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SESSÃO N.° 78 DE 19 DE MARÇO DE 1912 17

para onde pudéssemos ir trabalhar: pois podíamos ficar todos no país, a cultivar a nossa terra, sem aplicarmos as leis de Malthus, que não era em cinco décadas, nem em dez que começaríamos a sentir a saturação de gente.

Não se passam as cousas assim; mas bom será que a nossa emigração comece a ter outra característica; que em lugar de exportarmos analfabetos, exportemos homens válidos, não por terem simplesmente dois braços fortes, que só por si valem pouco na concorrência dos povos emigrantes, mas pela capacidade mental juntamente com a robustez fisiológica. Vê-se bem, a necessidade de educarmos depressa o nosso povo e de começarmos a valorizar as nossas riquezas naturais para pormos um travão â corrente migratória, e nesta deixarmos ir somente os que tenham grande probabilidade de, na América ou na África, serem felizes. "Ser um bom animal é o primeiro requisito de sucesso na vida, e ser uma Nação de bons animais é a primeira condição da prosperidade nacional", disse-o Herbert Spencer.

É sabido de todos tambêm, que o Brasil já não dá ao português aquele bom asilo que muitas vezes se transformava numa mina de ouro, que se drenava para aqui.

O Brasil... Eu sou do norte do país, e será estranho para muitos que me tenha ocupado aqui principalmente do sul.

E isto porque a gente da minha terra de há muito caminha desoladoramente para o Brasil. A minha aldeia, de 1:500 habitantes, tem constantemente da outra banda do mar, 160 pessoas.

Êste número de gente vive constantemente em idas e voltas; não enriquece; vão pobres, com esperanças, e voltam pobres, desiludidos e muitas vezes doentes. Mas superabundam na terra natal e tornam êles mesmos ou outros a fazer a travessia do Atlântico num raivem permanente. A tuberculose parece que vem na bagagem; e os cemitérios vão registando pelas covas abertas em Portugal e no Brasil muitas ilusões perdidas, emquanto famílias desorganizadas arrastam uma vida de privações, raras vezes contrariadas pelo azar que a algum trouxe fortuna.

O que se dá na minha aldeia, dá-se em quási todo o norte do país. E seria necessário uma enorme remodelação económica, que não podemos fazer, para que a relativamente pequena natalidade que escapa, pudesse ficar em Portugal, sem emigrações patológicas.

Nós não podemos esperar, nem da indústria, nem da agricultura minhota um desenvolvimento e aperfeiçoamento tal, que apenas 60 por cento dos que nascem, em algumas terras, possam permanecer depois no país. É um facto a saturação actual; e não é possível, mesmo numa década, mudar os processos culturais do norte e o seu regime agra rio, nem tam pouco industrializar bem pela utilização da energia hidráulica que ainda hoje se desperdiça vergonhosamente, para que a emigração seja um pouco sustada ali. Grande parte da gente que emigra são operários e uma parte é gente da lavoura, trabalhadores rurais. Ora as construções civis não aumentam nas vilas e cidades, quási todas estacionárias, ou de vagaroso estacionamento em proporção ao aumento demográfico; a vida do trabalhador do campo não tenta; pelo contrário, afugenta para o Brasil e para as vilas ou centros industriais as novas camadas de população.

A indústria nacional adstrita à máquina de vapor, não se desenvolve, apetrechada de bons operários e boas máquinas para concorrer com a estrangeira nos mercados da metrópole e das colónias. Ao lado das grandes fábricas de fiação do norte ouve-se o tic-tac dos teares manuais, que fazem má concorrência aos maquinismos, emquanto por seu lado êstes arrasam aqueles. Os nossos rios vão continuando a ser motivo para os poetas, cada vez mais raros e mais ensonsos; o nosso céu é sempre daquele azul tam cantado; mas nem uma cousa nem outra modifica a nossa economia.

O poeta é cada vez mais plangente e fatalista; o povo é cada vez mais pobre.

Deixemos o quadro triste da actividade portuguesa, e vamos ver como poderemos mudar um pouco e depressa, como tanto é necessário, o aspecto da nossa vida.

Eu disse - depressa - porque é urgente, de facto, remodelarmos a vida económica portuguesa.

Era urgente - e já foi um pouco tarde -fazer-se a República; mais cedo tivesse sido, e com mais ordem e tino tivéssemos depois procedido e já agora seria outra a actividade nacional.

É urgente modificar a nossa emigração: e eu sinto que a Câmara só una dia de fugida e pela rama se tenha ocupado dêste aasunto.

É necessário caminhar depressa; as nossas terras de alêm-mar precisam de ser exploradas; e o país aqui pré* cisa de ser valorizado, e desta valorização, principalmente pela agricultura, depende não só a nossa melhoria económica, mas tambêm, julgo, a conservação do nosso domínio colonial.

No fundo é necessário educar o nosso povo, levar a geração nova a desprender-se inteiramente da burocracia e da carta de bacharel, e a olhar para o trabalho de iniciativa individual, como a grande escola da reorganização dum povo.

Eu penso que, se nós não caminharmos depressa, pode acontecer que sejamos de vez tidos como um estorvo à marcha da vida intensa dos outros povos dentro de poucos anos: e que então de nada nos valerá nas colónias os nossos decantados direitos histories, que não temos sido capazes de efectivar com uma actividade e administração sensatas.

E por outro lado, a vida desregrada e inconsciente que temos arrastado, por mais alguns anos prolongada, levar-nos há a sermos classificados de vez como povo incompetente e preguiçoso, inmerecedor de gozar indolente as delícias dêste canto privilegiado da Europa: uma administração estrangeira impor-se há, se nós com a República continuarmos insensatos a dormir a sesta...

Falou se hoje aqui em colonização africana. Eu entendo que não podemos colonizar a África, sem mandarmos para lá aqueles elementos capazes, que não temos mandado senão por excepção para o Brasil. As duas terras estão em condições muito disemelhantes.

No Brasil, com a raça branca preponderante de há séculos, já se dá, de há muito, uma estratificação dos colonos em camadas de capacidades muito diferentes, o que tem permitido, e permite mesmo aos mais inferiores, como a máxima^ parte dos nossos, um lugar na conquista da vida.

Em África não. O colono vai ser o peoneer onde não há quási camadas demográficas de gente branca no exercício de mesteres para que só basta o trabalho manual: êste, na sua forma mais rude, é destinado ao indígena, que luta, com vitória, na concorrência com todo o europeu, valorizado apenas em energia mecânica.

Bem sei que o leader é tudo, quer na vida política, quer no desenvolvimento económico.

Um bom chefe numa exploração agrícola ou industrial vale muitas vezes mais do que os melhores maquinismos' E isto pode dizer-se na nossa colonização africana, onde será principalmente pela qualidade dos directores, pela disciplina, pela conservação da pureza da raça branca, pela moralidade irrepreensível e pela economia dos meios de transporte que se obterá o bom êxito da empresa.

Eu sempre acreditei que o chefe - o leader - é tudo; o resto é massa que executa mais ou menos inconsciente, depois de orientada num só desígnio. Ora esta orientação e a conservação da pertinácia do esforço é que caracteriza o chefe; por isso o leader é tudo.

Os egípcios tinham o Não fecundante sujeito às vicissitudes naturais; mas, passada de há muito a grandeza de outrora, não tinham êles, que como ninguêm manejavam