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SESSÃO DE 9 DE JULHO DE 1890

Presidencia do exmo. sr. Pedro Augusto de Carvalho

Secretarios - os exmos. srs.

José Joaquim de Sousa Cavalheiro
Antonio Teixeira de Sousa

SUMMARIO

Sobre a acta dão explicações os srs. Fernando Palha e Pedro Victor, sendo depois approvada. - Lê-se na mesa um officio do sr. barão de S. Clemente, offerecendo á camara o segundo volume do seu livro Estatisticas e biographias parlamentares portuguezes; e os srs. Dias Ferreira, ministro da fazenda, Carlos Lobo d'Avila e Alberto Pimentel. encarecendo os serviços do auctor daquelle livro, lembram, e é approvado, seja votada por acclamação a proposta do sr. Dias Ferreira, para se adquirirem 200 exemplares d'aquelle volume, a fim de se distribuirem aos srs. deputados. - Tem segunda leitura o projecto de lei relevando os vereadores da camara municipal do concelho de Ponte do Lima da responsabilidade em que incorreram no anno de 1889, por haverem gasto em despezas obrigatorias, superiormente approvadas, do exercicio d'esse anno, a quantia de 2:494$217 réis do cofre de viação municipal do mesmo concelho. - O sr. Baptista de Sousa propõe que as sessões nocturnas sejam annunciadas ao indicar-se a entrada na ordem do dia, e fica pira segunda leitura esta proposta. - Chama o sr. Christovão Ayres a attenção do governo para a necessidade de rever alguns pontos do tratado da índia, de 26 de dezembro de 1878, discursando sobre esse assumpto. - Apresenta o sr. Fuschini uma representação da classe dos chapelleiros, e troca explicações com o sr. ministro da fazenda sobre o cumprimento da lei preventiva sobre a importação dos tabacos e sobre o contrato com a companhia das aguas. - Manda o sr. Ferreira de Almeida para a mesa as emendas da commissão de marinha ao decreto de 31 de março do corrente anno. - Por parte da commissão de administração publica manda o sr. Pestana de Vasconcellos o parecer sobre o projecto de transferencia da assembléa eleitoral de Villa Chã para a freguezia de Carlão. - O sr. Adriano Monteiro aponta a necessidade de se completar o cordão sanitario desde Villa Real de Santo Antonio até Castello de Vide, e o sr. ministro da fazenda encarrega-se de transmittir as indicações ao seu collega do reino. - Manda o sr. Espregueira para a mesa uma representação da camara de Valença do Alinho contra o addicional de 6 por cento. - O sr. José de Castro apresenta uma representação da camara de Grandola, pedindo para desviar 3:400$000 réis do fundo de viação. - O sr. Eduardo Abreu manda para a mesa uma representação dos empregados do commercio, reunidos no atheneu commercial de Lisboa no dia 22 do mez passado, e requer documentos pelo ministerio da justiça relativos á collegiada de Guimarães. - O sr. Costa Pinto apresenta requerimentos de interesse particular. - Apresenta o sr. José Maria dos Santos uma representação da camara de Alcacer do Sal para desviar 6:000$000 réis do fundo de viação.

Na ordem do dia (primeira parte) entra em discussão o projecto n.º 141, auctorisando o governo a adjudicar em concurso publico o exclusivo da fabricação dos tabacos no continente do reino, actualmente na administração do estado.- Levanta uma questão previa, para que haja uma discussão na generalidade e outra na especialidade, por grupos de bases, o sr. José Maria de Alpoim, que apresenta uma proposta assignada tambem por mais cinco srs. deputados. - Entram no debate desta proposta os srs. ministro da fazenda, Dias Costa, Pedro Victor, Carlos Lobo d'Avila, Pinheiro Chagas e Fuschini. Submettida á votação, é a proposta rejeitada.

Na ordem do dia (segunda parte) continua a discussão do projecto de lei n.º 120, que lança um addicional de 6 por cento sobre as contribuições do estado.- Falia até ao encerramento da sessão contra o projecto o sr. Francisco José Machado, que fica ainda, a seu pedido, com a palavra reservada.

Abertura da sessão - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada 75 srs. deputados. São os seguintes: - Abilio Eduardo da Costa Lobo, Adriano Augusto da Silva Monteiro, Adriano Emilio de Sousa Cavalheiro, Alberto Augusto de Almeida Pimentel, Albino de Abranches Freire de Figueiredo, Alexandre Maria Ortigão de Carvalho, Alfredo Mendes da Silva, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio Augusto Correia da Silva Cardoso, Antonio de Azevedo Castello Branco, Antonio Baptista de Sousa, Antonio Eduardo Villaça, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Manuel da Costa Lereno, Antonio Maria Cardoso, Antonio Costa, Antonio Mendes Pedroso, Antonio Ribeiro dos Santos Viegas, Antonio Teixeira de Sousa, Arthur Alberto de Campos Henriques, Arthur Hintze Ribeiro, Arthur Urbano Monteiro de Castro, Augusto Maria Fuschini, Bernardino Pacheco Alves Passos, Carlos Lobo d'Avila, Christovão Ayres de Magalhães Sepulveda, Columbano Pinto Ribeiro de Castro, Custodio Joaquim da Cunha e Almeida, Eduardo Augusto da Costa Moraes, Eduardo de Jesus Teixeira, Eduardo José Coelho, Emygdio Julio Navarro, Eugênio Augusto Ribeiro de Castro, Feliciano Gabriel de Freitas, Fernando Pereira Palha Osorio Cabral, Fortunato Vieira das Neves, Francisco de Almeida e Brito, Francisco de Barros Coelho e Campos, Francisco de Castro Mattozo da Silva Corte Real, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco Joaquim Ferreira do Amaral, Francisco José Machado, Francisco Xavier de Castro Figueiredo de Faria, Jacinto Cândido da Silva, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Alves Bebiano, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Maria Gonçalves da Silveira Figueiredo, João de Paiva, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Rodrigues dos Santos, João de Sousa Machado, Joaquim Germano de Sequeira, Joaquim Ignacio Cardoso Pimentel, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José de Alpoim de Sousa Menezes, José Antonio de Almeida, José Augusto Soares Ribeiro de Castro, José Bento Ferreira de Almeida, José Christovão Patrocínio de S. Francisco Xavier Pinto, José Dias Ferreira, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Julio Rodrigues, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Charters Henriques de Azevedo, José Maria de Oliveira Peixoto, José Maria Pestana de Vasconcellos, José Maria de Sousa Horta e Costa, José Paulo Monteiro Cancella, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Júlio Antonio Luna de Moura, Luciano Cordeiro, Luiz de Mello Bandeira Coelho, Manuel de Oliveira Aralla e Costa, Marcellino Antonio da Silva Mesquita, Matheus Teixeira de Azevedo, Pedro Ignacio de Gouveia, Pedro Victor da Costa Sequeira, Thomás Victor da Costa Sequeira e Visconde de Tondella.

Entraram durante a sessão os srs.: - Agostinho Lúcio e Silva, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alfredo Cesar Brandão, Antonio Fialho Machado, Antonio Jardim de Oliveira, Antonio José Arrojão, Antonio Maria Jalles, Antonio Sérgio da Silva e Castro, Augusto Cesar Elmano da Cunha e Costa, Barão de Paço Vieira (Alfredo), Bernardino Pereira Pinheiro, Caetano Pereira Sanches de Castro, Carlos Roma du Bocage, Eduardo Abreu, Eduardo Augusto Xavier da Cunha, Fernando Mattozo Santos, Fidelio de Freitas Branco, Francisco Severino do Avellar, Frederico de Gusmão Corrêa Arouca, Frederico Ressano Garcia, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Ignacio Emauz do Casal Ribeiro, João do Barros Mimoso, Joaquim Alves Matheus, Joaquim Pedro de Oliveira Martins, Joaquim Simões Ferreira, José Elias Garcia, José Estevão do Moraes Sarmento, José Frederico Laranjo, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Maria Greenfield de Mello, José Maria Latino Coelho, José Maria dos Santos, José Monteiro Soares de Albergaria, Julio Cesar Cau da Costa, Lourenço Augusto Pereira Malheiro, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Augusto Pimentel Pinto, Luiz Virgílio Teixeira, Manuel Affonso Espregueira, Manuel de Arriaga, Manuel d'Assumpção, Manuel Constantino Theophilo Augusto

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1112 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Ferreira, Manuel Francisco Vargas, Manuel Pinheiro Chagas, Miguel Dantas Gonçalves Pereira, Pedro de Lencastre (D.) e Roberto Alves de Sousa Ferreira,

Não compareceram á sessão os srs.: - Abilio Guerra Junqueiro, Adolpho da Cunha Pimentel, Alexandre Alberto da Rocha Serpa Pinto, Álvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Antonio José Ennes, Antonio Maria Pereira Carrilho, Antonio Pessoa do Barros e Sá, Aristides Ivloreira da Motta, Augusto Carlos de Sousa Lobo Poppe, Augusto da Cunha Pimentel, Augusto José Pereira Leite, Condo do Côvo, Conde de Villa Real, Elvino José de Sousa o Brito, Estevão Antonio de Oliveira Júnior, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco José de Medeiros, Ignacio José Franco, João José d Antas Souto Rodrigues, João Marcelino Arroyo, João Pinto Moreira, João Simões Pedroso do Lima, Joaquim Teixeira Sampaio, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José de Azevedo Castello Branco, José Domingos Ruivo Godinho, José Freire Lobo do Amaral, José Luiz Ferreira Freire, José de Vasconcellos Mascarenhas Pedroso, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Manuel Thomás Pereira Pimenta de Castro, Manuel Vieira de Andrade, Marianno Cyrillo de Carvalho, Marquez de Fontes Pereira de Mello, Pedro Augusto de Carvalho, Sebastião do Sousa Dantas Baracho e Wenceslau de Sousa Pereira Lima.

Lê-se a acta.

O sr. Fernando Palha: - Sr. presidente, acabo de ouvir ler attentamente a acta, e não posso deixar de dizer a v. exa. que nem tudo o que se passou hontem á noite n'esta casa está inserido n'esse documento.

Não se diz, por exemplo, que, quando se procedeu á votação, ainda estava fallando um dos oradores deste lado da camara, que ainda outro estava inscripto sobre o modo do propor, e que ou linha pedido a palavra sobro o modo de votar.

V. exa. comprehende perfeitamente que, se motivos especiaes não nos obrigassem a passar uma esponja sobro esto incidente, nós não deixariamos passar similhante procedente som protestarmos o mais energicamente que nos fosse possivel, (Apoiados.) como dispostos estamos a protestar todas as vexes que da parte da maioria se nos queiram fazer imposições e violencias. (Apoiados.)

V. exa. teve hontem um exemplo de que, só nós quizessemos fazer obstruccionismo á moda do que se fez aqui nos ultimos annos, tambem o sabiamos fazer. (Apoiados.) Creia v. exa. que nós tambem o saberemos fazer todas as vezes que, em logar de usarem para comnosco da mesma benevolencia que nós usámos para com a maioria, esta nos quizer impor as suas vontades. (Apoiados.)

Porém, sr. presidente, quem presidia á sessão nocturna de hontem não era v. exa. e se nós hoje exigissemos um desaggravo da violencia de que hontem fomos victimas, e o obtivessemos, ora mais do que um desaggravo para nós era tambem uma desauctorisação de quem ordinariamente se senta n'essa cadeira e por que todos nós, d'este lado da camara, temos o maior respeito e consideração. (Apoiados.) Longe do nós similhante pensamento. (Apoiados.)

Nenhum dos oradores que tem fallado d'este lado da camara deixou ainda de tecer elogios a s. exa.

Parece, porém, que d'aquelle lado da camara se tem interpretado estes elogios, como meio de protrahir as discussões, ou como uma demonstração de menos respeito.

Isto não é exacto. Todas as palavras que d'aqui têem sido pronunciadas têem sido sentidas. (Apoiados.)

Pela minha parte estou maguado, porque, não alheio em geral á violencia, e usando d'ella unicamente quando me sinto aggravado, eu tinha pedido a palavra sobre o modo do votar, com a intenção firme de quando me fosse concedida, pedir tardiamente que a Anotação fosse nominal; estou maguado porque, sabendo o sr. presidente que eu me tinha inscripto, não houvesse conservado a serenidade de espirito até ao fim e não me houvesse concebido a palavra.

Apesar d'isso, nem em meu nome nem em nome de ninguem d'este lado da camara, peço, na ausencia do sr. presidente, cousa alguma, (Apoiados.) porque estamos convencidos de que houve apenas um equivoco, e que, se s. exa. estivesse presente e appellassemos hoje para a sua nunca desmentida lealdade, elle seria o primeiro a desfazel-o.

Sem deixar de lavrar um protesto, mas attribuindo, repito, o que se passou a um equivoco, porque não desejamos que a qualquer pretensão nossa possa ser ligada a idéa de desauctorisação para com o sr. presidente, (Apoiados.) nós desistimos de continuar n'este incidente, e damos a nossa approvação á acta, embora a julguemos irregularmente redigida. (Apoiados.)

O sr. Pedro Victor: - Pedi a palavra, porque ouvi o sr. Fernando Palha proferir umas phrases, ás quaes desejo dar uma ligeira e leve resposta, embora não tenha procuração da maioria para o fazer.

Eu desejo dizer a s. exa., e a todos os membros da opposição, que por parto da maioria nunca houve, não ha, nem ha de haver, nenhum proposito de ser desagradavel, ou do ser oppressor para com a minoria.

É este, singela e simplesmente o digo, o nosso sentir e o nosso modo de pensar.

O sr. Fernando Palha dirigiu-se ao sr. presidente, Pedro de Carvalho com phrases lisonjeiras e sobremodo agradáveis; v. exa. comprehende que toda a camara não póde deixar de applaudir as palavras de s. exa., dirigidas ao nosso presidente, a quem tanto respeitâmos. (Apoiados.)

Tenho dito.

O sr. Presidente: - Não pedindo ninguem mais a palavra considera-se a acta approvada.

Vae ler-se o expediente.

EXPEDIENTE

Officios

Do ministerio das obras publicas, participando, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Adriano Monteiro, que nehuma despeza só fez, pela direcção geral de agricultura, com a secção agricola da exposição industrial da avenida da Liberdade. Apenas foi auctorisado por aquella direcção o emprego da madeira das matas do estado na construcção do pavilhão destinado á exposição de productos florestaes.

Para a secretaria.

Illmo. e exmo. sr. - Em sessão do 18 de maio de 1887 tive a honra de offerecer á camara dos senhores deputados da nação portugueza um exemplar do primeiro livro intitulado Estatisticas e biographicas parlamentares portuguesas comprehendendo os factos occorridos até 1886.

Agora offereço á mesma camara um exemplar do segundo livro, que está dividido em duas partes, vindo já a primeira, e a segunda espero não se demorará muito a sua apresentação.

O segundo livro contém em si, não só os factos mais notáveis que tiveram logar no parlamento portuguez nas sessões legislativas de 1887, 1888 e 1889, e algumas referencias aos de 1890, e bem assim varias biographias de cidadãos portuguezes que occuparam os elevados cargos de ministros, conselheiros d'estado, pares do reino, deputados da nação, e, alem disto, muitos factos politicos que muito importa aos homens publicos ter d'elles conhecimento.

Contém igualmente a relação nominal dos ministros distado no tempo das regencias do D. Izabel Maria, D. Miguel de Bragança e D. Pedro IV e os de 1830 a 1890, as-

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sim como os nomes dos ministros honorarios actualmente existentes e os dos deputados que estuo habilitados para puderem ser nomeados ou eleitos pares do reino, segundo as disposições da lei de 3 de maio de 1878 e o decreto dictatorial de 20 de fevereiro do 1890.

Os respectivos indices indicam bem claramente a variedade, importancia e alcance dos assumptos tratados no dito segundo livro e agora na primeira parte d'este.

Se ao principio do segundo livro vem transcriptas algumas apreciações respeitantes ao primeiro feitas no parlamento e na imprensa, foram ellas ali transcriptas só e unicamente para mostrar o modo lisonjeiro por que esse livro foi tido e considerado, e para se conhecer tambem que elle deu logar aos interessantes artigos publicados na Illustração portugueza, pelo distincto escriptor publico Manuel Pinheiro Chagas.

A obra não é completa nem é perfeita, não prima pela arte, nem pelo modo como está organisada, roas afigura-se-me que ella é mais uma prova de que trabalho, e trabalho com respeito a assumptos que reputo, não só de utilidade publica e interesse parlamentar, mas que ao mesmo tempo se encaminham a tornar conhecido o que tem havido na vida constitucional, parlamentar e politica em Portugal.

Se tenho conseguido este fim ignoro-o.

A outros, que não a mim pertence dizel-o.

Trabalhos do genero d'aquelles que vem tratados no primeiro e segundo livros, livros para os quaes tenho ministrado gratuitamente os competentes originaes, não têem sido tentados nem effectuados por outrem desde que no nosso paiz ha systema representativo.

Creio ter feito com elles um bom serviço; esta crença é quanto me basta.

Do segundo livro, que offereço agora á camara dos senhores deputados, nenhum outro premio desejo senão o de que esta offerta seja recebida com maxima benevolencia da parte de v. exa. e da camara a que v. exa. tão digna como acertada e escrupulosamente preside.

Deus guardo a v. exa. Lisboa, 8 de junho de 1890. - Illmo. e exmo. sr. conselheiro Pedro Augusto de Carvalho, dignissimo presidente da camara dos senhores deputados da nação portugueza. = Barão de S. Clemente, director geral da repartição de redacção e tachygraphia junto às cortes geraes da nação portugueza.

Para a secretaria.

Segundas leituras

Projecto de lei

Artigo 1.° São relevados da responsabilidade em que incorreram os vereadores da camara municipal do concelho de Ponte do Lima, no anno de 1889, por haverem gasto em despezas obrigatórias, superiormente approvadas no exercicio d'esse anno, a quantia do 2:434$217 réis, do cofre de viação municipal do mesmo concelho.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

O deputado pelo circulo n.° 1, João de Barros Mimoso.

Lido na mesa, foi admittido e enviado á commissão de administração publica.

REPRESENTAÇÕES

De uma commissão da classe dos operarios chapelleiros pedindo protecção para a sua industria.

Apresentada pelo sr. deputado Fuschini, enviada á commissão de commercio e artes e mandada publicar no Diario do governo.

Da camara municipal de Valença do Minho, contra o imposto addicional de 6 por cento.

Apresentada pelo sr. deputado M. A. de Espregueira, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do governo.

Da camara municipal do concelho de Grandola, pedindo auctorisação para desviar do fundo de viação a quantia de 3:400$000 réis, para ser applicada á construcção de um cemiterio.

Apresentada pelo sr. deputado José de Castro e enviada á commissão de administração publica, ouvida a de obras publicas.

Da commissão delegada da reunião de empregados no commercio, realisada no atheneu commercial de Lisboa, em 22 do mez passado, pedindo a promulgação de uma lei protectora, do encerramento dos estabelecimentos ao domingo e da distribuição equitativa do trabalho.

Apresentada pelo sr. deputado Eduardo Abreu, enviada á commissão de petições e mandada publicar no Diario do governo.

De uma commissão eleita pelos empregados complementares de obras publicas, pedindo melhoramento de situação.

Apresentada pelo sr. deputado Adriano Monteiro, enviada á commissão de petições e mandada publicar no Diario do governo.

De Henrique de Lima e Cunha, José de Saldanha Oliveira e Sousa e Zeferino Brandão, pedindo a revogação do artigo 9.º do decreto de 20 de outubro de 1888.

Apresentada pelo sr. deputado Costa Pinto, enviada á commissão de instrucção primaria e secundaria e mandada publicar no Diario do governo.

Da camara municipal do concelho de Alcacer do Sal, pedindo auctorisação para desviar do fundo de viação a quantia de 6:000$000 réis para ser applicada ao abastecimento de agua na mesma villa.

Apresentada pelo sr. deputado José Maria dos Santos e enviada á commissão de administração publica, ouvida a de obras publicas.

REQUERIMENTO DE INTERESSE PUBLICO

Com urgencia roqueiro que, pelo ministerio da justiça, me sejam enviados os documentos seguintes:

1.° Copia do relatorio do conselheiro director geral sr. Brito de Seixas, sobre a real collegiada de Guimarães, em resposta a uma consulta que lhe foi dirigida pelo ex-ministro da justiça sr. Veiga Beirão.

2.° Copia do parecer do reverendo arcebispo de Braga, sobre a mesma real collegiada. = Eduardo Abreu.

Mandou-se expedir.

JUSTIFICAÇÃO DE FALTAS

Participo a v. exa. e á camara que tenho faltado a algumas sessões d'esta camara por motivo justificado.

Sala das sessões, 9 de julho de 1890. = O deputado, João Pinto dos Santos.

O sr. Dias Ferreira: - Quando o barão de S. Clemente offerece a qualquer das camaras um exemplar das suas valiosissimas obras, (Apoiados.) e pratica seguida n'esta e na outra casa do parlamento, e ainda hontem observada n'aquella assembléa politica tomar 200 exemplares d'essa obra para serem distribuidos pelos membros das côrtes geraes.

Por isso mando para a mesa uma proposta cuja urgencia roqueiro, e vae formulada nos seguintes termos.

(Leu.)

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Escuso do acompanhar de quaesquer considerações esta moção. O parlamento portuguez não conta um só membro que não conheça, e que não respeite os serviços extraordinarios praticados pelo barão de S. Clemente ao corpo legislativo, e á nossa historia constitucional.

Ha de ser difficil mesmo encontrar entre os membros das duas assembléas politicas algum que lhe não deva, como eu, os mais relevantes serviços e os mais valiosos esclarecimentos sobre os assumptos dos nossos debates, subsidios que aquelle benemerito funccionario fornece a todos os lados da camara, sem distincção de cor politica, com a maior imparcialidade. (Apoiados.)

Nenhum parlamento estrangeiro tem de certo a fortuna de possuir na sua secretaria funccionario mais distincto, mais trabalhador e mais versado na historia politica do seu paiz, que o barão de S. Clemente. (Apoiados.)

Qualquer individuo, nacional ou estrangeiro, que vá consultar este honradissimo funccionario, distincto entre os mais distinctos, sobre qualquer acontecimento da vida constitucional portugueza encontrava nos productos do seu amor ao trabalho um verdadeiro thesouro, um armazem vivo de todos os factos da nossa vida liberal. (Apoiados.)

Não para nós, porque no nosso espirito e no nosso coração está o reconhecimento pelos serviços do barão de S. Clemente ao paiz, mas para as gerações futuras, desejo que nas nossas actas fique testemunho authentico de que as côrtes geraes da nação portugueza consideram relevantes os serviços do sr. barão de S. Clemente, e por isso mando para a mesa cata proposta, cuja urgencia roqueiro, abstendo-me de mais considerações para a justificar.

Vozes: - Muito bem.

(S. exa. não reviu.)

Foi lida na mesa a proposta e foi admittida á discussão.

O sr. Dias Ferreira:- Eu pedia a v. exa. que se declarasse na acta que a urgencia da minha proposta fôra votada por unanimidade.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco):- É simplesmente para declarar, não só como membro do governo, mas como membro que sou d'esta camara, que adheri com a maior satisfação e com o maior enthusiasmo á proposta que foi mandada para a mesa e que a camara acaba de admittir urgentemente á discussão.

Desde que entrei nesta casa, e antes, quando já me interessava pelas cousas politicas, habituei-me a considerar o sr. barão de S. Clemente, não só como um dos homens mais distinctos do meu paiz, mas como o mais conhecedor da historia constitucional de Portugal.

Devo dizer que não conheço quem tenha colligido maior numero de elementos importantes, com maior solicitude, zêlo, trabalho o intelligencia do que s. exa.

Portanto não podia deixar de fazer esta declaração, tanto por minha parte, como por parte do governo.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O sr. Carlos Lobo d'Avila: - Duas palavras apenas.

O sr. Dias Ferreira precedeu-me na apresentação da proposta que tinha tenção de mandar para a mesa. Assim, só me resta associar-me, em meu nome, e creio que em nome de todos os meus collegas da opposição (Apoiados geraes da esquerda.) ás palavras, que não foram de elogio, mas unicamente merecidas, aos eminentes serviços prestados ao paiz pelo sr. barão de S. Clemente.

Todos nós, os novos como eu, e os mais antigos, como o sr. Dias Ferreira, sabemos o que póde e vale a bondade inexgotavel, a solicitude, o constante amor ao trabalho e o saber d'aquelle distincto funccionario. (Apoiados.)

Não ha discussão na camara em que o orador que se levante não deva o melhor das suas informações á solicitude com que o barão de S. Clemente a todos auxilia. (Apoiados.)

É, portanto, uma obra de justiça e não só uma obra de justiça mas de moralidade, dar um galardão excepcional a um funccionario que cumpre os seus deveres tambem excepcionalmente.

Proponho que se vote por acclamação a proposta apresentada pelo sr. Dias Ferreira. (Muitos apoiados.)

O sr. Alberto Pimentel: - Julgo interpretar os sentimentos da maioria, associando-me á manifestação que os illustres oradores, que me precederam, acabam de iniciar e apoiar em honra do sr. barão de S. Clemente. (Apoiados.)

Este funccionaaio distinctissimo, que tem dado tantas provas de illustração e proficiencia sempre que se propõe tratar todos os assumptos, que fundamentalmente conhece, da vida constitucional do nosso paiz, tem direito a que publicamente a camara dos representantes do povo, que personificam neste momento o principio da soberania nacional, emanado do constitucionalismo, dê ao barão de S. Clemente, seu chronista, esta manifestação de subida, consideração e alto apreço. (Apoiados.)

Assim, creio que não preciso senão repetir que a maioria se associa festiva e unanimemente á manifestação da camara. (Apoiados.)

A proposta foi approvada por acclamação.

Todos os srs. deputados foram comprimentar o sr. barão de S. Clemente que se achava na sala.

O sr. Baptistas de Sousa: - Sem me referirão que se passou na sessão nocturna, sem me referir ao incidente que aqui teve logar, mas entendendo que convem acautelar incidentes futuros, vou mandar para a mesa uma proposta para que ao entrar-se na ordem do dia se declare por parte da mesa se ha ou não sessão á noite, porque desse modo o orador já sabe a que horas termina a sessão.

É a seguinte:

Proposta

Proponho que as sessões nocturnas sejam indicadas pelo sr. presidente em cada sessão diurna respectivamente na occasião de se indicar que se vae entrar na ordem do dia. = Antonio Baptibta de Sousa.

Ficou para segunda leitura.

O sr. Mattozo Côrte Real: - Tinha pedido a palavra para quando estivesse presente o sr. ministro das obras publicas, como s. exa. não está presente desisto de fallar agora.

O sr. Christovão Ayres: - Sr. presidente, eu pedi a palavra para chamar a attenção do illustre ministro da marinha e ultramar para alguns pontos da administração da provincia de Goa. Sinto que s. exa. não esteja presente; mas como as minhas observações constarão do Diario das camaras, terá o sr. ministro ensejo de tomar conhecimento d'ellas e prover como reputar de justiça e de necessidade.

Sendo a primeira vez que uso da palavra perante esta illustre assembléa, reccorro da benevolencia dos que me ouvem. O meu proposito é apenas referir-me singelamente, e sem atavios de phrase, a alguns assumptos que, no meu entender, requerem a attenção dos poderes publicos.

Approxima-se a data da conclusão do tratado da India, de 26 de dezembro de 1878, e sou de parecer que esse documento necessita absolutamente de uma revisão, no sentido de melhorar algumas das suas disposições que mais directamente implicam com a nossa soberania e com os interesses materiaes dos povos da India portugueza. (Apoiados.)

Antes de mais nada, sr. presidente, cumpre-me declarar que nas observações que vou fazer, muito sumariamente, não vae o menor signal de falta de veneração e de estima pela memoria do portuguez illustre que firmou aquelle tratado e o effectuou na convicção, até certo ponto justificada, de que ia dotar o paiz com um verdadeiro beneficio. Se no seu largo e bello plano colonial, - porque o teve o notavel ministro, como raros o têem tido neste paiz, - o illudiu muitas vezes a sua boa fé e o desconhecimento de

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certas circumstancias especiaes, não foi porque na sua alma de portuguez deixassem de pulsar vigorosos, os sentimentos do amor da patria e da mais nobre dedicação pela causa publica. (Apoiados.)

A propria generosidade dos nossos sentimentos tem sido muitas vezes a arma que contra nós têem vibrado os nossos adversarios. (Apoiados.)

A questão dos culis de Macau e uma prova d'esta minha affirmativa, que encontra na nossa historia outras confirmações desagradaveis.

Contra o commercio dos culis em Macau erguiam-se protestos no parlamento inglez, havia reclamações do governo britanico, levantava-se em toda a Inglaterra contra nós um grito humanitario; e nós aboliamos esse commercio, distruiamos a principal fonte de receita da nossa colonia na China, para restabelecermos e engrandecermos igual commercio em Hong-Kong, onde a Inglaterra o queria enraizado, sem a competencia da proxima colonia portugueza.

Era o paiz do contrato do monopolio del assiento, para a partilha dos lucros da escravatura, no seculo passado; era o paiz que tinha como base do seu commercio na Gambia a escravidão, em 1864; que para Ceylão e para a ilha Mauricia enviava milhares de escravos ao anno, e que a respeito de culis não só negociava com elles em Hong-Kong, mas em Jamaica, na Guyana e na Trindade, e reduzia de quinze a doze pés, em 1853, a bordo dos navios, o espaço concedido a cada emigrante nativo da Africa ou da Asia; era o paiz que, segundo os seus proprios escriptores, tinha em Glasgow, Birmingham, Liverpool e Leeds, fabricas destinadas a produzir fazendas proprias para o tranco de escravos; - era um paiz n'estas circumstancias, sr. presidente, que nos apontava ao mundo como um paiz negreiro e escravista, impondo-nos a suppressão do commercio portuguez, em beneficio do seu. (Muitos apoiados.)

Emfim, são modos de fazer fortuna! e abençoada, em todo o caso, a nossa pobreza, quando tem por fundo um nobre sentimento de generosidade ou de humanidade! (Muitos apoiados.)

No tratado da India não cedemos porem á sentimentalidade. As instancias da Inglaterra para a conclusão do tratado, que tinha, por pretexto, a questão de Surrate, mas, como fim real, o evitar o contrabando do sal portuguez, e aproveitar o porto de Mormugão, o melhor da costa occidental do Indostão, como o mais facil ingresso á poderosa e monumental rede de caminhos de ferro construidos e em construcção, que cruzam e recortam a India inteira, correspondia o nosso desejo de abrir, pelo nosso lado, á civilisação uma colónia que encravada na India ingleza se achava num atrazo lastimoso.

Pena foi, porem, que não attentassemos em que, no pé da mais amigavel concordia, negociavamos sobre os moldes dos tratados de Pondichery, de 1815 e 1818, realisados sob a impressão, ainda viva e dolorosa, dos desastres de Waterloo. A França porém, por meio de revisões amigaveis, acabou por obter as vantagens que primitivamente não conseguíra e hoje não é ella que está peior.

A experiencia deve ter-nos ensinado tambem a desejar no tratado de 1878 a revisão equitativa de algumas clausulas principaes. (Apoiados.)

De duas ordens, como disse, são as melhorias que reputo indispensaveis: as que respeitam as condições que ferem e melindram a soberania nacional, e as que importam um aggravamento do fisco, tendente a mudar de todo a industria e o commercio do paiz nalguns dos seus ramos principaes. (Apoiados.)

Não é meu proposito discutir aqui o tratado, nem nas suas origens, nem nos seus effeitos proximos ou remotos; limito-me por isso a simples indicações, não com respeito ás bases do contrato, que reputo, infelizmente, irremediaveis; mas n'alguns pontos de facil e equitativo accordo; guardo outros para uma analyse mais circumstanciada.

Convertidos como estamos, pela essencia do contrato, em zeladores do fisco inglez, (Apoiados. - Aparte: - Zeladores pagantes.) o nosso fim deve ser conseguir que dentro de nossa casa sejamos unicamente nós quem mandemos e nos façamos obedecer. Os poderes dados aos agentes inglezes dentro do territorio portuguez, principalmente pelo artigo 12.°, requerem, em nome dos principios da soberania nacional, uma revindicação de direitos, por principio algum inalienaveis. As clausulas d'esse artigo que põem os proprietarios das salinas á merco dos agentes inglezes, e constituem as auctoridades portuguezas na obrigação de os forcar a arrendar ou a supprimir as salinas, mesmo que o não queiram, e, sobretudo, as clausulas f e g, que impõem a adopção na India portugueza do processo e penalidades em vigor na India britannica, armando ao mesmo tempo os agentes inglezes com a faculdade de prender, e inspeccionar ad libitum as propriedades e os barcos, de dar busca a pessoas, animaes, carros, embarcações, mercadorias, volumes, etc., a pretexto de contrabando suspeito, são clausulas attentatorias da dignidade do paiz; de funcção da policia, doutro do territorio nacional, e uma das mais sagradas affirmações da soberania. (Apoiados.)

A morte da industria do sal em toda a provincia de Goa era de prever; a Inglaterra n'aquelle pacto não vinha buscar o sal á India portugueza, mas impedir a producção d'esse genero no nosso territorio, evitando assim que o contrabando continuasse a prejudicar o monopolio estabelecido na India ingleza e que na occasião do tratado rendia mais de 6.000:000 de libras. De 6,145:413 libras fôra a media do rendimento de 1883 a 1S86.

A idéa do tratado, por conseguinte, n'esse particular, era acabar com a producção portugueza, supprimindo as salinas, e obrigar o consumo do sal inglez. (Apoiados.)

O resultado foi o seguinte:

A producção do sal na India portugueza que cm, antes do tratado, de 2.903:240 mãos (de 10 arrobas), embora de pouco valor, em 1886 estava reduzida a 449:797 mãos; no adubo das palmeiras, em vez do sal, ha boje terras onde se ensaia o lodo salgado; o até me dizem que ha pontos em que o povo, por se privar do uso do sal, vae adquirindo doenças caracteristicas. Vejo confirmadas estas informações no lucido relatorio que acaba de apresentar á gerencia do banco nacional ultramarino o sr. A. F. Nogueira.

Informa o illustrado relator:

«Diz-me uma pessoa pratica e muito conhecedora do assumpto: Se o governo inglez só não prestar a fornecer de futuro todo o sal necessario, não só para o consumo domestico, mas tambem para a salga do peixe e adubo (como contratou com os francezes em Pondichery) serão gravissimas as consequencias para a saude publica, para o commercio e para a receita do estado.»

Eu não me quero alongar, sr. presidente, nas considerações que este assumpto me está suggerindo; (Vozes: - Falle, falle.) porque fallando no curto praso destinado para antes da ordem do dia, e estando outros oradores inscriptos, não devo occupar o tempo todo.

Passarei por isso rapidamente a outro ponto do tratado para que desejo tambem chamar a attenção do governo: - e o posado imposto que, recaíndo sobre as bebidas alcoolicas num modo crescente, representa nada menos que a aniquilação do commercio dos licores espirituosos da palmeira e do caju, e tambem do vinagre e da jagra, que é o assucar do povo, feito do soro refrigerante e alcalino do coqueiro, chamado sura.

O imposto do consumo inglez, ou o excise, applicado ás bebidas alcoolicas de producção portugueza e ao tory, tem crescido de um modo assustador, e se por emquanto não demonstra diminuição no consumo é porque recáe sobre um genero de absoluta necessidade, que é para a natureza do indio o que aqui é o vinho para o peninsular, ou a cerveja para os povos do norte.

Quer v. exa. saber, sr. presidente, qual a progressão

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do imposto sobre a palmeira, depois do tratado? Antes d'este cada palmeira pagava de importo 2 tangas, ou a sexta parte de uma rupia, que era então de 12 tangas cada uma; em virtude do tratado, e em consequencia do artigo 7.° do regulamento do abkari, passou cada palmeira a, pagar 1 rupia, que em resultado do contrato passara a valer 16 tangas, e cada palmeira brava a valer meia rupia, - isto em 31 de dezembro do 1879; de janeiro de 1883 a janeiro de 1884, passou cada palmeira a pagar 2 rupias; o dobro do que pagava em 1879, e dezeseis vezos o que pagava antes do tratado; um annos mais tarde, por portaria do governador da provincia, subia a 4 rupias o imposto de cada coqueiro em Goa, e a 5 em Damão! Hoje consta-me que se elevou ou se vae elevar a 6 rupias em Goa.

Esta imposição da taxa ingleza dá em resultado, fatalmente, a diminuição da producção portugueza e tem para os inglezes a vantagem de tornar impossivel a concorrencia do producto portuguez.

É habil e logico da parte do adversario; o que seja do nosso dispenso-me de o classificar. (Apoiados.)

Ouvi já calcular na rasão de dez para dois a diminuição da producção do coqueiro, hoje, na India portugueza; mas é em extremo exagerado este calculo, porque, como disse, o consumo das bebidas alcoolicas é de uma necessidade absoluta na India, quer por exigencia do clima, quer por habito adquirido. Mas o calculo que reduz a cerca de metade o numero das palmeiras lavradas á sura, que antes do tratado occupavam perto de oito mil pessoas, é mais exacto.

Quanto ao espirito de cajú, sr. presidente, bastara dizer que a taxa distilatoria começou por ser de 3 tangas ao principio da execução do tratado, passou depois a 6 tangas; mais tarde a 7; e consta me que vae ser elevada a 1 rupia o calão de 20 garrafas. E diga-me v. exa. se ha industria que resista a este imposto assim crescente.

A supposta liberdade concedida ao governo portuguez, de augmentar, reduzir ou abolir os direitos do exportação sobre quaesquer artigos originarios da nossa India, ou ali manufacturados, é uma pura ficção; porque se comprehende bem o que serão as nossas manufacturas e os nossos productos originarios, com as fronteiras abertas aos productos das industrias inglezas. Mas é o mesmo artigo 9.° que generosamente estipula que a quantidade total dos artigos importados que sejam necessarios, bona fide, para o consumo da India portugueza, «será primeiramente sujeita ao pagamento de direitos, e a importancia dos direitos cobrados sobre a quantidade, pela qual a isenção for concedida, será no fim do anno entregue ao governo da India portugueza, para ser por elle reembolsado, pro rata, aos diversos importadores».

E tratando em seguida dos vinhos de Portugal destinados ao consumo da India portugueza, fixa em 500 pipas, ou 41:500 gallões imperiaes, a quantidade que tem de pagar o direito antigo de importação (2 xerafins e 2 tangas o almude), sendo todo o excesso obrigado á taxa geral dos vinhos inglezes.

Quer dizer, depois de 500 pipas, já o vinho não é portuguez, e não podemos consumir nem sequer o que é nosso sem ser pela medida estabelecida pelo estrangeiro!

Isto em principio é o sufficiente para representar uma sujeição ás conveniencias de terceiro, fóra de todos os limites, (Apoiados.) e representa, alem d'isso, uma restricção na importação do vinho, que deve aliás crescer, e cresce realmente dia a dia. Esta restricção é determinada pela obrigação de depositar o imposto por inteiro, para ser liquidado apenas no fim do anno o que representa uma verdadeira peia que prende a acção do negociante portuguez, o portanto limita a importação dos nossos vinhos, que aliás desde 1885 tende a augmentar, e mais augmentará ainda quando desapparecerem os impecilhos e as difficuldades actuaes. (Apoiados.)

Em 1886 a importação foi do 47:493 gallões liquidos, ou de 44:821 galiões, exclusivamente para o consumo portuguez. Isto mostra a necessidade de olharmos especialmente para este assumpto.

Sr. presidente, está-me a custar o ter de continuar a tomar tempo á camara; mas fallando do tratado da India necessito chamar a attenção do governo para o assumpto que principalmente me levou a pedir a palavra; é o assumpto do caminho de ferro de Mormugão.

Eu proponho, sr. presidente, - e estimaria que a minha proposta podesse ser attendida - que o governo portuguez adquira aquelle caminho de ferro, a tempo do evitar futuras complicações e antes de encontrar diante de si maiores embaraços.

É um conselho do amigo. As tristes receitas d'aquelle caminho e a indemnisação ingleza de 4 laques de rupias, não chegam para os juros do capital immenso, prodigamente desbaratado n'aquella linha, e d'aquelle que ainda o governo ha do ser obrigado a garantir para as obras do porto. (Apoiados.)

Não tardará muito que vejâmos ainda mais claramente os dentes do lobo que nos ha de devorar. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu lembrarei ao governo um emprestimo amortisavel e a juros modicos, de 4 por cento por exemplo, para reembolsar a companhia do capital que doidamente se está gastando. Assim evitariamos, não só futuros e crescentes encargos, mas quiçá complicações desgraçadas. O caso de Lourenço Marques deve servir-nos de escarmento. (Apoiados.)

O dinheiro que se gasta com a fiscalisação portugueza, objecto de riso e de desdem dos empregados inglezes, é um desperdicio inutil, que desappareceria, ou se tornaria menos irrisorio com uma explicação directa da nossa parte. (Apoiados.) Quasi que o dinheiro gasto com a fiscalisação bastaria para a exploração da linha; e perante uma assembléa culta e patriotica como esta a quem me dirijo, escusado será, enumerar as vantagens que nos proviriam da acquisição do caminho do Mormugão, cujo traçado, com algumas clausulas do tratado que de proposito me dispenso de citar, mostram bem claramente qual foi o seu fim, e a intenção que a elle presidiu. (Apoiados.)

A India portugueza, ar. presidente, não tem merecido á metropole a attenção que lhe é devida, e seria bom não deixarmos, na fórma do costume, para o momento do uma crise irremediavel, o attendermos a esse glorioso padrão da nossa historia. Lembremo-nos de que não e tão desprezivel aquelle cauto da terra que não tenha sido objecto de ambições e de cobiças. Nos fins do seculo passado e principios d'este, tivemos as nossas possessões da India occupadas pelo estrangeiro, que ali nos tratou do mesmo modo que na Europa eramos tratados pelos nossos fieis alliados na guerra; e em 1839, a pretexto de suppostos auxilios prestados pelas auctoridades portuguezas aos rebeldes de Bounsuló, - quando pelo contrario, lealmente cooperavamos com a Inglaterra na extincção dos revoltosos,- era-nos feita, por intermedio de lord Howard, uma proposta para cedermos Goa, Damão e Diu, e «outros pequenos estabelecimentos que tivessemos, ou pretendessemos ter, na costa indica».

E quer v. exa. saber, sr. presidente, o que respondia Sá da Bandeira? O seguinte, que eu desejo que fique consignado nos annaes do parlamento portuguez:

«Sua Magestade, a cujo alto conhecimento o abaixo assignado teve a honra de levar a referida nota de s. exa., ficou em extremo maguada com o seu conteúdo, por não esperar que similhante proposta lhe fosse feita pelo mais antigo dos seus alliados; e auctorisou ao abaixo assignado a declarar, em seu augusto nome, ao governo de Sua Magestade Britannica que jámais admittiria, como base de quaesquer transacções, ainda que vantajosas possam ser a seus subditos, a cessão d'aquelles ou outros quaesquer dominios que pertençam á corôa portugueza, que sejam, como

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os de que se trata, monumentos da gloria nacional, de perseverança nunca excedida de principes, augustos predecessores de Sua Magestade, e do esforçado animo dos antigos guerreiros e navegadores portuguezes, taes como Vasco da Gama, Affonso de Albuquerque, D. João de Castro e D. João de Mascarenhas.»

Tal era a resposta d'esse portuguez venerando, que soube ensinar-nos a erguer bem alto o brio e a dignidade da nação, (Muitos apoiados.) e que ha de servir sempre de bandeira em todas as questões era que se trate de assumptos que affectem a pátria. (Apoiados.)

Vou terminar, sr. presidente, guardando para me referir n'outra occasião aos varios pontos de administração da India, para que desejo chamar a attenção do sr. ministro da marinha e ultramar. Limitar-me-hei hoje a ali adir á portaria n.° 20, de 11 de abril ultimo, que, explicando as disposições da lei de 10 de julho de 1889, enviou para Goa duas tabellas, em que se computara em moeda fraca as gratificações dos officiaes d'aquella guarnição.

Eu sei, sr. presidente, que essa disposição se funda em a lei dizer que subsistem as gratificações antigas; mas evidentemente o espirito da lei, desde o momento que convertia a moeda forte os vencimentos dos officiaes do ultramar, era manter as gratificações antigas, mas convertidas n'essa moeda; quando não, teria declarado que essas gratificações subsistiam na quantia e no valor, visto que a lei do que tratava exactamente era de converter os vencimentos dos officiaes em moeda forte.

Se nada especialisou, foi por entender superfluo, e ao espirito equitativo do ministro compete deferir no sentido não só mais sensato, porém mais justo.

Porque a interpretação dada pela portaria de 11 do abril não faz mais do que crear anomalias e desigualdades, não entre os officiaes da provincia de Goa e os da metropole, mas dentro da propria classe dos officiaes de Goa.

Assim temos que, no commando do corpo, tanto o coronel de infanteria como o de artilheria, tem igual gratificação; o tenente coronel no commando do corpo tem sómente 700 réis fortes de gratificação, que não chega nem para a quarta parte do expediente; e o tenente e o alferes, commandando companhia, vencem uma gratificação superior á que vence o capitão no mesmo exercicio. Parece-me, pois, de toda a equidade que se ordene que as referidas gratificações sejam do mesmo numero de réis estabelecidos na antiga lei, mas considerados fortes, pela mesma rasão por que o são os da tabella 2.

E alludirei por ultimo, gr. presidente, a uma questão capital: - á necessidade absoluta de se reorganisar o ensino publico na India, onde ha aptidões admiraveis, hoje atrophiadas pela falta do uma instrucção condigna. A reforma radical da escola medica, do instituto e do lyceu é de uma necessidade inadiavel, a fim, não só de levantar o nivel intellectual e moral d'aquella colonia, mas de constituir n'um nucleo de civilisação, e num foco de irradiação intellectual para as outras possessões portuguezas, essa antiga e nobre colonia portugueza.

Houve um tempo em que as sciencias e as letras, sobretudo as sciencias mathematicas, eram versadas na India com alta proficiencia; hoje é impossivel crearem-se n'aquelle meio homens que possam equiparar-se a tantos que, dentro e fóra do seu paiz, o têem sabido honrar e enobrecer, e entre os quaes se contam sete bispos sagrados, quatorze deputados em cortes, e innumeros lentes, magistrados, politicos escriptores, poetas distinctissimos. (Apoiados.)

A antiga e illustre classe dos representantes dos primeiros portuguezes, fundadora do imperio oriental, está n'uma apagada decadencia; as variadas e intelligentes raças nativas, entre as quaes se nota uma bella floração mental, que o estudo e o trabalho não fariam senão fecundar e enriquecer, estão atrophiadas e inertes.

Dois problemas tem, portanto, de resolver todo o governo que queira levantar aquella longinqua e bella possessão portugueza, tão digna de melhor sorte: - aproveitar, fortalecer, fecundar as aptidões das nativas raças, e renovar por todas as fórmas, o elemento portuguez. (Apoiados.)

Só assim estabelecerá ali, em bases seguras, a unidade e a solidariedade nacional!

Vozes:- Muito bem, muito bem.

(O orador foi comprimentado por toda a camara.)

O sr. Fuschini: - Mando para a mesa uma representação dos operarios chapelleiros, que pedem protecção para a sua classe.

Acompanharei esta representação com algumas considerações, que poderão esclarecer o sr. ministro da fazenda e a camara, sobre as graves circumstancias em que se encontra esta classe.

A importação dos chapéus estrangeiros tem crescido consideravelmente em numero, mas não tem crescido proporcionalmente o valor do numero dos chapéus importados. Quer isto dizer que o valor médio por unidade tem diminuido.

Effectivamente, em 1872, o valor médio por chapéu era de 1$056 réis e desceu em 1888 a 456 réis.

Ora os direitos aduaneiros antes dos tratados commerciaes eram direitos lixos, pelos tratados em vigor são direitos ad valorem.

V. exa. comprehende que n'estas condições o augmento de importação, e ao mesmo tempo a diminuição de um valor medio, trazem não graves inconvenientes para o thesouro publico, como para a classe nacional productora, ou operaria chapelleira. É forçoso confessal-o, esta classe é hoje uma das mais desgaçadas. Póde-se dizer que os seus salarios medios não ascendem a 400 réis diarios, e se continuar, como e provavel que continue, o augmento de importação, ficara em condições completamente impossiveis; quer dizer não podendo continuar em tal industria.

A camara e o sr. ministro da fazenda sabem quanto e difficil aos operarios creados em uma industria passarem para outra, ainda o que seja congenere, ou similhante.

A commissão dos operarios envia n'este sentido ao parlamento uma representação, que peço seja publicada no Diario ao governo.

A camara verá que vem em termos muito polidos. Vê-se mesmo que ha sinceridade na exposição que fazem. Alem d'isso conheço alguns dos operarios e por elles sei as difficuldades com que luctam.

É preciso, portanto, applicar qualquer remédio a este importante ramo de trabalho nacional.

Em regra tenho dito sempre que é indispensavel proteger o trabalho nacional, e n'este caso as condições dos operarios manifestam-se tão desgraçadas, que o remedio e instante e urgente.

Fallei com a commissão dos operarios e aconselhei-a a que fossem procurar o sr. ministro da fazenda, dizendo lhe que era minha convicção, qualquer que fossem as opiniões particulares de s. exa., que elle a receberia com toda a attenção e teria todo o desejo em resolver o que fosse justo e em beneficio da classe.

Creio que fiz justiça ao sr. ministro, porque não ha alguem que não deseje ser util aos desgraçados.

Estes operarios pediram-me então que dissesse a s. exa. que desejavam ser recebidos em audiencia.

Aconselhei-lhes a proxima sexta feira, suppondo que na quinta feira haverá assignatura.

N'esse dia, pela exposição detida que tencionam fazer, s. exa. o ministro conhecerá desenvolvidamente a questão, e acceitará os alvitres propostos na representação, se porventura julgar que são acceitaveis.

Um é de effeito immediato e outro de effeito mais ou menos remoto.

O de effeito immediato consiste em nomear uma commissão especial para fixar o valor dos chapéus importados; o de effeito futuro consiste em attender aos direitos, quando houver de se modificar o tratado.

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Verse-ha, então, se é possivel modificar o direito, transformando o direito ad valorem n'um direito fixo.

Se s. exa. fallar com os operarios, conhecerá os variados subterfugios de que usa o commercio para diminuir e mesmo evitar o pagamento dos direitos.

É conveniente ainda saber como se faz este negocio entre nós; a maior parte dos chapéus que vem do estrangeiro e são vendidos a praso de seis mezes. V. exa. pude bem comprehender como os chapéus estrangeiros, com os pequenos direitos que pagam, e o largo praso de pagamentos, têem contribuido pura arruinar a importante industria da chapellaria nacional.

Tenho de chamar a attenção de s. exa. para um outro assumpto. Foi ha dias approvado um projecto que, muito regularmente, deu ao governo o direito de cobrar condicionalmente as novas taxas sobre o tabaco estrangeiro manipulado, emquanto se não discutir o projecto do monopólio.

Esta lei tem na sua applicação difficultado a saída da alfandega do tabaco existente nos armazens, o que não me parece que fosse o espirito do legislador.

Alem d'isso devo tambem participar a s. exa. um facto que me dizem ter-se dado e que não póde admittir-se.

Não por vontade dos empregados da alfandega, mas por outras circumstancias, os grandes importadores têem tido preferencia nos despachos de tabaco, ficando manifestamente prejudicados os pequenos importadores, que, no ultimo dia em que a lei facultava a saída da alfandega ao tabaco pelo direito antigo, isto é, no sabbado, tiveram grande difficuldade em fazer alguns despachos.

Isto não é justo; entrego a questão nas mãos de s. exa., que certamente procederá em harmonia com os interesses de todos.

Sr. presidente, desejava, tambem referir-me a uma representação que recebi dos empregados menores de obras publicas; mas não trato d'esse assumpto, porque o meu illustre amigo o sr. Adriano Monteiro tem tambem esta representação e de certo elle advogará melhor do que eu os interesses dos representantes.

Por ultimo peco ao sr. ministro das obras publicas que mande o contrato das aguas á camara dos deputados.

S. exa. prometteu-me ha dois mezes que o mandaria, mande-o ao menos á commissão competente para nós o discutirmos; senão ha de ver-se obrigado no fim d'este anno a dar uma annuidade importante á companhia e eu sei que o sr. ministro da fazenda não está disposto a isso.

Para evitar um conflicto ministerial entre dois amigos pessoaes meus, peço a s. exa. que mande para a mesa este contrato. Tenho a certeza de que s. exa., vendo pelos seus proprios olhos e ouvido alguma cousa que possa dizer-se-lhe ha de ser o primeiro a declarar este contraio nefasto para os interesses do municipio de Lisboa.

Tenho dito.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco):- Sr. presidente, eu entendo que nas obrigações de um ministro da corôa entra, em primeira linha, acima de quaesquer preoccupações, a de receber e ouvir os que reclamam pelos seus direitos e justos interesses, e tanto mais se os que reclamam estão em mais inferior posição social. O sr. Fuschini já avisou a commissão de operarios a que se referiu, que eu a receberia na sexta feira, e acaba de participar-me; eu apresso-m'o a dizer a s. exa. que da melhor vontade os receberei na sexta feira, ao meio dia.

Com respeito ao assumpto de que s. exa. tratou mais especialmente na primeira parte das suas observações, devo dizer que concordo com s. exa. em que effectivamente esta industria é uma d'aquellas cuja situação é a mais difficil senão a mais afflictiva.

O illustre deputado, versado como é n'estes assumptos economicos e industriaes, especialmente no ramo que tomou sob o seu cuidado e protecção, sabe os motivos principaes que conduziram esta industria ás circumstancias em que hoje se encontra; mas eu creio que ha de ser difficil fazer uma cousa radical e verdadeiramente efficaz antes da revisão do tratado com a França.

O tratado termina em 1892, e uma das necessidades do governo, é no intervallo da sessão legislativa, preparar uma reforma da pauta para qualquer eventualidade, a fim do paiz estar armado com disposições economicas e fiscaes para poder renovar o tratado em bases mais convenientes.

Com relação aos tabacos devo dizer que fui já procurado por alguns interessados no assumpto, e do Porto foram-me communicadas pelo telegrapho reclamações sobre a forma porque eram feitos os despachos.

Eu hei de ouvir a procuradoria geral da corôa sobre a interpretação da lei e hei de resolver em conformidade com o que for legal; e se se tornar preciso tomar qualquer resolução legislativa, não tenho duvida em vir ao parlamento apresentar qualquer medida a este respeito.

Entretanto pedi já informações minuciosas sobre se havia despachos de commerciantes de tabacos, e as informações que recebi foram que até hoje ainda tal facto se não deu. Como visse n'um jornal reclamações a este respeito pedi uma nota dos tabaco existente na alfandega quando se publicou a lei que mandou cobrar por deposito e taxa sobre os tabacos. Não descurarei o assumpto, e, repito, é minha intenção, e tem sido o meu systema unico, dar cumprimento á lei e attender á justiça de cada um.

Como já tambem disse, quando for preciso pedirei ao parlamento qualquer medida, e estou prompto a fazel-o.

Com relação ao contrato da companhia das aguas, o sr. Arouca já disse a s. exa. que o mandaria a esta camara e o meu collega não deixara de cumprir a sua palavra.

O que possa afiançar a s. exa. e que nem sobre este assumpto, nem sobre qualquer outro, póde haver divergencia entre mim e o sr. Arouca, porque são tão affectuosas as nossas relações pessoaes, que, se fosse preciso, qualquer de nós não teria duvida em ceder das suas opiniões para evitar qualquer divergencia.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Ferreira de Almeida: - Mando para a mesa o parecer da commissão de marinha sobre a proposta de emendas ao decreto de 31 de março do corrente anno, promulgado pela auctorisação n.° 1 do decreto dictatorial n.° 5 de 10 de fevereiro.

As emendas são as seguintes:

Proponho que aos decretos de 31 de março de 1890, que reorganisou os quadros dos officiaes das differentes classes da corporação da armada, se façam as alterações e additamento que seguem:

No capitulo VI. - Regras fundamentaes da promoção.
Artigo 39.° incluir o

N.° 6.° Estão quites com a fazenda de quaesquer alcances liquidados, e abonos não vencidos.

§ 3.° O official a quem competir a promoção e tenha satisfeito a todas as condições exigidas por lei, excepto a da capacidade physica, será reformado no posto, e com as vantagens a que teria direito, se a promoção se tivesse realisado.

O § 3.° passa a § 4.°

No capitulo XVII. - Disposições diversas e transitorias.

Artigo (novo). Continuam em vigor as disposições do § 1.° do artigo 1.° da carta de lei de 23 de julho de 1885, unicamente na parte que concede o accesso da 2.ª e 1.ª classe aos facultativos navaes, quando tenham quatro annos de serviço, dos quaes dois, pelo menos, n'uma ou mais commissões de embarque fóra dos portos do continente do reino, para os actuaes medicos navaes de 2.ª classe, e bem assim para os aspirantes a medicos navaes matriculados á data da publicação da nova organisação.

Substituir o § unico do artigo 176.° pelo seguinte:

§ unico. Aos officiaes de que trata este artigo, e a

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quem pela presente lei, são exigidos tirocinios de embarque novos ou maiores do que os actualmente estabelecidos, são applicaveis todas as disposições da legislação, anterior para a promoção ao posto immediato áquelle em que estiverem á data da publicação d'este decreto, mas satisfazendo á disposição que ao presente se exige, de estar quite com a fazenda, designada no artigo 98.° da nova organisação. = Ferreira de Almeida.

Mandou-se imprimir.

O sr. Pestana de Vasconcellos: - Mando para a mesa o parecer da commissão do administração publica, sobre o projecto do lei apresentado pelo sr. Antonio Teixeira de Sousa, transferindo a séde da assembléa eleitoral de Villa Chã para a freguezia de Carlão.

Mandou-se imprimir.

O sr. Adriano Monteiro: - As circumstancias actuaes aconselharam o governo a que fizesse estabelecer o cordão sanitario desde Villa Real de Santo Antonio até Castello de Vide; mas sou informado de que o commando da quarta divisão militar não tem força sufficiente para esse cordão, que por isso está estabelecido só até Chança.

Chamo a attenção do governo para este assumpto, que me parece grave, porque, estando o cordão incompleto, corremos o risco de que elle seja inefficaz e estamos a gastar muito dinheiro, sem proveito.

Parece-me, portanto, que ou se deve estabelecer o cordão completo em toda a extensão precisa, ou então é melhor acabar com elle, porque assim é mais economico.

Tenho a apresentar uma representação dos empregados menores das obras publicas, e como ella está redigida em termos convenientes, peço a v. exa. que consulte a camara para que seja publicada no Diario do governo.

Poucas palavras tenho a acrescentar ao que se diz n'esta representação.

Os empregados das obras publicas têem rasão no que dizem, mas ha grande difficuldade em organisar um quadro que os contenha a todos pela diversidade de habilitações.

Eu pedia que se pozesse um dique á entrada de empregados analphabetos, e ao mesmo tempo que se não sacrificassem as aptidões praticas que muitos têem e a quem o acaso não permittiu terem uma instrucção profissional mais distincta.

É debaixo d'este ponto de vista que eu recommendo esta representação que mando para a mesa.

Consultada a camara, auctorisou a publicação da representação.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco): - Tenho a declarar ao illustre deputado que o sr. presidente do conselho continúa dedicando o maior cuidado a tudo quanto se refere á saude publica. Ainda hontem tive occasião de saber que s. exa. em breve traria ao parlamento uma proposta de lei para chamar as reservas, se assim julgasse conveniente.

O sr. Presidente: - Vae passar-se á ordem do dia. Os srs. deputados que tenham alguns papeis a mandar para a mesa, podem fazel-o.

O sr. Espregueira - Mando para a mesa um representação da camara municipal de Valença do Minho contra o imposto addicional de 6 por cento.

Peço para ser publicada no Diario ao governo.

Foi mandada publicar no Diario do governo e enviada á commissão de fazenda.

O sr. José de Castro: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal do concelho de Grandola, pedindo auctorisação para desviar do fundo de viação a quantia do 3:400$000 réis para ser applicada á construcção de um cemiterio e um projecto de lei no mesmo sentido.

Foi enviada á commissão de administração publica, ouvida a de obras publicas, e o projecto ficou para segundas leituras.

O sr. Eduardo Abreu: - Mando para a mesa uma representação da commissão dos empregados no commercio na reunião realisada no atheneu commercial de Lisboa em 22 do mez passado, pedindo a promulgação de uma lei protectora do encerramento. dos estabelecimentos aos domingos e da distribuição equitativa do trabalho.

Peço para ser publicada no Diario do governo.

Mando tambem para a mesa o seguinte requerimento:

(Leu.)

A representação foi mandada publicar no Diario do governo e o requerimento foi expedido.

O sr. Costa Pinto: - Mando para a mesa uma representação de Henrique de Lima e Cunha, José de Saldanha de Oliveira e Sousa e Zeferino Brandão, pedindo a revogação do artigo 9.° do decreto de 20 de outubro de 1888.

Peço para que seja publicada no Diario do governo.

Foi mandada publicar no Diario do governo e enviada á commissão de instrucção primaria e secundaria.

O sr. José Maria dos Santos: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal do concelho de Alcacer do Sal, pedindo auctorisação para desviar do fundo de viação a quantia de 6:000$000 réis, para ser applicada ao abastecimento de aguas da mesma villa.

É de toda a justiça o pedido que se faz n'esta representação porquanto é uma das necessidades mais instantes d'aquella villa, para poder melhorar as suas condições hygienicas o abastecimento de aguas, e se esta necessidade é sempre urgente, muito mais o era n'uma quadra como esta, em que os calores são excessivos e em que ha o receio de invasões epidemicas.

Peço á commissão do fazenda, a que esta representação ha de ser submettida, que a attenda como é de justiça.

A representação foi enviada á commissão de fazenda.

PEIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.° 141, auctorisando o governo a adjudicar, em concurso publico, o exclusivo da fabricação dos tabacos, no continente do reino, actualmente na administração do estado, em harmonia com es bases que fazem parte d'esta lei e a ella vão annexas.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o projecto.

Leu-se na mesa o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 141

Senhores deputados da nação. - Á vossa commissão de fazenda foi presente a proposta de lei governamental n.° 113-1, que altera o actual regimen da industria do fabrico dos tabacos, no continente do reino.

Procedendo a um demorado estudo e discussão d'este importante documento, não deixou a mesma commissão de examinar as diversas phases por que tem passado, entre nós, aquella industria e de discutir, seguidamente, qual dos regimens mais conhecidos e preconisados podia, na presente conjunctura, ser proveitosamente adoptado ou aconselhado.

A aspiração do governo, claramente definida no relatorio do illustre ministro da fazenda e a natural tendencia da commissão, seria poder escolher a liberdade de fabrico, voltando-se assim simplesmente a pôr em pratica o regimen, que, entre nós vigorou desde 1864 a 1887.

Aquella aspiração e a este desejo oppunham-se, porém, formalmente as observações que em seguida temos a honra de expor á vossa consideração o esclarecido exame.

Se, por exemplo, a 31 de dezembro de 1889, no fim do primeiro semestre do anno economico corrente, se quizesse proceder á liquidação da régie, a fim de passar para a liberdade de fabrico, o balanço da administração geral dos tabacos, convenientemente completado com as contas do

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thesouro, referentes a tabacos, apresentaria o seguinte resultado, resumindo:

Activo:

[Ver tabela na imagem]

Papeis de credito ....
Saldo dos valores em credito e debito ....
Indemnisações pagas ás fabricas ....
Idem a pagar (approximadamente) ....
Tabacos expropriados ....
Antigos contratadores ....
Total ....

Passivo:

Supprimentos feitos para tabacos pela thesouraria do ministerio da fazenda .... 7.281:167$120
Idem a fazer (approximadamente) para completar as indemnisações ás fabricas .... 68:524$854
7.349:691$974

Do exame d'este balanço, relativo ao dia 30 de dezembro de 1889, se concilie que para cobrir o desembolso do thesouro, 7:350 contos de réis, numeros redondos, apenas se póde dispor, approximadamente, de 2:177 contos de réis. E como n'estes 2:177 contos de réis não estão computados 68 por cento do valor dos tabacos manipulados em ser, e por outro lado se considera um excesso de valor, 500 contos de réis approximadamente, nas verbas que representam o custo da expropriação de predios, utensilios e machinismos e nos saldos cobraveis de contas em liquidação, transforma-se aquella verba, attendendo ás correcções indicadas em 2:830 contos de réis, numeros redondos.

O estabelecimento da liberdade de fabrico representaria, pois, para o estado, em relação áquelle dia, uma perda immediata de 7:350 - 2:830 = 4:520 contos de réis.

Este resultado negativo, bem visivel, poderia, comtudo, ser compensado, em relação ao caso especial que nos occupa, durante os dezeseis annos, correspondentes ao periodo de arrematação do exclusivo a que se refere a proposta do governo.

E, porém, facil verificar que não aconteceria assim.

O rendimento dos tabacos, no continente do reino e ilhas, nos ultimos annos do regimen da liberdade foi:

Contos de réis

[Ver tabela na imagem]

1877-1878 ....
1878-1879 ....
1879-1880 ....
1880-1881 ....
1881-1882 ....
1882-1883 ....
1883-1884 ....
1884-1885 ....
1885-1886 ....

O augmento de consumo durante este periodo, que mais se avizinha da epocha actual, traduz-se por um acrescimo de receita de 81 contos annuaes, ou 2,83 por cento; sem mesmo attender ás correcções que avolumam este numero, provenientes da possivel antecipação de direitos que começou a fazer-se sentir em 1886 e da alteração introduzida na pauta em 1879.

Determinado assim o augmento de consumo, considerando que do rendimento do tabaco, no regimen da liberdade, teria de ser annualmente deduzida a annuidade necessaria para amortisar 4:520 contos de réis em dezeseis annos, e tendo em vista a proposta do governo e a extincção de todos os encargos que oneram o estado, conclue-se que no periodo que de corre desde 1890-1891 até 1906-1907 o estado perderia, dada a preferencia ao regimen da liberdade de fabrico, uns 6:000 contos de réis.

Convem notar que n'este calculo nem foi considerada a partilha nos lucros, nem se attendeu á despeza com o indispensavel augmento de fiscalisação para tornar possivel esse acrescimo de receita, constante, de 81 contos de réis, durante dezesete annos.

Debaixo, pois, do ponto de vista financeiro, como accentuadamente o indica o nobre ministro da fazenda no seu relatorio d'este anno, o regresso ao regimen de liberdade de fabrico no momento actual, seria uma operação ruinosa, que as circumstancias da nossa fazenda publica não podem admittir.

A uma perda annual, media, de 350 contos de réis acresceria nos primeiros annos, uma muito mais sensivel diminuição das receitas do estado, quando justamente a opportunidade, para as nossas finanças, indica que se criem condições diametralmente oppostas, visto como se considera, com justos motivos, necessidade inadiavel o equilibrio orçamental das nossas receitas e despezas ordinarias.

Outra rasão principal, não menos digna de ponderação, exclue temporariamente o regresso ao regimen da liberdade de fabrico.

Em 31 de dezembro do 1889 existiam em serviço na administração geral dos tabacos:

Empregados diversos .... 247
Operarios, jornaleiros .... 723
Operarios, empreiteiros .... 4:503

D'este pessoal considera a administração geral dos tabacos como fora dos respectivos quadros 30 empregados e 31 jornaleiros, addidos ou sobresalentes, e precisa licenciar, diariamente, cerca de 1:050 empreiteiros, pagando-lhe 2/3 do seu ordenado medio, para conseguir igualar a producção cem o consumo.

Se no fabrico dos tabacos se empregassem os apparelhos e machinismos usados hoje vulgarmente n'aquella industria, certamente o pessoal empreiteiro poderia ser ainda reduzido a uns 2:000 operarios, ou talvez menos, e nos jornaleiros tambem seria possivel uma notavel reducção.

Considerando, ainda, que o pessoal não operario seria mais que sufficiente para o serviço das novas fabricas, que se estabelecessem, só seria licito suppor que ellas funccionariam em condições industriaes ordinarias, quando o pessoal operario, actualmente em serviço da régie se achasse reduzido nas condições acima indicadas.

Mas sendo certo que o estado não poderia impor ás novas fabricas uma condição onerosa, que fosse quasi incompativel com o regular e livro exercicio da industria do fabrico dos tabacos, como seria obrigal-as a dar trabalho a 2:500 operarios para manipularem tabacos a mais do que as necessidades do consumo exigem, ou forçal-as a pagar a esses operarios 2/3 do seu salario medio, licenciando-os;

Não sendo, por outro lado, possivel para o estado, que por todos os modos procura evitar despezas, tomar a seu cargo o pagamento da avultada, embora decrescente, somma de 315:000$000 réis, que a tanto monta o despendio a fazer com aquelles operarios, quando licenciados;

Tendo a legislação vigente garantido a esses mesmos operarios direitos e regalias do que não podem ser esbulhados;

Por isso a vossa commissão, plenamente convencida e sem julgar necessario adduzir mais rasões, reconheceu quanto era justa a opinião do nobre ministro da fazenda ao considerar como praticamente insustentavel a implantação, n'esta occasião, do regimen de liberdade de fabrico.

Não foi intento da commissão de fazenda apurar responsabilidades, expondo estes factos de uma exactidão indis-

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cutivel, mas ora sua obrigação descrever com clareza a situação presente para justificar os motivos por que defendendo o partido regenerador em 1887 e 1888 a liberdade de fabrico, não julga a vossa commissão possivel, n'este momento, a passagem áquelle regimen.

Reconhecida a impossibilidade de voltar, desde já, á liberdade de fabrico, restava preparar, pela fórma mais rendosa para o estado, esse regresso possivel dentro de um determinado praso e considerar d'entre os demais regimens conhecidos qual d'elles conviria adoptar.

Para a vossa commissão o problema achava-se pois circumscripto a escolher entre o exclusivo administrado por conta do estado ou por conta de particulares, conforme cada um d'esses processos se ajustasse melhor com as conveniencias do paiz e da sua bem entendida administração financeira.

Os echos do nosso parlamento já, por mais de uma vez, ouviram a erudita e prolongada discussão, theorica, d'esta these.

Não é nosso intento reproduzir n'este logar o que no exame dos annaes parlamentares o vosso esclarecido criterio póde apreciar bem melhor e por completo.

Bastará observar que em ambos os systemas se notam defeitos e se preconisam vantagens.

A preferencia a dar a qualquer dos dois regimens, na nossa opinião, deve depender principalmente das circumstancias particulares a cada paiz, da maneira como se achem organisados ou se pretendam estabelecer um ou outro exclusivo, e emfim das condições especiaes peculiares a cada uma das hypotheses, que se apresentem.

A vossa commissão é ainda de parecer que, sacrificada a liberdade de fabrico, e desde que o exclusivo arrematado não seja investido de poderes magestaticos, póde haver só uma unica rasão, de ordem verdadeiramente superior, que, na grande maioria dos casos e a priori, possa determinar a preferencia entre os dois regimens do exclusivo de fabrico.

Essa rasão encontra-se, naturalmente, n'uma elevação das receitas do thesouro, provenientes de tabacos. E aquelle dos exclusivos que assegurar essa melhoria de rendimentos, n'um determinado paiz, não póde, com rasão de valia, deixar de obter a preferencia.

A régie appareceu entre nós em 1888, mais como um expediente ou uma transacção de occasião, do que como um fim, preconcebido, que se pretendia attingir.

Difficuldades que sempre embaraçam os governos, no nosso paiz, levaram a escolher-se uma solução intermediaria e talvez inesperada.

Mas se é conveniente fazer esta observação para recordar a origem da implantação da régie entre nós, é tambem verdade que o nobre ministro só julgou indispensavel alterar o regimen existente da industria do fabrico dos tabacos por se convencer que d'esta medida financeira adviria um incontestavel augmento de rendimento para o thesouro e por entender ainda que não podia prescindir d'esse acrescimo de receita para a regular administração da fazenda publica.

Á vossa commissão foram presentes todos os esclarecimentos necessarios para bem poder avaliar como as opiniões do nobre ministro são devidamente fundamentadas.

Conhecidos pelo projecto de lei, que temos a honra de apresentar ao vosso esclarecido exame, todos os encargos que oneram o concessionario e vantagens correlativas;

Considerados, por outro lado, os rendimentos provaveis da régie;

Tendo em attenção, em qualquer dos dois regimens, a liquidação por completo dos encargos tomados pelo estado;

Conclue-se, facilmente que o exclusivo arrematado renderá a mais para o estado, approximadamente, em media, e por anno, entre 1:000 e 400 contos de réis, durante 17 annos, considerada a renda mim ma de 4:200 contos de réis e a partilha nos lucros, estabelecida no projecto de lei.

A vossa commissão entendeu dever definir por meio de numeros a sua opinião com relação a este ponto para bem claramente significar quaes os motivos determinativos que a levaram a concordar, plenamente, com as indicações e proposta do nobre ministro da fazenda.

Proseguindo no estudo da mesma proposta verificou ainda a commissão de fazenda que o projecto satisfaz á condição essencial de offerecer ao arrematante a indispensavel margem para lucros, condição absolutamente necessaria para se poder admittir a concorrencia das emprezas a uma operação d'esta natureza. Convem observar que esta circumstancia encontra, no embate da licitação, o seu natural e racional correctivo.

Resta á vossa commissão chamar a attenção da camara para diversas modificações introduzidas na proposta de lei, de completo accordo com o governo, que em nada a alteraram nos seus lineamentos geraes.

Referir-nos-hemos apenas áquellas alterações de maior importancia sem nos demorar com a analyse do ligeiras differenças de redacção, facilmente apreciaveis e de alcance limitado, introduzidas ás bases 3.ª, 4.ª, n.ºs 2.° e 9.° da base 9.ª, 15.ª 18.ª, 19.ª 20.ª e 21.ª

Modificações

Base 2.ª

A alteração feita na redacção d'esta base tem por fim principal não prejudicar a possibilidade de se estabelecer no programma do concurso, que a arrematação terá logar por meio de licitação verbal, como era antigo uso.

Base 5.ª

O pensamento expresso na base 5.ª da proposta do governo, que dá ao concurso para a concessão do exclusivo todas as garantias da mais perfeita e absoluta correcção, vae, na sua integra e quasi pelas mesmas palavras reproduzido na ultima parte da base 5.º do projecto de lei.

Como, porém, pela redacção da base 7.ª da proposta do governo parecia que o estado reclamava do concessionario 7:200 contos de réis, sómente a titulo de reembolso, pelas fabricas expropriadas e valores existentes na administração da régie d'aquella proveniencia, que na base 14.ª são avaliados em 2:700 contos de réis mais ou menos uma quantia relativamente pouco elevada, o que poderia parecer contradictorio;

Como não era esse o pensamento, que presidiu á organisação da proposta, pois que o governo, e mais tarde a commissão, entendem que o concessionario deve pagar pelo privilegio do exclusivo arrematado uma renda fixa annual, não inferior a 4:200 contos de réis, e cumulativamente, por uma vez, 7:200 contos de réis, afora uma determinada partilha, eventual, nos lucros;

E, emfim, como é em troca da concessão e da cedencia dos valores existentes na administração da régie que o estado recebe a partilha nos lucros, bem como as duas verbas acima mencionadas, que representam o mais importante onus para o adjudicatario;

Por isso se resolveu, de commum accordo, modificar a redacção da base 5.ª e 7.ª pela fórma indicada no projecto de lei.

Base 6.ª

A redacção dada á base 6.ª da proposta impunha sempre ao concessionario a obrigação de constituir uma sociedade anonyma de responsabilidade limitada.

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A nova redacção concede mala ampla liberdade e teve em vista augmentar o numero dos concorrentes á arrematação do exclusivo.

Pareceu á vossa commissão que as unicas garantias verdadeiramente importantes a exigir ao arrematante deviam ser, que a administração e gerencia da empreza e do exclusivo fique sempre exercida e confiada a cidadãos portuguezes, seja qual for a proveniencia dos capitães por ella empregados, e bem assim que sempre e para todos os effeitos a empreza concessionaria fique sob acção exclusiva das leis e tribunaes portuguezes.

Desde que a empreza tem de entregar ao estado 7:200 contos de réis, nos primeiros sessenta dias depois de firmar o seu contrato, de certo é esta uma verdadeira e solida segurança em abono da sua respeitabilidade.

Base 7.ª

A alteração feita n'esta base já foi justificada quando nos referimos á base 5.ª

Apenas se determinou, ainda, de uma maneira mais precisa a epocha em que terá de realisar-se o pagamento ao estado dos 7:200 contos de réis.

Base 9.ª

N.° 1.° A alteração principal introduzida no n.º 1.° da base 9.ª do projecto de lei foi elevar a participação para o estado nos lucros liquidos da empreza. A nova participação é a divisão em partes iguaes e a da proposta governamental estabelecia a partilha de 2/3 para o concessionario e 1/3 para o estado.

Fixou-se em 7:200 contos de réis o capital a amortisar annualmente, a fim de se computar no calculo dos lucros liquidos a respectiva amortisação.

Fixou-se em 3:500 contos de réis o capital, que a proposta do governo considera como de laboração, por se suppor que o concessionario precisa de 800 contos de capital circulante, que juntos a 2:700 contos de valores existentes na administração da régie perfazem o capital indispensavel para o seu giro.

Fixou-se o praso para a liquidação e pagamento ao estado e ao pessoal operario e não operario dos lucros partilhados.

N.° 3 O n.° 3.° da base 9.ª da proposta passou a n.° 7.° da base 10.ª no projecto do lei.

O n.º 3.° do projecto de lei consigna a idéa de dar destino ao tabaco de tomadias, detalhe a que a proposta se não referia.

N.° 4.° A alteração consiste em reduzir a 50 contos de réis em titulos de divida publica, o deposito para a garantia das multas por se julgar essa quantia sufficiente.

A circumstancia de se preceituar que o deposito seja feito sómente em titulos de divida publica, corresponde a uma simplificação de serviços na caixa geral de depósitos.

N.° 5.° Sendo o pensamento do governo para evitar a natural perturbação occasionada pela mudança para um regimen diverso, no fim dos 16 annos da concessão, estar prevenido com um deposito de tabacos manipulados, não inferior a 1:500 toneladas, a fim de satisfazer ás necessidades do consumo nos primeiros mezes da mudança, modificou-se a redacção do n.° 5 para exprimir unicamente esta idéa.

Acrescentou-se que do preço da venda se devem deduzir 15 por cento para commissões aos vendedores e revendedores.

E fixaram-se tambem as epochas e fórma de realisar o pagamento d'esses tabacos manipulados.

N.ºs 6.°, 7.° e 8.° As alterações introduzidas na proposta do governo tiveram todas por fim garantir ao pessoal operario e não operario as suas collocações e vencimentos actuaes, bem como os beneficios que presentemente auferem do legado de João Paulo Cordeiro.

N.° 10.° As alterações introduzidas na proposta do governo tiveram por fim garantir aos vendedores por grosso a retalho, revendedores e depositarios commissões e descontos convenientemente remuneradores do seu trabalho.

N.° 11.° Obtemperando a reclamações dos cultivadores do Douro, ou antes da commissão geral da cultura dos tabacos do Douro, representada com a mais louvavel dedicação pelo seu illustre presidente o exmo. sr. barão das Lages, o governo e a commissão concordaram em elevar, de 10 por cento a 20 por cento do consumo, a quantidade de tabacos d'aquella região que o concessionario será obrigado a fabricar anuualmente, assegurando assim a venda a todo o tabaco produzido no Douro.

Mais se estabeleceu que o estado tomaria a seu cargo a seccagem e fermentação dos tabacos d'aquella região, o que representa um beneficio valioso de um duplo alcance e importancia; pois que, se por um lado allivia os productores da despeza com aquellas operações, pelo outro assegura para aquelles tabacos uma melhoria notavel no seu preparo e como consequencia um consideravel augmento no seu valor.

Considerou a vossa commissão que estas importantes concessões, juntas ao bonus de 100 réis por kilogramma, que o concessionario é obrigado a pagar, representavam para os cultivadores de tabaco do Douro uma protecção sufficientemente efficaz e largamente remuneradora.

Modificou-se, tambem, a constituição do tribunal arbitrai a fim de que o arbitro de desempate podesse ser um perito na especialidade, condição que difficilmente se realisaria no presidente do tribunal do commercio do Porto.

Base 10.ª

N.° 2.° Incluiram-se a mais nas isenções de direitos os machinismos e seus accessorios, o que á vossa commissão pareceu equitativo vistos os encargos, que oneram o concessionario.

N.° 3.° A principal alteração consiste em consignar a idéa que o concessionario terá direito a uma diminuição proporcional na renda fixa que tem de pagar, todas as vezes que uma epidemia geral no continente do reino ou uma guerra diminua consideravelmente e extraordinariamente o consumo, ou ainda quando uma outra causa bem definida e excepcional, determine um resultado similhante.

Fixou-se a maneira do estado fazer essa restituição por encontro nas prestações da renda fixa a pagar.

Supprimiram-se n'este numero quaesquer palavras ou phrases que podessem dar logar a uma interpretação latitudinaria por parte do concessionario.

Fixou-se a obrigação para o estado de dar trabalho nas repartições publicas ao pessoal não operario, licenciado por virtude das circumstancias anormaes acima indicadas.

A vossa commissão entendeu que, se era justo e equitativo admittir o licenceamento do pessoal operario e não operario em casos do guerra e de epidemia geral, que determinassem uma consideravel diminuição no consumo, pela mesma rasão se devia considerar um abatimento a fazer na renda fixa annual, proporcionalmente a esse desfalque extraordinario da venda.

Para evitar quaesquer abusos estabeleceo-se o limite maximo para o liccnceamcnto do pessoal e diminuição da renda.

N.° 4.° As alterações feitas na redacção d'este numero, têem por fim definir a maneira como tem de se effectuar, por parte do estado, a entrega dos direitos de importação sobre tabacos, cobrados nas alfândegas do continente do reino; a consignar, bem claramente que o concessionario não tem a receber os direitos de importação sobre tabacos cobrados nas ilhas adjacentes e no ultramar; e ainda a explicar, mais categoricamente, o que se preceitua na proposta do governo em relação ao imposto de licença.

N.ºs 6.° e 7.° Estes dois numeros pertencem exclusivamente ao projecto de lei da commissão.

O n.° 6.° estabelece a faculdade que o concessionario

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terá de nomear agentes seus, a que muito expressamente se não concederam nenhuns poderes magestaticos, a fim de fiscalisar e descobrir o contrabando.

Á vossa commissão pareceu esta condição indispensavel para ser possivel e praticamente realisavel a diminuição do contrabando.

O n.° 7.° corresponde ao n.° 3.° da base 9.ª da proposta governamental.

No n.° 3.° da base 9.ª da proposta não era permittido qualquer augmento de preço para as actuaes marcas da régie, embora o fosse sem limites para quaesquer outras marcas.

A modificação introduzida pela commissão consiste em dar plena liberdade, n'este ponto, ao concessionario, dentro do um máximo de 20 por cento a mais sobre os preços actuaes.

Todos sabem que o augmento de preço incita ao contrabando e é um factor determinante da diminuição do consumo; sendo assim o concessionario julgará como melhor convier ao seu commercio da determinação dos preços de venda.

Por outro lado e para o caso em que elle consiga fiscalisar devidamente o contrabando, dentro do periodo de dezeseis annos da sua concessão, entendeu a commissão não ser equitativo para o consumidor, e muito embora o concessionario tenha de soffrer a concorrencia da manipulados estrangeiros, consentir que a elevação dos preços podesse subir acima de 20 por cento, em media, dos preços actuaes.

Base 11.ª

Foi supprimida a faculdade que tinha o concessionario de deslocar os operarios manipuladores de tabacos para outras industrias.

Esta disposição poderia ser um fóco de interminaveis questões pela difficuldade de adaptação dos operarios a novos trabalhos e por ser muito limitado o numero de industrias em que se exerçam manipulações de natureza similar ás que na industria do fabrico dos tabacos constituem o trabalho ordinario dos operarios.

Fixou-se ainda em dois terços do salario medio do operario a compensação que o concessionario tem de lhe dar, se lhe convier licencial-o, como se pratica, ultimamente, na administração da régie.

Base 14.ª

Na proposta do governo não se preceituava expressamente que os predios, utensilios e machinismos figurariam pelo seu custo no balanço, o que poderia dar logar a discussão com o concessionario na apreciação contradictoria d'esse balanço.

Nos balanços da régie figuram os tabacos manipulados em deposito pelo seu valor de venda, menos 68 por cento, o que para a administração geral dos tabacos corresponde a um valor representativo do seu custo de producção.

A commissão entendeu que deviam continuar a computar-se, no balanço do dia da entrega ao arrematante, aquelles tabacos pela fórma adoptada na régie, substituindo assim a redacção dada á proposta do governo, que os fazia figurar, primeiro, pelo seu valor de venda e depois constituia ao concessionario um credito de 68 por cento d'esse valor total para ser pago em dezeseis prestações annuaes.

Tambwm se fixa a epocha para se effectuar o pagamento da differença, a mais ou menos de 2:700 contos de réis, que houver entre o activo e o passivo da régie no dia da entrega da administração do exclusivo ao concessionario.

Supprime-se o n.° 18 do passivo da proposta do governo para que o concessionario comece a sua administração em contas correntes com a fazenda.

Base 16.ª

Ampliam-se para o estado os direitos e regalias consignadas na proposta do governo no caso de rescisão do contrato, perceituando-se expressamente que elle não é responsavel por quaesquer dividas contrahidas pelo concessionario.

Base 23.ª

A commissão entendeu dever consignar no projecto de lei a elevação de 1 $000 réis em kilogramma sobre os actuaes direitos dos charutos e 500 réis sobre os dos outros tabacos importados do estrangeiro.

A rasão d'esta elevação está na concorrencia que estes tabacos fazem hoje aos productos manufacturados da régie, sendo sobretudo notavel relativamente aos charutos e ainda muito sensivel em relação aos outros manipulados.

Base 25.ª

Para evitar futuras reclamações a commissão julgou conveniente dar a esta base uma redacção mais precisa e accentuada.

Foram ainda additadas algumas providencias para garantir o concessionario contra a concorrencia fraudulenta dos tabacos estrangeiros.

Base 26.ª

Na redacção d'esta base precisou-se o direito differencial que deverá proteger, no ultramar, o tabaco manufacturado no continente do reino e exportado para as nossas possessões ultramarinas.

Base 28.ª

N'esta base acrescentaram-se algumas providencias para garantir as ilhas adjacentes da invasão dos tabacos manufacturados no continente e estabeleceram-se direitos differenciaes a favor da industria nacional.

São estas as observações que a vossa commissão de fazenda entende dever apresentar ao exame da camara, acompanhando o projecto de lei, que em seguida vae transcripto, e que a mesma commissão considera nas circumstancias de poder ser approvado.

Projecto de lei

Artigo 1.° É o governo auctorisado a adjudicar, em concurso publico, o exclusivo da fabricação dos tabacos, no continente do reino, actualmente na administração do estado, em harmonia com as bases, que fazem parte d'esta lei e a ella vão annexas.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Bases a que se refere a lei datada de boje e que d'ella fazem parte

Pelo ministerio da fazenda e repartição do gabinete se annunciará, pelo menos com trinta dias de antecedencia e com a maior publicidade, no paiz e no estrangeiro, a abertura do concurso para a adjudicação do exclusivo do fabrico dos tabacos.

Os respectivos annuncios darão conhecimento circumstanciado e completo do programma do mesmo concurso, em harmonia com estas bases, e mencionarão as formalidades necessarias para a admissão dos concorrentes.

2.ª

O concurso estará aberto durante o praso de trinta dias.

O contrato, com a empreza ou individuo adjudicatario, far-se-ha dentro do praso maximo de um mez, a contar do dia em que se proceder á licitação.

3.ª

Para ser admittido ao concurso é preciso provar que se effectuou um deposito, na caixa geral dos depositos, de 200:000$000 réis em dinheiro, ou em titulos da divida publica pela sua cotação no mercado.

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1124 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O adjudicatario elevará ao dobro este deposito, no acto da assignatura do contrato, e só poderá levantal-o depois de satisfeito o encargo a que se refere especialmente a base 7.ª e a base 5.ª

Os outros concorrentes poderão levantar os seus depositos logo que o governo tenha resolvido sobre a adjudicação.

4.ª

A licitação eftectuar-se-ha perante uma commissão composta:

Do ministro dos negocios da fazenda, que será o presidente;

E dos vogaes:

O presidente do supremo tribunal de justiça;

O presidente do supremo tribunal administrativo;

O presidente do tribunal de contas;

O director geral da contabilidade publica;

O director geral da thesouraria;

E o administrador geral dos tabacos.

O governo reserva-se o direito de era conselho de ministros, não fazer a adjudicação se assim o entender por conveniente.

5.ª

O concessionario do exclusivo do fabrico dos tabacos, no continente do reino, deverá satisfazer a todas as obrigações constantes d'estas bases e nomeadamente:

1.° Ao pagamento, nos cofres do thesouro, de réis 7.200:000$000, nos termos indicados na base 7.ª

2.° Ao pagamento, nos mesmos cofres, de uma renda fixa, em prestações mensaes e em moeda corrente n'este reino, oiro e prata, correspondente a um minimo de réis 4.240:000$000 annuaes.

O pagamento d'esta renda fixa annual constituirá a unica e exclusiva base de licitação no concurso, o a preferencia entre os concorrentes, admittidos a licitar, será dada áquelle que offerecer mais elevada renda, superior ao minimo estabelecido.

6.ª

O concessessionario fica para todos os effeitos sujeito ás leis e tribunaes portuguezes, e a gerencia e administração da empreza e do exclusivo ficará sempre a cargo de cidadãos portuguezes.

Mas se o exclusivo for adjudicado ou transmittido a qualquer sociedade de responsabilidade limitada a minoria da sua direcção e conselho fiscal poderá ser composta por cidadãos estrangeiros, residentes fóra de Portugal, e deliberar separadamente, ficando porém as suas resoluções, para produzirem effeitos, sempre dependentes de ser ratificadas e confirmadas pela maioria portugueza.

Os estatutos da empreza concessesionaria têem de ser approvados pelo governo, que ouvida a procuradoria da corôa, póde dispensar a applicação do codigo commercial especialmente em relação á proporção a guardar entre a emissão de acções e obrigações.

7.ª

O pagamento dos 7.200:000$000 réis a que se refere a base 5.ª effectuar-se-ha em moeda corrente, ouro ou prata, e em duas prestações iguaes, a primeira entregue no dia da assignatura do contrato com o concessionario, e a segunda no praso imperogavel de sessenta dias a contar d'aquelle dia.

A falta de pagamento de qualquer das duas prestações, importa a rescisão definitiva e immediata do contrato nos termos absolutos da base 16.ª

8.ª

O concessionario do exclusivo obrigar-se-ha, emquanto durar a concessão, ao pagamento integral, até ao dia 10 de cada mez, de um doze avos de renda annual porque lho for feita a adjudicação, correspondente ao mez immediatamente anterior.

9.ª

O concessionario do exclusivo fica mais obrigado:

1.° A partilhar os seus lucros liquidos com o estado e com o pessoal operario, pela fórma seguinte:

Os lucros liquidos do concessionario, tendo previamente em consideração, no calculo, a deducção da annuidade para amortisar 7.200:000$000 réis em dezeseis annos á taxa de 5 por cento serão partilhados em partes iguaes entre o estado e o concessionario depois de deduzidos 5 por cento para fundo de reserva, 5 por cento para operarios, 1 por cento para o pessoal não operario e 10 por cento para dividendo de um capital de laborarão na importancia de 3.500:000$000 réis.

Estes lucros a partilhar com o pessoal operario, não operario e com o estado, serão liquidados e pagos no praso maximo de seis mezes a contar do fim do anno a que elles se referirem.

2.° A manter e conservar, pelo menos, duas fabricas uma em Lisboa e outra no Porto, por forma que os actuaes operarios não sejam deslocados, podendo, para satisfazer ás necessidades do consumo, abrir novas estações de fabrico, de accordo com o governo, mas sempre organisadas em boas condições hygienicas e de perfeição de trabalho.

3.º A receber, para lhe dar o destino conveniente, todo o tabaco de tomadias, entregando ao estado metade do valor das gratificações que actualmente pertencem aos agentes do governo por kilogramma de tabaco apprehendido, e ficando a cargo do thesouro o pagamento integral d'essas mesmas gratificações.

4.° A conservar, durante a vigencia do seu contrato, na caixa geral de depositos, para garantir o pagamento das multas, que lho possam ser impostas, um deposito de réis 50:000$000 reaes, em titulos de divida publica pela sua cotação no mercado, de que receberá o respectivo juro.

5.° A entregar ao governo no dia em que findar a concessão, das marcas que o mesmo governo lhe indicar, com uma antecedencia de tres annos, de entre as que habitualmente se fabriquem, um peso de tabacos manipulados não inferior a 1:500 toneladas. O governo pagará estes tabacos pelo preço corrente de vencia, deduzidos 15 por cento para commissões aos vendedores por grosso e a retalho.

Este pagamento effectuar-se-ha em duas prestações iguaes, a primeira no dia em que findar a concessão do arrematante e a segunda sessenta dias depois d'aquelle dia.

6.° A conservar todos os operarios e empregados, que se achavam era serviço da administração sem dos tabacos em 15 de maio de 1890, não podendo despedil-os sem motivo justificado, reconhecido pela commissão a que se refere a base 10.ª, ou julgado por sentença judicial.

7.° A manter para os operarios de que falla o numero anterior, a ultima tabella datada de 15 de março de 1890, reguladora dos salarios, elaborada pela administração geral dos tabacos. Creando-se marcas novas, fixar-se-hão para o referido pessoal salarios proporcionaes.

Qualquer modificação n'esta tabella de 15 de março de 1890 não será posta em execução sem previa approvação do governo, sobre parecer do commissario regio respectivo.

Ao pessoal não operario o que o mesmo n.° 6 allude serão garantidos os vencimentos, que percebiam ao tempo da apresentação no parlamento da proposta de fazenda n.° 2, do 14 do maio de 1890.

8.° A satisfazer, durante todo o tempo da concessão, ao pessoal operario e não operario os encargos do legado de João Paulo Cordeiro, calculados como o foram pela administração geral dos tabacos.

9.° A organisar no praso de seis mezes, a contar do dia em que tomar posse da administração do exclusivo, os regulamentos:

a) Que definam as condições de serviço inferno e trabalho dos operarios, penas disciplinares e motivos de suspensão e despedida;

b) Que determinem as condições em que continuará a

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manter-se e a conservar-se a caixa de reformas para o pessoal operario e não operario, organisada pela administração geral dos tabacos;

c) Que estabeleçam as condições em que ficara subsistindo a caixa de soccorros, tambem creada pela administração geral dos tabacos.

N'estes regulamentos o concessionario attenderá os direitos adquiridos; a que o dia de trabalho para os operarios, continúa sendo de oito horas garantidas; a que o governo concorrerá com 10:000$000 réis, annualmente, para a caixa de reformas, ficando a cargo d'elle concessionario, como condição obrigatoria, dotar a mesma caixa, pelo menos, com igual quantia; e a que 2 por cento dos lucros liquidos pertencentes ao pessoal operario, bem como 0,5 por cento da parte dos mesmos lucros destinados ao pessoal não operario, as quotas individuaes e outras receitas disponiveis, constituirão o fundo da caixa de soccorros.

Estes regulamentos só depois de approvados pelo governo, no praso maximo de dois mezes, poderão ser postos em execução.

Provisoriamente, emquanto o concessionario não os elaborar e o governo não os approvar, ficarão em vigor os regulamentos da administração geral dos tabacos de 12 de janeiro de 1889 sobre trabalho nas fabricas e sobre saude e beneficencia na parte relativa a estes assumptos e que for applicavel.

10.° A garantir aos antigos depositarios, vendedores por grosso, vendedores a retalho e revendedores, a que se refere o § 5.° da base 9.ª da lei de 22 de maio de 1888, um regular abastecimento e commissões ou descontos não inferiores a 10 por cento, sempre que elles continuem a prestar regularmente as suas contas.

Aos antigos depositarios e vendedores por grosso, acima referidos, serão ainda garantidos, a mais dos 10 por cento, descontos progressivos, em relação á importancia, das compras realisadas em cada trimestre, desde o minimo de 2 por cento para aquelles que, em tres mezes, comprarem 3:000$000 réis de tabacos, até ao maximo de 5 por cento para os que elevem a mais de 45:000$000 réis os seus fornecimentos trimestraes.

11.° A consumir todos os annos no fabrico tabacos da região do Douro, até ao maximo de 20 por cento, em peso, da totalidade do consumo no continente do reino, relativo ao anno immediamente anterior.

Os cultivadores de tabacos do Douro, n'uma epocha do anno, préviamente determinada, conduzirão os tabacos colhidos para dois depositos, um, situado na Regua e o outro no Pinhão, procedendo-se em seguida, por conta do estado e sob a direcção de um pessoal habilitado devidamente, nacional ou estrangeiro, ás operações de seccagem e fermentação d'esses tabacos.

O concessionario será obrigado a pagar um bonus de 100 réis por kilogramma de tabaco do Douro, a mais do preço mercantil que lhe for estipulado, exceptuando-se o tabaco deteriorado ou que for considerado como refugo.

Quaesquer duvidas sobre a venda o acquisição dos tabacos da região do Douro, serão resolvidas por arbitros, sendo um nomeado pelo vendedor, outro pelo concessionario e o terceiro escolhido pelas duas partes, e não concordando estas, nomeado pelo governo.

10.ª

O concessionario do exclusivo terá direito:

1.° De usufruir a concessão pelo tempo fixo do dezeseis annos, a contar do dia em que se lavrar o respectivo termo de entrega na administração geral dos tabacos.

Exceptua-se o caso de rescisão previsto n'estas bases.

Não é permittido ao concessionario trespassar a concessão sem previa auctorisação do governo.

2.° Do importar, livre de direitos, todo o tabaco em rama, machinismos e seus accessorios e bem assim materias primas, excepto papel, de que precise para a industria do fabrico dos tabacos.

3.° De licenciar, sem vencimento, uma parte do pessoal operario e não operario, a que se refere o n.° 6.° da base 9.ª, mas nunca em numero supeiior a metade d'esse mesmo pessoal em activo serviço no fabrico dos tabacos, e sempre de accordo com o governo, que tomará a seu cargo dar provisoria e temporariamente trabalho nas officinas do estado aos operarios e serviço nas repartições publicas aos empregados licenciados, todas as vezes que sobrevierem circumstancias excepcionaes, como guerra ou epidemia intensa no continente do reino ou analoga calamidade geral, que diminua consideravel e extraordinariamente o consumo.

N'este caso o concessionario terá direito tambem a uma diminuição na importancia da renda fixa, a que se referem as bases 5.ª e 8.ª, exactamente durante o tempo que durar a calamidade, mas nunca superior a metade da renda mensal, que é obrigado a pagar em cada mez e, dentro d'este limite, na proporção do desfalque extraordinario havido no consumo.

A compensação, sem juros, effectuar-se-ha por encontro nos pagamentos dos mezes subsequentes, depois de se ter devidamente averiguado e comprovado a existencia de causa acima referida e determinado o numero de mezes da sua duração.

4.° De receber do estado, todos os mezes, por encontro com o pagamento das prestações mensaes da renda fixa annual, a importancia dos direitos de importação sobre tabacos manipulados, cobrados nas alfandegas do continente do reino.

Exceptuam-se os direitos dos tabacos manipulados importa-los por conta do concessionario, quaesquer augmentos sobre os direitos em vigor no dia em que esta lei comece a ter execução, e bem assim os emolumentos, taxas, ou direitos estatisticos.

O concessionario fica tambem obrigado a pagar ao estado o imposto de licença em vigor de 40 réis por kilogramma de tabaco, que vender, o qual cobrara dos cobradores.

Igual direito se cobrará nas alfandegas do continente, para o estado, sobre o tabaco estrangeiro manipulado, que for importado.

Os direitos de importação de tabaco cobrados nas alfandegas das ilhas adjacentes e do ultramar pertencerão sempre ao estado.

5.° De gratificar, de accordo com o governo, o pessoal da guarda fiscal, empregado na repressão do contrabando, e de pedir, sempre que assim o julgue necessario, o augmento de guardas mediante a mensalidade, por cada um, de 11^000 réis.

6.° De nomear agentes especiaes de sua confiança para promover a descoberta e a fiscalisação do contrabando.

Estes empregados do concessionario, quando ajuramentados, terão para todos os effeitos o caracter, as garantias e responsabilidades de agentes da auctoridade publica, não lhes sendo, comtudo, permittido prender, nem levantar autos, pois que a repressão do contrabando continuara pertencendo em absoluto á fiscalisação do estado, mas podendo requisitar a assistencia e o auxilio dos agentes do governo, sempre que assim se torne necessario.

7.° De estabelecer para a venda dos tabacos fabricados, em harmonia com o desenvolvimento do consumo, os preços que julgar por mais convenientes á prosperidade do seu commercio, mas dentro do limite maximo que em seguida vae determinado.

O concessionario não poderá nunca, em relação ás marcas actuaes da administração geral dos tabacos, ou a outras marcas novas, introduzidas no consumo, elevar, durante os dezeseis annos da concessão, o preço de venda em mais de 20 por cento, em media, do preço por que actualmente é exposto ao consumo um determinado peso e qualidade do tabaco.

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11.ª

O concessionario quando, nas epochas normaes, reconheça a existencia de um excesso de pessoal operario, poderá licencial-o de accordo com o mesmo pessoal, ou satisfazendo a cada operario dois terços do seu salario medio.

12.ª

Se se resolver, terminado o praso d'esta concessão, continuar na arrematação do exclusivo em concurso publico, o concessionario terá o direito de preferencia n'esse concurso, em igualdade de circumstancias.

13.ª

O concessionario gosará do direito de isenção do pagamento da contribuição industrial e o do de qualquer outra directa, excepto a predial, por todo o tempo que durar a concessão.

14.ª

Organisado pela administração geral dos tabacos o balanço relativo ao dia em que se effectuar o trespasse do exclusivo, pesára immediatamente para o concessionario:

Como activo e pelo valor no referido balanço:

1.° Todos os predios e fabricas pelo valor da sua acquisição.

2.º Todos os utensilios e machinismos pelo valor da sua acquisição.

3.º As letras a cobrar.

4.° As contas dos compradores de tabacos e respectivos saldos.

5.° As contas dos recebedores e os seus saldos.

6.° As contas em liquidação e os seus saldos.

7.º As contas de tabacos á consignação e os seus saldos.

8.° As contas de emprestimos a empregados e os seus saldos.

9.° As contas de devedores geraes e os seus saldos.

10.° Os tabacos manipulados em deposito nas recebedorias e em Lisboa e Porto pelo seu preço de venda, deduzidos 68 por cento.

11.° As materias primas em deposito nos armazens geraes.

12.° As materias primas em via de manipulação nas fabricas.

E como passivo, ainda pelo seu valor no mesmo balanço:

13.° As letras a pagar, excepto á fazenda.

14.° As dividas aos fornecedores.

15.° As dividas aos credores geraes.

16.° Os valores depositados pelos empregados na caixa economica.

17.° As dividas aos delegados districtaes.

18.° Os depositos dos licitantes.

A differença entre o activo e o passivo fixa-se em réis 2.700:000$000 para o dia em que tiver logar a posse do concessionario, indemnisando-o o governo de qualquer differença a menos e recebendo o estado o excesso, se o houver. Este pagamento, quer seja do governo quer do concessionario, effectuar-se-ha, por uma só vez e sem juros, no praso maximo de sessenta dias.

Quaesquer duvidas levantadas pelo concessionario em relação ao balanço organisado nos termos d'esta base e aos valores por que foram adquiridos os bens moveis e immoveis, ou por que n'elle figuram quaesquer saldos descriptos, serão resolvidas na conformidade do disposto na base 17.ª sem que comtudo a sua resolução definitiva possa impedir a execução do contrato.

Fica de conta do estado o deposito dos herdeiros de João Paulo Cordeiro para garantia do litigio pendente e a final liquidação d'esse processo. Tambem ficam de conta do estado as liquidações finaes das fabricas expropriadas, que ainda estiverem pendentes.

15.ª

O concessionario fica sujeito ao pagamento de multas e á rescisão da concessão pelas faltas ou abusos praticados em contravenção das disposições d'estas bases, podendo recorrer, sem effeito suspensivo, para o tribunal arbitrai, a que se refere a base 17.ª

A multa desde 2:000$000 réis a 9:000$000 réis será imposta:

a) Quando o concessionario se recusar a patentear a sua escripturação commercial ao director geral de contabilidade publica logo que o governo lhe incumba de proceder a esse exame, bem como a sua escripturação fabril aos commissarios régios ou qualquer parte dos seus estabelecimentos fabris aos agentes do governo;

b) Quando faltar ao pagamento mensal da renda, nos termos indicados na base 8.ª, ou ainda da quota parte dos lucros liquidos, pertencentes ao estado, aos operarios e aos empregados, e a que se refere o n.° 1.° da base 9.ª, nos seis mezes seguintes ao anno a que esses lucros pertencem, praso dentro do qual elles serão liquidados.

Em todos os outros casos de falta de cumprimento do concessionario, das condições e obrigações exaradas n'estas bases, serão applicaveis multas de 500$000 réis a 2:000$000 réis.

As multas não alliviam o concessionario do pagamento dos juros da mora, a 6 por cento, pelas quantias em divida ao estado.

A rescisão do contrato terá logar:

c) Quando o concessionario falte, seguidamente, a tres pagamentos mensaes da renda estipulada;

d) Quando o concessionario, durante o anno, falte a quatro pagamentos interpollados da mesma renda;

e) Quando o concessionario falte a dois pagamentos seguidos da quota parte dos lucros liquidos pertencentes ao estado ou ao pessoal operario e não operario;

f) Quando ao concessionario forem definitivamente applicadas seis multas até 2:000$000 réis, no periodo de dois annos;

g) Quando, no mesmo periodo de tempo, forem definitivamente applicadas ao concessionario tres muitas superiores a 2:000$000 réis.

h) Quando o concessionario abandonar a exploração da industria do fabrico dos tabacos.

16.ª

Rescindida a concessão, o estado entrara na posse immediata das fabricas e suas dependencias, dos machinismos e utensilios, das materias primas armazenadas e em via de manipulação e dos tabacos manipulados em deposito, sem que o concessionario tenha direito a qualquer indemnisação nem a alguma restituição por conta dos 7.200:000$000 réis por elle entregues nos termos das bases 5.ª e 7.ª ou por conta de qualquer outra quantia por elle já paga ao estado e sem responsabilidade alguma para o mesmo estado por quaesquer dividas pelo concessionario contrahidas.

17.ª

As duvidas entre o concessionario e o governo serão resolvidas por um tribunal arbitral, composto de cinco membros.

Dois d'estes arbitros serão nomeados pelo concessionario, dois pelo governo e o quinto pelo supremo tribunal de justiça.

O tribunal arbitrai funccionará no edificio do supremo tribunal de justiça, servindo de escrivão o secretario do tribunal. No processo seguir-se-hão os termos do processo civil ordinario, não sendo permittida inquirição de testemunhas nem outra diligencia, que dependa de carta de ordem ou rogatoria, e não podendo o processo saír do tribunal senão a final para conclusão aos juizes arbitros.

As duvidas entre o concessionario e quaesquer depositarios, vendedores e revendedores, serão concedidas por arbitros, sendo um nomeado pelos reclamantes, outro pelo concessionario, e servindo de arbitro por parte do governo o

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commissario regio respectivo. D'essa decisão ha recurso para um tribunal composto dos auditores fiscaes de segunda instancia e primeira de Lisboa, presidido pelo ministro da fazenda.

19.ª

As duvidas entre o pessoal operario e mão operario e o concessionario serão resolvidas respectivamente por uma commissão presidida sempre pelo commissario regio respectivo, e composta de dois delegados nomeados pelos operarios ou pelos empregados reclamantes e outros dois escolhidos pelo concessionario. D'essas decisões ha recurso para o tribunal de que trata a base anterior.

20.ª

O governo fará annunciar com a maior publicidade, antes de terminar o praso da concessão do exclusivo, se entende por conveniente passar ao regimen da liberdade de fabrico, se assim lhe for requerido, as quaes não poderão, comtudo, começar os trabalhos de fabricação sem findar o praso do contrato com o concessionario.

Nas fabricas que laborarem nesse regimen da liberdade, organisar-se-hão caixas de reformas subsidiadas pelo estado, e caixas de soccorros em condições taes que o pessoal operario e não operario a que se refere o n.° 6.° da base 9.ª possa auferir no novo regimen as mesmas vantagens que lhe eram concedidas pelo concessionario do exclusivo.

O pessoal não operario, actualmente em serviço na administração da régie, que não obtiver collocação nas novas fabricas, passará para o serviço do estado.

As mesmas fabricas não poderão admittir novos operarios emquanto estiverem sem collocação alguns dos existentes no serviço de administração geral dos tabacos em 15 de maio de 1890.

Os encargos que restarem do legado de João Paulo Cordeiro, quando terminar a concessão do exclusivo, ficarão a cargo do estado. Mas as fabricas que entrarem em laboração indemnisarão o estado d'esta empreza, dividindo entre si o encargo, proporcionalmente á producção fabril de cada uma.

Estas mesmas fabricas obrigar-se-hão a comprar ao estado os tabacos manipulados a que se refere o n.° 5.° da base 9.ª pelos preços por que o estado os adquirir e na proporção da sua producção provavel.

21.ª

No caso de continuar o regimen do exclusivo, quer na administração do estado, quer de particulares, o pessoal operario e não operario, actualmente ao serviço da administração geral dos tabacos, que existir n'essa data, continuara a gosar das vantagens que lhe confere esta lei. As fabricas, utensilios, machinismos, depositos de materias primas em ser e em via de manipulação, passarão para o estado ou para o futuro concessionario no dia em que findar o praso da concessão, e serão expropriados por utilidade publica, conforme as avaliações, feitas por peritos, a que se proceder. Quaesquer contestações sobre essas avaliações serão decididas por um tribunal arbitral, funccionando nos termos indicados na base 17.ª e composto de cinco arbitros, sendo dois nomeados por cada um dos interessados e o quinto pelo supremo tribunal de justiça.

No caso do exclusivo administrado por particulares, os tabacos manipulados a que se refere o n.° 5º da base 9.ª serão pagos pelo novo concessionario pelo preço por que o estado os adquirir.

22.ª

O concessionario para promover o augmento do consumo e venda dos productos que fabricar, póde offerecel-os ao publico por agentes seus fixos ou ambulantes, sem prejuizo do disposto na base 9.ª n.° 10.° Os recebedores de comarca e seus propostos, mediante commissão paga pelo concessionario, poderão ser empregados como depositarios de tabacos para venda, se aquelle assim o requerer.

23.ª

Fica prohibido o despacho para consumo do tabaco em rama, talo, rolo, ou outra fórma não manufacturada, a não ser feito pelo concessionario para as suas fabricas.

Os direitos sobre tabacos manufacturados, despachados para consumo nas alfandegas do continente do reino serão: para charutos 4$500 réis, para tabacos manipulados em quaesquer outras especies e talo picado 4$500 réis por kilogramma, ficando por esta fórma alterados os n.ºs 258.° e 259.° da classe 11.ª da pauta A das alfandegas, em vigor.

24.ª

Para segurança dos operarios e garantir as vantagens já mencionadas, para fiscalisar o exacto cumprimento das condições impostas nestas bases e para representar o governo nas suas relações com o concessionario, haverá dois commissarios regios funccionando junto das fabricas de Lisboa e Porto e os mais empregados que forem julgados necessarios para os coadjuvar, ficando a cargo do concessionario a respectiva despeza, que não poderá exceder 600$000 réis mensaes.

25.ª

O governo continuara a manter em serviços de fiscalisação pelo menos quatro mil e quinhentos homens, e a abonar gratificações eficazmente remuneradoras das apprehensões de tabaco.

Os tabacos manufacturados despachados para consumo não poderão sair da alfandega respectiva sem que em cada um dos volumes, massos ou caixas, como são expostos á venda a retalho, seja collada uma estampilha, distinctiva, feita na casa da moeda, devendo ainda cada um dos envolucros conter, em numeros visiveis, a designação do peso com que é exposto á venda a retalho.

26.ª

O tabaco manufacturado no continente do reino continuara a gosar á entrada nas provincias ultramarinas do beneficio de um direito differencial, conforme se acha estabelecido nos artigos 1.° e 2.° do decreto publicado pelo ministerio da marinha de 1 de dezembro de 1887, actualmente em vigor.

27.ª

A cobrança coerciva dos creditos do concessionario, pela venda dos tabacos, poderá ser feita nos mesmos termos que a das dividas ao estado por contribuições directas.

28.ª

O concessionario poderá fabricar tabacos para exportação, sujeitando-se ao que for disposto para este fim nos regulamentos respectivos.

O tabaco manufacturado no estrangeiro, que for exportado do continente do reino para as ilhas adjacentes pagará ali, ao ser despachado para consumo, o mesmo direito como se fosse importado de outra qualquer proveniencia.

O tabaco manufacturado nas ilhas adjacentes, ao entrar no continente do reino pagará os mesmos direitos como se fosse estrangeiro menos 10 por cento.

O tabaco manufacturado no continente do reino e importado nas ilhas adjacentes, pagara os direitos correspondentes ao tabaco estrangeiro menos 10 por cento d'esses mesmos direitos.

29.ª

Fica o governo auctorisado a fazer os regulamentos necessarios para a execução d'estas bases.

Sala das sessões da commissão de fazenda da camara dos senhores deputados da nação, em de junho de 1890. = Manuel Pinheiro Chagas = Manuel d'Assumpção = José de Azevedo Castello Branco = Adolpho Pimentel = José Dias Ferreira (vencido) = Antonio José Lopes Navarro = Arthur

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1128 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Alberto de Campou Henriques = Abilio Eduardo da Costa Lobo = Arthur Hintze Ribeiro = Sergio de Castro = Jacinto Candido = Urbano de Castro = José de Castro = J. M. dos Santos = A. Carrilho = L. Malheiro = Antonio Arroyo = Luciano Cordeiro = Antonio de Azevedo Castello Branco = José Lobo do Amaral = Pedro Viciar da Costa Sequeira, relator.

N.º 113-I

Artigo 1.° É o governo auctorisado a adjudicar, em concurso publico, o exclusivo da fabricação dos tabacos, no continente do reino, actualmente na administração do estado, em harmonia com as bases, que fazem parte d'esta lei e a ella vão annexas.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, em 14 de maio de 1890. = João Ferreira Franco Pinto Castello Branco.

Bases a que se refere a lei datada de hoje e que d'ella fazem parte

1.ª Pelo ministerio da fazenda e repartição do gabinete se annunciará, pelo menos com trinta dias de antecedencia e com a maior publicidade, no paiz e no estrangeiro, a abertura do concurso para a adjudicação do exclusivo do fabrico dos tabacos.

Os respectivos annuncios darão conhecimento circumstanciado e completo do programma do mesmo concurso, em harmonia com estas bases, e mencionarão as formalidades necessarias para a admissão dos concorrentes.

2.ª O concurso estará aberto durante o praso de trinta dias.

O contrato definitivo com a empreza ou individuo adjudicatario, far-se-ha dentro do praso maximo de um mez, a contar do dia em que se proceder á abertura das propostas dos licitantes.

3.ª Para ser admittido ao concurso é preciso provar que se effectuou um deposito, na caixa geral dos depositos, de 200:000$000 réis em dinheiro, ou em titulos da divida publica pela sua cotação no mercado.

O adjudicatario elevará ao dobro este deposito, no acto da assignatura do contrato, e só poderá levantal-o depois de satisfeito o encargo a que se refere a base 7.ª

Os outros concorrentes poderão levantar os seus depositos logo que o governo, tenha resolvido sobre a adjudicação.

4.ª O concurso effectuar-se-ha perante uma commissão composta:

Do ministro dos negocios da fazenda, que será o presidente;

E dos vogaes:

O presidente do supremo tribunal de justiça;

O presidente do supremo tribunal administrativo;

O presidente do tribunal de contas;

O director geral da contabilidade publica;

O director geral da thesouraria;

E o administrador geral dos tabacos.

O governo reserva-se o direito de em conselho de ministros, não fazer a adjudicação se assim o entender por conveniente.

5.ª A unica e exclusiva base de licitação no concurso será o pagamento de uma renda fixa, em prestações mensaes e em moeda de oiro e prata corrente n'este reino, de um minimo de 4.250:000$000 réis annuaes.

Terá a preferencia entre os concorrentes, admittidos a licitar, aquelle que offerecer mais elevada renda, superior ao minimo estabelecido.

6.ª A sociedade, parceria ou individuo a quem for adjudicado o exclusivo fica obrigado a constituir uma empreza, nacional ou nacionalisada, com a maioria da sua direcção e conselho fiscal formada por cidadãos portuguezes, sem dependencia de conselhos (comités) estrangeiros. Se a minoria da direcção for composta por cidadãos estrangeiros, e residentes fóra de Portugal, poderá ella reunir-se e deliberar separadamente, mas as suas resoluções, para produzirem effeitos, carecem de ser ratificadas e confirmadas pela maioria portugueza.

Os estatutos da empreza concessionaria têem de ser approvados pelo governo, que, ouvida a procuradoria da corôa, póde dispensar a applicação do codigo commercial.

7.ª O concessionario do exclusivo fica obrigado a reembolsar o estado da quantia de 7.200:000$000 réis, por elle levantados para a expropriação das antigas fabricas de tabaco e para a installação do fabrico por conta do mesmo estado.

O pagamento d'esta quantia effectuar-se-ha em duas prestações iguaes dentro do praso improrogavel de sessenta dias, a contar da assignatura do contrato. A falta de pagamento do qualquer das prestações importa a rescisão definitiva e immediata do contrato nos termos absolutos da base 16.ª

8.ª O concessionario do exclusivo obrigar-se-ha, emquanto durar a concessão, ao pagamento integral, até ao dia 10 de cada mez, de um doze avos da renda annual por que lhe foi feita a adjudicação, correspondente ao mez immediatamente anterior.

O concessionario do exclusivo fica, mais, obrigado:

9.ª 1.° A partilhar os seus lucros liquidos com o pessoal operario e não operario e com o estado pela fórma seguinte:

Dos lucros liquidos, consideradas as amortisações em dezeseis annos ao juro de 5 por cento, deduzidos 5 por cento para fundo de reserva, 5 por cento para os operarios, 1 por cento para o pessoal não operario e 10 por cento do capital de laboração empregado, para dividendo, o restante será partilhado na rasão de dois terços para o concessionario e um terço para o estado.

2.° A manter e conservar, pelo menos, duas fabricas em Lisboa e no Porto, por fórma que os actuaes operarios não sejam deslocados, podendo, para satisfazer ás necessidades do consumo, abrir novas estações de fabrico, de accordo com o governo, mas sempre organisadas em boas condições hygienicas e de perfeição de trabalho.

3.° A produzir e vender, sem augmento nos preços correntes actualmente, as marcas adoptadas pela administração geral dos tabacos, e em harmonia com as exigencias do consumo, com excepção das marcas especiaes destinadas para a setima secção da zona fiscal, podendo fabricar e entregar ao consumo quaesquer outras marcas nas condições que julgar por mais convenientes.

4.° A conservar, durante a vigencia do seu contrato, na caixa geral de depositos, um deposito de 100:000$000 réis reaes, ou o correspondente valor em dinheiro, para garantir o pagamento das multas, que lhe possam ser impostas. Se este deposito for em titulos da divida publica, receberá o concessionario o respectivo juro, se for em dinheiro abonar-se-lhe-ha o juro medio da divida fluctuante.

5.° A entregar ao governo no dia que findar a concessão, das marcas que o mesmo governo lhe indicar com uma antecedencia de tres annos, igual numero de toneladas de tabacos manipulado aquelle que, na occasião de tomar posse do exclusivo, lhe for trespassado pela administração geral dos tabacos.

Esse peso de tabacos manipulados, a entregar no fim da concessão, não será nunca inferior a mil e quinhentas toneladas e o governo pagara estes tabacos ao concessionario pelo seu preço da venda ordinario.

6.° A conservar todos os operarios e empregados, que passaram para o serviço da administração geral dos tabacos, não- podendo despedil-os sem motivo justificado, reconhecido pela commissão a que se refere a base 19.ª, ou julgado por sentença judicial.

7.° A manter para os operarios de que falla o numero anterior, a ultima tabella, reguladora dos salarios, elaborada pela administração geral dos tabacos. Creando-se marcas

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novas, fixar-se-hão para o referido pessoal salarios proporcionaes.

Qualquer modificação n'esta tabella não será posta em execução sem previa approvação do governo, sob parecer do commissario regio respectivo.

8.° A satisfazei, durante todo o tempo da concessão, ao pessoal operario e não operario os encargos do legado de João Paulo Cordeiro.

9.° A organisar no praso de tres mezes, a contar do dia em que tomar posse da administração do exclusivo, os regulamentos:

a) Que definam as condições de serviço interno e trabalho dos operarios, penas disciplinares e motivos de suspensão e despedida;

b) Que determinem as condições em que continuará a manter-se e a conservar-se a caixa de reformas para o pessoal operario e não operario, organisada pela administração geral dos tabacos;

c) Que estabeleçam as condições em que ficará subsistindo a caixa de soccorros, tambem creada pela administração geral dos tabacos.

N'estes regulamentos o concessionario attenderá os direitos adquiridos; a que o dia de trabalho para os operarios continua sendo o fixado na base 3.ª § 3.° da lei de 22 de maio de 1888; a que o governo concorrerá com réis 10:000$000 annualmente, para a caixa de reformas, ficando a cargo d'elle concessionario, como condição obrigatória, dotar a mesma caixa, pelo monos, com igual quantia; e a que 2 por cento dos lucros liquidos pertencentes ao pessoal operario, bem como 0,5 por cento da parte dos mesmos lucros destinados ao pessoal não operario, as quotas individuaes o outras receitas disponiveis, constituirão o fundo da caixa de soccorros.

Estes regulamentos só depois de approvados pelo governo poderão ser postos em execução.

Provisoriamente, emquanto o concessionario não os elaborar e o governo não os approvar, ficarão em vigor os regulamentos da administração geral dos tabacos de 12 de janeiro de 1889 sobre trabalho nas fabricas e sobre saude e beneficencia na parte relativa a estes assumptos e que for applicavel.

10.° A garantir aos antigos vendedores de tabacos, a que se refere o § 5.° da base 9.ª da lei de 22 de maio de 1888, um regular abastecimento e commissões não inferiores a 10 por cento, sempre que elles continuem a prestar regularmente as suas contas.

11.° A empregar no fabrico 20 por cento de tabacos nacionaes, sendo em regra 10 por cento de tabacos do Douro, 5 por cento das ilhas e 5 por cento das colonias.

O governo, conforme as circumstancias, poderá estabelecer, para cada anno, uma diversa distribuição da acima indicada, especialmente quando por falta de producção não se possa satisfazer ao fornecimento nas referidas percentagens.

O tabaco do Douro terá um bonus em harmonia com o disposto nas leis de 12 de março de 1884 e 28 de abril de l880.

As duvidas sobre os preços dos tabacos nacionaes serão resolvidas por arbitros, sendo um nomeado pelo vendedor, outro pelo concessionario, servindo de arbitro, por parte do governo, o presidente do tribunal do commercio do Porto.

10.ª O concessionario do exclusivo terá direito:

1.° De usufruir a concessão pelo tempo fixo de dezeseis annos, a coutar do dia em que se lavrar o respectivo termo do entrega na administração geral dos tabacos.

Exceptua-se o caso de rescisão previsto n'estas bases.

Não é permittido ao concessionario trespassar a concessão sem previa auctorisação do governo.

2.° De importar, livre de direitos, todo o tabaco em rama e outras materias primas, excepto papel, de que precise para a industria do fabrico dos tabacos.

3.° De licenciar sem vencimento uma parte do pessoal operario e não operario, sempre de accordo com o governo, que tomara as necessarias providencias para dar trabalho a esses operarios e empregados licenciados, quando sobrevenham circumstancias de força maior, que diminuam consideravelmente o consumo, como seria uma epidemia geral no continente do reino, uma guerra ou outro acontecimento similhante.

4.° De receber do estado, em prestações trimestraes, a importancia dos direitos de importação sobre tabacos manipulados. Esses direitos não serão nunca inferiores aos designados na pauta geral das alfandegas, hoje em vigor.

Exceptuam-se os direitos de tabacos manipulados, importados por conta do concessionario, os augmentos sobre os direitos actuaes, e bem assim os emolumentos, taxas, licenças ou direitos estatisticos.

5.° De gratificar, de accordo com o governo, o pessoal da guarda fiscal, empregado na repressão do contrabando, e de pedir, sempre que assim o julgue necessario, o augmento de guardas mediante a mensalidade, por cada um, de 11$000 réis.

11.ª O concessionario, quando, nas epochas normaes, reconheça a existencia de um excesso de pessoal operario e não operario, poderá licencial-o de accordo com o mesmo pessoal, ou empregal-o, em Lisboa e Porto, de accordo com o governo, no serviço de outras industrias, exercidas por conta do mesma concessionario.

N'este caso o pessoal operario será tambem interessado em 5 por cento dos lucros d'essas industriasse o pessoal não operario em 1 por cento, sem prejuizo das outras vantagens e garantias que tenham na industria do fabrico dos tabacos.

12.ª Se se resolver, terminado o praso desta concessão continuar na arrematação do exclusivo em concurso publico, o concessionario terá o direito de preferencia n'este concurso, em igualdade de circumstancias.

13.ª O concessionario gosará do direito de isenção do pagamento da contribuição industrial e do de qualquer outra directa, excepto a predial, por todo o tempo que durar a concessão.

14.ª Organisado pela administração geral dos tabacos o balanço relativo ao dia em que se effectuar o trespasse do exclusivo, passará immediatamente para o concessionario:

Como activo e pelo valor no referido balanço:

1.° Todos os predios e fabricas.

2.° Todos os utensilios e machinismos.

3.° As letras a cobrar.

4.° As contas dos compradores de tabacos e respectivos saldos.

5.° As contas dos recebedores e os seus saldos.

6.° As contas em liquidação e os seus saldos.

7.° As contas de tabacos á consignação e os seus saldos.

8.° As contas de emprestimos a empregados e os seus saldos.

9.° As contas de devedores geraes e os seus saldos.

10.° Os tabacos manipulados em deposito nas recebedorias e em Lisboa e Porto pelo seu preço do venda.

11.° As materias primas em deposito nos armazens geraes.

12.° As materias primas em via de manipulação nas fabricas.

E como passivo, ainda pelo seu valor no mesmo balanço:

13.° As letras a pagar, excepto á fazenda.

14.° As dividas aos fornecedores.

15.° As dividas aos credores geraes.

16.° Os valores depositados pelos empregados na caixa economica.

17.° As dividas aos delegados districtaes.

18.° As dividas pelo imposto da licença de venda de tabaco.

19.° Os depositos dos licitantes.

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Sessenta e oito por conto do valor dos tabacos mencionados no n.° 10.° constituirá credito do concessionario sobre o thesouro, que por este será satisfeito em dezeseis prestações iguaes e annuaes, sem vencimento de juro.

A differença entre o activo e o passivo fixa-se em réis 2.700:000$000 para o dia em que tiver logar a posse do concessionario, indemnisando-o o governo em dinheiro de qualquer differença a menos e recebendo o estado o excesso se o houver em letras a cobrar. Quaesquer duvidas levantadas pelo concessionario em relação ao balanço organisado nos termos d'esta base, serão resolvidas na conformidade do disposto na base 17.ª

Fica do conta do untado o deposito dos herdeiros de João Paulo Cordeiro para garantia do litigio pendente e a final liquidação d'esse processo. Tambem ficam de conta do estado as liquidações finaes das fabricas expropriadas que ainda estiverem pendentes.

15.ª O concessionario fica sujeito ao pagamento de multas e á rescisão da concessão pelas faltas ou abusos praticados em contravenção das disposições d'estas bases, podendo recorrer, sem effeito suspensivo, para o tribunal arbitral, a que se refere a base 17.ª

A multa desde 2:000$000 a 9:000$000 de réis será imposta:

a) Quando o concessionario se recusar a patentear a sua escripturação ou qualquer parte dos seus estabelecimentos fabris aos agentes do governo;

b) Quando faltar ao pagamento mensal da renda, nos termos indicados na base 8.ª, ou ainda da quota parte dos lucros liquidos, pertencentes ao estado e a que se refere o n.° 1.° da base 9.ª, nos seis mezes seguintes ao anno a que esses lucros pertencem e tiverem sido liquidados.

Em todos os outros casos de falta do cumprimento do concessionario, das condições e obrigações, exaradas n'estas bases, serão applicaveis multas de 500$000 a 2:000$000 réis.

As multas não alliviam o concessionario do pagamento dos juros da móra, a 6 por cento, pelas quantias era divida ao estado.

A rescisão do contrato terá logar:

c) Quando o concessionario falto, seguidamente, a tres pagamentos mensaes da renda estipulada;

d) Quando o concessionario, durante o anno, falte a quatro pagamentos interpollados da mesma renda;

e) Quando o concessionario falte a dois pagamentos seguidos da quota parte dos lucros liquidos pertencentes ao estado;

f) Quando ao concessionario forem definitivamente applicadas seis multas até 2:000$000 réis, no periodo de dois annos.

g) Quando, no mesmo periodo de tempo, forem definitivamente applicadas ao concessionario tres multas superiores a 2:000$000 réis.

h) Quando o concessionario abandonar a exploração da industria do fabrico dos tabacos.

16.ª Rescindida definitivamente a concessão o estado entrara na posse immediata das fabricas e suas dependencias, dos machinismos e utensilios, das materias primas armazenadas e em via do manipularão e dos tabacos manipulados em deposito, som que o concessionario tenha direito a qualquer indemnização nem a alguma restituição por conta dos 7.200:000$000 reis, por elle entregue no acto da assignatura do contrato, conforme a base 7.ª

17.ª As duvidas entre o concessionario e o governo serão resolvidas por um tribunal arbitral, composto de cinco membros.

Dois d'estes arbitros serão nomeados pelo concessionario, dois pelo governo e o quinto pelo supremo tribunal de justiça.

O tribunal arbitral funccionará no edificio do supremo tribunal de justiça, servindo de escrivão o secretario do tribunal. No processo seguir-se-hão os termos do processo civil ordinario, não sendo permittida inquirição de testemunhas nem outra diligencia, que dependa de carta de ordem ou rogatoria, e não podendo o processo saír do tribunal senão a final para conclusão nos, juizes arbitros.

18.ª As duvidas entre o concessionario e quaesquer vendedores serão decididas
por arbitros, sendo um nomeado pelos vendedores reclamantes, outro pelo concessionario, e servindo de arbitro por parte do governo o commissario regio respectivo. D'essa decisão ha recurso para um tribunal composto dos auditores fiscaes de segunda instancia e primeira de Lisboa, presidido pelo ministro da fazenda.

19.ª As duvidas entre os operarios e o concessionario serão resolvidas por uma commissão presidida pelo commissario regio respectivo, e composta de dois delegados nomeados pelos operarios reclamantes e outros dois escolhidos pelo concessionario. D'essa decisão ha recurso para o tribunal de que trata a base anterior.

20.ª O governo fará annunciar com a maior publicidade, antes de terminar o praso de concessão do exclusivo, se entendo por conveniente passar ao regimen da liberdade do fabrico, permittindo n'este caso a construcção de novas fabricas, se assim lhe for requerido, as quaes não poderão, comtudo, começar os trabalhos de fabricação sem findar o praso do contrato com o concessionario.

Nas fabricas que laborarem n'esse regimen da liberdade, organisar-se-hão caixas de reformas subsidiadas pelo estado, e caixas de soccorros em condições taes que o pessoal operario e não operario possa auferir no novo regimen as mesmas vantagens que lhe eram concedidas pelo concessionario do exclusivo.

As mesmas fabricas não poderão admittir novos operarios emquanto estiverem sem collocação alguns dos existentes nas fabricas ao tempo da lei de 22 de maio de 1888.

Os encargos que restarem do legado de João Paulo Cordeiro, quando terminar a concessão do exclusivo, ficarão a cargo do estado. Mas as fabricas que entrarem em laboração indenmisarão o estado d'esta despeza, dividindo entro si o encargo proporcionalmente á producção fabril de cada uma.

Estas mesmas fabricas obrigar-se-hão a comprar ao estado os tabacos manipulados a que se refere o n.° 5 da base 9.ª pelos preços correntes de venda e na proporção da sua producção provavel.

21.ª No caso de continuar o regimen do exclusivo, quer na administração do estado, quer de particulares, as fabricas, utensilios, machinismos, depositos de materias primas em ser e em via de manipulação, passarão para o estado ou para o futuro concessionario no dia em que findar o praso da concessão e serão expropriados por utilidade publica conforme as avaliações, feitas por peritos, a que se proceder. Quaesquer contestações sobre estas avaliações serão decididas por um tribunal arbitrai, funccionando nos termos indicados na base 17.ª e composto de cinco arbitros, sendo dois nomeados por cada um dos interessados e o quinto pelo supremo tribunal de justiça.

No caso do exclusivo administrado por particulares, os tabacos manipulados a que se refere o n.° 5.° da base 9.ª serão pagos pelo novo concessionario pelo preço por que o estado os adquiriu.

22.ª O concessionario promoverá o augmento do consumo e venda dou productos que fabricar, podendo offerecel-os ao publico por agentes seus fixos ou ambulantes, sem prejuizo do disposto na base 9.ª n.° 10.° Os recebedores de comarca e seus propostos, mediante commissão paga pelo concessionario, poderão ser empregados como depositarios de tabacos para venda, se aquelle assim o requerer.

23.ª Fica prohibido o despacho para consumo do tabaco em rama, rolo, ou outra fórma não manufacturada, a não ser feito pelo concessionario para as suas fabricas.

24.ª Para segurança dos operarios e garantir as vantagens já mencionadas, para fiscalisar o exacto cumprimento

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das condições impostas n'estas bases e para representar o governo nas suas relações com o concessionario, especialmente no que respeitar á repressão do contrabando, haverá dois commissarios regios funccionando junto das fabricas de Lisboa e Porto e os mais empregados que forem julgados necessarios para os coadjuvar, ficando a cargo do concessionario a respectiva despeza, que não poderá exceder 600$000 réis mensaes.

25.ª O governo tomara providencias adequadas para evitar o contrabando, abonando gratificações eficazmente remuneradoras das apprehensões, recommendando o maior zêlo e cuidado no desempenho d'este serviço, e emfim empregando todos os meios ao seu alcance para a repressão do contrabando.

26.ª O tabaco manufacturado no continente do reino gosará á entrada nas provincias ultramarinas do beneficio de um direito differencial estabelecido por accordo entre o governo e o concessionario, suficientemente protector para poder competir com o tabaco estrangeiro manipulado.

27.ª A cobrança coerciva dos creditos do concessionario, pela venda dos tabacos, poderá ser feita nos mesmos termos que a das dividas ao estado por contribuições directas.

28.ª O concessionario poderá fabricar tabacos para exportação, sujeitando-se ao que for disposto para este fim nos regulamentos respectivos.

29.ª Fica o governo auctorisado a fazer os regulamentos necessarios para a execução d'estas bases.

Ministerio dos negocios da fazenda, 14 de maio de 1890. = João Ferreira Franco Pinto Castello Branco.

O sr. Presidente: - Este projecto tem uma só discussão, na generalidade e na especialidade.

O sr. José Maria de Alpoim (para uma questão prévia):- Leu a seguinte proposta:

«Proponho que haja uma discussão na generalidade e, na especialidade, uma discussão por grupos de bases, a saber:

«1.° Base 1.ª, 2.ª, 3.ª, 4.ª, 5.ª, 6.ª, 7.ª, 20.ª 23.ª, 26.ª

«2.° Base 8.ª, 9.ª, 28.ª

«3.° Base 10.ª, 11.ª, 12.ª, 13.ª, 14.ª, 16.ª, 21.ª, 22.ª

«4.° Base 15.ª, 17.ª, 18.ª, 19.ª, 24.ª, 25.ª = José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral = Fernando Pereira Palha = F. J. Machado = Roberto Alves = F. F. Dias Costa = E. J. Coelho.»

Apresentando esta proposta, no uso legitimo do seu direito, não tinha em vista fazer obstruccionismo.

Tinham-lhe repugnado tanto as scenas a que assistira em 1887, 1888 e 1889, e tanto desejava não ver o parlamento desprestigiado, que fizera o protesto de não se servir dos mesmos processos.

Havia de cumprir fielmente este protesto.

Não podia deixar de estranhar que um projecto d'esta magnitude fosse mettido na primeira parte da ordem do dia. Um projecto d'esta gravidade não podia discutir-se aos bocadinhos, intercalando-se com outro projecto tambem muito importante, como é o do addicional.

A sua proposta justificava-se com a simples leitura do projecto.

Não podiam englobar-se n'uma só discussão vinte e seis bases importantes e que têem muitos pontos de vista.

Por isso entendeu que não podia deixar de haver duas discussões, uma na generalidade, onde se derimissem quaesquer questões politicas, e outra, já não dizia por bases, mas por grupos de bases.

Esta discussão por bases era tanto mais necessaria quanto as alterações introduzidas no projecto pela commissão eram profundas.

E esta discussão, que naturalmente havia de ser acre, violenta, não podia deixar de ter toda a latitude.

Não podia deixar de se discutir largamente a questão financeira, porque se tratava de milhares de contos de réis.

Precisavam ter uma discussão ampla as condições concedidas ao arrematante, condições que podem dar logar a questões que annullem qualquer bem que do projecto possa advir.

As disposições do projecto relativas ao Douro tambem deviam ter uma discussão larga, porque como estão no projecto são uma irrisão.

Havia tambem um ponto importante que carecia de ser discutido com cuidado; referia-se aos cinco mil operarios empregados nas fabricas da régie.

Se ficasse nas mãos de um arrematante ganancioso o destruir as vantagens concedidas aos operarios por meio da régie, elles podiam reagir pela força.

Tambem defenderia a sua proposta com um argumento do auctoridade.

O sr. Franco Castello Branco, em 1888, empregara todos os recursos da sua voz, fallando até duas sessões sobre o modo de propor, para sustentar a proposta que fizera, a fim de que houvesse duas discussões sobre a proposta dos tabacos que o sr. Marianno de Carvalho então apresentára.

Havia, ainda assim, uma differença, e era que a proposta do sr. Marianno de Carvalho tinha dez bases e o projecto actual tem vinte e seis.

Redigíra, portanto, a sua proposta nos mesmos termos da do sr. Franco Castello Branco.

Pedia á maioria que, em nome dos interesses dos operarios, em nome dos interesses do Douro, e em geral em nome dos interesses do paiz, assim como para bem da dignidade e da coherencia do sr. ministro da fazenda, acceitasse a sua proposta.

(O discurso será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. haja revisto as notas tachygr-phicas.)

Foi lida na mesa a proposta do sr. José Maria de Alpoim.

Ficou em discussão.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco):- Sr. presidente, o illustre deputado que acaba de fallar terminou as suas considerações appellando para v. exa. e para a maioria, a fim de zelarem a minha dignidade e a minha coherencia.
Sem exaltação preciso dizer que quanto á minha coherencia, defendel-a-hei quando for atacada com factos ou argumentos e não com palavras; e quanto á minha dignidade, direi que tenho quinze annos de vida publica...

O sr. José Maria de Alpoim: - Não podia referir-me senão á dignidade parlamentar.

O Orador: - N'esse caso dou a mesma resposta que já dei quanto á minha coherencia, e como isso é costume antigo, não me defendo.

Mas não foi por este motivo que pedi e uso da palavra; foi por uma consideração mais importante.

O illustre deputado o sr. Alpoim fundamentou a sua questão prévia n'uma questão prévia por mim apresentada em 1888, quando tambem n'esta casa se discutiu a questão dos tabacos. O facto e verdadeiro, mas eu preciso dizer os motivos por que então procedi, e os motivos por que procedo hoje.

A questão prévia ha de ser resolvida pela maioria, e ella decidirá, como entender; a mim o que me cumpre é dar a minha opinião e dizer os motivos d'essa opinião.

Effectivamente quando em 1888 entrou em discussão o projecto dos tabacos, eu propuz que houvesse duas discussões, uma na generalidade e outra na especialidade, e o sr. Alpoim e todos os membros da maioria d'essa epocha, rejeitaram a minha proposta e decidiram que houvesse uma só discussão.

Portanto, hoje trata-se de ver qual a melhor fórma a dar á discussão d'este projecto, e não desejo que por fórma alguma se vão estabelecer processos novos, em relação a projectos meus, trazidos a esta casa, nem desejo que se

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vá alterar o processo já admittido com relação á mesma questão. E eu dou esta opinião como deputado e não como ministro.

V. exa. comprehendo perfeitamente que o haver duas discussões, uma na generalidade e outra na especialidade, tinha como effeito pratico dar origem a que esta discussão se alongasse mais do que seria conveniente.

Relativamente aos factos que succederam n'esta camara, e de que um sr. deputado quiz dar-me a responsabilidade, dizendo que eu tenho pyrrhonices, que sou teimoso e outras que taes accusações - não me cumpre responder.

V. exas. comprehendem que não devo estar a tomar o tempo á camara com cousas de tão limitado valor.

Voltando ainda ao outro assumpto, devo dizer que depois da maneira como os trabalhos d'esta casa têem corrido, evidentemente o dar duas discussões sobre este projecto unicamente acarretaria mais um motivo para se alongarem as discussões parlamentares (Apoiados.)

Se em 1888 a maioria parlamentar que entrão aqui estava, entendeu que bastava uma só discussão para este assumpto, ainda se não indicou agora motivo absolutamente algum, para que se não proceda exactamente da mesma maneira. (Apoiados.)

O sr. Navarro, que me está dando o prazer de ouvir-me lembrou-se, de certo, que em 1887, quando aqui se propoz para se mandarem ao tribunal de verificação de poderes umas certas eleições contestadas (parece-me que eram as do Louzada e Felgueiras), foi tambem a maioria d'essa epocha accusada por esse lado da camara, de que queria proceder, como maioria, em contrario aos principios sustentados áquelle respeito, como opposição. S. exa. levantou se e num discurso tão energico como applaudido pela camara do então, sustentou que era preciso que não houvesse duas leis: uma para progressistas, outra para regeneradores.

Ora é exactamente o que digo hoje; é preciso tambem que nas questões parlamentares, principalmente em assumptos de natureza identica, não haja duas leis, uma para progressistas, outra para regeneradores. Esta é a minha opinião e o meu parecer.

Mas, torno a dizer, não é a ruim que me compete resolver, é á maioria d'esta camara: ella resolverá como julgar mais conveniente, e por fórma alguma me melindrarei se, porventura, entender que deve decidir que haja duas discussões.

Resolva como entender que é mais conveniente para o paiz e para os trabalhos parlamentares.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Dias Costa: - Com franqueza, não percebo bem a argumentação do sr. ministro da fazenda; attribuo-a a um processo novo de s. exa., tendo em pouca conta tudo quanto é antigo e entendendo dever adoptar em tudo processos noves.

Já no relatorio de fazenda usa s. exa. de processos novos para mostrar qual é a situação da fazenda publica, porque tratou de formar uma estatistica pela fórma que julgou mais conveniente e d'ahi deduziu as conclusões que lhe pareceu, sommando quantidades a seu bello prazer, para aggravar mais ou menos o deficit, que a final ninguem sabe qual é.

O sr. ministro da fazenda parece-me que não tem rasão absolutamente alguma para não sustentar hoje o que sustentou quando se sentava d'este lado da camara; pelo contrario, s. exa. tinha agora mais rasão ainda para se manter nas mesmas idéas, na mesma opinião.

Diz s. exa. que não quer duas leis, uma para progressistas, outra para regeneradores.

Mas o facto a que s. exa. alludiu não tem relação alguma com este de que se trata.

Então, tratava-se da interpretação de uma só lei, que era tanto para progressistas como para regeneradores, agora o caso é muito differente; as mesmas rasões que s. exa. allegou então dão-se hoje, mas ainda mais reforçadas; hoje trata-se de animo leve de um projecto, cuja approvação póde acarretar graves prejuizos para o paiz, não só sob o ponto de vista financeiro, como sob o ponto de vista social. (Apoiados.)

Pois tem alguma comparação o projecto apresentado hoje com o projecto apresentado em 1888?

Parece-me que não.

O projecto de 1888 tinha apenas dez artigos, não soffreu grandes modificações na commissão; o projecto que hoje se apresenta, quasi que póde dizer-se, é perfeitamente diverso do projecto do sr. ministro da fazenda. (Apoiados.)

Já aconteceu o mesmo com a proposta dos 6 por cento.

Quem compara o projecto do sr. ministro da fazenda com o projecto da commissão, encontra-lhe differenças enormes.

E ainda bem que assim aconteceu, porque ao menos ficou attenuada a iniquidade de similhante medida.

Lamento que a discussão do projecto dos 6 por cento esteja condemnada a garrote, porque desejaria fazer á camara a analyse do projecto da commissão com a proposta do governo, para se ver bem a madureza com que s. exa. architectou o seu chamado projecto financeiro.

Pois então s. exa. não disse que a questão financeira é opportunista?

Pois agora é que s. exa. tinha occasião de ser opportunista. Pois o projecto apresentado á discussão da camara está exactamente nas condições em que estava o projecto de 1888? Então tratava-se de passar do regimen do gremio para a régie e agora é completamente differente; quer-se passar da régie, para o monopolio. Então o governo ficava senhor da administração da industria dos tabacos, e sempre com a faculdade sustentada pela commissão, de intervir no systema da régie, com as modificações que entendesse convenientes, para evitar desvios.

Era um systema novo, e quando se empregam processos novos não se póde prever com toda a exactidão e precisão, e por conseguinte é necessario que o governo fique com os meios necessarios para acudir a qualquer difficuldade que possa surgir; o mesmo aconteceu com a régie. Mas com este projecto - com a segunda edição d'este projecto, porque o projecto da commissão é differente - com este systema, não se dá essa mesma vantagem. E se a camara o approvar, como deve, o que ha de acontecer? Resultara para o paiz o inconveniente de que não póde ser rescindido senão no fim de dezeseis annos! (Apoiados.)

O sr. ministro da fazenda quer que o governo, que é uma entidade impessoal, agora representada em parte por s. exa., mas no futuro por outra pessoa, fique enfeudado a uma companhia, que inclusivamente póde ser companhia estrangeira?
Isso é que não póde ser de maneira nenhuma. Por consequencia, n'uma questão d'esta importancia é necessario andar com cautela e não nos estarmos a illudir, suppondo que as circumstancias de hoje são as mesmas de 1888!

Não ha incoherencia em sustentar hoje a questão do gremio, que então não se admittia, porque as circumstancias eram completamente differentes.

O governo prefere actualmente acceitar o projecto como está, quer ir enfeudar-se a uma companhia, que póde ser estrangeira, sem cuidar dos males resultantes, sobretudo se quizer seguir o systema de se lhe impor 6 por cento!

O sr. ministro da fazenda seria coherente com o seu systema perfeitamente racional - de opportunista de questões financeiras - se acceitasse a questão prévia. (Apoiados.)

Trata-se de um projecto muito desenvolvido, que é de uma grande responsabilidade, que póde dar grandes vantagens, mas que póde dar enormissimos prejuizos! É preciso discutil-o pensada e maduramente, e é preciso que a maioria e o governo attendam a qualquer emenda, substituição e additamento que seja apresentado ao projecto,

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exactamente como dizia o sr. Franco Castello Branco, quando sustentava a questão previa. S. exa. n'aquelle tempo queria discussão á li espanhola, e agora quer discussão á moda de si mesmo!

Discutiram-se as bases por grupos ou separadas, então; hoje já s. exa. não é tão amante da nação hespanhola! Pois conserve igual amor a essa nação irmã; n'esse ponto devemos imitar os hespanhoes; mesmo a s. exa. convem que noa saibamos como e que o partido regenerador, que d'antes era absolutamente contrario ao monopolio, quer agora o monopolio. Que significa isto? S. exas. mudam de opinião com muita facilidade; nos bancos da opposição, têem uma opinião, e nos bancos do poder, outra. Da nossa parte e que não ha incoherencia.

As questões são completamente differentes. Passar do gremio para a régie não é o mesmo, repito, que passar da régie para o monopolio. Então era passar de um para outro regimen, em que o governo creava a sua auctoridade; agora abdica d'essa auctoridade. (Apoiados.)

Não sei qual é a rasão por que o illustre ministro da fazenda não acceita esta questão prévia, que seria o caminho melhor para chegarmos a uma questão meditada e cuidadosa, como convem aos interesses do paiz. (Apoiados.)

O que se deve ter em vista na discussão deste projecto? Que se obtenha a maior somma de vantagens para a fazenda. Póde-se discutir um projecto d'esta importancia, como o bill, sem ordem nem nexo? Andando a mudar do opinião a cada momento é para receiar que alguem possa empregar a mesma linguagem do sr. Franco Castello Branco, quando deputado da opposição, censurando asperamente o partido progressista por andar ensaiando differentes systemas.

Quer a camara saber o que dizia então o sr. Franco Castello Branco?

(Leu.)

Ora, não desejando eu que alguem possa dizer do governo, em que figura brilhantemente o illustre ministro da fazenda, o mesmo que s. exa. disse no tempo do governo progressista, estimaria que s. exa. procedesse com a maxima prudencia o não se quizesse levar esta questão de assalto. (Apoiados.)

A melhor maneira de conquistar uma praça bem defendida não é com um plano mal meditado. É necessario pensar maduramente, estudar um plano rasoavel e discutir cada una dos differentes pontos d'esse plano. Se não houver regularidade na discussão o proprio governo ficará prejudicado. Qual é o seu interesse? Certamente o governo não espera que d'esta questão se faça uma questão politica. Não se trata d'isso. O interesse do governo é que todos concorram da melhor vontade para se obter uma solução satisfactoria e conveniente para os interesses do paiz, o que só se póde obter com methodo. (Apoiados.)

Pois nós não sabemos o que aconteceu na discussão do bill? Por não se considerar na especialidade cada um dos decretos por sua vez, discutiu-se tudo na generalidade e na especialidade e quem entrou no debate não chegou a poder formular uma opinião clara sobre cada um dos assumptos. (Apoiados.) Para evitar isto parecia-me muito conveniente que se pozesse de parte esta perrice - que outra cousa se não póde chamar - e se aceitasse a questão prévia. (Apoiados.)

Nenhuma idéa ha por parte da opposição progressista de fazer obstruccionismo; se a houvesse seria naturalmente apresentada proposta identica, aquella que em 1888 apresentou o sr. Franco Castello Branco.

Não vejo que para o governo nem para a boa discussão do projecto possa haver inconveniente em acceitar a questão prévia, discutindo por grupos de bases que se referem ao mesmo assumpto. (Apoiados.)

Entendo, por consequencia, que o illustre ministro da fazenda faria um bom serviço se aconselhasse a maioria a que não empregasse mais uma vez a força do numero contra uma questão fundamental, como esta, que não tem um caracter de politica partidaria. (Apoiados.)

O que nós desejâmos é que o debate corra com regularidade, o que não só póde conseguir discutindo, como s. exas. querem, um projecto com vinte e nove bases. A experiencia d'este anno já tem mostrado que, quando se discutem ao mesmo tempo assumptos muito varios, longe de só tirar vantagem da discussão, introduz-se a desordem no debate. De resto qual é o interesse do sr. ministro da fazenda? é fazer uma operação financeira tomando por base o monopolio do tabaco.

Ora s. exa. de certo não se lembra dos perigos que daqui podem resultar, porque, se se recordasse do que aconteceu em 1865 com o contrato do caminho de ferro de sul e sueste que custou 1.000:000 de libras, de certo não quereria andar tão depressa. (Apoiados.) Eu tenho medo de que ámanhã sejamos obrigados a dar 2.000:000 de libras a alguma companhia de inglezes.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco):- Ha effectivamente uma companhia ingleza a quem teremos do dar bastante.

O Orador: - Pois, se o sr. ministro da fazenda está convencido que se errou em relação á tal companhia estrangeira, - e eu não quero saber quem teve a culpa do erro a que allude, se o houve - para que se arrisca a commetter outro erro com uma companhia que apparentemente seja portugueza, mas que póde ser estrangeira?
Porque todos nós sabemos como essas cousas se illudem, tanto mais que a ninguem fica mal, em negocios commerciaes, representar os interesses de outros.

Ora, para que não aconteça o mesmo que aconteceu em 1865, é que eu peço ao sr. ministro da fazenda faça com que este projecto corra regularmente.

Em 1865 o governo estava em uma situação financeira talvez melhor do que aquella em que se encontra agora, o quiz fazer uma operação bem combinada. Ora, é tambem de uma operação bem combinada que se trata agora. S. exa. quer fazer uma operação bem combinada, e para isso pretende restabelecer o monopólio do tabaco.

O contrato do caminho de ferro do sul e sueste veiu á camara, levantando-se sobre elle um debate desenvolvido, e a final o contrato foi approvado. O que é que aconteceu? A companhia deu letras ao estado, e foi fazer uma emissão a Londres. Essa emissão falhou, e a companhia, não podendo pagar as letras, falliu; seguiu-se o governo tomar conta da linha.

A companhia reclamou, e os interessados foram para Londres fazer o mesmo que fizeram agora os portadores do emprestimo de D. Miguel; o sr. Carlos Bento foi tambem a Paris ver se aplanava as difficuldades; mas por fim o governo teve de pagar 1.000:000 de libras. Quererá agora o sr. ministro da fazenda correr o risco de collocar-se na mesma situação?

Portanto, sr. presidente, é necessario proceder com toda a madureza. Não vamos approvar um projecto d'esta ordem sem o estudar bem; e entendo que o sr. ministro da fazenda fazia um bom serviço ao paiz, e até mesmo a si proprio, concordando em que houvesse sobre este projecto uma longa discussão, de modo que nós podessemos por fim votar uma lei, que faria talvez a gloria financeira de s. exa.

(S. exa. não reviu o seu discurso.)

O sr. Pedro Victor: - O sr. ministro da fazenda, quando ha pouco fallou, disse que esta questão tinha de ser derimida pela maioria. Ora, eu sou de opinião exactamente contraria á dos dois illustres deputados que acabam de fallar, e sou de opinião contraria por uma rasão muito simples. Em 1887 votou-se aqui um projecto sobre tabacos comprehendendo o estabelecimento do monopolio, do gremio e da régie, e não foi preciso mais que uma discussão.

Discutiu-se a implantação de tres regimens perfeitamente

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diversos, o monopolio, a régie e a liberdade com o gremio, aprovou-se o projecto de lei com uma só discussão.

Mas como a maioria progressista d'esse tempo parece que achou mau o projecto de 1887, veiu logo, em 1888, uma outra proposta de lei governamental para emendar a antiga. Então, e muito naturalmente, o sr. Franco Castello Branco pediu e instou na camara para que houvesse duas discussões, com o fim de se pensar bem sobre o assumpto, e não se estar todos os dias a decretar novos regimens para o exercicio da industria dos tabacos. É por isso que s. exa. dizia ao governo e á maioria de então: «Pensem bem, senhores! Pois no anno passado votámos um projecto de tabacos, e este anno vamos já votar outro? Isto não póde ser, não é serio, pensem bem». (Apoiados.)

Mas o que fez essa maioria progressista? A maioria de então, não só não admittiu a reclamação do sr. Franco Castello Branco, e portanto houve uma discussão, mas essa mesma questão prévia, com grande indignação do sr. Fuschini, foi discutida conjunctamente com o projecto. Veja v. exa. e veja a camara como essa maioria considerava estas questões! (Apoiados.)

O sr. Alpoim vem hoje dizer-nos que a lei da régie era magnifica, era optima. Logo, o parlamento, com uma só discussão, fez uma lei não só sabia e justa, como é do seu dever, mas até uma lei optima, magnifica, na opinião do sr. Alpoim, e eu não sei como nós não podemos tambem agora com uma só discussão fazer exactamente o que fizeram os srs. progressistas, isto é, uma lei sabia e justa, optima e perfeita. Se os illustres deputados da opposição souberam, com uma só discussão, fazer uma lei excellente, não vejo porque nós não havemos de saber fazer o mesmo. É porque s. exa. eram mais intelligentes do que nós?

Não creio que se possa allegar essa rasão que representaria uma inadmissivel falta de modwstia. (Apoiados - Riso.)

Portanto, sr. presidente, eu aconselho á maioria que, por sua dignidade propria, discuta e vote o projecto n'uma só discussão, porque, se não o fizesse assim, collocava-se n'uma posição inferior á da maioria progressista, que tambem soube, com uma só discussão, elaborar leis tão preconisadas e tão elogiadas.

Não devemos pois hesitar em votar que haja uma só discussão; mas o que desde já declaro, e do que v. exas. podem terá certeza, é que terão a mais ampla e a mais completa liberdade do discussão. (Apoiados.) Da nossa parto ha só o desejo intenso de fazer saír d'aqui um projecto bom e util para o paia. (Apoiados da direita.)

Sendo estas as intenções de nós todos, tenham os illustres deputados da opposição a certeza de que mesmo com uma só discussão hão de ter ampla e plena liberdade de discutir, de apreciar, de additar e de propor as emendas que entenderem, na parte em que não concordem com o projecto e depois ainda as suas observações serão devidamente apreciadas e estudadas a contento de todos.
(Vozes - Muito bem.)

Eu devia terminar aqui as minhas considerações, porque demonstrei de uma maneira irrecusavel que s. exas. por coherencia até têem de votar comnosco. Demonstrado isto estava finda a minha missão, não tinha nada mais que dizer, um relator, na minha opinião tem de ser feio, forte e franco. (Riso.) Feio como quem diz correntão. Não sou um elegante na phrase como o sr. Carlos Lobo d'Avila, não me preoccupo em fallar, rendilhando os meus discursos de donaires de eloquencia, como dizia antigamente o sr. Ayres de Gouveia.

Mas, tendo-se o sr. Alpoim referido ha pouco, a um ponto relativo ao projecto, não posso deixar passar a observação de s. exa. sem a contradizer immediatamente.

S. exa. referiu-se aos operarios da régie, e pareceu indicar que as suas reclamações e os seus pedidos não estavam devidamente attendidos.

Eu devo declarar a v. exa. que me parece mais papista que o proprio Papa. (Apoiados da direita.) N'este projecto tem-se procurado por todos os meios, em repetidas conferencias com esses differentes operarios, attender por completo a todos os seus justos e rasoaveis pedidos.

Era esta a declaração terminante que eu tinha a fazer para não deixar ficar uma erronea impressão, que podia ser interpretada como um procedimento incorrecto da nossa parte, quando nós fizemos tudo quanto era possivel para satisfazer aos pedidos justos d'essa tão honrada classe.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Carlos Lobo d'Avila: - Disse que uma discussão tão importante não era uma questão partidaria.

A opposição não queria fazer obstruccionismo, queria discutir o assumpto com a madureza que elle merece.

Se a maioria entendia que a minoria tinha errado em 1888, porque era que queria errar agora tambem; portanto o argumento de em 1888 se ter votado que houvesse uma só discussão não colhia.

Para prova da importancia do assumpto bastava o facto de que as receitas dos tabacos ficam, pelo monopolio, acorrentadas durante dezeseis annos.

Entendia que um projecto com vinte e seis bases não podia apreciar se devidamente n'uma só discussão.

Dissera o sr. Pedro Victor que a discussão seria ampla, mas dava-se já o facto de que um projecto tão grave fora intercalado com outro tambem importante.

(O sr. deputado não restituiu as notas tachygraphicas do seu discurso.)

O sr. Pinheiro Chagas: - Disse que fôra o sr. Alpoim quem primeiro invocára o precedente, citando a proposta apresentada em 1888 pelo sr. Franco Castello Branco.

Sustentou com algumas considerações que, devendo haver, segundo as declarações do sr. relator e segundo os desejos de todos, uma discussão larguissima, não via necessidade de se realisarem duas discussões, uma na generalidade e outra por grupos de bases.

(O sr. deputado não restituiu as notas tachygraphicas do seu discurso.)

O sr. Fuschini: - Em 1888 ventilou-se exactamente n'esta camara a questão que actualmente se discute, e a minha interferencia foi em 1888 a mesma que vae ser hoje.

Não vou discutir largamente a questão prévia; comtudo chamarei a attenção do sr. relator e do sr. ministro para alguns pontos do projecto, que têem particular interesse e o tornam muito importante.

Quando em 1888 se discutiu o projecto da régie, ao lado do sr. Franco Castello Branco sustentei a necessidade de que o projecto tivesse duas discussões; todavia o projecto não tinha a importancia que tem este.

Em primeiro logar, como acaba de dizer o sr. Lobo d'Avila, este projecto passa do regimen da administração do estado para o regimen do monopolio durante dezeseis annos; ora todos sabem que do actual regimen, longe de se dar o que affirmou o illustre orador que me precedeu, é muito facil passar para o regimen da liberdade, emquanto que no monopolio ficarão os redditos publicos presos a um contrato que dura longos annos.

Posso affirmar á camara, sem receio de errar, que o projecto de contrato que vamos discutir é o que envolve maior praso; o hespanhol é apenas por doze annos e não me consta que outro exista, ou tenha existido, com similhante duração.

Em segundo logar, ha outras circumstancias especiaes, a que é necessario attender.

As classes operarias vem passar do regimen do estado-patrão para o regimen do capital patrão.

Se no projecto da régie podiam ficar certas disposições mais ou menos longas, com respeito aos operarios, porque devia ter-se confiança em que o estado não ía sophismal-as, para diminuir as vantagens que queriamos garantir ás

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SESSÃO DE 9 DE JULHO DE 1890 1035

classes operarias, o mesmo não succedcrá com o monopolio.

Alem d'isso, os homens que têem estado á testa da administração da régie, possuem outra força e outra vontade para fazer cumprir as disposições da lei, força que não terão os simples commissarios regios, junto do monopolio.

A passagem da régie para o monopolio, por muito boa que seja a vontade do sr. ministro e do relator, e perigosissima para as classes operariam, como provarei mais tarde. Confesso, permitta-me a camara que eu abra um parenthesis para fazer justiça a quem a merece, que da parte do sr. ministro tem havido boa vontade, mas nem sempre a nossa boa vontade correspondo aos resultados que desejâmos obter.

A serie de sophismas que póde introduzir um capital egoista no cumprimento das disposições legaes, é de tal ordem, que, por mais que estudemos este assumpto, podemos ter a certeza de que mais tarde teremos de recorrer a outros meios, para evitar que sejam desprezadas e esquecidas as garantias que vamos legislar.

N'este sentido, portanto, o projecto deve ser maduramente discutido e pensado.

E não é só isto, sem querer offender alguem, o projecto está um pouco obscuramente redigido em certas bases; a disposição d'ellas não é tambem das mais faceis e claras.

O sr. Ministro da Fazenda (Franco Castello Branco):- Todas as emendas que tenderem a aclarar o projecto serão acceitas.

O Orador: - As emendas hão de ser acceitas, assim o supponho, mas s. exa. comprehende a impossibilidade de as apresentar completas n'uma discussão na generalidade.

Essa boa vontade de s. exa. deve leval-o a acceitar as duas discussões, é prudente fazel-o.

O projecto é importantissimo nas suas condições financeiras; traz, como s. exa. sabe, gravissimos encargos para o thesouro. Serão compensados estes encargos por vantagens? É o que resta demonstrar.

Se estamos dispostos a abrir uma larga discussão sobre o assumpto, e proporcionar um methodo de discussão, para que chegue a todos a occasião opportuna de apresentarem as emendas de que o projecto carece, é necessario haver uma discussão na generalidade e pelo menos uma na especialidade.

Por isso, sr. presidente, precisamente como fiz em 1888, venho propor á maioria regeneradora d'esta camara, como propuz á maioria progressista, um alvitre intermrdio que póde resolver todas as difficuldades.

Não dividam a discussão na especialidade em quatro grupos, adoptemos só duas discussões, uma na generalidade, outra na especialidade; mais ainda, se o illustre ministro quer, e digo isto em meu nome apenas, limite o tempo da discussão na especialidade.

A camara sabe que o orador inscripto sobre a ordem, exceptuando o que inicia a discussão, não póde segunda vez usar da palavra; ora é evidente que só depois de ouvidas todas as opiniões n'uma discussão geral se podem formular convenientemente as emendas; para as apresentar bastará, porém, uma rapida discussão na especialidade, que por accordo de todos se podia fixar em uma sessão apenas.

Se a maioria está disposta, como parece, a dar uma larga discussão ao projecto, applique uma ou duas sessões para uma discussão na especialidade.

Não é exigir muito.

Não estou longe do systema das maiorias concordarem com as minorias nos dias que devem empregar para discutir os projectos; se tivesse a honra de representar n'esta casa uma fracção politica, e ella me desse procuração para o effeito, não teria duvida de acceitar esta norma de procedimento, que para tudo me parece util.

Se a maioria entende discutir largamente este assumpto, peco-lhe pois que, para bom methodo de discussão e utilidade d'ella acceite este alvitre.

Limito aqui a minha exposição, dizendo pouco mais ou menos o que disse em 1888, sendo ainda mais restricto.

A camara fará que o entender; mas reparemos bem que nenhum dos argumentos do sr. ministro tem força nem valor para cobrir a responsabilidade de s. exa.

A maioria saiu do partido regenerador; os seus processos, hoje, devem ser os mesmos que quando o partido estava na opposição.

Se então o methodo e a logica lhe indicavam a conveniencia de dividir a discussão do projecto de lei, que estabelecia o regimen da regia, em duas partes, a mesma logica, o mesmo methodo lhe indicam essa divisão para um projecto mais importante.

Quer a maioria garantir-se contra a perda, de grande numero de sessões?

Lance mão de outro systema, abafe como. quizer a discussão; mas não condemne a divisão da discussão, que é justa, logica e foi defendida por s. exas. na opposição.

O sr. Jacinto Candido: - Requeiro a v. exa. consulte a camara sobre se julga a materia sufficientemente discutida.

O sr. Presidente: - A inscripção está esgotada.

(Riso.)

Foi rejeitada a questão prévia.

SEGUNDA PARTE DA ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do projecto de lei n.º 120, que lança um addicional do 6 por cento sobre as contribuições do estado

O sr. Presidente: - Vae entrar-se na segunda parte da ordem do dia, discussão do projecto n.° 120.

Continúa no uso da palavra o sr. Francisco Machado.

O sr. Francisco Machado: - Para ver a largueza que havia de dar ao seu discurso, desejava saber se depois de acabar de fallar, a discussão ha de terminar ou se se dá a palavra a mais alguem.

O sr. Presidente: - Declarou que havia de cumprir as disposições do regimento; emquanto houvesse oradores inscriptos havia do lhes dar a palavra, a não ser que a camara julgasse a materia discutida.

O Orador: - Pergunta a que horas acabava a sessão.

O sr. Presidente: - Disse que acabava ás seis horas e meia.

O Orador: - Disse que, em vista das respostas do sr. presidente, comprehendia que logo que terminasse o seu discurso, a materia seria julgada discutida, e então havia de empregar quantos esforços houvesse para demorar a discussão, porque declarava que não queria que o projecto passasse, o seguindo um tal caminho entendia prestar um serviço ao paiz.

Disse que, se o governo tivesse consentido que faltassem mais alguns oradores, o principalmente o sr. Manuel de Arriaga, a discussão teria já terminado; mas como tudo indicava que se queria pôr termo á discussão, havia de fallar até caír exhausto de forças.

Já hontem mostrara que em 1888 o sr. Baracho na discussão do orçamento rectificado gastara tres sessões, e o sr. Franco Castello Branco n'uma questão de pautas gastará tambem tres dias. E sendo isto assim, não se lhe podia estranhar que n'uma questão tão importante como eram os addicionaes elle orador gastasse algum tempo.

Passou em seguida a mostrar os trabalhos sobre as linhas ferreas que o partido progressista fez, assim como as medidas que tomou sobre diversos ramos da administração.

Tratou do systema seguido na construcção de estradas, systema que reputava mau e prejudicial para o thesouro.

A este respeito tomára o sr. Navarro algumas providencias, assim como as tomára quanto ao serviço telegraphico.

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E n'estas e n'outras medidas é que se despenderam pelo ministerio das obras publicas sommas avultadas.

E como désse a hora pediu para lhe ficar reservada a palavra para a sessão seguinte.

(O discurso do sr. deputado será publicado na integra, em appendice a esta sessão, quando for restituido.)

O sr. Presidente: - Ámanhã ha sessão de dia.

Continúa a mesma ordem do dia, e pela ordem por que está dada.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas e meia da tarde.

O redactor = Barbosa Colen.

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