4 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
que o governo ha de proceder com a energia que o teu dever e as circumstancias lhe impõem.
Referiu-se o digno par a uma associação que não discuto aqui —a liga liberal.
Essa associação é tanto quanto eu sei, um agrupamento politico formado de paizanos e de militares; não é exclusivamente de militares.
Póde ser que não esteja legalmente constituida conforme as leis do reino.
Ignoro se está ou não. Como ministro da fazenda careço de competencia para interferir em similhante assumpto.
Se está legalmente constituida, não ha que dizer, porque a todos os cidadãos é licito aggremiarem-se a fim de discutirem Os negocios publicos, nem ha, que me conste, lei que lhes negue esse direito.
O sr. Camara Leme: — Peço a v. exa. que leia a portaria que vem numa ordem do exercito de 1886, em que se prohibe aos militares reunirem-se para tratar de politica.
O Orador: — Essa portaria prohibe as manifestações politicas feitas collectivamente por militares.
Já confessei á camara a minha incompetencia no assumpto, mas não me consta que exista lei alguma que prohiba a um militar pertencer a uma associação politica; o que as leis prohibem são as manifestações collectivas dos militares, quer sejam politicas, quer não. Isto mesmo conhece perfeitamente o digno par, que tem pertencido a mais de um gremio politico.
Se a associação a que s. exa. se referiu está legalmente constituida, o governo não tem nas leis existentes os meios precisos para impedir que ella continue. Entretanto se alguns dos seus membros pertencentes ás classes civil ou militar praticarem actos contrarios á legalidade, não lhe faltará a força para os fazer entrar a todos na ordem.
Se a associação estiver legalmente constituida, póde continuar a existir, comtanto que se mantenha dentro dos preceitos que as leis lhe impozerem.
Não posso desconhecer que as questões em que s. exa. fallou, são importantes. Communicarei aos meus collegas tudo quanto se disse, mas acrescento: Não terá este governo prestado alguns serviços ao paiz?
Não são tantos quantos elle desejaria prestar; mas é facto que, no tocante á ordem, o espectro da revolta na praça publica desappareceu e não me parece que possa haver o minimo receio de qualquer perturbação.
O sr. Antonio Candido: — Já tinha desapparecido.
O Orador: — A desordem violenta havia desapparecido mas a agitação dos espiritos permanecia e para acalmul-a era preciso tempo.
(Aparte.)
Não estou accusando ninguem.
Houve uma revolta. Essa revolta deixou um profundo rastro, uma consideravel agitação nos espiritos. A pouco e pouco, pelo trabalho, pelo patriotismo, pelo bom senso de todos, uma tal ou qual agitação que ficara foi-se attenuando, foi desapparecendo, e hoje já não existe, apesar da crise economica que o paiz atravessa. Não sei se a attenuação do mal a que me refiro começou no tempo do ministerio anterior e se consolidou nos primeiros tempos do ministerio actual; o certo é que cada um pela sua parte, contribuiu para os resultados que estamos presenciando.
(O sr. ministro não revia as notas do seu discurso )
O sr. Ornellas: — Desejava dirigir-me ao sr. ministro das obras publicas, mas como s. exa. não está presente, o caso a que tenho de alludir é da maior urgencia, e o governo está representado, vou chamar a sua attenção, esperando que o sr. ministro da fazenda se digne transmittir ao seu collega as observações que vou apresentar e confiando que se não demorem as promptas providencias que requeiro.
Por noticias que recebi, e que reputo fidedignas, sei que os ultimos temporaes causaram no porto de abrigo do Funchal damnos importantissimos, e que, por consequencia, torna-se de urgencia acudir ao mal.
Não existia, nem existe lá actualmente, engenheiro hydraulico competente que determine a natureza dos prejuizos, e assim eu desejava que o sr. ministro das obras publicas se informasse a este respeito com pessoas competentes, visto que deve saber perfeitamente o que se deu na ilha, por intermedio dos seus delegados.
Peço ao governo que mande proceder sem demora ás obras necessarias n’aquelle porto de abrigo, tanto mais que serão de muito maior alcance e de maior despendio se porventura não forem immediatas as providencias que solicito, e convem exigir a responsabilidade dos empreiteiros dentro do praso marcado no contrato.
Pedi, pois, a palavra para chamar a attenção do governo para este ponto, e espero que s. exa. não deixarão de adoptar immediatamente as providencias que o caso exige.
O sr. Ministro da Fazenda (Marianno de Carvalho): — Quando visitei a ilha o anno passado, já então se dizia que o porto de abrigo do Funchal não estava em boas condições, e dizia-se tambem que ainda não tinham occorrido temporaes que dessem a prova de que essa obra estava em condições de poder resistir aos embates do oceano.
Creio que o sr. ministro das obras publicas já terá adoptado as medidas necessarias; entretanto eu transmittirei ao meu collega as observações do digno par, acrescentando, como opinião individual, que entendo ser indispensavel mandar á ilha não só uru engenheiro hydraulico, como tambem um arboricultor.
É necessario nãs só mandar proceder ás obras do porto de abrigo, como tambem a arborisação da serra, e tanto uma como outra cousa se fará, tendo sempre em attenção as nossas circumstancias financeiras.
Para o desenvolvimento d’aquelle porto é preciso attender ao regimen das aguas e a todas as condições de solidez e duração nas obras, assim como é preciso attender a outros elementos de desenvolvimento importantes e de que deve resultar a riqueza d’aquella ilha.
Ao sr. ministro das obras publicas transmittirei as observações do digno par.
(O sr. ministro não reviu as notas do seu discurso.}
O sr. Ornellas: — Sr. presidente, dou-me por satisfeito com as declarações do sr. ministro da fazenda que não só tem conhecimento do assumpto, mas parece animado das melhores intenções de attender ás necessidades da ilha da Madeira quanto as circumstancias do thesouro o permitiam.
Restringi o meu pedido ao que era mais urgente.
Espero que o nobre ministro, tomando em consideração as minhas observações, mande um engenheiro hydraulico para as obras do porto, e, se possivel for, um silvicultor para tratar da arborisação das serras; então os habitantes da Madeira ficarão satisfeitos e não terão motivos de queixar-se do abandono a que todos os governos tem votado os mais caras interesses d’aquella ilha.
O sr. José Luciano de Castro": — Sr. presidente, o digno par, o sr. D. Luiz da Camara Leme, enganou se pensando que eu vinha n’esta occasião levantar perante a camara a questão de fazenda e dirimir responsabilidades em relação ao passado do actual sr. ministro da fazenda ou de qualquer outro.
A minha intenção é mais modesta. O meu pensamento é simplesmente chamar a attenção da camara e do sr. ministro da fazenda para o estado da fazenda publica, e sobretudo pedir ao sr. ministro que se digne dar á camara alguns esclarecimentos, as informações que poder, sem inconvenientes, dar, para tranquillisar o espirito publico ou preparal-o para qualquer solução mais ou menos violenta e extrema que porventura a gravidade as circumstancias ha já de impor ao paiz.
Eu não esperava que o sr. D. Luiz da Camara Leme escolhesse este momento para dirigir uma accusação tão