe s. exa. que as sociedades são regidas por leis sociaes, tambem naturaes e impreteriveis, que correspondem a necessidades evidentes da sua natureza intima e da sua conservação?
Esta tendencia provada será apenas uma phantasia da opinião publica, porque, emfim, sr. presidente, directa ou indirectamente, no regimen moderno, nas democracias contemporaneas, quem inicia, ou pelo menos fortalece, os movimentos, é a opinião publica representada por uma fracção mais ou menos importante do povo?
Ora, se uma manifestação de opinião corresponde a necessidades sociaes, quem são ellas n'este caso?
A resposta não se ias esperar nem é duvidosa. Dão-n'a todos os publicistas que se têem occupado do direito eleitoral: Stuart-Mill em Inglaterra, Zanardelli na Italia, Gambetta em França, e outros que, por toda a parte, se têem occupado dos problemas eleitoraes.
Podem existir outras rasões especiaes: na Italia existia, por exemplo, a extrema divisão de partidos, que em 1880 prolongou tres semanas a resolução de uma crise ministerial; podem certamente, mas não deixam estas de ser importantes e geralmente confessadas.
São: o abuso do dinheiro, a veniaga eleitoral; e o egoismo local, o espirito de campanario.
Como o escrutinio de lista corrige estes dois defeitos sociaes, ninguem o ignora, e, bem ou mal, vem este desenvolvido no relatorio, por isso não me repetirei.
Pergunto outra vez á camara, se serão os manipuladores de systemas, os utopistas, que têem força para insinuar ás classes, que pensam e dirigem as sociedades, a necessidade do escrutinio de lista, e para conseguir a sua realisação social?
Quando se manifesta uma tendencia d'esta ordem, repito, corresponde sempre a uma necessidade social.
O mal podia, facilmente, prever-se discutindo em principio, o circulo uninominal; a experiencia, porém, está feita e ha expressamente a propria confissão dos publicistas. (Apoiados.)
N'este ponto devo dizer á camara, que não é minha intenção atacar ninguem, n'isto que vou expor.
Quando se discuto uma questão politica, discutem-se idéas e principios, e salvam-se as personalidades.
N'outra occasião em que fallei n'esta casa, disse - que não condemnava senão as influencias locaes perniciosas.
Largamente defini o que entendia por influencias perniciosas, e sobre este ponto veiu ainda o meu amigo e collega Gonçalves de Freitas, com a sua palavra facil e elegante, esclarecer as minhas idéas.
Não fui comprehendido.
Vejo-me, pois, obrigado a definil-as rigorosamente lendo uma parte do relatorio que foi presente á commissão, parte que se eliminou para a libertar da responsabilidade da opinião, que presentemente para mim assumo.
No relatorio, depois de definidas as boas influencias, dizia-se o seguinte:
«Desgraçadamente as cousas entre nós como por toda a parte, não se passam assim senão por exceptues rarissimas; a regra é bem diversa.
«( )influente local é um intermediario entre o governo e os eleitores da localidade, e, como verdadeiro intermediario mercantil, aufere uma percentagem enorme de ambas as partes em utilidade propria e exclusiva. Os povos habituam-se a este absurdo, e por isso não é excepcional encontrar um circulo possuindo dois deputados indicados alternativamente para o parlamento conforme o partido militante, que está no poder. Confiança pessoal, convicções da parte do eleitor, essas, não existem, o que lhes basta saber e que o seu representante manda com certa e determinada situação politica no poder. Outras vezes, o que é peior ainda, o in-

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532 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

fluente local não quer sair da sua modesta obscuridade e recebe voluntariamente o nome indicado pelo poder, qualquer que seja a sua proveniencia e origem. Em qualquer dos casos a consequencia é simples, do ut des, reciprocidade dos serviços, troca de veniagas, tudo em nome dos beneficios da localidade.
"Em beneficio do povo: substituições dos administradores, dos escrivães de fazenda, de todo o pessoal emfim, que dirige ou fiscalisa uma funcção do estado; em beneficio do povo: má elaboração de matrizes, protecção a certas industrias, e, finalmente o concerto da igreja parochial e meia duzia de kilometros de estrada, traçados consoante o interesse do influente local ou dos seus apaniguados. Quem julgar o quadro carregado, que olhe em volta de si.
"Em compensação, é a consequencia logica das premissas, o poder adquirir um firme esteio no parlamento; que se discuta uma grave questão de interesse geral do paiz, que se aprecie uma medida que vae affectar outra ou outras localidades, eis o que lhe é um pouco indifferente, logo que se salve o palladio da sua força politica; mas o projecto mais justo e mais rasoavel, que lhe transforme a sua machina eleitoral, esses,, soffre uma guerra desapiedada, que vae desde a ameaça politica até onde póde ir; por vezes, e mais modestamente insinua a sua medida especial em beneficio propaio, e reclama a protecção governamental como paga dos seus serviços politicos. Taes são as influencias locaes, que levaram Stuart-Mill e Gambetta a protestar solemnemente em nome dos bons principios representativos.
"Dá-se a rotação dos partidos, sobe ao poder uma situação adversa, as consequencias são faceis de prever. A importancia do medianeiro cae pela raiz, alimentava-se da seiva do poder e esse desapparreceu; a sua ephemera popularidade, que não se fundava n'uma qualidade individual independente e autonoma, desapparece phantasticamente; sem administradores, sem delegados do thesouro, sem escrivães de fazenda, que, sempre em nome do beneficio do povo, são trucidados em hecatombe official, reduzido a um punhado de fieis que confiam no futuro, a lucta infrene do dinheiro apparece como a unica possivel; a conveniencia da limitação do suffragio manifesta-se-lhe então, porque a sua popularidade lhe fica dispendiosa.
"Todos estes defeitos são a final attribuidos ao principio do suffragio e tudo e caminha regularmente."
Eis as influencias que me parecem, condemnaveis e inconvenientes para a boa governação publica. (Apoiadas.)

gora vamos ao celebre argumento da lista entre nós.
Disse s. exa. - não conheceu o sr. deputado esse velho devasso e immoral, que se chama escrutinio de lista. Ora esse velho devasso e immoral, antes de 1852, manifesta va-se pela eleição indirecta, a que eu attribuo todas, ou quasi todas as preversidades que o illustre deputado lançou á conta d'aquelle pobre escrutinio de lista.
Aliás vejamol-o de 1852 até 1859, desacompanhado da eleição indirecta; isto é estudemos como funccionou o circulo plurinominal directamente.
Eu abro este livro do sr. Antonio Candido sobre Principios e questões de philosophia politica, do qual o sr. Manuel de Arriaga leu só uma parte, deixando era silencio aquella em que o illustre escriptor defende a lista multipla, e encontro a paginas 41 um pequeno quadro contendo as differentes legislaturas occorridas de 1852 até 1881, e notando não só a sua duração, mas ainda o numero de deputados de opposição com que iniciaram em seus trabalhos; pois as camaras de 1853, 1857 e 1858, eleitas por lista, multipla, que ia de 2 a 7 nomes, sem representação de minorias deram em media 25 deputados á opposição, e são eleitas pela lista simples.
Como eu supponho que uma lei eleitoral não tem outro fim senão garantir a representação da opinião do paiz, pelos seus resultados indiscutiveis e evidentes a lei de 1852 representou melhor as frações opposicionistas do que a de 1859.
Dirão o que quizerem, mas esta é a eloquencia, dos algarismos.
Se isto não é prova, não sei o que seja um argumento positivo.
Demais a experiencia do systema em 1852, nada provaria se se demonstrasse que o meio social d'então para cá tinha soffrido transformações profundas, e uma das não menos importantes é o alargamento do suffragio pela lei de 1878; acontecendo alem d'isso que os deffeitos da lista plurominal são em parte corregidos pela representação das minorias e pelo systema das accumulações empregado no projecto, porque uma o outro contribuem para fortalecer as fracções oppicionistas.
Constituem exactamente aquelle elixir, a que se referiu o sr. Guilherme de Abreu.
Ora n'este ponto seja-me licito dizer que julgo singular attribuirem-me o emprego dos argumentos da auctoridade.
Ácerca d'este assumpto não citei auctoridade alguma no relatorio. Apenas referi duas phrases de dois estadistas, phrases que pela sua elegancia e verdade synthetisavam o que se acabava de expor.
Para evitar confusões tive o cuidado de escrever no principio do periodo: descendo da auctoridade das nações para a autoridade dos homens.
Não gosto de argumentos de auctoridade, senão quando a auctoridade é a dos povos ou das nações, porque esta representa mais alguma cousa do que a simples opinião mais ou menos valiosa de um individuo.
E n'este ponto não é licito chegar a excesso do sr. Manuel de Arriaga, que para se fundar n'uma a grande auctoridade, para nós indiscutivel, exclamou: se Antonio Rodrigues Sampaio em 1859 conhecesse o systema proporcional tinha o por certo abraçado; e eu responderei a s. exa. que se elle em 1859 conhecesse o systema de Carteret, ou da lista incompleta, não teria outra opinião. E ambos temos rasão.
Chegar ao ponto de dar a um homem, que já está na eternidade, uma opinião que concorda com a nossa, é um perfeito cumulo do argumento de auctoridade.
Em todo o caso as opiniões do sr. Guilherme de Abreu, ao menos são logicas. Educado na antiga escola, os homens como elle, não gostam de ver tocar com mão impiedosa na arvore da liberdade, á sombra, da qual se acolheram, e que elles mesmo cultivaram; eis o que é natural; como é natural que nós, os homens da geração nova, não tenha-mos o menor respeito por aquelle arbusto e o arranquemos para plantar o grande cedro da democracia moderna.
As do sr. Arriaga é que infelizmente o não são, quando s. exa. prefere o circulo uninominal a plurinominal, e exclama triumphante:
"Quando as massas, que são nossas, poderem entrar aqui em nome da lei, ai de vós!"
As massas podem entrar, porque, como s. exa. disse, o suffragio em Portugal é universal.
Um dos defeitos da lista plurinominal é, segundo affirmam, dar, pela ligação e arregimentação, uma força insuperavel ás maiorias; ha mesmo quem affirme que a republica franceza quer estabelecer hoje o escrutinio de lista simples, para esmagar a reacção monarchica.
Tem as massas pelo seu lado, tem o escrutinio de lista, porque não entra s. exa. n'esta casa, e não conquista o poder?
Permitta-me o illustre orador que lhe diga, que estas linda phrases das massas, da liberdade, da igualdade e fraternidade, bellas phrases jacobinas. . .
O sr. Manuel do Arriaga: - Eu não proferi a palavra massas.
O Orador: Tenho aqui textualmente copiada a phrase de s. exa. Entretanto, se s. exa. me diz que não a pronunciou, eu creio o.

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SESSÃO DE 6 DE MARÇO DE 1884 533

O sr. Manuel de Arriaga: - Fallaria em multidões, em massas não fallei.
O Orador: - Supponhamos que são multidões. Se as massas não estão no eleitorado portuguez, estarão as multidões, não percebendo eu muito bem a differença das palavras.
Esta fórma pomposa de fallar da liberdade, da igualdade e fraternidade com modos imponentes foi boa quando estas tres bellas expressões da democracia constituiam ideal, a que se procurava chegar nas sociedades; hoje, porém são inuteis porque somos mais ou menos iguaes, a liberdade campeia entre nós, e a fraternidade não está felizmente muito longe dos nossos arraiaes. (Apoiados.)
Eu digo francamente, ao illustre deputado e meu amigo, que são inuteis esses assomos demagogicos, porque o jacobinismo que começava na historia com aquella celebre phrase de Voltaire «o ultimo rei enforcado na tripa do ultimo frade» terminara com a bala, que quebrou os queixos do Robespierre. (Vozes: - Muito bem.)
Se s. exa. entrar aqui com as suas multidões para nos esmagar dir-lhe-hei como aquelle girondino, que levavam á guilhotina, disse para os jacobinos: «Vós matais-me hoje quando o povo está louco, mas ámanhã, quando elle recuperar a intelligencia, sereis tambem fatalmente condemnados.» E foram-n'o.. .
O sr. Manuel de Arriaga: - Peço licença para interromper s. exa.
Eu não disse nada d'isso. O que eu disso foi que, se s. exa. quer garantir ás minorias a sua proporcional representação, é um acto justo, para que as minorias imperem aqui com as maiorias; mas a lei como está exclue as minorias.
O Orador: - Eu não quero contestar a auctoridade da asserção de s. ex.ª; mas está aqui nos meus apontamentos escripta a phrase textual de s. ex.ª; mas enganar-me-ia ou.
Vejamos agora a questão da proporcionalidade; eu não tenho pretenções a cousa alguma; mas permitta-me o illustre deputado lhe diga que se ha parte do relatorio da commissão, que me pareça claro, methodico, e devidamente desenvolvido, é a que se refere á proporcionalidade da representação parlamentar.
Repetir o que se escreveu é trabalho, a que me não abalanço e com que não cançarei a camara.
Eu acceito o principio da proporcionalidade como um principio justo; o que me não parece, porém, é que até hoje se tem encontrado um systema pratico e exequivel para o realisar.
S. exa. citou a Dinamarca, que ensaia em uma das suas pequenas provincias o systema de Andrae, n'estas condições talvez possa dar alguns resultados; na Dinamarca o eleitorado exigindo trinta annos de idade, o numero de eleitores deve ser pequeno e a arca em que se applica o systema é pequenissima. Não funccionaria bem aquelle systema com um grande numero de eleitores, em um paiz consideravelmente maior do que a area da experiencia.
Alguns argumentos n'esta discussão são como a hydra de Lerna, por cada cabeça cortada renascem-lhe cem. O principio da proporcionalidade é um principio superior, delicado, constituo já uma verdadeira philosophia eleitoral e para que uma sociedade possa pratical-o ou precisa de grandes restricções de voto ou então de uma boa educação do seu corpo eleitoral.
Eis para o que serve um principio mais simples como o da lista incompleta; se o meu illustre collega emarasse as questões sociologicas por um prisma mais positiva acharia esta rasão de grande peso e valia.
E necessario preparar o meio social para elle comportar amplas reformas, e não experimentar no corpo social senão com a maxima prudencia e reserva.
Quem lhe contesta que a proporcionalidade é um lente e verdadeiro principio?
O que se lhe contesta é a possibilidade de o introduzir na pratica e em boas condições; algumas rasões tiveram os legisladores de Hespanha, da Italia e da Inglaterra, para adoptar o systema de lista incompleta de preferencia a qualquer outro, principalmente na Inglaterra onde nasceu o systema proporcional de Thomas Heare.
É porque realmente isto de fazer experiencias n'um paiz não é precisamente o mesmo que experimentar in anima vili.
E os estadistas têem obrigado de se opporem a estas experiencias que podem subvertera ordem, ou pelo menos alterar o regular andamento social.
Por estas rasões os homens que occupam o poder são o devem ser, meticulosos e prudentes, isto é, na velha phrase, conservadores.
Talvez o meu illustre amigo mio observasse ainda o phenomeno constante da transformação em conservadores dos partidos mais avançados e radicaes que se elevam ao poder! Pois é um phenomeno social de grande importancia e de facil explicação.
A fracção republicam que actualmente dirige a politica da França, já é conservadora para a extrema esquerda. Os seus estadistas illustres, Grevy, Ferry, Freycinct, Waldeck Rousseau e tantos outros são já conservadores aos olhos de Rochefort, Cemenceau e Claude Hugues.
Este phenomeno explia-se com uma só phrase- a responsabilidade da ordem publica.
O illustre deputado e eu, na nossa circumscripta esphera politica, temos responsabilidades limitadas e pessoaes, as das nossas familias, as dos nossos pequenos filhinhos.
Mas os homens que estilo m? cadeiras do poder têem, e se não têem devem ter, o cuidado, a responsabilidade da ordem publica, do bem estar e do socego dos cidadãos.
Aquelles logares não se crearam para satisfazer vaidadiolas e gloriolas, nem o parlamento se fez para discutir rhetoricamente. (Apoiados.)
Todo este Complicado mechanismo social foi inventado e composto elemento a elemento com o fim unico de proporcionar ás sociedades o máximo socego e a maxima ordem, para que o individuo e a familia possam conservar-se e desenvolver-se socegada e normalmente. (Apoiados.) Não teve outro fim.
Da consciencia d'esta finalidade social e da sua responsabilidade nascem esta força imperiosa e esta rasão, que afastam os estadistas do desconhecido e do incerto, levando-os a reformar lentamente, observando os factos, pesando as consequencias e estudando a experiencia dos outros povos, antes de experimentar n'aquelle a que pertencem. E só por esta fórma cumprem a sua missão. (Vozes: - Muito bem.)
Sr. presidente, repugna-me repetir n'esta casa os argumentos, bons ou maus, que a commissão desenvolveu no seu relatorio para defender as suas opiniões; por esta fórma as discussões tornam-se interminaveis e é perfeitamente inutil relatar circumstanciadamente os projectos de lei; por isso, serei breve na minha exposição.
O principio da proporcionalidade é um principio justo e verdadeiro conquistado definitivamente para a sciencia social. É; mas como todos os principios politicos e sociaes exige processos mais ou menos complicados para entrar na pratica social.
Quantos preceitos justos, conhece v. exa. nas mesmas condições? Pois a perequação do imposto, a sua igual repartição, não é um preceito justo e fundamental e todavia a difficuldade de a traduzir na pratica é evidente, e tão evidente que os estadistas e os financeiros luctam em toda a parte para o estabelecer, sem que o seu esforço seja coroado da perfeito resultado.
Demos de barato que existia um bom systema proporcional já experimentado lá fóra; o que não ha, porque o exemplo da Dinamarca é feito em condições especialissi-

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mas como já disse; mas consintamos por um momento em quo elle existe.
Quer o illustre deputado applicar esse systema, que é já philosophico e delicado, ao nosso corpo eleitoral, quando a sua illustração é tão grande que um illustre deputado (o sr. D. José de Saldanha) vem pedir que se mudem os nomes de circulos plurinominaes e uninominaes, porque lá fóra pouca gente os comprehendia; e outro deputado affirmou n'esta mesma tribuna, em que estou falhando, que um par do reino lhe disser? não comprehender o systema de lista incompleta, porque realmente não via como tendo tres deputados o circulo se póde votar só em dois! N'um paiz com este grau de civilisação politica entregar á massa eleitoral uma grande lista, com a dificuldade da escolha e da apreciação relativa dos candidatos, não é possivel; isto não é praticavel n'um paiz que sáe agora das faxas da representação uninominal.
Pensar n'isso é a utopia das utopias. (Apoiados.}
No que nós podemos e devemos pensar e cm educar o corpo eleitoral, em habilitar o paiz para novos processos, eleitoraes; preparando assim o advento racional de reformas mais perfeitas.
Ora exactamente o systema de lista incompleta satisfaz a este fim.
É simples, não é exigente, adpta-se facilmente aos nossos costumes eleitoraes; é portanto um bom mestre o um bom guia.
Até aqui tinhamos a lucta initada das maiorias e das minorias; vamos ter agora una estrategia e uma tactica eleitoral.
Para este effeito é preciso preparar os eleitores, que a final não são quadradinhos de papel ou feijões com que em nossa casa nos entretemos a figurar votações. O illustre deputado porém não quer nada d'isto e com um bando de zulus intenta formar um exercito para a alta sciencia guerreira de Moltke! Seja.
Tratarei agora de um assumpto quo vou desenvolver muito rapidamente.
Diz s. exa. o sr. Manuel de Arriaga que o relator errou os calculos. Póde ser, ainda que não me parece que assim seja; mas, repito, póde ser, e se assim for defender-me-hei apenas com um verso do Plauto ou de Terencio: Homo sum, humani nihil a me alienum puto.
Se errei, penitencio-me, mas o que peço sobre tudo, é que me façam uma pequena justiça, porque entre tantas cousas que escrevi, e pensei provavelmente, algumas pequenas verdades e acertos compensarão os erros.
Não me refiro ao illustre deputado o sr. Arriaga, s. exa. alem de meu collega é meu amigo, e até fez, não a justiça, mas a injustiça de me attribuir maior valor do que aquelle que realmente possuo.
Eu estava resolvido a não entrar n'esta questão, mas vamos a ver emfim, o que digo no relatorio.
Fiz um exemplo theorico, isto é, suppuz um caso que a pratica quasi nunca dará, o da concorrencia de duas listas, uma da maioria e outra da minoria, e suppuz o quociente eleitoral, isto é, o minimo de votos que um candidato deve obter para ser eleito deputado, fixado pelo processo ordinario, pelo numero de listas entradas divididas pelo numero de deputados a eleger.
Em vista d'isto disse, e digo ainda, que para a minoria vencer é indispensavel ter pelo menos o terço da votação, aliás, inferior ao quociente eleitoral, não elegerá deputado algum.
D'este raciocinio concluiu o sr. Manuel de Arriaga que eu declarava que a minoria que tivesse um terço da votação teria sempre um representante, o que eu não disse: apesar de que na pratica sempre que a relação da maioria para a minoria seja de 2 para 1, difficilmente aquella empolgará o deputado d'esta.
Para demonstrar o meu erro apresentou s. exa. uns calculos que não contesto na sua exacção numerica, mas a que dou, pelas rasões apresentadas em um dos meus precedentes discursos, muito pouca importancia. Eu sinto que não esteja presente, n'este momento, um homem versado em todas estas questões, um habil mathematico, auctoridade para nós todos pelo seu talento e pela sua illustração, o sr. Mariano de Carvalho, porque havia de perguntar-lhe, qual é a consideração que elle liga na pratica das eleições a estes calculos apresentados, para combinar decisivas victorias da maioria.
Se os calculos fossem praticaveis, porque é quo não se tem empregado mais vezes nos paizes, que têem a lista incompleta? A Inglaterra fez já, se me não engano, tres eleições com o systema de lista incompleta; a de 1868, a de 1874 e a de 1880; a Italia uma o a Hespanha duas e como a primeira tem 13 circulos a segunda 26 e a terceira 34, teremos 120 casos de eleição por lista incompleta, citando-se apenas como abafadas por combinações uma eleição em Birmingham e outra em Glasgow.
A relação das eleições sophismadas para as realisadas já é para descansar os espiritos mais timoratos, restando ainda conhecer as forças relativas das fracções politicas n'aquellas duas cidades, para se poder avaliar a verdade da asserção, o que infelizmente não consegui obter.
Eis claramente apresentadas as minhas opiniões por consideração para com o illustre deputado, porque, emquanto ao resto, digo ao illustre deputado que se os antigos diziam que um homem aos trinta annos deve saber curar-se, eu acrescento que igualmente tem obrigação de possuir a necessaria philosophia, essa excellente medicina da alma, para não se deixar ir na corrente do quaesquer opiniões adversas, ou envolto nas ondas de ruins paixões, que se levantam para o incommodar.
Eu só respondo ao que quero responder, e se geral e gostosamente acceito qualquer discussão, imponho aos outros uma condição de que me não esqueço facilmente, o de serrem delicados; quando vejo, pois, a aggressão inutil, fecho o livro, dobro o jornal e sem me preoccupar em extremo com os sentimentos que a dictaram, fico pensando apenas em que para as altas discussões scientificas, que eu não tenho a vaidade de guindar ao Empyrco, tudo será necessario menos a indelicadeza.
Na discussão que tenho sustentado n'esta tribuna, e lá fóra com os meus adversarios, prezo-me de ter empregado sempre a mais delicada cortezia. (Apoiados.)
Procuro esclarecer-me o esclarecer, mas para engrandecer o meu pequeno merito jamais deprimi alguem, e para abrandar a minha atrabilis jamais magoei alguem.
Os erros noto-os com a simplicidade com que, se m'os notam, emendo os meus. (Apoiados.)
Sobretudo não procuro edificar o pedestal da minha gloria com o resto das estatuas derrocadas pelo meu camartello.
O sr. Manuel de Arriaga: - Parece-me que s. exa. não se dirige a mim, creio que o não injuriei.
O Orador: - Já declarei a s. exa. que para mim não é justo, mas injusto em me considerar mais do que sou. Foi isto pouco mais ou menos o que eu disse. Taes são as qualidades superiores que me attribue. A camara poderá confirmar se foi esta a minha phrase.
O sr. Manuel de Arriaga: - O que eu não desejava é que s. exa. se julgasse offendido por mim.
O Orador: - Eu já disse á camara quaes as relações as ligações de profunda amisade que me ligam a v. exa. Fomos bons companheiros em Coimbra. Ainda agora mesmo recriado as impressões da minha mocidade, eu senti treme-me um pouco a voz.
Não fazia referencia a alguem apresentava a v. exa., algum pontos da minha philosophia pratica, de que tanto carece quem n'este nosso paiz anda envolvido na politica.
Tenho experiencia de mais para saber que quando um homem, obrigado pelas circumstancias, se evidencia por um nomento, ha sempre um sarcasmo ou um motejo para lhe arremessar. (Apoiados.)

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Pois, sr. presidente...
O sr. Manuel d'Arriaga: - Eu podia ao illustre deputado que só explicasse, porque n'estas questões de honra deve haver todo o melindre. Eu pedia ao illustre deputado que dissesse, se quando falla em injurias, em ironias, etc., se refere a mira ou qualquer outro membro d'esta casa; porque, se se referisse a mim, eu era o primeiro a retirar tudo o que se podesse considerar como injurioso (Vozes:- muito bem).
O Orador: - V. exa. não tem cousa alguma a retirar, porque em nada me offendeu, nem ao meu antigo amigo me referia, ou podia referir.
Divaguei um pouco no campo especulativo e talvez sentimental, expondo principios geraes, mas não referencias pessoaes.
Seguindo agora o fio dos meus raciocinios vejamos, sr. presidente, o que tanto o sr. Emygdio Navarro, como eu dissemos em uma das passadas sessões.
E peço a attenção de s. exa., para me corrigir só eu não for, porventura, perfeitamente exacto, porque s. exa. não devo tomar a responsabilidade do que eu repetir, se não, for inteiramente conforme com as suas idéas.
É sempre necessario algum esforço da parte do orador para expor claramente d'esta tribuna raciocines, que se fundam em algarismos e por isso peço a attenção da camara.

raciocinio é comtudo muito singelo, dissemos nós, e realmente assim é; tendo a maioria tres quintos da votação no caso do circulo de tres deputados, ou quatro setimos da votação no caso de quatro deputados, e sempre possivel em calculo organisar as cousas por maneira tal que a minoria, que não seria vencida com a divisão grosseira de duas listas, seja empolgada.
O sr. Emygdio Navarro liga alguma importancia a este calculo.
Eu não lhe ligo nenhuma importancia.
E já que vejo presente o meu illustre amigo o sr. Mariano de Carvalho, pergunto a s. exa., cuja alta competencia n'este assumpto é conhecida, pois que é um mathematico distincto o um espirito pratico e positivo, que valor pratico attribuo a este calculo que se tem produzido para mostrar que a combinação das maiorias póde abafar minorias, que aliás seriam representadas.
O sr. Mariano de Carvalho: - Se v. exa. me dá licença responderei que não lhe dou valor algum.
O Orador: - Ora ainda bem que já encontro alguem da minha opinião, e alguem de tanta competencia e valor.
O sr. Emygdio Navarro: - Se v. exa. me dá licença, eu direi que para os circulos de taes ou quatro deputados não lhe dou valor algum.
O Orador: - Como nós não temos outros...
O sr. Emygdio Navarro: - Mas para os circulos de cinco ou seis deputados algum valor lhe dou.
O Orador: - Eu não lhe ligo valor nenhum, e direi as rasões porque e muito succintamente; pedindo aos illustres deputados que sigam com attenção o que vou dizer. Seja um circulo com 6:300 eleitores, e tomo este numero porque é divisivel por tres, por quatro e por seis. Supponha-mos á minoria 2:100 eleitores que é um terço, e á maioria 4:200. Quantos casos se podem dar?
Tres casos:
1.° A maioria vota n'uma só lista e n'esse caso ganha dois deputados e a minoria um.
2.° A maioria vota desigualmente em duas listas e tambem ganha dois nomes e a minoria um.
3.° A maioria vota igualmente em duas listas e então empata os seus candidatos com os da minoria, todos votados a 2:100 votos.
Agora, diz-me o sr. Manuel de Arriaga, ahi tem o seu erro; a maioria não divide a votação por essa fórma, o que equivalia a perder força, mas combina-a artificiosamente e em logar de empatar empolga o deputado da minoria.
De accordo, eu não contesto isto. O que eu disse, e repito, o que está escripto no discurso é que esta combinação artificiosa é assas perigosa por um lado o assas complicada na pratica por outro.
Effectivamente, a maioria que tem 4:200 n'um circulo de 3 deputados, organisará 3 listas:
Eleitores
A, B- Votada por 1:400
B, C-Votada por 1:400
C, A- Votada por 1:400
4:200
E, portanto, obterá:
Votos
A- Votado com 2:800
B- Votado com 2:800
C- Votado com 2:800

E como a minoria, tendo 2:100 eleitores, não poderá apresentar os seus candidatos votados com mais de 2:100 votos, perderá todos 3, quando no caso da divisão da maioria em duas listas a peior hypothese era a do empate.
Este mesmo raciocinio faz-se para o circulo de 4 deputados, sendo então 4 as listas concorrentes por parte da minoria.
Em regra, se póde dizer, como affirmou o sr. Emygdio Navarro, que a maioria que n'um circulo de 3 deputados possuo 3/5 da votação; empata; como empata no de 4 deputados possuindo 4/7 da mesma votação; effectivamente, no caso do 6:300 eleitores e no circulo de 3 deputados:

Maioria = 3/5. 6:300 = 3:780
Minoria = 2/5. 6:300 = 2:520
6:300

Dividida a votação da maioria por 3 listas, cada lista teria 1:260 eleitores, e os 3 candidatos correspondentes 2:520 votos cada um.
Um raciocinio identico para o circulo de 4 deputados mostraria que com os 4/7 da votação haveria tambem empate.
Ora, só o meu illustre adversario e amigo tivesse lido o meu anterior discurso, ou o tivesse attendido, não vinha renovar um raciocinio quo eu contrariei com argumentos, quo não foram respondidos, e, todavia, merecem alguma consideração.
Não contesto o valor do calculo, o que affirmo é que na pratica encontra grandes dificuldades e correctivos.
Em que se funda o artificio?
Primeiro no conhecimento perfeito das votações totaes de um circulo.
Segundo na divisão, por listas concorrentes e fixadas de antemão, da votação da maioria.
Em circulos de 15:000 a 20:000 eleitores o conhecimento e a fixação d'aquelles elementos, base indispensavel do calculo, é perfeitamente impossivel.
A extensa area dos circulos tambem difficulta aquellas operações, que exigiriam combinações seguras, quando e sabido que nas eleições renhidas ha sempre uma grande duvida sobre os pontos vulneraveis e incertos das votações.
O deslocamento á ultima hora de um influente importante não só destruiria todas as combinações, mas daria provavelmente a victoria da lista á minoria, quando por outra fórma não seria sufficiente para alterar sensivelmente as votações relativas.
Do resto, em circulo de numerosos eleitores e de grande superficie esta divisão de listas pelos pelotões de eleitores é uma idéa, que accusa nos seus propugnadores uma ignorancia absoluta das luctas eleitoraes.

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E note s. exa. que os grandes influentes que têem a certeza de fazer vencer os seus nomes, não se prestarão facilmente a combinações, desconfiados como são por natureza.
Ora, sinceramente, estes argumentos produzidos no meu anterior discurso eram tão fracos que não careciam de resposta?
Não me parece.
Não contesto, pois, a verdade do calculo; o que affirmo, repito, é a sua inexquibilidade, e a camara verá que geralmente ha de empregar-se a concorrencia de duas listas.
A maioria ha de garantir uma d'essas listas, e tratar de empolgar o deputado da minoria com a outra.
E aproveitando o ensejo, podemos apreciar o effeito da lista incompleta por uma fórma clara, quasi palpavel.
Supponhamos uma lista de 3 deputados, lista simples, isto é, sem representação de minoria e um circulo de 6:300 eleitores. Com quantos ganha a maioria? Com 3:151.
Com quantos ganha a minoria, fazendo os calculos ardilosos que citou o sr. Manuel de Arriaga? Com 3:783, porque com 3:780 empatava. Quantos votos precisa a maioria ter mais para ganhar a lista toda nos circulos de lista incompleta? 632 votos.
Aqui tem v. exa. e a camara, o minimo com que a lista incompleta fortalece as opposições; porque tanto faz dizer que a maioria precisa ter tantos votos mais para vencer, como dizer que a minoria foi reforçada com esses tantos.
Vou quasi no fim d'esta tarefa, mas resta-me ainda chamar a attenção da camara para a comparação da nossa lei com a lei hespanhola.
N'este ponto vou soccorrer-me a um argumento de auctoridade, n'este caso quasi desculpavel.
Abrindo o folheto publicado pelo sr. Antonio Candido, que já citei, a pag. 36, encontrâmos o seguinte:
«N'uma carta celebre, dirigida por Emilio Castellar a Emilio de- Girardin, pouco antes da morte d'este eminente jornalista, affirmava o grande tribuno hespanhol, que aquella lei (a eleitoral hespanhola de 1878), era a mais perfeita do toda a Europa. Tinha toda a rasão. Quem estranhou e combateu aquelle juizo, desconhecia as melhores theorias do direito eleitoral.»
Chamo a attenção dos illustres deputados para este assumpto. Parece-me que não faço um equilibrio de dialetica, mas emprego um verdadeiro argumento.
Já vimos que o nosso paiz é um dos primeiros da Europa no eleitorado.
Vamos agora a ver outro lado importantissimo, que é a formação da camara dos deputados.
Eu disse no relatorio que os parlamentos deviam traduzir dois grandes principios: serem numerosos, sem se transformarem cm multidão, o que é sempre inconveniente, para que todas as idéas e as opiniões do paiz possam n'ellas ser representadas e para que as votações sejam muito accentuadas, a fim de darem ás suas deliberações uma força numerica, que lhes dá auctoridade; terem curta duração, porque a corrente da opinião publica moderna é rapida, e podia acontecer que uma camara, eleita por largo praso, como as inglezas por sete annos, não represente no fim de alguns annos a opinião publica do paiz, quando aliás deve acompanhal-a.
Eu supponho que ninguem contesta a verdade d'estes principios.
Comparemos agora o nosso projecto de lei com a lei hespanhola.
A duração da legislatura hespanhola é de cinco annos, a nossa será de tres, isto é, quasi metade d'aquella.
Quanto aos grupos eleitoraes em Hespanha ha l deputado por 38:600 habitantes em media, em Portugal l deputado por 31:200 habitantes; ou reduzindo tudo ao mesmo typo, por cada 1.000:000 de habitantes a Hespanha tem cerca de 26 deputados, e Portugal tem cerca de 31 deputados.
A nossa representação é, pois, proporcionalmente bem mais larga do que a hespanhola.
Vamos aos circulos.
Façamos uma hypothese dmissivel: que não entram na camara hespanhola senão os deputados da minoria, e que o mesmo succede em Portugal.
A divisão dos circulos em Hespanha é esta:
Deputados Maioria Minoria
Circulos de 8 deputados 1 8 6 2
» 5 « 2 10 6 4
» 4 » 1 4 3 1
» 3 » 22 66 44 22
26 88 59 29
» 1 » 343 342
369 431

E em Portugal por este projecto de lei:

Deputados Maioria Minoria
Circulos de 6 deputados 1 6 4 2
» 4 « 6 24 18 6
» 3 » 14 42 28 14
- - - -
21 12 50 22
» 1 « 90 90
111 162

Da comparação d'estes elementos podem tirar-se alguns esclarecimentos.
Em Hespanha 20 circules com representação de minorias, elegem 88 deputados, que representam cerca do 88X38:600 = 3.395:000 habitantes, e cerca de 193:500 eleitores (na Hespanha os eleitores representam 5,67 por cento da população); em Portugal 22 circulos em representação de minorias elegem 72 deputados, que representam, pela estatistica politica eleitoral de 1881, 2.102:000 habitantes e 36:226 eleitores.
Em Hespanha, portanto, a representação das minorias abrangia 20 por cento da população o dos eleitores; em Portugal 44 por cento.
Em Hespanha teriamos:

402:29:: 100: x=7,2

Em Portugal:
140 : 22 :: 100 : x = 15,7

isto é, em Portugal a representação attribuida á minoria é mais do dobro da attribuida em Hespanha.
N'estas condições, sr. presidente, encarando as duas leis pelos seus mais importantes elementos, o eleitorado e a formação da camara, não me resta a menor duvida sobre a superioridade do nosso projecto; oxalá que aos meus contradictores o mesmo succeda.
Acceitem a auctoridade de Castellar em Hespanha, e a do sr. Antonio Candido em Portugal, como eu faço, e tirem d'estes dados as logicas consequencias.
Entremos, por ultimo, no capitulo das accumulações.
Eu já disse n'um precedente discurso, que era um dos principios mais sympathicos, mais procedentes o mais liberaes da lei, o principio da accumulação de votos.
Oh! sr. presidente, o que eu disse é preciso sentil-o, como eu o sinto. O que desejo é dar ao eleitor plena liberdade de escolher o seu eleito onde quer que seja. O que eu ambiciono é que os homens illustres possam ser votados onde quer quo seja, embora não entrem n'esta camara. Quando homens isolados, que não têem força politica, forem procurados pelo sou valor, e sobre elles recair uma votação de 1:500 ou 2:000 votos, demonstrará esse facto

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que o paiz está mais adiantado e que se elevou o seu nivel moral e intellectual. (Apoiados.}
O lado politico por que se encarou esta questão é realmente bello, e sob este ponto de vista foi que a discutimos na commissão; desejâmos todos introduzir na nossa legislação este principio injusto, como lhe chamou o sr. Guilherme de Abreu, porque elle reforça um pouco a força das opposições!
E nós na commissão votámos essa injustiça, e não tomemos engrossar a minoria e fortalecer a opposição nos limites rasoaveis, porque é preciso tambem notar que não póde nem deve um partido tecer a corda, com que se ha de enforcar. (Apoiados)
Pois este liberal e salutar principio, sr. presidente foi causa de um ataque da parte do sr. Illidio do Valle, o que eu, francamente não esperava.
As accumulações, disso s. exa., são suphismas em favor das minorias, se se estendem a todo o paiz; ou em favor das maiorias se se reduzem aos circulos uninominaes!
D'este dilemma não se sáe, porque ha de ser forçosamente uma das cousas.
N'esse caso prefiro que sejam um sophisma em favor das opposições, porque se salva a sua melhor essencia.
Eu estou convencido, e era quasi escusado repetil-o, de que o principio da accumulação da votação, como nós a adoptamos, é de maxima conveniencia social; como convencido tambem estou de que este projecto de lei deve ter um grande alcance politico e transformador, poucos trabalhos eleitoraes têem siho maduramente pensados como este foi na commissão.
O principio da accumulação constitue ainda uma compensação para as imperfeições do systema da lista incompleta, e o meio de se fazer a estatistica politica e partidaria do nosso paiz
Nós ignorâmos completamente o valor dos nossos partidos, as suas forças relativas.
A primeira eleição não dará em resultado conhecer-se esse valor, mas nas seguintes uma vista prespicaz e uma intelligencia arguta descriminarão a verdadeira situação dos partidos em Portugal.
Quer-se estabelecer o systema proporcional em bases seguras e certas, experimente-se, ausculte-se o paiz, ouça-se o quo elle diz e o estado da opinião publica, e ai de nós se encontrarmos a plena indifferença politica que é a peior lepra que pôde atacar uma sociedade democratica.
Quando o sr. Arriaga acoimava os partidos conservadores de quererem suffocar os partidos avançados, empregando os systemas de representação de minorias para fortalecer as suas maiorias, opinião singular que jamais comprehendi bem, dizia eu commigo que não fôra comprehendido nem o alcance nem o resultado das accumulações, como nós as propozemos.
Pois o facto é importante, e convem mencional-o.
Quando a Lisboa se dá uma lista de 6 deputados com quatro nomes para a maioria e dois para a minoria, equivale isto a conceder a cada eleitor 4 votos; nos circulos de 4 deputados com representação de l, cada eleitor dispõe de 3 votos, e de 2 votos nos circulos de 3 deputados.
Supponhamos uma fracção politica que tenha em Lisboa 3:000 eleitores, no Porto 1:000, na Madeira 1:000 e em Ponta Delgada 500.
É um exemplo.
Se nós tivessemos apenas limitado as accumulações aos circulos uninominaes tinha 5:000 votos esta fracção; e assim tem 18:500, isto é, triplicam as suas forças.
Se em Lisboa, em vez de uma só lista de seis nomes, se tivessem creado 2 circulos de 3 deputados, a força d'essa fracção politica desceria, n'aquella hypothese, a 12:500 votos.
A pequena fracção poderá, pois, luctar na lista de Lisboa, e ter grandes probabilidades para as accumulações.
O que diz o illustre deputado republicano a esta proporção?
Foi o nosso desejo de esmagar as fracções adversas que nos levou a triplicar-lhes as forcas eleitoraes, exactamente nos pontos em que s. exa. confessa que o partido republicano tem mais força e está mais condensado?
E, creia o illustre deputado que não caímos n'um erro, nem por ingenuidade, nem por ignorancia, sabiamos perfeitamente onde chegavamos, mas não tivemos receio de deixar manifestar as opiniões fortalecendo-as até para este effeito, certos, como estamos, que a opiniões e a argumentos saberemos contrapor argumentos e opiniões, e força a força, se infelizmente necessario for.
É quando o illustre deputado affirma que não ha senão um partido que possa luctar com a lista incompleta tambem labora n'um profundo erro.
O que succede nos circulos uninominaes?
Ahi não ha garantia alguma para as opposições. Se vence a maioria são excluidas as minorias, e no circulo plurinominal, com a lista incompleta, ao menos attende-se a um grupo da minoria.
O raciocinio de s. exa. podia ser exacto se o paiz constituisse um só circulo dando, por exemplo, 100 deputados, e votando-se apenas em 100, isto é, sendo 50 attr-buidos a minoria, a probabilidade seria de facto em favor da minoria mais importante.
Mas como o paiz ficará dividido em 22 circulos plurinominaes, e 79 uninominaes, e a dispersão dos partidos não é, nem póde ser, proporcional por toda a sua superficie, as minorias mais insignificantes n'um ponto serão as mais numerosas n'outro, e, como acontece hoje e mais facilmente do que hoje, as differentes fracções politicas terão os seus representantes.
Pois no mesmo circulo de lista simples, como é o de Lisboa para as eleições municipaes, não têem rompido nomes dos differentes partidos? Na mesma eleição não têem entrado na camara municipal progressistas, regeneradores e republicanos? Têem, e sabe porque?
Porque o principio de que o illustre deputado se serviu, para estabelecer os seus capciosos calculos, a hypothese de que são authomatos os eleitores, é perfeitamente falso. Á ultima hora eliminam-se nomes, porque os eleitores têem as suas opiniões, as suas sympathias e antipathias, pessoaes, os seus interesses; fazem-se combinações.. .
O sr. Manuel de Arriaga: - V. exa. aconselha a maxima disciplina.
O Orador: - Eu aconselho-a, porque em toda a especie de lucta é um grande meio de victoria, mas a final cada um faz o que quer e os resultados são os que apontei.
E aqui termino o que posso dizer ácerca das accumulações.
É possivel que alguma cousa mais ainda me escapasse sem resposta, ou possa ser melhor desenvolvida, mas como não prometto não tomar a palavra outra vez, evitarei mais tarde qualquer falta e preencherei a lacuna.
Não entro tambem em outra ordem de considerações em resposta a argumentos que têem mais cabimento na especialidade, porque para ella me reservo, procurando então responder a todas as indicações, que me têem sido feitas por varias fórmas.
A hora vae adiantada e eu desejo terminar esta exposição, apresentando ainda algumas opiniões sobre alguns assumptos, por isso rapidamente responderei ao sr. Antonio Maria de Carvalho, dizendo-lhe que o projecto actual não é inferior nem superior ao primitivo; é o mesmo projecto.
As classificações fazem-se pelos principaes caracteres; não pelos accidentaes ou secundarios.
Na sociologia, como na zoologia, as leis não podem ser classificadas ou comparadas senão pelos seus caracteres principaes.
Quaes são os principios fundamentaes do projecto? As

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538 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

assembléas terminarem a uma hora certa os seus trabalhos? Não.
A centralisação do escrutinio? Não;
O novo processo apresentado pela commissão para a elaboração dos recenseamentos politicos? Não.

que caracterisa o projecto são os dois principios: o da lista plurinominal com representação de minoria, e o das accumulações.
Ora, estes principios tanto pertencem ao primeiro projecto como ao segundo.
Agora ha circulos plurinominaes e uninominaes e no projecto primitivo eram todos plurinominaes, de accordo; mas s. exa. conhece o estado da opinião a este respeito; seria util, se não fôra indispensavel, deixar funccionar os dois systemas um em face do outro, para que a experiencia traga a convicção geral sobre qualquer d'elles.
Foi o que se fez. De resto, eu devo dizer a v. exa. que eu não adoptava a lista simples senão como vim meio de passagem para a representação das minorias, e por outro lado poucas esperanças tinha de que ella se salvasse na discussão.
A lista simples e a centralisação do escrutinio estavam de antemão irremediavelmente perdidas. Não é preciso ser muito perspicaz para antever este resultado, que para mim era previsto de ha muito tempo.
A lista plurinominal simples e a centralisação do escrutinio esses principios magnificos, defendidos pelo illustre deputado o sr. Antonio Maria de Carvalho, eram exactamente aquelles que haviam de cair sob o garrote da camara; eram aquelles que encontravam maiores difficuldades na opinião.
Mas que queria v. exa., sr. presidente, que succedesse? Era indispensavel levantar o projecto primitivo para deprimir este!
Eu estava sentado n'aquella cadeira junto do illustre deputado e meu amigo, o sr. Azevedo Castello Branco, e quando se levantou esta questão lembrei-lhe uma bella poesia de Victor Hugo, que eu não vou repetir, mas de que vou dar uma ligeira idéa. A poesia chama-se-Melancolia-. O poeta n'um sublime vôo atravez do ideal, vão notando varias cousas injustas e tristes d'este mundo. Eis que depara com um homem intelligente e bom, que espalha com mão prodiga os seus thesouros de bondade e de virtude; ministro, occupa-se, pensa noite e dia na felicidade do seu paiz; philosopho, prescruta a natureza para lhe arrancar uma verdade; poeta, pensa e rima apenas os grandes sentimentos e as acções sublimes.
Em volta d'elle, porém, agitam-se as paixões e os interesses; as suas acções são sophismadas, mal interpretadas e até calumniadas. Um dia vem a morte e leva o martyr. Quando acaba do ser pregado o ultimo prego ao caixão que o encerra, aquelles que outr'ora o cercavam do vaias e de apupos, escutam cuidadosamente e sentindo que não ha o menor ruido, tomam um aspecto triste e em voz plangente exclamam:
C'était un grand homme!
Pois sr. presidente o projecto primitivo foi glorificado por esta fórma, mas não está morto.
Sr. presidente, é certo que o projecto primittivo envolvia doutrinas e preceitos acceitaveis e que um dia, mais cedo ou mais tarde, entrarão na nossa legislação eleitoral.
Serão sacrificados? Não, foram adiados.
E em troca do adiamento o que conquistámos? Estas simples cousas. Verificação de poderes por um tribunal, no caso de ser requerida a verificação por quinze membros do parlamento. Sabe v. exa. o que isto representa? A elevação da auctoridade do parlamento, evitando-lhe discussões, que não quero agora qualificar, o que enfranquecem a representação nacional.
Que conquistámos mais?
Tirarmos a auctoridade administrativa a terrivel arma do recrutamento, que eu não temo tanto pelos seus resultados politicos, como pelas flagrantes e tristissimas injustiças, que fazia pezar sobre as classes mais pobres e desvalidas do paiz.
E conquistámos ainda uma cousa de um valor inexcedivel, o iniciar-se n'este paiz, com boa e firme vontade, a tendencia de se corrigir os excessos do poder central.
Este principio só por si vale mais do que todas as disposições prohibitivas e restrictas de uma lei.
Em vista d'isto não me importa, pois, que chamem illogico e contradictorio ao meu procedimento, e a este respeito darei apenas uma simples explicação.
Depois que eu fallei n'esta casa no dia 19 do dezembro do anno passado deu-se um facto importante na politica do nosso paiz, e esse facto necessariamente actuou sobre as minhas opiniões e as modificou; fallo do accordo.
Sobre esta questão do accordo desejo passar muito rapidamente, porque sou positivista, e como tal dou as explicações mais simples aos factos historicos, alem d'isso não desejo que ninguem n'ellas o intento de atacar individualidade alguma politica. Ahi vae a minha singela explicação.
Nós tinhamos no paiz dois grandes partidos organisados, o partido regenerador no poder, e o partido progressista na opposição; o partido progressista havio-se lançado fóra da orbita constitucional; acontecia, pois, não existir senão um unico partido capaz de governar; e como governar um paiz democratico com um só partido é problema que ainda ninguem resolveu, uma de duas cousas se devia fazer, ou chamar esse partido para dentro da esphera constitucional, ou crear outro artificialmente.
Ora, Deus nos livro da creação artificial de partidos.
Seria, todavia, possivel organisar artificialmente um partido?
Talvez, mas como naturalista e positivista que sou, eu não ía para ahi.
A creação artificial de um partido levava naturalmente o partido condemnado a seguir um d'estes dois caminhos: se tinha bastante força lançava-se na revolução; ora, eu considero no momento historico, que atravessâmos, uma revolução mortal para nós, porque poderia ser a perda funestissima da nossa autonomia nacional, e com toda a certeza era a morte das nossas finanças; ou esse grande partido se desaggregava e uma parte das suas influencias vinham para nós, outra parte ía para o partido que se pretendia constituir, e a parte pensante e forte, que tinha obrigação de ser digna e de não se deixar derrubar sem lucta só para satisfazer meros interesses particulares, lançava-se no partido republicano.
Realmente não me preoccupa que o partido republicano cresça pelas vias naturaes e legaes, pelos seus exemplos e pela sua propaganda; ainda que eu julgo que hoje e durante muito tempo ainda a monarchia democratica, e emquanto o for, ha de ser vantajosa para o paiz; mas para o que eu não contribuiria, certamente, era para atirar para o partido republicano homens não convictos, mas desesperados, republicanos da ultima hora, faltos de convicções mas cheios de paixões violentas.
Aqui está a rasão por que acceitei o accordo, considerando-o como acto meritorio para o paiz. (Vozes: - Muito bem, muito bem.)
De resto, eu não via a menor vantagem em afastar das cadeiras do poder homens que para ellas tinham direitos e merecimentos.
Se a alguem não convier o accordo, sinto-o sinceramente; mas consola-me este pesar a certeza do que para esse os seus interesses particulares não estavam em perfeita harmonia com os interesses do paiz.
Realisado o accordo, e manifestado n'esta camara, sentados n'aquellas cadeiras o sr. presidente do conselho e o sr. ministro do reino, perguntaram-me se estava contente, eu respondi a s. ex.ªs affirmativamente.
Effectivamente tinhamos evitado uma revolução, ou em

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SESSÃO DE 6 DE MARÇO DE 1884 539

todo o caso uma grande injustiça sem resultado algum para o paiz, porque é sempre injusto afastar homens de valor e de importancia, afastal-os pela força ou pela astucia, dos logares que elles mais cedo ou mais tarde devem occupar. (Apoiados.)
É esta minha opinião sobre o accordo.
Portanto, se em vez de commetter a terrivel contradicção de acceitar os principios fundamentaes do projecto passado, fosse necessario praticar uma contradicção flagrante para facilitar o acto do accordo, eu teria consentido no sacrificio da minha pobre e humilde individualidade. Para alguma cousa servem ás vezes os homens insignificantes, quando com as suas convicções sinceras, com boa vontade e com certo desinteresse trabalham a favor do seu paiz.
Agradeço á camara e a v. exa. a attenção que me dispensaram, e se tomei tanto tempo foi pela necessidade de expor as minhas idéas e de responder aos illustres oradores que me precederam, o que fiz não só por dever do meu cargo, mas por dever de delicadeza.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O orador foi comprimentado por muitos dos seus collegas.)
O sr. Presidente: - A ordem do dia para ámanhã é trabalhos em commissões e para sabbado a mesma que vinha para hoje.
Peço aos illustres deputados que venham a tempo de se poder abrir a sessão ás duas horas.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas e meia.

N.° 26-A

Senhores. - A commissão do guerra, tendo examinado o requerimento do major reformado Antonio Maria de Brito, que pede melhoria de reforma, por se julgar preterido pelo fallecido general Francisco Damasio Roussado Gorjão, é de parecer que este requerimento deve ser enviado ao governo.
Sala da commissão, 6 de março de 1884.= Caetano Pereira Sanches de Castro = José Frederico Pereira da Costa =Jeronymo Osorio de Albuquerque =Sebastião de Sousa Dantas Baracho =Manuel Joaquim da Silva e Mata =J. C. Rodrigues da Costa =Antonio José d'Avila, relator.

E. N.° 17

Senhores.- A camara municipal do concelho da Calheta, districto do Funchal, vem respeitosamente perante Vossa Magestade, em nome dos interesses dos seus municipes reclamar a sua superior attenção, para o mal mais grave que nas actuaes circumstancias póde affectar os interesses d'este districto.
A navegação a vapor que acode ao porto do Funchal e que é a maior fonte e sempre continua da vitalidade d'este districto, começou já a abandonar-nos attrahida pelas maiores conveniencias que encontra nos portos das nossas vizinhas asilhas Canarias.
Tanto basta, Senhor, para que Vossa Magestade, pelo seu illustrado governo, se digne fazer tomar as providencias precisas para obstar áquelle abandono, já destruindo peias que um confisco irreflectido muitas vezes cria, já procurando realisar no porto do Funchal melhoramentos que rivaisem com os dos nossos concorrentes, que assim ameaçam suffocar-nos.
Eis, pois, o que a Vossa Magestade implora esta camara.- P. a Vossa Magestade assim o mande pelos respectivos ministros da fazenda e de obras publicas, commercio e industria.- E. R. M. cê= (Seguem-se as assignaturas).

E N.° 18

Senhores.- De todos os concelhos do districto do Funchal, para nenhum foi mais dolorosa a perda dos vinhos pela phylloxera do que este de Camara de Lobos.
Exclusivamente dedicados áquella cultura e sem aguas do irrigação por meio das quaes possa dedicar-se a outros ramos de industria agricola parallelamente productivos, temos os nossos campos limitados apenas, e em parte, a algumas producções pobres que nada valeriam sem a procura que lhes proporciona o mercado do Funchal, pela navegação a vapor que ali acode em larga escala.
Facil é, portanto, de ver a magua profunda com que os habitantes d'este concelho olham para a miseria certa que os espera, desde que áquella navegação nos abandone, como já começa, attrahida pelas vantagens e facilidades que os vizinhos hespanhoes lhes offerecem nas suas ilhas Canarias.
É por isso que a camara d'este municipio de Camara de Lobos vae implorar a Sua Magestade que, pelo seu illustrado governo e por medidas previdentes, procure obstar áquelle mal, de modo que o porto do Funchal possa luctar e concorrer com vantagem com os que ameaçam suffocal-o.- P. a Sua Magestade assim o mande pelos respectivos ministerios da fazenda e obras publicas, commercio e industria, e aos senhores deputados da nação que se dignem attender a justa causa. - E. R. Mercê.
Camara municipal do concelho de Camara de Lobos, aos 19 de dezembro de 1883- - (Seguem-se as assignaturas.)

Rectificações

Na sessão de l de março, discurso do sr. Gonçalves de Freitas, pag. 488, col. 1.ª, lin. 1.ª, onde se lê "dos apostolados", leia-se "nos apostolados"; lin. 57.ª, onde se lê "a qual", leia-se "o qual". Na mesma pagina, col. 2.ª, lin. 26.ª, onde se lê "pergouna , leia-se "pergunta"; lin. 41.ª, onde se lê "fechando-se", leia-se "fechando"; lin. 46.ª, onde se lê "caminha-se", leia-se "caminha"; lin. 56.ª, onde se lê "evidentemente", leia-se "eminentemente"; lin. 57.ª, onde se lê "a base do poder", leia-se "a verdade do poder"; lin. 65.ª; onde se lê "caracteristicos", leia-se "caracteristicas". Pag. 489, col. 1.ª, lin. 18.ª, onde se lê "poderia", leia-se "podia"; lin. 47.ª, onde se lê "lhe chamou", leia-se "lhes chamou". Na mesma pagina, col. 2.ª, lin. 39.ª, onde se lê "destaca", leia-se destaco". Pag. 491. col. l.ª, lin. 6.ª, onde se lê "como Lamartine", leia-se "com Lamartine"; lin. 8.ª, onde se lê "caminhar", leia-se "caminho"; lin. 21.ª, onde se lê "até nos chega", leia-se "ato nós chega".
Na mesma sessão, discurso do sr. Alberto Pimentel, pag. 482, col. 1.ª, lin. 37.ª, onde se lê "vê-se pelos dados estatisticos de que acabo de dar noticia á camara, que esta lei não tem produzido resultados salutares, etc.", leia-se "vê-se pelos dados estatisticos de que acabo de dar noticia á camara, que esta lei tem produzido resultados salutares, etc.". No mesmo discurso, na mesma pagina, na mesma columna, lin. 52.ª, onde se lê "foi este jornal, etc.", leia-se "por este jornal, etc.".
Na sessão de 3 de março, discurso do sr. Arriaga, pag. 496,-col. 2.ª, onde se lê "tem a nobre concepção de o confessar", leia-se "tem a nobre isenção de o confessar". Pag. 497, col. 1.ª, onde se lê "quando elle é d'aquelles", leia-se "quando elle é d'aquellas". No periodo immediato, onde se lê "como ella se realisasse", leia-se "como se ella se realisasse". Na mesma pagina, col. 2.ª, onde se lê "a presidencia em obrigou", leia se "a presidencia me obrigou", Pag. 499, col. l.ª, onde se lê "a situação em que fica elle segundo a minoria", leia-se "a situação em que fica, segundo elle, a minoria". Pag. 502, col. l.ª, onde se lê "se os cidadãos tivessem no seu paiz", leia se "se os cidadãos tivessem no meu paiz". Na mesma columna, quasi no fim, onde se lê "meuos o esperasseis", leia-se "menos o esperasseis". Na mesma pagina, col. 2.ª, onde se lê "as populações novas", leia-se "as populações ruraes". Logo abaixo, onde se lê "a superioridade do voto", leia-se "a superioridade do numero". Pag. 603, onde se lê "por mim acima apontado", leia-se "por mim acima apontados".

Redactor = Rodrigues Cordeiro.

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