O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 243

—243—

Discurso que devia ler-se a pag. 233, col. 1.ª, lin. 68, da sessão n.° 19 d'este vol.

O sr. Pequito: — Sr. presidente, depois de terem usado da palavra tantos e tão distinctos oradores, fallando uns a favor, outros contra o projecto da commissão, conheço que é da minha parte uma grande temeridade pedir a palavra, e usar d'«11 a no estado em que se acha a discussão. Para, em taes circumstancias, podér conciliar a attenção da camara, fóra absolutamente indispensavel possuir uma voz já auctorisada e ennobrecida pelos triumphos parlamentares, um engenho capaz de descobrir argumentos novos, e a eloquencia necessaria para os fazer valer.

Na profunda, e, infelizmente, bem fundada opinião, de que todos estes dotes me fallecem: convencido de mais a mais, como estou, e como devo estar, de que vou fallar perante a assembléa mais illustre e mais illustrada do paiz, estou sentindo, nem me pejo de o confessar, correr-me um tremor frio por todos os membros do corpo; e eu teria desistido da palavra se me não animasse a esperança de que a camara escutará com benevolencia e julgará sem severidade, o que eu lhe peço encarecidamente, as humildes ponderações que me abalanço a offerecer á sua illustrada consideraçao.

Sr. presidente, o subsidio litterario já ha muito que esta julgado e reprovado pelos homens da sciencia, que têem por ella conhecido a natureza defeituosa d'este imposto; e esta, tambem ha muito tempo, julgado e reprovado por lodo o paiz, que tem sentido pela experiencia os seus funestos inconvenientes. Esta opinião, tomando corpo e tornando-se geral, subiu até ás regiões do poder, e desceu de lá felizmente, como acontece nos governos livres, formulada n'uma proposta de lei, em que aquelle imposto é abolido, e em que se estabelece o modo de o substituir. Sr. presidente, a discussão tem mostrado com a maior evidencia, que a primeira parte da proposta do governo, convertida em projecto de lei pela commissão respectiva, merece a approvação de todos os lados da camara. Todos querem, todos abraçam, todos desejam, todos folgam de poder votar a extincção do subsidio litterario: não ha a este respeito duas opiniões diversa; na camara.

Toda ella concorda igualmente na necessidade da substituição, porque todos, com a mão na consciencia, conhecemos que no estado actual das nossas finanças, nas circumstancias em que esta o thesouro, não é possivel dispensar o rendimento, que n'elle entrava, proveniente daquelle tributo. Mas ainda mais, sr. presidente: todos nós estamos de accordo ácerca de qual ha de ser o tribulo que havemos de pôr no logar daquelle que entendemos dever extinguir, porque todos querem que o rendimento provavel do tributo extincto seja addicionado á contribuição de repartição predial. O unico ponto questionável, a unica difficuldade que lemos a resolver, e que tem dado materia para uma tão energica e acalorada discussão, consiste na escolha da base em que deve assentar a distribuição. O projecto estabelece que o rendimento do subsidio litterario, calculado em réis 115:904780 pelo termo medio dos ultimos dez annos, seja repartido pelos districtos do reino, pagando cada um mais de contribuição predial a parte que d'antes pagava de subsidio litterario. O illustre deputado o sr. Maximiano Osorio propoz que a repartição fosse feita na proporção do contingente da contribuição predial, que toca a cada districto; e o sr. conde de Samodães, applicando esse principio, offereceu uma tabella para substituir a da commissão, na qual se encontra calculado o quanto cada districto deve pagar, addicionada á quota de repartição, e em proporção com ella a parte respectiva da importancia do rendimento, que o thesouro auferia do subsidio litterario. É pois entre estes dois modos de fazer a distribuição que a camara tem a optar.

Sr. presidente, quanto mais reflicto, quanto mais procuro esclarecer-me pela experiencia, tanto mais profundamente me convenço, de que as difficuldades, que se encontram na resolução da maior parte das questões, procedem mais do modo de as pôr, e de as collocar, do que da sua propria natureza.

Quando bem se medita sobre as consequencias de ambos estes systemas, conhece-se, que toda a questão se reduz a examinar, qual é mais justo, qual é mais util nas circumstancias, actuaes do paiz, acabar com o subsidio litterario, e haver O rendimento, que d'elle provinha, por um modo em geral vantajoso para o paiz, ou por um modo, que, prejudicando gravemente uma parte dos districtos do reino, á qual se lançam tributos completamente novos, vae altamente beneficiar a outra? O systema da commissão dá em resultado o primeiro, o das propostas o segundo, e por isso decido-me terminantemente a favor da doutrina do projecto. Com a extincção de um tribulo tão defeituoso lucram todos, porque pagam só para o thesouro o termo medio do seu rendimento, quando existindo elle, e andando, como sempre andava, arrematado, pagam de mais todos os ganhos dos arrematantes, e soffrem os vexames do arrolamento, e arrecadação. Quem gosa as maiores vantagens da extincção são os districtos vinhateiros, o que torna tambem preferivel, por mais equitativo, o systema da commissão*

É verdade, que por parte dos illustres deputados, que impugnam este systema, se pretende que o termo medio do supposto rendimento do subsidio litterario não significa cousa alguma, porque não ha vinho; e então o que se faz verdadeiramente é crear-se um tribulo novo para preencher o desfalque, que devia causar ao thesouro o desapparecimento de outro por falta de materia collectavel. Mas se assim é, não sei a rasão, por que o meu illustre amigo o sr. Paulo Romeiro se cansou tanto em mostrar as vantagens da extincção do subsidio litterario, que estava morto por sua natureza. O que é certo, é, que a colheita do vinho tem diminuido consideràvelmente, mas não acabou, e que ha bem fundadas esperanças de que torne ao seu antigo estado, sendo não menos certo, que a grande elevação do preço tem supprido em boa parte essa escassez; e finalmente, que o têrmo medio, adoptado pela commissão, não é tão defeituoso, como parece, porque é contemplada para o formar a producção dos annos de menor colheita, e porque no paiz sempre se recolhe muito mais vinho do que consta dos respectivos arrolamentos. Sendo assim, como é, todos ganham com o projecto, que nos lermos, em que está concebido, tem o verdadeiro caracter de uma medida de utilidade publica. Mas supponhamos mesmo, sr. presidente, que a base, que adoptou a commissão, não é inteiramente exacta: mesmo n'essas circumstancias os que não tiverem vinho lá têem na lei garantido o recurso para reclamar, se os collectarem n'um rendimento, que não tiveram. Mas as delongas, os incommodos, e as despezas d'esse recurso? diz o meu illustre amigo, o sr. Paulo Romeiro. Em primeiro logar direi, que essas reclamações não são custosas, e em segundo logar que não sendo possivel, como não é, prevenir todas as injustiças, é sempre uma grande vantagem deixar uma porta aberta para as poder-reparar a troco de um pequeno sacrificio, sem o qual seriam impossiveis os recursos.

Mas será o contingente da contribuição predial, base adoptada nas propostas, menos defeituoso ou mais exacto?

Oh, sr. presidente! quem é que não sahe, que n'esle paiz esses contingentes exprimem com relação a uma grande parte dos districtos, e especialmente dos districtos vinhateiros, aquillo que cada um paga, mas não o que deve pagar? N'estes e em geral em todos os do norte, o modo deserda sua propriedade miudamente fraccionada escapa fàcilmente ao alcance da collecta, sempre favoravelmente diminuida quando recáe sobre as vinhas, no intuito de tornar mais suaves as injustiças do subsidio; nos do sui, e especialmente nos do

Página 244

-244-

Alemtejo, em que a terra está apenas dividida em poucas mas vastas herdades, quasi todas arredadas, a collecta cáe sobre ella quasi com o mesmo rigor legal, com que cáe nos ordenados dos empregados publicos. É pois inquestionavel, que a base adoptada pelos illustres deputados os srs. conde de Samodães e Maximiano Osorio é consideràvelmente defeituosa e inexacta. Ora sendo assim, não é menos indubitavel, que as desigualdades e injustiças que ella iria causar seriam muitas mais, e muito mais importantes nas proporções que fundamentasse, do que as causadas pela outra base adoptada pela commissão, ainda que tambem exacta não fôsse.

Assim, approvadas as propostas, o districto de Béja teria um tributo novo de 3:488110 réis, o de Evora um de 4:566$407 réis, o de Portalegre um de 4:409$281 réis, e o de Faro finalmente um de 2:634$741 réis. E em que circumstancias iamos nós, sr. presidente, sobrecarregar de novo, e tão pesadamente estes districtos, e os de Lisboa e Porto para aliviar os outros na mesma proporção! V. ex.ª sahe perfeitamente porque a provincia do Alemtejo se compraz de o contar no numero dos seus mais benemeritos filhos; sabe-o esta camara, sabe-o lodo o paiz, que aquella nossa infeliz provincia esta atravessando uma crise verdadeiramente assustadora e terrivel. A escassez de todos os generos da sua producção foi tal, que não ha noticia, que eu saiba de outra similhante nos annaes da sua historia. A terra ingrata nem sequer se dignou no anno findo restituir ao lavrador, que a ensopara de seus suores, a semente que lhe havia confiado. A não ser o elevado preço de seus gados, unico recurso que lhe tem valido em tão espantosa esterilidade, a população teria ali, a não ser extraordinariamente soccorrida, morrido de fome e de miseria.

E é, sr. presidente, sobre uma provincia que não póde, que não tem com que pagar os já para ella muito pesados tributos existentes, que se vão lançar 13:000$000 réis de tributos novos para aliviar outras provincias! E o Algarve, sr. presidente! O Algarve a quem Deus nos ultimos annos tem tão severamente visitado em sua colera! N'um victimas da peste em toda a força de sua voracidade, n'outro da peste e da fome reunidas!

Eu desejava terminar aqui as minhas considerações, porque não devo, porque não é minha intenção, abusar da paciencia da camara que se tem dignado ouvir-me com tanta benevolencia, o que eu lhe agradeço profundamente reconhecido; mas conceda-me a camara licença para fazer ainda umas ligeiras observações sobre a importancia e o alcance que se tem querido dar a esta questão. Tem-se dito que ella não e, não póde, não deve ser ministerial, e que seja qual

for o modo por que se decida, o ministerio fica igualmente habilitado a proseguir desassombrado no seu systema de governo. Eu, sr. presidente, sei pouco de questões ministeriaes, nem mesmo me quero dar a esse estudo, porque tenho para mim que nunca me verei por necessidade da minha posição obrigado eu mesmo a determinar a natureza d'essas questões. Comtudo entendo que os illustres deputados que julgam que o ministerio póde assistir á discussão d'este projecto sem apresentar sobre elle uma opinião franca e decisiva, lhe irrogam, de certo sem que o queiram, uma grave injuria. Pois que, sr. presidente? Ha de o governo comparar-se ao avarento, ao agiota, ao homem sem alma, nem coração, que o que quer é dinheiro, muito embora para o haver tenha de despir a camisa a algum pobre pae de familia? Alem de vir directamente do governo a proposta que aqui* se discute, não nos apresentou elle, como uma das regras do seu systema, a melhor, a mais facil arrecadação do imposto? E póde elle sem offensa do seu credito deixar de pronunciar-se categoricamente sôbre o melhor systema de o distribuir? Pela minha parte digo francamente que não.

Sr. presidente, vou concluir, e faço-o pedindo á camara em nome das provincias do sui, e escudado com o seu direito, que se está disposta a approvar as propostas dos illustres deputados os srs. Maximiano Osorio e conde de Samodães, deixe as cousas como estão, e não vote a extincção do subsidio litterario.

(O orador foi repetidas vezes apoiado durante o seu discurso, e no fim comprimentado por muitos dos seus collegas de todos os lados da camara.)

ERRATA.

Pag. Col. Liv. Erros Emendas

185 2.ª 43 Da camara municipal de Coimbra Da camara municipal de Amarante

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×