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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SESSÃO EM 31 DE MAIO EM 1864

PRESIDENCIA. DO SR. CESARIO AUGUSTO DE AZEVEDO PEREIRA

Secretarios os srs.

Miguel Osorio Cabral

José de Menezes Toste

Chamada — Presentes 65 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — Os srs. Sá Nogueira, Quaresma, Gouveia Osorio, Seixas, A. Pinto de Magalhães, Mazziotti, Pinheiro Osorio, Magalhães Aguiar, Pinto de Albuquerque, A. de Serpa, Palmeirim, Bispo Eleito de Macau, Ferreri, Almeida Pessanha, Cesario, Claudio Nunes, Bivar, Barroso, Abranches Homem, Coelho do Amaral, Diogo de Sá, Gaspar Teixeira, Pereira de Carvalho e Abreu, Henrique de Castro, Medeiros, Blanc, Sant'Anna e Vasconcellos, J. A. de Sousa, J. J. de Azevedo, Nepomuceno de Macedo, Sepulveda Teixeira, Albuquerque Caldei-

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ra, Joaquim Cabral, Torres e Almeida, Matos Correia, Rodrigues Camara, Mello e Mendonça, J. Pinto de Magalhães, Faria Guimarães, Lobo d'Avila, José da Gama, Alves Chaves, Figueiredo Faria, Costa e Silva, Frasão, Alvares da Guerra, Rojão, Menezes Toste, José de Moraes, Gonçalves Correia, Oliveira Baptista, Julio do Carvalhal, Levy M. Jordão, Camara Leme, Martins de Moura, Alves do Rio, Manuel Firmino, Mendes Leite, Sousa Junior, Murta, Miguel Osorio, Modesto Borges, Placido de Abreu, Monteiro Castello Branco, Ricardo Guimarães, R. Lobo d'Avila e Visconde de Pindella.

Entraram durante a sessão — Os srs. Affonso Botelho, Garcia de Lima, Annibal, Vidal, Ayres de Gouveia, Arrobas, Mello Breyner, Antonio Pequito, Pereira da Cunha, Lopes Branco, A. V. Peixoto, Zeferino Rodrigues, Barão das Lages, Barão de Santos, Garcez, Abranches, Beirão, Carlos Bento, Cyrillo Machado, Pinto Coelho, Domingos de Barros, Fernando de Magalhães, Gaspar Pereira, Guilhermino do Barros, Silveira da Mota, Gomes de Castro, Mártens Ferrão, Fonseca Coutinho, Aragão Mascarenhas, Sette, Fernandes Vaz, Luciano de Castro, Sieuve de Menezes, Mendes Leal e Rocha Peixoto.

Não compareceram — Os srs. Adriano Pequito, Braamcamp, Abilio, Soares de Moraes, A. B. Ferreira, Carlos da Maia, Correia Caldeira, Antonio Eleuterio, Brandão, Gonçalves de Freitas, Ferreira Pontes, Fonte, Lemos e Na polés, David, Barão da Torre, Barão do Vallado, Barão do Rio Zezere, Freitas Soares, Oliveira e Castro, Albuquerque e Amaral, Almeida e Azevedo, Conde da Azambuja, Conde da Torre, Cypriano da Costa, Poças Falcão, Drago, F. F. de Mello, Fernandes Costa, Ignacio Lopes, Vianna, Borges Fernandes, Gavicho, F. L. Gomes, F. M. da Costa, Bicudo, F. M. da Cunha, Pulido, Chamiço, Cadabal, Mendes de Carvalho, João Chrysostomo, Costa Xavier, Calça e Pina, Ferreira de Mello, Coelho de Carvalho, Simas, Neutel, Veiga, Galvão, Infante Pessanha, D. José de Alarcão, J. M. de Abreu, Casal Ribeiro, Latino Coelho, Silveira e Menezes, Batalhós, Camara Falcão, Freitas Branco, Affonseca, Alves Guerra, Pereira Dias, Pinto de Araujo, Sousa Feio, Charters, Moraes Soares, Fernandes Thomás, Simão de Almeida, Thomás Ribeiro, Teixeira Pinto e Vicente de Seiça.

Abertura — Á uma hora da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

1.º Uma declaração do sr. Cyrillo Machado de que por doente faltou ás sessões e 21 do corrente. — Inteirada.

2.º Uma representação da sociedade das sciencias medicas, pedindo a approvação do projecto de lei do sr. Beirão, para se conceder um grau de doutor aos alumnos da escolas medico-cirurgicas de Lisboa e Porto, que concluirem os seus estudos — Á commissão de instrucção publica.

3.º Da camara municipal de Ponte de Sor, pedindo que se não approve projecto de lei algum para a admissão permanente de cereaes estrangeiros. — Á commissão de agricultura.

4.º Dos escrivães e contadores de direito da 3.º e 4.ª varas da comarca de Lisboa, fazendo algumas considerações sobre a proposta do sr. ministro da justiça, relativa á divisão orphanologica da capital. — Á commissão de legislação.

5.° Vinte e dois requerimentos da officialidade de infanteria n.° 8, pedindo a approvação da reforma do exercito, apresentada pelo sr. ministro da guerra. — Á commissão de guerra.

EXPEDIENTE

A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA

REQUERIMENTOS

1.º Tendo esta camara approvado, na sessão de 27 d'este mez, que fosse mandada ao governo pelo ministerio da justiça a proposta que fiz, para se obterem, com urgencia, todos os esclarecimentos, a tira de ser elevada a comarca a muito notavel villa da Praia da Victoria da ilha Terceira, requeiro que seja expedida com a maior brevidade a dita proposta. = J. M. de Sieuve de Menezes.

2.º Tendo esta camara approvado, na sessão de 28 do corrente mez de maio, que fossem mandadas para o governo, pelo ministerio das obras publicas, todas as propostas para estudar estradas a construir, e como entre ellas ía a proposta n.° 76, que propuz para ser estudada a estrada que ligue a estação do caminho de ferro de Torres Novas com varias povoações daquelle concelho, como são Alcanena e outras, requeiro que esta proposta seja mandada com urgencia ao governo. = Sieuve de Menezes.

Foram remettidos ao governo.

3.º Requeiro que seja convidada a illustre commissão de obras publicas a dar com urgencia o seu parecer sobre o contrato Debrousse do caminho de ferro de Lisboa para Cintra, pendente de parecer na commissão. Sieuve de Menezes.

Foi enviado á commissão de obras publicas.

O sr. Secretario (Miguel Osorio): — Ha sobre a mesa uma proposta apresentada pelo sr. Pinheiro Osorio, que teve segunda leitura na sessão de 23 de maio, sendo então apoiada por 56 votos contra 5, e em virtude do artigo 141.° da carta constitucional deve ter segunda leitura passados seis dias, á qual se vae proceder (leu).

O sr. Sá Nogueira: — Esta proposta foi apresentada na camara ha já alguns dias. É do estylo, e creio que do regimento, que uma proposta de lei tenha segunda leitura no dia immediato ao da sua apresentação.

O sr. secretario, julgando, pela explicação que deu, que o artigo da carta, cuja reforma se propõe, era constitucional, declarou que devia esta proposta seguir os tramites que a carta marca em taes casos.

Ora, esta intelligencia dada ao artigo da carta constitucional é que me parece que não devemos deixar passar. Entendo que este artigo não é constitucional, e para o demonstrar direi poucas palavras, porque não é occasião de haver sobre esta materia uma discussão muito larga.

Não se trata n'esta proposta das attribuições da outra camara, e o que é constitucional é só o que trata das attribuições dos differentes poderes do estado. A proposta não trata de lhe querer tirar attribuição alguma, trata sómente da maneira d'ella ser constituida; e portanto o artigo, na minha opinião, não é constitucional, e por conseguinte a proposta deve seguir a marcha que segue uma proposta de lei ordinaria; e para não deixar passar o principio contrario é que pedi a palavra, para apresentar uma questão previa.

Entendo que esta proposta devia ter segunda leitura no dia immediato aquelle em que foi apresentada; portanto agora, visto que já foi admittida, não ha outra cousa a fazer senão manda-la a uma commissão. A commissão a que terá de ir não sei, porque manda-se aqui tudo á commissão de legislação, e devia talvez haver uma commissão de direito politico, para examinar assumptos d'esta ordem; mas como esta commissão não existe, talvez deva ir a uma commissão especial para tratar d'este objecto, que reputo grave.

O sr. Secretario (Miguel Osorio): — Devo informar o sr. deputado de que esta proposta foi apresentada na camara pelo seu auctor, o sr. deputado Pinheiro Osorio, e teve segunda leitura na sessão de 23 de maio. A carta constitucional diz no artigo 140.° (leu).

É preciso que tenha as tres leituras; esta é a segunda e só depois d'ellas é que a mesa entende que póde ser submettida á discussão.

O sr. Sá Nogueira: — O artigo 144.° da carta responde ao que diz o Sr. secretario e aos artigos que leu. Este artigo diz:

«Artigo 144.° E só constitucional o que diz respeito aos limites e attribuições respectivas dos poderes politicos, e aos direitos politicos e individuaes dos cidadãos. Tudo o que não é constitucional póde ser alterado, sem as formalidades referidas, pelas legislaturas ordinarias.»

Ora, não se tratando na proposta das attribuições da outra camara, mas unicamente do modo de a e instituir, se isto é inconstitucional, tambem se póde dizer que o é o termos constituido a camara dos deputados por differentes modos, porque é certo que qualquer modificação feita na lei eleitoral affecta a constituição d'esta camara, e por consequencia se nós declararmos constitucional esta proposta, havemos de declarar tambem que não podemos tocar na lei eleitoral, porque vamos contender com a constituição da camara dos senhores deputados. A verdade é porém que apesar das modificações que se têem feito na lei eleitoral, nunca se atacaram as suas attribuições; e é por isso que nunca se julgou que se atacava a carta constitucional, alterando a lei eleitoral; como entendo do mesmo modo que se póde approvar a proposta em discussão, sem offensa da mesma carta.

Concluindo, proponho que essa proposta seja mandada a uma commissão como uma proposta ordinaria.

O sr. Presidente — Queira mandar a sua proposta para a mesa por escripto.

(Pausa.)

O sr. Sá Nogueira: — Mando para a mesa a seguinte

PROPOSTA

Proponho que este projecto de lei seja immediatamente mandado a uma commissão especial eleita por esta camara, para sobre elle dar o seu parecer. = Sá Nogueira.

Foi admittida.

O sr. Miguel Osorio: — Tendo dado as explicações que me cumpria como membro da mesa, para fazer conhecer ao sr. deputado e á camara os motivos que tinham determinado a direcção que indiquei á proposta do sr. Pinheiro Osorio, agora que o sr. Sá Nogueira apresentou outra proposta em que formula uma questão previa, não posso deixar de tomar a palavra n'este logar para expor as rasões por que me não conformo, á vista da letra da carta, com esta proposta do illustre deputado.

Já li os artigos, pelos quaes entendo que a unica direcção rasoavel e legal que se podia dar á moção do sr. Pinheiro Osorio, era aquella que foi indicada pela mesa. A questão previa do sr. Sá Nogueira reduz-se a não considerar como assumpto constitucional a materia da proposta do sr. deputado, o sr. Pinheiro Osorio, e adduziu como argumento principal para sustentar a sua opinião, que quando assim não fosse se devia tambem julgar constitucional tudo quanto diz respeito á eleição da camara dos deputados, e que n'esse caso não podia pelos meios ordinarios decidir-se qualquer ponto relativo a essa eleição.

Eu entendo que o argumento não procede nem tem applicação para o caso presente. Todas as leis que têem sido discutidas n'esta e na outra casa do parlamento, e que se têem promulgado, têem fixado o nosso direito eleitoral pura e unicamente regulamentar.

Emquanto á fórma de constituição d'esta camara, está ella regulada em primeiro logar na carta constitucional, e depois no acto addicional, que é uma parte da mesma carta.

Não ha attenção alguma substancial ou essencial da organisação d'esta camara, que não esteja prevenida e marcada na lei fundamental do paiz.

Tudo o que nós temos resolvido por leis ordinarias com o concurso de todos os ramos do poder legislativo é materia só regulamentar. Assim, por exemplo, a eleição que se fazia indirectamente, segundo a carta constitucional, para que passasse a ser directa, foi preciso que a mesma constituição do estado no acto addicional, que faz parte d'ella, estabelecesse o principio de que a eleição ficaria sendo directa. Quanto ao mais se haviam de ser eleitos conjunctamente muitos deputados, ou se cada um d'elles por circulo singular, é regulamentar, não tem nada com a fórma de constituição da camara, e não admira que isso fosse determinado, resolvido e definido pelas leis ordinarias que se têem feito no parlamento. Mas não acontece assim quanto á proposta do sr. Pinheiro Osorio, essa é exactamente relativa á essencia e á constituição da camara dos dignos pares (apoiados), porque determinando a carta constitucional que o pariato seja hereditario, pela proposta do sr. Pinheiro Osorio pretende se estabelecer o principio contrario que o pariato não seja hereditario, e isto é ir alterar essencialmente a organisação e constituição da camara dos dignos pares (apoiados).

Não estão no mesmo caso as leis que nós temos votado, regulamentares e só regulamentares, para a eleição da camara dos deputados, que são para regular o principio já estabelecido na constituição do estado. E sendo isto assim, entendo eu que a proposta do sr. Pinheiro Osorio, que é relativa á constituição, organisação essencial, e ao modo de ser da camara dos dignos pares, não póde deixar de ser considerada como materia constitucional, estabelecida no artigo 144.º da carta, não podendo deixar de applicar se o que está escripto nos artigos 140.° e 141.° da mesma carta, nem póde deixar de se lhe dar a direcção que lhe deu a mesa (apoiados).

N'estes termos não se póde, sem infracção da lei fundamental do estado, votar e approvar a proposta do sr. Sá Nogueira, e pelo contrario deve manter-se a direcção que a mesa deu á moção do sr. Pinheiro Osorio (apoiados).

Voto portanto contra a proposta do sr. Sá Nogueira.

O sr. Levy: — A questão que acaba de ser suscitada pelo sr. Sá Nogueira é grave, não só porque é prejudicial, e sem a solução d'ella não póde a camara marchar, mas tambem porque, se for approvada a proposta do sr. deputado, está claro que os tramites a seguir relativamente á moção do sr. Pinheiro Osorio são diversos d'aquelles que já começámos a seguir; e se não for approvada, isto é, se a camara entender que a materia do artigo da carta é constitucional, n'esse caso prevalece o que já se começou a fazer, e a moção ha de ter primeira, segunda e terceira leitura.

Salvo o respeito devido ás opiniões em contrario, inclino-me á do sr. Sá Nogueira.

O artigo 144.° diz: «É só constitucional o que diz respeito aos limites e attribuições respectivas aos poderes politicos e aos direitos politicos e individuaes dos cidadãos. Tudo o que não é constitucional póde ser alterado, sem as formalidades referidas, pelas legislaturas ordinarias».

Para sabermos pois se a moção de e. ex.ª versa ou não sobre materia constitucional, devemos referi-la pela disposição do artigo 144.°, e ver se está comprehendida em qualquer das duas partes do artigo 144.° Isto é, se diz respeito aos limites e attribuições respectivas aos poderes politicos do estado, ou se é relativa aos direitos politicos e individuaes dos cidadãos.

Quanto á primeira parte, entendo não se poder pôr em duvida que o artigo não é constitucional, porque a proposta nem diz respeito aos limites nem ás attribuições de qualquer poder do estado.

A circumstancia de ser ou deixar de ser hereditario o pariato nada tem com os limites, nem com as attribuições da camara dos pares, como ramo do poder legislativo. Logo a proposta do sr. Pinheiro Osorio não toca nos limites, nem nas attribuições do poder legislativo, porque não affecta os limites, nem as attribuições da camara dos dignos pares, um dos ramos d'esse poder.

Quanto á segunda parte do artigo, se se podesse entender esta disposição da carta n'um sentido lato, que nos levaria ao absurdo, não haveria disposição que não fosse constitucional.

E esta parte do artigo 144.°, direitos politicos e individuaes, não se refere senão á disposição do artigo 145.°, em que se estabelecem as garantias dos direitos civis e politicos aos membros da sociedade portugueza; este artigo 145.° é que não póde ser alterado, a não ser pela fórma marcada nos artigos 140.° e seguintes. Nem me parece que esta segunda parte do artigo 144.°; relativa aos direitos politicos e individuaes, possa ser explicada senão pelo artigo 145.°, porque de outra fórma, repito, não haveria lei que não devesse ser considerada constitucional. Por exemplo, quando se marca o senso na lei eleitoral, quando ninguem póde votar sem pagar tanto, torna-se directamente dependente d'esta condição o direito politico de votar, e se uma lei alterar o censo para mais viria modificar os direitos politicos, e por consequencia chegaríamos ao absurdo de sustentar que este assumpto era constitucional.

Parece-me que a camara não quererá dar ao artigo uma intelligencia que, levada -a todas as suas legitimas consequencias, nos conduziriam ao absurdo. De mais, já temos uma lei com que poder argumentar, e é a de 1845, que estabeleceu as condições para os herdeiros succederem no pariato, e nem por isso o assumpto foi considerado constitucional.

Ora se a hereditariedade fosse cousa essencial ao pariato (o que não posso admittir), então tambem se não podia ter modificado por qualquer fórma esse principio pela lei de 1845, porque, pela carta constitucional, para a successão ao pariato não era preciso mais do que o ponto de ser filho ou successor do par e de ter uma certa idade, e a lei de 1845 acrescentou mais uma condição, exigindo dos successores o curso completo, ou da universidade ou de alguma escola superior, vindo portanto restringir o direito d'aquelles que não tinham essas habilitações.

Logo, modificando-se de certo modo o principio da hereditariedade, entendeu-se que esse principio não era constitucional, e parece-me que muito bem, porque a hereditariedade nada tem com as attribuições e limites daquelle

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ramo do poder legislativo, que pôde funccionar da mesma fórma, seja hereditario ou vitalicio.

Não acrescentarei mais ao que acabo de dizer. Abundando nas idéas do sr. Sá Nogueira, parece-me que a moção do sr. Pinheiro Osorio não contém materia constitucional, e portanto voto pela proposta do sr. Sá Nogueira, pedindo desculpa á camara d'estas breves considerações para que não estava preparado, porque não podia prever este incidente.

O sr. Sá Nogueira: — Para não occupar a attenção da camara, limito-me a declarar simplesmente que me reporto a tudo que acaba de dizer o illustre deputado o sr. Levy Maria Jordão.

O sr. Monteiro Castello Branco: — A questão que se agita é bastante grave; mas as rasões apresentadas pelos illustres deputados, os srs. Sá Nogueira e Levy Maria Jordão, não me parecem tão procedentes que nos possam levar a concluir que esta questão não é constitucional, e que a proposta do sr. Pinheiro Osorio, seguindo os tramites ordinarios que se seguem em todos os projectos de lei n'esta casa, tem attingido o fim a que se propõe.

Eu entendo pelo contrario que a proposta do sr. Pinheiro Osorio é essencialmente constitucional.

Entrarei na analyse do artigo 144.° da carta constitucional, visto que é n'esse artigo que se define quaes são as materias que se reputam constitucionaes, dependentes por consequencia das formulas estabelecidas nos artigos 141.° e 142.° da carta.

O sr. Sá Nogueira viu apenas no artigo 144.° da carta a parte relativa ás attribuições dos poderes, e d'ahi concluiu que, não sendo a hereditariedade uma attribuição da camara dos pares, estava por consequencia no caso de ser derogada pelas formulas ordinarias em todas as leis. O sr. Levy porém completou esta doutrina, argumentando com a outra parte do mesmo artigo 144.°, que trata dos direitos e garantias dos cidadãos.

Ora, effectivamente, não é só constitucional o que diz respeito ás attribuições dos poderes publicos, mas tambem é constitucional o que respeita aos direitos e garantias dos cidadãos.

Emquanto á primeira parte, é innegavel que se não pôde reputar a hereditariedade como uma attribuição da camara dos pares; mas tambem é innegavel que a hereditariedade é forçosamente um direito.

O sr. Levy Maria Jordão disse que supposto que a hereditariedade seja um direito, comtudo a carta constitucional no artigo 144.° parece ter mais em vista regular os direitos marcados no artigo 145.°, no qual não se comprehende a hereditariedade.

Permitta-me s. ex.ª que eu lhe reflicta que no artigo 144.° não ha cousa alguma que nos leve a concluir que n'este artigo se comprehendem sómente os direitos e garantias marcadas no artigo 145.° A doutrina do artigo 144.° é geral; comprehende todos os direitos e garantias contidas na carta constitucional.

Portanto, se por um lado o artigo 144.° não faz exclusão dos outros direitos estabelecidos em outras disposições da carta constitucional; e se por outro lado nós não podemos negar que a hereditariedade é um direito que um individuo tem de succeder nas funcções de seu pae, se este pertencia á camara dos pares; claro está que a conclusão de tudo isto é que a proposta do sr. Pinheiro Osorio é essencialmente constitucional (apoiados).

O sr. Levy apresentou ainda outro argumento, deduzido da lei de 1845, que estabeleceu as condições com que um individuo pôde succeder no pariato; e concluiu que = assim como o legislador n'essa epocha se julgou com direito de regular as condições para a successão no pariato, sem attenção ao que estava determinado na carta constitucional, tambem nós hoje podemos derogar o artigo da carta constitucional, que estabelece a hereditariedade para a camara dos pares, sem recorrer aos meios que a carta estabelece nas artigos 141.° e 142.° =.

Ora, este argumento parece-me não proceder, porque a lei de 1845 effectivamente creio ter regulado a latitude com que o direito de hereditariedade era estabelecido na carta constitucional. E eu lembro a s. ex.ª que a lei de 1845 não negou o direito; regulou as condições para o uso do direito: e uma cousa é regular o uso do direito, e outra cousa é negar o direito.

A proposta do sr. Pinheiro Osorio não tem em vista regular o uso do direito, mas sim negar o direito; são cousas diversas. E por outro lado; se as côrtes de 1845 se julgaram com direito de fazer o que fizeram, nós não podemos considerar-nos por, esse facto com direito para extinguir um direito estabelecido na carta constitucional, senão pelos meios marcados na mesma carta.

Alem d'isso, pôde muito bem ser que a lei de 1845 offendesse mais ou menos a carta constitucional; mas d'isso não podemos tirar argumento para levarmos mais longe esse, talvez abuso, que as côrtes de então fizeram: um abuso não justifica outro. O mais que poderiamos chegar a concluir era que a lei de 1864 foi um abuso, mas isso não nos auctorisa a que ampliemos mais esse abuso.

Entretanto, eu declaro que não reputo a lei de 1845 offensiva da carta. Muitas leis se têem feito para regular o uso dos direitos e attribuições dos diversos poderes publicos, e ninguem disse ainda que essas leis eram uma violação da carta. A carta contém apenas principios geraes, que ás leis ordinarias pertence desenvolver e regular. A lei de 1845 teve o mesmo fim, emquanto se limitou a garantir o paiz da capacidade dos successores ao pariato. Parece-me portanto que não se pôde negar que a hereditariedade é um direito politico; e tudo que diz respeito aos direitos politicos e individuaes não pôde alterar-se sem se recorrer aos meios estabelecidos nos artigos 141.° e 142.° da carta constitucional.

Posso pois concluir que a proposta do sr. Pinheiro Osorio foi muito bem interpretada pela mesa, e que por conseguinte não pôde ser admittida nem approvada a proposta apresentada pelo meu amigo o sr. Sá Nogueira.

O sr. Antonio de Serpa: — A questão parece-me clara.

Eu tambem entendo que a mesa deu a este negocio o andamento que devia ter, segundo o artigo da carta que diz expressamente que são constitucionaes aquelles, artigos da mesma carta que dizem respeito aos limites e attribuições dos diversos poderes politicos, e aos direitos politicos e individuaes dos cidadãos.

No meu modo de ver esta proposta envolve em si uma completa restricção aos direitos de um dos poderes politicos; porque o poder moderador, segundo a carta, pôde nomear pares sem numero fixo. Se se adoptasse, por exemplo, que a segunda camara fosse electiva, aqui estava cerceado um dos principaes direitos do poder moderador. Se se estabelecessem categorias, d'entre as quaes o Rei devesse de escolher, aqui estava tambem cerceado este direito.

Por consequencia parece claro que a proposta, restringindo os direitos ou attribuições a um dos poderes do estado, está comprehendida na letra e no espirito da carta como alterando um dos seus artigos constitucionaes.

Segundo os argumentos que se acabam de apresentar, querendo que esta proposta seja resolvida por uma lei ordinaria, com a mesma logica se podia sustentar que a monarchia se pôde converter n'uma republica com presidencia electiva, ou que pôde transformar-se o poder modera dor hereditario em poder moderador electivo.

Estas conclusões já por si são sufficientes para mostrar que devemos ter toda a cautela em não sermos latitudinarios n'esta questão.

Por outro lado parece claro que esta proposta cerceia as attribuições do poder moderador, e como tal tende a alterar um artigo da carta, que deve ser considerado como constitucional.

Alem d'isto temos já o precedente de uma reforma, que foi apresentada n'esta camara ácerca da camara hereditaria, relativamente á qual a camara resolveu que se procedesse como a mesa tem procedido a respeito d'esta questão.

O sr. José de Moraes: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se julga a materia da proposta do sr. Sá Nogueira sufficientemente discutida.

Consultada a camara, verificou-se não haver vencimento.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer passar á segunda parte da ordem do dia, ficando suspensa a resolução d'esta proposta para ser tratada em outra sessão.

Assim se resolveu.

O sr. Arrobas: — Mando para a mesa um parecer da commissão do ultramar ácerca da proposta de lei para aposentações no ultramar.

ORDEM DO DIA

O sr. Ministro da Fazenda (Lobo d'Avila): — Peço a v. ex.ª que ponha em discussão o projecto de lei n.° 77.

Leu-se na mesa, e é o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 77

Senhores. — A commissão de fazenda examinou attentamente a proposta do governo n.° 66 - D, que tem por fim reduzir á 1 por milhar o direito de 2 por cento a que estão sujeitas as baldeações de mercadorias.

Considerando a commissão que o direito de 2 por cento ad valorem, que o artigo 4.° do decreto de 22 de março de 1834 manda pagar das mercadorias que não entrarem no deposito, e se fizer d'ellas baldeação de uns para outros navios, é por tal fórma excessivo que o commercio raras vezes procede a esta operação, ficando assim o estado privado das vantagens que d'ella deviam resultar se porventura se verificasse em larga escala;

E attendendo a que a diminuição do direito de que se trata, facilitando as baldeações, ha de dar em resultado um maior movimento mercantil e consequentemente maiores interesses para o thesouro;

É de parecer que a proposta do governo seja convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° O direito de 2 por cento a que estão sujeitas as baldeações de mercadorias, em virtude do disposto no artigo 4.° do decreto de 22 de março de 1834, fica reduzido a 1 por milhar.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, em 27 de abril de 1864:. = Belchior José Garcez = Placido Antonio da Cunha e Abreu = Anselmo José Braamcamp = Joaquim Januario de Sousa Torres e Almeida = João Antonio Gomes de Castro = Guilhermino Augusto de Barros = Antonio Vicente Peixoto = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc.

Foi logo approvado na generalidade e na especialidade.

O sr. Ministro da Fazenda: — Agora peço que se entre na discussão do projecto de lei n.° 97.

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 97

Senhores. — Foi presente á commissão de fazenda a proposta de lei n.° 91 - C, da iniciativa do sr. ministro e secretario d'estado dos negocios da fazenda, que tem por fim crear o logar de archivista da repartição de fazenda do districto do Funchal.

O decreto de 29 de dezembro de 1860, que fixou o quadro dos empregados das repartições de fazenda dos districtos administrativos do continente e ilhas adjacentes, não creou o logar de archivista. Todavia o estado cahotico do importante cartorio da repartição de fazenda do Funchal justifica a medida excepcional de que se trata.

Considerando pois as rasões allegadas no relatorio que precede a proposta do sr. ministro;

Considerando que o governo reputa necessario ao serviço publico a creação do logar de archivista na referida repartição, da qual se não pôde distrahir nem um só empregado para o encarregar especialmente do arranjo do cartorio:

E a commissão de parecer que a proposta n.° 91 - C seja convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º O quadro dos empregados da repartição de fazenda no districto do Funchal, fixado por decreto de 29 de dezembro de 1860, é augmentado com um logar de archivista, que terá o ordenado de 240$000 réis annuaes, em moeda forte, e accesso aos logares superiores da mesma repartição de fazenda.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão', em 10 de maio de 1864. = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc — Jacinto Augusto de Sant'Anna e Vasconcellos = Placido Antonio da Cunha e Abreu— João Antonio Gomes de Castro = Anselmo José Braamcamp = Joaquim Januario de Sousa Torres e Almeida.

O sr. Sieuve de Menezes: — Não impugno o projecto que se discute; mando para a mesa um additamento concebido n'estes termos:

«E nos tres districtos dos Açores.»

Depois que o nobre ministro da fazenda apresentou n'esta casa este projecto em virtude das requisições do delegado do thesouro da ilha da Madeira, para ser creado um logar de archivista n'aquella ilha, apresentei tambem um projecto assignado por mais alguns srs. deputados dos Açores, para que o mesmo logar de archivista seja creado nos districtos de Ponta Delgada, Angra o Horta, tendo o archivista obrigações perante o delegado do thesouro e perante os governos civis. As necessidades dos Açores são iguaes ás da Madeira, n'esta parte ha a mesma rasão e justiça.

Pedia pois ao nobre ministro da fazenda que, não tendo a commisão de fazenda dado parecer com respeito ao nosso projecto, o que muito me admira, adoptasse o additamento que mando para a mesa.

As rasões que lá tem o governo para augmentar o quadro dos empregados do districto do Funchal são as mesmas que se dão, a meu ver, com respeito aos outros districtos.

Mando para a mesa o meu additamento, e esta camara não pôde deixar de o apreciar para ser justa e imparcial a sua decisão.

Foi admittido.

O sr. Ricardo Guimarães: — Mando para a mesa um parecer da commissão de administração publica.

O sr. Ministro da Fazenda: — Apresentei essa proposta para a creação d'esse logar no Funchal, porque tive repetidíssimas reclamações do delegado do thesouro d'aquelle districto, de que era indispensavel este funccionario, e que d'elle não existir resultava perderem se muitos papeis pertencentes á fazenda, e por consequencia perda para o thesouro, visto que esses papeis eram titulos dos quaes a fazenda podia vir a tirar receita. Portanto foi por exigencias do serviço, depois de repetidas informações, que eu apresentei essa prodosta.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Apoiado.

O Orador: — Se se derem identicas circumstancias a respeito dos outros districtos, depois de colhidas as informações, eu de certo hei de proceder do mesmo modo; mas bem sabe o illustre deputado que eu não posso apresentar a proposta n'esse sentido senão depois de colher as devidas informações. Não posso portanto aceitar o seu additamento.

O sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Apoiado.

O sr. Sieuve de Menezes: — Depois da declaração do sr. ministro da fazenda, peço a v. ex.ª que queira consultar a camara sobre se me dá licença para retirar o meu additamento.

Foi-lhe concedida.

Foi approvado o projecto.

O sr. Ministro da Fazenda: — Peço que entre em discussão o projecto n.° 110, que tratado processo para o pagamento da contribuição nas ilhas.

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 110 Senhores. — Foram presentes á commissão de fazenda dois projectos de lei, tendo um o n.° 38 - D, da iniciativa de tres srs. deputados, e outro o n.° 55 - A, nos quaes se propõe que se realise nos districtos do Funchal e Açores o pagamento da contribuição industrial em duas prestações iguaes, á similhança do que se faz no Porto e em Lisboa; e

Considerando que em materia de imposto é principio de incontestavel utilidade tornar-se a sua percepção o mais suave e commoda ao contribuinte que for possivel;

Considerando que o pagamento em duas prestações não prejudica a fazenda, ao passo que favorece o contribuinte;

Attendendo ás rasões expendidas nos relatorios que precedem as propostas alludidas, e a não haver algum motivo plausivel para negar aos districtos do Funchal e Açores o mesmo que se concede a Lisboa e ao Porto:

E a vossa commissão de parecer, de accordo com o governo, que se converta em lei o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º O pagamento da contribuição industrial nos districtos do Funchal e Açores será realisado em duas prestações iguaes.

Art. 2.° O governo fixará as epochas do pagamento das prestações de que trata o artigo 1.°, ouvidas as camaras municipaes e os respectivos conselhos de districto.

Art. 3.» É o governo auctorisado a fazer o regulamento necessario para a execução d'esta lei.

Art. 4.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 14 de abril de 1864. = João Antonio Gomes de Castro = Claudio José Nunes = Hermenegildo Augusto de Faria Blanc = Antonio Vicente Peixoto = Jacinto Augusto de Sant'Anna e Vasconcellos = Guilhermino Augusto de Barros.

Foi approvado na generalidade, sem discussão.

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O Sr. Sant'Anna e Vasconcellos: — Peço a v. ex.ª que consulte, a camara sobre se quer que, dispensando-se o regimento, se passe á especialidade.

Consultada a camara, decidiu afirmativamente.

Artigo 1.° — foi approvado.

Entrou em discussão o artigo 2.º

O sr. Sieuve de Menezes: — Não me opponho á disposição do artigo 2.°, que se discute, chamo a attenção do sr. ministro, sobre as palavras «ouvidas as camaras municipaes».

Já n'esta casa passou um projecto, auctorisando o pagamento das contribuições predial e pessoal, nos districtos dos Açores e da Madeira, em duas epochas, fixando o governo os mezes do pagamento ouvidos os governadores civis em conselho de districto,; mas eu vejo que n'este projecto se diz «ouvidas as camaras municipaes». Já aquelles projectos não se manda ouvir as camaras municipaes, não sei se haveria harmonia, mandando-se ouvi-las n'este.

Não faço questão d'isto, mas se s. ex.ª quizer harmonisar as disposições d'este projecto com as disposições dos outros que estão votados, deve proceder-se á eliminação das palavras «camaras municipaes».

Era unicamente esta a lembrança que tinha a fazer com relação ao artigo 2.°

O sr. Ministro da Fazenda: — Não tenho duvida em aceitar a indicação do nobre deputado, para ir este artigo redigido como foi um projecto analogo a este, quer dizer «ouvido o governador civil em conselho de districto».

O sr. Sieuve de Menezes: — Mando para a mesa a minha proposta.

É a seguinte:,

PROPOSTA

Proponho a eliminação das palavras «camaras municipaes». = Sieuve de Menezes. Foi admittida.

O sr. Presidente: — O sr. Sieuve de Menezes mandou para a mesa uma emenda ao artigo 2.°, e como emenda vae ler-se e votar-se primeiro.

A emenda foi approvada, salva a redacção.

Artigo 2.° — approvado.

O sr. Ministro da Fazenda: — Peço que se discuta agora o projecto n.° 118 d'este anno sobre a contribuição industrial.

Leu-se, e é o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 118

Senhores. — A commissão de fazenda examinou com escrupulosa attenção o projecto de lei, da iniciativa do sr. deputado Joaquim Ribeiro de Faria Guimarães, tendente a reduzir o imposto que actualmente pagam as fabricas de distillação de aguardente e genebra.

Reconhece a commissão o melindre e gravidade do assumpto. É perigoso reduzir os impostos existentes. Dali resulta, em regra, desfalque para a receita publicas que, embora tenha crescido nos ultimos annos, ainda não attingiu comtudo a cifra necessaria para occorrer ás despezas do estado e ás necessidades da civilisação.

Entretanto cumpre attender a que o imposto exagerado é sempre o menos productivo, velho aphorismo economico, que apesar de velho nem sempre tem sido respeitado pelos financeiros.

Os fabricantes de aguardente e genebra que d'antes pagavam de 2$400 réis minimo até 7$200 réis maximo, acham se hoje sujeitos nas duas principaes cidades do reino ao pagamento de uma contribuição que pôde ser elevada a réis 1:296$000 réis, o que não está em proporção com os lucros d'esta industria, sobretudo depois de reduzidos, como foram, os direitos de importação dos álcoois estrangeiros, e augmentados os do melaço, materia prima indispensavel para a fabricação nacional da aguardente chamada redonda.

Convem pois reduzir este imposto em harmonia com as faculdades dos contribuintes, conciliando tanto quanto é possivel as vantagens do productor com as do thesouro.

Satisfazendo este duplo intuito a commissão tem a honra de submetter á vossa approvação, dó accordo com o governo, o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° As fabricas de distillação de aguardente ou genebra de que trata a tabella A, que faz parte da carta de lei de 30 de julho de 1860, serão classificadas na terceira parte da tabella B. e pagarão:

Pelas distillações ordinarias ou alambiques...... 9$000

Pelas distillações intermittentes................ 18$000

Pelas distillações continuas................... 36$000

Em Lisboa mais uma e meia vezes estas taxas para compensar os direitos de consumo.

No Porto mais uma vez para a mesma compensação.

Art. 2.° Pela differença que houver entre o imposto estabelecido no artigo antecedente e o que se tem lançado em virtude da citada lei de 30 de julho de 1860, passar-se hão aos fabricantes titulos de annullação para lhes serem levados em conta no pagamento dos impostos que deverem da mesma proveniencia, restituindo-se lhes em presença dos mesmos titulos qualquer differença que haja quando a sua importancia for superior aquella que estiver em divida.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 24 de maio de 1864. = Placido Antonio da Cunha e Abreu = Anselmo José Braamcamp = Jacinto Augusto de Sant'Anna e Vasconcellos — Hermenegildo Augusto de Faria Blanc = Guilhermino Augusto de Barros = Antonio Vicente Peixoto = João Antonio Gomes de Castro — Joaquim Januario de Sousa Torres e Almeida.

Entrou em discussão na generalidade.

O sr. Sá Nogueira: — Não combato o projecto, pelo contrario approvo o na generalidade por isso que trata da reducção de um imposto, mas desejava que o relator da commissão, ou o auctor do projecto, nos explicassem a rasão por que em Lisboa se ha de pagar esta taxa uma e meia vezes e no Porto uma vez sómente.

Desejava que se me explicasse a rasão por que em Lisboa ha de ser fabricada a aguardente, pagando-se a taxa uma e meia vezes, e no Porto uma só vez.

Espero que o relator da commissão ou o auctor do projecto dêem explicações satisfactorias, para sabermos a rasão por que se apresenta esta differença.

O sr. Faria Guimarães: — O fim do projecto foi remediar uma grande injustiça que se fez involuntariamente, estabelecendo-se um imposto que importava para estes estabelecimentos annualmente em 1:200$000 réis. Não sou eu que o digo, é o governo, porque a iniciativa d'este projecto é do governo.

No primeiro anno em que se poz em execução a contribuição industrial, o governo reconheceu que tinha havido um erro no modo de calcular esta contribuição, e veiu o sr. ministro da fazenda trazer á camara um projecto para reparar esta injustiça. Agora o projecto limita-se unicamente a reduzir o imposto ao que é rasoavel.

A rasão de proporção em que estão n'este projecto o Porto e Lisboa é a mesma do projecto originario. No projecto originario dizia se que = a contribuição para Lisboa seria vinte vezes maior do que para as outras terras do reino, e e para o Porto dez vezes maior =; e agora diz se: «Esta contribuição será acrescentada para Lisboa com mais 150 por cento, e para o Porto será duplicada».

Conseguintemente guardou se a mesma proporcionalidade, e do que se tratou foi tanto para Lisboa como para o Porto, de reduzir o imposto ao que é rasoavel. De mais o governo foi quem reconheceu que o imposto era insustentavel, porque não ha industria alguma que pague uma contribuição de 1:200$000 réis por anno.

Posto o projecto á votação, foi approvado na generalidade.

O sr. Faria Guimarães: — Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer que, dispensando-se o regimento, se passe á especialidade.

Assim se resolveu, e seguidamente foram approvados os artigos do projecto.

O sr. Ministro da Fazenda: — Agora peço que se discuta o projecto n.° 63 e depois o n.° 64.

O sr. Ministro da Marinha: — Eu peço que, terminada a discussão d'estes projectos, prossigamos na discussão do orçamento do ultramar.

Entrou em discussão o projecto de lei n.º 63.

É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 63

Senhores. — Foi presente é commissão de fazenda o requerimento dos chefes de repartição do thesouro publico, no qual pedem se lhes conceda a gratificação annual de 180$000 réis, igual á que percebem os chefes de repartição da secretaria d'estado dos negocios da fazenda e do tribunal de contas.

A commissão, considerando que o serviço a cargo dos chefes de repartição do thesouro publico não é inferior ao que prestam os chefes de repartição da secretaria da fazenda e do tribunal de contas;

Considerando que os chefes de repartição da secretaria da fazenda vencem annualmente 1:104$000 réis; a saber: ordenado liquido de decima 510$000 réis, compensação do Diario do Governo 114$000 réis, gratificação 180$000 réis, emolumentos perto de 300$000 réis;

Considerando que os chefes de repartição do tribunal de contas vencem annualmente 980$000 réis, sendo 800$000 réis de ordenado e 180$000 réis de gratificação;

Considerando que os chefes de repartição do thesouro publico têem um vencimento muito inferior, porque percebem apenas annualmente a quantia de 660$000 réis; a saber: ordenado liquido de decima 640$000 réis, emolumentos 20$000 réis;

Considerando quê os directores geraes do thesouro publico e o official maior da secretaria da fazenda são igualmente chefes de repartição, como se declara na portaria de 19 de novembro á 1849, dirigindo debaixo da sua immediata inspecção os trabalhos das respectivas repartições centraes;

Considerando porém que o official maio da secretaria da fazenda vence annualmente 1:234$000 réis; a saber: ordenado liquido de decima 640$000 réis, compensação do Diario do Governo 114$000 réis, gratificação 180$000 réis, emolumentos 300$000 réis, quando os directores geraes do thesouro vencem sómente 990$000 réis, sendo de ordenado liquido de decima 960$000 réis e 30$000 réis de emolumentos;

Considerando que o serviço das direcções geraes e repartições do thesouro é muito importante, porque tem a seu cargo a administração do patrimonio publico, e o conhecimento e resolução de graves e difficeis questões;

Considerando que as conveniencias do serviço exigem que se estabeleça a necessaria igualdade nos vencimentos dos servidores do estado, que prestam identico serviço, e que são da mesma categoria, não havendo rasão plausivel que possa justificar a desigualdade apontada:

Por todas estas considerações a commissão, de accordo com o governo, tem a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° E concedida aos directores geraes e aos chefes de repartição do thesouro publico a gratificação annual de 180$000 réis.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 13 de abril de 1864. = Jacinto Augusto de Sant'Anna e Vasconcellos — Anselmo José Braamcamp = João Antonio Gomes de Castro = Claudio José Nunes — Hermenegildo Augusto de Faria Blanc = Guilhermino Augusto de Barros = Antonio Vicente Peixoto. =Tem voto do sr. Joaquim Januario de Sousa Torres e Almeida.

O sr. Rodrigues Camara: — Acho os fundamentos d'este projecto muito justos, mas entendo que os considerandos não ligam bem com a conclusão, porque diz o artigo (leu).

Quer dizer que os chefes de repartição são considerados, mas que esta igualdade não se estabelece para os directores geraes do thesouro publico e do tribunal de contas, porque, ainda que os directores geraes do thesouro publico e do tribunal de contas sejam da mesma categoria e exerçam funcções analogas, os emolumentos do tribunal de contas constituem receita do estado, e os do thesouro publico são repartidos pelos empregados.

Por consequencia, para se tirar uma conclusão igual d'estes considerandos, tomo a liberdade de mandar para a mesa a seguinte emenda (leu).

Leu-se na mesa a seguinte

PROPOSTA

E concedida aos directores geraes do thesouro publico e tribunal de contas, e aos chefes de repartição do thesouro publico a gratificação annual de 180)5000 réis. = Joaquim José Rodrigues da Camara —Antonio Maria Barreiros Arrobas =Augusto Xavier Palmeirim.

Foi admittida.

O sr. C. J. Nunes: — Proponho que á moção mandada para a mesa pelo sr. Camara se addicione o seguinte

ADDITAMENTO

Proponho que á moção do sr. Camara se addicione: «e ao secretario do tribunal de contas». = Claudio José Nunes = Augusto Xavier Palmeirim.

Foi admittida.

O sr. Ministro da Fazenda: — Não posso deixar de dizer algumas palavras ácerca do requerimento dos directores e chefes de repartição do thesouro publico, pedindo á camara que se lhes desse uma gratificação, que a commissão de fazenda entendeu de justiça.

Devo dizer que estes directores e chefes de repartição são habeis funccionarios e que prestam o melhor serviço, mas estão collocados era circumstancias inferiores aos empregados analogos em outros ministerios, porque estes empregados não têem emolumentos, não têem as gratificações que outros empregados têem; por exemplo, a gratificação do Diario do Governo, e a gratificação dos chefes de repartição, os quaes alem d'isto têem emolumentos que estes empregados do thesouro, a que se refere a proposta, não têem. Estes empregados não têem nenhum d'estes vencimentos, têem meramente os ordenados.

E pois de justiça que se lhes dê esta gratificação, e ainda assim ficam numa situação inferior aos empregados de identica categoria nos outros ministerios, porque têem um assiduo e constante trabalho, e pésa sobre elles uma gravissima responsabilidade, porque todos os negocios que lhes passam pelas mãos são de grande importancia e valia para o thesouro publico. Julgo portanto que, pela consideração do trabalho que está a seu cargo, e pela circumstancia de elles se acharem em posição inferior a respeito de vencimentos a outros empregados de igual categoria; isto é, não tendo direito e emolumentos que outros têem, que é justa a gratificação que se lhes arbitra.

O sr. Affonso Botelho: — Reconhecendo e desejando muito o principio da igualdade na remuneração de todos os empregados publicos, tenho a convicção de que nós temos empregados de mais, e que mais tarde ou mais cedo não pôde o governo deixar de olhar para a necessidade de fazer uma grande reducção no funccionalismo, que é talvez hoje um dos obstaculos maiores que existe em Portugal para um governo bom e regular.

Os nossos paes diziam «empregado da nação»; nós hoje podemos dizer «nação dos empregados».

Sinto muito ter de votar contra uma proposta que tem o apoio do meu nobre amigo, que respeito muito, o sr. ministro da fazenda; mas como a minha consciencia me obriga a votar na generalidade contra tudo que for augmento de despeza com o funccionalismo, tenho dito a rasão por que hei de votar contra a proposta.

O sr. Sá Arrobas: —... (O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O sr. Ministro da Fazenda: — Estou de accordo com o illustre deputado e meu amigo o sr. Affonso Botelho, emquanto a não se dever dar demasiada extensão ao funccionalismo.

Eu estimaria se os quadros se podessem reduzir successivamente, mas era necessario que os empregados que ficassem ao serviço do estado fossem devidamente remunerados (apoiados), porque não se pôde exigir trabalho Bem a devida remuneração.

O sr. Affonso Botelho: — Estou de accordo.

O Orador: — Portanto estamos de accordo no principio. Estes empregados, como acabei de dizer, têem a seu cargo negocios da mais grave responsabilidade e interesse para o thesouro.

O sr. Affonso Botelho: — Creio.

O Orador: — Da boa fiscalização e gerencia d'estes empregados dependem muito as receitas do thesouro, e desempenhando elles com muita assiduidade, muito zêlo e muita intelligencia os seus logares, são á anos d'esta remuneração. (Apoiados.) Alem d'isso votou-se aqui hontem uma proposta, que não critico nem censuro, era que se arbitrou uma gratificação aos directores e chefes de repartição do ministerio da justiça. A mesma camara que votou essa gratificação não pôde rejeitar esta, porque os directores e chefes de repartição do ministerio da justiça têem emolumentos, e os empregados a que se refere este projecto, alem de serem de igual categoria, não têem emolumentos alguns; julgo pois de justiça que se lhes conceda esta gratificação. 0 augmento de despeza que d'aqui resulta é insignificante, não altera o equilibrio do orçamento, e julgo esta despeza productiva, porque é applicada a retribuir serviços valiosos (apoiados).

O sr. Presidente: — Não ha mais ninguem inscripto. Vae ler-se o artigo 1.° para se votar A proposta do sr. Camara

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é um additamento, por consequencia vota-se em segundo logar.

Foi approvado o artigo 1.º

Posto á votação o additamento do sr. Camara, verificou-se não haver vencimento.

O sr. Ministro da Fazenda: — Peço então que seja expedido o projecto, embora das propostas se faça um projecto especial para não prejudicar o andamento d'este (apoiados).

Posta novamente á votação a proposta do sr. Rodrigues Camara, verificou-se ainda não haver vencimento.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o artigo 2.° para se votar.

O sr. Sieuve de Menezes: — Não pedi a palavra para me oppor á votação d'este artigo, que diz que = fica revogada a legislação em contrario =, nem podia de fórma alguma oppor-me; os meus poucos conhecimentos chegam ahi, mas para dizer a v. ex.ª e á camara que, segundo as prescripções do regimento, se bem me recordo, quando não ha vencimento sobre qualquer objecto, continua a discussão. Como não houve vencimento sobre as propostas dos srs. Rodrigues Camara e Claudio José Nunes, parece-me mais coherente que v. ex.ª consultasse a camara sobre se queria passar a este objecto, até serem postos novamente á votação os additamentos. E esta simples reflexão que tinha a fazer, e pedir a v. ex.ª que consultasse a camara a este respeito, no que não haverá inconveniente algum.

O sr. Rodrigues Camara: — Requeiro que o additamento, que tive a honra de mandar para a mesa, seja remettido á commissão de fazenda conjunctamente com o do sr. Claudio José Nunes, a fim da commissão dar o seu parecer sobre elles, sem prejuizo do andamento do projecto.

Pondo se á votação este requerimento, verificou se não haver numero na sala.

O sr. José de Moraes: — Peço a v. ex.ª que mande convidar os srs. deputados, que estão nos corredores, a virem tomar os seus logares na Bala, e votar cada um como quizer.

O sr. Mártens Ferrão: — Como os additamentos apresentados estão ligados ao projecto, e não se poderam resolver por não haver vencimento, parecia-me que o mais regular era V. ex.ª pôr de parte o projecto com os additamentos, e passarmos a outro objecto, reservando este de que tratámos agora para quando a camara estiver mais numerosa. Se ainda então não obtiverem vencimento, a camara resolverá o que entender mais conveniente.

O sr. Sant'Anna: — Agora já ha numero na casa, e peço por isso que se consulte novamente a camara. I O sr. Presidente: — A camara ouviu que o sr. deputado Rodrigues da Camara requereu que o seu additamento e o do sr. Claudio José Nunes fossem remettidos á commissão, sem prejuizo da votação e andamento do projecto; é sobre este requerimento que se vae votar.

Consultada a camara, decidiu que os referidos additamentos fossem remettidos á commissão de fazenda, sem prejuizo do andamento do projecto.

Posto a votos o artigo 2.º do projecto, foi approvado.

O sr. Ministro da Marinha: — Peço que se continue na discussão do orçamento do ultramar.

O sr. Presidente: — Mas o sr. ministro da fazenda tinha pedido que se entrasse na discussão do projecto n.° 64.

O sr. Ministro da Fazenda: — Eu concordo em que se continue na discussão do orçamento do ultramar, e antes d'isso seja-me permittido mandar para a mesa uma proposta de lei.

É a seguinte:

PROPOSTA DE LEI

Senhores. — Por decretos de 10 de setembro de 1863 e de 12 de maio findo, constantes das copias juntas, foram concedidas á camara municipal de Extremoz a igreja do extincto convento dos Capuchos, extramuros d'aquella villa, a fim de servir de capella do cemiterio contiguo, para encommendação dos finados que ali enterram; e a junta de parochia da freguezia de Grijó, para continuação do culto divino, a igreja do extincto convento de Grijó, que está servindo de parochial, a sacristia e mais pertenças accessorias no mesmo designadas; ficando porém estas concessões dependentes da approvação do corpo legislativo.

Tenho por isso a honra de submetter á vossa consideração a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° São confirmadas as concessões feitas á camara municipal de Extremoz, por decreto de 10 de setembro de

1863, da igreja do extincto convento dos Capuchos, extramuros d'aquella villa, a fim de servir de capella do cemiterio contiguo para encommendação dos fieis que ali se enterram; e á junta de parochia da freguezia de Grijó da igreja que está servindo de parochial, sacristia e mais pertenças e accessorios para continuação do culto divino.

Art. 2.° Estas concessões ficarão de nenhum effeito logo que as ditas igrejas e suas pertenças e accessorios deixem de ter a applicação para que foram concedidas.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Ministerio dos negocios da fazenda, em 31 de maio de

1864. = Joaquim Thomás Lobo d'Avila. Foi enviada á commissão de fazenda.

O sr. Presidente: — Está em discussão o orçamento da provincia de S. Thomé e Principe.

Foi approvado com as alterações propostas pela commissão.

O sr. Presidente: — Está em discussão o orçamento da provincia de Angola.

O sr. Sá Nogueira: — Não vejo no orçamento de Angola verba alguma para explorações, nem para determinação ao mesmo tempo de differentes pontos importantes d'esta provincia.

Quando eramos senhores do Brazil o governo de Portugal teve sempre todo o cuidado de mandar explorar os principaes rios d'aquella possessão, e mandar explorar tambem os sertões; ora não vejo verba alguma destinada para este fim no orçamento da provincia de Angola, e eu desejava, e muito, que o sr. ministro ou o governo portuguez mandasse explorar os sertões de Angola, e o rio Cunnene, ao sul de Mossamedes; que é um dos maior se n'esta possessão, e que, segundo me consta, pôde ser navegavel n'uma longa extensão. Junto a este rio ha o forte Bembe. Isto é importante, e eu desejava que o sr. ministro da marinha desse as providencias convenientes para continuar a exploração que principiou a fazer, creio que o sr. Leal, homem muito intelligente, activo e habil, e a quem o sr. ministro, com muita rasão e acerto, encarregou a administração do districto de Mossamedes (apoiados).

E direi tambem que seria muito conveniente que s. ex.ª mandasse explorar o sul e parte de leste de Mossamedes, e mesmo estabelecer alguns presidios mais para o sul d'aquelle districto.

Tambem conviria que s. ex.ª mandasse determinar a posição de differentes logares para se poderem marcar nas cartas de Angola, e haver mais perfeita geographia d'aquella nossa possessão.

Desejava por isso que s. ex.ª encarregasse algum official de marinha ou pessoa habil para determinar a longitude ou latitude de differentes pontos. Isto é uma cousa importante, mas vejo que s. ex.ª não pede verba alguma para este fim, provavelmente talvez seja porque pôde applicar, ou tenha tenção de applicar para este serviço, alguma outra verba do orçamento.

Tenho que fazer tambem algumas perguntas a s. ex.ª relativamente á exportação dos chamados colonos livres, que se faz de Angola para S. Thomé e Principe; não sei se com effeito cessou de facto, ou se minorou esse transporte, como é muito para desejar.

Ha em Inglaterra uma sociedade muito poderosa encarregada de promover a abolição da escravatura; esta sociedade queixa-se de que têem saído, ou sáem, colonos negros de Angola para S. Thomé e Principe, e que d'aqui foram transportados para Cuba, a fim d'ali serem vendidos como escravos. Não sei se isto é exacto, desejo ouvir a este respeito explicações do sr. ministro, porque não desejo que pese sobre o governo portuguez a suspeita de que fecha os olhos a esse trafico.

Quando se tratar da discussão do orçamento de Moçambique farei tambem uma pergunta similhante a s. ex.ª, relativamente á saída de negros d'aquella possessão para Havana. Não quero tomar muito tempo á camara, e por isso limito-me a estas observações, e peço a s. ex.ª que queira dar as devidas explicações.

O sr. Ministro da Marinha (Mendes Leal): — Por mais de uma vez tenho repetido n'esta casa, que, segundo me parece, nunca é perdido o tempo que dispensamos em tratar das cousas do ultramar.

Repetirei tambem agora algumas explicações, que já dei por occasião de se discutirem os creditos extraordinarios para as provincias ultramarinas; repeti-las hei, porque algumas das considerações do illustre deputado já foram igualmente apresentadas n'aquella occasião.

Quanto a explorar os sertões ha diversos modos de o fazer. A boa rasão porém aconselha que se empreguem as explorações scientificas. Mas antes de emprehender similhante genero de exploração, devemos applicar os nossos recursos a organisar e consolidar os diversos ramos de serviço publico n'essas regiões, a fortalecer nos no territorio que conhecemos e occupâmos. Não nos faltam terrenos; falta nos aproveitar e fecundar os que possuimos, (apoiados).

Creio comprehender o pensamento de s. ex.ª O nobre deputado sabe que estamos na effectiva posse dos pontos mais avançados do interior de Africa partindo da costa occidental, assim como não ignora que senhoreamos partindo da costa oriental outros pontos correspondentes tambem muitas dezenas de leguas para o interior. Dominando uns e outros pontos podemos, por meio de explorações, ir facilitando a passagem de uma a outra costa, resultado immenso por todos os modos considerado. Basta ver na carta os postos que occupâmos na chamada cintura de Africa, para proseguir no empenho de os tornar escallas de uma communicação, que será um dos mais graves acontecimentos modernos. O nobre deputado tem na sua familia quem altamente comprehenda estas questões e que se tenha desvelado em resolve-las (apoiados).

Esse desejo tão natural, esse pensamento tão elevado, é

0 de todos os homens que entendem o presente, que olham ao futuro, que se interessam pelo desenvolvimento, pela prosperidade, pelo porvir das nossas provincias africanas. Esse é o pensamento do governo.

Para emprehender e seguir com fructo similhantes explorações são necessarios recursos e subsidios extraordinarios. Não é com poucos contos de réis que taes commettimentos se hão de realisar. Muitas e muitas sommas terão de era pregar-se, devem empregar-se, mas depois de organisada ali a administração, depois de desenvolvida a riqueza, depois de haver n'essas provincias base sufficiente para taes despezas, muito uteis, certamente indispensaveis, mas não agora as mais urgentes. E isto o que pede a ordem natural. O contrario não seria prudente.

Quanto á exploração do rio Cunene já tive a honra de dizer a s. ex.ª em outra occasião, que o governo fez o que podia fazer. O governo já deu ordens ao intelligente governador de Mossamedes para que auxiliasse quanto podesse a exploração intentada por um particular.

É necessario tambem que nos costumemos a fazer como fazem os inglezes. Auxilia o seu governo todas as grandes emprezas; mas a iniciativa individual toma a si muitas cousas, quer seja na metropole, quer nas colonias. E assim que se honra a liberdade, é para isto que ella serve. Esse é o seu uso mais discreto.

1 Quanto á investigação, descripção e fixação de alguns pontos interiores d'aquellas provincias no territorio já occupado, quer seja para aperfeiçoamento da geographia, quer a bem do commercio, podem effectua-la sem maiores difficuldades os officiaes habilitados, que vão governar os concelhos ou commandar os presidios. Já por este modo se fizeram sondagens no Quanza, na Africa occidental, como era tão preciso. Já um official da armada examinou as bôcas do Zanbeze, na Africa oriental. Já outro, o tenente Craveiro Lopes, colligindo trabalhos dispersos e observações proprias, reuniu n'um só corpo a descripção das costas de Angola. No sentido indicado tem sido enviadas instrucções, e quanto maior for o numero de officiaes habilitados que possa ir servir no ultramar mais largas e mais perfeitas serão estas observações. O digno governador de Mossamedes, a que s. ex.ª se referiu fazendo-lhe a devida justiça, tem cooperado não pouco para tornar mais conhecida a topographia africana e rectificar muitos erros.

Para emprehender com vantagem expedições longiquas de exploração scientifica, será necessario auctorisar verbas especiaes, e para isso cumpre que as circumstancias da fazenda o permittam, ou esperar que os subsidios extraordinarios, fixados no orçamento com applicação ás provincias de Africa, se achem desembaraçados de outros encargos, de obras indispensaveis, para que uma parte d'elles possa ter esse destino (apoiados).

Quanto á questão dos pretos livres e libertos que de Angola se transportam para S. Thomé, é um assumpto complexo. Cumpre encara lo por duas faces. A transportação de colonos livres e libertos de Angola para S. Thomé é um direito da corôa e da nação portugueza, direito expresso e consignado no tratado de 1842, ao sincero exercicio do qual o governo não pôde nem deve pôr obstaculo, antes dar protecção. Mas qualquer sophisma d'esse direito, todo o artificio que de um ou de outro modo o tome por pretexto, é dever e decoro impedi lo. Manter o direito, evitar a fraude, eis a dupla e rigorosa obrigação do governo.

Tive já a honra de referir-me a este assumpto quando me occupei do trabalho indígena e da colonisação. Disse então que era preciso por meio de regulamentos adequados estabelecer e assegurar a genuina condição dos libertos. Este o passo essencial. Este o principio fundamental de uma reforma efficaz, que permittirá sem inconvenientes a exportação dos braços necessarios, realmente livres, realmente libertos, e por isso realmente uteis (apoiados). Na defficiencia actual de taes regulamentos, e do que affiance a sua completa execução, com a difficuldade inegavel de verificar e afirmar a genuidade d'aquella condição, entendeu o governo opportuno restringir provisoriamente a exportação a um numero que, mesmo na mais estreita, na mais forçada interpretação do tratado, não podesse ser impugnado, a um numero que, ainda quando a qualidade de libertos podesse ser plausivelmente disputada, a exportação não fosse justamente suspeita. Fez-se isto, não por desconhecer ou para menoscabar o direito que assiste a Portugal de transportar de uma para outra das suas provincias os trabalhadores livres ou libertos, mas para poder fortificar esse mesmo direito, purificando-o e constituindo o em bases solidas e incontrastaveis, para lhe dar o apoio da boa fé, a grande força da rasão. Não são os nomes que fazem as cousas; não basta chamar a um homem liberto para que elle o seja; é indispensavel tornar esse titulo uma inegavel realidade (apoiados).

Um facto recente veiu confirmar a necessidade de toda a circumspecção, e tornou ainda maior para o governo o dever de velar cuidadosamente era tal assumpto.

Apresentaram-se ultimamente ao consul portuguez em Havana tres individuos de côr preta, naturaes de Angola, dizendo os seus nomes, e declarando que tinham sido para ali transportado com escravos, sendo livres, e pedindo ser restituídos á sua patria. Com esta reclamação provaram aquelles homens ser effectivamente de uma condição muito acima da vulgar nos libertos, e mesmo muitos designados como livres. A resolução de irem queixar-se ao seu consul, e de pedirem regresso á terra da sua naturalidade, indica um certo conhecimento dos seus direitos, e um certo grau de civilisação. Se isto todavia os não isemptou, apesar de toda a vigilancia das auctoridades, e de toda a severidade do governo, que se ha de pensar do que pôde succeder a negros absolutamente boçaes e arrancados ao sertão? Quanta prudencia não é portanto necessaria! De quanta urgencia não é deffinir claramente regular de um modo permanente e indubitavel a sorte e condição dos libertos!

As riquissimas ilhas de S. Thomé precisam braços, reconheço-o. Devem te los e hão de te los. Mas, em proveito mesmo da prosperidade e da segurança dos proprietarios, é preciso regular previamente a situação dos libertos para com elles, e as mutuas obrigações. O tempo e a experiencia mostrarão que não ha melhor meio de satisfazer tão grave necessidade!

Concluindo, o governo quer ser previdente, mas para isso ha de ser justo. Não ha maior força do que a da justiça. Por dignidade sua, sobretudo por dignidade do paiz, a maxima obrigação n'este caso é nem tolerar abusos que prejudiquem a sua independencia, nem auctorisa los que manchem a sua sinceridade (apoiados. — Fozes: — Muito bem).

O sr. A. J. de Seixas: — Discutindo se o orçamento da provincia de Angola, eu tinha de fazer algumas perguntas ao nobre ministro sobre assumptos d'esta provincia, nas quaes me precedeu o nobre deputado, o sr. Sá Nogueira; e como me satisfizeram completamente as respostas do nobre ministro da marinha dadas ao sr. Sá Nogueira, por isso limitar-me-hei unicamente, por agora, em pedir ao sr. ministro que haja de dizer se sabe alguma cousa relativamente á companhia das minas do Bembe, no sentido das fortificações que esta empreza era obrigada a fazer do Ambriz

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ao mesmo ponto do Bembe; ou de um caminho á america na no mesmo ponto.

Ultimamente por um convenio ou promessa d'esta mesma companhia, ella tinha-se compromettido em logar do caminho do Ambriz ao Bembe fazer certas fortificações. Primeiro ponto. Segundo — se os empregados civis da provincia de Angola, que têem requerido com tão attendiveis rasões augmento de vencimentos, se s. ex.ª tenciona tomar alguma medida a esse respeito, porque não é possivel que continuem com os que têem decretados ha muitos annos, ha talvez cem ou duzentos annos, no tempo em que o trafico reprovado dos negros era um commercio legal n'aquella provincia, o que dava logar a que aquelles empregados podessem fazer grandes interesses no serviço de que estavam encarregados, e a poderem servir por uma recompensa, decretada para os respectivos empregos, muito diminuta. Hoje, sr. presidente, as cousas mudaram completamente em Angola a todos os respeitos, porque não só as subsistencias têem encarecido, assim como tudo mais necessario á vida, facto palpavel em toda a parte, mas especialmente em Angola.

Hoje, repito, os empregados d'esta provincia, alguns, estão vivendo com o ordenado de 320$000 réis na alta graduação de primeiros funccionarios da secretaria geral do governo e da junta de fazenda; e se antigamente podiam viver com este ordenado é porque tinham outros lucros que hoje não têem (apoiados). Por exemplo o official maior da secretaria do governo e o primeiro escripturario da junta de fazenda com 320$000 réis, não podem viver decentemente, e obrigados a servir com honra com tal ordenado, n'uma terra aonde pela visita de ma medico se paga 5$000 réis, e por uma de cirurgião 3$000 réis! Escuso de mencionar outros factos (apoiados).

Sei quaes são as intenções do nobre ministro da marinha a este respeito, e sei que s. ex.ª tem encarregado o conselho ultramarino de dar o seu voto ácerca d'este assumpto.

O sr. Ministro da Marinha: — Apoiado.. O Orador: — Com estas considerações não é minha intenção fazer a mais pequena censura ao nobre ministro da marinha que não a merece, e sómente peço ao nobre ministro, que redobre a sua iniciativa e a sua' actividade diante do conselho ultramarino, porque sou o primeiro a confessar, que s. ex.ª tem feito tudo quanto lhe é possivel dentro da orbita das suas attribuições, e em harmonia com as faculdades que lhe são conferidas como membro do poder executivo (apoiados).

Vozes: — Muito bem.

O Orador: — Passarei ao terceiro ponto das minhas observações ao nobre ministro. Como o governo fica auctorisado pelo projecto de lei que approva o orçamento do ultramar a organisar as repartições publicas nas provincias ultramarinas, lembro ao Sr. ministro a creação do logar de mestra no recolhimento de D. Pedro V. estabelecido em Loanda. Este recolhimento foi creado em 1854; tem já prestado importantes serviços, vive das dispensas dos piedosos habitantes de Loanda; o governo nada tem despendido com este importantissimo estabelecimento; pedia portanto que s. ex.ª houvesse por bem de crear com sufficiente vencimento o logar da dita mestra, e que provesse este logar em uma pessoa capaz. Sei as diligencias que s. se. tem feito, mas, como deputado por aquella provincia, não posso deixar de pedir, se é possivel, mais actividade e iniciativa de s. ex.ª sobre este negocio importante.

O sr. Ministro da Marinha: — Seguirei a ordem dos assumptos indicados por s. ex.ª

E o primeiro a situação da companhia das minas do Bembe. As condições primitivas do contrato celebrado por aquella companhia continham que ella devia fazer a expensas suas uma estrada. Esta condição foi estabelecida pela companhia, talvez por não conhecer bem todas as difficuldades com que teria de lutar. Mesmo quando a companhia conseguisse fazer uma estrada em taes terrenos, e estabelecer n'ella material rolante, os negros, que lucram no modo actual de transportes, destruiriam provavelmente esse material, sem possibilidade de o impedir no meio de sertões. A estrada portanto ficaria inutil.

Em agosto, creio, de 1862, o governo, solicitado pela companhia, permittiu-lhe que substituisse aquella estrada por uma linha de fortes até á margem esquerda do Loge.

Esperava que esta condição fosse immediatamente levada á execução, como se me affiançava. Infelizmente enganei-me.

A companhia, em consequencia de lhe terem adoecido ou morrido os seus engenheiros e conductores de trabalhos, como é usual em homens do norte, tem lutado com graves difficuldades, e parece achar-se na impossibilidade de realisar a nova condição.

Não se tendo construido a linha de fortes, o governo entende que a companhia faltou á obrigação solicitada, aceita e contrahida, e tem instado com o seu agente para que se saia d'este estado incerto e prejudicial a todos. Se a companhia cessar os seus trabalhos, isso terá de certo inconvenientes; mas muito maiores resultam de não se cumprir o estipulado (apoiados). Quando apresentou esta nova condição, a companhia não podia já allegar desconhecimento das localidades e do seu proprio estado. Sem o cumprimento de condições que lhe assegurem o transito e communicação, a companhia não tem futuro. Por ahi se deveria ter começado. A firmeza em exigir o cumprimento dos contratos será uma garantia da seriedade d'elles (apoiados).

E o segundo ponto o augmento dos ordenados. S. ex.ª sabe que pelos meios ao meu alcance beneficiei já quanto pude os funccionarios mal retribuidos. Elevei os ordenados de diversas classes em mais 20 por cento.

Um projecto geral está porém affecto ao conselho ultramarino. E não se pense que por culpa d'aquella corporação se não acha já resolvido. Ha graves circumstancias a ponderar n'essa reforma. São precisas minuciosas informações. Ha particularidades e especialidades a que é preciso attender. Citarei, por exemplo, a differença que importa estabelecer entre os empregados nativos de Africa, e os que vão da Europa. Seria injustiça relativa dar a uns e outros igual remuneração, porque as necessidades de uns e outros não são iguaes, porque uns vivem entre os seus já estabelecidos, e outros ou deixaram familia na Europa, ou têem de se estabelecer de novo.

É indispensavel tambem graduar proporcionalmente os vencimentos pelas habilitações e importancia dos serviços conservando entre os diversos graus a necessaria relação. E, como se vê, assumpto difficil que só convem regular do um modo generico e permanente para evitar reclamações fundadas, e a anarchia que resulta de melhorias fraccionadas. Espero todavia que em breve se possa proceder a uma geral melhoria, não como deve definitivamante ser, mas segundo as possibilidades financeiras para começar, e tenho para mim que a melhor sorte dos empregados ha de tambem produzir melhores finanças, atalhando graves desperdicios (apoiados).

Os vencimentos dos empregados nas provincias ultramarinas sito comparativamente muito inferiores aos de igual categoria no reino, quando deviam ser superiores por motivos bem obvios. Como muito bem ponderou o illustre deputado resentem se do tempo em que foram estabelecidos. Existiam então as avenças com os commerciantes de escravos. Estas avenças eram uma especie de emolumentos que não tinham limite, e se tornavam extremamente productivos. Muitas vezes nada mais era preciso para enriquecer. Não se precisavam por consequencia nem reformas, nem aposentações, nem pensões. O vencimento designado era o menos, irão constituia isso o rendimento real. Este estado acabou ou deve estar a acabar. Para evitar até a menor apparencia de plausibilidade de que venha a renovar-se, é de summa conveniencia augmentar os vencimentos, elevando-os aquillo a que os funccionarios precisam para viver ali, áquillo de que necessariamente hão de viver. Negar a satisfação das necessidades não é economia, é abrir a porta a expedientes maléficos e a pretextos ruinosos (apoiados).

S. ex.ª não ignora que não abro mão d'este negocio, e muito lhe agradeço o valioso testemunho que dá á minha boa vontade. Entendo que não ha senão um meio de organisar a administração das provincias ultramarinas, é moralisa-la. Não me canço de repeti-lo, a minha maxima é — pagar bem e castigar melhor—(apoiados) castigar os que delinquem, bem entendido. E não os castiga o governo, castigam os as leis!

O terceiro ponto é o recolhimento de D. Pedro V. Depois que se retirou a regente d'aquelle estabelecimento, tratei logo do fazer abrir concurso para prover o logar. Mas para obter bom pessoal é indispensavel pagar bem. Estamos sempre no mesmo principio. O estabelecimento tem já sido util, mas pôde, mas deve tornar-se muito proveitoso com uma boa direcção. Para isso e para ampliar o numero dos recolhidos, convem criar rendimentos. Para o conseguir, a primeira cousa que importará fazer será discutir a proposta e o parecer relativo ao cofre dos orphãos de Angola, visto que ali se determinam os meios de receita permanente, que muito hão de cooperar para elevar essa piedosa instituição ao que importa que seja.

Sejamos francos, em nenhuma cousa é possivel exigisse cabal organisação sem proporcional dotação. Não ha melhoramento que não custe. Se os queremos realisar, votemos-lhes os meios (apoiados).

O sr. A. J. de Seixas: — Agradeço ao sr. ministro as explicações que acabou de me dar, e nem podia esperar outra cousa do seu zêlo pelos negocios do ultramar, que eu sou o primeiro a reconhecer.

Relativamente ás minas de Bembe tenho só a lembrar a s. ex.ª que ha dez annos que aquella companhia existe; estou convencido de que s. ex.ª continuará a empregar o seu zêlo e dedicação para que de qualquer fórma este negocio se conclua a bem do estado e da empreza, cujos interesses eu não pretendo hostilisar por conhecer as difficuldades com que ella tem constantemente lutado.

Emquanto aos empregados, eu fui o primeiro a declarar e a louvar o sr. ministro pelo modo por que tem andado n'este negocio. No entretanto imploro toda a protecção de s. ex.ª para os empregados civis de Angola, em lhes crear uma situação que os faça viver com vencimentos proprios a alimenta-los, e a dar o resultado para o estado que o nobre ministro conhece poderá vir de se pagar bem aos funccionarios publicos; e que no ultramar é onde esta regra deve ser observada mais attentamente.

(Interrupção que se não ouviu.)

O Orador: — Esqueceu-me mencionar os 20 porcento que já se decretaram a favor de alguns, e mesmo a respeito dos militares que estão hoje em uma situação, senão lisongeira, ao menos regular. Mas torno a dizer que a respeito dos empregados civis, os unicos que podem subsistir com os vencimentos actuaes são os das alfandegas, porque têem, alem dos seus ordenados determinados em lei, uma percentagem sobre os rendimentos; mas os outros não podem subsistir com os vencimentos que têem, mesmo os ecclesiasticos. Eu peço a s. ex.ª que redobre a sua actividade junto do conselho ultramarino, para que este negocio se resolva quanto antes, porque não é possivel que um conego viva com 320$000 réis, e os empregados que mencionei tenham os mesmos 320$000 réis. Mesmo já com o augmento que s. ex.ª fez, ha empregado em Angola que tem 240$000 réis em empregos de muita graduação, e não pôde viver com elles. Não poderão ter grandes augmentos, attendendo

ás finanças da provincia de Angola; mas ao menos dêem-se-lhes em moeda forte o que tinham, pela moeda fraca.

Emquanto a outros assumptos não tenho nada a dizer, porque a sessão vae adiantada. S. ex.ª respondeu ás perguntas que eu tinha feito, e espero que continuará com o zêlo que tem desenvolvido até agora (apoiados).

Vozes: — Muito bem.

O sr. Secretario (Miguel Osorio): — A commissão de redacção não fez alteração alguma nos projectos n.ºs 56 e 128, que foram approvados por esta camara; por consequencia vão ser expedidos para a outra.

O sr. Sá Nogueira: — Tenho muito pouco que dizer ou quasi nada.

Principio por agradecer a p. ex.ª, o sr. ministro da marinha, a bondade que teve de responder ás interrogações que lhe fiz. S. ex.ª pareceu-me entender que eu desejava se fizessem explorações no sul e no interior da Africa para augmentar o nosso territorio. A questão principal não é essa, não nos falta territorio, temos territorio talvez de mais; a questão principal é outra, é fixar ou nossos limites, para que o territorio não nos venha a faltar, para que alguem se cão apodere d'elle; porque do cabo da Boa Esperança têem saído expedições que têem chegado perto das nossas possessões ou talvez já chegado a ellas, e com essas expedições vae-se ás vezes tomando posse de territorios que deviam pertencer á corôa portugueza. Para que isto se não dê é que eu desejo que se façam as explorações, a fim de te escolherem os pontos convenientes para ahi se estabelecerem presidios; porque o presidio ainda que tenha meia duzia de homens, já é um titulo do posse, e evita que os estrangeiros vão apoderar-se d'esse territorio.

A outra questão, e questão importante, é que essas explorações se devem tambem verificar para se conhecer onde se pôde fazer o commercio com vantagem; aonde dos differentes estabelecimentos da colonia se pôde ir fazer o commercio de modo que dê vantagem. Isto é uma questão muito importante, e que têem sempre em vista as expedições que vão fazer essas explorações. Emquanto á determinação de differentes pontos do interior de Africa, s. ex.ª já concordou commigo; mas seria bom que não se esperasse pela possibilidade de se mandar uma expedição em grande, porque se o é esperar por isso, então tarde poderemos fazer alguma cousa. Convem que se faça o que s. ex.ª disse que já mandou fazer, e que alguns individuos habilitados que vão para o interior sejam igualmente encarregados de fazer a determinação d'esses pontos importantes.

Concluirei pedindo ainda a s. ex.ª um esclarecimento que ha de ser preciso para outra discussão, e é—se acaso entende que as vantagens que se concederam aos officiaes do nosso exercito devem ser tambem concedidas aos officiaes do exercito do ultramar, tanto em Angola como nas outras possessões. A resposta de s. ex.ª a esta minha pergunta deve esclarecer a discussão da proposta do governo para a reforma do exercito, porque se acaso s. ex.ª tem de estender o beneficio que aquella proposta confere aos officiaes do exercito do continente do reino tambem aos do ultramar, o resultado será que o augmento da despeza ha de ser muito maior.

Vozes: — Votos, votos.

O sr. Ministro da Marinha: — As explorações que o illustre deputado indicou, segundo agora deprehendo, não são para avançar no territorio, são de outra natureza. Essas mesmas podem considerar-se de duas especies. A primeira é uma verdadeira demarcação de limites. S. ex.ª sabe que nos tratados estão já em grande parte esses limites determinados por linhas convencionaes de tal a tal grau. Deseja porém s. ex.ª que essas indicações, um tanto vagas, sejam convertidas em alguma cousa mais palpavel, quero dizer em pontos, materialmente occupados estabelecendo-se ali presidios. E justamente o que se tem feito, o que se vae fazendo. Tem se successivamente feito quanto é possivel. Para o ampliar quanto s. ex.ª deseja, é necessario ir progressivamente augmentando as forças, e para augmentar estas engrossando os meios de receita, porque o augmento das forças não pôde deixar de motivar um augmento nas despezas. E é preciso tambem que esses presidios sejam commandados por europeus (apoiados), o que torna maior o dispendio.

A segunda especie de explorações, que foi o que tomei por expedições de outro genero, visto que s. ex.ª fallou em sertões; a segunda especie, digo, comprehende os terrenos que possuimos e já occupâmos. Essa especie de explorações todos os dias se está fazendo. A prova é que todos os dias se rectifica a escolha dos logares onde se deve fazer o commercio. O commercio do interior, por exemplo, tinha tomado por seu centro na Africa Occidental o ponto de Cassange. Sem que para a provincia resultasse muito mal, poderia este commercio ser estabelecido em Malange. Eis o que já resulta das explorações e da experiencia interna. Talvez este ponto fosse o mais conveniente, se não predominasse a idéa superior de alargar as nossas relações para o interior da Africa por aquelle lado... e já essas relações vão a centenas de leguas alem... a fim de se ligarem com as que tem por base as nossas possessões do lado oriental. Se não fosse esta consideração capital, a questão de commercio estava resolvida, e estava resolvida em resultado das observações internas já feitas.

Na Africa oriental este genero de exploração deu em resultado a recente reocupação da feira do Zumbo, e a proposta transferencia da villa de Tete para local mais acommodado e salubre. As explorações d'esta ordem pertence aos governadores geraes determina-las, e como s. ex.ª vê não tem deixado de se effectuar com proveito.

Quanto á applicação ao exercito do ultramar de algumas disposições comprehendidas na nova reforma do exercito do

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continente, direi ao illustre deputado que, achando-se pendente uma proposta de unificação dos dois exercitos, e sendo o exercito do ultramar por isso ainda distincto do continente, não creio que as disposições adoptadas com relação a este sejam forçosamente obrigatorias para aquelle.

O sr. Placido de Abreu: — Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda sobre as pensões que foram mandadas á camara pelos ministerios da guerra e marinha.

O Sr. Blanc: — Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda.

Leu-se e approvou se a ultima redacção do projecto de lei n.° 110 com a alteração que se lhe tinha feito. Expediu-se para a outra camara.

O sr. Antonio Pequito: — Mando para a mesa dois pareceres da commissão de legislação.

O sr. Presidente: — Como não ha Já numero na sala, vou dar a ordem do dia para ámanhã. É a continuação da que estava dada e mais o projecto n.° 125.

Está levantada a sessão.

Eram quasi quatro horas da tarde.

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