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SESSÃO DE 12 DE MAIO DE 1882

Presidencia do exmo. sr. Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa

Secretarios - os srs.

Francisco Augusto Florido da Mouta e Vasconcellos
Augusto Cesar Ferreira de Mesquita

SUMMARIO

É enviada ás commissões de regimento o legislação civil uma proposta do sr. presidente ácerca da verdadeira interpretação de alguns artigos do regimento da camara. - O sr. Augusto do Castilho faz largas considerações ácerca de diversos serviços no provincia de Moçambique. - É apresentado o parecer da commissão de fazenda sobre as propostas offerecidas na discussão do projecto de lei n.º 100 (imposto do sul); e, dispensando-se o regimento, é approvada sem discussão. - Na ordem do dia entra em discussão o orçamento da despeza do ministerio da marinha. São approvados os capitulos 1.º, 2.º e 3.º, e entra em discussão o 4.º - É interrompida a discussão do orçamento e dada a palavra ao sr. Francisco de Campos, para pedir explicações ao sr. ministro do reino sobre irregularidades do administração publica no districto de Vizeu. Responde o sr. ministro do reino. O sr. Luciano de Castro pede explicações sobre a administração publica no districto de Aveiro. Responde o sr. ministro do reino. Resolvo-se prorogar a sessão até se concluir este incidente. - O sr. ministro da marinha apresenta duas propostas de lei: 1.ª, reorganinando o serviço de saude naval; 2.ª, abrindo no ministerio da fazenda um credito de 481:370$000 réis, para saldar as despezas das provincias ultramarinas, relativas ao anno economico de 1882-1883. Fallam ainda sobre o incidente os srs. Francisco de Campos, José Bernardino, Emygdio Navarro o ministro do reino. Manifestando o sr. ministro desejos de que este incidente ficasse adiada para a sessão seguinte, e sendo necessaria resolução da camara a este respeito, verifica-se não haver numero. Publicam-se os nomes dos srs. deputados presentes.

Abertura - Ás duas horas e meia da tarde.

Presentes á chamada - 50 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão os srs. : - Lopes Vieira, Agostinho Lucio, Alberto Pimentel, Sarrea Prado, Pereira Corte Real, A. J. d'Avila, Pereira Carrilho, Santos Viegas, Pinto de Magalhães, Ferreira de Mesquita, Pereira Leite, Fonseca Coutinho, Trajano de Oliveira, Augusto de Castilho, Castro e Solla, Sanches de Castro, Conde de Sobral, Eugenio de Azevedo, Firmino Lopes, Vieira das Neves, Mouta o Vasconcellos, Coelho e Campos, Gomes Teixeira, Cromes Barbosa, Hermenegildo da Palma, Jeronymo Osorio, Rodrigues da Costa, Brandão e Albuquerque, Scarnichia, Sousa Machado, J. A. Gonçalves, J. J. Alves, Amorim Novaes, Borges de Faria, José Frederico, Figueiredo Mascarenhas, Figueiredo de Faria, J. M. Borges, José de Saldanha (D.), Vaz Monteiro, Luciano Cordeiro, Gonçalves de Freitas, Bivar, Luiz da Camara (D.), M. J. Vieira, Aralla e Costa, Guedes Bacellar, Mariano do Carvalho, Miguel Candido, Visconde de Balsemão o Visconde da Ribeira Brava.

Entraram durante a sessão os srs.: - Abilio Lobo, Sousa Cavalheiro, Moraes Carvalho, Sousa e Silva, Cunha Bellem, Mello Ganhado, Seguier, Potsch, Fuschini, Saraiva do Carvalho, Zeferino Rodrigues, Barão do Ramalho, Conde da Foz, Borja, Cypriano Jardim, Emygdio Navarro, Pinto Basto, Wanzeller, Correia Arouca, Guilherme de Abreu, Illydio do Valle, Jayme da Costa Pinto, Franco Frazão, J. A. Pinto, Ferreira Braga, Ferrão Castello Branco, J. A. Neves, Avellar Machado, José Bernardino, Dias Ferreira, Elias Garcia, Rosa Araujo, José Luciano, Sousa Monteiro, Pereira do Mello, Malheiro, Luiz de Lencastre, Manuel d'Assumpção, Rocha Peixoto, Correia do Oliveira, M. P. Guedes, Pinheiro Chagas, Guimarães Camões, Miguel Dantas, Pedro Correia, Pedro Franco, Pedro Martins, Dantas Baracho, Tito de Carvalho o Visconde de Porto Formoso.

Não compareceram á sessão os srs. : - Adolpho Pimentel, Agostinho Fevereiro, Azevedo Castello Branco, Gonçalves Crespo, Ignacio da Fonseca, A. J. Teixeira, António Maria de Carvalho, Caetano do Carvalho, Brito Corte Real, Conde do Thomar, Diogo de Macedo, Estevão de Oliveira Junior, Filippe de Carvalho, Francisco Patrício, Silveira da Motta, Freitas e Oliveira, Ribeiro dos Santos, Ponces de Carvalho, Pereira dos Santos, Ferreira Freire, Teixeira de Queiroz, J. M. dos Santos, Pinto Leite, Lopo Vaz, Luiz Palmeirim, Silva e Matta, Vicente da Graça, Marçal Pacheco, Miguel Tudella, Pedro Roberto, Barbosa Centeno, Visconde de Alentem e Visconde de Reguengos.

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Representação

Da companhia das aguas pedindo que o governo a indemnise dos prejuizos que lhe tem resultado com a demora no cumprimento da condição do encanamento obrigatorio.

Apresentada pelo sr. presidente e enviada a commissão da petição.

SEGUNDAS LEITURAS

Projecto de lei

Senhores. - Rectificando o conteúdo da representação junta, a mira dirigida pela mesa da santa casa da misericordia da Vidigueira;

Considerando que é do grande urgencia que o convento de Nossa Senhora do Carmo seja convertido em hospital, estabelecimento de que aquella villa está privada;

Considerando que ganhará muito a villa da Vidigueira, não sendo obrigada a dcspezas que teria de fazer se fosse obrigada a construir o edificio proprio;

Considerando que o cofre da municipalidade não poderia nunca inferir recursos bastantes para uma construcção que nunca poderia ser igual a do convento em questão;

Mas, considerando tambem que a freira existente no convento, não poderá, fora d'elle, auferir as rendas dotaes, nem mesmo parte d'ellas, logo que d'ali saia;

Tenho a honra de mandar para a mesa o seguinte:

PROJECTO DE LEI

Artigo 1.° E o governo auctorisado a ceder á misericordia da villa da Vidigueira o convento de Nossa Senhora do Carmo da mesma villa, quando fallecer a ultima freira que ainda ali existe.

§ unico. O edificio do convento é destinado ao estabelecimento de um hospital, que ficará a cargo da misericordia da villa.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Camara dos deputados, 11 de maio do 1862. = Cypriano Leite Pereira Jardim, deputado por Cuba.

Foi admittido e enviado á commissão de fazenda, ouvida a de saude.

O sr. Presidente: - Tenho dado a alguns artigos do regimento uma interpretação que me parece que tem suscitado duvidas da parto do alguns srs. deputados.

Eu entendo que na ordem do dia, quando só inscreve algum membro do governo, se tiver pedido algum sr. deputado a palavra para uru requerimento, prefere na concessão d'ella o sr. ministro que se inscreveu; porém alguns srs. deputados entendem que deve preferir quem a pede para um requerimento.

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O meu desejo é sempre acertar. É possivel e até muito provavel que eu esteja em erro, mas para que este negocio se resolva, parece-me conveniente submetter uma proposta á approvação das commissões de regimento e de legislação civil, a fim de que dêem um parecer ácerca da verdadeira interpretação que se deve dar a este artigo do regimento e a camara na sua alta sabedoria decidir sobre a interpretação que deve ter o regimento nesta parte, porque, repito, o desejo da mesa é acertar. (Apoiados.)

A proposta é a seguinte:

Proposta

Entendem alguns srs. deputados, fundando-se nas disposições dos artigos 90.° e 91.º do regimento, que na concessão da palavra prefere a qualquer membro do governo o depiitado que, na ordem do dia, a pede para um requerimento.

A presidencia, com fundamento nos artigos 96.°, 67.º n.° 2.° e 211.° do mesmo regimento, tem entendido que prefere o ministro.

Qual a verdadeira interpretação destes artigos? Pede-se o parecer das illustres commissões de regimento e legislação civil. = Luiz Bivar.

Vou portanto consultar a camara sobre se é de opinião que esta proposta seja enviada às commissões reunidas de regimento e legislação civil para apresentarem sobre ella o seu parecer com a maior brevidade.

Consultada a camara, resolveu afirmativamente.

O sr. Presidente - Vae dar-se conta á camara de um telegramma que recebi do presidente da camara de Villa Real.

Leu-se na mesa.

É o seguinte:

Villa Real. - Exmo. sr. presidente da camara dos deputados. - A camara da minha presidência deliberou solicitar a approvação da proposta de lei que tributa a aguardente de cercãos, e pede a v. exa. a sua efficaz cooperação em favor d'aquelle pedido, que os povos d'esta provincia reputam de conveniencia urgente. = O presidente da camara, Antonio Alberto Teixeira Lobato.

O sr. Presidente: - Vae ser enviado á commissão de fazenda.

O sr. Mouta e Vasconcellos: - Participo a v. exa. á camara, que acabo de cumprir o triste e para mim dolorosissimo dever de ir desanojar os nossos illustres collegas, os srs. Filippe de Carvalho e Caetano de Carvalho, pelo infausto successo por que acabaram de passar, em consequencia da morte de um filho e irmão.

Encarregaram-me esses nossos illustres collegas de agradecer a v. exa. e á camara a sua deferencia.

O sr. Avila: - Mando para a mesa, a fim de ser enviado á commissão de fazenda, um parecer da commissão de guerra sobre o requerimento do sr. Antonio Correia Cardoso Telles Pamplona, coronel do exercito de Portugal.

O sr. Augusto de Castilho: - Tive ha dias a honra de dirigir umas perguntas ao governo a respeito de dois factos occorridos na provincia de Moçambique, os quaes se mo afiguravam graves.

O sr. ministro das obras publicas, unico ministro que então estava presente, disse á camara que não estava habilitado para responder ácerca d esses factos, mas que informaria o seu collega o sr. ministro da marinha.

O sr. ministro da marinha não tem comparecido n'esta casa do parlamento, e infelizmente, creio que por motivo de doença, segundo, ouço dizer; entretanto a noticia que eu dei á camara, relativamente aos factos occorridos, vem hoje confirmada em um jornal da capital, o que me leva a acreditar que ella não era destituída de fundamento.

Ora, visto que a noticia é grave, parece-me que o governo deve dar algumas explicações ácerca dos factos, historiando-os minuciosamente, e dizendo ao mesmo tempo á camara quaes as providencias eme entende dever adoptar para restabelecer a segurança e a confiança n'aquelles paizes.

No principio desta sessão, em 28 de janeiro, tinha eu pedido, pelo ministerio do ultramar, uma serie de esclarecimentos que ainda até hoje não chegaram; desejava, portanto, que a mesa renovasse as suas instancias para com o governo, a fim de ver se esses esclarecimentos podem chegar antes do fechada a camara.
Quando eu tive a honra de mandar para a mesa a nota do pedido destes esclarecimentos, que dizem respeito principalmente ao districto de Lourenço Marques, não tive meramente a vaidade de ver o meu nome publicado entre os demais oradores no Diario da camara; tinha o desejo de conhecer alguns pontos da administração do districto de Lourenço Marques, do avaliar as suas forças, para ver só o districto tinha em si recursos que podessem habilitar o governo a emprehender um certo numero de medidas que são já hoje indispensáveis no estado em que elle se encontra.

O sr. Luciano Cordeiro: - Apoiado.

O Orador: - Esses esclarecimentos eram indispensaveis para eu poder basear o meu juízo ácerca da maneira de formular a minha proposta, e não vinham apenas satisfazer um capricho de mera curiosidade. E por isso, sr. presidente, que eu instara com v. exa. para que novamente se perguntasse ao ministerio da marinha se mandava esses esclarecimentos por mim solicitados ha já tres mezes e meio.

Eu não vou tão longe como aquelles que dizem que Portugal só póde justificar a sua autonomia pela conservação das suas colonias. Supponho apenas que o progresso e o desenvolvimento das colonias deve augmentar consideravelmente a importância e o prestigio de Portugal quando ellas forem devidamente administradas, (Apoiados.) e é isso, infelizmente, o que até hoje se não tem feito de uma maneira systematica e efficaz, como ellas reclamam. (Apoiados.)

Eu tenho a infelicidade de conhecer uma boa parte do ultramar; e digo infelicidade, não porque não me tenha admirado e extasiado perante as multíplices condições de prosperidade que aquelles paizes em geral encerram, mas porque vejo com pezar a falta dessas providencias administrativas, que fecundam e desenvolvem essas riquezas importantíssimas que ali se encerram, que ali estão, para assim dizer, latentes e improductivas.

Um dos assumptos que mais interessam á provincia do Moçambique, que é aquelle de que mais particularmente me desejo occupar, é o das communicações com os centros civilizados da Europa.

A provincia de Moçambique esteve durante séculos, até 1873, sem ter com a Europa outras communicações que não fossem as de navios de vela.

Em 1873 estabeleceu-se uma companhia de paquetes que, vindo de Inglaterra pelo cabo da Boa Esperança, seguiam até Zanzibar, tocando em Moçambique. Essa companhia, que se denomina Union, e que tem a sua sede em Loudres, começou a ir á provincia de Moçambique, não por ser attrahida polo commercio que já ali existisse, mas porque, tendo um contrato com o governo inglez para fazer o serviço das malas entre o cabo da Boa Esperança e Zanzibar, tanto para o norte como para o sul, passaram os seus vapores duas vezes por mez em frente e á vista de Moçambique, e tiveram vontade de estudar o commercio que ali se fazia já, para ver se, com as communicações regulares que ella lhe offerecia, esse commercio podia desenvolver-se e vir a ser remunerador.

A companhia Union continuou o seu serviço emqnanto durou o contrato com o governo inglez para as inalas de Zanzibar, isto é, até fevereiro de 1881, e acordou effectivamente as attenções da Europa e do mundo, para a vastidão dos recursos d'aquelles esplendidos paizes e para o vigoroso commercio que elles
podiam alimentar.

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Esses vapores começaram depois tambem a tocar em Lourenço Marques, e mais tarde em Inhambane e Quilimane, quando o tempo e o estado d'aquellas barras lh'o permittiam.

Depois veia outra companhia, a Britisk India, fazer o serviço pelo norte, isto é, pelo canal de Suez até Zanzibar. Esta companhia solicitou ou obteve do governo portuguez um contrato para fazer o serviço de Lisboa até Moçambique, e mais tarde o de Moçambique, para os portos do sul, até Lourenço Marques. Este serviço era feito mediante um subsidio muitissimo avultado, que era de 0:000 libras esterlinas (27:000$000 réis) desde a metrópole a Moçambique, e mais 8:000 libras esterlinas (13:500$000 róis) para o serviço dos portos ao sul de Moçambique; ao todo 9:000 libras esterlinas.

Começou, pois, a companhia British India a fazer o seu serviço, primeiro só até Zanzibar, e depois até Moçambique; e o serviço para os portos ao sul de Moçambique nunca o fez durante quatro ou cinco annos, desempenhando-o então a companhia Union sem regularidade, sem compromissos connosco, e só pelo seu interesse proprio.

No entanto, as agencias que em Lisboa e outras terras tinha a companhia British India annunciaram que os seus vapores recebiam carga em Lisboa para os differentes portos da provincia de Moçambique, e o que succedia é que os vapores quando chegaram a Moçambique descarregaram a carga para a alfândega, e os consignatarios ou donos d'essas cargas eram obrigados a fazer até novo frete com outros Vapores, e esse frete tinham do o pagar também, o que importava um grande vexame, um grande atraso para o commercio, e um grande augmento de despeza.

Ainda mais, sr. presidente, emquanto os paquetes da companhia British India chegavam só a Zanzibar, o que durou annos, as nossas malas idas de Lisboa eram ali entregues aos vapores da companhia Union, os quaes quatro dias depois as entregavam em Moçambique, seguindo sem demora para os portos do sul, com as que a esses portos eram destinadas.

Este estado de cousas, emquanto a malas, pelo menos, era satisfactorio, e por isso tratou-se de o aperfeiçoar... peiorando-o.

A British India começou a descer a Moçambique; mas, como precisava de ir tambem às ilhas do Cômoro e a Madagáscar, gastava do Zanzibar a Moçambique, por essas demoradas escalas, onze dias; isto é, sete a mais do que a companhia Union, que vinha directamente pela costa abaixo.

Ora, como a British India era portadora das nossas malas, deixava neste caso de as entregar aos vapores da Union em Zanzibar, o seguia com ellas por Anjoalme, Mayotta e Majunga, demorando as mais sete dias do que devia, e chegando a Moçambique sete dias depois do ter largado para os portos do sul o vapor da Union!

O resultado era que as malas destinadas a Quelimane, Inhambane e Lourenço Marques, ficavam com este aperfeiçoamento demoradas em Moçambique, de onde só partiam tres semanas mais tarde!

Contra estes factos incriveis nunca, que me conste, reclamou o nosso governo, continuando a companhia a zombar do serviço que desempenhava a sou bel-prazer, sem ser fiscalisada nem compellida a um melhor desempenho.

Este estado de cousas não podia continuar. Como, porém, no contrato com o governo não havia condição alguma pela qual a companhia fosse castigada no caso de não fazer um serviço regular e rápido, esta não attendia às reclamações que o commercio mais de uma vez nos diversos portos lho dirigiu.

Succedia mais; os paquetes que vinham de Inglaterra e tocavam em Lisboa tinham obrigação do reservar o espaço para 100 toneladas do carga que em Lisboa fosse embarcada; mas, às vezes em Inglaterra embarcavam carga a mais, e quando chegavam a Lisboa não tinham a capacidade necessária para receber as 100 toneladas de contrato. Succedia, pois, que os negociantes que de Lisboa tinham de mandar carga para Moçambique nunca tinham a certeza de que ella podesse ser embarcada, e muito menos, de que ella chegasse por acaso ao seu destino.

Acontecia, também, às vezes, que os vapores chegando a Aden, porto onde se encontravam com o vapor que seguia para Moçambique, tinham de fazer baldeação para esse vapor mais pequeno, quando estes não estivessem já abarrotando de carga vinda da India e tendo pago novo frete porque em tal caso desembarcavam no Aden a carga vinda de Lisboa, sem o minimo escrupulo.

O resultado era ter essa carga de esperar em Aden que outro vapor a recebesse, ficando, por consequencia, demorada ali, e sujeita a todos os inconvenientes e prejuizos que d'ahi podessem resultar para o commercio.

Dizem ainda da provincia de Moçambique, que a companhia British India não faz; o serviço com regularidade; não só as viagens são morosas, mas não tem a regularidade que seria para desejar; e alem disso não ha segurança para a carga confiada aos cuidados da companhia, succedendo muitas vezes que essa carga é estragada á bordo, roubada o viciada.

E como todas estas cousas não estão acauteladas no contrato, por moio de multas que obriguem a companhia a fazer um serviço regular, a companhia commette essas irregularidades sem a mais pequena responsabilidade.

É para isto que eu desejava chamar a attenção do governo, a fim de que por meio dos seus agentes na provincia, que são o governador geral e os seus subalternos, procurasse informar-se minuciosamente, ouvindo tambem o commercio, das queixas justas que possa haver contra a companhia, e tomar providencias para remediar este estado de cousas, obrigando a companhia a um serviço mais regular e mais perfeito.

O outro ponto sobre que eu desejava chamar a attenção do sr. ministro da marinha era o serviço medico na provincia de Moçambique, serviço que tem sido ali muito descurado.

Aquelles pontos não são tão salubres como a Europa, mas tambem podem deixar de ser tão maus como em geral são considerados por aquelles que se comprazem em desacreditar, desconhecendo-os. Consegue-se isto já emprehendendo junto às povoações os grandes trabalhos de saneamento que em algumas d'ellas se iniciaram, já e especialmente se nós ali tivermos o pessoal medico competente para occorrer às necessidades dos differentes districtos.

Infelizmente não succede assim os quadros estão quasi desertos, e não tendem a preencher-se as vagas que n'elles ha; nos portos de mais importancia faltam às vezes facultativos, faltam, pharmaceuticos, faltam medicamentos, e está a população entregue aos desvelos do um qualquer curandeiro que queira ganhar dinheiro.

Este abandono não podo nem deve continuar por mais tempo; é necessario attender-se á saude dos empregados que vão ali arriscar a sua vida ou pelo menos a sua saude a troco do remunerações exiguos. (Apoiados.)

Se o sr. ministro da marinha e ultramar olhar com attenção para estes assumptos achará muito que reformar e melhorar.

Outro assumpto que tambem deve merecer a attenção do s. exa. é o das obras publicas.

A organisação que em 1877 se deu às obras publicas na provincia de Moçambique e nas outras era talvez grandiosa, mas devia com o tempo proporcionar beneficos resultados a esses paizes, se a idéa que a creou tivesse sido continuada; infelizmente a idéa foi interrompida, e os recursos faltaram mesmo durante os tres annos a que se tinham obrigado engenheiros distinctissimos que para lá foram. Nem mesmo a maior parte das obras que elles ence-

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taram foi concluida. E o que digo da provincia de Moçambique digo-o de todas as outras.

Isto é mais importante do que se póde á primeira vista imaginar.

Antes de se mandarem aquellas expedições de obras publicas, cada uma das provincias tinha a seu cargo as obras da provincia, satisfazia às suas necessidades com os recursos, maus ou bons, de que dispunha. Logo que chegaram as expedições tornou-se impossível a continuado do antigo estado de cousas, e foi extincto quanto havia de obras publicas e entregue às novas direcções. De maneira que hoje estão as novas direcções quasi sem meios para continuarem os seus trabalhos, e cessou ha, muito o antigo estado de cousas e não se sabe nem se prevê como será resolvida a continuação das obras publicas no ultramar, que reclamam ainda grossos cabedaes.

Ora, parecia-me que as despezas que se fizessem com as obras publicas, longe de serem improductivas, seriam altamente compensadas num próximo futuro, pela grande vantagem que às provincias dariam, já estabelecendo-se communicação com o interior, por meio de caminhos de forro e telegraphos, já incutindo nos indigenas as uteis praticas do trabalho, que os levantam e que os vão successiva e gradualmente regenerando e civilisando.

Mais duas palavras antes de terminar. Existe no districto de Lourenço Marques um ponto muitissimo salubre nas margens do rio Bembe ou Inhampura, onde ha pouco mais de um anno se foi estabelecer um verdadeiro portuguez, (Apoiados.}, um homem muitíssimo patriota, muitissimo intelligente, com immensa boa vontade e energia, com muitos conhecimentos praticos do sertão, e que devia ser mais bem aproveitado pelo governo do que o tem sido; esse homem é conhecido por muitos dos que me estão ouvindo, e chama-se Deocleciano Fernandes das Neves; era um antigo caçador de elephantes, n'aquelles sertões e no Transwaal, é homem de toda a probidade e amigo do regulo Musilla, que elle ajudou a collocar no throno nas guerras contra o irmão Mauéva.

Pôde por consequencia ser aproveitada a sua influencia para bem do nosso commercio no interior da Africa. Esse homem, que está prompto a empregar essa influencia em nosso favor da melhor vontade, está hoje estabelecido no Bembe sob os auspicios do Musilla, e póde prestar os mais assignalados serviços ao governo portuguez e á nossa soberania n'esses territorios, se soubermos aproveitar a sua intelligencia e boa vontade.

Para este e outros assumptos que a camara não desconhece, seria muito necessario remodelar completamente as attribuições administrativas dos governadores do ultramar. N'esse sentido, o illustre ministro do ultramar que precedeu o actual, o sr. Julio de Vilhena, reuniu diversas commissões para tratarem d'esses assumptos; essas commissões, com excepção da minha pessoa, que fazia parte de uma d'ellas, eram compostas de pessoas as mais competentes que se podiam encontrar para estudos d'essa natureza. Essas coumiissões fizeram varios trabalhos, uns concluidos, outros quasi, mas não me consta que nenhum d'elles fosse convertido em lei ou esteja em condições de ser praticamente aproveitado ou pelo menos experimentado.

Seria por tanto tambem muitíssimo conveniente que o actual sr. ministro do ultramar chamasse a si esses estudos já feitos, ponderasse a importancia d'elles, e no caso de os achar aproveitaveis, os convertesse em leis, e no caso contrario, nomeasse commissões para os corrigir no sentido que s. exa. entendesse. (Apoiados.)

Havia ainda differentes pontos sobre que eu desejaria chamar a attenção de v. exa. e da camara, mas como a hora está adiantada, não farei agora mais considerações.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O sr. Manuel d'Assumpção: - Mando para a mesa o parecer da commissão do fazenda ácerca das alterações propostas ao projecto n.º 100, que tem por fim tributar o sal.

Peço a v. exa. que consulte a camara se dispensa o regimento para poder entrar desde já em discussão.

Consultada a camara, resolveu afirmativamente. O sr. Presidente: -Vac ler-se o parecer para entrar em discussão.

É o seguinte:

PARECER

Senhores. - A vossa commissão de fazenda examinou as alterações que pelos srs. deputados Mariano de Carvalho, Elias Garcia e Franco Frazão foram apresentadas em sessão de é de abril, com o fim de alterar o disposto no projecto n.° 100, que tem por fim tributar o sal.

Versam essas propostas sobre assumptos que tinham sido já ponderados pela commissão e por isso resumidamente agora apresenta as rasões do seu parecer.

O sr. Mariano de Carvalho propoz:

1.° Que fosse isento do imposto o sal empregado nos usos agricolas e induatriaes, podendo ser desnaturado.

Esta proposta não parece attendivel á commissão, porque, sendo o sal entre nós de muito restricta applicação nos usos agricolas, as difficuldades que esta isenção traria á fiscalisação do imposto, não ficavam compensadas pelas vantagens dos agricultores, acrescendo que o systema de desnaturação do sal tem sido abandonado como prejudicial e inefficaz por quasi todas as nações que o ensaiaram. Emquanto ao sal empregado nas industrias, já no projecto se isenta o que podia ser isentado.

2.º Propoz o mesmo sr. deputado que se declarasse na lei que a fiscalisação do imposto só podia ser exercida nos locares da producção, sendo livro e sem dependência de guias o transito do sal e a sua venda. Acrescentando que, no caso do se estabelecerem guias e licenças para a fiscalisação do imposto, se declarasse se ficavam ou não sujeitas ao imposto do sólio e qual elle fosse.

Estas alterações dizem respeito á fiscalisação do imposto, e terão de ser ponderadas quando se tratar do regulamento para essa fiscalisação.

Esse regulamento deverá ser feito em harmonia com o disposto no projecto e de modo que dê as suficientes garantias ao estado, som vexame para os contribuintes, não julga assim a vossa commissão que seja no projecto em questão que se devam inserir estas disposições.

3.° Propoz que o imposto fosse fixado sobre o peso o não sobre o volume do sal.

A commissão, ponderando que a medida de capacidade é a usada entre nós para a compra e venda do sal, julga que deve ter fixado o imposto por esta medida, pois é mais fácil e monos sujeita a fraudes a cobrança do imposto.

4.º Propoz que fosse isento do imposto o sal empregado na salga da azeitona.

Esta isenção tornaria quasi impossivel a fiscalisação do imposto, e sendo o azeite um producto de preço elevado para cujo fabrico o sal entra em diminuta porção, não póde o imposto influir no seu preço de modo que reclame uma isenção justificavel.

5.° Propoz que se declarassem as penas e multas a que ficavam sujeitas as transgressões da lei, mas estas penas e multas já estão fixadas na respectiva legislação, que se refere a descaminho de direitos devidos á fazenda publica, e assim nenhuma necessidade ha de se inserirem no projecto.

O sr. deputado Elias Garcia propoz que fosse isento do imposto o sal empregado na salga da courama; a commissão, porém, não julga que haja motivo bastante para justificar esta isenção.

A proposta apresentada pelo sr. deputado Franco Frazão é uma substituição do projecto, reduzindo o imposto a 2 réis em litro de sal, sem admittir isenção alguma; pelos motivos já expostos pela vossa commissão no parecer que precede o projecto, não parece attendivel esta proposta.

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N'estes termos, é a vossa commissão de parecer que nenhuma das alterações propostas pode á ser attendida.

Sala da commissão de fazenda, 2 de maio de 1882. = Lopo Vaz de sampaio e Mello - Filipe de carvalho - Adolpho Pimentel - Antonio de Sousa Pinto de Magalhães - José Maria dos Santos - J. A Gonçalves - Antonio Maria Pereira Carrilho = Azevedo Castello Branco = Frederico Gusmão Pereira Arouca - Luciano Cordeiro - Manuel d'Assumpção, relator.

Posto á votação, foi approvado.

O sr. Carrilho: - Mando para a mesa um requerimento.

É o seguinte:

Requerimento

Requeiro, por parte da commissão de fazenda, que seja devolvido á camara, da direcção geral das alfandegas, com urgencia, o projecto do lei que transforma o imposto do 70:000$000 réis, pagos pela cultura do tabaco nas ilhas dos Açores o Madeira, independentemente da resposta do governo. = A. Carrilho, secretario.

Mandou-se expedir.

O sr. Lopes Vieira: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal do Leiria, em que pede a esta camara a approvação do projecto n.° 128-D, que
estabelece o imposto do 360 réis sobre cada decalitro de aguardente.

Peço a v. exa. que, a exemplo do que se tem concedido a representações analogas, consulte a camara se permitte que esta representação seja publicada no Diario do
governo.

Mando tambem para a mesa a declaração de que, por motivo justificado, faltei ás duas ultimas sessões.

Leu-se na mesa o seguinte:

Participação

Declaro que não compareci às duas anteriores sessões, por motivo justificado. = Lopes Vieira.

Á secretaria.

O sr. Luciano Cordeiro: - Mando para a mesa um projecto tendente a resolver a situação indefinida e illegal em que se acham os officiaes que constituiram a expedição scientifica á Africa central em 1877.

Este projecto, supponho eu, que considera e attende os diversos alvitres indicados nas differentes propostas que se apresentaram n'esta e na outra camara em 1880.

Não farei commento algum ao projecto que mando para a mesa, e que tem uma natureza muito especial. Entre o ter de me alargar nas considerações que naturalmente me suggerem os factos a que este projecto se refere, ou que mais ou menos intimamente se relacionam com elle, e o conservar uma discreta reserva ácerca dê muitos d'esses factos, prefiro este segundo expediente, para honra do paiz e para honra nossa.

Mas, como disse, este projecto prende-se com um assumpto especialissimo, e por isso mando para a mesa um requerimento para que seja nomeada uma commissão especial de sete membros, a fim do dar urgentemente parecer sobre este projecto, de accordo com o governo.

Mando tambem para a mesa o seguinte requerimento. (Leu.)

Este requerimento é para que a camara se possa elucidar perfeitamente, se o não está ainda, ácerca dos relevantissimos serviços prestados por estes distinctissimos e benemeritos officiaes, que tão alto e tão nobremente levantaram e honraram o nome portuguez aos olhos da Europa culta.

Peço a v. exa. que me reserve a palavra para quando estiver presente o sr. ministro da marinha e ultramar, porque desejo associar me às observações feitas pelo meu amigo, o sr. Castilho, ácerca das providencias que só tenham tomado sobre os graves acontecimentos occorridos na provincia de Moçambique, o particularmente ácerca do enxovalho que soffreu um navio de guerra portuguez na bahia de Tungue, ao sul do parallelo 10 e 41, que é o limite norte d'aquella provincia.

O sr. Fonseca Coutinho: - Mando para a mesa nina representação da camara municipal de Castello de Vide, pedindo a concessão de alguns predios existentes no seu concelho e pertencentes nos ministerios da fazenda e guerra, para fins do utilidade publica.

Requeiro a publicação no Diario do governo.

Assim se resolveu.

O sr. Emygdio Navarro: - Eu tinha pedido a palavra na sessão anterior para quando estivesse presente o sr. ministro do reino, porque eu o sr. Coelho de Campos tinhamos que solicitar de s. exa. providencias para accudir ao estado do anarchia que lavra nos districtos de Aveiro o de Vizeu.

Lamento que s. exa., prevenido pelo sr. ministro das obras publicas, que de certo não deixou de lhe communicar os nossos desejos, ainda aqui não apparecesse.

O sr. Presidente: - Peço licença ao sr. deputado para lhe dizer que o sr. ministro já aqui esteve na sala, e cá empenhado numa discussão na camara dos pares.

Desejo que o governo me diga quaes são as providencias que tomará sobre estes factos gravissimos.

Isto está num estado tal de anarchia que não sei onde iremos parar.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): possivel que se tenham da os factos a que o illustre deputado alludiu, mas não chegaram ao meu conhecimento.

Creio que o sr. ministro da marinha virá aqui na sessão de hoje, o poderá melhor do que eu dar explicações ao illustre deputado.

D'estes factos isolados, que eu estimaria que não se tivessem dado, se se deram, não se póde tirar a conclusão que o lllustre deputado tirou.

Elles não provam mais do que a existencia do criminosos, que não é de agora, é de todos os tempos, e a necessidade de os cohibir e punir. (Apoiados.)

O sr. Rosa Araujo: - Mando para a mesa uma representação ácerca do projecto sobre o augmento de direitos na aguardente de cereaes.

Peço a v. exa. que lhe dê o destino conveniente.

O sr. Luciano de Castro: - Mando para a mesa um requerimento pedindo esclarecimentos ao governo.

(Leu.)

Peço a v. exa. que mande expedir com urgencia este requerimento, porque preciso destes documentos para pedir explicações ao sr. ministro do reino, a respeito do procedimento do governo em relação á eleição de procuradores A junta geral de Aveiro, e aos factos verdadeiramente extraordinarios que ali têem occorrido.
V. exa. já disse em resposta ao sr. Navarro, que o sr. ministro do reino tinha estado nesta camara, mas que não está agora presente, porque foi para a outra casa do parlamento; e coroo não desejo fazer observações algumas na ausencia de s. exa., por isso pedia a v. exa. o favor do

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mandar prevenir o sr. ministro, de que desejava fazer-lhe algumas perguntas, ácerca do estado da administração dos districtos de Aveiro e Vizeu, e que essas perguntas exigem uma resposta urgente, porque é urgente o assumpto.

Desejo tambem chamar a attenção de s. exa. sobre os ultimos acontecimentos da capital, por occasião das festas do centenario pombalino. Está presente o sr. presidente do conselho, e não sei se s. exa. se julgará habilitado para responder-me, porque então, não tinha duvida alguma em formular as minhas perguntas.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Fontes Pereira de Mello): - Peço a palavra.

O Orador: - Aguardo a resposta de s. exa.

Leu-se na mesa o seguinte:

Requerimento

Requeiro que seja enviado com urgencia pelo ministerio do reino copia:

1.° De uma portaria dirigida no fim de abril ultimo ao ministerio publico no supremo tribunal administrativo, sobre recursos pendentes relativos a eleições dos procuradores às juntas geraes;

2.° De um telegramma dirigido por aquelle ministerio ao governador civil de Aveiro no dia 1 de maio a respeito da consulta do supremo tribunal administrativo relativo á eleição de Gaspar de Castro Lemos para procurador á junta geral por Oliveira de Azemeis. = José Luciano.

Mandou-se expedir.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: - (Fontes Pereira de Mello): - Sobre os assumptos relativos aos districtos de Aveiro e Vizeu, parece-me que é mais conveniente que responda o sr. ministro do reino, que está, certamente, minto mais habilitado do que eu para, responder; agora sobre o assumpto que diz respeito ao centenario pombalino, não sei quaes serão as perguntas que o illustre deputado pretende fazer. Taes serão ellas que eu não possa responder.

S. exa. é quem póde calcular se poderei ou não, rasoavelmente, responder sobre esse assumpto.

Nada mais.

O sr. Manuel d'Assumpção: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Alijo pedindo a approvação da proposta de lei apresentada pelo sr. ministro da fazenda sobre o imposto da aguardente do cereaes.

Peço a v. exa. que lhe dê o destino conveniente.

O sr. Luciano de Castro: - Effectivamente as perguntas que desejo fazer ao governo sobre os acontecimentos por occasião do ultimo centenário dizem mais respeito ao sr. ministro do reino, e por isso aguardo a presença de s. exa., renovando novamente o meu pedido a v. exa. para que, com urgência, mande prevenir o sr. ministro de que desejo chamar a sua attenção para assumpto grave.

O sr. Presidente: - Já mandei prevenir o sr. ministro do reino á outra casa do parlamento, e s. exa. não póde tardar. Em todo o caso promotto ao illustre deputado que a sessão não se encerrara sem que s. exa. dirija as perguntas que deseja ao sr. ministro do reino.

A hora está muito adiantada, passa-se á

ORDEM DO DIA

Discussão do orçamento da despeza do ministerio da marinha

Capitulo 1.° - Secretaria d'estado e repartições auxiliares .... 67:490$350

Foi approvado sem discussão.

Capitulo 2.º - Armada nacional .... 856:696$545

Foi approvado sem discussão.

Capitulo 3.° - Tribunaes e diversos estabelecimentos .... 78:960$908

O sr. Scarnichia: - Fui pouco apressado: queria dizer algumas palavras sobre o capitulo que diz respeito á armada nacional, porque, como official da marinha, entendo que não posso deixar de dizer alguma cousa sobre o assumpto, principalmente no que passo a expor.

Desejo chamar a attenção do governo para um facto que infelizmente não é de agora e que por isso não tenho em vista pedir responsabilidades a nenhum dos srs. ministros, limitando me a desejar que a elle prestem a sua attenção.
Refiro-me ao estado em que se encontra actualmente a nossa marinha de guerra. (Apoiados.)

Infelizmente o numero de navios diminuo, e se o governo não attender a que é preciso fazer novas construcçõcs para substituir aquclles navios que já se acham bastante deteriorados, nós cVaqui a dois annos ficámos sem armada. (Apoiados.)

O sr. ministro sabe isto muito bem e creio que é d'esta mesma opinião.
As estações estão com uma força deficientissima.

A de Macau acha-se apenas com uma canhoneira, quando ali deve haver, pelo menos três navios, sendo um para estar na provinda, outro para ir ao norte, onde temos importantíssimos interesses, e o terceiro para estacionar em Timor, onde é conveniente que tambem appareça a nossa bandeira.

A estação de Angola tambem está reduzida; ali deve haver navios que não só façam o serviço da costa, mas que tambem vão ao Brazil, onde temos bastantes interesses, e onde não vae navio nenhum de guerra portuguez ha muitos annos. (Apoiados.)

Moçambique não está melhor. Apenas ha dois navios e em rná.s condições.

Ora, nestas circumstancias, parece-me que, embora o estado do thesouro não seja o mais animador, comtudo e preciso fazer sacrifícios para votar alguns meios que permitiam novas construcções e assim substituir os navios incapazes por novos, com que possamos sustentar a nossa autonomia nas colonias. (Apoiados.)

Ha tambem outro ponto para o qual chamo a attenção do governo. O sr. ministro já aqui apresentou uma proposta, mas por circumstancias que escuso lembrar nfiO se discutiu ainda; refiro-me á reorganisação das capitanias de portos, projecto que, embora traga algum augmento de despeza, é compensado pela receita que se cobra; alem de que a despeza que se propõe, já quasi que ha muito se faz, porque a necessidade do serviço assim o tem reclamado.

A respeito do corpo de marinheiros nada direi, porque o recrutamento tem ido, embora em muito pequena escala, produzindo o pessoal necessario para attender, não só ao serviço, como tambem às baixas a que algumas praças já tinham direito.
N'esta parte nada mais digo senão que faço votos para que o pessoal continue a entrar para o corpo de marinheiros como agora succede, porque, embora elle venha em pequena escala, de alguma maneira suppre às deficiências que havia ainda ha muito pouco tempo.

Tenho aqui para apresentar três propostas assignadas pelos meus collegas da marinha, e que me parece devem merecer a attenção do sr. ministro da marinha, que, se trazem, creio eu, algum pequeno augmento de despeza, é este tão justo, que não se torna digno de reparo.

A primeira diz respeito á companhia de veteranos da armada.

No exercito, quando uma companhia de veteranos excede 100 praças, a gratificação do commandante e de 10$000 réis mensaes, não sendo justo que haja differença para a divisão de veteranos da armada.

A segunda, que tem por fim dar aos capitães de fragata e capitães tenentes as comedorias dos postos immediatos, quando exercem o cominando de estação, tem rasão de ser, porquanto não me parece que, exigindo-se-lhes as despezas

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de taes cargos, não sé lhes auxilie a receita, como acontece, segundo a tabella n.º 3, de comedorias como capitães de mar e guerra e officiaes generaes.

A terceira proposta e para que sejam abonados 25 por cento sobre os seus vencimentos aos escreventes da armada, quando em estação.

Eram estas as observações que tinha a fazer, e espero que o governo e a illustre commissão as tomem na devida conta.

Leram-se na mesa as seguintes:

Propostas

1.ª Propomos que ao commandante da divisão de veteranos da armada se tornem extensivas as disposições do artigo 5.° do decreto com força de lei do ministerio da guerra, de 4 de novembro de I8t!8, que manda abonar a gratificação mensal de J0$000 réis aos commandantes das companhias do reformados do exercito, quando estas tenham força superior a 100 praças.

Sala das sessões da commissão de marinha, 12 de maio de 1882. = João Eduardo Scarnichia = Augusto de Castilho = Custodio Miguel Borja = Francisco de Paula Gomes Barbosa.

2.ª Propomos que aos capitães de fragata e capitães tenentes, commandando mais de um navio em estação, se abonem as comedorias do posto immediato, como para os capitães de mar e guerra e officiaes generaes prescrevo a tabella n.° 3, de comedorias, annexa ao decreto com força de lei de 30 de dezembro de 1868.

Sala das sessões da commissão de marinha, 12 de maio de 1882. = João Eduardo Scarnichia = Augusto de Castilho = Custodio Miguel Borja = Francisco de Paula Gomes Barbosa.

3.ª Propomos que aos escreventes, de bordo dos navios do estado se façam extensivas as disposições do § 1.º do artigo 7.° do decreto com força de lei de 30 de dezembro de 1808, que mandou abonar 25 por cento sobre os respectivos vencimentos ás diversas classes do estado menor dos sobreditos navios, quando em serviço de estação na Africa, America, China e Timor, porquanto são os referidos escreventes as únicas praças do citado menor que não gosam do dito beneficio, não obstante serem os que têem menor vencimento.

Sala das sessões da commissão de marinha, 12 de maio de 1882. = João Eduardo Scarnichia = Augusto de Castilhe = Custodio Miguel Borja = Francisco de Paula Gomes Barbosa.

Foram admittidas.

O sr. Ministro da Marinha (Mello Gouveia): - Sinto que o1 meu estado dó saude não tenha melhorado quanto era preciso para eu poder bem cumprir os meus deveres perante o parlamento.

E como esta situação de saude me não permitte dar grande desenvolvimento às minhas observações, responderei succintamente às reflexões do illustre deputado que me precedeu.

Notando, em primeiro logar, a s. exa. que, emquanto a navios da armada, comprchendo a necessidade de se augmentar o numero d'elles; mas eu estou ligado a uma administração que tomou por objectivo da sua gerencia o por ponto de apoio da sua politica compor as desordens da fazenda publica, procurando equilibrar as receitas e as despezas ordinarias da nação, extinguindo, ou, pelo menos, attenuando notavelmente o deficit consideravel que ha muito tempo desconcerta o seu balanço; e não mo atrevo, portanto, a apresentar nesta sessão a proposta que mo propunha trazer ao parlamento para subsidiar a acquisição de, pelo menos, quatro navios, dois comprados no estrangeiro e dois fabricados em o nosso arsenal, porque, comquanto esta despeza se possa considerar como extraordinaria, é claro que viria pesar sobro os recursos ordinarios do thesouro, porque não é actualmente a occasião opportuna de recorrer do novo ao credito, o que perturbaria as combinações financeiras a que o governo applica a sua especial attenção. Comtudo, se a camara, compenetrada da necessidade urgente que temos de prover aos serviços, importantes que a marinha é destinada a desempenhar nas estações coloniaes e na protecção devida ao nosso commercio externo, e convencida de que não temos o numero de vasos em estado de servir que é necessario para essas commissões, não só para as reforçar, mas mesmo para as render, quizer e poder tomar alguma resolução que nos dê os recursos necessarios para este effeito, eu não torci senão a congratular-mo com a sua providencia e com o seu patriotismo.

Referiu-se o illustre deputado tambem às capitanias dos portos, que desejou ver reorganisadas conforme a um projecto que está pendente da bencção parlamentar.

Não sou ou que posso contestar a necessidade de serem reorganisadas, porque fui eu mesmo que ha quatro ou cinco annos apresentei á camara a proposta de lei de que se trata, que, depois do esquecida muito tempo nos archivos das commissões, foi approvada nas duas casas do parmento na sessão legislativa do 1881, se me não engano, vindo á camara dos senhores deputados com umas pequenas emendas feitas na camara alta, e caducando pela terminação da legislatura em 1881. Actualmente creio que está suspensa no andamento por considerações de despeza, que o governo quer evitar em tudo o que não seja indispensavel; mas, pela minha parte, estimarei muito a occasião em que venha a ser approvada.

Quanto ao corpo de marinheiros, o illustre deputado sabe que se tem melhorado o recrutamento para a marinhagem, e tanto que se têem dado regularmente as baixas a todos os marinheiros que, tendo acabado o seu tempo de serviço, as requerem. Se o recrutamento não está ainda nos termos que era para desejar, não poderá s. exa. deixar de reconhecer que tem melhorado muito; não se faz tudo de uma vez, o é já uma grande satisfação que os marinheiros não bradem contra a violencia que os retém no serviço contra as suas conveniencias e a sua obrigação. E é já muito para estimar que as baixas d'este corpo, que não ha muito tempo ainda chegavam a ser do 600 e mais homens, não passem hoje de pouco mais de 200.

As propostas do illustre deputado vão á commissão, aonde serão devidamente consideradas e attendidas como merecerem.

O sr. Mariano de Carvalho: - O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Secretario (Ferreira de Mesquita): - A commissão de redacção não fez alteração ao projecto de lei n.º 100.

Vão ser expedido para a outra casa do parlamento.

O sr. Ministro da Marinha (Mello Gouveia): - Agradeço ao illustre deputado a benevolência com que me tratou, corto de que s. exa. não porá em duvida a sinceridade da minha gratidão, porque não póde desconhecer o alto valor em que tenho a sua amabilidade e cortezia.

Respondendo aos seus quesitos direi, sobre a historia graciosa que s. exa. fez das aventuras de navegação do casco da corveta Sagres, que não ha mudança alguma na idéa do governo de estabelecer no Porto uma escola de alumnos marinheiros, similhante á de Lisboa; e se o tempo continuou e impediu a entrada na barra do Porto d'aquelle navio não se desiste por isso d'esse pensamento, que opportunamente se ha do realisar em condições definidas de organização e do utilidade pratica.

A corveta ia fazer no Porto as obras necessárias para se adaptar a-este destino de escola do moços e esperar ali a auctorisação legal que ainda não tínhamos para esta fundação.

S. exa. sabe que está pendente da sancção parlamentar a proposta de lei apresentada pelo governo dos seus amigos, o de que ou renovei a iniciativa, para a, creação des-

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tas escolas no Porto e era Faro, e já que o tempo se encarregou de nos dar uma lição de legalidade, impedindo que a corveta entrasse no Porto, antes de estarmos; auctorisados para custear a despeza da escola, e bom que a aproveitemos, habilitando-nos primeiro para esse fim, no que conto com o apoio do illustre deputado, visto que s. exa. sabe que o corpo de marinheiros tem 40:000$000 réis de sobras do seu credito orçamental, que são os recursos applicados a esta despesa e que em tal caso bem chegariam para custear uma destas escolas no Porto e outra em Faro, que é a idéa do governo persistente: porque entende que estas escolas são utilissimas á marinha militar, familiarisando as creancas com a vida do mar, educando-as nos habitos da disciplina militar e instruindo-as cuidadosamente no que ha de servir ao seu caracter moral e á sua aptidão profissional.

Referindo-se á escola naval, s. exa. notou que era um estabelecimento caro, cujos productos não correspondiam á despeza, quereria que fosse reformado em condições mais economicas, já porque ali havia cadeiras que existiam em outras escolas da capital, aonde podiam ser frequentadas pelos alumnos da escola naval, poupando-se a duplicação de professores das mesmas disciplinas, já porque nesta escola havia cadeiras servidas com um desperdício singular de vencimentos e aptidões, porque até havia um contra-almirante servindo de professor auxiliar de desenho, e, finalmente, porque um guarda-marinha saia desta escola por um preço fabuloso em comparação do que custava nas escolas navaes de Italia e de outros, paizes, accentuando especialmente a, comparação da escola da Italia e da nossa.

Sr. presidente, eu não sei se nós poderemos reformar a escola naval em condições mais economicas, como deseja o illustre deputado e nós todos devemos estimar, parecendo á primeira vista que o ensino das mathematicas e de quaesquer outras disciplinas que sirvam de preparatórios às theorias e praticas da sciencia náutica, bem poderiam ser estudadas em outros estabelecimentos aonde existem estas cadeiras, fora desta escola de applicação; e assim é claro que se pouparia na escola naval a despeza dos respectivos professores - questão que se não resolve sem o exame das condições orgânicas dos estudos desta e das outras escolas alludidas, dados que nós não temos agora presentes para nos decidirmos.

Mas o que sei e que, em todo o caso, o argumento de comparação, adduzido por s. exa., com a escola da Italia, não procede, porque uma grande marinha habilita periodicamente o numero de officiaes que precisa para o seu serviço e que, saindo da mesma escola, dão um quociente de despeza proporcionalmente inferior ao numero menor de officiaes que habilita uma marinha mais pequena, noutro instituto similhante, que sendo pouco mais ou menos de igual organisação, não póde variar sensivelmente nos limites da despeza geral.

E esta condição desfavoravel e irremediavel para nós, que somos os da marinha pequena. E tão irremediavel, sr. presidente, que nós ainda habilitámos mais guardas-marinhas do que precisâmos e temos de restringir esta habilitação; ou pelo menos não nomear segundos tenentes senão em caso de vacatura, alterando o preceito de lei, que faz segundo tenente todo o guarda-marinha que tiver o tirocinio pratico.

É realmente para sentir que seja fundado o reparo do illustre deputado no facto de estar um contra-almirante servindo de professor auxiliar de desenho. E sem que isto seja desairoso para o digno militar, que nobremente procura no seu trabalho os recursos de que carece a sua vida, é de justiça observar que o quadro do pessoal da nossa marinha de guerra está fixado pela lei do sr. Latino Coelho para 32 navios armados e que infelizmente o nosso armamento naval não passa de 18 ou 19 navios, e d'ahi vem que os benemeritos officiaes da armada, se vêem obrigados a solicitar e a aproveitar todas as commissões e todas as
occupações honestas que podem alcançar para melhorar os seus meios de existência.

Por ultimo affirmou s. exa. que era preciso discutir a questão colonial e que passará de leve sobre o orçamento de marinha se lhe promettem uma poposta ou texto qualquer para essa discussão. Pois eu vou dar a s. exa. um texto apropriadissimo para esse debate.

Mando para a mesa uma proposta pedindo um credito de 481:000:000 réis para saldar as despezas do ultramar no anuo económico de 1882-1883.

Mando mais para a mesa outra proposta reorganisando o serviço de saude naval.

É provavel que não haja tempo para se, discutir ainda nesta sessão a proposta a que me acabo de referir, mas li cará conhecida da camara e do publico para ser discutida na proxima sessão.

Creio ter respondido às perguntas que me foram dirigidas pelo illustre deputado, a quem continuarei a satisfazer no que poder e souber com a consideração que me merece.

As propostas são as seguintes:

Proposta de lei n.º 170-A

Senhores. - O serviço de saude naval, de cuja boa organisação depende em grande parte a saude e a vida dos que lidam na arriscada tarefa da navegação militar, é um dos que exigem mais desvelada attenção da parte dos poderes publicos.
Cumpre por isso que, sempre que a experiência demonstrar que aquelle ramo da administração publica carece de ser melhorado, não se lhe falte com as providencias que as circumstancias aconselharem.

Os decretos com força de lei de 26 de dezembro de 1868 e de 9 de dezembro de 1869, que reorganisaram o serviço de saude da armada, obedecendo ao principio da mais rigorosa economia, supprimiram legares que não podiam ser dispensados, desattendendo algumas necessidades deste serviço, que não podem preterir-se numa nação maritima de tão vasto dominio colonial, como a nossa.

D'esde ha muito que a experiência está demonstrando que a organisação estabelecida por aquelles decretos não póde subsistir sem modificações que melhorem o serviço e atraiham a elle pessoas habilitadas para o desempenhar.

As necessidades do serviço têem augmentado, e as difficuldades do recrutamento do pessoal de facultativos só podem desapparecer pela adopção de providencias legislativas, que considerem com justiça a situação e o futuro distes utilissimos servidores do estado.

Estas considerações me levam a apresentarmos a seguinte proposta de lei, em que são attendidas as mais instantes exigencias do serviço medico naval, e que me parece o collocará em circumstancias de satisfazer às actuaes necessidades da nossa marinha de guerra.

Em breve resumo vos exporei as principaes modificações que proponho na actual organisação, e as rasões que, no meu entender, as justificam e as tornam necessarias.

No quadro dos facultativos navaes, já de si pouco numeroso para as necessidades do serviço, dá-se, desde ha muitos annos, a notavel anomalia de haver sempre um crescido numero de vacaturas, sem que se offereçam candidatos para preenchel-as. Desta deficiencia de pessoal provem o não serem muitas vezes attendidos todos os serviços que aquelles funccionarios são destinados a desempenhar, e o pesarem fortemente sobre elles os encargos dos mesmos serviços pela repetição, com breves intervallos, de commissões árduas e penosas, como não acontece às outras classes dos officiaes da armada.

Differentes causas concorrem para afastar d'aquelle quadro os facultativos, e a tão graves inconvenientes não têem sido indifferentes os governos, que têem procurado obviar-lhes com providencias em diversas epochas promulgadas. Entre estas foi de provada proficuidade a creação dos logares de aspirantes a facultativos, á qual tem fornecido os

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unicos individuos admittidos no quadro de saneie naval durante os ultimos vinte annos.

Tal providencia, porém, se ha d'essa forma proporcionado a substituição dos facultivos que se têem reformado e dos que têem fallecido, não tom satisfeito cabalmente ao que d'ella se esporava, e que era o completo preenchimento do quadro. Tem obstado á realisação d'este intuito o facto de abandonarem o serviço da armada, logo que completam o tempo por que são obrigados a desempenhal-o, muitos dos facultativos que foram aspirantes, para irem em busca de maiores vantagens que lhes offerecem a clinica civil, os quadros das provincias ultramarinas, o do exercito, etc.

Importa que ao proveja de remedio a este estado do cousas, e que se removam as cousas que, não só levam estes facultativos a isentar-se, assim que o podem fazer, de um serviço que apenas consideram como encargo transitorio, mas tambem evitam que os facultativos civis se apresentem candidatos á entrada no quadro.

Entre essas figura, como a de maior vulto, o demoradissimo accesso que têem os facultativos navaes, e que por dilatados annos os conserva afastados dos logares superiores do seu quadro.

Por isso proponho a reorganisação d'aquelle quadro, de modo que abrevia o aceesso aos facultativos navaes, e ao mesmo tempo facilita a escolha do governo para o desempenho das mais importantes commissões do saude naval. Tal providencia concorrerá efficazmente para que se conservem no quadro os facultativos depois de concluido o seu serviço obrigatorio, e convidará tambem os medicos civis a virem alistar-se no mesmo quadro.

É elevado de quatro a seis o numero maximo dos aspirantes a facultativos navaes, com o fim de mais facilmente só recrutar o pessoal para o quadro de saude, mas tal numero só será preenchido quando seja necessario.

No quadro dos enfermeiros navaes, que a pratica demonstra insufficiente para o serviço de bordo e do hospital da marinha, proponho o augmento de seis praças, sendo duas destas com a graduação de sargentos ajudantes, não só porque muito convém á disciplina que tenham tal graduação os individuos que exercem as funcções de fiscal e de fiel- no hospital, mas tambem para melhorar as condições, proporcionando-se melhor futuro a uma classe que presta tão util e tão arduo serviço. Separam-se da companhia de saude naval os outros empregados menores do hospital, ficando considerados como praças avulsas, porque a experiencia tem demonstrado que não é possivel conseguir-se o alistamento do taes individuos como praças effectivas da companhia, por isso que não querem sujeitar-se á condição dos seis annos de serviço obrigatorio. A proporção em que tem augmentado o movimento do hospital da marinha torna indispensavel a creação, que proponho, de mais quatro logares de serventes.

Os dois pharmaceuticos navaes, bastante onerados pelos encargos de serviço que lhes incumbem, já na preparação dos medicamentos para consumo do hospital, já nas analyses e exames dos viveres para uso da armada, estão hoje muito desfavorecidos em vencimentos e vantagens comparativamente com a classe dos officiaes de fazenda da armada, á qual se exige muito menores habilitações.

Para remediar essas más condições, estabelece-se na, proposta que os vencimentos dos pharmaceuticos sejam equiparados aos dos ofriciaos do fazenda de igual graduação e qne o mais antigo d'elles, quando complete vinte e cinco annos de bom e effectivo serviço, tenha a graduação de capitão tenente.

É obvia a necessidade de que no arsenal da marinha haja, convenientemente organisado, um serviço sanitario, para que ali esteja sempre um facultativo prompto a prestar os primeiros soccorros nos casos de desastre, tão frequentes n'um estabelecimento fabril d'aquella ordem, o tambem para que possam ser convenientemente; seguidas as indicações da hygiene, tão indispensaveis num edificio em que ha tão avultados depositos de material de diversas naturezas, e em que permaneço durante quasi todo o dia um tão grande numero de pessoas.

Na actual organisação não está essa necessidade atendida, mas, por ser ella imperiosa, um dos meus antecessores estabeleceu de um modo provisorio que os facultativos dos navios surtos no Tejo desempenhassem o serviço do saude do arsenal.

Tal providencia, porém, não satisfaz cabalmente aquellas necessidades o prejudica o serviço sanitario de bordo dos navios, que não é menos importante. Xá proposta que tenho a honra de apresentar-vos, attribue-se o serviço medico do arsenal a dois facultativos navaes, d'elle exclusivamente encarregados.

Tambem se estabelece que esses facultativos, juntamente com o chefe do serviço pharmaceutico, sejam os encarregados do exame e analyse dos viveres adquiridos para a alimentação das praças da armada. Convem separar esse encargo da junta de saude naval que em rasão de outros serviços, que pesam sobre seus membros, o não póde desempenhar de um modo conveniente.

N'outros pontos de menor importancia, e que me parece escusado enumerar, é alterada a actual organisação do serviço de saude naval.

Em disposições geraes o transitorias, proponho alguns meios de se facilitar a passagem de uma para a outra organisacão e o preenchimento prompto dos quadros que são ampliados. E com estes fundamentos tenho a honra de submetter á vossa approvação a seguinte proposta de lei:

CAPITULO I

Do quadro do saude naval

Artigo 1.° O quadro de saude naval comprehende:

1.° O corpo dos facultativos navaes;
2.° Os pharmaceuticos navaes;
3.° A companhia de bando naval.

Art. 2.° O corpo da facultativos navaes é constituido por:

1.° Um primeiro inspector de saude naval, com a graduação de capitão de mar e guerra;

2.° Dois segundos inspectores de sau.de naval, com a graduação dt, capitães de fragata;

3.° Tres terceiros inspectores de saude naval, com a graduação do capitães tenentes;

4.° Dez facultativos navaes do 1.ª classe, com a graduação de primeiros tenentes;

5.° Doze facultativos navaes de 2.ª classe, com a graduação do segundos tenentes;

6.º Os aspirantes a facultativos navaes.

§ unico. Os aspirantes a facultativos navaes não têem numero determinado, mas nunca excederão a seis.

O ministro da marinha fixará annualmente o numero dos que devam ser admittidos, conforme as vacaturas existentes e as provaveis no quadro dos facultativos.

Art. 3.° Em caso de necessidade e havendo vacaturas no quadro dos facultativos navaes, podem ser admittidos facultativos auxiliares, cujo numero não deve exceder o d'aquellas vacaturas.

§ 1.° Os facultativos navaes auxiliares têem a graduação, honras e vencimentos que competem aos facultativos navaes de 2.ª classe.

§ 2.° Os facultativos savana auxiliares são exonerados quando se tornam desnecessarios.

Art. 4.° Para o serviço de saude naval ha dois pharmaceuticos navaes, que fazem parte do pessoal do hospital da marinha, e são coadjuvados por um praticante do pharmacia com praça de primeiro sargento da companhia do saude naval.

§ unico. O pharmaceutico mais graduado e, em igualdade de graduação, o mais antigo, tem a designação de chefe do serviço pharmaceutico naval o as attribuições

Sessão de 12 de maio de 1882 86 *

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lhe são determinadas na presente lei e no regulamento do serviço de saude naval.

Art. 5.ª O quadro da companhia de saude naval e composto de:

1.° Dois sargentos ajudantes;

2.° Dez enfermeiros de 1.ª classe, com a graduação de primeiros sargentos;

3.º Vinte enfermeiros de 2.ª classe, com a graduação de segundos sargentos.

Art. 6.° Quando o quadro da companhia de saude naval, por circumstancias extraordinária», sei a insufficiente para o serviço, ou quando esteja incompleto e não possa completar-se segundo as regras prescriptas pira a admissão, o governo, sobro proposta do director do hospital, e ouvida a junta consultiva de saude naval, póde mandar admittir enfermeiros auxiliares, os quaes devem ser despedidos quando se tornem dispensaveis, e, em igualdade de circumstancias, têem preferencia para entrar no quadro effectivo da companhia.

CAPITULO II

Do serviço de saude naval

Art. 7.° Os facultativos navaes são destinados a servir:

1.° Na secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar;

2.° Na junta consultiva de saude naval e do ultramar, junto da mesma secretaria;

3.° No commando geral da armada;

4.° A bordo dos navios do estado;

5.º A bordo dos transportes mercantes em que embarque força militar destinada ao ultramar;

6.° No hospital da marinha;

7.° No arsenal da marinha;

8.° No corpo de marinheiros da armada:

9.° Nos hospitaes fluctuantes da marinha militar;

10.° Na junta de saude naval;

11.° Em todos os actos de inspecção sanitaria nos navios, estabelecimentos e dependencias do ministerio da marinha.

Art. 8.° O primeiro inspector de saude naval faz parte do estado maior do commando geral da armada, onde exerce as funcções de chefe do serviço de saude, tendo a seu cargo a inspecção de todos os serviços sanitarios navaes, na forma prescripta pelo respectivo regulamento.

Art. 9.° A junta consultiva de saude naval e do ultramar tem por vogaes todos os inspectores de saude naval que estiverem em Lisboa.

Art. 10.° A bordo dos navios da armada o serviço de saude é commettido a um facultativo naval de 1.ª ou 2.ª classe.

Nas mesmas commissões podem tambem ser empregados os segundos e terceiros inspectores de saude naval, que não estejam desempenhando os serviços que a presente lei torna privativos das suas classes.

Art. 11.° Quando uma força naval, composta de dois ou mais navios, tenha de sair a barra de Lisboa para o desempenho de qualquer commissão de serviço, a direcção do serviço de saude é n'ella incumbida a una inspector de saude naval, o qual toma o titulo de chefe do serviço de saude da divisão naval a que pertence e faz parte do estado maior do commando da mesma divisão.

Art. 12.° Em navio cuja guarnição seja superior a 200 praças, e que se destine a operações immediatas de guerra ou a permanecer em portos muito insalubres, o pessoal do serviço de saude será augmentado com mais um facultativo e um enfermeiro navaes.

Art. 13.° A junta de saude naval é constituída por três inspectores de saude naval, nomeados pelo ministro dentre os que estiverem em Lisboa em serviço effectivo. O mais graduado d'elles e, em igualdade de graduação, o mais antigo será o presidente, e o menos graduado ou o mais moderno servirá de secretario.

§ unico. Em caso de necessidade os facultativos navaes, de 1.ª classe poderão servir, como vogaes, na mesma junta.

Art. 14.º O serviço medico do arsenal da marinha é desempenhado, na fórma estabelecida pelo regulamento do serviço de saude naval, por dois facultativos do quadro de saude naval. O mais graduado ou mais antigo tem o titulo de director do serviço de saude do arsenal.

§ unico. A duração da commissão d'estes facultativos nunca será superior a dois annos.

Art. 15.º Haverá no arsenal um posto medico, provido do todo o material necessario pura soccorro urgente do pessoal do mesmo estabelecimento.

§ unico. Um enfermeiro naval coadjuva os facultativos do arsenal no serviço do posto medico.

Art. 16.° O exame dos mantimentos para uso das praças da armada será feito, da forma prescripta pelo regulamento do serviço do saude naval, por uma commissão composta dos dois facultativos do arsenal e do chefe do serviço pharmaceutico.

§ unico. No arsenal haverá, a cargo do director do serviço de saude, um gabinete provido de todo o material conveniente para a analyse e exame das substancias alimenticias.

Art. 17.° As commissões de director do hospital da marinha e de facultativo do corpo de marinheiros são desempenhadas por segundos ou terceiros inspectores de saude naval.

Art. 18.° Os facultativos navaes podem, em caso do necessidade, desempenhar voluntariamente o serviço de saude nas provincias ultramarinas. Têem direito, n'este caso, a ser promovidos ao posto immediato, sem prejuizo da antiguidade dos facultativos mais antigos da mesma graduação, nos termos do decreto de 10 de setembro de 1346.

Art. 19.º Os facultativos navaes que estiverem sem commissão irão servir no arsenal ou no hospital da marinha, segundo as conveniências do serviço, coadjuvando os facultativos d'aquelles estabelecimentos nos serviços que lhes estão a cargo.

§ unico. Exceptuam-se desta disposição os facultativos cuja graduação for superior às dos directores do hospital e do serviço de saude do arsenal.

CAPITULO III

Dos vencimentos, admissão, promoção e vantagens dos empregados do quadro de saude naval

Art. 20.° Os facultativos navaes nas differentes situações têem os mesmos vencimentos que por lei competem aos officiaes combatentes da armada, de igual graduação.

Art. 21.° Os pharmaceuticos navaes têem vencimentos iguaes aos dos officiaes de fazenda de igual graduação.

Art. 22.° São consideradas commissõcs activas as que os facultativos navaes exercem, quando servem no hospital da marinha.

Art. 23.° Quando os facultativos navaes sejam encarregados do serviço de saude nas provincias ultramarinas, sem o accumularem com o de bordo, percebem pelo cofre da provincia em que servirem um vencimento igual ao dos facultativos de igual graduação pertencentes ao quadro da província. Se, porém, os seus vencimentos como facultativos navaes, incluindo as comedorias, forem superiores aos d'aquelles facultativos, recebem pelo rcfc7-iclo cofre os seus vencimentos como se estivessem servindo a bordo.

Art. 24.° Os vencimentos das praças da companhia de saude naval continuam a ser os determinados pela legislação em vigor.

Art. 25.° A admissão no corpo de facultativos navaes continua a ser regulada pela legislação vigente.

Art. 26.° O tempo de bom e eftectivo serviço, indispensável para adquirir direito á promoção na classe dos facultativos navaes, é o mesmo que se exige aos officiaes combatentes da armada, de igual graduação.

Art. 27.° A promoção, desde facultativo naval de 2.ª

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classe até primeiro inspector do saude, verifica-se por antiguidade, satisfeitas as condições do artigo 17.° do regulamento de 24 de abril de 1869.

§ unico. Para o accesso ao posto de primeiro inspector é indispensavel que o facultativo tenha, como segundo ou terceiro inspector, serviço de embarque, durante um anno pelo menos, em uma ou mais commissões fora do Tejo.

Art. 28.° A entrada no quadro dos pharmaceuticos navaes realisa-se precedendo concurso entre individuos que reunam as seguintes condições:

1.ª Curso completo de pharmacia na universidade de Coimbra, ou nas escolas medico-cirurgicas do continente;

2.ª Bom comportamento moral e civil, provado por documentos legaes;

3.ª Idade que não exceda a quarenta annos;

4.ª Aptidão physica para o serviço verificada pela junta de saude naval.

Art. 29.° Alem das provas de que trata o artigo antecedente os concorrentes mostrarão tambem, perante um jury composto de dois facultativos e do um pharmaceutico navaes, a sua aptidão pratica em analyse chimica e em manipulações pharmaceuticas.

§ unioo. O jury perante o qual for prestada esta prova, votará sobre o merito absoluto e o relativo dos candidatos, classificando-os pela ordem da sua aptidão profissional.

Art. 30.° Os pharmaceuticos navaes são admittidos como pharmaceuticos de 2.ª classe, com a graduação de segundos tenentes, o promovidos á 1.ª classe com a graduação de primeiros tenentes, quando completem doze annos do bom e effectivo serviço, ou quando assumam as funcções de chefe do serviço pharmaceutico naval por vacatura occorrida n'este cargo.

Art. 31.º O chefe do serviço pharmaceutico naval, logo que haja completado vinte e cinco annos de bom e effectiva serviço no quadro de saude, passará a ter a graduação de capitão tenente.

Art. 32.° Os facultativos e pharmaceuticos navaes gosam do todas as honras, privilégios e recompensas honorificas concedidos por lei aos officiaes combatentes da armada de igual graduação.

Art. 33.° Aos facultativos navaes, que não houverem pertencido á classe dos aspirantes, serão contados, para o effeito da reforma, os cinco annos correspondentes á duração do curso medico-cirurgico.

Art. 34.° O regulamento do serviço de saude naval determinará o modo de admissão e promoção na companhia de saude naval.

Art. 35.° As praças da companhia de saude naval obrigam-se, rio acto da sua admissão, a servir durante seis annos; estão sujeitas às leis e regulamentos militares que regem para as praças de pret da armada, o são equiparadas às praças do corpo de marinheiros para o fim de serem addmittidas na divisão de veteranos da marinha.

CAPITULO IV

Do hospital da marinha e depositos annexos

Art. 36.° O hospital da marinha é destinado ao tratamento dos doentes militares e civis dependentes do ministerio da marinha e ultramar, e pôde, quanto o permitiam a sua capacidade e mais condições, receber doentes do exercito, da guarda municipal do Lisboa e de outras corporações não dependentes d'aquelle ministerio.

Art. 37.° O quadro do pessoal do hospital da marinha é o seguinte:

Um director, inspector do saude naval;

Três facultativos internos, facultativos navaes de 1.º ou 2.ª classe;

Dois pharmaceutioos navaes;

Um capellão;

Um chefe da contabilidade, segundo official do corpo doe officiaes de fazenda da armada;

Um fiscal, sargento ajudante da companhia de saude naval;

Um fiel, idem;

Um amanuense, primeiro sargento da companhia;

Um praticante de pharmacia, idem;

Seis enfermeiros, primeiros ou segundos sargentos da companhia;

Um porteiro;

Um cozinheiro;

Quinze serventes.

Art. 38.º O deposito de instrumentos cirurgicos e appositos e o do medicamentos, para o serviço de saude naval e do ultramar, são annexos ao hospital da marinha. O primeiro está a cargo do mais graduado ou mais antigo dos facultativos internos, e o segundo do chefe do serviço pharmaceutico. Tanto um como o outro estão sob a immediata inspecção do director do hospital.

Art. 39.° A companhia de saude é annexa ao hospital, e está sob as ordens do director do mesmo estabelecimento.

Art. 40.° O serviço clínico do hospital é desempenhado, na conformidade do regulamento do serviço de saude naval pelos facultativos internos, pelos que servem náquelle estabelecimento em virtude do disposto no artigo 19.° e, em caso de necessidade, pelo facultativo do corpo de marinheiros, quando a sua graduação não seja superior á do director. Só em caso de necessidade absoluta será tal serviço prestado tambem pelo director.

Art. 41.° O serviço de facultativo interno é desempenhado por tres facultativos navaes desembarcados, que servem em tal commissão durante um anno, não podendo durante esse tempo ser distrahidos para serviços estranhos ao hospital.

§ unico. Esta commissão póde ser incumbida, sem limite de tempo:

1.° A facultativos navaes que, tendo sido reformados, estejam todavia nas circumstancias de a desempenhar, aos quaes se abonará a gratificação correspondente ás commissões de residencia;

2.º A facultativos navaes auxiliares, no caso previsto no artigo 3.°, e na conformidade do § 2.° do mesmo artigo.

Art. 42.° Um dos capellães do quadro da armada tem a seu cargo o serviço religioso do hospital da marinha.

§ unico. Quando não haja eapellão naval desembarcado, para ser encarregado d'este serviço, póde elle ser desempenhado por um presbytero para esse fim contratado:

Art. 43.° O porteiro e o cozinheiro do hospital conservam os vencimentos que têem pela legislação em vigor. Os serventes terão vencimento igual ao dos primeiros grumetes da armada.

§ unico. Um dos serventes accumulará com o respectivo serviço o de barbeiro, sendo-lhe por isso abonada a gratificação annual do 16$000 réis.

Art. 44.° O porteiro, o cozinheiro e os serventes do hospital da marinha, quando estejam em qualquer dos casos previstos pelos n.ºs 1.° e 2.º do artigo 3.° do decreto, com força de lei, de 17 de dezembro de 1868, que creou a divisão de veteranos de marinha, terão direito a ser admittidos na mesma divisão, nos termos que o referido decreto estabelece a respeito das praças de pret do corpo de marinheiros.

Art. 45.° A administração económica do hospital da marinha é commettida a um conselho administrativo, formado pelo director, que servirá de presidente, pelo mais graduado ou mais antigo dos facultativos internos e pelo chefe da contabilidade, que servirá de secretario.

Art. 46.º O conselho administrativo exerce, quanto á administração economica do hospital, as funcções que lhe incumbe o regulamento do serviço de saude naval.

Art. 47.° O fiscal é encarregado da policia e da hygiene do hospital, e coadjuva o fiel no serviço que a este incumbe.

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Art. 48.° E abonada pelo hospital uma ração diária a cada um dos seguintes empregados: o fiscal, o fiel, o amanuense, o praticante de pharmacia, os seis enfermeiros, o porteiro, o cozinheiro e os quinze serventes.

APITULO V

Disposições geraes e transitorias

Art. 49.° Continuam era serviço no hospital da marinha, no exercício dos cargos que actualmente desempenham, o segundo official, o aspirante e o encarregado das arrecadações, do extincto quadro do mesmo hospital com as vantagens que lhes concedem o artigo 11.° e seu § unico da carta de lei de 10 de junho de 1880.

Art. 50.° Emquanto estiver em serviço no hospital o antigo encarregado das arrecadações do. extincto quadro d'aquelle estabelecimento, um dos sargentos ajudantes da companhia de saúde naval fará p serviço que pertence aos enfermeiros de 1.ª classe da mesma companhia, na qual deixará de preencher-se uma vacatura de enfermeiro d'aquella classe.

Art. 51.° Emquanto o logar de amanuense do hospital j for desempenhado pelo aspirante do antigo quadro do mês mo estabelecimento, permanecerá vago um logar de enfermeira de 1.º classe da companhia de saúde naval.

Art. 52.° Os actuaes facultativos navaes poderão ser: promovidos às classes immediatamente superiores áquelles em que presentemente se acham, sem dependencia do tempo de serviço e de embarque exigido pelos artigos 26.° e 27.° e § unico do artigo 27.° d'esta lei.

Art. 53.° Os facultativos navaes auxiliares que actualmente servem nos navios do estado serão admittidos no quadro effectivo dos facultativos navaes, sem dependencia de concurso e pela ordem da sua antiguidade, quando haja vacaturas e elles tenham completado dois annos de serviço de embarque com boas informações.

§ unico. Estes facultativos não poderão ser promovidos a inspectores de saúde naval senão no acto de serem reformados.

Art. 54.° Continua no exercício do cargo de fiscal do hospital, de marinha o primeiro sargento da companhia de saude naval que actualmente o está desempenhando, sendo promovido a um dos logares de sargento ajudante da mesma companhia.

Art. 55.° Os serventes que actualmente pertencem ao quadro effectivo da companhia de saúde naval continuam a pertencer-lhe, com as mesmas graduações e vantagens que têem pelo seu actual alistamento, emquanto se conservarem no serviço activo.

Art. 56.° O governo procederá á revisão do regulamento do serviço de saúde naval, em harmonia com as disposições da presente lei.

Art. 57.° Fica por esta lei subrogado o decreto de 9 de dezembro de 1869 e revogada toda a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, 15 de abril de 1882. = José de Mello Gouveia.

Proposta de lei n.° 176-B

Senhores. - Apesar dos esforços que todos os governos têem empregado para melhorar as condições economicas das possessões portuguezas do ultramar,, não chegaram estas ainda a desenvolver os seus recursos naturaes a ponto de poderem satisfazer a todas as despezas, que as circumstancias especiaes de umas e as necessidades impreteriveis creadas pelo adiantamento de outras, tem determinado desde 1876. O seu progresso lento, mas manifesto e evidente, tem sido, no periodo de seis annos, por mais de uma vez, interrompido em algumas das possessões por circumstancias metorologicas, que influiram na producção e por consequencia no commercio, em outras, como na índia, pelos effeitos de providencias resultantes de compromissos internacionaes, que; não obstante o seu alcance civilisador, transformam e paralysam no momento da execução as fontes da receita publica,. perturbando as finanças por um periodo mais ou menos longo, segundo a actividade e discrição com que são postas em vigor, e finalmente, como acontece na Guiné, porque a sua autonomia nascente não lhe deu ainda tempo de alargar a exploração dos productos do seu fecundo solo.

É força confessal-o; as receitas do ultramar, com excepção das provincias de Cabo Verde e Macau, não chegara para accorrer às suas despezas orçamentaes, e um déficit de 190:700$970 réis, que podereis avaliar pelo mappa junto, assoberba a administração da fazenda das possessões ultramarinas.

Devo, porém, ponderar-vos que estes algarismos não são ainda a expressão exactissima, da situação, financeira do ultramar. Algumas das suas receitas e despezas hão de soffrer alterações, que não é possível avaliar desde já, ou carecem de rectificações para mais e para menos, que se não fizeram em virtude do4preçeito legal, que só permitte inscrever nos orçamentos verbas anteriormente decretadas. Este decretamento falta ainda em grande parte á India e á Guiné portuguesa, attenta a transformação por que estão passando, a primeira em virtude do tratado de 26 de dezembro de 1878, celebrado com o governo britannico, e a segunda em consequencia do estabelecimento da propria autonomia, que a pouco e pouco vae reclamando modificações em alguns dos seus serviços publicos.

O contrato para a construcção do caminho de ferro de Mormugão, celebrado por virtude da carta de lei de 17 de junho de 1880, privando a administração da India dos quatro laques de rupias (160:000$000 réis), que, a titulo de compensação, o governo da Gran-Bretanha paga ao de Portugal, e que nos termos do dito contrato são applicados aos juros dos capitães levantados para esta obra, abriu o déficit do orçamento do estado da India, que era inevitavel e fatal, desde que a cargo deste estado ficasse, como devia ficar, o custeamento de tal obra.

Ha ainda a considerar o atrazo nos vencimentos da tropa e dos empregados nas provincias de Moçambique e da Guiné, e os fornecimentos provenientes de contratos que têem de ser pagos impreterivelmente na importencia de réis 103:300$000, e a despeza determinada por alguns serviços creados pelos governadores, por simples diplomas de caracter administrativo, que não foram por emquanto legalmente estabelecidos, mas que subsistem por circumstancias imperiosas e especiaes de ordem administrativa, que seria arriscado desattender. Tanto uns como outros, como deveis prever, não foram introduzidos no orçamento para 1882-1883; todavia, podeis pela adjunta nota verificar áquelles que mais avultam, fazendo subir o deficit do ultramar á importante quantia de 351:787$850 réis.

As expropriações para as obras do caminho de ferro e do porto de Mormugão, que, conforme avalia o respectivo engenheiro, importam em 76:000$000 réis, e que pelo contrato alludido o governo portuguez é obrigado a pagar, constituem mais um encargo a que é forçoso prover. Parte d'estas expropriações já está feita, o resto sel-o-ha successivamente. Acrescentando a esta verba a de 53:583$000 réis, differença entre o producto recolhido da subscripção publica e a despeza orçada para a installação da estação civilisadora que se projecta estabelecer no Zaire, em conformidade do decreto de 18 de agosto de 1881, teremos ainda uma somma de 129:583$000 réis de gastos coloniaes a cobrir pelo thesouro da metropole para o anno de 1882-1883.

Deve esperar-se que não virá longe o tempo em que se poderá pôr termo a este estado de cousas, creado pelas necessidades da civilisação e da affirmação e defeza do nosso dominio; mas emquanto se não dão às provincias ultramarinas sufficientes faculdades para o desenvolvimento natural dos elementos de riqueza agrícola e industrial que em si contêem, e para attenderem por si mesmas às

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exigencias da sua administração o do seu progresso social, não póde a metropole dispensar-se de as amparar com o seu auxilio, para não destruir e perder o que por ellas tem já feito.

Por estes fundamentos tenho a honra de submetter á vossa approvação a, seguinte proposta do lei:

Artigo 1.° É aberto um credito no ministerio da fazenda a favor do da marinha o ultramar de 481:370$000 réis, para saldar as despezas das provincias ultramarinas, relativas ao anno economico de 1882-1883.

Art. 2.° D'esta importancia será applicada a quantia do 311:787$000 réis a despezas das provincias ultramarinas a de 40:000$000 réis ao pagamento dos restos de alguns contratos de fornecimentos para as mesmas provincias, feitos no ministerio da marinha e ultramar, e a de réis 129:583$000 para se occorrer exclusivamente as despezas das expropriações feitas e a fazer para a construcção do caminho de ferro e porto de Mormugão, e ás do estabelecimento da estação civilisadora no Zaire.

Art. 3.º Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, 9 do maio de 1882. = José de Mello Gouveia.

Mappa da receita e despeza do ultramar para 1882-1883

[Ver tabela na imagem].

Secretaria d'estado dos negocios da marinha o ultramar, 9 de maio de 1882. = José de Mello Gouveia.

Nota das importancias que, alem do deficit calculado no orçamento da receita e despeza do ultramar, são necessarias para satisfazer outras despezas

[Ver tabela na imagem].

Secretaria d'estado dos negocios da marinha e ultramar, 9 de maio do 1882. = José de Melo Gouveia.

O sr. Sarrea Prado: - Mando para a mesa a seguinte proposta:

(Leu.)

Esta proposta tem origem no que vou expor.

O mestre d'esta officina dirigiu á camara um requerimento pedindo augmento de vencimento, requerimento por elle baseado em considerações muito attendiveis. A pretensão foi enviada á commissão de marinha, e eu por parte dessa commissão mando agora para a mesa a proposta, acompanhada dos documentos respeitantes ao assumpto, na conformidade da resolução tomada.

Junto com os documentos vae um attestado do director da officina de fabricação de instrumentos necessarios á navegação em que certifica o bom serviço d'este empregado.

A pretensão é justissima, porque com o trabalho que elle faz, depois que foi aposentado o antigo mestre da officina, tem-se feito uma grande economia na despeza.

A vista do que deixo dito espero que a proposta será tida em consideração e attendida na mesa a seguinte:

Proposta

Proponho que no artigo 16.° a verba destinada ao mestre da officina de instrumentos mathematicos seja elevada

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a 540$000 réis e a verba destinada ao official da mesma officina seja tambem elevada a 300$000 réis.

12 de maio de 1882. = O deputado, A. de Sarrea Prado.

Enviada á commissão do orçamento.

O sr. Mariano de Carvalho: - (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Ministro da Marinha (Mello Gouveia): - Eu quero só dizer ao illustre deputado o sr. Mariano de Carvalho, que tomo em boa memoria as suas observações a respeito da administração de marinha, para as aproveitar em occasião opportuna.

Depois d'essas observações, s. exa. referiu-se a um facto lamentavel occorrido ha pouco, de uma maneira que não é nada lisonjeira para a nossa marinha de guerra e mercante, e eu vejo-me obrigado a rectificar as suas asserções, porque me parece que nem uma nem outra merece as suas censuras, assim como tambem creio que não as merece a administração da marinha militar.

Quando occorreu o naufrágio a que s. exa. se referiu, nós tivemos na tarde de 20 de abril um telegramma do capitão do porto da Figueira participando o succedido e pedindo um vapor.

O arsenal da marinha podia ter escolhido logo entre os navios da armada real o que lhe parecesse que mais promptamente podia ser enviado ao logar do ministro, mas, como o naufrágio tinha occorrido numa restinga, entendeu que nenhum dos navios de guerra disponíveis podia satisfazer, porque era preciso um barco que demandasse menos agua que se podesse approxirnar melhor do baixio e dos nau fragos, e por isso é que se fretou o vapor Conductor.

Foi o vapor Conductor, o qual não poude cumprir a sua commissão porque o mar repellia os esforços dos mais ousados.

É preciso fazer justiça á marinha mercante.

Todos os homens entendidos em cousas do mar são conformes em declarar que o commandante do vapor Conductor se justificou plenamente na carta que publicou e todos vimos, e não põem hoje em duvida, que só depois de esgotados todos os meios e todas as tentativas de prestar auxilio aos náufragos sem o conseguir, e em presença do risco dó seu navio e da sua tripulação é que se resolveu a recolher-se ao Tejo.

A 28 de abril, pela tarde, chegou outro telegramma da Figueira, do capitão do porto, noticiando que o salva-vidas de Buarcos tinha salvado dois homens e que do terceiro nada se sabia.

Foi então que mandei sair a Bartholomeu Dias. Havia ainda um homem a salvar e para salvar um homem mandaria a armada toda se fosse precisa. (Apoiados.) O mar tinha já caído muito senão não chegava lá o salva-vidas como não poude chegar no dia antecedente. Nào foi inútil a viagem da corveta, os navios são para navegar, não suo para estar parados ; não ha desdouro para a briosa officialidade de marinha em não chegar a tempo por deficiência das informações do logar do sinistro, e em todo o caso poude reconhecer a impossibilidade do vapor Conductor soccorrer os naufragos.

Se a administração de marinha entendesse que um navio da armada podia fazer melhor serviço, tel-o-ía mandado; mas o costume é, em casos destes, mandar um vapor de pequena lotação, que melhor se approxime de terra e dos baixios, com o necessario para acudir ao naufragio.

Por parte da administração de marinha foram, pois, adoptadas todas as providencias que o caso exigia; e não havendo, por consequencia, motivo para fazer, a respeito d essa administração, um juizo tal como o que foi formado pelo illustre deputado, é de esperar que s. exa. reforme o seu conceito.

Posto á votação o capitulo 3.° foi approvado.

Capitulo 4.° - Arsenal da marinha e suas dependencias .... 385:537$635

O sr. Mariano de Carvalho: - (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

Leu-se na mesa a seguinte .

Proposta

Proponho que se eleja uma commissão parlamentar a fim de estudar a actual organisação do arsenal de marinha e os meios de o reformar. = Mariano de Carvalho.

Foi admittida, e ficou em discussão.

O sr. Mariano de Carvalho: - (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado neste logar.)

O sr. Presidente: - Tem de se interromper agora, para continuar ámanhã, a discussão do orçamento, visto que eu não posso deixar de dar a palavra aos srs. deputados que se inscreveram no principio da sessão, para quando estiver presente o sr. ministro do reino.

O sr. Carrilho: - Peço que a proposta do sr. Mariano de Carvalho, em logar de ir á commissão do orçamento, vá á commissão de marinha, attendendo às considerações que o illustre deputado acaba de fazer, e que não têem nada com o orçamento, porque as verbas do actual orçamento são as do anterior.

O sr. Presidente: - Quando se votar o capitulo do orçamento será submettido á votação da camara o requerimento do sr. deputado.

O sr. Avila: - Mando para a mesa o parecer da commissão de guerra, sobre o projecto de lei apresentado na sessão de 10 de fevereiro pelo sr. deputado Pereira dos Santos.

O sr. Rodrigues da Costa: - Mando para a mesa os pareceres das commissões de guerra, marinha e administração publica, sobre a proposta de lei de fixação de recrutas para o exercito e armada.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Francisco de Campos, que a pediu para quando estivesse presente o sr. ministro do reino.

O sr. Francisco de Campos: - Ainda ha pouco tempo eu aqui realisei uma interpellação ao sr. ministro do reino, por causa do procedimento do governador civil do districto de Vizeu, relativamente ao conselho de districto.

Por essa occasião disse eu ao sr. ministro do reino que se tinham dado scenas lamentáveis, e que a boa vontade da opposição fôra que evitara que essas scenas não fossem mais para sentir.

Lembrei a s. exa. por essa mesma occasião que, se as cousas continuassem no mesmo caminho, era muito natural que tivéssemos a repetição, se não o aggravamento, d'aquelles factos lamentaveis.

E pedi a final ao sr. ministro do reino que por qualquer modo pozcsse teimo áquella situação tão indecorosa para o governo, como vexatória e afflictiva para os povos.

Por essa occasião o sr. ministro do reino respondeu-me, como v. exa. e toda a camara obtiveram, que ia mandar proceder á formação de nova lista para o conselho de districto, porque tinha escrúpulos tanto com relação áquella. que lhe tinha sido remettida, póde dizer-se, pela opposição, como com relação áquella que lhe tinha sido dirigida pelo seu delegado.

Devo antes dizer uma cousa. S. exa. achava na primeira faltas que não podiam ser absolvidas, e na segunda circmstancias que a tornavam completamente valida, mas os seus escrúpulo de ministro e de liberal tinham feito com que pozesse esta tambem de parte, e a sua intenção era mandar que na reunião ordinária da junta geral do districto se formulasse uma nova lista.

Foi isto o que s. exa. prometteu, como v. exa. e a camara ouviram; foi que daria ordem para que pelo governo

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civil fosse enviada para o ministerio a seu cargo essa nova lista formulada na proxima reunião ordinaria da junta geral.

Como é tambem sabido, reuniu-se a junta no 1.° do maio, sob a presidência do decano dos seus procuradores, o sr. José Bernardino de Abreu Gouveia, que, para infelicidade d'elle, era o mais velho que ali estava.

Instalou-se a junta nesse dia, chamando o presidente decano pela lista que lho entregaram os nomes que figuravam n'ella como sendo os dos procuradores á incarna junta; mas succedeu que, em logar de chamar vinte e um, como manda a lei, elle chamou, vinte e quatro nomes, numero correspondente, creio eu, ao dos individuos que estavam na sala.

Depois d'isto levantaram-se duvidas sobre se porventura parto d'aquelles indivdiuos podia ou não podia ter assento na junta.

Comtudo tres dos individuos presentes que pertenciam ao partido progressista e estas eleições tinham sido annulladas indevida e illegalmente no conselho de districto, toma rara assento, prestaram juramento e funccionaram como membros da junta.

O sr. governador civil sanccionou os actos da junta abrindo a sessão, e sanccionou-os depois tambem fechando-a com as formalidades da lei em ambos os casos.

Parecia que não havia duvidas sobre o que havia occorrido; mas depois, pensando de outra maneira e querendo ter por força um conselho de districto da sua parcialidade, mandou instaurar um auto contra o procedimento da junta e em seguida mandou redigir pelo seu secretario geral o recurso para o conselho do districto.

O conselho do districto decidiu que a commissão executiva da junta geral fosse intimada a fim do que sobrestivesse as resoluções que a junta tinha tomado e que desta decisão se desse conhecimento aos interessados para em qninzo dias responderem, para depois mais opportuna e pausadamente se deliberar.

Eu chamo a attenção de v. exa. e da camara para um assumpto que á primeira vista poderá parecer de campanario, mas que é um assumpto gravo e serio.

Aquella cidade segue ha muito as idéas mais liberaes e progressistas; deu o exemplo em todas as lactas da liberdade; os seus largos e as suas praças foram regados com o sangue de muitos martyres, e não admira que os filhos d'aquelles que se sacrificaram pela liberdade venham aqui dizer que essa liberdade conquistada á custa de tantos sacrificios, está esquecida e que a lei é atropellada ali pelo delegado do sr. ministro do reino.

Continuando com a enumeração dos factos, succedeu mais que, quando a junta geral se reuniu e deliberou formar nova lista para o conselho de districto, entregou a acta dessa sessão ao governador civil para a remeti cr ao sr. ministro do reino; mas desconfiando de que o governador civil só demorava em remettel-a, como usa fazer a qualquer resolução que venha de corporações que pertencera no partido progressista, a mesma junta geral remetteu-me copia da acta, para eu, em companhia dos meus illustres amigos os sr. Lucinno de Castro e Mariano de Carvalho a entregar ao sr. ministro do reino.

Por essa occasião disse eu a s. exa.: «Parece-me que os meus amigos tiveram receio e desconfiaram que o delegado de s. exa. não cumpriria o seu dever, por isso que nesta acta, em vez do se referirem á ordem que s. exa. promettera mandar-lhe, apenas se reportam ao que s. exa. dissera no parlamento. Já se vê que o governador civil não deu communicação á junta geral dessa ordem por s. exa. promettida».

A isto respondeu s. exa., que se tinha esquecido demandar essa ordem, e eu acredito; mas nem toda a gente deixaria de ter uma suspeita, combinando este facto com o que se está passando no meu districto.

Eu não quero azedar a questão, usar de phrases irritantes e empregar adjectivos que possam revoltara camara. Cada um da cavalheiros dê a este procedimento o qualificativo que entender em sua consciencia.

O que eu peço ao sr. ministro do reino e que se sirva dizer quaes as medidas que tenciona pôr em pratica para acabar com este estado afflictivo e indecoroso.

Sr. presidente, o pretexto com que o governador civil protestou contra os actos da junta geral era funccionarem na junta cidadãos que não tinham a qualidade de membros dessa corporação.

Eu vou mostrar como isto era um pretexto que poderia illudir alguem, mas que não
e serio.

Em primeiro logar, os tres individuos que ali se sentaram cotavam legitimamente eleitos; em segundo logar, porque o conselho de districto não é O competente para annullar essa eleição, caso ella fosse menos valida.

Um cavalheiro da minha terra veiu declarar e sustentar que era o conselho do districto o competente, e eu repito que não, com o mesmo fundamento que então tive, alem do qual ha outro mais moderno.

Os fundamentos de que o conselho de districto não é competente para annullar a eleição dos membros da junta geral são, em primeiro logar, a letra expressa e clara do codigo administrativo, que diz que a junta geral do districto é a unica competente para julgar da validado da eleição dos seus membros; em segundo logar foi o accordo do supremo tribunal administrativo com relação a um caso analogo no districto de Aveiro. Em Aveiro recorre-se para o supremo tribunal administrativo, em Vizeu é ao conselho do districto que incumbo decidir identicas pendencias!!

Supponhamos que ha um tribunal administrativo para validar ou invalidar « eleição de qualquer membro da junta. Qual é, aonde está?

Em Vizeu é o conselho de districto. Não se acha boa, não se conta com a resolução d'esse tribunal, leva-se então o recurso para o conselho d'estado que já por vezes tem dito que a competencia reside na junta, á ultimamente resolve uma questão idêntica em Aveiro sem a intervenção da primeira instancia, que é o conselho de districto. Quando saíremos d'este labyrintho?

Sr. presidente, dia o conselho de districto que na junta figuravam tres individuos que não eram Membros d'ella, pois que por um accordão sou lhes tinha annullado as eleições.

Supponhamos que o conselho de districto é o competente para julgar da validade das eleições. Mas o que é verdade é que estes tres cavalheiros não prejudicavam em nada a resolução da junta.

A junta fuuccionou com vinte e quatro individuos; tirando-lho tres, ficam vinte e um; nós tinhamos quatorze votos, menos esses tres ficam onze, que é a maioria de vinte e um. Logo temos maioria, logo está tudo perfeitamente legal, logo não ha, nem póde haver duvida sobre a legitimidade das deliberações da junta.

Como é, pois, que o conselho de districto póde annullar todas as decisões da junta, ou mandar sobreestar sobre ellas até que se resolva opportunamente?!

O que se pretende é originar um conflicto para que o sr. ministro do reino possa dissolver a junta. Dou-lhe os parabens se o fizer. Esse procedimento é muito mais franco. Venha essa solução, porque isto assim hão póde continuar. A dissolução, sr. ministro do reino, venha a dissolução.

Na opinião do governador civil e do conselho de districto de Vizeu, onze não é maioria do vinte e tini!

Sr. presidente, o sr. ministro do reino tinha promettido mandar ordem para que se fizesse nova lista para o conselho de districto.

Mas o sr. ministro do reino, infelizmente, esqueceu-se! O sr. governador civil abriu com as formalidades da lei a sessão ordinaria da junta, encerrou-a com as mesmas formalidades, e só agora é que se lembra de annullar todos

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os seus actos!! Acho tudo isso muito bom, muito correcto, extremamente legal!!!

Ainda ha mais outra circumstancia que prova que o que affirmo é a verdade.

A mesma junta fez uma representação a esta casa para que se altere a disposição do codigo administrativo, que manda fazer os orçamentos das juntas geraes em maio, para novembro, e foi esta representação feita na ultima sessão a cujo encerramento estava presente um dos cavalheiros pertencentes ao partido do governo. Refiro-me ao meu amigo, sr. José de Matos Cid, que sei não teve duvida em assignar um documento em que se pedia que a epocha fixada para a confecção dos orçamentos fosse alterada para novembro por assim o requerer a conveniencia do serviço.

Aqui tem v. exa. e a camara como os factos são. Aqui tem como constantemente se têem atropellado as leis e como se têem praticado actos que, já disse, não me atrevo a classificar.

Agora concluo, aguardando a resposta do sr. ministro do reino, e por ella verei se tenho a fazer mais algumas considerações.

O sr. Ministro do Reino (Thomás Ribeiro): - (S. exa. não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado neste logar.)

O sr. Luciano de Castro: - (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado neste logar.)

O sr. Carrilho: - Peço a v. exa. que consulte a camara se permitte que se prorogue a sessão até terminar este incidente.

Foi approvada a prorogação.

O sr. Ministro do Reino (Thomás Ribeiro): - S. exa. não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.}

O sr. Francisco de Campos: - Não hei de causar muito a attenção da camara, porque não hei de acompanhar o sr. ministro do reino em tudo aquillo quanto s. exa. disse, tanto em resposta a mini, como em resposta ao meu illustre amigo o sr. Luciano de Castro, e porque a questão está exactamente na mesma.

Começarei por dizer a s. exa. que foi injusto commigo quando lembrou as expressões que eu aqui soltei a respeito do conselho de districto de Vizeu.

Eu suppunha-me ao abrigo das suas censuras, porque, quando de principio me dirigi ao sr. ministro do reino, declarei logo que não tinha a mais pequena animosidade contra as pessoas que compõem aquelle conselho, que s. exa. nada tinham com isto, e a quem eu tornava responsavel de tudo o que tem succedido era ao sr. ministro do reino. (Apoiados.)

Como eu tinha dito isto havia muito pouco tempo, suppunha que tornal-o a repetir era perfeitamente escusado.

Agora as minhas observações reduzem-se a muito pouco, e ellas ahi vão em quatro palavras.

O sr. ministro do reino quiz de alguma maneira defender-se, e o que fez foi enredar-se mais nos seus próprios argumentos, sem colher resultado algum.

O sr. ministro do reino disse que as deficncias do codigo podem curar-se com qualquer regulamento.

Eu lamento, em todo o caso, que s. exa., antes do governo vir pedir a esta camara a absolvição dos seus actos da dictadura, e auctorisado pelas reclamações deste estado de anarchia em que está a administração em alguns districtos, não tomasse uma providencia qualquer que desse satisfação aos povos. (Apoiados.)

Deixasse ficar o conselho de districto como tribunal competente para julgar estes recursos, ou desse ao supremo tribunal administrativo essa faculdade, mas deixasse ficar, qualquer cousa clara e definida e depois viesse dar contas às cortes, que de certo approvaria o seu procedimento.

Eu quero conceder que seja o conselho de districto, dou isso de barato; mas, diz o sr. ministro do reino, que ainda assim os calculos dos deputado por Vizeu são errados, porque não tinha entrado na junta um membro que, entrando, de algum modo podia influir para um ou outro lado.

Eu peço licença a s exa. para lhe dizer que não está bem informado, porque, se estivesse bem informado, havia de concordar com o que eu aqui lhe digo.

Abstrahindo dos tres membros da junta geral do districto de Vizeu, cujas eleições foram annulladas no conselho de districto, mas de cujas annullações não houve intimação aos procuradores, ficam vinte e um.

Se o sr. José de Matos Cid não tomou assento no primeiro dia, é claro que só tomaram assento vinte e tres e não vinte e quatro membros, e em tal caso tinham os progressistas os mesmos votos, e os governamentaes menos um, o que para o resultado é o mesmo.

(Áparte do sr. ministro do reno.)

Perdõe-me s. exa.; eu tenho aqui os nomes numa representação que vou mandar para mesma.

Eram 24. Presidia um tio do sr. José Bernardino. Fez-se a chamada, responderam a ella 24. Supponham mesmo que o sr. Cid não tomou assento; ficavam 23; mas, tomando elle assento, eram 24. Excluindo 3, ficavam 21, e, portanto, sempre a maioria era do partido progressista, que, ainda descontados os 3, tinha 11 votos contra 10 ou contra 9.

Ora, se o governador civil abriu a junta, se a fechou, se não havia irregularidade alguma, como é que se vem dizer que os intrusos, se o eram, fizeram com que houvesse deliberações que não haveria se lá não estivessem?

O argumento principal do sr. ministro do reino é que não se deu assento a um cavalheiro que tinha lá o seu logar, mas esse argumento é sem valor, como fica provado com a maior evidencia, pois que a presença desse cavalheiro, ou a sua ausência, não podia tirar ao meu partido a maioria que temos na junta. Nem esse cavalheiro protestou, mas, ao contrario, collaborou até ao fiai com os seus collegas.

Tenho concluido.

O sr. José Bernardino: - Em primeiro logar, duas rectificações á exposição feita pelo sr. Francisco de Campos.

Os factos passados na junta geral do districto de Vizeu não são exactamente como s. exa. os citou.

S. exa. principiou por declarar que um homem, que tinha a infelicidade de ser o mais velho n:aquella corporação, chamara 24 procuradores, quando a junta pela lei tinha 21 somente.

Este facto é menos verdadeiro. S. exa. está menos bem informado.
Por informações de quem estava presente e fazia até parte da junta, vou- eu dizer o que se passou.

Reunidos os procuradores, o mais velho d'elles, ao qual infelizmente não podia ser contestada essa triste prerogativa, assumiu a presidencia.

Para se fazer a chamada appareccram na mesa duas listas; uma vinda do governo civil, em que estavam incluídos nos 21 procuradores os 3 a quem o conselho de districto por accordão conferira esse direito, e outra fornecida pela commissão executiva, na qual estes 3 procuradores eram excluídos e inscriptos os 3, cujas eleições tinham sido julgadas validas pela junta geral.

Sobre esta, isto é, sobre a escolha da lista para se fazer a chamada é que se levantou debate, e por proposta do sr. dr. Eduardo Correia de Oliveira, approvada por maioria, foi decidido que se fizesse a chamada de todos, e constituiu-se a junta com 24 procuradores.

Já vê s. exa. que não foi por livre arbitrio do presidente da mesa preparatória que foram chamados todos os procuradores, legaes ou illegaes, que estavam presentes, mas sim em virtude do uma proposta da maioria da junta, e por

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consequencia a imputação desse facto só cabe aos partidarios do sr. Coelho de Campos.

Não foi o presidente que de seu motu proprio chamou 24 procuradores, quando só podo haver 21; chamou-os por deliberação da junta, que lhe cumpria executar.

Chamados os 24 começou a junta, os seus trabalhos com esse numero.

E qual foi o seu primeiro acto? Foi conhecer da legalidade ou illegalidade com que os, seus membros iam encetar os trabalhos? Foi conhecer da legitimidade dos poderes das suas procurações? Foi constituir-se legal o legitimamente?

Não foi. O seu primeiro acto foi a eleição da mesa definitiva, em que votaram todos os 24 procuradores presentes: quer dizer, uma corporação administrativa que, pelo codigo, só póde ter 21 membros, começa a funccionar com 24, e com 24 procede á eleição da sua mesa. Diz s. exa. que, apesar disso, essa eleição é valida, porque n'ella votaram 14 partidarios seus e que, portanto, descontando 3 ainda ficam 11.

Ora, n'uma eleição por escrutinio secreto não póde saber-se quem votou, ou deixou de votar, a favor ou contra.

O sr. Coelho de Campos: - O resultado é publico.

O Orador: - O resultado é publico, mas o escrutínio é secreto. Quaes foram os que votaram a favor e os que votaram contra?

(Interrupção.)

Em todo o caso, votassem de uma ou de outra maneira uma eleição feita por 24 procuradores, numa corporação que tem sómente 21, é evidentemente nulla. (Apoiados.)

A outra rectificação que tenho a fazer ao que disso o sr. Francisco de Campos, é sobre a couta por que s. exa. arranja para si maioria na junta.

Diz s. exa. que, tendo 14 procuradores, deduzidos os 3 sobre que póde haver duvidas, lhe restam 11.

(Interrupção.)

Isso é com o sr. ministro do reino. Não sei se o sr. José de Matos Cid tomou ou não parte em algumas das sessões posteriores: mas, pelas informações que tenho, e que são do presidente da mesa preparatoria, que é meu tio, posso affirmar á camara que, em seguida á eleição da mesa, o presidente eleito não deferiu ao sr. Matos Cid juramento, nem o admittiu a funccionar por deliberação da maioria da junta com o protesto de que em novembro se não tinha conhecido da sua eleição.

De maneira que o procurador José de Matos Cid é posto fora da junta por se não ter em novembro conhecido da validade da sua eleição, apesar de haver um artigo no codigo administrativo, que diz.

(Leu.)

A respeito da eleição do procurador Cid não houve protestos nem reclamações; ainda mesmo que os tivesse havido, tendo ha muito expirado o praso dentro do qual tinham do ser apreciados, sem que disso se conhecesse, não podia haver a menor duvida de que elle era legal e legitimo procurador ajunta geral; e emquanto este procurador 6 posto fora das sessões, são chamados outros individuos, não sei se bem, se mal escolhidos, para o substituir e substituir o sr. Francisco de Campos, de cujo impedimento a junta não tinha tomado ainda conhecimento; e são chamados indivíduos que, por accordãos do conselho de districto estavam inhibidos de fazer parte d'aquella corporação.

A exclusão do sr. José de Matos Cid e o chamamento de substitutos, que não tinham a quem substituir, e de outros individuos que, emquanto que fossem revogados os accordãos do conselho de districto, se é que o podem ou devem ser, não podiam ter assento na junta geral, deslocaria a arithmetica do sr. Coelho de Campos e a maioria conquistada por tal modo transforma-se em pequena minoria.

Eu disse que emquanto os accordãos do conselho de districto não fossem revogados, não podiam os procuradores, cujas eleições foram por elles annulladas, tomar assento na unta, e disse o que é incontestavel.

A junta não póde por si revogar esses accordãos, e cumpre-lhe acatal-os e cumpril-os em todos as seus effeitos.

Tanto isto é vordadc que o sr. Francisco do Almeida Dardoso do Albuquerque, um dos procuradores excluído por aquelles accordãos, vciu requerer ao supremo tribunal administrativo a suspensão dos effeitos do accordão que o excluiu para poder tomar assento na junta, e se essa sustensão era precisa para s. exa., era precisa igualmente para todos os excluidos, o desde que em relação a estes não estava suspenso o efeito dos accordãos não era a junta competente para o suspender, e chamar os que elles excluíram e pôr fora os que elles julgaram legitimos.

Á vista do que acabo do expor, eu não comprehendi nem posso comprehender ainda a exaltação do sr. Francisco de Campos.

Comprehendia, sim, essa exaltação da minha parte ou da parte da maioria de esta camará: (Apoiados,) mas dá parte de s. exa., que diz que a maioria é sua, não se comprehende o que s. exa. queira.

Diz s. exa. na maioria da junta é minha», logo da sua parte é que estão todas as illegalidades.

Diz s. exa.: «a auctoridade que recorresse», mas foi unicamente isso o que ella fez.

De que se queixa s. exa.?

S. exa. até do facto do governador civil abrir e fechar a sessão quer tirar o argumento de que o e», governador reconhecera a legalidade de tudo quanto a junta fizera.

O governador civil não conheceu nem tinha a conhecer de cousa alguma: cumpria um preceito da lei, e na fórma por que a lei o prescreve.

No dia em que se devia abrir a sessão, declarou-a aberta em nome de El-Rei; no dia em que lhe deram parte de que estavam terminados os trabalhos, declarou-a encerrada em nome de El-Rei.

Cumpria única e exclusivamente o determinado no codigo; não conhecia da legalidade ou illegalidade das deliberações tornadas, nem ao governador civil compete, em caso algum, conhecer de similhante cousa.

As attribuições das juntas geraes são completamente independentes dos governos civis: das suas decisões sómente podem tomar conhecimento para as apreciar os tribunaes administrativos e o governo.

E do governador civil que se limitou a abrir de a encerrar a sessão da junta em virtude da lei, o da auctoridade que no uso de uma faculdade que a lei lhe confere e no. cumprimento de um dever que o seu cargo lhe impõe, só limita a recorrer para os tribunaes, a quem só compete a decisão de actos que julga menos regulares e justos, vem dizer-se aqui, que só commetteram illegalidades o violencias!

Dizer que a liberdade está postergada, que o direito da cidadãos foi violado, que a justiça foi offendida, invocar a memoria dos martyres que regaram com o seu sangue as praças de Vizeu, tudo isso será muito bom para fazer rhetorica, para armar ao effeito das turbas, mas não tem neste logar cabimento algum.

Falla-se muito em liberdade, mas nem todos sabem o que é ser liberal,
Eu não reconheço outra maneira de se ser verdadeiramente liberal senão ser-se profundamente tolerante e fielmente cumpridor e mantenedor da lei. (Apoiados.)
É-se liberal, quando se respeitam e acatam todas às opiniões, e só se é cidadão liberal quando se acatam e respeitara todas as leis do paiz.

Quem não cumpre a lei, quem se insurge contra ella, é a maioria da junta geral de Vizeu.

É a maioria da junta geral de Vizeu que não cumpre os deveres que a lei lhe impõe; ella, que fecha a sua sessão ordinaria no fim de tres dias!

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Isto é que é calcar aos pés a lei, postergar a liberdade, violar o direito dos cidadãos, offender a justiça!

Calcar aos pés a lei é não a cumprir.

Postergar as liberdades publicas, é não acatar as decisões de um tribunal superior.

Violar os direitos dos cidadãos é desprezar as manifestações da uma popular.

Offender a justiça é calcar aos pés lei, direito, voto, tudo! (Apoiados.)

E é nestas condições que se atrevem a vir dizer-nos que a liberdade periclita, que a desordem lavra em toda a parte?!

Periclita, sim, a liberdade; lavra, sim, a desordem e ha muito tempo, mas é na junta geral do districto de Vizeu.

Ha muito tempo que ella reclama dos poderes públicos o remédio que a justiça aconselha, e a lei lhe impõe!

Disse o sr. José Luciano de Castro: «Quem deu ao sr. ministro do reino auctoridade para vir declarar illegal a junta geral do districto de Vizeu por terem votado vinte e quatro procuradores?»

Todo o individuo que conhece á lei conhece os seus effeitos; e o sr. ministro do reino, conhecedor das leis do Seu paiz, não podia deixar de reconhecer a illegalidade de uma eleição feita com vinte e quatro membros, numa corporação que não póde ter mais de vinte e um. (Apoiados.}

Mas s. exa., como responsavel pelos actos dos seus delegados, não fez mais, apesar disso, do que recorrer para os tribunaes, e era isso que o illustre deputado queria que se a fizesse, era isso que o illustre deputado exigia.

Portanto os delegados do sr. ministro do reino é que executaram e cumpriram a lei. Recorreram das deliberações da junta, porque todos essas deliberações dimanavam de um acto nullo, a eleição; e com este vicio de origem, eram nullo todos os actos praticados pela junta geral do districto de Vizeu.

E da legitimidade destes recursos não póde haver questão como na dos recursos em matéria eleitoral.

Eu não quero tratar agora da questão se ha ou não recurso das deliberações da junta sobre eleições, nem se, havendo-o, deve de ser para o conselho de districto ou para o supremo tribunal administrativo.

Hei de um dia ter ensejo de mostrar ao sr. José Luciano de Castro que s. exa. póde ter rasão, mas que tambem é possivel que a tenha eu.

À lei não é tão clara como s. exa. imagina. As disposições que a s. exa. se affiguram claras são para muita gente que tem auctoridade em direito administrativo, confusas a ponto de terem, como eu, uma opinião differente da do illustre deputado. Mas o que desde já lhe asseguro é que ou não ha recurso, ou, se o ha, não é nem deve ser para 5 supremo tribunal administrativo.

Parece-me completamente insustentavel a doutrina deste tribunal, indo procurar a sua competência, para conhecer, em recurso directo, das deliberações das juntas geraes sobre as eleições dos seus membros, a um artigo do regulamento que o rege, muito anterior ao codigo administrativo, que evidentemente revogou esse artigo.

A doutrina do supremo tribunal administrativo só me parece verdadeira quando admitte o recurso das deliberações das juntas, mas não quando sustenta que esse recurso deve ser interposto directamente perante aquelle tribunal e não perante o conselho de districto.

Na questão, porém, que nos occupa agora, ninguem contesta a competencia do supremo tribunal, e a junta geral do districto de Vizeu não podia, sem a decisão d'elle, ter admittido a funccionar nas suas sessões individuos d'ellas excluidos pelo conselho de districto, pondo fora aquelles que só tinham direito a tomar parte nos trabalhos da junta.

Por consequencia, se na realidade se desacata a lei; se reina a anarchia; se se posterga e se viola tudo, leis, de veres, justiça, moralidade, esse procedimento cabe á maioria actual da junta geral do districto de Vizeu!

Se o sangue dos inartyres tem de levantar-so do solo que o embebeu para nos recordar calamidades e iniquida-des de ha cincoenta annos, accusando alguém de as provocar n3o é sobre nós que clle ha de cair, não é a nós que elle ha de manchar!

O sr. Francisco de Campos gloriava-se ha pouco de ser sua a maioria da junta.

Tenho duvidas sobre esse ponto, mas não as tenho sobre ser sua a maioria que tem funccionado: e porque ella é sua, porque ella é da sua cor politica, deixo-lhe reivindicar para ella taes louros, deixo-lhe intactas todas as illegalidades, deixo lhe inteira a responsabilidade de todos esses actos praticados pela tal maioria, e nada mais digo a similhante respeito. (Apoiados.)

O Sr. Emygdio Navarro: - (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Mariano de Carvalho: - Peço a v. exa. que mande verificar se ha numero na sala.

O sr. Ministro do Reino (Thomás Ribeiro): - ( S. exa. hão restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Presidente: - Em vista das declarações de sr. ministro fica este
incidente para amanhã.

O sr. Mariano de Carvalho (para um requerimento}: - Requeiro:

1.º Que se verifique se ha, ou não numero na sala;
2.° Se não houver, que v. exa. cumpra as disposições do regimento ácerca dos ausentes;
3.° Que v. exa. cumpra a resolução da camara do se abrir a sessão às duas horas da tarde.

O sr. Presidente: - Vae-se fazer a chamada para se verificar se ha numero.

O sr. J. A. Neves (para um requerimento): - Requeiro a v. exa. que tenha a bondade de ler o artigo do regimento sobre este assumpto. Se houver do se proceder a uma votação, e na occasião da chamada se verificar que não ha numero, é que os nomes dos deputados presentes têem de ser publicados.

O sr. Mariano de Carvalho (sobre o modo de propor}- - Eu requeri que se verificasse se ha numero. na sala. E um requerimento sobre que póde recair votação.

O sr. Presidente : - Já declarei que ia verificar-se se havia numero. Vae-se cumprir o regimento.

Fez-se a chamada.

Estavam presentes só os srs. :

Sarrea Prado, Pereira Corte Real, Cunha Bellem, Carrilho, Ferreira de Mesquita,
Castro e Solla, Sanches de Castro, Borja, Emygdio Navarro, Francisco Campos, Illydio do Valle, Jayme da Costa Pinto, Jeronymo Osório, Franco Frazão. J. A. Pinto, Brandão e Albuquerque, Scarnichia, J. A. Neves, Avellar Machado, Borges de Faria, Elias Garcia, José Frederico, José Luciano, J. M. Borges, Luiz de Lencastre, Bivar, Luiz da Camara (D.), Áralla e Costa, M. P. Guedes, Mariano de Carvalho, Guimarães Camões, Pedro Correia, Pedro Martins, Dantas Baracho, Tito de Carvalho, Visconde de Balsemão.

O sr. Presidente : - Não ha numero. Serão publicados, os nomes dos srs. deputados presentes.

Ámanhã às duas horas da tarde faz-se a segunda chamada, e desejarei Abastante que haja numero para se abrir a sessão a essas horas, e dar logar a que se entre na ordem do dia às tres horas.

A ordem do dia é a que estava dada e mais os projectos de lei n.ºs 164 e 174.
Está levantada a sessão.

Eram sete horas e quinze minutos da tarde.

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