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N.º 42

SESSÃO DE 28 DE MARÇO DE 1881

Presidencia do exmo. sr. João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens (vice-presidente)

Secretarios - os dignos pares

Visconde de Soares Franco
Eduardo Montufar Barreiros

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta da sessão antecedente. - A correspondencia é enviada ao seu destino. - Discursos dos srs. presidente do conselho (Rodrigues Sampaio), visconde de S. Januario, Ferrer, visconde de Seabra, Henrique de Macedo, ministro da fazenda (Lopo Vaz), ministre da guerra (Sanches de Castro), ministro da marinha (Julio de Vilhena), Costa Lobo, conde de Rio Maior, Aguiar e visconde de Chancelleiros.

Ás duas horas e um quarto da tarde, sendo presentes 51 dignos pares, o. sr. presidente declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão precedente, julgou-se approvada na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Mencionou-se a seguinte:

Correspondencia

Um officio da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição de lei sobre fianças criminaes e soltura de réus.

Outro com a proposição relativa á bibliotheca da universidade de Coimbra.

(Estava presente todo o ministerio.)

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Rodrigues Sampaio): - Sr. presidente, tendo-se levantado um conflicto entre a camara dos dignos pares do reino e o ministerio transacto, o meu digno antecessor julgou dever depositar as pastas nas mãos de Sua Magestade El-Rei.

Em consequencia d'isto, foi chamado para organisar o novo gabinete o sr. Fontes Pereira, de Mello, o qual não acceitou essa honra.

Fui eu então chamado para o mesmo fim, e apresento hoje á camara dos dignos pares do reino o ministerio que está aqui perante ella.

Não fazemos programma, porque desejamos antes praticar alguma, cousa boa e util, do que fazer promessas que talvez não possamos cumprir.

Não tenho a dizer á camara senão que ella me conhece ha muito, assim, como conhece tambem os meus dignos collegas que, se são novos na idade e no governo, todavia já são maiores na gerencia de diverros negocios publicos.

Desejâmos merecer a benevolencia d'esta camara, e acceitaremos todas as suas advertencias como conselhos que podem concorrer para o bem geral.

Não faremos cousas grandes, mas temos desejos de fazer cousas boas e uteis; e se tivermos o apoio de ambas as casas do parlamento, sustentar-nos-hemos no poder;, se o não tivermos, cumpriremos o nosso dever, entregando a gerencia dos negocios publicos á quem melhor a possa desempenhar.

Pela minha parte, direi que seria isso para mim uma satisfação particular, mas o dever obriga, e eu não sei afastar-me do meu posto de honra, nem deixar de praticar tudo aquillo que possa ser util á nação.

O sr. Visconde de S. Januario: - Sr. presidente, tenho a fazer uma declaração por parte do gabinete demissionario, ao qual tive a honra de pertencer, declaração que já foi feita na outra casa do parlamento pelo illustre
ex-presidente do conselho de ministros, e que é do meu dever repetir aqui.

S. exa. declarou na camara dos senhores deputados qual a rasão que moveu o ministerio anterior a apresentar a sua demissão, que foi acceita.

Eu, auctorisado pelos membros que foram d'aquelle gabinete, tenho a dizer á camara dos dignos pares que o ministerio entendeu que, em presença da attitude d'esta casa do parlamento, não possuia as condições necessarias e indispensaveis para gerir os negocios publicos com vantagem para o paiz.

Foi este o motivo que o levou a apresentar a sua demissão.

Faço esta declaração, sem idéa de censura, mas unicamente como exposição dos factos.

Pela parte que me toca direi simplesmente que mantenho perante o governo actual uma attitude de opposição franca e leal, mas não impeditiva.

O sr. Visconde de Seabra: - Felicita-se e felicita o paiz, por ver sentado nas cadeiras do governo una grupo de homens tão distinctos pela sua elevada intelligencia, pelo seu saber, pelo seu caracter e pelo seu acrisolado patriotismo.

Tem a convicção de que esta sua bem nascida e bem fundada esperança não será lograda.

Entende que o governo faz bem em não apresentar programma, porque elles estão desacreditados! Tão sensato é o que faz promessas temerarias, como o que acredita n'ellas.

O governo, cumprindo a carta constitucional, tem feito o melhor programma que se póde imaginar.

Se os ministros não precisam apresentar programma, porque das suas obras é que depende tudo, já não acontece o mesmo aos que têem de lhe prestar o seu apoio, que para nenhum homem de bem póde ser incondicional.

O programma do orador, e de todos os que pensam como elle, que julga serão quasi todos os que têem assento na camara, resume-se em uma grande synthese, e esta é o cumprimento de todos os deveres legaes e profundo respeito para com todos- os direitos. Se os srs. ministros se afastarem deste caminho, não póde
acompanhal-os.

Esta synthese desdobra-se em milhares de hypotheses, que não apresentará agora para não alongar o seu discurso; mas pede licença para fazer algumas ligeiras observações sobre dois ou tres pontos, que lhe preoccupam mais o espirito.

Primeiro que tudo é necessario se faça justiça completa e se emendem os gravames e injustiças feitas.

É necessario que se saiba que o espirito partidario, que é uma necessidade legitima no systema representativo, tem balisas, que não se podem ultrapassar.

Não recommenda uma severa economia com os dinheiros publicos, que são sangue do povo, porque essa é uma condição indispensavel dos legares que occupam os srs. ministros.

S. exas. hão de marchar n'esse terreno, e não se esquecerão de que todas as nossas aspirações, por mais grandiosas que sejam, não podem ultrapassar os seus naturaes limites, salvo se se quizesse proceder como o, selvagem que corta á arvore para colher o fructo.

Na ordem politica observa que duas idéas se agitam: a

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da reforma do pacto constitucional em alguns dos seus artigos, e a da idéa nova, a que incorrectissimamente se chama republica. Tocará ligeiramente estes dois pontos.

Emquanto á reforma de alguns artigos da carta, diz que com muita satisfação ouviu o auctor principal desta idéa declarar que a deseja, mas dentro dos limites legaes.

Não póde haver separação, neste ponto, entre o partido regenerador e o partido constituinte, porque a propria carta reconhece esse principio.

Com relação ás nossas circumstancias, considera a chamada idéa nova como uma planta exotica, a que faltam todas as condições para se radicar e poder prosperar n'este paiz.

Se se quizer transplantar para aqui, faltando-lhe, como lhe faltam, as condições de que ella carece, ai d'aquelles que a propagam e d'aquelles que hão de ser victimas d'ella.

Se querem liberdade, a maxima liberdade, compativel com as circumstancias do nosso paiz, que lhes falta na carta constitucional? Não têem ali meios para satisfazer todas as necessidades publicas?

A carta, entendida como deve de ser, executada fielmente, é a melhor republica, cercada de todas as instituições livres.

Como as côrtes vão ser adiadas, pede aos seus collegas que lhe permittam levar para a sua casa uma exigua folha da capella immarcessivel de louros com que se tem coberto esta camara. Esta pequena folha servirá para ter o orgulho de enfeitar o seu arado, e dizer:

"Com esta gloria me contento, que a minha terra amei e a minha gente".

(O discurso de s. exa. será publicado quando o devolver.}

O sr. Ferrer: - Sr. presidente, ha dois annos, quando saiu dos conselhos da corôa o ministerio regenerador, tive occasião de estabelecer aqui alguns principios, que ainda hoje entendo que têem a sua applicação.

Disse eu que, quando havia uma crise, era necessario discutil-a em toda a sua amplitude, não só pelo lado dos que saíam como pelo lado dos que entravam.

Os ministros não são só responsaveis pelo que fazem ou deixam de fazer durante a sua administração, são responsaveis tambem pelo seu nascimento e pela sua morte.

Os ministros devem nascer, viver e morrer abraçados á constituição do estado e aos estylos e praticas parlamentares.

Sr. presidente, então pareceu-me que o ministerio regenerador tinha subido aos conselhos da corôa inconstitucionalmente, e agora julgo que o mesmo aconteceu.

Parece que uma fatalidade persegue os governos d'este partido.

Entram e saem, vivem e morrem, sempre em completa contradicção cem os preceitos da carta constitucional.

Sr. presidente, n'este momento occupar-me-hei unicamente do ministerio que acaba de entrar pela primeira vez n'esta casa, para provar o que já asseverei, fazendo a narração da factos que precederam a organisação do mesmo ministerio.

A narração dos factos é velha. Todos sabem que desde ha muito está reconhecido como chefe do partido regenerador o sr. Fontes Pereira de Mello, cavalheiro, para mira, de toda a respeitabilidade, e creio que igualmente para toda a camara. (Apoiados.)

Sr. presidente, o sr. Fontes apresentou ha poucos dias nesta camara uma moção de censura ao partido progressista. Esta moção foi realmente considerada como uma indicação ao chefe do estado. Esta foi a minha opinião; e fiquei muito satisfeito ao ver que um honrado e experimentado caracter como é v. exa., não -só pelos seus talentos como pela pratica parlamentar, era da mesma opinião.

O que disse v. exa., sr. presidente, quando o sr. Fontes apresentou a sua proposta?

Disse que ella era um indicador politico. E era verdade.

Portanto, muito bem andou o chefe do estado mandando chamar o sr. Fontes para organisar o novo ministerio; attendeu a esta indicação parlamentar, visto que s. exa. era o chefe do partido opposicionista, era o auctor da moção de censura.

Mas, o que aconteceu, sr. presidente?

Foi o sr. Fontes não acceitar a missão de que Sua Magestade o encarregára.

O sr. Fontes Pereira de Mello: - Peço a palavra.

O Orador: - N'esta recusa, permitta-me o digno par que lhe diga que andou menos correctamente, porquanto a s. exa. assistia-lhe o dever de acceitar esta missão, e desempenhar-se d'ella. Desde que um partido ataca o governo de outro partido, o chefe da opposição tem obrigação rigorosa de acceitar a missão de organisar governo e governar. (Apoiados.)

Se assim não fôra, podia dar-se o absurdo de não haver quem governasse, o que seria a maior de todas as infracções constitucionaes.

O que aconteceu, porém, no caso de que se trata? Foi encarregado o sr. Antonio Rodrigues de Sampaio, homem por quem tenho o maior respeito e consideração, pelos seus antigos serviços á liberdade.

Mas, a verdade é que a favor do sr. Sampaio não havia nenhuma indicação que o recommendasse ao chefe do estado para ser encarregado da organisação do gabinete; não sei como as cousas se passaram no palacio real, não sei se houve indicação ou conselho do sr. Fontes para que o chefe do estado encarregasse o sr. Sampaio da organisação do governo, ou se o sr. Fontes annuiu ou consentiu na delegação no sr. Sampaio; mas o que é publico e notorio é que o sr. Fontes fez todas as diligencias possiveis para organisar o ministerio como elle se acha, e da narrativa dos factos se deduz que o actual ministerio nasceu da falta do cumprimento de um dever por parte do sr. Fontes.

Sr. presidente, não só por este peccado original do ministerio, mas tambem porque são differentes os principios e as tendencias dos dois partidos, do ministerio actual, e do partido progressista, nós não podemos deixar de fazer opposição ao actual governo; (Apoiados.) mas, sr. presidente, a nossa opposição será leal e franca, na tribuna do parlamento, na tribuna da imprensa, mas nunca nas das com a arruaça, (Apoiados.) não a fizemos nem nunca a havemos de fazer. (Apoiados.)

A opposição ha de marchar na linha recta, traçada pelos principios da justiça, e pela honra e conveniencias da nação; nada mais, nem nada menos. (Apoiados.)

Sr. presidente, muito poderia eu fallar sobre o imposto de rendimento, e do mal fadado, para não lhe dar outro epitheto, tratado de Lourenço Marques; mas ficará para outra occasião; por agora, cumpre-me indicar á camara e ao paiz, que em presença das declarações do governo, feitas na outra casa do parlamento, tanto o tratado de Lourenço Marques como o tributo de rendimento ficam de pé.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Henrique de Macedo: - Sr. presidente, em presença das declarações feitas pelos dignos pares, sr. visconde de S. Januario e Ferrer, depois das declarações sim imantes hontem feitas na outra casa do parlamento pelo sr. Anselmo Braamcamp, a quem reconheço como meu chefe politico, reputaria eu inutil vir a esta casa definir a minha attitude diante do actual gabinete, se entendesse dever baseal-a em motivos exclusivamente partidarios; porque, comquanto a minha entrada nesta assembléa seja de recente data, creio que os meus antecedentes politicos são sufficientemente conhecidos pelos membros d'ella, para que a minha posição politica não carecesse de ser explicada, se ella porventura derivasse, repito, de motivos exclusivamente partidarios; não succede, porém, assim; e, se tomei a palavra n'este momento, foi não só porque precisava dirigir algumas perguntas a differentes membros do novo

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governo, e enunciar francamente a minha opinião com respeito aos acontecimentos que produziram a ultima crise politica e em relação á solução d'ella, mas muito principalmente porque entendi dever expor a esta camara e ao paiz os motivos pelos quaes, independentemente de quaesquer considerações de politica partidaria, sou levado a declarar-me desde já em opposição franca e aberta, mas leal e moderada, ao actual ministerio.

Sr. presidente, no meu entender, a missão d'esta camara não é principalmente politica; o papel que a nossa constituição e o bom senso lhe destinaram é, segundo creio, sobretudo um papel de revisão legislativa.

Não quero significar com estas palavras que á camara dos dignos pares não assista o direito de assumir uma attitude politica em caso algum; entendo, porém, que ella só póde e deve fazel-o em circumstancias excepcionaes, extraordinarias, quando a queda, a ascenção no poder, ou a manutenção n'elle de um determinado grupo politico, se traduzam em manifesta calamidade publica, em verdadeiro e evidente perigo para as instituições ou para a ordem social.

E' portanto convicção minha, bem definida e radicada, que o voto de um membro d'esta casa raro poderá determinar-se por fundamentos exclusivamente partidarios.

Em presença do actual gabinete, e apesar de o ver constituido por cavalheiros filiados na sua grande maioria em um partido politico contra o qual sempre militei, podia eu, devia até, segundo a ordem de idéas que acabo de expor, e se outras fossem as circumstancias, tomar uma posição de expectativa benevolente, aguardar os actos do governo antes de o julgar; as condições especiaes em que os actuaes ministros subiram ao poder determinam-me, porem, uma posição inteiramente differente, como logo explicarei.

A resolução da ultima crise, sr. presidente, reputo-a eu perfeitamente constitucional; e não se imagine que, exprimindo-me por esta fórma, esteja em contradicção com o meu respeitavel amigo e venerando correligionario, o sr. Ferrer, porque pretendo significar unicamente com estas palavras que o alto poder do estado a quem, segundo a constituição, incumbe a escolha dos ministros responsaveis, não podia, em presença das circumstancias em que se deu a crise, e muito principalmente em vista da singularissima posição assumida pelos cavalheiros que compõem o estado maior dos differentes partidos politicos que a produziram proceder de maneira que mais se harmonisasse com os preceitos e praxes constitucionaes.

Ao poder moderador, portanto, segundo o meu modo de ver, nem mesmo moralmente póde imputar-se qualquer responsabilidade pelo modo como a crise foi resolvida, porque os homens e as cousas se conspiraram para que o chefe do estado não tivesse, constitucionalmente fallando, dois caminhos abertos diante de si, duas soluções possiveis do problema.

Mas, sr. presidente, se eu entendo que se não póde duvidar da constitucionalidade com que foi resolvida a crise, penso tambem, por outro lado, que ella foi nos seus antecedentes como nos seus consequentes, que são a formação do ministerio, tal como elle se acha constituido, perfeitamente illogica.

A crise, sabemol-o todos, foi provocada por um facto tambem de todos nós conhecido. O sr. Barjona de Freitas apresentou aqui uma moção de censura ao governo, transacto, moção que depois foi substituida por outra, mais suave na fórma, mas evidentemente a mesma no pensamento e nos intuitos, apresentada pelo illustre chefe do partido regenerador. Desde esse acto, que é um, senão o primeiro antecedente da crise, começa esta de mostrar-se manifestamente illogica.

Os differentes grupos de opposição ao governo transacto que votaram aquella segunda moção, e que nesse proposito se colligaram, parece que formaram tal colligação para o fim unico e exclusivo de derrubar o governo. Esqueceram as opposições que estavam pendentes graves problemas de governação publica, e não sómente negocio importantissimo de administração interna, como tambem questões internacionaes de momento. E no ardor da lucta e com o fito na sonhada victoria, esqueceram-se tambem essas opposições de que não estavam de accordo na solução de um pé quer d'esses problemas pendentes.

Succedeu, portanto, o que a logica pedia que succedesse; no dia seguinte áquelle em que tinham colhido as palmas da victoria, esses grupos, profundamente divididos de idéas em tudo que não fosse a guerra a todo o transe ao ministerio transacto, não poderam accordar-se para formar um gabinete que representasse a supposta unidade de idéas de uma colligação em que as não havia communs, porque nascêra de um principio negativo, do exclusivo intuito de derrubar a administração transacta.

Succedeu o que o illustre chefe do partido regenerador parece não ter previsto, mas o que não era licito á largueza de vistas propria de um homem de estado como o sr. Fontes, deixar de prever, de prevenir ou de impedir dominando as impaciencias dos seus proprios amigos; succedeu que o partido regenerador teve de acceitar sosinho o poder, apesar das declarações formaes que o sr. Fontes, com a sua voz que eu até então suppozera auctorisada, fizera poucos dias antes n'esta casa, e das palavras proferidas por um dos actuaes ministros, o sr. Lopo Vaz, na outra casa do parlamento, onde, em nome do seu partido e declarando que fallava nos nomes dos chefes d'elle, disse que a occasião constitucional de subir ao poder ainda não chegára nem chegaria na presente sessão parlamentar para o partido regenerador.

E o sr. Lopo Vaz, que então repetiu com formal e singular insistencia essas declarações, ahi está nas cadeiras do governo!

E o sr. Fontes, e o illustre ministro que ha poucos dias reputavam por certo inconveniente para a causa publica (porque se assim o não entendessem não fariam de certo taes declarações) que o partido regenerador succedesse ao gabinete progressista, cooperaram manifestamente e de perfeito accordo para que essa solução tivesse logar.

Portanto os proprios actos, as repetidas afirmações dos illustres ministros que se sentam n'aquellas cadeiras, affirmações feitas por vozes auctorisadas tanto n'esta como na outra casa do parlamento, me dão o direito de deduzir que a solução da crise, alem de illogica, imprevista e impensada, foi uma solução que tanto os ministros como os seus mais illustres correligionarios antecipadamente reputaram e affirmaram inconveniente para a causa publica.

Na enumeração dos motivos que fazem com que eu me colloque e declare desde já em opposição ao novo gabinete, motivos por tal fórma concludentes e imperiosos que, ainda que me encontrassem desprendido de quaesquer laços partidarios, me inhibiriam de prestar-lhe o meu apoio, ou ainda de recebei-o ao menos com expectativa benevolente, permittam-me v. exa., consinta-me a camara, que eu seja um pouco mais extenso e demorado do que desejaria sel-o n'esta occasião.

Os negocios e os assumptos de alto interesse publico, pendentes perante uma ou outra das casas do parlamento, no momento em que com tanta imprudencia e maior imprevidencia se provocou a crise de que resultou a queda do gabinete transacto, eram muitos e importantes, e a respeito de cada um d'elles, pelo menos a respeito dos de maior vulto, vejo eu representado no gabinete, apesarada sua quasi homogeneidade politica, o antagonismo mais completo e radical. Senão vejamos: em relação ao imposto de rendimento, assumpto tão largamente discutido, no parlamento, na imprensa, e nas reuniões populares, e que na opinião dos membros do actual governo, na dos seus correligionarios, e ainda na d'aquelles que, sem o serem, contribuiram para os levar áquellas cadeiras, constituia uma das mais graves causas de agitação da opinião publica; em relação ao imposto de rendimento, sr. presidente, quer v. exa., quer a camara

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saber quantas e quão diversas opiniões se acham representadas no seio d'esse gabinete homogeneo?

N'aquellas cadeiras vejo eu, na sua qualidade de novo ministro da justiça, o digno par o sr. Barros e Sá, que foi o relator... não ... que substituiu o relator e desempenhou o papel d'este, sustentando nesta camara o parecer da commissão de fazenda sobre o imposto de rendimento; vejo tambem ali como presidente do conselho o sr. Sampaio, que votou n'esta casa a favor do projecto do imposto de rendimento salvo na parte relativa ás inscripções, se me não falha a memoria; e vejo por outro lado, fazendo parte do mesmo ministerio, o sr. Hintze Ribeiro, que ha poucos dias ainda declarava na outra casa do parlamento que o imposto de rendimento era o mais iniquo, o mais vexatorio de todos os impostos, um imposto selvatico até.

E é em taes circumstancias, com tal homogeneidade de vistas, de idéas e de intuitos sobre assumpto de tanto momento, sr. presidente, que o sr. ministro da fazenda vem dizer ao paiz e ao parlamento, como o fez hontem na camara dos senhores deputados, que vae estudar esse imposto, na idéa de lhe supprimir legislativa ou regulamentarmente os vexames, negados por alguns dos seus collegas, exagerados e consubstanciados por outros com a propria natureza de tal contribuição!!

É claro, portanto, que em tal e tão importante questão, em assumpto de tamanho vulto, e que tão prompta resolução exige "ao só pela intensidade com que preoccupa actualmente a opinião do paiz, como pelas consequencias que da sua solução hão de advir para o estado da fazenda publica, existem as maiores divergencias no seio do gabinete; que alguns dos srs. ministros têem sobre ella opiniões perfeitamente contradictorias; outros não têem sequer opinião.

Pende, porém, perante esta camara um outro assumpto de não menor importancia e gravidade, o tratado de Lourenço Marques, já approvado na outra casa do parlamento. Sobre tal assumpto disse na ultima sessão da camara dos senhores deputados o sr. presidente do conselho, que não exporia ali a opinião do governo, porque o tratado de Lourenço Marques já não estava em discussão n'aquella camara, e que quando elle viesse a ser discutido n'esta casa, o governo manifestaria então a sua opinião, qualquer que ella fosse, mas em sessão secreta.

Disse mais s. exa. na mesma sessão e logar: que o governo não queria comprometter desde já a sua opinião sobre esse assumpto, porque não queria affirmar hoje opiniões que, mais tarde, por quaesquer circumstancias, tivesse de modificar. Este foi, pelo menos, o sentido das declarações do sr. Sampaio; as palavras não affirmo eu que fossem as mesmas; e se tal não foi o sentido das declarações do sr. presidente do conselho, a. exa., que me está ouvindo, poderá rectifical-o se o tiver por conveniente.

Mas, sr. presidente, estas declarações do sr. presidente do conselho demonstram no governo tal irresolução, ou tão singular dissimulação, que realmente não me parece admissivel em assumpto tão debatido e conhecido. (Apoiados.) Mas ha mais, sr. presidente, perguntado s. exa. directa e indirectamente sobre o modo como o governo tencionava proceder em relação ao tratado, se ao meãos era sua intenção adiar a discussão d'elle, s. exa. houve por bem responder muito evasivamente que o governo não adiava por agora o tratado; mas que, tencionando pedir a El-Rei o immediato adiamento das côrtes, esse facto importava o adiamento da discussão do tratado.

É claro, porém, e tambem o sr. presidente do conselho o declarou, que o adiamento das côrtes não póde ser por um longo praso, porque dentro em pouco carecerá o governo de vir ao parlamento pedir que lhe vote o orçamento ou a lei de meios, e não era de certo com relação a este adiamento de meia duzia de semanas que o governo era interpellado na outra camara. Portanto a resposta do sr. presidente do conselho não podia satisfazer ninguem e por nenhum modo.

Direi mais, sr. presidente, e ainda com respeito ás declarações obscuras e evasivas do sr. presidente do conselho em relação ao assumpto, não me parece que por ter sido o tratado discutido e votado na outra casa do parlamento, caso por esse facto inhibido qualquer membro d'aquella ou d'esta assembléa de interrogar o governo sobre qual seja o seu pensamento politico com relação á marcha que tenciona seguir a respeito do tratado, se o acceita ou não.

E a esta pergunta podia o sr. presidente do conselho responder em sessão publica.

Nem as perguntas dos srs. deputados, nem a resposta do sr. presidente do conselho, qualquer que ella fosse, comtanto que se limitasse a exprimir precisamente uma opinião e resolução do governo sobre o assumpto constituiriam discussão do assumpto, que por sua natureza só póde ser discutido em sessão secreta.

Se taes perguntas e respostas fossem materia reservada para sessão secreta, raro seria licito ás commissões de negocios externos de uma ou de outra casa do parlamento emittir pareceres publicos, de accordo ou em desaccordo com o governo, ácerca dos assumptos que lhe são submettidos.

O que se deduz portanto de tudo isto, sr. presidente, é que o governo não tem, ou não ousa emittir opinião sobro este assumpto, que com outros lhe serviu e aos seus correligionarios, amigos e ex-amigos, de cavallo de batalha para excitar a opinião contra a situação transacta.

Ainda n'outro problema de governação publica, que se bem que de menor gravidade e importancia do que aquelles a que acabo de me referir, tem ainda assim um certo valor de occasião, vejo eu representadas no gabinete opiniões diversas, ou antes perfeitamente contradictorias. Refiro-me ao contrato para a navegação a vapor entre a metropole e as nossas provincias de Africa.

O sr. Hintze Ribeiro actualmente ministro das obras publicas commercio e industria, condemnava ha pouco na outra camara esse contrato, increpando pelo facto de o ter elaborado e assignado o respectivo ministro em termos, não direi virulentos, mas pelo menos violentos. Da mesma opinião que s. exa. era n'esta camara o sr. Barros e Sá, hoje ministro da justiça, assignando como relator um parecer da com missão de legislação em que esse contrato foi qualificado de illegal.

Per outro lado o sr. Julio de Vilhena, que hoje se acha sentado ao lado de s. exa. na qualidade de ministro da marinha, tem a sua opinião presa ao mesmo contrato de um modo favoravel como ajudante que era do procurador geral da corôa que interveiu de officio na outorga d'elle.

É manifesto, por conseguinte, o antagonismo entre as opiniões enunciadas ainda recentemente pelos differentes membros do gabinete, a que acabo de me referir, sobre este assumpto de alto interesse colonial.

Seja-me permittido agora dirigir me ao sr. ministro da guerra, referindo-me a um assumpto que serviu de base a larga discussão politica n'esta casa, assumpto que, se não logrou agitar, impressionar sequer, a opinião publica, teve o especial condão de inflammar e enthusiasmar os espiritos irrequietas de alguns dignos pares da opposição ao gabinete transacto.

Refiro-me ao projecto de lei concedendo um bill de indemnidade ao ministerio demissionario, e estendendo a concessão feita a alguns coroneis da arma de infanteria pelo decreto de 10 de setembro de 1880, e por outros que se lho seguiram, a muitos outros militares.

Desejaria que o sr. ministro da guerra se dignasse dizer-me se approva o additamento proposto pelo sr. Fontes ao projecto de lei apresentado pelo sr. Camara Leme.

Este projecto, de que foi relator o sr. Barros e Sá, tinha por unico fim dar sancção legislativa ás concessões feitas

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pelo governo nos decretos de 10 de setembro e seguintes, e releval-o da responsabilidade em que incorrera por ter exorbitado das suas attribuições publicando-os.

O sr. Fontes, porém, propoz, e as commissões respectivas acceitaram, que as concessões feitas por taes decretos a alguns coroneis de infanteria se tornassem extensivas a todos os officiaes de outras armas que estivessem nas mesmas circumstancias d'aquelles a que se referiram o decreto de 10 de setembro e outros.

O que eu desejo saber é se o sr. ministro da guerra acceita ou não este additamento, já acceite peio seu illustre collega da justiça?

Desejaria tambem que algum dos membros do governo se dignasse explicar-me a seguinte contradicção, ou pelo menos o que ao meu espirito se affigura tal.

Provocados alguns dos actuaes ministros, então simples deputados, a apresentarem na outra casa do parlamento um bill de indemnidade sobre o assumpto a que acabo de .me referir, ou a promoverem por taes factos a accusação do governo, s. exas. negaram-se a fazel-o, e limitaram-se a combatel-o com ardor por occasião de uma simples interpellação sobre o assumpto.

Pelo contrario, n'esta casa, a meu ver talvez a menos idónea para propor e votar um bill de indemnidade ao governo, por qualquer motivo, foi apresentado o bill a respeito da referida questão dos coroneis.

D'estes factos affigura-se-me licito deduzir que no modo de proceder e pensar dos membros do actual governo, sobre as attribuições e direitos das duas casas do parlamento em questões d'esta ordem, ha uma contradicção essencial, que eu desejaria que fosse explicada.

E visto como estou tratando de um assumpto relativo ao exercito não virá de certo fóra de proposito dirigir tambem algumas perguntas, que n'este momento me occorrem, ao sr. ministro da guerra, cuja resposta, se s. exa. se dignar dal-a clara, precisa e terminante será, por certo, de summo interesse para esta camara e para o paiz que nos escuta.

Diz-se, e fui eu um dos que já o disse, ha pouco, que o actual gabinete é exclusivamente regenerador e, portanto, homogeneo.

O sr. ministro da guerra, porem, não é tão conhecido na vida publica, ou antes nas luctas politicas, que a sua filiação partidaria não deixe nascer no espirito de alguns, no meu, por exemplo, algumas duvidas.

Em 1878, ha eu já e assiduamente, bem que por nenhuma fórma partilhasse as doutrinas politicas d'elle, um jornal que ainda hoje leio por vezes, e sempre com o mesmo interesse e intuitos, senão com a mesma assiduidade. Refiro-me á Democracia.

N'um dos numeros d'esse jornal deparei eu com uma lista de candidaturas, não direi officiaes mas apoiadas pelo governo, que então era regenerador, e n'essa lista encontrava-se o nome do sr. Sanches de Castro ao lado dos nomes dos srs. Osorio de Vasconcellos e Elias Garcia, com igual classificação, a de candidatos democratas; no artigo do fundo do mesmo jornal o no mesmo dia dizia-se que aquelles illustres candidatos democratas eram redactores politicos d'aquella folha.

Dias depois ha eu no mesmo jornal um artigo de fundo, no qual claramente se pedia a mudança da fórma de governo. Pela mesma epocha, se não me engana a memoria, annunciavam varios jornaes que o actual sr. ministro da guerra presidira a uma reunião ou comicio eleitoral republicano destinado a promover e apoiar a eleição do sr. Elias Garcia, e corria impressa pela cidade uma circular recommendando a eleição d'este candidato regenerador-republicano-democrata, assignada pelo sr. Sanches de Castro.

Desejaria pois que o illustre ministro me respondesse, especialmente sobre o primeiro ponto, que é aquelle de que possuo ainda hoje provas escriptas e publicas, e sobre o qual tenho a certeza de não ser illudido por qualquer enganosa ou illusoria reminiscencia. A promptidão, clareza e sinceridade da resposta importa mais a s. exa. do que a mim, porque esta camara de certo não poderá acolher benevolamente no seu seio um ministro da corôa cujas opiniões sejam suspeitas de republicanismo mais ou menos transigente. (Apoiados.)

Mas, sr. presidente, não foram só os motivos bem precisos e averiguados que acabo de expor á camara, e as bem fundadas duvidas que tão claramente resultam das perguntas que dirigi aos srs. ministros, que imperaram no meu animo por fórma que, independentemente de quaesquer considerações de politica partidaria, eu viesse desde já declarar-me em opposição aberta ao actual governo.

Causas houve, e ha que, ainda que de uma outra ordem, ainda que representando mais um modo de ver do meu espirito, uma apreciação mais subjectiva do que as rasões geraes que levo ditas, em presença dos graves problemas ~ de administração e politica interna e de politica externa, que urge resolver (todos elles, seja dito de passagem, herança que o governo progressista, que apoiei, recebeu dos seus antecessores), e encontrando me o animo já preparado e inclinado, determinaram a final a attitude politica que assumi. Essas causas passo a enumeral-as em poucas palavras.

Tão grave se me afigura a situação, tão difficil a conjunctura, sr. presidente, que eu desejaria ver agora ali, ainda de preferencia ao governo transacto, que apoiei leal e dedicadamente, um governo que primasse por forte. Da força dos governos, porem, uma das condições, senão a primeira entre todas, é a perfeita homogeneidade no pensamento politico como no systema administrativo, e no modo de ver ácerca dos problemas pendentes e inadiaveis.

Da existencia de uma tal homogeneidade no actual gabinete, sr. presidente, tenho eu o direito de duvidar, ainda sob o ponto do vista exclusivamente politico, só pelo conhecimento dos factos que citei, em relação ao sr. ministro da guerra; e não será, de certo, um gabinete que se nos apresenta com tal pecha de fraqueza, o destinado a resolver esses grandes problemas a que já me referi.

Não é, porém, esta a unica causa de fraqueza do ministerio actual.

Porque não entrou no gabinete o chefe do partido, que quasi exclusivamente contribuiu para a constituição d'elle, o cavalheiro que constitucionalissimamente foi chamado pelo chefe do estado para o constituir? Que me respondam ou não a esta pergunta, o que me é licito affirmar é que o facto da não entrada do sr. Fontes no governo trouxe como consequencia uma situação manifestamente de transição, uma administração evidentemente fraca.

A posição dada pelo sr. Fontes ao sr. Sampaio e acceita por este, de certo .em virtude de um sentimento de exagerada lealdade partidaria, de seu substituto temporario ou permanente n'aquella cadeira, trouxe ao actual gabinete uma incontestavel condição de fraqueza.

N'esta occasião, entre todas, sr. presidente, desejava eu que se tivesse, constituido um governo forte, um governo apto e capaz para luctar com as difficuldades de momento; em logar d'isso, porém, vejo ali um governo tão fraco, que não hesita em confessar a propria fraqueza e que em presença do problema mais grave e difficil dos nossos tempos, a justa satisfação das legitimas aspirações das sociedades, modernas como dizia ha dias o sr. Barjona em frente das exigencias crescentes da idéa nova, na pbrase syntheticamente elegante do meu collega e amigo Fernandes Vaz, não só não se sente apto a dar-lhe ou preparar-lhe rasoavel solução, mas nem tem a consciencia da energia e da urgencia, com que elle se nos impõe.

Não invento, nem exagero, sr. presidente; refiro me ás poucas palavras de motejo com que, pelo sr. presidente do conselho, foi acolhida na outra camara uma pergunta feita ao governo a tal respeito.

O problema a que me refiro, sr. presidente, não admitte

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senão duas soluções, e para preparal as [...] diante do homem d'estado senão dois [...] sistencia e o da transacção. Ao jornalista, [...] lendario, ao paniphletario illustre, ao principio politico de 1846, ao varão prestante, que tantos e tão [...] serviços prestou outr'ora á causa da liberdade, n'essa segunda e não menos amua quadra da nossa [...] liberal, ao chefe apparente do actual governo, está naturalmente vedado pelos seus antecedentes politicos, o caminho da repressão, da resistencia. Restava-lhe o da transacção. Sem affirmar ou discutir n'este momento, qual dos dois seria o melhor, o que porém, sabemos já pelas declarações officiaes, é que em nenhum d'estes caminhos, s. exa. ou o governo, darão um só passo, o que em presença das instantes exigencias da idéa nova, das aspirações legitimas da sociedade moderna, o gabinete, que nem póde, nem sabe, seguir o caminho da resistencia, que não quer inclinar-se aos meios de transicção, que não reconhece [...] urgente necessidade de resolver o problema, ou de preparar-lhe a solução, deliberou, não sei se mais por força inercia, producto natural da sua confessada fraqueza, se por falta de sciencia e de consciencia dos difficuldades da epocha, revelada tambem nas suas proprias palavras, manter no que diz respeito a instituições politicas, um statu quo, que, para o actual governo, póde ser transitorialmente commodo, mas que, para essas instituições, se me afigurar manifesta e eminentemente perigoso. (Apoiados.)

De um gabinete assim constituido, sr. presidente, de um gabinete com tal programem, ou antes, com tal ausencia de programma politico, e em tão difficil e grave conjunctura, é que, a meu ver, poderia dizer-se, affirmar-se com fundada convicção, que elle não está á altura, da gravidade das circumstancias.

E baseando-me em tal convicção, salva a grammatica e a logica da phrase, que não é minha, poderia eu traduzirei o meu pensamento em moção e mandal a para a mesa, com bem mais justiça e fundamento do que o fazia, ha [...] sr. Barjona, enviando para a mesa uma moção similhante em relação ao governo transacto.

Não o faço, porém, sr. presidente, porque na opposição franca, aberta e leal que hei de fazer ao gabinete, procurarei sempre, e aproveito esta ocasião para o affirmar, ser moderado e cordato, cingir-me, não ás praticas, mas á indole propria e ao caracter da missão constitucional d'esta camara, tal como eu a comprehendo, tal como ha pouco defini. (Apoiados.)

Das palavras pronunciadas na outra casa do parlamento pelo sr. Sampaio, que, por assim dizer, aponte sua nos veiu dizer que o actual governo era fraco, que não tinha nem queria ter programma, que a sua missão se limitaria a procurar fazer algum bem, se o deixassem, parece claramente deduzir-se que o ministerio actual é e se considera a si proprio como um gabinete transitorio e de pura administração. E eu, sr. presidente, que nunca, poderia confiar á priori no gabinete debaixo do ponto de vista politico, porque as minhas idéas politicas divergem profundamente as apregoadas pelo partido que hoje se acha representado no poder, que ainda menos confio politicamente, no governo actual, e já disse porque, depois das declarações [...] politica do sr. Sampaio, nego-lhe tambem desde já, terminante e categoricamente a minha confiança no campo exclusivamente administrativo em que s. exa. e o governo parece que desejam ser julgados e apreciados, não só porque as, minhas idéas sobre administração publica differem tambem e essencialmente das opiniões conhecidas dos membros do governo, mas muito principalmente que ainda me não esqueceram os oito annos quasi ...ruptos da desgraçada administração regeneradora! (Apoiados repetidos.)

Estas as rasões fundamentaes porque não confio no gabinete presidido pelo sr. Sampaio.

Sr. presidente, visto que estou com a palavra, peço licença: para mandar para a mesa um requerimento, que não fundamento, porque me lembro ainda de ter sido ha poucos dias tão viva quão justamente increpado por um respeitabilisado collega, nosso, por ter procedido, em occasião analoga, por modo diverso. V. exa. porém, interpretando o requerimento as praxes d'esta casa, como melhor entender, submetter não á discussão, mas em todo o caso fará racaír sobre elle uma votação, quando o tiver por conveniente.

Passo a lêl-o.

(Leu.)

Leu-se na mesa o seguinte:

Requerimento

Requeiro:

1.° Que pelo ministerio dos negocios do reino, seja remettida como urgencia a esta camara, copia dos documentos que constituem o processo da syndicancia ultimamente feita aos actos da camara municipal de Lisboa, embora tal processo esteja actualmente affecto ao exame da procuradoria geral da corôa e fazenda.

2.° Que logo que tal copia de entrada na secretaria da camara, seja mandada publicar na folha official, ainda que n'essa data a secção legislativa tenha já sido encerrada ou adiada. = Henrique de Macedo.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Rodrigues Sampaio): - Sr. presidente, evidentemente nós somos fracos mas por isso mesmo foi pouca generosidade, depois de nos julgarem assim, promoverem nos desde logo guerra tamanha; era melhor mover essa guerra contra um governo forte que estivesse sentado n'estas cadeiras.

Se aqui estivesse o sr. Fontes, certamente que o governo seria um governo forte, mas dar-lhe-ia o digno par o seu apoio?

Eu creio que não.

A desgraçada logica tambem hoje soffreu tratos horriveis: o digno par, o sr. Ferrer, declarou que a formação do ministerio foi inconstitucional; o digno par que acaba de fallar achou, pelo contrario, que o ministerio tinha sido formado constitucionalmente.

Na verdade a logica aqui é forte!

Se fosse preciso que as opposições fossem coherentes, ellas hoje tinham ficado desfeitas mas nas opposições não é necessario haver essa homogeneidade, cada um póde atacar por qualquer motivo sem colligação, como se tem feito até aqui, e no fim commum do deitarem o ministerio abaixo, sem que depois qualquer dos illogicos fique habilitado para formar uma administração; nós, porém, temos esse defeito.

O sr. Fontes devia ser o presidente do conselho, mas havia um inconveniente, que exa. a grande difficuldade creada pelas declarações solemnes de s. exa. por mais de uma vez remetidas, de que não seria o succesor do governo transacto.

Se s. exa. estivesse aqui sentado, accusal-o-íam de ter faltado ás [...] promessas e por faltar á sua palavra, como agora estão sendo combatidos alguns dos ministros porque n'este ou n'aquelle assumpto foram d'este ou d'aquelle parecer; ora, por este modo não ha logica possivel, e o illustre cavalheiro que não vejo sentado no seu logar, teria de ficar inhibido de formar ministerio pelas declarações ultimamente feitas.

Ora, o mundo governa-se pouco pela logica, governa se mais dos actos; e se eu quizesse ler jornaes, poderia concluir e demostrar, que o tratado de Lourenço Marques foi combatido por muitos que depois e approvaram.

D'esta fórma não podiamos marchar; a logica faria com que se não dásse um passo.

Não faço politica retrospectiva n'esta casa, nem a quiz fazer na outra camara. Perguntaram ali qual era a opinião do governo cobre o tratado de Lourenço Marques; respondi que o tratado estava pendente n'esta camara, e aqui

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haviamos de dar a nossa opinião em sessão secreta, e não me recusava a dar a explicação que me pediam se não estivasse em sessão publica. Por conseguinte não posso entender a logica do digno par.

Ainda direi que eu podia responder ao digno par, o sr. Macedo, com as palavras que ha pouco proferiu o sr. Ferrer, e a este digno par podia responder com as palavras proferidas pelo sr. Henrique de Macedo. São os inconvenientes da muita logica. A logica racional, que foi a que eu estudei, não ensinava isso.

Tenho de declarar tambem que no ministerio que começa agora podiam estar representados os diversos grupos que formaram a opposição; eu desejava que isto assim acontecesse, e se estamos aqui exclusivamente regeneradores, a culpa não é nossa.

Eu, sem temer a guerra, prefiro a paz. Ainda não me declararam guerra, mas declararam opposição; isso é uma prova de que não concordam com as nossas idéas, o que é licito e permittido.

Já disse na outra camara que não desejaria ter unanimidade. As vezes, segundo diz o auctor do Espirito das leis, o excesso de virtude é um vicio!

Nós não queremos receber força senão das leis e da constituição, e a confiança que provier dos actos que praticarmos. Não peço que confiem que hei de fazer tudo, e por, isso sou reservado muitas vezes.

Creio que ninguem se sentou aqui, não se senta, nem se sentará, que não deseje fazer o bem; mas acredito tambem que ninguem póde fazer tudo quanto deseja. Não direi que faremos o óptimo, nem o melhor, rnas se fizermos o bom ficamos satisfeitos cumprindo este santo dever, e a patria ha de nos ser agradecida.

Acho tambem bella a theoria da idéa nova, e se nós não tivessemos constituição, se estivessemos no cahos e possuissemos uma força omnipotente, talvez baseariamos as nossas instituições n'outros moldes; mas não estamos nessas circumstancias, estamos n'este planeta, estamos na terra. Muitos têem promettido modificar as instituições, mas não o têem conseguido, porque não acham a occasião opportuna. São opportunistas, apesar de se mostrarem contra o opportunismo, e com isso não praticam mal:

É melhor não promover dissensões, e procurar no meio da tranquillidade e socego publico fazer alguma cousa boa e util para o paiz.

Dizem não querer ninguem associar-se a nós por causa de discordancia nas reformas politicas, e eu entendo que, com as que temos, podemos fazer muito; e acredito pouco em reformas politicas, que todos promettem e que nenhuns executam.

A respeito de outros pontos em que o digno par fallou, os respectivos ministros responderão como poderem e souberem, e creio que se hão de desempenhar facilmente da sua tarefa á vista da logica com que são tratados. Se escapâmos de Scylla, caímos em Charybedes. Haviamos de ser accusados sempre, fosse qual fosse o nosso programma.

Estimo que nos façam guerra, que nos façam opposição. Creio que governariamos peior se não a tivessemos.

Direi poucas palavras sobre a inconstitucionalidade na formação do ministerio.

Queriam que o illustre chefe do partido regenerador viesse sentar se n'estas cadeiras? Queriam, bem o sei; mas não era para o elogiarem, era para o combaterem por elle haver faltado á sua palavra, como arguem alguns dos meus collegas por elles terem um voto differente na outra camara sobre questões que não vieram ainda á discussão.

Não se sabe como resolveremos a, questão do imposto de rendimento. Sabemos só que havemos de procurar acalmar a excitação publica e estabelecer a paz entre o povo. Sobre os meios para conseguir este resultado, se algum de nós tiver opinião divergente, não viremos aqui manifestal-a; e se viermos, tanto melhor para os dignos pares da opposição que nos podem tomar contas d'essas divergencias.

Eu desejo mais administração e menos idéas novas, porque nem sei mesmo onde estão os auctores d'ellas nem o que pretendem. Tudo é novo, e tudo que é novo se faz velho.

Mas tenho-me apartado do ponto, principal em que eu queria tocar.

Direi que a formação do governo foi constitucional.

O alto poder do estado, chamando alguem a formar gabinete, não póde obrigal-o a isso, quando essa pessoa entenda que não deve assumir o governo em tal ou tal occasião.

Queriam que ficássemos sem governo? Creio que não. Visto que já na opposição ha divergencia, uns julgam constitucional a formação do gabinete, outros inconstitucional; por tão diversas theorias em caracteres tão abalisados, não se póde sair d'este embaraço, e tudo isto por força da lógica; mas a logica é uma arte e não uma sciencia.

Eu entendo que nós prestaremos bom serviço ao paiz se podermos encaminhar os negocios a uma solução em harmonia com os interesses e necessidades publicas; e Deus queira que o possamos fazer ou que o possam fazer os nossos successores.

Direi, pois, que prefiro o bem á coherencia, e isto não quer dizer que não sejamos coherentes; mas a nossa coherencia ha de sobretudo consistir, disse-o na outra casa, e repito-o agora nesta, em procurar resolver convenientemente os negocios, á proporção que elles se apresentarem, e pela ordem da sua urgencia.

Não direi mais nada, porque quero dar logar a que os meus collegas respondam sobre o que mais directamente lhes diz respeito, e mesmo porque entendo que é mais tempo de trabalhar do que fatiar.

O sr. Ministro- da Fazenda (Lopo Vaz): - Sr. presidente, cumpre-me responder ás considerações do digno par, o sr. Ferrer, relativas ao imposto de rendimento, mesmo porque vejo que não foi bem comprehendido o que a esse respeito declarei na camara dos senhores deputados; e, visto que estou com a palavra, responderei tambem a uma referencia que foi feita á minha pessoa pelo digno par o sr. Henrique de Macedo.

Quanto á minha declaração a respeito do imposto de rendimento, feita na camara dos senhores deputados, o digno par o sr. Ferrer de certo não me ouviu e foi mal informado.

Eu asseverei á camara dos senhores deputados, e assevero agora á camara dos dignos pares, que procurarei dar a essa questão do imposto de rendimento uma solução a contento da opinião publica e sem prejuizo dos interesses da fazenda.

Ocioso seria expor agora a minha humilde opinião sobre o imposto de rendimento, sob os pontos de vista da sciencia financeira, da economia politica e da justiça na incidencia do imposto. Os financeiros menos versados sobre estes assumptos têem opinião theorica sobre esta materia, e por isso não é de admirar que eu tenha tambem a minha. Não se trata, porem, de expor uma opinião sobre a theoria do imposto de rendimento, o que seria extremamente facil; trata-se, sim, de investigar até que ponto é, ou não, possivel, expurgar a lei e o regulamento sobre o imposto de rendimento das disposições que têem concitado a animadversão da opinião publica. As melhores theorias não são sempre exequiveis, antes, pelo contrario, acontece não raras vezes que a sua execução é incompativel, em uma dada occasião, com os interesses economicos do paiz, com os habitos e costumes dos povos, e até com a tranquillidade publica. Quando se dá este facto é mister modifical-as, ou, só isso não é possivel, pol-as de parte.

Pôr isso eu digo: o governo procurará dar á este assumpto uma solução que mereça o apoio da opinião publica, e que, por outro lado, não prejudique a fazenda; tem, pois que investigar se porventura lhe será, ou não, possivel dar execução ao imposto de rendimento, sem que haja

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vexames, nem vigorem as disposições contra as quaes se tem agitado a opinião do paiz.

Se for possivel, expurgará o regulamento d'essas disposições e fará executar a lei.

Se essas disposições forem de tal modo inherentes á economia da medida financeira de que se trata, que a sua suppressão importe a inexequibilidade do imposto, não terá duvida em propor a suppressão d'esse imposto na parte em que depende do lançamento previo, propondo n'esse caso outra medida, da qual provenha para o thesouro publico receita equivalente.

Entretanto, de qualquer das fórmas, procurará resolver cabalmente esse assumpto. Uma das causas por que o governo deseja o adiamento das côrtes é, pois, a necessidade de tempo para se entregar a esses trabalhos, que dependem de muitas informações e estado.

Parece-me ter dito o sufficiente sobre este assumpto. Passemos a outro.

A proposito das considerações que fez sobre a crise politica que acaba de ter logar, o digno par, e sr. Henrique de Macedo, deu-me a honra de se referir a uma declaração que fiz na camara dos senhores deputados, quando dissera que julgava não ser chegado o momento constitucional do partido regenerador assumir o poder, se porventura o ministerio que estava á frente dos negocios publicos tivessa de caír na presente sessão parlamentar. A este respeito, devo dizer ao digno par e á camara, que eu expliquei esta phrase em outra sessão, quando fui interogado por um illustre deputado ácerca do verdadeiro sentido d'aquellas minhas palavras, Declarei então que não quiz significar com ellas que reputava inapto o partido regenerador para gerir a causa publica, nem era natural que um membro de um partido qualquer podesse enunciar similhante opinião a respeito do partido a que pertence. O meu pensamento era que, se porventura caísse o gabinete progressista ante a opposição da camara, o governo que lhe succedesse devia ser tirado dos differentes, grupos que constituiram a opposição parlamentar e não exclusivemente de um d'esses grupos. Ora, se hoje se apresenta aqui um ministerio composto inteiramente de elementos do partido regenerador, é porque de outro modo não se conseguiu formar o gabinete. A camara sabe já quaes as circumstancias que o ocorreram e determinaram este facto. O sr. presidente do conselho acaba de declarar que se esgotaram todos os meios Dará se checar a um accordo entre os differentes ferem grupos que formavam a opposição, a fim de se constituir um ministerio em que todos elles estivessem representados. Sendo impossivel, pois, chegar a, exa. accordo, havia de tomar conta da administração publica ara só d'esses partidos, porque não se póde prescindir de governo á testa dos negocios publicos. Pela minha parte, posso dizer que não acceitei a pasta da fazenda senão depois do nobre presidente do conselho me declarar que tinha tenção de empregar todos os meios para conciliar os differentes grupos politicos da opposição parlamentar na composição do gabinete.

Disse.

O sr. Ministro da Guerra (Sanches de Castro): - O digno par, o sr. Henrique de Macedo, desejou saber qual era a minha opinião sobre o additamento proposto ao projecto do bill de indemnidade, relativo á questão chamada dos coroneis. Devo declarar que me conforme completamente com elle, assim como mo conforme com a prevista aqui apresentaria para que o mesmo projecto, que comprehende o referido addiramento, vá á commissão de fazenda, para fixar a despeza com respeito a este negocio, e dar o seu parecer n'esta parte.

O digno par, a quem estou respondendo, creio que se referiu a ter em 1878 apparecido o meu nome n'um pariodico, que me indicava como deputado democrata. Não sei que importancia possa ter esta indicação; julgo que o ser democrata não repugna com a idéa de ser monarchico, O que declaro ao digno par e á camada, sob a minha palavra, é que não ha ninguem que seja capaz ds assegural, com verdade, que eu tenha estado filiado em qualquer partido. Nunca me filiei em partido algum, e só fui filiado do partido regenerador por muito tempo, e tão intima foi essa alliança que hoje me posso considerar regenerador.

Tambem o digno par disse que eu presidira & uma reunião republicana. É claro que, não me achando eu filiado em partido algum, não podia presidir a qualquer reunião politica.

Embora não tenhamos tido relações, o digno par conhece-me ha muito tempo, para acreditar na minha palavra; e eu declaro debaixo da minha palavra de honra que nunca presidi a similhante reunião, eu a outras quaesquer reuniões politicas.

Emquanto ás minhas idéas politicas, entendo que os meus quarenta e dois annos de serviço, como soldado leal ao rei, á patria e ás instituições, (Vozes: - Muito bem.) soldado que nunca se revoltou, porque se o quisesse fazer havia de pedir primeiro a sua demissão, são sufficiente garantia para o paiz; todavia, o que eu peço á camara dos dignos pares é que não me negue a justiça que me assisto, isto é, que não me condemne sem esperar pelos meus actos. (Apoiadas.)

O sr. Ministro da Marinha (Julio de Vilhena): - O digno par, sr. Henrique de Macedo, apreciando a supposta fraqueza do ministerio, entendeu que havia uma certa contradicção entre a minha situação n'este logar, e a minha intervenção no contrato celebrado pelo meu digno antecesdor ácerca da navegação para a Africa.

Cumpre-me declarar que s. exa. está laborando n'um equivoco.

Eu não intervim no contrato de navegação de Africa, nem mesmo na minha qualidade de ajudante do procurador geral da corôa.

A minha opinião é inteiramente livre.

Se o digno par deseja saber qual ella é, não tenho duvida em a declarar desde já.

Sou de opinião que, tendo sido aquelle contrato celebrado por um membro do poder executivo, representante de uma auctoridade legal, não posso, em nome do mesmo poder, annullar esse contrato. Se ha individuos prejudicados, porque o contrato foi celebrado de medo contrario á lei, se houve excesso de poder ou de jurisdicção, os tribunaes e que são competentes para o annullar.

Se eu entender que o contrato é contra as disposições da lei, virei na sessão seguinte propor um bill de indemnidade.

Não posso dizer, no momento actual, se o contrato é legal ou illegai. O que digo é que na legislação do paiz ha os meios necessarios para fazer sanar todas as illegalidades. Só alguns individuos se julgarem, prejudicados com aquelle contrato, têem na legislação vigente remedio para esse mal; ninguem lhes póde negar e recurso para os tribunaes competentes.

Como membro do governo hei de acceitar as decisões d'esses tribunaes.

Não vim ao poder para annular os actos dos meus antecessores; nem para levantar quaesquer suspeitas sobre o seu caracter. Se houve qualquer illegalidade, o que é facil acontecer, sem intenção da parte dos ministros, temos na constituição e nas leis do paiz, os meios necessarios para sanar tudo convenientemente.

Acceito as palavras proferidas ha pouco pelo sr. visconde de Seabra, de que devemos respeitar todos os direitos e cumprir todos os deveres.

Respeitando, pois, toda e qualquer decisão dos tribunaes competentes ácerca d'este contrato, entendo que prestâmos a devida homenagem aos bons principios, e temos attendido ao bem do paiz.

O sr. Costa Lobo: - Manifestou-se em opposição ao governo; declarou sentir que a camara tivesse estabelecido

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o novo principio constitucional de se aproveitar das arruaças para fazer caír um governo, notou que este ministerio podia ser considerado como filho das assuadas, concluindo por dizer que neste paiz o que falta é quem diga o que pensa e faça o que deve.

(O discurso de s. exa. será publicado logo que o devolva.)

O sr.. Conde de Rio Maior: - Arredado da politica pelo mau estado da minha saude, tenho ficado alheio aos debates levantados n'esta casa. e raras vezes tenho pronunciado o meu voto. Entendo, todavia, que é dever meu apresentar hoje algumas observações na presença do novo gabinete, e dizer como penso sobre a solução da crise.

Tambem eu, sr. presidente, não hesito em affirmar a minha opinião. Declaro alto e bom som: este ministerio não nasceu dá arruaça, é filho do voto manifestado livremente pela camara dos pares (Apoiados.) e pela opinião publica, que pesava de uma terrivel maneira sobre a administração transacta!

O sr. presidente do conselho occupa o seu elevado cargo pelos grandes e importantes serviços prestados por elle á patria e á liberdade; foi, todos bem o sabemos, um dos soldados mais fortes e valentes no momento em que essas liberdades publicas perigavam! (Muitos apoiados.)

Sr. presidente, o paiz ganhou com o modo por que terminou a crise; com certeza evitámos maiores perigos.

Apoiei no principio o ministerio transacto, é se mais tarde lhe fiz opposição, foi por elle adoptar uma maneira de proceder, que contradiz completamente as promessas do partido progressista, quando este combatia o sr. Fontes. Fui contra o ministerio que se demittiu; comtudo ha dois actos dos ex-minisiros, que approvo. Fez bem o sr. Braamcamp acceitando o veredictum da camara dos pares, e não seguindo os conselhos d'aquelles, que lhe aconselhavam a resistencia.

Louvo s. exa. por isto, como tambem louvei o seu governo, quando entrou aqui pela primeira vez, e antepoz ao programma politico ao partido a conveniencia de tratar primeiro a questão de fazenda. A necessidade de resolver o problema foi a rasão de ser do gabinete progressista, este ponto o paiz exigia que fosse examinado com urgencia.

Vã promessa! Illusão perdida! Quasi depois de dois annos de administração soubemos pelo relatorio do ministro da fazenda que em 30 de junho de 1881 ha um deficit de 6.500:000$00 réis, e d'este desconta o ministro, para nossa consolação, 2.100:000$000 réis de receitas provaveis, systema que s. exa. no seu relatorio anterior condemnou como methodo perigosissimo de apreciar as finanças do estado. (Apoiados.)

Estes factos, sr. presidente, explicam claramente a perda de todas as nossas illusões, e, todavia, esses mesmos factos são inferiores nos algarismos enunciados á verdade inteira!

Não se queixem da camara dos, pares.

Sinto que, apesar da leal coadjuvação d'esta camara, não melhorasse a questão de fazenda. Embora esta assembléa não tivesse profunda symnpathia por todas as propostas tributarias, que examinámos, comtudo o patriotismo dos pares do- reino foi grande, e o ministerio do sr. Braamcamp alcançou no annno passado a approvação dos, novos impostos, julgados necessarios. Que culpa tem esta camara que os impostos, pedidos quasi no fim do anno economico de 1879-1880, e que a camara unicamente acceitou para não se fechar a sessão antes de se augmental a receita na presença de um deficit avultado; que culpa, digo, tem esta camara de se achar o paiz assoberbado com um imposto iniquo, votado pelos srs. deputados, e que ficou mais cruel por um notavel regulamento de 235 artigos?!

Sr. presidente, o imposto de rendimento, alem dos seus naturaes defeitos, possue o grave inconveniente de prejudicar de modo terrivel o serviço todo das contribuições directas. Tambem este ponto convem considerar.

Não gritem contra a camara dos pares.

Quando se discutiu a questão do real de agua, o ministerio passado tinha aqui maioria. Perdeu-a pelo seu procedimento posterior, perdeu-a por causa do contrato de Torres Vedras, e pela minha parte foi depois d'essa discussão na camara dos senhores deputados que me separei do governo. Tambem o sr. Braamcamp perdeu a sua maioria por causa da ultima fornada! Poucos erros politicos têem sido maiores, e é esta a opinião, creio eu, do illustre homem de estado, infelizmente ausente, que costuma presidir aos nossos trabalhos.

Sr. presidente, qual foi a situação creada pelo procedimento do governo?

A camara dos pares teve de declarar solemnemente perante a nação a urgencia de harmonisar a politica com os interesses do paiz. Duas questões obrigavam hontem, e ligam ainda hoje os nossos deveres de patriotas; o imposto de rendimento reclama ser alterado, e o negocio de Lourenço Marques, chamando a attenção de todos os portuguezes, impõe graves deveres áquelles, que são obrigados a dar o seu voto na qualidade de legisladores. .

Não somos facciosos! E já que se põe em duvida ou se discute o direito da camara dos pares de iniciar, pe tratar questões politicas, devo lembrar quando eu e alguns membros desta casa faziamos forte opposição ao gabinete presidido pelo sr. Fontes, os louvores e os applausos, que recebiamos do partido progressista! Vinham os progressistas aqui, e approvavam essa campanha tenaz, que promovia-mos contra aquelle ministerio, que nós aggrediamos, levantando todos os dias questões politicas!

Recordo-me bem, quando se tratou da questão da Zambezia, o que se passou n'esta casa, o modo por que o partido progressista nos congratulou por termos encetado essa questão, dando-lhe excessiva feição politica.

Então não diziam os membros d'esse partido que eramos incompetentes, e que deviamos deixar á outra casa do parlamento o tratar os assumptos de natureza politica, porque só a ella competiam taes materias.

Perguntou-se aqui pela questão eleitoral, e o sr. conde do Casal Ribeiro, na resposta ao discurso da coroa, já depois de approvados todos os diplomas dos deputados, apreciou largamente, individualisando mesmo, o modo por que. se havia effectuado a eleição geral. O partido progressista muito o applaudiu, e ninguem disse que esta camara não tinha direito de tratar assumptos como esse.

Esta era a situação n'aquella epocha, e agora que vemos-? Vemos louvar a opposição d'esta camara, por ter usado do direito de censura politica em 1879, e negar, ou, pelo menos, pôr em duvida em 1881 esse mesmo direito, dizendo se, alem d'isto, que esta camara está mal constituida, a mais mal constituida de todos os senados existentes nos diversos paizes da Europa, e que os pares portuguezes gosam de uma influencia politica, que em direito constitucional lhes não pertence!

Quero responder a este ataque injustissimo; peço aos censores que me digam o modo por que estamos constituidos?

Sr. presidente, estes pares do reino, que estão aqui, são filhos ou do uso da prerogativa real, ou do direito hereditario; mas, se assim é, perguntarei como é que o partido progressista, gritando contra a prerogativa, abusou tanto do exercicio d'essa mesma prerogativa? E n'estas contradicções que está o descredito que muitas vezes soffrem os partidos politicos!

Demais parece-me ingratidão da parte do grupo politico, a que me estou referindo, atacar tambem a camara por ser filha do principio hereditario, quando muitos dos seus mais denodados campeões tem aqui tomado assento em virtude d'esse principio! (Apoiados.)

Agora, quanto á acção politica da camara, nego redondamente que a camara dos dignos pares se tenha imposto alguma vez á camara dos senhores deputados. Sabemos

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quaes são os nossos direitos, e nunca pretendemos abusar d'elles.

Se esta assembléa tem influencia politica, é porque justa e naturalmente as leis da historia lh'a concedem. Esta camara tem precedentes, tem actos que lhe dão uma grande importancia na historia politica do nosso paiz. Aqui tiveram iniciativa questões de alto interesse publico, ou acharam uma resolução mais perfeita; as liberdades publicas encontraram nos pares um poderoso sustentaculo, e leis profundamente, liberaes como a que extinguiu os morgados, saíram da iniciativa dos membros d'esta casa. N'ella nunca deixaram de ter echo os justos clamores da opinião publica, nem aos mais caros interesses do paiz faltaram dentro d'este recinto propugnadores infatigaveis e ardentes.

Os factos attestam estas minhas asserções, e escuso enumeral-os.

Só notarei ainda um acontecimento recente, é a reforma d'esta camara, nascendo da sua propria iniciativa. Julgo, portanto, justificada a influencia politica d'esta casa do parlamento, tem direito a tel-a pelos relevantes serviços prestados á causa publica; aqui encontrou o paiz remedio para vencer graves difficuldades.

Esta assembléa, finalmente, prepondera, porque contem no seu seio homens do mais elevado merecimento, vistos eminentes nos differentes ramos dos conhecimentos humanos, estadistas experimentados, magistrados respeitabilissimos pelo seu saber, pela sua posição, e nelas suas altas qualidades.

Este conjuncto de circumstancias, e de tão grande alcance, não póde deixar de dar importancia á camara dos dignos pares. Desconhecel-o é negar a verdade; prejudicar a patria!

Mas diz-se: a camara dos dignos pares é velha; a carta tem cincoenta annos; esta camara é antiga. E cita-se para isso a Inglaterra!

Ora, sr. presidente, quando ainda ha pouco um ministro inglez declarou, na camara dos communs, que os lords necessitavam reforma, veiu logo em seguida, immediatamente, lord Granville á camara dos mesmos lords declarar que o seu collega mal se tinha explicado.

Sr. presidente, diz-se, este ministerio tem defeitos na sua origem, e um d'elles é não reconhecer o governo a necessidade de propor a reforma politica.

Direi com franqueza a minha opinião.

Se estes ministros viessem pedir a esta camara uma nova, lei eleitoral, de modo que o eleitor ficasse garantido contra os abusos dos argentarios, e contra a pressão da auctoridade, seria eu o primeiro a concordar.

Não quero alargar mais o suffragio; mas quero que o eleitor exerça o seu direito livremente.

Com relação a outra especie de reformas politicas por exemplo a reforma da constituição, entende que não são necessarias nem opportunas.

Falla-se muito em descentralisação; mas é indispensavel não exagerar; em virtude de alguns principios, já adoptados, vemos na lei inconvenientes maiores do que vantagens.

As finanças municipaes do primeiro municipio do reino talvez não estivessem em circumstancias tão difficeis como estão, se não se tivesse tirado ao governo o direito de approvar os emprestimos e os orçamentos municipaes...

(Interrupção que se não ouviu.)

Sr. presidente, estão alguns amigos meus a lembrar-me que estou cansado, e que por motivo de saude não devo continuar a usar da palavra; mas peço licença para_ apresentar ainda umas ligeiras observações.

Diz-se que o ministerio está mal constituido, que o sr. Fontes devia ter sido chamado a tomar a, direcção cos negocios publicos. Ora o sr. Fontes disse desde o principio da actual sessão que elle não seria o chefe do gabinete que se seguisse ao ministerio transacto; mas o digno par não quiz indicar que quaesquer que fossem as eventualidades, os seus amigos politicos ficariam annullados para bem servir a nação.

O sr. Fontes Pereira de Mello: - Apodado.

O Orador: - Factos d'esta ordem tem-se dado em outros paizes, Em Inglaterra foi chamado um partido para formar gabinete, sem que o chefe d'esse partido fosse o chefe da situação.

Quando em 1852 caíu o ministerio tory, por causa de uma discussão sobre o income tax, e o imposto sobre as casas, foi substituido pelo partido whig.

O marquez de Lansdowne tinha n'este partido uma posição igual á do sr. Fontes no partido regenerador; não quiz por diversos motivos ser o primeiro ministro, portanto foi encarregado de organisar o gabinete lord Aberdeen, entrando Gladstone, auctor da moção de censura, e lord John Russel, antigo presidente de 1846 a 1852, como ministro sem pasta.

Estes são os precedentes de paizes constitucionaes, e convem, quando se invocam, cital-os com exactidão.

O sr. Fontes podia não entrar no gabinete, e, todavia, podia contribuir para se formar uma administração de homens do seu partido.

Quanto aos actos financeiros do ultimo ministerio regenerador não temos que os examinar agora.

Vejo diante de mim homens de illustração e patriotas. Estou convencido que as questões de Lourenço Marques e do imposto de rendimento hão de ser resolvidas de modo conveniente.

No imposto de rendimento respondeu perfeitamente o actual sr. ministro da fazenda; s. exa. não vae estudar os vexamos, que bem os conhece, s. exa. quer só examinar o modo de os remediar. (Apoiados.)

Direi ácerca de Lourenço Marques: n'uma questão tão grave como esta, não posso pedir ao governo que se precipite, e diga, em sessão publica, aquillo que a constituição manda tratar em sessão secreta. Concordo que seja, talvez de vantagem o adiamento, não um adiamento até janeiro, mas o adiamento de algumas semanas. Estimarei que o paiz seja, informado então da verdade da factos occorridos, podendo aproveital-os no interesse da causa publica. Hoje nada mais acrescentarei.

Vozes: - Muito bem.

O sr. A. de Aguiar: - A hera está bastante adiantada, e eu tinha vontade, sr. presidente, de desistir da palavra, porque não desejava saír d'aqui com o pesado encargo de continuar ámanhã, a fallar. Resumirei o que tenho a dizer, tanto quanto me seja possivel, e espero que nos vinte minutos que me restam - n'este. pouco tempo que nos falta para se encerrar a sessão, possa cumprir a minha tarefa .

Dizem uns que o silencio é um erro, e que portanto, todo o homem que deixa passar tudo em silencio, commette uma falta; mas outros atreveram, que só o silencio tem valor, e póde significar, na epocha que atravessâmos, a verdadeira eloquencia. Escolherei e meio termo, e no proposito de fallar pouco, até o tempo de que disponho me favorece.

Não levantarei sr. presidente, questões partidarias. Ando haverá tres annos ausente da patria, dois dos quaes se podem contar passados em commissões difficeis - no Oriente e em Londres. Não sou politico abalisado nem parlamentar conhecido. Estou n'esta camara ha poucos dias, havendo n'ella tomado assento apenas a semana passada. Nunca fallei d'este logar, e não me julgo auctoridade sufficiente permanecido sempre alheio a politica, não sei mesmo bom e que se tem passado. Onde eu estava, apenas o ecco me transmittia as noticias. Sem distincção de partidos, tenho até hoje prestado os meus fracos serviços a nação como todos e devem fazer. Não buscarei, sr. presidente, este momento, que para mim é solemne, para aggredir os meus adversarios, nem para exalçar as virtudes dos meus amigos. Sou modesto

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por condição, e sei avaliar as difficuldades com que luctam os trabalhadores sinceros. Confesso mais, que me não atreveria a entrar no debate, se um dever para mim sagrado, qual é o de tomar todas as responsabilidades que me pertencem ao encetar a carreira politica, me não forçasse a descerrar os labios, e a manifestar summariamente o meu pensamento.

De mais a mais ha vinte quatro horas que na outra casa do parlamento e na imprensa se têem feito allusões á minha humilde individualidade. Todos sabem que tive a honra de ser convidado para fazer parte do novo gabinete que se acha presente, e muitos poderão pensar que não sou ministro por cobardia ou por orgulho. E como felizmente não o deixei de ser, nem por uma cousa nem pela outra, careço de explicar-me. Os que me conhecem, creio me farão Justiça, porque as minhas, aspirações são simples. Amo sobretudo o meu paiz sem ambição de especie alguma, e sem inveja pelos homens que o illustram patrioticamente. Estou prompto para servir sempre a patria e não quero servir-me d'ella.

Não pretendo tambem, seja-me permittido o vocabulo usado nas escolas, fazer sabbatina aos illustres ministros, cujo merito, embora não tenha a fortuna de conhecer a maior parte d'elles pessoalmente, está affirmado de um modo brilhante nas discussões parlamentares em que figuraram. Um professor como eu não lhe faltará occasião, nas aulas em que o é, para fazer sabbatinas. O meu proposito é outro. Os illustres ministros vem dizer porque se encontram n'aquellas cadeiras. Eu direi porque não estou ao lado d'elles.

Na realidade, estando longe ha tanto tempo, não posso ter opinião segura sobre a crise quanto ao ministerio transacto, porque precisava para isso assistir a ella; mas, entendo que posso fazer juizo com relação á fórma como se resolveu a crise, e, se é verdade o que se avança, francamente acrescentarei que a resolução me não póde satisfazer.

Qual é a situação politica de que procede este ministerio? Como é que elle chegou a organisar-se? Quaes foram as peripecias da lucta? O digno par, o sr. Fontes, que seu sempre respeitei pelos seus altos dotes de estadista, tinha feito uma moção de censura ao ministerio transacto, e parecia, que havendo pedido este a demissão a El-Rei após a votação da moção, só o sr. Fontes seria o indicado a tomar a presidencia do governo.

Se é certo, como se dizia, que as instituições cornam risco e estavam até em muito perigo, não direi que fosse a patria tambem; se era averiguado que o espirito publico não podia mais soffrer a administração progressista; se na realidade os motins de Lisboa eram a expressão fiel da opinião publica exaltada contra esta administração; eu entendo, na minha humildade politica, que o sr. Fontes, recusando a presidencia do conselho, deixou perder uma occasião muito opportuna de prestar relevantes serviços ao paiz, e as declarações feitas anteriormente n'esta casa por s. exa. não o inhibiam de o vermos agora sentado n'aquellas cadeiras. Quando ha perigo real, um homem do estofo politico do sr. Fontes não póde manter declarações, feitas talvez n'um momento de impaciencia.

Direi mais, que não é permittido, quando se está na brecha, combatendo uma situação politica, fazer declarações d'aquelle caracter.

Combater um inimigo para não nos aproveitarmos da victoria, não é plano que eu possa persuadir-me haver passado pela mente de um general tão habil como s. exa. E que houvesse feito essas declarações? Sustental-as é que eu julgo inopportuno e até perigoso.

O homem publico não pertence a si. O homem publico pertence ao seu paiz. Havia grande excitação de animos e temiam-se acontecimentos graves?! Era pois uma excellente occasião para s. exa. poder mostrar que ainda é o reformador de outras epochas, e o mais notavel iniciador dos melhoramentos materiaes, emfim um financeiro, e administrador de primeira ordem.

Mas que vemos nós? Em vez do chefe supremo do partido regenerador, temos ali um liberal illustre e um patriota eximio do mesmo partido, mas que talvez nunca pensasse em tomar o logar d'elle. Em vez dos homens experimentados do partido regenerador, apparece-nos este mesmo partido, é certo; mas representado pela sua nova guarda. Como justificação d'esta mudança inesperada, declara o nobre presidente do conselho de ministros, que não foi possivel formar um ministerio de conciliação com as fracções opposicionistas, porque a isso se recusaram os chefes d'essas fracções. Tudo se julga por esta fórma justificado e aclarado, mas não se confessa com a franqueza precisa, que tal situação se tornara impossivel desde o momento em que o partido que no governo pretendia ficar em maioria, se oppunha a discutir todas as condições do contrato. Agora, sim, já todos o sabem o podem avalial-o. Este ministerio não tem programma, nem quer entrar no caminho das reformas politicas. A conciliação n'estes termos ficava sem objectivo. Seria uma conciliação para se não fazer cousa alguma. Uma conciliação sem utilidade.

E digo isto muito especialmente e só com referencia aos meus amigos politicos, que já na outra casa do parlamento declararam hontem pela sua voz mais auctorisada, que as rasões da nossa recusa se fundavam na divergencia com o sr. presidente do conselho na questão das reformas politicas, e tambem na falta de um programma que seria a base indispensavel para uma conciliação.

Nos termos vagos e indefinidos em que se pretendia chegar a um accordo, era impossivel crear-se ama situação vigorosa e duradoura.

Um ministerio com a fragilidade do vidro, não valia a pena emprehender-se.

Se eu, posso ter uma opinião em politica, irei mais longe ainda.

O paiz necessitava, é certo, nas actuaes circumstancias, de um ministerio de conciliação; mas formado dos elementos mais valiosos de todos os partidos, um ministerio em que figurassem os chefes das opposições, e no qual até estivesse representado o grupo progressista.

Situação robusta, que desse treguas á politica, treguas absolutas, com os homens mais experimentados na gerencia dos negocios publicos, todos unidos num pensamento unico, e compenetrados da alta necessidade de resolver as grandes questões de fazenda e reforma do exercito, da instrucção publica e administração colonial.

Um ministerio assim podia levar a cabo a solução dos grandes problemas, e collocar o paiz n'uma situação vantajosa para depois os partidos emprehonderem isoladamente as reformas politicas.

E não se diga que o accordo entre homens que nos seus respectivos partidos gosam da preeminencia não chegaria nunca a realisar-se.

É nos momentos solemnos que o patriotismo se manifesta, e eu tenho por verdadeiros patriotas todos os chefes dos nossos partidos politicos.

A felicidade do paiz impunha a todos o sacrificio de pequenas vaidades.

Aqui está a conciliação a que se devia ter chegado, eis ahi o que se devêra ter feito, e o que se não conseguiu nem tentou.

A politica, como ella se entende ordinariamente, adiou mais uma vez a solução da crise nacional.

Tentou se uma conciliação, mas inefficaz, que não podia satisfazer o espirito publico, sendo tão graves, como dizem todos, as circumstancias do paiz; uma conciliação em que só figurariam principiantes, e emprego esta palavra n'este momento, porque estou pensando em mim principalmente; uma conciliação que nada mais representaria do que um ministerio de transição, tão fraco, como o sr. presidente do conselho declarou já que seria o seu governo, um pacto

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que só serviria para annullar os homens que o acceitassem, sacrificio inutil e por isso bom foi que se não fizesse.

Com os chefes teria a conciliação outro caracter, e nós ficariamos sabendo, uma vez por todas, o que valeria um ministerio de homens experimentados, em que não faltasse nenhum elemento politico.

Sendo impossivel a conciliação entre os inexperientes, appareceu finalmente um ministerio regenerador presidido paio sr. Sampaio, o qual tambem não resolve a difficuldade por maiores que sejam os merecimentos dos seus membros, a amizade e confiança, que individualmente lhes tributarios.

Esta situação, sr. presidente, não póde deixar de considerar-se tambem transitoria, e para que o não duvide-nos, basta ouvir que não tem programma, e que não quer reformas politicas.

É um governo, que marchará ora á direita ora á esquerda, que muito desejaria se podasse marchar por dois caminhos ao mesmo tempo; quer indo e não quer nada, que não póde abertamente exprimir a sua opinião sobre qualquer assumpto; que promette estudar o que já condemnou e talvez approval-o, como não tem programma, depois do estudo. Se algum principio proclama é a idéa velha. Emfim, ha de ser o que Deus quizer!

E a isto se reduz o verdadeiro opportunismo da nossa terra!

Se o ter programma é arriscado, porque o programma póde converter-se em lençol mortuario para descer á valla sem epitaphio, o não ter programma, quando o paiz no [...] impõe, é tambem o caminho para a sepultura.

Acabemos na politica com a theoria do celebre SpanFanzani, que no corpo do homem, dizia elle, tudo se transforma em sete annos, e não a exageremos ainda em uma applicando-a ao pensamento.

Acabemos cem o triste exemplo de mudar de idéas em vinte e quatro horas, quando d'este logar em que estou, se passa para aquellas cadeiras onde os ministros se sentam.

Desprendido de toda a politica partidaria, e sem intenção de ferir nenhum dos meus adversarios politicos, vejamos, sr. presidente, a largos traços, qual deveria ser o programma do governo que confessa não ter programma, e vejamos qual é realmente o partido a que pertence o programma que tentarei esboçar.

O sr. presidente do conselho declarou igualmente que não sabe bem o que se póde entender por idéa nova, sem se lembrar que elle foi já uai dos principaes defensores da idéa nova do seu tempo, quando nos recordou tanto haver padecido pela liberdade!

A idéa nova para mim não são as utopias dos visionarios nem as exagerações dos agitadores que pretendem arrastar as sociedades modernas á confusão e á desordem; mas é a aspiração justa do povo a todas as conquistas do progresso.

A idéa nova é a applicação da justiça sem sophisma. É para a classe rude e desvalida a distribuição equitativa da instrucção, é a educação mora: e intellectual dos cidadãos até o mais humilde. É a monagem definitiva da grande machina que se dia humanidade, de modo que possa funccionar sem attritos.

Não é a revolução na praça publica. É a revolução intellectual, que se não póde conseguir quando os governos se deixam arrastar por antigos preconceitos; em vez de guiarem os povos pelo methodo scientifico. A idéa nova é o methodo scientifico introduzido na politica. É [...] de todos os cerebros para a [...] utilisação de todos os braços para o trabalho. É pôr a luz onde haja trevas. E a guerra á ignorancia e ás importancias. É o Estado considerando o homem - cidadão, o tratando d'elle como pae e pae extremoso, em vez de o julgar unicamente um instrumento material dos seus caprichos!

Os homens mais eminentes da actualidade, com quem tive occasião de avistar-me na Europa, todos comprehendem o alcance da idéa nova e todos sabem definil-a.

Deixando, porém, de parte esta questão, que me poderia desviam do meu caminho, consideremos n'outro campo o estado ao nosso paiz, e começamos pelas finanças. Ha quantos annos ouvimos fallar da questão de fazenda? Quantos governos têem promettido o equilibrio orçamental? Qual tem sido o resultado d'essas promessas? Sabemol-o todos.

Os factos são simples. Nenhum partido tem conseguido os seus fins, porque todos se preoccupam principalmente de politica partidaria, e quando se discutem assumptos a que ella deveria ser estranha, levantam-se opposições sem fundamento, que não deixam os governos alcançar o que desejam.

Tudo se põe de parte para se viver de expedientes. Os emprestimos continuam sem interrupção. Contam-se quasi pela folhinha. Anno novo, novo emprestimo, ou pelo menos fazem-se regularmente de dois em dois annos. O deficit é permanente.

Da divida fluctuante não fallemos, já todos sabem que ella é de geração espontanea! Acabou o governo transacto de fazer um avultado emprestimo para exterminar a divida fluctuante, e apesar d'isto ficaram 2.600:000$000 réis d'esta divida na caixa de depositos. Paga a ultima, letra, recomeça no mesmo caminho; isto é, caminha-se para um novo emprestimo.

Temos necessidade, alem d'isto, de capitaes, e de capitaes avultados, para desenvolver as, colonias, porque não podemos prescindir d'ellas para progredir, e como estão, só servem para vexar o nosso amor proprio.

Ao mesmo tempo que o capital nos escasseia, e se antevê a impossibilidade de novos emprestimos, descobre-se que não é possivel dar um passo sem muito e muito dinheiro.

Outr'ora os nossos credores residiam em Londres, hoje estão dispersos por todas as cidades do mundo. Temos feito correrias em todas as praças, com o que muito folgam certos espiritos que se esquecem dos exemplos do Egypto e da Turquia!

Com uma agencia financial em Londres, que poderia poupar, na minha opinião, os intermediarios, lançâmo-nos, talvez menos avisadamente, na mão dos syndicatos, que não costumam trabalhar de graça.

Os corretores de Londres, pelo pouco lucro que os nossos emprestimos lhes podem dar, recusam-se s, recommea-dal-os aos seus clientes. Em junho carecemos de 500:000 libras, e em dezembro de igual quantia para os encargos da ultima operação financeira, Pagâmos com emprestimo todos os dividendos, e a possibilidade da bancarota é até apregoada nos documentos officiaes. Mais tarde admirâmo-nos que a imprensa ingleza copie o que está escripto n'esses mesmos documentos, e foi traduzido para o Livro azul, apenas attenuado pela phrase que temos a, mania de pagar!

Passae algumas semanas na agencia financial, como eu passei, e vereis que a questão de falida não póde ser adiada.

Visto que se trata agora de fazer estudos, ou convidaria o sr. ministro da fazenda a que mudasse temporariamente a sua residencia para Londres, a fim de ver de perto se eu falto á verdade.

Poucos dias antes da minha partida de Inglaterra, foi visitar-me um dos principaes banqueiros que fez comnosco transacção ha muitos annos [...] vossos compatriotas que as nações são como os individuos, e que é necessario mudar de caminho. Fazei pagar os proprietarios ricos, que se esquivam ao imposto, e alliviae os pobres. Se todos pagarem o que devem , talvez não seja difficil restabelecer o equilibrio; mas sobretudo é preciso que vos obstenhaes de novos emprestimos. Não vos illudaes

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com a cotação dos fundos; a situação é perigosa, e deveis saír d'ella por novos processos".

N'um dos ultimos annos pagou a agencia 50.000:000$000 réis de encargos, sendo a receita apenas a metade d'esta avultada quantia.

E' necessario, de uma vez para sempre, que deixemos de fazer questão politica em materia de finanças.

Sr. presidente, se o governo não tem programma, o seu programma deve ser este - tratar de resolver a questão de fazenda, porque sem ella estar resolvida, não ha meio de atacarmos de frente, e com bom exito, todas as outras questões com que luctâmos.

O paiz não morre, primeiro hão de desapparecer aquelles que o prognosticam; mas é preciso ter coragem e bom senso.

Passemos agora á questão dos impostos. Todas as opposições n'este paiz combatem os governos quando elles lançam impostos, e todos os governos, por uma ausencia de logica imcomprehensivel, aproveitam e sanccionam os impostos que combateram na opposição. Isto quer dizer que se faz tambem politica em materia de impostos. O povo pouco esclarecido não acceita facilmente nenhum imposto votado, mas está sempre prompto a acceitar áquelle que se não votou. Muitas vezes o temos visto levantar-se até contra os impostos que o não ferem, e só se julgaria feliz se podesse conseguir a abolição de todos. Para o illudir augmentamos todos os dias os impostos indirectos, cuja incidencia elle não póde perceber tão facilmente; mas isto não basta, nem poderá continuar por muito tempo, porque todos os impostos votados, sem grande reforma, não chegam para- acudir ás despezas publicas.

Os partidos, sabendo as condições em que se encontra a fazenda publica, em vez de dizerem ao povo que não póde viver, ter independencia, estar á altura dos outros povos sem pagar, vem para o parlamento combater todas, os impostos apresentados pelas administrações adversas. Assisti a muitas discussões parlamentares n'outros paizes, e principalmente me impressionou o que vi
passar-se em França. Ali a questão do imposto é sagrada para todos os partidos. É uma questão em que todos prestam o seu apoio ao governo constituido, seja elle qual for. E é por isso que a França, onde se têem passado as crises mais temerosas dos tempos modernos e os desastres da guerra attingiram proporções desconhecidas na antiga historia, nunca viu as suas finanças em desequilibrio assustador. O seu systema financeiro, estabelecido ha perto de cincoenta annos, tem atravessado todas as commoções politicas e revolucionarias. O povo paga o tributo com a mesma regularidade e seriedade que um homem de bem satisfaz as suas dividas.

Abri o mais elementar livro ou tratado de politica, e ahi vereis como é julgado o nosso systema tributario. Portugal tem uma multiplicidade de impostos que não póde realisar, e todos os dias complica mais a sua situação. Portugal despende 20 por cento na cobrança dos seus impostos. Portugal, quando procede ás eleições, esquece-se, que os eleitores que dispõem de maior numero de votos, são tambem contribuintes! Ás vezes tambem se engana com o valor eleitoral do contribuinte e perde os votos e os tributos!

Aqui tendes uma outra parte do vosso programma, srs. ministros. - Reforma completa do systema tributario, melhor cobrança e lançamento do imposto. Que me importa a mim que o governo nos diga que não tem programma. Lancae equitativamente os tributos, exigi-os da mesma maneira a todos os contribuintes, acabae com as diversas fórmas de imposto, que só representam a confusão, e adoptam um systema que seja, alem de justo, applicavel a todos os cidadãos igualmente. Organisae á lei eleitoral, de modo que nenhum governo possa perdoar impostos para alcançar votos. Mais contribuintes e menos votantes até que as finanças se achem em equilibrio. Antes cáiam os governos que o thesouro se arruine. A nação é só uma, e ministros não faltam.

Fallaes da vossa independencia com uma soberba que ás vezes assusta as nações. Parece que tendes coragem para ir desafiar a Hespanha, a Inglaterra, a França e até o Imperio Allemão. E quando olhâmos para o vosso exercito, o que vemos? Qual é á vossa força armada? Qual é o armamento d'ella? Qual é a disciplina? Quaes são as leis rigorosas que adoptastes para o recrutamento? A respostas simples. Sobre effectivo do exercito nem pretenda que me respondaes. Ácerca do seu armamento, apesar dos esforços que se têem feito para o melhorar, estaes longe da perfeição, n'uma epocha em que o valor pessoal do soldado não tem valor. No tocante á disciplina. .. não quero dizer uma palavra. Sobre recrutamento sabemos todos, que os partidos se interessam em salvar recrutas, quando são afilhados da influentes eleitoraes. Até o tributo de sangue, o mais pesado de todos os tributos, não escapa ás influencias politicas. Ainda se consente que haja dois exercitos, um nas colonias e outro na metropole, como se as colonias não fizessem parte do territorio portuguez. Mais ainda: mandam-se para as colonias os soldados incorregiveis que ali vão servir de documento vivo da nossa decadencia, que não podem manter a dignidade nacional; mas que expõem toda a nação á critica austera dos estrangeiros. Ali, onde infelizmente mais estamos em contacto com os inglezes, é onde lhes damos occasião de nos avaliarem com maior severidade.

No estado actual das sociedades, todas as nações precisam de ter exercito. Nós não podemos subtrahir-nos a esta necessidade imperiosa, tanto mais que somos ainda uma vasta nação colonial. Precisâmos de exercito, não para fazer a guerra ao estrangeiro, mas para sustentar a dignidade e os brios de nação que adora a sua independencia. Precisâmos de exercito para a paz interior e para acudir ás colonias. Um exercito bem organisado é a chave da nossa independencia.

Aqui está ainda o vosso programma: - é reformar o exercito, reorganisal-o completamente.

E não julgueis que estaes dispensados de o emprehenderdes, só porque dissestes não terdes programma.

Quanto á instrucção publica, precisaria de uma longa sessão, sr. presidente, para indicar com minuciosidade o que tenho investigado. Tudo que ha feito,
póde-se dizer que existe simplesmente no papel.

A instrucção superior acha-se em relação ao paiz muito disseminada e portanto enfraquecida. As escolas não possuem o material de ensino que exigem as necessidades da epocha. O ensino oral deixa na sombra o ensino pratico. Falla-se mais na cadeira do que se aprende nos laboratorios.

Nas escolas o que resta ainda são alguns professores que mantêem a instrucção superior na altura em que deve estar; mas, no dia em que esses professores desapparecerem, e eu não vejo por emquanto quem ha de vir substituil-os, a sciencia ficará na mais precaria situação. Se até a mocidade que frequenta os cursos já está eivada dos vicios dos velhos egoistas. A escola serve para conferir um diploma, o diploma para se alcançar um emprego. O empenho acompanha o alumno desde a sua entrada nas aulas até a sua saída. Os professores resistem, mas é preciso muita coragem para luctar contra os padrinhos! Frequentemos os cursos com o menor trabalho possivel, exclamam os afilhados. Ao saír das escolas fecham-se os livros para sempre, porque se considera que o estudar é distinctivo das intelligencias fracas. O homem de talento adivinha as questões. Não desce á discussão minuciosa dos problemas. Paira nas regiões da synthese!

Da instrucção secundaria, póde dizer se sr. presidente, que está cada vez mais cara, menos solida e mais sobrecarregada! Não se estudam as disciplinas, mas estuda-se o exame para o que ha professores especialistas. Decorada a materia, logo que se faça exame, esquece-se o que se es-

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tudou, porque se não aprendeu senão a responder ás perguntas do jury.

Temos muitas leis que se não executam, e pomposos programmas de ensino com que nos contentâmos.

Da instrucção profissional que tem por fim crear homens uteis, achamo-nos no mais completo esquecimento. Felizmente o paiz tem boa indole, e não póde dar-se aqui o que se observa noutras nações onde ha desequilibrio entre as escolas litterarias e profissionaes; porque se não fôra assim, não faltariam agitadores e homens sem officio, aptos para todas as revoluções, menos para uma - a felicidade dos outros.

Sobre a instrucção primaria escuso de insistir n'este rapido esboço, que forçado pelo tempo tenho levado de corrida. Já tratastes alguma vez da educação da mulher? Não sabeis qual é a influencia que ella póde ter nas sociedades modernas? Não me surprehende que vos esqueçaes de instruil-a, porque nem sequer na educação do homem haveis ainda seriamente pensado.

Citarei o mais eloquente de todos os factos.

Vejo na lei de Passos Manuel, que data de 1842 decretado o ensino obrigatorio em Portugal - obrigatorio e gratuito - duas grandes idéas; mas, pelo ultimo recenseamento verifica-se, que sómente um sexto da população do paiz sabe ler e escrever.

O povo, portanto, ainda não sabe ler nem escrever, e é preciso que saiba ambas as cousas ao mesmo tempo, e quanto antes, embora o ministerio não tenha programma. A reforma do ensino em bases serias é outro capitulo que devem ter bem presente todos os governos, tenham ou não tenham programma.

Ácerca das colonias de que hoje tanto se falia, e pelas quaes julgo que todos se interessam, é minha opinião que estão carecendo de um impulso vigoroso. Houve um homem que teve este pensamento elevado, porem, como a politica partidaria se intromette na administração colonial da mesma fórma que se envolve na questão de fazenda e no recrutamento, o sou pensamento não tem sido desenvolvido seguidamente. E n'uma questão tão difficil, e que carece de tantos recursos pecuniarios e de tempo, não havendo pensamento seguido, como ha em Inglaterra, tarde se tornam os resultados palpaveis.

As colonias que, para mim, são as unicas minas que restam a Portugal, e que, pela sua natureza de minas, nunca darão rendimento se não forem larga e sabiamente exploradas, não podem deixar de resentir-se do estado de perturbação constante em que vemos a metropole no tocante aos pontos esboçados. Se a administração da metropole é má, a das colonias é peior. Se a justiça nem sempre impera no continente, a injustiça e as extorsões têem sido regra quasi sempre geral nos dominios de alem mar. Se as eleições têem causado na metropole os mais desastrosos effeitos, nas colonias as eleições têem sido um foco de intriga permanente, que paralysa todas as actividades, destroe os melhores planos, levanta os maiores attritos entre os funccionarios e quebra a lei na mão de todas as auctoridades. Vi só uma, a mais gloriosa, por sem duvida, e a mais civilisada, mas essa mesma que vi, e terei occasião de voltar a este assumpto, me dá uma idéa perfeitissima do que se passa nas outras. O estado de abandono é completo, a miseria geral. Mas nós não podemos prescindir de lançar mão d'ellas, como o nosso ultimo recurso, e, portanto, fazei leis para as colonias differentes das da metropole e adequadas á Índole especial de cada uma, embora vos falte programma.

A solução de todos os problemas apontados valia bem que se podesse ter chegado, sr. presidente, a formar um ministerio de conciliação com os homens principaes de todos os partidos. Nada mais natural do que uma tentativa neste sentido; e ninguem tem o direito de duvidar da efficacia de simiihante tentativa, sem havermos feito a experiencia primeiro. Não succedeu; porém, assim. Pretendeu-se um ministerio de conciliação constituido sob outras bases. Queria-se dois principiantes do meu partido, quando hoje n'aquellas cadeiras deviamos ver os homens mais conhecedores dos negocios publicos. A falta de governo forte e duradouro, temos outro que, sobre as questões da actualidade e que promoveram a crise, ainda não possue opiniões assentes. Declaro francamente, que se estivesse n'aquellas cadeiras e me tivessem perguntado qual era a minha opinião sobre o tratado de Lourenço Marques ou sobre o imposto de rendimento, não hesitaria um segundo em manifestal-a. Mas para isto é necessario ter programma, caso que não succede aos srs. ministros. Ha muitos modos de ter programma sem se perder de vista a modéstia. Ninguem pede milagres aos srs. ministros, mas não terem opinião sobre os assumptos que os trouxeram áquelles logares, isso é que é na realidade um phenomeno incomprehensivel!

Agora as reformas politicas. N'este ponto é que o governo actual tem convicções arreigadas. Não quer reformas politicas. E tanto bastava que se dissesse para ser impossivel conciliar-se comnosco. O partido que me fez a honra de trazer-me pela primeira vez ao parlamento considera, que alem das reformas de administração e outras já enumeradas, são necessarias tambem reformas politicas. Os meus amigos politicos entendem, que havendo ministros revolucionarios, se evitam todas as revoluções, e eu accrescento, para tornar mais frisante este nosso pensamento, que em Portugal a revolução deve sempre declarar-se no governo.

As reformas politicas que entendemos precisas não hão de assustar a monarchia, nem tão pouco, está entendido, se emprehenderão para vexar o povo. Tanto havemos de insistir por ellas que alguma vez as veremos realisadas. Este programma póde ser posto em pratica por qualquer partido monarchico, porque eu declaro ao paiz e a todos os meus illustres collegas que me escutam, que sou monarchico; acrescentando mais, que a instituição monarchica n'este paiz está intimamente ligada á sua independencia. Isto não é uma simples opinião politica, é tambem, se quizerem, uma opinião philosophica que partilho e aprendi com o nosso grande pensador Alexandre Herculano.

A manutenção da liberdade dos povos e o futuro das sociedades está na monarchia constitucional. Eu não nego que a republica contenha muitas excellencias, mas não acho que se torne necessaria n'um paiz onde haja um rei com uma constituição que se não opponha á acquisição de todas as liberdades. Nem ha liberdade que não possamos ter dada pela constituição,[embora haja rei. Demais a mais as nossas condições peculiares poderiam com a republica conduzir-nos á escravidão. A historia mostra o exemplo de muitas republicas sem liberdade; e povos ha que só se lembram de republica para absorverem os mais fracos!

Queremos reformas politicas apesar de monarchicos, e queremol-as mesmo por isso, para ir de encontro ás aspirações exaltadas dos partidos radicaes, que, pregando reformas impossiveis, só conseguiram até hoje na pratica o mais cruei dos despotismos. Não desejamos, porem, o estacionamento da sociedade, e pretendemos acompanhal-a na sua evolução em todos os progressos. Comprehendemos perfeitamente as necessidades da epocha.

Taes idéas estão no polo opposto da idéa velha a cuja sombra nos quizeram adormecer.

Por ultimo, sr. presidente, declaro a v. exa. e á camara que nem eu nem os meus amigos politicos desejam ser ministros. Considero o ser ministro o maior encargo que o homem politico d'este paiz póde tomar sobre os seus hombros, e julgo mais que não vale a pena ser ministro para rasgar o programma feito na opposição, ou para nos apresentarmos ao paiz sem programma. Até hoje ainda não acceitei nenhum cargo publico sem reflectir primeiro se o podia desempenhar. Ser ministro é o maior sacrificio que se póde

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fazer pela causa publica, e só vale a pena vir a sel-o para levantar este paiz.

Qualquer governo patriotico que se organise na actualidade, deve emprehender estas reformas sem hesitação, e caír com ellas immediatamente, se o paiz, desvairado por um falso conhecimento dos seus verdadeiros interesses, as não quizer acceitar. Caír tantas vezes quantas forem precisas para que fiquem implantadas. Ora, como o actual governo não julga necessario fazel-o, nem mesmo talvez tenha em vista propor os delineamentos das grandes reformas d'este programma, que representam a felicidade da patria; no meu entender, tive por acertado não - o acompanhar na sua peregrinação porventura esteril ás secretarias do estado. Se me enganar neste juizo tanto melhor.

Estarei com os meus amigos politicos emquanto houver accordo completo sobre estes principios, não se perdendo de vista que só farei politica sensata e de inteiro proveito para a nação, porque sou acima de tudo homem do meu paiz e só depois homem do meu partido.

Não deve julgar-se o que fica dito, sr. presidente, o programma exclusivo de um determinado grupo politico da actualidade. É, sim, o programma que as circumstancias impõem a todos os homens d'estado da nossa epocha. O governo que se esquecer de cumpril-o nasce morto para a historia!

O sr. Bispo de Bragança: - Mando para a mesa um parecer da commissão de negocios ecclesiasticos sobre o projecto de lei auctorisando o governo a applicar definitivamente o extincto convento de Santo Agostinho de Chellas, no concelho tios Olivaes, e a sua dotação, para ser n'elle fundado um collegio filial das missões ultramarinas portuguezas.

Foi a imprimir.

O sr. Visconde de Chancelleiros: - Dissertou sobre as causas que deram logar á formação do novo gabinete; pediu aos srs. ministros que sustentem no poder e sanccionem pelos seus actos as idéas que sustentavam na opposição, porque n'este caso podem contar com o seu apoio. Declarou que tomava á responsabilidade de toda a opposição feita ao ministerio transacto. Disse que o governo não representa a anarchia, porque a opinião parlamentar, n'esta casa, obedecendo á imposição dos preceitos constitucionaes, obstou a que o ministerio passado deixasse as pastas caídas na lama, o que o unico acto d'aquelle governo que póde applaudir é o de ter pedido a demissão.

Discursou tambem sobre a necessidade de resolver a questão financeira, e da reforma eleitoral, feita de modo que o paiz se interessasse na gerencia dos negocios publicos.

(O discurso de s. exa. será publicado quando o devolver.)

O sr. Presidente: - Ámanhã continua a mesma ordem do dia.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas.

Dignos pares presentes na sessão de 28 de março de 1881

Exmos. srs. João Baptista da Silva Ferrão de Carvalho Mártens; Marquezes, de Ficalho, de Penafiel, de Pombal, de Sabugosa, de Vallada, do Vianna de Monfalim; Condes de Avillez, de Bretiandos, do Cabral, de Castro, de Fonte Nova, de Gouveia da Ribeira Grande, de Rio Maior, da Torre, de Valbom, de Bomfim da Louzã; Bispos de Bragança, eleito do Algarve; Viscondes: de Almeidinha, de Alves de Sá, de Bivar, de Borges de Castro, de Chancelleiros, da Gandarinha, de S. Januario, das Laranjeiras, de Ovar, da Praia Grande, do Seisal, de Soares Franco, de Valmor, de Villa Maior, da Praia; Barão de Ancede; Ornellas, Augusto de Aguiar, Pereira de Miranda, Mello e Carvalho, Quaresma, Sousa Pinto, Barros e Sá, Couto Monteiro, Fontes Pereira do Mello, Seixas e Andrade, Magalhães Aguiar, Rodrigues Sampaio, Serpa Pimentel, Costa Lobo, Barjona de Freitas, Cau da Costa, Xavier da Silva, Palmeirim, Bazilio Cabral, Carlos Bento, Eduardo Barreiros, Fortunato Barreiros, Francisco Cunha, Margiochi, Henrique de Macedo, Andrade Corvo, Ferreira Lapa, Mendonça Cortez, Gusmão, Braamcamp, Pinto Bastos, Castro, Fernandes Vaz, Reis e Vasconcellos, Manços de Faria, Ponte e Horta, Costa Cardoso, Mexia Salema, Daun e Lorena, Pereira pias, Vaz Preto, Franzini, Canto e Castro, Placido de Abreu, Calheiros, Thomás de Carvalho, Ferreira Novaes, Vicente Ferrer, Seiça e Almeida, Francisco Machado, Pires de Lima.

Discurso proferido pelo digno par Conde de Valbom na sessão de 15 de março, e que devia ler-se a pag. 272, col. 2.ª

O sr. Conde de Valbom: - Sr. presidente, eu não venho aqui excitar paixões, nem apreciar de um modo injusto os factos ou as pessoas. Muito menos venho para tratar de um modo severo os individuos pelos actos da sua vida passada. Venho, sim, apreciar seriamente a actual situação do paiz, chamando para ella a attenção dos poderes competentes, para que se proveja de remedio a este estado de cousas, em vez de se continuar em tal imprevidencia, porque da imprevidencia e da, obcecação seguem-se fatalmente funestas consequencias. (Apoiados.}

O facto lastimoso que se deu em Lisboa, duplamente lastimoso porque foi uma arruaça e uma desordem, e porque o governo a reprimiu de um modo violento e censuravel, é um symptoma, não nos illudamos, da agitação que lavra em todo o paiz, (Apoiados.} e n'isso está a sua maior gravidade. Antes de tudo, e para prevenir qualquer accusação, direi que entendo ser de obrigação de todo e qualquer governo, regularmente constituido, manter a ordem publica e o respeito ás instituições. Sem essa condição não ha governo possivel; mas é necessario tambem que, no desempenho d'esse dever, não se afaste da stricta legalidade, nem d'aquillo que a salvação publica lhe impõe. Reprimir qualquer desordem, qualquer arruaça, que tenda a perturbar a paz publica, é um dever da administração e da policia; mas é necessario que se faça isso na devida fórma, a fim de que não seja castigado o innocente pelo culpado; é preciso que se façam as intimações previas (Apoiados.} e se proceda na conformidade da lei, para que não aconteça que muitos individuos, que nem mesmo curiosos são, que, no trafego da sua vida ordinaria, transitam pelas ruas, sejam victimas de violencias que elles não provocaram. Isso é que se não póde tolerar (Apoiados.) n'uma sociedade civilisada, em nome de nenhum principio de ordem publica, nem da segurança e da paz do paiz. (Apoiados.) O governo tem obrigação de manter essa paz, essa ordem e essa segurança; mas tem formulas a guardar, tem leis a que deve obedecer, circumstancias que deve respeitar; e não pôde. unicamente invocando o principio absoluto da manutenção da ordem publica, fuzilar, metralhar e acutilar a torto e a direito homens indefezos, cidadãos innocentes, mulheres e creanças. (Apoiados.)

Sr. presidente, mas porque são estes meetings, estas reuniões publicas, porque é toda esta agitação que se manifesta no paiz? Será a opposição a este governo que a provoca, será ella a causa unica que a produz? Não é de crer.

Quando uma nação está contente com um governo, quando não se sente mal, quando os cidadãos não têem de que se queixar, qualquer que seja a agitação não se manifesta na escala em que apparece entre nós, desde certo tempo para cá. Tanto mais, n'um paiz como o nosso que, se é accusado de alguma cousa, não é de exaltação politica, nem de excitação partidaria, pelo contrario, é de um certo indifferentismo politico; portanto ha outra causa que excita os animos, que leva o paiz a esta agitação, que já agora,

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quaesquer que sejam as medidas de repressão, não póde parar, nem ha de parar, emquanto não cessarem as suas causas: e quaes são essas causas que todos nós podemos apreciar? É que o governo quando subiu ao poder, dil-o-hei com franqueza e lealdade, foi bafejado por uma certa aura popular, pelo favor da opinião; e esse governo, pelos seus actos, tem arredado de si essa opinião favoravel e excitado a animadversão publica. (Apoiados,)

Ainda o anno passado, eu aqui accentuei isto, por occasião de se tratar aqui a questão do imposto de rendimento, que eu combati, e que combati não por desconhecer as necessidades da fazenda publica, por desconhecer a urgencia da creação de receita para occorrer ás nossas despezas, mas porque entendi em minha consciencia, depois de maduro estudo, que esse imposto seria improductivo, vexatorio, altamente inconveniente e que havia do encontrar grande reluctancia no paiz..

O que eu disse o anno passado realisou-se, porque a exaltação contra o imposto de rendimento é geral em todo o paiz, e se não se tinha manifestado ha mais tempo, e porque ainda não tinha tocado de tão perto o vexame. (Apoiados.)

Tambem combati a restauração d'aquella obsoleta entidade chamada "o arrematante do real de agua" e combati porque d'ali não vem senão vexame sem beneficio algum para o thesouro, por isso que o rendimento para este é o mesmo, e o que mais póde advir é para o arrematante-(Apoiados.)

Se a applicação d'este systema condemnado não se havia levado á pratica, existia pendente como uma ameaça sobre o povo.

Junte-se a isto que o governo actual, em vez da tolerancia, veiu inaugurar o systema da perseguição politica, que irrita os animos e os revolta pelas injustiças.

Acrescente-se ainda que este governo, que veiu em nome das economias, em vez de as realisar, augmentou as despezas ordinarias, como eu aqui o demonstrei, e só cerceou a verba destinada a melhoramentos publicos; (Apoiados.) simulou suspender as gratificações que se davam, para as restabelecer por diversa fórma, com a unica differença de ser em favor dos seus apaniguados. (Apoiados.)

Estes factos, estes abusos, para não mencionar outros, não passaram desapercebidos, e são elles que têem indignado o paiz contra o governo, que faltou ao seu programma, não realisando nenhuma das medidas que havia promettido. (Apoiados.) E admiram-se então que haja esta indisposição do paiz inteiro! Admiram-se que elle procure manifestar a sua opinião nos meetings, nas reuniões publicas, contra o systema do governo! Não têem de que se admirar Tenham menos amor proprio e mais consciencia. Não acreditem só na ambição insoffrida da opposição. Examinem os seus actos, e vejam se elles não deviam ter estas consequencias. Não foi a opposição que creou artificialmente os meetings, foi a successão natural dos acontecimentos que os tornou necessarios. (Apoiados.)

Ha quem condemne os meetings; eu não os condemno. Mas antes de tratar d'esta questão, seja-me licito recordar ainda um dos motivos que póde ter causado esta perturbação dos animos.

Que motivo póde ter feito apparecer estas manifestações externas e ruidosas do partido republicano, de um partido que até aqui se conservava no recesso dos gabinetes, na contemplação extatica das suas aventurosas doutrinas? Não seria o proceder insensato o condemnavel d'aquelles que, para derrubar os seus antagonistas do poder, empregaram a injuria e a calumnia contra a corôa, desprestigiando o rei, condemnando como a mais custosa burla e n'esse systema representativo, e desauctorisando completamente as instituições monarchicas (Apoiados.) em favor do republicanismo? (Apoiados,) Não seria isso cavar o descredito do monarcha e da monarchia? (Apoiados.) E esperam-se agora de haver engrossado o partido republicano, de que faça meetings numerosos, de que ostente em publico a sua força, mais apparente do que real, de que nos surprehenda com a sua audacia, que ultrapassa as raias da legalidade!

De um gremio de scismadores fizeram um bando de arruadeiros; converteram os apostolos em chefes de partido; transformaram parte, pequena em verdade, de um povo, naturalmente monarchico por indole e tradição, n'uma chusma improvisada de republicanos. E depois espantam-se da sua obra!

O partido republicano, entro nós, se acaso brotou de uma aspiração e se enraizou pelos erros dos governos monarchicos, não é menos certo que essa planta exotica e rachitica só medrou á sombra do vosso condemnavel systema da calumnia e da injuria, medrou pelos meios empregados para supplantar os seus adversarios, e por todos aquelles que o governo tem continuado a empregar para se sustentar num triste poder, que já lhe vacilla nas mãos! (Apoiados.)

Não se admirem das consequencias dos erros que praticaram, não se espantem dos resultados das faltas que commetteram, não attribuam aos seus adversarios aquillo que é de exclusiva responsabilidade sua. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu não censuro os meetings; admitto-os; acho-os perfeitamente justificados, em these, e muito mais na hypothese..

Como podemos nós querer que o povo, sem espirito de revolta e com as intenções mais pacificas, deixe, em determinadas condições e em certas circumstancias, de se reunir em meetings para manifestar a sua opinião?

Pois que meios tem a opinião publica de se manifestar entre nós?

Quaes são os indicadores seguros que póde ter o poder moderador para exercer a sua prerogativa, e saber quando ha de mudar de governo? Será a simples indicação parlamentar?

Eu não quero desacreditar o systema representativo, não quero depreciar este systema que é commum ás diversas fórmas de governo; mas, em consciencia, todos devemos confessar que elle ainda hoje não chegou infelizmente a praticar-se genuinamente entre nós. O principio eleitoral ainda está viciado, e ninguem póde dizer, com a mão na consciencia, que a camara dos senhores deputados é o producto legitimo da vontade livre e espontanea dos eleitores. A viciação a que me referi não provem tanto das influencias locaes, porque estas hão de sempre existir, e o seu conjuncto fórma a opinião publica do paiz, nem mesmo das influencias partidarias, porque essas debatem-se livremente sem a pressão da auctoridade; mas sim das influencias officiaes que derivam da auctoridade, dos abusos do poder, das concessões que elle faz, da corrupção que exerce promettendo e dando empregos, diminuindo as contribuições aos individuos que servem nas eleições, isentando mancebos do recrutamento, demorando ou suspendendo as execuções fiscaes, perseguindo, transferindo e demittindo os empregados que têem uma opinião propria ou que se não prestam a ser dóceis instrumentos nos manejos eleitoraes, vexando, torcendo a justiça, denegando todo o favor, complicando em mil chicanas todo o cidadão que não se subordina ás suas intimações ou aos seus desejos, finalmente, é em toda esta pressão, que exerce a auctoridade em larga escala, que está o principal vicio das eleições.

O que fez o governo, que tanto estygmatisou quando era opposição estes abusos da auctoridade, esta sophisticação eleitoral?

Primeiramente montou a machina administrativa, para depois, debaixo da pressão d'essa machina, fazer as eleições, a que chamou, por irrisão, eleições livres. (Apoiados.)

Eu não digo que um ou outro deputado não seja livremente eleito; não quero lançar estygma sobre a outra capa do parlamento; fallo em geral sobre o caracter das eleições, e ninguem póde desconhecer a verdade do que acabo de

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expor; os proprios srs. ministros estamparam esta apreciação em documentos impressos, que toda a gente conheça. (Apoiados.)

Portanto, digo que o povo, a massa da nação, não se acha representada na camara dos senhores deputados. Esta, por espirito de partido, dá em todas as questões, boas ou más, maioria ao governo; e, digamos com verdade, que sempre têem dado maioria aos governos, excepto a um que, prescindindo de influir nas eleições, caíu immediatamente.. Esse governo é conhecido na nossa historia politica por um epitheto ridiculo.

É necessario que corrijamos estes defeitos e estes vicios, que fazem com que a representação nacional não possa merecer a confiança que mereceria, se ella fosse o producto genuino do voto livre da nação, e é isso que faz com que, em determinadas occasiões, quando pende sobre o povo uma questão que ameaça os seus direitos e os seus interesses mais importantes, elle se vê obrigado a recorrer aos meetings, ás associações publicas, para exprimir a sua opinião, e fazel-a chegar até ao parlamento e ao throno, a fim de que se conheça qual é a vontade do paiz.

Que fez este governo para deixar exprimir livremente as opiniões?

A camara dos pares, pelo seu caracter permanente, possue, como ninguem póde negar, condições de mais independencia.

Quando tratou de manifestar livremente a sua opinião, procuraram supplantar-lhe a independencia de voto e de parecer com successivas fornadas, para transformar a maioria da camara. (Apoiados.}

Eu não digo que se não possa nomear pares, em maior ou menor numero, quando ha uma grande medida reclamada pelo publico, á qual é obstaculo uma maioria facciosa ou renitente n'esta camara mas nomear pares successivamente, fazer fornadas consecutivas, só para estabecer o predominio politico de um partido, sem um determinado fim de utilidade publica, isso é que é injustificavel. (Apoiados.}

O governo constitucional é essencialmente um governo de transacção, um governo de conciliação; e se a camara dos pares houvesse de subscrever servilmente a tudo o que o governo conseguisse fazer votar na outra casa do parlamento, deixava ella de ter rasão de existencia. (Apoiados.}

Não fica mal a nenhum .governo transigir, conciliar as opiniões; antes lhe fica muito bem, que é para isso que existe o equilibrio das instituições, a harmonia de differentes elementos, dos quaes deve resultar a opinião que mais se coadune com os interesses do paiz. (Apoiados.)

Destruido este equilibrio, ficando tudo sujeito ao predominio exclusivo de uma facção, acaba a indole do systema representativo. (Apoiados.}

O governo procurou desvirtuar, frustrar todas as manifestações da opinião publica, da opinião independente que lhe era contraria, e agora admira-se de que o povo trate de reunir-se para manifestar essa opinião e fazel-a chegar onde deve.

Os meetings, em geral, são uteis, são necessarios. Mesmo na Inglaterra, onde a eleição da camara popular mais se approxima da verdade, apparecem os meetings, quando se trata de discutir uma grande questão de interesse publico, tanto de politica interna, como de politica externa. Mas, entre nós, a necessidade dos meetings sobe de ponto, pelas considerações verdadeiras, sinceras, innegaveis, que eu acabei de fazer.

"Cumpre, porém, que esses meetings se mantenham dentro da legalidade." De accordo; e sem isso elles não podem, nem devem existir; mas o que é tambem necessario é que se não deixe nascer a suspeita de que outras pessoas, que de certo não pertencem á opposição, porque esta não tem interesse nenhum em desvirtuar os meetings, é que aquelles, digo, que podem ser mais suspeitos, porque têem interesse em vicial-os, lancem a perturbação sobre o exercicio livre de reunião que tem o povo. (Apoiados.)

O que é necessario é que não appareça, entre nós, esse producto hybrido, que não é conhecido em parte alguma do mundo - os meetings officiaes, mandados fazer pelo governo ou pelas suas auctoridades, o que é outra viciação que vem emparelhar com a viciação do direito eleitoral pelas auctoridades. (Apoiados.) Nem em Inglaterra, nem em parte alguma, repito, se fez nunca o meeting official. Ali, o governo espera ser julgado pelos seus actos, mantem a ordem publica e a liberdade dos cidadãos, e o paiz é que dá a sentença. Não procura servir-se dós meios da auctoridade, nem da força que lhe 4á o poder, para fabricar uma opinião publica de proposito para o seu serviço. (Riso.) Assim é que o governo devia proceder, a não estar a fabricar meetings, como se tem visto por esse paiz. (Apoiados.) Pois é crivel que o povo faça um meeting para pedir ao governo que lhe lance o imposto de renda, como o melhor dos impostos?! (Riso.) Já se viu em alguma parte do mundo que o povo pedisse para lhe lançarem um imposto, por mais suave que esse imposto podesse ser? .(Riso.)

Pois dão-se d'estas cousas em Portugal, no meeting official de Braga, por exemplo. (Riso.)

Como se póde acreditar, na verdade, de manifestações de similhante natureza? Como se póde crer que o povo, entre nós, chegasse já á perfeição de ser elle proprio quem peça que se lhe lance um imposto, e imposto tão inacceitavel, como é o de renda?

Aqui está, pois, a rasão por que eu temo que se chegue a viciar completamente este outro modo de manifestar a opinião publica, e que a final as reuniões populares não tenham a significação real que devem ter. Portanto, essa creação hybrida, inadmissivel e inconstitucional, que tende a desnaturar a expressão sincera do voto popular por meio de reuniões ou meetings officiaes, deve ser fulminada por todos os homens que têem amor ao exercicio livre do systema constitucional e aos sãos principios da liberdade. (Apoiados.)

Mantenha-se a ordem dentro da legalidade, mas deixem ao povo exprimir livremente a sua opinião, sem a influencia da auctoridade.

Agora que tenho dito estas verdades, embora duras, ao governo, devo tambem dizer a verdade ao povo e ao partido republicano.

Este partido, como, já disse, e é exacto, medrou á sombra dos expedientes politicos d'este governo, e continua a figurar na scena publica por virtude de alguns d'esses expedientes.

Qual é a rasão por que esse partido apparece agora e não apparecia dantes? É porque, comquanto as nossas instituições garantam a maxima liberdade de cada um manifestar as suas opiniões, e embora a nossa indole seja ò mais tolerante possivel, e certos individuos que professam as idéas mais avançadas tenham as nossas sympathias, a immensa maioria dos portuguezes não é de certo republicana; (Apoiados.) por isso as idéas republicanas não achavam até agora tanto acolhimento.

A explicação, pois, de serem agora mais publicamente acceites as idéas republicanas, é porque os verdadeiros republicanos são aquelles que se fazem monarchicos para terem occasião de tornar esse systema antipathico. (Apoiados.}

Póde haver homens de doutrina e de gabinete, que acreditem de boa fé nas excellencias do systema republicano; mas é preciso que, antes de procurarem desvairar o povo, elles examinem se o paiz está no caso de o estabelecer.

Isso é que é necessario sobretudo ter em attenção, e não vir lançar no paiz uma agitação inutil, ou antes prejudicial.

As agitações do partido republicano não podem actualmente em Portugal servir senão para sustentar este ministerio.

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Enganam-se se julgam que as suas agitações podem contribuir para a queda d'este governo, condemnado pelo seu systema administrativo e financeiro, assim como pelo seu proceder politico, que é o da intolerancia; ao contrario, estas manifestações vão-lhe dar força, pois tendem a impedir a opposição de obrar livremente, para que se não diga que ella faz causa commum cem um elemento antagonista das actuaes instituições, elemento com que ella não póde capitular, porque é monarchica. (Apoiados.}

Identificando a causa do governo com a do principio monarchico, os republicanos põem n'este ponto a opinião geral do paiz do lado da conservação do actual ministerio, para que ninguem possa attribuir a queda d'elle á preponderancia do partido republicano, o que, não obstante ser uma completa illusão, teria uma, apparencia de realidade.

Ha porém, ainda um mal maior, que deve ser maduramente ponderado.

Se a agitação republicana, por quaesquer circumstancias de occasião, como é principalmente a exploração do sentimento nacional a proposito do tratado de Lourenço Marques, conseguisse assumir proporções assustadoras, e tomar um caracter revolucionario, isso poderia fazer acreditar aos governos dos estados da Europa, na sua grande maioria monarchicos, que entre nós tinham um foco de adversarios perigosos, e podia chamar sobre nós a má vontade desses governos e a indisposição das nações que elles dirigem.

Bem sei que cada nacionalidade é independente no seu modo de viver, não ha ninguem que negue este principio; mas tambem não se póde negar o facto de cada nacionalidade ter de subordinar esse principio á sua força e á sua grandeza, porque ainda não se estabeleceu o direito das gentes por fórma tal que se respeitem em todas as nações iguaes direitos. O que se têem visto até agora, em todo o periodo historico, é prevalecer o direito da força sobre a força do direito.

portanto, se todas as nações devera ter juizo, as nações pequenas têem amola mais necessidade de o ter e de procederem cone muita prudencia. (Apoiados.) A sua existencia, posto que garantida pelos tratados e peie direito internacional, é mais arriscada do que a das nações grandes, que têem força bastante em se para se conservarem a despeito de todas as luctas.

Supponhamos que a doutrina republicana conseguia ter tantos proselytos; entre nós, que chegava prematuramente a triumphar. Qual era a consequencia d'isso? Era correr risco a nossa independencia e a nossa liberdade, ou chamar sobre nós uma intervenção estranha. Esta é a verdade, é necessario que o povo saiba isto; nós não podemos ser a pretensão de querer impor á Europa, cuja grande maioria é monarchica, o systema republicano, o isco quando temos ao pé de nós a Hespanha, que lucra em todo o caso com a nossa disolução politica, e onde existe, a par da latente aspiração iberica, um governo monarchico que trata de se consolidar, e que está agora mais forte do que nunca.

Portanto, eu direi ao partido republicano que as suas manifestações não servem actualmente senão para sustentar este governo, contra o qual a nação se manifesta, e não servirão n'um futuro, mais ou menos proximo, senão para comprometter e pôr um risco a nossa nacionalidade e chamar sobre nós grandes calamidades. (Apoiados.) Todas as idéas têem e seu tempo, e todas as doutrinas a sua occasião .

A evolução da sociedade segue uma ordem natural, não se póde forçar. Quando na sociedade europêa essa evolução movimento social chegar ao seu completo desenvolvimento, e tiver como resultante uma determinada fórma de governo, ella ha de vir espontaneamente, sem revoluções violentas, porque então é a ordem natural das cousas, que lhe dará o ser.

Mas emquanto essa evolução natural das sociedades humanas não chegar a esse ponto, é prematuro querer estabelecer essa fórma de governo, que compromette não só o socego da sociedade, onde se promove o advento de uma idéa que ainda não está amadurecida, mas que sacrifica a propria idéa.

Já Lamartine proferiu um grande axioma, quando afrmou que uma verdade colhida antes de tempo é uma decepção.

Isto digo eu tambem ao partido republicano, e direi mais, que das fórmas politicas não é boa na realidade senão aquella que for mais adaptada ás condições de uma determinada sociedade.

O sr. Visconde da Chancelleiros: - A que der governo sobretudo.

O Orador: - Quando digo adaptada, entende-se como condição primordial a de dar bom governo.

A primeira necessidade de uma sociedade é ser governada, é ter ordem e liberdade, sem o que não póde viver. (Apoiados.)

No systema que nos rege ha tolerancia para todas as opiniões, e permitte-se a propaganda pacifica. Á imprensa se de alguma cousa padece, não é de certo por estar amordaçada. (Apoiados.)

Pelo contrario: a imprensa escreve todo que quer, e ás vezes era melhor que não escrevesse certas cousas; (Apoiads.) mas, essa imprensa póde considerar-se tambem como uma manifestação da opinião publica, comquanto seja principalmente orgão dos seus redactores ou dos que os inspiram, porque quando são muitos os jornaes escrevendo no mesmo sentido, é evidente que, entre os seus numerosos leitores, estabelecem uma certa corrente de idéas, que exerce uma poderosa influencia no espirito publico e o identifica cada vez mais com esse modo de ver, sobretudo quando a inconveniencia dos actos do governo coopera para, o mesmo fim, justificando a critica de que são alvo.

Ora, a imprensa do paiz na sua grande maioria á centra o governo, e por consequencia tambem por este lado lhe não é muito favoravel a opinião.

Sem applaudir certas demasias da imprensa, que seria para desejar se evitassem, não se póde deixai de reconhecer que & actual situação politica não tem grande direito de as estranhar, porque as provocou, iniciando e prateando, para derrubar os seus adversarios e subir ao poder, o systema de injuriar e calumniar, (Apoiados.) de medo que, se nós fossemos lidos lá fóra, nos deviamos envergonhar, não do que toda a imprensa escreve, mas uma parte d'ella.

Não se póde, porém, negar que quem auctorisou isto, e é digno de maior censura, foram os que começaram a trilhar este caminho. (Apoiados.)

Uma VOZ: - Houve outros exemplos mais antigos.

O Orador: - Eu bem sei que ha precedentes; não na factos, nem absurdos alguns que não tenham infelizmente o seu precedente na historia, (Apoiados.) mas tambem sei que não se devem invocar senão os bons precedentes, e muito bem o disse o nosso distincto publicista o sr. Silvestre Pinheiro "que uma nação não se governa pelos exemplos, mas sim pelas regras e principios"

Ha na nossa historia politica precedentes de estylo violento na imprensa, é verdade; mas é necessario corrigirmos-nos em vez de aggravar o mal, sem deixar de attender as nossas apreciações á diversidade das circumstancias.

Quando hoje abro o Espectro, de que se fez agora uma nova edicão, esse pamphleto acrimonioso, escripto no meio, dos ardores da guerra civil pelo nosso primeiro jornalista vejo ali a par da violencia e irritação do momento, a elevação e a grandeza da verrina politica; a grandiloquencia do estylo e o levantado das idéas, a par das expansões da paixão. E hoje que vemos nós?! Hoje, no regaço da paz, sem luctas civis, sem embate de principios, no meio de indifferentismo publico, vemos a philipica descabellada e a

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diatribe chocarreira arrastar-se n'um estylo mascavado e relles pela lama das ruas. (Apoiados.)

Se ha precedentes historicos para estas aberrações da imprensa, ha infelizmente tambem uma lastimosa decadencia na sua injustificavel imitação. (Apoiados.)

Sr. presidente, a agitação no paiz provem das causas que tenho ponderado; não se extingue com duas cargas de cavallaria. (Apoiados.)

Existe, porque está na ordem natural das cousas.

A compressão violenta póde ter um exito momentaneo, mas produz fatalmente uma reacção mais energica, que póde ir até á revolução.

A imprevidencia e a obcecação, são más conselheiras, e sob o seu funesto influxo nascem as catastrophes (Vozes:- Muito bem.)

Eu sentiria muito, que depois de meio seculo de systema parlamentar, os altos poderes do estado não soubessem interpretar devidamente a grave situação politica em que nos encontramos, e não providenciassem, como lhes cumpre, na sua alta sabedoria.

Receio, repito, as tremendas consequencias que, fatalmente, derivam da imprevidencia e da obcecação.

Sr. presidente, o imposto de renda não póde ser applicado.

É necessario que se convençam d'isto.

Em minha consciencia, eu entendo que este imposto é o mais improductivo e vexatorio, e que podia ser substituido por outro que rendesse muito mais e vexasse muito menos. (Apoiados.)

A arrematação do real de agua não se póde manter.

Este systema é vexatorio e obsoleto, e rende muito menos do que poderia produzir a administração directa pelo estado.

Nenhum governo póde contar com que a resurreição do arrematante de resultados satisfactorios. (Apoiados.)

O systema do governo augmentar as despezas ordinarias e diminuir as que dizem respeito aos melhoramentos publicos, é um systema ruinoso e anti-economico. (Apoiados.)

A tendencia do governo para centralisar a administração, tem por fim diminuir as liberdades e os direitos locaes, e robustecer a força do poder que vicia as eleições. (Apoiados.)

Esta tendencia é nefasta, e nunca póde conduzir o paiz pela estrada da prosperidade.

Portanto, acho justificada a agitação que estamos presenceiando.

Condemno as arruaças e a desordem; condemno as manifestações de um republicanismo prematuro e inconsiderado; mas apoio as manifestações pacificas e sensatas do povo, porque o paiz tem direito a ser bem governado. (Muitos apoiados.)

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi comprimentado por muitos dignos pares e srs. deputados que se achavam na sala.)

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