SESSÃO DE 25 DE JUNHO DE 1880 585
possa allegar como justificação de não querer consentir na reducção do imposto do consumo dos vinhos, o receio do enfraquecimento das receitas; porque o partido progressista nunca mostrou preoccupar-se com isso senão antes de entrar para o poder. Depois que está á frente dos negocios publicos os seus actos têem mostrado a maior despreoccução pelo futuro financeiro do paiz; provam-n’a os repetidos emprestimos, com opções e preferencias em detrimento do estado, a alienação de muitas receitas, as despendiosas reorganisações dos serviços publicos, com augmentos de quadros e alem d’isso a invenção dos addidos aos quadros, e, até os pagamentos subpreticios de importantissimas sommas.
E se ainda estas provas não bastam, ahi está agora o projecto de lei que vem de ser approvado na camara dos senhores deputados. Leixões-Salamanca, que representa uma nova e lucrativa preferencia que se avalia em cerca de 2.000:000$000 réis a favor dos financeiros que o governo protege, uma nova concessão aos bancos do Porto cujo alcance ninguem póde avaliar com segurança, um grande sacrificio para o thesouro e nenhuma vantagem para o estado.
Portanto as rasões apresentadas não colhem, e o que obsta á acceitação das propostas da opposição, serão outras rasões que eu não menciono, para não ser inculpado de tirar a esta questão a feição de questão aberta, como o governo pretende inculcar que a considera. Assim devia ser. O facto porem, é que o projecto, assim como está, não melhora as más condições em que se encontram os productores de vinhos.
O que eu não póde deixar de estranhar foi que o governo para se negar a conceder uma protecção tão justificada, 938-crupulise tanto com o desfalque das receitas, quando não tem escrupulisado quando se tratou de satisfazer interesses particulares e mesmo interesses particulares assas illegitimos.
Mas, sr. presidente, eu preciso agora referir-me a algumas objecções que n’esta discussão apresentou o digno relator das commissões reunidas, contra a diminuição no imposto de consumo.
S. exa. é um iliustre e abalisado professor de agronomia e um funccionario que conhece a fundo as necessidades do paiz e da sua industria agricola, pelos serviços a que tem superintendido e o muito que tem estudado estes assumptos; por consequencia são de grande valor as suas opiniões a respeito da materia d’este projecto.
Disse s. exa. que na sua cadeira procura a verdade como ella se offerece, e aqui sente-se embaraçado porque receia não levar a convicção a todos os espiritos como, lhe parece que consegue como professor em relação aos seus alumnos. S. exa. na sua cadeira profissional trata desassombradamente de discutir um assumpto e instruir os seus discipulos, mas ali discute com toda a lucidez do seu espirito e unicamente inspirado pelo desejo de descobrir a verdade.
Aqui s. exa. defende um projecto que não fez, e se o fizesse estou intimamente convencido que não o redigiria.
Ba a rasão porque s. exa. se sente algum tanto embaração.
A dificuldade que encontra procede unicamente de ter de sujeitar a sua consciencia ao principio da lealdade partidaria.
Em toda a sua argumentação mostrou o illustre relator que se depara dominar por uma visão tenebrosa, a visão do taberneiro indo pelo silencio da noite, com os seus acolytos, adulterar os vinhos com que envenena os consumidores, misturado-lhes largas quantidades de agua e juntando-lhes não sei que materias córantes.
Ora, sr. pressente, esta visão não póde ser obstaculo á diminuição dos direitos de consumo; antes deveria aconselhar a adopção de similhante providencia.
Eu vou rapidamente justificar a minha asserção.
Em primeiro logar o illustre relator da commissão parece admittir que todo o consumo se faz unicamente por intermedio do taberneiro. Mas não é assim. Uma parte muito importante do consumo não passa pelas mãos deste adulterador de vinhos.
Em segundo logar, se o taberneiro é um falsificador, contra essas fraudes, prejudiciaes á saude dos consumidores, deve haver castigo previsto nas leis. Corrija-se, pois, o abuso pela applicação da lei, e se não ha lei cumpre ao governo estudar o assumpto e depois trazer ás côrtes uma proposta que attenda a esta necessidade publica.
E uma alta questão de hygiene.
Não se trata sómente de augmentar o consumo dos vinhos genuinos, trata-se precisamente de conseguir que esses vinhos que concorrem aos mercados sejam puros e não uma bebida artificial e algumas vezes perigosa á saude.
Este ponto é importante.
Contra a diminuição dos direitos de consumo ha quem allegue que essa diminuição a final não vae influir no preço do vinho que se vende a retalho nas tabernas.
Ainda quando assim fosse eu já notei que o taberneiro não é o intermediario de uma grande parte dos consumidores, e esses lucrariam com a diminuição de preço.
Alem d’isso conseguir-se-ia que os productores de bons vinhos, de vinhos genuinos, os poderiam trazer aos nossos mercados e que os consumidores teriam por preços não superiores aos actuaes vinho genuino em vez de bebidas falsificadas e prejudiciaes para a saude.
E não seriam estes grandes resultados compensação bastante do desfalque de receita com que se quer argumentar?
Agora, sr. presidente, vejamos como se melhoraria a situação da nossa industria vinicola pelo alargamento dos mercados estrangeiros.
Para isso, para acudir a essa necessidade, temos o artigo 5.° do projecto.
Ora o artigo 5.° do projecto está redigido por fórma, que quanto mais o leio, mais sinto augmentar a minha surpreza, e analysando-o grammaticalmente, tenho de interpretal-o pela maneira que vou expor á camara, reputando-o inefficaz, e um mero expediente, que não póde de maneira alguma influir nos mercados.
O artigo 5.° diz o seguinte:
(Leu.)
Consideremos as consequencias praticas d’esta disposição.
Ora, esses 20:000$000 réis hão de ser distribuidos em premios ás associações de viticultores e aos vinicultores que fabricarem pelo menos quarenta pipas de vinho.
Mas fabricados em que condições?
Os agricultores, commerciantes, ou fabricantes preparam quarenta pipas de vinho conforme um typo adequado ao consumo estrangeiro, e para esse fim necessitam conhecer esse typo que lhes é fornecido annualmente em amostras approvadas.
A primeira duvida que se me offerece é a seguinte:
Aonde estão essas amostras?
Essas amostras quem as fornece?
Vão buscal-as ao estrangeiro?
São amostras de vinhos estrangeiros, de certos vinhos estrangeiros de que se presume que os nossos vinhos por sabias combinações poderão approximar-se?
As amostras, diz o artigo, teem de ser approvadas por um jury especial,
Eu tenho obrigação de? interpretar este artigo pelas palavras que elle encerra. É um jury especial de que fazem parte os viticultores, os commerciantes de vinhos e os delegados dependentes da direcção geral de agricultura, e não sei que entidades novas virão encorporar-se n’elle.
Não é um jury, é um numerosissimo congresso, que não sei aonde poderá funccionar; não me parece que possa caber nas mais amplas salas dos nossos estabelecimentos