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N.º 42

SESSÃO NOCTURNA DE 20 DE MARÇO DE 1902

Presidencia do Exmo. Sr. José Joaquim de Sousa Cavalheiro (Vice-Presidente)

Secretarios - os Exmos. Srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
José Joaquim Mendes Leal

SUMMARIO

Approvada a acta, entra-se na ordem da noite, - discussão do mappa de despesa n.° 2, Ministerio da Marinha, do projecto de lei n.º 12 (Orçamento Geral do Estado). - O Sr. Antonio Cabral justifica a moção que apresenta, respondendo-lhe o Sr. Ministro da Marinha (Teixeira de Sousa). - Faz varias considerações o Sr. Vellado da Fonseca sobre diversos capitulos. - O Sr. André de Freitas envia para a mesa um projecto de lei sobre prorogação de prazo concedida á Misericordia da Horta. - Justifica a moção que apresenta o Sr. Conde de Penha Garcia, respondendo-lhe o Sr. D. Luiz de Castro, a quem o Sr. Conde de Penha Garcia depois cumprimenta. - O Sr. Costa Ornellas manda para a mesa os pareceres das commissões de obras publicas e de guerra, sobre o projecto de lei n.° 9-B.

Abertura da sessão - Ás 8 horas e 3 quartos da noite.

Presentes - 60 Senhores Deputados.

São os seguintes: - Affonso Xavier Lopes Vieira, Agostinho Lucio e Silva, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Alberto Botelho, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Albino Maria de Carvalho Moreira, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alexandre José Sarsfield, Alfredo Augusto José de Albuquerque, Alfredo Cesar Brandão, Alvaro de Sousa Rego, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Affonso Maria Vellado Alves Pereira da Fonseca, Antonio de Almeida Dias, Antonio Belard da Fonseca, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Joaquim Ferreira Margarido, Antonio José Boavida, Antonio José Lopes Navarro, Arthur Eduardo de Almeida Brandão, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Cesar da Rocha Louza, Augusto Neves dos Santos Carneiro, Belchior José Machado, Carlos Alberto Soares Cardoso, Carlos Malheiro Dias, Conde de Castro e Solla, Domingos Eusebio da Fonseca, Ernesto Nunes da Costa Ornellas, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José Machado, Francisco Limpo de Lacerda Bavasco, Francisco Roberto de Araujo de Magalhães Barros, Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira, Hypacio Frederico do Brion, João Alfredo de Faria, João Augusto Pereira, João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos, João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira, João Joaquim André de Freitas, João Marcellino Arroyo, João de Sousa Tavares, Joaquim da Cunha Telles e Vasconcellos, Joaquim Faustino de Poças Leitão, José Antonio Ferro de Madureira Beça, José Coelho da Motta Prego, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Joaquim Dias Gallas, José Joaquim Mendes Leal, José Maria de Oliveira Simões, Julio Ernesto de Lima Duque, Luiz Filippe de Castro (D.), Luiz Gonzaga dos Réis Torgal, Manuel Joaquim Fratel, Manuel de Sousa Avides, Marianno José da Silva Prezado, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Matheus Teixeira de Azevedo e Rodolpho Augusto de Sequeira.

Entraram durante a sessão os Srs.: - Abel Pereira de Andrade, Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Alipio Albano Camello, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio Barbosa Mendonça, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Centeno, Antonio Maria de Carvalho Almeida Serra, Antonio Rodrigues Ribeiro, Antonio Tavares Festas, Augusto José da Cunha, Carlos de Almeida Pessanha, Clemente Joaquim dos Santos Pinto, Conde de Paçô-Vieira, Conde de Penha Garcia Custodio Miguel de Borja, Eduardo de Abranches Ferreira da Cunha, Fernando Mattozo Santos, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Frederico dos Santos Martins, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Henrique Matheus dos Santos, José Caetano de Sousa e Lacerda, José Jeronymo Rodrigues Monteiro, José do Mattos Sobral Cid, Julio Augusto Petra Vianna, Luciano Antonio Pereira da Silva, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Luiz de Mello Correia Pereira Medella, Manuel Affonso de Espregueira, Paulo de Barros Pinto Osorio, Rodrigo Affonso Pequito e Visconde da Torre.

Não compareceram á sessão os Srs.: - Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Amadeu Augusto Pinto da Silva, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Augusto de Sousa e Silva, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Roque da Silveira, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio de Sousa Pinto de Magalhães, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto Fuschini, Avelino Augusto da Silva Monteiro, Carlos Augusto Ferreira, Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda, Eduardo Burnay, Francisco José de Medeiros, Francisco José Patricio, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Frederico Ressano Garcia, Guilherme Augusto Santa Rita, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Ignacio José Franco, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Monteiro Vieira de Castro, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Antonio de Sant'Anna, Joaquim Pereira Jardim, José Adolpho de Mello e Sousa, José Caetano Rebello, José da Cunha Lima, José Dias Ferreira, José da Gama Lobo Lamare, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria de Oliveira Mattos, José Maria Pereira de Lima, José Mathias Nunes, José Nicolau Raposo Botelho, Julio Maria de Andrade e Sousa, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luiz José Dias, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Homem de Mello da Camara, Marianno Cyrillo de Carvalho, Marquez de Reriz, Matheus Augusto Ribeiro Sampaio, Ovidio de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Visconde de Mangualde e Visconde de Reguengo (Jorge).

Acta - Approvada.

O Sr. Alberto Bramão: - Mando para a mesa o seguinte

Projecto de lei

Auctorizando a Camara Municipal de Monção a lançar um imposto de 10 réis em cada kilogramma de ferro e

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ferragem que entrarem dentro do concelho para consumo e uso dos seus habitantes, applicado ao pagamento do subsidio concedido á empresa concessionaria do caminho de ferro entre Valença e Monção. = Alberto Bramão = Malheiro Dias = Oliveira Simões.

Ficou para segunda leitura.

ORDEM DA NOITE

Discussão do mappa n.° 2 da despesa, Orçamento do Ministerio da Marinha, do projecto de lei n.° 12 (Orçamento Geral do Estado).

O Sr. Antonio Cabral:- Sr. Presidente: em obediencia ás prescripções do Regimento, começo lendo a minha moção de ordem:

"A Camara, reconhecendo que o orçamento do Ministerio da Marinha e Ultramar representa um. aggravamento de despesa, em relação tio proprio orçamento de 1901 a 1902, e, alem d'isso, que é inexactamente calculado, de modo que o augmento de despesa é bem maior do que o previsto no orçamento em discussão, estranha e lamenta este facto, e passa á ordem da noite. = O Deputado, Antonio Cabral".

Hesitei muito tempo antes de arcar com este monstro que se chama o Orçamento Geral do Estado. Estive em duvida sobre se devia seguir o conselho do nosso collega o Sr. João Pinto dos Santos, um parlamentar too distincto pelas qualidades do seu caracter, como pela illustração do sou espirito, que toda a Camará estima e pelo qual eu tenho particular sympathia, de que não se deve ler o orçamento para entrar na sua discussão; mas, por fim, Sr. Presidente, resolvi-me a mergulhar neste oceano de cifras, e vou expor á Camara, muito resumidamente, o mais breve que possa, aquillo que eu encontrei no fundo d'este mar immenso de phantasmagorias e falsidades.

Como V. Exa. sabe, o Ministerio da Marinha abrange duas direcções geraes: a de marinha, e a do ultramar. A de marinha comprehende todos os serviços relativos á ma rinha de guerra, e a do ultramar todas as despesas do ultramar feitas na metropole. O resto das despesas feitas nas colonias pertencem aos orçamentos coloniaes, que ainda não foram apresentados á Camara pelo Sr. Ministro da Marinha.

E, permitta-me S. Exa. que eu estranhe que ainda não trouxesse á Camara esses orçamentos, não seguindo assim o exemplo do seu illustre antecessor, o Sr. Conselheiro Villaça, que num anno, pelo menos, me recordo ter apresentado á Camara os orçamentos coloniaes, fazendo assim com que o Parlamento pudesse apreciar a administração financeira das colonias.

E claro que o Sr. Ministro da Marinha pode dizer-me que esses orçamentos é costume decretá-los pelo Acto Addiccional, mas assim ficamos privados de poder apreciar a administração financeira do ultramar; é por isso que eu lembro a S. Exa. a conveniencia de apresentar esses orçamentos, a fim de que nós, representantes da nação, possamos habilitarmos a apreciar essa administração ultramarina.

Eu, como V. Exa. vê pela minha moção, pretendo demonstrar duas theses: a primeira é que o actual orçamento de Ministerio da Marinha representa um augmento de despesa em relação ao do anno passado, e a segunda é que as desposas estão inexactamente calculadas, de forma que o augmento é bem maior de que o previsto no orçamento pelo Sr. Ministro da Marinha.

Olhando para o orçamento do Ministerio da Marinha, na nota preliminar depara-se-nos logo o augmento de despesa confessado de 47:000$000 réis. Devo dizer que falo sempre em numeros redondos, porque é fastidioso descer ás fracções, e eu não tenho memoria para estar a citá-las com toda a minudencia. Este augmento de 47:000$000 réis é nas despesas ordinarias.

Os principaes augmentos, segundo a nota que tirei, são:

(Leu)

Estes que apontei sito os principaes, mas ha ainda outros que pude apurar. E desde já devo declarar que faltam neste orçamento as verbas para despesas com a Direcção dos Caminhos de Ferro e a Inspecção de Fazenda, que me parece deviam aqui figurar.

Olhando em seguida para o parecer da commissão, eu verifico que esta corrigiu o orçamento apresentado pelo Sr. Ministro, augmentando a despesa correspondente ao pagamento a 408 praças de marinhagem, ou sejam réis 64:260$000. Faltando, portanto, no orçamento esta verba para pagamento ás 408 praças, o que representa um esquecimento estranhavel, temos que juntar esses 64:000$000 aos 47:000$000 réis confessados pelo Sr. Ministro, e assim vemos que o augmento de despesa é de 111:000$000 réis.

A commissão, porem, para não alterar o resultado final do orçamento, não fez esta somma e foi fazer cortes em diversas verbas, para obter os 64:000$000 réis que precisava para pagar ás 408 praças de marinhagem!

Isto é uma nota característica, typica, do modo do fazer orçamentos.

Não se contou com as 408 praças de marinhagem, e d'aqui concluo eu uma de duas cousas: ou o Sr. Ministro da Marinha tinha calculado mal as diferentes verbas de despesa em que a commissão fez os necessarios cortes, para arranjar os taes 64:000$000 réis, e a commissão mostrou o mal que o Sr. Ministro tinha procedido; ou então tinha o Sr. Ministro calculado bem, e a commissão não podia fazer as reducções que fez para obter os 64:000$000 réis.

Parece-me que se não pode fugir d'este dilemma. Ou o Sr. Ministro da Marinha tinha calculado mal, e a commissão, emendando, involve no seu parecer uma censura ao Sr. Ministro da Marinha, ou então S. Exa. tinha calculado bem, e a commissão não podia nem devia fazer os cortes nas verbas ato perfazer os 64:000$000 réis.

A verdade é que o Sr. Ministro da Marinha tinha calculado bem, tanto quanto possível. O erro todo parte do não ter sido incluída no orçamento a quantia necessaria para pagar ás 408 praças de marinha.

O sr. Ministro da Marinha (Teixeira de Sousa): - Apoiado!

O Orador: - Quero agora, Sr. Presidente, examinar o mais resumidamente possivel estas differentes verbas que a commissão reduziu.

A primeira, segundo leio no parecer, é verba para subsidios de embarque, rações e material de bordo. A verba importava em 190:000$000 réis e a commissão reduziu réis 20:260$000.

Pergunto: Para que se fez isto?

Não vejo razão nenhuma para se fazer este corte.

Se se for examinar a nota preliminar do orçamento, vê-se que o Sr. Ministro da Marinha propôs para subsidios de embarque um augmento de 24:860$825 réis sobre o orçamento anterior.

Claro é que, se o Sr. Ministro da Marinha propôs esta quantia a mais do que a constante do orçamento do anno passado, foi por que entendeu que estes 24:860$825 réis eram mais indispensaveis. Tinha estudado esta verba e reconheceu que ella era insuficiente, portanto accrescentou estes 24:000$000 réis.

Mas o que fez a illustre commissão?

Reduziu esta verba e o Sr. Ministro da Marinha concordou!

Não sei, realmente, como é que S. Exa., tendo estudado esta verba, de forma a entender que era insuficiente, propondo, por essa razão, o augmento de 24:000$000 réis,

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concordou com a commissão em fazer a reducção do réis 20:260$000 do maneira a poder obter uma verba para arranjar os taes 64:000$000 réis, que eram precisos para pagar ás 408 praças de marinhagem.

Se a verba para subsídios de embarque fosse a mesma do orçamento anterior, então comprehendia eu que a illustre commissão fizesse este corte, mas, tendo o Sr. Ministro da Marinha reconheci que a verba do orçamento anterior não chegava e que era necessario augmentá-la com mais 24:000$000 réis, realmente não percebo como é que a illustre commissão fez este corte na verba - e não foi um corte pequeno - deixando apenas 4:000$000 réis.

Portanto, veja a Camara a consciencia c a seriedade com que é feito o Orçamento Geral do Estado.

Vamos á segunda verba:

A segunda verba, constante do parecer, é: - Material para o Arsenal da Marinha.

Na verba para material do arsenal, na importancia final do 236:000$000 réis, a illustre commissão diminuiu réis 30:000$000, tudo para obter a verba de 64:000$000 réis necessaria para o pagamento das 408 praças de marinhagem que tinham esquecido de incluir no orçamento. Ora, pergunto eu ao Sr. Ministro da Marinha e á illustre commissão se porventura esta verba para material do arsenal comporta esta reducção de 30:000$000 réis?

Eu vou á nota preliminar do orçamento, e vejo que o Sr. Ministro da Marinha propunha para ferias dos operarios do Arsenal o augmento de 6:690$000 réis e que para material mantinha a mesma verba do orçamento anterior; portanto, entendeu S. Exa., ou pelas informações recebidas da secretaria, ou por conhecimento proprio e especial que S. Exa. tinha d'este assumpto, que devia manter a mesma verba para material constante, do orçamento anterior o que devia augmentar a verba das ferias.

Sabem o que fez a illustre commissão?

Mantem a mesma verba para ferias, porque era para pagamento ao pessoal, e fui á verba de material e cortou lhe 30:000$000 réis, e o Sr. Ministro concordou, o que realmente me causou estranheza!

Pois então que elementos, que informações tem a illustre commissão para proceder d'esta maneira?

Não pude averiguar como se pudesse fazer isto, como se mantem a verba para pessoal e se diminuiu a verba para material. A unica explicação que encontrei, foi que o material, ou lhe diminuam ou lhe augmentem, não só queixa, porque, emfim, é material, emquanto que o pessoal podia queixar se, protestar mais ou menos energicamente contra este corte que se lhe fazia. Foi por isso que a commissão manteve a mesma verba para o pessoal. (Apoiados).

Aqui tem V. Exa. o que se mo offerece dizer a respeito d'esta segunda verba que n illustre commissão reduziu, de forma a poder obter os 64:000$000 réis de que carecia para pagamento ás 408 praças de marinhagem.

Vamos á terceira verba: - Material e sobresalentes para os navios da armada. A esta verba, na importancia final de 159:000$000 réis, diminuiu a commissão 6:000$000 réis.

Pergunto: Que alterações se deram desde que o Sr. Ministro da Marinha confeccionou este orçamento até que a commissão reduziu esta verba, para a levarem a fazer esta reducção?

Porventura chegariam á illustre commissão documentos, informações que a auctorizassem a reduzir esta verba, como já tinha reduzido outras?

Eu não creio que chegassem nem informações, nem documentos; a commissão necessitou de fazer esses cortes, até perfazer os 64:000$000 réis de que carecia para pagar ás 408 praças, e, portanto, foi ás verbas maiores e reduziu-as. (Apoiados).

O que se vê, por consequencia, Sr. Presidente, é que todas as reducções são artificiaes e que o orçamento não representa mais do que uma falsidade. (Apoiados). É esta a conclusão unica a que chego.

Vamos á quarta verba: - Pequenas construcções e reparações de navios.

Nesta verba, a importancia final de 25:000$000 réis, a commissão diminuiu 8:000$000 réis - proximamente a terça parte - de modo que esta verba, que é já de si diminuta, foi diminuída quasi na terça parte, ficando uma verdadeira insignificancia!

Portanto, fica uma verba insuficiente para construcção e reparação de navios.

Estas são as conclusões a que chego depois de ter examinado estes cortes. O que se vê é que não ha razão plausível que justifique o procedimento da commissão.

A commissão cortou a esmo, diminuiu estas verbas como podia ter diminuído outras.

O fim que a commissão teve em vista, repito, foi obter a verba de 64:000$000 réis para pagar ás 408 praças de marinhagem que esqueceu incluir no orçamento.

A commissão apresenta duas razões principaes para justificar as reducções que fez nestas quatro verbas. A primeira, é não aggravar as circumstancias do Thesouro, e a segunda é estarem algumas verbas para material largamente calculadas.

Diz a commissão:

(Leu).

Mas, Sr. Presidente, as circumstancias do Thesouro aggravam-se da mesma maneira, porque estas despesas hão de fazer-se, e, como muito bem disso o Sr. Francisco Machado, ha de recorrer se depois aos creditos especiaes.

A segunda razão - estarem algumas verbas para material largamente calculadas - tambem não colhe. E tanto isto é verdade, que a primeira diminuição que a commissão fez foi na verba que diz respeito a subsídios de embarque, que não é verba que diga respeito ao material!

Como se faz isto, assim, de animo leve?

Realmente não se justifica este modo de proceder da commissão parlamentar, e, para não alongar a discussão, limito-me unica e simplesmente a dizer que as verbas para material, longe de estarem largamente calculadas, são até insufficientes.

Portanto, vê-se que a commissão ou não tinha razões a dar, porque as que dá não colhem, ou então fez estas redacções fictícias, e amanhã temos de recorrer aos creditos especiaes para satisfazer estas despesas, que são necessarias e obrigatorias.

Concluo, portanto, do que acabo de expor á Camara, que á verba de 47:000$000 réis, de augmento de despesa, confessado pelo Sr. Ministro da Marinha, devemos acrescentar 64:000$000 réis, para pagamento ás 408 praças de marinhagem, o que representa um augmento de despesa ordinária, no orçamento da marinha, de 111:000$000 réis, numeros , redondos. Por consequencia, demonstrada está a these da minha moção, em que eu disse, que o orçamento da marinha e ultramar representa um aggravamento de despesa em relação ao proprio orçamento de 1901 a 1902, e alem d'isso que ó inexactamente calculado, de modo que o augmento de despesa, é muito superior áquelle que está previsto no orçamento em discussão.

Vamos agora ás despesas extraordinarias do Ministerio da Marinha. Nestas despesas extraordinarias inseriu se, para reparação da corveta couraçada Vasco da Gama, a verba de 200:000$000 réis.

A illustre commissão, no seu parecer, a pag. 12, diz: que esta verba é attenuada em outras verbas, com a diminuição de 18:000$000 réis, e por consequencia o augmento extraordinario de despesa é de 182:000$000 réis. Eu pergunto á illustre commissão: onde foi ella buscar esta attenuação?

Do parecer não consta.

Depois de muito parafusar, e depois de muito ler, parece-me que encontrei a explicação d'este enigma.

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4 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Depois de um estado muito aturado, sem valor decerto, e nem outro estudo eu podia fazer porque não sou proprofissional, sendo-me, portanto, necessario um grande excesso de trabalho para conseguir alguns resultados, fui procurar o orçamento anterior para ver se descobria esta verba de 18:000$000 réis, porque no orçamento actual e no parecer da commissão nada pude encontrar que esclarecesse o meu espirito sobre esta verba de 18:000$000 réis, para attenuação da verba destinada á reparação da curveta couraçada Vasco da Gama.

Quer-me parecer que esta verba de 18:000$000 réis, a que á illustre commissão se refere, é a que figura no orçamento passado, para reparações de navios, feita em estabelecimentos fora de Lisboa, e acquisição de material.

Hás pergunto eu: não ha de haver reparações de outros navios, no anno economico futuro? Só se ha de reparar a Vasco da Gama, e não outros navios?

Eu creio que sim.

Creio que ha de haver necessidade de reparações, e esta verba de 18:000$000 réis deve, por isso, continuar a figurar no orçamento; mas é tão insignificante, que tem até de ser augmentada. Como é então que a illustre commissão diz: que esta verba de 200:000$000 réis, proposta para reparações da Vasco da Gama, fica attenuada em 18:000$000 réis?

Isto representa apenas uma falsidade e nada mais.

Sr. Presidente: comparativamente com o orçamento do anno anterior, verifica-se que ha a diminuição de réis 182:000$000; mas o augmento é pelo menos de réis 200:000$000, porque esta quantia dos 18:000$000 réis é indispensavel para a reparação de outros navios.

Portanto, parece-me que a illustre commissão teve só em vista armar ao effeito; ou, por outra, trazer á Camara um augmento de despesa o mais pequeno possível e por isso apresentar um orçamento fictício, que não representa realmente a verdade. (Apoiados).

Se nós compararmos as despesas extraordinarias d'este anno, no orçamento que estamos discutindo, com o do anno passado, vemos que, alem de se cortar esta verba de 18:000$000 réis, que era indispensavel, cortou-se tambem, na verba de "munições e material de guerra", a quantia - numeros redondos - de 24:000$000 réis!

Pergunto a illustre commissão se o nosso arsenal está de tal forma abastecido de todos os aprestos necessarios, que não precise de uma verba para adquirir munições e material de guerra?!

Mas então, se não é bastante esta verba para abastecer o arsenal, como é que o Sr. Ministro da Marinha ha de proceder, quando tiver necessidade de fazer acquisição d'este material?

Ha de recorrer fatalmente aos creditos especiaes e extraordinarios.

Portanto, ha de pagar o país aquillo que não está descripto no orçamento e devia estar, se o orçamento fosse verdadeiro. ( Apoiados}.

Sr. Presidente: o que se pretendeu foi o equilíbrio da receita com a despesa, ou, pelo menos, fazer o desiquilibrio o menor possível; mas amanhã, repito, ha de haver necessidade dos creditos extraordinarios, que o pais terá de pagar.

Mas ha mais.

A pag. 3 do orçamento, art. 5.°, noto que se faz uma economia de 3:000$000 réis na verba para pagamento aos officiaes da armada.

Ora os illustres Deputados sabem e o Sr. Ministro da Marinha melhor do que ninguem, que tem havido na armada uma grande promoção.

Como é, portanto, que, nesta verba para pagamento aos officiaes da armada, apparece uma diminuição de 3:000$000 réis?

Confesso que não posso achar a razão d'este facto.

Pergunto eu: haverá augmentado a verba para os reformados ?

Vou examinar essa verba e vejo que ella não augmentou, mas diminuiu em 6:000$000 réis.

Portanto, não comprehendo como, tendo havido uma grande promoção na armada, apparece a verba para pagamento aos officiaes de marinha diminuída em 3:000$000 réis e a verba para os reformados tambem diminuída. (Apoiados).

Sendo isto verdadeiro, era caso para pedir ao Sr. Ministro da Marinha que fizesse maior numero de promoções na armada, porque quanto mais promoções se fizessem, mais a respectiva verba de pagamento aos officiaes diminuiria.. .

A ser isto verdade, peço que se continue fazendo uma larga promoção na armada. (Apoiados).

Mas como isto não é assim, não se comprehende como esta verba diminuiu. (Apoiados).

O que é certo é que os officiaes da armada hão de ser pagos por alguma verba.

Qual é ella ?

Será por que estejam em alguma commissão? Não sei.

Á verdade pois é que o orçamento é uma completa phantasmagoria. (Apoiados).

Uma outra verba que está no orçamento inscripta de um modo insufficiente, é a quo se destina á nova installação, da Escola de Torpedos Moveis e Electricidade.

É unia outra verba que não chega, e que ha de obrigar o Sr. Ministro da Marinha a recorrer a mais uns creditos especiaes, para que essa escola possa desempenhar devidamente as suas funcções. (Apoiados).

Agora vou fazer, muito rapidamente, o exame da parte do orçamento que diz respeito ao ultramar.

Nesse orçamento estão calculadas as receitas, a meu ver, com um grande exagero, e decerto foi isto feito com o fim de attenuar o deficit. (Apoiados).

As despesas também não estão orçadas devidamente.

Ha uma diminuição de despesa ordinaria fictícia, realizada em varios cortes que se fizeram no orçamento.

Assim temos que na despesa para emigração houve um corte na importancia de 10:000$000 réis.

Quando nós temos necessidade de colonizar a nossa Africa, de enviar para ali o maior numero de colonos, a fim de tornar productivos aquelles nossos terrenos e possessões, tão desejadas e cubicadas por outros países, vae-se a esta verba destinada á emigração e cortam-se 10:000$000 réis!

Não ha escrupulo algum, por parte do Governo, para metter gente nas secretarias, em augmentar as despesas em milhares de contos; ha verbas para commissarios regios, para fiscaes do sêllo e até para pagar aos provadores das aguas thermaes, e vae-se á verba de colonização, que se devia augmentar, e essa é que se corta!

Isto parece-me um verdadeiro crime.

Desde que todos conhecem que é preciso colonizar a nossa Africa e mandar para ali o maior numero de colonos, tirar 10:000$000 réis á verba destinada a esse fim, somente para se apresentar uma diminuição de despesa, não me parece razoavel.

Outra verba que ó tambem cortada, é a da garantia de juro para o Caminho de Ferro de Ambaca. Nesta diminuem-se 20:000$000 réis. Não encontro motivo para esta diminuição. Preciso que o Sr. Ministro da Marinha me esclareça sobre este ponto.

Eu creio que os kilometros explorados neste caminho de ferro são os mesmos; portanto, como ó que se faz esta diminuição na verba que estava inscripta no orçamento passado para garantia de juro?

Isto mais vem confirmar que estas economias são verdadeiramente fictIcias, não representam a realidade, e o que era necessario, era que se dissesse a verdade ao pais, e que se trouxessem ao Parlamento orçamentos com as

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verbas o mais approximadas que fosso possIvel da verdade.

Pois os kilometros em exploração, na linha de Ambaca, são os mesmos e vae diminuir-se a verba para garantia de juro d'esse caminho de feiro? Não me parece que isto seja coherente e justificavel.

É claro que esta verba ha de sair depois do orçamento da metropole, e em todo o caso a nação é que ha de pagar.

Vamos ás despesas extraordinarias do ultramar.

Vê-se no orçamento que as despesas extraordinarias das províncias ultramarinas estão orçadas em 400:000$000 réis; mas se V. Exa. Sr. Presidente, for ao orçamento do Ministerio da Marinha e Ultramar, ha de ver que ali, a pag. 55, não ha o menor elemento para se calcular e apreciar esta verba de 400:000$000 réis. Não ha elementos de calculo algum.

V. Exa., Sr. Presidente examina o orçamento e vê: despesas extraordinarias das províncias ultramarinas, réis 400:000$000. Não ha outros esclarecimentos!

É possIvel que outras pessoas mais competentes do que eu, e todos que me estão ouvindo o são, encontrassem esses esclarecimentos; eu não os encontrei, não pude descobrir elementos de calculo para verificar se esta verba, orçada em 400:000$000 réis, era exacta, se tinha fundamento, ou se era ainda uma verba que não representava a verdade.

Sr. Presidente: as despesas do orçamento d'este anno estão orçadas em mais 162:000$000 réis do que no anno passado, o que quer dizer que o Sr. Ministro da Marinha fez uma correcção de 162:000$000 réis ao orçamento anterior; mas, comtudo, S. Exa. prevê já um deficit de réis 92:000$000.

Isto no orçamento colonial, ou seja decreto de 24 de agosto de 1901. Ora, S. Exa. pede no orçamento, para cobrir este deficit no futuro anno, 400:000$000 réis.

Como se comprehende isto? Se o Sr. Ministro entendeu fazer uma correcção de 162:000$000 réis no orçamento anterior, tendo previsto um deficit de 92:000$000 réis, como é que vem pedir agora 400:000$000 réis para cobrir o deficit do futuro anno? É claro que em dados tão vagos, tão divergentes, não pode haver confiança. Sem uma explicação plausível, sem se justificar este deficit e este augmento de despesa, nada se comprehende. (Apoiados).

Aqui tem V. Exa., Sr. Presidente, o que eu pude extrahir, que foi muito pouco, d'este revolto mar de cifras em que tive necessidade de estar mergulhado por algum tempo.

Eu podia dizer muito mais, e alguns elementos tenho aqui para fazer um discurso mais longo; mas entendo que não devo fazê-lo, primeiro, porque já estou falando ha tres quartos de hora, segundo, porque não desejo cansar a attenção da Camara. Acho até que foi uma ousadia da minha parte vir metter foice em seara alheia, mas a verdade é que eu apresentei o resultado do meu estudo, o resultado do exame que fiz do orçamento da marinha, e, como V. Exa. vê, em alguns pontos com uma falta absoluta de elementos de estudo e de calculo, porque, como disse ao principiar as minhas considerações, o Sr. Ministro da Marinha não trouxe á Camara os orçamentos coloniaes, e, portanto, para o exame da administração financeira do ultramar, nós não temos elementos absolutamente nenhuns.

O meu estudo resente-se, por isso, de duas cousas: a primeira, da falta de competencia de quem o fez, a segunda da falta de elementos para o fazer mais completo. Mas, emfim, tal qual o fiz, assim p apresentei á Camara, e o que peço ao Governo é que administre bem, que se convença de uma cousa, e é: que no estado actual das finanças publicas, neste momento historico, verdadeiramente critico, que a nação atravessa, ou ha de haver boa administração financeira, quer na metrapole, quer nas colonias, o mais parcimoniosa, exacta e rigorosa possIvel, ou fatalmente - e isto está no espirito de todos, não é só espirito de opposição - caminharemos para a ruína e para a miseria. (Apoiados).

Como a Camara viu, eu não fiz um discurso polItico. Bem sei que tenho fama de faccioso, em política, que sou tido e havido como tal pelo Sr. Presidente do Conselho e tambem um pouco pelo Sr. Ministro da Marinha; mas nesse ponto permitta-me S. Exa. que lhe diga que somos collegas, porque, se da minha parte ha facciosismo político, S. Exa., como toda a Camara sabe, é facciosissimo. E, note-se uma cousa, eu não me aborreço de que me chamem faccioso.

O Sr. Ministro da Marinha (Teixeira de Sousa): - Apoiado.

O Orador: - Acho que uma das primeiras qualidades do politico - e eu sou dos mais humildes - é ser faccioso, ter o acrisolado amor do seu partido. Não julgue V. Exa. que eu digo que se deve levar o amor do partido, o facciosismo, até ao exagero, até proceder de forma incorrecta. Não; nem eu, nem S. Exa. seriamos capazes d'isso. O que digo, é que se deve ter amor ao partido, já se vê, depois de pôr em primeiro logar o amor ao pais: - esse esta acima de tudo.

Todo o politico, que o é verdadeiramente, deve ter o chamado facciosismo, deve amar o partido politico á sombra de cuja bandeira se alistou. Este amor preso-me eu de o ter e deve tambem comprazer-se de o ter o Sr. Ministro da Marinha.

S. Exa. não deve desgostar-se de que lhe chamem faccioso, como eu tambem me não desgosto.

Mas, como V. Exa. vê, Sr. Presidente, fui hoje o menos faccioso que é possivel. Não quis fazer um discurso politico. Ainda hoje o Sr. Francisco José Machado disse que se não devia fazer politica com o exercito, porque isso é muitas vezes ir deitar polvora na fogueira.

Entendo que nestes assumptos de administração publica, como é a discussão dos orçamentos, não se deve tambem fazer politica. Deixemos a política para outras questões, em que se pode discutir á vontade, e nestas questões relativas á administração publica, ao exercito e outras semelhantes, não façamos politica: olhemos pura e simplesmente para o bem da patria. É isso o que peço ao Governo, ao Sr. Ministro da Marinha e a todos os homens que se sentam actualmente nas cadeiras do poder.

Peço que façam unica e simplesmente administração. É isto que vejo que os Srs. Ministros não teem feito e entendo que deveriam fazer. Ainda estão a tempo de seguir a estrada que deveriam ter seguido. Desde que se sobe aos conselhos da coroa, deve-se fazer simplesmente administração e Azedar para o lado essa política mesquinha que tem seguido o Governo e que tem sido o cancro roedor do nosso país e o ha de levar talvez á perdição e á ruína.

Peço desculpa de ter tomado tanto tempo á Camara, e por aqui concluo as minhas modestas considerações.

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado).

(Foi lida e admittida a moção mandada para a mesa pelo Sr. Antonio Cabral, ficando conjuntamente em discussão).

O Sr. Ministro da Marinha (Teixeira de Sousa): - O illustre Deputado a quem me cabe responder, começou o sen discurso mandando para a mesa uma moção em que lamenta que o, orçamento da Marinha apresente um augmento de despesa e, fundamentando a sua moção, o illustre Deputado falou bastante habilmente, com toda a apparencia de quem não quer fazer facciosismo politico. Mas, Sr. Presidente, devo dizer que, apesar d'isso e a despeito da sua affirmação, S. Exa. foi faccioso como nunca, porque, S. Exa. começou o seu discurso por mandar para a mesa uma moção em que lamentava que eu tivesse

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6 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

apresentando ao Parlamento o orçamento com augmento de despesa, o no decorrer do sou discurso não teve outra cousa em vista senão mostrar que eu, longo de me lançar no caminho das reduções, em harmonia com n situação da Fazenda Publica, me afastava d'elle para mo lançar no do augmento das despesas.

Francamente, o illustre Deputado anda longe de dizer a verdade, o digo isto sem querer por modo algum ser desagradavel ao illustre Deputado; pelo contraído, não posso esconder a muita sympathia que tenho pela sua intelligencia o pelo ser caracter.

O que e facto, é que S. Exa. foi faccioso até ao ponto de não ser justo para commigo.

Sentei-me d'esse lado da Camara e durante muitos annos fizer affirmação do que dadas as circumstancias da Fazenda Publica era indispensavel reduzir ao minimo essas despesas, e eu honro-me desde o primeiro dia em que entrei para o Ministerio da Marinha, até hoje, do nunca me esquecer de honrar essa affirmação. Hei do ter occasião do demonstrar e os factos se encarregarão de provar, ao contrario do que o illustre Deputado pensa, que tenho feito grandes redacções nas despesas. (Apoiados).

O illustre Deputado começou por confessar que não tinha os elementos precisos para apreciar o orçamento do Ministerio da Marinha e ultramar, porque lhe faltavam os orçamentos coloniaes.

Não quero confrontar a minha administração com a dos meus antecessores, porque não quero por maneira nenhuma pronunciar palavras que possam significar quebra do muito respeito e estima pessoal que tenho pelos meus illustres antecessores, os Srs. Eduardo Villaça e Dias Costa, Não quero referir factos praticados por mim, alguem não pense que desejo confrontes.

S. Exa. fizeram uma administração intelligente e honesta, o eu não quero recordar factos praticados por mim, porque não quero que só pense que vou comparar os meus actos com os actos praticados por S. Exa.

Mas o illustre Deputado está perfeitamente equivocado, porque os orçamentos coloniaes nunca vieram á Camara. Desde 1895 para cá, quem publicou o orçamento da provincia do Moçambique, fui eu. Até aqui não havia esse orçamento. (Apoiados).

Ha muitos annos que a provincia do Moçambique se governava sem orçamento, não porque os Ministros não defendessem os interesses do Thesouro, mas porque as circumstancias o não permittiam.

Quem publicou pela primeira voz os orçamentos de to das as provincias ultramarinas, saiba-o agora S. Exa. que me accusou com lauta paixão: fui eu.

Se este anno não o trouxe os orçamentos já á, Camara, e pela primeira vez seriam aqui apresentados orçamentos coloniaes, é isso devido á recente organização do exercito ultramarino, que obrigou a um trabalho muito aturado e longo, e que faz com que só d'aqui a alguns dias os orçamentos das provincias ultramarinas estejam completos.

O illustre Deputado, logo a seguir, estranhou que eu fizesse um augmento de despesa na Direcção Geral de Marinha, e o illustre Deputado, com muito methodo, distinguiu as despesas da Direcção Geral de Marinha e da Direcção Geral do Ultramar. S. Exa. disse que eu tinha feito um augmento na despesa da Direcção Geral de Marinha.

Quem ouvisse tal, havia de imaginar que eu tinha praticado actos que significassem augmento de despesa. Disse S. Exa.: "Pois então o orçamento da Direcção Geral de Marinha não apparece com um augmento de 47:000$000 réis?" Apparece. Mas ha alguem que possa fazer a demonstração de que isso é devido á minha administração?

Não.

Se S. Exa. tivesse lido a nota a pag. 71, havia de ver que isso e devido ao maior numero de guardas-marinhas que eu encontrei, e que não nomeei, ao maior numero de alumnos na Escola Naval, que eu não admitti, aos subsidios, ferias do operarios, soccorros a naufragos, provenientes da execução de uma lei, cuja iniciativa não foi minha, e da gratificação a quatro sargentos em serviço do departamento de oeste.

Tirando tudo isto, ficam as despesas inherentes ao pagamento a quatro officiaes collocados no serviço d'aquella secretaria.

Aqui então é que está o meu peccado?

Eu organizei as forças militares no ultramar, no intuito de dotar as províncias ultramarinas com elementos de segurança, o com o intuito de evitar novas despesas com expedições, o como a sua execução é dependente da Secretaria da Marinha, colloquei quatro officiaes junto da Direcção d'aquelle Ministerio. E não imagino o illustre Deputado que tal fiz para dar boa collocação aos meus amigos.

Em primeiro logar, esses quatro officiaes não recebem mais um real do que recebiam, e em segundo logar, estão em virtude de uma selecção feita de maneira tal, que elles dão toda a garantia de bem servir o país.

E tão aturado, tão difficil e tilo grande é o sou trabalho, que muita dificuldade tenho tido em os conservar na situação, em que hoje se encontram.

Ora, Sr. Presidente, a parte mais importante do discurso do illustre Deputado referiu-se ás alterações que a commissão de marinha fez no orçamento, no que diz respeito á dotação precisa para 408 praça.

Eu tinha feito um calculo; a commissão de marinha alterou-o e aqui o illustre Deputado achou razão para concluir que eu tinha proposto bem á Camara e que nesse caso a commissão de Marinha tinha procedido mal, ou que eu tinha proposto mal e então que a commissão do marinha tinha procedido bem ! Nem uma cousa, nem outra. O que eu fiz foi corrigir um erro que subsistia desde longo tempo. (Apoiados).

Eu não augmentei, por disposição minha, o numero de praças do corpo de marinheiros. Mas o que eu fiz, foi evitar que se repetisse d'aqui por deante, o que ha 2 ou 3 annos se tem dado; e é que o numero de praças da armada é muito superior ao fixado no mappa do armamento. D'isse resulta, que todos os annos se tem aberto créditos especiaes para pagamento ao numero de praças, que excede o fixado nos mappas do armamento. E aqui, o illustre Deputado havia de ter motivo para mo elogiar e applaudir, o nunca para me censurar. (Apoiados).

Sr. Presidente: tive a honra de entrar para o Governo em 26 de junho de 1900, e encontro! a mesma situação no que diz respeito ao numero de praças do corpo do marinheiros, que havia no anno anterior. Pois para se fazer face ao augmento de praças do corpo de marinheiros e a outras despesas da gerencia anterior, o Ministerio da Marinha abriu um credito de 247:000$000 réis. Eu mantive o mesmo numero de praças no exercício de 1900-1901, e longe de abrir o credito especial de um real para pagar a essas 488 praças a mais, reduzi o economizei na Direcção Geral de Marinha para o pagamento a essas praças. E tive de sobra 18:000 libras.

O illustre deputado, que é muito justo, encontraria nisso motivo para me applaudir, e nunca para me censurar.

Entendo eu, como entendi sempre, que o orçamento do Estado deve ser um documento serio; e não era legitimo que no corpo de marinheiros existissem 5:200 praças e que no orçamento houvesse verba para 4:600.

Entendi que era preferível transferir as sobras de capitulo para capitulo, do que dar a tua impressão de que o orçamento fosse falso, dotando só um certo numero de praças, quando na verdade o effectivo excedia esse numero.

Então que fiz eu?

Commetti o grande crime do ir basear dentro do orça-

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7 SESSÃO NOCTURNA N.° 42 DE 20 DE MARÇO DE 1902

çamento o necessario para o pagamento d'esse excesso. (Apoiados).

Podia não dotar essa verba com o preciso, mas não fiz tal; porque a minha consciencia dizia-me que dentro das verbas do orçamento eu tinha o preciso para o pagamento d'essas 408 praças.

O illustre Deputado, sempre na sua benevola intenção de não querer ser faccioso, disse que ou a commissão me quisera dar um cheque, ou que ella, nas alterações que fez, reduzindo o subsidio para embarque, teve o fim de cobrir a despesa a fazer com as 408 praças inscriptas no orçamento a mais.

Oh! Sr. Presidente, nem uma cousa nem outra succederam Em primeiro logar devo dizer ao illustre Deputado: quem apresentou na commissão de marinha a idéa d'essa suppressão, fui eu.

Dizia-se: Como é que o Ministro da Marinha pode reduzir a verba para subsídios de embarque?

Então as praças não continuam embarcadas ?

Como é que o Ministro pude fazer essa despesa diminuindo a verba?

Sr. Presidente: é simples e fácil. No Ministerio da Marinha o orçamento que diz respeito a forças da armada faz-se em fronte do mappa de armamento.

Quasi todos os nossos navios figuram estar fora do Tejo 12 meses em commissão, e como se sabe que elles não estão fora do Tejo tantos meses, podia-se portanto nessa verba de subsidios de embarque obter essa reducção. E ainda se comprehende de outro r iodo, porque o que é certo é que eu não pus dinheiro do meu bolso, mesmo porque o não tinha.

Se na gerencia anterior se tinha aberto um credito de 220:000$000 réis e eu não pedi um credito do um ceitil, mas ainda obtive economia de 18:000 libras para pagamento da primeira prestação do couraçado Vasco da Gama, é evidente que no orçamento a verba pura .subsídios de embarque não carecia de ser tão elevada.

E assim é que se justifica a reducção de 20:000$000 réis na verba destinada para o Arsenal da Marinha.

O illustre Deputado faça-me essa justiça; não me julgue competente para administrar a Fazenda Publica, mas reconheça-me a vontade firme e inabalavel de defender, até ao ultimo ceitil, os dinheiros publicos. (Apoiados).

A reducção de 20:000$000 réis para o material facilmente se justifica. Porque? Porque no Arsenal da Marinha se está construindo um navio, Patria, por conta de capitães levantados no Brasil, pagos por uma commissão que tem representação em Lisboa.

A carreira do Arsenal está, portanto, occupada, não podendo ser occupada por outra construcção. Por consequencia, esta diminuição ha de dar-se, e não preciso de me alongar em mais considerações para mostrar que, numa verba de cento e tantos contos ha de haver a reducção d'estes 30:000$000 réis.

O illustre Deputado encontrou logo outra verba em que não comprehendeu que se fizesse reducção de despesa. É a verba para pequenas construcções.

É facil de explicar também, como vae ver.

As despesas do ultramar são pagas ou por conta da metropole, ou das colonias.

Nós podemos fazer pequenos navios por conta da metropole no Arsenal da Marinha; mas o que se tem feito no ultimo anno e o que temos a fazer e que ha de ser pago no anno economico que vem, são pequenas construcções que vão ser pagas pelas receitas coloniaes. E assim mandei fazer duas lanchas-canhoneiras para a Guine, as quaes já foram entregues e pagas pelos orçamentos coloniaes, e assim temos pagas pelo ultramar duas canhoneiras para a Zambezia.

Se eu fizer as pequenas construcções pelos orçamentos coloniaes, não tenho necessidade alguma de incluir essas verbas nos orçamentos da metropole.

Ora o illustre Deputado passou logo á despesa extraordinaria.

S. Ex.a chega á despesa extraordinaria e encontra um augmento de despesa de 182:000$000 réis.

O que é que S. Exa. estranhou? É que, inscrevendo se a verba de 200:000$000 réis para a reparação do couraçado Vasco da Gama, essa verba apparecesse diminu da em 18:000$000 réis. Ha, porem, uma cousa que S. Exa. não fez: fui perguntar quanto custa a reparação do Vasco da Gama, e se o Ministro tinha no orçamento a verba necessaria para fazer face a essa despesa? S. Exa. notou a verba de 200:000$000 réis (e neste ponto ou não o pude comprehender), perguntou como é que esta verba apparecia diminuída em 18:000$000 réis?

A reparação do Vasco da Gama foi contratada por 112:000 libras, e eu o que peço no orçamento são réis 200:000$000.

Isto quer dizer que, com a verba do orçamento no fim do anno economico a que elle se refere, está paga a reconstrucção do Vasco fia Gama ?

Se S. Exa. me quisesse perguntar, eu faria a demonstração de que o Ministerio da Marinha vae dotar a marinha de guerra com o seu melhor navio, pedindo ao orçamento apenas 200:000$000 réis; pois, alem do pouco que ainda lhe resta na Junta do Credito Publico, vae buscar ás suas economias o que falta para perfazer a differença entre 112:000 libras em ouro e 200:000$000 réis.

O illustre Deputado passou depois do orçamento da Direcção do Ministerio da Marinha para o da Direcção do Ultramar, o começou por estranhar que se cortassem réis 10:000$000 réis na verba destinada a despesas com a emigração, dizendo: "Pois quando tudo aconselha a que se faça a colonização das nossas possessões africanas, reduz-se a despesa com a emigração em 10:000$000 réis?" Era a minha obrigação, porque eu, apesar de não ter contrato com a Empresa Nacional de Navegação, tenho tido para a costa occidental tantas passagens gratuitas quantos são os colonos que teem pedido passagem gratuitamente. E se não tenho dado passagens para a costa oriental, é porque são muito raros os verdadeiros colonos que a pedem. Se eu, portanto, tinha 20:000$000 réis para emigração e não gastava nada, não é muito que corte nessa verba 10:0000000 réis, porque ainda me chegavam os outros 10:000$000 réis. (Apoiados).

O illustre Deputado passou em seguida a referir-se á verba destinada á garantia de juro do Caminho de Ferro de Ambaca.

Disse S. Exa.: Mas como é que o Sr. Ministro da Marinha apresenta este anno uma verba inferior á do anno passado, como garantia do juro para o Caminho de Ferro de Ambaca?

É porque a garantia de juro é uma funcção da despesa com a exploração do rendimento da linha. O juro é calculado, como todas as outras despesas, pela media dos ultimos 3 annos. A media é de 539:800$000 réis. Não é calculada arbitrariamente. O calculo é feito numa repartição, á frente da qual está um engenheiro distincto, que me apresentou esta nota com toda a verdade, nota que não tenho duvida em offerecer ao illustre Deputado.

Mas o mais extraordinario é que o illustre Deputado passou depois para a verba de 400:000$000 réis destinada ás despesas ordinarias das provincias ultramarinas, mas não para achar que era exigua.

Sr. Presidente: tenho muita consideração por todas as qualidades do Sr. Antonio Cabral, e por isso, francamente, nesta occasião esperava que S. Exa. me dirigisse os seus applausos, porque a situação é esta:

Até ao exercício de 1901-1902 o orçamento para as despesas geraes das provincias ultramarinas era de réis 700:000$000, e o illustre Deputado, que é muito conhecedor de todos os assumptos de administração, sabe - e está perto de S. Exa. um antigo Ministro que o pode in-

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8 DIARIO DA CAMARA DOS SENHOBES DEPUTADOS

formur - sabe que, alam doa 700:000$000 réis destinados ás desposas, se gastava mais. (Apoiados).

Quer dizer: a administração financeira das nossas províncias ultramarinas encerrava-se com deficit, coberto no orçamento com os 700:000$000 réis e ainda com o que se pedia ao Ministerio da Fazenda; do forma que a despesa era não só dos 700:000$000 réis inscriptos no orçamento, mas do muito mais de outros 700:000$000 réis.

Por isso era natural que o illustre Deputado, tendo visto no orçamento para o exercício futuro, apenas a verba de 400:000$000 réis, dissesse: "Não pode ser; pois os seus antecessores pediram 700:000$000 réis e a despesa ia alem de 80.000$000 réis? Portanto, a verba de 400:000$000 réis, destinada a cobrir as despesas das províncias ultramarinas, é falsa". Más não. O illustre Deputado, apesar de todo o seu engenho, veiu dizer que esta verba é exagerada, porque o Sr. Ministro da Marinha, no orçamento colonial para o exercício corrente, indica apenas a verba do 202:000$000 réis, inscripta no orçamento da metropole, para cobrir esse deficit.

A conclusão não podia ser outra senão que a verba é insufficiente ; entretanto, S. Exa. accusa-me porque ella é exagerada.

O Br. Antonio Cabral: - Concluo V. Exa. isso; mas ou é que comecei logo por dizer que não tinha nenhuns elementos para conhecer do orçamento das províncias ultramarinas, tive de fazer os meus calculos ; e a conclusão que tirei d'elles é que tudo isto é uma falsidade.

O Orado?: - Sr. Presidente: nós temos já uma tal dureza de ouvido, que nem faz impressão a palavra falsidade!

O illustre Deputado não precisava mesmo d'esses elementos, porque habituado, como está, a estudar estes assumptos, nada mais tinha do que comparar as receitas e as despesas das colonias, para achar o deficit que é coberto pela metropole.

O que precisa, portanto, saber é com quanto concorre a metropole para cobrir esse déficit. Não ha couta nem mais certa, nem mais exacta, nem mais desenvolvida; desde que saiba com quanto concorreu a metropole, sabe qual é o deficit das colonias.

Vamos aos factos.

(Leu).

Logo, a desposa das províncias ultramarinas, em 1899-1900, foi de 2.414:000$000 réis.

Vejamos agora o que se passa no exercício de 1900-1901, pondo de lado, como já em 1899-1900, tudo quanto é despesa extraordinaria.

(Leu.).

Temos 2.132:000$000 réis, o que já dá uma differença para monos de 282:000$000 réis.

Devemos, porem, notar que neste anno houve já um notavel decrescimento de receita no sul da província de Moçambique, onde a principal receita, que é representada pelo caminho de ferro e alfandega, chegou a proporções mínimas.

Vimos já os exercícios anteriores; vamos agora ver qual foi a despesa descripta na tabeliã para o exercício corrente.

Temos, portanto, 2.002:000$000 réis, o que representa menos 412:000$000 réis do que no exercício de 1899-1900 e monos 1 30:000$000 réis que no exercício de 1900-1901.

A demonstrarão é facil, não ha equivoco possível.

Não tenho mesmo duvida em pôr á disposição do illustre Deputado os documentos precisos para fazer essa demonstração.

O Sr. Antonio Cabral: - Eu é que não os tive.

O Orador: - E que S. Exa. não os pediu; se os pedisse ou os tivesse procurado no Ministerio da Marinha, já S. Exa. tinha esses elementos.

Mas S. Exa. não desconhece que d'antes se inscrevia no Orçamento a verba do 700:000$000 réis para fazer face ás despesas das províncias ultramarinas e que alem d'esses 700:000$000 réis se gastavam muito mais do que outros 700:000$000 réis; por maneira que as províncias ultramarinas corriam com um deficit superior a 1.500:000$ réis.

Pois no anno corrente disponho apenas de 400:000$000 réis para cobrir o deficit das províncias ultramarinas e - o que é mais - no fim de fevereiro apenas tinha gasto 33:000$000 réis d'essa quantia.

Isto é tão exacto que eu ponho todos os documentos á disposição do illustre Deputado, e se S. Exa. entende que elles foram preparados ad hoc, ponho ainda á sua disposição todo o Ministerio da Marinha, e desafio-o, no bom sentido da palavra, a que demonstre que esta affirmação não é exacta. (Apoiados.- Vozes: - Muito bem).

Se fosse mais alem, se quisesse levar mais longe a demonstração, podia mesmo dizer que a despeito da crise de Angola, que teve um enorme decrescimento de receita, a despeito da situação especial da província de Moçambique, a administração está corrente com saldo.

Podia dizer qual foi a minha administração; porque se ou gastei 30:000$000 réis foi dos 400:000$000 réis inscriptos no orçamento é porque tinha por conta da metropole 142:000$000 réis.

Não quero abusar da attenção da Camara, e direi apenas como corre a administração financeira da Direcção Geral de Marinha.

(Leu).

Tudo isto consta do documentos que estão á disposição dos illustres Deputados que os queiram apreciar.

Na Direcção Geral do Marinha houve um differença apparente de 150:000$000 réis, porque a differença real foi muito maior.

O illustre Deputado increpou-me benevolamente, e eu benevolamente lhe respondo.

O que é certo ó que tendo eu como norma da minha administração a reducção das despesas publicas, V. Exa. Sr. Presidente, comprehende que não é de boa sombra que posso receber a accusação de que não defendo os dinheiros do Estado.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Vellado da Fonseca: - Sr. Presidente: vou ser muito breve e muito resumido nas considerações que vou fazer, mas algumas duvidas tenho sobre o orçamento que está em discussão.

Vou apenas por um dever de officio, sem fé, sem esperança que as minhas palavras, embora insignificantes, contribuam para melhorar em qualquer cousa o triste orçamento que se discute, porque apesar de não ser velho, já conheço os hábitos da Camara.

Quando se fala da opposição, o Governo ouve sempre com attenção, mas o caso é que por mais cousas que diga, por mais ásperas que ellas sejam, terei apenas um apoiado, um sorriso d'aqui, um sorriso d'ali. Posso mandar algumas propostas de emenda, que é provável que ellas não sejam acceites, embora sejam de toda a justiça, e se assim a illustre commissão o entender, agradeço em nome das pessoas a quem isso é agradavel.

Mas o que quero é ser muito breve, e não seguirei velhos exemplos, como um discurso que tenho aqui, do Sr. Teixeira de Sousa, o actual Ministro da Marinha, por quem tenho, e S. Exa. sabe-o perfeitamente, muita sympathia pessoal aqui e lá fora, mas o que não impede que, como Ministro, lhe peça a responsabilidade dos seus actos e censure aquelles que, por illegaes ou injustos, ache d'isso merecedores.

Em 30 de março de 1898 S. Exa. fez as seguintes declarações, de que eu tomei nota, porque dizem respeito á pasta que S. Exa. hoje dirige.

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Depois de largas considerações, o Sr. Teixeira de Sousa, Deputado da opposição de então, dizia as seguintes palavras, que V. Exa. julgará a applicação que podem ter á actual administração:

" Os estreitos limites em que se faz a nossa administração são absolutamente incompativeis com o equilíbrio do orçamento; cortar despesas no orçamento para atirar poeira aos olhos do país, para continuar a gastar á larga e para ir buscar aos creditos especiaes o que falta para este regime de folia, não é serio, nem é digno.

Uma das condições essencialmente de salvação é o equilíbrio do orçamento; mas equilíbrio por novos emprestimos, por novos impostos, pode levar o pais a uma situação desesperada e perigosa para as instituições, para tudo e para todos. É preciso cortar profundamente pelas despesas publicas".

Bellissimas palavras que S. Exa. proferiu; e quer V. Exa. saber até onde foi S. Exa., para se manter dentro das despesas do orçamento?

V. Exa. sabe decerto que o Sr. Teixeira de Sousa é um medico distincto, por cuja sciencia eu tenho a maior consideração; pois S. Exa., como medico distincto que é, dizia aqui na Camara:

"Equilibrado o orçamento, só amanhã a Junta Consultiva de Saude Publica, os governadores civis, as instancias officiaes, emfim, convencerem o Sr. Ministro do Reino, de que está imminente uma epidemia, ou porque nos venha do Lazareto, ou porque nos seja propagada de nação vizinha, a cholera ou a febre amarella, havendo verba no orçamento para satisfazer ás despesas do um cordão sanitario, que porventura seja aconselhado, estabeleça-se o cordão, mas se não houver verba corra-se o risco da cholera cá entrar".

Veja V. Exa. a valentia do Sr. Ministro. Mas ha mais. A proposito de cousas que correm pela sua pasta, dizia S. Exa. ainda:

"É o Governo informado de que houve um ataque á soberania portuguesa por qualquer novo Zixaxa ou Gungunhana, que determine a necessidade e que obrigue ás despesas de uma expedição militar; se ha verba no orçamento, satisfaça-se o nosso orgulho, mas se não ha, aguarde-se outra opportunidade para novos triumphos para as armas portuguesas".

Oxalá que S. Exa., com mais pratica dos negocios publicos, tenha mudado de opinião. Muitas vezos acontece isso, aqui d'este lado da Camara tem-se uma opinião, quando se vae para aquellas cadeiras, fica-se do avesso, diz-se o contrario do que se disse d'aqui. Eu só faço este voto: é que se amanhã houver uma revolta no ultramar, o Sr. Ministro gaste até aos ultimos 5 réis, gaste tudo, mas faça respeitar, como até hoje se tem feito, o nome de uma nação que é pequena decerto, mas que tem grande prestigio nas cinco partes do mundo.

Deixo as palavras do Sr. Ministro e vou ao orçamento, porque eu prometti sor breve, e gosto do cumprir as minhas promessas.

A commissão do orçamento é formada de pessoas muito distinctas, estão lá officiaes da nossa marinha, mas apesar d'isso arranjaram uma trapalhada do 200:000$000 róis, ou de 182:000$000 réis, differença de -18:000$000 réis para reparações da corveta couraçada Vasco da Gama, que ninguem se entende.

Mas, em todo o caso, com 18:000$000 réis a mais ou com 18:000$000 réis a menos, o couraçado la será arranjado.

O Sr. Ministro da Marinha fez um verdadeiro milagre com o arranjo d'este couraçado! E a prova da importantíssima obra que elle vae soffrer, é que se transforma completamente esse velho vaso de guerra - que já era vaso de guerra quando eu andava ao collo da minha ama! - e fica com taes qualidades e taes condições de estabilidade o supremacia, que virá a ser um dos principaes navios das esquadras europeias!!... Oxalá assim seja.

Isso vae custar os 200:000$000 réis inscriptos no orçamento !... É caso para felicitar o Sr. Ministro por ter vacca tão gorda, por tão pouco dinheiro!...

Mas parece que aqui ha algum embrulho!... Diz-se, mas não affianço, que o Sr. Ministro da Marinha, ha tempo, mandara suspender todos os pagamentos de fornecimentos pelo seu Ministerio, e juntar as parodias de todas os verbas disponíveis, fez d'isso bolo, com que foi pagando essa verba das obras do couraçado, que tambem segundo sou informado, é, no primitivo orçamento de 106:000 £, que ao cambio actual devem ser 624:000$000 réis.

Mas á ultima hora apparece a noticia - de que o couraçado vae soffrer algumas alterações, ficando fim mais comprimento e a fim de se obter a velocidade contratada precisa soffrer grandes modificações na proa!... São mais tontos, ou menos contos!...

Os orçamentos, como são constituídos, afastam-se sempre da verdade: são apenas formalidades que veem.

Nós, Deputados da opposição, entretemo-nos a dizer algumas verdades, que ninguem ouve e, o pais não se importa !...

Depois vem alguem da maioria e diz:

"O Governo ó composto de pessoas excellentes, de enormissimo talento, fizeram o que deviam fazer, as contas estão reduzidas !"

Mas os deficits vão ficando augmentados, como depois se ha de saber.

É o que acontece quasi sempre.

Mas não nos importamos com isso!...

Vejamos Sr. Presidente, o que acontece a este orçamento. O Sr. Ministro da Marinha este anno demorou-se um pouco! Creio que no anno passado, por esta época, já tinha tido parecer o orçamento das colonias. S. Exa. quando ha pouco respondeu ao Sr. Antonio Cabral deu uma explicação, mas isso pouco importa para esta questão. O Sr. Ministro da Marinha já está ha bastante tempo a gerir a sua pasta para poder fazer alguma cousa mais do que tem feito!

O Sr. Ministro da Marinha é sabio, intelligente e activo, tem força nas suas opiniões - e até é forte no seu jogo de sabre segundo se diz - mas porque ó que S. Exa. não seguiu um pouco do plano que encontrou do meu illustre amigo, o Sr. Conselheiro Villaça, que tamanhas e tão excellentes recordações deixou da sua passagem pelo Ministerio da Marinha? (Apoiados).

As minhas palavras não são uma lisonja para S. Exa., porque elle é incontestavelmente um homem de alto valor, de altíssimo critério, e prestou, mesmo com sacrifício da sua saúde, importantes serviços no Ministério da Marinha, deixando por fim um plano, que não digo que não tinha defeitos, mas que tem muita cousa boa para as nossas colonias. (Apoiados).

Não digo que o actual Ministro da Marinha, não tenha feito nada, seria faltar á verdade; mas o que ó certo é que devia ter feito muito mais. (Apoiados).

Uma das cousas que o Sr. Ministro da Marinha encontrou no seu Ministério, e que era de importancia, era o projecto para a construcção do caminho de ferro do Benguella, que tem já, dado tanta volta com a actual gerencia do Sr. Teixeira de Sousa.

S. Exa. sabe, que se estão cobrando verbas especiaes para esse caminho de ferro, que deu ordem terminante em portaria, para que os trabalhos começassem no 1.° de janeiro de 1901, mas que até hoje, esse caminho de ferro, que tão necessario é para o desenvolvimento das nossas colonias, das quaes depende o nosso futuro, continua sendo um problema para ser resolvido quando as circumstancias ou o acaso o permittam.

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10 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Emquanto isto succede, os nossos vizinhos do Congo Belga estrio trabalhando no sou caminho do forro prolongando-o alem do Stanley-Pool com grande prejuízo para o nosso futuro.

Projectamos um caminho do forro, fizemos os projectos, mas nada mais se fez, em virtude da nossa inércia, pró viniente talvez d'esta doçura de clima o d'esta doçura de costumes a que catamos sempre habituados.

Sr. Presidente: tenho-me perdido um pouco a conversar nas colonias; vamos agora ao que interessa, ao que importa:

Orçamento do Marinha do 1902.

Tive agora, por acaso, na nulo o orçamento da Camará Francesa, e permitta-me V. Exa. que repita uma phrase do relator geral d'aquelle orçamento. Diz Lackroy, cujo nome é bem conhecido no nosso pais, e antigo Ministro da Marinha - a tradução é minha o desculpe V. Exa. se ella não for perfeitamente exacta:

"O objectivo de um orçamento militar ó a preparação para a guerra. Todas as despesas que não concorrerem para a preparação para a guerra, devem ser reduzidas, eliminadas, supprimidas. Suo inuteis e perigosas. Inuteis, porque não contribuem para a defesa nacional; perigosas, porque tiram á defesa nacional uma parte das forças necessarias".

Ora, Sr. Presidente, devo confessar a V. Exa. que concordo absolutamente com este modo do sentir.

Estamos hoje a discutir o orçamento do Ministerio da Marinha, o triste ó dizê-lo, para defesa nacional, para augmento do nosso Arsenal, do nosso armamento, para o aperfeiçoamento da nossa marinha do guerra, V. Exa. o que vê é reduzir as desposas, e quando assim não é, vi a commissão, que foi encarregada de o apreciar e da qual fazem parto dois distinctissimos officiaes de marinha que eu muito considero, ainda nossas cortarem um poucochinho por considerarem de mais o pouco dinheiro que havia para armamento.

Ora, Sr. Presidente, isto é preciso que acabe.

Eu já declarei que, só queremos conservar os restos historicos do nosso dominio colonial, é preciso olharmos com mais attenção para as nossas possessões ultramarinas, que são, por assim dizer, a razão de ser da nossa existencia como nação livro, Se amanhã, por qualquer desastre, deixassemos de possuir os nossos terrenos ultramarinos, Portugal não teria razão de existir. Isto é uma verdade crua que ninguem contestará.

Pr. Presidente; vamos a ver o que foz o Sr. Ministro da Marinha neste ultimo tempo da sua gerência. Em primeiro logar, S.Exa. obedecendo sempre a estes princípios liberaes, que sempre nos guiaram, S. Exa. foi modificar, sem auctorização especial, o regulamento da disciplina na armada.

Isto é tudo quanto ha de mais liberal, de mais moderno. Basta dizer a V. Exa. que, por elle, fica o Ministro auctorisado, elle só, pelo seu livre arbitrio, de suspender durante um anno qualquer official, sem dar satisfações a ninguem, sem dizer porque, som haver recurso algum. Como V. Exa. vê, isto é tudo que ha de mais liberal!

O Sr. Ministro pode suspender um official do marinha por um motivo qualquer, porque não tem satisfações que dar a ninguem.

Dá-lhe para castigar, para mandar prender, S. Exa. fica com inteira liberdade para isso. Isto é tudo quanto ha do mais liberal, e de mais apropriado para este principio de seculo em que vivemos. Mas não pára aqui.

Instituiu tambem uma pena nova, foi a de separação de serviço, que corresponde, mais ou menos, á morto civil, e cata pena, para ser applicada, deve ser primeiro ouvido o Conselho Disciplinar, mas o Ministro fica com toda a liberdade.

Veja V. Exa. que liberdade! É liberdade á laia do Sr. D. Miguel. Fica com liberdade do, consultando o Conselho Disciplinar, se ahi houver uma voz divergente, tomar essa opinião e castigar o official, apesar das divergencias e opiniões em contrario da maioria do Conselho. Com que garantias se fica hoje na armada? O Sr. Ministro pode dizer-me: está você a berrar contra essas cousas todas, quando no exercito succede o mesmo. Será assim, mas por que razão estabeleceu S. Exa. isto para a armada? Foi depois da viagem ás ilhas, depois do ter elogiado muito a armada por ter cumprido a sua obrigação de uma maneira inexcedivel? Foi o premio que S. Exa. lhe deu, esta invasão do poderes?

Vamos ao orçamento. Se V. Exa. ler o artigo 5.°, capitulo 20.º encontra, pelo que diz respeito a pessoal, uma diminuição do verba de 1:080$000 réis. Isto foi milagre que houve na contabilidade do Ministerio da Marinha, porque em vez de diminuir o numero do vice-almirantes, aumentou em um, e a verba diminuiu 1:080$000 réis. Não habilidades do Sr. Ministro.

Para os contra-almirantes foi a mesma cousa, diminuiu a verba em 3:240$000 réis, o V. Exa. sabe quantos contra-almirantes ha esto anno ? Ha 7 e no anno passado haviam 5, augmentaram 2 e diminuiu a verba em 3:240$000 réis.

O Sr. Custodio Borja: - Haviam 9.

O Orador: - Mas no orçamento estavam inscriptos 5.

O Sr. Custodio Borja: - São reduzidos a 7.

O Sr. Antonio Cabral: - Eu li algures que a nossa armada em numero de almirantes a sexta ou setima, quando é das ultimas era navios de guerra.

O Orador: - Essas cousas concordam umas com as outras.

No anno passado havia 22 capitães de mar e guerra. Este anno no orçamento figuram 23, mas Ha realidade ha 33. Augmenta a verba no orçamento em 480$000 réis, o que quer dizer que fica recebendo um capitão do mar e guerra 44$444 réis! Por este preço vale a pena subir de posto.

O Sr. Teixeira de Sousa ó o unico Ministro que por um preço tão barato arranja capitões de mar e guerra.

Na, verdade não ha nada mais barato do que um capitulo do mar e guerra por 44$444 róis annuaes.

O Sr. Ministro da Marinha (Teixeira de Sousa): - Continue V. Exa. na escala hierarchica e verá.

O Orador: - Se V. Exa. me dá licença deixo o pessoal e vou ao material. Só me permitte vou á Escola de Torpedos.

O Sr. Ministro do sociedade com collega da Guerra resolveram fazer uma economia no serviço de torpedos.

Os torpedos estavam installados em Paços de Arcos, onde havia pessoal habilitado, considerado talvez o segundo em serviço de torpedos na Europa.

Este pessoal vivia com uma verba pequena, 17:917$000 réis por anno.

Tendo isto desappareceu, porque os dois Srs. Ministros resolveram passar os torpedos para o Ministerio da Guerra, a fim de fazerem uma economia, arranjando os torpedos com todo o luxo possível.

Vamos a ver as economias. O pessoal do Ministerio da Guerra começou n ter o vencimento do 14:940$250 réis e para material 7:500$000 réis, o que tudo sommado dá 22:440$250 réis.

Na marinha gasta-se:

Serviço do torpedos - material........... 8:000$000

Escola de Torpedos - pessoal............ 9:835$000

Somma total.................. ............. 40:281$250

A verba total do anno passado............. 17:917$000

O que dá differença para mais............. 22:364$250

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Resultado final: gastam-se agora 40:281$025 réis. A economia negativa é de 22:364$000 réis.

Não ha nada mais barato.

Mas, imagine V. Exa. que o Sr. Ministro da Guerra installou o serviço de torpedos, mas foi preciso que o Ministerio da Marinha lhe mandasse pessoal habilitado, porque o que lá tinha não era sufficiente para se haver com o serviço.

Mandaram-se desembarcar, do cruzador D. Carlos, officiaes e praças que hoje estão ás ordens do Ministério da Guerra.

Era este pessoal que fazia este serviço no Ministerio da Marinha.

O que se ganha com isto?

Até agora acho apenas de ganho um deficit de 22:000$000 réis.

Pode ser que de futuro se venha a ganhar com isso, actualmente não vejo outros resultados.

Quanto aos barcos torpedeiros que estavam, no seu quartel de inverno construído em Paço de Arcos, e que já foi aqui dito que custou umas centenas de contos do réis, estão hoje debaixo do um telheiro alugado e arriscados a que um dia sejam esmagados quando aquelle telheiro desabar, o que ameaça seriamente.

O que se ganha com estas modificações?

Ganha-se apenas uma economia negativa de 22:000$000 réis.

Segundo a opinião do Sr. Ministro da Marinha todo este material do torpedos não é cousa que valha a pena ser aqui discutida.

Foi esta a opinião que S. Exa. revelou na Camara dos Dignos Pares quando o Sr. Conselheiro Sebastião Telles alguma cousa lhe disse a esto respeito.

O que foi que S. Exa. lhe respondeu? S. Exa. respondeu-lhe o seguinte:

"Não é technico, mas a respeito de questão tão comesinha permitte-se ter uma opinião assente. Os torpedos fixos ficara pertencendo ao Ministerio da Guerra por serem destinados a defender o porto de Lisboa, o que é cousa muito differente de serem lançados ao mar".

S. Exa. disse que os torpedos fixos ficavam pertencendo ao Ministerio da Guerra.

Pois, apesar d'isto tudo, sabe V. Exa., Sr. Presidente, quem está encarregado de os ir buscar o de os tratar? É o pessoal do Ministerio da Marinha.

O Sr. Ministro já ha muito tempo prometteu, pela boca de Sua Majestade, no Discurso da Coroa, que faria a reforma do Corpo de Marinheiros.

Pedia ao Sr. Ministro da Marinha o favor do empregar a sua boa vontade a este respeito, porque, afinal, na dictadura que se fez, e em que se publicaram varias cousas, não se introduziu este regulamento.

Não foi por má vontade de S. Exa., naturalmente, foi porque houve qualquer duvida; mas, seria um grande favor feito, não a mim mas ao serviço publico, e que todos lh'o agradecerão.

O regulamento que está em execução é uma trapalhada e traz grandes dificuldades.

Vão um official dá uma ordem em cumprimento de um dos regulamentos, mas essa ordem vão logo contrariar qualquer dos outros regulamentos, do maneira que ninguem se entende.

Não ha duas pessoas que se entendam, e para se fazer idéa imagine até V. Exa. que o mestre da banda do musica dos marinheiros, teve que assentar praça como grumete, porque não havia meio de entrar na armada por outra forma.

Teve de assentar praça, e hoje é um primeiro grumete estando a receber como primeiro sargento. Imagine V. Exa. que trapalhada!

É necessario, portanto, uma reforma, e espero que S. Exa. não se demorará em trazer um projecto á Camara.

Ha pouco, o Sr. Ministro da Marinha, quando respondia ao Sr. Antonio Cabral, procurou justificar o augmento de 11:000$000 réis, nos serviços hydrographicos, soccorros a naufragos, pesquisas no Minho, etc.

Ora, francamente, a razão que S. Exa. deu não me convenceu, porque, do anno passado para cá, não se deu razão alguma para este augmento.

Seria para fazer concorrencia aos commissarios do Governo?

E possível. Mas o que é verdade é que o augmento deu-se.

Com relação aos operários provisorios do Arsenal, ha tambem um augmento do 5:000$000 réis, mas o que é que se faz no Arsenal?

Está-se construindo, por conta particular, um navio que é pago por subscripção aberta no Brasil, e não ha ali trabalhos a executar por conta do Estado, e porque é que se ha de augmentar com 5:000$000 réis a verba dos operarios provisorios?

Outra cousa, Sr. Presidente. O Sr. Ministro da Marinha reformou, neste interregno, a Escola Pratica de Artilharia Naval. Mas nesta reforma ha uma cousa curiosa e engraçada!... Indica-se no artigo 2.° que todos os alumnos matriculados nesta escola sejam ensinados com o material mais aperfeiçoado e tudo quanto haja de melhor. Entretanto vem no orçamento, para acquisição de material para essa escola 8:000$000 réis!

Mas, Sr. Presidente, se o Sr. Ministro da Marinha quisesse satisfazer este numero segundo do seu regulamento, teria de gastar proximamente 40:000 libras, o não seria muito para o organizar.

E agora, Sr. Presidente, vou referir-me, muito ligeiramente ao regulamento d'esta Escola Pratica. Imagine V. Exa., que nesta escola, aonde se vão matricular os artilheiros, para sor artilheiro de 1.ª classe ó preciso ter a classificação de 14 valores; mas para poder dar tiros com bala, ó preciso ter 15 valores!... Este regulamento admitte a possibilidade de haver artilheiros... como lhe chamarei.., gazosos! Porque realmente atiram; mas só fazem combustão de pólvora sêcca, empregam unicamente os gazes !...

De modo que artilheiros de l.ª classe, que toem um valor a menos, na pratica, só dão tiros de pólvora sêcca: ha só fumo, gazes e mais nada!...

Mas, Sr. Presidente, esses homens, caso não possam trabalhar a bordo do navio escola, por não haver material, vão fazer exercício a bordo dos navios que estejam mais bem organizados. E diz o artigo 3.° do regulamento:

"Fará os tiros com material de combate". Mas porque é que S. Exa. não tomou resolução sobre uma proposta que tem no seu Ministerio - proposta nacional, se não me engano - para o fornecimento de balas exactamente para exercícios, a fim de que ficassem muito mais baratas e não só estragasse o material com os tiros que se fizessem?!...

Mas isso ficará para quando houver vagar.

Calculando em 80 artilheiros a 50 tiros cada ura, o que não será demasiado para a sua instrucção, são 4:000 tiros que em 8 peças, o maximo que existem nos nossos cruzadores, daria 500 tiros a cada peça, numero que está do sobejo provado ser muito superior aos que com ellas se podem dar.

Quer dizer, com. esta disposição, ou os artilheiros não podem dar tiros com bala, ou as peças ficam estragadas.

Isto não pode pois continuar assim, e espero que o Sr. Ministro da Marinha quando tiver tempo, modifique estas disposições.

O meu illustre collega o Sr. Antonio Cabral referiu-se tambem a um ponto, a que igualmente se referiu o Sr. Ministro da Marinha, mas do tal forma que não fiquei percebendo nada.

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12 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

E com relação ao recrutamento. Não sei qual é o numero certo do recrutas estabelecido.

Vi nesta Camara o projecto que fixa a força naval, e li o que lá se marrava, 5:800 praças.

Vou ao orçamento para o anno do 1902-1903, leio o que lá se escreve, o vejo o seguinte:

"Mappa da força naval proposta paru serviços durante o anno economico 1902-1903-5:192; o anno passado eram 5:202. No projecto de lei n.° 12 propôs este orçamento em pag. 11 - 5:600".

Ha pois aqui uma confusão do numeres, com relação tis praças, que eu não sei explicar.

O Sr. Ministro da Marinha esteve fazendo referencia a todos estos numeros não fui capaz do o entender.

O que sei é que tem havido indivíduos que teem querido assentar praça, e teem lhe respondido que não ha verba.

Está marcado o numero de praças, mas e que vejo é que não ha verba, o que foi preciso fazer uma redução em outras verbas orçamentais.

Ora assa reducção precisa sor um pouco revista, porque essa verba já estava reduzida.

A despesa com este arranjo no Vasco da Gama ha de custar muito mais do que cata no orçamento.

Devo dizer, neste ponto, que se diz que no Ministerio da Marinha se estão fazendo desde já fornecimentos a credito para se pagarem no futuro anno.

O Sr. Ministro da Marinha (Teixeira do Sousa): - No Ministerio da Marinha não se deve nada.

Não brinque V. Exa. com uma cousa que é seria.

O Orador: - Eu estou falando serio.

Não sei se isto assim é; mas que isto se diz é uma verdade.

V. Exa. não se livra d'isto.

Sr Presidente: já estou aqui lia muito tempo a falar sem valor a pena, o vou terminar.

Mas ha uma cousa que mo faz muita impressão. No capitulo 2.°, artigo 8.°, encontro o mesmo numero de machinistas navaes, emquanto a verba foi augmentada. Fui procurar a razão d'este augmento, procurei na lei, procurei em toda a parte e, francamente, não encontrei razão para isso.

O Sr. Ministro da Marinha, na ultima viagem que fez ás ilhas em companhia de Suas Majestades, teve occasião de reconhecer mais do porto o serviço arduo dos encarregados das machinas e de reconhecer que, embora tivessem debaixo das suas ordens ás vezes mais de quarenta pessoas, elles estavam enormemente sobrecarregados, tanto pela responsabilidade como pelo arduo serviço.

Entendendo que eram pequenos os vencimentos, S. Exa. mandou abonar, por sua alta recriação, 20$000 réis aos encarregados das machinas do cruzador D. Carlos, e 15$000 réis aos encarregados das machinas dos outros cruzadores.

Isto don em resultado que um immediato, que tom tanto ou mais serviço que o encarregado da machina, fica, embora em funcção de maior responsabilidade, ainda que differente, em peor situação pecuniaria e recebendo no fim do mês muito monos do que elles recebem.

Pergunto a V. Exa. e pergunto á Camara se isto é justo.

Eu creio que não.

Noto V. Exa.: Os immediatos sito officiaes combatentes com outro curso e do graduação superior, geralmente era dois pontos, aos encarregados das machinas.

Pelo regulamento de serviço são responsaveis por todos os serviços do bordo, responsaveis, portanto, tanto ou mais que os encarregados, pelo estado e serviço das machinas.

Que S. Exa. entendesse que o trabalho era demasiado e era mal remunerado para os outros, muito bem, mas acho tambem que sendo um serviço de igual responsabilidade o de igual causado, como por exemplo para os medicos e outros officiaes de bordo, como são os encarregados do electricidade e dos torpedos, que, cora toda a razão.

S. Exa. lhes devia ter concedido uma gratificação especial.

E assim que sendo os encarregados de torpedos o da electricidade, os immediatos e os encarregados da artilharia, os que teem. o maior trabalho que ha a bordo, os que teem maior responsabilidade, a alguns d'elles mesmo deve o Estado economias importantes.

S. Exa. sabe muito bom que o official encarregado da electricidade a bordo do navio D. Carlos deve uma economia superior a 800 libras, porque mais de 1:000 libras era a quantia que a casa constructora pedia para fazer uma installação eléctrica, emquanto que este official mandou vir os apparelhos, e pela sua habilidade, pratica e paciencia, fez uma instalação com uma verba relativamente insignificante, que não passou de 200 libras.

Feita esta economia, havendo esta differença de postos, este excesso de trabalho, porque estes officiaes são os que estão constantemente a bordo, são os que criam os encarregados de torpedos, os que criam os electricistas especiaes, os artilheiros, não seria de toda a justiça, que assim como em todas aã escolas que ha no Ministerio da Marinha os officiaes teem uma qualificação especial, estes a tivessem tambem por esse trabalho?

Parece-me justo, sobretudo estando o exemplo já dado com os encarregados das machinas.

Estes officiaes ao verem que os professores especiaes encarregados nas escolas d'esse serviço teem esta gratificação, e elles que são quem instruem as praças, e a prova é que na passagem dos torpedos para o Ministerio da Guerra, foi tambem o pessoal que estava instruído abordo do cruzador D. Carlos, ficam unicamente cora a consciencia de terem cumprido a sua obrigação.

Eu vou terminar, mandando para a mesa esta proposta de emenda.

IIa, infelizmente, uma verba que ficou disponível no orçamento pela morte do um homem cujos serviços e qualidades eram de sobejo conhecidos para que me dispense de as relembrar, e á memoria do qual já a Camara prestou a merecidissima homenagem ; é a deixada pelo almirante Baptista Andrade.

"Considerando o espinhoso trabalho dos officiaes que a bordo dos modernos cruzadores D. Carlos. Rainha D. Amelia, S. Raphael, S. Gabriel e Adamastor, desempenham os encargos especiaes de officiaes immediatos, torpedos, electricidade e artilharia;

Considerando que no orçamento, no capitulo 2.°, artigo 8.°, está mencionada a verba de 1:020$000 réis para pagamento de gratificações aos machinistas encarregados das machinas d'aquelles navios;

Considerando que do abono de tal gratificação resulta haver embarcados no mesmo navio officiaes do graduação superior ou igual á dos marchinistas navaes gratificados, que recebem vencimentos sensivelmente inferiores, tendo identicas responsabilidades e trabalho;

Considerando que em todas as escolas em que os instructores recebam gratificações especiaes superiores á que proponho, não existe o material de artilharia e torpedos que os modernos cruzadores possuem, de onde resulta que a instrucção ao pessoal de bordo tem do ser ministrada pelos officiaes encarregados d'estes importantes serviços ;

Considerando, ainda, que no estrangeiro, os encarregados d'aquelles serviços a bordo teem gratificações especiaes :

Proponho :

1.° Que aos 'officiaes immediatos e aos encarregados a bordo dos serviços do artilharia, torpedos e electricidade seja arbitrada a gratificação de 180$000 réis annuaes ;

2.° Que esta verba seja inscripta no orçamento, como já o está para os machinistas encarregados;

3.° Que a este encargo se applique parte da verba de

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4:000$000 réis descripta no artigo 5.°, do capitulo 2.°, do orçamento do Ministerio da Marinha e Ultramar, disponível em virtude da morte do almirante Baptista de Andrade".

Sr. Presidente: espero que a illustre commissão tomará em attenção esta proposta que tenho a honra de mandar para a mesa, dando assim satisfação a esta proposta, que tenho por tão justa.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado).

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção. Vae votar-se.

É lida na mesa a moção do Sr. Antonio Cabral e, posta á votação, é rejeitada.

Em seguida é lido e approvado o orçamento do Ministerio da Marinha.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para entrar em discussão, o mappa n.° 2, na parte relativa ao orçamento do Ministerio dos Negocios Estrangeiros.

É lido.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Conde de Penha Garcia: - Sr. Presidente: a hora vae muito adeantada e eu não quero nem devo abusar da paciencia da Camara. Por isso procurarei resumir, quanto possível, as considerações que tenho a fazer sobre o orçamenta do Ministerio dos Negocios Estrangeiros.

Antes, porem, permitia V. Exa. que eu peça á Camara a sua benevolencia não só para mim, que d'ella bem preciso, mas, sobretudo, para o Governo, que é quem mais d'ella carece neste momento.

E eu digo porquê.

O orçamento d'este anno pode caracterizar-se como sendo na vida administrativa do Governo aquillo que os franceses chamam le dernier jour de garçon.

Vamos ter em breve realizado o convenio com os credores externos, e entre outros dos seus extraordinarios e esplendidos benefícios, annuncia-se uma regeneração completa do nosso systema de administração financeira. Oxalá que assim seja; e se considerarmos, que o Governo neste orçamento augmentou sem conta, peso nem medida, as despesas publicas, consolemo-nos ao menos acreditando com effeito, que este é o ultimo orçamento perdulario e ruinoso do Governo; le dernier jour de graçon para os Governos maus em Portugal. (Apoiados).

Do orçamento em geral e do orçamento do Ministerio dos Negocios Estrangeiros em particular, direi que, como instrumento de previsão, se assemelham a um bem conhecido de todos, com respeito ás previsões meteorologicas, que se chama o Borda de Agua.

O valor das previsões orçamentaes pode-se igualar ao das previsões do tempo da folhinha alludida. Não falta até aquella generica designação da chuva por partes, que põe o almanach a coberto de qualquer erro. Nas previsões orçamentaes tambem ha chuva por partes: são os créditos extraordinarios e especiaes! (Apoiadas).

Não abusarei da paciencia da Camara dissertando sobre generalidades orçamentaes, e por isso circumscreverei a minha analyse ao assumpto - Ministerio dos. Estrangeiros - que é o que está em discussão.

Começo mandando para a mesa a minha moção de ordem, que, nos termos do Regimento, vou ler:

"A Camara, considerando que o orçamento do Ministerio dos Estrangeiros traduz o mau criterio administrativo e financeiro do Governo, porquanto nelle se deixaram de incluir despesas certas já conhecidas, se augmentou o funccionalismo desnecessario è se augmentaram as despesas de caracter permanente, recommenda ao Governo a redacção das despesas publicas, e continua na ordem da noite. = Conde de Penha Garcia".

É modesta, relativamente, a dotação do orçamento do Ministerio dos Estrangeiros.

Figura apenas no maré magnum de algarismos do Orçamento Geral, com uma verba de 400:000$000 réis; e assim, o orçamento dos Negocios Estrangeiros, passa ás vezes sem discussão e até corre foros de verdade assente, que a sua dotação é tão modesta, que realmente não pode ser reduzida.

Em parte discordo d'esta opinião e com bons fundamentos, não porque ache excessiva a verba, mas porque em outros países, onde o criterio financeiro é diverso do nosso, e onde as necessidades de representação no estrangeiro são semelhantes, as despesas dos respectivos Ministérios dos Negocios Estrangeiros são feitas com uma verba ainda mais reduzida do que a que está no orçamento português.

Para confirmar o que estou dizendo, vou ler á Camara a dotação orçamental de varios países como a Suecia e Noruega, a Hollanda, a Grecia e a Suissa:

"Despesas orçamentaes com os serviços Dependentes dos Ministerios dos Negocios Estrangeiros, nos seguintes países, no anno de 1900:

Suecia e Noruega, 309:000$000 réis; Hollanda, réis 319:000$000; Grecia, 432:000$000 réis, e Suissa, réis 125:000$000".

Parece-me poder afirmar, em face d'estes algarismos, que na verdade o orçamento dos Estrangeiros está suficientemente dotado, embora sem excesso, e que nas suas verbas se poderiam conseguir, não digo notaveis economias, porque de notaveis economias estamos nós cansados, mas algumas diminuições de despesa, que, dada a nossa situação financeira, não seriam para desprezar. (Apoiados).

Por dois processos diversos se pode criticar o orçamento. Em primeiro logar, averiguando se as despesas nelle contidas são verdadeiras e bem calculadas; em segundo logar, examinando se a distribuição das verbas é feita proporcionalmente pelos serviços de maior necessidade e importancia.

Ora, applicando o primeiro methodo, verifica-se que o orçamento em discussão é incorrecto, porque se calcularam mal as despesas e nelle se deixaram de inscrever verbas que presuponho serão avultadas e que hão de augmentar ainda mais o déficit, esse temeroso deficit, que S. Exa. o Sr. Ministro da Fazenda quis avaliar apenas em menos de 1.000:000$000 réis, mas que, infelizmente para o pais, ha de ascender a mais de 5.000:000$000 réis! (Apoiados).

Para o exame de algumas verbas do orçamento, necessitava eu de um documento, que aliás já tinha ha muito tempo pedido, ha mais de dois meses, para com elle me habilitar a discutir a reforma da organização do Ministerio dos Negocios Estrangeiros, por occasião da discussão relativa ao uso, ou antes abuso, que o Governo fez das auctorizações parlamentares. Só agora tive, emfim, a rara felicidade de obter esse documento.

Não é elle longo, e eu mostra-lo-hei á Camara, para que veja como é moroso o trabalho das nossas secretarias, que necessitam de dois meses para me enviar estas quatro pobres folhas de papel almaço.

Quando recebi este documento, fiquei satisfeito por emfim poder comprovar as afirmações, que já fizera quando discuti na Camara a reforma do Ministerio dos Negocios Estrangeiros.

Infelizmente, tendo - procedido á sua leitura, vi que elle não era nem o que desejava, nem o que eu pedira.

Bem longe d'isso. Lembra-me este documento, aquillo que se conta de um illustre membro d'esta Cornara, que

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um tempo foi relator do um projecto de lei que criava tres logares novos. Quando de um dos lados da Camara se lhe perguntava só os logares em estipendiados, respondia imperturbavelmente: "Já disse ao illustre Deputado, que posso affirmar, que serão todos cidadãos portugueses".

A lista do collocação do pessoal do Ministerio, que eu pedira, refunda ao dia 24 de janeiro d'este anno, foi-me enviada apenas com referencia ao dia 25 de dezembro de 1901! Fiquei, pois, sabendo apenas, que são todos cidadãos portugueses !

Que, ainda assim, Sr. Presidente, o documento em questão sempre me trouxe algumas novidades.

Aprendi, por exemplo, que alguns funccionarios do Corpo Diplomatico e Consular tinham desapparecido. Não sei se houve crime, creio que não, mas o que é certo é que o nosso cousul em Tanger, o secretario da nossa legação na Russia, o Sr. Thomaz Ribeiro Ferreira e outros, não apparecem neste documento. Nelle tambem aprendi, que o Governo tem deixado do cumprir nua lei, que neste país só promulgou no intuito de favorecer a classe dos sargentos, a que o Sr. Ministro da Guerra se referiu ainda hontem ou hoje com tanto interesse, ao que parecia.

Existe uma lei, Sr. Presidente, que destina o provimento de certos logares publicos aos sargentos com baixa, quando os haja com as habilitações necessarias: quer-me parecer que no Ministerio dos Estrangeiros se deixou do cumprir a lei!

Logares foram providos, sem se attender ao que nesta lei se ordena!

Outra cousa ainda se averigua do documento a que me vou referindo, é que houve no Ministerio dos Estrangeiros uma singular necessidade de augmentar consideravelmente certa classe de pessoal.

Mo sei bem a que criterio obedece esta necessidade; o que é certo é que o numero de segundos officiaes augmentou e augmentou muito!

Esse e outros augmentos trouxeram como resultado final que as despesas de secretaria augmentaram em réis 2:220$000!

Ora veja V. Exa., Sr. Presidente, e a Camara, se na situação actual do pais nós necessitamos augmentar as despesas de secretaria! (Apoiados).

Agora, Sr. Presidente, e porque eu não quero alongar muito as minhas considerações, como prometti á Camara, deixo isto de lado, ficando demonstrado que as despesas de secretaria cresceram dois contos e tanto, com esta necessidade subita de augmentar os logares de segundos officiaes; e peço desculpa de usar esta antiga e burocratica designação, porque S. Exa., na secretaria dos Estrangeiros, chamam-se segundos secretarios e consules de 2.ª classe!

A reforma do Sr. Ministro foi um verdadeiro jubileu; hoje ninguem ha na secretaria que não seja consul, secretario ou ministro! D'isso estamos riquíssimos! (Apoiados).

Alem do augmento da verba da secretaria, outros, Sr. Presidente, encontro no orçamento que mereciam menção especial, se não temesse cansar a Camara, entrando em minucias; mas não deixarei de citar uma.

Na reforma do seu Ministerio o Sr. Ministro dos Estrangeiros estabeleceu que as despesas telegraphicas das legações e consulados seriam pagas pelo Ministerio.

Eu não digo a V. Exa. se a medida é boa ou má; creio até que é justa. Mas o que á certo é que até hoje parle d'estas despesas eram pagas pelas verbas de expediente das legações e consulados na importancia de mais de 2:000$000 réis.

Passam agora a ser pagas pelo Ministerio, e eu não vejo em nenhuma das verbas em que podem ser incluídas, traços da sua passagem.

É innegavel que as despesas se elevaram o não vêem consignadas no orçamento.

De alguma parte hão de sair, e como digo, sendo despesas certas o nau estando incluídas no orçamento, quer-me parecer que o Sr. Ministro se verá embaraçado para as mandar pagar em tempo opportuno.

Em varios artigos d'este orçamento do Ministerio dos Estrangeiros se podem notar consideraveis diminuições de despesa em relação ás que só inscreviam no orçamento anterior.

Isto surprehenderá a Camara, anciosa de conhecer essa avia rara que se chama diminuição de despesas.

Para illusão, que se esvae como fumo!

Trata se apenas de um artificio, que em ultima analyse representa augmento de despesas. Passam á categoria de permanentes, despesas que até agora eram de caracter transitorio, e que estavam destinadas a desapparecer do orçamento.

Mas onde a imprevidencia é ainda mais avantajada e condemnavel é no capitulo das despesas extraordinarias.

Nessas é que me parece que, por maior que seja o talento, e realmente é grande, do Sr. Ministro dos Estrangeiros, as difficuldades hão de ser enormes para não exceder a verba orçamental e seguramente S. Exa. ha de recorrer aos creditos especiaes. (Apoiados).

Pelo que respeita ás despesas extraordinarias, descreve-se uma verba global, para occorrer a serviços muito diversos.

As missões extraordinarias, a commissão de demarcação de fronteiras e a de pescaria do rio Minho, são alimentadas em comum por esta verba, sem especificação da despesa que se faz em cada serviço.

E um dos defeitos do Orçamento, não só d'este Ministerio, mas de todos os Ministerios, é inscrever as verbas para certas despesas em globo, de modo que a fiscalização do Parlamento é impossível.

Do mais a verba para as duas commissões, a que me referi, não está convenientemente escripturada.

É uma despesa ordinaria, constante, que figura em todos os orçamentos ha muitos annos.

Inscrevê-la nas despesas extraordinaria é falsear a verdade do orçamento.

O peor é que com essas despesas que aqui figuram com a singela designação de "missões extraordinarias", vae o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros ter muito que fazer.

Senão vejamos:

Temos, em primeiro logar, a missão á China, à tout seigneur, tout honneur.

Em outubro de 1901, se a memória me não trae, soube-se, com grande surpresa indígena, que o Governo ia mandar uma missão á China.

Esta noticia causou, como V. Exa. deve saber, grande sobresalto no publico.

Dizia-se, então: Pois quê? O nosso pais vae mandar uma missão extraordinaria á China?! Que extraordinarios negocios diplomaticos irá o Governo resolver? Terá, talvez, o Governo o projecto de arranjar, para Portugal, um largo quinhão do Imperio Chinês?

Partiu a missão, cercada de mysterio, como convem, e, durante muito tempo nada d'ella se soube, até que, ultimamente, chegou, como um echo, ao nosso pais, o ruído das saúdes feitas em banquetes dados em sua honra. Até hoje a isso se limitaram os resultados conhecidos d'essa famosa missão extraordinaria! (Apoiados).

Quando se abriram as Camaras todos esperavam que, no Discurso da Coroa, o Governo daria, emfim, a chave do enygma sobre a celebre embaixada á China. Nada, porem, se disse e, hoje, nós estamos na mesma ignorancia das causas e effeitos d'essa extraordinaria embaixada.

Numa das sessões passadas, eu dirigi um aviso previo

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ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, levado, talvez, por um excessivo sentimento de curiosidade. Julgo, no entanto, ter prestado ao Governo um grande serviço; embora seja seu adversário político, entendi que devia fazê-lo.

Na opinião publica, a par dos que acreditavam, piamente, que a grandes empresas se tinha abalançado o Governo, e que grandes actos diplomaticos delineava no Extremo Oriente, havia tambem uma corrente de scepticos, que consideravam essa famosa embaixada á China como um acto de diplomacia interna!

Não sei bem a significação o alcance da phrase, mas é assim que só classificava.

Eu entendi que prestava um serviço ao país, convidando o Governo a demonstrar se obedeceu realmente a um critério de boa administração, e, sobretudo, de predente administração colonial, pensando em fazer alguma cousa em beneficio de uma colonia, que realmente o merece, a colonia portuguesa na China, ou se a missão á China foi apenas o mais condemnavel dos expedientes políticos. (Apoiados).

O que é certo ó que a missão á China, quaesquer que sejam os seus effeitos e resultados, não se tara de graça, e eu confesso a V. Exa. que não sei calcular, com toda a franqueza o digo, quanto poderá custar.

Já busquei nos documentos referentes á ultima embaixada extraordinaria á China em 1887, e encontrei então o mesmo que acontece agora, as despesas confundidas, sendo difficil destrinçá-las.

Essas despesas eram de cerca de 60:000$000 réis, divididos por tres exercidos e comprehendiam despesas extraordinarias com a Legação de Londres, delimitação de fronteiras na Africa, inspecção dos consulados no Brazil e a missão á China.

Presupponho que d'aquellas despesas as que mais devem avultar são as despesas com a missão á China.

Por consequencia, dou de barato que, num país modesto e de finanças avariadas, esta embaixada custe 30:000$000 réis.

S. Exa. o Sr. Ministro dos Estrangeiros tem para des pesas extraordinarias 50:000$000 réis; logo, fica apenas com 20:000$000 réis para satisfazer despesas inevitaveis, como, por exemplo, a da commissão de limitação de fronteiras entre Portugal e Hespanha.

Entre parenthesis, peço ao Sr. Ministro que veja se pode resolver este grande problema, acabar de vez com esta delimitação de fronteiras, problema tão insolúvel que chega a ser humilhante.

Pois, então, nem entre Portugal e Hespanha conseguimos limitar a linha fronteiriça depois de mais de 20 annos de trabalho? (Apoiados).

Alem d'isso ha as despesas extraordinarias com as legações e consulados fora da Europa. Para as satisfazer tem o Sr. Ministro que recorrer á verba de 20:000$000 réis, que já soffreu o bote, cuja importancia não posso calcular, das despesas da commissão de delimitação do fronteiras.

Ora, isto é um pequeno poema, porque S. Exa. criou algumas legações, deu-se a esse luxo, mas essas legações, que não teem ainda verba no orçamento, hão de ser alimentadas por esta verba das despesas extraordinarias.

Depois vêem as despesas com a commissão de pescarias no rio Minho.

V. Exa. sabe que são continuas as questões com a Hespanha em materia de pesca.

Portanto, a commissão de pescarias não poderá supprimir-se, e o nobre Ministro terá que pagar-lhe.

Por esta forma, dos 50:000$000 réis para despesas extraordinarias, apenas 2:000$000 réis ou 3:000$000 réis, no maximo, poderão ficar disponíveis, depois de pagas as despesas que enumeramos.

Em missões extraordinárias, porem, tem o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros muito que gastar, e o país ha de pagá-las. (Apoiados).

Eu vou dizer a V. Exa., Sr. Presidente, e á Camara, o que S. Exa. ainda tem que gastar.

Em primeiro logar, uma missão extraordinaria que, seguramente, ha de ser enviada a Londres, para assistir á coroação do Sua Majestade o Rei de Inglaterra. É um dever de cortesia, a que o Governo Português não pode faltar, e eu não vejo verba descripta por onde essa despesa possa fazer se. (Apoiados).

Em segundo logar, outra missão extraordinaria, que o nosso Governo deve enviar a Madrid, para assistir á coroação de Sua Majestade o Rei do Hespanha, e para a qual não ha tambem, verba orçamental. (Apoiados).

Portanto, a verba para despesas extraordinarias do Ministerio dos Negocios Estrangeiros, está calculada por forma tal, que não chega a meio caminho.

Vê, pois, V. Exa., Sr. Presidente, e vê a Camara, que o orçamento, que se discute, não é, realmente, um orçamento - ante - convenio. De outra maneira, não se comprehende como o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros traz á Camara um orçamento, cujas despesas são computadas pela forma que eu acabo de demonstrar.

As despesas extraordinarias, porem, não param aqui.

Sabe V. Exa., Sr. Presidente, que o nosso país se honrou e honrou as suas tradições de hospitalidade, recebendo, em seu seio, uma grande quantidade de emigrados boers. Ora, é claro que tambem haverá despesas a fazer com a sustentação d'esses emigrados. Essas despesas não figuram no orçamento, mas hão de figurar, mais tarde, provavelmente, em creditos extraordinarios, abertos para esse fim. (Apoiados).

Aqui tem, pois, V. Exa., Sr. Presidente, e a Camara, quatro verbas, para as quaes não ha dotação orçamental, e que são inevitaveis.

Está, portanto, demonstrado, como eu tinha promettido ao Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, quando discuti a reorganização do seu Ministerio, que o orçamento dos Estrangeiros não corresponde á expressão da verdade. (Apoiados).

Mas ha mais.

Não desejo cansar a attenção da Camara, e, por isso, não entrarei em minucias demasiadas. Mas, que me diz V. Exa., Sr. Presidente, com respeito, por exemplo, á verba para addidos commerciaes? Nós já sabemos que estão dois nomeados. Como no orçamento não ha verba especial para elles, segue-se que ella ha de sair de alguma das outras, que já são insuficientes para os encargos conhecidos.

Naturalmente, S. Exa. o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros, chamará em seu auxilio o Sr. Ministro das Obras Publicas e aquelle famoso artigo do regulamento das bolsas, que tanto tem beneficiado os commissarios regios, absolutamente necessarios para se chegar á realização do convenio, ha do vir ainda em auxilio do Governo para pagar estas despesas, que deviam estar previstas e para as quaes não ha verba orçamental.

Ponho aqui ponto nas considerações que dizem respeito ás despesas não incluídas no orçamento.

Pelo que respeita á distribuição das despesas, quer-me parecer que S. Exa. foi infeliz.

Assim, por exemplo, o pessoal da secretaria foi augmentado com seis empregados, e até agora não conheço facto nenhum que demonstrasse a necessidade d'este augmento; até o que me consta é que realmente a secretaria, depois da addição d'estes seis empregados, ficou peor, porque, como disse a V. Exa. pedi uns documentos na dois meses e depois da beneficiação da secretaria com estes seis empregados a mais, só consegui haver um documento de quatro paginas, depois de dois meses de paciento espera.

Depois as legações. E evidente que o orçamento do Ministerio dos Negocios Estrangeiros não é de legações que

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precisa; as legações criadas pelo Sr. Ministro são desnecessarias, escusadas, podem servir para collocar pessoal, mas para mais nada, porque, se me é permittido emittir com franqueza a minha opinião, direi que julgo que as relações diplomaticas do nosso país só teem importancia real pelo que respeita a certos paises; por isso eu preferiria que em materia de legações fosse reduzido consideravelmente o seu numero. (Apoiados).

Nós temos actualmente 14, somos um país abastado, rico de legações, e, ao contrario do que hoje succede, eu prefiriria que as verbas de dotação dessas legações fossem augmentadas e o seu numero diminuído. Menos legações e melhor retribuídas; pois é mesquinho que um representante do pais numa curte estrangeira tenha vencimentos, que não chegam muitas vezes para as despesas indispensaveis de uma modesta representação.

Achava preferível que p Sr. Ministro dos Negocios Estrangeires tivesse aproveitado a occasião da reforma dos serviços do seu Ministerio para reduzir o numero de legações e augmentar-lhes a dotação.

Com respeito aos consulados, algumas considerações da mesma natureza eu poderia fazer. Precisa revista a lista dos nossos consulados. Se se observar quaes são os consules que durante mais largo espaço de tempo estão ausentes dos seus consulados, ter-se-ha obtido uma indicação da pouca necessidade d'esses consulados. Se considerarmos a importancia do movimento commercial do nosso país com a sede de certos consulados ou a importancia da colónia portuguesa nessa região, reconheceremos que certos consulados são hoje susceptíveis de estarem a cargo apenas de cônsules de 3.ª classe ou vice-consules, pois é insignificante o valor dos serviços, que desempenham.

Podiam-se criar outros consulados em pontos onde o commercio português nos últimos annos tem augmentado. Realmente já existem consulados alem do quadro, cujos consules recebem remuneração especial, o que prova a necessidade d'esses consulados.

De forma que em ultima analyse no meu entender devem supprimir-se alguns consulados e crear outros. (Apoiados).

Sr. Presidente: a hora vae adeantada e eu não quero cansar a attenção da Camara.

Parece-me que nestas ligeiras o desataviadas considerações demonstrei que o orçamento do Ministerio dos Negocios Estrangeiros era defeituoso, porquanto nas despesas ordinarias havia verbas mal calculadas, insuficientes, e tinham-se augmentado sem necessidade, 6 funccionarios nas secretarias alem do augmento nas legações. Por ora, em virtude das hesitações do Sr. Ministro, as novas legações não são providas mas sê-lo-hão mais tarde como for conveniente !

Quanto ás despesas extraordinárias a incorrecção orçamental, é na verdade excessiva e mostra bem claramente que o nosso orçamento é um documento do qual se pode dizer o que Talleyrand dizia da palavra humana.

Por isso parece-me que nem pelo que respeito ás despesas ordinarias nem ás extraordinarias, o orçamento do Ministerio dos Estrangeiros merece confiança. E não é preciso ser grande propheta para assegurar, que este orçamento ha de ser completado com um numero rasoavel de creditou especiaes, que hão de contribuir para augmentar ainda mais o deficit que felizmente para nós ha de ser o ultimo, porque o Governo realizou o convenio e vae em breve apresenta-lo á consideração e voto da Camara, e convenio e deficit são ideas antagonicas.

Ninguem faz concordatas com os credores ao passo que continua fazendo bancarrotas annuaes!

Este será pois o ultimo deficit nos orçamentos do nosso país, e por isso não será nem dos menores nem dos menos assignalados. (Apoiados).

De resto o pais parece que pouco ou nada se interessa coza o orçamento, temos no sangue as taras de velhos fidalgos arruinados. Não vale a pena examinar a nota das despesas: a despreoccupação fidalga manda que se rasgue, atirando um punhado de ouro á cara dos exactores fiscaes. Por isso se diz que o trabalho das Camaras em materia orçamental é improfícuo e que se gasta aqui um tempo precioso em simples escaramuças de palavras, sem que isso beneficie o país. A verdade é que se não se tira resultado é por que se não quer (Apoiados), porque da discussão ficam precisamente indicados os pontos que necessitam reforma, as despesas inúteis, as verbas enganosas. (Apoiados).

Se houvesse alguém, e bem precisava de energia e de coragem - que quisesse cumprir um programma de nova administração economica e severa, introduzindo na nossa administração publica boas regras, de que tanto necessitamos, esse alguem podia esclarecer-se muito com as discussões, que tem merecido sempre o Orçamento do Estado durante annos seguidos.

O peor porém, Sr. Presidente, é que na conjuntura presente quem menos quis ser esclarecido foi justamente o Governo, que tem despendido á doida e compromettido gravemente a situação financeira do país, d'esse pobre país, Sr. Presidente, cuja situação no momento presente me traz á imaginação o quadro bem conhecido intitulado "O Pesadello", devido ao génio de um notavel artista flamengo.

Figura esse quadro um homem adormecido numa gruta, tendo no rosto e na contracção do corpo impressos o terror 'e a oppressão; próximo e ao de redor d'elle, aos lados e em varios pontos, rastejam monstros estranhos, reptis de formas bizarras e repugnantes; no ar esvoaçam morcegos e vampiros, e ao fundo da gruta faíscam os olhos de um monstro horrível, dragão phantastico, que rastejante e de garras abertas se avizinha do adormecido.

O orçamento português poderia fornecer a um pintor, se questões financeiras pudessem inspirar um artista, o symbolo do um quadro semelhante.

No primeiro plano, o povo português adormecido, em volta todos esses reptis, que na sombra devoram os dinheiros publicos, esses vampiros de formas e nomes bizarros, commissarios, inspectores, fiscaes, que sugam o sangue do pobre contribuinte. Ao fundo de olhos esbrazeados, garras aduncas, e avidas fauces escancaradas avança o monstro insaciavel, o déficit, que se prepara para devorar o adormecido!

Este quadro, Sr. Presidente, este quadro singular, poderia figurar como pagina illustrativa do relatorio do Sr. Ministro da Fazenda, e não se intitularia o pesadello, porque infelizmente elle é uma triste e perigosa realidade!

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O Sr. D. Luiz de Castro: - Sr. Presidente: o illustre Deputado, o Sr. Conde de Penha Garcia terminando ha dias um discurso nesta casa do Parlamento, recitou,- primorosamente,- versos do delicioso poeta das Doloras e das Humoradas. Pois a Campoamor seguiria Zorrilla, e, com elle, diria eu ao illustre Deputado:

"Hombre de hierro que velas..."

como D. João á estatua do Commendador, se o Sr. Penha Garcia fosse um politico - homem de ferro - que criticasse com argumentos bronzeos

Mas S. Exa. é um político faccioso, não é de ferro; os seus argumentos não são bronzeos, são de cera.

O illustre Deputado, o Sr. Penha Garcia, criticou porque é da opposição, mas a sua critica, exercendo-se sobre o orçamento do Ministerio dos Negocios Estrangeiros, encontrou tão fraca presa que, a mim, que não sou orador nem argumentador parlamentar, me parece que, seguindo o veio das suas considerações, irei desfazendo um a um os pontos de accusação deduzidos por S. Exa.

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Ora, começou o illustre Deputado por dizer que o nosso pais faz enormes gastos com o Ministerio dos Estrangeiros, e comparou com o nosso os orçamentos dos Ministerios dos Estrangeiros da Hollanda, da Suecia e Noruega. Esta comparação não foi talvez das mais felizes, porque as circumstancias que se dão na Scandinavia, país sem colonias, sito differentes das de Portugal, e porque o orçamento do ministerio dos negocios externos da Hollanda em muito pouco é inferior ao português.

S. Exa. esqueceu-se, porem, de um outro pais, que talvez com este tenha mais motivo de comparação, e que é a Belgica.

Se S. Exa. consultasse os documentos officiaes d'essa pequena nação, colonial em muito menor escala do que Portugal, que tem uma população pequena e uma area inferior á da nossa, veria que o seu orçamento do Ministerio dos Estrangeiros excede 500:000$000 réis, sondo assim bastante superior a este que S. Exa. critica no sou pais.

Depois S. Exa., seguindo a sua orientação, disse: "que o nosso orçamento estava muito sobrecarregado, e que o Sr. Ministro devia ter feito economias".

Ora, realizar economias num orçamento de pouco mais de 400:000$000 réis, depois de se lhe terem feito cortes collossaes por duas vezes, ha muito poucos annos, um na importancia de 77:000$000 réis, e outro na importancia de 50:000$000 réis, seria um verdadeiro desastre para o país, que se tornaria o escarneo das nações, porque as suas relações com o estrangeiro nem mesmo poderiam ser decentes.

Se neste ponto houvesse motivo para accusações, seria a primeira exactamente essa de S. Exa. o Sr. Ministro dos Estrangeiros, não ter augmentado o orçamento do seu Ministerio. (Apoiados).

Ainda ha pouco na Camara de um pequeno Estado, a Dinamarca, um Deputado da opposição increpava o Ministro doa Estrangeiros nos mesmos termos em que o Sr. Conde de Penha Garcia se dirige ao Sr. Conselheiro Mattozo Santos.

O Ministro dinamarquês respondia que não só eram exíguas as verbas, como a Dinamarca tinha a necessidade de augmentar os seus empregados diplomaticos, e apresentara como uma grande necessidade a criação de uma legação no Japão.

Perguntará S. Exa. com a mesma admiração com que se referiu á embaixada portuguesa da China: "Como é que o Governo d'aquelle pequeno país julga necessaria a criação de uma legação no Japão .

Procure S. Exa. nos annaes parlamentares d'aquella nação e encontrará confirmado ente facto, que de resto tem uma explicação facil, attentando-se na importancia política que áquelle Estado oriental adveio do tratado que firmou com a Gran-Bretanha.

O Sr. Conde de Penha Garcia - e tudo se explica pela paixão partidaria - pegando no orçamento do Ministerio dos Estrangeiros, apontou á Camara um augmento extraordinario de 22:000$000 réis nas despesas de Secretaria: simplesmente o Sr. Conde esqueceu-se, que a par d'esses 22:000$000 réis havia uma diminuição de perto de réis 22:000$000 tambem, de modo que comparando estas duas verbas, reduz-se apenas o deficit a 315$000 réis! Mas esta parte escondeu-a cuidadosamente o Deputado que me precedeu no uso da palavra.

E esse pequeníssimo augmento de despesa de que provém?

Da despesa obrigatoria de 962$500 réis, com que Portugal tem de concorrer para a repartição internacional do Tribunal Internacional de Arbitragem, criado em seguida á conferencia da Haya.

Se não fosse tal imposição, o orçamento do Ministerio dos Negocios Estrangeiros fechava-se este anno, não com augmento, mas com uma diminuição de perto de 1:000$000 réis.

Seguiu S. Exa. depois analysando algumas das despesas especiaes do Ministerio dos Negocios Estrangeiros, em virtude da ultima reforma feita naquella secretaria de Estado pelo Sr. Conselheiro Mattozo Santos.

S. Exa. demorou mais especialmente a sua critica sobro a criação de addidos commerciaes!

Aonde é que o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros vae buscar verba para pagar a estes addidos ? pergunta o Sr. Deputado.

S. Exa., que tão bem estudou este assumpto, esqueceu-se, para completar o seu trabalho, de consultar a lei organica, aonde S. Exa. veria o artigo 65.°, que diz o seguinte:

"Aos consules, addidos commerciaes, poderá ser abonada, a mais até á quantia de 1:000$000 réis, para despesa de residencia, quando esta não seja na sede do consulado".

Ora quaes são os addidos commerciaes nomeados até agora?

O nosso consul em Londres fica addido commercial á Legação de Londres. Não traz por isso augmento de despesa. (Apoiados).

A nomeação do Sr. Jayme de Séguier, para addido commercial junto á Legação de Paris, é que pode trazer esse augmento, mas tem verba perfeitamente indicada no artigo 12.° do capitulo 4.° do orçamento da despesa ordinária, sem recorrermos ao capitulo unico das despesas extraordinarias. E pode ainda acontecer outra hypothese: o Sr. Jayme de Séguier ficar com residencia na sede de um consulado, e nesse caso nem 1:000$000 réis se gasta.

Mas, sobre addidos commerciaes, é necessario que se diga mais alguma cousa:

Era necessaria a sua criação.

Exercer a critica apenas sobre certas disposições legaes só pelo facto de se augmentar a despesa, sem cuidar dê investigar os benefícios que d'esse accrescimo provém, é encarar as cousas sob um aspecto mesquinho.

E as vantagens que dos addidos commerciaes podem provir são, quanto a mim, incontestáveis. E se não houvesse outras considerações a adduzir a favor da organização dos serviços d'estes funccionarios, bastariam os nomes dos dois nomeados para garantir a seriedade, a sciencia, o zelo, a intelligencia com que vae ser tentada a experiencia. O Sr. Jayme de Séguier é áquelle distinctissimo funccionario consular, que em numerosas commissões officiaes tem prestado ao país relevantes serviços, que os Governos não podem, nem devem esquecer como os interessados não esquecem.

Ainda ha poucos meses, num congresso vinícola reunido em Lisboa, nós assistimos a uma vibrante ovação feita ao nosso Consul em Bordeus por mais de 2:000 congressistas vindos de todos os pontos do pais. É que ao espirito de todos estava presente a então recente victoria alcançada por áquelle nossso delegado na conferencia de Bruxellas, para a garantia da propriedade industrial e das marcas de procedencia, é que todos se lembravam da obra persistente e intelligente levantada em Bordeus a favor dos nossos vinhos e da missão de propaganda vinícola que o levou á America do Sul.

O Sr. Jayme Batalha Reis, nosso consul geral em Londres, é o trabalhador incansável, a intelligencia lucidissima, a erudição vasta, que nós vemos a cada momento honrando o nome do seu país com uma obra de propaganda insistente, pela palavra e pela escrita, a favor de Portugal em todos os meios, em todas as espheras da actividade intellectual e do esforço commercial.

Estes elementos dão a qualquer emprehendimento, em que entrem, umas garantias de seriedade, actividade e de talento, afastam de tal modo qualquer idéa de favoritismo, que só por si a escolha d'estes funccionarios para os cargos de addidos commerciaes justificam por completo a criação d'estes logares, se o exemplo de países estrangeiros, bem menos necessitados de propaganda official commercial do que nós, nos não estivessem indicando esse caminho.

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18 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Assim, a Allemanha - e propositadamente escolho este pais para exemplo - de iniciativa individual tão forte, cujos agentes de propaganda de commercio particular inundam do mercados mundiaes, a Allemanha distribua no estrangeiro numerosos addidos commerciaes, remunerados pelo Ministerio dos Negocios Estrangeiros, e se um, pais, tão pratico nos seus processos mercantis, assim procede, é porque os resultados colhidos são auspiciosos. De resto a necessidade da propaganda official entre nós era evidente.

Os agentes commerciaes, pagos pelas associações e permittidos pela lei organica do Ministerio dos Negocios Estrangeiros elaborada pelo Sr. Conselheiro Barros Gomes, deram as suas provas, não dando nenhumas, pois que nenhum foi indicado nem nomeado.

A par d'isto a iniciativa particular por si só tambem nada produzia. (Apoiados). A orientação das medidas economicas tomadas pelo Governo, especialmente pela pasta das Obras Publicas, onde o Sr. Conselheiro Vargas, com vistes largas e altas, sobretudo no respeitante ao commercio de vinhos, pedia positivamente este complemento pela pasta dos Estrangeiros.

Infelizmente o tempo curtíssimo de que disponho não me permitte demonstrar em detalhe esta ultima asserção que avancei o evidenciar a obra moderna, seria e scientifica emprehendida em materia de commercio internacional, especialmente pela pasta das Obras Publicas, e completada agora pela criação dos addídos commerciaes tão desdenhada pelo orador que me precedeu no uso da palavra.

Mas o Sr. Conde de Penha Garcia, continuando no seu discurso, criticou, em tom faceto, que tão mal lhe fica, a criação da legação em Tanger.

Transformou-se um consulado em legação como não podia deixar do ser, dada a organização do corpo diplomatico e consular ali residente, e em face dos nossos interesses actuaes naquelle pais onde contamos um grande numero de compatriotas, sobretudo algarvios, que vão á costa marroquina exercer a industria da pesca o onde não raramente só originam conflictos do certa gravidade que um consulado difficilmente resolve, mormente junto de um corpo diplomatico.

Um consul nestas condições nem tem força nem prestigio.

E depois não é só isso. O Imperio de Marrocos é na Africa o que a China é na Asia: a presa de todas as ambições territoriaes o políticas. A Inglaterra e a França, uma no litoral, outra no interior, era combates diplomaticos o guerreiros pretendem alcançar posição primordial para a partilha, do imperio. Logo a seguir a Allemanha, a Hespanha, a Italia, até a Austria e a Russia, empenham esforços para fortalecer a sua influencia no Maghzen.

Evidentemente está para breve a abertura de Marrocos á exploração livre, e nesse momento ó possível, é provável mesmo, que Portugal encontre naquelle pais -debaixo de varios pontos de vista - vantagens a explorar.

Ora, é preparando as cousas com tempo, é actuando lentamente que se conseguirá, a par com as outras nações, algumas das utilidades que cilas procuraram para si e que certamente não compartilhariam comnosco se nos não fizessemos lembrados.

A esperança d'este futuro vale certamente a transformação de um consulado em legação, com um pequeno augmento de despesa que no orçamento total é sobejamente equilibrado.

Referiu-se tambem S. Exa. á missão á China, mas, neste ponto, seja-me permittido manifestar a minha admiração, ao ver o Sr. Conde de Penha Garcia, que se occupa de questões internacionaes, que numa das legislaturas passadas tratou nesta mesma casa dos interesses portugueses no Extremo Oriente, seja-me permittido, evidenciar o meu profundo espanto pelo ar desdenhoso do S. Exa. ao tratar da missão diplomatica portuguesa á China neste momento historico.

Se algum defeito ha no mandado de um embaixador á China, está elle em não ter sido enviado ha mais tempo.

O illustre Deputado, pela sua seriedade e pelo seu saber, tinha obrigação de se não deixar arrastar pelas opiniões faltas de base do publico que desconhece factos e considerações que a um claro espirito, como o de S. Exa., são ou devem ser familiares.

Quereria o illustre Deputado que nos succedesse a mesma vergonha que em 1862, quando fomos á China solicitar um tratado, dois annos depois do momento propicio que teria sido ao findar a campanha de 1860, quando as outras potencias os obtiveram? A vergonha de em 1864 ser recusada a ratificação do tratado que solicitaramos em 1862 e que estava ratificado já por nós?

Da China só se consegue alguma cousa quando está dominada pelo medo; deixando passar a sezão, todas as negociações caem em monotonia.

Quereria o illustre Deputado que passasse esto ensejo unico de regularizarmos o tratado de 1887 que deixou pendentes as questões de delimitação das nossas possessões na China, á espera que o Celeste Imperio se dignasse designar um plenipotenciario que com outro nosso deveria fixar esses limites? Designação que não chegaria nunca? Quereria para o seu pais essa posição deprimente e essa prova de desleixo?

Desde 1897, pelo menos, que Portugal tinha o dever de acreditar um embaixador em Pekim. Muito menores interesses lá tem a Hespanha e a Belgica e comtudo mantinham e manteem representações extraordinarias.

Foi de 1897 a 1899 que Portugal deveria ter mandado um representante seu ao Celeste Imperio, para que fizeste ouvir a sua voz no coro de reivindicações - das quaes a nossa seria, porventura a mais justa - de todas as potências mundiaes.

Em seguida á derrota que áquelle pais collosso inflingiu o Japão e quando a Allemanha occupava Kiacetchao, a Russia Porto-Arthur e Taliennan, a Inglaterra o Hei hainei e Kau lun e a França Kuau-chcu-van; quando a campanha diplomatica estava no seu auge em Pukía, para se alcançar do Governo Chinês as concessões appetecidas, era então que Portugal deveria ter começado a exigir para si, pelo menos, o cumprimento de alguns dos seus antigos desejos justificadissimos, como, por exemplo, a occupação das Ilhas de D. João, da Lapa, da Montanha, imposição da nossa esphera de aceito na Ilha de Hian-clian, estabelecimento do campo neutro ato ás montanhas de Pac-siac, etc.

Noto V. Exa. e note a Camara que eu falo em meu nome só; não tenho procuração do Governo para expor os fins da missão que enviou á China, nem mesmo os sei; e, quando os soubesse, comprehende-se que as regras mais elementares da boa política nacional me impediriam de os espalhar.

Mas, nem em 1897, nem em 1899, quisemos cuidar dos interesses de Portugal no Extremo Oriente; deixamos escapar uma occasião rara de zelarmos o nosso património, de arredarmos o vexatorio cordão aduaneiro com que a China cerca Macau, de alargarmos, como tínhamos direito, os limites da nossa colonia, e a imprensa de vários paises interessados na partilha da China era a primeira a reconhecê-lo.

Essa culpa não cabe ao Ministerio que está nos bancos do poder. Aproveitando a circunstancia favoravel da intervenção internacional nos negocios da China em seguida á revolta dos boxers, sabendo comprehender o momento propicio da assignatura do tratado que de ora avante liga o Japão á nossa fiel alliada, o Governo Português fez o que devia, enviando um embaixador a Pekim tratar dos nossos interesses no Extremo Oriente.

Poderá dizer-se que tinha lá o governador de Macau, que deveria executar essa missão.

Podia mas não devia; o pais, aproveitando um funccionario que estava na China, mostrava pouco interesse pela missão; alem d'isso, o Governador da possessão portu-

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19 SESSÃO NOCTURNA N.º 42 DE 20 DE MARÇO DE 1902

guesa, que o Celeste Império não vê com bons olhos, exacerbaria, porventura, os animos dos diplomatas chineses, e sobretudo no meio diplomatico internacional em que teria de entrar, meio tão susceptível e praxista, um governador ultramarino transformado em embaixador não teria a precisa consideração, por maiores que fossem os seus talentos, para se fazer attendido e apoiado.

Quanto gasta esta embaixada ? Porque verba ha de ser custeada ?

O que elle, orador, pode dizer á Camara, é o que a verdade manda e consta de uma nota que está em poder do Sr. Penha Garcia.

Essa despesa será satisfeita pelo capitulo unico do orçamento da despesa extraordinaria.

E a verba d'esse capitulo único é de 20 contos inferior, á do orçamento de 1897-1898, quando geria a pasta dos estrangeiros o Sr. Conselheiro Mathias de Carvalho, de 14 contos, inferior á do orçamento do 1898-1899, e do 6:0000000 réis á do orçamento de 1899-1900, quando estava no Ministerio dos Negocios Estrangeiros o Sr. Conselheiro Beirão.

E agora, terminando, seja-me licito perguntar: qual a auctoridade, que em consciencia, pode ter um deputado d'aquelle lado da Camara para vir fazer as accusações armadas no ar, que todos acabam de ouvir ao Sr. Conde de Penha Garcia?

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado).

(S. Exa. não reviu o discurso).

O Sr. Conde de Penha Garcia: - Pedi a palavra para cordialmente cumprimentar o meu amigo o. Sr. D. Luiz de Castro, pelo seu discurso sobre o orçamento do Ministerio dos Negocios Estrangeiros, e pela maneira tão cheia de brilho e engenho como pretendeu justificar este orçamento injustificavel.

S. Exa. o demonstrou, e senão veja S. Exa.:

Pelo que respeita aos addidos commerciaes, demonstrado fica naturalmente que, pelo menos, com um d'elles ha de haver o augmento de despesa.

Esta proposta, deixe-me S. Exa. dizer, não é de muito exito, porque no commercio usa-se já hoje, como meio de propaganda habitual, enviar caixeiros viajantes a varios paises estrangeiros.

Mas o motivo que me levou a pedir a palavra, foi o desejar eu cumprimentar S. Exa., e para responder a algumas palavras proferidas por S. Exa. a respeito da famosa embaixada á China e á minha posição na ultima sessão parlamentar.

É por isso mesmo, porque durante dois annos estive em Macau, que me referi á embaixada á China. Nesta ponto S. Exa. fez revelações verdadeiramente extraordinárias. Não suppunha que os intuitos do Governo fossem tão aguerridos! Mas, como vamos conquistar uma parte da China, como o Sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros por meios diplomaticos vae conquistar uma parte do Celeste Imperio, eu estimo que seja muito feliz nessa brilhante empresa.

Não foi em tom faceto que me referi á embaixada á China; foi contristado por o Governo ter tido a idéa de ahi mandar uma embaixada em occasião absolutamente inopportuna.

E por hoje tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

(O orador não reviu).

O Sr. Costa Ornellas: - Mando para a mesa os pareceres das commissões de obras publicas e de guerra sobro o projecto de lei n.° 9-B, que tem por fim auctorizar que ao desenhador de 2.ª classe do quadro auxiliar de obras publicas, adido ao quadro da Direcção Geral do Serviço de Engenharia, Antonio Baptista Ribeiro, seja contado, para o effeito da sua aposentação, o tempo que serviu no exercito, e como apontador de obras publicas.

Foram a imprimir.

O Sr. Presidente:- Está esgotada a inscripção. Vae ler-se, para se votar, a moção do Sr. Conde de Penha Garcia.

É lida e rejeitada.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se, para se votar, o mappa n.° 2, na parte relativa á despesa do Ministerio dos Negocios Estrangeiros.

É lido e approvado.

O Sr. Presidente: - A proxima sessão realizar-se ha no sabbado, 22, á hora regimental. A ordem do dia é a mesma que vinha para hoje.

Peço aos Srs. Deputados que compareçam a horas de se poder abrir a sessão o mais cedo possível.

Está encerrada a sessão.

Era meia noite.

O redactor interino = Affonso Lopes Vieira.

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