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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 231

acautelando-o que não fizesse similhante concessão, addu-zindo gravissimas rasões para provar que a via larga não era necessaria para Cezimbra; e que, sendo um degrau para subir ao Pinhal Novo, seria a linha de Cacilhas a este sitio alfatnente prejudicial ao caminho de ferro do sul.

Desgraçadamente o sr. ministro tapou os ouvidos a este espirito de previdencia de homens tão competentes e peritos, e fez a concessão de via larga para a linha de Cacilhas a Cezimbra. Foi a segunda concessão; se a primeira fôra facil, esta já foi de costa acima.

O concessionario marchando sempre innocentemente aos pulinhos, não parou; deu novo pulinho, e foi pedir terceira concessão, a de uin ramal da quinta do Conde ao Pinhal Novo, entroncando no caminho de ferro do sul. Então a opposição dos engenheiros e membros da junta consultiva das obras publicas foi grande; levantaram-se unanimes como um só homem, e consultaram ao governo que não fizesse similhante concessão. Mas o sr. ministro tapou ainda os ouvidos ás fortes rasões d'estes homens tão competentes e peritos, e com o coração leve fez a terceira concessão. Com ella o concessionario chegou ao seu desideratum; tinha conseguido o grande fim, que desde o principio se tinha proposto; tinha um caminho de ferro de Cacilhas ao Pinhal Novo; o ramal para o alto de Cezimbra fôra sómente para architectar um castello de concessões, a fim de chegar a esta ultima, que era o seu verdadeiro alvo, a que sempre mirou, porque só ella lhe promettia grandes interesses.

Os engenheiros, sr. presidente, nada disseram sobre a legalidade ou illegalidade d'estas concessões. Então, como quiz o sr. ministro na questão da legalidade escudar-se com a auctoridade d'aquelles engenheiros, dizendo, que achavam a concessão da linha de Cacilhas a Cezimbra innocente e ineffensiva?

Consumou-se o escandalo. Parece que o concessionario devia estar satisfeito com as tres concessões. Mas, como não estava cansado de tantos pulinhos, veiu ainda dar outro, e pediu uma quarta concessão, para segurar bem as outras, e pôr a corôa a todas. Fallo da alteração da linha e do traçado feito e approvado, para o dirigir de novo pela costa, junto ao mar, de Cacilhas ao Caramujo e á quinta do Alfeite.

Esta quarta concessão precisa de explicação para se entenderem os prejuizos que vae causar ao caminho de ferro do sul.

Desde Cacilhas até ao Caramujo e quinta do Alfeite o mar é profundo; e a costa limpa, não tem todos, e com facilidade se póde fazer ali um caes para embarque e desembarque de passageiros e de mercadorias, com despeza infinitamente menor do que aquella que o governo ha de fazer para construir uma comprida ponte e um cães no Barreiro. E porque? porque do Caramujo até ao Barreiro o mar é cheio de todos e dizem os engenheiros, que tem mais de quinze metros de profundidade, e que o terreno, debaixo d'estes todos, é de alluvião, aonde muito difficilmente se poderão fazer as obras da ponte e caes com a segurança precisa; e acrescentam, que o governo terá de gastar com estas obras mais de 800:000$000 réis e que talvez chegue a gastar 1.000:000$000 réis; e que por isso póde o governo com menos despeza mudar a estação do Barreiro para Cacilhas, ou para algum ponto entre Cacilhas e Caramujo, como já tem aconselhado muitos e auctorisados engenheiros.

Mas, feita esta quarta concessão, que permittiu a alteração da linha, cujo traçado estava approvado, para ella agora correr pela costa do mar de Cacilhas ao Caramujo, o governo se privou do direito de o fazer, sem pagar pesadissima expropriação ao concessionario; porque a nova linha occupa todos os pontos da costa, em que o mar é profundo e sem lodo.

Assim que, sr. presidente, o governo fica encerrado na região d'esses todos, que se estendem do Caramujo ao Barreiro, e não póde passar para baixo do Caramujo na direcção de Cacilhas. Fica preso no Barreiro, como os antigos culpados estavam presos no pelourinho.

E o governo concedeu todas estas cousas com tão grande prejuizo do estado sem remuneração nenhuma. E queixa-se quando lhe chamam esbanjador!

E cedeu toda esta costa ao concessionario, privando-se, não só de poder mudar a cabeça do seu caminho do sul, mas de fazer outra qualquer empreza no mar junto a esta costa, e que precise da saida por esta para o seu caminho do sul.

E podia o governo fazer esta concessão, que equivale a uma pura doação, sem o concurso de uma lei?

Para se dar uma casa do estado a uma camara municipal ou a qualquer irmandade, sempre os governos têem pedido o concurso do poder legislativo; e para dar uma costa do Tejo tão comprida, julgou o sr. ministro que não precisava trazer esta doação ao parlamento; e não viu n'isto nem prejuizo, nem encargo para o thesouro. Que santa innocencia!

Onde estara a perspicacia e o talento do sr. ministro?

Cedeu, pois, o governo o direito de mudar a cabeça da sua linha do caminho de ferro do sul para algum dos pontos abaixo do Caramujo a Cacilhas e corre o risco, como logo provarei, de ficar privado da cabeça do caminho de ferro do sul, que lhe ha de fugir para Cacilhas, cabeça do caminho do concessionario.

E basta por agora notar a camara, que é mais perto de Lisboa a Cacilhas do que ao Barreiro.

Disse-nos o sr. ministro que a linha de caminho de ferro é só de Cacilhas a Cezimbra, porque a via da quinta do Conde ao Pinhal Novo, a entroncar com o caminho de ferro do governo, é apenas um ramal; mas, eu digo a s. exa. que a verdadeira linha é de Cacilhas ao Pinhal Novo.

Eu podia abandonar esta questão, porque tratando-se da legalidade como, tanto a linha de Cacilhas a Cezimbra, como a do Cacilhas ao Pinhal Novo, têem cada uma mais de 20 kilometros, é claro que uma e a outra são illegaes. Por este lado nada ganha o sr. ministro. Mas faz-lhe conta instar n'esta idéa da linha a Cezimbra, para poder justificar depois a concessão do ramal da quinta do Conde ao Pinhal Novo, porque sem linha d'onde parta o ramal, não póde existir este, que a suppõe preexistente.

Já eu disse, que a linha importante para o concessionario era a de Cacilhas ao Pinhal Novo, e não a de Cacilhas ao alto de Cezimbra; que aquelle fôra sempre o seu fim, porque entroncando no caminho do sul, lhe promette grandes lucros.

Que póde esperar o concessionario da linha a Cezimbra? Elle o disse, quando pediu a mudança d'esta linha de via reduzida para via larga, - a conducção do peixe para Lisboa, e dos marmores da serra da Arrabida, de que Lisboa não precisa para as suas edificações, porque os tem muito bons e mais perto.

E poderá esta conducção tão pequena dar lucros, que justifiquem a feitura da linha de Cacilhas a Cezimbra, sem o chamado ramal da quinta do Conde ao Pinhal Novo? Ninguem o dirá em boa fé, assim como ninguem dirá que a verdadeira linha, pela sua importancia, não é a de Cacilhas ao Pinhal Novo. O accessorio cede ao principal.

Seja, porém, a verdadeira linha, como quer o sr. ministro, a de Cacilhas a Cezimbra. Tem ella, como já disse, mais de 20 kilometros, e por isso foi a sua concessão illegal, porque o sr. ministro só póde conceder linhas até 20 kilometros de extensão, segundo o decreto de 31 de dezembro de 1864.

Já eu disse, que o fim do sr. ministro sustentando que esta é a verdadeira linha, era para ver se podia salvar a concessão do ramal partindo d'ella na quinta do Conde para o Pinhal Novo. Porém, a dizer a verdade, s. exa. nada ganha com isso.

Demonstrado, como deixo demonstrado, que a concessão d'esta linha fôra illegal, e sendo nullo tudo o que é illegal,