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N.° 49

SESSÃO DE 23 DE ABRIL DE 1900

Presidencia do exmo. sr. Luiz Fisher Baquó Poças Falcão

Secretarios - os exmos. srs.

Joaquim Paes de abranehes
Frederico Alexandrino Garcia Ramirez

SUMMARIO

Approvada a acta, o sr. presidente communica á camara ter recebido uma representação de varios cidadãos residentes no concelho de Bouças. - Dá-se conta do expediente o tem segunda leitura um projecto de lei. - Prestam juramento e tomam assento os srs. deputados Emygdio Navarro e Franco Frazão. - Sob proposta do sr. Dias Costa é approvado, depois de algumas considerações do sr. João Franco, que o sr. presidente fique auctorisado a alterar as horas a que a camara costuma reunu-se. - O sr. Dantas Baracho desenvolve o seu aviso previo sobre a substituição do official que estava em diligencia em Moncorvo por occasião das eleições, e sobre a substituição de um capitão, tambem do mesmo regimento; insta por diversos documentos que pediu, e mostra desejos de que seja publicado o relatorio da commissão encarregada de formular um projecto de promoções Responde-lhe o sr. ministro da guerra. - Sob proposta do sr. Barbosa de Magalhães é aggregado o sr. Paulo Cancella á commissão do administração publica, e o sr. Catanho de Menezes á commissão de legislação civil. - O sr. Luiz José Dias manda para a mesa um parecer da commissão de fazenda. - O sr. Luciano Monteiro troca algumas explicações. Com o sr. ministro das obras publicas ácerca da extincção dos gafanhotos no Algarve, e lamenta a ausencia do sr. presidente do conselho. - O sr. Mathias Nunes declara que vae lançar na caixa respectiva dois requerimentos de interesse particular. - Os srs. Marianno de Carvalho, Mello e Sousa, Cabral Moncada, Antonio de Vasconcellos, Malheiro Reymão, Paulo Falcão, Domingos Tarroso e Adriano Anthero mandam para a mesa representações. - Os srs. Catanho de Menezes e Adriano Anthero mandam para a mesa avisos previos; o sr. visconde da Ribeira Brava apresenta um projecto de lei e o sr. conde do Burnay requer varios esclarecimentos.

Na ordem do dia continua a discussão do capitulo 1.° do projecto de lei n.° 14, orçamento geral do estado para 1900-1901, usando da palavra o sr. João Franco e o sr. ministro da fazenda, e sendo a materia julgada discutida a requerimento do sr. Sinel de Cordes. Approva-se o capitulo com o additamento proposto pelo sr. relator. Das moções approva-se a do sr. Luiz José Dias, sendo rejeitadas ou retiradas todas as outras. As declarações do sr. ministro serão, a requerimento do sr. João Franco, exaradas na acta. - Por proposta do sr. Luiz José Dias é aggregado ás commissões de fazenda e do orçamento o sr. Emygdio Navarro.- O sr. Arthur Perdigão manda para a mesa dois pareceres da commissão de fazenda. - Entra em seguida em discussão o capitulo 2.º, usando da palavra o sr. Augusto Fuschini, que não concluo o seu discurso.

Primeira chamada - Ás duas horas da tarde.

Presentes - 6 srs. deputados.

Segunda chamada - Ás tres horas da tarde.

Abertura da sessão - Ás tres horas e um quarto.

Presentes - 68 srs. deputados.

São os seguintes: - Abel Pereira de Andrade, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alberto Affonso da Silva Monteiro, Alfredo Carlos Le-Cocq, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Osorio Sarmento de Figueiredo, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Teixeira de Sousa, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto Cesar da Silveira Proença, Auguste Fuschini, Conde de Caria (Bernardo), Eusebio David Nunes da Silva, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José Machado, Francisco Limpo de Lacerda Ravasoo, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Francisco Xavier Correia Mendes, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, João Augusto Pereira, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João José Sinel de Cordes, João Marcellino Arroyo, João Monteiro Vieira de Castro, João Pinto Rodrigues dos Santos, João de Sousa Bandeira, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Paes de Abranches, Joaquim da Ponte. Joaquim Rojão, Joaquim Simões Ferreira, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José de Azevedo Castello Branco, José Christovão do Patrocinio de S. Francisco Xavier Pinto, José Eduardo Simões Baião, José Estevão de Moraes Sarmento, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José Gonçalves Peroira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Mana Barbosa de Magalhães, José Maria de Oliveira Mattos, José Mathias Nunes, José Osorio da Gama e Castro, José Pimentel Homem de Noronha, Julio Ernesto de Lima Duque, Libanio Antonio Fialho Gomes, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Luiz José Dias, Manuel Augusto Pereira e Cunha, Manuel Francisco Vargas, Manuel Homem de Mello da Camara, Manuel Paes de Sande e Castro, Marianno Cyrillo de Carvalho, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro, Ovidio Alpoim Cerqueira Borges Cabral, Pedro Monsinho de Mascarenhas Gaivão, Polycarpo Pecquet Ferreira dos Anjos, Salvador Augusto Gamito de Oliveira, Sebastião do Sousa Dantas Baracho, Visconde de Guilhomil e Visconde da Ribeira Brava.

Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho Ferreira Loureiro, Antonio Augusto de Sousa e Silva, Antonio Lopes Guimarães Pedroza, Arthur Alberto de Campos Henriques, Arthur de Sousa Tavares Perdigão, Augusto José da Cunha, Carlos de Almeida Pessanha, Conde de Burnay, Domingos Tarroso, Emygdio Julio Navarro, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco José de Medeiros, Francisco Xavier Esteves, Henrique da Cunha Mattos de Mendia, Ignacio José Franco, Jacinto Candido da Silva, João Catanho de Menezes, Joaquim Heliodoro da Veiga, Joaquim José Fernandes Arez, José Adolpho de Mello e Sousa, José Antonio de Almada, José Capello Franco Frazão, José Dias Ferreira, José Malheiro Reymão, José Paulo Monteiro Cancella, José Teixeira Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Telles de Vasconcellos, Matheus Teixeira de Azevedo, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Miguel Pereira Coutinho (D.), Paulo José Falcão e Victorino de Avellar Froes.

Não compareceram á sessão os srs.: - Abilio Augusto de Madureira Beça, Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Affonso Augusto da Costa, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Alexandre Ferreira Cabral Paes do

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Amaral, Alfredo Baptista Coelho, Alvaro de Castellões, Antonio Faustino dos Santos Crespo, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Simões dos Reis, Antonio Tavares Festas, Antonio Vellado da Fonseca, Augusto Guilherme Botelho de Sousa, Conde de Idanha a Nova (Joaquim), Conde de Paço Vieira, Duarte Gustavo de Roboredo Sampaio e Mello, Francisco Joaquim Fernandes, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Frederico Ressano Garcia, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconeeilos, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, João Lobo de Santiago Gouveia, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Augusto Lemos Peixoto, José Bento Ferreira de Almeida, José Braamcamp de Mattos, José Gonçalves da Costa Ventura, José Joaquim da Silva Amado, José Mendes Veiga de Albuquerque Calheiros, Luiz Pereira da Costa, Manuel Antonio Moreira Junior, Visconde de Mangualde, Visconde de S. Sebastião e Visconde da Torre.

Acta - Approvada.

O sr. Presidente: - Tenho a communicar á camara que recebi uma representação de varios cidadãos residentes no concelho de Bouças, pedindo a promulgação de uma lei que determine a trasladação para a igreja dos Jeronymos, freguezia de Santa Maria de Belem, dos restos mortaes do visconde de Almeida Garrett.

Vae ser enviada á commissão de administração publica.

EXPEDIENTE

Officios

Do ministerio da marinha, remettendo os documentos pedidos nos n.ºs 7.° e 8.° do requerimento apresentado pelo sr. deputado Ferreira de Almeida na sessão de 24 de janeiro ultimo.

A secretaria.

Do tribunal de verificação de poderes, remettendo nota da retribuição arbitrada pelo respectivo accordão a mais um juiz, que, por delegação d'este tribunal, procedeu ao inquerito no circulo eleitoral n.° 24.

A commissão administrativa.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - Foi Portugal um paiz riquissimo de caça. As suas campinas e os seus montes foram povoados de veados, gamos, cabras, javalis, lebres, coelhos, perdizes e outras, especies.

Hoje, infelizmente, em virtude da deficiencia da legislação sobre caça, tem esta ido desapparecendo e se se lhe não acudir já de prompto com remedio decisivo e efficaz, ter-se-ha perdido um elemento de riqueza publica a que é preciso attender.

Fonte de riqueza natural, impõe-se aos legisladores solicitos pelos interesses dos seus paizes; protegem-a hoje leis especiaes em todos os povos civilisados, e tanto mais previdentes essas leis e com tanto maior rigor executadas, quanto maior é o adiantamento da sua civilisação.

Nas grandes nações da Europa, os estadistas não julgam perdido o tempo empregado no estudo e na elaboração d'essas leis. Não se limitam para isso a consultar os jurisconsultos, ouvem os sabios, os naturalistas, os economistas agricolas, os sportsmen, que têem a auctoridade technica da pratica, alem da que lhes póde advir da sua illustração, e os industriaes tambem, porque a prosperidade das industrias da caça, actualmente impossiveis de fundar entre nós e que trazem em movimento grandes capitães em Inglaterra, na França, na Bélgica e na Allemanha, é como a de todas as industrias, dependente das leis e regulamentos que as regem.

De todas as nações da Europa é a Allemanha a mais ricamente dotada no capitulo da legislação venatoria; é tambem, e por isso, o paiz que produz, consome e exporta maior quantidade de caça. É esta uma fonte de riqueza, que a sua administração explora, e procura por todos os meios desenvolver, e se o seu rendimento para o estado é grande em França, é enorme na Allemanha, onde tudo n'este caso é superior - as leis, os regulamentos, e os seus fiscaes e executores, guardas florestaes e seus chefes educados em escolas especiaes.

A affirmação de que os artigos contidos no capitulo II, titulo III do codigo civil, são doutrina bastante para nos regermos hoje n'esta materia, é gratuita e sem fundamento. A lei ou leis, a que se refere o artigo 394.°, nunca foram promulgadas, e da falta de regulamentos que preceituassem sobre a abertura e encerramento da epocha de caçar, e estabelecessem as multas e penas para os seus contra-ventores, e para os que violassem os direitos declarados n'esse titulo m, resultou a pouca attenção que as auctoridades de toda a ordem, têem dispensado a este ramo da administração publica, e portanto a irregularidade e desigualdade, tanto na interpretação das prescripções do codigo, como na elaboração e execução das posturas municipaes.

Mas ha mais ainda - quando, logo em seguida á publicação do codigo civil, fosse, como era de esperar, promulgada essa lei, seu complemento natural, seria um caso raro que, passados mais de trinta annos, ella podesse satisfazer as exigencias e defender os interesses de tantas industrias, que hoje vivem da caça, umas já então existentes lá fora, e desconhecidas ou desprezadas pelo legislador, outras de origem mais recente! A lei moderna tem, portanto, de abranger, na sua acção, uma area muito mais vasta - o que era sufficiente em 1867, é evidente que não basta em 1900.

O estado de miseria a que chegou a caça na nossa terra exige uma lei completa que satisfaça a dois fins, que ambos se nos impõem - o primeiro é travar este movimento inconsciente de devastação, que parece ter nascido á sombra protectora da lei de l de julho de 1776, e do artigo do codigo civil, que permitte entrar em terrenos alheios e apprehender os animaes que lá estão sem licença do seu dono, o que, para nós, constituo indiscutivelmente uma violação do direito de propriedade - embora formulada em lei nos nossos codigos - o outro fim é tornar possivel e proteger a fundação de centros de creação para repovoar tantas regiões do nosso paiz, actualmente quasi desertas, e tambem para exportar, industrias que constituem hoje nos paizes, que têem lei de caça, um ramo de commercio assas lucrativo, e que, dadas as excellentes condições do nosso clima para a prooreação das aves e das outras especies venatorias, seria um novo campo aberto ao capital é á actividade dos que procuram entre nós, e muitas vezes em vão, um trabalho remunerador. Só por summa ignorancia, por ingenuidade, ou por irrisão é que se póde dizer que para tudo isto, aqui apenas e muito por alto indicado, a doutrina do codigo é bastante, e que não carecemos de outras leis!

Funesta foi tal doutrina, bastante só para o resultado obtido - a quasi extincção da caça, em regiões, em terrenos creadores, como os nossos, onde ella era abundantissima! D'ella se originou entre nós a idéa falsa e altamente prejudicial á riqueza do paiz, de que todos os cidadãos portuguezes, alem dos outros direitos naturaes que as leis lhe reconhecem em todos os povos civilisados, têem mais um - o de, em materia de caça, não reconhecerem o direito de propriedade! Singular aberração do espirito dos

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legisladores do codigo civil, que fez retroceder os nossos Costumes até ás epochas primitivas, em que o homem selvagem ainda, antes da creação da industria agtieola, procurava a sua alimentação animal exclusivamente na caça e na pesca e que deu foros de lei ao que não era mais do que um abuso, explicavel pelo periodo de revolução de que o nosso paiz ia saindo, mas que a boa rasão e a lição aos factos mandavam corrigir, não sanccionando com a auctoridade das leis o que era apenas tuna manifestação anarchica dos instinctos naturaes e da ignorancia e imprevidencia do povo.

Não conheciam esses jurisconsultos, aliás dos mais abalisados, praticamente o assumpto sobre que iam legislar, não o estudaram a fundo nos outros paizes, não lhe ligaram a importancia que elle merece, e por isso, e para não irem de encontro a habitos e costumes até ali consentidos, sanccionaram a abusiva e vandalica pratica, e no n.° 3.° do artigo 384.° concederam a todos o direito de caçar nos terrenos particulares não cultivados, nem murados, de forma que esses terrenos, pela simples circumstansia de não serem no momento cultivados nem murados, podem ser legalmente invadidos, e occupados temporariamente, por qualquer: que quizer ir lá divertir-se e caçar!

Isto pelo que respeita ao direito de entrar na propriedade ameia sem consentimento do seu dono.

Resta outro ponto ainda a estudar, e este á tambem importantissimo.

O artigo 384.°, já citado, estabeleça que a caça é propriedade de todos nos terrenos particulares, não cultivados, nem murados. Nova violação do direito de propriedade. Á caça é tanto propriedade dos donos das terras onde ella viva; como o são as manadas dos toiros e de cavallos, e os rebanhos que n'ellas pastam e se criam.

Onde está à differença entre as circumstancias da vida d'estas especies, todas naturalmente sedentarias?

"Ninguem terá a faculdade de caçar na propriedade dó outrem sem o consentimento do proprietario, ou dos seus representantes". É isto o que diz a lei franceza logo no seu artigo 1.° E esta lei, datada de 1844, e assignada pelo rei Luiz Filippe, força da republica de 1848, na do imperio, e é ainda a que rege os destinos da caça n'aquella grande nação, hoje segunda vez republica.

Identicas disposições se encontram nas leis da Belgica de 26 de fevereiro de 1846 e 29 de março de 1873, da Hollanda de 1 de julho de 1807, da Hespanha de 10 de janeiro de 1879 e nos estatutos de 1831 de Guilherme 4.° de Inglaterra. Na Italia é tambem respeitada a propriedade particular e tambem em certas condições na Austria, na Prnssia. Na Suissa a caça é arrendada pelo estado.

Os resultados d'estas disposições é o haver muita caça n'estes paizes e alem d'isso constituir ella um dos rendimentos dos predios pela exploração da caça ou arrendamento do direito de caçar, direito tão legitimo como o de cultivar.

Vê-se, portanto, que contra o espirito e a letra da nossa legislação actual, na parte que respeita o direito dos particulares, protestam o bom senso, a experiencia e a legislação de todos os paizes civilisados.

A unanimidade dos protestos não prova senão a extensão e a profundidade do mal, e a urgente necessidade de se lhe acudir com o remedio.

Obedecendo á convicção da inadiavel necessidade de uma lei que proteja a caça, definindo os direitos dos caçadores, sem offender os da proprietarios, dando assim unidade á legislação cynegetica, apresentou aqui o meu amigo e collega José Capello Franco Frazão, na sessão de 4 de maio de 1899, um projecto de lei que a meu ver realisava os fins que pretendia attingir.

No relatorio que o procede explica o sr. Franco Frazão os principios fundamentaes do seu projecto, dizendo que para evitar a diminuição da caça julgava conveniente adoptar o principio dos coutamentos.

Contra isto não protestaram os proprietarios, cujos direitos eram assim reconhecidos, mas insurgiram-se os caçadores allegando que, no seu entender, isto seria um privilegio, e por isso anti-liberal, um retrocesso aos tempos do absolutismo.

Embora me pareça que os que tal afirmaram e afirmam, confundem cousas differentes como são coutos com coutadas, como no projecto alludido, só se permitte o coutamento do predios, cuja superficie seja superior a 100 hectares, chego a suppor que o privilegio se dava efectivamente a favor dos grandes proprietarios, quando, para o não haver, o mesmo direito se devia conceder aos pequenos.

Creio que a necessidade de guardar terrenos de abrigo para a caça é geralmente reconhecida o proclamada e a prova pratica d'esta verdade temol-a no facto publico de que uma das primeiras associações de caça de Portugal, cuja sede é em Lisboa, a Associação protectora da caça no tempo defeso, não podendo reatisar no paiz as suas excursões venatorias com a certeza de encontrar caça, arrendou para esse fim os contos da Gandara e Atalaya, em Hespanha. Se a encontrasse aqui na nossa terra, não iria procural-a em paiz estranho; não obstante isto a commissão d'esta camara modificou o projecto do sr. Franco Frazão, retirando d'elle os coutamentos.

Não tendo sido submettidos á discussão os dois projectos, eu, em vez de renovar a iniciativa de qualquer d'elles e com o consentimento do sr. Franco Frazão, extrahi do seu projecto o que entendi mais pratico e conducente aos fins que tenho em vista, e que eu acceito, e tirando do projecto da commissão as modificações feitas áquelle e que não são oppostas ao meu intento, resolvi formular um novo projecto em que, acabando com privi-e dando a todos a faculdade de defender os seus e defendendo a caça o tornasse pela justa e equitavel distribuição dos deveres e dos direitos uma lei verdadeiramente liberal.

Actualmente, senhores, o proprietario de um predio póde defendel-o com a lei contra todas as invasões, meios uma, - a dos caçadores. Desde que qualquer põe ao hombro uma espingarda para elle não ha barreiras, a não ser a dos altos muros, que não possa transpor.

Quando o póde fazer, desmoronando-os e abrindo brecha como em praça inimiga elle não recua, e só o receio de algum guarda destemido é que o fará retroceder.

O proprietario, o que possue, o que comprou, o que gasta, e o que paga as contribuições é posto de parte pelo caçador, este é que é o senhor absoluto da caça, elle e os seus cães matam, pizam, destroem, espantam, o que está e o que está para vir! E a qualquer observação que se lhe faça poderá responder que está no sou direito, e que quem se julgar lesado, reclame nos tribunaes por perdas e damnos.

Póde continuar um tal estado de cousas?

De certo que não. - Os direitos de uns terminam onde começam os direitos dos outros - accrescendo a isto que esta é uma questão que interessa a riqueza publica, e os interesses do estado, que na vigencia d'essa lei e d'estes costumes, ha tantos annos que são prejudicados.

Lei verdadeiramente liberal é só aquella que reconhece por igual os direitos de todos.

O exemplo das nações estrangeiras, tantas vezes invocado por nós, devemos seguil-o tambem n'este caso; lá ninguem póde caçar noa terrenos alheios sem licença do seu dono, o que lhes augmenta o valor, quer elle seja caçador e como tal os usufrua, quer alugue a outros o direito de n'elle caçarem.

Embora fosse talvez mais justo propor disposições iguaes ás das leis estrangeiras sobre este direito de caçar nos predios alheios, não quiz ir de prompto contra costumes inveterados, - se bem que insustentaveis em face do direito - e por isso proponho uma transição ou meio ter-

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mo, acatando o direito de propriedade e dando ao proprietario a faculdade do prohibir, quando quizer, a caça nos seus predios, conseguindo assim que se respeite a propriedade quando o proprietario queira que ella seja respeitada.

Não supponham, porém, os caçadores que pelo facto de terem os proprietarios a faculdade do prohibir que só caco noa seus predios, todos elles tornem effectiva essa prohibição.

Pela leitura do projecto que tenho a honra de apresentar poderão os caçadores ver que para que essa prohibição se torne effectiva são necessarias formalidades que obrigam a certas despezas, que nem todos poderão ou quererão fazer, o que, portanto deixará ainda á sua disposição uma grande parte dos terrenos que elles estão costumados a explorar.

Em Hespanha, na extensissima provincia de Badajoz, ha apenas seis contos que são, felizmente para os caçadores do lá, os viveiros com que se repovoam constantemente as regiões abertas e esgotadas.

Algumas contadas no Alemtejo seriam uma riqueza a mais para esta provincia, para o paiz, para o estado o para os caçadores.

Não entrarei em mais considerações porque mo parece, que o que fica exposto é sufficiente para mostrar a necessidade do alterar o actual regimen do caça entre nós, o qual o presente projecto modifica principalmente:

1.° Prohibindo o exercicio da caça em predios alheios som licença do dono, quando este assim o queira;

2.° Prohibindo o exerercio da caça em predios alheios quando applicados á industria e renovação da caça;

3.° Exibindo licença para caçar.

Alem d'isso, senhores, estabelece ella tambem a protecção ás aves uteis á agricultura, em harmonia com o accordo acceite por nós no congresso internacional de Paris de 1895.

E finalmente uniformisa a legislação sobre caça em Portugal o que se está tomando indispensavel.

A ordem da materia do projecto e a mesma da do sr. Franco Frazão.

Diz-se primeiro o que seja caçar e quem póde caçar, depois onde se caça, em seguida como o quando se caça e finalmente trata-se do transporte, fiscalisação, processo e penas.

Em harmonia com o que fica exposto, tenho a honra de submetter á vossa apreciação o seguinte projecto de lei:

CAPITULO I

1.ª SECÇÃO

Do direito de caçar

Artigo 1.º Caçar é o acto de procurar, perseguir ou apprehender os animaes bravios.

§ 1.° Animaes bravios ou selvagens são os que vivem no estado de liberdade e não podem ser apprehendidos senão pela força ou pela notocia e bom assim os animaes domesticados que tenham recobrado a sua primitiva liberdade.

§ 2.º Animaes domesticados, são os animaes bravios occupados pelo homem e com elle mais ou menos habituados.

Art. 2.º Os animaes bravios são inoffensivos, damninhos ou uteis a agricultura e podem ou não ser apprehendidos por meio da caça em harmonia com as disposições d'esta lei.

Art. 3.° A todos som distincção de pessoas é licito caçar durante o tempo em que a caça for livro, estando o caçador munido da respectiva licença, a qual dá direito ao uso porte de arma ou armas do fogo pura caçar.

Art. 4.º O caçador apropria-se do animal pelo facto da apprehensão, mas adquire direito ao animal que feriu emquanto for em sou seguimento, salvo o disposto no artigo 36.°

§ unico. Considera-se apprehendido o animal que é morto pelo caçador emquanto dura o acto venatorio.

2.ª SECÇÃO

Das licenças

Art. 5.º A licença para caçar será passada na administração do concelho ou bairro onde o individuo tiver o seu domicilio; é valida por espaço de um anno no continente do reino o ilhas adjacentes, e só poderá ser recusada com fundamento nos artigos 9.°, 10.°, 11.°, 12.° e 13.°

§ 1.° Estas licenças serão, no praso de tres dias, registadas na repartição de fazenda do respectivo concelho ou bairro.

§ 2.° Cada licença pagará 2$000 réis de sêllo, e a falta de licença corresponde á falta de sêllo para os effeitos fiscaes.

Art. 6.° A licença será requerida em papel sellado e passada n'um cartão com a assignatura da pessoa a quem é concedida sempre que esta formalidade possa ser preenchida e, quando o interessado não souber escrever, a auctoridade competente assim o declarará no mesmo documento.

Art. 7.° Podem caçar sem licença todas as pessoas da familia real.

Art. 8.° Os creados de um caçador que façam o effeito de batedores não andando armados de espingarda estão isentos do licença se o caçador a tiver.

Art. 9.° O administrador do concelho ou bairro póde recusar licença para caçar:

1.° Aos individuos que estejam sob a vigilancia policial ou condemnados a qualquer pena;

2.° Pelo espaço de dois annos a todo o individuo que tiver sido condemnado como reincidente por infracções da presente lei.

Art. 10.º Não podem ser concedidas licenças para caçar:

1.° Aos dementes;

2.° Aos surdos-mudos.

Art. 11.° As licenças para caçar podem ser concedidas a menores, mas só quando requeridas por seus pães ou tutores.

§ unico. As licenças concedidas a menores do dezeseis annos não dão direito ao uso e porte de arma de fogo.

Art. 12.° Não será concedida licença para caçar aos policias, guardas fiscaes, cantoneiros das estradas, guardas campestres, florestaes, ruraes e fluviaes, excepto para usarem d'ella durante o goso de licença do exercicio de suas funcções.

Art. 13.° A licença aos individuos que tenham sido condemnados pelos crimes de vadiagem, mendicidade, furto ou abuso de confiança só poderá ser concedida tres annos depois de cumprida a pena.

Art. 14.° Todo aquelle que caçar é obrigado a apresentar a sua licença nos individuos encarregados da fiscalisação d'esta lei quando estes a reclamarem.

Art. 15.º Ao caçador que for encontrado sem licença serão apprehendidas, sondo possivel, as armas.

§ 1.° O portador das armas apprehendidas poderá resgatal-as no praso de quinze dias só apresentar a respectiva licença ao administrador do concelho onde ellas estiverem, registada, nos termos do § 1.° do artigo 5.°, anteriormente ao acto a que este artigo se refere.

§ 2.° As urinas apprehendidas serão logo entregues ao caçador mediante fiança, ou deposito na administração do concelho, de 10$000 réis por cada arma, deposito que terá o destino marcado no artigo 88.°, caso a licença não seja apresentada no praso marcado no paragrapho antecedente.

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Art. 16.° Quando o caçador apresentar licença que lhe não pertença será esta apprehendida e annullada.

CAPITULO II

Dos direitos e deveres do proprietario e do caçador

Art. 17.° É permittido caçar:

1.° Nos terrenos proprios cultivado ou não cultivados;

2 ° Nos terrenos publicos, municipaes ou parochiaes não cultivados nem murados ou não exceptuados administrativamente;

3.° Nos terrenos particulares com, excepção dos cultivados, murados, vedados por sebe viva ou morta, arame, ferro ou madeira, e d'aquelles em que administrativamente seja prohibido caçar, sendo essa prohibição requerida pelo proprietario, usufructuario, emphyteuta, rendeiro, devidamente auctorisado, do predio ou predios ou rendeiro da caça.

Art. 18.° A prohibição administrativa de caçar nos terrenos particulares será requerida ao administrador do concelho ou bairro a que pertença a maior parte da superficie dos terrenos.

§ unico. A prohibição será ordenada por alvará e só póde ser negada quando não esteja em dia o pagamento da contribuição predial relativa aos terrenos onde se pretende a prohibição.

Art. 19.° Para poder ser ordenada a prohibição administrativa de caçar em terrenos particulares é preciso pagar para o estado 2,5 por cento da contribuição predial relativa aos terrenos onde se pretende a prohibição.

§ unico. Ao requerimento em que se pedir a prohibição juntar-se-ha sempre o recibo de se haver pago a quota a que este artigo se refere e bom assim a certidão de achar-se paga a contribuição predial do ultimo anno e relativa aos terrenos onde se pretende a prohibição e documento comprovativo da qualidade em que assa prohibição é pedida.

Art. 20.° No requerimento em que se pedir a prohibição administrativa mencionar-se-ha sempre a qualidade em que o requerente a pede, as confrontações dos terrenos, os nomes dos proprietarios, os numeros da matriz predial e a superficie total dos mesmos terrenos.

§ unico. Estas declarações serão extractadas no alvará de prohibição.

Art. 21.° A prohibição administrativa de caçar em terrenos particulares será publicada por meio de editaes afixados, um na porta da administração do concelho e outro na das igrejas das freguezias a que os terrenos pertençam, e o alvará será publicado em tres numeros do Diario do governo e em tres de um jornal da séde do concelho, havendo-o, á custa do requerente.

§ 2.° O alvará não será entregue ao requerente sem que tenham sido apresentados os numeros dos jornaes onde se fez a publicação, o que no referido alvará será mencionado por averbamento.

Art. 22.° O que pretender a prohibição administrativa do caçar fará para isso uma declaração ao escrivão de fazenda e requererá a liquidação da quota a que se refere o artigo 19.°

§ unico. Na declaração serão mencionadas as confrontações dos terrenos onde se pretende a prohibição e os respectivos numeros da matriz predial, o que será tambem exarado no recibo do pagamento, do qual constará a importancia da contribuição predial que pagam os terrenos

Art. 23.° Até ter sido apresentada na repartição de fazenda do concelho, por quem requereu a prohibição, declaração de que quer que ella termine, será annualmente passado conhecimento especial para pagamento da quota a que se refere o artigo 19.°

§ unico. Quando não seja paga a quota mencionada n'este artigo, os escrivães de fazenda remetterão á administração do concelho, onde foi concedida a prohibição, certidão de ella não haver sido paga para os effeitos do artigo seguinte.

Art. 24.° A prohibição administrativa caduca quando deixe do se pagar a quota annual a que se refere o artigo anterior, ou quando mude o rendeiro dos terrenos, quando a prohibição lhe tenha sido concedida, ou o rendeiro da casa, se este a não sublocar ou quando o predio seja transmittido por titulo oneroso.

Art. 25.° Por cada alvará só póde ser concedida a prohibição de caçar em terrenos particulares continuos ou contiguos e, quando pertençam a proprietarios ou rendeiros differentes, é necessario para isso auctorisação especial de cada um.

Art. 26.° Para que se torne effectiva a prohibição administrativa de caçar, a que se refere o n.º 3.° do artigo 17 °, é necessario que nas extremas dos terrenos, sejam collocados disticos com á designação vedado, bem patente e com letras de altura não inferior a 2 decimetros, de 100 em 100 metros em terrenos descobertos e de 50 em 50 metros em terrenos cobertos, quando a sua superficie for superior a 50 hectares, o de 50 em 50 metros em terrenos descobertos e de 20 em 25 metros em terrenos cobertos quando a sua superficie for inferior a 50 hectares e o comprimento de cada lado das extremas for superior a estas distancias, porque quando o comprimento das extremas for inferior deverá haver um distico ao meio d'ella.

§ 1.° Os disticos estarão collocados a, pelo menos, 1m,50 do solo.

§ 2.° Nos terrenos em. que haja prohibição administrativa de caçar deverá haver, pelo menos, um guarda ajuramentado nos termos do artigo 56.°, não podendo accumular a guarda de outros terrenos.

Art. 27.° Quando caduque a prohibição administrativa de caçar pelos motivos mencionados no artigo 24.° ou por declaração expressa feita na administração do concelho e repartição de fazenda respectiva, o requerente é obrigado a pagar a quota mencionada no artigo 19.° relativa ao tempo da prohibição.

§ unico. A terminação da prohibição será annunciada pela forma por que esta o foi, determinada no artigo 21.° e a despeza paga pelo individuo ou individuos a requerimento de quem foi concedida.

Art. 28.° A prohibição administrativa de caçar nos terrenos publicos, municipaes ou parochiaes será annunciada pela forma mencionada no artigo 21.°

Art. 29.° É permittida prohibição especial de caçar em terrenos applicados á exploração da caça viva para repovoação ou para industria.

§ 1.° Para a concessão d'esta prohibição e em tudo o mais é applicavel o que fica disposto relativamente á prohibição administrativa de caçar em terrenos particulares, salvo o disposto nos paragraphos seguintes.

§ 2.° A designação nos disticos a que se refere o artigo 26.º é substituida pela palavra "reservado".

§ 3.° Para poderem ser concedidas estas prohibições é preciso pagar para o estado 5 por cento da contribuição predial relativa aos terrenos em que se pretenda a prohibição.

Art. 30.° Aquelle ou aquelles a requerimento de quem foi concedida prohibição de caçar em terrenos particulares são responsaveis pelos damnos causados pela caça.

§ unico. O proprietario ou usufructuario é solidariamente responsavel com aquelles a quem cederam ou arrendaram o direito de caçar.

Art. 31.° À responsabilidade mencionada no artigo anterior cessa, provando-se que se empregaram todos os meios para evitar os damnos ou que o damnificado semeou uma cultura especial para attrahir a caça ou demorou a colheita mais tempo que o costume.

Art. 32.° Nos terrenos publicos, municipaes ou parochiaes, em que o direito de caçar seja exceptuado admi-

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6 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

nistrativamente, será tambem obrigatoria a collocação dos disticos a que se refere o artigo 26.º

Art. 33.° Se os signaes indicativos da prohibição de caçar forem destruidos por malvadez ou por incidentes fortuitos, não perde o proprietario os seus direitos provando que cumpriu o preceituado no artigo 26.°, mas fica obrigado a repor o distico no praso de um mez.

Art. 34.º Será permittido que os donos de propriedades confinantes se reunam para pedir a prohibição de caçar n'essas propriedades.

Art. 35.° O direito de caçar nos terrenos vedados administrativamente pertence a quem tiver pedido a prohibição o ás pessoas a quem elle previamente tiver auctorisado por escripto; nos predios murados, ou vedados por sebe viva ou morta, arame, ferro ou madeira, pertence ao proprietario, emphytenta ou usufructuario.

Art. 36.° Se o animal ferido ou perseguido se refugiar em predio murado ou vedado e ahi for morto pelos cães que vão em sua perseguição, o caçador póde exigir que o dono do predio ou quem o representar, estando presente, lh'o entregue ou permitta que o vá buscar, mas sem nenhum séquito, e o mesmo succederá quando o animal ahi cair morto.

§ unico. Se, porem, o animal se refugiar, ferido, em predio murado ou vedado e não for morto pelos cães, não poderá o caçador ir buscal-o sem licença do possuidor do predio ou de quem o representar, estando presente.

Art. 37.° O caçador é responsavel pelo damno que causar.

§ 1.° Sendo mais de um caçador, são todos solidariamente responsaveis pelos damnos.

§ 2.° O facto da entrada dos cães em predio murado ou vedado independentemente da vontade do dono, em seguimento do animal que haja penetrado no dito predio, só produz a obrigação de mera reparação dos damnos que causarem.

§ 3.° A acção para indemnisação de perdas e damnos causados pela caça prescrevo passado um auno a contar do dia em que elles foram commettidos, e para indemnisação das perdas e damnos causados pelos caçadores ou cites a caçar prescreve passados 90 dias, excepto se se provar que, apesar de se terem empregado todas as diligencias, não foi possivel durante este praso conhecer o auctor das perdas e damnos, porque, n'este caso, o praso para a prescripção conta-se desde que se teve esse conhecimento.

CAPITULO III

Da veda

Art. 38.° Nos districtos do Lisboa, Beja, Castello Branco, Evora, Faro, Leiria, Portalegre, Santarem e nos das ilhas adjacentes, é prohibido caçar desde o dia 1 de março a 14 de agosto inclusive, e nos restantes districtos desde o dia 1 de março a 31 de agosto inclusive.

§ 1.° Nos terrenos abertos povoados de pomares e vinhas estende-se o periodo da prohibição até ao fim da colheita dos respectivos fructos.

§ 2.° Poderá, porem, ser pormittida pelos governadores civis a caça ás codornizes depois do dia 1 de julho nos campos ou lezirias que estejam de pousio ou onde tenham sido já levantadas as colheitas.

Art. 39.° O proprietario ou possuidor de predios murados ou vedados por forma que a caça de pello não possa entrar ou sair livremente póde caçar essa especie de caça n'essas propriedades por qualquer modo ou em qualquer tempo.

Art. 40.º É permittido aos proprietarios e cultivadores destruir em qualquer tempo nos seus terrenos cultivados os animaes bravios, que só tornarem visivelmente prejudiciaes ás suas sementeiras e plantações.

§ 1.° Para poderem usar da faculdade concedida n'este artigo deverá ser pedida licença á auctoridade administrativa, a qual a concederá depois de se informar de que o motivo allegado é verdadeiro e marcará para aquelle effeito um certo numero de caçadas e um praso para a sua realisação.

§ 2.° Igual faculdade têem os proprietarios e cultivares com relação ás aves domesticas, no tempo em que nos campos houver terras semeadas, ou cereaes, ou outros fructos pendentes em que possam causar prejuizo.

Art. 41.° É permittido destruir os animaes damninhos ou nocivos, podendo dar-se-lhes caça em todo o tempo e por qualquer processo.

§ unico. Consideram-se animaes damninhos ou nocivos, o lobo, o lynce, o javali, a raposa, a lontra, o texugo, o tourão, a fuinha, o gato, a doninha, o rato, a águia, o abutre, o falcão, o gavião, o milhafre, o bufo, o corão, a gralha, a pega, o gaio e o melharaco ou abelharuco.

Art. 42.° O individuo a requerimento de quem foi concedida prohibição para caçar em terrenos destinados á exploração de caça viva para repovoação ou industria póde approhendel-a por qualquer forma e em qualquer epocha.

Art. 43.° Somente é permittido caçar desde o começo do crepusculo da manhã ao fim do crepusculo da tarde excepto ás aves aquáticas do arribação, que poderão caçar-se de noite a tiro.

Art. 44.° É permittido caçar a salto com ou sem cães de mostra, e ás lebres e coelhos tambem a corricão.

§ unico. É prohibida a caça da perdiz a corricão ou a sua perneguição a cavallo.

Art. 45.° É prohibido, no exercicio da caça, o uso ou emprego de substancias venenosas, corrosivas ou inebriantes assim como de reclamos, abuizes, laços, fios, redes, ramos, esperas, ratoeiras, chozes, furões, perdigões ou perdizes de chamada ou qualquer outra especie de armadilhas ou artificios.

§ 1.° Igualmente é prohibido apprehender ou matar os animaes bravios na occasião das roças de mato, das queimadas ou quando se achem cercados pela agua das cheias.

§ 2.º É prohibida a venda de armadilhas a que este artigo se refere.

§ 3.° É prohibido caçar por qualquer processo quando os terrenos se achem cobertos de neve.

§ 4.° Os administradores do concelho podem conceder licença para caçar com furão.

Art. 46.° É prohibido apropriar-se ou destruir em todos e quaesquer predios, os ninhos, ovos, ninhadas, ou creação de caça de qualquer especie.

Art. 47.° É prohibido caçar ou destruir os pombos correios em todo o tempo e por qualquer processo, salvo o disposto no § 2.° do artigo 40.°

Art. 48.° Por serem uteis á agricultura é prohibido matar ou apprehender por qualquer forma as seguintes aves: alveloas, andorinhas, gaivões, guinchos ou ferreiros, papa moscas, toutinegras, fulosas, fuinhos, rouxinol, philomelas, rabiruivos, piscos, caiadas, cartaxos, petinhas, carriças, solitarios, estrellinhas, chapins, cedovom, foguete, trepadeiras ou marinheiras, pica-paus, papa-formigas, ou torcicolo, rabilongo, rollieiro, cotovias, carreirolas, pintasilgos, cegonhas, lavandiscas, milheiriços e noitibo.

§ unico. Os governadores civis poderão conceder auctorisações especiaes a pessoas de sua confiança, para em todo o tempo apprehenderem aves de qualquer especie, ninhos, ou ovos, comtanto que seja com um fim reconhecidamente scientifico ou util.

Art. 49.º É prohibido deixar caçar os cães durante a veda, ou em qualquer tempo utilisar para o exercicio da caça os cães de guarda de rebanhos.

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CAPITULO IV

Transporte e venda

Art. 50.º É prohibida a receptação, transporte, compra ou venda de qualquer especie de caça prohibida durante o tempo defeso, excepto nos tres primeiros dias.

Art. 51.° É prohibido vender, transportar ou receptar caça que não tenha sido morta pelos processos permittidos n'esta lei.

Art. 52.° As buscas para apprehensão de caça só podem ser feitas nos hoteis, hospedarias, lojas e domicilios dos negociantes de comestiveis, fabricas de conservas, nos domicilios dos individuos reconhecidos como caçadores furtivos, nas estações de caminhos de ferro, nas das e legares abertos ao publico, e a caça apprehendida será entregue ao estabelecimento de bemficencia mais proximo do local da apprehensão.

Art. 53.° Os proprietarios de caça a que se refere o artigo 29.º podem transportal-a e vendel-a mediante auctorisação, por escripto, do administrador do concelho a que pertence a propriedade.

CAPITULO V

Fiscalisação

Art. 54.° A superitendencia para a execução d'esta lei compete aos governadores civis, administradores do concelho ou bairro, commissarios de policia, aos commandantes das secções da guarda fiscal e aos agronomos e silvicultores officiaes.

Art. 55.° Poderão tambem fiscalisar o cumprimento d'esta lei os socios das associações de caçadores que estejam para isso superiormente auctorisados.

Esta auctorisação será concedida pelo governador civil por meio de alvará, em virtude do pedido feito pela direcção das referidas associações.

Art. 56.º São fiscaes directos d'esta lei os regedores, os fiscaes do governo junto das companhias de caminhos de ferro e os empregados dos caminhos de ferro do estado, officiaes de diligencias judiciaes e administrativos, policias, guardas fiscaes, cantoneiros das estradas, guardas campestres florestaes ou ruraes, guardas fluviaes, cabos de policia e os guardas particulares ajuramentados.

As associações de caçadores poderão nomear guardas-caça especiaes, os quaes prestarão juramento perante o juiz de direito da respectiva comarca com officio do presidente da direcção das referidas associações.

Os guardas particulares poderão ser ajuramentados, para os effeitos da fiscalisação d'esta lei, a requerimento do proprietario ou arrendatario dos predios ou da caça.

Art. 57.° Os empregados aduaneiros, os fiscaes do sêllo e quaesquer empregados administrativos ou das contribuições indirectas serão considerados como fiscaes accidentaes da lei de caça e deverão levantar o respectivo auto todas as vezes que no exercicio das funcções do seu cargo encontrem infracções da presente lei.

CAPITULO VI

Disposições geraes

Art. 58.° Os governadores civis em casos extraordinarios e por motivo de ordem publica poderão suspender as licenças para caçar concedidas no seu districto.

Art. 59.° A auctoridade districtal poderá interdizer uma determinada especie de caça pelo espaço de tempo que achar conveniente para evitar a extincção da mesma especie.

Art. 60.° Os administradores de concelho ou bairro têem o dever do mandar publicar editaes recordando o cumprimento d'esta lei, quinze dias antes de começar o concluir a veda, sem que o não cumprimento do disposto n'este artigo isente das obrigações impostas n'esta lei.

Art. 61.° Sempre que haja apprehensão de armadilhas de qualquer especie, serão estas mandadas destruir pela auctoridade competente.

Art. 62.° Quem passar com cães por predio vedado deverá leval-os presos ou acamados.

CAPITULO VII

Fórma do processo

Art. 63.° Os administradores do concelho ou bairro quando recebam ou mandem levantar qualquer auto por infracção da presente lei, remettel-o-hão, no praso de oito dias, ao delegado do procurador regio da comarca onde ella tenha sido commettida.

§ 1.° Se ao administrador do concelho ou bairro for apresentada qualquer queixa por infracção da presente lei, mandará levantar o outro e procederá a competente investigação no praso de oito dias, quando as testemunhas sejam residentes no concelho ou bairro e, em igual praso, remetterá o auto ao delegado do procurador regio da comarca onde a infracção foi commettida.

§ 2.° Quando as testemunhas forem de concelho ou bairro differente mandará lavrar o competente auto de queixa, que no referido praso remetterá ao delegado do procurador regio para este promover a formação do respectivo corpo de delicio.

Art. 64.° Os individuos a que se referem os artigos 55.°, 56.° e 57.°, logo que encontrem ou tenham conhecimento de qualquer infracção da presente lei, levantarão d'isso o competente auto, que terá fé em juizo até prova em contrario.

§ unico. Igualmente terão fé em juizo, até prova em contrario, os autos que forem mandados levantar pelas auctoridades mencionadas no artigo 54.°

Art. 65.° Os autos a que se refere o artigo antecedente e seu paragrapho serão enviados ao administrador do concelho, ou bairro no praso de quarenta e oito horas.

Art. 66.° Quando a qualquer infração da presente lei for unicamente applicavel a pena de multa, poderá esta ser voluntariamente paga pelo infractor perante a auctoridade onde pender o processo, sendo cobrada pelo minimo, suspendendo-se o seu proseguimento.

§ unico. Só o processo estiver pendente do poder judicial ao pagamento da multa accresce o das respectivas custas.

Art. 67.° Compete aos juizes de paz da situação dos bens conhecer de todas as questões sobre perdas e damnos causados pela caça e pelos caçadores.

§ 1.° Só têem recurso para o juiz de direito as acções de valor superior a 50$000 réis, e as de valor indeterminado.

§ 2.° Quando haja reconvenção o valor da acção é o do pedido na acção principal.

§ 3.° Quando a acção seja cumulativamente tentada por varios individuos, o valor da acção é o da somma de todos os pedidos.

Art. 68.° Quem pretender ser indemnisado das perdas e damnos causados pela caça ou pelos caçadores ou seus cães, fará para isso um requerimento ao juiz de paz expondo os fundamentos do pedido e o valor do damno, indicando até cinco testemunhas e juntando quaesquer documentos.

Art. 69.° O responsavel será citado para, no praso de cinco dias, apresentar no cartorio a sua defeza por escripto, indicando logo até cinco testemunhas e juntando quaesquer documentos.

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§ unico. Se o citado não apresentar a sua defeza no praso indicado, será, sem inais formalidades, condemnado no pedido e d'esta sentença não haverá recurso.

Art. 70.º Se, em sua defeza, o citado só contestar o valor da indemnisação, o juiz mandará citar as partes para, perante elle e no dia, hora e local que designar, não excedendo a cinco dias, nomearem arbitradores para avaliarem a, indemnisação.

§ 1.° A avaliação será feita por tres arbitradores, sendo um nomeado pelo auctor, outro pelo réu e o terceiro pelo juiz, devendo este, em caso de empate, conformar-se com um dos valores dados.

§ 2.° Os arbitradores hão de ser dos judiciaes da comarca e residentes na area da jurisdicção do juiz do paz, e não podem ser recusados, salvo sendo pães ou irmãos de alguma das partes, devendo a recusa ser feita no acto da nomeação.

§ 3.° Quando na area da jurisdicção do juiz de paz não haja arbitradores judiciaes suficientes para a avaliação, serio nomeados outros quaesquer individuos idóneos n'ella residentes.

Art. 71.° Nomeados os arbitradores serão estes intimados paru, no praso do oito dias, apresentarem no cartorio certidão da avaliação.

§ unico. A requerimento fundamentado dos arbitradores póde ser prorogado até quinze dias o praso para apresentação da certidão.

Art. 72.° Apresentada a certidão, o juiz, no praso de cinco dias, dará a sentença condemnando na indemnisação segundo a avaliação.

Ari. 73.º Quando tenham de ser inquiridas testemunhas, a inquirição será feita pelo juiz no praso de quinze dias.

§ unico. Quando tenha tambem de haver avaliação será ella feita em harmonia com os artigos anteriores.

Art. 74.° O depoimento das testemunhas só será escripto quando o valor da indemnisação pedida exceder á alçada do juiz.

§ unico. Quando mesmo o pedido exceda a alçada do juiz, deverá o depoimento das testemunhas ser só verbal se as partes declararem que prescindem do recurso.

Art. 75.° No praso de tres dias depois da inquirição e depois da avaliação, quando tenha logar, irão os autos conclusos para sentença, que será proferida no praso de oito dias.

Art. 76.º A acção por indemnisação de perdas e damnos póde ser intentada cummulativamente por varios individuos, quando a causa do damno for a mesma e contra o mesmo ou mesmos individuos.

Art. 77.° Quando não sejam encontradas bens para pagamento da indemnisação e custas, póde a sua importancia ser substituida por prisão á rasão de 1$000 réis por dia.

§ unico. Fará se dar esta substituição, deve ella ser requerida pelo exequente, devendo o juiz de paz remetter os autos ao juiz da comarca, o qual, distribuido o processo, mandará dar vista d'elle ao ministerio publico, o qual, promoverá a aubstituição nos termos e pela forma estabelecida para o pagamento das custas na lei do 4 de maio de 1896, não podendo a prisão exceder a quatro mezes.

Art. 78.° Todos os delictos e contravenções previstas n'esta lei serão perseguidos perante os tribunaes competentes pelos respectivos agentes do ministerio publico, podendo tambem sel-o por qualquer parte interessada e o processo competente é o de policia correccional.

CAPITULO VIII

Disposições penaes

Art. 79.° Incorre na pena de prisão correccional de cinco dias a tres mezes de multa de 10$000 a 30$000 réis:

1.° O que caçar sem licença, passada e registada nos termos do artigo 5.° e § 1.°;

2.° O que caçar durante os mezes que por esta lei é prohido o exercicio da caça;

3.° O que, em qualquer tempo caçar por qualquer dos modos prohibidos n'esta lei.

Art. 80.° Incorre na pena de tres a trinta dias de prisão e multa de 6$000 a 30$000 réis:

1.° O que, sem ter auctorisação para vedar, collocar quaesquer signaes indicativos de probibição de caçar;

2.° Os que, tendo auctorisação para vedar, abrangerem com os signaes maior extensão de terreno do que aquella para que a auctorisação foi dada.

3.° Os que conservarem os signaes de prohibição passados trinta dias depois de ter caducado a respectiva concessão;

4.° Quem infringir o disposto do artigo 43;

5.° O que, sem licença do proprietario ou arrendatario da caça, caçar em terrenos murados ou vedados, ou que estando em propriedade sua ou anotorisada, ou estrada, publica, ou particular, fizer caçar os cães em terrenos circumjacentes e vedados;

6.° O que importar, vender ou subministrar qualquer armadilha para a apanha da caça, e igualmente o que as transportar ou conservar em casa quando não sejam para collecções;

7.° Os proprietarios ou cultivadores que abusarem da anctorisação a que se refere o artigo 40.° e seus paragraphos.

Art. 81.° Será punido com a multa de 60000 a 10$000 réis:

1.° O que se apoderar da caça agarrada pelo cão em tempo defeso;

2.° Aquelle que durante o tempo da veda deixar vaguear os cães pelos campos sem acamo ou atrellados;

3.° O que, tendo licença, não a apresentar quando lhe for pedida pelas pessoas para isso auctorisadas pela presente lei;

4.° O que apanhar caça pertencente a outrem e se recusar a entregar-lh'a;

5.° O dono do predio murado, ou vedado, ou quem as suas vezes fizer que eó recuse a entregar a caça pertencente ao caçador;

6.° O caçador que entrar sem licença a caçar em predio murado ou vedado;

7.° O que infringir as disposições dos artigos 49.° e 50.°;

8.° O que vender, transportar ou receptar caça que tenha sido morta pelos processos prohibidos.

Art. 82.° Incorrem na pena de multa estabelecida no artigo antecedente, quando o transporte seja feito pelo caminho de ferro, os chefes da estação onde for feito o despacho e os conductores dos comboios onde seja feito o transporte, e os chefes das estações de recepção, e quando o transporte seja pela via fluvial o dono, o commandante ou patrão do respectivo barco.

Art. 83.° Incorre na multa de 20000 a 6$000 réis:

1.° Quem infringir as disposições do artigo 62.°;

2.° Quem infringir as disposições do artigo 48;

3.° O que sem licença do dono ou quem as suas vezes fizer, caçar ou seguir animal ferido em terrenos cultivados abertos durante a epocha em que se achem semeados de cereaes ou de outra qualquer sementeira ou plantação annual;

4.° O que caçar ou seguir animal ferido em terrenos que se achem de vinha desde o tempo em que as plantas começam a abrolhar, até á colheita do respectivo fructo;

5.° O que caçar em pomares desde o começo da maturação dos fructos até á sua colheita.

Para proseguir por qualquer das infracções punidas nos n.ºs 3.°, 4 ° e 5.°, é preciso queixa do offendido.

Art. 84.° No caso de primeira ou segunda reincidencia

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de qualquer infracção da presente lei, a pena nunca será inferior a dois terços do maximo da applicavel.

No caso de terceira ou mais reincidencias a pena poderá ser elevada ao triplo do maximo da applicavel sem alteração da forma do processo, não podendo comtudo ser inferior ao maximo da applicavel pela primeira condemnação e na de privação de licença para caçar por tempo não inferior a dois annos nem superior a cinco.

No caso de condemnação de setima, ou mais reincidencias o delinquente, depois de cumprida a pena, será entregue á disposição do governo para lhe dar- o destino mencionado no artigo 10.° da lei de 21 de abril de 1892 o não lhe poderá ser concedida fiança.

Art. 85.° No caso de não ser, possivel apprehender as armas, como determina o artigo 15.°, ou de não ter sido apresentada a licença no praso de quinze dias, concedidos para a sua apresentação, será o delinquente condemnado no mesmo processo correccional na quantia de 10$000 réis de malta per cada arma, como indemnisação peia não apprehensão das mesmas armas.

Art. 86.° Os pães ou tutores são responsaveis civilmente pelo pagamento da indemnisação de damnos, multas e custas do processo impostas ou provenientes de actos praticados em infracção da presente lei pelos filhos menores ou pelos tutelados.

Art. 87.° A obrigação de pagamento das multas por transgressão d'esta lei passa aos herdeiros do contraventor quando a sentença tenha passado em julgado.

Art. 88.° Das multas que forem impostas e pagas pertencerá um terço ao denunciante, um terço ao encarregado da fiscalisação que fizer a autuação e um terço ao estado.

Quando não haja denunciante, dois terços da multa pertencerão ao empregado da fiscalisação que fizer a autuação, e no caso da participação ser feita directamente a qualquer das auctoridades encarregadas da superintendencia da execução d'esta lei, os dois terços da multa pertencerão ao participante.

Art. 89.° O procedimento criminal por contravenções ou delictos previstos n'esta lei, prescreve no praso de um anno.

Art. 90.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 20 de abril de 1900.=O deputado, José Paulo Monteiro Cancella.

Foi admittido e enviado á commissão de administração publica.

O sr. Presidente: - Constando-me que está nos corredores da camara o sr. deputado eleito Emygdio Julio Navarro, convido os srs. Francisco de Medeiros e Ovidio de Alpoim a introduzirem-n'o na sala.

Foi introduzido, prestou juramento e tomou assento.

O sr. Dias Costa: - Como a sessão legislativa vae já muito adiantada, poucos projectos têem sido discutidos, e as sessões vão agora ser em mais pequeno numero, visto a camara dos dignos pares ter de reunir mais vezes, parece-me conveniente que esta camara mude as horas das suas sessões para hora diversa d'aquella em que costuma funccionar a camara dos dignos pares, reunindo-se de manhã ou de noite, como v. exa. achar mais conveniente, comtanto que a parte destinada aos trabalhos da ordem do dia ou da noite não seja nunca inferior a duas horas e meia.

Obedecendo a esta ordem de considerações, formulei uma proposta que vou mandar para a mesa, e peço a v. exa. que se digne consultar a camara sobre se á considera urgente.

Proposta

Proponho que até ao fim da presente legislatura fique auctorisado o exmo. sr. presidente, nos dias em que funccionar a camara dos dignos pares do reino, a marcar para a sessão da camara dos deputados hora diversa da que vem designada no artigo 49.° do regimento, por fórma, porém, que o espaço de tempo destinado em cada sessão, para a discussão da ordem do dia, ou da noite, não seja inferior a duas horas e meia. = Francisco Felisberto Dias Costa, deputado pelo circulo n.° 39 (Arouca)

(S. exa. não reviu.)

Consultada a camara, foi a proposta considerada urgente, entrando em seguida em discussão.

O sr. João Franco: - Pedi a palavra simplesmente para declarar que a opposição regeneradora acompanhará os trabalhos da camara, embora considere violento o systema que se pretende estabelecer.

O sr. Presidente: - Como não ha mais nenhum sr. deputado inscripto, vão votar-se a proposta.

Foi approvada.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Dantas Baracho para dirigir ao sr. ministro da guerra as perguntas a que se refere o seu aviso previo mandado para a mesa na sessão de 6 de abril.

O sr. Dantas Baracho: - Antes de entrar no assumpto do seu aviso previo, pergunta se já chegaram os documentos que pediu, pelo ministerio das obras publicas, em 4 de abril.

O sr. Presidente: - Responde que ainda não chegaram.

O Orador: - Pede que se inste pela remessa d'estes documentos, porque lhe são indispensaveis para entrar na discussão do orçamento.

Chama tambem a attenção do sr. ministro da guerra para o requerimento que apresentou, ha dois ou tres dias, pedindo copia do relatorio da commissão especial, encarregada de formular um projecto de lei de promoções.

O seu intuito, pedindo este documento, é requerer que elle seja publicado no Diario do governo, para que toda a camara o possa apreciar; o julga que não haverá inconveniente n'esta publicação, porque tem visto largos extractos d'elle nos jornaes.

Passando a occupar-se do assumpto do seu aviso previo, refere-se em primeiro logar á substituição do alferes Lima, de infanteria n.° 13, que estava em diligencia em Moncorvo, quando ali se tratava da eleição de um deputado.

Consta, pelos jornaes, que aquelle alferes foi substituido por não querer auxiliar uma prisão arbitraria, exigida pelo administrador do concelho.

Este facto mostra como a disciplina do exercito é mantida no consulado do sr. Sebastião Telles.

Os officiaes que têem tio boa folha de serviços que se recommendam á consideração dos seus superiores e da opinião publica, são tratados por similhante forma.

Em 27 de março o sr. José de Azevedo pediu informações a este respeito, e o sr. ministro da guerra prometteu dal-as, quando as recebesse, pois que o assumpto era da alçada do general da respectiva divisão.

A este respeito tem a observar, em primeiro logar, que o sr. ministro da guerra parece querer cobrir-se com os generaes de divisão, quando é s. exa. que os deve cobrir. A camara não tem nada com os generaes; tem com o governo, que é obrigado a dar-lhe explicações.

Em segundo logar, julga que o sr. ministro deve já estar suficientemente informado sobre o caso, e por isso pergunta s. exa. se sabe quaes foram as causas determinantes da substituição do alferes Lima; se o general procedeu em virtude das informações do commandante do corpo a que aquelle official pertence, ou se attendeu apenas ás reclamações da auctoridade administrativa.

É preciso que s. exa. dê explicações cabaes a este respeito.

O segundo ponto do seu aviso previo é o da substituição do capitão Magalhães do mesmo regimento.

Este official, que, segundo as informações que tem, é dignissimo, foi substituido, quando estava aboletando a

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força de cincoenta praças com que acabava do chegar a Moncorvo para policiar uma assembléa eleitoral d'aquelle circulo.

Representa esta substituição a exauctorisação do capitão Magalhães, e deu-se porque o sr. governador civil de Bragança dirigiu ao governo um telegramma, dizendo-lhe que elle não me merecia confiança.

Nunca se viu isto em parte alguma! É um facto attentatorio do brio e decoro militares, e, por consequencia, altamente prejudicial á disciplina.

Disse o sr. ministro da guerra, respondendo em tempo ao sr. Teixeira de Sousa e ao sr. Avellar Machado, que ella official é conhecido como um politico exaltado!

É possivel que já chegássemos a uma epocha tão decadente que se peçam contas da politica que segue quem serve honrada e dignamente no exercito?

O orador apresenta ainda algumas considerações, commentando o facto de ter de se repetir a eleição de Moncorvo quatro vezes, apesar do governo ter sempre affirmado que providenciaria para que aquella eleição corresse com toda a legalidade, e mostrando a conveniencia de que seja empregada de preferencia a policia para manter a ordem. Se assim se tivesse sempre praticado, ter-se-iam evitado muitas vozes, como aconteceu em Cezimbra, que as forças militares fizessem, no justo direito do manterem a sua dignidade, algumas victimas.

Voltando a fallar do capitão Magalhães, diz que convem saber-se se este official é ou não digno da espada que traz á cinta, tornando-se, portanto, necessario que o sr. ministro da guerra diga se o general da divisão procedeu em virtude das notas biographicas do mesmo militar, as quaes devia ter pedido ao commandante do corpo, ou se procedeu em virtude das reclamações da auctoridade administrativa.

É tambem necessario que s. exa. diga como procedeu para com o general, se elle só afastou das boas doutrinas militares.

Para concluir, e vendo já presente o sr. ministro das obras publicas, pede a s. exa. que lhe envie os documentos que requereu em 4 de março, e que lhe são indispensaveis para a discussão do orçamento.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Elvino de Brito): - Hoje mesmo assignei o officio de remessa da documentos, que, provavelmente, estarão na mesa dentro do alguns minutos.

O sr. Presidente: - Achando-se nos corredores da camara o sr. deputado eleito Franco Frazão, convido os srs. deputados conde de Caria e Correia Mendes a introduzil-o na sala para prestar juramento.

Foi introduzido, prestou juramento e tomou assento.

O sr. Mastro da Guerra (Sebastião Telles): - Com relação ao relatorio da commissão de promoções, tem a declarar que o mandou imprimir em folheto, o que prova que o seu intuito é dar-lhe toda a publicidade. Quando a impressão estiver concluida, será o folheto remettido para a camara.

Quanto ao caso de alferes Lima, póde informar que no dia seguinte aquelle em que lhe foram feitas as perguntas, recebeu cio general commandante da 2.ª divisão a participação de que tinha havido conflicto entro o commandante a diligenciar e a auctoridade administrativa, e de que, sendo nececsario que a diligencia continuasse na localidade, mandáram render o commandante.

Ordenou-lhe elle, orador, que mandasse syndicar dos acontecimentos.

Está se procedendo a esta syndicancia, cujos resultados ainda não chegaram ao ministerio da guerra, e é este o motivo por que ainda não póde dar mais informações á camara.

Com respeito ao caso do capitão Magalhães, de que já se tratou na sessão de 26 de março, disse então o que tinha a dizer, e julgava o incidente findo. Tanto assim é que o sr. deputado tratou hoje a questão noa mesmos termos, accrescentando apenas alguns commentarios que não a esclarecem.

A esto respeito tem a ponderar que não disse ser aquelle official um politico exaltado. Quem o disse foi o sr. governador civil de Bragança.

Pela sua parte, o que disse foi que o facto de ser politico exaltado não deslustrava um official, como tambem não desauctorisava qualquer militar uma substituição determinada, como n'aquella de que trata, por circumstancias especiaes.

Disse ainda o sr. deputado que o general da divisão devia consultar o commandante do corpo. Pois não consultou, e fez bem. Para fazer o que estava na sua alçada não tinha que fazer tal consulta. O general merece-lhe toda a confiança, e está certo de que elle não praticava qualquer acto contra a disciplina

Depois de outras considerações declarou o orador que não vem acobertar-se com os generaes; muito ao contrario, assume a responsabilidade dos seus actos, emquanto julgar que procederam bem; declarava mais que tambem desejaria que houvesse a policia necessaria para só manter a ordem publica, mas não tem sido possivel conseguir-se isto, attento o grande augmento de despeza, que d'ahi resultaria. Observando que, se os srs. deputados vem occupar-se na camara d'estas questões insignificantes do serviço interno dos quarteis, é porque não têem outras com que possam atacal-o. Felicita-se por isto.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. o restituir.)

O sr. Dantas Baracho: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se consente que eu uso novamente da palavra.

(Consultada a camara, resolveu negativamente.)

O sr. Barbosa de Magalhães: - Mando para a mesa as seguintes propostas

Propostas

Proponho que seja aggregado á commissão de administração publica o sr. deputado José Paulo Monteiro Cancella. = Barbosa de Magalhães.

Proponho que seja aggregado á commissão de legislação civil o sr. deputado João Catanho de Menezes. = Barbosa de Magalhães.

Foram approvadas.

O sr. Luiz José Dias: - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre a proposta do lei n.° 5-E, que tem por fim modificar a situação dos chefes dos serviços fazendeiros districtaes o concelhios.

Foi a imprimir.

O sr. Presidente: - Tem a palavra para um negocio urgente o sr. Luciano Monteiro.

O sr. Luciano Monteiro (para um negocio urgente): - Teve hoje noticia de que no Algarve, proximidades de Castro Marim, se desenvolveu uma invasão do gafanhotos, o que é de superior gravidade pelos prejuizos de que, por esse motivo está ameaçada a agricultura.

Não sabe se o sr. ministro das obras publicas tem conhecimento do facto em todo o caso, communica a noticia a s. exa., e pede-lhe que, se ella é verdadeira, tome providencias urgentes para evitar o desenvolvimento do mal, o que lhe parece facil, no começo da invasão.

Vae agora fazer uma pergunta para sua elucidação.

No começo da semana passada apresentou um anno previo dirigido ao sr. presidente do conselho. No regimento não se marca claramente o praso de vinte e quatro horas para os ministros virem responder, mas da redacção ao

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artigo 58.° póde deprehender-se que o praso é este. Em todo o caso o sr. presidente do conselho não compareceu nem depois de decorridas vinte o e quatro horas, nem depois de decorridas as quarenta e oito.

O sr. Presidente: - Pede licença para interromper o orador.

O Orador: - Diz que só quando saia da ordem, o sr. presidente o póde interromper. Pergunta se saiu da ordem.

O sr. Presidente: - Responde que s. exa. está effectivamente saindo da questão.

O sr. deputado tinha pedido a palavra para um negocio urgente e para a mesa dizer que o negocio urgente era a noticia de uma invasão de gafanhotos no Algarve.

N'essa occasião, elle, presidente communicou a s. exa. o motivo por que o sr. presidente do conselho não podia vir hoje á camara, accrescentando que contava comparecer ámanhã.

Ora, tendo s. exa. declarado qual o negocio urgente de que desejava occupar-se, e havendo-lhe sido concedida a palavra só para esse fim, desde que o sr. deputado pretende tratar de outro assumpto a presidencia está no seu direito de chamar o sr. deputado á questão, apesar da muita consideração que lhe dedica.

O Orador: - Julga que o sr. presidente está sendo victima de um equivoco da sua memoria.

Precisa dar uma explicação, porque das palavras de s. exa. póde inferir-se que elle, orador, foi menos leal.

Quando entrou hoje na camara, recebeu um aviso do que o sr. presidente desejava fallar-lhe. Subiu á presidencia, e ali s. exa. lho communicou, sem lhe dizer o motivo, que o sr. presidente do conselho não podia comparecer hoje.

Ouvindo esta declaração, nada disse; mas, tendo apresentado um aviso previo, e tendo já decorrido tantos dias depois d'isso, quusera, sem a menor idéa de critica, fazer uma pergunta para sua elucidação.

(Susurro. Trocam-se ápartes.)

O sr. Presidente: - Peço ao illustre deputado um momento de attenção.

S. exa. attribuiu-me um lapso de memoria.

Efectivamente, na confusão que por vezes se dá na mesa, antes de se abrir a sessão, é possivel dar-se qualquer esquecimento, e tambem, não é para estranhar que agora não tenha bem presente tudo o que se passou na conversação que tive com o sr. deputado.

Ainda assim, recordo-me de que pedi a s. exa. que subisse á mesa para lhe dizer o motivo por que o sr. presidente do conselho não podia comparecer hoje.

Em todo o caso, desde que a palavra lhe foi concedida para um unico assumpto, que reputou urgente, exposto este assumpto, não póde s. exa. occupar-se de outro, e a presidencia cumpre o sou dever chamando-o a questão. O sr. presidente do conselho telegraphou-me dizendo que não póde vir hoje á camara por incommodo de saude, como tencionava, mas que conta vir ámanhã.

Tambem s. exa. me pediu que fizesse esta communicação ao sr. Luciano Monteiro e ao sr. Fuschini.

Dito isto, dou por encerrado o incidente, e vou dar a palavra ao sr. ministro das obras publicas.

(Trocam-se ápartes.)

O Orador: - Vae sentar-se, reconhecendo mais uma vez que a falta do sr. presidente do conselho é fundamental.

(O discurso será publicado na integra guando s. exa. o restituir.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Elvino de Brito): - Sr. presidente, eu pedi a palavra para dizer ao illustre deputado, sr. Luciano Monteiro, que logo que por s. exa. soube o que tinha succedido mandei immediata mente chamar o sr. director geral de agricultura para me informar do facto a que s. exa. alludira, e para lhe assegurar que póde o illustre deputado ter a certeza de que, com a mesma solicitude com que procurei no anno findo providenciar para a exterminação do gafanhoto, hei de ccupar-me do assumpto para que s. exa. chamou a minha attenção, porque entendo que elle é realmente grave merece toda a attenção do governo. Posto isto, quero ainda ainda dar ao illustre deputado uma noticia, que de certo lhe será agradavel. O anno passado tomei diversas providencias pelo ministerio para debellar o mal que assolou o Alemtejo e o Algarve, mas não estava então munido das faculdades que hoje possuo, pois no decreto de 23 de dezembro de 1899 tive o cuidado de ornar extensivas a todos os flagellos as medidas que o governo estava auctorisado a adoptar quanto ao phyloxera, por isso, não obstante o auxilio prestado pelas camaras municipaes e por muitos proprietarios que coadjuvaram o governo na extincção dos males a que ha pouco me referi,- folgo de poder prestar, n'este momento, a homenagem publica do meu reconhecimento para com esses proprietarios a quem o governo tanto deve - o governo não tinha acção tão facil e proficua como actualmente.

Termino, dizendo ao illustre deputado que ámanhã ou n'uma das proximos sessões virei, espontaneamente, dar conta a s. exa. do que houver passado sobre este assumpto.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Presidente: -Vae passar-se á ordem do dia. Convido os srs. deputados a enviar para a mesa os papeis que tinham a apresentar.

O sr. Mathias Nunes: - Declaro que vou mandar lançar na caixa respectiva um requerimento do medico naval inspector, Manuel Rodrigues de Oliveira, e outro do medico naval sub-chefe, Achilles de Almeida Navarro, em que pedem o restabelecimento das disposições do artigo 162.° do decreto de 14 de agosto de 1892, que foi suspenso, mas não revogado pela carta de lei de 30 de junho de 1893.

Recommendo estes requerimentos á consideração da commissão a que elles têem de ser presentes, porque os pedidos n'elles feitos se me afiguram de toda a justiça.

O sr. Marianno de Carvalho: - Mando para a mesa uma representação da caçadores residentes na cidade de Setubal contra o projecto de lei sobre a caça.

Peço a v. exa. que se digne consultar a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.

Teve o destino indicado no respectivo extracto, que vae publicado no fim da sessão.

O sr. Mello e Sousa: - Mando tambem para a mesa varias representações contra o projecto de lei sobre a caça, dos corpos gerentes da associação protectora da caça, da associação dos portuguezes, do club dos caçadores de Braga, dos caçadores de Ourique, dos caçadores das Caldas da Rainha, dos caçadores de Azambuja, dos caçadores de Villa Franca de Xira e do club da Figueira da Foz.

Como o sr. Marianno de Carvalho, peço igualmente a v. exa. que se digne consultar a camara sobre se permitte a sua publicação no Diario do governo.

Tiveram o destino indicado no fim da sessão.

O sr. Catanho de Menezes: - Mando para a mesa os seguintes

Avisos previos

"Peço que seja avisado o sr. ministro da marinha de que o deseja interrogar sobre a navegaçõo entre Lisboa e, o archipelago da Madeira, e circumnavegação d'esta ilha. = J. Catanho de Menezes."

"Peço que seja avisado o sr. ministro da fazenda de que o desejo interrogar sobre o regimen de introducção do melaço na ilha da Madeira, e sobre a exigencia agora

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feita ás camaras municipaes das quotas com que algumas concorriam para as juntas geraes do disiricto, na conformidade do codigo administrativo de 1886. = J. Catanho de Menezes."

Mandaram-se expedir.

O sr. Cabral Moncada: - Mando para a mesa uma representação dos caçadores portuguezes contra o projecto de lei sobre a caça.

Peco a v. exa. se digne consultar a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.

A representação vae por extracto no fim da sessão.

O sr. Antonio de Vasconcellos: - Mando para a mesa uma representação dos empregados administrativos do concelho de Mertola, pedindo que sejam garantidos aos actuaes empregados administrativos os direitos adquiridos á data da publicação da lei de 26 de julho ultimo.

Peço a v. exa. se digne consultar a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.

A representação vae por extracto no fim da sessão.

O sr. Malheiro Reymão: - Mando para a mesa uma representação dos empregados da repartição de fazenda do districto de Vianna do Castello, contra a proposta de lei que regula a aposentação dos empregados civis.

Peço a v. exa. se digne consultar a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.

A representação vae por extracto no fim da sessão.

O sr. Paulo Falcão: - Mando para a mesa uma representação da classe dos industriaes ferreiros e serralheiros da cidade do Porto contra a proposta de lei relativa á contribuição industrial na parte que lhe diz respeito.

Peço a v. exa. se digne consultar a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.

A representação vae por extracto no fim da sessão.

O sr. Adriano Antnero: - Mando para a mesa o seguinte

Aviso previo

Desejo interrogar o sr. ministro da fazenda sobre algumas disposições do regulamento da contribuição de registo e lei e regulamento do sêllo. = Adriano Anthero.

Mando para a mesa uma representação dos fabricantes de distillação de alcool na cidade do Porto e em Villa Nova de Gaia, contra a proposta vinicola, na parte que lhes diz respeito.

Peço a v. exa. se digne consultar a camara sobre se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.

O aviso previo mandou-se expedir e a representação vae por extracto no fim da sessão.

O sr. Domingos Tarroso: - Mando para a inesa uma representação das irmjisinhas dos pobres, pedindo que sejam livres de direitos de importação 33 toneladas de ferro em vigas, destinadas ao edificio do asylo dos velhinhos em Campolide.

A representação vae por extracto no fim da sessão.

O sr. Francisco Machado: -Participo a v. exa. que vou mandar lançar na caixa respectiva um requerimento de Augusto Maria Branco, tenente coronel do quadro auxiliar, pedindo que lhe sejam applicaveis as disposições da lei da perequação.

O sr. Visconde da Ribeira Brava: - Mando para a mesa um projecto de lei auctorisando a camara municipal do concelho da Vidigueira a converter os seus dois actuaes emprestimos n'um só; e bem assim a applicar do seu fundo especial de viação a quantia de 2:500$000 réis ás obras necessarias para abastecer de aguas potaveis a freguezia de Villa de Frades.

Este projecto é tambem assignado pelos srs. Francisco Ravasco, Antonio de Vaseoneellos e Fialho Gomes.

Ficou para segunda leitura.

O sr. Conde de Burnay: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, sejam enviados, com urgencia, a esta camara, por copia, os seguintes documentos:

Actas das sessões do conselho da companhia dos tabacos de Portugal de 17 e 21 de janeiro de 1897 (já foram requisitadas na sessão de 14 de abril de 1899).

Officio do conde de Burnay á direcção geral da thesouraria do ministerio da fazenda, datado de Paris, em 25 de setembro de 1897.

Telegramma do director geral da thesouraria do ministerio da fazenda ao conde de Burnay, em Paris, datado de 30 de setembro de 1897.

Carta do conde de Burnay ao exmo. sr. conselheiro Augusto Ernesto da Fonseca Gollaço, director substituto da direcção geral da thesouraria, de 15 de maio de 1898.

Officio da direcção geral dá thesouraria de 10 de maio de 1898, á casa Henry Burnay & Ca.

Officio de Henry Burnay & Ca., de 13 de maio de 1898, á direcção geral da thesouraria.

Officio do secretario geral do ministerio da fazenda a Henry Burnay & Ca., de 16 de maio de 1898.

Nota das transferencias de fundos para o estrangeiro, realisadas pelo thesouro ou por sua conta, desde 1 de janeiro de 1897 até ao presente, especificando as importancias, as datas, os cambios, as commissões, e os nomes das entidades com quem se realisaram as operações.

Mappas das cotações officiaes, diarias, dos cambios sobre Londres, desde 1 de janeiro de 1897 até ao presente.

(Estes documentos já foram pedidos na sessão de 15 de maio de 1899.)

Correspondencia trocada entre a direcção geral da thesouraria e o conde de Burnay, ou a firma Henry Burnay & Ca. acêrca dos quatro pagamentos feitos á dita firma, constantes da nota da dita direcção geral, de 10 de maio de 1899, apresentada n'esta camara em sessão de 29 do mesmo mez pelo deputado o sr. Ressano Garcia.

(Estes documentos já foram pedidos na sessão de 14 de junho de 1899.) = Conde de Burnay.

Mandou-se expedir.

O sr. Presidente: - Os srs. deputados Marianno de Carvalho, Mello e Sousa, Cabral Moncada, Antonio de Vasconcellos, Malheiro Reymão, Paulo Falcão e Adriano Anthero pediram que eu consultasse a camara sobre se permittia a publicação no Diario do governo das representações que mandaram para a mesa.

Vou consultar a camara n'este sentido.

Foi auctorisada a publicação.

ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do capitulo 1.° do projecto de lei n.° 14 (orçamento geral do estado para o anno economico de 1900-1901)

O sr. João Franco: - Sr. presidente, tenho a boa fortuna de me seguir, no uso da palavra, ao illustre deputado e meu amigo o sr. dr. Arthur Montenegro; e chamo boa fortuna a esse facto, porque - fallo com sinceridade. - posso assim prestar-lhe a homenagem do meu respeito e da minha admiração pelos seus talentos, pela sua illustração e pelo seu caracter. (Apoiados geraes.)

Não costumo ser prodigo de elogios, exactamente para que aquelles, poucos, que faço, possam porventura ter, ao menos, o merecimento de serem justos e sinceros;

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tambem não costumo faltar á minha consciencia nem ao tributo que se deve á verdade, e quando elogio rasgadamente o caracter e os merecimentos do illustre deputado é porque realmente o considero, do entre os novos d'esta camara, um dos mais distinctos e um dos mais estimados. (Apoiados.)

O que não posso, porém, é acompanhar o illustre deputado e meu amigo nos seus enthusiasmos, a que parlamentarmente poderei chamar juvenis, pelo orçamento que está em discussão e pela situação financeira do thesouro.

O diploma que se discute, o orçamento, é de ha muito um diploma que, devendo encerrar em si a maior verdade e merecer ás camaras a maior attenção e cuidado, de facto nem satisfaz a uma nem a outra d'estas condições. (Apoiados.)

Mas se desgraçadamente isso assim tem acontecido, se o descredito em que o orçamento e a sua discussão têem caldo entre nós podem ser justificados, nunca, como hoje, o são, (Apoiados.) apesar de, segundo a declaração tantas vezes repetida pelo sr. José Luciano de Castro, cuja falta eu sinto pelos motivos que lhe dá origem, a missão principal d'este governo ter sido restaurar o imperio da legalidade, tão offendida e menosprezada pelos seus antecessores.

Para não me referir a outros factos, para não sair da materia que está em discussão e alludir simplesmente ao orçamento - sabe v. exa. o que tem sido esse respeito e amor pela legalidade da parte dos ministrou da fazenda collegas de s. exa., e especialmente da parte do actual, o sr. Espregueira? Tem sido o seguinte.

Ha tres annos 23:000 contos de réis de titulos de divida publica portugueza têem sido vendidos pelo governo, sem nunca se haver pedido auctorisação ao parlamento, (Apoiados.) sem nunca se lhe ter dito que queria fazer-se essa emissão e essa venda, e, assim, sem se fixarem as condições em que o governo o poderia fazer. (Muitos apoiados.)

Venderam-se 23:000 contos de réis de divida interna e externa, nas circunstancias que aos ministros aprouve, ás pessoas a quem elles muito bem quizeram, sem limite de maximo encargo, ou de minimo preço, hoje, ámanhã, consecutivamente, como muito bem. aprazia. (Apoiados.)

O governo de que fiz parte póde effectivamente ser accusado de não ter sido um observador exacto e fiel da constituição, no que se refere ao funccionamento do poder legislativo; mas o que alie não fez, foi convocar o parlamento só para lhe arrancar auctorisações dê reformas de serviços, que depois se vão fazer a talante e a gosto dos srs. ministros e clientela, sempre com augmento de despeza; e ao mesmo tempo vender 23:000 contos de réis de titulos de divida publica portugueza, sem conhecimento algum do parlamento, sem nunca se ter munido de poderes que auctorisassem tal emissão, o que não tem precedentes absolutamente nenhuns na nossa historia' constitucional. (Apoiados.)

Eu bem sei que o sr. Ressano Garcia quiz sustentar já que o sr. Hintze Ribeiro tinha vendido titulos durante a sua gerencia. Essa coarctada teve resposta cabal e completa e não se póde estar sempre a repetir as mesmas palavras e os mesmos argumentos.

Efectivamente succedeu que o governo de 1892 caucionou, com titulos em opção, um supprimento, e no vencimento o credor usou da opção, dando origem este facto á alienação dos titulos.

Mas o que nunca ninguem fez, foi vender titulos como o tem feito o actual ministro da fazenda, vendendo-os aos guichets dos bancos, ao desbarato, a qualquer financeiro, para com o producto cobrir despezas ordinarias, sem sequer se aperceber com a auctorisação necessaria para fazer um emprestimo, porque só a nação podia auctorisar .os encargos d'esta operação, visto que á nação cumpre pagal-os. (Apoiados.)

Portanto, desde que, sem auctorisação e sem conhecimento do parlamento, o sr. ministro da fazenda entende vender de uma só vez 8:500 contos de réis de inscripções, como fez ainda em dezembro, para applicar o seu producto a despezas geraes do estado, para que serve estarmos aqui a discutir o capitulo das receitas do orçamento, calculando as em 52:000, 53:000 ou 54:000 contos de réis, se nós vemos que o sr. ministro da fazenda não tem pejo, nem pudor de empregar os processos que lhe apraz, para ter as receitas que quer, vendendo titulos ao desbarato? (Apoiados.)

Vale bem a pena que um illustre ornamento d'esta casa, o sr. Arthur Montenegro, gasto o seu tempo, o seu estudo e a sua illustração, para justificar que está bem calculada uma tal verba do orçamento, que este ou aquelle imposto deve render 30 ou 40 contos mais, quando o sr. ministro da fazenda, com a maior facilidade, sem ter em conta as leis, nem os precedentes, nem os bons principios de administração publica, arranja 2:000, 3:000 ou 4:000 contos de réis de receita, aquillo de que carece, com o producto da venda de inscripções a 29, 30 ou 31, pelo preço, emfim, que póde alcançar? (Apoiados)

Para que é, pois, este trabalho?

Chega mesmo a ser ridiculo, chega a ser desprestigiador do parlamento estarmos a entreter sessões e sessões seguidas na discussão do orçamento, para fixar as receitas do estado, quando o sr. ministro da fazenda arranja as receitas que quer, para que esta folgança, esta orgia possam continuar! (Muitos apoiados.)

E o que digo em relação ás receitas, repete-se com as despezas. Para que discutir se n'este ou n'aquelle ministerio, se n'esta ou n'aquella repartição, as despezas eventuaes podem ser de o ou 7 contos, se deve haver um servente a mais ou a menos, se cabe dar uma gratificação a este ou aquelle empregado, quando tudo isto é minimo, insignificante, em comparação do facto do sr. ministro da fazenda, sem auctorisação nenhuma, sem mesmo dar contas ao parlamento, estar pagando todos os semestres - como aqui foi provado por um documento lido pelo sr. Teixeira de Sousa-os coupons de uma companhia particular, na importancia de centenas de contos?! (Muitos apoiados.)

Tal facto poderá ser justificavel; mas quem auctorisou o sr. ministro da fazenda a proceder assim?

Então se s. exa., para gastar centenas de contos com o pagamento de coupons de uma companhia particular, julga poder prescindir do voto do parlamento, para que vem pedir esse voto para dar 200$000 ou 300$000 réis a um empregado qualquer? Se o sr. ministro da fazenda entende que na administração do estado não ha senão uma lei, que é o seu arbitrio e vontade, abreviemos por completo a discussão de um diploma que para nada serve, porque n'elle se occulta propositadamente a verdade, e não nos occupemos do ninharias na discussão de receitas e despezas, que não são verdadeiras.

No discurso do illustre deputado, feito com todo o enthusiasmo em defeza do governo, uma affinnação houve que vem ainda corroborar o que estou dizendo. S. exa. não podendo justificar o calculo das receitas feito no orçamento, contrariamente ao que mandam os principios do regulamento de contabilidade, como foi demonstrado pelo srs. Mello e Sousa, Teixeira de Sousa e Abel de Andrade, disse, com uma certa surpreza minha, por vir de quem vinha a affirmação, que não se importava com o que diz o regulamento de contabilidade, porque nós aqui podemos alterar esse regulamento, como podemos alterar qualquer lei.

Assim comprehendo eu como foi calculado este orçamento. Então cada um de nós é um poder legislativo, com sancção real e tudo! Eu estava costumado a ouvir, e tinham-me ensinado, que, effectivamente, o poder legislativo tem a seu cargo interpretar e fazer leis.; mas é o po-

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der legislativo; não é cada um dos membros d'esse poder, isoladamente, que póde absolver o governo do qualquer illegalidade com o fundamento de que ao parlamento compete fazer leis.

A lei do paiz tem de ser observada por todos. Os preceitos legaes de contabilidade não podem ser alterados pelo ministro, nem essa alteração póde ser defendida por um deputado, com o fundamento de que somos membros do poder legislativo. Emquanto forem leis têem de ser observadas; e se o seu contexto não agrada aos intuitos e pensamento do governo, o que elle tem a fazer é propor a sua alteração; mas esta tem de ser feita pelo poder legislativo, constituido pelas duas camaras; tem do ser sanccionada pelo rei; e se então é que se fica dispensado de obedecer ao que se achava estabelecido.

N'esta afirmação de s. exa., que é tão illustrado e deve ler um criterio firme e assente em assumptos de jurisprudencia, não vejo senão a impossibilidade de justificar o defender um diploma, que, como tenho vindo demonstrando, nem sequer as impõe ao parlamento por ser tão mau como o dos seus antecessores. (Apoiados.) E cá estamos caldos na velha o relha questão do que fizeram os regeneradores, do que elles despenderam.

Tenho seguido com toda a attenção o debate, quer por parte da opposição, quer por parte da maioria, e vejo que a preoccupação constante, o cuidado do sr. ministro da fazenda e dos seus defensores, não é justificar os actos da administração de s. exa. e mostrar, por argumentos directos, que esta administração tem sido boa e que a situação do paiz e auspiciosa; mas é insinuar que, peor do que eu e, fizeram os regeneradores. Emquanto assim correr o debate, tenho-o dito muitas vezes e hei de continuar a dizel-o, como protesto contra similhante processo de argumentação, elle não encobre senão a falta de rasões para defender actos que são absolutamente condemnaveis. (Apoiados.) Pois então, quando assim fosse, o paiz havia de ser o eterno ludibrio de progressistas e regeneradores? Elles haviam de ficar absolvidos, desde o momento que provassem que, se uns andaram mal, peor tinham andado os seus antecessores? Então em Portugal não ha mais ninguem? Pois tal principio, se é verdadeiro, poderia justificar os actos do governo? O que se ha de esperar outro dos governos que hão de vir, sejam elles quaes forem? (Apoiados.) Em materia de precedentes, para justificar e defender as administrações que vierem, este governo deixa margem para tudo quanto se queira. (Apoiados.) Pretende o governo, que lho succeda, vender titules, fazer emprestimos? Não precisa de vir ao parlamento, a exemplo do que foz o actual governo. (Apoiados.) Quer emprestar dinheiro a companhias para pagar os seus coupons) Tambem não é precisa lei, nem auctorisação das cortes, porque o governo actual deixou assim, nos fastos da administração publica, precedentes bastantes para se poderem desviar á vontade muitas centenas de contos de veio. Quer alargar comarcas, ou crear comarcas novas, quer fazer generaes pintados, quer fazer, emfim, toda a serie de loucuras e destemperos? é o termo. Bastará pagar nos annos da administração d'este governo e apontar as precedentes que ella deixa. (Apoiados.)

Ha de haver só uma dificuldade, e essa consiste em imital-o, em igualal-o. (Apoiados.) Ha de custar a encontrar n'este paiz homens publicos que tenham a coragem do praticar os actos a que só têem abalançado os actuaes ministros. (Apoiados.)

Mas, quando assim fosse, tal desculpa, tal justificação não poderia ser admittida, e para salvação do paiz é necessario que, de uma vez por todas, condemnemos aqui o processo do defender os actos de um governo com o que fizeram os seus antecessores. (Apoiados.) O que se tem feito nos ultimos annos é de tal forma e natureza que, e este principio mio for condemnado, não só pela opposição regeneradora, por este ou aquelle grupo, mas pela camara inteira, faço a prophecia de que não torna a haver ordem, nem regularidade na administração publica. (Apoiados.) No dia em que homens bastante audazes e movidos por motivos estranhos aos interesses publicos, se senhorearem d'aquellas cadeiras, farão de nós o que quizerem, sem que ninguem lhes possa ir á mão.

Mas, sr. presidente, esses miseraveis regeneradores que augmentaram muito as despezas publicas no consulado de 1893 a 1897, não estão governando n'este momento, não é o orçamento, por elles apresentado, que se discute; não consinto, pois, que se invertam os papeis e que, quem deve defender-se dos erros que está praticando, venha atacar pretensos erros passados.

Direi, entretanto, que osso consulado de 1893 a 1887 deixou no seu activo, para comprovar a sua administração financeira, quatro factos de uma importancia o de um valor, como talvez nenhum outro ministerio constitucional portugaez dos ultimos tempos possa allegar em sua defeca.

Foi esse governo que fez o convenio de 1893 com os credores externos, cortando uma questão embaraçosa de momento e deixando-a em termos que, ha sete para oito annos decorridos, está financeiramente rogularisada a situação d'esses credores; e fel-o sem recorrer a emissões abusivas de titulos de divida publica, fel-o por tal forma que esse convenio, por um lado, cortou cerce todas as reclamações e todas as perturbações que a reducção do juro tinha provocado, e por outro lado não foi tão mal calculado o encargo por parte dos que o propozeram o por parte dos que o votaram, que as circumstancias não tenham demonstrado que estava em harmonia com as forças do paiz, que o tem podido pagar até hoje.

Foi o mesmo ministerio que, rompendo subitamente, n'uma das nossas mais prosperas colonias uma revolta de gentio, a que porventura não eram estranhos elementos europeus, encontrou, sem recorrer ao credito estrangeiro, dentro do paiz, recursos proprios e meios sufficientes para poder mandar á Africa a melhor, a mais completa e bom armada expedição que lá tem ido, (Apoiados.) o cujos resultados, devidos ao brilhantismo do nosso exercito, se fizeram sentir na Europa inteira, (Apoiados.) o que foi observado e dito, não pelos jornaes e pelos amigos do governo, mas pelos estrangeiros, na presença do chefe do estado, que n'essa occasião viajava na Europa e teve ensejo do apreciar como o nome portuguez se tornava a levantar e como de novo apparecia a confiança na melhoria dos nossos destinos.

Foi ainda esse governo que arrancou ao banco de Portugal os 9:000 contos de réis das obrigações dos tabacos que lá tinham sido empenhadas o sobre ellas conseguiu recursos novos para o thesouro e lançar a base pêra a acquisição e reforma do material da nossa marinha de guerra, que ha mais de quinze annos estava abandonada dos poderes publicos.

Foi, finalmente, devido á sua previdente sabedoria, - não tenho duvida em dizel-o apesar de ter sido membro d'esse governo - que se deixaram aos seus successores 72:000 obrigações dos caminhos de ferro, conservadas religiosamente em vista da indemnisação da Berne, que nós teriamos forçosamente de pagar, e que hoje permittem ao actual governo e ao paiz solver esta responsabilidade, (Apoiados.) mostrando-se assim, por um exemplo de previdencia, que não é o mais usual na historia da nossa administração, que nós, os ministros de 1883 a 1897, duas vezes salvámos de um manifesto descalabro o nosso dominio e o nosso imperio colonial. (Apoiados.)

Quando alguem, repito, accuse aqui a administração d'esse minibterio, cabe-me o dever e tambem a honra de a defender; mas n'este momento não consinto que sejam invertidos os termos da questão, e que, em logar de discutirmos os actos do governo, que são maus, como o governo é incapaz de administrar bem, se analysem e discutam os actos de um governo, que já não existe, e que na

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contextura, que então teve, certamente não tornará a existir.

Sr. presidente, qual é o estado da fazenda publica? E o que importa á camara e ao paiz, e a todos que se interessam pela nação portugueza.

Qual é o estado da fazenda publica no momento actual?

Foi o que ao sr. ministro perguntou o sr. Mello e Sousa, meu querido amigo e distinctissimo parlamentar, que a um estudo aprofundado dos assumptos reune uma sinceridade verdadeiramente inexcedivel na maneira como os apresenta ao parlamento. (Apoiados.)

O sr. Mello e Sousa descreveu a situação da fazenda publica em dois traços largos e simples, facilmente perceptiveis para todos. (Apoiados.) Não é necessario ser um financeiro ou fazer jogos malabares com milhares e milhares de cifras para comprehender desde logo as duas proposições, que compõem o thema exposto pelo sr. Mello e Sousa a esta camara. (Apoiados.) S. exa. disse que a nossa situação actual, dada a proporção entre os encargos da divida publica e o montante das receitas, era ou mais grave ou sensivelmente tão grave como era nas véspera da bancarota de 1892; (Apoiados.) que então, não se podendo com essa situação, houve de fazer-se reducção nos juros da divida publica, e que hoje poderá succeder o mesmo, se continuarmos n'este caminho. (Apoiados)

S. exa. mostrou ainda que, se as receitas têem crescido, muito mais têem crescido as despezas, e que d'esta forma têem sido inuteis os novos aggravamentos de impostos, e que com o accrescimo constante e desproporcionado das despezas mais se abre a voragem que de um momento para o outro nos poderá submergir. (Apoiados.)

Como respondeu a isto o sr. ministro da fazenda?

Disse que aos encargos da divida publica se devia abater a importancia do imposto de rendimento sobre os titulos da divida interna, cujos juros estão orçados pela sua totalidade, e que d'esses encargos deviam tambem deduzir-se os juros dos titulos na poáse da fazenda. Mas tudo isto já fez o meu amigo sr. Abel de Andrade, e chegou á conclusão, agora irrespondivel, a não ser que novos argumentos sejam apresentados pelo sr. ministro da fazenda, fundados em factos e não em jogos de cifras, de que a nossa situação, sob o ponto de vista da proporção entre as receitas publicas e os encargos da divida, era nas vésperas da bancarota de 43 por cento e hoje é de 41,5 por conto.

Para que, sr. presidente, empregar tantos subterfugios de argumentação, se, não obstante o aggravamento dos impostos, chegámos a uma situação, que, segura e positivamente, nos indica que, a continuarmos assim, na gerencia dos dinheiros publicos, ella nos conduzirá fatalmente á bancarrota? (Apoiados.) E, se não estamos tão perto d'ella, se ella não vem tão breve como já se tem annunciado, é porque ao lado da questão financeira ha a questão economica; o thesouro nada tem feito para melhorar a situação financeira, mas o paiz - honra lhe seja, gloria se lhe deve - tem trabalhado desde 1891 a esta parte, com intelligencia, com tenacidade; (Apoiados.) e, juntando a estas qualidades as suas naturaes tendencias de economia e parcimonia no gastar, facilmente se comprehende como se creou rapidamente uma verdadeira riqueza industrial, o que tem sustentado, póde dizer-se, as populações operarias, (Apoiados.) o povo de Lisboa e do Porto, perante o accrescimo notavel do preço das substancias mais necessarias á alimentação. (Apoiados)

Alem d'isso, como observou, e muito bem, o sr. Mello e Sousa, ao passo que a divida fluctuante em 1890-1891 estava quasi toda no estrangeiro, hoje, ainda que muito mais avultada, não é, na maior parte, de prompto exigivel, por se representar em successivas emissões de notas do banco de Portugal. Mas, não tenhamos illusões, sr. presidente; se continuarmos n'este caminho, nada nos podera livrar de que as mesmas causas venham a produzir os mesmos effeitos.

Tem a actual situação progressista empregado algum esforço para diminuir as despezas publicas a fim de aproveitar os accrescimos das receitas?

Tambem o sr. Mello e Sousa respondeu a este ponto, fazendo a comparação dos numeros representativos de receitas e de despezas nos orçamentos de 1896-1897 e no que foi apresentado este anno pelo sr. Espregueira.

Em quatro annos, sr. presidente, as receitas cresceram 3:991 contos, 4:000 contos de réis, numeros redondos; mas as despezas cresceram 6:711 contos de réis!

Veja o contribuinte portuguez para que serve o dinheiro que se lhe vão buscar pelo ultimo addicional, pela ultima rede de arrastar, a lei do sêllo, e pelo augmento de outras contribuições, para tudo desapparecer na voragem dos desperdicios, aggravando cada vez mais a situação da fazenda publica, distanciando assim a possibilidade de qualquer remedio que mais tarde se lhe queira applicar. (Apoiados.)

Pois o sr. ministro da fazenda, em resposta ao sr. Mello e Sousa, só teve para dizer, que os orçamentos da situação regeneradora eram falsos e o seu é que era verdadeiro.

Sr. presidente, que um deputado, no uso de uma liberdade que o seu logar lhe permitte e consente, possa appellidar de falso um diploma qualquer apresentado ao parlamento, é cousa que póde deixar de merecer censura. Mas que um ministro da fazenda tenha, em relação a um orçamento apresentado á camara por um dos seus antecessores, o desplante e a audacia de o capitular de falso, só é explicavel quando não poder ter em resposta cousa alguma a demonstrar que, falso por falso, mais falso é o feito por elle; (Apoiados da esquerda.) e não ha de ser com argumentos, mas com a simples enunciação de factos, que hei de provar que o sr. ministro da fazenda não póde atirar accusações d'estas aos seus adversarios.

O anno passado, sendo já ministro da fazenda, por todo o anno, o sr. Espregueira, apresentou ás camaras um orçamento, em que calculava a receita e a despeza para o anno corrente.

Estão publicadas as contas da gerencia d'esse anno, vem no Diario do governo de 6 de outubro de 1899.

Sabe v. exa. como se apresenta o producto das receitas, calculadas pelo sr. ministro da fazenda, depois de ver a audacia com que elle chamava falso um diploma que tinha sido apresentado por um dos mais respeitaveis homens que se tem sentado n'aquellas cadeiras? Ha de pensar-se que as receitas foram as que estavam calculadas. Pois, sr. presidente, foram inferiores em 1:126 contos de réis ás calculadas pelo sr. ministro da fazenda.

Note v. exa. que essa gerencia foi prospera. Se isto succedeu com respeito ás receitas, imagine-se o que foi com relação ás despezas, que o proprio ministro declarou ainda ha pouco ser a parte mais fallivel das previsões orçamentaes.

Se o sr. Espregueira não tem melhores argumentos a produzir, a affirmação apresentada pelo sr. Mello e Sousa fica de pé, para demonstrar que têem sido inuteis todos os augmentos naturaes de receita, todos os appellos ao contribuinte, e que a nossa situação, igual á de 1890- 1891, está como nas vésperas da bancarota e mais se aggrava dia a dia, com este crescer constante e desenfreado das despezas publicas.

E quem é o culpado d'isto? E o sr. Espregueira. Digo o sr. Espregueira; e vou dar a rasão porque E errado, principalmente em Portugal, attribuir o augmento das despezas e o desequilibrio da fazenda publica exclusivamente á acção do ministro da fazenda. Eu já o fui durante oito mezes e vi que a sua acção é tão pouco efficaz em relação ás despezas ordenadas pelos differentes ministerios que a mim mesmo prometti que não mais occuparia esse logar. Desde que o ministro da fazenda não póde pôr o voto ás

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despegas effectuadas pelos seus collegas, ou desde que nós, infelizmente, nem pelo respeito ás leis, nem pelos tradições parlamentares e politicas, temos o costume de fazer approvar um orçamento rigorosamente calculado o de nos cingirmos ás suas auctorisações durante o anno, v. exa. comprehende que o papel do ministro da fazenda só reduz á situação triste de arranjar dinheiro para os outros gastarem. Como de situações passivas não gosto, por isso resolvi por num mesmo não mais tornar a ocoupar aquelle logar.

É este o caso do sr. Espregueira - supporta elle os resultados, as consequencias de uma administração a que tem procurado obstar, que não suscitou, que não suggestionou? Não, sr. presidente. O sr. ministro da fazenda, prégando quasi desde o primeiro dia em que se assentou n'aqnellas cadeirão o optimismo da nossa situação financeira, e annunciando-nos sempre factos demonstrativos de uma melhoria larga e intensa do estado do thesouro, convidou, por assim dizer, os seus collegas a lançarem-se na voragem das despezas e o parlamento a fechar os olhos ou criticas, ás accusações e até ás objurgatorias dirigidas contra taes processos de administração. Creou-se emfim esta lenda do uma melhoria que póde supportar o augmento de novos encargos. (Apoiados.)

É esta a responsabilidade directa, formal e importante de s. exa.. Se o sr. Espregueira se tivesse apresentado, não ao diante doe sons collegas, mas perante o parlamento, dizendo - a situação do thesouro é grave, mas não desesperada; respondo por ella, mas é absolutamente indispensavel que no não augmentum as despezas publicas - o sr. Espregueira poderia ámanhã ser victima de um cataclismo financeiro, siinilhante aquelle que assoberbou a administração do sr. Dias Ferreira em 1892; ninguem podia malquerer-lhe, exprobal-o ou censural-o. A situação de um paiz não se modifica por um golpe da magia, ou de prestidigitação. Mus desde que o sr. ministro tem sido o primeiro a proclamar por toda a parte que a nossa situação fundamental mente se modificou e onde tudo era negro, hoje é côr de rosa, onde as receitas diminuiam crescem hoje, onde nu despezas augmentavam agora diminuem, comprehende-se que os seus collegas, levados por esta tendencia de todos os ministros a fazer um nome nas pastas que regem, á parte do nome do gabinete a que pertencem, e ainda assediados pelas pretensões e instancias dos seus amigos politicos, tenham dado ao paiz este triste espectaculo da creação de comarcas, da nomeação, ás centenas, de juizes, (Muitos apoiados.) e delegados, (Apoiados.) de promoções de generaes as mais escandalosas e immoraes, (Muitos apoiados.) de despezas illegaes, desordenadas, vexatorias até, como a da exposição de Pariá, (Apoiados.) e tantos outros factos, por onde as receitas, apesar do incremento natural que têem tido, vão desaparecendo, como agua deitada n'um crivo, deixando o thesouro na situação em que o sr. Mello e Sousa pintou a traços bastante largos e simples para tudo comprehenderem e por iodos serem comprehendidos. (Apoiados.)

Não ha duvida que, principalmente a partir de fevereiro do anno passado, as receitas começaram a ter um incremento accentuado sobre as dos dois annos anteriores, não ha duvida que a abundancia de papel cambial nos ultimos tempos tem sido notavel e em maior quantidade do que era até ali; mas o que significa isto? Significa por acaso que a crise financeira do thesouro e a, crise economica do priz desappareceram? Significa que a nossa situarão em relação ao desequilibrio entre as receitas e as despesas haja, tido uma melhoria sensivel caminhando seguramente para o equilibrio? Significa o robustecimento do nosso credito no estrangeiro, onde principalmente se abalou, e que lá se tenha modificado o estado dos espiritos a nosso respeito? Não, nada d'isto se dá. (Apoiados.)

Foi um facto vulgar, banal aã historia de todas as crises economicas o financeiras dos estados, conhecido e apontado pelos publicistas, fazendo-se até o confronto entro esse facto e o que succede com as epidemias. (Apoiados.)

As epidemias, como aquellas crises, não caminham, por via de regra, nem em linha recta ascendente, nem em linha recta descendente. As linhas que as epidemias e as crises traçam na sua marcha têem curvas ascendentes e curvas descendentes, têem annos maus e têem annos melhores. Ha dias em que se regista maior numero de victimas do que em outros. Mas estos dias intercalam-se nas epidemias, assim como os annos bons e maus se intercalam nas crises economicas e financeiras. Ha certamente uma tendencia para caminhar em sentido ascendente ou em sentido descendente; mas isoladamente cada um d'aquelles factos ou d'aquellas curvas não contem em si a resolução completa e formal do problema. A affirmação opposta é uma absoluta illusão com o proposito do iiludir o paiz para viver regaladamente. (Apoiados.)

Em 1894-1895, governando então o ministerio de que eu fazia parto, tambem as circumstancias economicas do paiz permittiram que houvesse uma situação financeira melhor do que tinha havido nos dois annos anteriores; mas já em 1896-1897 circumstancias economicas influiram de modo e maneira que as receitas diminuiram, as despezas cresceram, os cambios se aggravaram e as difficuldades augmentaram, chegando-se a esse grau de penuria mais accentuado na gerencia do sr. Ressono Garcia, Depois, a partir dos fins de 1898, operou-se uma melhoria na situação economica do paiz, trazendo como consequencia uma melhoria na situação financeira do thesouro.

Preparou-a em alguma cousa o sr. ministro da fazenda, que chegou ao poder em setembro de 1898? Absolutamente em nada. V. exa. sabe como os factos economicos proseguem lentamente, para imaginar se é n'um pequeno percurso de seis ou sete mezes que se póde determinar, seja em que sentido for, uma mudança na situação financeira e economica de um paiz.

Esse resultado não pede attribuir-se senão a circumstancias de ha muito postas, a que já tive occasião de me referir. Mas sabem o que começa a succeder, o que no mez actual já se dá em relação ás receitas das alfandegas, a cujo accrescimo, quasi exclusivamente, deve o sr. ministro da fazenda o ter podido dispor de mais recursos do que o seu antecessor?

É o seguinte: até sabbado, em vinte e um dias, as receitas das alfandegas, até aqui sempre crescentes de mez para mez, em comparação com as dos mezes do anno anterior, já são inferiores em 345 contos do réis. E note v. exa. que essa diminuição accentua-se nas receitas geraes, exactamente n'aquellas que são demonstrativas do maior ou menor desenvolvimento commercial. É principalmente n'essas receitas, e não só na dos cereaes, que se dá em vinte e um dias esta importante diminuição de 345 contos de réis. Póde dizer-se que n'este mez de abril foi a semana santa, e que houve dois feriados que não houvera no mez de abril do anão passado. Dois dias de receitas das alfandegas perdidos ou ganhos é effectivamente alguma cousa de importante para o resultado final da comparação; mas ainda que se abatam 145 contos de réis, em que se póde calcular a receita d'esses dias, a diminuição ainda assim é de 200 contos de réis, o que parece pressagiar que uma nova curva decrescente se quer operar na economia do paiz, o que mais virá aggravar o problema financeiro, que o governo se diz empenhado em resolver.

Eu não quero dar aos factos maior importancia do que elles realmente têem; sei bem que não é só pela diminuição das receitas n'um mez que só pude tirar uma conclusão; mas ella póde ser já um indicador, como dizem todos aquelles que estudara a marcha das leis economicas.

Este facto poda ser um toque de rebate; e pura mim ainda cresce de importancia, quando vejo que, tendo diminuido nos ultimos annos por uma forma importante a exportação do oiro de Portugal para Inglaterra, já ao

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primeiro trimestre d'este anno voltou a accentuar-se um augmento avultado ha exportação d'esse metal, por isso que, tendo-se exportado para Inglaterra, no primeiro trimestre de 1899, segundo as estatisticas inglezas £ 53:000, n'este anno e em igual trimestre se exportaram £ 121:000, isto é, mais do dobro. Não está isto indicando tambem como que um inicio de modificação na nossa situação economica, a que de um para Outro momento póde corresponder um perigo, um embaraço, uma dificuldade financeira da maior importancia, similhante a outras que já temos tido depois de 1891 ? (Apoiados.)

Mas deu-se essa melhoria e poderá prolongar-se ainda muito mais? Oxalá, porque ou não tenho outro interesse, senão o de ver prosperar o paiz, visto que a elle tenho ligada, não só a minha fortuna, mas a de meu filho; oxalá que essa melhoria provisoria continuo e se torne definitiva. Em todo o caso ha o direito de perguntar a s. exa. como a tem aproveitado. Aproveitou-a para introduzir a ordem e a regularidade na administração do estado, onde ella de ha muito falta? (Apoiados.) Responde a isso a venda dos 23:000 contos de réis de titulos da divida publica, sem auctorisação nem conhecimento do parlamento, cousa que nunca se fez. (Apoiados.)

Nós estamos sempre a dizer que os nossos costumes politicos têem melhorado. Talvez; mas não os nossos costumes parlamentares. (Apoiados.)

Ha vinte e cinco ou trinta annos vinha aqui pedir-se auctorisação, como no tempo em que Serpa Pimentel era ministro da fazenda, para se fazer um emprestimo de 1:500 ou 1:600 contos de réis, em obrigações dos caminhos de ferro do Minho e Douro; e quando se fazia um emprestimo em inscripções era tambem sempre com auctorisação do parlamento. Então dava-se a estes actos a maior importancia e o maior valor. Pois só de uma vez o sr. miniatro da fazenda acaba de mandar vender 8 mil contos de réis em inacripções pelo preço que muito bem quiz, sem auctorisação do parlamento, sem d'isso lhe dar conhecimento; e, o que é mais extraordinario, tendo praticado um acto dos mais graves qual o da creação de titulos da divida publica, (Apoiados.) com manifesta infracção da lei, nem sequer sentiu necessidade de vir, n'um relatorio especial, explicar as rasões por que o fizera, o preço por que os vendera e para que servira o producto d'esse emprestimo (Apoiados.) Foi necessario que um deputado da opposição requisitasse na camara esses esclarecimentos, ou andasse respigando em diversos documentos apresentados ao parlamento desde fevereiro de 1897, para aqui e alem encontrar ora um milhão de libras esterlinas, ora algumas centenas de milhares de libras de titulos externos vendidos, ora a venda de inscripções, por intermedio de tal casa ou de tal banco, ou da caixa geral de depositos, emfim, um trabalho que, em boa verdade, devia pertencer ao governo, visto que é elle que tem de dar ao parlamento contas dos seus actos. (Apoiados.)

Diz o sr. ministro da fazenda, e esta é uma das suas affirmações mais favoritas, que a sua administração tem sido seria. Eu, não costumo contradizer affirmações d'esta natureza com palavras que por si nada provam; faço-o com factos e esses impõem-se tão brutalmente que é preciso reconhecel-os.

O sr. ministro da fazenda tem viajado, esteve em Paris pouco tempo antes de vir assumir a effectividade da pasta que hoje gere, conhece lá muito naturalmente financeiros e institutos de credito, tambem conhecerá homens politicos e, em todo o caso, conhece a historia governativa d'aquelle paiz, como deve conhecer a da Hespanha, da Italia, da Inglaterra, da Belgica e de tantas outras nações; pois eu pergunto a s. exa. se em algum d'esses paizes houve alguma vez ministro da fazenda que mandasse crear, por seu livre arbitrio, titulos da divida publica, e que mandando vendel-os na importancia de perto de 50 milhões de francos, carecendo de auctorisação legal, não tivesse de passar no dia seguinte, pelos maiores desgostos (Muitos apoiados.) ô não tivesse de arrostar com as mais formidaveis responsabilidades. Em toda a parte tenho visto que é cousa muito melindrosa a creação de titulos da divida publica, (Apoiados.) em toda a parte onde ha parlamento é só r este que tal póde auctorisar, e nenhum ministro ousaria lançar-se em tal caminho, creando titules para no dia seguinte os vender (Muitos apoiados.) sem auctorisação legal. No nosso proprio paiz, nunca nenhum tal fizera; só queria contrahir um emprestimo, vinha ao parlamento e dizia-lhe qual o quantitativo d'esse emprestimo, qual o typo do titulo a crear, qual o maximo do encargo a tomar, e, depois do parlamento ter auctorisado o ministro a legalmente concorrer ao mercado, é que elle realisava a operação. (Apoiados.) É procedendo assim, creando titulos a seu talante e vendendo-os ao desbarato, que o sr. ministro da fazenda quer fazer acreditar que a sua administração tem tido um cunho de seriedade e que esta ordem de serviços da administração financeira do estado está hoje mais adiantada do que estava quando tomou conta da pasta da fazenda! E o mesmo, sr. presidente, posso dizer em relação ás despezas, pela facilidade com que se mandam pagar centenas e centenas de contos de coupons de uma companhia particular sem que o parlamento o auctorise e sem que o paiz o saiba.

Eu devo declarar a v. exa. que todos os esforços são baldados, e todos os sacrificios são inuteis emquanto a administração da fazenda publica estiver regulada por maneira que taes desmandos possam continuar a dar-se, porque d'esta sorte, esforços, sacrificios, o mesmo é que deitar agua n'um cesto, sáe toda pelo fundo; o estado, se mal está, mal ficará, e o paiz pcor ainda porque terá a sobre-carregal-o o áugmento de impostos, que constantemente incidem sobre elle.

Melhorou por acaso s. exa. os impostos, pela sua equitativa distribuição? É a isso que s. exa. quer referir-se, para ter a vaidade de dizer-nos que é um ministro da fazenda superior aos que se têem sentado n'aquella cadeira?

V. exa. sabe o que a este respeito fez o sr. ministro da fazenda e faz ainda agora.

Ha dois annos o seu antecessor veiu aqui pedir auctorisação para lançar um addicional, declarando que era provisorio e só por aquelle anno. O anno passado ainda se quiz entreter o espirito publico com esta illusão. (Apoiados.) Este anno, por isso mesmo que o sr. ministro da fazenda, tanto no relatorio, como nos seus discursos, não se cansa em apregoar que a nossa situação melhora a olhos vistos e que, se continua n'este caminho - são as palavras de s. exa. - iremos á gloria, s. exa. vem propor que este imposto addicional fique permanente! (Apoiados.)

Pois se quando a situação do thesouro era peor, este addicional era temporario, e nos ficava a esperança de que em breve havia de cessar, para que vamos agora, quando a nossa situação melhorou, declarar permanente aquelle addicional? (Apoiados.)

Certamente não é por esta forma que o sr. ministro da fazenda póde arrogar-se o merito de ter emendado as desigualdades no lançamento e cobrança dos impostos, a que aqui se referiu. (Apoiados.) E eu, quando ouvia s. exa. fallar assim, perguntava a mim mesmo, que não estou desmemoriado, e que, quanto possivel, acompanho um pouco os actos da nossa administração, quando é que o actual titular da fazenda, por uma medida qualquer, procurou corrigir a desigualdade do lançamento e cobrança dos impostos? (Apoiados.)

Effectivamente esta desigualdade existe em Portugal, e é evidentemente um dos factos mais perturbadores da nossa organisação fiscal; mas o que tem feito o sr. ministro da fazenda para corrigir tal

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Vou citar um facto.

Em 1897, aqui n'este logar, combatendo um ministerio pertencente á actual situação politica, fiz a mais vigorosa opposição a uma das peores medidas que elle podia trazer ao parlamento, a renovação do contrato com a companhia dos tabacos. Levantei então, com outros membros da minoria, a questão da partilha dos lucros d'esta sociedade com o ostudo. Pois leio nos jornaes que se reune a arbitragem para resolver o que se deve á companhia das aguas; vejo que se reune a arbitragem para se fixar o que se deve á companhia da Beira Alta; e o sr. ministro da fazenda, tão preoccupado em nivelar os impostos e em fazer pagar o que se deve ao thesouro, a respeito da arbitragem da companhia dos tabacos, nem ao menos a tem feito acompanhar as arbitragens da companhia da Beira Alta e da companhia das aguas, que nos hão de custar alguns centos de contos de réis, como depois se verá. (Apoiados.) Eram estas duas mortas, e enterradas, cuja resurreição se deve á actual situação politica. (Apoiados.)

Sc não é n'isto, é por acaso n'esta rede de arrastar, chamada remodelação da lei do sêllo, que o sr. Espregueira pretende encontrar os seus titulos de gloria?

A lei do sêllo poderá ser productiva; mas dizer que ella veia, por qualquer maneira, corrigir a desigualdade que havia no imposto, é, por certo, de todas as affirmações a mais paradoxal. (Apoiados.) N'esta lei até ha disposições que não se executam, (Apoiados.) como é, por exemplo, a que diz que os titulos antigos, feitos anteriormente á publicação d'ella, e sellados em harmonia com a lei então vigente, deverão ser revalidados segundo a nova lei. (Apoiados.) Sei que não se executa esta disposição, e até podia dizer a rasão porque; mas o facto só prova uma cousa, e é que, era relação á execução d'esta lei, o sr. ministro da fazenda procede com o mesmo arbitrio com que procedeu para a venda de titulos; nada mais. (Apoiados.)

Á proposito da tão fallada contribuição predial, é certo que azemos uma lei no anno passado; eu e a opposição sustentámos que a contribuição predial urbana era susceptivel da augmonto de rendimento, por incidir sobre uma capitalisação, mas que a contribuição predial rustica, pelo contrario, affecta uma industria que é preciso continuar a proteger. (Apoiados.)

Poderá vir a acabar-se com as actuaes desigualdades, mas só depois de feitas as matrizes, se o sr. ministro da fazenda quizer e poder fazel-as, guiado por um superior criterio e sem as pressões da politiquice actual, a que tão subordinado se mostra. Por ora só vejo que o sr. ministro tem empregado uma ardilosa manha para a execução da lei. (Apoiados.)

Ora é isso que eu censuro acremente. Que se peça ao contribuinte quanto se julga que elle deve pagar, está perfeitamente, usa-se de um direito; mas o sr. ministro não faz isso, procede por uma maneira ardilosa, manhosa, de modo que o contribuinte se sinta colhido na rede sem sabor que foi por ella apanhado; e quem procede assim só procura arranjar receita por forma injusta e desleal.

Pois o que quer dizer a tentativa de executar a lei sem o regulamento necessario?

O que significa impor aos contribuintes a obrigação de apresentar as suas declarações, não dentro de um praso precisamente fixado, mas até ao dia em que se installarem as commissões?

Isto é serio? Póde admittir-se? Então os contribuintes não têem o direito de saber o dia certo até ao qual taem de apresentar as suas declarações?

Por esta forma de executar a lei, os apaniguados do sr. ministro da fazenda, que estejam no segredo da abelha á espera de que as commissões sejam ou não nomeadas, fazem á propria hora as suas declarações (Apoiados.), não as fazendo antes para não revelarem o rendimento dos eeus predios, ao passo que todos os mais, ignorantes dos verdadeiros intuitos do sr. Espregueira e receiosos das penalidades severas da lei, terão de fazer apressadamente declarações que, em qualquer hypothese, ficarão sempre nas repartições de fazenda como elemento para os comprometter e sobrecarregar. Não se cria assim uma desigualdade revoltante?

Havia um praso estipulado por uma portaria para a apresentação de declarações; mas como se levantaram resistencias, o sr. ministro da fazenda immediatamente fingiu encolher as garras (é uma figura de rhetorica que fica muito bem n'este caso), declara que esse periodo não tem valor e pouco depois expede outra portaria determinando nas declarações sejam apresentadas até á installação commissões!

Quer dizer, para mostrar a sinceridade que determina os seus actos, a maneira como quer nivelar os impostos o fazer desapparecer as desigualdades existentes, começa por dar ao contribuinte esta prova de isenção, lealdade e seriedade governativas. O que deve fazer o contribuinte? E responder pela mesma fórma -manhã por manhã.

Aqui está, sr. presidente, o que tem feito o sr. ministro da fazenda sobre impostos.

Fez-se ainda uma lei de contribuição de registo que apenas veiu complicar e embaraçar mais os actos e transacções respeitantes a propriedade immobiliaria; outra sobre contribuição de renda de casas que deixou as cousas no estado em que se encontravam. E no dominio fiscal sobre imposto de consumo, do real de agua, da decima de juros, do pescado e outros dos mais gravosos e iniquos o que tem feito o sr. ministro da fazenda? Nada, absolutamente nada; arrecada tudo o que póde apanhar e vae-o gastando, mas com menos legalidade.

O credito é outro ramo de administração financeira, em que o sr. ministro da fazenda poderia fazer reflectir a sua boa orientação.

Igualmente desastrosa se tem mostrado ahi a sua gerencia financeira.

Internamente, não ha quem empreste ao governo senão sobre caução das inscripções. Póde ser que a nossa situação seja hoje melhor, mas o que eu afianço, é que até 1897, em que deixei de ser ministro, ninguem no paiz recusava emprestimos ao governo sem caução de qualquer especie. (Apoiados.)

Com relação ao credito externo...

O sr. Presidente: - Decorreu a hora regimental. V. exa. tem ainda quinze minutos para concluir o seu discurso.

O Orador: - Tinha muito mais a dizer, mas vou abreviar as minhas considerações.

O anno passado, n'esta casa do parlamento, introduziu-se o principio de se poderem crear titulos de divida publica interna para caução de supprimentos, e eu perguntei immediatamente ao governo o que significava isso - se era um terrivel rebate do nosso descredito, mostrando que o governo só sob caução de inscripções encontrava quem lhe emprestasse dinheiro dentro do proprio paiz. O sr. ministro respondeu-me que era só para os supprimontos a realisar no estrangeiro, porque já fizera assim um supprimento em Paris e contava fazer outros. Ora, pelos contratos já lidos na camara, sabe v. exa. para que servem essas inscripções na maior parte? Para caucionar emprestimos da divida fluctuante interna.

Eis um facto que prova bem eloquentemente a seriedade das declarações do sr. ministro da fazenda e o decantado robustecimento do credito, quando, até já no paiz, ninguem se arrisca a emprestar ao governo sem penhor ou caução.

Outra affirmação insistente do sr. ministro é que os credores externos estão hoje menos exigentes, o que é tambem prova de que a nossa situação tem melhorado, e essa melhoria já se reflecte no estrangeiro. Mas, o que até hoje sei pelos jornaes estrangeiros, que não pelo governo do meu paiz, (Apoiados.) é que os credores externos nos pe-

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dem a duplicação do juro actual, dentro de um periodo de quinze annos, e representação na administração da divida publica. Se isto é melhor do que o anterior, pergunto o que nos exigiam elles? Só se era a nossa propria cabeça; eu não vejo que maiores exigencias póde haver do que estas.

Agora permitta-me v. exa. que eu me refira á projectada conversão, como sendo uma d'estas questões de tal importancia e transcendencia que, no caminho em que eu vejo marchar as cousas, póde comprometter definitivamente o futuro do paiz. (Apoiados.)

V. exa. sabe que em 1893 fez-se um convenio, um arranjo, um accordo, como quizerem chamar, com os credores externos, o qual foi convertido em lei. De então para cá os credores têem acceitado e recebido o que essa lei lhes attribuiu, sem repugnancia nem reclamação, quer da parte d'elles quer dos governos estrangeiros. Ha alguns annos julga-se conveniente modificar definitivamente essa situaçSo, substituindo os antigos titulos no mercado por titulos novos com a reducção não só do juro, mas do capital. Nunca fui hostil a essa idéa, antes pelo contrario, sempre a julguei util e conveniente. É claro que ninguem podia abalançar-se a pedir aos credores uma reducção no capital sem lhes dar em troca alguma cousa; e não permittindo as circumstancias do thesouro maior augmento de juro, só nos restava o expediente de lhes offerecer maior garantia no juro actual - e assim se pensou em fazer a consignação das receitas das alfandegas. Foram iniciadas as negociações por parte do governo, e por aqui se vê que ellas são um acto voluntario e expontaneo que elle praticou, e não filhas da necessidade de resolver qualquer conflicto. Em 1893 havia uma questão pendente entre o estado portuguez o os seus credores; ao passo que a situação de hoje é completamente diversa. Se não quizermos proseguir n'essas negociações ninguem nos obrigará a dar-lhes andamento e, se chegarmos a qualquer resultado mau, a nossa responsabilidade será tanto maior, por isso que voluntariamente fomos procurar esse resultado.

A lei de 1898 auctorisou a consignação das receitas aduaneiras á dotação da divida publica, mas a consignação não pareceu aos credores compensação bastante porque julgam suficientemente garantidos pelos governos respectivos, principalmente depois do chamado accordo anglo-allemão. Diante de factos d'esta ordem estava naturalmente indicado que, não podendo o governo portuguez dar-lhes mais nem melhor que a referida consignação e não se julgando os credores melhor garantidos por ella, o que havia a fazer era, não abandonar, mas dar uma larga paragem ás negociações, até que a situação financeira permittisse fazer outra cousa. (Apoiados.)

Não se procedeu assim; as negociações continuaram, pelo menos com as camaras abertas, mas com largos intervallos durante o verão; e, quando j á pensavamos que essa questão do convenio, a que sempre se fez referencia no discurso da coroa e em que este anno não se fallou, estava posta de parte, é com a maxima surpreza que vemos o governo entrar no caminho perigoso de discutir a possibilidade de pagar em quinze annos 2 por cento dos juros da divida externa e termos representantes desses credores na administração da divida publica! (Apoiados.)

Póde o sr. ministro da fazenda recusar-se a dar a este respeito respostas claras á camara, pois que não ha maneira material de o obrigar a fallar, e a que ha, é de ordem e natureza a não poder ser empregada; mate depois das informações trazidas, ha poucos dias, pelo sr. Teixeira de Sousa e por outros membros d'esta camara, e ultimamente apresentadas na dos dignos pares pelo chefe do partido regenerador, não tendo o sr. ministro da fazenda opposto uma negativa formal ás condições e cláusulas noticiadas, não póde deixar de julgar-se como existente tal facto, que constituo um perigo imminente no nosso horisonte financeiro. (Muitos apoiados.)

E temos de proceder em relação a esse facto exactamente ao invez do que procedemos em relação á passagem das tropas inglezas pela Beira.

Permittiu-se a passagem de tropas inglezas pela Beira e quando isso veiu ao conhecimento do parlamento estavamos em frente de um facto consumado. O sr. ministro dos estrangeiros declarou que era inconveniente para os interesses do estado qualquer discussão a tal respeito. A opposição, visto que se tratava do um facto consumado e o sr. ministro dos negocios estrangeiros tinha declarado que era uma questão diplomatica, havendo melindre e inconveniencia em a discutir, não a discutiu, nem fez o mais pequeno esforço para provocar discussão.

Mas em relação ao convenio a situação é diversa, trata-se de um facto a realisar, de um facto que simplesmente póde acontecer. (Muitos apoiados.)

Disse o sr. ministro da fazenda que a discussão a este respeito já tem prejudicado o andamento das negociações. Pois, sr. presidente, se ellas assentavam nas bases agora reveladas, felicito-me por pertencer a uma opposição que tem conseguido embaraçar o sr. ministro da fazenda na desgraça e ruina do paiz. (Prolongados applausos.)

Declarou ainda que nada diz a respeito do convenio para não prejudicar mais as negociações, mas que se os resultados a que chegar excederem a auctorisação parlamentar, não assignará o contrato sem o trazer á camara. Não faltava mais nada do que isso. Se o fizesse, podia v. exa. ter a certeza do seguinte: ou havia possibilidade de se não cumprir um accordo feito sem a camara ter consentido n'elle, e eu havia de envidar todos os meus esforços para que elle se não cumprisse; ou, quando as circumstancias internacionaes creadas por similhante attentado fossem de ordem que obrigassem ao seu cumprimento, empregaria então todos os meus esforços para fazer castigar severamente quem assim exorbitara. (Muitos apoiados.)

Já o disse e agora o repito. Se houver uma reunião de credores, é porque nós mesmos a provocâmos. Ha dois annos que um delegado do governo tem constantemente andado em negociações com elles; portanto, não poderemos allegar mais tarde ignorancia de quaes sejam as suas exigencias. Conhecendo-as, e provocando nós a reunião, é porque queremos acceital-as, e v. exa. comprehende que não é permittido n'uma negociação d'esta natureza, a que não são alheios os governos estrangeiros, acceitar em reunião de credores uma conclusão qualquer, que evidentemente implicaria o voto e opinião do governo, para vir mais tarde rejeital-a n'uma camara em que, ninguem o ignora, tem o governo, dedicada e importante maioria politica.

Não nos illudamos; a assignatura do convenio, ainda que ad referendum, e até aa simples reunião dos credores por nós provocada, corresponderá a um facto consummado, á em 1892 se rejeitou um convenio feito em condições similhantes. Non bis in idem; e com a aggravante de que em, 1892 foram os credores que provocaram a reunião em Paris, ao passo que hoje teriam o direito de dizer-nos: "Estavamos tranquillos o resignados; foi o governo portuguez quem veiu ter comnosco propondo-nos, primeiro isoladamente e depois collectivamente, novas condições; acceitamol-as; que nação e povo este, que nem paga pontualmente as suas dividas, nem quer nunca fazer bons os compromissos acceites pelos seus delegados e representantes?" (Apoiados.).

Vou concluir fazendo duas perguntas ao sr. ministro da fazenda.

S. exa. tem a maioria para o acompanhar, tem a confiança da coroa para governar com o apoio d'essa maioria; não lh'o contesto, reconheço-lhe esse direito, essa situação, que, de mais a mais, a mim pessoalmente em nada me contraria. Ha, porem, uma cousa que tenho o direito de pedir a s. exa. e á maioria que o apoia: é que nos falle com franqueza e sinceridade, para sabermos aquillo que

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vamos fazer e se não votem charadas e enygmas. (Apoiados.)

for necessario, pedirei a v. exa. mais alguns minutos para expor esta questão.

O sr. ministro da fazenda inscreve no artigo 6.° nem mais nem menos do que tres podidos para crear inscripções.

Veja v. exa. onde o sr. ministro vae buscar os recursos, quando u situação é por s. exa. pintada tão côr de rosa o fagueira! Não se contenta, pelo primeiro pedido, em ser auctorisado, como no anno passado, a crear titulos para caucionar as letras o escritos do thesouro até á quantia de 8:500 contos de réis; póde mais no § 2.° auctorisação para crear as inscripções necessarias para garantir bilhetes do thesouro em lopresontação da receita. Ao passo que na proposta do governo se dizia - da receita auctorisada - no projecto foi riscada a ultima palavra, dizendo-se simplesmente - da receita. - Mus qual receita? É a receita em representação da divida fluctuante? Essa está auctorisada pelo § 1.° É a receita total do orçamento? Então v. exa. comprehende que isso é um pedido para vender inscripções. Pois faça-se, mas aberta e claramente, dizendo as condições em que pretende ser auctorisado a vender, som lhe deixarmos a maxima latitude e liberdade (Apoiados.) Porem querer, que por um lado se lhe permitta crear titulos do divida publica para garantir os bilhetes do thesouro até á representação de 3:500 contos de réis, e depois a seguir - "os que forem necessarios para garantir bilhetes do thesouro em representação da receita" - sem designar qual é essa receita, é uma verdadeira innovação nas nossas leis orçamentaes.

Nunca um pedido d'esta ordem foi aqui apresentado. (Apoiados.) Peço, portanto, a s. exa. que explique bem duramente qual é o sou pensamento.

A maioria póde votar, mas nós minoria temos o direito de lho pedir que nos diga no menos o que ella approva e nós nem sequer sabemos se devemos rejeitar. O contrario é jogar á cabra cega com milhares o milhares de contos de réis da divida publica, que já temos visto como são desbaratados pelo governo. (Apoiados.)

Mas não para aqui. Julga v. exa. que é bastante isto? Pois não é. Ha ainda o § 4.° a que já se referiu o ar. Mello e Sousa e que é ainda mais curioso. Diz assim:

"Os titulos do divida fundada que o governo está auctorisado a emittir para os fins de que trata o artigo 3.° da lei de 2õ de junho de 1898, poderão ser tambem de divida interna e nas condições fixadas no mesmo artigo."

O sr. Presidente: - V. exa. tem ainda cinco minutos para concluir o seu discurso, mas se v. exa. quer eu consulto a camara sobre se ella permitte que v. exa. continue no uso da palavra.

Vozes: - Falle, falle.

Consultada a camara, resolveu affirmativamente.

O Orador: - Eu agradeço á camara a sua manifestação ô procurarei não abusar da sua condescendencia.

Esta questão é muito importante, pelo menos para mim, que quero saber o que voto; (Apoiados.) e comquanto eu saiba que, se o governo quizer eximir-se a responder-me, a sua maioria se julgará no dever politico de o acompanhar, todavia insisto, porque preciso saber o que voto e n'isso faço tombem serviço apropria maioria, que, como eu, não sabe o que vae votar.

Já vimos o que diz o § 4..° do artigo 6.° do projecto em discussão; vejamos agora o que diz o artigo 3.° da lei de 1898, a que o mesmo paragrapho se refere:

"É tambem auctorisado o governo a emittir titulos da divida fundada externa do typo do juro, capital e amortisação, que mais conveniente for aos interesses do estado, para consolidar ou garantir a actual divida fluctuante e fazer face a todas as despezas provenientes da execução do artigo 1.° d'esta lei, as quaos não deverão, em caso algum, exceder a importancia de 1/2 por conto do valor nominal dos actuaes titulos que só sujeitarem ao nosso regimen ; não podendo o juro real da quantia mutuada, exceder de Vá por conto o juro effectivo correspondente á cotação dos fundos consolidados portuguezes no momento de se realisar a operação o ficando aos encargos d'esta, igualmente consignadas em primeiro grau, as receitas alfandegarias, nos termos do artigo 2.° e seus paragraphos."

Como v. exa. vê, n'este artigo ha tres fins distinctos e diversos; um d'elles é destinar os titulos de divida externa, que se podiam crear nas condições do artigo, para consolidar a divida fluctuante; o outro tinha em vista garantir com esses titulos a mesma divida, e o ultimo destinava-os ao pagamento das despezas resultantes do convenio. A qual d'estes fins mim o sr. ministro da fazenda? Quer s. exa. ficar auctorisado para poder, por meio d'esses titulos que vae crear, consolidar a divida fluctuante? N'esse caso é um pedido claro e simples de emprestimo e não vejo a rasão por que o sr. ministro da fazenda o não pude pedir nos termos usuaes, (Apoiados) dizendo claramente ao parlamento que o governo quer ficar auctorisado a consolidar a divida fluctuante até á quantia de 10:000, de 20:000, do 30:000 contos de réis, por meio de inscripções ou titulos de 4 por cento ou de 4 1/2 ou de 5 por cento, ou ainda de 6 por cento, que foi o limite maximo do encargo do emprestimo do ar. ministro da guerra para a compra de armamento. Se não é para isso, é para garantir a divida fluctuante? Não póde ser: já está auctorisado isso, no § 1.°

Mas não é nada d'isto; o que se quer é procurar os meios de pagar as despezas do convenio, (Muitos apoiados.) pois que o sr. ministro da fazenda, podendo conseguir um convenio, talvez não possa conseguir a operação de credito annexa ao convenio, para a qual estava auctorisado pela lei de 1898; e quer assim ficar com duas auctorisações para poder mais facilmente realisar o seu intento, (Apoiados) ou emittindo lá fora titulos de divida externa conforme a lei do 1898, ou emittmdo divida interna em fuce d'esta lei, se no estrangeiro lhe for impossivel collocar a externa. Mas se é assim, o bom o parece, diga-o claramente e qual a importancia que pretende, porque o parlamento não póde auctorisar, ás cegas, a creação de titulos, principalmente a um governo, que sem auctorisação de especie alguma (Apoiados.) já vendeu mais de 23:000 contos de réis.

Desejo que s. exa. me responda com clareza; e parece-me que não é pedir muito. (Apoiados.)

Eu ainda desejava analysar outros actos da gerencia de s. exa., mas excedi a hora regimental, a camara teve a bondade de permittir que eu podesse concluir as minhas considerações sobre o ponto restricto, de que me estava occupando, e agora, ao terminar, quero apenas insistir sobre a necessidade, que o sr. ministro da fazenda tem, de dizer ao parlamento portuguez alguma cousa que o socegue, e por elle a nação, sobre esse convenio malfadado, que s. exa. quer levar por diante. (Apoiados.)

Consta-me que o chefe do partido regenerador já definiu na outra camara a altitude do meu partido n'esta questão.

Sr. presidente, n'esta parte, não é só por motivos de disciplina e de solidariedade partidaria que eu acompanharei o illustre chefe do partido regenerador; ou quero acompanhal-o convicta o apaixonadamente, porque estou certo do que a realisação do um convenio nas bases annunciadas seria, a breve trecho, a ruina da nossa situação financeira, trazendo, como consequencia immediata, a perda do nosso dominio colonial. (Apoiados.)

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi comprimentado por todos os membros da opposição regeneradora.)

O sr. Sinel de Cordes: - Peço a palavra para um requerimento.

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O sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): - Peço a palavra.

O sr. Sinel de Cordes: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a v. exa. se digne consultar a camara só julga a materia suficientemente discutida. = João José Sinel de Cordes, deputado pelo circulo n.° 70.

O sr. Teixeira de Sousa: - Então o sr. ministro da fazenda não falla?!

Vozes: - Falle, falle.

Sussurro.

Vozes: - Ordem, ordem.

O sr. Presidente: - O requerimento do sr. Sinel de Cordes será posto á votação depois do sr. ministro da fazenda ter usado da palavra.

O sr. Sinel de Cordes: - Sr. presidente, v. exa. dá-me licença?

É para dizer a v. exa. que a minha idéa ao mandar para a mesa esse requerimento, foi de que elle não prejudicasse qualquer resposta que o sr. ministro da fazenda pretendesse dar ao ar. João Franco.

Continua o sussurro.

O sr. Presidente: - Eu já declarei a v. exa. que o requerimento do sr. Sinel de Cordes só será posto á votação depois do sr. ministro da fazenda ter usado da palavra.

Tem a palavra o sr. ministro da fazenda.

O sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): - Já tinha pedido a palavra antes de se levantarem alguns srs. deputados da esquerda da camara, como que intimando a elle, orador, para que foliasse; se assim não fosse talvez a não tivesse pedido depois d'essa intimação, porque não é por essa forma que se mantem a boa ordem dos trabalhos parlamentares.

S. exas. que reputam fraqueza o que não é senão cortezia, têem obrigação de respeitar a posição que, elle, orador, occupa.

Vae responder unicamente ás perguntas do sr. deputado João Franco, por dizer s. exa. que julgava indispensavel que lhe respondesse para poder dar o seu voto; mas responde unicamente sobre o que está em discussão.

Em primeiro logar, o § l.° limita a auctorigação do artigo, o que é bem claro, Esta auctorisação vae até ao limite do exercicio, e exercicio não é gerencia. Segundo o § 1.°, os escriptos e letras do thesouro, novamente emittidas como representação da receita, não podem exceder 3:500 contos de réis, somma que ficará amortisada dentro do exercicio.

O § 2.° refere-se a bilhetes do thesouro, já emittidos, e que carecem de garantia ou caução.

Em referencia ao § 4.° ha uma completa confusão da parte de s. exa.

A lei de 1898 auctorisou a creação de titulos de divida externa para um determinado fim, e este paragrapho torna extensiva essa auctorisação tambem a titulos internos: quer dizer, podem ser creados titulos, tanto internos como externos, para satisfazer ás disposições d'aquella lei, mas a totalidade é aquella que é permittida pela propria lei.

Devo dizer á camara, que o principal fim que tem em vista, é a consolidação da divida fluctuante.

E se s. exa. não está satisfeito com a redacção do artigo e do additamento mandado para a mesa e com a sua declaração, redija o sr. deputado João Franco uma emenda que elle, orador, se a poder acceitar, acceital-a-ha.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)

Leu-se na mesa o requerimento do sr. Sinel de Cordes e posto á votação, foi approvado.

O sr. João Franoo: - Poço a palavra para um requerimento.

O sr. Presidente: - Não sei se o illustre deputado reparou que foi votado o requerimento julgando a materia discutida.

O sr. João Franco: - Já se votou?

O sr. Presidente: - Sim, senhor.

O sr. João Franco: - Mas isso em nada prejudica o requerimento que vou mandar para a mesa e que é o seguinte:

Requerimento

Requeiro que as declarações feitas pelo sr. ministro da fazenda, em resposta ás minhas perguntas, sejam lançadas na acta. = João Franco.

O sr. Presidente: - Vão votar-se as moções, depois vota-se o capitulo 1.°, e em seguida o additamento mandado para a mesa pelo sr. relator.

Depois d'isto é que porei á votação o requerimento do sr. João Franco.

Parece-me que por esta forma s. exa. em nada fica prejudicado, e segue-se a ordem designada no regimento.

O sr. Luiz José Dias (relator): - Em qualquer votação que se faça, relativamente ao projecto que se discute, peço que se mantenha o principio de que não ficam prejudicadas as emendas que se apresentarem sobre as differentes disposições do referido projecto.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Mello e Sousa.

Lida na mesa, foi rejeitada.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Teixeira de Sousa.

O sr. Teixeira de Sousa: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que eu retire a minha moção.

Assim se resolveu.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Luiz José Dias.

Lida na mesa, foi approvada.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Malheiro Reymão.

O sr. Malheiro Reymão: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que eu retire a minha moção.

Assim se resolveu.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Domingos Tarroso.

O sr. Domingos Tarroso: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que eu retire a minha moção.

Assim se resolveu.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. João Arroyo.

Lida na mesa, foi rejeitada.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada, para a mesa pelo sr. Queiroz Ribeiro.

Lida na mesa, foi approvada.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Teixeira de Vasconcellos.

Lida na mesa, foi rejeitada.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o moção mandada para a mesa pelo sr. Antonio Cabral.

O sr. Antonio Cabral: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que eu retire a minha, moção.

A camara assim resolveu.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Abel de Andrade.

O sr. Abel de Andrade: - Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que eu retire a minha moção.

A camara resolveu affirmativamente.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Cayolla.

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22 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O sr. Cayolla: - Peço a v. exa. que consulte a camara eobre se consente que eu retire a minha moção.

A camara assim resolveu.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Paulo Falcão.

Lida na mesa, foi rejeitada.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a moção mandada para a mesa pelo sr. Arthur Montonegro.

O sr. Arthur Montenegro: - Peço a v. exa. que consulte a cornara sobre se permitte que eu retire a minha sessão.

A camara annuiu ao pedido.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o capitulo 1.° para ser votado.

A approvação d'este capitulo não envolve o prejuizo de qualquer emenda que sobre elle passa a ser apresentada, conforme a declaração ha pouco feita pelo sr. relator da commissão.

Posto á votação o capitulo 1.°, foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o additamento mandado para a mesa pelo sr. relator.

Lido na mesa, foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o requerimento mandado para a mesa pelo sr. João Franco.

Lido na mesa, foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o capitulo 2.° do projecto para entrar em discussão.

Leu-se.

O sr. Presidente: - Está em discussão.

O sr. Luiz; José Dias (relator): - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeira que v. exa. se digne consultar a camara sobre se consente que seja aggregado ás commissões de fazenda e orçamento, conforme deliberação das respectivas commissões, o sr. deputado Emygdio Navarro. = O deputado, Luiz José Dias.

Foi approvado.

O sr. Tavares Perdigão - Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda, sobre a proposta de lei n.° 21-E, que tem por fim conceder a importação livre de direitos, de todos os objectos que a secretaria d'estado dos negocios da guerra submetter a despacho de importação nas alfandegas do reino, destinados ao armamento, municiamento o equipamento do exercito portuguez.

Mando tombem para a mesa um parecer da mesma commissão, sobre o projecto de lei a que se refere o parecer n.° 106 da commissão transacta, de 4 de julho de 1899.

Foram a imprimir.

Entra em discussão o capitulo 2."

O sr. Fuschini: - Disse que antes de começar a sua exposição ia pedir duos finezas ao sr. presidente:

Que o não avisasse do fim da hora concedida aos oradores.

Que, findo o quarto de hora de tolerancia, se, como era provavel, não houvesse terminado o seu discurso, s. exa. se dignasse consultar a cornara se lhe consentia continuar no uso da palavra.

É um velho parlamentar, não está habituado a fallar por medida. Considera o tempo regimental sufficiente para descompor os ministros ou reciprocamente, mas insufficiente para expor uma questão como a que vae desenvolver.

Espera merecer á camara, esta consideração, porque declara não ter feito jamais na sua vida parlamentar obstruccionismo ... nem mesmo quebrado carteiras ...

Alem d'isso observa que, havendo ainda cinco discussões distinctas no orçamento, poderá pedir a palavra em cada uma, o que representa seis horas do uso da palavra.

Em seguida passa a ler a sua moção:

Moção

A camara considerando difficil, embora não insoluvel, a situação financeira do poiz, convida o governo a melhorar os processos de administração publica, a reorganisar o nosso systema tributario, em bases da mais rigorosa repartição e maxima economia no lançamento e cobrança dos impostos, bem como a fazer nas despezas todas as reducções compativeis com a regularidade dos serviços de verdadeiro interesse publico, evitando por esta forma uma conversão da divida externa que produzirá augmento de encargos e quebra da autonomia da nação, e passa á ordem do dia.

Lisboa, 23 de abril de 1900. = Fuschini.

Pergunta ao sr. presidente a que horas termina a sessão.

Vozes: - Não ha numero na sala.

O sr. Presidente: - Sai, por momentos, da sala e acabo de ser informado pelo sr. vice-presidente de que o illustre deputado desejou sabor a hora em que se devo fechar a sessão, não podendo o sr. vice-presidente responder-lhe com precisão, por não saber quando se entrou na ordem do dia.

Posso eu informar v. exa. de que a sessão deve fechar ás sete horas e vinte minutos; e se v. exa. quer continuar o seu discurso póde usar da palavra até essa hora; mas, não querendo, eu não tenho duvida em fechar desde já a sessão, reservando a v. exa. a palavra para a sessão immediata, como é costume fazer-se.

O Orador: - Concluo que n'estas condições ficará com a palavra reservada.

(O discurso será publicado na integra quando s. exa. devolver as notas tachyqraphicas.)

O sr. Presidente: - Fica, portanto, v. exa. com a palavra reservada.

Ámanhã ha sessão e a ordem do dia é a continuação da que estava dada.

Está encerrada a sessão.

Eram seis horas e meia da tarde.

Documentos enviados para a mesa n'esta sessão

Representações

De cidadãos residentes no concelho de Boticas, pedindo uma lei que determino recolher na igreja dos Jeronymos, da freguezia de Santa Maria de Belem, os restos mortaes do visconde de Almeida Garrett.

Apresentada pelo sr. presidente da camara, Poças Falcão, e enviada á commissão de administração publica.

Dos caçadores residentes na cidade de Setubal, contra o projecto de lei sobre a caça, apresentado pelo sr. deputado Paulo Cancella.

Apresentada pelo sr. deputado Marianno de Carvalho, enviada á commissão de administração publica e mandada publicar no Diario do governo.

Dos corpos gerentes da associação protectora da caça, associação dos caçadores portuenses, club dos caçadores de Braga, caçadores de Ourique, caçadores das Caldas da Rainha, caçadores de Azambuja, caçadores do Villa Franca de Xira e club da Figueira da Foz, fazendo igual pedido.

Apresentadas pelo sr. deputado Mello e Sousa, enviadas á commissão de administração publica e mandadas publicar no Diario do governo.

Da associação dos caçadores portuguezes, fazendo igual pedido.

Apresentada pelo sr. deputado Cabral Mancada, enviada

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SESSÃO N.º 49 DE 23 DE ABRIL DE 1900 23

á commissão de administrado publica e mandada publicar no Diario do governo.

Dos empregados administrativos do concelho de Mertola, pedindo a revogação dos §§ 3.° e 5.° da base 29.ª das que fazem parte da lei de 26 de julho ultimo, ou garantir aos actuaes empregados administrativos os direitos adquiridos á publicação da citada lei.

Apresentada pelo sr. deputado Antonio de Vasconcellos, enviada á commissão de administração publica e mandada publicar no Diario do governo.

Dos empregados da repartição de fazenda do districto de Vianna do Castello, contra a proposta de lei n.° 14-G, que regula a aposentação dos empregados civis.

Apresentada pelo sr. deputado Malheiro Reymão, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

Da classe dos industriaes de ferreiros e serralheiros da cidade do Porto, contra a proposta de lei da contribuição, na parte que lhes diz respeito.

Apresentada pelo sr. deputado Paulo Falcito, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

Dos fabricantes de distillação de alcool, na cidade do Porto e em Villa Nova de Gaia, contra a proposta vinicola, na parte que lhes diz respeito.

Apresentada pelo sr. deputado Adriano Anthero, enviada ás commissões de agricultura, fazenda, ultramar e commercio, e mandada publicar no Diario do governo.

Das irmãsinhas dos pobres, em Campolide, pedindo que sejam livres de direitos de importação 33 toneladas de ferro em vigas, destinadas ao edificio para asylo de trezentos pobres velhinhos de um e outro sexo.

Apresentada pelo sr. deputado Tarrozo e enviada á commissão de fazenda.

Justificação de faltas

Tenho a honra de participar a v. exa. e á camara que, por motivo justificado, não tenho comparecido a bastantes sessões d'esta casa do parlamento. = Antonio de Menezes e Vasconcellos, deputado.

Á secretaria.

O redactor = Sá Nogueira.

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