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SESSÃO DE 6 DE ABRIL DE 1886

Presidencia do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho (supplente)

Secretarios os exmos. srs.:
Henrique da Cunha Matos de Mendia
Joaquim Augusto Ponces de Carvalho

SUMMARIO

Um officio da camara municipal do concelho de Alijó. - Segunda leitura e admissão de quatro projectos de lei. - Uma representação que acompanhou aquelle officio, outra apresentada pelo sr. Elvino de Brito e outra pelo sr. Lamare. - Justificações de faltas dos srs. A. Joaquim da Fonseca, Luiz Freire, João Augusto Teixeira, Moraes Machado, Garcia de Lima, visconde de Pindella, Pedro Correia, José Borges, Camões, Pereira Sampaio, Adriano Cavalheiro, J. A. Neves, Cypriano Jardim, Correia de Oliveira, Teixeira de Vasconcellos, Lobo Lamare e Augusto Poppe. - Rectificação apresentada pelo sr. Hintze Ribeiro. - Vota-se que seja publicada no Diario do governo a representação da camara de Alijó. - O sr. Firmino Lopes apresenta um parecer da commissão de verificação, que é approvado, tendo-se dispensado o regimento. - É do mesmo modo approvado um parecer mandado para a mesa pelo sr. Carrilho. - O sr. Avellar Machado declara constituida a commissão de inquerito agricola e propõe a aggregação do sr. Fontes Ganhado á mesma commissão. - A camara approva. - O mesmo sr. deputado pede que entre em discussão o projecto n.° 44, e o sr. Scarnichia o projecto n.° 160 do anno passado. - O sr. Consiglieri Pedroso chama a attenção do governo para o facto de se recusar o administrador de Beja a realisar o registo civil de duas creanças. - Dá-se conta da ultima redacção do projecto de lei n.° 5l. - Responde ao sr. Consiglieri o sr. ministro da justiça. - O sr. Mendes Pedroso pergunta se já vieram uns documentos que pediu e se o governo já está habilitado a prestar os esclarecimentos que solicitou em uma das sessões passadas ácerca do desvio de direitos na alfandega de Lisboa, accusado por um empregado da do Porto. - Responde á primeira pergunta o sr. Mendia, secretario, e á segunda o sr. ministro da fazenda. - Resolve-se que seja publicada, no Diario do governo uma representação apresentada pelo sr. Lamare, que em seguida pergunta se já vieram uns documentos que pediu pelo ministerio das obras publicas. - Responde-lhe o sr. Mendia, secretario.
Na ordem do dia entra em discussão o projecto n.° 36. - Não concorda com elle o sr. ministro da fazenda. - No mesmo sentido pronuncia-se o sr. Consiglieri. -Defendem o projecto os srs. Neves Carneiro e Marçal Pacheco, que responde especialmente ao sr. ministro da fazenda. - Tomam parte no debate o sr. Alfredo Peixoto, a favor, e o sr. Elvino de Brito, contra. - Por falta de numero não se vota o projecto. - Prosegue-se na discussão do projecto de lei n.° 46. - O sr. Marçal Pacheco sustenta a opinião de que o parecer deve voltar á commissão, por não ter sido observado o regimento. - Trocam-se a este respeito explicações entre o mesmo sr. deputado e o sr. presidente da camara, e levanta-se a sessão.

Abertura - Ás quatro horas da tarde.

Presentes á chamada - 63 srs. deputados.

São os seguintes: - Adolpho Pimentel, Agostinho Lucio, A. da Rocha Peixoto, Silva Cardoso, Antonio Baptista, Antonio Candido, Pereira Côrte Real, Lopes Navarro, Moraes Sarmento, Pereira Mazziotti, Jalles, Carrilho, A. M. Pedroso, Santos Viegas, Sousa Pavão, Almeida Pinheiro, A. Hintze Ribeiro, Pereira Leite, Neves Carneiro, Barão do Ramalho, Bernardino Machado, Albuquerque Carneiros, Lobo d'Avila, Ribeiro Cabral, E. Coelho, Elvino de Brito, Sousa Pinto Basto, Fernando Geraldes, Fernando Caldeira, Firmino Lopes, Francisco Beirão, Correia Barata, Francisco de Campos, Castro Matoso, Barros Gomes, Matos de Mendia, Melicio, Scarnichia, Sousa Machado, Ponces de Carvalho, Joaquim de Sequeira, J. J. Alves, Simões Ferreira, Avellar Machado, Correia de Barros, Ferreira de Almeida, Borges de Faria, Elias Garcia, Lobo Lamare, Figueiredo Mascarenhas, Pinto de Mascarenhas, Luciano Cordeiro, Marçal Pacheco Guimarães Camões, Miguel Tudella, Pedro de Carvalho, Gonçalves de Freitas, Barborsa Centeno, Tito de Carvalho, Visconde de Ariz, Visconde das Laranjeiras, Visconde de Reguengos e Consiglieri Pedroso.

Entraram durante a sessão os srs.: - Alfredo Barjona de Freitas, Sousa e Silva, Garcia Lobo, Pereira Borges, Cunha Bellem, Franco Castello Branco, Oliveira Martins, Laranjo, Lourenço Malheiro, M. P. Guedes, Pinheiro Chagas, Mariano de Carvalho, Miguel Dantas, Santos Diniz e Pereira Bastos.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adriano Cavalheiro, Lopes Vieira, Moraes Carvalho, Garcia de Lima, Albino Montenegro, Torres Carneiro, Antonio Centeno, A. J. da Fonseca, Antonio Ennes, Fontes Ganhado, Moraes Machado, Pinto do Magalhães, Seguier, Urbano de Castro, Augusto Barjona de Freitas, Augusto Poppe, Fuschini, Avelino Calixto, Barão de Viamonte, Caetano de Carvalho, Sanches de Castro, Carlos Roma du Bocage, Conde da Praia da Victoria, Conde de Thomar, Conde de Villa Real, Cypriano Jardim, Emygdio Navarro, Goes Pinto, Estevão de Oliveira, Filippe de Carvalho, Vieira das Neves, Mártens Ferrão, Wanzeller, Frederico Arouca, Guilherme de Abreu, Sant'Anna e Vasconcellos, Silveira da Mota, Costa Pinto, Baima de Bastos, Franco Frazão, J. A. Pinto, Augusto Teixeira, J. C. Valente, Souto Rodrigues, João Arrojo, Teixeira de Vasconcellos, Ferrão de Castello Branco, J. Alves Matheus, J. A. Neves, Teixeira Sampaio, D. Jorge de Mello, Amorim Novaes, Azevedo Castello Branco, Dias Ferreira, Pereira dos Santos, José Luciano, Ferreira Freire, José Maria Borges, Oliveira Peixoto, Simões Dias, Luiz Ferreira, Reis Torgal, Luiz Dias, Luiz Jardim, Luiz Osorio, Manuel d'Assumpção, M. da Rocha Peixoto, Correia de Oliveira, Manuel de Medeiros, M. J. Vieira, Aralla e Costa, Martinho Montenegro, Pedro Correia, Rodrigo Pequito, Dantas Baracho, Vicente Pinheiro, Visconde de Alentem, Visconde de Balsemão, Visconde de Pindella, Visconde do Rio Sado e Wenceslau do Lima.

Acta - Approvada sem reclamação.

EXPEDIENTE

Officio

Da camara municipal de Alijó, remettendo uma representação em que pede para serem convertidas em lei as propostas da commissão de defeza do Douro, approvadas em sessão de 19 de dezembro do 1885.
Ás commissões de agricultura e de commercio e artes.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - Não sendo provavel, até pela minha idade e doenças, que volte a esta casa, desejo aproveitar esta sessão para deixar registadas as principaes das minhas idéas sobre os assumptos de que passo a tratar, e para que peço benevolencia. Ha alguns assumptos sobre que pouco ha a dizer.
Felizmente já não é preciso justificar a necessidade de abolir os passaportes para o estrangeiro. Esta necessidade está no animo de todos.
Tambem não é preciso demonstrar a conveniencia de serem adoptadas as outras medidas que tenho a honra de propor. De uma d'ellas, a navegação a vapor para Timor e para os Estados Unidos, depende essencialmente o alargamento das nossas uteis relações commerciaes com as vas-

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tas terras que deixo indicadas. Por má sorte nossa não temos visto que New-York é hoje a estrada d'esse novo mundo, cada vez maior e mais rico, e que n'esse novo e vastissimo mundo, é raro o vinho do Portugal que não lhe seja levado por navios estrangeiros, a preços exaggerados? Junto vereis, senhores, um importante mappa mostrando a grandeza das terras, e que irão ser servidas pela nossa navegação a vapor dirigida a New-York.
Da necessidade de telegrapho dos Açores nem já é preciso tratar. As muitas tentativas infelizes para o estabelecer, são do conhecimento de todos, mas na parte geral de confiança no seu valimento está a rasão principal por que ainda nenhuma subscripção chegou á somma necessaria, que é avultadissima.
Confio, senhores deputados, que não serão de todo perdidas as poucas reflexões que faço, e os meus projectos. Faltou-me ainda fallar da pesca do bacalhau. Principiou muito bem esta industria, mas a ultima elevação de direitos, condemnou a apodrecerem, mais de vinte navios já destinados á pesca e á fome, mais de duzentos marinheiros e as suas familias, pela maior parte açorianos, e que terão de augmentar a emigração, unico recurso que tem hoje quem precisa de pão nos Açores.
Artigo 1.° São abolidos os passaportes para o estrangeiro.
§ unico. Quando o passageiro esteja obrigado ás leis do recrutamento, terá unicamente a depositar na municipalidade do seu domicilio uma apolice original por onde prove que fez o seu seguro e pelo qual o estado será pago quando, durante a sua ausencia, for devidamente exigida a sua substituição em dinheiro. Um certificado d'esta apolice substituirá o passaporte até agora exigido para a saida do reino ou ilhas.
Art. 2.° Todo o mancebo matriculado em navios de alto mar, tendo feito tres viagens fica livre do recrutamento militar maritimo.
Art. 3.° É restabelecido o antigo direito a que até 1865 esteve sujeito o bacalhau pescado sob bandeira portugueza, sejam quaes forem os mares da pesca, nacionaes ou estrangeiros.
Art. 4.° O governo é auctorisado a estabelecer duas carreiras bimensaes a vapor, uma para os Estados Unidos e outra para Timor, subsidiando estas carreiras somente com a despeza que fizerem em carvão. A carreira dos Estados Unidos será entre Lisboa, Funchal, S. Miguel. Terceira, S. Jorge, Faial, Corvo, Flores e New York.
Art. 5.° Dado o caso de que se mallogre a actual tentativa do estabelecimento da linha telegraphica que porá Portugal em serviço directo com o archipelago dos Açores, o governo é auctorisado a conceder para beneficio do mesmo serviço um auxilio perfeitamente igual, ou equivalente, ás concessões feitas em 1860, para as linhas da África Occidental.
Art. 6.° O governo é auctorisado a acceitar qualquer contrato de que provierem meios para as despezas creadas por esta lei, não sendo, porém, por nenhuma especie de contribuição directa nem sobre a propriedade, o producto agricola ou industrial.
Art. 7.° Fica revogada toda a legislação em contrario. Sala das sessões, 5 de abril de 1886. = Filippe de Carvalho, deputado pelo circulo da Horta.
Lido na mesa, foi admittido e enviado ás commissões de negocios externos, marinha e fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - Pedimos o favor da attenção dos nossos collegas para o assumpto de que vamos tratar.
Tanto quanto progride a civilisação, vão sendo aperfeiçoados os processos de instrucção primaria, base incontestavel de todo o saber. Os poderes publicos de Portugal têem reconhecido isto, e têem providenciado sobre o caso. Já temos previdentes leis, sendo as principaes as de 8 de maio de 1878 e 11 de junho de 1880, mas ainda não satisfazem completamente, como vemos.
Ha uma questão grave, que não está resolvida, como é para desejar. As despezas da instrucção primaria estão a cargo das camaras municipaes; mas estas, na sua grande maioria, luctam com falta de meios, e é por esta rasão que estamos a ver o facto, muito desagradavel, de muitos dos nossos mestres de instrucção primaria terem de mendigar o pão do seu sustento. Não se lhes póde pagar. É certo que, pelo artigo 11.° da lei de 11 de junho de 1880, as camaras municipaes são obrigadas a lançar um imposto especial para a instrucção primaria.
Mas é certo tambem que raras camaras têem lançado o imposto por não o poderem lançar. O povo oppõe-se.
Realmente já não existe artigo algum de consumo publico mais conhecido, susceptivel de ser augmentado no imposto, ou que possa suppôr imposto novo.
N'estas circumstancias, tendo-me votado desde muito ao cuidado das despezas da nossa instrucção primaria, parece me ter encontrado em legislações estrangeiras um exemplo que não parece dos peiores. Não direi que é dos melhores porque, francamente o direi, em materia de impostos nenhuns ha bons. A fortuna está sómente na escolha dos que menos repugnam á acceitação publica. E é ao mais onde se póde chegar quem estuda estes negocios.
Um imposto sobre os phosphoros, creado ha muitos annos em França, hoje já rende para o seu thesouro mais de 3.000:000$000 réis por anno. É esta uma somma importante. O mesmo imposto póde e deve dar-nos nas mesmas proporções uma quantia superior a 300:000$000 réis, e mais cedo ou mais tarde as despezas da instrucção primaria em Portugal poderão ter na receita de um imposto dos phosphoros, que entre nós ainda não está aproveitada, um auxilio assás importante e para as camaras municipaes um grande allivio e para o povo um bem por um imposto insensivel.
Na minha proposta não prejudico nenhuns interesses creados ou direitos adquiridos. Pelo contrario dá-se vida á industria dos phosphoreiros, que está quasi morta em Portugal pela avultada entrada dos phosphoros estrangeiros.
Não quero ser auctor de uma lei entre nós que me crie adversarios. Ha meios para todos viverem e de dar emprego á actividade industrial e ao capital da cada um.
Acresce ainda que o meu projecto vae estabelecer interesses de uma certa ordem, e garantir o presente e o futuro em uma industria que, tendo já sido muito portugueza, póde affirmar-se que está agonisante, quando ainda póde sustentar muita gente. Como já ponderei, os phosphoros que gastamos vem de fóra a um preço a que não podemos hoje concorrer pela industria nacional. Os capitaes e as machinas têem no norte da Europa feito prodigios n'este ramo de industria. Um escriptor allemão calculava ha poucos mezes, escrevendo sobre a prodigiosa producção de phosphoros na Allemanha e Belgica, que aquelles paizes recebiam só d'aquella industria um valor orçado annualmente de 50.000:000$000 a 60.000:000$000 réis. Parece isto fabuloso, mas chega-se á verdade ao ver os vastos edificios da fabricação de phosphoros da Allemanha, Russia, Belgica e Italia. Ha fabricas que custaram centenas de contos de réis.
Mas nós somos um paiz pequeno. A nossa fabricação e exportação nunca ha, de ser avultada. Não podemos competir em muitos artigos de industrias com os paizes grandes, mas podemos fornecer o nosso paiz e elevar o fabrico nacional tendo protecção. Não deve esquecer que em perfeição se dá ordinariamente uma circumstancia contra nós, que é ser em Portugal o capital muito caro, e não facil ao industrial, e todavia o capitalista portuguez tem muita rasão, porque tem bons empregos seguros e certos, sem correr o risco do commercio e da industria.
É preciso ser pratico e observar, que quando faltem os meios ás municipalidades para a sustentação dos professo-

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res de instrucção primaria, terá o thesouro de os supprir, o que seria mais uma nova calamidade sobre o orçamento do estado, o qual nós devemos poupar. Eis o projecto que tenho a honra de vos submetter:
Artigo 1.° Dando-se repetidas vezes o lamentavel facto denunciado pela imprensa e por diversas representações dos professores de instrucção primaria, de muitos atrasos e irregularidades no pagamento dos seus vencimentos, quando a lei quer que sejam bem pagos, tendo até para isso auctorisado um imposto municipal especial, creado pelo artigo 11 da lei de 11 de julho de 1880, ficar desde agora fixado este imposto especial no consumo dos phosphoros.
Art. 2.° Este imposto será de 2 reaes em cada caixa de phosphoros amorphos até 60 lumes e em cada caixa de phosphoros ordinarios não amorphos, chamados lumes promptos até 100 lumes.
Art. 3.° Todo o fornecimento dos phosphoros para o consumo nacional será obrigatoriamente de fabricação portugueza sujeito ao imposto.
Art. 4.° Todo o serviço do imposto será dirigido e administrado temporariamente pelo ministerio do reino, por via do conselho superior de instrucção publica, com representação dos fabricantes, estabelecendo-se as regras do fornecimento, fiscalisação e cobrança, mas sem nunca se crear monopolio. Todo o fabricante ou fabrica, fica no livre exercicio do seu trabalho e sómente sujeito temporariamente aos preceitos necessarios para regularidade dos fornecimentos no interesse commum de todos os fabricantes, e fiscalisação e cobrança do imposto, como é indispensavel no começo da execução d'esta lei.
§ unico. Sobre o rendimento do imposto dos phosphoros, o governo fica auctorisado a fazer uma operação de credito, pela qual os professores a quem se dever vencimentos sejam promptamente pagos.
Art. 5.° A industria, fabricação e exportação dos phosphoros nacionaes fica isenta de outro qualquer imposto do estado, districtal ou municipal.
Art. 6.° Os direitos de entrada dos phosphoros estrangeiros em viagem são elevados a mais 100 por cento, alem do imposto municipal.
Lisboa, 6 de abril de 1886. = Filippe de Carvalho.
Ás commissões de instrucção primaria e secundaria, de fazenda e de commercio e artes.

Projecto de lei

Senhores. - Encontro na legislação de Italia (lei de contabilidade publica) uma disposição sobre os vencimentos dos empregados publicos, que me parece conveniente adoptarmos.
Não traz encargo nenhum para o thesouro, porque se vae completar os vencimentos de um mez nos casos de morte do empregado, deixa de os pagar no mez em que foi feita a nomeação.
A grande maioria dos novos empregados não é abastada de fortuna e acontece que quando algum funccionario quasi sempre por motivo de doença necessita de recorrer ao credito sobre o seu vencimento, o do mez corrente, só o obtém com juro onerosissimo.
O mutuante dá sempre, e com rasão, como motivo de elevação do juro a incerteza da vida do empregado e os bancos não podem fazer negocios a risco.
Ora, por este projecto, a familia do empregado, no caso do fallecimento, encontrará alguns meios, ao menos para as primeiras despezas a que se vir forçada por tristes circumstancias.
É tão digna entre nós a classe dos funccionarios publicos que nos deve merecer attenção, e por isso é que vos proponho o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° Todo o cidadão que receber vencimento mensal do thesouro começará o seu vencimento desde o dia primeiro do mez seguinte ao do seu despacho. Os dias anteriormente decorridos não lhe serão contados senão para os effeitos da aposentação, promoção ou reforma.
Art. 2.° A todo o cidadão civil ou militar que receber vencimento mensal do thesouro, contar-se-há por inteiro o mez em que falleceu. Deixando familia o chefe d'esta receberá esses vencimentos, mostrando por um simples attestado do administrador do concelho a sua idoneidade, não havendo necessidade de habilitação judicial.
Art. 3.° Todos os vencimentos, antes de pagos, serão representados para todos os effeitos de credito, por um titulo rubricado pelo thesoureiro respectivo encarregado de fazer o pagamento; o titulo custará 50 réis de sêllo e 50 réis de reconhecimento.
Art. 4.° O governo é auctorisado a crear em Lisboa e Porto officiaes publicos sem ordenado, para estes reconhecimentos, ficando obrigados a registal-os em livro especial e a fazer uma estatistica para conhecimento do governo.
Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrario.
Lisboa, 5 de abril de 1886.= Filippe de Carvalho.
Á commissão de fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - No estado cheio de difficuldades das nossas finanças não se tem attendido ou prestado a devida attenção a assumptos que não devem ficar esquecidos no interesse da fazenda publica.
Tem Portugal e seus dominios consideraveis valores em bens dotaes, patrimonios e pensões que gosam gratuitamente de um privilegio em que é prejudicado o estado. Ao mesmo tempo é de má politica economica tirar a propriedade territorial do commercio. Conheço predios que são dotaes ha seculos, porque se succedem os dotes, patrimonios, etc., na mesma familia.
Por outro lado devemos proteger o credito publico numa nova procura dos seus ttulos.
Tenho pois, a honra de vos propor o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° O governo é auctorisado a lançar um pequeno imposto addicional, a todas as propriedades, que a titulo de privilegiadas e portanto não vendaveis, andam fora do commercio da compra, venda e hypothecas.
Art. 2.° É facilitada e permittida em todos os casos a subrogação de bens de raiz por inscripções de assentamento, depositadas na caixa geral dos depositos, durante a existencia do privilegio.
Art. 3.° Desde hoje em diante é prohibida toda a clausula, pela qual a propriedade fique sujeita ao onus de não poder ser vendida de prompto.
Art. 4.° Os privilegios dotaes só poderão ser constituidos em inscripções de assentamento da junta do credito publico ou de bancos, que tendo mais de vinte annos, criem titulos especiaes para tal fim, sufficientemente garantidos conforme as instrucções do governo.
Sala das sessões, 5 de abril de 1886. = Filippe de Carvalho.
Ás commissões de legislação civil e de fazenda.

REPRESENTAÇÕES

1.ª Da camara municipal de Alijó, pedindo que sejam convertidas em lei as propostas da commissão de defeza do Douro, approvadas em sessão de 19 de dezembro de 1885.
Remettida em officio da camara municipal de Alijó, enviada ás commissões de agricultura e de commercio e artes, e mandada publicar no Diario do governo.

2.ª Da camara municipal de Constancia, pedindo que o caminho de ferro da Beira Alta atravesse o Zezere junto d'aquella villa, e siga pela margem direita do Tejo.
Apresentada pelo sr. deputado Elvino de Brito, enviada ás commissões de obras publicas e fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.

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3.ª De uma commissão de professores primarios do circulo escolar de Lisboa, pedindo que sejam introduzidas algumas modificações nas leis de 2 de maio de 1878 e 11 de junho de 1880.
Apresentada pelo sr. deputado Lamare, enviada á commissão de instrucção primaria e secundaria, e mandada publicar no Diario do governo.

JUSTIFICAÇÕES DE FALTAS

1.ª Participo a v. exa. e á camara que o sr. deputado Antonio Joaquim da Fonseca tem faltado e continuará a faltar ás sessões d'esta camara por motivo justificado. = João Eduardo Scarnichia.

2.ª Declaro a v. exa. e á camara que os srs. deputados Luiz Ferreira de Figueiredo e João Augusto Teixeira têem faltado a algumas sessões por motivo justificado e que faltarão ainda a mais algumas. = O deputado, Martinho Camões.

3.ª Declaro a v. exa. e á camara que os srs. deputados Antonio Maria de Moraes Machado, Albino Augusto Garcia de Lima, visconde de Pindella e Pedro Augusto Correia da Silva têem faltado e faltarão a algumas sessões por motivo justificado. = O deputado, Martinho Camões.

4.ª Declaro que por motivo justificado tenho faltado ás ultimas sessões. = José Borges de Faria, deputado por Braga.

5.ª Declaro a v. exa. e á camara que por motivo justificado faltei a algumas sessões. = O deputado, Martinho Camões.

6.ª Participo a v. exa. e á camara que os srs. deputados, Joaquim Teixeira de Sampaio e Adriano Cavalheiro têem faltado ás sessões por motivo justificado. = O deputado, Santos Viegas.

7.ª Declaro que o sr. deputado Joaquim Antonio das Neves não tem comparecido a algumas sessões por motivo de doença. = O deputado, Joaquim Germano de Sequeira.

8.ª Declaro que o sr. deputado Cypriano Jardim não tem comparecido ás sessões desde o dia 1 por motivo de doença. = Joaquim Germano de Sequeira.

9.ª Participo a v. exa. e á camara que o sr. deputado Manuel Correia de Oliveira tem faltado ás sessões por motivo justificado. = O deputado, Ponces de Carvalho.

10. a Participo a v. exa. e á camara que o sr. deputado João Pereira Teixeira de Vasconcellos tem faltado a algumas sessões e faltará ainda a mais algumas por motivo justificado. = O deputado, Lopes Navarro.

11.ª Participo a v. exa. e á camara que por motivo justificado não compareci á sessão de hontem.
Sala das sessões, 6 de abril de 1886. = Lobo Lamare.

12.ª Participo a v. exa. e á camara que o meu amigo e collega Augusto Poppe, não pôde comparecer á sessão de hontem e terá de faltar ainda a algumas sessões por motivo justificado.
Sala das sessões, 6 de abril de 1886. = Lobo Lamare.
Para a acta.

RECTIFICAÇÃO

Declaro que na sessão de 31 de março do corrente anno foi o exmo. sr. visconde das Laranjeiras e não eu, como por engano se publicou no extracto das sessões com essa data, quem apresentou a representação da camara municipal da Villa da Ribeira Grande, da ilha de S. Miguel, contra a reforma da actual circumscripção judiciaria, pedida pela municipalidade da Villa do Nordeste, e que foi mandada por mim para a mesa, na sessão de 26 de janeiro passado. = O deputado, Arthur Hintze Ribeiro.
Para a acta.

O sr. Presidente: - Com o officio que ha pouco foi lido, recebi da camara municipal de Alijó, uma representação dirigida a esta casa do parlamento, expondo as circunstancias em que se encontram as regiões vinhateiras do Douro e pedindo para serem convertidas em lei as propostas da commissão de defeza do Douro, approvadas em sessão de 19 de dezembro de 1885.
Os interessados pedem para que esta representação seja publicada na folha official.
Consulto a camara a este respeito.
Resolveu-se affirmativamente.
O sr. Firmino Lopes: - Mando para a mesa um parecer da commissão de verificação de poderes, declarando vago o circulo n.° 25, (Villa do Conde).
Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que entre desde já em discussão este parecer.
Resolveu-se affirmativamente.
Leu-se o seguinte:

PARECER

Senhores. - Á vossa commissão de verificação de poderes foi presente o officio do sr. João Marcellino Arroyo, participando que havia acceitado o cargo de vogal supplente do tribunal de contas, para que fôra despachado era 18 de fevereiro proximo passado.
É, portanto, a vossa commissão de parecer, á face do artigo 2.° do primeiro acto addicional á carta constitucional da monarchia, que o circulo n.° 25, (Villa do Conde), que o sr. João Marcellino Arroyo representava em côrtes, deve ser considerado vago para todos os effeitos legaes.
Sala das sessões da commissão, 6 de abril de 1886. = Firmino João Lopes = F.
Arouca = Moraes de Carvalho = Pereira Leite.
Foi approvado sem discussão.

O sr. Carrilho: - Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda, concluindo por um projecto de lei para te abrir novo credito supplementar, na importancia de 2:290$950 réis, ao artigo 9.° da tabella de despezas rectificadas do ministerio da fazenda, a fim de se poder occorrer ao pagamento de subsidios aos senhores deputados.
Peço a v. exa. que consulte a camara se dispensa o regimento para que possa desde já entrar em discussão este parecer.
Assim se resolveu, e foi lido o seguinte

PARECER

Senhores. - Á vossa commissão do fazenda foi presente a mensagem da illustre commissão administrativa d'esta camara, sobre a necessidade de dotar convenientemente a verba da tabella de despeza referente aos subsidios dos srs. deputados, que aliás já foi augmentada com a importancia de um credito supplementar na importancia de 6:542$240 réis, como do projecto de lei d'esta camara n.° 28.
É a vossa commissão, attendendo a que as sessões d'esta camara foram prorogadas até 8 do actual mez, entende, de accordo com o governo, que, para poderem ser pagos integralmente os referidos subsidios até 8 de abril corrente, deveis approvar o seguinte projecto de lei.

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Artigo 1.° É aberto, no ministerio da fazenda, um novo credito de 2:290$950 réis, supplementar ao do artigo 9.° da tabella de despeza rectificada do dito ministerio e actual exercicio de 1885-1886, para pagamento de subsidios e despeza de jornada dos srs. deputados.
Art. 2.° Fica revogada a legislação, em contrario.
Sala da commissão, aos 6 de abril de 1886. = Eduardo Coelho = Arthur Hintze Ribeiro = Luciano Cordeiro = Correia Barata = Franco Castello Branco = Filippe de Carvalho = Lopes Navarro = Marçal Pacheco = Adolpho Pimentel = Antonio Maria Pereira Carrilho, relator = Tem voto dos srs.: Francisco de Castro Matoso = Carlos Lobo d'Avila = Pinheiro Chagas.
Foi approvado sem discussão.

O sr. Avellar Machado: - Por parte da commissão parlamentar de inquerito agricola, mando para a mesa a declaração de que esta commissão elegeu para seu presidente o sr. Guilherme de Abreu em substituição do sr. José Maria dos Santos, que foi eleito par do reino, reelegendo para vice-presidente o sr. Estevão de Oliveira e para secretario o sr. Henrique de Mendia.
Ao mesmo tempo mando para a mesa um requerimento para que seja aggregado á mesma commissão o sr. Fontes Ganhado.
Por ultimo, peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte que entre desde já era discussão o parecer n.° 44.
O sr. Presidente: - Parecia-me conveniente deixar á mesa o regular a ordem dos trabalhos, pois que o parecer n.° 44 já está dado para ordem do dia.
O Orador: - Se v. exa. tenciona pôr ainda hoje em discussão o projecto a que me refiro, eu não tenho duvida em retirar o meu requerimento. Do contrario, mantenho-o.
Leu-se na mesa a seguinte

Participação

Communico a v. exa. e á camara, que a commissão parlamentar de inquerito agricola, nomeou para seu presidente o sr. deputado Guilherme de Abreu, confirmando a resolução tomada o anno passado, reelegendo para vice-presidente o sr. deputado Estevão de Oliveira, e para secretario o sr. Henrique Mendia. = Avellar Machado.
Para a acta.

Leu-se na mesa o seguinte:

Proposta

Por parte da commissão parlamentar de inquerito á agricultura, proponho que seja aggregado á mesma commissão os srs deputados Fontes Ganhado e Lobo Lamare. = Avelar Machado.
Declarada urgente, foi logo approvada.

O sr. Santos Viegas: - Tenho a honra de mandar para a mesa duas justificações de faltas, dos srs. Teixeira de Sampaio e Adriano Cavalheiro. Ao mesmo tempo pedia a v. exa., não havendo inconveniente n'isso, se dignasse dar para ordem do dia o projecto de lei n.° 74 da sessão passada.
As justificações vão publicadas no logar competetente.
O sr. Scarnichia: - Participo a v. exa. e á camara, que o sr. deputado Antonio Joaquim da Fonseca, não tem comparecido a algumas sessões e continuará a faltar a mais algumas, por incommodo de saude.
Peço a v. exa. que em occasião opportuna, se digne pôr á approvação da camara o projecto de lei n.° 160 do anno passado.
A justificação vae publicada no logar competente.
O sr. Consiglieri Pedroso: - Pedi a palavra, sr. presidente, suppondo que estivesse presente o sr. ministro do reino; como s. exa., porém, está empenhado n'uma discussão na camara dos pares, dirijo-me ao sr. ministro da justiça, visto que o assumpto de que vou tratar, igualmente se relaciona com a sua pasta.
O administrador do concelho de Beja oppõe-se a realisar o registo civil de duas creanças, filhas de dois individuos, um dos quaes reside ha quatorze annos n'aquella localidade; não ha rasão alguma para esta resistencia.
O registo civil é uma lei do paiz. Não ha motivo nenhum para que a auctoridade a que me refiro, e a quem está incumbida a execução d'esta lei, se negue ao cumprimento d'ella. É um abuso intoleravel.
Em consequencia da recusa do administrador, um dos individuos deliberou-se a processar esta auctoridade conforme a lei lh'o faculta.
Mas isto não basta, e é indispensavel a intervenção do governo.
Como pelo ministerio da justiça tambem se trata de registo civil, eu pedia ao sr. ministro da justiça, o favor de tomar as providencias necessarias para o inteiro cumprimento da lei, rogando-lhe ao mesmo tempo o favor de communicar ao seu collega do reino as minhas palavras.
Direi ainda, que provavelmente esta resistencia do administrador, é o resultado da circular confidencial de um ex-governador civil d'aquelle districto, em que este impunha aos seus subordinados, o não obedecerem ás prescripções da lei.
Apesar de parecer inaudito este facto, posso assegurar a v. exa. que similhante circular existia! É pois contra estes abusos, que eu peço as mais energicas providencias, porque seria uma vergonha deixal-os subsistir!
O sr. Presidente: - A commissão de redacção não fez alteração alguma ao projecto de lei n.° 51, que vae ser enviado á outra casa do parlamento.
O sr. Ministro da Justiça (Francisco Beirão): - Em resposta ao illustre deputado, que se me dirigiu, na ausencia do sr. ministro do reino, direi que tanto no assumpto a que s. exa. se referiu, como em todos os outros, o governo está na firme intenção de fazer cumprir as leis.
Não tenho, porém, communicação alguma do facto apontado pelo illustre deputado, e logo que o tenha tomarei as devidas providencias que dependam da minha pasta para que a lei, no tocante ao registo civil, seja cumprida.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Elvino de Brito: - Sr. presidente, tenho a honra de mandar para a mesa uma representação da camara municipal de Constancia, pedindo ao parlamento que interponha o seu valimento para que o caminho de ferro da Beira Baixa partindo da Praia, que é o ponto do entroncamento, atravesse o Zezere junto d'aquella villa e siga pela margem direita do Tejo.
Pedia a v. exa. consulte a camara se permitte que esta representação seja publicada no Diario do governo.
Assim se resolveu.
O sr. Mendes Pedroso: - Pedi a palavra para saber se os esclarecimentos relativos á quinta regional de Cintra, que pedi pelo ministerio das obras publicas na sessão de 23 de março, já vieram para a mesa.
O sr. Secretario: - O requerimento de s. exa. foi expedido em 24 de março e ainda não obteve resposta.
O sr. Mendes Pedroso: - Sinto-o, e já agora será inutil renovar a instancia.
Desejava agora saber do sr. ministro da fazenda se s. exa. já procedeu ás indagações que nos prometteu fazer com respeito ao desvio de direitos na alfandega do Porto, e se tencionava abrir um inquerito a esse respeito, como havia proposto o nobre ministro quando se achava na opposição.
Era conveniente saber-se se o desvio tinha effectivamente tido logar ou se a informação fôra calumniosa.
O sr. Ministro da Fazenda (Mariano de Carvalho): - O negocio a que o illustre deputado alludiu não foi aqui levantado por mim mas sim pelo meu colloga o sr. Emy-

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gdio Navarro, e refere-se não á alfandega do Porto mas sim á alfandega de Lisboa. A denuncia é que foi feita por um empregado da alfandega do Porto.
Posso informar a s. exa. que o processo segue os seus termos, e tenha o illustre deputado a certeza de que eu não o abandono nem um momento. Hei de proceder a respeito d'este como já procedi a respeito de outro que já deu em resultado a demissão de um empregado e a suspensão de outro, bem como a condemnação a uma multa da casa contraventora.
Devo acrescentar que já n'estes ultimos dias se descobriu outro caso de descaminho de direitos, e posso assegurar á camara que a respeito de todos hei de proceder com a mesma energia.
O sr. Lamare: - Mando para a mesa uma representação dos professores de instrucção primaria da circumscripção de Lisboa, pedindo modificações nas leis de 2 de maio de 1878 e 11 de junho de 1880.
Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se permitte a sua publicação na folha official.
Já que estou com a palavra, desejava que v. exa. me dissesse se já chegaram os documentos que pedi, pelos ministerios das obras publicas e da guerra.
Foi approvada a publicação da representação.
O sr. Secretario: - Os documentos a que o illustre deputado se refere foram pedidos, os do ministerio das obras publicas, em 19 de março d'este anno, e os do ministerio da guerra em 2 de abril, e ainda não vieram.
O sr. Adolpho Pimentel: - Desejava fazer algumas considerações em presença do sr. ministro do reino, mas como s. exa. não compareceu, peço que se me reserve a palavra para occasião opportuna.

ORDEM DO DIA

Leu-se na mesa o

PROJECTO DE LEI N.° 36

Senhores. - A vossa commissão de administração publica, julgando procedentes as rasões allegadas na representação da camara municipal dos Arcos de Valle de Vez, a que se refere o projecto de lei, apresentado na sessão de 12 do corrente, e que acompanha o referido projecto, é de parecer, ouvido o governo, que o projecto seja convertido em lei nos seguintes termos:

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal dos Arcos de Valle de Vez a applicar dos fundos da viação municipal a quantia de 6:873$352 réis para construcção de um tribunal judicial, de uma casa de detenção e da ponte de Santar.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da commissão, em 23 de março de 1886. - Marçal Pacheco = J. A. Neves = Franco Castello Branco = Guilherme de Abreu = M. d'Assumpção =L. Cordeiro = Adolpho Pimentel = Neves Carneiro = A. da Cunha Bellem = Pereira Leite, relator.

N.º 22-I

Senhores. - A camara municipal dos Arcos de Valle de Vez, na representação que dirige a esta camara, e que tenho a honra de mandar para a mesa, pede auctorisação para applicar dos fundos de viação municipal a quantia de 6:873$352 réis, a fim de construir um tribunal judicial, uma casa de detenção e a ponte de Santar.
São perfeitamente attendiveis as considerações allegadas na dita representação, que mando para a mesa com o meu projecto.
O estado de viação municipal do concelho dos Arcos torna evidentemente preferivel a applicação da verba pedida para as obras indicadas na representação.
São de uma necessidade inadiavel as obras que a camara pretende realisar.
A verba que a camara pede no imposto para viação municipal não chega para metade das despezas orçadas.
A camara dos Arcos carece ainda de fazer grandes sacrificios para concluir as mencionadas obras. A verba pedida é um simples auxilio. Ainda que estivesse muito atrazada a viação municipal dos Arcos, não haveria estrada cuja importancia podesse equiparar-se á das obras projectadas.
N'estas circumstancias, entendo que deve merecer a vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É auctorisada a camara municipal do concelho dos Arcos de Valle de Vez a applicar dos fundos de viação municipal a quantia de 6:873$352 réis para construcção de um tribunal judicial, de uma casa de detenção e da ponte de Santar.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.
Sala das sessões da camara, 27 de março de 1886. = A. Neves Carneiro.

O sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade e na especialidade.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Estou completamente de accordo em que é necessario modificar a lei de 1864, que diz respeito aos fundos do viação municipal, mas em nome do governo estou em completo desaccordo sobre esse projecto de lei e sobre todos que forem de igual natureza.
A camara póde votal-os, porque é soberana, mas o governo não toma a responsabilidade d'elles. (Apoiados.)
O sr. Consiglieri Pedroso: - Estou perfeitamente conforme com a declaração do governo.
Já o anno passado, nas vezes que se tratou aqui de desvio de fundos de viação municipal, eu fui um dos poucos deputados que sustentou uma verdadeira campanha contra similhante processo de illudir a lei.
Mandei até para a mesa uma proposta em virtude da qual não deveria ter andamento nenhum dos projectos analogos emquanto se não resolvesse ácerca do assumpto por meio de uma disposição geral.
Portanto, sr. presidente, não posso deixar agora de me congratular com o sr. ministro da fazenda pela declaração que acaba de fazer; entendo que é tempo de pôr um dique a esta torrente de projectos, que ameaçam fazer perder os beneficos effeitos de uma lei que foi votada em virtude de urgentes reclamações publicas.
Precisa a legislação de 1864 de ser reformada, n'um sentido mais descentralisador?
Assim o creio.
Mas emquanto ella subsistir é indispensavel que se não illuda, e principalmente que o parlamento não seja cumplice de tal infracção.
O sr. Neves Carneiro: - Sr. presidente, como não está presente o sr. relator da commissão, pedi a palavra, como auctor do projecto, para dizer duas palavras em sua defeza.
Preciso primeiramente dizer a s. exa. e á camara, em resposta ao sr. ministro da fazenda, que acaba de declarar, em nome do governo, que não concorda com o projecto, que o sr. ministro do reino, presente á sessão da commissão de administração publica, em que se discutiu e approvou este projecto, declarou que era, em geral, contrario ao pensamento dos projectos d'esta natureza, mas que se não oppunha a este, embora o não perfilhasse e defendesse, como membro do governo. O mesmo illustre ministro reconheceu n'essa occasião a importancia das obras projectadas pela camara dos Arcos. Em summa, o nobre presidente do conselho declarou que não tomava a iniciativa do projecto, mas que se não oppunha a que a maioria

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da camara, que não era sua partidária, lhe desse o seu voto, como tinha o direito de dar.
Em virtude desta declaração do governo no seio da commissão, não empregou o parecer as palavras: de accordo com o governo, que se encontram nos outros pareceres, apresentados pelas commissões, em attenção às relações de provada benevolência que se têem mantido entre o governo e a maioria.
Sr. presidente, to projecto não merece as honras de uma larga discussão. É um modesto projecto de interesse local, similhante a muitos que têem passado., no parlamento sem a menor difficuldade.
A camara municipal dos Arcos de Valle de Vez pediu, numa representação dirigida a esta camara, e que eu tive a honra de enviar para a mesa conjunctamente com o projecto que se discute, que fosse auctorisada a applicar dos fundos da sua viação municipal a quantia de seis contos e tantos mil réis para construcção de um tribunal judicial, de uma casa de detenção e de uma certa ponte.
Allega esta camara que estas obras são mais necessárias e urgentes de que as poucas estradas municipaes que lhe restam por fazer.
Diz que é acanhada e imprópria a casa era que actualmente funcciona o tribunal e que é indecente e incapaz o local que serve de casa de detenção. Acrescenta que têem sido reiteradas as reclamações dos juizes de direito da comarca relativamente a este objecto.
Quanto á ponte de Santar, está evidentemente comprehendida no pensamento geral da lei que regula a viação municipal e é reclamada pelos interesses commerciaes e agrícolas das localidades que mais directamente favorece.
Que póde objectar-se á materia da representação que serve de base ao projecto que se discute? Quem é mais competente para apreciar a questão de facto? A camara dos Arcos assevera que, no estado de adiantamento da sua viação municipal, é preferivel a applicação que intenta fazer.
De resto, s. exa. e a camara hão de reconhecer por certo, como reconhece o sr. presidente do conselho no meio da commissão, a necessidade urgente das obras que a camara dos Arcos projecta levar a effeito com a applicação dos fundos mencionados.
Quanto á questão de princípios, não póde facilmente sustentar-se que seja contrario aos bons principios de administração local que os fundos dos municipios tenham a applicação que for mais favorável aos interesses do concelho, segundo o parecer dos seus legítimos representantes.
Resta só a questão da lei de 1864, cujo pensamento e disposições se não contestam, e por causa da qual é submettido á sancção parlamentar o projecto que se discute.
De resto, sr. presidente, o projecto que se discute fundamenta-se, pouco mais ou menos, nas mesmas considerações com que se têem sustentado centenas de projectos da mesma natureza, que têem sido approvados sem discussão em ambas as casas do parlamento.
Ao contrario, são de uma necessidade especial e inadiavel as obras a que se refere o projecto, e tornam por isso mais justa e conveniente a sua approvação pelo parlamento.
O sr. Marçal Pacheco: - Sr. presidente, preciso dizer a v. exa., e á camara, algumas palavras que são tanto mais necessárias, quanto são recommendadas pela minha lealdade.
Tenho a honra de ser presidente da commissão que deu este parecer. Quando nella se discutiu este assumpto, estava presente o sr. ministro do reino e presidente do conselho de ministros, e v. exa., o sr. ministro da fazenda e a camara, comprehendem de certo que, dada a situação política, que é conhecida, nenhuma commissão se lembraria de dar um parecer sobre qualquer projecto para o trazer á camara, contra a opinião do governo, porque imperaria isso desde logo a abertura de uma crise entre a maioria e o governo.
O sr. ministro do reino disse na comissão que, sim se conformar em principio com estes desvios de dinheiro dos fundos para viação municipal, embora para serem applicados a melhoramentos tambem municipaes, todavia não reprovava este de que se trata, e se contentava com a declaração de que tinha sido ouvido o governo.
Depois desta declaração do sr. ministro do reino, fui eu que propuz á commissão a discussão deste parecer.
Por consequência, comprehende v. exa., que a maioria, em ter deixado de cumprir o seu dever de lealdade com o governo, e de hombridade para consigo própria, póde e deve approvar este parecer.
Quanto á questão, de serem, em principio, inconvenientes estas infracções periódicas, que se dão na salutarissima lei de 1864, creio que todos estão de accordo; mas fazem-se, e justificam-se excepções, e esta não é mais importante do que outras, que se têem feito, e portanto não vejo que a camara proceda incorrectamente, nem menos lealmente na sua situação politica com o governo, votando este parecer. (Apoiados.)
(S. exa. não reviu.)
O sr. Rocha Peixoto: - O precedente não póde ser prejudicial, porque não me consta que haja muitos projectos nestas circumstancias. E como filho da provincia do Minho, não posso deixar de estranhar que se levante tanta opposição contra este projecto que interessa a um concelho daquella província que tão poucos favores desta natureza tem pedido.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): - Eu não combati o projecto, nem digo que a camara municipal dos Arcos de Valle de Vez tem ou não rasão. O que disse foi que a camara estava no direito de votar este projecto ou outro idêntico, mas que o governo não toma a responsabilidade de qualquer delles, porque não concorda com a sua doutrina.
O sr. Elvino de Brito: - (O discurso será publicado quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente: - Está exgotada a inscripção. Vae verificar-se se ha numero para se votar.
(Pausa.)
Não ha numero para a camara poder deliberar, porque estão apenas presentes 46 srs. deputados, e por isso fica adiada a votação do projecto. Ha todavia numero para a camara poder continuar a funccionar, e como ficou aberta a inscripção sobre o projecto n.° 46, póde proseguir a discussão desse projecto.
O sr. Avellar Machado (para um requerimento): - Ha pouco prescindi da votação de um requerimento, porque v. exa. se comprometteu a pôr em discussão os projectos pela ordem numérica...
O sr. Presidente: - O sr. deputado pediu agora a palavra para um requerimento, e foi para isso que eu lha concedi.
O sr. Avellar Machado: - Nesse caso requeiro a v. exa. que, consultando a mesa, veja se deve ou não pôr em discussão os projectos que estão em, ordem do dia pela sua ordem numérica.
O sr. Presidente: - Eu já declarei que não havia na sala numero para a camara poder deliberar.
Vozes: - Já ha numero.
O sr. Presidente: - Para a camara poder deliberar é necessario que estejam presentes 57 srs. deputados, e segundo a contagem feita pelo sr. secretario, estavam apenas presentes 47. Vae verificar-se novamente se ha numero.
(Pausa.)
O sr. Presidente: - Estão presentes apenas 43 srs. deputados, e por consequencia não ha numero para a camara poder deliberar; mas ha numero para a camara pó-

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der funccionar, e por isso vae continuar a discussão do projecto n.° 46.
O sr. Marçal Pacheco (para uma questão prévia): - Continua em discussão o projecto de lei n.° 46, que trata das ferias judiciaes. Este projecto está assignado pelos srs.: Neves Carneiro, Affonso Geraldes, Eduardo José Coelho, Pereira Leite, Martinho Camões e Germano de Sequeira. São, pois, seis, como v. exa. vê, os membros da commissão que assignam este parecer. Ora o artigo 122.° § 1.° do regimento diz o seguinte:
«Nenhum parecer ou projecto de qualquer commissão poderá ser impresso, nem distribuído, nem dado para discussão, sem estar assignado pela maioria dos seus membros e especificado o relatar.»
Chamo a attenção de v. exa., sr. presidente, sobre este assumpto porque se trata de uma questão que respeita á mesa. Eu tenho aqui o livro das commissões para 1886, e vejo que a commissão de legislação civil é composta dos seguintes membros, os srs.:

Albino Garcia de Lima.
Augusto Neves dos Santos Carneiro.
Fernando Affonso Geraldes.
Firmino João Lopes.
Frederico de Gusmão Correia Arouca.
João Franco Castello Branco.
João Marcellino Arroyo.
Joaquim António Neves.
Joaquim Germano de Sequeira.
Joaquim Teixeira de Sampaio.
José de Abreu do Couto Amorim Novaes.
José Maria Borges.
Emygdio Júlio Navarro.

A estes, que foram eleitos pela camara, acresceram, por aggregação, mais o membros, achando-se por isso composta actualmente de 16 a commissão de legislação civil.
Eu estudei pouco de mathematica, mas ainda assim cheguei a ficar sabendo que a maioria de 16 anda por uns 9, (Riso.) e como vejo aqui apenas 6 assignaturas, a não ser que. 6 seja igual a 9, parece-me claro que este projecto, segundo o regimento, não podia ser impresso, distribuido, nem dado para discussão; e todavia elle está impresso, distribuído e dado para ordem do dia.
Desejava, pois, que v. exa., em nome da mesa, me esclarecesse sobre as causas que motivaram o não cumprimento do regimento nesta parte. Creio que alguma rasão deve haver, porque v. exa., a quem eu tributo o máximo respeito e consideração, tem-so distinguido, não só pela sua imparcialidade, mas pela muitíssima competência com que dirige os trabalhos desta camara, (Muitos apoiados.) e por isso, a não ser por um d'esses lapsos que são tão naturaes em v. exa. como em qualquer outro, não sei como explicar a irregularidade a que alludo; e se houve efectivamente lapso, estamos a tempo de o emendar, enviando o projecto á commissão.
O sr. Presidente: - Tenho a informar o sr. deputado que o projecto entrou em discussão na sessão de hontem, em resultado de uma deliberação da camara, para ser dispensado o regimento.
O parecer foi remettido para a mesa pelo sr. relator da commissão e por parte da mesa foi mandado imprimir, porque naturalmente se considerou que os membros que assignaram o parecer representavam a, maioria dos onze que nos termos das disposições regimentaes em vigor deve ter a commissão de legislação civil.
Mas o procedimento da mesa, mandando imprimir o parecer e distribuil-o, está inteiramente approvado pela camara, desde que ella resolveu que o projecto entrasse em discussão.
N'estas circumstancias a questão prévia para que o parecer volte á commissão é uma moção de adiamento; que póde ficar em discussão conjunctamente com este parecer, conforme permitte o regimento.
O Orador: - V. exa. comprehende bem que eu na minha ordem de idéas não posso acceitar essa indicação. (Apoiados.)
Se eu proponho que o parecer volte ás commissões para vir em termos de ser discutido, é claro que não posso concordar em que a minha questão previa fique ao mesmo tempo em discussão com o parecer. Desse modo eu não conseguiria o fim que tive em vista ao apresentar a questão.
O sr. Presidente: - A questão prévia importa o adiamento e este, nos termos do regimento, póde ser discutido antes da questão principal ou simultaneamente; mas a deliberação sobre este ponto é da competência da mesa, a menos que a camara não tenha tomado uma deliberação em contrario.
Pela minha parte entendo que a questão prévia considerada como adiamento deve ficar em discussão simultaneamente com o projecto.
O Orador: - Peço licença para replicar á muito habilissima explicação que v. exa. me acaba de dar.
V. exa. diz que a questão previa importa o adiamento e como tal póde entrar em discussão conjunctamente com a materia; mas eu observo que nem sempre o adiamento é uma questão prévia; de onde se segue que a doutrina que rege o adiamento não é aquella que rege a questão prévia.
V. exa. recorda-me a doutrina que rege o adiamento, e diz-nos - que assim como o adiamento entra conjunctamente em discussão com a matéria, assim a questão prévia, que importa tambem um adiamento, entra igualmente em discussão conjunctamente com a matéria! Mas v. exa. podia, talvez, querendo solicitar um pouco mais as vastíssimas faculdades da sua intelligencia, reconhecer que a doutrina que rege a questão prévia não é precisamente a mesma que rege o adiamento, a não ser que v. exa., por um esforço de habilidade na argumentação, iguale a questão prévia ao adiamento. Neste caso, embora as consequências sejam as mesmas, o que é facto é que os assumptos são completamente diversos.
V. exa. bem vê que o adiamento póde resultar de não estar a matéria sufficientemente esclarecida; póde resultar, e resulta quasi sempre, da inopportunidade da matéria que está em discussão.
Ora eu não discuto agora a inopportunidade da discussão deste projecto; esta discussão funda-se na necessidade de alargar as ferias, por causa das colheitas da uva e do pão! (Riso.)
Desde já vou declarando que, quando este projecto vier definitivamente á discussão, depois de terminada esta questão prévia, hei do apresentar tambem o argumento do figo, porque sou do Algarve. (Riso.) Os figos começam a colher-se em principio de agosto, e tambem quero tempo para a sua colheita. As férias devem começar em agosto... (Riso. - Apoiados.)
Depois virão alguns collegas mais, uns com o argumento da apanha da batata, outros da azeitona, e assim se irão alargando as ferias até não haver tempo útil para administrar justiça.
Mas não entro neste momento no fundo da questão e, por consequência, não trato senão de saber só este projecto está nas condições regimentaes de poder ser discutido. Pela minha parte entendo que não está, pela rasão que já apresentei, de não estar nelle assignada a maioria da commissão.
O sr. Carrilho: - A camara dispensou o regimento para que elle entrasse em discussão.
O Orador: - A camara dispensou o regimento, mas não dispensou todo o regimento.
Houve dispensa parcial do regimento; não se póde dispensar o regimento todo se fosse assim estava dispensado

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tudo e nós escusavamos de estar aqui a discutir e a votar.
O sr. Carrilho: - A camara quando dispensou o regimento não distinguiu...
O sr. Presidente: - Peço ao illustre deputado que não interrompa o orador.
O Orador: - Se v. exa. me dá licença, peco-lhe para que consinta em que o illustre deputado continue a interromper-me, porque me esclarece.
Diz-me o illustre deputado no seu aparte, que a camara não distinguiu na dispensa do regimento! A camara não podia dispensar o regimento para entrar em discussão o que não é ainda parecer, porque não tem o voto da maioria da commissão;
Se a camara entende que deve dispensar este projecto do parecer, muitíssimo bem; vamos a discutil-o sem parecer; mas não se diga á vossa commissão foi presente ... quando o não foi; isso importa uma falsidade, porque a commissão não póde funccionar quando não está em maioria.
Portanto, torno a dizer a v. exa., por maior que seja o desgosto que isso me cause, não posso concordar no modo como v. exa. indicou que vae apresentar a questão previa. Se v. exa. entende que a questão previa deve entrar em discussão conjunctamente com a materia do projecto, eu peço então o mais humilde e respeitosamente, que é possivel, licença para appellar da decisão de v. exa. para a camara. Isto sem a mínima quebra do muito respeito e da muita consideração que tenho por v. exa.
O sr. Presidente: - Eu não posso consultar a camara sobre a classificação desta questão previa, porque ainda não ha numero na sala para a camara poder resolver.
Tenho a declarar ao sr. Marcai Pacheco que a mesa continua ainda a considerar esta moção como uma moção de adiamento.
De facto, o que a moção propõe é que o projecto volte á commissão de legislação civil para ser por ella visto novamente, e por consequência para que seja adiada a discussão do projecto até que a commissão dó parecer, nos termos em que o sr. Marçal Pacheco entende que seria regular e conforme às disposições regimentaes.
Se o projecto não estivesse já em discussão, com inscripção aberta e em resultado de uma deliberação da camara, a questão prévia teria de ser discutida e votada antes do projecto; mas desde o momento em que a discussão deste está aberta, por virtude de uma deliberação da camara, e que sobre o mesmo projecto já fallaram diversos oradores, entre os quaes o próprio sr. Marçal Pacheco, a mesa não póde deixar de considerar a proposta do illustre deputado como um adiamento, deixando á camara a classificação e resolução da proposta, visto que o sr. Marcçal Pacheco entendeu dever appellar para a resolução da assembléa.
Repito, a mesa entende que, nas condições actuaes em que se encontra a discussão deste projecto, não póde deixar de considerar como uma proposta de adiamento a questão prévia; mas, se o illustre deputado se não conforma com esta resolução, a camara resolverá.
O Orador: - Eu bem sei que esta questão prévia importaria um adiamento, se a camara estivesse em condições de a poder approvar; mas para os effeitos de ser considerada como adiamento, é que me parece não ser assim.
V. exa. nota que, no estado da discussão não póde deixar de considerar a proposta como um adiamento, porque a ser questão prévia devia ter sido apresentada antes; mas eu estava e estou convencido ainda de que v. exa. apresentou este projecto á discussão julgando que elle estava assignado pela maioria da commissão, por isso que, sendo do regimento ser a commissão de legislação composta de onze membros, desde que estavam seis assigmidos, tinha a maioria; de onde se concluo que v. exa. tinha pensado que a dispensa do regimento não abrangia este caso
O sr. Carrilho: - Mas a camara dispensou o regimento.
O Orador: - No espirito do sr. presidente o que pesou foi o estar o parecer assignado por seis membros da commissão, e como o regimento dizia que fosse composta de onze, seis era a maioria.
O sr. Carrilho: - Mas a camara dispensou o regimento.
O Orador: - Valha-nos Deus! não dispensou para este caso, nem o podia dispensar, porque, se a camara tivesse dispensado o regimento todo, tambem era de mais estarmos a discutir e votar este projecto. Teria sido dispensada a discussão e a votação...
O sr. Carrilho: - Dispensou o regimento até ao começo da discussão.
O Orador: - Isso importa o mesmo que dizer que a camara entendeu que podia discutir o projecto sem parecer.
Uma voz: - Era possível.
O Orador: - Diz um meu collega que era possível, e eu digo que, se a camara resolvesse que se discutisse este projecto sem parecer, igualmente teria resolvido que fosse approvado sem discussão e sem votação. Em tal caso, para que está em discussão? O absurdo é manifesto. A camara não resolveu nem podia resolver, creia o meu illustre amigo o sr. Carrilho...
O sr. Carrilho: - Eu não estava na sala quando se dispensou o regimento.
O Orador: - Pois parece que estava, pela maneira por que está interpretando a resolução da camará.
O sr. Carrilho: - Vi as actas e os extractos da sessão.
O Orador: - O illustre deputado, que é um dos mais velhos parlamentares, que conhece o regimen interno da camara como poucos, (e n'isto não lhe faço lisongerias nem lhe dirijo amabilidades que não mereça) o illustre deputado, que é dos mais sabedores de matérias de pareceres e não pareceres, que é "relator da maioria dos projectos, sabe a doutrina que rege este assumpto.
O sr. Carrilho: - A camara é soberana nas suas decisões.
O Orador: - Ora a camara é muito sabia, tem poderes muito soberanos, mas não póde com a sua soberania, por exemplo, supprimir o illustre deputado (Riso.) porque s. exa. seria o primeiro a revoltar-se contra similhante latitudinaria soberania.
A camara póde dentro dos limites da carta dispensar um ou outro artigo do regimento para um certo parecer entrar em discussão, mas para que um parecer seja parecer de uma commissão é necessario que tenha a maioria dos membros dessa commissão. Contra isto não ha nem sabedoria nem soberania possíveis.
Se o illustre deputado, ou algum collega nosso, pede á mesa que consulte a camara sobre se dispensa o regimento para entrar tal ou tal parecer em discussão, é claro que é de um parecer, que se trata, sob pena de enganar a mesa e a camará. Ninguém ousa dizer «peço que entre em discussão este parecer» sem ser parecer: se é parecer deve ter a assignatura da maioria dos membros da commissão; logo não póde em caso algum suppor-se que a camara dispensa o regimento neste ponto. Isto é incontestável e incontroverso.
Portanto, continuo a dizer a v. exa. que, embora eu não tivesse apresentado esta questão prévia no começo da discussão, porque realmente não reparei no numero das assignaturas e suppuz, como v. exa. suppoz, e assim toda a camara, que quando se mandava para a mesa um parecer era nas condições do regimento, todavia e nem por- isso a minha proposta deixa de ser questão prévia, porque aquillo que é vicioso e nullo de origem é nullo e vicioso sempre.
De novo torno, pois, a solicitar de v. exa. a benevolência, a justiça, de mandar á commissão este projecto para

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vir formulado conforme as disposições do regimento. Se v. exa. tem duvida nisto e continua a insistir no seu propósito, eu continuo então a insistir no meu propósito, pedindo licença a v. exa. para appellar da decisão de v. exa., que tenho na mais subida conta, para a camara, para ella na sua soberania julgar deste processo.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
O sr. Presidente: - Continua a não haver numero sufficiente de srs. deputados na sala para eu poder consultar a camara sobre qualquer assumpto.
Acham-se presentes apenas 42 srs. deputados; com este numero nem mesmo póde a camara funccionar; por isso vou encerrar a sessão.
A ordem dia para amanha é a continuação da que estava dada, e mais os projectos n.° 64, deste anno, e 160 de 1885.
Está levantada a sessão.
Eram cinco horas e um quarto da tarde.

Discurso proferido pelo sr. deputado Alfredo Filgueiras da Rocha Peixoto, na sessão de 12 de março de 1886, e que devia ler-se a pag. 622, col. 1.º

O sr. Alfredo da Rocha Peixoto: - Na sessão de 10 de julho de 1885 o sr. conselheiro Pinheiro Chagas, então ministro da marinha e do ultramar, apresentou a proposta de lei n.° 126-A, para a qual chamo especialmente a attenção do sr. presidente do conselho de ministros.
Não farei a historia completa do acto de valor a que se refere e em .que se funda esta proposta, para que cada um de nós fique convencido da justiça do prémio nella consignado, prémio que para esta camara e para o paiz representa o pagamento de uma divida sagrada.
Lerei apenas uns períodos do primoroso relatório desta proposta:
«Quando o major da guarnição da província de Moçambique, José Ayres Vieira, antevia um futuro brilhante na sua carreira militar, por isso que aos trinta e quatro annos de idade e mais de vinte de serviço, sendo a maior parte deste prestado em África, tinha obtido aquelle posto pelas suas distinctas informações e reconhecido zelo, demonstrado em muitas e importantes commissões por cujo desempenho mereceu louvores e mercês honorificas quiz a fatalidade que, sendo commandante da praça de S. Sebastião, da cidade de .Moçambique, e tentando no dia 18 de fevereiro de 1883 impedir, como impediu, que um cabo de esquadra do batalhão de caçadores n.° 1, da dita província, commettesse o crime de assassínio contra o seu commandante, o tenente coronel João António Fernarini, estando já com a carabina carregada e apontada, succedeu disparar-se o tiro, na lucta que José Ayres Vieira travou com o assassino, ficando este infeliz official com o joelho direito esmigalhado, sendo necessario em seguida proceder-se á amputação da perna.
«Por causa deste acto de valor teve o major Vieira de ser reformado em tão curta idade, vendo assim prejudicada a sua carreira militar; e recorreu ao governo pedindo que lhe fosse concedido o augmento de vencimento a que se refere a tabella n.° 1 da carta de lei de 8 de junho de 1863.º
O prémio proposto é pois considerar-se este bravo e desditoso official como tendo sido ferido e mutilado em combate. É de justiça incontestável e evidente.
Esta proposta foi enviada às commissões do ultramar e fazenda.
Não estranho que o assumpto seja novidade para o sr. presidente do conselho de ministros; nem peço a s. exa. que ácerca delle tome desde já um compromisso solemne. O que peço é que interceda perante o sr. ministro da marinha e ultramar, cuja ausência lamento nesta occasião, para que s. exa. examine o processo e veja se realmente se trata ou não de uma divida de sangue que a nação portugueza tem obrigação de pagar por sua honra.
Se o sr. presidente do conselho de ministros estiver habilitado a responder-me, creio que ficarei muito satisfeito com as suas declarações, as quaes não podem deixar de ser justas e em harmonia com os meus desejos; se porém s. exa. não tiver ainda conhecimento completo da questão, solicito de s. exa. a fineza de recommendar este importantissimo assumpto ao seu collega dos negocios do ultramar.
Antes de entrar em outros assumptos, para os quaes pedi a palavra, permitta-me v. exa. que eu dê á camara, e em especial ao meu excellente amigo o sr. Pereira Leite, a gratíssima noticia de que, para que um medico portuguez vá a Paris estudar o systema prophylactico contra a raiva, não é necessario que o governo tome a iniciativa. É conveniente que a tome; é mesmo necessario que mande um medico habilitado estudar este maravilhoso e utilíssimo processo; não terá, porém, a gloria de tão profícua iniciativa. Em Paris e no instituto de Pasteur, já está Portugal representado por um talentoso medico, que no ultimo anno lectivo concluiu o seu curso na universidade.
O distincto medico e meu amigo Joaquim Martins Teixeira de Carvalho partiu, ha cerca de um mez para Paris, a fim de estudar com toda a proficiência de que é capaz, este assumpto, que escolheu para a dissertação inaugural do acto de conclusões magnas, que se propõe defender para doutorar-se.
É-me gratíssimo consignar aqui este facto honrosissimo para a nossa universidade.
Agora vou dirigir-me ao sr. ministro do reino sobre assumptos de sua especial e bem reconhecida competência. Sei que estão inscriptos muitos collegas meus, a quem não quero prejudicar; portanto omittirei alguns assumptos de que desejava tratar; e resumirei, quanto possível, as minhas observações.
Pergunto em primeiro logar ao sr. ministro do reino se s. exa. tenciona deixar que continue o abuso, que tem havido, na generalisação do artigo 75.° da lei de instrucção secundaria de 14 de junho de 1880 para a nomeação dos professores provisórios e transformação destes em effectivos. Se o nobre presidente do conselho de ministros tem ainda a mesma opinião que tinha, ha mezes, sendo o chefe da opposição parlamentar nesta casa, fico satisfeito e esperando que s. exa. fará terminar tão desastrado abuso.
O artigo citado é o seguinte:
«Os actuaes professores provisórios só poderão ser nomeados proprietarios, sem exame, se tiverem mais de seis annos de bom e não interrompido serviço, e se mostrarem habilitados com a carta de algum curso superior, análogo á cadeira que tiverem regido nos seis annos ultimos, ou se tiverem mais de quinze annos de bom e não interrompido serviço, embora careçam de habilitação especial superior.
«Em qualquer dos casos a nomeação não póde ser feita sem proposta do conselho escolar, approvada pelo governo e voto affirmativo do conselho superior de instrucção publica.»
Não discuto agora esta disposição, que é monstruosa, mesmo com o caracter de excepção em que primitivamente por lei foi decretada; hei de aproveitar para isto a primeira occasião boa que se deparar.
E certo que este artigo se refere unicamente aos professores provisórios, que como taes funccionavam quando entrou em execução esta lei de instrucção secundaria, e em condições pela mesma lei fixadas. Não póde este artigo ser interpretado de modo que o ministro do reino tenha o direito de escolher para proprietários os professores provisorios que quizer, como possuindo as condições aqui indicadas.
É singular o que aconteceu com esta lei, e estou fallando com tanta sinceridade, que sei bem que estas minhas observações dizem respeito especial ao ultimo gabinete.
Esta lei tem sido executada em todas as suas partes,

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menos na única, que era essencial, a que determina que se proceda immediatamente a concursos, porque, desde o principio da execução desta lei até boje, ainda não se abriu um só concurso. O que tem havido, meus senhores, é uma serie de candidatos com bons empenhos e sem habilitações, até sem exame de instrucção primaria, os quaes têem sido nomeados professores provisórios. Depois de tudo isto, surgem novamente os empenhes para completarem o tempo indicado naquelle artigo, que é de quinze ânuos em geral e de seis para os que estiverem habilitados com curso superior análogo á disciplina que tiverem professado.
É principalmente por este motivo que a instrucção secundaria caiu no estado desgraçadissimo e vergonhosissimo em que infelizmente a vemos. (Apoiados.)
Não me alongarei nestas considerações, porque não quero prejudicar os meus collegas que estão inscriptos em seguida a mim. O que desejo é que o sr. presidente do conselho de ministros diga explicitamente, com a franqueza que o distingue nas suas declarações, se se compromette a nunca abusar deste artigo da lei de 14 de junho de 1880.
Passo a outra pergunta dirigida a s. exa. ainda.
Tenciona o nobre presidente do conselho de ministros determinar que não façam parte dos jurys dos exames de instrucção secundaria professores que tenham exercido leccionação particular?
É s. exa. de opinião que esta industria seja prohibida aos professores públicos de instrucção superior e secundaria?
Se na anterior questão desejo e estimo que o sr. presidente do conselho de ministros tenha a mesma opinião que aqui defendeu, ha mezes, como deputado da opposição, nestoutra, a que acabo de referir-me, desejo e estimo que o illustrado estadista se afaste, e para bem longe, do esperançoso deputado de 1855.
Como s. exa. sabe, foi devido unicamente á sua própria influencia e á sympathia da sua palavra que o seu fallecido mestre, de veneranda e saudosa memória para todos nós, o visconde de S. Jeronymo, foi vencido nesta questão.
O sr. presidente do conselho argumentava então com a liberdade da industria, liberdade que sustentava com enthusiasmo e sem restricção alguma; com essa liberdade prejudicou a causa da instrucção secundaria e até da superior. A experiencia ha de ter-lhe mostrado, creio bem, que errou nessa occasião; e honrosissimo será para s. exa. emendar hoje, no elevado cargo que occupa, o erro commettido no principio da sua afortunada carreira parlamentar.
Assim tambem prestará um tributo de gratidão á memoria do seu antigo mestre o visconde de S. Jeronymo, cuja auctoridade foi sempre respeitável para todos e por todos respeitada.
Deixando por agora estas questões de instrucção secundaria, desejo que s. exa. declare se está disposto a acceitar uma das indicações feitas pelo conselho superior de instrucção publica, na sua sessão plenária, ácerca dos cursos preparatórios para os estudos médicos.
Refiro-me á exigencia feita aos aluirmos que se destinam á faculdade de medicina na universidade de Coimbra, absurda exigencia, que os obriga a frequência e a exame do primeiro anno da faculdade do mathematica. Sá s. exa. tivesse frequentado este curso, sabia eu já qual seria a sua opinião a este respeito.
Estou certo de que não hesitaria em dispensar desta habilitação, ainda no corrente anno lectivo, por meio de uma providencia legislativa, os alumnos que se destinam, á faculdade de medicina.
Para o ingresso nas escolas de medicina de Lisboa e do Porto, não é exigida esta habilitação de instrucção superior; basta o exame do curso completo de mathematica elementar dos lyceus.
D'esta exigencia tem resultado que muitos alumnos têem demorado annos o inicio dos seus estudos médicos sem vantagem alguma.
O argumento apresentado para obrigar estes alumnos ao estudo do primeiro anno mathematico, na sua mais simples expressão, reduz-se ao seguinte:
O medico precisa de saber physica; para isto carece de possuir as noções fundamentaes do calculo differencial e conhecer as regras do calculo integral; e portanto é indispensavel para o medico o primeiro anno mathematico.
Mas, sr. presidente do conselho de ministros, veja o programma a este curso. Não encontra lá calculo differencial, nem integral!
Quer v. exa. saber que ramo das sciencias mathematicas é ahi professado com mais largo desenvolvimento? E a álgebra superior, que consome a maior parte do anno lectivo! Doutrinas abstractas, de comprehensão nem sempre fácil, e das quaes, em verdade, não carece quem se destina á clinica, nem ao estudo profundo da historia natural e das sciencias medicas, sr. presidente, eis o que tem de estudar com mais largo desenvolvimento o alunmo do primeiro anno de mathematica.
A álgebra superior, na sua parte mais transcendente, é inutil para o estudo da physica; apenas são necessárias umas noções que se estudam em dez ou doze lições.
Veja s. exa. que barbaridade é obrigar os alumnos que se destinam á faculdade de medicina na universidade a consumir metade do anno lectivo em estudos de álgebra superior sem conveniência alguma.
Comprehendo que o sr. presidente do conselho de ministros, que particularmente me honra com a sua amisade, como ministro tenha duvida em firmar-se apenas nas minhas considerações para apresentar uma providencia desta ordem; mas peço a s. exa. que attenda á consulta do supremo conselho de instrucção publica sobre esta questão e ouça tambem quatro dos collegas que s. exa. tem nos conselhos da coroa, os quaes são de competência especial para esclarecer s. exa. n'este ponto, os srs. ministros da fazenda, da marinha, dos estrangeiros e da guerra.
Desejo tambem chamar a attenção de s. exa., o nobre presidente do conselho de ministros, para a extravagante exigencia do exame da lingua grega aos alumnos das faculdades de medicina e philosophia, unicamente para a admissão a seus actos de formatura e aos licenciados em quaesquer faculdades, para que sejam admittidos aos actos de conclusões magnas.
Basta indicar a occasião em que similhante exigencia é feita, para que todos apreciem como é absurda esta disposição e como tal a condemnem.
Mas, sr. presidente, como são feitos estes exames? Não é justo que de outro modo sejam, emquanto a exigência for feita mesmo no fim de um curso superior. Que ridículo simulacro de exame!
Fallo por experiencia propria, pois não só fiz este exame, mas até já tive a honra de presidir a alguns.
Alumnos tem havido que nem sequer têem entrado na sala do exame e assim mesmo têem sido approvados! A v. exa. declaro, com franqueza, que em taes exames não tem havido, nem é justo que haja, seriedade.
Em breves palavras vou dirigir-me ao sr. ministro da justiça.
Conhece s. exa. muito bem as disposições da lei eleitoral de 21 de maio de 1884, na parte relativa ao recrutamento militar.
Diz o artigo 17.°, fallando do recurso das decisões do juiz do direito para as relações:
«Das decisões proferidas pelos juizes de direito cabe recurso para as relações, interposto perante os mesmos juizes até 20 de julho por meio de petição instruída pelos documentos que lhe servirem de prova.» Acrescenta o § 4.° do mesmo artigo:
«Os recursos serão resolvidos nas relações até 31 de ou-

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tubro, seguindo-se o processo estabelecido no decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, §§ 1.°, 2.° e õ.° do artigo 36.°, e artigos 1070.°, 1072.°, § único, 1073.° e seus paragraphos, e 1074.° do código do processo civil. A data do sorteio dos recrutas effectivos é transferida de 20 de outubro para 15 de novembro de cada anno.»
Tenho muita consideração pelo sr. ministro da justiça; mas estranho que s. exa. esteja conversando com o sr. ministro da fazenda, porque neste momento tenho direito á sua attenção.
Não quero censural-o; só quero solicitar de s. exa. a bondade de escutar-me.
Mas é bom que se saiba e consigne que, se o sr. Pinheiro Chagas alguma vez peccou assim, teve quem tão cedo lhe seguisse o exemplo. O sr. Elvino de Brito não terá quem o imite.
Referia-me eu, sr. ministro dos negocios ecclesiasticos e de justiça, a essa absurda e impossível disposição da lei de 21 de maio de 1884, que manda que os juizes da relação julguem todos os recursos sobre o recrutamento militar desde 20 de julho até 31 de outubro. O cumprimento desta disposição da lei é impossível.
Eu quiz formular um quadro estatistico e numérico dos recursos que têem subido á relação judicial do Porto e deduzir o numero dos processos desta natureza que cada juiz teria de examinar para julgar; mas não me foi possível; e sabem porque? Por falta de materiaes, porque, tendo-me dirigido ao digníssimo presidente da relação judicial do Porto e pedindo-lhe o quadro estatístico da distribuição destes recursos no primeiro anno da execução da lei, s. exa. respondeu-me que era impossível obsequiar-me neste ponto, como tinha sido impossível até então satisfazer a uma requisição feita pela repartição de estatística do ministerio das obras publicas.
Ha dois annos, na relação judicial do Porto, a distribuição foi feita por grandes maços de processos e sem ordem, de sorte que agora é extremamente difficil organisar as relações dos processos que tenham sido distribuídos ao mesmo juiz.
No ultimo anno não foi seguido este processo. Houve methodo e ordem na distribuição; mas querem v. exas. saber o que tem succedido? É que ainda hoje, 12 de março, não estão distribuídos todos os recursos, quando a lei manda que elles estejam julgados até. ao dia 31 de outubro. Isto era de prever; e não póde ser evitado.
Que, por exemplo, o meu excellente amigo e distincto collega o sr. Agostinho Lúcio, que está sentado a meu lado, eu ou qualquer dos outros nossos collegas, que não temos a honra de ser jurisconsultos, tivéssemos tomado parte principal na confecção desta lei, tínhamos alguma desculpa; mas que jurisconsultos a fizessem sabendo que ella era inexequível, sr. presidente, é caso que não se comprehende.
A consequência destes erros podia ter sido funesta; não o foi, porque a nossa magistratura judicial é a primeira corporação em servir bem o paiz. (Apoiados.)
O poder judicial póde servir de exemplo a todos os funccionarios em Portugal e fora deste paiz. Assim o exemplo fosse seguido.
Desde que a lei manda entregar ao poder judicial os processos de recrutamento militar para julgal-os num certo praso; desde que isto é impossível: o poder judicial é forçado a não cumprir a lei; e muito para sentir é que, mesmo por força de uma lei inexequível, diante do impossível, este honradíssimo poder tenha a impreterivel necessidade de fornecer um exemplo de que tambem não cumpre uma lei.

Discurso proferido pelo sr. deputado Alfredo Felgueiras da Rocha Peixoto, na sessão de 12 de março de 1886, e que devia ler-se a pag. 626, col. 2.º
O sr. Alfredo da Rocha Peixoto (sobre a ordem): - Envio para a mesa duas moções de ordem.

São as seguintes:
«É adiado o parecer n.° 21 até que sejam enviadas a esta camara as informações indispensavelmente necessárias para a discussão do mesmo parecer. - Alfredo da Rocha Peixoto.»
«A camara lembra ao governo a conveniência de mandar publicar annexa á conta geral da administração financeira do estado na metrópole, e em volume separado, uma tábua das relações seguintes:
«1.ª Entre as despezas e as respectivas receitas;
«2.ª Entre as receitas liquidadas e as cobradas;
«3.ª Entre as receitas calculadas e as cobradas;
«4.ª Entre as receitas calculadas e as liquidadas. = Alfredo da Rocha Peixoto.»
O illustre ministro da fazenda, no dia em que, pela primeira vez, se apresentou nesta casa como conselheiro da coroa, declarou que nunca tinha encontrado o acaso como divindade cega no estudo que havia feito nas sciencias mathematicas e da natureza.
S. exa. foi menos modesto do que tinha sido Laplace, o eminente mathematico, que conquistou pelos seus merecimentos e serviços a corôa de marquez e honrou a humanidade com a corôa de creador da mechanica celeste.
É certo que o ultimo legado de Laplace foi a preciosa declaração de ser pouco o que sabemos e immenso o que ignoramos.
Foram estas as ultimas palavras que Laplace proferiu, com os lábios já desbotados pela morte próxima.
Não sei qual será o ultimo legado do sr. ministro da fazenda, em um futuro que desejo muito afastado; mas o que sei é que Laplace não ousou dizer tanto contra o acaso, como o nobre ministro da fazenda.
Póde-se apostar mil contra um por um agente universal e creador infinito contra o acaso; foi o que affirmou o auctor da mechanica celeste, nas inspirações do seu génio transcendente; não ousou ser absoluto como foi o sr. Marianno de Carvalho.
É certo que o sr. Marianno de Carvalho, no profundo e variadissimo estudo que fez nas sciencias exactas e da natureza, nunca encontrou o acaso como principio ou causa; mas não é verdade que o não tenha encontrado como circumstancia.
O sr. Marianno de Carvalho ha de lembrar-se de que escreveu Arago, mathematico e astrónomo distincto no seu tempo, que tambem foi excellente ministro: em matéria de sciencia o imprevisto tem sempre a parte do leão.
O que é este imprevisto se não o acaso?
S. s. exa. não se quizer contentar com os estudos das sciencias da natureza e quizer antes refugiar-se nas sciencias exactas, ha de lembrar-se que Oscar Schloemilch, num bello livro traduzido pelo professor belga Joseph Graindorge, escreveu que Euler foi conduzido por uma espécie de acaso feliz a um theorema importante da theoria das funcções ellipticas.
Se eu quizesse favorecer os planos do governo, aliás de transparente habilidade, bem podia procurar na maravilhosa historia das sciencias naturaes muitos casos, grandes melhoramentos e fecundas inspirações de génios, que appareceram por circunstancias do acaso.
E nas cousas ordinarias da vida que influencia tem o acaso?
Quantos casamentos ha que são obra do acaso! E quantos casamentos ha que têem grande influencia na fortuna das famílias, nos destinos dos governos e na sorte dos partidos!
Mas, se eu quizesse mostrar á camara do modo mais claro o que vem a ser o acaso para o sr. Marianno de Carvalho, bastava esta proposta de lei, a que se refere o parecer n.° 21, proposta que hesito em acreditar que seja obra do sr. Marianno de Carvalho.
Pois que, sr. ministro da fazenda, recorre já a um processo grosseiro, empyrico, ordinário, proprio de merceeiros

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que, tendo feito as contas do anno e visto que não perderam, calculem que tudo que lhes é devido e seja pago vale como ganho? Mas este processo não é o de um financeiro eminente, como é o sr. Marianno de Carvalho. Não póde fazer isto quem tantos annos passou a fundar uma escola positivista de finanças.
Honro-me de apresentar-me como seu discípulo, sr. Marianno de Carvalho. Mas onde estará v. exa. para responder-me? Nos conselhos da coroa?
Pois ouça, sr. ministro da fazenda.
Quaes são os princípios em que se fundou o nobre ministro da fazenda para apresentar esta proposta de lei?
De que factos partiu?
Que cálculos fez?
Que elementos tem para apreciar os resultados d'esta monstruosa providencia?
Lê-se este relatório; e não se encontra um único fundamento sensato! Apenas uma inspiração do acaso!
O que devia s. exa. fazer para apresentar esta proposta? Sabe-o muito melhor do que eu. O pouco que sei e que vou dizer não hesito em declarar novamente que o devo, em grande parte, ao methodo positivo que o sr. Marianno de Carvalho tanto tem usado, para não dizer que delle tem abusado tanto.
A grande força do sr. Marianno de Carvalho provém desse methodo, fecundado pelo espirito geometrico com que a natureza o dotou, por essa qualidade preciosa e rara, sem a qual, na phrase dos estatutos da nossa universidade, não podem conservar-se, nem fazer progresso algum os conhecimentos naturaes do homem, em qualquer objecto que seja.
Não ha muitos annos, em 1879, o sr. ministro da fazenda, na discussão da eleição feita pelo circulo de Belém, em que se haviam apresentado só dois candidatos, os srs. Pedro Franco e Fuschini, tendo sido o numero dos votantes impar, teve a grande habilidade de convencer a maioria da camara de então, de que nenhum dos dois candidatos tinha obtido maioria absoluta. (Riso.)
(Interrupção do sr. Luiz José Dias.)
Houve muitos membros dessa camara que se deixaram convencer disso; entre elles um talentoso lente de theología, cuja memória ha de ser sempre querida para o partido a que pertence o illustre deputado, o dr. Pires de Lima.
Volto já ao assumpto.
O que devia ter feito o sr. ministro da fazenda para fundamentar esta proposta? Devia ter apresentado um quadro das contribuições em divida, acompanhado de minuciosas indicações, principalmente da relação nominal dos contribuintes devedores. Por ahi é que havíamos de descobrir as causas das irregularidades que têem havido nes-tas cobranças.
O § 2.° do artigo 1.° diz o seguinte:
«A falta de exacto pagamento de uma prestação torna vencidas todas as seguintes, que serão cobradas pelos meios ordinários.»
Sabe v. exa. quaes são estes meios ordinarios? São os que não deram resultado algum até este momento; os mesmos que inspiraram esta providencia, porque não têem sido executados.
Desde o momento em que as contribuições não foram pagas, deviam os exactores da fazenda relaxar os respectivos contribuintes ao braço justiceiro da auctoridade administrativa.
Pois não se fez o que se devia.
Não quero trazer nomes para aqui; não devo fazel-o agora; mas posso, devo e quero expor, apreciar e condemnar um facto geral, que, na sua triste e desgraçada realidade, revela bem a natureza e os fins d'esta providencia monstruosa aqui proposta.
Não ha muitos dias, estudando eu esta questão, fui informado por um meu amigo de Lisboa, para mim de todo o credito de que, no bairro desta capital onde estou residindo actualmente, homens importantes na política, titulares de linhagem, cidadãos poderosos, nunca pagaram suas contribuições, as quaes estão em divida e comprehendidas n'esta generosa proposta.
Esta questão fica para mais tarde, quando eu demonstrar que o projecto em discussão não é democratico, antes é para favorecer principalmente os poderosos, que levam, o seu patriotismo até figurar nas assembléas parlamentares, até mais alto ainda, se mais podem subir; mas que j perdem completamente esse patriotismo quando vêem abertas as arcas do thesouro para receber as contribuições que elles devem, contribuições que tinham de juntar-se às dos humildes e pobres.
Mas, afastando-me desta ordem de considerações, vou justificar as minhas moções de ordem.
Na falta de esclarecimentos especiaes, que o sr. ministro da fazenda, devera ter fornecido, falta muito de sentir porque estas questões, para mim, não têem caracter politico e são muito importantes; na falta de especiaes esclarecimentos, fui consultar o volumoso livro da conta geral da administração financeira do estado. Vou indicar á camara os elementos de apreciação que ali encontrei.
Não vem indicadas com sufficiente desenvolvimento as contribuições em divida. Encontra-se, é verdade, indicada a differença entre as contribuições liquidadas e as contribuições cobradas; mas não vem as contribuições em divida especificadas por artigos, como era absolutamente indispensável para a acertada discussão deste projecto de lei.
Vejamos o que dá este volumoso livro, que para mim tem um grande valor.
Ao sr. Marianno de Carvalho peço me ouça como collega já antigo que tem sincera admiração pelo seu talento e pelos seus merecimentos, e que manifesta esta admiração estudando com attenção as questões em que com s, exa. vem discutir.
N'isto não ha cumprimentos de cortezia.
Nós, os regeneradores, não precisamos de negar o talento a quem Deus o deu, nem encobrir os merecimentos alheios. Principalmente em questões de natureza mathematica, como são as financeiras, devemos reconhecer o valor dos outros; nem ha que invejar-lhes, porque temos a fortuna de possuir o primeiro génio da península nesta transcendente sciencia.
Bem desejo eu que o sr. Marianno de Carvalho acceite opportunamente a minha segunda proposta, completando assim a conta geral da administração financeira do estado na metrópole, e traduzindo em números abstractos os factos desta administração.
Actualmente quem quizer fazer uma apreciação da administração financeira do estado, sr. presidente, tem de dar-se a um grande trabalho, porque, para ler-se neste enorme volume, tem de effectuar-se muitas operações numéricas.
Se a este livro estivesse annexa a tabeliã, um pequeno fascículo, que indico, ficariam todos bem habilitados a fazer rapidamente, num abrir e fechar de olhos, um juízo seguro do andamento dos negócios da fazenda publica.
Eu já disse, em outra occasião, e repito agora que estou persuadido de que se faz o que vemos neste livro da conta gral da administração financeira do estado., para que pouca gente conheça a nossa verdadeira situação financeira, porque, a dizer a verdade, não ha questão mais simples do que esta...
(Aparte.)
O sr. Marçal Pacheco, pelos estudos que tem feito ácerca da questão, não o reconhece assim; mas que difficuldades conhece o illustre deputado depois do estudo attento das propostas do governo?
Refere-se este volume aos exercícios findos dos annos económicos decorridos desde 1877-1878 até 1882-1883, abrangendo, entre muitas outras, as contas definitivas das

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receitas avaliadas, liquidadas e cobradas, não só na gerencia do anno respectivo, mas tambem nos correspondentes exercicios findos.
Pelo que toca a 1883-1884 faltam os ultimos seis mezes de exercício; para esse vem só as contas geraes até 31 de dezembro de 1884.
Para o anno seguinte, o ultimo, vem só a conta provisória.
Vejamos a importância dos impostos directos cobrados em cada um destes annos. Designando por), a somma dos impostos directos liquidados; por 7, a dos impostos directos cobrados; por i o numero de ordem do anno, a contar do anno económico de 1877-1878, para o qual seja i = 1; e por a pagina da conta geral da administração financeira do estado na metrópole; teremos:

[Ver tabela na imagem]

A inspecção destes números não é sufficiente para dar idéa segura e immediata das cobranças; e menos ainda para conduzir ao conhecimento da lei que ellas seguiram e de quaesquer a ocidentes que n'ellas hajam occorrido.
É elemento indispensável o considerar-se nesta questão a relação da differença entre os impostos directos liquidados e os cobrados para á somma dos primeiros.
A tabella d'estas relações, uma tábua de números abstractos, tem para a intelligencia e aproveitamento do livro da conta geral da administração financeira do estado na metrópole a mesma importância que para a geometria tem
a trigonometria.

[Ver formula na imagem]

[Ver tabela na imagem]

O valor de as afasta-se muito dos precedentes porque não está findo o respectivo exercício; é fundado na conta provisória do ultimo anno da serie ou do período que considera o livro a que me refiro.
Para o valor de é necessario uma correcção, porque faltam seis mezes de exercício.
Na conta geral da administração financeira do estado na metrópole vem cada um dos impostos directos do continente separado do respectivo imposto das ilhas.
Não percebi a rasão disto, porque os impostos, no mesmo livro, vem indicados tambem por districtos. Não vejo vantagem alguma nesta distincção, porque ninguem reputará que seja vantajoso obrigar quem estudo estas questões a fazer sommas.
Declaro por isso que ... e 7, representam a somma dos impostos directos, do continente e das ilhas )..., liquidados e 7, cobrados.
Para comparar os differentes regimens de cobrança para os diversos impostos é preciso organisar para cada um tábuas como a que acabei de ler para a somma total dos impostos directos.
Se para una apparecer a relação é superior á do quadro já deduzido, é evidente e certo que para outros será é menor.
Vamos ver qual é a tábua correspondente aos direitos de mercê, já que pela, proposta sujeita ao debate parlamentar ao regimen destes é analogo o que se pretende applicar às contribuições directas em divida.
Adoptando para estes impostos a designação já indicada, teremos:

[Ver tabela na imagem]

A indicação das paginas é a mesma que ficou feita para a somma dos impostos directos.
Já temos elementos para concluir que o regimen de cobrança dos direitos de mercê é dos mais deficientes entre os adoptados para a cobrança dos impostos directos. Pois - que os valores de p, para a totalidade dos impostos directos oscula entre 0,063 e 0,105, excluído o ultimo anno, emquanto que para a mesma serie de annos os valores de p, para os direitos de mercê osculam entre 0,446 e 0,321, creio ter mostrado como é condemnavel o regimen de cobrança destes impostos.
Mas verifiquemos os valores de p, para outros impostos. Vejamos o que succede com a contribuição sumptuaria:

[Ver tabela na imagem]

Permittam-me v. exa. e a camara uma pausa na leitura dos numeros relativos a outros impostos, para aqui fazer uma observação.
Bem sei que para o estudo completo deste assumpto, devera ter deduzido os valores de p, para a somma de todas as receitas do estado. Mas esse estudo não teria a vantagem que se podia presumir, porque, como v. exa. sabe, já pela natureza dos impostos, já por circumstancias especiaes da respectiva cobrança, não se póde comparar os impostos directos com a maior parte e os mais importantes dos impostos indirectos; sob este ponto de vista e para este effeito, podem ser considerados quantidades heterogéneas os productos dos impostos directos, comparados com os productos dos indirectos. Seria pois, sem importância, sem significação pratica, similhante quadro, que só poderia revelar paciência, que melhor póde ser aproveitada para outros trabalhos financeiros, que a reclamam.
Permitia a camara que um pouco me demore na inspecção do quadro dos p, para os direitos de mercê. Temos aqui um bello exemplo, que mostra a importancia destes quadros ou tábuas de números abstractos; e assim vou praticamente demonstrando a vantagem da minha proposta para que sejam publicadas, em tábua separada, as relações entre as receitas avaliadas, liquidadas e cobradas.

[Ver formula na imagem]

que pouco differem entre si, chegámos logo, atravez de um salto, a
0,446,
que é relativo ao anno 1880-1881.

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SESSÃO DE 6 DE ABRIL DE 1886 829

Para os annos seguintes, vão diminuindo successivamente os valores de p, até que o de p; é 0,321 e o de cg é 0,275.
E note-se a observação que já fiz em relação aos últimos dois annos.
Devemos já concluir que, independentemente das causas geraes, tem havido em relação aos direitos de mercê uma causa perturbadora, que não tem affectado a maior parte das outras contribuições directas; e que essa causa vae decrescendo successivamente em influencia, depois de ter sido muito forte no anno económico de 1880-1881.
Nos ultimos dois annos económicos houve um grande melhoramento na cobrança d'estes impostos.
É natural que cada um procure descobrir a causa que a determinou e trate portanto de averiguar que alterações possa ter havido neste serviço. Quem a investigar ha de encontral-a na mudança que ultimamente se fizera no pessoal da repartição competente.
(Interrupção.)
Foi um distincto funccionario do ministerio da fazenda, com quem tenho relações pessoaes, o sr. Olival, quem activou esta cobrança; e com inexcedivel zelo continua a actival-a.
Folgo de deixar aqui consignado este meu testemunho de consideração por este illustre funccionario.
As considerações expostas conduzem-nos, isto não obstante, á conclusão de que este systema de cobrança é o menos profícuo.
Ora é análogo a esto mesmo o systema adoptado na proposta do sr. ministro da fazenda e no parecer da commissão para a cobrança das contribuições directas em divida; e aqui está um argumento, deduzido scientificamente, que condemna o projecto sujeito n'este momento ao debate parlamentar.
Bem sei que neste meu argumento ha um defeito, proveniente da reunião dos direitos de mercês honorificas com Os de mercês de serviços ou lucrativas.
Vendo a meu lado o sr. Consiglieri Pedroso, illustre deputado e meu amigo, que na sessão do anno passado esteve tão impaciente por esclarecimentos a respeito dos direitos de mercê ...
(Interrupção do sr. Consiglieri Pedroso.)
O illustre deputado exigia, ao principio, a relação nominal das pessoas que deviam direitos de mercê; mais tarde declarou que se contentava com a nota da importância dos mesmos direitos em divida. Bem percebi logo que s. exa. queria estes esclarecimentos somente, ácerca dos direitos devidos por mercês honorificas.
Se s. exa. quizesse saber a importancia total dos direitos de mercê em divida, facilmente havia de deduzil-a da conta geral da administração financeira do estado na metrópole; o que não encontraria lá seria o que precisamente queria, a destes direitos devidos por mercês honorificas.
E, sejamos francos, o illustre deputado tinha rasão em querer, pelo menos, a separação entre estes direitos correspondentes a mercês honorificas, e os correspondentes a mercês lucrativas. Pela natureza das próprias mercês, sr. presidente, é certo que não são quantidades homogéneas as quantias provenientes dos direitos respectivos. E até absurda a confusão que ainda subsiste.
É sensivel esta falta que, com outras, observamos na conta geral da administração financeira do estado na metrópole.
Peço ao sr. ministro da fazenda e ao distincto funccionario que coordena, regista e dirige esta excellente publicação, o sr. relator, que tome nota destas observações; e que, se as julgarem acertadas, as aproveitem para o proximo anno.
Entre os impostos directos já tive occasião de mostrar que são os direitos de mercê os que mais urgentemente reclamam a attenção e mesmo providencias especiaes do ministro da fazenda, para a sua regular cobrança; mas, para que essas providencias sejam efficazes, sem que sejam injustas nem vexatorias, é indispensavel a distincção entre as duas especies destes direitos.
Fallo com esta franqueza ácerca d'esta publicação da conta geral a que me tenho referido, porque me honro de haver tomado a iniciativa no mais elevado testemunho de consideração parlamentar por este trabalho.
O sr. Marianno de Carvalho prestou a homenagem do seu louvor a este mesmo trabalho; igual homenagem prestaram os actuaes srs. ministros da justiça e dos estrangeiros. Mas fui o único que teve a honra de traduzir essa homenagem numa proposta de louvor; só fiz justiça; pena foi que nem todos a fizessem.
Essa proposta foi, não sei porque, enviada á commissão de fazenda para dar sobre ella o seu parecer.
Assim, sr. presidente, um deputado traduz numa proposta um voto de louvor que está no animo dos deputados que melhor conhecem o facto distinguido com esse louvor; essa proposta está em harmonia com o voto do governo, exarado expressamente numa portaria de louvor publicada no Diario do governo, pois devo lembrar que este mesmo trabalho teve tão subida distincção; o louvor proposto é para um trabalho que representa merecimento e estudo, que custou muitas noites mal dormidas e muitos dias de cogitações. Pois, com tudo isto, tal proposta é enviada á poderosa, doutíssima e não sei se divina commissão de fazenda. E esta commissão, naturalmente por não ser membro della o auctor da proposta, entende, na sua alta sabedoria, que sou o primeiro a reconhecer, a respeitar, a admirar e a exaltar, que tal proposta fique a dormir o somno dos justos ! Pois não serei quem vá accordal-a; tal é o meu profundo acatamento pela doutíssima commissão!
Para que sejam reconhecidos o merecimento e os serviços, é certo que não são indispensáveis votos de louvor; mas ha muitas pessoas a quem é agradável que um seu trabalho seja bem apreciado e que por aspiração de gloria procuram prestar serviços relevantes.
Não posso pois deixar de sentir o proceder da illustrada commissão.
Creio que, se em algum espirito tinha apparecido a idéa de que era um sentimento menos patriótico, menos justo e menos conveniente o que me tinha determinado a analysar tão detidamente a conta geral da administração financeira do estado na metropole, ha de estar dissipada essa apprehensão.
Tenho de apreciar, pelo processo que deixo indicado, a cobrança das principaes contribuições directas; e por consequencia vejo-me na impossibilidade de terminar hoje. Alem disso um collega nosso, o sr. Franco Castello Branco, pediu a palavra para antes de se encerrar a sessão; e seria menos delicado da minha parte usar do direito que tinha para poder concluir as minhas observações nesta sessão.
Por estas rasões, se v. exa. e a camara mo permittirem, ficarei com a palavra reservada para a sessão seguinte.

Redactor = S. Rego.

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