256 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
be como a paciencia publica os permitte, e sobretudo em que é facil, mas lamentavel a desvairação?
Agora, porque não quer; alongar o debate, vae dirigir-se directamente ao actual Sr. Ministro da Marinha.
Publicou a imprensa d'este paiz, por largos dias, mezes, insistentemente, artigos sobre a presumida prorogação do malfadado negocio do caminho de ferro do Lobito.
Provocou-se directamente o Governo e a sua imprensa officiosa, faziam se as accusações mais vehementes, que não pode ler á Camara, e não houve nem uma resposta de allivio, nem uma confirmação, nem um desmentido, mas sim obstinação tenaz, um desprezo absoluto, com obstinação sem limites, e aberto o Parlamento foi o Digno Par Sr. Baracho que perguntou o que havia sobre o assumpto.
Era impossivel então o silencio. O paiz soube officialmente que de facto o Ministro da Marinha, com magua o diz o orador, perdeu uma occasião de bem servir o seu paiz para se tornar um cumplice do contrato mais funesto e mais infeliz que n'estes ultimos tempos se tem realisado.
Não teve occasião de responder ao Sr. Presidente do Conselho, quando S. Exa. pretendendo justificar esse acto do Governo, deu ao Digno Par Sr. Baracho, á Camara e ao paiz uma explicação, que de lamentar é tivesse sahido d'aquellas cadeiras, explicação ou razão que, demais a mais não é exacta, e não tem decerto todo o alcance dado pelo Sr. Presidente do Conselho se o tivesse, muito mais grave seria a responsabilidade do Governo.
Vae ler á Camara o que diz um jornal muito sisudo, e que crê, está em harmonia com os Annaes parlamentares.
Quanto á concessão em si, era sabido que o Digno Par Sr. Dantas Baracho, no pleno uso do seu direito, a combateu acerrimamente; mas era tambem certo que por seu lado varios outros Dignos Pares haviam adduzido razões e argumentos contrarios ás opiniões de S. Exa. e que afinal o Parlamento dera razão a estes ultimos e ao Governo, approvando o seu procedimento e da mesma fórma o paiz se manifestara do seu lado, pois não reagira contra a decisão parlamentar.
O orador não sabe o que estas palavras significam. É possivel, que, se estivesse presente o Sr. Presidente do Conselho, pudesse fazer alguma aclaração que o satisfizesse, evitando ao orador a necessidade de desfazer o equivoco que ellas encerram. Do exposto deduz, que o Sr. Presidente do Conselho quiz dizer, que o Parlamento havia approvado o procedimento do Governo. Isto não é exacto.
Não houve moção votada, porque a maioria e a opposição se abstiveram de a propor. Não póde pois, em epocha alguma, invocar-se a este respeito a auctoridade do Parlamento.
Da sua parte e d'aquelle lado da Camara houve o proposito muito reflectido de não propor moção alguma a tal respeito, porque a questão poderia degenerar em uma questão politica.
Mas nota o orador que este acto, muito reflectido e ponderado d'aquelle lado da Camara, é exactamente o que o Sr. Presidente do Conselho vem desfazer com a affirmação verdadeiramente inconveniente a que se referiu e que póde ser invocada como argumento decisivo contra a illegalidade do contrato.
A Camara não se pronunciou, affirma o orador, manteve-se em silencio, não approvou, nem rejeitou.
Comprehende certamente a Camara, feitas estas considerações, que elle, orador, não poderia deixar passar taes palavras sem o devido commentario.
Se porem traduziu o pensamento do Governo, o Sr. Ministro dirá se o que acaba de expor não se harmonisa com a verdade dos factos.
O orador já disse á Camara, muito de fugida, que as mesmas cautelas, chamemos-lhes assim, o mesmo segredo de estado se manteve durante o periodo das novas concessões á companhia de que se trata.
A fatalidade quiz que assim fosse, para o desprestigio de tudo e de todos?
Entrando propriamente na questão da prorogação, que elle, orador, repelle, como já disse, pela razão categorica que no seu espirito se impõe, de que sendo nullo o contrato, nulla é a prorogação, deseja dirigir algumas perguntas ao Sr. Ministro da Marinha porque, como sempre, quer ser muito leal na argumentação.
Em primeiro logar vê este doeu mento que o Sr. Ministro conhece de certo (Signal affirmativo ao Sr. Ministro) e que está a paginas 2 dos documentos:
"Em referencia ao pedido de prorogação: de prazos feito por essa companhia, encarrega-me S. Exa. o Ministro de dizer a V. Exa. que, attendendo á resolução da companhia de mandar proceder immediatamente á construcção da ponte do Catumbella, o Governo concede que os prazos a que se referem os artigos 45.° e 46.° do contrato approvado por decreto de 28 de novembro de 1902 e que eram contados de 1 de janeiro de 1903. passem a ser contados de 1 de novembro de 1904, sendo os restantes prazos que constam dos mesmos artigos prorogados por igual espaço de tempo e devendo os trabalhos de construcção recomeçar o mais tardar em 1 de janeiro de 1900. Esta prorogação não implica alteração alguma na contagem dos demais prazos que constam do mesmo contrato de concessão, com excepção dos fixados no n.° 6.° do artigo 4.°, que serão prorogados como os prazos dos artigos 45.° e 46.°
Se a companhia não cumprir as condições do contrato dentro do prazo assim prorogado, procederá o Governo como o proprio contrato preceitua para o caso da sua inexecução.
Deus guarde a V. Exa. - Illmo. e Exmo. Sr. Administrador Delegado da Companhia do Caminho de Ferro de Benguella, 19 de dezembro de 1903. - M. Terra Pereira Vianna.
Despacho de S. Exa. o Ministro. - Approvo. - Paço, 19 de dezembro de 1903. = M. Gorjão".
Não houve, portanto, nenhuma prorogação proposta e acceita pelo Governo, pergunta o orador?
Não sabe se a sua pergunta é bem comprehendida. Deseja ser muito claro, porque de outra maneira não nos entendemos.
O Sr. Ministro da Marinha (Raphael Gorjão): - Como mais minuciosamente explicará, quando tiver a honra de responder ao Digno Par, a companhia propoz, anteriormente á prorogação, outras bases que não chegaram a tornar-se effectivas. N'ellas não se fallava na ponte do Catumbella.
Depois d'isto é que o Governo entendeu que era acertado modificar as condições que primitivamente tinham sido apresentadas.
O Orador: - Não foi pois impertinente a pergunta que fizera a S. Exa.
O Sr. Ministro da Marinha (Raphael Gorjão): - Pelo contrario.
O Orador: - Mas então o que se infere d'aqui, é, que o Sr. Ministro, perdoe-lhe S. Exa., não informou devidamente a Camara, porque, d'este officio, aliás lacónico de mais, como demonstrará, fica se sabendo, que nenhuma outra prorogação ou acto tendente a alterar as condições da concessão se tinha effectuado entre (c) Governo e a Companhia.
Tinha o Sr. Ministro acceitado, ou não, as propostas anteriores a este despacho?
O Sr. Ministro da Marinha (Raphael Gorjão): - Não estava feita a concessão anterior.
As primeiras combinações ficaram annulladas. O Governo admittiu outras condições, se o concessionario não se compromettesse a construir a ponte do Catumbella, como depois se comprometteu.