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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SESSÃO DE 13 DE JULHO

PRESIDENCIA DO SR. CUSTODIO REBELLO DE CARVALHO

Secretarios os srs.

Miguel Osorio Cabral

Claudio José Nunes

Chamada — Presentes 82 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs. Affonso Botelho, Moraes Carvalho, Alvares da Silva, Soares de Moraes, Sá Nogueira, Correia Caldeira, Quaresma, Brandão, Gonçalves de Freitas, Arrobas, Mazziotti, Pequito, Antonio de Serpa, David, V. Peixoto, Palmeirim, Barão da Torre, Barão do Rio Zezere, Bento de Freitas, Oliveira e Castro, Almeida e Azevedo, Claudio Nunes, Rebello de Carvalho, Cypriano da Costa, Domingos de Barros, Poças Falcão, Faustino da Gama, Celorico Drago, Abranches Homem, Amaral, Diogo de Sá, Ignacio Lopes, Borges Fernandes, Gomes, F. M. da Costa, Gaspar Pereira, Guilhermino de Barros, João Chrysostomo, Fonseca Coutinho, J. J. de Azevedo, Almeida Pessanha, Macedo, Aragão, Sepulveda Teixeira, Noronha e Menezes, Ferreira de Mello, Torres e Almeida, Neutel, Ortigão, Faria Guimarães, Lobo d'Avila, J. A. Maia, Infante Pessanha, José Estevão, José Guedes, Alves Chaves, Luciano de Castro, Feijó, D. José de Alarcão, J. M. de Abreu, Costa e Silva, Sieuve de Menezes, Pinto de Almeida, Gonçalves Correia, Oliveira Baptista, José Paes, Batalhoz, Julio do Carvalhal, Camara Falcão, Rocha Peixoto, Sousa Junior, Murta, Pereira Dias, Pinto de Araujo, Miguel Osorio, Modesto Borges, Placido de Abreu, Charters, Pitta, Thomás Ribeiro, Teixeira Pinto e Ferrer.

Entraram durante a sessão — Os srs. Braamcamp, A. B. Ferreira, Dias da Silva, Ferreira Pontes, A. Pinto de

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Magalhães, Fontes, Pinto de Albuquerque, Lopes Branco, A. Peixoto, Xavier da Silva, Zeferino Rodrigues, Barão de Santos, Carlos Bento, Ferreri, Cyrillo Machado, Cesario, Conde da Torre, Fernando de Magalhães, Fortunato de Mello, Bivar, Barroso, Fernandes Costa, Izidoro Vianna, Bicudo Correia, Chamiço, Magalhães Lacerda, Carvalho e Abreu, H. de Castro, Blanc, Gomes de Castro, Mártens Ferrão, Roboredo, Calça e Pina, J. Coelho de Carvalho, Simas, Matos Correia, 3. Pinto de Magalhães, Ferreira da Veiga, J. A. Gama, Rojão, Mendes Leal Junior, Alves Guerra, Almeida Maia, Vaz Preto, Monteiro Castello Branco, Ricardo Guimarães, Moraes Soares, Velloso de Horta e Visconde Pindella.

Não compareceram — Os srs. Ayres de Gouveia, Carlos Maia, Gouveia Osorio, Seabra, Aristides, Basilio Cabral, Garcez, Abranches, Pinto Coelho, Conde de Azambuja, Conde de Valle de Reis, Pulido, Mendes de Carvalho, Sousa Machado, Galvão, Silva Cabral, Figueiredo Faria, Frazão, Alvares da Guerra, Silveira e Menezes, Camara Leme, Freitas Branco, Mendes de Vasconcellos, Affonseca, S. Coelho de Carvalho, Simão de Almeida e Visconde de Portocarrero.

Abertura — Aos tres quartos depois do meio dia.

Acta — Approvada.

O sr. Presidente: — A grande deputação, encarregada de apresentar a Sua Magestade a resposta ao discurso da corôa, acaba de cumprir a sua missão, tendo sido recebida pelo mesmo augusto senhor com a sua costumada benevolencia e affabilidade.

Foram mandadas lançar na acta as seguintes

DECLARAÇÕES DE VOTO

1.ª Declaro que votei pela proposta do sr. deputado José Estevão, tendente a prohibir em Portugal o instituto das irmãs da caridade de S. Vicente de Paulo, sejam ellas francezas ou portuguezas. = Ricardo Guimarães.

2.ª Declaro que na sessão de 11 do corrente votei contra todos os paragraphos da resposta ao discurso da corôa, contra todos os additamentos que lhe foram propostos, e a favor das votações nominaes. = Domingos de Barros Teixeira da Mota.

EXPEDIENTE

1.º Uma declaração do sr. Coelho de Carvalho (Joaquim), de que o sr. Sebastião José de Carvalho, por motivo justificado, não comparece á sessão de hoje, nem talvez compareça a mais algumas. — Inteirada.

2.° Do sr. Quaresma, de que o sr. Gouveia Osorio não pôde comparecer á sessão de hontem, nem comparece á de hoje por incommodo de saude. — Inteirada.

3.° Do sr. Freitas Soares, de que o sr. Alvares da Guerra tem faltado ás tres ultimas sessões e faltará a mais algumas por incommodo de saude. — Inteirada.

4.° Do sr. Sousa Junior, de que o sr. B. F. de Abranches não póde comparecer á sessão de hoje e a mais algumas, por ter fallecido um seu irmão. — Inteirada, mandando-se desanojar.

5.º Um officio do ministerio do reino, acompanhando, em satisfação a um requerimento do sr. Julio do Carvalhal, o mappa da população do districto de Villa Real, e do numero de recenseados para o serviço militar nos annos de 1859 e 1860. — Para a secretaria.

6. ° Do ministerio da justiça, acompanhando os esclarecimentos pedidos pelo sr. Pereira de Carvalho de Abreu, sobre o provimento da igreja de Santa Comba da Ermida. — Para a secretaria.

7.º Do ministerio da marinha, dando os esclarecimentos pedidos pelo sr. Pinto de Almeida, sobre a despeza annual feita com a publicação do Boletim e Annaes do conselho ultramarino. — Para a secretaria.

8. ° Uma representação dos empregados da repartição de fazenda do districto de Coimbra, pedindo que os emolumentos sejam repartidos por todos os empregados. — Á commissão de fazenda.

9. ° De alguns officiaes amnistiados pela convenção de Evora Monte, pedindo que se lhes garanta a patente de alferes, a que se julgam com direito. — Á commissão de guerra.

SEGUNDAS LEITURAS

PROPOSTA

A commissão de administração publica pede que seja aggregado á mesma o sr. Guilhermino de Barros, vista a ausencia do sr. Seabra. = O secretario da commissão, Antonio Carlos da Maia.

Foi admittida e logo approvada.

O sr. Presidente: — Vou dar a palavra aos srs. deputados que estão inscriptos para antes da ordem do dia.

O sr. Pereira Dias: — Eu pedi a v. ex.ª a palavra para uma explicação.

O sr. Presidente: — O illustre deputado fica inscripto para antes da ordem do dia no logar que lhe competir.

O sr. Pereira Dias: — Peço perdão; eu peço a palavra para uma explicação pessoal, e por consequencia pedia a v. ex.ª que consultasse a camara se me concede a palavra para este fim.

O sr. Presidente: — Eu vou consultar a camara se concede a palavra ao sr. deputado Pereira Dias, pedida para uma explicação pessoal.

Decidiu-se afirmativamente.

O sr. Pereira Dias: — Pedi a palavra para uma explicação, porque, saíndo hontem d'esta casa, em virtude de um caso inherente á profissão que exerço, não pude ouvir os illustres deputados que me succederam a fallar. Hoje pretendo levantar de sobre mim um compromisso, e ao mesmo tempo rectificar um ponto, ácerca do qual, por equivoco, fui menos verdadeiro.

Hontem por equivoco, alludindo á opinião publica, revoltada contra o respeitavel tribunal da relação do Porto, disse = que ella o accusava na sua maioria =; foi um verdadeiro equivoco, e creio que todos aquelles que prestassem attenção ao que eu disse em seguida, haviam de ver que o meu pensamento estava em diametral opposição com o emprego deste termo — maioria. — A opinião publica accusa apenas a minoria d'aquelle respeitavel corpo.

Isto é pelo que diz respeito ao equivoco.

Emquanto ao compromisso, consta-me que s. ex.ª o sr. Lopes Branco dissera: «Que em virtude das accusações que eu apresentei contra o tribunal da relação do Porto, eu estava obrigado a apresentar as provas d'essas mesmas accusações». Eu entendo que não estou obrigado a apresentar similhantes provas, porque não fiz accusação alguma ao tribunal da relação do Porto. Eu apresentei unicamente aquellas que na opinião publica se lhe faziam, e por consequencia não tomo sobre mim a responsabilidade da veracidade d'essas accusações; mas attendendo a que ellas eram geraes e constantes, não só na cidade do Porto, como de mais a mais nas provincias do norte, entendi dever reclamar por medidas que fossem remediar este estado de desconceito em que se acha aquelle tribunal. Admittindo, mesmo por hypothese, que estas accusações fossem falsas, como na maior parte são, eu ainda mesmo neste caso pediria remedio ou providencias para serem levantadas essas accusações ao tribunal da relação do Porto. Se eu visse que um juiz de uma comarca era accusado de corrupto e venal, embora estivesse convencido de que o não era, não deixaria de pedir que este juiz fosse removido quanto antes desta comarca, porque desde esse momento não póde elle juiz administrar a justiça como devia, visto que a opinião publica estava revoltada contra elle. Por consequencia, digo, não sou obrigado a apresentar provas contra as accusações, porque as não apresentei. Agora se o sr. Lopes Branco e a camara me obrigam a apresentar provas das asserções que eu aqui avancei, isto é, que a opinião publica da cidade do Porto e das provincias do norte accusa o tribunal da relação do Porto de corrupto e venal, estou prompto para apresenta-las, mas não me responsabiliso pela veracidade dellas.

O sr. Presidente: — Já deu uma hora, vae passar-se á ordem do dia. Se algum sr. deputado tem a mandar para a mesa requerimentos ou representações póde manda-los.

O sr. Barão do Zezere: — Mando para a mesa uma proposta da commissão de guerra, para ter pela mesa o competente andamento; e mando mais duas propostas, pelas quaes renovo a iniciativa de dois projectos de lei.

Aproveito a occasião para mandar para a mesa os seguintes requerimentos: um do cidadão Joaquim Antonio Nunes, outro de João Pires da Maia, outro do marechal de campo Antonio Ferreira Lopes, e outro de Joaquim Anastacio Lobo d'Avila.

O sr. Presidente: — Os requerimentos de particulares não se podem apresentar aqui, devem ser deitados na caixa.

O sr. Barão do Zezere: — Então peço á mesa que os mande para a secretaria, para por ali se lhes dar o destino devido.

O sr. F. L. Gomes: — Mando para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos ao governo.

O sr. Aragão Mascarenhas: — Mando para a mesa uma proposta, renovando a iniciativa de um projecto de lei.

O sr. Mendes Leal: — Mando para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos ao governo.

O sr. J. M. de Abreu: — Mando tambem para a mesa um requerimento, pedindo esclarecimentos ao governo.

ORDEM DO DIA

DISCUSSÃO DO ORÇAMENTO

O sr. Presidente: — Vae entrar-se na discussão do orçamento. É costume começar-se a discussão pelo orçamento da despeza; depois passa-se ao da receita, e em seguida aos differentes projectos de meios que a commissão apresenta. No anno passado a discussão da despeza teve logar por ministerios, podendo na occasião d'essa discussão qualquer sr. deputado apresentar as propostas que julgasse convenientes, sobre as quaes houve votação especial. Nos outros annos a discussão não foi por ministerios, mas por cada um dos capitulos d'elles. Agora a camara resolverá qual dos dois methodos quer adoptar; se a discussão ha de ser por ministerios, como teve logar no anno passado, ou por capitulos.

O sr. Antonio de Serpa (sobre a ordem): — Discutiu-se em outras epochas qual seria a maneira de se discutir o orçamento: assentou-se e praticou-se por muitos annos haver uma discussão geral sobre o orçamento da receita e despeza; e depois uma discussão por capitulos de cada um dos ministerios. Este systema apenas foi alterado na sessão passada, discutindo-se o orçamento por ministerios, o que teve logar em julho do anno passado; mas então havia circumstancias muito especiaes; e ellas aqui foram apresentadas para justificar esse modo de discussão. O governo tinha poucos dias de existencia, o orçamento não tinha sido confeccionado por elle; não havia tempo nem era possivel exigir do ministerio que apresentasse proposta sua, com o fim de alterar o orçamento; por consequencia as circumstancias do anno passado eram muito especiaes. Hoje entendo que se não devem alterar as praticas estabelecidas, se querem que a discussão do orçamento seja uma cousa séria.

Se se resolver que o orçamento se discuta por ministerios, põe-se á discussão o ministerio do reino; v. ex.ª dá a palavra a quem a pede seguidamente, porque na discussão do orçamento não ha palavra a favor nem palavra contra; os differentes srs. deputados vão fallando um sobre a organisação da secretaria, outro sobre theatros, outro sobre guardas municipaes, etc.; e que se póde colher desta discussão? Nada, porque isto assim não passa de um simulacro de discussão (apoiados).

E não se diga que a discussão do orçamento ha de ser muito longa; e que a estação não permitte que a camara se conserve por muito tempo aberta; porque todos que estamos aqui somos testemunhas de que o orçamento se tem discutido sempre em dez ou doze dias. Não me lembra de discussão mais longa do que a que houve em 1857, que começou na sessão do ultimo dia do mez de maio e acabou em 22 de junho; mas ainda assim pão foram esses vinte e dois dias gastos só na discussão do orçamento; porque durante esses mesmos vinte e dois dias discutiram-se de permeio dez ou doze projectos importantissimos; e alem d'isto, uma parte do tempo das sessões era applicada para sessões secretas (não sei se para a questão da concordata, porque não estou bem certo). Por consequencia só metade dessas sessões é que foram applicadas para a discussão do orçamento, a mais debatida que tem havido nesta casa desde 1852.

E não tenha receio o ministerio de que se queira por parte da opposição embaraçar e prolongar a discussão, sobretudo depois do procedimento que eu tenho visto estabelecer n'esta camara, precedente novo, que corta as discussões de uma maneira completa, que é recusando a maioria admittir á discussão as propostas dos membros da opposição; facto novo, que nunca vi praticar n'esta casa senão em casos rarissimos! Por consequencia a opposição faz o seu dever, apresentando as suas idéas, mas como não tem esperança de que as suas propostas sejam admittidas, porque pelo simples facto de serem da opposição não só são rejeitadas, mas nem mesmo muitas vezes se admittem á discussão; já se vê que ella não póde embaraçar muito o debate.

Decida a maioria como entender. No entanto não posso deixar de proclamar que a discussão do orçamento por ministerios não é uma discussão séria (apoiados).

Proponho pois que, na conformidade da pratica seguida ha muitos annos, pelo menos desde 1852, haja uma discussão geral sobre a receita e despeza de todo o orçamento, e depois uma discussão por capitulos.

Mando para a mesa a minha proposta.

O sr. Pinto de Araujo: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre este objecto, para não estarmos a prolongar esta discussão: approve se ou rejeite-se a proposta do sr. deputado, mas não se perca tempo com esta discussão.

O sr. Presidente: — Vae ler-se a proposta do sr. Antonio de Serpa.

É a seguinte:

PROPOSTA

Proponho que a discussão do orçamento tenha logar havendo uma discussão geral sobre o orçamento da receita e despeza, e depois uma discussão especial por capitulos. = Antonio de Serpa.

O sr. José Estevão: — Se ainda me é permittido ouvir, porque não sei se ha já alguma moção prohibindo aos depurados da opposição a faculdade de ouvirem, mas creio que não, peço a v. ex.ª que tenha a bondade de mandar ler outra vez a proposta do sr. Serpa, de maneira que se possa ouvir.

Leu-se novamente.

Foi admittida e entrou em discussão.

O sr. Coelho de Carvalho (Joaquim): — A pouca pratica que tenho dos negocios parlamentares faz que tenha duvidas sobre o assumpto, que se vae tratar, e peço ser esclarecido.

Parece-me que a commissão encarregada do exame do orçamento é a commissão de fazenda com os delegados de algumas das commissões desta casa, e parece me por isso que as commissões que mandaram os seus delegados á commissão de fazenda para, conjunctamente com ella, examinarem o orçamento, tem no orçamento dos ministerios que lhe respeita uma certa responsabilidade solidaria com a commissão de fazenda.

Ora, á vista do parecer n.° 7 da commissão de fazenda, vejo que as commissões que deviam mandar os seus delegados á commissão para, conjunctamente com ella, examinarem o orçamento, não tiveram parte nesse exame. Por consequencia para regularidade, para eu saber mesmo como hei de marchar, peço ás commissões que mandaram os seus delegados á, commissão de fazenda, para examinarem o orçamento dos differentes ministerios, que declarem se aceitam a responsabilidade solidaria que tinham as commissões da camara dissolvida com a commissão de fazenda d'essa mesma camara. Tenho duvidas sobre isto, e peço portanto ser esclarecido a este respeito.

O sr. Lobo d'Avila: — A commissão de fazenda, julgando que era da maior urgencia, e creio ir n'isto de accordo com todos os srs. deputados, apresentar quanto antes o parecer sobre o orçamento, adoptou o parecer da commissão da camara transacta, que já existia impresso. Para se elaborar esse parecer foram ouvidos os delegados das diversas commissões da camara transacta (apoiados). E adoptando a commissão aquelle trabalho como elle se achava, e sobre o qual tinham sido ouvidos os delegados das commissões competentes, julgou estarem satisfeitas as prescripções e formalidades que se exigem.

Isto não quer dizer que não deviam ser ouvidos os delegados das novas commissões; mas a commissão entendeu que era de maior utilidade publica apresentar quanto antes este parecer, ainda que se não satisfizesse rigorosamente a todas as formalidades, porque na occasião da discussão do orçamento os srs. deputados podem fazer todas e quaesquer observações que entenderem convenientes, as quaes serão tomadas na devida consideração por parte da commissão.

Qualquer inconveniente que n'isto se possa notar será menor, no estado de adiantamento em que está a sessão, do que demorar por mais tempo a discussão do orçamento. Portanto, repito, não houve nesta falta, por parte da commissão, a menor desconsideração por qualquer das commissões desta casa, mas unicamente o desejo de que quanto antes esta discussão tivesse logar.

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São estas as explicações que tenho a dar por parte da commissão.

O sr. J. M. de Abreu: — A proposta do meu illustre amigo, o sr. Antonio de Serpa, parece-me muito curial e muito regular, e creio que será bem aceita por todos os lados da camara,

O sr. Mendes Leal: — Conforme.

O Orador: — Parece-me curial e regular, porque a pratica tem mostrado ha muitos annos que não é demorada a discussão do orçamento quando ella é por capitulos. Pelo contrario, a discussão por ministerios faz-me lembrar a discussão da resposta ao discurso da corôa, em que se falla em tudo, e a final não póde haver uma resolução importante sobre qualquer objecto de administração publica (apoiados).

Nós temos aqui muitas vezes ouvido dos bancos dos srs. ministros, que as diversas questões que interessam mais immediatamente A administração e economia da fazenda publica, podem e devêra ser tratadas convenientemente nos diversos capitulos do orçamento (apoiados).

Esta doutrina que está sanccionada na pratica, e na pratica de outras assembléas, e ainda ultimamente a vimos adoptada na discussão do orçamento em França, esta pratica, digo, póde-nos conduzir a resultados salutares, e é igualmente proveitosa para os interesses do paiz, para a camara e para o proprio interesse do governo (apoiados); e é do interesse de todos, e do decoro do governo e da conveniencia publica que assim se discuta.

Que quer dizer a discussão geral por ministerios? A discussão por este modo não faz senão que os deputados que tomarem a palavra façam longos discursos, fallando em tudo, e que por parte do ministerio não possam ser dadas explicações categoricas sobre todos os pontos por elles mencionados (apoiados). E note-se que com isto não pretendo censurar o governo, porque sei a grande difficuldade que ha de ter para responder a differentes deputados que o interrogarem a respeito de muitos e variados pontos.

A discussão do orçamento é a primeira das obrigações constitucionaes (apoiados); e não se deve fazer de modo que a representação nacional não possa mostrar o empenho e o zêlo que deve ter em examinar os differentes ramos da administração publica; de ver quaes as economias que n'ellas se possam introduzir; de provocar explicações da parte dos srs. ministros; e de apresentar alvitres, alguns dos quaes possam desde logo ser realisaveis, ou que o possam ser nas reformas e melhoramentos, que porventura hajam de se introduzir para o futuro na administração do estado (apoiados). Já se vê que as diversas questões, que dizem respeito á administração publica, se devem tratar no orçamento, e que se deve portanto examinar esse orçamento com relação ás necessidades publicas, o que só se póde fazer quando, a sua discussão for por capitulos (apoiados).

É necessario pois, que pela discussão nos convençamos se no orçamento do estado se podem ou não introduzir diversas economias, e saber quaes as reformas que ha a fazer, e onde ellas se devem realisar. E necessario que de uma vez se saiba se se podem fazer essas economias, umas realisaveis desde logo, e outras que se possam realisar successivamente. É necessario que nos desenganemos se podem ou não ter logar alguns cortes ou eliminações de differentes verbas nos diversos capitulos do orçamento, ou se porventura podem ser com mais proveito publico applicados a verbas de outros capitulos do mesmo orçamento; porque a minha opinião é, di-la-hei com franqueza, é que entendo que no orçamento do estado não ha muitas economias a fazer, absolutamente fallando, mas que se póde fazer melhor distribuição dos fundos publicos (apoiados). Nós carecemos de fazer muitos melhoramentos em differentes ramos do serviço publico, que se acham mal attendidos e mal considerados, podendo-se para estes applicar alguns côrtes, que porventura se possam fazer das demazias e superfluidades, que possam existir em outros capitulos (apoiados). Este é o ponto que todos os homens publicos devem ter em vista pelo interesse da causa publica, e o governo não póde nem deve por fórma alguma recusar-se a esse exame, a essas considerações que os representantes do paiz têem obrigação de fazer, e com tanta mais rasão quanto se exigem do paiz graves sacrificios (apoiados). É portanto de necessidade que nós, em cumprimento do nosso mandato, procuremos introduzir na administração da fazenda publica aquelles melhoramentos que forem susceptiveis de se fazer; e igualmente mostrar ao paiz que os seus representantes, não descurando dos seus interesses, procuram resolver essas questões; procuram mostrar até onde podem chegar essas economias, e até onde são indispensaveis os sacrificios que se pedem ao povo. E quando essa discussão grave e solemne tiver logar talvez possamos mostrar que muitos dos preconceitos, que muitas das opiniões que se têem levantado, são infundadas (apoiados); e o governo, fortalecido com o apoio do parlamento e do paiz, póde com muita mais rasão, força e auctoridade moral exigir esses sacrificios que os melhoramentos do paiz alta e rigorosamente reclamam.

Se estes são, na minha opinião, os principios de boa administração, se estas são as boas praticas de conveniencia publica, por outro lado, sem o menor espirito de partido, digo que não será digno e proprio que de qualquer dos lados da camara se queira fazer da discussão do orçamento um systema de analyse muito rigorosa, porque d'ahi podia resultar dar logar a muitas divergencias, que cumpre pôr de lado; e porque a discussão do orçamento nem d'esta maneira satisfaz a todas as conveniencias do serviço do estado. Parece-me portanto que até não convirá perder muito tempo n'esta breve discussão, o qual póde ser aproveitado na discussão do orçamento.

Não posso por esta occasião deixar de dizer duas palavras sobre a observação que fez o illustre relator da commissão emquanto á duvida suscitada pelo meu illustre amigo e collega, o sr. Coelho de Carvalho, a respeito de não terem sido ouvidos os delegados das commissões. Direi, sem espirito de censura, que é uma irregularidade; mas não deixo de attender á estreiteza do tempo e á necessidade de discutir o orçamento, e que por consequencia esta falta, esta irregularidade, que de certo não foi o resultado (faço justiça á commissão) de menos consideração para com as commissões d'esta casa, entendo que é mais uma rasão para discutirmos o orçamento por capitulos; porque discutindo-se d'este modo, os membros das illustres commissões d'esta casa podem apresentar qualquer indicação, qualquer moção que o seu zêlo, illustração e especialidade exija ou permitta que elles apresentem. Eu muito de proposito abstenho-me-de toda e qualquer observação; porque, digo francamente, que não quero fazer n'isto uma questão politica nem de opposição, mas sim uma questão de principios e de conveniencia publica. E direi que se não tratassemos de uma questão de conveniencia publica, e se se resolvesse que a discussão do orçamento fosse por ministerios, era um precedente que podiamos aproveitar no futuro; mas declaro, pelo contrario, que d'isto não faço uma questão politica, porque não quero fazer questão politica da discussão do orçamento, o qual quero que examinemos só no interesse da causa publica.

N'este sentido, reconhecendo a justiça e procedencia das observações do sr. deputado Coelho de Carvalho, peço a s. ex.ª que não insista na idéa de serem ouvidos os delegados das commissões, comtanto que o orçamento se discuta por capitulos e se assim se decidir, eu pela minha parte terei occasião de fazer algumas considerações sobre alguns pontos que julgo convenientes, e hei de faze-las unicamente com o intuito de pedir explicações sobre as duvidas que se me suscitarem; e hei de propôr alguns melhoramentos que se possam realisar desde já ou para o futuro.

O sr. Pinto de Araujo (sobre a ordem): — Mando para a mesa a seguinte

PROPOSTA

Proponho que haja uma só discussão do orçamento por ministerios. = Pinto de Araujo.

(Continuando.) A sessão actual vae muito adiantada (apoiados), e ha muitos srs. deputados que se lhes torna necessario retirarem-se...

Uma voz: — Não viessem cá.

O Orador: — Não viessem cá, não é rasão. Todas as vezes que se podem conciliar os trabalhos da camara com as necessidades dos individuos que formam parte d'ella, para que havemos de estar aqui inutilmente (apoiados), gastando tempo em discussões de mero luxo, e em parte estereis, que se podia aproveitar melhor simplificando as questões. Não se diga que com isto não quero a discussão do orçamento. Quero tanto a discussão do orçamento, como a querem os srs. deputados que opinam pela proposta do meu illustre collega o sr. Antonio de Serpa, que propõe que haja duas discussões, uma geral e outra especial por capitulos; mas a mesma discussão por qualquer outro modo. Quaes são as bases que existem para a confecção do orçamento geral do estado? Não são as leis existentes? São. Póde porventura no orçamento incluir-se verba de despeza que não seja auctorisada por lei? Não. Póde o orçamento modificar-se, póde alterar-se, sem que primeiro se vote a lei que sanccione essa alteração? Não. Póde na discussão do orçamento levantar-se a questão de conveniencia ou de inconveniencia de certas despezas, da menor ou maior despeza que se faz neste ou n'aquelle ministerio, da maior ou menor despeza que se faz numa repartição? Tudo isto são considerações que se podem fazer na discussão do orçamento por ministerios, ou por outra qualquer fórma; porque o resultado d'isto não é ir alterar o orçamento nesta parte, porque isso só se póde fazer em virtude de leis que sejam previamente approvadas.

Para se chegar a esse resultado, tanto faz que nós discutamos o orçamento por ministerios, como por capitulos; porque a discussão por ministerios não se limita a dizer — as despezas deste ministerio são taes e taes; estende-se á analyse dos capitulos que formam esse ministerio...

O sr. Presidente: — Mas o sr. deputado pediu a palavra sobre a ordem, e deve ler a sua proposta... (Vozes: — Já leu, já leu; todos ouviram.) Na mesa não se tinha ouvido a leitura da proposta, e por isso fiz esta observação.

O Orador: — Parece-me pois que nós chegavamos ao mesmo resultado havendo uma ou outra discussão; mas se nós chegâmos ao mesmo resultado com qualquer das discussões, e uma dellas nos indica um caminho mais breve, mais facil e mais simples, porque não havemos de adopta-la? Parece-me que seria isto pouco curial. Na votação que se fizer por ministerios não póde nunca ser preterida qualquer proposta que se tenha feito com relação a alterações que qualquer sr. deputado entenda que se devem fazer nos diversos capitulos do mesmo ministerio; não póde deixar de ser votada essa proposta, e, sendo votada, temos conseguido o mesmo resultado. Agora se me dissessem que com a discussão por ministerios não póde haver votação sobre qualquer proposta que se faça para alterar quaesquer verbas de despeza de qualquer ministerio, então diria eu — não quero a votação por ministerios, porque me tolhe exercer o direito que tenho de propor alterações ás diversas verbas de despeza dos differentes ministerios. Mas o exercer esse direito não me tolhe a discussão por ministerios...

Uma voz: — Tolhe.

O Orador: — Como é que tolhe? Pois não ha de haver uma votação sobre as propostas que se façam com relação a qualquer ministerio? Não póde deixar de ser, porque todas as propostas têem uma votação, menos aquellas que estiverem prejudicadas pela approvação de outras. Quando haja uma proposta relativamente a alterar qualquer verba do orçamento tem de ter uma votação, e se eu entendesse que a não podia ter não votava a discussão por ministerios...

Uma voz: — Fecham a discussão.

O Orador: — Fecham a discussão? Perdão. Eu não posso argumentar com o abuso que se possa fazer do andamento de uma discussão qualquer, e se se póde abusar da discussão por ministerios, tambem se póde abusar da discussão por capitulos. Eu argumento com lealdade; eu parto d'aquillo que é para aquillo que se deve fazer, que é costume fazer e que se póde fazer. Quanto ás intenções reservadas que possa ter qualquer individuo relativamente a esta votação, n'isso não entro nem me importa. Se eu entendesse que a votação por ministerios podia prejudicar o direito que assiste a qualquer deputado...

Uma voz: — Fecham a discussão.

O Orador: — Mas a discussão não póde fechar-se do mesmo modo sendo por capitulos?

Parece-me portanto que não ha inconveniente algum em que o orçamento se discuta por ministerios, como proponho na proposta que vou mandar para a mesa, porque o resultado, emquanto a mim, é o mesmo, e eu fallo com lealdade, sem me importar com qualquer abuso que possa haver com relação a este ou a outro methodo de discussão. Entendo que sendo a discussão por ministerios ou por capitulos o resultado é o mesmo, porque eu posso discutir ou todos os capitulos ao mesmo tempo ou cada um d'elles por sua vez, e sobre cada um d'elles propor as alterações que quizer, que todas ellas hão de ter uma votação, nem podem deixar de ter.

Lida na mesa a proposta do sr. Pinto de Araujo, foi admittida á discussão.

O sr. Aragão Mascarenhas: — Ambas as idéas que se discutem se apoiam na regularidade da discussão e na economia do tempo.

Por uma parte quer-se que haja uma só discussão por ministerios, e por outra quer-se que haja uma discussão na generalidade, e depois uma minuciosa discussão por capitulos; e parece-me que ha um meio termo entre estas duas opiniões — que é haver uma discussão na generalidade, e depois uma discussão por ministerios (apoiados). Assim os oradores que quizessem fazer considerações largas sobre o orçamento em geral, sobre as tendencias financeiras, sobre os costumes, etc. tinham uma discussão larga sobre a generalidade do orçamento, e as reflexões com relação a uma ou outra verba mais especial podiam fazer-se na discussão por ministerios. E não havia a confusão que se suppõe, porque nem todos temos a fallar sobre todas as verbas dos ministerios, e desde que nós tivermos separado a occasião de fazer considerações geraes sobre o orçamento da occasião de apresentar quaesquer considerações especiaes com relação a cada verba de cada ministerio, não póde haver confusão alguma.

Eu podia dizer alguma cousa sobre as causas por que nós estamos no dia 13 de julho sem orçamento; sobre quem quer a discussão do orçamento e a tem querido sempre; e sobre quem tem estorvado por diversas modos e levado as cousas a este ponto; mas não digo nada, absolutamente nada sobre isso; e limito-me a apresentar esta idéa, e vou mandar para a mesa uma proposta no sentido que acabei de indicar.

Leu-se na mesa a seguinte

PROPOSTA

Proponho que haja uma discussão geral sobre a receita e despeza do estado, e depois uma discussão geral sobre cada ministerio. = Aragão Mascarenhas.

Foi admittida á discussão.

O sr. José Estevão: — Coméço por dizer a v. ex.ª que proponho desde já que haja votação nominal sobre este assumpto (apoiados). E não me diga depois v. ex.ª que não propuz na occasião em que v. ex.ª não julga a competente...

O sr. Presidente: — É verdade. Agora não é occasião de propor votação nominal. Segundo o regimento e a pratica a votação nominal requer-se antes de se propor á votação, e se o illustre deputado quer requerer que haja votação nominal, não é agora occasião de a requerer (apoiados).

O Orador: — É justamente o que eu fiz, propuz a votação nominal antes de se passar á votação (riso).

O sr. Presidente: — Quando se passar á votação é que tem logar requerer-se a votação nominal; agora não posso tomar nota do requerimento do illustre deputado (apoiados).

O Orador: — Se este meu requerimento agora não vale para v. ex.ª vale para o publico, que fica sabendo que propuz a votação nominal; se v. ex.ª não regista o meu requerimento, regista-o o publico...

O sr. Presidente: — Torno a repetir: o illustre deputado póde requerer que haja votação nominal; mas este requerimento só o póde fazer quando se passar á votação. Quando eu declarar que vae votar-se sobre o assumpto é que tem logar requerer que a votação seja nominal (apoiados).

O Orador: — O meu requerimento está feito á camara, e espero que será submettido á sua deliberação como o deve ser.

A camara deve emittir o seu voto livremente por meio de votação nominal; cada deputado póde querer juntar ao seu voto o seu nome, porque muitas vezes os corpos deliberantes podem julgar conveniente a votação nominal em vista de certas circumstancias politicas. Ha certas questões em que se não póde votar incognitamente. As votações nominaes dão mais trabalho; mas eu quero por este meio manifestar a minha opinião, que faz parte de mim mesmo, e a qual quero que fique bem clara.

A questão que nos occupa é uma d'aquellas que sempre se póde discutir, que muito se tem discutido, e por differentes vezes. O lado esquerdo incessantemente sustentou

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que o parlamento tinha o direito de votar o orçamento, não por capitulos nem por ministerios nem em globo, mas sim verba por verba. E sustentou mais — que não só o parlamento tinha o direito de discutir e votar o orçamento verba por verba, mas que havia todo o direito para fazer n'essa occasião todas as innovações que se quizesse nas leis que tinham relação com o orçamento (apoiados), porque a lei do orçamento é a lei maxima das outras leis. Portanto podia na discussão do orçamento propor-se quaesquer alterações, podiam-se cortar ordenados, augmenta-los, dar novas fórmas aos differentes ramos de serviço, n'uma palavra, na discussão do orçamento podia-se reformar toda a administrarão publica (apoiados).

Discutiu-se e sustentou-se esta doutrina, e ficou a final assente que o parlamento tinha o direito não só de discutir o orçamento verba por verba, mas tambem de fazer todas as innovações que quizesse. E se não fosse deste modo a discussão do orçamento, era evidente que a lei do orçamento era a mais intima e a mais pequena de todas as leis. Os decretos das dictaduras, creando empregos e marcando ordenados, não poderiam ser reformados pela lei do parlamento votada no orçamento. Isto seria uma doutrina anarchica que não podia nunca ser aceita.

Mas depois de decidido o direito que o parlamento tem de discutir e votar o orçamento verba por verba, regateia-se até a discussão por capitulos, e quer-se que seja por ministerios! O illustre deputado meu amigo, mostrou que toda a discussão era impossivel e dispensavel, absolutamente dispensavel. Isso sei eu; porque quando todos os actos que se discutem são de igual importancia, e se prohibe que se discutam, é escusado discuti-los.

Qual é o melhor modo de discutir? Quando se quer discutir, todos são bons. Agora se nós discutirmos qual é a melhor lei de liberdade de imprensa, o ao mesmo tempo nos for prohibido escrever, todas as leis são iguaes, então todas as palavras de qualquer lei são nada. E o mesmo que se me disserem: «Vós podeis transitar perfeitamente livre pelo paiz, mas deveis ir munido de passaporte». É uma cousa inutil. Se me não deixam andar quando eu saír de casa!...

O sr. Serpa propoz duas discussões. A discussão geral sobre a receita e despeza, e a discussão da especialidade capitulo por capitulo; depois um outro illustre deputado apresentou uma especie de transacção sobre isto. Consertar a discussão em geral e votar ministerio por ministerio.

Eu tambem tenho a minha idéa de transacção, mas troco os pontos: transijo, querendo que se discuta capitulo por capitulo e dou de barato á discussão geral. A discussão da receita publica, essa não póde evitar-se, tem logar em muitos orçamentos e principalmente no orçamento da fazenda; e a despeza discute-se em cada um dos capitulos, e então acho inutil uma discussão larga sobre a despeza publica.

Mas discutir o orçamento por ministerios, é um modo menos engenhoso e mais grosseiro de fraudar o voto parlamentar, e de tornar as discussões inuteis.

A camara diz: «Em attenção ás circumstancias em que nos achâmos, por mero expediente, e prestando homenagem, aos bons principios, ou sem que os desconheçamos, nós votâmos aqui, sem que se cite o precedente, por tal ou tal expediente». Eu deixaria á consciencia da camara esta resolução; mas votar como sancção de principios, como doutrina regular e não como expediente compativel com o systema representativo, isso não póde ser.

O illustre deputado diz: «É necessario combinar as commodidades particulares dos deputados com o exercicio das suas funcções parlamentares». Excellente. Mas a melhor combinação era irmos-nos todos embora; e para mim é um penoso sacrificio achar-me em Lisboa n'este tempo, ser obrigado a vir aqui, e tomar parte nos nossos debates. Mas se não podemos fazer composições sobre a nossa saude, não podemos fazer composições com o nosso dever e com a nossa obrigação.

A carta determina que os deputados examinem a receita e despeza publica: e pergunto eu — como se póde examinar a receita e despeza votando-se ministerio por ministerio?

E agora explico por que discutimos a resposta ao discurso da corôa, e tenho mais uma prova da minha simplicidade. Insisti em que nos não levassemos por considerações particulares, para deixar do seguir o principio que tinhamos assentado e feito valer, e responderam-me que nos não haviam de deixar discutir o orçamento, nem as altas questões da governação publica. Eu não podia suspeitar que houvesse tanta cegueira para calcar aos pés todos os principios. Agora estou desenganado; e fico sabendo, e fiquem-no sabendo todos, que nos não deixam discutir porque a camara não quer, porque o governo o não consente, e principalmente porque o não consente essa fracção reaccionaria do governo, positiva e petulantemente reaccionaria nas questões internas e externas, reaccionaria, reputada por muitos que assim o consideram nos corredores, e que vêem aqui votar contra a sua consciencia.

Vozes: — Ordem, ordem.

O Orador: — Eu não peço senão votação nominal. Não espero que o parlamento portuguez se furte a este incommodo, para não dizer claramente o seu voto á face do paiz. Quando em 1861 o parlamento francez assentou e tomou a disposição de discutir o orçamento capitulo por capitulo eu não supponho que haja parlamento portuguez que cerceie assim as prerogativas parlamentares. E vão depois dizer que querem economias, que são populares, que não são lazaristas! São tudo quanto lhe mandam ser, não ao aceno do governo, mas do ministerio predilecto que ali está.

Peço votação nominal.

O sr. Presidente: — Eu já disse que não tomava agora nota do requerimento; quando se passar á votação é que é occasião de se requerer.

O sr. Antonio de Serpa: — Eu tambem transijo, mas não transijo com os principios: não posso transigir com que se deixe de discutir o orçamento capitulo por capitulo (apoiados). E como esta discussão da generalidade das questões de fazenda, vem muito, a proposito na questão relativa á receita geral do estado, eu cedo da primeira parte da minha proposta, a respeito da discussão geral do orçamento, e conservo a ultima parte, para que a discussão seja capitulo por capitulo.

Portanto peço licença a v. ex.ª ou peço á camara que consinta que risque da minha proposta a parte que se refere á discussão geral, e que fique sómente a discussão capitulo por capitulo.

A camara permittiu-o.

O sr. Pinto de Almeida: — Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara se a materia deste incidente está sufficientemente discutida.

O sr. José Estevão: — Sr. presidente, eu peço votação nominal (Riso.)

O sr. Presidente: — Vou pôr á votação o requerimento do sr. Pinto de Almeida.

Julgou-se a materia discutida.

O sr. Presidente: — Vão ler-se as propostas.

Leram-se.

O sr. Pinto de Araujo: — Peço para retirar a minha proposta.

Foi retirada.

O sr. José Estevão: — Lembre-se v. ex.ª que eu pedi votação nominal.

O sr. Presidente: — Restam portanto as duas propostas. N'estas duas propostas propõe-se tres cousas, que vem a ser — que haja uma discussão geral sobre o orçamento de receita e de despeza, e o sr. Serpa propõe que a discussão especial seja por capitulos, e o sr. Aragão que seja por ministerios. A primeira cousa que vou propor á camara é, se quer que haja uma discussão geral na fórma da proposta do sr. Aragão, porque o sr. Serpa retirou a primeira parte da sua proposta n'este mesmo sentido.

O sr. Antonio de Serpa: — Visto que não ha senão dois alvitres propostos, um para que se discuta por capitulos, e doutro para que se discuta por ministerios, havendo uma discussão geral; o que é rasoavel é propor á votação successivamente estas duas propostas.

O sr. Aragão, pela maneira como fallou, e era escusado eu dize-lo, propondo uma discussão geral sobre o orçamento, é porque presuppõe já que depois ha uma discussão sobre cada ministerio, e eu propondo uma discussão especial por capitulos, é porque entendo que quando se tratar do orçamento da receita, se póde tratar da questão geral de fazenda, se a camara quizer entrar n'essa discussão.

O sr. Presidente: — O sr. Aragão não retirou a primeira parte da sua proposta.

O sr. Antonio de Serpa: — Eu peço que se vote primeiro a minha proposta, e depois a do sr. Aragão.

O sr. Presidente: — A primeira cousa a resolver é se ha de haver uma discussão geral, e depois de decidido isto, é que ha de resolver-se sobre as outras partes das propostas.

O sr. Serpa: — Quando v. ex.ª propozer a do sr. Aragão, proponha-a por partes, mas proponha primeiro a minha, que essa é a ordem, porque foi a primeira apresentada.

O sr. Presidente: — Quando se enceta uma discussão qualquer, a primeira cousa é saber se ha de haver uma discussão geral, ou se ha de passar-se logo á discussão especial. É isto o que entendo que a camara deve, no caso presente, resolver primeiro. Depois da camara resolver se ha de ou não haver uma discussão geral sobre o orçamento, então tem logar a votar-se a proposta do illustre deputado, porque não póde propor primeiro á votação se a discussão ha de ser por ministerios ou por capitulos, sem a camara ter resolvido se ha de haver ou não uma discussão geral. O sr. deputado retirou a primeira parte da sua proposta, mas ha outra que tem a primeira parte no mesmo sentido da que o sr. deputado retirou.

O sr. José Estevão (sobre o modo de propor): — A discussão geral sobre o orçamento, e para que v. ex.ª invoca o que se observa na discussão geral sobre qualquer outro projecto de lei, não é exactamente o mesmo que a discussão geral sobre cada um d'esses projectos de lei, abrange muito mais pontos, tantos quantos são os variados assumptos da receita e da despeza publica. Ora, o sr. Serpa quiz assegurar os direitos da camara para se occupar deste importante debate; mas procurando conseguir este seu proposito assegurou, a meu ver justamente, o direito que menos podia ser contestado, porque, sem reparo de v. ex.ª nem reparo da camara, e com assenso de todos os oradores, ao discutir-se a verba de um ministerio, suppondo que a discussão seja por ministerios e especialmente a do ministerio da fazenda, facilmente a discussão transborda para as suas generalidades naturaes, e portanto n'esta questão a generalidade do debate não é o que eu quero assegurar, essa está segura, que ha de vir pela força logica das idéas; o que eu quero é assegurar, não a prerogativa parlamentar que consiste nos exames largos e elevados da materia, porque essa ha de ser exercida por sua natureza, mas a prerogativa parlamentar, que consiste no direito de ver, examinar e esquadrinhar as mais pequenas partes da receita e da despeza publica.

O sr. Presidente: — Agora do que se trata é do modo de propor.

Vozes: — Votos, votos.

O Orador: — Mas perdôe-me v. ex.ª Se eu não concluir sobre o modo de propor, nomeie v. ex.ª dois dos mais abalisados Genuenses desta casa, e mande-lhes dar-me palmatoadas logicas (riso).

Eu concluo dentro dos termos a que me tinha obrigado, dizendo o seguinte — o que deve fazer objecto principal da votação da camara não é a discussão da generalidade...

O sr. Presidente: — A discussão está fechada: o que se deve propor á votação da camara é se ha de haver uma discussão na generalidade, e sendo isto resolvido, se á discussão na especialidade ha de ser por capitulos ou por ministerios.

O Orador: — Eu proponho que v. ex.ª sujeite á deliberação da camara, primeiro que tudo, se a discussão do orçamento ha de ser por ministerios ou por capitulos, e peço sobre isto votação nominal.

O sr. Presidente: — Eu tenho direito e obrigação de estabelecer as questões como ellas são e como manda o regimento (apoiados). Uma vez que se apresentou uma proposta para que haja uma discussão geral, a minha obrigação é submetter primeiro á votação essa proposta. Resolvido pela camara que haja ou não uma discussão geral, depois submetterei á sua resolução se a discussão especial ha de ser por capitulos ou por ministerios. Isto é que é regular e conforme o regimento, e não posso deixar de o fazer. A primeira cousa que vou pôr á votação é — se ha de haver uma discussão geral sobre o orçamento.

O sr. Ministro da Fazenda (A. J. d'Avila) (sobre o modo de propor): — Eu começo por perguntar acamara se me permitte dizer algumas palavras sobre esta questão prejudicial, porque não sei se a prerogativa de um ministro, que não é membro d'esta camara, vae ao ponto de poder tomar parte n'esta questão toda da camara.

Vozes: — Falle.

V. ex.ª tem rasão: entretanto parecia-me que não valia a pena de se levantar uma questão, quando ha um tão grande numero de cavalheiros, membros d'esta casa, que têem uma opinião diversa.

A proposta do sr. Aragão é uma proposta completa; o sr. Aragão, para o caso em que a discussão do orçamento tenha logar por ministerios, propõe uma discussão na generalidade, e se a discussão fosse por capitulos, elle retirava essa parte da sua proposta. N'este caso eu proporia a v. ex.ª que propozesse á votação qualquer das duas propostas; mas sem a dividir.

O sr. Presidente: — Sem o sr. deputado retirar a sua proposta eu não posso deixar de a propor.

O Orador: — Parecia-me que qualquer das propostas deve ser posta á votação completamente; uma é substituição da outra; os cavalheiros que propõem a discussão do orçamento por capitulos prescindem da discussão na generalidade, porquanto estão persuadidos de que a discussão por capitulos ha de necessariamente trazer comsigo a discussão da generalidade; e o sr. Aragão, propondo uma discussão na generalidade, quer que depois d'ella se discuta o orçamento por ministerios. No logar de v. ex.ª, eu proporia pois á votação estas duas propostas, uma depois da outra; mas sem as dividir.

Por esta occasião não posso deixar de dizer, que o sr. José Estevão foi muito injusto com o governo, e comigo com especialidade, suppondo que eu tinha influido nesta questão; para o governo é indifferente que a camara admitta uma ou outra d'estas duas propostas; o que o governo deseja é que a camara se compenetre da situação em que nos achámos, que não perca de vista, que a sessão está muito adiantada (apoiados); que é necessario, que se vote a lei da receita e a despeza, que se votem outros projectos importantes, que já estão sobre a mesa, e que os ministros tenham tempo para preparar trabalhos para a sessão seguinte.

Peço a v. ex.ª desculpa de ter dito estas poucas palavras á camara; mas insistiria ainda em que se votasse qualquer dos dous systemas, mas completos (apoiados).

O sr. Aragão Mascarenhas: — Eu não retiro a minha proposta em nenhuma parte, mantenho-a tal qual está.

O sr. Presidente: — N'esse caso eu não posso deixar de pôr á votação a proposta do sr. deputado.

Os senhores que approvam a primeira parte para que haja uma discussão geral sobre o orçamento queiram levantar-se.

Foi rejeitada.

O sr. Presidente: — Está rejeitada esta parte, segue-se agora propôr se a discussão especial ha de ser por capitulos na conformidade da proposta do sr. Antonio de Serpa.

O sr. Quaresma: — Eu desejo que v. ex.ª me diga o que se vota, porque o não sei.

O sr. Presidente: — Eu explico. A camara resolveu que não houvesse discussão geral do orçamento; agora propuz se a discussão ha de ser por capitulos; se for approvado que seja por capitulos, fica prejudicada a proposta do sr. Aragão, para que a discussão seja por ministerios; se não for approvado que seja por capitulos tem logar o propor-se á votação a proposta do sr. Aragão.

O sr. Aragão Mascarenhas: — Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara se permitte que eu retire o resto da minha proposta.

Foi-lhe permittido retira-la.

O sr. Presidente: — O sr. José Estevão pediu que a votação a que se vae proceder seja nominal.

O sr. José Estevão: — Eu desisto do meu requerimento.

E propondo-se logo.

Se a discussão do orçamento ha de ser por capitulos? — Decidiu-se afirmativamente.

O sr. Presidente: — Vae começar a discussão do orçamento da despeza.

Vae ler-se o parecer da commissão de fazenda, que adopta o parecer da commissão de fazenda da camara transacta.

É o seguinte:

PARECER N.° 7

Senhores. — A commissão de fazenda, considerando quanto é urgente submetter á vossa consideração o orçamento da receita e despeza do estado para o anno economico de 1861

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a 1862, adoptou o parecer da commissão de fazenda de 21 de março do corrente anno, em que interveiu a maioria da commissão actual, e sobre cujo assumpto foram ouvidos os delegados das diversas commissões da camara dissolvida. A commissão apresenta igualmente á vossa approvação os projectos de lei que acompanham o referido parecer.

Sala da commissão, em 18 de junho de 1861. = Francisco de Oliveira Chamiço = Joaquim Thomás Lobo d'Avila =João Antonio Gomes de Castro = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc = Antonio Vicente Peixoto = João Rodrigues da Cunha Aragão Mascarenhas = Anselmo José Braamcamp =Augusto Xavier da Silva.

Refere-se ao seguinte.

PARECER N.° 59

Senhores. — A commissão de fazenda, tendo procedido ao exame do orçamento geral do estado para o anno economico de 1861-1862, vem hoje dar-vos conta dos seus trabalhos.

Propõe o governo que a despeza para o referido anno seja de 14.303:686$731 réis, e a commissão consignando as alterações que por virtude de leis posteriormente votadas, ou de propostas fundamentadas, foram sujeitas á vossa consideração, elevou aquella quantia a 14.393:702$626 réis, e expõe-vos na nota respectiva a rasão d'esse augmento equivalente a 90:015$895 réis.

A receita geral é calculada na somma de 13.301:512$407 réis, comprehendendo a extraordinaria, e a que resulta dos donativos de Suas Magestades, das deducções na dotação de outros membros da familia real, e nos vencimentos dos empregados publicos e classes inactivas. As verbas incluídas pela commissão na referida somma geral da receita importam em 50:250$000 réis.

O deficit que resulta da comparação das indicadas quantias computa-se em 1.092:190$219 réis. Tem de acrescer a este deficit a importancia dos creditos supplementares que o governo tenha de abrir na conformidade do artigo 2.° do projecto de lei de despeza, e os encargos dos emprestimos que no futuro anno economico hajam de realisar-se para occorrer ás despezas dos caminhos de ferro em construcção, e das estradas a construir e a reparar.

A commissão de fazenda espera que esse deficit ha de ser consideravelmente attenuado no futuro anno economico pelo progressivo augmento que demonstra o rendimento das alfandegas maiores do reino, o qual nos oito mezes decorridos do actual anno economico, indica um excesso de réis 317:723$547 sobre o periodo correspondente ao anno economico de 1859-1860, e promettendo continuar na mesma proporção durante os quatro mezes restantes; fundado motivo ha para esperar que no futuro anno economico esta receita constitua um acrescimo de 550:000$000 sobre a que vae calculada pelo governo e pela vossa commissão. Ella confia igualmente em que os novos impostos creados pelo concurso dos poderes publicos nas sessões passada e presente do parlamento servirão ainda a reduzir muito o deficit, considerando que da contribuição industrial e imposto de viação, e das contrições de registo e do sêllo com as modificações que o governo vae apresentar a estas duas leis, modificações aconselhadas no interesse dos contribuintes e do estado, ha de provir uma somma mais avultada do que aquella em que estes impostos vem orçados; e a commissão veria com grande prazer que esse augmento fosse tal, que, produzindo o equilibrio da receita com a despeza geral do estado no anno economico de 1861-1862, permittisse a este paiz, pela consolidação do credito publico, o desenvolvimento dos seus numerosos recursos e da prosperidade a que tem direito um povo que tanto procura coadjuvar os poderes publicos nos esforços e sacrificios feitos para a conseguir.

Comtudo, prevenindo qualquer diminuição que possa haver na fundada espectativa da commissão, não póde ella querer que o governo deixe de ficar auctorisado para applicar ao supprimento do deficit os recursos para esse effeito indispensaveis, e n'este sentido recommenda á vossa approvação as disposições contidas na lei de receita.

Sanccionando o principio de que os vencimentos dos servidores do estado devem ser adequadamente melhorados á medida que as circumstancias do paiz o permittam, a vossa commissão conveio na nova reducção do desconto que pesava sobre estas classes, reducção que traz ao thesouro um encargo de 180:000$000 réis no futuro anno economico. Não se atreve porém a vossa commissão a estabelecer, como conveniencia para o serviço publico, que este augmento dos vencimentos aos servidores do estado vá pesar exclusivamente nos annos futuros sobre a actual verba respectiva da despeza geral, antes julga ella dever recommendar ao governo a reducção gradual do numero presente dos empregados publicos n'aquellas repartições do estado onde as vacaturas que forem occorrendo possam deixar de preencher-se sem prejuizo do expediente regular, convertendo a verba resultante d'esta reducção em proveito da classe em geral. Não póde haver duvida de que o expediente muito deve melhorar ainda com um pessoal reduzido á medida que esse pessoal seja mais convenientemente renumerado e habilitado.

Estas considerações nascem do desejo que a vossa commissão partilha sem duvida comvosco e com o governo de ver estabelecida a mais restricta economica em todos os ramos do serviço, a fim de melhor se habilitar o thesouro publico para satisfazer, em proporção dos seus recursos, a todas as reclamações fundadas contra o estado, ás quaes as difficuldades financeiras e as calamidades que por tantos annos affligiram este paiz não têem permittido attender.

Quando esta aspiração se ache satisfeita poderá o paiz, persistindo todavia no empenho de estabelecer nas bases mais productivamente economicas a sua administração, confiar nos valiosos recursos que deve auferir da consolidação do credito publico, para os applicar aos indispensaveis melhoramentos das suas communicações internas, ao desenvolvimento das suas valiosissimas colonias e á conquista moral da posição que lhe cabe na communhão das nações mais adiantadas.

A vossa commissão reputa igualmente uma necessidade urgente o melhoramento da contabilidade publica entre a repartição central da contabilidade no thesouro publico e todos os ministerios, bem como nas repartições de fazenda, alfandegas e mais estações publicas do estado, e pede para este assumpto a attenção do governo.

JUNTA DO CREDITO PUBLICO

Propõe o governo para despeza geral, no futuro anno economico, da junta do credito publico a quantia de réis 4.173:606$189 que excede em 249:154$198 réis a que foi consignada na carta de lei de 28 de julho de 1860.

A vossa commissão augmentou ainda esta verba com réis 15:000$000, juro de 500:000$000 réis de inscripções que devem ser creadas para garantia do emprestimo votado em ambas as casas do parlamento para reparo das estradas, barras e portos do reino. Sabe portanto a totalidade da despeza da junta do credito publico a 4.188:606$189 réis.

MINISTERIO DOS NEGOCIOS DA FAZENDA

A despeza do ministerio da fazenda auctorisada pela carta de lei de 25 de julho de 1860 para o anno economico de 1860-1861 foi de 2.997:308$301 réis, e aquella que o governo propõe para 1861-1862 é a de 3.086:547$563 réis, quantia esta que a commissão teve ainda que modificar em harmonia com as transacções e as reformas realisadas depois da publicação do orçamento.

A lei de 11 de agosto de 1860 auctorisou o governo a decretar as alterações que julgasse convenientes na administração da fazenda publica, impondo-lhe como unica restricção que o augmento na despeza não excedesse a réis 30:000$000 sobre a despeza ordinaria ou extraordinaria que então se fazia com o mesmo serviço.

Usando d'esta auctorisação o governo realisou a reforma pelos decretos e regulamentos de 3 de novembro e 29 de dezembro ultimos.

A commissão, sem entrar no exame das vantagens que devem resultar da nova organisação, entendeu que lhe cumpria tão sómente averiguar se tinha sido guardada a disposição do artigo 9.° da lei.

O relatorio do ministerio da fazenda de 7 de janeiro e os documentos que o acompanham demonstram que o encargo effectivo, tanto com os empregados do quadro como com os addidos e com as gratificações, era anteriormente de réis 134:864$980, que juntos aos 30:000$000 réis de augmento que concede a lei, elevam a 164:864$980 réis o maximo da despeza auctorisada, e que por outro lado a importancia dos vencimentos dos quadros novamente estabelecidos não excede a 155:784$000 réis.

Mais tarde o governo, completando a organisação do serviço, apresentou á commissão a tabella das gratificações que elle reputa indispensaveis, sendo:

Para os empregados com cartas de bachareis.... 2:000$000

Para os sete inspectores de contribuições..... 4:900$000

Para o serviço das visitas aos concelhos por parte das repartições de fazenda... 2:000$000

Ao todo 8:900$000 réis, que deixa ainda uma differença de 180$000 réis para menos sobre a quantia que podia gastar.

N'esta reforma o governo procurou trazer para os quadros das repartições os empregados que se acham addidos, mas nem todos estavam em circumstancias de ser despachados, e para compensar pela fórma possivel esta despeza, que elle não podia evitar, o governo deixou vagos oito logares de segundos amanuenses.

A commissão, approvando esta disposição, que ella entende que se deve continuar, convenceu-se de que o governo se tinha conservado dentro dos limites da auctorisação que lhe foi concedida, e não duvidou inserir nos capitulos VII, VIII, XIII e XV d'este orçamento as alterações correspondentes.

No capitulo II, a organisação ultimamente adoptada por esta camara para a publicação das suas sessões, trouxe um augmento de despeza de 1:952$000 réis nos vencimentos dos tachygraphos.

No capitulo IV elimina-se averba de 7:012$50 réis relativa aos emprestimos contratados com a companhia Viannense, e que foram pagos integralmente, mas acresce por outra parte a somma de 15:000$000 réis, maximo encargo que póde resultar do emprestimo de 200:000$000 réis para reparos nas estradas, portos e barras do reino.

No capitulo XI finalmente augmenta a quantia de réis 521$150, importancia de gratificações aos officiaes do exercito empregados no serviço de ronda na alfandega municipal.

Estas alterações, que melhor constam dos mappas demonstrativos que vão juntos ao relatorio, elevam a despeza do ministerio da fazenda á somma de 3.125:6570418 réis, com um augmento de 39:109$855 réis, sobre a quantia pedida pelo governo, e de 127:269$117 réis sobre o orçamento de 1860-1861.

Analysando as principaes alterações que produzem este resultado, a commissão conheceu que algumas são sómente despezas que já existiam; que outras, longe de pesar sobre o thesouro, correspondem a um desenvolvimento proporcional das rendas publicas e do commercio do paiz, e que todas estão firmadas em disposições legislativas ou na conveniencia do serviço.

O governo, adoptando o principio, que a commissão muito approva, de inserir no orçamento todas as despezas publicas, circumscrevendo tanto quanto lhe é possivel aquellas que têem de ser pagas pelos creditos extraordinarios, inclue na sua proposta a quantia de 16:215$400 réis que custavam os serões e as gratificações a diversos empregados do thesouro publico, a de 5:954$784 réis que se gastava igualmente nas repartições de fazenda dos districtos, e a de 38:000$000 réis, excesso da despeza que se fazia com a esquadrilha de fiscalisação das alfandegas, que, orçada em 12:000$000 réis, tem sido na realidade de 50:000$000 réis por anno.

Estas parcellas, que importam em mais de 60:000$000 réis, embora não viessem mencionadas, eram despezas effectivas que saíam dos cofres publicos, e que, se augmentam a cifra do orçamento, não aggravam de certo as circumstancias do thesouro.

No capitulo dos encargos diversos encontra-se um augmento de perto de 24:000$000 réis que não constituem despeza.

A differença nas verbas para falhas e annullações nas contribuições de repartição representam o maior rendimento das mesmas contribuições, e portanto dos 2 por cento que sobre ellas se recebem para este fim, e assim o acrescimo na restituição dos direitos de tonelagem e do arroz não é mais do que a restituição de um deposito feito pelos navios que vem commerciar, pelos negociantes que trazem o arroz, para o beneficiar antes de reexportado, e que uns e outros não viriam aos nossos portos, se não fosse a certeza do reembolso.

Deduzindo as sommas que deixâmos enunciadas, já o augmento que notámos no orçamento de 1861-1862 perde muito da sua importancia.

Das alterações restantes, algumas, como o augmento com o serviço da fiscalisação nas alfandegas, são despezas productivas imperiosamente reclamadas para interesse do fisco.

Outras finalmente são consequencia inevitavel do systema financeiro que adoptámos. Todos os annos votâmos avultados emprestimos para melhoramentos materiaes e ainda para preencher o deficit, e os encargos correspondentes vem annualmente engrossar o capitulo dos juros e amortisações a cargo do thesouro. Este orçamento já comprehende mais 88:940$000 réis, juros de novos emprestimos, e que elevam a sua importancia a 959:473$641 réis como complemento do pesado encargo da nossa divida. Todavia convem observar que a referida somma abrange algumas amortisações que montam a mais de 330:000$000 réis, e que os outros 630:000$000 réis estão em grande parte representados pelos juros das inscripções que servem de garantia aos diversos emprestimos, e vem orçados em 571:000$000 réis na receita do estado.

O governo tem a faculdade de vender as inscripções, mas para não pesar sobre o mercado e poder aproveitar a occasião de as traspassar com mais vantagem, elle tem adoptado o systema de as empenhar, systema com que a commissão concorda plenamente, e que encontra a sua melhor justificação no progressivo augmento de valor que vão alcançando os nossos fundos.

A commissão compraz-se em observar que o governo se occupa activamente da reforma dos regulamentos e expediente das alfandegas, e confia ver n'essa reforma uma economia effectiva para o thesouro, não menos do que a simplificação do actual processo complicado de despacho e escripturação, processo cujos inconvenientes para o trafico mercantil, e cujo encargo para o thesouro na exigencia de numeroso pessoal tem sido sufficientemente demonstrado.

MINISTERIO DO REINO

A importancia auctorisada para as despezas do anno economico de 1860-1861 pela carta de lei de 21 de julho de 1860 foi de 1.374:788$552 réis.

E o orçamento proposto para o anno economico de 1861 a 1862 importa na somma de 1.435:509$860 réis, havendo assim uma differença para mais de 60:721$808 réis.

Este augmento de despeza provém:

1.° Das leis de 3, 10, 11 e 14 de agosto de 1860, que elevaram a consignação de 102:886$426 réis, que o governo pagava á camara de Lisboa para despezas de illuminação, calçadas e limpeza da capital, a 120:000$000 réis em cada anno; da gratificação annual de 90$000 réis a cada um dos officiaes ordinarios da secretaria do tribunal do conselho d'estado; do augmento do ordenado de 240$000 réis ao porteiro da bibliotheca nacional de Lisboa; e de 1 por cento para as despezas da administração do theatro nacional de D. Maria II, do imposto estabelecido sobre os premios das loterias.

2.° Do augmento de 7:935$690 réis das verbas relativas á imprensa nacional de Lisboa e Coimbra, pelo seu maior desenvolvimento de trabalhos; sendo que estes estabelecimentos se mantêem com seus proprios recursos.

3.° De 2:400$000 réis, subsidio de tres novas cadeiras creadas na universidade de Coimbra pelas cartas de lei de 26 e 27 de fevereiro do corrente anno; do vencimento de quatro empregados da secretaria do extincto conselho superior que estão addidos á universidade, na importancia de 1:270$000 réis. Alem da creação de mais de cincoenta cadeiras de instrucção primaria e mais despezas provenientes do augmento do terço dos ordenados e jubilações dos professores.

4.° Da importancia de 4:812$957 réis para soccorros a estabelecimentos de beneficencia, e especialmente para auxiliar a receita do hospital das Caldas da Rainha.

5.° De mais 1:150$000 réis para impressão dos relatorios dos governos civis; custo da legislação para distribuir pelas auctoridades; impressão das contas do ministerio, bem como 3:036$280 réis com o augmento de despeza do Diario de Lisboa.

Deve porém notar-se que esta despeza junta ao pessoal do mesmo Diario, é attenuada pelo producto da receita do mesmo; assim como a verba de 1 por cento de imposto estabelecido sobre o premio das loterias deve desapparecer logo que se ponha em execução a lei dos sêllos.

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De mais 3:000$000 réis para satisfazer as despezas de policia preventiva, para a captura de ladrões e malfeitores, e inspecção sanitária das meretrizes e outras despezas; além do augmento de mais 60$000 réis para despezas; de mais 500$000 réis por se haver reconhecido a insufficiencia do subsidio mensal para os pensionistas do estado, que estão estudando as bellas artes em paizes estrangeiros; e finalmente de mais 400$000 réis para habilitar o governo com as impressões da imprensa nacional, incluindo o boletim de instrucção publica. A despeza a mais proposta pelo governo foi augmentada ainda pela commissão com a quantia de 12:496$540 réis, conforme a respectiva nota demonstrativa, augmento que vae já incluido na totalidade já mencionada de 60:721$808 réis.

Taes são as alterações mais notaveis que a commissão de fazenda encontrou no orçamento do ministerio do reino, e de que julgou dever dar-vos conta.

A commissão, tendo ouvido o governo sobre diversas reformas indicadas n'esta repartição, pelas quaes se devem conseguir uteis melhoramentos em varios ramos da publica administração, confia ver estas reformas brevemente convertidas em propostas de lei para serem submettidas á vossa esclarecida discussão.

MINISTERIO DOS NEGOCIOS ECCLESIASTICOS E DE JUSTIÇA

Propõe o governo para a despeza d'este ministerio a quantia de 491:607$543 réis, havendo portanto um augmento de 133$333 réis sobre a despeza auctorisada pela carta de lei de 28 de julho de 1860. Este augmento provém da terça parte do ordenado a um juiz de direito, por decreto de 20 de junho de 1860, augmento que não pôde ser incluido no orçamento do actual anno economico.

Com relação a este ministerio, na auctorisação pedida pelo governo na respectiva proposta de lei, a commissão é de parecer que se lhe permitta abrir tambem creditos supplementares para a despeza de transporte dos degradados, e assim o consigna no competente projecto de lei.

MINISTERIO DOS NEGOCIOS DA GUERRA

A despeza do ministerio da guerra proposta no orçamento era de 2.951:746$871 réis, inferior portanto em réis 23:213$393 á votada pela carta de lei de 28 de julho de 1860.

Esta diminuição era resultado da extincção progressiva da classe dos officiaes supranumerarios, cuja despeza baixara em 4:680$000 réis; e do menor numero de muares e de cavallos nos corpos de artilheria e de cavallaria, cujo sustento e tratamento reduziu a verba correspondente em réis 35:774$150.

Como o orçamento se fechára em 30 de junho passado, occorreram n'elle as alterações descriptas em a relação que a commissão tem a honra de vos apresentar, para com a vossa approvação se fazerem as emendas convenientes nos capitulos respectivos. Avultam nas despezas addicionaes a de 3:708$000 réis como consequencia da carta de lei de 14 de agosto de 1860, que beneficiou os officiaes dos batalhões nacionaes do Porto, verba que ha de ter incremento á medida que se liquidarem os direitos de outros officiaes, e para o qual o governo pediu um credito extraordinario, e a de 20:000$000 réis para compra de salitre. A respeito d'esta ultima somma deve a commissão advertir, que sendo destinada a reforçar uma despeza productiva, a da fabricação da polvora, vae compensada no maior rendimento do mesmo genero descripto na receita geral do estado, onde se acha mencionado por 56:000$000 réis, orçamento que o governo e a commissão calculam por segurança em menos do que esperam que seja na realidade.

A commissão julga do seu dever chamar a attenção sobre a fabricação e a venda d'este genero, por se persuadir com fundamento que dellas póde resultar uma receita valiosa para o thesouro, principalmente quando se adoptem alguns aperfeiçoamentos. Existe um trabalho muito desenvolvido da commissão creada pelo decreto de 8 de março de 1854, sobre a fabricação e administração do referido genero por conta do estado e do seu commercio em Portugal e no ultramar, que leva á evidencia o grande partido que o governo póde tirar d'esta industria. Suscitando a lembrança d'aquelle relatorio, e sabendo que um commissionado do governo que se acha em França para estudos scientificos, se dedica á investigação de um novo processo melhor e mais economico de obter a polvora, a commissão tem por fim inculcar a utilidade de que se reforme o modo de ser actual da fabrica respectiva e o do commercio da mesma polvora. É injustificavel o monopolio de um genero que não produz a quantidade reclamada pela procura, nem acha vendedores para um grande numero de localidades. Eis a rasão do grande contrabando que acontece, e a da fabricação clandestina na maior parte dos districtos, animada alem d'isto pela disposição do decreto de 22 de julho de 1842, que manda pagar cada arratel de polvora apprehendida por um preço superior ao da manufacturada illegalmente pelos particulares.

A commissão verificou a legalidade de todas as verbas de despeza proposta, e encontrou-as regulares. Este exame e o grande interesse que tem pelo exercito, e pelo que lhe diz respeito, pela missão importante que lhe cabe na defeza da patria e na manutenção da segurança e tranquillidade do paiz, levou a commissão a pensar que seriam talvez praticaveis alguns melhoramentos que elevassem a força viva do mesmo exercito, sem lhe alterar a dotação actual. O governo declarou n'essa occasião ter-se occupado activamente, pelo modo que teve por opportuno, de melhorar a organisação da força publica nos limites do orçamento, visando a maior utilidade do serviço e respeitando os direitos adquiridos. A commissão, reconhecendo a madureza e circumspecção indispensaveis para reconstituir e robustecer o exercito com os seus proprios elementos actuaes, julga prudente recordar por esta occasião alguns factos que a experiencia manda ter presentes quando forem planeadas quaesquer reformas. É o primeiro a falta de previsão economica, desaproveitando os empregados quando se extinguem algumas repartições, sendo por isto que ainda hoje sobrecarregam o orçamento da guerra na importancia de 22:888$200 réis (artigo 48.° e 49.° do orçamento), alem dos quadros. É o segundo facto que obsta ao melhoramento do exercito, a grande quantidade de leis excepcionaes que, alterando a lei vigente, têem dado vantagens notaveis a individuos e a classes, que tendo de entrar na dos reformados, a que se acha destinada uma verba constante, paralysam as recompensas de grande numero de officiaes. Outro facto é o da existencia ainda não definida da classe dos officiaes em commissões activas, na maior parte estranhas ao exercito, e que embora sejam de bastante utilidade publica, parece deverem achar collocação mais racional em ministerio differente do da guerra. A indeterminação desta classe póde prestar-se a grandes abusos. Parece portanto rasoavel excogitar um quadro cujo numero não podessem exceder.

A commissão accordou com o governo, e tem a honra de vos propor na lei da despeza, que no ministerio da guerra possam ser applicadas á construcção e reparação dos quarteis militares quaesquer sommas que deixem eventualmente de ser empregadas nos diversos capitulos de despeza. É indispensavel reforçar assim os meios de prover á melhor accommodação dos nossos soldados.

Se for approvada, como é de esperar por ser justa, a proposta do governo para serem abonados os amanuenses da secretaria da guerra com um quarto do ordenado respectivo, subirá a verba resultante a 1:440$000 réis.

Em virtude da disposição da carta de lei de 28 de julho de 1860, vae abatida na verba destinada aos officiaes reformados a importancia de 3:504$000 réis pelas vacaturas occorridas pelo fallecimento dos officiaes comprehendidos no decreto de 23 de outubro de 1851.

Por tudo que vae referido é a despeza total do ministerio da guerra para o futuro anno economico de 2.974:631$871 réis.

MINISTERIO DOS NEGOCIOS DA MARINHA

Pedindo o ministerio da marinha 978:260$048 réis para as suas despezas no anno economico futuro, excede em réis 41:616$594 a somma que lhe foi votada pela lei do orçamento de 28 de julho de 1860.

Provém esta differença, na sua maior parte, de 26:850$300 réis de augmento no armamento naval, de salario aos aprendizes do arsenal, do estabelecimento de rações no hospital da marinha, da reparação e conservação de edifficios, e do pagamento ao monte pio respectivo das pensões liquidadas em virtude da carta de lei de 16 de abril de 1859.

A commissão achou que as verbas descriptas eram conforme as leis. Todavia, de accordo com o governo, e para estabelecer por modo explicito o direito na parte relativa ao ordenado do comprador do arsenal, tem a honra de vos offerecer um projecto de lei, que não só tende a facilitar a escolha do governo com utilidade do serviço, mas ainda conduz á suppressão futura de um logar.

A commissão tambem vos offerece outro projecto de lei auctorisando o governo a despender 53:100$000 réis na compra de uma machina a vapor para a corveta que se está construindo no arsenal da marinha, despeza que tem origem na proposta de lei de 10 de março de 1860.

A commissão compraz-se em ver inaugurar em maior escala este systema de franqueza, recorrendo ás camaras quando são indispensaveis verbas extraordinarias qual a de que se trata. Dotando-se o arsenal apenas para a conservação e fabrico das embarcações da esquadra, sempre que se levantam construcções novas ha presumpção, ou antes certeza de que se vão distrahir verbas destinadas ao armamento e ao movimento naval. D'aqui provém muitas vezes a paralysação d'essas poucas embarcações que constituem a nossa esquadra, e o vermos no apparecimento de cada navio novo a desconfiança pelo menos de se ter feito uma despeza sem conhecimento previo e legal. Se qualquer emprestimo para uma obra municipal de certa ordem, de que tem de resultar encargo ao respectivo concelho, não é auctorisado por esta camara sem que o acompanhe uma planta e o orçamento respectivo, como se póde conceber a construcção ou apparecimento de navios que importam em dezenas e por vezes em centenas de contos, sem precedencia de orçamento, sem designação de meios, sem conhecimento da sua utilidade e sem discussão da opportunidade?

A commissão pronunciando-se neste sentido e mencionando uma verdade, reconhece que o orçamento das despezas da marinha de guerra anda inferior ás necessidades navaes e ao serviço e protecção reclamados pelas nossas possessões. Neste assumpto ella não faz senão continuar na opinião da sua antecessora.

Se por emquanto nos não podemos elevar ao que convem a uma nação maritima da nossa classe, importa pelo menos possuirmos bons navios adequados para transportes e adquirirmos alguns vapores de menor lotação e despeza que concorram á manutenção do que possuimos pela opportuna ostentação de força, e que coadjuvando a administração local, obstem ao muito contrabando que se faz nas ilhas e nos extensos litoraes das nossas colonias africanas.

Tratando da fórma do orçamento, a commissão julga tambem de utilidade convidar a attenção do governo sobre a maneira de a melhorar, classificando e designando com maior propriedade e individuação as differentes despezas, partindo de bases averiguadas. Este melhoramento de fórma é praticável desde já, mas para ser completo convirá que leis especiaes designem por modo permanente a força e a lotação da nossa esquadra, e lhe estabeleçam o pessoal correspondente.

MINISTERIO DOS NEGOCIOS ESTRANGEIROS

Querendo o governo regularisar a despeza que effectivamente se tem feito com os serviços a cargo d'este ministerio, propõe para o futuro anno economico a despeza d'elle em 184:036$028 réis que apresenta quanto ao anno economico de 1860-1861 um augmento de 23:858$060 réis, como se vê da respectiva nota preliminar, e provém, abatida a quantia de 150$000 réis, despeza a menos na legação de Napoles, do augmento de 11$860 réis na pensão de um correio da secretaria, na conformidade do regulamento de 21 de maio de 1825, de 1:000$000 réis, differença a mais no cambio regulador dos pagamentos ao corpo diplomatico consular e commissões mixtas, calculado pelo que effectivamente importou esta differença em termo medio nos tres ultimos annos economicos; de 8:330$000 réis, augmento em cada anno do mesmo triennio nas ajudas de custo aos empregados nomeados para diversas commissões diplomaticas, e para satisfazer os vencimentos dos empregados das commissões mixtas portuguezas e hespanholas; e finalmente de 14:667$000 réis, augmento calculado do mesmo modo nas despezas extraordinarias das legações em cada um dos annos economicos de 1857-1858, 1858-1859 e 1859-1860. A commissão convencida da necessidade de regularisar despeza que tem sido feita com manifesta utilidade das relações externas do paiz, deseja porém que estas verbas desappareçam do orçamento, e espera por isso que ainda na actual sessão o governo apresentará, sendo possivel, ao parlamento a conveniente reforma deste ramo do serviço publico, collocando o corpo diplomatico portuguez em posição de prestar ao paiz um serviço importante, mas graduado pela situação relativa dos interesses nacionaes com respeito a cada missão, sem comtudo perder de vista a nossa situação economica e financeira.

Pela mesma occasião folgaria ver a commissão proceder o governo á reforma dos emolumentos consulares que pesam actualmente sobre a navegação portugueza, a qual está assim em mui desvantajosa posição a respeito de quasi toda a marinha europea. Seria ao mesmo tempo de utilidade a este ramo de serviço, aos interesses do commercio e aos do thesouro que o governo preferisse para os empregos consulares os mais respeitaveis commerciantes nacionaes ou estrangeiros das localidades aonde tiverem de ser representados, os quaes, a exemplo do que se dá com outros paizes, serviriam de bom grado o emprego consular gratuitamente pelas isenções que d'elle lhes provém.

MINISTERIO DAS OBRAS PUBLICAS, COMMERCIO E INDUSTRIA

Pede o governo para a despeza deste ministerio a quantia de 1.049:8510269 réis, vendo-se assim um augmento na despeza ordenada de 44:386$162 réis sobre a cifra consignada no orçamento do ultimo anno economico. Este augmento, derivado de maior desenvolvimento que tem de dar-se aos proveitosos ramos do serviço publico a cargo d'este ministerio, e que a nota preliminar explica circumstanciadamente, foi ainda augmentado pela commissão com mais 1:000$000 réis differença nas alterações que tem a propor-vos, e constam da respectiva nota. É portanto o augmento effectivo no orçamento d'este ministerio, no futuro anno economico, de 45:386$162 réis.

DESPEZA EXTRAORDINARIA DO ESTADO

Propõe-se 74:108$859 réis para o futuro anno economico, incluindo-se n'ella, alem das prestações mensaes para supprimento das despezas publicas no estabelecimento de Macau, Solor e Timor e outros, na conformidade da carta de lei de 25 de julho de 1856, na importancia de 26:666$666 réis, mais a quantia de 18:000$000 réis para pagamento de doze prestações mensaes á companhia lisbonense de illuminação a gaz por conta de divida liquidada. A commissão não teve a consignar alteração alguma a esta tabella.

A commissão de fazenda, tendo assim concluido o exame do orçamento geral da receita e despeza do estado para o anno economico de 1861-1862, tem a honra de vos submetter o resultado do seu trabalho e de pedir a vossa approvação para os projectos de lei que o acompanham.

Sala da commissão de fazenda, 21 de março de 1861. = Faustino da Gama = Francisco José da Costa Lobo = Justino Antonio de Freitas = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc = Anselmo José Braamcamp = Augusto Xavier Palmeirim = João Rodrigues da Cunha Aragão Mascarenhas = Augusto Xavier da Silva = Antonio Vicente Peixoto = Francisco de Oliveira Chamiço, relator.

JUNTA DO CREDITO PUBLICO

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Poz-se á discussão o

Capitulo 1.°

O sr. Antonio de Serpa: — Eu desejava pedir uma explicação ao sr. ministro da fazenda: desejava saber se o governo e a commissão não julgavam conveniente na dotação da junta do credito publico, e em geral no orçamento, introduzir as sommas que hão de ser gastas com a execução de muitas leis importantes como são as duas leis sobre caminhos de ferro e a lei das estradas.

Eu desejava ouvir alguma explicação da parte do sr. ministro para podermos fazer uma completa idéa do orçamento; é necessario que nós saibamos para o anno para que se faz o orçamento, quaes hão de ser as receitas e as despezas, e portanto se no actual entraram todas as sommas, que hão do ser despendidas no anno seguinte com as duas leis dos caminhos de ferro e com a lei de 9 de agosto do anno passado, que mandou fazer perto de 700 kilometros de estradas.

O sr. Ministro da Fazenda: — Sr. presidente, se o illustre deputado se contenta com que estes esclarecimentos venham no orçamento proximo, não tenho duvida em satisfazer o illustre deputado, e creio mesmo conveniente em que isso se faça; mas em relação a este orçamento o governo não o podia fazer, porque os trabalhos não tinham dado logar a que se podesse calcular qual era a somma de titulos que será necessario emittir: mas não tenho duvida, repito, em condescender com os desejos do illustre deputado, de que no orçamento proximo do ministerio da fazenda, ou propriamente da junta do credito publico, ou no relatorio que precede o orçamento geral do estado, se insira approximadamente a somma dos titulos que será preciso emittir durante esse anno, a somma que será preciso para fazer frente aos encargos dos melhoramentos materiaes que estão ou forem votados.

Havia outra circumstancia que tornava difficil esta apreciação e vinha a ser — que o governo não renunciou á esperança de que, com as novas leis que foram votadas, haja um augmento consideravel no valor dos titulos da nossa divida fundada, e esta circumstancia ha de attenuar a cifra que podesse ser apresentada no orçamento para satisfazer aquelles encargos.

E isto é muito importante, porque ha muita gente que attende só á cifra da divida consolidada, sem querer saber qual é o augmento real que na riqueza publica esta cifra representa.

Pouco importa que haja divida, se o paiz tiver receita sufficiente para fazer frente aos seus encargos. O paiz que estiver n'estas circumstancias póde-se dizer que está numa situação prospera (apoiados).

Foram estes os motivos por que não se inseriu no orçamento esta cifra, mas no anno seguinte se eu estiver ainda neste logar hão de ser satisfeitos os desejos dos illustres deputados.

O sr. Antonio de Serpa: — Dou-me por satisfeito com as explicações do sr. ministro; estas observações que eu fiz fariam parte de outras se acaso houvesse uma discussão geral, mas reservo-me para em occasião opportuna as apresentar.

Espero pois que o sr. ministro nos apresente, ao menos no orçamento que tem de apresentar na futura sessão, as sommas em que devem importar, durante o anno para o qual se faz o orçamento, os encargos provenientes dos melhoramentos materiaes que tragam despeza ao estado, e principalmente dos caminhos, de ferro e das estradas, que são as mais importantes.

Quanto ao caminho de ferro era muito conveniente que se fizesse não só o orçamento das sommas a dispender, mas mais alguma cousa. Eu sinto não estar presente o sr. ministro das obras publicas, porque queria chamar a sua attenção para a execução da lei em que se votaram os caminhos de ferro, e na qual se determina que o governo traga um relatorio á camara sobre a execução da lei, não só na parte financeira, mas na parte economica e administrativa. É necessario que nós saibamos, e não devemos em regra votar o orçamento sem saber o andamento dos trabalhos publicos e dos caminhos de ferro, como as companhias tem executado os seus compromissos, os seus contratos, e quando podemos ter a esperança de ter estes meios de communicação; e saber tambem quaes são as sommas que o governo tem despendido no pagamento das subvenções, saber qual é a parte construida e qual a somma que se tem gasto. E isto é necessario mesmo para que se saiba se se justificam as apreciações de alguns illustres deputados que suppunham, que da maneira como estavam organisados os contratos do caminho de ferro, as companhias haviam de prevalecer-se de algumas disposições d'estes contratos, e fazer a parte facil do caminho, deixando de fazer a parte difficil, recebendo uma parte avultada da subvenção, e deixando de fazer a obra. Eu desejo e tenho mesmo direito a que o paiz saiba da bôca do sr. ministro se as companhias do caminho de ferro de leste e do norte e a do sueste têem cumprido com o seu dever e com a sua obrigação, e se porventura se podem receiar os males de que se desconfiava, assim como se é verdade que ella tem gasto já quantias enormes; porque se é verdade o que tenho ouvido dizer, tem-se gasto quantias avultadas, e tem-se comprometido enormes capitães, não tendo ainda exigido do estado senão uma pequena parte do que o estado é obrigado a dar-lhe. Sinto pois que não esteja presente o sr. ministro das obras publicas; mas, quanto á parte da subvenção que o governo tem dado á companhia, desejo ouvir o sr. ministro da fazenda.

(Entrou o sr. ministro das obras publicas.)

O sr. ministro das obras publicas acaba de entrar, mas eu escuso de repetir o que disse, porque creio que é sr. ministro da fazenda tomou nota, e até porque creio que s. ex.ª está ao alcance dos factos, e pediu a este respeito já a palavra.

O sr. Ministro da Fazenda: — Sr. presidente, creio que tenho dado á camara uma prova de que comprehendo a questão da mesma maneira que a entendeu o illustre deputado. A lei de 4 de junho de 1857 obrigou o governo a dar conta ao parlamento de todas as operações que se fizessem para levantar fundos para as obras do caminho do ferro, e eu tenho satisfeito esta obrigação, porque nós meus relatorios tenho dado conta de todas estas operações (apoiados). E esta é a obrigação rigorosa do ministro da fazenda, porque estes factos devem ser trazidos ao conhecimento do parlamento, para que o parlamento primeiro o depois o publico possam ter confiança nos ministros, e conhecer que os sacrificios votados são applicados para o objecto a que foram destinados.

Eu não posso agora dizer ao illustre deputado qual é a verdadeira cifra que se tem já dado de subvenção ao caminho de ferro: esperava que o illustre deputado fizesse esta pergunta quando se tratasse da discussão do orçamento do ministerio das obras publicas, e então eu apresentaria esta cifra.

O que posso dizer é que as subvenções que até agora se têem pago não são em grandes sommas. A ultima subvenção foi de 153:000$000 réis: creio que na totalidade não montam a 300:000$000 réis.

Mas afianço á camara que, á medida que as requisições são feitas, são immediatamente satisfeitas. (O sr. Ministro das Obras Publicas: — Apoiado.)

Direi mais á camara que o governo tem tido a fortuna de obter estes meios com sacrificios módicos em relação ao preço que tem hoje o dinheiro. Ainda ha pouco o governo fez um emprestimo de 300:000$000 réis com condições moderadas e sem garantia.

O governo quer obrigar as companhias, que estão encarregadas da construcção dos caminhos do ferro, pela pontualidade com que cumprir as suas obrigações, a que ellas cumpram tambem as suas (apoiados). E portanto pelo lado do ministerio da fazenda estão tomadas todas as disposições necessarias para que sejam rigorosamente pagas, á medida que o sr. ministro das obras publicas as for solicitando, as sommas a que as companhias possam ter direito.

O sr. Antonio de Serpa: — Como as poucas reflexões que tenho a fazer ficam feitas por uma vez, offerecendo-as agora por occasião de se discutir este capitulo, parece-me que não se perde nada em acabar com este incidente.

Eu sei que o sr. ministro da fazenda tem cumprido a obrigação que lhe impõe a lei apresentando-nos os seus relatorios; mas não estranho que o seu collega das obras publicas não tenha feito outro tanto, porque a sessão não acabou ainda, e na repartição a seu cargo ha tantos e tão importantes objectos que justificam até certo ponto a demora na apresentação desse trabalho. Talvez s. ex.ª não tenha ainda trabalhos sufficientes para trazer aqui um relatorio completo.

Mas dizendo as leis dos caminhos de ferro que o governo dará conta ás côrtes, em cada sessão legislativa, do uso que houver feito das auctorisações que lhe foram concedidas, o que não se refere sómente á parte financeira, porém a tudo o mais, peço ao nobre ministro que na sessão seguinte apresente o respectivo relatorio, porque é necessario que o paiz saiba o andamento das obras, que estou persuadido tem sido conforme ao que a lei determina na parte que lhe diz respeito.

Emquanto aos negocios de obras publicas que toquei de passagem, não é este o logar para d'elles tratar, e por isso reservo-me para o fazer quando se discutir o orçamento do ministerio respectivo.

E pelo que respeita á nota do sr. ministro da fazenda, dir-lhe-hei que não a peço com o fim de demorar esta discussão, e que me contento com que s. ex.ª a traga n'esta sessão.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Velloso de Horta): — O sr. Serpa quasi que me preveniu no que vou dizer.

Eu não apresentei ainda o relatorio com respeito á importante lei do caminho de ferro, porque, havendo grande difficuldade em marcar a directriz, sobre a qual tem o governo tido mais de uma questão, e não estando ella ainda definida em todos os pontos, entendi que não era conveniente faze-lo n'este estado de cousas.

Os trabalhos têem tido um grande desenvolvimento em todas as secções, o se não têem sido pagas á companhia quantias avultadas é porque ella encetou os trabalhos em muitos pontos; mas têem-se-lhe pago já as duas primeiras prestações, e vae-se pagar a terceira.

Quando entrarmos na discussão do orçamento do ministerio a meu cargo darei es esclarecimentos que o illustre deputado entender que deve pedir, sem comtudo me abster de apresentar o relatorio; o que farei logo que haja materia para isso.

Como ninguem mais se inscrevesse, poz-se á votação o capitulo, e foi approvado.

Capitulo 2.° — Approvado sem discussão.

Capitulo 3.° — Approvado sem discussão.

O sr. Presidente: — A commissão de fazenda, no parecer relativo á divida interna, propõe o augmento de 15:000$000 réis, juro de 500:000$000 réis de inscripções que devem ser creadas para garantia de um emprestimo já votado.

Está em discussão.

Como ninguem se inscrevesse, poz-se á votação, e foi approvado.

O sr. Chamiço: — Eu pedia que, em vez de se votarem os capitulos do orçamento, como foi apresentado pelo governo, se provocasse a votação sobre os capitulos como estão designados no parecer da commissão, porquanto esses trazem logo as alterações demonstradas, e d'este modo poupava-se uma votação.

O sr. Presidente: — É o mesmo que se tem seguido.

Capitulo 4.°— Approvado sem discussão.

Capitulo 5.°

O sr. Thomás Ribeiro: — Pedi a palavra, não para questionar a respeito do orçamento, primeiro que tudo porque me julgo incompetente para tratar d'esta materia, e em segundo logar porque pouco tempo tenho tido na mão o orçamento, o que todavia não succede a alguns dos meus collegas que, mais infelizes do que eu, o não possuem ainda; desejo simplesmente fazer uma pergunta — ou a algum dos membros da commissão ou ao sr. ministro da fazenda.

Eu encontro aqui no orçamento da junta do credito publico — no mappa da despeza ordinaria e extraordinaria do estado — apontada a quantia de 2.087:612$487 réis para a despeza com os encargos da divida externa, ao passo que no resumo geral se diz = que essa despeza sobe a 2.196:703$396 réis =, e como d'esta maneira vem a haver uma differença de cento e tantos contos, quizera ser elucidado sobre a rasão d'esta' differença.

Vozes: — É o que se tira para a amortisação.

O Orador: — Como não tinha visto isto explicado, eis a rasão por que puz esta duvida, porque podia haver um erro de somma.

Vozes: — Vem no relatorio.

O Orador: — Bem. Estou satisfeito com essa explicação. Julguei que tinha havido engano.

Posto á votação o capitulo 5.º, foi approvado.

Capitulo 6.º — Approvado sem discussão.

Ia ler-se o capitulo 7.°

O Sr. Chamiço: — O 7.° não, porque cessou a amortisação. O 8.°

Capitulo 8.º — Approvado sem discussão.

O sr. Presidente: — Esta verba dos 15:000$000 réis, que vem nos encargos da divida interna, já tinha sido votada. Passa-se ao orçamento do ministerio da fazenda.

Vi o seguinte:

MINISTERIO DOS NEGOCIOS DA FAZENDA

«Ver diário original»

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Capitulo 1.° — Approvado sem discussão.

Capitulo 2.°— Approvado sem discussão.

O sr. Antonio de Serpa: — Vou mandar para a mesa uma moção, para que sejam incluidos nos encargos geraes d'este capitulo os encargos provenientes das sommas necessarias para satisfazer ao dote da senhora infanta D. Antonia. O projecto foi já votado n'esta camara, e visto que a camara o approvou, parece-me que devem ser incluidos aqui os encargos que o estado tem obrigação de satisfazer. Mando portanto para a mesa a minha proposta.

Eu vejo que n'essa auctorisação o governo pediu para levantar as sommas de que se trata pelo modo que julgasse mais conveniente; por consequencia se fosse por meio de inscripções, era necessario consignar essa verba nos encargos da junta do credito publico, mas como a proposta está n'esta latitude, parece-me que é necessario indicar aqui isto nos encargos geraes do ministerio.

A proposta é a seguinte:

PROPOSTA

Proponho que nos encargos geraes do ministerio da fazenda sejam incluidos os encargos geraes das sommas que devem ser levantadas para satisfazer o dote da senhora infanta D. Antonia. = Antonio de Serpa.

Foi admittido e ficou em discussão.

O sr. Ministro da Fazenda: — Não acho inconveniente nenhum em que se insira nos encargos geraes o que propõe o illustre deputado, entretanto devo declarar á camara que não se trata aqui unicamente do dote, mas tambem das despezas do enxoval, e a rasão por que não vem aqui já mencionadas, é porque não é ainda possivel saber quaes são os encargos do levantamento destes 120:000$000 réis. Mas se o illustre deputado quer apresentar uma proposta para que se consigne aqui o juro ordinario d'esta somma, não acho n'isso inconveniente, posto me pareça não ser de grande vantagem.

O sr. Antonio de Serpa: — O que eu pedia era que fosse á commissão de fazenda a minha proposta, sem prejuizo da discussão.

O sr. Ministro da Fazenda: — Apoiado.

O sr. José Maria de Abreu: — Eu reconheço que as perguntas que quero fazer vem um pouco fóra de logar, porque dizem respeito a um capitulo que já foi approvado sem ao menos ter sido lido.

O sr. Secretario (Miguel Osorio): — Todos os capitulos que têem sido approvados, têem sido lidos previamente.

O Orador: — Então foi culpa minha, não reparei; mas parece-me que a camara me relevará dizer alguma cousa a respeito do capitulo segundo.

Neste capitulo trata-se da despeza relativa á secretaria da camara dos pares e deputados, e não vejo a nota da lei que a auctorisa. Eu creio que uma parte das despezas das secretarias, tanto da camara dos pares, como da camara dos deputados, não tem sido regulada e fixada por leis especiaes, e que as camaras têem votado gratificações e ordenados em attenção ao bom serviço dos seus empregados, sem duvida, mas de um modo pouco regular. Entendo que tudo isto está fóra da lei commum e é inconveniente. Pedia pois ao sr. ministro que tomasse em consideração este objecto, tratando de regular e fixar este serviço de fórma que estas verbas se não augmentem a bel-prazer das diversas camaras. Não ha rasão alguma para que isto continue assim. (Vozes: — Já está votado.)

O sr. Ministro da Fazenda: — Parece-me que não póde agora discutir-se este ponto, e o mesmo illustre deputado conveiu que é negocio que só se póde regular por uma lei. As camaras tem chamado a si a prerogativa de fixar o ordenado dos seus empregados. Isto tem estado assim até hoje e não se póde alterar senão por uma lei. Entendo como o illustre deputado, que é conveniente estabelecer regras a este respeito, mas parece-me que não se póde tratar d'isso n'esta occasião (apoiados).

O sr. Chamiço: — O sr. ministro da fazenda preveniu-me; o capitulo a que se refere o illustre deputado já está votado, e toda a discussão agora sobre as verbas que lhe dizem respeito parece-me fóra de logar (apoiados). Foi sempre da prerogativa das duas camaras fixar os ordenados dos seus empregados, e assim succedeu ainda no anno passado quando se tratou da publicação das sessões d'esta camara no Diario de Lisboa. Mas o illustre deputado está no seu direito, usando da sua iniciativa para apresentar um projecto de lei sobre este assumpto; agora porém não me parece que tenha logar discussão a respeito de um capitulo que já está votado.

O s. Presidente: — Vae ler-se o capitulo 4.° E depois proporei á votação da camara a proposta do sr. Antonio de Serpa.

Foi approvado o artigo 4°, e votou-se que a proposta do sr. Antonio de Serpa fosse enviada á commissão de fazenda.

Capitulo 5.°

O sr. Castro Ferreri: — Sr. presidente, eis-nos chegados ao capitulo 5.° que trata das classes inactivas de não consideração.

Estou pois no campo, para onde me convidou o sr. ministro da fazenda, para fallar d'este assumpto. É tempo de fazer justiça a esta infeliz classe, que, soffrendo nos seus vencimentos uma diminuição de 50 por cento, faz uma excepção a todas as pensionistas do estado, pois que nenhuma soffre um abatimento de, tal ordem. Sobre indicação do sr. ministro da fazenda mandei ha dias para a mesa uma proposta para melhorar a sua sorte; estou certo que v. ex.ª a terá enviado á commissão de fazenda segundo o meu pedido. Espero agora que a illustre commissão, compenetrada dos meus sentimentos e da grave injustiça que aquella classe supporta ha tantos annos, a adopte sendo apoiada pelo sr. ministro da fazenda. Não é um beneficio que solicitam, é uma restituição que pedem do que se lhes tirou ha dezoito annos. O monte pio é uma divida sagrada, porque proveio das quotas com que seus paes e maridos contribuiram para legarem a suas familias alguns meios de subsistencia. É um contrato celebrado entre o contribuinte e o estado, que lhe garantiu aquellas vantagens. Não podem estas serem cerceadas á vontade dos governos, sejam quaes forem as circumstancias em que nos achemos.

A nação deve satisfazer este encargo integral e pontualmente; porque do contrario infringe-se a lei, ataca-se a propriedade, e deixa-se viver na miseria quem tem direito de esperar de nós e do governo todo o apoio, e toda a protecção. Como já disse não mando para a mesa emenda alguma a este capitulo, porque n'este momento não poderia ser tomada em consideração, porém aguardo com anciedade o resultado da minha proposta, a qual eu confio plenamente terá a approvação desta camara pois ella toda e unanimemente sympathisa com uma causa tão justa.

Não digo mais nada para não protelar a importante discussão que nos occupa; estando certo que a camara ha de ter levado a bem que eu tomasse a defeza por uma classe desvalida que não pede senão justiça.

O sr. Visconde de Pindella: — Sr. presidente, vou mandar para a mesa uma proposta que estava a acabar de escrever, mas pouco mais ou menos n'este sentido — que no capitulo 5.° do ministerio da fazenda se diminuam todos os encargos, a fim de se pagarem por inteiro as prestações aos egressos, e se faça um abatimento de 5 por cento nos encargos das outras classes inactivas, isto é, que ellas venham a perceber mais 5 por cento do que actualmente recebem. É pouco mais ou menos isto e que eu digo para poder sustentar a minha proposta.

Já nesta sessão, isto é, ha poucos dias, tive a honra de chamar a attenção do nobre ministro da fazenda sobre este ponto, ao que s. ex.ª se dignou responder-me, mostrando muito boa vontade, e desejo mesmo, de que ainda n'esta sessão, e nesta occasião precisa, se fizesse alguma cousa a favor desta infeliz classe, e que para isto combinaria com os illustres membros da commissão de fazenda; mas, e ouça-se bem, que o logar proprio para sé attender a esta pretensão era no orçamento. Concordei com s. ex.ª, e tanto que respondendo o nobre ministro ao illustre deputado, o, sr. Ferreri, que já tinha dito que não era ali o logar proprio de tratar d'aquelle assumpto, eu apoiei o nobre ministro. O logar chegou, e eu estou tambem no meu logar; chegou a discussão do orçamento e portanto é esta a occasião propria de levantar a minha voz a favor de tão justa causa (apoiados), e della ser escutada.

Já o anno passado, por occasião da discussão do orçamento, eu e alguns meus illustres collegas, fizemos tambem uma proposta como esta, e n'este mesmo sentido, e alguma cousa, bem pouca cousa é verdade se conseguiu então, mas que nada produziu; nada, sr. presidente, pois que os egressos não têem tirado as vantagens que nós suppunhamos tirariam (O sr. Ministro da Fazenda: — É verdade, é). E sabe a camara por que? porque como se facilitaram as habilitações dos egressos e havendo muitos ainda que não estavam habilitados por falta de facilidade para as habilitações, seguiu-se que os que tem fallecido não dão as prestações d'estes para os entrados de novo, não é um computo tal das prestações que tem vago com o fallecimento dos egressos, superior áquelle dos novos que têem entrado. Não sei se me faço perceber (apoiados).

Eu peço as prestações por inteiro para os egressos, porque peço uma cousa justissima, e que é sua; é uma divida sagrada, é uma restituição, não é uma graça, um favor que venho pedir. Aqui, sr. presidente, a estas alturas, quando estes individuos estão no ultimo quartel da vida, não se pede um beneficio, uma melhora, porque seria insufficiente, pede-se o que se lhes prometteu dar, o que é uma vergonha se lhe não dê; peço a prestação por inteiro (apoiados).

Eu não quero fazer d'esta questão uma questão nova, quando ella é tão sabida e tão velha (e nisto é que vae a desgraça) porque estamos sempre com isto, e parece que só terá fim quando deixar de existir o ultimo egresso! Então a bom tempo! Então, s. presidente, que epitafio á negligencia dos nossos governos! (Apoiados.)

Eu não quero chamar para aqui o sentimentalismo, não quero. Todos nós sabemos que é uma classe que está na ultima, na terrivel quadra da vida, que está a tombar para o sepulchro, cheia de dores, e de mais ainda, de fome! (apoiados) De fome, sr. presidente, e que não vê mão amiga e generosa que lhe leve um lenitivo a tão grandes padecimentos. Disse, não quero chamar o sentimentalismo, quero pedir justiça e nada mais, quero que se lhes dê o que se lhes prometteu. Ha egressos que tem oitenta annos de annos de idade, que estão a morrer, e que talvez ou de certo para o anno tenham deixado de existir. Peço attenção para esta consideração: não devemos por fórma alguma consentir que homens tão respeitaveis acabem os seus dias na agonia, e na mais atroz de todas, na fome e na miseria! porque o que se lhes dá não chega para um homem novo, quanto mais para um homem no estado de velhice e doente, em que quasi todos se encontram (apoiados).

Ainda que o campo é magnifico não o quero explorar de modo que alguem possa imaginar que sou eu o unico que tenho estes sentimentos humanitarios, que assim me julgo, quando eu os reconheço no nobre ministro, nos illustres membros da commissão de fazenda e em toda a camara (apoiados); mas quero que se dê a prestação por inteiro aos egressos, que se attenda esta respeitavel classe, e a attender-se é agora, e já (apoiados). E já, sr. presidente, porque ámanhã é tarde para muitos. E que peso para o thesouro! Oh! sr. presidente, pois todos os dias não está a diminuir o numero? D'aqui a pouco quantos haverão? Espero que a illustre commissão, de combinação com o sr. ministro, fará justiça a esta classe, justiça inteira e de prompto que é o que eu peço (apoiados), e pede-o a humanidade e a justiça.

Emquanto ás outras classes inactivas, quero ver revogado esse fatal decreto de 1843, esse fatal decreto interino ha dezoito annos! Porque são igualmente dignas, porque têem igual justiça; peço para essa infeliz classe alguma cousa, e bem pouco peço; peço pouquissimo para que se me conceda, peço um abatimento de 5 por cento nos onus que sobre ella pesam, e que por outra receberão mais 5 por cento do que na actualidade: não é quasi nada, bem vejo, mas é para o poder obter, e porque tem todo o direito a isso. Sr. presidente, alem de se levar a consolação ao seio de uma familia, que quer viver honestamente e aonde hoje só habita a dor e o soffrimento, era até uma consideração para o exercito, era respeitar a memoria desses bravos officiaes que tiraram um dia de soldo para assegurar ás suas familias um futuro decente; tiraram de si para lhes legar, para deixar á sua esposa, á sua filha com que passar a resto da vida. E que se lhe dá, sr. presidente?

Que respondam ellas, essas mesmas viuvas e orphãs, todos os dias pelas escadas dessas secretarias (apoiados), ou nos corredores d'esta casa, mostrando-se assim, não a, nós, mas ao paiz todo. (Apoiados.) Isto corta o coração, isto não póde nem deve assim continuar; e até direi que não acho politico esta desconsideração (apoiados).

Portanto, proponho que aos egressos se lhes tirem todos os encargos e deducções, que vai o mesmo que se lhes pague as suas prestações por inteiro; e que emquanto ás outras classes inactivas, que se lhes abata 5 por cento sobre-os onus que sobre ellas carregam; isto é o que quero e o que peço aos illustres membros da commissão de fazenda que estão presentes e que me ouvem, que hajam de aceitar estas minhas propostas que são justas e santas. Não continuarei portanto a fazer mais algumas considerações sobre um assumpto que todos nós conhecemos; lembro sómente que d'aqui a dois dias deixarão de existir muitos para quem hoje peço justiça. Sr. presidente, o dia em que tal justiça se fizer, é um bello dia, honrará o parlamento portuguez, e eu espero que este dia ha de vir breve, que esse dia chegou (apoiados). Vou ler a minha proposta.

É a seguinte:

PROPOSTA

Proponho que no capitulo 5.° do orçamento do ministerio da fazenda, que se inscreve = classes inactivas =, se supprimam todas as deducções e encargos que pelas leis actuaes pesem sobre as prestações dos egressos, e que se faça um augmento de 5 por cento a favor das outras classes inactivas. = Visconde de Pindella = Ferreira de Mello = Barão da Torre.

O sr. Ministro da Fazenda: — É para pedir aos srs. deputados, que têem mandado moções para a mesa, que conviessem em que o orçamento fosse discutido sem prejuizo d'essas moções (apoiados); porque vão á commissão do orçamento para as examinar e dar sobre ellas o seu parecer.

O sr. Chamiço: — A occasião é opportuna para eu mandar para a mesa uma representação que me foi entregue ha dias n'esta casa, dirigida a v. ex.ª e á camara, assignada por tres egressos, um de oitenta e tres annos, outro de setenta e dois e outro de sessenta e seis, como representantes da sua classe nesta capital, e pedindo que se attenda a que o acto de justiça que o parlamento quiz applicar--lhes pela carta de lei de 11 de agosto de 1860 nenhum effeito tem tido até hoje, pois que os egressos de consideração especial de pagamento continuam percebendo apenas os 10$800 réis por mez que antes tinham.

Quando o parlamento na penultima sessão votava quasi por acclamação esta lei, mal suppunha que votava em vão,

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porque a justiça que queria fazer, infelizmente não procedeu: as vacaturas que se deram por fallecimento de alguns egressos deixaram um acrescimo de receita de obra de 2:000$000 réis, que mal têem chegado para applicar ao pagamento de novos egressos que, em virtude d'aquella lei, têem vindo habilitar-se para a prestação.

É dolorosa, sr. presidente, a posição do deputado que deseja contribuir para apagar os vestigios das nossas discordias passadas, e reparar embora parcialmente as injustiças que aquellas discordias produziram! Ergue-se constantemente diante d'elle a penuria do thesouro e a escassez dos recursos do estado. Porém no caso presente creio que, dando-se as mãos o governo e as camaras, não será difficil achar meio de satisfazer ao que está na vontade de todos (apoiados), e fazer com que os poucos egressos a quem devia aproveitar a lei a que já me referi, tenham antes de descer ao tumulo o beneficio do pequeno augmento na sua prestação.

Não tenho agora presentes os dados officiaes que me habilitem a dizer á camara qual é exactamente o numero de individuos a quem aproveitará a disposição citada; mas creio que não excedem a cincoenta, e sendo assim o encargo annual de menos de 800$000 réis, infelizmente no caso de ser gradualmente reduzido pela mortalidade, não aggravará as circumstancias apoucadas do thesouro.

Se não podemos pagar desde já a divida em que estamos com algumas das classes inactivas, e especialmente com os pensionistas do monte pio, que herdaram aquillo que o thesouro indevidamente lhes cerceia; se não podemos melhorar a sorte mesquinha da classe geral dos egressos que foram expulsos do seu patrimonio, haja pelo menos consideração pelo meio cento de venerandos necessitados que já não podem saír de casa, talvez, para ganharem a triste esmola da missa diaria, e accudamos, emquanto é tempo, a diminuir as privações de alguns que, porventura entrevados, vêem approximar-se os seus ultimos dias, ouvindo-nos clamar por justiça, sem que até agora se lhes tenha feito (apoiados).

Não faço mais reflexões, e mando para a mesa a representação, para que seja remettida tambem á commissão de fazenda.

Posto á votação o capitulo 5.º, foi approvado.

O sr. Presidente: — A proposta do sr. deputado visconde de Pindella vae ser remettida á commissão de fazenda.

O sr. Pequito (para um requerimento): — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer prorogar a sessão até se votar o orçamento do ministerio da fazenda.

Consultada a camara decidiu afirmativamente.

Capitulo 6.°— approvado sem discussão.

Capitulo 7.°

O sr. Mártens Ferrão: — Pedi a palavra para fazer algumas reflexões a respeito de um ponto a que alludi, quando discuti a resposta ao discurso do throno. Respondendo ao sr. ministro da marinha, disse eu que mal podia s. ex.ª censurar a organisação de novos serviços com a creação de funccionarios especiaes, quando pela ultima reforma das repartições de fazenda se havia augmentado consideravelmente o quadro dos empregados, e não censurava eu por isso o sr. ministro da fazenda, porque me queria persuadir que s. ex. teria attendido ás necessidades do serviço. O nobre ministro da fazenda interpretando diversamente as minhas palavras quiz sustentar que deminuira o numero dos empregados em cincoenta e quatro; e que se aquella reforma fosse feita pelo seu antecessor, Deus sabe como seria feita! Devo levantar uma e outra asserção, uma não me parece exacta, a outra não de certo justa. Pela lei de 11 de agosto de 1860 foi o governo auctorisado a reformar as repartições de fazenda, podendo augmentar a despeza até 30:000$000 réis sobre toda a que por aquelle ministerio se faria com aquelle serviço.

Sendo a reforma feita pelo sr. ministro, encontro consumida toda aquella verba de 30:000$000 réis, menos 180$000 réis, e por consequencia encontro consideravelmente augmentado o pessoal. Creio que se quiz considerar como correspondendo a um empregado cada serão; mas effectivamente essa apreciação não póde julgar-se exacta; basta a consideração de que esses serões, que não são só do tempo da administração passada, mas de todas as administrações, conforme as urgências do serviço, não eram sempre uniformes, não se fariam sempre, para se ver que não é possivel contar cada serão como um empregado, e que por isso o augmento dos quadros foi consideravel, em vez de haver a diminuição de cincoenta e quatro empregados.

Eu tinha ficado debaixo de uma impressão desagradavel, e entendi agora dever levantar aquellas expressões do nobre ministro e dizer á camara, que vejo effectivamente um augmento de pessoal nas duas repartições da fazenda e thesouro. E permitta-se-me que eu faça n'este logar uma simples referencia. A camara que entende que o sr. ministro da fazenda é, e eu acredito igualmente que é, um cavalheiro economico nos negocios que dependem da sua repartição, reconhecerá quanto foram bem calculadas pelo sr. Casal Ribeiro as necessidades do serviço n'aquellas repartições. (O sr. Ministro da Fazenda: — Apoiado.) E quanto foi immerecida por consequencia a asserção do sr. ministro da fazenda quando disse = que não sabia como essa reforma teria sido feita se o ministerio passado a realisasse =. Veja a camara que, com um ministro economico, n'uma situação que quer fazer alarde de fazer economias, e ha de fazer tantas como qualquer outra situação, porque esse desejo anima a todos os homens publicos, mas ha uma grande difficuldade em fazer essas grandes economias que ordinariamente se apregoam como programmas, mas que não se realisam, porque ha pouco em que; veja a camara, digo, que a despeza com a organisação do ministerio da fazenda foi aquella que tinha sido calculada pelo sr. Casal Ribeiro, menos apenas 180$000 réis!

O sr. ministro da fazenda de certo não notará que eu levante aqui qualquer asserção que possa ir ferir aquelle meu collega (O sr. Ministro da Fazenda: — Apoiado.) de quem me prezo de ser amigo desde muitos annos, e que não estando n'esta casa tem direito de esperar que aquelles que o acompanharam nos trabalhos da administração publica, defendam as suas medidas e levantem qualquer insinuação que possa parecer que lhe é menos favoravel. (O sr. Ministro da Fazenda: — Apoiado.)

Eu podia n'este logar dizer alguma cousa a respeito da organisação do ministerio da fazenda e do thesouro; mas não entrarei n'essa questão. Discordo em muitos pontos d'aquella organisação; e discordo em pontos que para mim são de doutrina, porque eu desejaria ver uniformisada a organisação das differentes secretarias, e que a respeito d'esta se tivesse estabelecido a mesma doutrina que já se acha consignada a respeito de outras; declarando quaes são as causas de demissões e dando-se assim garantias aos empregados. E note v. ex.ª que este não é um principio novo, porque está ella consignado na legislação belga e na legislação do Brazil.

Discordo pois n'este ponto da organisação, e mesmo quanto á base das habilitações. Eu desejaria que se exigissem mais habilitações para os logares superiores daquella repartição do que aquellas que effectivamente ali se exigem (apoiados). Note s. ex.ª que temos um grande numero de homens com habilitações superiores, que podem muito melhor servir o paiz do que aquelles que as não têem, e é necessario que as leis lhes garantam a sua collocação primeiro de que aos outros.

Igualmente noto que quando nas reformas das outras secretarias, feitas durante a administração transacta, se estabeleceu um systema regular de concursos com provas de capacidade, este ponto essencial para a boa escolha de funccionarios fosse posto de parte, consignando-se o velho principio, que não dá garantias ao merito, e que abre a porta ao arbitrio.

Não discuto agora estes pontos, porque nos levaria a uma discussão um pouco mais larga do que aquella que hoje desejo seguir. Quiz sómente registar a minha opinião a este respeito, e quiz tambem notar que não houve economia real de individuos, que não houve economia na organisação, e que o sr. Casal Ribeiro tinha calculado perfeitamente a despeza que era necessaria para a organisação dos novos serviços. Quiz notar finalmente que na lei de 10 de agosto de 1860 se acham as bases fundamentaes que estão desenvolvidas no regulamento, e era facil a um homem publico illustrado, como o sr. ministro da fazenda, conhecer á vista d'essas bases qual seria a applicação que o seu antecessor teria feito da auctorisação, se porventura fosse elle o encarregado de a executar!

Feita esta declaração e registada a minha opinião quanto á organisação d'aquella repartição, não tenho mais nada a dizer sobre o objecto, porque não desejo demorar o debate.

O sr. Ministro da Fazenda: — Eu folguei muito de ouvir o nobre deputado, e se a discussão da resposta ao discurso da corôa tivesse corrido tão placidamente (e n'isto não ha censura da minha parte a pessoa alguma), quanto esta discussão vae correndo e espero que continue, nem eu havia de suppor que da parte do illustre deputado havia censura nas observações que s. ex.ª tinha feito com relação á organisação da administração da fazenda, nem algumas expressões que eu tivesse pronunciado tambem seriam consideradas como censuras por s. ex.ª Estimo muito que s. ex.ª declare que não teve intenção alguma no que disse de me censurar, e pela minha parte declaro tambem que não tive a menor idéa de censurar o sr. Casal Ribeiro, não só porque não está aqui, mas tambem porque me parece que tenho dado demonstrações bem solemnes e bem publicas da alta consideração em que tenho aquelle cavalheiro.

É exacto o que disse o nobre deputado; na lei de 10 de agosto de 1860 estão as bases da reforma, e isso é que a justifica, porque eu não estava auctorisado para a fazer senão sobre aquellas bases, e eu capricho sempre em cumprir as auctorisações que o parlamento me dá sem as exceder. O illustre deputado não quiz entrar no exame de algumas das disposições da reforma, e quando s. ex.ª quizer tratar mais desenvolvidamente d'esse assumpto eu tambem terei a satisfação de dizer a s. ex.ª os motivos por que essas disposições foram adoptadas. Mas em relação ao pessoal, s. ex.ª comprehende bem o que eu quiz dizer. Para o parlamento não digo que seja indifferente o numero de empregados da reforma; mas o objecto principal para o parlamento era a despeza. S. ex.ª conveio em que não excedi a despeza. Declarou que o sr. Casal Ribeiro a tinha calculado bem, a ponto de que eu, desenvolvendo a reforma para que elle lançara as bases, fizera a mesma despeza. Estamos completamente de accordo; mas eu entendo, em todo o caso, que é um mau expediente o trabalho dos serões, e por isso os supprimi (apoiados). O empregado que trabalha seis horas, como tem obrigação de trabalhar na sua repartição, não está geralmente nas circumstancias de voltar á noite para fazer um trabalho que mereça a gratificação que se lhe dá. Por consequencia para o facto da despeza os serões equivaliam a novos empregados. O que posso affirmar á camara é que o serviço ha effectivamente melhorado, e que se acaso for preciso fazer-se algum trabalho extraordinario no thesouro que obrigue os empregados a fazer mais uma hora de serviço por dia estou certo de que esse trabalho se ha de fazer; porque nenhum empregado se recusa, quando vê que o governo o considera e retribue condignamente (apoiados); e n'este sentido tenho feito e hei de continuar a fazer tudo quanto poder, convencido como estou de que não ha serviço nenhum tão caro como aquelle que parece barato (apoiados).

Não continuo. Quando o illustre deputado quizer voltar mais largamente a este assumpto, encontrar-me-ha prompto para dar as explicações que precisas forem. O que eu desejo sobretudo é que fique comprehendendo que eu nem por sombras quiz censurar um cavalheiro a quem me prezo de prestar a mais completa justiça.

O sr. Bivar: — Não entro na questão do pessoal da reforma do thesouro, vou apenas dirigir uma pergunta ao nobre ministro da fazenda; pergunta que me suscitou a leitura do artigo 63.° do decreto de 3 de novembro de 1860, publicado em execução da carta de lei de 11 de agosto do mesmo anno. Tem apparecido por varias vezes no parlamento e fóra d'elle queixas ácerca do modo demorado e irregular por que a expedição dos negocios correm na secretaria da fazenda e thesouro publico, e tanto isto é assim, que no artigo 63.° do citado decreto diz-se o seguinte:

«O official maior da secretaria d'estado e os directores geraes do thesouro, reunidos em conferencia e consultando os chefes de repartição e os empregados que julgarem conveniente, proporão sem perda de tempo os methodos que, por sua simplificação, possam produzir o mais rapido andamento dos negocios sem prejuizo da regularidade do serviço.»

Ora, eu desejava que s. ex.ª me dissesse qual é o modo por que se tem cumprido esta disposição do regulamento. Se os methodos actuaes do serviço não são bons, como entendo que não são, e do mesmo artigo 63.° se deprehende, parecia-me que a realisação da idéa ou disposição que n'este artigo vem consignada devia ser de grande vantagem, pelo que se ganharia no andamento dos negocios publicos, simplificando o methodo da sua expedição, e talvez que essa simplificação do methodo no andamento d'elles tornasse desnecessario o provimento de logares quando vagassem ou a creação de novos. Na minha opinião teria sido muito melhor mandar organisar os methodos simples da expedição dos negocios antes de se fazer a reforma, do que faze-la e mandar depois organisar esses methodos. Entretanto não se fez isso, seguiu-se outro caminho, e eu agora o que desejo é perguntar a s. ex.ª que cumprimento tem dado ao artigo 63.º do decreto de 3 de novembro de 1860. Desejo-o saber, porque entendo que é sempre de grande importancia o simplificarem-se os methodos do serviço publico, visto que quanto mais simples elles forem, mas rapido andamento terão os negocios nas secretarias, e com isso ganharão tanto os particulares como o estado.

O sr. Ministro da Fazenda: — Estou completamente de accordo com o illustre deputado quanto á necessidade e utilidade que ha em simplificar os methodos da exposição dos negocios publicos, e foi para obter essa simplificação que no decreto vem o artigo a que o illustre deputado se referiu, e que lhe affirmo que não ha de ficar em letra morta.

O sr. Antonio de Serpa: — Eu pouco tenho que dizer depois das explicações que acaba de dar o sr. ministro da fazenda relativamente á expressão que lhe ouvi quando disse, n'uma das sessões passadas = que se a reforma fosse feita pelo ministerio passado, Deus sabe o que se teria feito =. S. ex.ª deu todas as explicações, e eu não tenho nada a acrescentar.

Mas não posso deixar de dizer com toda a franqueza, que sinto que o sr. ministro da fazenda usando da auctorisação para fazer a reforma a fizesse como a fez; sinto que s. ex.ª não seguisse em muitos pontos as regras que foram adoptadas nas reformas das outras secretarias, contra as quaes se gritou tanto (apoiados), acontecendo que n'esta o novo pessoal é superior em numero ao pessoal de todas as outras reformas; e invocaria o testemunho de alguns dos collegas do sr. ministro da fazenda, que sinto não estejam presentes, para me dizerem e á camara as vantagens que elles tiraram das reformas que acharam feitas nas secretarias pelo ministerio passado (apoiados). Sinto que não esteja presente sobretudo o sr. ministro das obras publicas, para que elle informasse a camara ácerca do pessoal introduzido na secretaria das obras publicas (apoiados). Eu sinto que o sr. ministro da fazenda, na reforma que fez, desprezasse dois principios tantas e tão repetidas vezes proclamado e reclamado n'esta casa, e que foram introduzidos nas reformas das secretarias feitas pela administração transacta: s. ex.ª não adoptou na reforma para a organisação do thesouro publico estes dois impreteriveis principios que são: habilitações e concurso (apoiados).

O sr. Ministro da Fazenda: — Peço a palavra.

O Orador: — S. ex.ª, sinto dize-lo, n'estas questões de progresso economico parece que é necessario instiga-lo (apoiados)! S. ex.ª devia tirar grandes vantagens se na reforma que fez tivesse estabelecido e adoptado estes dois principios — habilitações e concurso. Pois para os empregos tão importantes do thesouro publico exige-se apenas principios elementares de arithmetica? Isto é crivel?

O principio de concurso para os officiaes já estava estabelecido no ministerio das obras publicas: já lá encontrei os beneficos resultados que d'elle se tiram, e o sr. ministro mesmo póde dar testemunho da habilidade de alguns destes empregados.

A escolha dos officiaes de secretaria e as habilitações das pessoas que para ali são admittidas são cousas muito importantes, porque os ministros, por mais intelligencia, erudição e vontade que tenham, não podem preparar os trabalhos todos, que hão de ser apresentados ao parlamento, se não tiverem ao seu lado pessoas habilitadas e illustradas que os coadjuvem. Na secretaria da justiça, antes da reforma, havia empregados muito probos, muito honestos e muito intelligentes; mas acontecia que eram poucos os que eram jurisperitos, e muito poucos os que tinham conhecimento pra-

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tico da lingua latina. Como era possivel que na secretaria da justiça e dos ecclesiasticos os trabalhos corressem com toda a perfeição e regularidade, quando ahi eram poucos, ou eram a excepção, os empregados que sabiam a sciencia de direito, e que tinham o conhecimento pratico da lingua latina? Estes inconvenientes foram remediados na reforma feita pela administração passada.

Portanto, eu sinto que o sr. ministro, desprezando estes precedentes, não admittisse o principio das habilitações e o principio do concurso.

O sr. Ministro da Fazenda: — Sr. presidente, eu desejava muito que esta discussão continuasse tão plácida como começou, e não hei de ser eu que hei empregar a menor expressão que a possa azedar, apesar do sr. Serpa dizer = que é necessario que me piquem para eu entrar no caminho do progresso. =

O sr. Serpa: — Não disse isso.

Vozes: — Foi instigar.

O Orador: — É o mesmo. Deixo a apreciação d'esta asserção á camara e mesmo á consciencia do illustre deputado (apoiados).

Direi só — que n'este assumpto ninguem tem ido adiante de mim; comprehendendo o illustre deputado.

O sr. Serpa: — Isto é incrivel!

O Orador: — Pois que fez o illustre deputado, por exemplo, na reforma das pautas? Nomeou uma commissão e desprezou um trabalho que eu tinha apresentado, e que foi muito elogiado lá fóra. Mas não entremos n'este campo.

O sr. Serpa: — V. ex.ª chama-me a elle, vamos a elle.

O Orador: — O illustre deputado é que me chama a elle.

O illustre deputado disse tambem = que na minha reforma eu desprezei dois principios, o do concurso e o das habilitações. = O illustre deputado leu com attenção a minha reforma? Pois lá está o principio do concurso expressamente; lá está, quando se diz = que se na classe inferior não houver individuos habilitados para a classe superior, podem concorrer individuos de fóra =. Lá está este principio. Lá está o principio = de que os empregados das repartições de fazenda e os escrivães de fazenda são candidatos aos logares do thesouro, e concorrem com os empregados do thesouro =. Não será isto concurso? E em consequencia d'esta disposição da ultima reforma, que é um dos seus grandes melhoramentos, dois empregados das repartições de fazenda do districto de Lisboa, e que eram primeiros officiaes da mesma repartição, passaram a segundo officiaes do thesouro, e um d'elles está nomeado inspector de contribuições e o outro delegado do thesouro.

Bastava que se tivesse banido para as promoções o principio da antiguidade, para se não poder dizer que a reforma excluia o principio do concurso.

Eu até dividi os concelhos em primeira, segunda e terceira classe. O escrivão de fazenda de terceira classe passa para a segunda, se o merecer, os de segunda passam para a primeira, e os de primeira são concorrentes aos logares de segundo officiaes do thesouro.

Leia pois o illustre deputado a minha reforma, e verá que lá estão os principios que o illustre deputado quer. Eu fui dos primeiros ministros da fazenda que estabeleci o concurso na reforma de 10 de novembro de 1849, e lá estão tambem designadas as habilitações, sem as quaes ninguem poderia entrar nas repartições superiores da fazenda publica.

Não digo mais nada. Peço ao nobre deputado a que me habilite, e eu farei tambem o mesmo pela minha parte, a que continuemos n'esta discussão, sem estas recriminações de que não tirâmos nenhum partido, e o paiz ainda menos (apoiados).

O sr. Sá Nogueira: — Eu não quero demorar a discussão, e por isso direi só duas palavras.

Eu pedi a palavra quando o nobre deputado por Moimenta da Beira disse = que seria conveniente que este ministerio tivesse seguido os dois principios adoptados pela administração transacta, referindo-se ás habilitações e aos concursos =. Eu não queria deixar passar esta opinião do sr. deputado sem algumas reflexões.

Em primeiro logar, emquanto a certas habilitações, talvez s. ex.ª mesmo meditando n'ellas as não approve.

Entre nós reputa-se que um homem está habilitado para tudo sendo bacharel formado em direito. Estamos ainda com muitas idéas antigas.

Outra cousa contra que eu me insurjo é contra os chamados concursos. A primeira vista parecerá que não quero concursos, mas o que eu não quero é fantasmagoria de concursos. O que têem sido os concursos? E apparecerem uns poucos de individuos, apresentarem certos documentos, e depois?.. Ss. ex.ªs sabem bem o que fizeram (varios srs. deputados pedem a palavra). Antes dos ministros tomarem, uma deliberação a respeito dos taes chamados concursos, já cá fóra se sabia quem eram os que haviam de ter a preferencia. Isto era uma sofismação do systema dos concursos, e isto o que eu não queria, é necessario seguir outro systema.

Eu sei que nem para todas as carreiras se póde estabelecer o mesmo, mas para algumas póde-se estabelecer, por exemplo, isto = Um individuo sabe contar? Faça uma conta. = Sabe francez? Traduza. = Sabe mathematica? Faça um calculo. = Sabe escripturação mercantil? Faça uma conta de partidas dobradas. = Isto é que se chama concurso (apoiados).

O sr. Antonio de Serpa: — Assim se fez.

O Orador: — Não se fez assim.

O sr. Antonio de Serpa: — Isso é inexacto.

O Orador: — Em grande parte não se fez assim.

O sr. Antonio de Serpa: — Em nenhuma.

O Orador: — Os concorrentes apresentaram os seus documentos, e depois esses documentos foram avaliados como se quiz.

O sr. Antonio de Serpa: — Isso é completamente falso.

O Orador: — Não é falso.

O sr. Antonio de Serpa: — É falsissimo, e provoco s. ex.ª para apresentar as provas do que diz.

O Orador: — O illustre deputado bem vê que se eu for a apresentar provas (e uma podia eu apresentar de prompto), isso ia entender com pessoas, era trazer para aqui questões de pessoas, mas isto que digo são verdades.

O sr. Antonio de Serpa: — É uma falsidade.

O Orador: — Ha um individuo muito habilitado, dos mais habilitados para ser empregado na secretaria do reino, e aqui está um sr. deputado, que então era ministro do reino, que poderá dizer se quizer se assim é ou não; esse individuo foi convidado pelo proprio sr. ministro do reino para ir ao tal chamado concurso, promettendo-lho o logar, e depois, entrou para lá outro menos habilitado. (O sr. Fontes: — Eu peço a palavra.) É isto verdade ou não? Talvez s. ex.ª se esquecesse.

O sr. Fontes: — Eu tenho a palavra, e a camara não ha de encerrar o debate sem me deixar explicar.

O Orador: — Não quero nomear o individuo, porque não quero fazer questões de pessoas.

O sr. Fontes: — Póde nomear, eu responderei.

O Orador: — Assim se têem feito muitos dos concursos entre nós, e eu não posso approvar taes concursos. Eu quero concursos reaes, que signifiquem alguma cousa, e não concursos d'estes, em que fica ao arbitrio do ministro fazer o que quer.

O sr. Antonio de Serpa: — Não sou eu que azede o debate. Se eu disse algumas palavras ácerca do modo como penso a respeito das reformas feitas pelo sr. ministro da fazenda, isto não é recriminar; recriminar não é tratar dos actos do governo; recriminar é da parte do governo defender-se com os actos dos seus antecessores. Pois não estamos nós aqui para julgar o governo pelos seus actos? S. ex.ª fez uma reforma na sua secretaria, e é d'este objecto que se está tratando aqui. Pois estou eu porventura fazendo recriminações, porque digo as rasões, em virtude das quaes entendo que s. ex.ª não fez a reforma como na minha opinião devia faze-la?!

S. ex.ª disse = que lá estava no decreto de reforma o principio dos concursos, porque ahi se dizia que os escrivães de fazenda seriam admittidos a concorrer para os logares de officiaes do thesouro. São esses os taes concursos de que um illustre deputado acaba de fazer a historia, historia falsa emquanto á epocha a que quiz applica-la, mas verdadeira no systema de concursos do sr. ministro da fazenda. Esses escrivães concorrem, e depois o ministro escolhe quem quer, e se o sr. ministro da fazenda póde escolher bem, outros virão que podem escolher mal.

O sr. Ministro da Fazenda: — Pois quem ha de escolher senão o ministro?!

O Orador: — Mas isso não é escolha, é arbitrio. N'essa reforma quaes são as habilitações que se exigem? O que se chama concurso é o concurso que está estabelecido com regras certas e com habilitações determinadas, como na reforma das secretarias feita pelo ministerio passado. Se ha concurso, quando se diz que concorrem e se para concorrer se não exigem habilitações nem exame, o concurso é o pleno arbitrio. Emquanto ao que acaba de dizer o illustre deputado, eu não faço senão dizer á camara que tudo quanto s. ex.ª disse a respeito do que se fez nos concursos para logares das secretarias no tempo do ministerio passado é completamente falso.

O sr. Sá Nogueira: — É verdade (riso).

O Orador: — E não venha dizer-se que não se apresentam as provas, para não se fazer questão de pessoas, porque a questão não é de pessoas, é necessario provar que aquelles concursos que se fizeram foram os taes concursos documentaes, em que podia succeder o que disse o illustre deputado.

O que se passa nos concursos das secretarias é exactamente o que o illustre deputado diz que devia ser, e o contrario do que suppõe que é. Quando se exige a habilitação do conhecimento pratico de uma lingua, francez e inglez, por exemplo, ou arithmetica ou escripturação commercial, fazem os concorrentes exame pratico d'estas materias, e um jury habilitado classifica-os segundo as provas do seu merito. E na secretaria do reino, a que alludiu o illustre deputado, os concursos têem marcadas habilitações na reforma que se fez, e os concursos que ali tiveram logar, consistiram em exames, que são as provas publicas de capacidade, que são os verdadeiros concursos, e não os concursos documentaes, como inexactamente affirmou o illustre deputado.

Algumas vezes quando se fazem reformas tem-se adoptado o proverem-se os logares superiores sem concurso; mas póde alguem aqui dizer que os homens que foram escolhidos para os ministerios, em que teve logar a reforma e cuja nomeação se fez portanto sem concurso, não eram dos mais habilitados, dos mais cheios de distracções academicas, e que esses homens não foram escolhidos sem attenção a côres politicas? Posso dizer ao illustre deputado, que na secretaria das obras publicas os homens que eu despachei para os logares superiores que tive de dar sem concurso foram homens de todos os partidos (apoiados); um d'elles até tinha sido redactor de um jornal da opposição; mas como eu sabia que no paiz não havia ninguem, que eu conhecesse com habilitações para a especialidade a que o destinava, por ser um ramo novo de serviço publico, e como eu sabia que aquelle individuo, escriptor distincto, tinha ido a paizes estrangeiros estudar essa especialidade, foi esse que eu despachei.

É pois completamente inexacto o que disse o illustre deputado: os concursos estabelecidos pelas reformas das secretarias são os verdadeiros concursos, e não aquelles que diz ter estabelecido o sr. ministro da fazenda. E mesmo quando o illustre deputado que me precedeu podesse provar que não tinham sido escolhidos em qualquer tempo os concorrentes com aquella imparcialidade com que na realidade o foram, o principio salutar e liberal lá estava marcado, e foi esse principio que desprezou o sr. ministro da fazenda.

Concluo, porque não é minha intenção prolongar o debate, nem embaraçar, nem teria dito tanto, se não fosse a provocação do illustre deputado por Abrantes, que veio aqui apresentar factos completamente inexactos.

Mas agora a maneira de não incorrer em censuras destas é clara e obvia; já todos a sabem; e é fazer o que o sr. ministro da fazenda fez na sua reforma. Diz que podem ser concorrentes com os empregados subalternos os escrivães de fazenda ou quaesquer outros, mas quando vaga um logar nomeia quem quer, e provavelmente nomeia bem; mas se nomear mal, não ha que dizer, porque não ha concurso, não ha habilitações determinadas, e não ha provas exigidas; mas assim quaesquer governos podem exercer um patronato escandaloso (apoiados).

Não digo mais nada.

O sr. Fontes Pereira de Mello: — Eu não tenho tomado parte n'este debate por não querer prolonga-lo, comtudo se a maioria da camara deseja gastar tempo, que eu queria poupar, não me recuso a entrar n'elle.

Estive calado pelo serviço da causa publica (apoiados); mas tenho agora necessidade de dar algumas explicações á camara em consequencia das accusações que o illustre deputado acaba de dirigir á administração de que fiz parte; o que na verdade não estranho da parte de s. ex.ª Não posso deixar de aceitar a luva que me lançam.

Se ha injustiça, se ha questão sem fundamento algum, nem o mais remoto, para me aggredir ou aos homens que comigo se sentaram naquellas cadeiras (as do ministerio), é a que o illustre deputado apresentou.

Eu fiz uma reforma na repartição a meu cargo, auctorisado por uma lei. Tinha em virtude d'ella de nomear uns poucos de empregados. O primeiro, um director geral que não era sujeito a concurso, nomeei-o sem concurso...

O sr. Sá Nogueira: — Ahi está o primeiro.

O Orador: — Pois o nobre deputado pensa que todos os empregados que se nomeiam são providos em concurso? Se a lei o não determinava para aquelle logar, e, pelo contrario, determinava positivamente que o não houvesse, queria que eu mandasse abrir o concurso para elle, em manifesta opposição com a lei! Permitta-me s. ex.ª que lhe diga — esta sua opinião é uma opinião cerebrina.

Mas o que aconteceu a respeito dos segundos officiaes e amanuenses? Estabeleci um concurso como ha muitos annos não se havia estabelecido em Portugal (muitos apoiados), porque alem do concurso documental, fiz um concurso de provas praticas, constituindo um jury especial para apresentar ao governo a sua opinião sobre quaes os candidatos que melhores as tinham dado. Para os segundos officiaes até exigia o conhecimento da legislação. Para os amanuenses exigia a perfeição na caligraphia, na orthographia e na grammatica, porque mais não era preciso exigir, sobretudo depois de adoptado por mim o systema de não poderem elles subir a outros logares sem concorrerem novamente.

E quando isto se fez, quando na folha official se publicou o programma para o concurso, quando se procedeu a exame na presença de um jury especial, quando eu não nomeei senão os primeiros candidatos indicados por esse jury, sem alterar um só, podem fazer-se accusações no sentido de haver individuos que tenham sido preteridos? Pois o jury qualificou (o jury não era eu, eram os directores geraes) os concorrentes como entendeu que devia qualifica-los, o ministro que então estava á testa d'essa repartição, nomeou os primeiros qualificados, sem discrepancia de um unico, e vem aqui dizer-se = que por occasião da reforma do ministerio do reino foram preteridos homens de grande merecimento por outros que pouco merecimento tinham!

Quem isto avança, quem altera assim os factos, como o illustre deputado o fez de uma maneira impropria de s. ex.ª, desconhece-os completamente.

O sr. Ferreira Pontes: — Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara se a materia está sufficientemente discutida.

Julgou-se discutida, e pondo-se logo á votação o

Capitulo 7.° — foi approvado.

Capitulo 8.°

O sr. Bivar: — Pela lei que auctorisou o governo a reformar as diversas repartições de fazenda e a gastar até á quantia de 30:000$000 réis n'estas reformas, julgo que se estabeleceu a nomeação de inspectores de contribuições. Parece-me que estes inspectores já foram nomeados pelo governo, e tanto que vem consignado pela commissão no parecer qual o ordenado que devem perceber. Desejo saber de s. ex.ª o sr. ministro da fazenda, se estes inspectores têem ido para os seus logares, e se não têem, qual o motivo.

Estes empregados estão nomeados, e por conseguinte elles têem obrigação de ir desempenhar o logar para que foram nomeados (apoiados). Desejo pois que o sr. ministro da fazenda me diga se estes empregados têem ido para os seus logares, e se não têem qual a rasão por que n'esta parte não têem sido obrigados a ir desempenhar as funcções para que foram nomeados.

O sr. Ministro da Fazenda: — Em resposta ao illustre deputado direi, que eu tenho nomeado os inspectores de contribuições, e procurei que a escolha recaisse em empregados dos mais habilitados e dignos, porque estas funcções são importantes, e é necessario que os empregados nomeados para estes logares sejam dos melhores e dos mais habilitados (apoiados), porque de contrario, não serve de nada lá manda-los; e entendo que uma das melhores disposições da nova reforma é esta creação (apoiados).

Mas aconteceu que alguns não aceitaram as suas nomea-

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ções, e uns com motivos fundados e outros sem elles; e já empreguei mesmo a respeito de um dos nomeados que não quiz ir para o seu logar uma medida bastante severa e que muito me custou, porque é um bom empregado, mas não tive remedio senão faze-lo.

Hoje posso asseverar ao illustre deputado, que estão em exercicio a maior parte dos inspectores, e aquelles que não estão, não é por falta de diligencia que eu tenha empregado, mas porque não é facil nomear empregados tão habilitados como seria para desejar para estas funcções. Não ha portanto obstaculo nenhum da parte do governo para que se execute a lei n'esta parte.

O sr. Bivar: — Não desejo prolongar o debate; mas tendo noticia de que estes empregados, cujas funcções nós reconhecemos de importancia, não se achavam ainda nos districtos, e estando-se pondo em execução as novas medidas de contribuições, julguei que era de grande vantagem que estes empregados fossem occupar os pontos que lhes estão marcados, para desempenharem as funcções que lhes foram commettidas. O sr. ministro da fazenda já disse que alguns se acham já collocados, e exercendo as suas funcções, e que outros, que haviam sido nomeados para estes logares, não tinham aceitado essa nomeação. Eu achava que sendo de urgencia que esses empregados fossem para os seus logares, o sr. ministro devia fazer com que os nomeados partissem immediatamente a occupa-los, e quando não quizessem aceitar, ou não quizessem ir, s. ex.ª os demittisse dos logares para que haviam sido nomeados, porque me parece que nós não estamos tão pobres de empregados, que quando tres ou quatro homens dizem que não aceitam um logar para que foram nomeados, não haja outros para os substituir. Eu quero fazer justiça aos nossos empregados, e estou persuadido de que ha de haver muitos empregados competentes, e muito habilitados para irem desempenhar aquelles logares (apoiados). Mas fizeram-se as nomeações, reconhece-se a necessidade de que estes empregados vão; se não vão o sr. ministro demitte-os d'aquelles logares, e nomeia outros. Parece-me que era a providencia adequada, para que o serviço publico não padeça. Não serei eu que estimule o sr. ministro a que demitta a torto e a direito; porém quando os empregados não querem cumprir o seu dever, o que ha á fazer é ir buscar outros.

E pondo-se logo á votação o

Capitulo 8.° — Foi approvado.

Capitulo 9.°

O sr. Sá Nogueira: — Sr. presidente, eu tambem não quero demorar o debate, e por isso reservo-me para quando se tratar dos ministerios especiaes em que as reformas tiveram logar, para então dizer mais alguma cousa. Por agora contento-me com as confissões que fizeram os illustres deputados de que, quando ministros, tinham nomeado individuos sem concurso, porque a final sempre disseram isto...

Vozes: — Isso já está discutido.

O Orador: — São só duas palavras.

O sr. Fontes disse que sendo ministro tinha nomeado sem concurso empregados superiores, porque a lei assim o determinava (apoiados).

Mas quem fez a lei?...

Vozes: — Foram as camaras.

O Orador: — Foi o sr. ministro que a propoz quando pediu a auctorisação que lhe deram para a reforma da secretaria.

O sr. Antonio de Serpa: — Peço a palavra.

O Orador: — Eu vou andando para diante.

Vozes: — Á questão, á questão.

O Orador: — Eu agora noto só isto, mesmo porque a hora está adiantada e não quero prolongar a discussão. Agora vamos á questão...

O sr. Pinto de Almeida: — Era o que devia ter feito, e não discutir uma cousa que já estava discutida.

O Orador: — Eu apresentei um projecto de lei que foi mandado á commissão de fazenda, pára que o tribunal de contas fosse composto do presidente e de seis conselheiros, porque esse numero é sufficiente para fazer o serviço do tribunal, uma vez que passe para os conselhos de districto a approvação dos orçamentos e exame das camaras municipaes e estabelecimentos de beneficencia...

Vozes: — Não ha numero.

Outras vozes: — Ha, ha.

O sr. Presidente: — O sr. deputado já acabou?

O Orador: — Não, senhor, é que não me deixam.

O que era regular, e o que eu tinha tenção de propôr, era que se adiasse o artigo 36.° d'este capitulo até que a commissão de fazenda desse o seu parecer sobre o projecto que eu apresentei e lhe foi enviado. Agora se a illustre commissão e o sr. ministro me dizem que hão de tomar esse projecto em consideração, e que elle não é prejudicado por qualquer resolução que n'esta occasião se tome, não faço d'isso questão.

O sr. Ministro da Fazenda: — O nobre deputado acabou precisamente como eu ía começar.

É evidente que, uma vez convertida em lei a proposta que está na commissão, vem a acabar a legislação actual; e a commissão não deixará de a tomar em consideração e de dar sobre ella o seu parecer.

Vozes: — Votos, votos.

Outra voz: — Não ha numero, não ha numero.

O sr. Secretario (Miguel Osorio) (contando quantos srs. deputados se acham na sala): — Estão presentes só 57 srs. deputados.

O sr. Presidente: — Não ha numero na sala. Vou dar a ordem do dia.

O sr. Ministro da Fazenda: — Mas eu peço licença para dizer que póde não haver numero para se votar, e no entretanto não me parece que por isso deixem de fallar os srs. deputados que estão inscriptos. Eu pediria que se acabasse a inscripção pelo menos, e na sessão seguinte se votaria.

Vozes: — Cedem todos da palavra.

O sr. Ministro da Fazenda: — Melhor. Isso então é outra cousa.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para segunda-feira é a mesma que está dada, e tambem os projectos n.ºs 20 e 21 sobre a creação de circulos de jurados nos julgados de Villa Nova de Portimão e Barca. Está levantada a sessão.

Eram quatro horas e tres quartos da tarde.

ORDEM DO DIA PARA 16 DE JULHO

A mesma que está dada.

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