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SESSÃO DE 10 DE MARÇO DE 1877

Presidencia do ex.mo sr. Joaquim Gonçalves Mamede

Secretarios - os srs. Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos/Barão de Ferreira dos Santos

SUMMARIO

Apresentam-se requerimentos, representações e participações. — Antes da ordem do dia o sr. Van-Zeller pede explicações ao governo ácerca da reforma eleitoral, e responde o sr. presidente do conselho. — Na ordem do dia e approvado o parecer da commissão de fazenda, que auctorisa o governo a levantar a somma de 6.500:000 libras nominaes, em titulos de tres por cento de divida externa, com applicação ao pagamento da divida fluctuante.

Presentes á chamada 51 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs.: Agostinho da Rocha, Alberto Garrido, Osorio de Vasconcellos, Braamcamp, Cardoso Avelino, Antunes Guerreiro, Avila, A. J. Boavida, A. «J. Teixeira, Cunha Belem, Pereira Carrilho, Neves Carneiro, Zeferino Rodrigues, Barão de Ferreira dos Santos, Carlos Testa, Vieira da Mota, Forjaz de Sampaio, Eduardo Tavares, Vieira das Neves, Cardoso de Albuquerque, Pinheiro Osorio, Mouta e Vasconcellos, Van-Zeller, Paula Medeiros, Palma, J. M. de Magalhães, Vasco Leão, Gonçalves Mamede, J. J. Alves, Matos Correia, Correia de Oliveira, Pereira da Costa, Guilherme Pacheco, Figueiredo de Faria, Namorado, Moraes Rego, Julio de Vilhena, Luiz de Lencastre, Camara Leme, Bivar, Faria e Mello, Alves Passos, Mello Simas, Marçal Pacheco, Mariano de Carvalho, Miguel Coutinho (D.), Pedro Jacome, Placido de Abreu, Julio Ferraz, Ricardo de Mello, Visconde de Guedes Teixeira.

Entraram durante a sessão — Os srs.: Adriano de Sampaio, Pereira de Miranda, Teixeira de Vasconcellos, Arrobas, Rodrigues Sampaio, Telles de Vasconcellos, Ferreira de Mesquita, Augusto Godinho, Mello Gouveia, Conde de Bertiandos, Pinto Bessa, Guilherme de Abreu, Illidio do Valle, Jacinto Perdigão, Ferreira Braga, Dias Ferreira, José Luciano, Ferreira Freire, Nogueira, Lourenço de Carvalho, Manuel d'Assumpção, Pinheiro Chagas, Cunha Monteiro, Pedro Franco, Pedro Roberto, Thomás Ribeiro, Visconde da Arriaga, Visconde de Moreira de Rey, Visconde de Sieuve de Menezes, Visconde de Villa Nova da Rainha.

Não compareceram á sessão — Os srs.: Rocha Peixoto (Alfredo), A. J. de Seixas, Falcão da Fonseca, Sousa Lobo, Conde da Foz, Conde da Graciosa, Custodio José Vieira, Filippe de Carvalho, Francisco Mendes, Francisco Costa, Jayme Moniz, Jeronymo Pimentel, Ribeiro dos Santos, Klerck, Pereira Rodrigues, J. M. dos Santos, Sampaio e Mello, Luiz de Campos, Freitas Branco, Pires de Lima, Rocha Peixoto (Manuel), Visconde da Azarujinha, Visconde de Carregoso.

Abertura—ás duas horas e um quarto da tarde.

Acta—approvada.

EXPEDIENTE

Representações

1.ª Dos escripturarios dos escrivães de fazenda dos bairros de Lisboa e dos concelhos de Belem e Olivaes, pedindo augmento de vencimentos. (Apresentada pelo sr. deputado Mariano de Carvalho.)

Enviada á commissão de fazenda.

2.ª Da camara municipal de Moncorvo, pedindo para distrahir do cofre da viação a quantia necessaria para a reconstrucção das cadeias e casa do tribunal, edificação de uma casa para escola de ambos os sexos e um cemiterio. (Apresentada pelo sr. deputado Thomás Ribeiro.)

Enviada á commissão de administração publica.

Participações

1.ª Participo a V. ex.ª que o sr. deputado visconde Azarujinha não póde comparecer á sessão de hoje, e talvez a mais algumas, por motivo justificado. == O deputado por Pombal, Antonio José Teixeira.

2.1 Declaro que por motivo justificado faltei a algumas sessões da camara.: — O deputado pelo Carregal, Fortunato Vieira das Neves.

Mandaram-se lançar na acta.

SEGUNDAS LEITURAS

Projecto de lei

Artigo 1.° O quadro do pessoal sanitario do exercito portuguez, composto dos medicos militares, dos pharmaceuticos militares e do corpo destinado ao serviço das enfermarias, secretarias, arrecadações, pharmacias e mais dependencias dos hospitaes militares e dos depositos do medicamentos, roupas, arsenal cirúrgico e material de ambulancias do exercito, é fixado conforme a tabella annexa.

Art. 2.° O medico inspector geral em chefe superintende a todo o serviço de saude do exercito, e responde por elle para com o ministro da guerra, por intermedio da respectiva repartição da direcção geral.

§ unico. Continua a ser-lhe tambem confiada interinamente a superintendencia de serviço de veterinaria.

Art. 3.° Os medicos inspectores geraes são os chefes do serviço de saude juntos aos quarteis generaes das divisões militares, nos quaes inspeccionam todo o serviço dos hospitaes e dos quarteis, fiscalisando a escripturação e contabilidade d'aquelles, e fazendo parte das juntas de saude, tanto das que se reunem nos quarteis generaes, como das reunidas nos hospitaes; sendo directamente subordinados aos respectivos commandantes das divisões e ao inspector geral em chefe.

Art. 4.° Os medicos inspectores adjuntos auxiliam os inspectores geraes em todo o serviço que lhes está commettido, substituem-nos nos seus impedimentos e formam parte das juntas com elles, podendo tambem ser nomeados para o serviço de inspecção de recrutas nos governos civis dos districtos. Tres medicos inspectores adjuntos são destinados aos cargos de directores dos hospitaes militares permanentes.

§ unico. São considerados hospitaes permanentes os de Lisboa, do Porto e de Elvas.

Art. 5.° Os medicos mores principaes e medicos mores de 1.ª classe fazem serviço na repartição respectiva da direcção geral do ministerio da guerra, nos corpos e hospitaes regimentaes, onde terão o encargo da directoria, nos hospitaes permanentes onde auxiliarão os respectivos directores ou exercerão a clinica das enfermarias, nas praças de guerra de S. Julião, de Peniche e do forte de Nossa Senhora da Graça, nos estabelecimentos militares do campo de instrucção e manobras, da escola pratica do Vendas Novas e do real collegio militar, da escola do exercito, no deposito do material de ambulância, no asylo de invalidos de Runa, nos estabelecimentos fabris da direcção geral de artilheria e nas guardas municipaes de Lisboa e Porto, cumprindo-lhes ainda o serviço das juntas de inspecção de recrutas nos governos civis dos districtos ou quaesquer outras commissões que lhes forem superiormente ordenadas.

Art. 6.° Os medicos mores de 2.ª classe fazem serviço nos corpos ou nos estabelecimentos onde auxiliam os medicos mores principaes ou os medicos mores de 3.ª classe, bem como no serviço de inspecção de recrutas, cumprin-

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do-lhes exclusivamente o encargo do serviço de dia nos hospitaes permanentes.

Art. 7.º Todos os medicos militares de qualquer graduação, excepto os que servirem na repartição do ministerio da guerra, exercerão a clinica nos hospitaes militares das localidades onde residirem.

Art. 8.° Os pharmaceuticos militares, sem distincção de patente, fazem serviço no deposito geral de medicamentos do exercito, onde haverá dois sendo á Vates director o mais graduado nas pharmacias dos hospitaes permanentes e nas das regimentaes que for conveniente organisar.

Art. 9.º Os officiaes do corpo de tropa 1.ª companhia de administração militar destinada ao serviço menor dos hospitaes, depositos e material de ambulancias só tem a seu cargo a parte disciplinar do mesmo corpo, e o commando das praças d’elle que não estiverem destacadas em estabelecimento medico militar subordinado á, direcção de official medico de qualquer graduação.

Art. 10.° Estes officiaes terão promoção no quadro do mesmo corpo, e os alferes d’elle serão despachados de entre os seus primeiros sargentos, incluindo os sargentos ajudantes segundo a ordem de antiguidade d'aquelle posto, comtanto que tenham as precisas habilitações o não tenham nota em todo o seu tempo de serviço.

Art. 11.° Os officiaes inferiores d'este corpo farão serviço nos hospitaes militares permanentes ou regimentaes, e nos hospitaes das praças de guerra, como enfermeiros, amanuenses, fieis das arrecadações ou empregados das pharmacias, nas secretarias dos quarteis do corpo, no deposito de ambulância.

§ unico. Em qualquer d'estas situações poderão ascender até ao posto de primeiro sargento, salvo os primeiros amanuenses dos hospitaes permanentes de Lisboa e Porto, que terão a graduação de sargentos ajudantes.

Art. 12.° A promoção será por concurso e para preenchimento das vacaturas que occorrerem dentro de cada uma das categorias das aptidões especiaes, enfermarias, secretarias, pharmacias e mais serviços hospitalares, não podendo as praças de uma categoria concorrer ás vacaturas que occorrerem n’outra.

Art. 13.° Os primeiros sargentos que contarem vinte e cinco annos de bom o effectivo serviço sem nota, poderão ser reformados no posto de alferes, quando forem julgados incapazes do serviço por uma junta milita]- de saude.

Art. 14.º Os cabo.-- e soldados do corpo auxiliarão os officiaes inferiores d’elle em todo o serviço, alem do mais que lhes for determinado pelos regulamentos especiaes.

Art. 15.° O alistamento é voluntario, não podendo as praças alistar-se senão como soldados, e o tempo de serviço obrigatorio o mesmo que na fileira, sendo concedidas readmissões successivas a todas as praças que tiverem bom comportamento, aptidão e zêlo pelos encargos que lhes forem commettidos. Os soldados que forem provadamente inhabeis para o serviço, ou tiverem inveneivel repugnancia para elle, serão passados á fileira, sob proposta do medico inspector em chefe.

Art. 16.º O governo distribuirá convenientemente todo o pessoal medico, pharmaceutico e auxiliar, e fará os necessarios regulamentos para a execução da presente lei. Art. 17.° Fica revogada a legislação em contrario.

Quadro do pessoal medico, pharmaceutico e auxiliar do serviço sanitario do exercito em pé de paz

Pessoal medico

1 Medico inspector geral em chefe, coronel, soldo o do patente, gratificação 30$000 réis, forragem 1.

5 Medicos inspectores geraes, coronel, soldo o da patente, gratificação 25$000 réis, forragens 5.

8 Medicos inspectores adjuntos, tenente coronel, soldo a da patente, gratificação 25$000 réis, forragens 5.

8 Medicos mores principaes, major, soldo o da patente, gratificação 20$000 réis.

52 Medicos mores de 1.ª classe, capitão, soldo o da patente, gratificação 20$00O réis.

52 Medicos mores de 2.ª classe, tenente, soldo o da patente, gratificação 10$000 réis e l5$OOO réis depois do seis annos de serviço.

Pharmaceuticos

1 Pharmaceutico mór, major, soldo o da patente, gratificação 15-;,0()0 réis.

4 Pharmaceuticos de 1.ª classe, capitão, soldo o da patente, gratificação ]0£000 réis.

5 Pharmaceuticos de 2.ª classe, tenente o da patente, gratificação 5;>000 réis.

Officiaes

1 Capitão, soldo o da patente, gratificação 10$OOO réis.

1 Tenente, soldo o da patente.

2 Alferes, soldo o da patente.

Praças de pret

2 Sargentos ajudantes, pret -110 réis, gratificação hospitalar 180 réis, da 1.ª readmissão 20 réis, da 2.ª readmissão 10 réis.

15 Primeiros sargentos, pret, 320 réis, gratificação hospitalar 100 réis, da 1.ª readmissão 20 réis, da 2.ª readmissão 10 réis. 25 Segundos sargentos, pret 270 réis, gratificação hospitalar 120 réis, da 1.ª readmissão 20 réis, da 2.ª readmissão 10 réis.

25 Furriéis, pret 260 réis, gratificação hospitalar 100 réis, da readmissão

20 réis, da 2.ª readmissão 10 réis.

90 Cabos, pret 220 réis, gratificação hospitalar 80 réis, da readmissão 20 réis, da 2.ª readmissão 10 réis.

220 Soldados, pret 16O réis, gratificação hospitalar 6O réis, da readmissão 20 réis, da 2.ª readmissão 10 réis.

Em pé de guerra augmenta o quadro em 2 medicos mores principaes, 8 medicos mores de 1.ª classe, e 20 medicos mores de 2.ª classe; 10 furriéis, 20 cabos e 180 soldados, sendo seis ordenanças a cavallo. Todos os medicos em serviço de. campanha têem forragens.

Sala das sessões, 8 de março de 1877. — A. M. da Cunha Belem.

Enviado á commissão de. guerra, ouvidas as de fazenda, e de saude publica.

Projecto de lei Senhores. — Tendo a experiencia de sete annos demonstrado que são incompativeis com as exigencias do serviço das camaras legislativas algumas das disposições do decreto com força de lei, datado de 15 de abril de 1869; e considerando, que toda a reforma, para ser proficua em todas as suas relações, cumpre que seja elaborada, por quem tenha conhecimento dos factos, que lhe devem servil de base;

Considerando que as camaras legislativas, alem da sua competencia constitucional, são os corpos, que se acham mais habilitados a conhecer das necessidades dos serviços immediatamente confiados & sua direcção e superintendencia; tenho a honra de submetter ao vosso esclacido exame o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Ficam auctorisadas as mesas das camaras legislativas a examinar em todos os seus pontos o decreto com força de lei, datado de 15 de abril de 1869, e a propôr ás suas respectivas camaras aquellas alterações de que elle carecer, no interesse do melhor desempenho do serviço publico.

Art. 2.º O accordo tomado por cada uma das camaras, com relação ao seu respectivo serviço, ficará constituindo disposição legal.

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Sessão do 10 do março do 1877

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Art. 3.° Ficam revogadas todas as disposições em contrario.

Sala da camara dos senhores deputados, em 9 de março de 1877.: — O deputado por Pombal, Antonio José Teixeira.

Enviado á commissão de legislação civil.

O sr. A. J. Teixeira: - Mando para a mesa dois pareceres da commissão de fazenda, de que é relator o sr. visconde da Azarujinha.

Declaro tambem a V. ex.ª que o sr. visconde da Azarujinha não póde comparecer á sessão de hoje e talvez a mais algumas por motivo justificado.

O sr. Luiz de Lencastre: — Mando para a mesa, por parte da commissão de legislação civil, uma requisição para que seja aggregado á mesma commissão sr. Antonio Cardoso Avelino.

Por esta occasião peço á illustre commissão de obras publicas, ao seu relator ou a qualquer dos seus membros, que tenha a bondade de me dizer qual o resultado que teve um projecto que apresentei n'esta camara, para o governo ficar auctorisado a dispender annualmente com a arborização dos areaes da costa maritima, desde o sul da foz do Mondego até ao rio Liz, a quantia de 6:000$000 réis, verba que será acrescentada ao orçamento das matas do reino.

Este projecto não é só de interesse do circulo que tenho a honra de representar n'esta casa, embora n'elle estejam estes terrenos, é de interesse geral do paiz; porque nós temos dado pouca importancia á arborisação do paiz, a qual ha de ser de uma grande utilidade. (Apoiados.)

Por circumstancias que não critico, nem avalio n'este momento, mas que deploro, nós estivemos parados muito tempo, e se depois caminhámos, progredimos no que respeita a melhoramentos politicos, ainda temos muito a fazer.

Temos feito muito, mas é preciso que se fuça mais, e a arborisação do paiz, assim como outros pontos pertencentes ao ministerio das obras publicas (c n'isto não quero irrogar censura a ninguem) têem sido descurados, o que tem causado um mal ao paiz. (Apoiados.)

Os srs. ministros que estão hoje á frente do poder (assim como os que estavam ali hontem), são homens bastante illustrados e lidos para saberem o que lá fóra se faz ácerca da arborisação o de outros ramos importantes de interesse publico.

A commissão pois pergunto o que é feito do meu projecto, e ao governo peço que não lhe negue os meios para que elle seja convertido em lei; e se eu vir da parte do governo, como espero, dedicar a sua attenção a este projecto e a outros de interesse publico, eu, que estou disposto a apoiar o governo pela garantia pessoal honradamente offerecida e honradamente acceita n'esta camara no dia da apresentação do gabinete, espero apoial-o pelos sons actos, dos quaes, se porventura e contra as minhas esperanças o os meus desejos, lhe negar o meu apoio, hei de separar sempre as pessoas dos srs. ministros, porque ha duas cousas em politica que nunca farei, o são offender a consideração pessoal de qualquer dos ministros que se sentam n'aquellas cadeiras, ou atacar por qualquer forma o principio da auctoridade, sem a qual não podemos existir.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros

(Marquez d'Avila e de Bolama): — Não posso deixar de tomar a palavra em nome dos meus collegas, e principalmente do sr. ministro das obras publicas, que não está presente, para declarar ao illustre deputado que farei com muito gosto tudo quanto eu possa para concorrer a fim de que o seu projecto seja convertido em lei, porque estou convencido que uma das necessidades d'este paiz, um dos melhoramentos indispensaveis para a sua agricultura é proceder á arborisação do raiz. (Apoiados.)

Por consequencia n'este sentido, e em tudo que forem projectos de interesse publico, cento o illustre deputado com o meu concurso, como é do meu rigoroso dever. Não é favor que lhe faço; é minha obrigação imprescriptivel.

O sr. J. M. de Magalhães: —Por parte da commissão de obras publicas declaro ao illustre deputado, o sr. Lencastre, que o projecto que s. ex.ª aqui apresentou está já relatado, e espero apenas que a commissão se reuna para o apresentar, a fim de ser assignado pelos membros da mesma commissão, se concordarem com o relatorio.

O sr. Carlos Testa: — Pedi a palavra unicamente para consignar a minha opinião ácerca de uma declaração que hontem se fez n'esta camara, e que versa sobre um assumpto que creio de grande importancia, e sobre o qual a cada um é tão licito o ter opinião bem firme e definida, como é devido o consignai a.

Para isso devo referir-me tambem a um incidente que teve logar n'esta casa, ha ainda apenas uma semana, o que foi devido a uma moção sobre a prioridade de se discutir, de entre os assumptos que estavam dados para ordem do dia, o projecto para o caminho de ferro da Beira Alta.

Houve uma discussão acalorada a este respeito, mas ainda assim o enthusiasmo de uma grande parte da camara em favor da discussão d'este assumpto levou varios dos seus membros a insistirem pela sua discussão immediata, não admittindo um adiamento ainda mesmo de poucos dias.

Houve uma votação a este respeito, votação em que a maioria decidiu que não se discutisse desde logo o projecto.

E por esta occasião declaro a V. ex.ª que, tendo eu sempre durante a administração passada apoiado todos os actos do governo transacto, do que não estou arrependido; n’aquella occasião eu votei com a minoria, e nos quinze votos que ella contava, o meu foi incluido, votando que se discutisse immediatamente o projecto do caminho de ferro da Beira Alta; e se assim procedi, foi não só porque é este um assumpto importante, mas porque eu tinha a honra do ser relator d'aquelle projecto, o não queria fugir ao combate.

As circumstancias mudaram, e hoje vemos pelas declarações do governo que fica adiada, sabe Deus para quando, a solução d'este importantissimo melhoramento publico.

As declarações do sr. ministro das obras publicas, que não vejo presente, foram n'esse sentido, dando a entender que punha de parto por emquanto o emprehendimento da construcção do caminho do ferro da Beira Alta; calem d'isso as declarações do sr. presidente do conselho, limitando-se a dizer que os desejos do governo são que se construam todos os caminhos de ferro, mas só quando for possivel, estabelecem um optimismo eventual, que prejudica a idéa principal, e eu entendo que o optimo é inimigo do bom.

Persuado-me que a construcção de todos os caminhos de ferro desde já seria uma impossibilidade, porém entendo tambem que é uma necessidade urgente a construcção prompta do mais util, que é o caminho do ferro da Beira Alta, porque é a parte portugueza do grande caminho de ferro internacional, do caminho de ferro europeu.

A posição geographica do porto de Lisboa e o engrandecimento que lhe deve advir da adopção de uma, politica commercial, fundada em principios inteiramente liberaes, deve dar um grande desenvolvimento ao paiz, deve produzir um grande augmento de riqueza publica, e movimento commercial, e ser um grande meio do receita. E a bandeira das economias, sempre apregoada por todos os partidos e por todos os governos, a bandeira das economias que é, por assim dizer um logar commum, acceite por todos, entendo eu tambem que não deve ter sua significação traduzida só por não gastar; deve ser traduzida por gastar n'aquillo que é util e productivo.

Eu creio que não póde haver obra mais util e productiva para o paiz do que o caminho de ferro da Beira Alta.

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Se estamos á espera de igualarmos a receita com a despeza a fim de entrarmos n'este emprehendimento, estaremos em um circulo vicioso.

Para se chegar ao equilibrio financeiro é preciso não deixar de parte aquelles emprehendimentos, que devem ser origem de grandes proventos e grandes beneficios para o paiz.

Eu considero, como disse, o caminho de ferro da Beira Alta de grande importancia local, mas não o avalio sómente debaixo d'este ponto de vista, considero-o tambem de grande importancia internacional, e n'este sentido, de grande resultado para o paiz.

Devo por ultimo declarar a V. ex.ª que, sendo eu deputado pela Beira Alta, seria isto mais uma rasão para advogar esta causa; mas devo tambem declarar muito terminantemente que, ainda que fosse deputado por outro qualquer circulo, cuja localidade fosse tão afastada da projectada directriz, a ponto de não ter n'ella interesse algum immediato, ainda assim havia de advogar a construcção d'este caminho de ferro da Beira Alta, de preferencia, e até se fosse necessario, com exclusão de qualquer outro.

Voto pela realisação d'este caminho de ferro, debaixo do ponto de vista da sua importancia local e internacional, e quero consignar bem esta opinião, para que não se diga que desejo captar benevolencias locaes. Conheço que os deputados são eleitos pelos circulos, mas são deputados da nação, e o interesse geral d'esta está acima de qualquer interesse local.

Não tenho ambições politicas, nem as poderia ter. Não pretendo captar benevolencias com segundo fim, para qualquer futuro meu na vida politica, porque o não pretendo; por consequencia declaro que não é debaixo do ponto de vista de quaesquer aspirações egoistas que venho pugnar pela construcção do caminho de ferro da Beira Alta.

Ainda que eu fosse deputado por outro qualquer circulo, repito, eu pugnaria por elle do mesmo modo, e isto pelo convencimento em que estou da sua alta importancia para o bem geral do paiz. (Apoiados.)

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

Por parte da commissão de legislação civil, requeiro que lhe seja aggregado o sr. deputado Cardoso Avelino. =-Luiz de Lencastre.

Foi approvada.

O sr. Mello Simas: — Requeiro a V. ex.ª que se digne consultar a camara, se consente que o sr. conselheiro Antonio Cardoso Avelino seja aggregado á commissão de legislação penal.

O sr. Braga: — Por parte da commissão do obras publicas, tenho tambem a pedir a V. ex.ª que consulte a camara, se consente que á mesma commissão seja aggregado o sr. Lourenço do Carvalho.

Leram-se na mesa as seguintes

Propostas

Requeiro que V. ex.ª se digne consultar a camara, para que seja aggregado á commissão de legislação penal o sr. deputado Cardoso Avelino. = Mello Simas.

Por parte da commissão de obras publicas, requeiro que lhe seja aggregado o sr. deputado Lourenço de Carvalho. — O secretario da commissão, João Ferreira Braga.

Foram approvadas.

O sr. Paula Medeiros: — Tenho a honra de me dirigir ao sr. presidente do conselho, para que s. ex.ª se digne declarar-me se o governo tem alguma idéa de apresentar, ainda n'esta sessão, a proposta da nova lei do recrutamento, que o ministerio transacto mandou elaborar por uma commissão extra-parlamentar, e cujos trabalhos se acham quasi concluidos, como, a instancia minha, em sessão de 9 de fevereiro, o affirmou, o então sr. ministro do reino e s. ex.ª por essa occasião assegurou que ainda n'esta sessão legislativa seria apresentado e discutido.

Sr. presidente, a camara e o paiz reconhecem os defeitos da actual legislação n'este ramo de serviço: o anno passado por votação unanime d'esta camara e em virtude de uma moção minha, foi admittida, como urgente a reforma d'aquella legislação: na falla do throno, por occasião da abertura d'este parlamento, Sua Magestade recommendou a necessidade de se fazer uma nova lei para providenciar a tal respeito.

Ora tendo o sr. ministro do reino dito que os trabalhos da commissão estavam muito adiantados, e que esta camara pouco teria a fazer, attenta a proficiencia dos que fizeram o projecto; e tendo já decorrido um mez que isto se passou, parece-me que o sr. presidente do conselho de bom grado se prestará a apresentar n’esta casa adita proposta, no que fará um grande serviço no paiz. Todos conhecem que a actual legislação sobre recrutamento tem muitos defeitos e dá margem a injustiças, vinganças e protecções, que muito se tem abusado, e a que é preciso pôr termo.

O sr. presidente do conselho pela sua longa experiencia em todos os ramos do administração, apenas precisa tomar conhecimento dos trabalhos da commissão a fim de os poder devidamente apreciar, e por isso nutro a esperança que ainda será n'esta sessão convertida em lei tal reforma, mas se assim não for, digo que a sessão legislativa de 1877 é a mais esteril de que ha memoria; e finda que seja sem nada se ter" feito, quando nós deputados regressarmos para os nossos circulos, faremos um bem triste papel, alem do ser um descredito para o systema representativo.

Tambem preciso pedir a s. ex.ª haja de fazer com que passe na camara dos dignos pares o projecto de lei votado aqui o anno passado, em que se concede um bem diminuto subsidio aos soldados do exercito libertador, que desembarcaram nas praias do Mindello.

Sr. presidente, considero isto como uma divida sagrada da nação, alem de ser uma vergonha, e uma negra ingratidão esta falta.

Ha uns poucos de annos que foi apresentado n'esta casa o primitivo projecto; em todas as legislaturas, em que tenho vindo ao parlamento, levantei a minha debil voz a favor d'aquelles desgraçados, que mendigam o pão da caridade e que já estão bem rareados emquanto se tem distribuido subsidios com mão larga, a pessoas que nunca arriscaram a sua vida no serviço da patria.

Sr. presidente, hontem fallou-se n'esta casa, em dar-se uma pensão vitalícia de 1:000$000 réis á sr.ª duqueza de Saldanha, á similhança do que se praticou com a sr.ª duqueza de Terceira, considerou-se isto como uma divida de honra; permitta-me V. ex.ª que eu declaro, que não acho paridade entre as circumstancias em que está aquella sr.ª com a viuva do sr. duque da Terceira: esta emigrou com seu marido, acompanhou-o e partilhou de todas as perseguições e privações que elle soffreu, achou-se ao seu lado durante o bloqueio da Terceira; estava n'aquella ilha quando teve logar a acção da Praia, e em que seu marido combateu pela liberdade, emquanto a viuva do sr. duque de Saldanha ha bem poucos annos casou, em segundas nupcias, com o nobre marchai, quando este exercia os logares mais importantes e lucrativos do estado, no meio do esplendor, do fausto o dos gases do tal posição, e acresce mais que a sr. duqueza de Saldanha percebo de montepio 1.320$000 réis annuaes; e por consequencia não são as suas circumstancias tão precarias, como se imagina.

Eu concluo, sr. presidente, declarando que emquanto não vir convertido em lei o projecto que concede aos soldados desembarcados nas praias do Mindello o pequeno subsidio que esta camara já lhes concedeu, não dou o meu voto a pensão alguma para a sr.ª duqueza de Saldanha. (Apoiados.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: —

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Sessão de 10 de março de 1877.

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Levanto-me para responder ás duas perguntas que me dirigiu o illustre deputado o sr. Paula Medeiros.

Sinto não o poder fazer completamente, porque não tenho idéa alguma dos trabalhos feitos pela commissão extra-parlamentar para a organisação de uma lei do recrutamento; mas posso assegurar á camara e ao illustre deputado que eu reconheço que é indispensavel que se faça uma lei que regule convenientemente este pesado sacrificio que se exige do paiz.

E alguma cousa sei eu pela experiencia propria a este respeito, porque tive a honra, na qualidade de presidente da camara municipal da cidade da Horta em 1831, de fazer o primeiro recrutamento para o exercito liberal que veiu dos Açores desembarcar nas praias de Portugal.

O illustre deputado fallou em Mindello, mas s. ex.ª ha de permittir-me que lhe diga que é isso um erro que se tem introduzido na nossa historia, não sei como.

Eu tive a honra, como administrador geral do Porto, de pagar uma divida que tinhamos em aberto ao Imperador e aos heroes que o acompanhavam, levantando um monumento no proprio sitio onde o desembarque teve logar. Ora, o desembarque do imperador e dos seus 7:500 bravos realisou-se na praia de Arnosa de Pampellido.

Mas isto não tem nada com a lei do recrutamento, que eu reconheço que é necessario ser feita com todo o rigor necessario para que se não aggravem ainda os encargos d'este penoso tributo que se lança ao paiz. E eu poderei tambem ajudar a commissão, alguma cousa, com a experiencia que tenho a este respeito, dos recrutamentos que tive a honra de fazer.

Passou-se, sem transição, d'esta questão para a questão dos veteranos que restam ainda do exercito que acompanhou o Imperador. Não sei que numero haverá de praças n'essas circumstancias.

O illustre deputado comprehende que as minhas sympathias são todas para com elles, nem podiam deixar de ser. O numero de homens d'essa epocha escaceia todos os dias, por conseguinte é justo que os moços, e estou rodeado d'elles, que hoje estão gosando o beneficio dos sacrificios que elles fizeram, os recompensem da maneira possivel. O projecto diz o illustre deputado que está na camara dos pares. Eu pela minha parto farei todo o possivel para que aquella camara possa fazer justiça a estes bravos, como foi feita pela camara dos senhores deputados.

O sr. Julio de Vilhena: — Por parte da commissão de instrucção publica, peço que lhe seja aggregado o sr. deputado Antonio Rodrigues Sampaio.

O sr. Diogo Forjaz: —Mando para a mesa o requerimento de um empregado da bibliotheca da universidade de Coimbra em que pede ser auctorisado o governo a conceder-lhe a reforma em virtude dos seus cançados annos e antigos serviços.

Mando tambem para a mesa uma proposta em nome da commissão de administração publica, pedindo que sejam aggregados á mesma commissão os srs. Antonio Rodrigues Sampaio e Antonio José Teixeira.

Leram-se na mesa as seguintes

Propostas

Requeiro que se consulte a camara sobre se consente que seja aggregado á commissão de administração publica o illustre deputado Antonio Rodrigues Sampaio.: — Julio de Vilhena.

Por parte da commissão de instrucção publica, proponho que sejam aggregados á mesma commissão os srs. deputados Antonio Rodrigues Sampaio e Antonio José Teixeira. = Forjaz Sampaio.

Foram approvados.

O sr. Van-Zeller: — Sr. presidente, quando V. ex.ª abriu a inscripção para os oradores que quizessem tomar parte na discussão antes da ordem do dia, olhei em torno de mim, e não vi nenhum dos meus illustres amigos politicos. Por consequencia julguei-me obrigado a entrar no meu posto de honra, apesar de me parecerem desnecessarias quaesquer explicações tendentes a demonstrar qual é a posição que tenciono occupar n'esta assembléa, em relação ao gabinete que hoje dirige a situação.

Não careço de repetir quaesquer declarações a este respeito, porque ellas já foram sufficientemente fornecidas á camara.

Tendo pedido a palavra antes da ordem do dia, e cabendo-me depois de haverem fallado alguns oradores, encontro nas respostas por parte do governo, o thema para abrir a discussão.

Eu hei de especialmente chamar a attenção do sr. ministro da fazenda para um assumpto que julgo urgente e merecedor da consideração de s. ex.ª Refiro-me a uma lei que já está publicada, e que deve começar a surtir os seus effeitos; é a lei de 30 de janeiro de 1877, que foi approvada por esta camara sem discussão, attenta a Urgência que havia em que ella passasse para a camara dos dignos pares. Felizmente foi lá sujeita a alguma discussão.

Reservando este ponto para depois pedir os devidos esclarecimentos ao sr. ministro da fazenda, desejo primeiro dirigir algumas observações ácerca da resposta que o sr. presidente do conselho deu ao sr. deputado Paula Medeiros sobre assumptos do recrutamento.

Ha no ministerio do reino documentos mais que sufficientes para habilitar o governo a resolver esta questão, sendo-lhe facil apresentar a respectiva proposta de lei.

A commissão nomeada pelo governo passado, e da qual fizeram parte alguns cavalheiros que se assentam n'esta camara, deixou os seus trabalhos promptos, dependendo apenas a apresentação da proposta de lei de uma conferencia com o sr. presidente do conselho. Parece-me portanto que o trabalho do governo não póde ser arduo, muito mais desempenhado com a collaboração do sr. presidente do conselho, que tem n'estes assumptos de recrutamento toda a experiencia que lhe dão os serviços que s. ex.ª tem exercido, fóra d'esta casa, como presidente do supremo tribunal administrativo.

Sr. presidente, não quero mencionar a minha opinião individual a este respeito, porque ella não tem importancia. Entretanto declaro que em materia de recrutamento se posso transigir com o adiamento do preceito de serviço obrigatorio, com o que não transijo de certo, e o que eu não acceito em nenhuma lei futura do recrutamento, é o principio consignado no artigo 8.° n.º 2.º da lei de 27 de julho de 1855. Refiro-me ás isenções por motivo de amparo.

Tenho a opinião de que esse artigo deve ser banido da lei, e se da sua completa revogação podem provir inconvenientes para as pessoas que a lei queria beneficiar, considero outros os meios que o legislador deve estabelecer, de harmonia com preceitos similhantes da legislação civil, porque assim como o codigo civil impõe ás municipalidades o encargo de sustentar os filhos das pessoas miseraveis, assim tambem as camaras municipaes, quer soccorrendo-se a commissões de beneficencia, quer auxiliando-se com os meios de que podem dispor nos seus orçamentos devem crear a receita necessaria para a sustentação das pessoas que a lei do recrutamento quiz proteger, e que não são em tão grande numero, como daria direito a suppor a multiplicidade de reclamações e recursos que obtêem provimento nas commissões districtaes e no tribunal superior.

E preciso examinar bem a verdade dos factos; e ouvir as queixas que se levantam continuamente nas localidades contra as injustiças relativas que se praticam, e que denunciam uma grande desmoralisação, favorecida aliás pela politica, porque todos sabem a pressão que a aucto-

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rida de administrativa exerce com o recrutamento. (Apoiados.)

Parecia-me portanto que abolir aquelle artigo da lei é grande serviço que se faz á administração e á moralidade publica. (Apoiados.)

Creio que as palavras do sr. presidente do conselho não terão podido satisfazer o sr. Medeiros, porque a resposta de s. ex.ª foi muito similhante a outras, a que eu não quero chamar evasivas, mas a que s. ex.ª se tem soccorrido por mais de uma vez. Fallou s. ex.ª sobre a grande experiencia que tinha em negocios de recrutamento, referindo que tinha sido presidente não sei de qual camara municipal, e contando que tinha reparado um erro historico, que eu prefiro não ver emendado, porque o nome de soldados do Mindello tem uma significação tão grande, que é melhor que essa denominação não desappareça. Eu entendo porém que s. ex.ª soccorrendo-se constantemente a estes expedientes, illude um pouco as questões; e por isso eu desejava n'este caso uma resposta mais cathegorica, porque aquella que s. ex.ª deu não me póde satisfazer.

Sr. presidente, vem a proposito esclarecer a discussão levantada hontem n'esta assembléa, sem me atrever a declarar qual foi a opinião emittida pelo illustre presidente do conselho porque não ouvi bem, e não ponde perceber, sé, com relação á lei eleitoral, s. ex.ª declarou hontem á assembléa, que iria ao seio da commissão dar as devidas explicações.

V. ex.ª sabe que não posso recorrer ao Diario das sessões, que não está ainda publicado; mas tenho á mão o Jornal do commercio onde leio as seguintes palavras, que são ou parecem ser o resumo das explicações dadas por s. ex.ª (Leu.)

Este incidente levantou-se, tendo hontem pedido a palavra, como presidente da commissão, que a camara elegeu, o illustre deputado o sr. D. Luiz da Camara Leme; s. ex.ª expoz o estado d'este negocio, negocio que póde ser submettido ao conhecimento da camara; porque todas as commissões d'esta camara lhe devem as explicações mais essenciaes sobre os projectos de que estão incumbidas.

Effectivamente celebrámos a primeira sessão em casa do sr. presidente e assentaram-se alguns pontos muito essenciaes. O que predominou principalmente, o que talvez prejudicou todas as outras questões foi o pensamento de restaurar pura é simplesmente á lei de 1859. Sendo assim, o trabalho da commissão limitar-se ía a formular e mandar para a mesa um parecer escripto em poucas linhas, pedindo que seja submettido á discussão e approvação o projecto apresentado pelo illustre deputado o sr. Barros e Cunha.

Infelizmente vemos que nem sempre se toma á responsabilidade de todos os actos que deveriam ser mantidos, qualquer que seja a posição em que os seus auctores se achem collocados dentro d'esta assembléa.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Peço a palavra.

O Orador — Repugna-me quanto possivel dizer cousas desagradaveis a cavalheiros por quem tenho toda a estima e consideração, é respeito tenho eu por todos os que se sentam nas cadeiras do governo; mas, apesar do meu temperamento fleugmatico, o que não posso é dizer cousas agradaveis ou deixar de as dizer desagradaveis, quando assim repugna á minha consciencia.

Se eu me julgasse no direito que aliás tenho de renovar discussões, que hontem findaram, eu poderia corroborar com factos conhecidos a asserção de que hoje não se advogam com a mesma efficacia, ali nas cadeiras dos srs. ministros, os projectos de lei ou as propostas enviadas á mesa, quando os seus auctores se assentavam nas cadeiras de deputados. Não comprehendo esta mudança de opinião.

Assentou-se, pois, na commissão, como regra de discussão, a restauração da lei de 1859; houve alguns outros: pontos incidentes de que se lavrou a acta que o illustre presidente da commissão apresentou ao illustre estadista que era presidente do conselho, e por motivo da doença de s. ex.ª não póde ter o andamento devido.

Occorre-me tambem que ficou para ser discutida uma alteração importante com relação aos circulos de Lisboa e Porto,. o que não vem agora para o caso. Do que trato unicamente é de pedir uma explicação franca e categorica ao sr. presidente do conselho. Se é verdade (repito que não pude ouvir distinctamente o que o illustre presidente do conselho pronunciou, o póde ser que o equivoco esteja todo da minha parte) que o illustre presidente do conselho declarou que iria ao seio da commissão dar explicações, por parte do governo; muito bem: o trabalho é facil. Sendo assim, cumpre ao illustre presidente da commissão de reforma mandar convocal-a hoje mesmo, porque não temos poucos trabalhos de que nos occupemos, como é prova o adiantado da hora e o pouco tempo que tem decorrido desde a abertura da sessão.

Mande-se pois convocar a commissão; o sr. presidente do conselho comparece e manifesta as suas opiniões. Se não é exacto o extracto que vem no Jornal do commercio, então a unica resposta que o illustre presidente do conselho nos póde dar é uma resposta negativa, é que o governo não julga conveniente, na presente sessão, tratar de medida alguma que não seja de preceito constitucional, de approvação de creditos, ou outras que repute indispensaveis. Mas, depois das manifestações que a camara, publicamente, tem dado contra a actual lei eleitoral, parece-me que ha de passar sem discussão alguma o projecto de lei apresentado pelo illustre deputado o sr. Barros e Cunha.

Aguardarei, portanto, n'este ponto as explicações do governo.

Passarei a outro que é menos importante, porque não tem significação politica, e quando tivesse, não poderia incommodar o governo, nem mesmo tenho desejo de transtornar o jubilo de que está possuido o sr. presidente do conselho, e que seria pleno, se eu estivesse ausente da sessão, porque veria s. ex.ª em torno de si a familia liberal toda unida, como elle tanto deseja e como é de certo o voto sincero do seu coração, que é bom e magnanimo, e quero ser o primeiro a reconhecel-o.

Passando, porém, ao outro assumpto, pergunto ao illustre ministro da fazenda se s. ex.ª mandou algumas instrucções aos seus agentes de fazenda relativamente á execução da lei de 30 de janeiro de 1877.

Posso dar a s. ex.ª algumas explicações praticas e de sciencia certa.

Não faço a critica da lei que se refere á reclamação extraordinaria da annullação por sinistros. Não critico a redacção d'essa lei que foi tão deploravel, que se os empregados de fazenda tivessem de cumpril-a á risca, se os tribunaes que porventura tivessem de conhecer em recurso de qualquer decisão de instancia inferior, quizessem cingir-se á letra da lei, esta seria completamente inutil e inefficaz. Considerar para a reclamação de annullação por sinistros o rendimento perdido desde 1 do outubro, quando estava finda a maior parte das colheitas, é deixar sem garantia a indemnisação ou beneficio que se teve em vista.

Felizmente na camara dos dignos pares, como consta do Diario das sessões, o digno par do reino o sr. conde de Rio Maior pediu explicações que foram terminantemente dadas, tanto pelo nobre ministro da fazenda do ministerio transacto, o sr. Antonio de Serpa, como pelo relator da commissão o sr. Barros e Sá.

As explicações do governo e do sr. relator da commissão satisfizeram-me completamente, mas, sr. presidente, não tendo sido alterada a redacção, e na falta de interpretação authentica, torna-se indispensavel a interpretação doutrinal; é essa interpretação doutrinal que eu desejo

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Sessão de 10 de março de 1877

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que o sr. ministro da fazenda subministre aos seus empregados de fazenda.

Em dois concelhos, Benavente e Villa Franca, sei Eu, que os empregados de fazenda tem respondido que não podem informar as reclamações favoravelmente, por quanto a lei refere-se ao rendimento perdido depois de 1 de outubro, e não comprehende na sua letra os prejuizos mais importantes que os lavradores soffreram, taes como a perda total das sementes, a perda dos gados, a destruição das arribanas e aposentos, e sobre tudo os arrombamentos dos vallados.

Por consequencia se o illustre ministro me prometter que dará as instrucções devidas, e se as suas observações forem de accordo com a opinião que tinha o Sr. ministro da fazenda, seu antecessor, eu fico descançado. Mas as explicações officiaes de s. ex.ª são convenientes porque elucidam o modo de ver a questão, e naturalmente os seus empregados hão de querer cingir-se a ellas; e fico tanto mais descançado, quanto a resolução contenciosa d'esta questão pertence exclusivamente ao ministro da fazenda.

As auctoridades inferiores de fazenda só têem a informar ás reclamações e remettel-as ao delegado do thesouro para subirem á direcção geral das contribuições directas, e a este proposito devo tambem chamar a attenção do governo, porque a lei mandou vigorar as instrucções de 7 de agosto de 1860, mas ao tempo em que vigoravam essas instrucções não estava publicado um decreto dictatorial do sr. bispo do Vizeu, que supprimiu os recursos das decisões dos ministros da fazenda. Por consequencia estão n'esta parte cerceadas as garantias que tinham os contribuintes, não podem interpor recursos; quem hoje resolve, unica e exclusivamente, as reclamações, é o ministro da fazenda.

Ao tempo em que vigoravam as instrucções regulamentares de 1860, cabia recurso das resoluções do ministro para a instancia superior do contencioso administrativo, mas a competencia foi extincta por um decreto de dictadura, legalisado depois por um bill do parlamento, e não foi nem podia ser revalidada nos regulamentos do ministerio da fazenda, assignados pelo meu illustre amigo o sr. Anselmo Braamcamp.

Por consequencia já V. ex.ª vê que no interesse dos contribuintes que têem de apresentar as suas reclamações, e que não podem interpor recursos, é conveniente que 0 sr. ministro da fazenda dê uma explicação que faça cessar o receio que sentem, duvidando que a lei seja bastante efficaz para melhorar a má sorte, e indemnisar uma parte dos prejuizos que sofreram os lavradores com tão graves desastres. Espero que o sr. ministro da fazenda dê explicações satisfactorias.

Leu-se na mesa a ultima redacção do projecto sobra a lei de receita, que foi enviado para a outra coisa do parlamento.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Como o discurso que acaba de pronunciar o illustre deputado se referiu aos meus collegas, das obras publicas, 0 da fazenda, eu responderei unicamente á parte que me toca e s. ex.ªs responderão ao que lhes diz respeito.

O illustre deputado disse que não tinha podido ouvir bem a resposta que eu tinha dado á pergunta que me fez o sr. Paula Medeiros. Sinto isso; porque me parece que s. ex.ª tinha ouvido bem alguma cousa que eu tinha dito, por incidente, que não linha importancia para a minha declaração: por exemplo, que eu tinha commentado um erro historico, erro que e agradavel a s. ex.ª, no qual elle quer permanecer. Está no seu direito. Que eu tinha dito que tinha sido presidente de uma camara, e que não sabia qual era. Parece-me que quem ouviu estas expressões devia ter ouvido o que disse ao sr. Paula Medeiros, com o que s. ex.ª ficou satisfeito.

Tratou-se da lei do recrutamento, e eu disse ao sr. Paula

Medeiros que havia do examinar o que havia sobre o assumpto, que havia de procurar habilitar-me com os trabalhos feitos, e que estimaria muito que ainda n'esta sessão podesse apresentar á camara esse trabalho, mas que não me compremettia á isso, por que não sei se será possivel fazel-o.

Aqui está a resposta que eu dei ao sr. Paula Medeiros. S. ex.ª, repito, ficou satisfeito. Foi a este respeito que eu disse que tinha feito um recrutamento, e que tinha conhecimento das leis do recrutamento, e que conhecia á absoluta necessidade de que taes leis fossem redigidas com a maxima seriedade para que a ordem de sacrificio que ellas impunham ao paiz não fosse aggravada por disposições impensadas. Mais ou menos era esta a ideia que eu queria exprimir; este era o meu pensamento.

Parece-me que debaixo d'este ponto de vista não tinha recorrido ás evasivas a que alludiu o illustre deputado quando disse que a resposta que ou tinha dado era igual a todas que eu tinha dado ha camara. Não lhe chamou evasivas, irias, em fim, deu á entender que o eram.

Preso-me de ser franco; e quando estou nos bancos do ministerio não perco, por isso, está qualidade: digo sempre a verdade como a entendo. Sinto que algumas vezes ella desagrade ás pessoas á quem tenho de me dirigir; mas eu satisfaço os deveres dá minha consciencia.

Este ministerio formou-se no dia 5, e apresentou-se na camara no dia G; alguns ilustres deputados pediram-lhe a sua opinião sobre variadissimos projectos; que lhes havia de responder? O governo não tinha tido ainda tempo de concertar entre si a sua opinião á respeito d'esses projectos, não tinha tido tempo de os examinar; o illustre deputado chamou a isto evasivas. A camara n'essa occasião não Considerou isto como evasivas, pêlo contrario, saí satisfeito da maneira por que a camara nos tinha recebido.

Não direi mais sobre este objecto, porque me parece que não é preciso.

Com relação á lei eleitoral, direi que alguns illustres deputados estão Com tanta pressa d'ella como só tivessemos á porta uma eleição geral. Não me parece que nós vamos fazer agora uma eleição geral no reino. Eu não tenho tal idéa, e parece-me que esta legislatura ainda dura algum tempo.

Não me parece que uma lei eleitoral se possa fazer com precepitação; é necessario fazel-a com tranquillidade e pausadamente. (Apoiados.)

Diz o illustre deputado, que lhe parece que o presidente do conselho declarou que está prompto para ir á commissão. Estou prompto; não duvido ir á commissão eleitoral, nem ir a nenhuma commissão; hei de sempre, com isso, aprender e ganhar; mas ao que não me posso comprometter é que hei de n'esta sessão apresentar, por parte do governo, um projecto de lei eleitoral. Isso não póde ser; não me comprometto senão aquillo que estou resolvido a fazer; eu costumo que as minhas obras vão alem das minhas promessas, e não fiquem áquem d'ellas.

Eu hei de examinar os trabalhos que ha no ministerio do reino com relação ao recrutamento, e se n'esta sessão/ depois de serem votadas as medidas absolutamente indispensaveis para a governação pública, poder apresentar Um trabalho a este respeito, da melhor vontade o farei, e terei muita satisfação em que a camara se possa occupar d'elle. *

Digo o mesmo com relação á lei eleitoral.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Barros e Cunha): — Pedi a palavra para responder a uma accusação directa que o illustre deputado, que se acha na minha frente, me dirigiu na occasião em que tratava de accusar o governo.

Disse o illustre deputado, que com pesar via que os ministros d'este gabinete não respondiam nos conselhos da corôa pelas opiniões que tinham fóra d'elles. Isto a propo-

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sito, creia eu, do projecto de reforma da lei eleitoral, que apresentei á camara, no qual pedia a revogação da lei de 1869 e o restabelecimento da lei de 1859.

Não era a primeira vez, nem a primeira sessão, que eu apresentava á camara os meus desejos de que o decreto de 1869 fosse revogado. Fiz isso no fim da sessão de 1874, e vi os meus esforços malogrados.

No principio d'esta sessão pedi mais alguma cousa (façamos a historia com fidelidade), pedi que a camara restabelecesse a lei eleitoral de 1859, mas, alem d'isso, que se occupasse de introduzir na nova lei todas as reformas e aperfeiçoamentos, que podessem manter e garantir a plena e genuina liberdade da eleição.

Isto é que eu pedi, e mantenho, isto é que o governo, de que tenho a honra de fazer parte, mantem e deseja.

Eu fazia parte d'essa commissão; hoje não faço. Mas peço licença ao illustre deputado, para lhe dizer, que se n'este assumpto estamos de accordo, muitos ha que individualmente, como deputado apresentei, e dos quaes de certo o illustre deputado não tem direito de impor, alem de mim, a responsabilidade a pessoa alguma.

O ministerio está de accordo nos assumptos da governação do estado; está de accordo na politica que o nobre presidente do conselho annunciou, e espero que as minhas contradições ficarão na fertil imaginação do illustre deputado.

O sr. Ministro da Fazenda (Carlos Bento): — Ouvi com attenção o que disse o illustre deputado com relação a assumptos dependentes do ministerio a meu cargo.

O illustre deputado mencionou circumstancias que se dão nas disposições da lei em relação aos prejuizos soffridos pelos proprietarios, em consequencia dos desastres que tiveram logar ultimamente, e que essa lei tinha dado logar a interpretações para a sua execução.

A essas interpretações deu explicação na camara dos dignos pares o sr. ministro da fazenda anterior.

O sr. Van-Zeller: — Eu tenho toda a duvida, pelo muito respeito que protesto á camara, em usar da palavra e responder ao sr. ministro das obras publicas, uma vez que a pedi por parte da commissão da reforma eleitoral e restrictamente sobre o assumpto que respeita á mesma commissão, no entanto V. ex.ª regulará a discussão como entender conveniente.

Depois das declarações terminantes do sr. presidente do conselho de ministros, dizendo que não tinha duvida alguma em ir ao seio da commissão dar as explicações necessarias e auxilial-a no estudo d'esta questão, eu creio que é de toda a conveniencia que o sr. presidente d'esta commissão a mande convocar e convide o governo a assistir ás suas reuniões.

O illustre ministro das obras publicas dignou-se responder-me, estranhando que eu o tivesse censurado por elle não manter como ministro as opiniões que tinha como deputado.

Declarou s. ex.ª que não tinha o direito de impor as suas opiniões e os seus projectos de lei aos seus collegas. Ora, eu digo sómente e com toda a franqueza que não acho desculpa plausivel n'esta explicação de s. ex.ª, muito mais na questão da reforma da lei eleitoral.

É tão simples esta questão que basta reduzil-a á pura restauração da lei de 1859, e, nem ha muito que reformar se a commissão acceitar o projecto do sr. Barros e Cunha, ainda que se lhe introduzam algumas alterações.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — -É o que eu propunha.

O Orador: — Se s. ex.ª propunha isto mesmo, tanto melhor. Compareça s. ex.ª na commissão, dê as explicações que quizer dar, e conte que a commissão com um trabalho constante e arduo ha de conseguir dar brevemente um parecer, que a camara discutirá quando quizer.

Agradeço a deferencia do sr. ministro da fazenda em responder, ás minhas observações, mas parece-me que as

explicações de s. ex.ª não são sufficientes como commentario á lei. E preciso publicar instrucções, determinar os prasos para a execução da lei e explicar aos empregados da fazenda que o governo está de accordo com a opinião que foi manifestada na camara dos dignos pares do reino pelo sr. Antonio de Serpa e pelo sr. relator da commissão.

O sr. Antunes Guerreiro: — O meu fim era fallar sobre negocios que dizem respeito ao ministerio da guerra; como porém não está presente o respectivo ministro, desisto da palavra, pedindo a V. ex.ª que me conserve inscripto para quando s. ex.ª vier, se porventura chegar antes de se entrar na ordem do dia.

O sr. Carlos Testa: —Na sessão de hontem o sr. ministro da marinha apresentou uma proposta de lei ácerca da força naval, e sobre essa proposta remetto para a mesa o parecer da commissão de marinha, para ter o destino conveniente.

O sr. Presidente: —Vae passar-se á ordem do dia; se alguns srs. deputados têem requerimentos ou representações a mandar para a mesa, podem fazel-o.

O sr. Visconde de Sieuve de Menezes: — Mando para a mesa uma nota de interpellação ao sr. ministro da justiça, ácerca da falta de juizes na relação dos Açores.

O sr. Mariano de Carvalho: — Mando para a mesa uma representação dos escripturarios dos escrivães de fazenda de Lisboa e Belem, pedindo augmento de vencimento.

O sr. Thomás Ribeiro: — Remetto para a mesa uma representação da camara municipal de Moncorvo, pedindo auctorisação para desviar do cofre da viação municipal algumas sommas com applicação a outras obras de necessidade.

Peço a V. ex.ª que dê a esta representação o devido andamento, remettendo-a á respectiva commissão.

O sr. Francisco de Albuquerque: — Mando para a mesa um projecto de lei, que tem por fim determinar como ponto de partida no caminho de ferro da Beira Alta o ponto fronteiro á Pampilhosa.

Requeiro a urgencia d'este projecto.

Leu-se na mesa o seguinte

Projecto de lei

Senhores. — O artigo 1.° § 1.° da lei de 26 de janeiro de 1876 auctorisa o governo a mandar proceder nos termos da mesma lei á construcção do caminho de ferro da Beira Alta, que partindo da estação de Coimbra, ou suas proximidades na linha do norte, siga por Santa Combadão ou nas proximidades, e termine na fronteira de Hespanha, ligando-se ao caminho de ferro de Salamanca.

Os estudos ultimamente feitos pelo distincto engenheiro o sr. Eça, vieram pôr em evidencia não só os graves inconvenientes da adopção do ponto de partida marcado na lei, mas tambem a necessidade de escolher a Pampilhosa para esse ponto de partida.

Alem do traçado de Coimbra ter mais que o da Pampilhosa 4:945,m57 este lhe é superior nas condições da tracção, na grande reducção das despezas de construcção, e nos interesses economicos, commerciaes e agricolas.

Para não cansar a vossa attenção, sómente direi que emquanto pelo Valle do Mondego ha 24 curvas em 300 metros de raio, no traçado da Pampilhosa nenhum ha de tão apertado raio, que em vez de 10 túneis e 22 viaductos, teremos 3 túneis e 7 viaductos, que se economisará para o estado cerca de 1.000:000,5000 réis, e que finalmente a região atravessada pela directriz da Pampilhosa é muito mais povoada e cultivada que a variante pelo Valle do Mondego.

Por todas estas rasões e outras que a vossa illustração me dispensa de produzir, tenho a honra de sujeitar a vossa apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° O ponto da partida do caminho de ferro da Beira Alta é fixado na linha do norte defronte da Pampilhosa.

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Sessão de 10 de março de 1877

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Art. 2.° Fica revogado n'esta parte o § 1.° do artigo 1.° da lei de 26 de janeiro de 1876.

Sala das sessões, 10 de marco de 1877. = O deputado pelo circulo de Mangualde. Francisco de Albuquerque.

Vencida a urgencia foi admittido e enviado á commissão de obras publicas.

O sr. Alberto Garrido: — Por parte da commissão do ultramar, remetto para a mesa o parecer da mesma commissão sobre a proposta que auctorisa o governo a organisar e subsidiar uma expedição scientifica destinada á exploração dos territorios comprehendidos entro as provincias de Moçambique e Angola.

Por esta occasião, aproveitando a palavra que V. ex.ª me concedeu, desejava chamar a attenção do sr. ministro da marinha, que não vejo presente, mas como o governo está representado nas pessoas de muitos dos seus membros, e principalmente na do illustre presidente do conselho, apresentarei ligeiras considerações para serem tomadas em consideração pelo illustre ministro da marinha.

O nobre presidente do conselho, respondendo ha pouco ao meu collega, o sr. deputado Van-Zeller...

O sr. Presidente: — Previno o sr. deputado de que eu tinha annunciado que se passava á ordem do dia, e por isso peço-lhe que resuma as suas considerações quanto seja possivel.

O Orador: — N'esse caso, agradecendo a advertencia de V. ex.ª, cedo da palavra, e usarei d'ella em outra occasião.

ORDEM DO DIA

Leu-se na mesa e entrou em discussão o seguinte

Projecto de lei n.º 23

Senhores. — A vossa commissão de fazenda, tendo examinado a proposta n.º 4-M apresentada pelo governo, com o fim de ser auctorisado a emittir o emprestimo necessario para a consolidação da divida fluctuante; e considerando que a projectada operação traz incontestaveis vantagens á causa publica, é de parecer que a referida proposta deve ser convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a emittir e a negociar até á somma do 6.500:000 libras nominaes em titulos do 3 por cento de divida externa, com applicação ao pagamento da divida fluctuante e da divida aos bancos em virtude do contrato de 22 de junho de 1872.

§ unico. O encargo resultante da operação auctorisada na presente lei não poderá ser superior a 3/4 Por cento acima do que realmente corresponder ao preço dos fundos no mercado, na. occasião em que esta operação for realisada.

Art. 2.° O governo dará conta ás coites na proxima sessão legislativa do uso que tiver feito da auctorisação concedida pela presente lei.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão, aos 6 de março do 1877. — Antonio José de /Seixas — Antonio M. P. Carrilho = Mello e /Simas—Jacinto A. Perdigão — Antonio Maria Barreiros Arrobas = A. C. Ferreira de Mesquita = Visconde de Guedes Teixeira —Antonio José Teixeira, relator;— Tem voto dos srs.: José Dias Ferreira—Joaquim José Gonçalves de Matos Correia == Visconde da Azaruginha.

O sr. Pereira de Miranda: — Pedi a palavra, não para demorar a discussão d'este projecto, e muito menos para o combater, porque o voto ao governo actual, ao qual dou o meu apoio, como o votaria ao governo transacto que combatia, e rejeital-o-ia, se eu visse que a applicação d'este emprestimo podia ser menos util e conveniente; mas o projecto de que se trata, é uma auctorisação indispensavel para dar o verdadeiro principio de organisação á fazenda publica.

Desde que é preciso contrahir um emprestimo para consolidar a divida fluctuante que nos opprime em grande escala, e quando uma grande parte d'essa divida é no estrangeiro, d'onde não poucas vezes nos tem vindo difficuldades graves, eu não podia recusar ao governo, ou elle fosse composto de homens que eu apoiasse, ou combatesse, os meios que julgo indispensaveis para a gerencia regular dos negocios publicos.

Pedi portanto a palavra unicamente para fazer ligeiras considerações.

Não sei bem se a cifra marcada no artigo 1.° d'este projecto de 6.500:000 libras, será sufficiente para consolidar toda a divida fluctuante existente não só no paiz, mas no estrangeiro. Pelos elementos que tem vindo á camara, fornecidos pelo ministerio da fazenda, creio bem que esta importancia não será sufficiente para consolidar toda a divida fluctuante, e tenho muito receio, como já succedeu na ultima consolidação, que deixemos desde logo principio para uma consolidação futura.

Votando, pois, esta auctorisação, se o governo a julga sufficiente, votal-a-ía mais ampla, se fosse necessario, de maneira que podesse abranger a consolidação de toda a divida fluctuante.

Não temos apenas a consolidar a divida fluctuante existente.

Pelo relatorio do sr. ministro da fazenda sabemos que se contrahiu ena París um emprestimo para obras publicas no ultramar, que o producto d'esse emprestimo foi applicado a outras despezas, tendo mais tarde o thesouro de fornecer a somma, a que deu diversa applicação; isto augmenta a importancia da divida fluctuante.

Repito, voto a auctorisação como está, ainda que receio que não seja sufficiente para a consolidação total da divida fluctuante.

Mas visto que se trata de uma auctorisação ao governo para contrahir um emprestimo, eu mando para a mesa uma proposta auctorisando o governo igualmente a levantar, pelo modo por que prescreve a lei de 2 de julho de 1867, as sommas necessarias para a conclusão das duas linhas ferreas do Minho e Douro.

Creio que não póde admittir duvida que o limite fixado por aquella lei, quanto á quantia a applicar na construcção d'aquellas duas linhas, está esgotado. Nem póde haver duas opiniões a este respeito.

Creio que tambem está no animo de todos, que não se interrompa a construcção d'essas linhas, e estando esgotadas ou proximamente esgotadas as sommas provenientes da 4.ª serie de obrigações, emittida no ultimo anno, por isso, e por me parecer que não é conveniente que o governo recorra á divida fluctuante para adquirir as sommas necessarias para a conclusão d'essas linhas, parecia-me conveniente que o governo ficasse auctorisado a levantar essas sommas sem alterar o systema anterior, isto é, pela emissão de obrigações.

Julgo tambem necessario que o governo fique habilitado com esta auctorisação, porquanto, tendo sido emittida a ultima serie em Portugal, mas com a faculdade de ser cotada no estrangeiro, como já o foi, e serem pagos tambem lá os juros, é muito possivel que a nova emissão tenha de ser realisada lá fóra, e no estrangeiro, sabe o sr. ministro da fazenda perfeitamente, que são um pouco cautelosos em exigir as auctorisações legaes, em virtude das quaes se procuram os mercados para levantar emprestimo.

Por consequencia, mando para a mesa uma proposta n'este sentido, que todavia não terei duvida de retirar se ao governo parecer mais conveniente apresentar um projecto de lei especial.

A minha proposta é a seguinte. (Leu.)

Repito, esta auctorisação parece-me absolutamente indispensavel; tanto mais necessaria quanto teremos de recorrer a mercado externo; pelo menos convem que haja a cotação lá fóra d'esta nova serie de obrigações, como a ha

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em relação á anterior: declaro dó novo que não terei duvida de retirar esta proposta se ao governo parecer mais conveniente pedir uma auctorisação especial.

O sr. Ministro da Fazenda: — Eu principio por onde o illustre deputado acabou.

O illustre deputado mandou uma proposta para a mesa para o governo ficar auctorisado a levantar as sommas necessarias para á construcção das linhas ferreas do Douro e Minho. O governo está de accordo com a idéa da moção do illustre deputado.

Entendo que é indispensavel ficar o governo auctorisado a levantar as sommas que forem necessarias para se fazer face á construcção dos caminhos de ferro do Minho e Douro, porque a auctorisação anterior está esgotada, e por isso o governo faz tenção de apresentar uma proposta de lei de auctorisação n'esse sentido, e não recorrerá ás praças estrangeiras se poder realisar o emprestimo no paiz. Estamos pois de accordo. O governo entende que é indispensavel que n'esta sessão fique auctorisado a levantar as sommas indispensaveis para estas construcções.

Eu estimei muito ouvir da parte do illustre "deputado, que manifestou a sua approvação ao projecto, dizer que votava o projecto não em relação á administração actual, mas em relação a qualquer governo. E bom fixar este principio, porque tambem entendo que as finanças do paiz não devem depender de uma ou outra situação que se ache representada n'estas cadeiras, porque o governo não póde viver sem a regularidade das suas finanças; e bom é que chegue a occasião em que não entrem em tal assumpto apreciações apaixonadas.

A divida de que se trata não é creação de divida nova, é a substituição de uma por outra divida a curto praso e com todos os inconvenientes que póde ter uma divida n'estas circumstancias.

Mas o meu dever é declarar n'esta occasião, fazendo justiça ao meu antecessor, que as circumstancias immediatas em que o governo se acha não significam que seja preciso realisar desde já o emprestimo para occorrer á divida fluctuante. Devo declarar que, na situação em que me encontro, essa divida não faz pressão immediata de modo que o governo não tenha a liberdade sufficiente para poder contratar nas melhores condições; condições a que lhe dá direito o testemunho de mais de vinte annos em que o paiz, apesar das circumstancias difficeis muitas vezes da sua fazenda, ainda não deixou de cumprir rigorosamente a sua obrigação (Apoiados.) em relação ás suas dividas. Esta circumstancia, que é muito e justamente apreciada lá fóra, dá direito a suppor que o governo ha de encontrar o auxilio dos capitães indispensaveis para realisar esta operação.

Esta esperança, e mesmo muito mais que esperança, porque tem chegado ao conhecimento do governo a proposta de diversos capitalistas e estabelecimentos muito respeitaveis que estão dispostos a contratar offerecendo ao governo os recursos que por este projecto vae estar auctorisado a levantar, torna-se em realidade.

A respeito do que o illustre deputado disse com referencia aos meios que esta operação offerece para amortisar completamente a nossa divida fluctuante, observarei que o illustre deputado sabe que a divida fluctuante só como representação de receita existe mesmo nas melhores condições financeiras; mas como representação de deficit devemos empenhar-nos todos para que deixe de existir. (Apoiados.)

Devo declarar que mesmo pelas considerações que acompanham o relatorio do ministro da fazenda anterior, não se calcula mesquinhamente esta somma; mas por outro lado é certo que ha sommas importantes que constituem a divida fluctuante, mas que o governo deve embolsar pelos adiantamentos que fez a alguns estabelecimentos bancarios.

Ahi tem o illustre deputado a prova que isso não deixará de favorecer as vantagens necessarias para a Consolidação da divida fluctuante.

São estas as explicações muito rapidas que por orai tenho de apresentar com relação ao projecto que não foi combatido, antes pelo contrario foi apoiado pelo illustre deputado.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta

E igualmente auctorisado o governo a levantar, nos termos do artigo 6.° e seus §§ da caria de lei de 2 de julho de 1867, as sommas necessarias para concluir as linhas ferreas do Minho e Douro. = Pereira de Miranda.

Foi admittida.

O sr. Pereira de Miranda: — Podia dispensar-me de usar novamente da palavra depois das considerações que fiz da primeira vez que usei d'ella.

Já disse claramente que o governo não estava auctorisado actualmente a levantar nova emissão de obrigações para attender á construcção dos caminhos de ferro do Douro e Minho; e sendo o desejo de toda a camara que aquellas obras se não interrompam, era absolutamente necessario regularisar a situação do governo de maneira que nunca as obras deixassem de progredir. (Apoiados.)

Quando apresentei a minha proposta, disse que se ao governo parecesse mais conveniente a apresentação de um projecto especial para este fim, não tinha duvida em ceder da minha proposta; e digo a V. ex.ª que a retiro desde que o governo declara que ha de apresentar um projecto a esse respeito, porque o meu fim está satisfeito.

Entendo que sem auctorisação não podemos dentro ou fóra do paiz fazer nova emissão de obrigações; mas que isto se consiga pela minha proposta ou por uma proposta de lei especial é perfeitamente indiferente.

Emquanto ás outras considerações do sr. ministro da fazenda nada tenho a dizer.

Acho de grandissima vantagem que nós estejamos votando este projecto quando as circumstancias não nos opprimem fortemente.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Apoiado.

O Orador: — Esta é a melhor situação de podermos negociar em bons termos.

Não é por occasião de exigencias, ás vezes desarrasoadas, e que nem sempre se podem combater, que se póde negociar com mais vantagem para o paiz. Este é de certo o pensamento do governo. (Apoiados.)

A melhor occasião para usar de auctorisações d'esta ordem é quando as circumstancias não opprimem o thesouro, e parece-me que as actuaes são as melhores para negociar em boas condições.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: —

Levanto-me para fazer uma declaração á camara, que me parece que está perfeitamente em harmonia com as ideias que o illustre deputado acaba de apresentar, e com que eu me conformo inteiramente.

A intenção do governo é não usar d'esta auctorisação senão quando isso lhe for absolutamente indispensavel, o quando o possa fazer em condições vantajosas para o paiz.

O sr. Cardoso Avelino: — Não vou discutir o projecto que está em ordem do dia, mas dizer duas palavras a respeito do um incidente que foi levantado pela proposta mandada para a mesa pelo meu illustre collega e amigo o sr. Pereira de Miranda.

Depois das declarações com que terminou o seu discurso o sr. ministro da fazenda, eu podia talvez dispensar-me de tomar tempo á camara, mas peço licença para dizer alguma cousa, porque todos conhecem de certo o grande empenho que devo ter em que os trabalhos dos caminhos de ferro do Minho e Douro não só se não suspendam, mas continuem a ter o mesmo desenvolvimento que têem hoje,

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(Apoiados.) e mesmo mais algum, quando isso seja possivel, (Apoiados.) a fim de que o termo da sua conclusão se não faça esperar muito.

Não quero agora entrar na discussão de saber se ao governo é absolutamente indispensavel a auctorisação que elle julga carecer. Respeito muito a opinião do governo, mas peço a qualquer dos membros do gabinete que segunda vez affirme á camara e assegure ao paiz que a sua intenção é não encerrar a sessão actual sem ficar auctorisado a levantar todas as sommas que ainda são indispensaveis para se concluírem estas duas linhas ferreas. Contento-me com essa declaração.

O sr. ministro da fazenda já disse que havia de apresentar n'esta camara uma proposta para ser o governo auctorisado a levantar esses capitães; mas não me satisfaz essa declaração. A apresentação da proposta não é o mesmo que ser discutida e approvada nas duas casas do parlamento.

A camara comprehende bem os motivos porque tomo tanto interesse por esta questão; o governo ha de desculpar-me de certo esse interesse, na certeza de que o paiz ha de agradecer-lhe os esforços que empregar para obter os meios indispensaveis para terminar estas duas linhas que tão importantes e convenientes são. (Apoiados.)

O sr. Ministro das Obras Publicas: — O interesse

que o illustre deputado que acaba de sentar-se mostra pela conclusão, no mais curto espaço, dos caminhos de ferro do Minho e Douro, que achei começados, não excedo de certo o interesse que tenho, o interesse que tem o governo, porque nada seria mais ruinoso para o estado, nas circumstancias actuaes, do que deixar por concluir aquelles importantes trabalhos. (Apoiados.)

Emquanto á duvida em que o illustre deputado está sobre se o governo carece ou não carece de auctorisação para levantar os recursos que lhe faltam para concluir aquellas linhas, eu sinto muito, como membro do governo, não poder duvidar de que se carece d'ella.

O governo estava auctorisado a gastar apenas réis 30:000$000 por kilometro; mas, nas emissões que se fizeram, já se excedeu esta somma, porque o caminho de ferro do Minho fica por 40:180$816 réis cada kilometro e o caminho de ferro do Douro fica por 48:212$107 réis cada kilometro.

« Já se excedeu em 447:200$000 réis a auctorisação votada, e, apesar d'isso, o governo tem apenas á sua disposição para concluir aquelles trabalhos 317:475,000 réis, quando a importancia que nos ha de custar ainda a conclusão d'aquellas linhas chega talvez a perto de réis 3.500:000$000.

Portanto o governo carece de ficar habilitado para levantar as sommas necessarias para fazer face á differença que vae d'aquillo em que estavam calculadas aquellas linhas ferreas ao que effectivamente nos tem custado e hão de custar.

São estas as declarações que tenho a fazer á camara, porque na realidade seria muito embaraçosa a nossa situação, se ou tivessemos de suspender as obras, o que seria quasi um crime, quasi um attentado contra os interesses do paiz, ou tivessemos de usar do recurso a que já estavamos habituados, isto é: a levantar, por dictadura, meios para cumprirmos o nosso dever.

A proposta vem depois de ámanhã á camara, e o governo espera do patriotismo da camara popular que não se demorará em votal-a. (Muitos apoiados de, todos os lados da, camara.)

Vozes: — Muito bem.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Não venho exigir ao governo actual a responsabilidade do projecto que se discute. Eu sei reconhecer, e não esqueço, que a necessidade que representa este projecto de lei foi herdada pelo actuai ministerio, cuja innocencia n'este ponto é completa.

Eu voto o projecto, é voto-o a este governo exactamente como o votava ao governo transacto. Não me levarão os actuaes ministros a mal, nem podem levar, que eu lhes diga, quando approvo o projecto, hostilisando o ministerio, exactamente o mesmo que diria ao governo passado, que apoiei durante longo tempo, e até á sua queda.

Eu não só apoiei o governo passado com convicção, mas apoiei-o com prazer; e estou convencido de que a sua administração representou para este paiz uma era de progresso, de melhoramentos e de credito nacional, que póde citar-se com orgulho legitimo. (Apoiados.)

Todos aquelles que apoiaram e concorreram para essa administração podem, na minha opinião, gloriar-se toda a sua vida de terem podido concorrer para os fins que se conseguiram. Mas o meu enthusiasmo não era tal que não expozesse francamente á administração passada as duvidas que se me offereciam, e que não estivesse disposto, ou a embaraçal-a no caminho que me parecesse errado, ou a empregar todos os esforços para chamar o governo ao verdadeiro caminho.

Um dos pontos em que eu e os meus amigos estavamos divergindo, era a respeito do estado da fazenda publica; desejávamos que a par de todos os melhoramentos não esquecesse o principio fundamental d'aquella administração, que o equilibrio do orçamento, agora promettido" pelo nobre presidente do conselho, era uma necessidade urgente e inadiável, reconhecida tambem pelo nobre presidente do conselho do ministerio transacto. N'estas condições nos tinhamos, tanto eu como os meus amigos, empregado os nossos esforços, embora pouco importantes, para que este fim não deixasse de se conseguir, e para que a promessa solemne do equilibrio orçamental não ficasse vã e irrealisavel.

No ultimo parecer da commissão de fazenda sobre o orçamento, vinha consignada a promessa solemne de que o governo, na proxima sessão legislativa, apresentaria á camara as medidas necessarias para se restabelecer aquelle equilibrio, e a este respeito eu provoco da parte do actual governo uma declaração explicita.

(Pausa.)

Acredito que os illustres ministros possam ter assumptos de maior importancia a tratar na presente occasião, em conversa particular com alguns deputados, e que mais uteis sejam essas conversações ao paiz do que a consolidação da divida fluctuante. Sendo assim, eu não tenho duvida alguma em interromper o meu discurso, e esperar que assumptos mais importantes se decidam primeiro do que o projecto actualmente em discussão.

(Pausa.)

Dizia eu, sr. presidente, que tinhamos, por parte do ministerio transacto, o compromisso solemne de que na proxima sessão apresentaria ao parlamento as medidas indispensaveis para restabelecer o equilibrio entre a receita e a despeza, e a este respeito provoco da parte do actual governo uma declaração solemne e categorica, em que nos affirme se acceita aquella declaração, se sim ou não, na proxima sessão legislativa o governo conta apresentar as medidas necessarias, tanto de creação de receita como de diminuição de despeza, que dêem em resultado o equilibrio do orçamento. É isto o que o paiz quer, e o que todos nós desejamos saber.

Se é ou não conveniente, quando existe uma divida fluctuante, que assoberba o governo e assusta o paiz, converter essa divida em divida consolidada, isso não se discute, porque toda a gente ha de preferir a divida consolidada á divida fluctuante. (Apoiados.)

Por consequencia, o accordo que se dá, depois de se mostrar a necessidade de consolidar uma divida fluctuante enorme, não é um accordo muito agradavel nem muito honroso para este paiz; significa apenas a dura e triste necessidade de ceder circumstancias.

Se o governo trata de consolidar a dívida fluctuante,

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mas ao mesmo tempo tem o proposito de continuar a contrahir, a par da divida consolidada, nova divida fluctuante, que ha de tornar inevitavel outra consolidação, então todo o accordo o toda a pressa que o parlamento possa mostrar em consolidar as dividas, é um triste symptoma de decadencia nacional.

Nós podemos tomar para exemplo de boa administração, tanto politica como financeira, um axioma, que como argumento de primeira força ainda ha pouco foi empregado no parlamento francez. Ali a todas as exigencias dos ministros, a todas as reclamações do governo ou dos representantes do paiz, sejam de que ordem forem, ha um argumento que convence, ou pelo menos faz ceder o parlamento inteiro, sem que ninguem tente resistir.

Basta mostrar-se que, votada uma despeza, o orçamento fica com deficit, para que ninguem insista em que a despeza se faça, sem se crear a receita correspondente.

O principio de regularidade de finanças consiste em seguir este systema, e em não approvar por caso algum um orçamento que tenha deficit, porque o orçamento que tenha deficit não tem necessidade de divida fluctuante para representar a receita, tem a necessidade de divida fluctuante para saldar o deficit, e por consequencia para consolidar n'um periodo maior ou menor a divida que o paiz contrahiu, fingindo que representava a sua receita, quando estava a diminuir o seu capital para augmentar a sua divida consolidada.

É necessario que os homens publicos tenham, por uma vez, a coragem de dizer ao paiz, que as despezas que se fazem em melhoramentos publicos o em todos os outros ramos de serviço, indispensaveis á existencia de uma nação, hão de ser pagas necessariamente pelo paiz, e que não vem de certo nenhuma outra nação encarregar-se de saldar n'um futuro mais ou menos proximo as despezas feitas pela nação portugueza; para isso, o meio unico, depois da reducção das despezas ao stricto indispensavel, é a creação de receita; todo o adiamento em recorrer a este meio, representa uma despeza e um encargo maior, e por consequencia a necessidade de crear uma receita superior. (Apoiados.)

Sei que é arriscado, para quem se senta nas cadeiras ministeriaes, e lhes sente os espinhos, mas apesar d'isso deseja a continuação do proprio sacrificio, sei quanto é arriscado ter de applicar esta verdade ao paiz, e pedir-lhe os sacrificios que são indispensaveis; mas isto ha de fazer-se um dia, e justo é que o façam primeiro e desde logo aquelles que accusam os seus adversarios por o não terem feito.

Outra declaração peço ainda ao meu illustre amigo o sr. ministro da fazenda, e é que diga ao parlamento, com toda a franqueza, se a cifra d'esta auctorisação é sufficiente para saldar toda a divida fluctuante, e mesmo para evitar ao governo a necessidade de a contrahir até á proxima reunião do parlamento. Eu refiro me á divida fluctuante, não como representação de receita, mas como meio do saldar o deficit existente; e creio que o governo não póde hesitar n'um momento em que a responsabilidade dos factos não é propriamente sua.

Politica ninguem a faz n'esta questão. Eu voto este projecto, e represento a opposição mais decidida ao governo actua].

Os nobres ministros encontram a camara cheia não só do mais pleno accordo, mas do enthusiasmo mais ardente por s. ex.ªs

Se a quantia pedida não basta para tudo, reputo melhor que o governo se habilite para fazer um emprestimo maior, que o deixe tratar em pleno socego e sem outros cuidados de restabelecer o equilibrio do orçamento, como o nobre marquez d'Avila tem em vista, como s. ex.ª deseja, e de certo deseja, e como prometteu, e talvez cumpra, como havemos de ver.

Peço ao governo declarações explicitas em relação a estes dois pontos, assim como desejaria que as desse em relação a todos os outros sobre que os nobres ministros são interrogados.

Eu provoco e espero a resposta; mas desde já sou obrigado a dizer que, se s. ex.ªs julgam que podem responder, fingindo que me respodem, se s. ex.ªs desejam empregar o systema já seguido pelo nobre presidente do conselho e por alguns dos seus collegas, respondendo, nem mesmo com evasivas, mas com palavras que, calculadamente, não têem nem podem ter significação alguma positiva, então não tenham o incommodo de se levantar por parte do governo, porque, sendo eu opposição, a falta absoluta de resposta serve-me tanto para auctorisar e justificar a minha posição, como me póde servir a resposta que não responde nada.

E n'esta parte sinto ter de referir-me especialmente ao meu nobre e caríssimo amigo, o sr. Barros e Cunha. E s. ex.ª sabe que desde o principio das nossas relações lhe tenho dedicado sempre a maior e mais constante sympathia.

Conquistam-se as cadeiras de ministros n'estes logares de representantes da nação n'esta ou na outra casa do parlamento...

(Interrupção.)

Nem sempre?! Entre nós quasi nunca. Estou falhando segundo os bons principios do systema representativo, e não estou fazendo a historia parlamentar portugueza. No entanto ninguem duvidará de que o meu nobre amigo, o sr. Barros e Cunha, talvez, por excepção, conquistou, o conquistou muito dignamente, n'este logar, o logar que actualmente occupa. (Apoiados.) Mas, quando se passa d'estas para aquellas cadeiras (apontando para as dos srs. ministros}, ha de ser com a consciencia e com a coragem de traduzir nos logares do governo as idéas que se sustentaram nos logares de representante do povo. (Apoiados.)

Não se diz, como disse s. ex.ª hontem por insinuação, não quero dizer por insidia, do meu amigo o sr. Thomás Ribeiro, seja antes por meio do conselho ou por causa da reclamação do sr. Thomás Ribeiro, não se diz, ahi está uma proposta que sinto ter apresentado, e que não apresentaria se presumisse que ella podia ter essa significação. Não se diz, como s. ex.ª disse hoje, não posso impor aos meus collegas os meus projectos de iniciativa individual que elles não conhecem. D'onde vieram então os col* legas de s. ex.ª? Vieram da China? (Riso.) Não conheciam elles os seus projectos, nem as suas idéas? Pois não estavam alguns d'elles n'esta casa, não estavam outros na outra casa do parlamento? Era s. ex.ª porventura um deputado tão ignorado, ou tão avaro das suas idéas, que não desse pelos meios de publicidade constitucional toda a expansão aos seus discursos, que deviam chegar e chegavam ao conhecimento de todos?

Alteraram-se os principios de direito constitucional a ponto de se admittir a declaração do illustre presidente do conselho, de que o governo é novo e não póde ainda conseguir pôr-se de accordo entre si?

(Interrupção do sr. ministro das obras publicas.)

Creio que é tambem dos bons principios parlamentares a necessidade de que um governo, antes de se apresentar ao parlamento, tenha opiniões proprias sobre todas as questões de administração publica, e especialmente sobre aquellas que estavam em discussão, no momento em que s. ex.ªs saíndo das duas casas do parlamento, tinham, como deputados ou como pares do reino, d'essas questões plenissimo conhecimento, e é por isso que eu digo que as respostas, por este systema, não chegam a ser uma evasiva, porque são a combinação de palavras expressamente combinadas e previamente calculadas com o fim de não responderem a cousa alguma, e de não comprometterem o governo que póde até, a cousa é licita entre nós, não ter opinião em cousa alguma.

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Na minha qualidade de opposição, prefiro poder allegar e provar que o governo não responde, e por consequencia o modo do responder, seguido ate hoje, satisfaz-me completamente.

É admiravel, por exemplo, que o nobre presidente do conselho não saiba o que é e o que vale a legislação eleitoral anterior ao ultimo decreto vigente!

Será necessario que s. ex.ª tenha longas conferencias com os seus collegas e com a commissão para preferir ou não preferir a legislação de 1859 á de 1809?

Esta questão tão conhecida, não só pelos sr. ministros, mas por todos os homens publicos, por todos os administrados de concelho, inclusivè por todos os regedores de parochia, poderá ser cousa tão phenomenal, questão tão importante, que o sr. presidente do conselho ainda hoje tenha de responder sem a devida clareza ao meu amigo e correligionario politico o sr. Van-Zeller?

A questão é outra, e para mim ficou resolvida porque me foi explicada particularmente, porque nós, seja-nos feita essa justiça, em politica fallamos com toda a franqueza apenas se encerra a sessão.

No proprio dia em que se apresentou aqui o governo eu recebi a agradavel noticia de que o maior desejo e a principal idéa do sr. marquez d'Avila e de Bolama era revogar o decreto eleitoral de 1869, e substituil-o pela legislação anterior, conforme o pedido que ao governo transacto tinha dirigido na camara dos dignos pares do reino, a que s. ex.ª então dignamente presidia, o sr. conde do Casal Ribeiro. Logo depois n'esse mesmo dia explicaram-me que era impossivel que s. ex.ª se atrevesse a fazer vingar uma idéa que era sua, porque o sr. Dias Ferreira tinha tido a veleidade de lembrar ao governo uma idéa que elle já tinha, e havia de parecer que o nobre marquez d'Avila e de Bolama tinha vindo realisar as idéas do sr. Dias Ferreira. Estas singularidades explicam muitos mistérios da politica portugueza.

Eu prefiro não dar credito nem importancia a cousas tão mesquinhas, mas seja o que for, façam o que quizerem, porém respondam precisamente ás questões e manifestem a opinião do governo com a devida e indispensavel clareza.

O nobre presidente do conselho de ministros tem actualmente tal auctoridade no paiz, exerce tal influencia e soube inspirar tanto enthusiasmo ás duas casas do parlamento, que póde muito bem dizer não quero aquillo que todos querem e todos apregoam como de primeira necessidade publica. Não corro o menor perigo, faça-o e eu asseguro a s. ex.ª que fica com grande maioria ainda.

Por consequencia nada de hesitar. A occasião é esta ou nenhuma.

Reconhecem os partidos todos que a legislação eleitoral é pessima, que o decreto de dictadura não se póde defender, comparando-o com a legislação anterior; mas reconhecem-no todos quando são opposição; apenas vão ao governo, como parece que o tal decreto é mais favoravel ao governo do que á representação do paiz, convertem-se e querem gosar d'aquellas vantagens, d'aquelles meios de acção que o mesmo decreto lhes assegura, e portanto adiam para quando lhes succederem outros que adiam tambem.

Se estão compromettidos a apresentar a reforma, respondem com evasivas ou com estas respostas claras, cuja unica clareza consiste em não dizer nada, podendo entender-se tudo.

Não me refiro a este ponto por interesse proprio. Para mim é absolutamente indifferente uma ou outra legislação eleitoral. Podem eleger com as leis que quizerem. Mas como membro da representação nacional, eu julgo que é indispensavel reformar a legislação, e entendo que o primeiro dever de todos nós é proscrever o systema que consisto em desviar d'esta casa a verdadeira representação do paiz, para a deixar substituir pela representação dos ministros.

E o interesse e principalmente dos ministros, que reconhecendo a necessidade de reformas, que mais cedo ou mais tarde se verão obrigados a propôr e a tratar da sua execução, reconhecem igualmente a necessidade, quasi urgente, de pedir ao paiz grandes sacrificios juntamente com a necessidade de lhe applicar reformas que devem trazer necessariamente uma certa resistencia.

Influam os srs. ministros por meios de pressão, de violencia, ou por outros meios suasorios nos circulos eleitoraes e consigam trazer ao parlamento representação, não do paiz mas dos proprios ministros, e reconhecerão depois, quando tiverem feito votar as suas reformas por homens que não tinham nos circulos o nas localidades a influencia, o respeito e a consideração que deviam ter, quaes são as funestas consequencias do systema de falsificar a representação nacional e de fazer votar os sacrificios que pediram ou as reformas que applicaram, por quem não representa o paiz a que têem de ser applicadas. Verão depois, mas já tarde, qual é a resposta para os ministros que pozeram em pratica este systema, e para os que o querem perpetuar, e mesmo para as instituições que taes ministros compromettem, fingindo o desejo de as conservar.

(Pausa.)

As vezes ha expressões que não posso dominar, e esta precisa de explicação.

Eu creio que os ministros, claro é que estou fallando genericamente, têem effectivamente o desejo de conservar, mas procedem por fórma que empregam o mesmo systema, que seguiriam se tivessem o desejo opposto.

É esta a significação que eu queria dar ás minhas palavras.

Espero as declarações do governo, se os nobres ministros entenderem que as podem dar com a devida clareza, principalmente para se saber se a quantia pedida por este projecto de lei é sufficiente para saldar toda a divida fluctuante e para assegurar ao governo os meios necessarios para a não contrahir pelo menos até á proxima reunião do parlamento. Se o podem declarar, eu fico descançado.

Por esta occasião devo dizer que não sinto o menor receio, e faço essa justiça aos srs. ministros, de que s. ex.ªs comprometiam por qualquer fórma o resultado da operação para que vão ser auctorisados, porque os creio com todas as qualidades que se exigem em bons administradores, e administradores zelosos dos dinheiros publicos, o confio que s. ex.ªs, na realisação e applicação do emprestimo, executarão esta lei nas melhores condições possiveis

Eu folgo sempre que possa ser, não direi amavel, mas benevolo e justo com os membros do ministerio. E a esse respeito permitta-se-me que diga, que não me fez boa impressão a declaração do sr. presidente do conselho assegurar á camara que o governo só usaria d'esta auctorisação na occasião em que lhe fosse absolutamente indispensavel.

Eu creio que, significando a auctorisação pedida n'este projecto uma necessidade inadiável, o governo deverá usar d'ella logo que o possa fazer em boas condições, embora se não veja solicitado ou apertado pelos credores para reembolso da divida fluctuante existente.

E claro que a realisação do emprestimo consolidado só se póde fazer com vantagem, sendo favoraveis as condições dos mercados. Emquanto as condições do mercado forem favoraveis é evidente que os credores da divida fluctuante longe de pedir o reembolso d'ella hão de offerecer novas sommas; se as difficuldades apparecem, se as condições do mercado deixaram de ser favoraveis, hão de exigir o reembolso, e então o governo fica em pessima situação para poder realisar a consolidação.

Creio mesmo que esta deve ser a idéa do sr. presidente do conselho, isto é, que o governo ha de usar d'esta aucto quando as condições sejam favoraveis e não unicamente quando seja solicitado para reembolsar os credores por

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divida fluctuante. A esse respeito o governo se explicará se quizer e procederá copio entender. O ponto principal sobre que peço explicações é ácerca da sufficiencia ou insufficiencia da quantia pedida para saldar as obrigações contrahidas e que existem hoje com o nome de divida fluctuante.

Tenho dito.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Eu julgava que estava em discussão o parecer n.º 23 e era para responder ás observações que tinham sido feitas que eu tinha pedido a palavra; mas V. ex.ª ouviu e a camara tambem, que foi d'esse assumpto que menos se occupou o illustre deputado. A maior parte do seu discurso foi empregado em discutir as respostas que eu aqui tinha dado em relação á lei eleitoral, e eu direi muito pouco a esse respeito porque quero resumir-me principalmente ao projecto que está em discussão.

Eu tinha idéa de que esta camara tinha eleito uma commissão especial para revêr a lei eleitoral (Apoiados.), e não para lhe trazer, sem parecer seu, a legislação de 1859.

Por consequencia eu entendi que não podia comprometter-me a cousa alguma com relação aos trabalhos que estavam na commissão, sem ter a honra de ter uma conferencia com ella e sem ter conhecimento d'esses trabalhos. (Apoiados.) Foi n'esse sentido que respondi. E já combinei com o sr. presidente da commissão em dizer-lhe na segunda feira da semana proxima, se n'esse dia, ou no immediato impreterivelmente, poderia ter a honra de comparecer na commissão para se tratar d'esse assumpto. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.)

Aqui está, por consequencia, o que eu tenho a. dizer a este respeito, e a primeira parte tinha eu já dito á camara quando disse: «Eu não entendo que o fim da commissão seja apresentar um parecer sem exame da legislação de 1859». Entendia que a commissão estava encarregada de examinar a legislação em vigor, ou não, sobre eleições, e apresentar um projecto com todos os melhoramentos de que esta lei é susceptivel; e foi n'este sentido que respondi.

O illustre deputado disse: eu não gostei de uma declaração feita pelo sr. presidente do conselho, e repetiu algumas palavras que eu tinha pronunciado; o que póde acontecer é que o illustre deputado entendeu que a parte principal da minha resposta é o primeiro periodo e não o segundo.

Eu disse: o governo não usará d'esta auctorisação senão quando for absolutamente indispensavel e sempre em condições vantajosas para o thesouro. E claro que se o governo se reservasse para dar execução a esta lei no momento em que sobre o governo pezasse uma certa pressão, as condições não podiam ser boas. E para o ministerio uma das condições essenciaes da operação é que ella possa ser levada a effeito em boas condições. E uma operação importante e se fosse feita em condições desvantajosas, isso trasia um encargo superior e permanente.

O encargo da divida fluctuante não me assusta tanto pela probabilidade que eu tenho de o reduzir ou do embolsar o credor d'essa divida; mas para o encargo da divida fundada não ha remedio nenhum, sobre tudo, quando os nossos titulos de divida fundada são de 3 por cento e não podemos appellar para a conversão voluntaria porque o não podemos fazer, e muito menos para a conversão forçada, que é uma medida de bancarota. Se os nossos titulos em logar de serem de 3 por cento fossem de 6 por cento, aproveitávamos o credito e um dia convertiamol-os em 5 por cento, outro dia em 4 por cento, no outro dia talvez em 3 por cento; mas converter o 3 por cento em 2 por cento eu em l ½ Por cento, grande prazer seria o que eu teria se isso se podesse trazer, mas não creio que jamais o poderemos fazer.

Entretanto, as condições necessarias para esta operação ser feita é não aggravar o thesouro, hoje, que já os juros da nossa divida fundada são bem elevados.

Agora deixo ao illustre ministro da fazenda o responder ás perguntas do illustre deputado e limito-me só a um ponto.

Pareceu-me que tinha sido bem explicito quando disse que o ministerio reputava uma das necessidades imprescriptiveis d'este paiz, o restabelecimento do equilibrio entre a receita e a despeza do estado. Isto disse eu, e disse mais: disse que este ministerio havia de empregar a mais severa economia na applicação da receita ás despezas e deduzo ainda d'aqui para responder no illustre deputado que disse que era necessario que o governo tenha coragem de exigir sacrificios ao paiz, que sim. Nós temos esta coragem: é conveniente dizer que se peçam sacrificios, é necessario que elles se façam, mas não ha ministerio nenhum que possa exigir sacrificios do paiz sem começar por se habilitar a applicar a mais severa economia em todas as despezas do estado. (Apoiados.)

Este é o principio, e só depois poderemos dizer ao paiz que procedemos assim, mas que apesar das diligencias que temos feito para reduzir as despezas, é ainda indispensavel que elle nos auxilie para se poder extinguir o deficit do thesouro.

E noto aos illustres deputados que não interpretem mal esta declaração.

Quando fallo em reduzir as despezas, não é compromettendo as necessidades do serviço. (Muitos apoiados.)

Então era muito facil chegar ao orçamento e dizer: «A despeza da repartição de tal fica reduzida a metade.» Essas economias são todas contraproducentes (Muitos apoiados.), desorganisam o serviço, a boa administração '(Estrepitosos apoiados.) e compromettem a segurança publica (Muitos apoiados.), produzem por consequencia resultados oppostos. São verdadeiros desperdicios. Não contem com o ministerio para isso.

Havemos de fazer todas as economias que se possam fazer sem comprometter as necessidades do serviço, e depois temos a coragem de nos apresentar diante do paiz e dizer: «Carecemos agora de que o paiz nos ajude, fazendo ainda taes e taes sacrificios.»

Ora, sr. presidente, isto ha de fazer o ministerio, se tiver a honra de occupar estas cadeiras na sessão seguinte. Ha de esforçar-se para poder apresentar um orçamento acompanhado das medidas necessarias para restabelecer o equilibrio entre a receita e a despeza. (Apoiados.)

Não digo mais nada para não privar o meu collega, o sr. ministro da fazenda, de expor melhor do que eu estas considerações e outras que lhe suggerir a sua reconhecida capacidade.

O sr. Ministro da Fazenda: — Podia dispensar-me de tomar a palavra depois das explicações que acaba de dar á camara o sr. presidente do conselho, se não fosse a necessidade de responder a algumas perguntas que o illustre deputado, que tomou parte n'este debate, me dirigiu mais directamente.

Sr. presidente, a circumstancia do illustre deputado se declarar em opposição é na minha opinião o melhor argumento que se podia apresentar a favor da sustentação do projecto que o illustre deputado não combateu, e ao qual dá a sua approvação.

Permitta-me o illustre deputado que na melhor harmonia mencione esta circumstancia em favor do projecto que está actualmente em discussão. Da parte dos illustres deputados que não fazem opposição ao governo, a approvação d'este projecto demonstra a convicção de s. ex.ª e indica claramente que este projecto é util; da parte dos illustres deputados que estão na opposição, a approvação d'este projecto resulta da convicção em que s. ex.ªs estão de que, apesar da sua posição politica, não podem deixar de apreciar todos os motivos que o justificam. E o illus-

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tre deputado tanto está persuadido da indispensabilidade do projecto, que julga indispensavel que se lhe dê as garantias? que julga necessarias, porque as que tem não são sufficientes.

Tambem quando se traia de emprestimo, o illustre deputado entende que, apesar dos inconvenientes de um emprestimo, todavia para occorrer aos fins a que é destinado, e necessario que a sua somma, ou que a sua importancia não seja insufficiente.

Este projecto não é do actual governo; a responsabilidade da sua adopção é que é completamente d'este governo.

O meu antecessor explicou n'um relatorio muito bem elaborado...

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Esse conheço eu bem, porque o li; o que desejo agora são explicações de V. ex.ª

O Orador: — Eu não posso dizer senão o que o meu antecessor disse quando historiou os factos com que fundamentou a apresentação d'este projecto.

O meu antecessor tinha estabelecido que esta somma podia occorrer ás difficuldades da situação financeira em que o governo se achava; e, note a camara, elle não mencionou só a importancia da divida fluctuante, mencionou tambem uma somma a que já um sr. deputado fez referencia, isto é, o emprestimo dos 1.000:000$000 réis para obras publicas nas provincias ultramarinas.

Uma parte d'essa somma não foi immediatamente applicada, e essa parte foi tomada em consideração pelo meu antecessor para a affixação do emprestimo que deve occorrer á consolidação da divida fluctuante.

O meu antecessor, querendo segurar-se, note bem a copiara e reflicta n'isto; com relação á somma que elle julgava necessaria para fazer face á completa amortisação da divida fluctuante, até tomou em conta os encargos que podiam resultar da deficiencia dos rendimentos, em relação ao semestre corrente, proveniente das difficuldades Originadas pelas ultimas inundações.

E n'esta occasião devo dizer de passagem que a tendencia natural em todos nós é para pedir todos os melhoramentos possiveis, o mesmo impossiveis; (Riso.) e, como não é na occasião em que se pedem melhoramentos que se faz a conta da despeza que elles trazem comsigo, ou, por outra fórma, como não é n'essa occasião que se realisam os encargos indispensaveis para o pagamento das despezas a fazer, é facil pedir toda a qualidade de melhoramentos, quer sejam d'estes melhoramentos materiaes que tão uteis são, quer sejam d'estes melhoramentos de serviço que importam sempre augmento de dotações e augmento de vencimentos.

E os srs. deputados, creio que sabem muito bem como se propõem e se votam augmentos de despeza. Nunca faltam pretextos para isso. Por muito pouca imaginação que se tenha, creio que não ha ninguem que não possa suggerir ao menos um pretexto para augmento do despeza. Todas as apparencias de plausibilidade são muito faceis de encontrar; agora occorrer aos encargos que trazem comsigo essas despezas, sem reclamação que é muito mais difficil.

Houve dois cavalheiros distinctos que dirigiram as finanças em França, que tiveram a ousadia de declarar, que as circumstancias prosperas impõem deveres serios a quem e ministro da fazenda. Mas mesmo pelo relatorio que o illustre deputado leu, e que não podia ter lido sem observar, sem dar a sua attenção aos factos que n'elle se mencionam, conhecerá que houve certo numero do despezas extraordinarias, que não podem repetir-se, ou que se não devem repetir. Mal iria para nós e para o paiz se todos os dias tivessemos que comprar artilheria, navios, de encommendar armamento novo e ter em armas uma reserva completa. Mal iria para as nossas finanças se por acaso se verificassem estas circumstancias. O relatorio do meu antecessor menciona que muitos d'estes encargos extraordinarios concorreram para o augmento da divida fluctuante.

E tendo já, por iniciativa do ministerio anterior, diminuido muitas d'essas despezas, já se vê que a este ministerio incumbe continuar attentamente n'esse caminho; com tudo não é ainda possivel realisar isso de maneira que nós possamos conquistar o equilibrio entre a receita e a despeza; o que não é uma victoria tão insignificante como se apparenta a muitos que superficialmente consideram as finanças de um paiz. E a prova de que não é uma victoria muito facil é que nada se tem conseguido, apesar das circumstancias favoraveis em que o nosso paiz se tem encontrado. E quer o illustre deputado, saber porque? É porque as economias não agradam nem aos governantes nem aos governados.

Eu devo dizer á camara que, se o ministerio transacto tivesse acceitado o lanço para a adjudicação do caminho de ferro da Beira Alta, estou persuadido de que muito pouca gente applaudiria esse acto.

Dotava-se o paiz com um melhoramento importante, não se fazendo a conta ao encargo. E eu acho uma grave responsabilidade para um governo, acceitar propostas para um melhoramento, quando o resultado d'esse melhoramento não corresponde aos encargos.

E eu chamo a attenção do illustre deputado, como chamou o illustre presidente do conselho, para a proposta que está em discussão, porque é impossivel, a dizer a verdade, que um ministerio de menos de oito dias possa ter a sua opinião formada com todo o desenvolvimento sobre o recrutamento, sobre a lei eleitoral, sobre a realisação de tão variados ramos do serviço.

Eu posso assegurar ao illustre deputado que tenho opinião determinada a respeito do recrutamento e da lei eleitoral. Sei o que se tem passado em outros paizes mais adiantados, que nos podem servir de modelo n'estes dois pontos importantes da administração e da generalisação dos direitos dos cidadãos no desempenho da sua missão eleitoral; mas a camara convence-se por certo de que a occasião não parece a mais opportuna para pedir ao governo extensas explicações ácerca da opinião que tem sobre esses objectos.

A respeito da lei eleitoral, eu propuz, na outra casa do parlamento, que se modificasse a legislação actual em relação ao subsidio que vencem os deputados, porque me parece, e eu estava em posição imparcial para o fazer, assim como a camara tambem o estava, parece-me, repito, que é uma crueldade obrigar o parlamento a fazer sacrificios individuaes, sacrificios enormes, quando se lhe impõe a obrigação de se reunir mais do que o praso de tres mezes, que é o praso legal.

Parece-me que este sacrificio individual não se devia continuar a impor aos deputados, tanto mais que este pensamento economico entendia-se quando a urgencia das circumstancias tinha feito com que, desde o chefe do estado até ao ultimo funccionario, todos concorressem com um sacrificio, para que as finanças do estado podessem melhorar de condições.

Como essas circumstancias desappareceram em relação a todos os outros, não acredito que devam subsistir só em relação á camara dos deputados.

Mas não se trata agora da lei eleitoral, trata-se do projecto que se discute.

Este projecto tem como recommendação, segundo declarei no principio d'esta sessão, o não ser a creação de uma divida nova; é a substituição de uma divida por outra, que tem a circumstancia favoravel do governo não estar dependente da boa vontade d'aquelles que lhe emprestaram a curto praso.

Um emprestimo feito com as circumstancias dos fundos serem de 3 por cento, circumstancia indispensavel para o tornar acceitavel em Inglaterra, onde a nossa divida se compõe, quasi na totalidade, de titulos d'este genero, não

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é muito agradavel, porque tem o inconveniente, a que se referiu o meu collega.

Pagando nós os juros da nossa divida, achamo-nos habilitados a inspirar confiança, o que prova o progressivo augmento de preço dos fundos publicos, e habilita-nos a poder contar com o resultado da operação, do que é já garantia o numero de proponentes que se apresentam para tomar parte n'essa operação.

Dada esta explicação, e tendo-se demonstrado qual a somma precisa, segundo os calculos que se referem á consideração de factos que illustram a materia, parece-me que não póde haver nenhum escrupulo em votar o projecto de que se trata.

Ora, sendo assim, está claro que não devemos passar de um emprestimo d'esta importancia para a continuação de um estado de cousas que demasiado ire tem prolongado para a situação da fazenda publica, porque se quizermos argumentar, como temos dito, com o melhoramento das nossas circumstancias economicas, parece-me que não temos rasão nenhuma para nos resignarmos á conservação do deficit no nosso orçamento; e para isso é que desejo chamar a attenção da camara, porque supponho que a verdade é a primeira necessidade da nossa situação financeira; o digo a verdade, porque muita gente se illude a respeito das exigencias da nossa situação financeira, quando suppõe que o melhoramento das condições financeiras, o augmento dos impostos, póde custear impunemente o augmento de todas as despezas que se imaginem.

Isso é que não é assim, o augmento dos rendimentos publicos não póde custear o que pretendemos lançar-lhe a seu cargo. E pela minha parte supponho que e o nosso dever não estar a contar com o futuro para a solução das difficuldades presentes. A nossa divida representa o muito que contámos com o futuro para a satisfação dos nossos encargos; e pela minha parte entendo que nenhum ministro da fazenda deve deixar de ter a força de dizer que a continuação do deficit, quando não ha circumstancias extraordinarias que o justifiquem, não significa o fim que deve ter em vista o ministro que se sentar por algum tempo n'estas cadeiras.

São estas as explicações que tinha a dar, e se os illustres deputados entenderem que. são precisas mais, estou prompto a usar novamente da palavra.

O sr. Osorio de Vasconcellos: — Começo por declarar a V. ex.ª e á camara, que não tenho duvida em votar este projecto a este governo, como o votaria ao anterior. E a rasão é muito simples: é porque não ha governo possivel, quando tem diante de si esse phantasma permanente e ameaçador que se chama divida fluctuante, não só interna como externa, que impossibilita, ou pelo menos difficulta, de uma maneira fatal toda a acção governativa.

Nós podiamos discursar largamente agora sobre as origens d'essa divida fluctuante, podiamos lastimar mais uma vez este triste fado que preside aos nossos destinos e em virtude do qual não foi ainda possivel igualar de uma maneira real e verdadeira a receita com a despeza por fórma que não tenhamos todos os annos de recorrer ao credito para saldar as nossas contas.

Este estado é deploravel, é desgraçadíssimo. Contra elle se tem empregado os esforços de todas as situações, de todos os gabinetes e de todas as maiorias; mas infelizmente o deficit manifesta-se sempre; é já quasi uma circumstancia logica, necessaria e permanente da nossa existencia. (Apoiados.)

Portanto eu voto este projecto e estimarei muito que as promessas e os bons desejos do governo se realisem de maneira que em muito pouco tempo não nos vejamos obrigados a votar uma nova auctorisação a este ou a um novo governo para consolidar a divida fluctuante. De consolidação em consolidação nós chegaremos por fim ao extremo de nos consolidar a nós todos. (Riso.) A questão toda é saber se nós mesmos ainda teremos valor no mercado. (Riso. — Apoiados.)

Aproveito a occasião de estar com a palavra para mandar para a mesa uma nota de interpellação ao meu illustre e antigo amigo o, sr. Barros e Cunha, hoje ministro das obras publicas. É assignada tambem pelo meu presado e antigo amigo o sr. Thomás Ribeiro. Apesar de ter quasi sempre divergido do meu amigo o sr. Thomás Ribeiro nas questões politicas que se tem ventilado n'esta casa, tenho todavia estado sempre com s. ex.ª em constante harmonia de pensamento, de esforços e de idéas a respeito do caminho de ferro da Beira Alta. Tanto o meu illustre amigo como os deputados da Beira, e agora citarei o sr. Francisco de Albuquerque...

O sr. Francisco de Albuquerque: — Apoiado.

O Orador: — Temos sempre tentado demonstrar, e creio que com excellente resultado, que a linha ferrea da Beira Alta não é uma linha provincial. E ainda hoje foi demonstrado pelo sr. Carlos Testa n'um discurso que não podia ter contestação que o caminho de ferro não é nem póde ser uma simples linha provincial, mas a verdadeira linha internacional. Portanto, é necessario, para a construcção d'ella, fazer convergir os esforços immediatos d'este governo, assim como me parece que os esforços da antiga maioria e do anterior governo eram verdadeiros e sinceros. (Apoiados.) Faço completa justiça. Eu acredito na sinceridade do governo transacto n'esta questão. (Apoiados.)

N'este ponto não tenho politica. Estava ao lado do anterior governo, e estarei irremediavelmente contra este governo senão construir o caminho do ferro da Beira Alta. (Apoiados.)

Disse o meu illustre amigo o sr. Carlos Bento n'um discurso muito espirituoso, e tanto mais politico quanto é certo que d'elle se não podia inferir facilmente a consequencia, que todos os melhoramentos tinham quem os applaudisse, mas que nem todos elles eram realisaveis. O illustre ministro disso de um modo elegante que havia melhoramentos possiveis e até melhoramentos impossiveis. Não creio que o meu illustre amigo, nem nenhum dos membros do governo capitule de melhoramento impossivel o caminho de ferro da Beira Alta.

O sr. Ministro da Fazenda: — De modo nenhum.

O Orador: — Muito bem. Por consequencia a resposta do sr. Barros e Cunha dada hontem ao sr. Francisco de Albuquerque não satisfez a nenhum de nós, nem podia satisfazer, porque a resposta era bastante sybilina.

Não satisfez o sr. Francisco de Albuquerque, porque ainda ha pouco mandou para a mesa um projecto de lei; não satisfez o meu amigo o sr. Thomás Ribeiro, nem a mim, porque vimos apresentar uma nota de interpellação, para a qual pedimos ao sr. ministro das obras publicas que se dê por habilitado, a fim de que discutamos amigavelmente, sem sombra da menor desconfiança, este assumpto, que é capita], para a Beira Alta, e para toda a camara, por isso que já se manifestou votando a necessidade de se construir aquelle caminho. E devo notar que ainda ha poucos dias, quando começou a discussão do projecto relativo a este assumpto, quando o governo já estava morto...

O sr. Avelino: — Ainda não estava.

O Orador: — Ha differentes chronologias. Respeito muito a do meu illustre amigo; mas a minha chronologia diz-me que quando começou a discutir-se o projecto relativo ao caminho de ferro da Beira Alta já o governo estava morto. Pois apesar d'isso podia julgar-se que, estando morto o governo que linha tido esta iniciativa, enfermaria e arrefeceria o enthusiasmo?

Não, senhores. Pelo contrario, muitos deputados pediram a palavra para defender sinceramente a necessidade d'esta construcção. (Apoiados.)

Concluindo as minhas observações, mando para a mesa

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a nota de interpellação que ha pouco annunciei, assignada tambem pelo meu amigo e collega o sr. Thomás Ribeiro.

O sr. Carrilho: — Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre as emendas offerecidas ao projecto de lei do orçamento de despeza.

O sr. Presidente: — O parecer que acaba de ser mandado para a mesa, juntamente com as propostas que se apresentaram durante a discussão do orçamento de despeza, vae a imprimir, e mandal-o-hei distribuir por casa dos srs. deputados, para que na segunda feira a camara decida se" deve entrar em discussão na ordem do dia.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Com muito prazer declaro ao nobre presidente do conselho que as suas explicações foram claras e categoricas, e satisfizeram-me completamente.

Sou opposição, muitas vezes violento em relação ás cousas e na apreciação dos factos; mas não desejo ser aggressivo para com as pessoas que me cumpre respeitar, e sobretudo desejo ser justo. Por isso quando me respondem, como me respondeu o nobre presidente do conselho, sei dizer que a resposta me satisfaz, e digo-o com a mesma franqueza com que disse que algumas respostas não são modos de responder.

Vou mais longe; fico com a certeza de que s. ex.ª realisará as explicações que deu á camara, e que conjunctamente com a commissão encarregada de revêr a lei eleitoral tratará, na segunda ou terça feira, de resolver o que é possivel fazer-se n'esta sessão sobre este importante assumpto.

Mas se eu folgo de fazer esta declaração emquanto ao sr. presidente do conselho, tenho immediatamente de sentir, em relação ao nobre ministro da fazenda, e meu amigo, de quem eu esperava maior clareza, que s. ex.ª se apressasse tanto a adoptar o systema da ambiguidade já abandonado pelo sr. presidente do conselho.

Sinto que s. ex.ª não me dissesse cousa alguma a respeito da pergunta que lhe dirigi. Talvez a culpa fosse minha, por não ser tão claro, como devia, na pergunta, e por isso a repito.

Eu perguntei ao sr. ministro da fazenda, se a quantia a que se refere a auctorisação pedida no projecto em discussão é ou não sufficiente para saldar toda a divida fluctuante hoje existente, e aquella que, não para representação da receita, mas sim para fazer face ao deficit do orçamento, lhe seja necessario contrahir. pelo menos até janeiro. Se s. ex.ª não póde ou não quer responder, dirijo-me a outra pessoa.

Estou convencido que n'estas questões de fazenda, e já o sei por experiencia propria, ninguem responde com tanta clareza como costuma responder, quando quer, o nobre presidente do conselho de ministros.

Eu sei o que disse a esta camara o meu nobre amigo, o sr. Antonio de Serpa, ministro da fazenda anterior; sei qual era a opinião d'elle; mas não é da opinião d'elle que eu quero saber; quero saber da opinião do sr. ministro da fazenda actual, o meu nobre amigo o sr. Carlos Bento da Silva. A quantia que se fixa n'esta auctorisação é ou não é sufficiente para saldar toda a divida que actualmente existe com o nome de divida fluctuante, e para fazer face aquella que o governo tenha necessidade de contrahir até á reunião das côrtes em janeiro? Se não é sufficiente, eu entendo que, não sendo esta questão nem do governo, nem da camara, mas principalmente de todo o paiz, recorrer á consolidação é muito mais conveniente de certo, do que a sustentação da divida fluctuante, que não pede sem perigo exceder certos limites, mas sei igualmente quanto é conveniente lançar mão d'estes recursos poucas vezes e sempre em periodos distantes.

Portanto, se a somma não chega, peça-se somma maior se o governo a julgar necessaria. Isto é muito preferivel, pois melhor é decretar-se agora um emprestimo mais elevado, do que ter que pedir no anno seguinte auctorisação para nova consolidação.

Já vê, portanto, o nobre ministro da fazenda que eu apesar de ser opposição, não só voto o projecto por que s. ex.ª insiste, mas até não duvido amplial-o, se s. ex.ª o julgar necessario. E não tem nada que estranhar e menos que agradecer no meu procedimento.

Eu faço opposição a meu modo, e esse modo não consiste em tentar lançar suspeitas sobre o caracter individual dos ministros, nem em lhes recusar os meios que são indispensaveis para que a nação se mantenha á altura que deve manter-se uma nação civilisada.

N’esta parte, embora seja opposição, eu primeiro que tudo sou portuguez; e o meu logar n'esta casa obriga-me a uma certa ordem de deveres que eu não sei nem posso esquecer.

Por tanto, a minha insistencia, que me parece conveniente para todos, consiste apenas em averiguar, se a somma é sufficiente ou insuficiente, não segundo a opinião do sr. Antonio de Serpa, mas segundo a opinião do governo actual, que é quem tem de lutar com estas difficuldades, e dar contas da applicação do emprestimo. Eu não desejo ver o sr. ministro da fazenda collocado em circumstancias que não sejam perfeitamente livres e desafogadas, mesmo para depois poder apreciar melhor os resultados da sua esclarecida gerencia.

O sr. Ministro da Fazenda: — Não tenho culpa de não ter tido clareza no que ha pouco expuz. E uma circumstancia particular, é uma falta que se não póde imputar a ninguem.

Eu sem querer, em referencia ás rasões apresentadas no relatorio do meu antecessor, o sr. Antonio de Serpa, acobertar-me atraz do talento de s. ex.ª, tinha em vista sómente dizer que o meu illustre predecessor se referiu a factos; e que esses factos, como não mudaram de natureza, acham-se exactamente revestidos das mesmas circumstancias.

Ora, o sr. Antonio de Serpa, calculou qual era a nossa divida fluctuante, e para isso mencionou mesmo a parte do emprestimo dos 1.000:000$000 réis para as colonias, que não tinha tido immediata applicação. Mas ha mais alguma cousa ainda: o sr. Antonio de Serpa considerou já o desfalque que nas receitas do semestre corrente podem ter produzido os desastres causados pelas ultimas inundações.

Depois d'isto o illustre deputado pergunta: não haverá divida fluctuante até janeiro? Eu respondo: não sei...

O sr. Visconde de Moreira de Rey. — Pois isso é que é preciso saber-se.

O Orador: — O illustre deputado quer saber? Mas como quer o illustre deputado que eu calcule as eventualidades de receitas occorridas n'este praso?

O illustre deputado acaba de ver que um illustre cavalheiro, que pertence ao grupo de que s. ex.ª faz parte, pediu explicações ao governo sobre a intelligencia ampla de uma lei que foi votada em ambas as casas do parlamento, e em virtude da applicação da qual a receita ha de diminuir. Como quer o illustre deputado que eu calcule a deficiencia que ha de trazer comsigo a execução d'essa lei?

Ao que o governo se compromette, e n'isso o compro/ nisso é categórico e solemne, é a apresentar a rectificação do orçamento, para se poder fazer uma idéa exacta dos encargos que pesam sobre o thesouro.

N'essa epocha o governo fará mais; o governo chamará a attenção da camara para o que, bem ou mal, se tem chamado creditos extraordinarios.

Assim como quando se apresenta um orçamento, por mais bem elaborado que elle seja, se não póde responder pela fidelidade d'elle em todas as suas partes, o que não se tem conseguido ainda em paiz nenhum, mesmo nos que têem as finanças nas melhores condições de regularidade, tambem se não póde tomar a responsabilidade até ao ultimo real de que esta somma será sufficiente para o fim de que se trata.

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Disse o illustre deputado que a opinião do sr. Antonio de Serpa não é a minha opinião.

Não me parece que isto importe um argumento para a questão.

Pois o sr. Antonio de Serpa não estava'habilitado para avaliar as circumstancias' financeiras, quando apresentou esta somma, e sobretudo quando mencionou os factos?

Parece me que o illustre deputado n'essa occasião ainda não era opposição; mas se não era opposição, ha do permittir-me que lhe diga que a obrigação é denos cingirmos aos factos economicos, obrigação de que a gente se póde emancipar, porque entendo que as reconsiderações só são vergonhosas quando são vergonhosos os motivos que as determinam.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: — Eu disse logo no principio que as observações que fazia ao governo actual eram exactamente as que teria de fazer ao governo anterior, a quem havia ajudado sempre.

O Orador: — A Verdade é que por differentes vezes se tem consolidado a divida fluctuante, e o illustre deputado, que não improvisa a este respeito, mencionou esta circurastancia para dar força ás suas apprehensões; mas no momento actual eu supponho que a somma que se vota é sufficiente para a regularisação das finanças.

E seria muito difficil augmentara importancia da somma pedida pelo projecto, que já está acceito, e direi, mais, que já é conhecida lá fóra pelos individuos que costumam negociar com o governo n'estes assumptos.

Depois de calculada a somma como está, seria de peior effeito que o governo viesse dizer: «Enganei-me, a importancia é outra, é maior do que a mencionada no projecto, e isto reconheceu-se porque se fizeram ultimamente calculos mais perfeitosb.

Já ha propostas de companhias, que entendem que devem fornecer os meios para o fim a que o projecto se propõe, e essas companhias já sabem qual a somma que é necessaria.

Reflicta o illustre deputado para esta circumstancia. r Não me parecia, pois, que se podesse alterar a importancia sem inconveniente; e tanto mais, que os factos que actualmente existem nos illustram sufficientemente para se poder saber que esta somma é bastante.

O sr. Visconde de Moreira do Rey: — Desde que o sr. ministro da fazenda declara que reputa sufficiente a quantia fixada no projecto, não tenho mais nada a dizer; estou satisfeito.

O sr. Presidente: —Tem a palavra o sr. Thomás Ribeiro, que a pediu para antes de se fechar a sessão.

O sr. Thomás Ribeiro: — É para mandar para a mesa uma nota de interpellação que não pude mandar antes de se entrar na ordem do dia. '

(Lev,.)

O sr. Presidente: — -Tem a palavra o sr: Neves Carneiro.

O sr. Neves Carneiro: — Mando "para a mesa uma proposta para se completar a commissão de poderes.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Marçal Pacheco.

O sr. Marçal Pacheco:. — Pedi a palavra para responder a uma observação feita pelo sr. Pinheiro Chagas na sessão de hontem; mas, em consequencia do adiantado da hora e do estado da camara, peço a V. ex.ª que me reserve a palavra para ámanhã.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para segunda feira é a discussão do projecto de lei n.º 18.

Espero que ámanhã sejam distribuidos por casa dos srs. deputados os pareceres sobre as emendas propostas ao orçamento da despeza e sobre as propostas de lei constitucionaes; e, sendo assim, tambem estes pareceres entrarão em discussão, se a camara o resolver.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas e meia da tarde.

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