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286 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

grammas de lã, alem do combustivel e das materias primas necessarias para a sua transformação em tecidos e artefactos de varia especie.

O movimento de mercadorias é de tal ordem, que ainda ultimamente, em consequencia das medidas sanitarias, se achavam retidos na fronteira quatrocentos wagons carregados de lã destinada ás fabricas d'aquella cidade, alem da que para ali foi já transportada, depois de supprimido o cordão sanitario.

Por estes numeros se póde julgar qual é hoje a importancia da industria fabril que naquella terra se creou e tem desenvolvido, luctando com as maiores difficuldades provenientes da falta de vias de communicação.

A situação topographica da Covilhã contribuiu para que esta cidade se conservasse por muito tempo isolada dos principaes centros de consumo do paiz e separada por grandes distancias das estradas ordinarias e das linhas ferreas.

Ainda hoje a linha mais proxima, que é a da Beira Alta, passa-lhe na Guarda, á distancia de 50 kilometros, que teem de ser percorridos por uma estrada accidentada, através de um paiz montanhoso.

As difficuldades de transporte foram taes, que para levar uma machina do porto de Lisboa até á Covilhã era preciso gastar uma somma igual ou superior ao custo da propria machina.

O transporte de uma simples roda hydraulica chegou a custar cerca de 1:000$000 réis, porque não havia outro modo de a conduzir senão em barcos e em carros de bois, e ás vezes até em animaes de carga.

Apezar d'estas enormes difficuldades, aquella industria attingiu o grau de prosperidade que é conhecido de todo! o paiz, a ponto de já hoje poder concorrer na perfeição e barateza dos seus productos com alguns artigos estrangeiros. Se em taes condições se creou e desenvolveu uma industria tão importante, é de presumir que ella augmente e progrida muito mais, logo que seja auxiliada com o beneficio immediato de uma linha ferrea, que a sirva convenientemente.

Ha dois modos de servir a Covilhã por meio do caminho de ferro; ou se ha de fazer um desvio no traçado, de modo que a linha principal, tomando a margem direita do Zezere, vá passar junto da cidade, onde deve ter uma estação; ou se ha de levar a linha pela margem esquerda e fazer um ramal, que, partindo da Covilhã, vá entroncar na mesma linha no ponto que for mais conveniente.

D'estes dois modos é sem duvida preferivel o primeiro; e só deveria adoptar-se o segundo, se as difficuldades technicas tornassem absolutamente impossivel a construcção da linha pela margem direita, pois nesse caso seria indispensavel o ramal.

Felizmente não se dá esta circumstancia. Segundo as informações que tenho, e á vista dos estudos que foram feitos pelo engenheiro a que o sr. Vaz Preto se referiu, por ordem do fallecido estadista o sr. Saraiva de Carvalho, convenço-me de que a variante pela margem direita, com estacão junto da Covilhã, é perfeitamente exequivel, serve melhor os interesses da industria e do commercio d'aquella cidade, e apesar de comprehender duas pontes e um tunnel, é menos despendiosa do que o ramal, que não poderia ter menos de 8 kilometros de extensão para ganhar a differença de nivel entre a linha principal e a Covilhã.

Em todo o caso, a despeza a fazer não é tão grande como se tem dito, nem é despeza que assuste; segundo os cálculos feitos na minha presença por dois engenheiros competentissimos, os 3 kilometros da variante pela margem direita podem importar um augmento de despega de réis 270:000$000, e o ramal de 8 a 10 kilometros havia de necessariamente custar mais, e teria ainda o inconveniente de augmentar as despezas da exploração.

Convém advertir que os cálculos, a que me refiro, foram apenas uma estimativa feita por alto, e por isso não póde haver n'elles perfeita exactidão.

Alem dos inconvenientes que apontei, o ramal tem ainda o grande defeito de estar apenas promettido, e não votado. Esta circumstancia é importante, e deve ter influido no animo dos covilhanenses, que podem, com rasão, nutrir o receio de que á promessa não chegue a cumprir-se, ou, pelo menos, que a construcção do ramal seja protelada por muitos annos, com grave prejuizo do movimento commercial e fabril da Covilhã.

Não quero dizer com isto que houvesse da parte do governo transacto, ou que possa haver do actual, o proposito de illudir os habitantes d'aquella cidade com uma promessa que não houvesse de ser cumprida; mas eu sei muito bem e sabe toda a gente, que por força das circumstancias e a despeito dos melhores desejos, nem sempre se póde cumprir aquillo que se promette.

Contra a variante da margem direita do Zezere tem-se ainda apresentado o argumento de que, podendo a linha da Beira Baixa servir como linha internacional, não deve alongar-se com um desvio de 3 kilometros só para servir uma povoação, embora importante, que fica no trajecto. Este argumento, porém, não colhe, porque o percurso de mais 3 kilometros é tão insignificante, que não vale a pena consideral-o na grande extensão de uma linha internacional. São quatro ou cinco minutos a mais em viagens de muitas horas.

Alem d'isso, como muito bem disse o sr. ministro das obras publicas, as linhas ferreas devem ter por objectivo principal os centros de população existentes no paiz, e não se devem traçar attendendo unica e exclusivamente ao encurtamento da distancia entre os pontos extremos, e á economia e facilidade da construcção.

Ora, sendo a Covilhã um grande centro industrial, o mais importante do paiz abaixo de Lisboa e Porto, e podendo construir-se a linha da Beira Baixa de modo que passe junto d'aquella cidade, o afastal-a dali seria um erro grave, de que infelizmente já temos entre nós um exemplo deploravel.

Vou concluir, repetindo a declaração que já fiz, de que n'esta questão me não movem sentimentos de politica partidaria, mas sim o desejo de bem servir os interesses da minha patria.

Reconheço os serviços prestados pelo digno par o sr. Vaz Preto á provincia da Beira Baixa, e folgo tanto mais de prestar-lhe aqui este publico testemunho de consideração, quanto é certo que nunca militei em politica ao lado de s. exa.

Tenho dito.

O sr. Presidente: - Vae ler-se a nota de interpellação mandada para a mesa pelo digno par o sr. marquez de Vallada.

Lida na mesa, mandou-se expedir a seguinte:

Nota de interpellação

Desejo interpellar os srs. presidente do conselho de ministros, ministro da justiça e ministro dos negocios estrangeiros, relativamente ás medidas tomadas já e áquellas que o governo entende deve adoptar para que se evite por uma vez o trafico criminoso da emigração clandestina.

Camara dos pares, 23 de março de 1886. = O par do reino, Marquez de Vallada.

Mandou-se expedir.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, começarei por agradecer ao digno par sr. Viegas o alto testemunho de consideração que me acaba de dar, e as palavras de muita deferencia que me dirigiu. Sr. presidente, é tanto maior o meu reconhecimento, quanto é grande o peso d'essas palavras.

Foram ellas proferidas por um collega meu, distincto pelo seu saber, considerado pelo seu elevado merecimento.