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DIARIO DO GOVERNO.

CAMARA DOS SENADORES.

Sessão de 18 de Fevereiro de 1839.

(Presidencia do Sr. Leitão.).

MEIA hora depois do meio dia teve principio a Sessão; presentes 37 Srs. Senadores.

Leu-se e approvou-se a Acta da precedente, e mencionou-se a seguinte correspondencia:

1.° Um Officio do Sr. Francisco Tavares de Almeida Proença, Substituto por Castello Branco, participando que comparecerá logo que cesse o seu impedimento, e antes mesmo do praso marcado para esse fim,

2.° Outro do Sr. João de Almeida Moraes Pessanha, Substituto por Villa Real, expondo que se acha quasi -restabelecido, e se apresentará quanto antes.

3.° Outro do Sr. Macario de Castro, Substituto por Vizeu, remettendo duas Certidões de facultativos para prova do seu impedimento. — De todos ficou a Camara inteirada.

4.º Um Officio do Ministro da Justiça, enfiando esclarecimento sobre a queixa que houve contra o procedimento da Junta do lançamento da Congrua do Parocho de S. Vicente Martyr, na Villa de Abrantes. — Estes esclarecimentos, que haviam sido exigidos sobre requerimento do Sr. Bergara, a pedido seu foram mandados á Commissão de Legislação.

O Sr. Trigueiros: — Tenho na mão 36 exemplares de um Requerimento que os alumnos de Medicina na Universidade dirigiram á Camara dos Deputados: sendo rogado para os offerecer aos Srs. Senadores, vou manda-los para a Mesa, e peço que V. Ex.ª os faça distribuir. — Assim se fez.

O Sr. Barão de Fonte Nova: — Sinto bem ter de me ausentar por quinze dias desta Camara; mas negocio de minha casa, urgente e importante, me obriga a isso: espero que a Camara consinta. — Resolveu-se na conformidade deste pedido.

Teve segunda leitura a Proposta do Sr. Zagallo para a organisação do Exercito. (V. Diario N.° 44, a pag. 218.) Teve a palavra o seu Auctor, e disse

O Sr. Zagallo: — Antes de demonstrar as vantagens que resultam da Proposta que tive a honra de oferecer a esta Camara, necessito desvanecer o escrupulo do Sr. Visconde do Sobral, relativamente á iniciativa do Governo sobre objectos desta especie. Diz o § 10.º do Artigo 37 da Constituição, (que compete ás Côrtes) = Fixar annualmente, sobe Proposta ou Informação do Governo, as forças de terra e mar. = Por este enunciado se vê, que a iniciativa que attribue ao Governo não tem relação alguma com organização, porque de outro modo teriamos de mudar de organisação todos os annos. A fixação que se nota neste paragrapho, segundo o meu entender, é relativa á força que se deve pagar; a organisação fica sempre em pé, destinando-se ama quantia para o Ministerio da Guerra; e este, pelo licenciamento, ou pelos outros meios que tem á sua disposição, fixa a força que as Côrtes mandam pagar: de outro modo, repito, haveria uma organisação cada anno, e não é presumivel que tal fôsse a intenção dos Legisladores da Constituição. Por esta parte, me parece não ha fundamento sufficiente para se suppôr que a iniciativa de que tracto pertença ao Governo, quando estou persuadido que ella pertence a qualquer das Camaras, por isso mesmo que a unica exclusão para a dos Senadores está marcada no Artigo 54 (leu-o). Eis aqui o que e iniciativa da Camara dos Deputados; todos os outros objectos, que não estão comprehendidos debaixo destes tres pontos, póde a dos Senadores tomar a iniciativa sobre elles; e o escrupulo do Sr. Visconde do Sobral e relativo á força que se fixa todos os annos, e não áquella que é determinada pela organisação. É verdade que quando se tracta de uma organisação, sempre anda junta a ella, uma força, mas isso e da natureza da cousa, porque não ha organisação sem força; mas no que eu insisto é que a força a que se refere o § 10.° do Artigo 37 da Constituição não e organisação: de outro modo (ainda o torno a dizer) seguia-se o absurdo de que todos os annos se devia mudar de organisação militar; mas quando de uma qualquer interpretação se segue absurdo, segundo as regras de hermeneutica devemos rejeita-la. Por tanto póde aqui tomar-se iniciativa sobre a organisação do Exercito; porque supposto que a organisação traga comsigo uma força, esta não exclue aquillo que pertence ao Governo, que aliàs póde dar as informações convenientes, pois só elle tem a pratica do Serviço, e da força que o mesmo Serviço exige. Não julgo dever adiantar-me mais sobre este objecto, porque no caso de se decidir que a Camara não tem esta iniciativa, escusado será entrar em maiores explicações.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — Ou eu me não expliquei bem na Sessão de Sabbado, ou não fui bem entendido. Quando pedi que se mandasse imprimir o Projecto de organisação do Exercito apresentado pelo Sr. Zagallo, foi porque me persuadi, e ainda hoje me persuado, que o seu alcance se não podia avaliar por uma simples leitura; e quando o Sr. Visconde do Sobral citou um Artigo da Constituição, tambem eu não estava, nem estou bem firme a esse respeito. De certo modo entenda que organisar é cousa differente de fixar mas por outro lado vejo que a organisação póde comprehender a fixação. Em fim, parece-me que, antes de tudo, o mais necessario e mandar imprimir o Projecto: ainda suppondo que o Senado não toma conhecimento delle, em materias desta ordem nada se perde com a impressão; é mais um Documento que póde estar á vista de quem se encarregar deste objecto. Por tanto insisto em que o Projecto se mande imprimir, antes de ír á Commissão; não devemos proseguir sem saber primeiro se podemos ou não tractar da materia: e eu, sem querer offender a Constituição, tambem me inclino a crer que o esqueleto, do Exercito póde ser marcado nas Camaras, posto que o fixar a força seja proposta que compete ao Governo.

O Sr. L. J. Ribeiro: — Pedi a palavra sobre a ordem, porque me parece que a Constituição põe termo a esta questão: os Srs. Senadores que acabam de fallar disseram talvez tudo que eu vou dizer, mas por outras palavras. A Camara dos Deputados, pelo Artigo 54 da Constituição, tem a iniciativa sobre Impostos e Recrutamentos; mas sobre todos os outros objectos, sejam de que natureza forem, tanto pertence a iniciativa ao Senado como á outra Camara, como ao Governo: por tanto sendo esta a disposição Constitucional, nenhuma duvida póde haver em admittir o Projecto em questão, e o Sr. Senador que o apresentou tinha todo direito a isso, e não offendeu em cousa alguma a Constituição.

O Sr. Barão de Villa Nova de Foscôa: — O Projecto deve, antes de tudo, ír á Commissão; a razão é obvia: naturalmente a Commissão ha de fazer-lhe algumas alterações, e então é que cabe imprimir-se, porque o Senado tem de deliberar sobre o Parecer da Commissão, e não sobre o Projecto. Logo, se se mandar imprimir tal Projecto, antes de ser remettido á Commissão, seguir-se-ha que teremos uma nova cousa, que são as emendas da Commissão, e que será preciso fazer-se uma nova impressão.: por consequencia convém praticar a ordem estabelecida, isto é, que o Projecto se imprima com as alterações que a Commissão lhe propozer. Quanto á questão principal, parece-me que não foram bem entendidas as reflexões do Sr. Visconde do Sobral. O Sr. Visconde do Sobral não duvida que seja objecto desta Camara a organisação do Exercito, e tudo que -é da iniciativa da outra (á excepção dos dons pontos marcados no Art. 54); o que o illustre Senador dizia era que não se podia aqui fixar a força de terra e mar: a questão é, pois, se neste Projecto se fixa alguma dessas forças. Logo que se diz = haverá tantos Corpos com tal numero de Officiaes e Soldados, fixa-se força: agora se o Sr. Zagallo dissesse = cada Regimento de infanteria conterá tantos Officiaes, e tantas praças de pret, tantos os de artilheria e cavallaria, sem fixar o numero dos Regimentos, nesse caso é outra cousa porque ao Governo ficava o direito de pedir os Regimentos que precisar; mas logo que o Projecto está redigido do primeiro modo, é inegavel que nelle se fixa a força de terra.

O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa: — O que acaba de dizer o Sr. Barão de Villa Nova de Foscôa, corrobora o meu pedido. Eu não queria entrar agora na questão de Direito, por isso pedi que o Projecto se imprimisse, antes de ír á Commissão, para vermos o seu alcance, para avaliarmos se a iniciativa delle era privativa do Governo, ou da outra Camara, porque com uma simples leitura, não fico convencido do que se possa dizer a este respeito. Embora se faça esta despeza, ainda quando o Projecto se não admitta nada se perde, porque o assumpto é de muita consideração; é mais um Plano de organisação que temos para consultar. Para saber se o Senado tem, ou não, direito de se occupar delle, é que eu queria vê-lo impresso.

O Sr. Trigueiros: — Depois do que disse o Sr. Barão de Villa Nova de Foscôa, e com a clareza que o disse, pouco ha a accrescentar. — O Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa insiste na necessidade de se mandar imprimir este Projecto, para á vista delle, depois de impresso, se poder ajuizar do direito que esta Camara possa ter, ou não ter, sobre a admissão do mesmo Projecto; mas parece-me que não e de maneira nenhuma necessaria similhante impressão, por quanto é cousa de primeira intuição, e de tal evidencia, que de um golpe de vista rapido se comprehende; a simples leitura do Projecto mostra, de um modo inquestionavel, que nelle se fixa a força dos Corpos, sobre os quaes se pretende estabelecer uma organisação: a questão por conseguinte deve versar sobre este ponto; — se fixando-se neste Projecto a força de terra, é ou não permittido a este Senado tomar conhecimento delle. — Que se fixa a força, nenhuma duvida póde haver, e sobre isso nenhum esclarecimento dará a impressão requerida; é por tanto inteiramente desnecessaria, e seria uma despeza e um trabalho não preciso, e que nada póde accrescentar ás nossas convicções.

Quanto ao direito, ou não direito que possa ter esta Camara de tomar conhecimento do Projecto, parece-me que a distincção feita pelo Sr. Barão de Villa Nova de Foscôa, é terminante: não lia ninguem entre nós que duvide de que o Senado possa tomar conhecimento da Proposta do Sr. Zagallo, tanto quanto fôr relativa á organisação; mas desde é momento em que se tractar de fixação de força, por maneira nenhuma, porque isso encontraria o § 10.º do Artigo 37 da Constituição, combinado com o Artigo 55. (Leu-o, e proseguiu.) Ora note-se agora que é sobre Proposta ou informação do Governo, que se hão de fixar as forças de terra e mar: mas em que Camara se póde tomar esta iniciativa? O Artigo 55 responde. (Leu-o.) Se necessariamente se exige que o Poder Executivo faça a Proposta para a fixação da força, se se exige a informação desse Poder; se o Governo o não póde fazer, se este objecto ha de ter iniciativa na Camara dos Deputados; nada mais evidente de que aqui não póde começar-se a tractar a materia.

Esta é a minha opinião.

O Sr. Zagallo: - Persuado-me que a questão consiste na maneira de interpretar o § 10.º do Artigo 37 da Constituição; se delle se colligir que a iniciativa sobre objectos de organisação Militar, que não póde deixar de tractar de força, (porque nunca vi organisação que a não comprehendesse) pertence sómente ao Governo, e não a nenhuma das Camaras; então acabou-se. Porém, Sr. Presidente, eu estou persuadido do contrario: o § 10,º do Artigo citado diz: = Fixar annualmente, sobre Proposta ou informação do Governo, as forças de terra e mar; — isto é muito positivo: e será de presumir que esta disposição tenha por fim dar annualmente uma organisação ao Exercito! Por certo não: por tanto como se póde conceder que se quisesse privar as Camaras do exercicio de a fazerem de tantos em tantos annos (e oxalá que se não fizessem tanto a miudo, para nos não vêrmos hoje, obrigados, a, fazer ainda mais uma)? Ora, a fixação, da força póde ser feita sobre Proposta ou, informação do Governo; por Proposta, se o Governo a fizer; e por informação, do modo que

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podem ter-se as do Ministerio, isto é, porque elle as dá voluntariamente, ou porque as Camaras lhas pedem; uma informação não é uma Proposta; por tanto este paragrapho admitte ambos os casos, ou o Governo faça a Proposta ou de as informações quer espontaneamente, quer depois de lhe serem pedidas. Eis-aqui como eu entendo o § 10.º do Artigo 37; por consequencia a qualquer das Camaras pertence esta iniciativa por isso que a nenhuma d'ellas é prohibida: no Artigo 55 é que se tracta de objectos que positivamente pertencem á Camara dos Deputados; tudo que alli não é descripto é igualmente da attribuição da Camara dos Senadores, porque a Constituição diz, que todos podem fazer aquillo que a Lei lhe não prohibe. Insisto por tanto na opinião de que a iniciativa sobre objectos de organisação pertence a cada uma das Camaras; havidas as informações do Ministerio. O que pertence a fixação de força, isso ha de fazer-se em consequencia do Orçamento, que e a que se refere o paragrapho, e reduz-se a distribuir todos os annos a despeza votada para o Exercito: póde ser que a redacção da Constituição, nesta parte, não esteja clara; mas creio que deve entender-se como digo; tudo que são objectos de organisação póde ter iniciativa em qualquer das Camaras, porque em ambas a podem ter os assumptos que não são exceptuados no Artigo 55 da Constituição.

Corroboro a opinião do Sr. Barão da Ribeira de Sabrosa para que se mande imprimir o Projecto, antes mesmo de ser remettido á Commissão, não só pelas razões que elle deu, mas ainda por outra consideração. Supponhamos que na Commissão de Guerra ha divergencia de opiniões, que uns Membros opinam pelo Projecto, e outros pelo Parecer da Commissão: neste caso, não deverão os Senadores estar ao facto tanto do Projecto, como do Parecer, para depois votarem pelo que a cada um pareça mais conveniente? Sem duvida. Julgo pois que não é perdida a despeza que se fizer com a impressão, quer seja para a discussão do Projecto, quer mesmo para a decisão da questão prévia sobre a iniciativa da Camara a este respeito.

O Sr. Vellez Caldeira: — Não ha duvida nenhuma que o objecto de fixar a força do Exercito não póde ter a iniciativa nesta Camara: agora quanto á impressão do Projecto de que se tracta, é expresso no Art. 48 do Regimento, e logo que elle seja admittido, deve mandar-se imprimir para ser distribuido; por consequencia sobre a impressão não póde haver duvida. Não se offerecendo outra observação, resolveu-se que a Proposta do Sr. Zagallo fôsse remettida á Commissão de Guerra, mandando-se desde logo imprimir

Passando-se á Ordem do dia, e devendo entrar em discussão o Projecto de Reposta ao Discurso do Throno, propoz o Sr. Presidente, e a Camara conveio, que neste debate se dispensasse a discussão sobre a generalidade. Lido por tanto o Art. 1.°, pediu a palavra sobre a Ordem, e disse

O Sr. Ministro da Guerra: — Sr. Presidente, para o Governo, é sem duvida nenhuma muito satisfactorio que quanto antes possa ser pronunciado ô juizo que está Camara faz da sua Administração; mas na Camara dos Srs. Deputados está, como V. Ex.ª sabe, igualmente em discussão este importante objecto; o Governo desejoso, como disse, de vêr quanto antes pronunciado o juizo desta Camara a seu respeito, acha-se com tudo em um embaraço, pois que ainda que aqui estão dous Membros da Administração eu que vim aqui, por deferencia com esta Camara de que tenho a honra de ser Membro, posso ver-me obrigado a sahir para ír á outra, e interromper-se a discussão. Offereço estas considerações á deliberação da Camara. (Apoiado.)

O Sr. Barão de Villa Nova de Foscôa: - Se nós entrarmos na discussão do Projecto de Resposta ao Discurso do Throno, ahi se chama toda a Administração a exame, porque nessa discussão é que se fazem perguntas ao Ministro, e interpellações: ora estando apenas aqui dous Ministros, não é da dignidade desta Camara deixar passar isto á rebelia na ausencia dos Ministros; em consequencia eu peço mesmo que não encetemos a discussão em quanto os Srs. Ministros não estiverem desembaraçados para assistir a ella. (apoiado.)

O Sr. Presidente propoz então — se a discussão dada para Ordem do dia ficaria addiada; e, por unanimidade de votos, se resolveu affirmativamente.

S. Ex.ª disse, que a proxima Sessão teria logar na Quarta feira (20); e dando para Ordem do dia a que fóra designada para hoje, fechou esta pela uma hora e meia da tarde.

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