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N: 63
SESSÃO NOCTURNA DE 10 DE MAIO DE 1898
Presidencia do exmo. Sr. Manuel Affonso de Espregueira
Secretarios - os exmos. srs.
Frederico Alexandrino Garcia Ramires
Carlos Augusto Ferreira
SUMMARIO
Approvada a acta e não havendo expediente, o sr. Ribeiro Coelho apresenta uma representação contra a lei de instrucção secundaria em vigor, acompanhando-a de considerações - O sr. Abel da Fonseca justifica as suas feitas. - O sr. Luiz José Dias apresenta uma representação da junta de parochia de Villa Mou, e espraiando-se em considerações, é interrompido pelo sr. Jacinto Candido.
Levantando-se baralho, e depois das advertencias do estylo, o sr. presidente interrompe a sessão. Reabarta, o sr. Luiz José Dias conclue o seu discurso, e entre os srs. Mello e Sousa (para um negocio urgente) e ministro da fazenda (Ressano Garcia) trocam-se explicações ácerca do supprimento caucionado com obrigações da companhia real dos caminhos de ferro do norte e leste.
Na ordem do dia, com a sessão prorogada e com a materia julgada sufficientemente discutida, vota-se e approva-se o capitulo 1.°, com excepção do artigo 2.°, do projecto de lei n.° 54 (orçamento de receita), fallando os srs. Lourenço Cayolla e Malheiro Reymão.
Abertura da sessão - Ás tres horas da tarde.
Presentes á chamada, 50 srs. deputados. São os seguintes : -Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Carlos Le-Cocq, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio de Menezes é Vasconcellos, Antonio Teixeira de Sousa, Carlos Augusto Ferreira, Conde de Paçô Vieira, Conde da Serra de Tourega, Conde de Silves, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Furtado de Mello, Francisco José Machado, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Manuel de Almeida, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Frederico Alexandrino Garcia Ramires, Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, João Abel da Silva Fonseca, João Baptista Ribeiro Coelho, João Catanho do Menezes, João Joaquim Izidro dos Reis, João de Mello Pereira Sampaio, João Monteiro Vieira de Castro, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Heliodoro Veiga, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Simões Ferreira, José Adolpho de Mello e Sousa, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Eduardo Simões Baião, José Estevão de Moraes Sarmento, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José de Borja Macedo e Menezes (D.), José Malheiro Reymão, José Maria de Oliveira Matos, José Matinas Nunes, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Luiz José Dias, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Pinto de Almeida, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro Sebastião de Sousa Dantas Baracho.
Entraram durante a sessão os srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Alvaro de Castellões, Anselmo de Andrade, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Tavares Festas, Arnaldo Novaes Guedes Rebello, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto José da Cunha, Bernardo Homem Machado, Carlos José de Oliveira, Conde de Burnay, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Silveira Vianna, Franciscoo Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Frederico Ressano Garcia, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jacinto Candido da Silva, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José da Cruz Caldeira, José Dias Ferreira, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim da Silva Amado, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Pereira de Jima,1 Leopoldo José da Oliveira Mourão e Manuel Teles de Vasconcellos.
Não compareceram dá sessão os srs.: - Abel da Silva, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alfredo Cesar de Oliveira, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Antonio Simões dos Reis, Arthur Alberto de Campos Henriques, Augusto Cesar Claro da Ricca, Conde de Idanha a Nova, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu o Lima, João Antonio de Sepulveda, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Lobo do Santiago Gouveia, João Pinto Rodrigues aos Santos, Joaquim Ornellas de Matos, Joaquim Paes de Abranches, Joaquim Saraiva de oliveira Baptista, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Benedicto de Almeida Pessanha, José Bento Ferreira de Almeida, José Capello Franco Frazão, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Barbosa de Magalhães, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Manuel Antonio Moreira Junior, Marianno Cyrillo de Carvalho, Sertorio do Monte Pereira, Visconde de Melicio e Visconde da Ribeira Brava.
Acta - Approvada.
Não houve expediente.
O sr. Ribeiro Coelho : - Sr. presidente, em 27 de fevereiro transacto realisou-se n´esta capital um comicio importantissimo, não só pelo numero e qualidade dos assistentes, mas ainda pelos fins da reunião fins que se prendem aos mais altos interesses do estado.
No referido comicio lavrou-se um protesto eloquente e sincero contra o regimen actual do ensino secundario, e votou-se a representação, que tenho aqui e vou enviar para a mesa.
Tive a honra de ser solicitado pela digna commissão promotora do comicio para acceitar o encargo de apresentar n´esta casa do parlamento a alludida representação.
Do melhor grado accedi ao pedido da illustre commissão; pois que pertenço ao numero dos que entendem que o actual regimen da instrucção secundaria carece de profundas e urgentes reformas. (Apoiados.)
A primeira vez que tive a honra de fallar n´esta cama a indiquei de um modo geral os vicios organicos da nossa instrucção publica, e teria versado em especial o as-
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sumpto do ensino secundario, se o nobre presidente do conselho estivesse presente.
Os assumptos relativos á instrucção publica inspiram-me vivissimo interesse.
Entendo que todas as tentativas de regeneração do paiz hão de naufragar no pelago da corrupção, em que escabujâmos, emquanto se não procurar com coragem e sem contemplação disciplinar os costumes, retemperar os caracteres, moralisar, em summa, a vida privada e a vida publica.
Só a instrucção e a educação moral e religiosa podem operar uma tão radical e salutar transformação. (Apoiados.)
É esta a minha convicção inabalavel, formada desde ha muito e cada vez mais robustecida pela observação da crescente degradação dos costumes e da correlativa depauperação do paiz.
Ha quem presuma que em se conseguindo equilibrar as finanças e tornar prospera a economia nacional, o paiz singrará despreocupado e jubiloso o lago azul, sereno de todas as venturas.
É uma errada comprehensão das condições e necessidades essenciaes á vida e progresso de uma nação. Não se attende a que o primeiro e mais fecundo elemento da vida social é a moralidade privada e publica. A ausencia e a adulteração d´este elemento torna inefficazes todos os esforços dos sabios da economia e das finanças. Ainda mesmo que descobrissem a pedra philosophal pela alchimia subtil das suas habeis combinações e calculos, a corrupção dos costumes tudo desconcertaria, devorando rapidamente os milhões custosamente reunidos pelos algebristas da finança.
Sr. presidenta, bem sei que antes da ordem do dia não é ensejo muito apropriado para tratar assumptos d´esta natureza, mas reputo algumas disposições da lei e do regulamento vigentes do ensino secundario tão carecidas de urgente reforma que não hesito em occupar-me do assumpto antes da ordem do dia e chamar para elle a attenção da camara.
Os prejuizos que o actual regimen está produzindo são já incalculaveis e em parte irremediaveis.
Ha tres annos que vigora e a decadencia na frequencia dos lyceus e institutos particulares é verdadeiramente assombrosa.
Tenho aqui um máppa official, por onde se póde ver qual o estado em que se encontra actualmente a instrucção secundaria.
D´este mappa vê-se que nos 24 lyceus do continente do reino e ilhas adjacentes estão matriculados nos tres primeiros annos de classe 1:640 alumnos.
Os institutos de ensino particular e o ensino domestico são frequentados nas tres primeiras classes por 1:496 alumnos.
O total da frequencia do ensino secundario nas tres primeiras classes, nos lyceus e no ensino particular, é de 3:136 alumnos.
No 1.° anno da vigencia da actual lei matricularam-se nos 24 lyceus 465 alumnos, passaram para o 2.° anno 853 e d´estes passaram para o 3.° anno 241. De maneira que nos 24 lyceus ha, no 3.° anno, 241 alumnos, o que dá em media para cada lyceu 10 alumnos.
No ensino particular temos o seguinte: no l.°anno matricularam-se 1:092 estudantes, passaram-se para o 2.º anno 602 e d´estes passaram para o 3.º anno 372.
Em resumo, nos lyceus e no ensino privado matricularam-se no 1.º anno 1:557, passaram para o 2.° anno 950 e para o 3.º anno 613.
Do 1.° para o 3.° anno a frequencia diminuiu mais de 50 por cento.
Isto é espantoso, e mostra o que vale a tão apregoada reforma de 1894.
O sr. Tello: - Mas isso é verdade?
O Orador: - Sim senhor, tenho aqui os mappas, que a direcção geral de instrucção publica enviou a requerimento meu. V. exa. póde vel-os e verificar que não exagerei nem alterei os numeros.
O 3.° anno é frequentado por 613 alumnos, sommada a frequencia dos lyceus com a do ensino particular e domestico. Se o decrescimento na frequencia proseguir na proporção indicada, quando chegar o 7.° anno não haverá meia duzia de alumnos em todo o paiz para entrarem nas escolas superiores.
E eis-ahi um dos mais frisantes resultados da reforma de 1894 e do regulamento respectivo.
Demais, sr. presidente, os alumnos de classe, mesmo os da 3.ª classe ou anno, nenhuma instrucção têem, como é notorio.
A multiplicidade de disciplinas em cada anno ou classe, e o numero de horas de aula conjugam-se na reforma admiravelmente para que os alumnos pouco ou nada possam aprender.
A reforma, copiando a organisação de alguns institutos estrangeiros, olvidou que tal organisação é para semi-in-ternatos.
Como não ha nos nossos lyceus o semi-internato, os alumnos gastam o dia em idas e vindas, em entrados e saidas de aulas e nos intervallos do aula para aula.
Não têem tempo para estudar.
Demais, o numero de disciplinas, que os alumnos têem de estudar em cada anno, é por tal fórma exagerado que os alumnos esmorecem a curto trecho e deixam de applicar-se.
Obrigar creanças de 10, 11 e 12 annos a estudar 7, 8, 9 e 10 disciplinas por anno é um absurdo e uma crueldide.
O mais que póde conseguir-se é cretinisar as creanças, se porventura ellas tomam a serio o seu papel. (Apoiados.)
Pois esta reforma, que tão nefastos resultados está produzindo e ha de produzir, exige desde já largas despezas ao paiz e para futuro demandará despezas enormes, sem compensação de receitas, nem sequer de progresso e desenvolvimento scientifico.
Só com a commissão de exame da livros gastaram-se já nos tres primeiros annos da reforma 9:147$175 réis.
Note-se que a alludida commissão é absolutamente inutil, pois que o denominado conselho superior de instrucção publica e o governo approvam ou rejeitam os livros que querem.
Assim é que o dito conselho e o governo têem approvado e mandado adoptar livros que a commissão rejeitou por unanimidade e têem rejeitado outros approvados pela commissão.
Pergunto: para que serve esta commissão? Serve para se gastar com ella em tres annos 9:147$000 réis, e para proporcionar aos seus membros uma passeiata a Lisboa.
A reforma vae no terceiro anno e quasi se acham despovoados os lyceus; pois apesar d´isso nos tres primeiros annos do curso lyceul foram já admittidos, sob a denominação de professores extraordinarios, nada menos de 37 professores, 16 para a lingua allemã e 21 para as demais disciplinas professadas nos tres primeiros annos.
Estes professores vencem mensalmente nada menos de 1:235$972 réis.
Só no lyceu de Lisboa, cuja frequencia total nos tres primeiros annos é de 397 alumnos, foram admittidos para estes tres primeiros annos 9 professores extraordinarios!
Imagino a camara, que os lyceus eram frequentados como d´antes, e que a reforma estava em pleno vigor nos sete annos do tirocinio lyceal! Quantos professores extraordinarios seriam precisos e quantos contos de réis custariam?
Ha lyceus sem alumno algum no terceiro anno, como os de Lamego e Guimarães.
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Ha lyceus com 2 alumnos no terceiro anno, como o do Funchal.
O lyceu de Villa Real tem apenas 1 alumno no terceiro anno.
Outros têem apenas 3 alumnos na referido anno; taes são Faro e Bragança.
Outros contam 5 alumnos no dito anno, como são os de Beja, Angra e Leiria.
Braga, lyceu central, onde antigamente a frequencia era importantissima, está reduzido a 4 alumnos no terceiro anno!
O Porto tem 23 alumnos no terceiro anno, e Coimbra 19.
Lisboa, apesar das diligencias dos interessados em manter a reforma, e apesar de ser a capital, tem apenas 71 alumnos no terceiro anno, resto dos 115 que se matricularam no primeiro anno da vigencia da reforma.
Os dados que indiquei são todos officiaes; tenho aqui os mappas respectivos; qualquer dos dignos membros d´esta camara poderá vel-os.
É facil concluir do expendido que, se não houver providencias immediatas, a instrucção publica em Portugal desapparecerá em breve, apesar de custar carissima ao estado a actual reforma de ensino secundario.
Se os lyceus forem frequentados regulamente e os sete annos do tirocínio chegarem a funccionar, ninguem póde calcular a legião de professores extraordinarios que haverá nos lyceus e as centenas de contos de réis que custará a reforma.
Sr. presidente, um dos intuitos mais patentes da reforma, a que venho alludindo, foi extinguir o ensino livre.
Bastaria este intuito, que de per si só é um crime n´um paiz constitucional, para a condemnar. (Apoiados).
O estado não tem direito de impedir o ensino livre, e de, impor o ensino offlcial.
A instrucção não póde constituir um monopolio do estado.
Os cidadãos têem o direito de sr instruirem onde, como e com quem quizerem.
O estado póde prescrever certas condições para o reconhecimento das habilitações dos candidatos a funccionarios publicos, etc; póde e deve proporcionar a instrucção e os institutos adequados; mas não póde impor, nem a sua instrucção, nem os seus institutos.
A reforma, atacando e ferindo de morte o ensino privado, desconheceu os effeitos salutares da concorrencia entre o ensino official e o particular, e olvidou os relevantissimos serviços prestados pelo ensino particular á instrucção e á educação.
Ha no paiz collegios muito bem organisados é admiravelmente installados, onde, a par da instrucção primaria e secundaria, se propina uma solida e sã educação moral.
Esses collegios tinham uma larga frequencia; têem sido, e podiam e deviam continuar a ser amparo e abrigo á juventude academica contra as seducções e perigos que o meio social das cidades offerece á mocidade. (Apoiados.)
Alem dos collegios de ensino privado, ha no paiz; milhares de cidadãos que se entregam ao magisterio secundario privado e d´elle vivem.
Trabalhadores indefessos, muitos d´elles gosam da justissima reputação de professores distinctos e abalisados educadores.
Não sei como ha coragem para condemnar milhares de familias á miseria, para manter uma lei draconiana, que nenhuns resultados uteis produziu nem póde produzir sem ser alterada.
O ensino privado existe em todos os paizes cultos, estimulando o ensino official n´uma gloriosa porfia de competencias.
A nossa actuai lei de instrucção secundaria procura eliminar este factor importantissimo do desenvolvimento scientifico e do progresso pedagogico.!
É de notar, Sr. presidente, que, alardeando os auctores e defensores da reforma de 1894 e 1895 largos conhecimentos dos methodos e planos de estudo estrangeiros, e especialmente allemães, não introduziram comtudo na reforma uma cadeira de religião, nem a educação moral os preoccupou.
A formação do Caracter é, no sentir dos melhores pedagogistas, um dos primordiaes objectivos da instrucção; pois, a reforma alludida, que se diz decalcada nos moldes allemães, não curou da educação moral, nem da organisação do caracter dos alumnos.
Tambem lá fóra, onde os nossos reformadores dizem que foram beber a inspiração, se cuida no desenvolvimento physiologico por meio da gymnastica, do canto, da hygiene, etc.
Porém os nossos reformadores desconhecem o sapientissimo brocardo pedagogico tão conhecido já dos romanos: mens sana in corpors sano.
O que os deslumbrou até á vertigem, no que viram nos institutos allemães, foi o latim e a multiplicidade exagerada das disciplinas em cada anno.
Quanto á educação religiosa, lá lhes pareceu que era cousa boa para allemães e outros barbaros similhantes.
Tal aversão manifestaram pela educação religiosa os nossos reformadores, que até prohibiram ao clero nacional o ensino secundario, quer official, quer particular.
Vozes: - Ora essa...
O Orador: - É a simples verdade. Quem ler os artigos 147.° e 193.° do regulamento geral do ensino secundario do estado, lá encontrará que os ecclesiasticos portuguezes não podem concorrer ás vagas de professores do lyceu, nem ensinar particularmente, nem dirigir collegios de ensino secundario. Deixou aquelle regulamento continuar a exercer o magisterio secundario aos ecclesiasticos que já o exerciam; mas para futuro os sacerdotes portuguezes não podem ensinar instrucção secundaria, porque não têem curso superior, nem o curso da lyceus, visto que seguem o curso preparatorio nos seminarios.
Assim, indirectamente, e não sei se por accinte, se por inconsciencia, affastou-se por completo o clero nacional do magisterio secundario, o que, alem de ser odioso, é inconvenientissimo. (Apoiados.)
Ao passo que inhibe o clero nacional de exercer o magisterio secundario, permitte-o aos clerigos estrangeiros, como se vê do artigo 150.° do citado regulamento.
Assim, protege os ecclesiasticos estrangeiros e persegue os nacionaes, como se os sacerdotes portuguezes não tivessem direito a serem respeitados nos seus direitos de cidadãos e no seu caracter sacerdotal e a serem protegidos e defendidos pelos poderes publicos como outros quaesquer cidadãos. (Apoiados.)
Sr. presidente, a reforma de que me tenho occupado alargou o tirocinio lyceal a sete annos e no entanto supprimiu as cadeiras de grego e inglez e não inseriu a cadeira de legislação, que a reforma de 1880 incluiu no quadro das disciplinas da instrucção secundaria, e que lá coube, posto que o tirocinio lyceal fosse apenas de seis annos.
Não se comprehende como é que, elevando a sete o numero de annos do curso secundario, se eliminam cadeiras, e se não cria uma cadeira onde se ministrem os rudimentos de sciencia social para habilitar, nos ultimos annos, os alumnos a ter uma noção do que é um estado, dos elementos que o constituem, da fórma e agentes do seu funccionamento, das leis fundamentaes da sua organisação e desenvolvimento, etc.
N´essa cadeira os alumnos adquiririam, alem d´isso, uma comprehensão adequada dos seus deveres e dos seus direitos, para saberem exercer uns e outros.
É indispensavel uma cadeira d´esta indole na instrucção secundaria; pois que nos cursos especiaes e superiores, á excepção da faculdade de direito, não se versam estes assumptos, aliás de tanta monta.
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O resultado é que não é raro encontrar homens instruidos, sem noção alguma de sciencias sociaes, o que aliás não obsta a que discutam os mais complicados problemas da política, da economia e do direito publico.
Mas, Sr. presidente, dizia eu que o que sobretudo deslumbrou os nossos reformadores, ao lerem a organisação de alguns gymnasios allemães, foi a funcção, que os allundidos gymnasios fazem desempenhar ao estudo do latim, a pautada e exagerada dynamisação do ensino e a accumulação de disciplinas em cada anno.
Não tiveram em conta a diversidade de disposições psychicas e physiologicas dos alumnos, resultante já de condições etinologicas, já do condições historicas.
Nem o alumno portuguez carece de sete annos, com aulas quasi diarias, para aprender o latim, como seccede ao alumno allemão, nem o alumno portuguez póde distribuir proveitosamente a sua intellectualidade, mais prompta e mais viva, por sete, oito e nove disciplinas em cada anno, como o allemão.
O alumno portuguez bebe com o leite uma língua, que é uma transformação do latim, e por isso não admira que em quatro, annos aprenda a mesma lingua que ao alumno allemão custa sete ou nove annos de aturados estudos.
A raça germanica tem uma organisação psychica um pouco differente da raça latina; os alumnos da raça germanica não fazem grande sacrificio, ao que parece, em applicar-se a oito ou nove disciplinas n´um anno, aprendendo uma dose homeopathica de cada uma; os alumnos da nossa raça parecem incapazes de tão ampla distribuição da attenção.
É o que mostra a experiencia da Italia e da Hespanha e o que está patenteando a debandada dos alumnos de instrucção secundaria no nosso paiz.
Sou ecclosiastico e amo a lingua latina; mas quando examino o plano da actual lei de ensino secundario e se me deparam sete annos de latim, com aulas quasi diarias, não posso occultar que reputo esta exigencia um dislate com pretensões pedagogicas dignas de outras eras. Sete annos de latim é latim de mais. (Apoiados.)
Quem examinar os programmas da reforma e os comparar com o numero de disciplinas que a lei impõe ás creanças em cada anno, sente-se horrorisado, e fatalmente ha de ajuizar, ou que a reforma foi adrede feita para aniquilar a instrucção publica, e n´este caso entrou como elemento no plano de política absolutista, desenvolvido pelo gabinete anterior, ou que os reformadores foram servidos pela mais deploravel ignorancia das verdadeiras bases, em que deve assentar uma reforma de ensino para o nosso paiz.
Obrigar uma creança de doze annos á assimilação das materias indicadas nas nove disciplinas do terceiro anno, é esgotar completamente as energias intellectuaes da creança, é cretinisal-a, é praticar um crime revoltante. (Apoiados.)
Leiam esses programmas das nove disciplinas do terceiro anno, portuguez, latim, francez, allemão, geographia, historia, mathematica, desenho e sciencias naturaes, comprehendendo a zoologia e a botanica, e depois de lerem consultem a sua consciencia e a sua experiencia e digam se ha cerebro infantil capaz de em oito mezes assimilar tudo aquillo, e se não é de recear que as creanças, tomando a serio o seu papel de estudantes, fiquem idiotas em poucos mezes. (Apoiados.)
Sr. presidente, não discutirei agora as virtudes e mais partes Attribuidas aos decantados processos de methodo decretados pela reforma; se quizera apreciar este ponto, aliás importantissimo, da reforma, diria que até na applicação de um optimo principio o reformador exagerou por tal fórma que, se as mas instrucções fossem seguidas á risca, produziriam n´algumas disciplinas os mais lamentaveis resultados.
Os processos pedagogicos são hoje objecto de largos estudos e acaloradas discussões.
O denominado methodo intuitivo tem valor até certa idade e em certas disciplinas; levado ao exagero do exclusivismo inhabilita as intelligencias para as elevadas abstractas o generalisações, que constituem as mais intensas aspirações da sciencia.
À intelligencia dos alumnos deve ser guiada com muita prudencia e segurança desde os primeiros ensaios da intuição até aos mais arrojados vôos da synthese reflexa e da abstracção.
Cada processo de methodo tem a sua opportunidade, e no reconhecimento e applicação d´esta é que está a halibilidade do reformador e do pedagogista. (Apoiados.)
Ora, a reforma actual nutre a pretensão de generalisar os processos do methodo intuitivo, o que reputo um imperdoavel e gravissimo erro. (Apoiados.)
Nem todas as sciencias se prestam a ser ensinadas vantajosamente pelos processos do methodo intuitivo exclusivo.
Sr. presidente, a reforma, a que venho alludindo, produziu uma unica e singularissima originalidade, impondo ao ensino secundario o mesmo livro para cada disciplina.
Não ha legislação alguma que prescreva o livro unico; n´isto foi o nosso legislador verdadeiramente original.
E que desastrada originalidade!
Resuscita-se o affrontoso e esterilisador processo do ipse dixit; reduz-se o professor a machina e o estudante a papagaio.
Ao professor impõe-se o livro unico e ameaça-se com as mais atrozes penalidades, como a demissão, se deslisar um apice do texto do livro.
O estudante é obrigado a estudar o livro e, em o tendo decorado, asseguro-se-lhe a approvação e o diploma de sabio na respectiva disciplina.
O professor não póde sair do texto adoptado, nem rejeitar a sua doutrina; nem póde interrogar senão sobre o que está no livro.
O estudante em decorando o livro é um alumno distincto.
É um systema algo parecido com o do mahometismo na propagação da sua doutrina.
Se o livro unico não é o koran dos mussulmanos da instrucção publica, então não sei o que seja, nem para que sirva... (Apoiados.)
Ha uma flagrante contradicção n´esta reforma; ao passo que parece fiar tudo do professor, como verdadeiro agente do ensino que é e deve ser, maniata-o completamente impedindo as suas iniciativas, tolhendo-lhe inteiramente a acção, pois o reduz a mero leitor do texto, podendo mesmo ser substituido por um phonographo com manifestas vantagens para o orçamento das despezas com a instrucção...
Sempre tive para mim que todo o ensino deve principalmente visar a desenvolver a intelligencia dos alumnos, a estimular lhes as espontaneidades, a guiar os alumnos a pensar, reflectir, raciocinar, apreciar, discutir, n´uma palavra, a assimilar conscientemente o que lêem, o que ouvem, o que observam, etc. (Apoiados.)
O ensino decretado pela reforma visa, ao que parece, a enriquecer a memoria, atrophiando a percepção.
Tal systema é absurdo; se é propositado, é um crime revoltante, porque tende a amesquinhar a dignidade humana, a converter os cidadãos illustrados no rebanho de Panurgio.
O livro unico póde effectivamente servir fins politicos detestaveis.
Os philosophos e historiadores teutonicos prepararam desde os fins do seculo passado o espirito nacional e a grandeza da Allemanha actual; mas nunca n´esta grande nacionalidade houve o livro unico.
Talvez os nossos reformadores, tendo na Allemanha o exemplo da influencia do ensino na formação do espirito
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publico, da consciencia nacional, e tendo entre nós, em tempos idos, o exemplo da disciplinação dos espíritos e dos caracteres pelo ensino publico, em ordem ao absolutismo, pretendessem fazer um ensaio em prol do ideal cezarista.
O livro unico pôde servir intuitos reservados até mesmo na esphera dos interesses privados.
Foi instituido o livro unico sob color de extinguir uns suppostos monopolios de livros.
E com tal pretexto o estado creou para si, ou não sei bem para quem, o verdadeiro monopolio dos livros de ensino secundario,-monopolio que já deu brado em matéria de escandalos, monumentaes, e que dá largo pasto á maledicencia publica.
O que se diz, o que se conta, á bôca cheia, é espantoso.
Os livros do ensino secundario custam agora o triplo e o quadruplo do que custavam antes da instituição do actual monopolio e são, em geral, peiores; mas que importa isso comtanto que as bolsas de certos protegidos mearem?
Tão precipitadamente se tem procedido no assumpto dos livros, que se tem fornecido amplissimo ensejo para ser abocanhada cruelmente a dignidade de funccionarios, que devem estar ao abrigo de taes vicissitudes, para honra das instituições a de todos. (Apoiados.)
O livro unico serve tambem para perseguir e vexar os professores, que se não amoldam completa e subservientemente ás vontades dos mandões da instrucção publica.
Ainda ha pouco li no Diario do governo uma portaria declaratoria da injustiça de uma queixa apresentada por um professor do Porto contra o distinctissimo professor do lyceu de Lisboa, sr. Pedro Monteiro.
Deprehende-se da portaria, e é publico, que um professor portuense se queixou ao governo de que o sr. Pedro Monteiro não preleccionava philosophia pelo koran oficialmente adoptado, de que é auctor o alludido professor; mas preleccionava pelo compendio de que o sr. Pedro Monteiro é auctor, e auctor tão altamente cotado e apreciado.
Provou-se pela syndicancia, a que o governo mandou proceder, que a queixa era falsa, como logo viram todos os que conhecem o caracter e a superior correcção e illustração do sr. Pedro Monteiro.
Mas o que ha a notar especialmente é o vexame exercido n´um professor tão talentoso, tão justamente considerado e tão cumpridor dos seus deveres; é a delicada situação moral, em que a syndicancia collocou o sr. Pedro Monteiro perante os seus discipulos, expondo a sua auctoridade e o seu prestigio por todos reconhecido e acatado a suspeições e desapreços.
E isto porque? Porque o auctor do koran da philosophia, mal informado, viu o seu feliz monopolio e os seus interesses ameaçados. É isto toleravel? (Apoiados.)
Não entro na apreciação dos livros adoptados e impostos; conheço alguns e posso affiançar que são pessimos; se os adoptados antes da reforma não eram bons, os actuaes são geralmente peiores.
E, o que mais escandalisa, os livros são carissimos. Para cada anno ou classe de cada disciplina publicam os auctores um fasciculo; sommados as importancias de cada fasciculo, os livros sáem por um preço exorbitante.
É caso de se dizer: caro e mau... (Apoiados.)
Sr. presidente, sinto-me assás fatigado;
Estou convalescendo de uma grave enfermidade e por isso é-me impossivel levar mais longe, como tanto desejava, as minhas observações.
Não quero, porém, sentar-me sem declarar que não venho aqui advogar os interesses nem os intuitos de ninguem.
Fallo como sei e como posso em nome dos interesses publicos, e em nome das minhas convicções, exprimindo-as sem rebuço, como costumo e como é meu feitio.
Não fallo em nome do gremio do professorado livre, nem do professorado official.
Hoje não sou professor particular nem official; fui professor de ensino privado quasi desde a infancia, e devo principalmente a essa profissão o pouco ou nada que sou.
Fui professor official; exonerou-me de tão nobre missão uma politica reles e mesquinha, acanhada nos intuitos e covarde nos processos. Posso recordar a minha exoneração sem desdouro para mim. (Apoiados.)
Não fui exonerado por incapacidade, nem por outro motivo deslustroso; (Apoiados.) se na minha exoneração houve desdouro, não foi certamente para mim. (Apoiados.)
Não defendo, pois, aqui os interesses de ninguem; defendo os interesses do meu paiz, os da justiça e da instrucção publica. (Apoiados.)
Entendo que a reforma da instrucção secundaria, decretada pelo gabinete regenerador, precisa de profundissimas modificações para se tornar viavel e benefica.
O unico argumento que tenho visto aduzir para manter inalteravel a reforma é este: a experiencia é ainda pouca. A reforma só vigora ha tres annos; não póde ainda a experiencia mostrar o que ella dará.
Francamente, sr. presidente, revolta-me ouvir similhante sophisma.
Pois então a instrucção publica é materia para ensaios e experiencias?
Pois os absurdos que enxameiam na reforma precisam ser patenteados com experiencias? (Apoiados.)
Ha na reforma paradoxos e dislates de tal ordem, que não é mister aguardar os resultados da experiencia nem dos ensaios para os reconhecer.
E se o reconhecimento é facil, porque não se expungem desde já? (Apoiados.)
Parece incrivel que a reforma não tenha já sido modificada; pois que muitos inconvenientes são manifestos e os prejuizos são já palpaveis e irremediaveis.
Os aluamos de classe nada sabem, e são tão poucos que bem se lhes póde applicar o conhecido verso do mantuano: rari nantes in gurgite vasto..
O proprio lyceu de Lisboa está quasi abandonado, apesar dos diligencias, da dedicação e bons officios do illustradissimo e talentoso reitor, que leva a sua devoção pelo aproveitamento e educação dos alumnos até ao fanatismo. (Apoiados.)
Apesar dos trabalhos do distinctissimo reitor do lyceu de Lisboa, os aluamos de classe estão atrazadissimos. Nomeiem uma commissão que vá verificar o estado em que se encontram os alumnos de classe, e ver-se-ha a verdade, a triste e negra verdade.
Quando isto succede no lyceu de Lisboa, onde o reitor desenvolve uma actividade extraordinaria, para onde se tem feito um recrutamento especial de professores, e para onde, como é publico, se pescam alumnos á fisga, com um afan digno de melhor emprego, o que irá por outros lyceus?
Verdade seja que os lyceus nacionaes são inuteis; servem apenas de preparatorio para os centraes.
Têem os lyceus nacionaes cinco annos de curso; nenhuma disciplina fica completamente ensinada nos cinco annos, á excepção do francez e do desenho, que se aprendem em qualquer escola industrial.
Mas, facto curioso, os collegios particulares podem professar o curso completo dos sete annos como os lyceus centraes.
De fórma que a lei concede nas mesmas localidades que ao lado dos lyceus, que para nada servem, funccionem institutos particulares onde se ministra toda a instrucção secundaria!
Muito mais se me offerecia dizer; mas o meu estado de fraqueza não m´o consente.
Mando para a mesa a representação do comicio; está.
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redigida em termos nobres, como era proprio dos cavalheiros que a redigiram e assignaram.
Tem a representação mais de tres mil assignaturas, na sua maior parte de cidadãos conhecedores do assumpto e interessados no desenvolvimento da instrucção e reforma do actual regimen.
Peço a v. exa. se digne consultar a camara se permitte que a representação seja publicada no Diario do governo.
Vozes: - Muito bem, muito bem.
(O orador foi muito cumprimentado.)
O sr. Abel da Fonseca: - Mando para a mesa uma justificação de faltas e uma declaração de voto.
O sr. Luiz José Dias: - Tem a mandar para a mesa uma representação da junta de parochia de Villa Mou, districto de Vianna; mas, como o sr. Ribeiro Coelho, seu illustre collega e amigo, fallou tão brilhantemente sobre assumptos de instalação publica, e sendo o assumpto tão momentoso, permitta-se-lhe expor tambem a respeito d´elle algumas considerações.
Está de accordo com a maior parte das que tão eloquente e methodicamente foram desenvolvidas por s. exa.
Disse, porem, o illustre deputado que na actual organisação dos serviços de instrucção secundaria se adoptou, por completo e exclusivamente, o methodo inductivo, pondo-se de parte o seu complemento.
Não lhe parece que deva causar a s. exa. grande estranheza este facto, porquanto essa organisação obedeceu á evolução actual do pensamento philosophica que, em todas as epochas, determinou o modo de ser das organisações d´estes ou de outros serviços.
Ha em philosophia um problema fundamental da mais difficil e complicada solução, do qual depende a determinação de duas correntes principaes que norteiam o espirito publico, n´um ou n´utro sentido.
A solução sensualista leva ao materialismo e ao atheismo; a solução idealista conduz ao racionalismo e ao deismo.
Se a philosophia, segundo a definição de um philosepho moderno, n´etant gue la raison, on ne peut suivre dans ce genro que la raison seule, a historia mostra que ella é a historia dos desvarios do espirito humano.
Aquellas duas soluções importam, como extremas, a adopção do methodo inductivo ou do deductivo.
O orador, em seguida, entra na analyse rapida da solução do problema na antiga philosophia oriental, no gnosficismo, no neo-platonismo, na philosophia grega e na idade media, mostrando como o actual methodo inductivo fôra preconizado na renascença por Bacon na sua obra monumental Novum organon.
Confrontando a organisação das instituições civis das differentes epochas no oriente e occidente, mostra como, effectivamente, as idéas fundamentaes que presidiram a essas organisações derivara da solução do problema ideologico, predominando, ora um, ora outro methodo.
Mostrando, por ultimo, que o methodo inductivo de que se resente a reforma de instrucção entre nós deriva da actualidade philosophica enaltece as suas vantagens, como poderoso instrumento de descoberta, de inducção, de analyse e de demonstração, ao qual muito deve o progresso sciencias.
(O discurso será publicado na integra guando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente: - O sr. deputado Mello e Sousa deseja interpellar o sr. ministro da fazenda sobre a publicação do contrato relativo ás 72:000 obrigações, antes de se entrar na ordem do dia. Vou consultar a camara a este respeito.
A camara resolveu affirmativamente.
Votação.
O sr. Mello e Sousa: - Viu v. exa. e viu a camara que a minoria d´esta casa se absteve muito propositadamente de entrar hontem no incidente que se levantou da antes, da noite, porque entende que só ao governo póde pedir explicações, e a elle vae pedil-as pela minha palavra.
O sr. ministro da fazenda, ou antes o governo, recusava-se a dar conhecimento á camara do contrato relativo ao supprimento com caução das 72:000 obrigações, porque a parte com quem havia contratado não tinha auctorisado a publicação d´esse mesmo contrato. Hontem, porém, ficou plenamente demonstrado que essa auctorisação existia; não ha, pois, rasão alguma para que o contrato e todos documentos não sejam publicados; (apoiados) não só não ha rasão para isso, mas pelo contrario ha todas as rasões para que elles se tornem conhecidos.
N´estas condições, peço ao governo que declare terminante o positivamente se faz ou não publicar o contrato e todos os documentos que lhe dizem respeito, e depois da resposta que me for dada pelo sr. ministro da fazenda, pedirei ou não a v. exa. novamente a palavra.
( S. exa. não reviu.)
O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - Deseja o illustre deputado saber qual é a opinião do governo ácerca do pedido que acaba de dirigir-me. Eu não faço senão reproduzir mais uma vez a resposta que tenho dado duas ou tres vezes n´esta ou na outra camara. O governo é o unico juiz da opportunidade da publicação de todos os documentos. Não julga n´este momento conveniente aos interesses do estado a sua publicação.
Não é de hontem para hoje que posso modificar a minha resposta.
(S. exa. não reviu.)
O sr. Mello e Sousa: - Sr. presidente, depois do incidente levantado hontem n´esta camara, e depois das circumstancias que eu vou apontar, é verdadeiramente extraordinaria e assombrosa a declaração feita pelo sr. ministro da fazenda! (Apoiados.)
Sr. presidente, quer n´esta camara, quer na camara dos dignos pares do reino, conforme o extracto da sessão, o sr. ministro da fazenda declarou o seguinte: (Leu.)
Por motivos similhantes, e ponderações iguaes, não póde dar conhecimento do contrato a que o digno par se refere, sem ter para isso a devida auctorisação da pessoa com quem contratou.
Affirma que conhece o contrato em todos os seus termos precisos, e que foi elle redigido segundo as instrucções que forneceu.
Conhece o teor do contrato; tem-o na sua pasta, mas não possue o documento authentico.
E evidente que o contrato a que o seu relatorio allude não é igual ao que em 1896 foi feito pelo digno par a quem responde; mas entende que o não póde publicar, sem audiencia ou consentimento da entidade com quem contratou.
Entende que tão correcto é o seu procedimento agora, como correcto foi o procedimento do digno par em 1896, recusando-se a denunciar um contrato sem estar para isso devidamente auctorisado pela outra parte contratante.
Insiste em dizer que não póde por emquanto dar conhecimento do contrato sobre as obrigações dos caminhos de ferro, mas não terá duvida em o publicar, quando para isso se julgue habilitado.
Não tem duvida em mostrar esse contrato ao digno par, ou a qualquer outro membro da camara, mas d´ahi a publical-o vae uma grande differença.
Precisa de ser muito cauteloso na apresentação de certos documentos, pois que o anno passado viu que deram á luz publica alguns que o orador, evidentemente, não destinava á publicidade.
Sr. presidente, vê v. exa. que o nobre ministro da fazenda se recusava a apresentar o contrato porque não tinha documento authentico, depois porque não estava habilitado ou auctorisado a publical-o, e agora, finalmente, porque é elle o unico juiz da publicação, e entende que não é conveniente para os interesses do estado! O que é conve-
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Diante para os interesses do estado é que o paiz saiba o que o governo fez. (Apoiados.)
Isso é positivamente conveniente aos interesses do estado, e tanto mais quando da parte que contratou se diz. Publique-se tudo..
A insistencia do sr. ministro em recusar á publicação de contrato fez nascer a suspeita de que não é por conveniencia dos interesses do estado que elle se não publica, mas por conveniencia para o governo, que alguma cousa pretende occultar. (Apoiados.)
Sr. presidente, tambem allegou a esta camara o sr. ministro da fazenda, que nunca se tinham publicado contratos d´esta natureza. Isto não é perfeitamente exacto, pois que, sendo um contrato de supprimento, como o proprio sr. ministro da fazenda declarou, devia ser publicado.
Foi assim que s. exa. lhe chamou, porque disse claramente o seguinte: (Leu.)
Pouco depois chamava-lhe um mero expediente! Ora, os supprimentos de thesouraria são publicados no relatorio dos actos de ministerio da fazenda e, n´este caso, que rasto ha, pois, para que este não seja publicado immediatamente?! (Apoiados.)
Não se conhece, nem se comprehende.
Não só é um supprimento de thesouraria (e os supprimentos de thesouraria costumam publicar-se), mas tambem a camara e o paiz têem todo o direito em conhecer da maneira como são geridos os negocios publicos. (Apoiados.)
O governo é apenas um mandatario do paiz, e em questões de administração de dinheiros publicos, tem positivamente de dar conta ao parlamento dos seus actos, porque é funcção essencialissima do parlamento fiscalisar os actos do governo. (Apoiados.)
Não se trata de negociar um emprestimo, cujo preço e condições têem de estar occultas, em proveito da negociadores, até a emissão estar effectuada; trata-se de um simples e mero expediente; trata-se de um contrato; fechado e de que a outra parte auctorisa a publicação.
É um simples supprimento, feito com a caução de obrigações, e não se comprehende, não se admitte, não ha meio nenhum de acceitar que não possa ser publicado.
O governo pediu dinheiro sobre 72:000 obrigações; pediu esse dinheiro e foi-lhe dado; é a operação mais simples, mais comezinha, mais ordinaria em questões bancarias ou financeiras. (Apoiados.) Que condições póde haver que prejudiquem os interesses do estado? Nenhumas, absolutamente nenhumas, a menos que sejam vergonhosas, e se alguma cousa prejudica é o interesse do governo e a sua conservação. (Apoiados.) O que o contrato póde e deve ter hoje, e póde-se dizer que deve ter, visto a recusa da publicação, é condição que obriga-o governo a sair d´aquellas cadeiras. Só por isso e por essa unica rasão é que se póde explicar a recusa da publicação do contrato. (Apoiados.)
O sr. Moncada: - Só por esse lado o contrato se recommendará.
O Orador: - É claro, é manifesto que não ha rasão alguma para as conveniencias do paiz que o contrato e os documentos que acompanham não sejam publicados. Sendo assim, qualquer que seja a replica por parte do governo, declaro por parte d´este lado da camara que todos os dias continuadamente, antes da ordem do dia, e na ordem do dia, será pedida a publicação d´esses documentos, d´esse famoso contrato, tão famoso, que do lado de quem deu o dinheiro se diz que se póde publicar, emquanto que da parte de quem o recebeu se responde que não póde ter publicidade! Por que rasto? For causa das conveniencias do estado. Alguem que esteia de boa fé comprehende bem que não possa ser publicado um contrato de simples expediente e com canção de obrigações? Póde haver no contrato outras clausulas que não sejam por 72:000 obrigações 12 ou tantos milhões de francos, ou outros tantos contos de réis a tal taxa e por tal praso? Pôde haver outras condições!
Não póde haver, e se não as ha, não se admitte vanta-tagem em que o paiz não conheça o contrato. Pelo contrario ha toda a vantagem em elle o conhecer.
O sr. Luciano Monteiro: - Póde ser; e tanto as ha que o governo occulta-o.
O Orador: - Pôde haver n´um emprestimo caucionado outras condições que não sejam o praso, a quantia e o juro? Não póde haver. Onde está, pois, o perigo, Onde está o inconveniente para os interesses do estado em que esse contrato seja publicado?
Ninguem o comprehende, e desde que não se comprehende, e desde que alguem da outra parte contratante pede para que se publique tudo, não ha senão uma unica cousa decorosa: fazer a publicação.
O sr. Conde de Burnay: - Peço a palavra.
O Orador: - Mas ha mais e mais importante ainda: é que o sr. ministro da fazenda no seu discurso sobre a conversão em que chamava a isto supprimento (contratos de supprimentos têem sido sempre publicados), dizia que com este expediente conseguira ter já no estrangeiro todo o oiro necessario para os coupons de abril e julho, e que os supprimentos que obtinha eram reformaveis obrigatoriamente até fevereiro de 1899.
Eram estas condições importantissimas e é necessario que o paiz as conheça pelo contrato em si. Se realmente a quantia alcançada por este supprimento chega para pagar os coupons de abril e julho.
Se realmente a quantia alcançada por este supprimento chega para pagar os coupons de abril e julho, repito, e se ha n´elles a condição obrigatoria de reformar o contrato até fevereiro de 1899, que condições são estas que não é conveniente que o paiz conheça?!
O sr. Luciano Monteiro: - Quer v. exa. a explicação do motivo por que não se publica o contrato? Tem essa explicação na phrase acerba, dura e cruel com que o sr. conde de Burnay terminou hontem o seu discurso: Deus os livre que eu diga tudo.
O Orador: - Creio ter demonstrado que n´um contrato de supprimento não póde haver outras clausulas sento as rudimentares, tempo, taxa e quantia, mas se alem d´isso ha a condição de ser obrigatoria a sua reforma até fevereiro de 1899, melhor. É uma condição acceitavel e póde ser favoravel a sua publicação para o paiz.
Supponhamos que as condições eram onerosas, que a taxa era elevada, que este contrato tinha sido tratado com a corda na garganta; pois ainda assim a sua publicação era conveniente para se conhecer que o projectado emprestimo ligado á conversão é uma verdadeira burla, porquanto, se não houve meio de realisar em boas condições com penhor, um pequeno contrato, como se ha de realisar um emprestimo fabuloso como s. exa. desejam!
A minoria não quer ser cumplice na sonegarão que se quer fazer d´esse documento, e protesta energicamente, e ha de protestar todos os dias, contra tal procedimento.
O contrato deve ser publicado, e agora, depois do des-graçadissimo incidente da sessão de hontem, indispensavel é a sua publicação para decoro e dignidade da camara, e para que não recáiam suspeitas sobre ninguem.
(O orador não reviu.)
sr. Presidente: - O sr. conde de Burnay pediu a palavra, mas, como a camara resolveu que ella fosse concedida ao sr. Mello e Sousa, que a pediu para um negocio urgente, não lh´a posso dar.
Vae entrar-se na
ORDEM Do DIA
Continuação da discussão do capitulo 1.º do orçamento de receita
O sr. Lourenço Cayolla: - Tenho de concluir hoje as considerações que vinha fazendo na discussão do orça-
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mento do receita, em resposta ao sr. Teixeira de Sousa.
For mais captivante que tenha sido a attenção da camara na primeira parte do meu discurso, não posso suppor que a sua memoria conserve a recordação das minhas palavras; mas como não quero abusar da sua benevolencia, continuarei desde já, sem fazer a minima recapitulação, na ordem das idéas que ia desenvolvendo.
Quando terminou a sessão de sabbado referia-me á verba incluida no orçamento, como devendo provir da receita dos alfandegas sobre a importação dos cereaes.
Esta verba é das que têem merecido mais reparos aos illustres deputados da minoria, e tanto que o sr. Teixeira de Sousa dizia que o facto d´ella figurar no orçamento representava um acto de troça da parte da respectiva commissão.
Não serei eu quem levante estas palavras. Quem lhe ha de responder ha de ser o relatorio da commissão, na parte era que o seu illustre relator, o meu querido amigo sr. Eduardo Villaça, provando mais uma vez as elevadas qualidades do seu saber e do seu criterio, demonstra plenamente como foi rigoroso o legal o seu calculo. (Apoiados.)
Tem-se dito que este anno as cearas apresentam um aspecto magnifico, e que se a colheita do anno passado chegou para nove mezes, a d´este anno, a não sobrevirem quaesquer contrariedades inesperados, deve fornecer trigos para todo o paiz e para todo o periodo que vae até á colheita futura.
Oxalá que tal succeda, porque os 5:000 contos em oiro de que, em media, temos sido tributarios dos mercados estrangeiros, ficarão a alimentar a riqueza nacional, e esse factor é por si só sufficiente para nos proporcionar um tal desafogo economico, que não poderá deixar do se reflectir beneficamente na situação cambial, e, portanto, na diminuição dos encargos do estado. (Apoiados.) Póde este perder o todo, ou parte, das receitas attribuidos á importação cerealifera. Se, porém, succeder assim, diminuirão tambem as despezas cambiaes, e não será, portanto, d´esse facto, que muito robustecerá a riqueza do paiz, que ha de advir prejuizo para a situação do thesouro. (Apoiados.)
Devemos reflectir ainda que o orçamento que estamos discutindo, para fazer face a qualquer diminuição da receita que se possa dar, apresenta um saldo de 2:305 contos, ou antes de 705 contos, deduzidas as despesas extraordinarias que não foram incluídas no primitivo orçamento de despeza, saldo que indemnisará essa differença.
É verdade que os illustres deputados da opposição manifestaram uma dolorosa perturbação no seu espirito, provocada pelo facto de só agora a commissão do orçamento ter contado com essas despezas extraordinarias. Levaram a sua surpreza até ao ponto do sr. Mello e Sousa condemnar esse procedimento da commissão, affirmando que no estrangeiro se ficaria com a impressão de que o saldo orçamental era o que tinha sido estipulado antes de se attenderem a taes despezas, e d´ahi surgiram terriveis e intractaveis exigencias.
Não vae, porém, passado muito tempo que o mesmo illustre deputado era precisamente o que dizia que no estrangeiro se sabe, em rigor, tudo o que entre nós se passa, que ali se seguem os nossos passos, que se conhecem todas as nossas cousas. (Apoiados.) Agora tudo mudou, como n´uma magica. E lá fóra tem-se apenas conhecimento da proposta ministerial, e ignora-se de todo o trabalho da commissão e o saldo a que ella chegou, saldo que, na opinião do sr. Mello e Sousa, póde prejudicar todos os trabalhos para o accordo com os credores externos. (Apoiados.)
Dizia ou que a minoria parlamentar não quer acreditar na existencia do saldo, e por isso, receiando que nem todos façam como ella, pretende dar-lhe o golpe de misericordia,
O sr. Teixeira de Sousa, que tantas propostas de economia aqui apresentou, que tantos córtes advogou, propoz-nos agora, no seu ultimo discurso, que se dotasse a verba de edifícios publicos em mais 600 contos.
S. exa. baseou esta proposta no facto de ter ficado deserto o concurso da primeira empreitada geral.
As palavras de s. exa. constituem, a meu ver, um caloroso elogio ao governo, porque só o facto das condições estabelecidos serem muito rigorosas, defendendo, com exag-gero talvez, os interesses do thesouro, é que póde explicar o ter ficado deserto o concurso, pois que os individuos que a elle podiam concorrer não encontraram nas clausulas do contrato margem sufficiente para os lucros que licitamente julgavam dever ambicionar. (Apoiados.)
Não obstante ter se dado o que se deu, comprehendo perfeitamente que essas clausulas possam ser modificadas, salvaguardando os interesses do thesouro de maneira que nos futuros concursos appareçam os concorrentes que faltaram agora. (Apoiados.)
A rasão dada pelo illustre deputado que me precedeu, de que a simples condição de se imporem aos adjudicatarios a admissão de uma determinada percentagem de operarios do estado, é sufficiente para termos a certeza de que nenhuma das empreitadas poderá ser adjudicada, considera-se de menos valor, visto que n´outras empreitadas muito importantes, e tão importantes como a das obras do porto de Lisboa, se introduziu essa clausula, e apesar d´isso ellas não ficaram desertas. (Apoiados.)
O sr. Teixeira de Sousa fundamentava ainda a proposta do augmento de 600 contos na verba dos edificios publicos, dizendo que ao ler alguns mappas do numero de operarios empregados em obras do estado, concluira que a verba votada não bastava sequer para os trabalhos a executar na cidade de Lisboa. S. exa. leu esses mappas até novembro, e procedeu assim prudentemente para a defeza da sua these, porque se continuasse e lesse os seguintes havia de reconhecer que as medidas do governo, e em especial do nobre ministro das obras publicas, para acabar com o exercito de operarios que lhe ficou por herança, têem sido coroadas dos melhores resultados; tanto assim, que tendo assumido o poder quando os operarios absorviam uma despeza de 17 contos por semana, chegando ella a ser de 22 contos, hoje essa despeza está, felizmente, reduzida a menos de 12 contos. (Apoiados.)
Mas dizia eu que, alem do saldo que figura no orçamento, o governo conta ainda com os recursos que ha de obter pela execução gradual do seu plano financeiro. (Apoiados.) Todos conhecem a base principal d´esse plano.
O illustre ministro da fazenda, a cujos esforços patrioticos e dedicação civica só o futuro poderá prestar a devida homenagem, (Apoiados.) porque é necessario que um homem do seu merito e qualidades tenha um grande amor ao seu paiz para se consagrar, como elle se tem consagrado, a uma missão tão rica do cuidados, como safara de glorias, (Apoiados.) comprehendeu, desde o primeiro momento de assumir o poder, os diversas phases do problema que tinha a atacar, e atacou-o com uma decisão, uma energia e, ao mesmo tempo, uma prudencia, que serviriam para justificar plenamente as suas raras qualidades de verdadeiro estadista, se ellas não estivessem já brilhante e sobejamente comprovadas. (Apoiados.)
O modo como faltámos abruptamente ás nossas obrigações de devedor, creou-nos uma atmosphera tão hostil e intransigente nas praças estrangeiras e um descredito tão deprimente n´essas praças, que debalde têem luctado contra esse descredito os mais energicos esforços do paiz. (Apoiados.) O augmento e a desvalorisação da circulação fiduciaria só tem aggravado a penosa situação a que chegámos. (Apoiados.)
Urgia portanto provar que n'uma situação normal não carecemos mais do que dos proprios recursos e para vencer a desconfiança externa, para combater O agio do piro,
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ferida aberta por onde sangram todas as forças vivas do paiz, chamar os credores do estado a um accordo sincero, honrado e digno para todos, accordo que transforme esses credores de inimigos em cooperadores do resurgimento nacional e robustecer e garantir por esse modo efficaz o excesso da circulação fiduciaria. (Apoiados.)
Mas não se limitou aqui o trabalho do sr. ministro da fazenda e de todos os seus collegas. Parallelamente procuram elles crear e desenvolver outros recursos. (Apoiados.)
Pelo projecto da conversão, que cessará a lucta que temos soffrido e libertará por um periodo largo o mercado interno da concorrencia do thesouro, conseguir-se-ha a diminuição do agio do oiro (Apoiados.)
É este, a meu ver, o problema mais importante que s. exa. podia tentar resolver. (Apoiados.)
Na situação em que nos encontramos, podemos para-phrasear a phrase celebre do grande orador da defeza nacional da França e exclamaremos: o agio é o inimigo. (Apoiados.)
Elle absorveu uma grande parte da riqueza do paiz. (Apoiados.) No relatorio que o sr. ministro apresentou ao parlamento prova s. exa. que só no ultimo anno o agio nos levou a importante quantia de 3:900 contos de réis; isto é, tanto como os encargos de uma divida consolidada de 65:000 contos de réis, que não recebemos, que não veio alimentar a nossa riqueza economica e de que comtudo pagámos os juros, que ameaçam subir ininterruptamente, lançando todas as economias nacionaes n´um sorvedouro insaciavel, monstro que tudo absorve sem nada produzir. (Apoiados.)
O governo preoccupado com a situação financeira viu-se obrigado a propor uns aggravamentos tributarios. Bastará que a descida cambial se accentue quatro pontos, para que o agio absorva os recursos que se pretendem crear com esses novos impostos. (Apoiados.)
Nada mais preciso dizer para provar que o plano do governo é o que mais utilmente se concilia com os interesses, do paiz. (Apoiados.) Diz-se que esse plano será inutil porque não poderemos responder pelos compromissos a que nos obrigámos. Aos que imaginam que o remedio proposto não é de seguro effeito, poderemos responder que a doença que nos consome, não sendo atacada com energia, nos matará com certeza. E que alvitres nos apresentam em substituição d´esse plano? Os regeneradores lembram córtes, muitos coórtes, que só fariam augmentar a miseria publica. Esse programma, vindo de quem vem, serve para confirmar o velho proloquio popular de que o diabo depois de velho sempre se fez ermitão (Apoiados e risos.)
Eu vejo que a camara está cansada com as successivas impressões por que tem passado desde que esta sessão se iniciou, e eu não quero abusar da sua attenção. Tencionava fazer outras considerações sobre os recursos com que o governo póde contar, e que fazem com que a nossa situação financeira não esteja, a meu ver, tão cheia de negrumes, como os illustre a deputados da minoria aqui estio a descrevel-a todos os dias.
Entre esses recursos conta-se um, e dos mais importantes, e esse vem incluído na propria proposta da conversão. É o que derivará de uma nova distribuição na amortisação dos emprestimos. Com as actuaes amortisações não ha economias possiveis para o equilíbrio orçamental. A prova é que nos dois ultimos mezes, sem termos recorrido muito ao credito em condições onerosas, os encargos da divida augmentaram como já disse, 701 contos; a prova é que não obstante n´este orçamento proporem-se economias no valor de 225 contos de réis, as despezas são superiores ás do orçamento anterior em 250 contos de réis, porque uma e outra verba foram absorvidas pelo aggravamento nos encargos geraes e nas despesas do divida publica. (Apoiados.)
Abreviando, porém, as minhas considerações, direi apenas que na serie de recursos que o governo tenciona crear, contavam-se, como já tive ensejo de referir, alguns aggravamentos tributarios. Uma d´essas propostas figura no orçamento que estamos discutindo.
Trata-se do addicional de 5 por cento sobre as contribuições do estado.
A este addicional a opposição annunciou já uma guerra intransigente, cruel, que irá até aos ultimos excessos, até ás ultimas violencias.
Se eu n´este momento quizesse alongar-me em considerações sobre este assumpto e dar ás minhas palavras um tem de paixão política, que ellas não têem tido, perdendo a serenidade que desejo conservar até ao fim, não faria mais, para justificar o addicional a que alludo, do que apresentar a seguinte moção de ordem:
A camara, reconhecendo a necessidade inadiavel de recorrer ao imposto para prover de remedio aos desvarios financeiros e administrativos da situação transacta, continua na ordem do dia.
Esta moção de ordem não é da minha inspiração. Como não desejo passar por plagiario, direi que ella é firmada por um dos oradores mais eloquentes da actual minoria parlamentar, que lamento não ver agora aqui presente, o sr. Teixeira de Vasconcellos, e fundamentada quando se discutiu n´esta camara o addicional de 6 por cento, proposto pelo sr. João Franco, então ministro da fazenda.
Parece que o illustre deputado, a que me estou referindo, que é incontestavelmente uma das palavras mais energicas, mais vibrantes e mais apaixonadas da opposição parlamentar, previa já o momento em que nos encontramos, os desvarios financeiros e administrativos da ultima situação regeneradora, e com uma fórma tão sobria como justa descrevia os estragos financeiros produzidos por essa situação, advogando como necessidade inadiavel a idéa de um imposto que podesse modificar os resultados de tantos desvarios e desvairamentos. (Apoiados.)
Poderia aqui espraiar-me em largos retaliações partidarias. Mas não o quero fazer. Não tenho mesmo que defender agora o addicional proposto, porque essa discussão seguir-se-ha á que estamos travando e por isso, muito, de passagem, direi apenas que, desde que o governo conta que pelo cumprimento gradual do seu plano financeiro augmentará os recursos do thesouro e tornará mais desafogada a situação do paiz, e considera como condição indispensavel, para que esse plano possa vingar, que o orçamento sáia d´esta camara verdadeiramente equilibrado, (Apoiados.) elle precisava de um acrescimo de receita, mas de um acrescimo de execução temporária, e não pódia lançar-se no caminho de remodelar com menos prudencia e reflexão os impostos, como a opposição o aconselha, sem ter a certeza absoluta de quaes seriam os verdadeiros resultados d´essa remodelação.
Os addicionaes padecem evidentemente de grandes defeitos. Theoricamente são condemnados como expedientes de occasião, que aggravam as injustiças e desigualdades do regimen tributario.
Mas na sciencia financeira a opportunidade não vale menos do que os princípios da theoria. (Apoiados.)
O governo está applicando e continúa a applicar um largo plano de fomento e desenvolvimento de riquezas, cujos resultados não podem ser immediatos. (Apoiados.) Os meios do thesouro devem augmentar n´um futuro proximo.
A esse fim obedeceu a proposta do novo contrato com a companhia dos tabacos, já sanccionada n´esta camara; o novo contrato com o banco de Portugal, já auctorisado pelo voto do parlamento; a proposta de protecção á marinha mercante, que ataca uma das questões mais vitaes para a nossa economia; e as de fomento agricola e colonial, umas já approvadas, outras sujeitas ainda ao estudo
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das camaras. Todas obedecem ao mesmo elevado e patriotico fim. (Apoiados.)
D´aqui a em anno o governo, com a execução cada vez mais desenvolvida d´essa larga serie de medidas, disporá de recursos que hoje lhe fallecem.
N´estes termos precisava obter um acrescimo de receitas seguro, mas por um praso antecipadamente limitado. (Apoiados.)
Por isso incluiu no orçamento, como um dos seus artigos, o addicional cuja existencia findará exactamente com o periodo em que finda o mesmo orçamento. Este addicional não é, como outros anteriormente votados, uma lei especial, de execução permanente; é uma disposição accidental que viverá apenas o tempo em que tiver execução o diploma que estamos discutindo. (Apoiados.) Não passa de uma taxa de effeitos muito transitorios, mas sobre o producto da qual não póde haver duvidas. (Apoiados.)
O addicional, porém, não prejudica os trabalhos que o nobre ministro da fazenda já iniciou, como o prova com a sua proposta do remodelação da lei do sêllo, e em que o governo de certo proseguirá, para rever todos os impostos e em especial a contribuição predial, por fórma que, sendo mais iguaes e equitativos, sejam tambem mais productivos para o thesouro. (Apoiados.)
Dizendo algumas palavras sobre o orçamento de receita, tire ensejo de me referir ao plano financeiro do governo e de affirmar a minha convicção de que d´esse plano dependo o rejuvenescimento do paiz.
Atravessâmos evidentemente uma hora difficil, mas para nos consolarmos da amargura que devemos sentir, temos o consolador espectaculo de um povo que não se deixa vencer pela desgraça e de uma situação economica que dia a dia tem ido melhorando. (Apoiados.)
O meu querido amigo e illustre collega o sr. Eduardo Villaça, quando tomou parte n´este debate, teve occasião de mostrar, com dados indiscutiveis, quanto na realidade a situação economica se tem transformado beneficamente nos ultimos tempos.
Não repetirei esses dados e apenas synthetisarei a minha opinião, dizendo que estamos n´um paiz, se não rico, mas remediado, o que não impede que tenhamos um thesouro pobre. (Apoiados.)
Precisâmos sobretudo rebustecer e animar o espirito publico. A meu ver, o maior perigo que corremos é de uma grave e intensa crise de medo. (Apoiados.) As nossas melhores economias seguem a toda a hora para o estrangeiro n´um exodo lamentavel e depauperante. (Apoiados.)
No notavel e proficientissimo discurso que o digno par do reino o sr. Correia de Barros, então nosso collega n´esta camara, proferiu sobre a conversão, mostrou elle, com dados positivos e indiscutiveis, que a nossa balança economica, não só está felizmente equilibrada, mas dá ainda um saldo positivo de perto de 6:000 contos de réis annuaes, apesar de pagarmos mais de 17:000 pela differença de cambios, computados a 50 por cento.
Os dados apresentados por s. exa. e as bases do seu calculo são rigorosamente verdadeiros. Deviamos, portanto, não soffrer o agio do oiro e este metal, tranformado em mercadoria, avultar mais no mercado em offerta do que em procura. (Apoiados)
Porque não succede assim? Porque todos os annos milhares de contos de capitaes portuguezes vão procurar na capitalisação estrangeira uma segurança que se lhes afigura faltar aqui.
Esta é a doença que nos corroe. doença que só se póde combater levantando-se o credito do paiz. (Apoiados.)
A crise de medo, a crise de terror, mesmo a que me referi, exige que caminhemos sem hesitações. (Apoiados.)
As classes que representam a riqueza publica podem dizer com orgulho que não atraiçoaram a sua missão e que souberam defrontar-se com o infortunio. (Apoiados.)
As manifestações de engrandecimento economico são palpaveis e evidentes. (Apoiados.) Debellados os receios da opinião e assegurado o desenvolvimento das melhores fontes de riqueza, com que muito podemos contar, Portugal readquirirá a sua antiga tradição de um povo modesto, sobrio, mas digno e honrado como os mais dignos e honrados. (Apoiados.)
A esse fim se destina o programma do actual gabinete. Uma administração severa, a valorisação dos nossos productos e em especial os do nosso domínio ultramarino e a melhoria crescente da balança economica são os tres factores da prosperidade nacional e do desafogo do thesouro. (Apoiados.)
Para os conseguir firmar não têem os actuaes ministros poupado esforços, nem canseiras. (Apoiados.) Provam-no os seus actos; provam-no as suas propostas e prova-o este mesmo documento que estamos discutindo. (Apoiados.)
Por isso continuo a dar-lhe o meu voto, convencido que d´esse modo cumpro, não só um alto dever civico, mas um verdadeiro acto de patriotismo!
Vozes: - Muito bem.
(O orador foi cumprimentado pelos ministros e por muitos srs. deputados.)
O sr. Malheiro Reymão: - Eu ouvi, sr. presidente, com a devida attenção o discurso do illustre deputado que me precedeu, e tenho muito prazer em render homenagem ás brilhantes qualidades de espirito e de talento que mais uma vez affirmou n´esta casa.
Disse s. exa. que o plano financeiro do governo era o que julgava mais harmonico com os interesses do paiz e o mais ajustado ás circumstancias da nação, e por isso lhe dava o seu apoio mais convicto e sincero!
Mas permitia-me o illustre deputado que lhe pergunte qual é o plano financeiro do governo!..
São essas medidas mirabolantes tão apregoadas e que, dia a dia, se foram esphacelando, não podendo nenhuma d´ellas converter-se em lei, por fortuna do paiz?!... São os actos do governo que, dia a dia, aqui se conhecem e nos produzem a vibração de um desgosto sincero, porque vemos que o plano financeiro do governo é levar-nos para um rumo desconhecido, de ruina e de vergonha, (Apoiados.) e que pouco lhe importam os circumstancias graves e desgraçadas que, infelizmente, o paiz atravessa!
O plano do governo é a occultação de contratos de que tanto depende o futuro do paiz!... É sonegar ao parlamento e á nação o conhecimento de assumptos que ella tem direito a saber - e ha de saber!... - (Apoiados.) porque quer fazer justiça á fórma como o governo procede!...
Plano financeiro do governo!... Que é feito d´esse plano?!. .. É a apresentação do addicional de 5 por cento, a fórma mais gravosa e vexatoria de tributação?... É o aggravamento do pesadissimo imposto do sêllo?... É o plano financeiro do governo vender, hypothecar, alienar pelas praças do mundo o nosso patrimonio, junto com muito trabalho e á custa de tanto sacrificio, que representa o sangue e a dôr de milhares de contribuintes, que têem estado constantemente a subscrever para que isto dure e viva?!...
Comprehendia realmente que as circumstancias do paiz nos determinassem, a todos nós, a seguir um caminho absolutamente diverso do que, infelizmente, se vae trilhando. (Apoiados.) Era o governo que, primeiro que todos, devia entrar na senda de uma remodelação completa dos nossos viciosos processos passados, presentes e que serão futuros. Era preciso que o governo seguisse uma vida completamente nova, despida d´estes refolhos e artificios, que podem mostrar habilidade mas que, por fórma alguma, concorrem para o bem do paiz.
Se nós não fossemos constantemente espicaçados, atirados para um caminho de protesto, seriamos n´este momento, que eu reputo de ama gravidado extrema, os primei-
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ros — e temol-o afirmado por muitas vezes—não a apoiar o governo, que não nos merece confiança, mas a cooperar com elle quanto em nossas forças coubesse, para ver se podíamos salvar a nossa patria, esta triste patria que se encontra collocada á beira do abysmo.
Na gravidade extrema d´esta conjunctura, quando arde em sinistras labaredas a casa do nosso vizinho, quando os mares se avermelham com o sangue de dois povos nossos amigos, quando está de luto a nossa alma, quando o nosso coração se sente angustiado com as dôres de um povo nosso irmão, quando está de negro o nosso futuro, porque hão de ter n´elle repercusão as calamidades imminentes a dois passos de nós, comprehendia eu que o governo seguisse por uma senda differente que levantasse o paiz n´uma hosanna de amor patrio, em vez de se preoccupar todos os dias com ridiculas negaças políticas. (Apoiados.) Triste habilidade politica! (Vozes: — Muito bem.)
Quando a opposição, quando o paiz todo pede a publicação d´esse contrato, que está acarretando enormes suspeitas sobra o governo, (Apoiados.) e, sobretudo, quando o que importa é arredar das cadeiras do poder essa onda de suspeições, que ámanhã póde arrastar no mesmo impeto culpados e innocentos, o governo nega teimosa e persistentemente a publicação de um contrato de tão alta importancia e gravidade para a situação do paiz. (Apoiados.)
Os planos financeiros do governo! Mas o que resta, o que fica d´esses planos que não seja um orçamento que, muito longe de estar inexpugnavelmente equilibrado, representa a mesma ficção na receita, o mesmo desbarate na despeza, sem por fórma alguma traduzir um balanço exacto e rigoroso do estado do paiz e das forças do thesouro.
Diz a commissão que o orçamento deve ser um espelho aonde nitidamente se reflictam todas as vicissitudes da administração publica, mas o que n´aquelle espelho se reflecte claramente é que continuâmos na mesma vida desregrada e de desperdicios, e que somos incapazes de um movimento efficaz de reacção, e que assim iremos ao ultimo extremo com a mesma alegria e jovialidade com que
o sr. presidente do conselho ainda ha pouco se ria das minhas desataviadas palavras...
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (José Luciano de Castro): — Eu não ri, nem podia rir-me das palavras de v. exa., nem era capaz d´isso; pelo contrario, v. exa. é um dos deputados da opposição, cuja palavra com mais attenção eu escuto.
O Orador: - Ainda bem, porque o momento não é para rir, (Apoiados.) sobretudo por parte de um estadista sobre quem impendem tão altas e tão graves responsabilidades, como são as do sr. presidente do conselho (Apoiados.) n´este momento e na situação em que se encontra o paiz, podendo ser que em poucos dias seja esse estado muito mais grave se continuar o mesmo systema de imprevidencia jovial e inconsciente, que tem sido o programma do governo.
Disse eu que o plano financeiro do governo era o desapparecimento e a falta de plano! O sr. ministro da fazenda, no seu relatorio apresentado á camara o anno passado, dizia:
(Leu.)
Quem tem de memoria esta promessa, para que eu agora chamei a attenção da camara, tem o direito de perguntar porque é que assim modificou o seu plano, porque assim alterou os seus projectos, porque, descuidando a remodelação dos impostos que podia fazer sem aggravar as taxas existentes, foi escolher; a fórma de tributação mais iniqua e mais desigual que póde pesar sobre os contribuintes!
Os contribuintes têem, por mais de uma vez, chamado a attenção dos poderes publicos, expondo-lhes que, ao passo, que ha propriedades que estão inscriptas com rendimentos muito superiores ao que produzem, outras se encontram enormemente alliviadas no rendimento collectavel; que, emquanto a fiscalisação, é dura, de bronze para, uns, é facil, de cera para outros.
Em tal situação, que o proprio governo reconhece e confessa, é humano, ou é justo, aggravar e augmentar todos estes vexames, tornar mais injustos todos estes impostos, com um addicional de 5 por cento?
Quem um pouco reflectidamente analyse e estude o producto das Contribuições, averigua que é principalmente em Lisboa onde, todos os dias, se estão dando factos extraordinarios, que os dinheiros publicos mais se desbaratam; que é sob as vistas de quem, por elles, devia ser responsavel, dos empregados mais graduados e elevados em categoria administrativa, e fazendaria, que isto acontece; que é precisamente aqui onde as contribuições são peiormente cobradas e arrecadadas, e que não ha comparação entre a fórma como esses serviços são desempenhados nas provindas e os resultados que dão na capital, demonstrando-se assim que a rede da fiscalisação só aperta e apanha os peixes mais miudos, deixando passar os tubarões e os baleotes da capital!
A contribuição predial que, segundo aã notas publicadas desde 1892-1893 a 1896-1897, em todos os districtos do paiz, com excepção de Lisboa, rendeu:
(Leu)
No districto de Lisboa rendeu:
(Leu.)
Quer isto dizer que do mesmo passo em que nos districtos do paiz a percentagem das perdas ficava em 4 por cento, na capital se dava uma perda superior a 7 por cento.
Ora, se as leis são as mesmas, a fiscalisação é a mesma, e ainda se ha differença deveria ser em favor de Lisboa, porque aqui se encontram todos os inspectores largamente remunerados e que para alguma cousa podiam servir, concluimos que esta contribuição, garantida pela propriedade, se fiscalisa é cobra mal por culpa do governo, que não exige dos funccionarios o trabalho que lhes deve exigir, o cumprimento dos deveres. E não se pense que isto são cousas mínimas que não devam occupar a attenção do sr. ministro da fazenda.
Eu estou, convencido do contrario. É preciso que o sr. ministro da fazenda encare a questão financeira desde os seus mais miudos pormenores ás suas mais complexas difficuldades.
De ministros para emprestimos, para empenhar e para vender, está, ou deve estar, farto o paiz!
Se o sr. ministro da fazenda houvesse pensado na lição d´estes algarismos, reconheceria desde logo que havia necessidade da remodelação completa d´estes serviços por fórma a tirar-se de ahi a receita ajustada á importancia do imposto liquidado.
Na contribuição de renda de casas repete-se a mesma cousa. Todos os districtos do paiz, com excepção de Lisboa para uma liquidação de 1:380 contos de réis ficam em divida com 154 contos de réis; em Lisboa a liquidação é de 1:767 contos de réis e a divida de 319. Aqui a percentagem ainda é mais escandalosa e extraordinaria! Ao passo que em todos os districtos do paiz se dá n´esta contribuição uma quebra de 4 por cento, em Lisboa essa quebra sobe a 18 por cento.
Porque é que o sr. ministro da fazenda, que foi auctorisado a reformar os serviços dependentes do seu ministerio, produziu apenas um producto enfezado e pequeno, o regulamento de 31 de dezembro de 1897!
Porque é que o sr. ministro da fazenda não remodelou o serviço das contribuições por fórma a que pague quem deve pagar em vez de ir augmentar os encargos d´aquelles que já pagam para deixar no mesmo allivio e tranquilidade aquelles que têem conseguido escapar-se ás durezas das leis fiscaes! Eis aqui uma questão que aproveita, não
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só ao thesouro, mas aos contribuintes, porque todos desejam pagar na exacta proporção dos rendimentos que têem.
Na contribuição industrial a liquidação em todos os districtos do reino, excepto Lisboa, foi de 4:342 contos de réis, isto com referencia aos ultimos cinco annos. A quantia que ficou em divida nas províncias de tal contribuição foi de 669 contos de réis, mas em Lisboa a importancia liquidada foi do 4:129 contos de réis, uma cifra inferior á que se liquidou em todos os demais districtos e ficaram em divida 848 contos de réis. Isto nos ultimos cinco annos porque se quizessemos fazer o calculo ou apreciação com respeito a mais prolongado periodo veriamos que:
(Leu.)
Não se comprehende assim que ha o direito de reclamar e de lavrar um protesto formal contra este calcar constante sobre os contribuintes de fóra para beneficiar os candongueiros e traficantes que na capital escapam á acção das leis?!
Existe necessariamente uma causa que é necessario investigai, que não é natural nem tem explicação facil, da qual resulta a diminuição do rendimento da contribuição e decima de juros, que emquanto nos outros concelhos augmenta de rendimento aqui experimenta uma baixa que por certo não é indicadora de uma prosperidade singular nas finanças dos que residem na capital.
Eu passo por isto rapidamente porque não vale muito a pena cansar-me em aridas e inuteis dissertações que poucos ouvem, nem desejo desviar a attenção da camara de outras mais agradaveis occupações, e demais a sessão está prorogada e tambem não quero demorar aos meus illustres collegas a hora do seu jantar.
Em relação á receita geral de contribuições liquidada em differentes annos, nós vemos que n´um periodo de nove annos, desde 1885-1886 a 1893-1884 se liquidou em Lisboa receita no valor de 35:164 contos de réis.
N´esse mesmo periodo as annullações subiram á importancia de 4:926 contos de réis, o que equivale a dizer que foi annullada a setima parte da receita, ao passo que se examinarmos o que se dá em relação aos outros concelhos do paiz, nós vemos que a importancia das annullações é da trigesima parte da receita liquidada. Prova isto que em Lisboa, onde ha um exercito de empregados de fazenda, onde a fiscalisação deve ser exercida com mais rigor, é precisamente onde o pagamento das contribuições se faz mais difficilmente, com menos exactidão e com mais prejuizo publico!
É necessario que o governo considere este assumpto, porque não deve pedir ao paiz um aggravamento de taxas sem que primeiro demonstre que arrecada bem as contribuições já lançadas.
Na importancia das contribuições em divida tambem acontece que só a capital á sua parte representa mais de metade da importancia total devida em todo o paiz!
E deve notar-se que isto acontece não obstante ter ha vido em um anno um verdadeiro jubileu de annullações perfeitamente extraordinario, com o fim de liquidar grande numero de conhecimentos inteiramente incobraveis.
Como é então que o nobre ministro da fazenda declara no seu relatorio:
(Leu.)
Pois o sr. ministro da fazenda tem a certeza, a segurança, de que por uma remodelação tributaria póde conseguir, sem gravame para o contribuinte e antes com allivio, d´elle o equilibrio orçamental o substitue esta parte essencialissima do seu programam financeiro por tudo o que ha de mais injusto e vexatorio, por tudo o que ha de mais indefensavel?
Eu não sei, sr. presidente, para que servem este apregoado conhecimento dos negocios e os explendores brilhantes da intelligencia quando não se traduzem em factos e em resultados. Podem dizer-me que a remodelação tributaria exige demasiado estudo, largo periodo de tempo e aturadas locubrações, mas então nunca se poderá fazer, sendo sempre incerta a duração de um ministerio, e cada vez tendendo para mais facilmente se desgastarem.
Eu não quero negar a realidade do talento do illustre ministro da fazenda, simplesmente lamento que a sua intelligencia lhe não suggerisse melhor lembrança e mais rasoavel recurso que este do addicional e do aggravamento da lei do sêllo. Não sei de que arte se ha de conseguir tirar ainda mais d´este imposto, que todos achavam já pesadissimo e que tem experimentado successivas remodelações em pouquíssimo espaço de tempo.
Dizia-se em tempos que só havia duas fórmas de equilibrar o orçamento e de crear receita; os addicionaes e a reforma das pautas; afóra ha tambem o sêllo. As pautas têem descansado, mas ficou o addicional e o sêllo. D´aqui para fóra não ha mais nada a fazer.
(Interrupção.)
É possivel, mas então para que é que nós mudámos de governo por que titulo é que se substituem os homens que se sentam n´aquellas cadeiras, se todos hão de sempre commetter os erros e os vicios que stigmatisaram nos seus antecessores? Com que direito se exigem sacrificios ao paiz e que confiança póde elle ter em um governo que não sabe defender-se senão com os maus exemplos dos que o precederam?
Esse é que é o grande erro; isso é que determina esta indifferença constante do paiz pelos governos e até pelo proprio parlamento, porque em vez de haver homens de rijo espírito, de boas intenções, de forte energia, que sacrifiquem ao seu paiz o seu socego, a sua tranquillidade, para fazerem governo, que se afastasse quando e onde fosse preciso de tudo o que estava no passado e reconhecessem que era mau preferem as facilidades de nada fazer. Homens taes, se para ahi fossem, haviam de encontrar o apoio de toda a gente sensata e honesta, apoio que só podem merecer aquelles que conseguirem uma completa revolução nos nossos constantes desacertos.
Mas dizia eu, quando o sr. presidente do conselho me interrompeu, que havia uma censura, um reparo, que eu tinha todo o direito a fazer em meu nome e em nome do paiz ao procedimento do governo e do sr. ministro da fazenda; pois s. exa. n´estas circumstancias calamitosas e tristes tem a certeza, a segurança do augmentar as receitas do thesouro publico sem encargos para os contribuintes; e renega esse programma que era bom e abandona essa obra que era a unica que devia tentar e fazer por sua honra e por bem do paiz? Não póde esta camara votar o aggravamento de contribuições que s. exa. propõe pelo addicional, sem que s. exa. declare que não era verdade o que dizia n´esse relatorio. O que esta camara deve impor ao sr. ministro da fazenda é que cumpra antes de mais nada essa promessa, que continue esse trabalho de remodelação tributaria e procure augmentar as receitas publicas sem novos sacrificios e encargos para os contribuintes. (Apoiados.)
Eu que sou ainda novo n´esta casa, e pouco habituado ao bulicio da capital, entrego-me ás vezes ao estudo das cousas que parecerão insignificantes e pequenas sem outra pretensão que não seja entreter o meu espirito e passar os ocios que aqui me deixam as minhas poucas occupações, e assim estranho que o sr. ministro da fazenda, em vez do recorrer a este expediente já usado e gasto dos addicionaes, e que por isso mesmo já devia ter sido posto de lado, não fizesse qualquer reforma na contribuição predial e não prosseguisse em trabalhos que tanto deviam augmentar as receitas.
Devo fazer justiça ao caracter político do illustre ministro da fazenda! Se s. exa. visse embargado o seu programma por entraves de quem quer que fosse, não devia estar ali, só assim é que poderia ter a consideração, o respeito e a estima do paiz, e nunca sacrificar a sua obra pela vai-
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dado, que póde dizer-se pouco invejavel, de se sentar n´aquellas cadeiras!
Acredito bem que se s. exa. não fez melhor foi por não saber; porque entre pôr em duvida as qualidades da sua intelligencia ou as do seu caracter, opto pela primeira. V. exa. sabe que pela lei de 24 de agosto de 1869 eram collectados especialmente os predios que fossem edificados, reconstruidos ou de novo arroteados desde que fundasse o praso das isenções que por leis especiaes lhe eram concedidas. Isto foi revogado pela disposição da lei de 1880. Porque não resuscitou s. exa. esta fórma de tributação?
Acontece pelo systema agora vigente que, comquanto o rendimento collectavel tenha augmentado nas matrizes desde 1880 até hoje n´uma importancia relativamente grande, por isso que, sendo em 1880 de 28:213 contos de réis, se encontra hoje em 32:132 contos de réis, o que representa um augmento de 3:919 contos de réis, o estado não tem tirado proveito algum d´este augmento de riqueza publica, porque é sempre a mesma a taxa de contribuição repartida, não tendo sido alterada desde a publicação da lei de 1880.
Comprehende v. exa. que este beneficio distribuido por cada contribuinte é insignificante, ao passo que seria apreciavel a vantagem que para o thesouro resultava da adopção da medida que vou propor.
Suppondo que aqui, na capital, se construiam em um anno predios que podessem ter nas matrizes um rendimento collectavel de 50 contos de réis, a contribuição que recáe sobre estes 50 contos de réis seria já importante, ao passo que o beneficio na diminuição da percentagem de cada contribuinte é infimo e assim perde o estado uma receita importante que o dispensaria talvez de onerar o contribuinte com mais um imposto vexatorio.
Porque é que o illustre ministro da fazenda, de accordo com uma commissão a quem incumbisse o estudo d´este assumpto, não fez ao menos isto que eu proponho? Todos os elementos que conheço demonstram que tiraria d´aqui optimos resultados.
Como v. exa. sabe, a camara municipal de Lisboa lançou uma contribuição especial sobre estes predios, por decreto de 13 de setembro de 1885; pois em 1891-1892 essa contribuição rendeu:
(Leu.)
O estado que ficou depois recebendo essa contribuição, pagando á camara uma quantia fixo, inscrevia no orçamento como quantia arrecadada nos annos em que a cobrou:
(Leu.)
Quer dizer, era uma contribuição importante, um augmento de receita importantissimo que sem aggravamento, sem injustiças, sem violencias, sem vexames para o contribuinte que paga honradamente, as suas contribuições, podia dar magnificos resultados para o thesouro, porque, se é necessario aproveitar todos os augmentos de receita, é tambem necessario não esquecer que o paiz tem direito a que esse augmento seja distribuido por fórma justa e equitativa e não por uma maneira violenta e vexatoria.
Eu sou sempre fiel ao que prometto e por isso, para que a prorogoção da sessão não vá muito alem da hora ordinaria, vou mandar para a mesa uma proposta, que ligeiramente justificarei.
Como v. exa. sabe, pelo artigo 7.° da carta de lei de 26 de fevereiro de 1892 foi concedida aos estabelecimentos e corporações de beneficencia, ás associações em determinadas condições e aos parochos que tivessem de congrua e outras proveniencias um rendimento inferior a réis 400$000, uma isenção do imposto de 30 por cento creado sobre os juros da divida, restituindo-se a esses parochos e a essas associações o imposto de rendimento que tivesse sido descontado no pagamento.
Devo dizer a v. exa. que a fórma por que se faz esta restituição representa um motivo constante de queixas, irregularidades e demoras, não só para aquelles estabelecimentos como tambem para os parochos, que sendo muitos de freguesias distantes, se vêem em grandes difficuldades, tendo de vir de muito longe aos centros de população e por causo de uma quantia insignificante fazer requerimentos ou commetter a terceira pessoa o recebimento d´essa quantia e o cuidado de insistir nos repartições competentes pelo recebimento, que só chega tarde e mal.
Isto constitue uma grave injustiça, quer para os institutos, quer paro os parochos que têem direito á isenção. ( Apoiados.)
Na receita do imposto de rendimento calculo-se a quantia total e no despeza inscreve-se uma verba para a indemnisação a que dá direito esta disposição da lei. Junto ao orçamento tambem vem uma lista em que se apontam e relacionam todos os institutos de beneficencia, que têem direito a este beneficio, como todos os parochos que pelo reduzido das suas congruas devem receber o indemnisação.
Eu propunha que se modificasse completamente este processo no que ha tambem uma vantagem para o estado, (Apoiados) porque v. exa. sabe que com este fundamento se estão abrindo creditos especiaes o extraordinarios e alem d´isto é um serviço complicado nas repartições competentes, que, segundo a minha proposta, se tornaria da maxima simplicidade e rapidez.
A minha proposta é para que os titulos da divida publica, que estão averbados a favor das corporações que actualmente gosam do beneficio da lei de 26 de fevereiro de 1892 sejam marcados com um carimbo especial, para lhes ser paga por inteiro a importancia do respectivo juro. De igual modo e para o mesmo fim serão carimbados os titulos da divida publica averbados a favor dos passaes dos parochos a quem tenha sido até ao presente reconhecido ou de futuro se reconheça o direito áquelle beneficio.
Acrescento que os titulos novamente adquiridos por aquellas classes de juristas não poderão ser averbados sem que previamente se verifique se continuam ou não ao abrigo aquella isenção, devendo, segundo os casos, appor-se o carimbo especial n´esses títulos ou trancal-o nos anteriormente possuidos.
A isenção, como v. exa. sabe, só aproveito aos estabelecimentos de beneficencia, quando dos seus orçamentos resulte que têem deficit, e aos parochos só aproveita, quando a importancia das congruas oddicionada á dos outros rendimentos do parochia não for superior a 400$000 réis, mas junto ao orçamento se encontra uma lista ou relação, que não se modifica de anno para anno, como é facil verificar pela analyse d´aquelles documentos, e por isso facil é apurar quaes os títulos a que deve applicar-se o processo que aconselho.
D´esta maneira, junta-se á justiça do beneficio devido áquelles modestos funccionarios, por quem tenho toda a estima e admiração, pois que alem do cumprimento dos seus deveres religiosos, exercem deveres de uma grande importancia social e administrativa, (Apoiados.} o poupal-os a demoras e vexames para receberem pequenas quantias, que são o complemento indispensavel das magras congruas com que provêem á sua sustentação. (Apoiados.)
Parece-me, por isso, melhor que eliminando-se do calculo do imposto do rendimento 307 contos de réis, que creio ser a importancia da indemnisação, se elimine consequentemente na despeza o mesma verbo. Este systema de corimbagem, que eu me lembro de propor, póde ser substituido por qualquer outro que mais ajustado pareça ás conveniencias do estado, e á fórma de evitar fraudes que não me parece se possam dar, porque estes títulos não andam no mercado, estão immobilisados e averbados o favor d´esses estabelecimentos e corporações e dos passaes dos parochos, e creio bem que assim se attendo a uma reclamação justíssima d´essa classe de juristas.
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Mando tambem para a mesa uma proposta no sentido das ponderares que ha pouco fiz.
(Leu).
Se esta percentagem for elevada, póde ser menor. Onde os predios estão avaliados com exactidão e rigor, 10 por cento talvez suja de mais. A lei de 1869 propunha, creio eu, uma taxa igual á que fosse distribuida nos respectivos concelhos ou freguezias; mas creio bem que isto seria injusto em muitissimos casos, porque esses predios de novo inscriptos na matriz têem o seu rendimento calculado mais exactamente e assim iriam supportar uma percentagem elevadissima em relação a outros sobre os quaes recairia uma porcentagem insignificante.
Se a sessão não estivesse prorogada e eu podesse seguir na ordem de considerações que tinha meditado, quando me referi á contribuição de renda de casas, teria chamado a attenção do Sr. ministro da fazenda para a necessidade de estabelecer uma providencia tendente a obrigar os empregados publicos da capital a pagar a contribuição de ronda da casas por descontos mensaes nos seus vencimentos, sendo obrigado cada um d´elles a apresentar até ao 1.° de janeiro de cada anno, ao chefe da repartição por onde seja processado o seu vencimento, uma declaração passada pelo escrivão de fazenda, indicando a casa que habitava ou da pessoa em nome da qual estivesse inscripta na matriz a casa por elle occupada, pois que essa quebra extraordinaria que se encontra na contribuição de renda de casas no districto do Lisboa é principal, senão exclusivamente devida, como póde verificar-se no mappa junto ao orçamento, á maneira como alguns funccionarios da capital evitam o pagamento d´essa contribuição. Não é justo que quem está recebendo do thesouro os seus vencimentos, deixe de satisfazer integralmente as suas contribuições. Não é justo que quem está recebendo de thesouro os seus vencimentos, deixe de satisfazer integralmente as suas contribuições.
Cerro por aqui as minhas considerações, mas não quero rematal-as sem fazer novamente um appello ao sr. ministro da fazenda. S. exa. ha de trazer á apreciação do parlamento e do paiz, com toda a urgencia, o contrato das 72:718 obrigações da companhia dos caminhos de ferro do norte e leste.
Peço-lh´o não só em meu proprio nome, mas no interesso do paiz, que está impaciente por saber o que é feito dos seus haveres, e a publicidade será proveitosa não só para o governo, mas para nós, que queremos saber como são administrados os nossos dinheiros.
Vozes: — Muito bem.
( o orador foi muito cumprimentado.)
O sr. José de Alpoim: — Mando para a mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro a v. exa. que se digne consultar a camara se julga a materia sufficientemente discutida. = José M. de Alpoim.
Foi approvado.
Lêem-se as propostas apresentadas pelo sr. Reymão.
O sr. Villaça (relator): — Peço que as propostas sejam enviadas á commissão sem prejuízo da votação do projecto.
O sr. Presidente: — Vae proceder-se á votação do projecto, sem prejuízo das emendas.
Leu-se na mesa e foi approvado o artigo 1.°
O sr. Presidente: — Conforme a resolução da camara o artigo 2.° fica reservado para discussão especial.
Seguidamente foram lidos e approvados os restantes artigos.
O sr. Presidente: — Ámanhã haverá sessão de dia, sendo a ordem dos trabalhos a continuação dos que estavam dados para hoje.
Está levantada a sessão.
Eram seis horas e um quarto.
Documentos enviados para a mesa n´esta sessão
Representações
De muitos cidadãos reunidos em comicio publico n´esta capital, por iniciativa do gremio do professorado livre portuguez, contra a lei de instrucção secundaria de 24 do dezembro de 1894 e regulamento geral de 14 de agosto de 1895.
Apresentada pelo sr. deputado Ribeiro Coelho, enviada a commissão de instrucção primaria e secundaria e mandada publicar no Diario do governo.
Da junta de parochia da freguezia de Villa Mou, do concelho e districto de Vianna do Castello, pedindo para ser auctorisada a lançar uma percentagem addicional ás contribuições do estado até 50 por cento, sendo o producto destinado especialmente ao pagamento da quantia de 897$860 réis, que é devida ao empreiteiro que tomou a seu cargo a reconstrucção da igreja parochial.
Apresentada pelo sr. deputado Luiz José Dias, e devendo ter destino igual ao projecto de lei sobre o mesmo assumpto, que ficou para segunda leitura.
Declaração do voto
Declaro que, se estivesse presente na sessão de 2 do maio, teria approvado a moção do sr. deputado José Maria do Alpoim. — O deputado pelo circulou n.º 56, João Abel da Silva Fonseca.
Para a acto.
Justificação do faltas
Declaro a v. exa. e á camara que, por motivos justificados, deixei de comparecer a algumas sessões. = o deputado, Oliveira Pacheco.
Declaro que, por motivo justificado, faltei a algumas das sessões anteriores. = O deputado pelo circulo n.°56, João Abel da Silva Fonseca
Para a secretaria.
O redactor = Sergio de Castro.