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52 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

trata. O digno par creio que pediu a palavra. Se for preciso pedil-a-hei tambem novamente.

O sr. Henrique de Macedo: — Sr. presidente, a argumentação do sr. presidente do conselho no que diz respeito ao facto primordial bem que menos essencial de todo este debate, o direito da auctoridade administrativa a rubricar os livretes, habil como é de uso em s. exa., assenta essencialmente sobre um simples equivoco de palavras. (Apoiados.) Não se trata aqui de fórma alguma dos livros de recenseamento eleitoral a que se refere o artigo 29.º do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, cujo § 3.° s. exa., devo dizel-o, tão inopportunamente citou. Não se trata tambem dos cadernos de recenseamento, a que o mesmo decreto em tantos dos seus artigos se refere, e que. como todos sabem são copias extrahidas d’aquelles livros depois de concluidas e encerradas as operações do recenseamento.

Não se traia portanto de nenhum d’aquelles documentos, que todos, segundo a lei, têem os seus termos de abertura e encerramento, assignados por todos os membros da commissão e pela auctoridade, e que por isso mesmo não podem ser exarados em folhas soltas. Ainda menos se trata de simples cadernos na vulgar accepção da palavra, que depois juntos, unidos, coordenados, viessem a constituir os livros do recenseamento, o que seria contra a lei que expressamente determina que taes livros tenham termo de abertura e encerramento.

De que se trata é de verbetes; e quer a camara saber o que são os verbetes? São simples elementos provisorios, meros apontamentos, que servem apenas como meio preparatorio, como elemento de simplificação, para a elaboração final dos livros do recenseamento, onde a final são lançados por copia os que durante o processo preparatorio não tinham sido annullados, modificados ou inutilisados. A esses verbetes, a esses apontamentos de natureza meramente particular, e que, segundo a lei, não fazem parte dos documentos constitutivos do processo eleitoral, não podia, de nenhum modo, referir-se a lei; nem se refere. Os verbetes ordenam, simplificam o trabalho das commissões de recenseamento, que d’esse meio ou pretendem servir; servem unicamente para este fim, para nada mais; não sendo cadernos, não sendo livros, não sendo nenhum d’aquelles documentos essenciaes e constitutivos do processo eleitoral a que a lei se refere, nenhuma das disposições da lei se lhe póde tornar extensiva, sem manifesto abuso, e muito menos quando essa extensão importa consequencias penaes, caso em que todas as regras de boa hermeneutica juridica mandam que a interpretação da lei seja essencialmente restricta á letra d’ella.

O que é notavel, porém, e o que, pelo menos para mim, tem uma significação importante, é que não tendo eu insistido, nem na presente sessão, nem na anterior, n?3sta parte do assumpto que se debate, tendo sempre dado de barato que a auctoridade administrativa ou a minoria das commissões de recenseamento tivesse o direito de rubricar os taes verbetes, tendo deixado essa questão sempre de parte, porque a julgava e reputo ainda pouco importante, o sr. presidente do conselho dirigisse quasi exclusivamente a argumentação do seu discurso a pretender provar aquillo que nem mesmo lhe era contestado. E a respeito da, prisão e segunda prisão das commissões de recenseamento, quasi nada; em relação ás occorrencias graves do meeting, nada!

O sr. Fontes, que a respeito da primeira parte do assumpto que se debatia, tão habilmente me respondeu com textos e interpretações de lei, que parecia ter li já á mão, limitou-se, com relação á prisão arbitraria dos membros da maioria das commissões, a affirmar-nos por auctoridade propria, que a auctoridade administrativa, em presença do facto da recusa da. commissão de recenseamento, tinha dois caminhos a seguir: autuar a commissão e remetter o auto ao poder judicial, ou prender os seus membros e entregal-os sob custodia a esse poder.

S. exa., porém, tão abundante de citações de lei pouco antes, esqueceu-se, exactamente no momento mais opportuno e interessante, de citar o texto legal em que se fundava o supposto direito da auctoridade administrativa a proceder do segundo modo.

Outro tanto não me succedeu a mim, sr. presidente, que na sessão anterior, quando tratei do assumpto, tive o cuidado de citar expressa e minuciosamente os textos legaas em que se fundavam as minhas apreciações, e a opinião que emitti e sustentei de que á auctoridade administrativa não era legalmente licito proceder senão pela primeira das maneiras indicadas por s. exa.

Não me recordo se exa. estava então presente, se o estava não reparou naturalmente na argumentação que então eu expendi e desenvolvi, por isso tomarei a liberdade de ter de novo o artigo do decreto eleitoral de 30 de setembro de 1852, a que me refiro.

E o artigo 144.° que diz assim:

«As auctoridades administrativas que, pelas disposições d’este decreto devem assistir ... e as sessões das commissões de recenseamento e a ... participarão immediatamente ao agente do ministerio publico respectivo qualquer delicto ou contravenção em offensa das disposições d’este decreto...»

S como não encontro na parte penal da legislação eleitoral outra disposição que se possa referir ao caso, entendo ainda, apesar das explicações do sr. presidente do conselho, que á auctoridade administrativa não era licito, sem que exorbitasse das suas legaes attribuições, mandar prender os membros da commissão.

Se entendia que as commissões não cumpriam com as disposições da lei autuasse-as. Nenhum outro caminho legal tinha para punir o supposto delicto ou reprimir a imaginaria contravenção. Mantenho pois a minha primeira apreciação.

Disse-nos tambem o sr. presidente do conselho que o governo havia de proceder n’este assumpto, como era da sua propria conveniencia e interesse no intuito de manter a paz e a ordem publica; affigura-se-me porém, que ha uma tal eu qual contradicção entre estas palavras e outras que s. exa. proferiu, quando, não duvidando confessar que o procedimento do governador civil do Porto fôra decerto menos prudente, nos disse que o governo podia obrigar os seus delegados a cumprir a lei, mas não podia forçal-os a serem prudentes.

Por minha parte entendo que a prudencia é uma das qualidades e deveres essenciaes das auctoridades, e que ao governo corre imperiosa obrigação de forçar os seus delegados, não só a cumprirem as leis, mas a escolherem no cumprimento d’ellas os caminhos apontados pela prudencia, no interesse da ordem publica, cuja manutenção é do interesse não só do governo mas de todos.

E s. exa., que tanto presa os dictames da prudencia, devia ser o primeiro não só a censurar como fez, mas a punir e impedir qualquer acto dos delegados do governo, contrario a esse principio.

A verdade, porém, é que não houve só imprudencia no procedimento da auctoridade; para mim é caso averiguado que houve uma flagrante illegalidade.

Quanto ao que se passou no meeting, confesso que não fiquei mais esclarecido depois da resposta de s. exa., e como tenho apenas simples informações particulares sobre os acontecimentos, reservo-me para mais tarde fazer as considerações que julgar convenientes.

Por emquanto e até novas averiguações recuso-me crer que a auctoridade administrativa procedesse com relação áquella reunião de maneira que faça suppôr que se deixou arrastar por áquella paixão politica de que injustamente fui accusado pelo sr. presidente do conselho, e de que, pelo que vou vendo, só s. exa. deve reputar-se isento.