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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
173.ª SESSÃO
EXTRAORDINÁRIA
EM 21 DE NOVEMBRO DE 1912
SUMÁRIO. - Aprovada a acta e lido o expediente, o Sr. Deputado Júlio Martins propõe, e é aprovado, que se publique no Diário do Govêrno a representação do comício promovido pelos revolucionários civis, constante do mesmo expediente. O Sr. Deputado Camilo Rodrigues conclui a sua interpelação ao Sr. Ministro das Colónias (Cerveira de Albuquerque), que lhe responde. O Sr. Deputado interpelante é autorizado pela Câmara a retirar a sua moção. O Sr. Deputado Ribeiro de Carvalho manda para a mesa um projecto de lei sôbre a escola de teatro. - O Sr. Deputado Baltasar Teixeira apresenta um parecer sôbre as Escolas Normais - O Sr. Deputado João Luís Ricardo requere documentos.
Ordem do dia. - Conclui-se a discussão e votação do projecto n.° 344 (Ministério de Instrução e Belas Artes), usando da palavra os Srs. Deputados Rodrigo Fontinha, Carvalho Mourão, João Barreira, Ministro do Interior (Duarte Leite), Brito Camacho, Costa Bastos, Carlos Olavo, Alfredo Ladeira e Jorge Nunes. - Fazem-se votações sôbre os artigos do projecto do Código Administrativo, já discutidos, fazendo uso da palavra os Srs. Deputados Dias da Silva, Jacinto Nunes, Germano Martins, Matos Cid, Carlos Olavo, Pires de Campos e Barbosa de Magalhães. - Encerra-se a sessão às 18 horas, marcando-se a imediata para o dia seguinte.
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Presidência do Exmo. Sr. António Aresta Branco
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Francisco José Pereira
Abertura da sessão. - As 14 horas e 40 minutos.
Presentes - 76 Srs. Deputados.
São os seguintes: Adriano Mendes de Vasconcelos, Afonso Augusto da Costa, Afonso Ferreira, Alberto de Moura Pinto, Alberto Souto, Alexandre Augusto de Barros, Alfredo Balduíno de Seabra Júnior, Alfredo Djalme Martins de Azevedo, Alfredo Maria Ladeira, Álvaro Poppe, António Afonso Garcia da Costa, António Alberto Charula Pessanha, António Albino Carvalho Mourão, António Aresta Branco, António Augusto Pereira Cabral, António Joaquim Ferreira da Fonseca, António Joaquim Granjo, António José Lourinho, António Maria de Azevedo Machado Santos, António da Silva Gouveia, António Valente de Almeida, Augusto José Vieira, Baltasar de Almeida Teixeira, Carlos António Calisto, Carlos Maria Pereira, Carlos Olavo Correia de Azevedo, Eduardo de Almeida, Ernesto Carneiro Franco, Ezequiel de Campos, Fernando da Cunha Macedo, Francisco de Sales Ramos da Costa, Gaudêncio Pires de Campos, Guilherme Nunes Godinho, Helder Armando dos Santos Ribeiro, Henrique José dos Santos Cardoso, Henrique de Sousa Monteiro, João Barreira, João Camilo Rodrigues, João Carlos Nunes da Palma, João Duarte de Meneses, João José Luís Damas, João Luís Ricardo, Joaquim José Cerqueira da Rocha, Joaquim José de Oliveira, Joaquim Ribeiro de Carvalho, Jorge Frederico Velez Caroço, Jorge de Vasconcelos Nunes, José de Barros Mendes de Abreu, José Bernardo Lopes da Silva, José Botelho de Carvalho Araújo, José Cordeiro Júnior, José Dias da Silva, José Francisco Coelho, José de Freitas Ribeiro, José Jacinto Nunes, José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães, José Miguel Lamartine Prazeres da Costa, José Pereira da Costa Basto, José Tristão Pais de Figueiredo, José Vale de Matos Cid, Jovino Francisco de Gouvêa Pinto, Júlio do Patrocínio Martins, Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho, Luís Inocêncio Ramos Pereira, Manuel Alegre, Manuel de Brito Camacho, Manuel José da Silva, Manuel Pires Vaz Bravo Júnior, Miguel de Abreu, Pedro Alfredo de Morais Rosa, Pedro Januário do Vale Sá Pereira, Philemon da Silveira Duarte de Almeida, Rodrigo Fernandes Fontinha, Severiano José da Silva, Vitorino Henriques Godinho, Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Entraram durante a sessão os Srs.: Adriano Gomes Ferreira Pimenta, Albino Pimenta de Aguiar, Alexandre Braga, Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá, Alfredo Rodrigues Gaspar, Álvaro Nunes Ribeiro, Álvaro Xavier de Castro, Américo Olavo de Azevedo, Amílcar da Silva Ramada Curto, Angelo Rodrigues da Fonseca, António Barroso Pereira Vitorino, António Caetano Celorico Gil, António Maria da Silva, António Pires Pereira Júnior, Aquiles Gonçalves Fernandes, Artur Augusto Duarte da Luz Almeida, Carlos Amaro de Miranda e Silva, Casimiro Rodrigues de Sá, Domingos Leite Pereira, Francisco José Pereira, Gastão Rafael Rodrigues, Germano Lopes Martins, João Fiel Stockler, João Gonçalves, João Pereira Bastos, Joaquim Brandão, Joaquim Teófilo Braga, José António Simões Raposo Júnior, José Bessa de Carvalho, José Mendes Cabeçadas Júnior, José da Silva Ramos, José Tomás da Fonseca, Miguel Augusto Alves Ferreira, Tito Augusto de Morais, Vítor José de Deus Macedo Pinto.
Não compareceram à sessão os Srs.: Alfredo Guilherme Howell, Angelo Vaz, António Amorim de Carvalho, António Cândido de Almeida Leitão, António Flórido da Cunha Toscano, António França Borges, António José de Almeida, António Maria da Cunha Marques da Costa, António Maria Malva do Vale, António Pádua Correia, António de Paiva Gomes, Aureliano de Mira Fernandes, Caetano Francisco Cláudio Eugénio Gonçalves, Carlos Henrique da Silva Maia Pinto, Emídio Guilherme Garcia Mendes, Fernando Baeta Bissaia Barreto Rosa, Francisco Correia Herédia (Ribeira Brava), Francisco Cruz, Francisco Luís Tavares, Francisco Xavier Esteves, Henrique José Caldeira Queiroz, Inocêncio Camacho Rodrigues, João Carlos Rodrigues de Azevedo, João Machado Ferreira Brandão, Joaquim António de Melo Castro Ribeiro, José Augusto Simas Machado, José Barbosa, José Carlos da Maia, José Maria Cardoso, José Montez, José Perdigão, Luís Maria Rosette, Manuel Gregório Pestana Júnior, Porfírio Coelho da Fonseca Magalhães, Sidónio Bernardino Cardoso da Silva Pais, Tomé José de Barros Queiroz, Tiago Moreira Sales, Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
O Govêrno representa-se pelos Srs. Presidente do Ministério e Ministros das Finanças e Colónias.
Foi lida e aprovada a acta.
Deu-se conta do seguinte
EXPEDIENTE
Licença
Exmo. Sr. Presidente da Câmara dos Deputados.- Desejando ausentar me para o estrangeiro, por motivos de saúde, peço a V. Exa. se digne consultar a Câmara sôbre se me permite quinze dias de licença, contados desta data. = O Deputado, Prazeres da Costa.
Concedida.
Para a comissão de infracções e faltas.
Justificação de faltas
Do Sr. Angelo Vaz, pedindo lhe sejam relevadas as suas faltas, devidas aos trabalhos do seu cargo médico-escolar de ambos os liceus do Pôrto.
Concedido
Para a comissão de infracções e faltas.
Representações
Da mesa do comício reunido na Avenida õ de Outubro, a 17 de Novembro de 1912, pedindo a execução de diferentes medidas de salvação pública, tendo em vista o artigo 85.° da Constituição.
Para a Secretaria.
Para publicar no "Diário do Governo".
Da Câmara Municipal de Santa Combadão, apresentando vários alvitres sôbre a momentosa questão da emigração.
Para a comissão de legislação civil e comercial.
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O Sr. Júlio Martins: - Sr. Presidente: Como o povo se reuniu num comício e exprimiu muito ordeiramente a sua maneira de pensar sôbre os negócios da República, dizendo o que entendia sôbre a marcha dos negócios públicos, e trouxe muito ordeiramente, uma representação ao Parlamento, eu entendo e proponho que, em homenagem aos revolucionários civis, essa representação seja publicada no Diário do Govêrno.
Assim se resolveu.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Dou a palavra ao Sr. Camilo Rodrigues para continuar a sua interpelação ao Sr. Ministro das Colónias.
O Sr. Camilo Rodrigues: - Respondendo às considerações feitas na sessão anterior pelo Sr. Ministro das Colónias, em resposta à interpelação por êle, orador, realizada, sôbre o decreto que reorganizou o serviço de fazenda das colónias, diz que elas em nada destruíram o que havia dito e o que, por consequência, mantêm todas as suas afirmações.
Responde em seguida a cada um dos argumentos de per si, e termina declarando, que se o Sr. Ministro das Colónias considerar a sua moção como de desconfiança, a retira, porque o partido evolucionista, ao qual êle, orador, pertence, continua mantendo a sua confiança no Govêrno.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Ministro das Colónias (Cerveira de Albuquerque): - Sr. Presidente: antes de responder às últimas considerações do Sr. Deputado Camilo Rodrigues, eu peço licença a V. Exa. e á Câmara para declarar aqui, mais uma vez e categoricamente, que não venho nunca para a Câmara com disposição sistematicamente assente, ou com deliberação antecipadamente tomada, de defender qualquer empregado do meu Ministério.
Desejo bem que a Câmara e o país o fiquem sabendo, e principalmente os senhores reporters, que com menos escrúpulo fazem para os seus jornais os extractos das sessões parlamentares.
E possível que não ouçam bem o que os oradores dizem; mas nesse caso é mais honesto nada escreverem do que inventarem.
Dizem alguns jornais de hoje que eu fiz aqui ontem uma calorosa defesa do Sr. Eusébio da Fonseca!
Afirma-se isto nos jornais, quando é certo ser absolutamente inexacto.
Creio que ninguêm aqui me ouviu pronunciar o nome do Sr. Eusébio da Fonseca; tive o máximo cuidado e escrúpulo em não pronunciar êsse nome; e na resposta que dei ao Sr. Deputado Camilo Rodrigues apenas me referi à Direcção Geral de Fazenda das Colónias. Pois os jornais dizem que eu fiz um elogio, uma defesa calorosa do Sr. Eusébio da Fonseca!
Estas cousas, que podem parecer sem importância, nem sempre são indiferentes, e muitas vezes vão actuar profundamente em espíritos doentes e obsecados por ódios rancorosos, produzindo manifestações de ordens diversas.
Essa falsa informação dos jornais foi sem dúvida a origem duma carta que recebi hoje, assinada com um nome de fantasia, e em que se me fazem ameaças.
Diz a carta que o elogio que fiz ao Sr. Eusébio da Fonseca parece ter sido feito pelo expulha de Aveiro; que eu merecia que me fizessem o que fizeram a Canalejas e que talvez o meu nome esteja já na lista. Bem sabe, diz ainda a carta, que eu não tenho medo, mas isso pouco importa porque ninguêm se pode livrar duma pontaria certeira.
Veja V. Exa., Sr. Presidente, onde chega o destempêro, a desorientação e a covardia! (Apoiados).
Para desejar é, pois, que os senhores reporters tenham para o futuro mais cuidado e mais escrúpulo na organização dos extractos parlamentares. Se não ouvem bem, é melhor não escreverem cousa alguma; inventar, é que é inadmissível e profundamente deplorável.
O Sr. Brito Camacho: - E, mas vendem-se mais jornais.
O Orador: - Posto isto, que entendi dever dizer à Câmara, para que não me atribuam cousas que eu não disse, ou responder ao Sr. Camilo Rodrigues.
Afirmou novamente S. Exa. que o decreto de 31 de Agosto dêste ano veio colocar o Governador Geral da província de Angola em piores condições do que as que lhe assegurava o regulamento de 1901. Francamente, é não querer ver o que é de facílima percepção!
Basta só notar o seguinte facto absolutamente incontestável: até aqui não havia o inspector superior, mas havia inspector geral, e, pela disposição do regulamento bastava que êsse inspector não pusesse o visto numa ordem e pagamento, para que o governador não a pudesse manar realizar.
O decreto de 31 de Agosto de 1912, preceitua que, pesar do parecer em contrário do inspector, o governador pode manter a ordem de pagamento, para o que reúne
Conselho da Província a quem expõe a questão, e, ouvido êsse conselho, pode o governador ordenar o pagamento em portaria justificativa, na qual, por espírito de imparcialidade, deve transcrever o parecer do inspector.
Eu creio que esta disposição é bem liberal e que coloca o governador geral, em relação ao inspector, numa independência bem maior do que aquela que lhe assegurava o regulamento de 1901.
Hoje, como ontem, continua S. Exa. a estranhar que seja o inspector superior quem organize o orçamento da província.
Mas que há nisso de estranhável? Quem tem competência para o organizar?
Evidentemente é o inspector, que, fiscalizando todos os serviços de fazenda da província e ouvindo todos os chefes de serviço, conhece melhor as necessidades de toda a província.
Mas isto mio quere dizer que o orçamento feito pelo inspector seja o orçamento que o Ministro há-de aprovar.
Êsse orçamento é enviado ao governador, que o apresenta ao Conselho do Govêrno, onde é discutido e sujeito a quaisquer modificações.
Além disso não é uma disposição nova; já existia no regulamento de 1901.
Ontem, como hoje, falou tambêm S. Exa. na questão dos oficiais da administração militar encarregados de fazerem a escrituração, os processos dos soldos, gratificações, ajudas de custo, etc. das forças militares.
Novamente, ao repisar êste assunto, salientou S. Exa. a situação deprimente em que, em sua opinião, ficavam êstes oficiais.
Mas eu tambêm, hoje como ontem, afirmo a S. Exa. que não é isso uma cousa nova; já estava em todos os documentos legais transactos; o que houve, foi uma concessão abusiva, mas de que não existe documento nenhum justificativo, para que êsses oficiais fizessem os seus serviços no Quartel General e não na inspecção de fazenda; foi uma concessão especial que se lhes fez, mas ainda assim, se V. Exa. visse bem o regulamento de 1901, verificaria que êsses oficiais ficavam, subordinados ao inspector, em tudo quanto dissesse respeito à fiscalização das despesas, o que não quere dizer que, em caso de guerra a que S. Exa. se referiu, êsses oficiais ficassem indepen-
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dentes e isentos de cumprirem as ordens do Quartel General.
São cousas bem distintas, que é necessário não confundir.
Nós temos na metrópole a guarda fiscal que está exclusivamente dependente do Ministério das Finanças, e, apesar disso, em casos especiais, essa guarda, fica às ordens do Ministério da Guerra e do comandante geral das forças de terra.
Assim, pois, o receio que S. Exa. tem com relação à anarquia que o decreto de 31 de Agosto possa trazer aos serviços públicos é apenas um receio pueril e injustificado.
Esteja S. Exa. tranquilo a tal respeito. O decreto não vem produzir anarquia; vem, pelo contrário, normalizar os serviços e evitar factos graves a que em breve me referirei.
Quere ainda S. Exa. que o governador geral exerça fiscalização sôbre o inspector superior.
Francamente direi a S. Exa. que não compreendo, por absurdo, um tal princípio.
Se o governador é o ordenador das despesas, e se o inspector tem por dever fiscalizá-las, não percebo como o governador possa ter acção directa sôbre o inspector superior no exercício das suas funções. Os factos são o que são e não o que nós desejamos que sejam.
Em teoria, a aspiração do ilustre Deputado, dando independência absoluta e completa ao governador geral, é muito respeitável; mas a prática de longos anos tem demonstrado que ela é profundamente perigosa e altamente prejudicial.
Eu vou citar alguns factos, dados em Angola, para demonstrar que, no estado actual da província, não poderia, sem graves riscos, aceitar-se o princípio da completa independência.
Por falta duma rigorosa fiscalização da fazenda existem ainda hoje em Angola, sem serem devidamente classificadas, um grande número de ordens de pagamento.
Êste lamentável resultado foi sem dúvida devido a estar concentrada toda a fiscalização num só inspector provincial.
Só quem fôr cego ou ignorante das cousas de administração pública, é que pode supor que um só homem possa fiscalizar toda a administração fazendária de Angola.
Mas há mais e pior; há 14:000 ordens de pagamento, na importância aproximada de 27:000 contos de réis, de despesas absolutamente ilegais, e que se fizeram porque o inspector não podia ver tudo e não era talvez completamente independente do governador.
O Sr. Camilo Rodrigues: - V. Exa. dá-me razão a mim.
O Orador: - V. Exa. não quere naturalmente que o governador ordene tais despesas; eu tambêm não quero; mas o facto deu-se, e sem dúvida por falta duma fiscalização rigorosa e independente.
O Sr. Camilo Rodrigues: - Desde o momento em que a lei não permita.
O Orador: - E não permite, como V. Exa. pode verificar no regulamento de 1901, como tive ocasião de afirmar, mas apesar disso, repito, o facto deu-se e como êste muitos outros se poderiam apontar. Creio que muita gente sente um inefável prazer em não cumprir a lei.
Uma voz: - Castigue-se o governador.
O Orador: - É fácil dizê-lo mas não é igualmente fácil fazê-lo, embora haja leis que o permitam. Eu entendo, porêm, que é melhor e mais eficaz evitar que o governador possa deixar de cumprir a lei, empregando uma fiscalização enérgica e independente da sua acção.
Castigar um governador é meio que só se deve empregar em casos extremos, porque êsse castigo será mais atentatório do seu prestígio do que o que preceitua o decreto de 31 de Agosto. Inspector e governador tem missões especiais perfeitamente harmónicas e compatíveis sem desprestígio para nenhum dêstes funcionários, e, assim como V. Exas. acham que se deve castigar o governador quando êste excede os seus poderes, hão de naturalmente achar bem que o Ministro castigue o inspector quando êle transgrida tambêm a lei, saindo fora da sua esfera legal de acção e invadindo a esfera de acção do governador. O próprio Poder Executivo está na metrópole subjeito à fiscalisação independente do Conselho Superior da Administração Financeira do Estado e eu não percebo que um governador duma colónia tenha poderes superiores ao próprio Ministro.
O governador continua a ser o primeiro magistrado da colónia, e, dentro dos seus direitos e deveres, tem plena liberdade de acção; mas no serviço técnico de que está encarregado o inspector não tem nem pode ter ingerência, porque o inspector é que é o fiscal de todo o serviço fazendário. São cousas harmónicas e compatíveis, e tanto assim, que os países mais liberais e avançados na sua administração colonial tem disposições idênticas às que insere o decreto que mereceu o desagrado do Sr. Deputado Camilo Rodrigues.
Contra esta minha asserção objectou S. Exa., dizendo que êsses países estão em circunstâncias diferentes. £ Então as colónias da África ocidental francesa não estão nas mesmas condições, não digo com relação ao seu progresso e adiantamente, porque não se podem comparar, mas em tudo o mais, da nossa província de Angola? Pois lá existe o mesmo inspector superior com idênticas faculdades. Não foi invenção minha, pode crê-lo S. Exa., e para o demonstrar já ontem li â Câmara o decreto que criou esta entidade na Indo-China, e pelo qual foram decalcados mais tarde os decretos que criaram entidades idênticas em Madagáscar e nas colónias da África ocidental francesa.
Referindo-se de novo á portaria aclaradora de 16 de Outubro disse S. Exa., e muito bem, que ela em nada alterava o decreto. De facto a portaria não alterou nem podia alterar o decreto. A minha dignidade pessoal, quando não fôsse a dignidade do poder, não podia consentir que eu, depois de publicar o decreto, o engulísse, permita-se-me o plebeismo.
Disse ainda S. Exa. que a portaria de nada serviu, pois, não alterando o decreto, não era necessária para o aclarar. Não é, decerto, da mesma opinião o governador de Angola, pois. como muito bem sabe o ilustre Deputado, esta autoridade protestando, contra o decreto e achando-o atentatório do seu prestígio e autoridade, apenas leu a portaria aclaradora agradeceu-ma penhoradíssimo, dizendo que ela lhe assegurava o necessário prestígio e autoridade para poder administrar uma província, como a de Angola. Êsse telegrama, que eu ontem li à Câmara, mostra bem que o próprio Governador, menos feliz do que o Sr. Camilo Rodrigues, não entendeu bem o decreto e julgou de grande utilidade e alcance a publicação da portaria. E estou convencido que, alem do Governador, milhares de pessoas em Angola não entenderam bem o decreto, e o próprio Sr. Deputado o não entendeu porque protestou contra êle.
S. Exa. conhece melhor Angola do que eu, por que nunca ali fui, e sabe por isso que, havendo lá indivíduos de provada competência, um grande número de habitantes da colónia não possuem as habilitações necessárias e as qualidades precisas para poderem compreender o que leram e medir o seu alcance.
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O Sr. Camilo Rodrigues: - Posso demonstrar a S. Exa. aque há indivíduos em Loanda que, pelos seus trabalhos sôbre questões coloniais, merecem tanta consideração como os que se dizem grandes entendidos na matéria; embora haja outros que nada percebem.
O Orador: - Mas quem o nega?
Êsses indivíduos competentíssimos não existem só em Angola, podem existir mesmo nos mais recônditos confins da África; mas o que se não pode contestar é que existem ao mesmo tempo muitos milhares de indivíduos que não tem a menor ilustração. Para êsses e para os ilustrados mal intencionados e que se publicou a tal portaria, e, ainda assim, só depois de terem pedido de Angola a sua publicação.
Voltemos agora mais uma vez à debatida questão da subordinação dos oficiais da Administração Militar ao inspector superior de fazenda.
Já ontem li à Câmara um trecho bastante elucidativo, claro e concludente, escrito por um oficial da Administração Militar.
Eu não precisava dêsse insuspeito testemunho para me convencer de que a disposição, que se contêm no decreto, é uma disposição salutarissima. Vou apontar um facto que se passou num Quartel General das nossas colónias. Foi o seguinte:
O governador geral entendeu que devia, por intermédio do chefe do estado maior do Quartel General, mandar abonar gratificações extraordinárias a todo o pessoal dêsse Quartel General.
Essas gratificações não foram ao visto do inspector, porque foram pagas dum fundo permanente que ilegalmente se havia criado no Quartel General.
O chefe do estado maior mandou abonar essas gratificações ilegais, tiradas dêsse fundo ilegal, a todos os oficiais com excepção dele.
Passado tempo, o chefe do estado maior saiu com licença, e o sub-chefe mandou então abonar tambêm ao chefe a gratificação, que êle não quisera abonar a si próprio. Foi um acto ditado pela gratidão ou pelo conhecido princípio do sapateiro de Braga.
Em vista dos factos que apontei, tornava-se urgente e indispensável uma rigorosa e independente fiscalização, não só nas despesas ordenadas, mas nas cobranças a realizar. E eu creio que o decreto de 31 de Agosto devo trazer para êstes serviços os mais salutares resultados.
De tudo que disse e duma leitura, atenta e imparcial do decreto, eu estou certo que para todos há-de advir a convicção, embora isso pese ao ilustre Deputado interpelante, de que o atacado decreto apresenta, sôbre o regulamento de 1901, as seguintes vantagens e melhorias:
- Dá ao governador geral, alem de todas as prerrogativas já asseguradas nas leis anteriores, mais a de ordenar e mandar executar pagamentos mesmo contra o parecer do inspector de fazenda;
- Descentraliza, para os inspectores distritais, uma grande parte do serviço que até aqui estava exclusivamente entregue ao inspector provincial, com vantagem para os próprios serviços e com aumento de prerrogativas para os governadores de distrito;
- Passou para a competência do governador geral a nomeação de muitos empregados de fazenda, que eram até aqui de nomeação ministerial, aumentando assim os poderes daquela autoridade, e reduzindo considerávelmente as despesas do transporte dos mesmos funcionários da metrópole para as colónias;
- Abriu tambêm a entrada para o quadro da fazenda aos naturais das duas províncias, o que até aqui não conseguiam geralmente;
- Tornou efectiva e justa a responsabilidade do inspector de fazenda, o que até aqui era praticamente irrealizável;
- Melhorou e apressou o movimento da engrenagem dos serviços fazendários, criando as inspecções distritais, pois evitou a demora nos processos e pagamentos, o que e de altíssima importância em toda a parte, e principalmente nas colónias, como Angola e Moçambique, em que os meios de comunicação são poucos e demorados;
- Tornou efectiva e eficaz a fiscalização da fazenda militar, que já estava dependente, pelas leis anteriores, do inspector distrital, criando uma sub-inspecção militar, funcionando na inspecção civil;
- Finalmente, copiando o que já se acha há muito estabelecido em Madagáscar, na Indo-China, nas colónias da África Ocidental Francesa, e nas colónias inglesas, estabeleceu uma fiscalização rigorosa na fazenda colonial, fiscalização que é, na opinião de Stourm, ao mesmo tempo indício e causa do progresso financeiro dum país.
O Sr. Presidente: - Previno V. Exa. que faltam apenas cinco minutos para se passar á ordem do dia.
O Orador: - Eu termino já. Uma cousa há ainda a notar, e é ela não ter reclamado contra a nova organização de fazenda em Angola e Moçambique nenhum empregado dessas províncias, cora excepção do Sr. Simões da Silva, que escreveu o célebre folheto intitulado Palavras rebeldes, arvorando-se em procurador ou defensor oficioso de quatro outros empregados, cujas notas biográficas eu tive ontem ocasião de ler à Câmara para sua completa elucidação. Só um dêsses quatro empregados foi preterido na sua promoção, não porque fôsse mau empregado, mas por circunstâncias especiais de que êle realmente não é responsável, mas que o inibem, no meu modo de ver, de ascender aos últimos postos do seu quadro.
O próprio regulamento do 1901 diz que a simples antiguidade não é qualidade para promoção quando com ela não concorram outras qualidades. E circunstância a atender e que dá a preferência, mas em igualdade de condições.
O Sr. Deputado Camilo Rodrigues quis tirar dêsse facto efeitos oratórios, falando ao sentimento e ao coração, e proclamando bem alto a igualdade da lei para todos os portugueses. Eu não acompanharei o ilustre Deputado nas suas considerações, porque a questão é muito mais melindrosa e complexa do que ao ilustre Deputado se afigura; mas direi apenas que há praxes, ou preconceitos se assim o quiserem, que muitas vezes são superiores ás leis e que nunca os países se governaram pelos impulsos sentimentais, mesmo quando êsses impulsos são expontâneos e sinceros, caso que me parece não ser aquele de que presentemente se trata.
Mas, dizia eu, que nenhum empregado de fazenda reclamou contra o decreto de 31 de Agosto, e pelo contrário todos ficaram contentes e satisfeitos, a ponto de agradecerem comovidos a sua publicação, como V. Exa. pode verificar, se quiser ler um telegrama que me enviaram, e que está aqui na minha pasta.
Os vencimentos dalguns dêsses empregados foram aumentados, porque, como a Câmara muito bem compreende, não se pode exigir ao empregado de fazenda um rigoroso cumprimento dos seus deveres sem lhe haver criado uma certa independência, e esta só se consegue facultando-lhe os meios necessários para a sua subsistência, e todos sabem que muitos empregados em Angola recebiam miseráveis vencimentos.
O Sr. Pereira Cabral: - Mas V. Exa. apenas aumentou os vencimentos aos empregados superiores.
O Orador: - Aumentei a quási todos. E ainda bem que o Sr. Pereira Cabral me interrompeu, porque me deu lugar a tocar num ponto que me esquecia tocar, e é êle, provar ao Sr. Camilo Rodrigues que, o que S. Exa. afirmou com relação ao aumento de despesa, não é exacto.
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Peço a atenção de V. Exa. Está aqui neste mapa a despesa total a fazer, pelo decreto de 31 de Agosto, com todo o pessoal de fazenda de Angola.
Leu.
Como V. Exa. vê, os inspectores superiores ficaram com o vencimento de 5:400$000 réis, mais 200$000 réis do que tinham; mas em compensação suprimiu-se o lugar de adjunto, o que trouxe uma economia de 4 contos de réis.
O aumento de despesa, na pior hipótese, é de 11 contos de réis aproximadamente, nicas é natural que não exceda 8 contos de réis, porque alguns dos oficiais da administração militar são tenentes.
Isto pelo que diz respeito a Angola; agora relativamente a Moçambique:
Leu.
Há uma economia de 4:500$000 réis aproximadamente. Assim pois, o aumento de despesa nas duas províncias não pode exceder, na pior hipótese, G:500$000 réis, o que é bem diferente do que se disse nos jornais, que avaliaram o aumento em 140 contos de réis.
Procurou-se tambêm na reorganização reduzir a desproporção enorme e injustificável que havia entre os vencimentos de Moçambique e de Angola, tratando-se de pessoal igual e com igualdade de serviços.
O Sr. Pereira Cabral: - Mas a vida na província de Moçambique é muito mais difícil porque é extraordinariamente mais cara.
O Orador: - Bem sei, mas os de Moçambique continuam ainda a receber mais. O que não era de justiça era a desproporção enorme, desproporção que a continuar poderia dar em resultado nada receberem, como nós todos corremos idêntico risco se não atendermos às circunstâncias financeiras do país.
Creia V. Exa. que não é possível continuar a sustentar tanto luxo.
O Sr. Machado Santos: - Vejo que os meus cálculos estão errados; por êles o aumento de despesa ia até G3 contos de réis.
O Orador: - Eu creio que sim, que os cálculos de V. Exa. estão errados. O que é exacto é o que consta dêstes mapas detalhados, elaborados pela repartição respectiva. Mas não se desconsole V. Exa.; o êrro do seu cálculo é bem menor do que o dos cálculos feitos por alguns jornais, que chegaram, como já disse, a 140 contos de réis. Verdade é que sôbre bases falsas, inventadas e menos escrupulosas, não pode nunca arquitectar-se um cálculo exacto, nem mesmo aproximado.
Vou concluir, Sr. Presidente, e é agora a ocasião de responder à pregunta que o Sr. Deputado Camilo Rodrigues me fez sôbre a moção com que iniciou a sua apaixonada interpelação ao Ministro das Colónias.
No final do seu discurso de hoje referiu-se S. Exa. ao artigo 87.° da nossa Constituição, parecendo querer indicar que eu, pelo citado artigo, não podia publicar o decreto de 31 de Agosto, visto êle se prender com as cartas orgânicas das colónias, que só ao Parlamento compete elaborar. S. Exa., ao citar o artigo 87.°, não o fez com aquela exactidão que é sempre para desejar nas citações das leis. S. Exa. disse que o artigo 87.° só permitia a publicação de decretos para casos urgentes; ora u verdade é que o artigo 87.° diz que no interregno parlamentar o Govêrno poderá publicar para as colónias as medidas que julgar necessárias e urgentes. O juiz dessa urgência e dessa necessidade é o Govêrno.
O Sr. António Granjo: - Faz o que quere.
O Orador: - Não senhor, faz apenas o que entende ser necessário e urgente fazer, dentro do próprio artigo, sem o sofismar, nem esquecer. Se V. Exa. me disser que a disposição do artigo 87.° é vaga e mal definida, eu concordarei plenamente com V. Exa. Mas como especificar e enumerar os casos de urgência? Apropria Constituinte, de que V. Exa. fazia parte, reconheceu a dificuldade e aprovou o artigo, como êle está redigido, na impossibilidade de fazer cousa mais concreta, e fez muito bem, porque se supõe que o Poder Executivo tem a confiança do Legislativo, única base em que se apoia a sua fôrça e a sua existência.
Também não posso aceitar o argumento do Sr. Camilo Rodrigues com relação às cartas orgânicas. £ O decreto de 31 de Agosto tem íntima ligação com as cartas orgânicas de Angola e Moçambique? Evidentemente tem, mas que medidas poderia o Govêrno publicar que não se prendessem mais ou menos com as mesmas cartas? Eu creio que nenhuma, e sendo assim, o artigo 87.° seria simplesmente inútil.
Demais, o artigo 87.° determina que o Govêrno dará conta ao Parlamento das medidas que publicar era virtude do mesmo artigo. Assim, o Parlamento sôbre essas medidas se pronunciará e o Ministro receberá a decisão do Parlamento, decisão que acatará como lhe cumpre. Mas é preciso que o Parlamento julgue; sem êsse julgamento é que me parece ser inconveniente a suspensão de qualquer medida.
No que acabo de dizer está dada a resposta à pregunta do Sr. Camilo Rodrigues com relação á sua moção; mas, concretizando, para maior clareza, direi que, como particular e como admirador e amigo do Sr. Camilo Rodrigues e desejoso de lhe ser agradável, nenhuma dúvida teria em aceitar, até com satisfação, a moção de S. Exa. Como membro, porem, do Poder Executivo e por decoro e prestígio do mesmo Poder, acho inoportuna e descabida a moção sem que sôbre o decreto se faça uma larga e desapaixonada discussão, para avaliar da sua importância, paro o emendar e aperfeiçoar, se julgar conveniente, ou para o revogar, se se reconhecer a sua inoportunidade.
O Parlamento é, porêm, soberano e fará o que entender.
Depois das considerações que acabo de fazer, espero que o Sr. Deputado Camilo Rodrigues ficará, não digo convensido, mas pelo menos satisfeito pelo modo franco e liai com que procurei responder às suas críticas feitas ao decreto de 31 de Agosto, e espero tambêm que terá terminado de vez esta campanha, e que mais nenhuma se levantará, com tanto aparato bélico, contra outra qualquer medida publicada pelo artigo 87.° da Constituição e referente a assuntos da fazenda das colónias.
O Sr. Vasconcelos e Sá: - Está V. Exa. enganado; esta foi apenas o início.
O Orador: - Registo essa afirmação, e u vista dela eu posso tambêm assegurar a V. Exa. que o fulcro em torno do qual girou toda esta questão ou campanha, há-de ser o mesmo em torno do qual hão-de girar as outras campanhas que V. Exa. anuncia. Quia potest capere capiot.
Tenho concluído.
Vozes: - Muito bem.
O Sr. Camilo Rodrigues: - Sr. Presidente: depois da declaração do Sr. Ministro das Colónias, de que considera como moção de desconfiança a minha moção, peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que eu a retire.
Foi autorizado.
O orador não reviu.
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SESSÃO N.° 173 DE 12 DE NOVEMBRO DE 1912 7
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à ordem do dia: os Srs. Deputados que tenham papéis para mandar para a mesa podem fazê-lo.
O Sr. Presidente: - Declara aberta a inscrição para antes da ordem do dia.
Inscrevem se vários Srs. Deputados.
Documentos mandados para a mesa durante a sessão
Projecto de lei
Do Sr. Deputado Ribeiro de Carvalho, dispensando para o ano lectivo de 1912-1913 a apresentação da certidão do exame de francês para a matrícula no 2.° e 3 ° anos da Escola da Arte de Representar.
A publicar no "Diário do Governo", para depois ser submetido à admissão.
Parecer
Da comissão de instrução primária e secundária, dando o seu apoio favorável, com algumas modificações à proposta de lei do Sr. Ministro do Interior sôbre a admissão às escolas normais e de habilitação ao magistério primário.
A imprimir para se distribuir.
Requerimento
Requeiro que da administração dos Caminhos de Ferro do Sul e Sueste, por intermédio do Ministério do Fomento, me seja fornecida,, com urgência, nota do rendimento do ramal de Montemor-o-Novo, de Setembro de 1909 a Setembro de 1910, de Setembro de 1910 a 1911 e de Setembro de 1911 a Setembro de 1912, assim como a nota ou importância da exploração nos referidos anos. = João Luís Ricardo.
Mandou-se expedir.
ORDEM DO DIA
Projecto de lei n.° 344 - Ministério de Instrução Pública e Belas Artes
O Sr. Presidente: - Está discutido o artigo 15 ° do projecto, tendo sido apresentadas uma proposta de substituição, uma proposta de emenda e um aditamento. Vão ser lidos para se votarem.
O Sr. Rodrigo Pontinha: - Peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que retire a minha proposta.
Foi autorizado.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se â votação das outras propostas.
Procedeu-se à votação.
Foi rejeitada a proposta do Sr. Alexandre de Sarros.
O Sr. Alexandre de Barros: - Sr. Presidente: é necessário a comparência do Sr. Ministro do Interior, para poder continuar a discussão do projecto, porque a doutrina seguida hoje deve ser a doutrina de ontem.
Entrou na sala o Sr. Ministro do Interior.
O Sr. Ribeiro de Carvalho: - Mando para a mesa um projecto sôbre a Escola do Teatro, e chamo para êle a atenção da Câmara, porque é de importância.
A Escola do Teatro, como está, terá de fechar-se, por falta de concorrência, por consequência, é una prejuízo para a arte nacional.
O orador não reviu.
O projecto foi mandado a imprimir.
Leu-se na mesa a seguinte proposta do Sr. Adriano Pimenta:
Proposta
Proponho que no artigo 15.° sejam eliminadas as palavras "equiparada, etc.", e substituídas por: a serão remunerados segundo estabelece o orçamento em vigor, relativos ao Ministério do Interior". = O Deputado, Adriano Pimenta.
Foi aprovada.
Leu-se na mesa o artigo 15.º do projecto.
Foi aprovado juntamente com a proposta do Sr. Adriano Pimenta.
Leu-se na mesa o seguinte artigo adicional, proposto pelo Sr. Carvalho Mourão:
Proposta
Artigo... Junto do Ministério de Instrução Pública e Belas Artes funcionará um Conselho da Língua Nacional.
§ 1.° Êste Conselho sara composto dos professores dos cadeiras de filologia e de pessoas de comprovado e reconhecida competência e assuntos longuísticos.
§ 2.° Incumbe ao Conselho da Língua Nacional:
1.° Elaborar um dicionário completo da língua portuguesa;
2.º O estudo da dialectologia portuguesa;
3.° A revisão da ortografia oficial, quando o progresso e novas aquisições da sciência filológica o exigirem;
4.° A publicação de edições, críticas, comentadas e populares, dos nossos melhores escritores;
5.° O estudo da onomástica e da toponímia do nosso país;
6.° A propaganda da língua nacional e a reivindicação da sua vernaculidade;
7.° Elaborar uma gramática histórica da língua portuguesa;
8.° Organizar um plano geral de estudos de filologia portuguesa;
9.° Elaborar programas de concurso para a publicação de obras sôbre a língua portuguesa;
10.° Dar parecer sôbre todos os assuntos referentes à língua portuguesa;
11.° O estudo de todas as questões que se relacionem com a filologia portuguesa;
12.° Dar parecer sôbre todos os livros destinados ao ensino.
§ 3.° Um regulamento especial determinará o modo porque deverá funcionar o Conselho, o número de sessões mensais, a gratificação respectiva a cada um dos seus membros e bem assim o número dêstes, alêm dos professores das cadeiras de filologia.
Sala das sessões da Câmara dos Deputados, em 20 de Novembro de 1912. = Carvalho Mourão.
Foi admitida.
O Sr. João Barreira: - A comissão está com o espírito da proposta do Sr. Ribeiro de Carvalho.
Parece, todavia, dispensável introduzir essa disposição no projecto, tanto mais que já se eliminou o § 2.°
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Interior (Duarte Leite): - Fui eu que propus que se eliminasse o § 2.°, mas fiz ver que a enumeração era omissa, visto que faltava o Conselho de Arte Teatral.
A proposta do Sr. Carvalho Mourão acaba de confirmar a minha opinião. É que não há necessidade de mencionar isso na lei; deve ser objecto dum decreto regulamentar, não só para estas corporações, mas para outras. Não acho que seja indispensável acrescentar a esta lei a proposta de S. Exa.
O orador não reviu.
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8 DIÁRIO DA CAMAKA DOS DEPUTADOS
O Sr. Carvalho Mourão: - Não concorda em que o conselho que propôs seja mais próprio para um decreto; regulamentar, e está mesmo convencido de que, ficando para um regulamento, êsse conselho nunca se criará.
Em nome dos sagrados interesses da sociedade portuguesa, pede que a sua proposta seja aprovada.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. João Barreira: - Quando ontem S. Exa. me leu a sua proposta, eu disse-lhe que estava em espírito com ela, mas fiz-lhe a observação de que essa função de velar pela pureza e conservação da língua pertencia à Academia das Sciências.
Desde o momento em que há um organismo oficial, a cargo do qual está a conservação e pureza da língua, não podemos duplicar êsse organismo.
O Sr. Carvalho Mourão: - Está provado que não depura nada.
O Orador: - Então o que é necessário é uma proposta que reforme a Academia, que a obrigue a cumprir o seu dever.
Estou convencido de que toda a Câmara está com o espírito da proposta, e essa proposta, ficando como bom desejo da Câmara, ia é bastante.
Não podemos estar a criar conselhos, para cujas funções já existe uma entidade.
O orador não reviu.
O Sr. Brito Camacho: - Não uso da palavra para discutir a proposta do Sr. Carvalho Mourão, mas para que um assunto desta magnitude não passe inteiramente despercebido, e não se diga lá fora que, suscitando-se no Parlamento uma questão que diz respeito à pureza e conservação da língua, ela passa como se tratasse duma questão de mera regedoria, quero fazer algumas considerações.
No fundo estou inteiramente de acôrdo com o Sr. Deputado Carvalho Mourão; estamos até todos de acôrdo, a começar no Sr. Deputado João Barreira, que reconhece que se deve manter a língua em toda a sua pureza. Mas se é necessário criar um órgão essencialmente destinado a conservar a pureza da nossa língua, é um caso discutível.
Sustentou o Sr. Carvalho Mourão que êsse órgão não existe, ou, se existe, não tem sabido desempenhar a sua importantíssima função, e propõe então a criação dêsse órgão indispensável.
Por outro lado, o Sr. João Barreira sustenta, e muito bem, que a função da Academia é vigiar pela pureza da língua nacional.
Mas sendo a nossa língua um dos elementos mais ricos da nossa nacionalidade, seria absolutamente absurdo e até perigoso que a deixássemos sofrer toda a espécie de corrupção por uma evolução, não superior, mas retrógrada.
Todos sabem a Juta travada na Bélgica sôbre a questão da sua linguagem. É uma questão fundamental para aquela nacionalidade.
E quanto carinho a França não põe na expansão, na cultura da língua francesa em toda a parte onde se faz literatura francesa?
E por que?
Porque, sendo a língua um dos elementos característicos de nacionalidade, vai alem fronteiras, como que alargando a sua pátria no que esta tem de espiritual.
Associo-me ao pensamento do Sr. Deputado Carvalho Mourão, no sentido de se criar um órgão destinado a fiscalizar a pureza da língua portuguesa.
Se existe, tanto melhor para nós; se não existe, que se crie.
A língua, repito, e um dos elementos fundamentais da nossa nacionalidade.
E, para terminar, vou contar a V. Exa. e á Câmara o seguinte característico e interessante caso.
Num concurso para uma escola superior, tive ocasião de ver que um candidato apresentou umas brilhantes provas, sendo, portanto, o primeiro classificado.
Pois querem V. Exas. ouvir o que êle sustentou?
Que muito mais que o poema de Camões, tinha contribuído para a fixação da língua, não sei que secundário monumento de arte!
Qual é o português que tenha lido o poema de Camões, que diga que há alguma cousa mais para se fixar a língua, do que êsse poema?!
Não há, decerto.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação do artigo novo apresentado pelo Sr. Deputado Carvalho Mourão.
Foi rejeitado.
O Sr. Carvalho Mourão: - Peço a contraprova.
Feita a contraprova deu o mesmo resultado.
O Sr. Presidente: - Vai discutir-se o artigo 16.°
O Sr. Rodrigo Fontinha: - Vou mandar para a mesa uma proposta de emenda, pela qual fica assim redigido o artigo 16.°
Leu-se na mesa.
Proposta de emenda
Artigo 16.° Os actuais empregados de qualquer dos Ministérios a cujo cargo estão os serviços que passam para o novo Ministério da Instrução Pública e Belas Artes serão por êste distribuídos conforme a sua categoria e habilitações e em harmonia com as conveniências do serviço, sendo-lhes garantidas todas as vantagens e direitos adquiridos de acôrdo com a legislação em vigor, à data da promulgação dêste diploma. = Rodrigo Fontinha.
Devo declarar que, se porventura esta proposta for aprovada, apresentarei seguidamente uma outra para eliminação do artigo 17.°, visto que a minha proposta abrange a doutrina compreendida, quer no artigo 16.°, quer no 17.°
As razões que me levaram a apresentar esta proposta foram as seguintes:
Em primeiro lugar, diz o projecto:
Leu.
O que é certo é que não é só a cargo dos Ministérios do Interior e do Fomento que estão actualmente serviços que transitam para o novo Ministério. Estão tambêm serviços das escolas do Ministério das Colónias.
Para que fique completo e perfeito, deve alargar-se tambêm os serviços de ensino que ora estão a cargo do Ministério das Colónias.
Ora o artigo do projecto diz:
Leu.
Sr. Presidente: se o artigo do projecto fôsse assim aprovado, traria como consequência uma imediata, deslocação de funcionários que estão prestando serviços de muita utilidade.
Com o que se quere estabelecer, apenas dois empregados estão em condições de poder continuar a fazer serviço no Ministério da Instrução.
Êsses funcionários são os Srs. Queiroz Veloso e Carneiro de Moura.
Todos os outros terão de ser deslocados, e assim todos êsses empregados irão aumentar o número de adidos, provocando o acréscimo das despesas públicas.
Isto não aproveita nem ao Estado, nem ao serviço, nem aos funcionários.
Será necessário nomear empregados para o novo Mi-
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SESSÃO N.° 173 DE 21 DE NOVEMBRO DE 1912 9
nistério, e por muito competentes que sejam êsses empregados, não terão a competência que tem aqueles que já estão desempenhando êsses serviços.
Os serviços de instrução pública, estando hoje repartidos por três Ministérios, são desempenhados por funcionários competentíssimos, e êsses empregados, sendo deslocados para outros serviços diferentes, não irão de boa vontade desempenha-los, porque lhes são completamente alheios.
Isto há-de forçosamente causar uma anarquia nos serviços públicos.
Eu disse que isso não aproveitaria ao Estado, porque assim êsses empregados não poderão bem desempenhar serviços de que não estão conhecedores, e serão tambêm prejudicados.
A aprovação do artigo do projecto como está é prejudicialissima, e dá em resultado irmos fazer uma obra de desorganização.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Vozes: - Muito bem.
O Sr. Costa Bastos: - Mando para a mesa a seguinte:
Proposta
Emenda ao artigo 16.°:
Os actuais empregados dos Ministérios do Interior e do Fomento e qualquer outro Ministério a cujo cargo estão os serviços que passam para o novo Ministério continuarão exercendo as suas funções independentemente do disposto no artigo 11.° e suas alíneas, o qual só terá execução à medida que forem vagando os respectivos lugares. = O Deputado, Costa Bastos.
É lida e admitida a proposta ao Sr. Rodrigo Pontinha.
O Sr. Carlos Olavo: - Mando para a mesa a seguinte
Proposta
Substituição:
Proponho que o artigo 16.° fique assim redigido:
"Artigo 16.° O provimento dos cargos mencionados no artigo 11.° será feito nas condições aí indicadas, podendo todavia ser neles colocados, consoante as suas aptidões, os empregados actualmente incumbidos dos serviços que passam para êste Ministério, embora não satisfaçam àquelas condições de provimento". = Carlos Olavo.
A aprovação do artigo 16.°, como está, implica um aumento de despesa para o Tesouro, e por isso apresentei a minha proposta, que tem a vantagem de desfazer a impressão de se aumentar a despesa com a criação do Ministério de Instrução Pública e Belas Artes, e de fazer justiça àqueles que, por razões fundadas na competência que é indispensável para o desempenho dêstes cargos, votaram o artigo 11.°
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Jorge Nunes: - Sr. Presidente: pedi a palavra para justificar o meu voto favorável à proposta do Sr. Rodrigo Fontinha. Entendo que nós, na discussão do artigo 16.°, devemos ter em atenção não só os interesses dos funcionários, que até á data estão exercendo ao suas funções no Ministério do Interior, mas ao mesmo tempo os interesses do Estado.
Os funcionários que estão hoje nessas diferentes repartições, distribuídos em dois ou três Ministérios, não serão todos competentes para desempenhar as suas funções.
Concordo plenamente que haja na direcção dêsses serviços, nos amanuenses, nos primeiros oficiais e nos chefes, homens que sejam competentes para desempenhar as suas funções, mas que alguns existam que não estejam nessas condições. Ora, contra êstes, o Ministro tem mais uma arma dentro da legislação vigente. E assim, todas as vezes que no exercício dessas funções o Ministro se encontre em face dum funcionário cuja competência deixe muito a desejar, há mil maneiras de o desviar do exercício das suas funções: é passar êsse funcionário para as classes inactivas. E certo que estamos atravessando uma terrível crise financeira, mas, apesar disso, devemos empenhar todos os nossos esforços em favor da instrução, e podemos, sem excluir a capacidade dos dirigentes, fazê-lo sem agravar o Tesouro, antes salvaguardando os seus interesses, criando o Ministério de Instrução Pública e Belas Artes.
Entendo que os funcionários, ainda que não sejam altamente competentes, irão procurar satisfazer as exigências da lei e, então, isso basta para que eu esteja convencido de que a instrução no país vai lucrar com o desdobramento do Ministério do Interior.
Estou certo de que desviando para lá todos os funcionários a cujo cargo estão hoje os serviços da instrução, êsse Ministério há-de procurar satisfazer KS exigências do pais em matéria da sua instrução.
Assim eu dando o meu apoio à proposta do Sr. Rodrigo Fontinha pretendo: 1.° salvaguardar os interesses legítimos do Estado o dos funcionários; 2.° salvaguardar o Ministro da dificuldade em que se pode encontrar de ter que admitir um funcionário que êle antecipadamente entende como incompetente; 3.° dada esta hipótese, consignar na lei disposições suficientes para o desembaraço dessa dificuldade.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Duarte Leite): - Ouvi com atenção o Sr. Deputado Rodrigo Fontinha justificar a sua proposta.
O orador não foi ouvido.
E sempre difícil a um Ministro desviar do serviço um empregado incompetente, porque êle sempre reclama, a não ser que se forme um processo disciplinar, o que é bastante dificultoso e melindroso.
Portanto, não se pode passar facilmente à situação de adido qualquer funcionário, como o Sr. Deputado Jorge Nunes julga.
O orador não reviu.
O Sr. João Barreira: - Sr. Presidente: quando a comissão redigiu o artigo 16.°, fê-lo naturalmente para que se pusesse em vigor o espírito do artigo 11.° Ora, como êste artigo em parte não existe, visto que a Câmara rejeitou o texto, entendo que, se não fossem mantidos os direitos a êsses funcionários, não havia ensejo para estas disposições transitórias.
O orador não reviu.
O Sr. Alfredo Ladeira: - Mando para a mesa a seguinte
Proposta
Proponho que na proposta do Sr. Deputado Rodrigues Fontinha se acrescentem as seguintes palavras:
Onde se diz: "todos os direitos adquiridos", se acrescente: a incluindo os de promoção". = Alfredo Maria Ladeira.
Foram admitidas as propostas dos Srs. Carlos Olavo e Alfredo Ladeira.
O Sr. Presidente: - Como não está mais nenhum Sr. Deputado inscrito vai passar-se à votação.
Foi lida e aprovada a proposta do Sr. Rodrigo Fontinha.
Em seguida foi aprovada a proposta de aditamento do Sr. Deputado Alfredo Ladeira.
As outras propostas consideram-se prejudicadas.
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10 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS
O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para entrar em discussão, o artigo 17.°
Leu-se.
O Sr. Rodrigo Pontinha: - Vou mandar para a mesa uma proposta eliminando êste artigo.
O Sr. Presidente: - Julgo desnecessário votar-se a proposta do Sr. Rodrigo Fontinha, porque êste artigo encontra-se prejudicado pelas votações já feitas.
Vai passar-se à votação dos artigos já discutidos do Código Administrativo.
O Sr. Jorge Nunes (por parte da comissão de obras públicas): - Sr. Presidente: peço a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se permite que a comissão de obras públicas reúna durante a sessão.
Consultada a Câmara, resolve afirmativamente.
O Sr. Baltasar Teixeira: - Mando para a mesa o parecer sôbre a proposta do Sr. Ministro do Interior, relativa a Escolas Normais.
Foi mandado a imprimir.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação do artigo 163.°, titulo VII do Código Administrativo. Foi aprovado, assim como o artigo 164.°
O Sr. Dias da Silva: - Requeiro que o artigo 165.° seja votado por números.
Consultada a Câmara, resolveu afirmativamente.
Aprovaram-se os seis primeiros números e a emenda ao n.° 7.°
Foi aprovado o artigo 166.° com a eliminação do parágrafo, e a seguir o artigo 167.° e aditamento, e artigos 168.° a 173.°
Aprovou-se um artigo novo.
O Sr. Presidente: - Chamo a atenção da Câmara. Passa a votar-se o artigo 193.°
O Sr. Jacinto Nunes: - Sr. Presidente: tendo o presidente da Câmara Municipal do Pôrto enviado à comissão umas emendas relativas à organização do município daquela cidade, e tendo-se perdido essas emendas, parecia me conveniente adiar-se a votação desta parte do Código até dar tempo a que se escreva para que venham novas emendas.
Aproveitando o estar no uso da palavra, lembro à Câmara que nas disposições transitórias se podia estabelecer qualquer disposição relativa à ilha do Corvo, que se encontra em condições especiais.
O orador não reviu.
O Sr. Germano Martins: - Pedi a palavra para declarar que fui eu, como Deputado pelo Pôrto, que entreguei ao Sr. Jacinto Nunes as propostas feitas pelo município daquela cidade.
De acôrdo com o que disse o Sr. Deputado Jacinto Nunes, parece-me igualmente que se deve adiar a votação até dar tempo a virem novas emendas.
O orador não reviu.
Aprovaram-se os artigos 194.° a 197.º
O Sr. Matos Cid (por parte da comissão): - Sr. Presidente : a comissão entende que deve ficar para depois a votação do titulo XI, por isso que há nele disposições que tem de ser harmonizadas com a lei eleitoral.
Assim se resolve.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se para se votar, o titulo XII, artigo 204.
Leu-se.
Foi aprovado, assim como os artigos, seguintes até o n.° 214.°
O artigo 207.° foi eliminado por proposta da comissão.
Carlos Olavo: - Pedi a palavra para dar um esclarecimento à Câmara.
Na ocasião em que veio à discussão o artigo 214.° apresentei uma emenda, que foi aceite pela comissão, restringindo o uso da advocacia aos secretários gerais.
Essa proposta de emenda era concebida nos seguintes termos:
Leu.
Tendo sido, como já disse, aceite esta minha proposta pela comissão, e para corroborar esta minha afirmação apelo para o testemunho do Sr. Deputado Matos Cid, compreende, decerto, a Câmara, que e com grande surpresa que vejo agora essa proposta rejeitada pela comissão.
O orador não reviu.
O Sr. Matos Cid: - E a expressão rigorosa da verdade tudo o que acaba de afirmar o Sr. Deputado Carlos Olavo. Fui eu, quem, em nome da comissão e por ela autorizado, declarou que aceitava a proposta do Sr. Carlos Olavo.
Foi rejeitado o § único ao artigo 207.° e aprovada a substituição.
Seguidamente aprovaram-se os artigos 215.° a 220.°
O Sr. Presidente: - Vai ler-se o título 15.°
O Sr. João Luís Ricardo: - Requeiro que seja dispensada a leitura.
Consultada a Câmara, resolveu afirmativamente.
O Sr. Pires de Campos: - Sr. Presidente: considerando eu êste titulo bastante importante, e havendo Deputados que sôbre êle desejam apresentar propostas, parecia-me conveniente adiar a sua discussão para amanhã.
O orador não reviu.
O Sr. Dias da Silva: - Sr. Presidente: peço licença para observar a V. Exa. que a discussão já está feita até o título XVIII. Veja V. Exa. a sessão de 21 de Junho.
Pausa.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Tem muita razão o Sr. Deputado Dias da Silva.
Vai ler-se, para entrar em discussão, o título XIX.
O Sr. Barbosa de Magalhães: - Sr. Presidente: eu entendo que, tratando êsse título das disposições transitórias, êle não pode ser discutido sem estarem discutidos e votados todos os outros, por não se saber antes o que ficará como definitivo.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã, às 14 horas, sendo a ordem do dia. a continuação da discussão do projecto ao Código Administrativo.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas.
O REDACTOR = Sérgio de Castro.
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APÊNDICE A SESSÃO N." 173 DE 21 DE NOVEMBRO DE 1912 11
Discurso proferido pelo Sr. Deputado Carvilho Mourão, que devia ler-se a pag. 8 da sessão n.° 173, de 21 de Novembro de 1912
O Sr. Carvalho Mourão: - Sr. Presidente: ouvi com a maior atenção as palavras dos Sr s. João Barreira e Ministro de Interior, e devo declarar com toda a lialdade e franqueza que não me parecem aceitáveis as razões invocadas por S. Exas., pretendendo demonstrar não ser necessária a aprovação da minha proposta, para a criação dum conselho de aperfeiçoamento da língua nacional.
Disse o Sr. Ministro do Interior que era objecto regulamentar a criação dêsse conselho. S. Exa. permitir-me há observar-lhe, aliás com toda a consideração que à sua superior inteligência é devida, que se me afigura laborar num êrro. Se a criação do aludido conselho importa indubitavelmente um aumento de despesa, embora relativamente insignificante, não pode deixar de ser objecto dum texto legislativo; não cabendo, por isso, nas faculdades do Poder Executivo inseri-lo num simples regulamento. (Apoiados).
Demais, desde que não ficasse consignada na lei, nenhuma esperança teria de ver a minha proposta adoptada no regulamento, ainda que o facto fôsse legalmente possível; não porque S. Exa. deixe de reconhecer a necessidade dum conselho daquela natureza, mas porque dificuldades de várias espécies, embaraços de toda a ordem, haviam de impedir que no decreto regulamentar êle se estabelecesse. Entendo, portanto, que não ficaria mal ca lei. Embora a Câmara tenha rejeitado o § único do artigo 2.° do projecto em discussão, não me parece de modo nenhum inconveniente que nele se inscreva o princípio de que é indispensável um conselho especial, para tratar de assuntos que são tambêm especiais, direi mais, especialíssimos.
S. Exa., pela enumeração das atribuições que eu pretendo conferir ao conselho da língua nacional, reconhecerá facilmente que são de alta importância para o progresso e para o aperfeiçoamento da nossa língua, base essencial, como disse ontem, de toda a educação nacional.
Entendo, pois, que adiar para mais longe a criação dum conselho, cujo fim principal, senão exclusivo, é trabalhar porque a nossa língua, tam bela, tam rica, tam formosa, que não há nenhuma das congéneres que se lhe compare, que possua, por exemplo, uma sinonímia como ela, que se amolda a todas as circunstâncias e a todos os assuntos, como talvez nenhuma outra, continue a ser vergonhosamente deturpada, pela inconsciência de muitos, pelo desmazêlo absolutamente condenável de quási todos.
Conseguintemente, peço á Câmara e ao Sr. Ministro do Interior que não se oponham a que o meu artigo adicional seja aprovado. S. Exa. sabe muito bem a que situação deplorável chegou a nossa língua, que parece andar unicamente por mãos de bárbaros, desconhecedores em absoluto da sua estrutura, do seu léxico, da sua gramática, emfim.
Completamente deturpada, numa mescla vergonhosa, que por aí se vê e se ouve com aparências de linguagem nacional, não é português, é vasconço. E verdadeiramente entristecedor o que se diz, o que se escreve, em toda a ordem de publicações. O próprio teatro não tem concorrido pouco para êste deplorável abastardamento; tem sido até um dos agentes mais poderosos da corrupção da linguagem: é indispensável, portanto, aplicar um correctivo enérgico a esta situação deveras deprimente, que nos coloca mal perante todos os povos cultos. (Apoiados).
Vozes: - Para que serve a nossa Academia?
O Orador: - Para o que tem servido já todos nós o sabemos. O que ela fará de futuro não o sei eu nem será muito fácil sabê-lo.
O que eu sei, e tenho observado, é que as nações mais civilizadas tem o culto da língua; sendo ela objecto de cuidados especiais de todos os homens competentes no assunto. (Apoiados).
Sem a língua, já se disse, e repito-o, não há nacionalidade. (Apoiados). A pureza da linguagem é uma das condições da autonomia nacional, e sem ela morrem as nacionalidades, como a história constantemente no-lo atesta. (Apoiados).
V. Exa., Sr. Ministro do Interior, que é um homem de larga cultura mental, há-de concordar comigo que é preciso opor um dique poderoso à onda de barbarismos que ameaça subverter a nossa língua, e dum modo assustador, deturpando-a miseravelmente. E o remédio há-de ser pronto e eficaz, se quisermos evitar o seu completo aniquilamento. (Apoiados).
A Câmara compreende que nós, Deputados, como bons patriotas, temos obrigação de concorrer com os nossos esforços, para o ressurgimento da língua, procurando, por todos os meios ao nosso alcance, levantá-la do abatimento a que ela tem chegado, sobretudo nos últimos tempos.
O descalabro é completo: conseguintemente, a existência dum organismo que possa depurá-la de todas as impurezas que a tem inquinado, é de absoluta e indiscutível necessidade. (Apoiados).
Posta a questão nestes termos, claros e precisos, quere-me parecer que ninguêm, nesta Câmara ou fora dela, poderá legitimamente impugnar a utilidade e até a urgência da minha proposta, destinada apenas a estabelecer uma sentinela vigilante, que se oponha à invasão deveras assustadora dessa aluvião de estrangeirismos de toda a ordem, que ameaça destruir a pureza da nossa rica e formosa língua.
E não me cansarei de repetir, Sr. Presidente, que se nos impõe imperiosamente o dever sacratíssimo de conservar e aperfeiçoar êste precioso legado dos nossos antepassados, como afirmação perene de que queremos manter altivamente a nossa nacionalidade. (Muitos apoiados).
Já sabemos que da Academia, pelos trabalhos conhecidos, nada nos é licito esperar.
Se, depois de tantíssimos anos e de tam largo estipêndio, para a elaboração dum dicionário completo da língua, nos deu apenas um volume, que garantias nos oferece de que, para o futuro, os seus trabalhos hão-de ser mais apreciáveis?
O Sr. Ministro do Interior (Duarte Leite): - O dicionário está feito, como já ontem disse a V. Exa.
O Orador: - Não duvidei, nem me é lícito duvidar das afirmações de V. Exa.; mas eu não tenho conhecimento dele.
Êsse trabalho ainda não foi publicado, de modo que não posso argumentar com trabalho de que o público não tem conhecimento.
O que de todos é conhecido é apenas o primeiro volume que termina, como se disse, no verbo "azurrar".
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12 DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
E, para êste trabalho insignificante, tem o Estado contribuído com largos subsídios!
Ora, sendo isto incontestável, claro fica serem absolutamente procedentes as minhas considerações.
Demais, que importa para o caso que se discute, que o dicionário esteja concluído?
Já não é sem tempo, nem êsse facto pode invalidar a justeza das minhas observações.
E, se no complemento do dicionário seguiu a Academia a orientação que geralmente se lhe atribui, muito maior razão nos assiste para duvidarmos do valor e da eficácia dos seus trabalhos, no sentido de se evitar o abastardamento da língua. (Apoiados).
Parece-me, pois, evidentemente provado que, tendo sido nula a acção da Academia, indispensável se torna a criação dum organismo que vantajosamente a substitua, no exercício de funcções para que ela se tem mostrado inútil. (Apoiados).
Temos, para isso, professores muito competentes, como os Srs. Gonçalves Guimarães, Ribeiro de Vasconcelos, Mendes dos Remédios e D. Carolina Michaelis, da Universidade de Coimbra; Epifânio Dias e Leite de Vasconcelos, da Universidade de Lisboa; e, fora do professorado oficial, possuímos ainda homens de alto valor, como o Sr. Gonçalves Viana, Cândido de Figueiredo e outros que excelentes serviços poderiam prestar, entrando no conselho, cuja criação proponho.
Conheço alguns de altíssima competência, que da melhor vontade - estou certo disso - poriam o seu saber, os seus conhecimentos especiais, ao serviço duma causa tam alevantada, tam nobre, tam patriótica. (Apoiados).
Interrupção dalguns Srs. Deputados que não foi ouvida.
O Orador: - Não trato aqui de pessoas, aprecio apenas os seus trabalhos literários ou scientitícos, as obras que tem publicado, e por elas e que formo o meu juízo a respeito do valor relativo de cada um deles. (Apoiados).
Vou concluir, Sr. Presidente, por me parecer estar a Câmara suficientemente esclarecida sôbre o assunto que se discute.
Penso que ela, na sua alta sabedoria, avaliará bem os factos que deixo apontados, que são, a meu ver, demasiadamente concludentes e justificam plenamente a proposta que tive a honra de apresentar à sua consideração.
Concluo, pois, na convicção de que a Câmara não a rejeitará, em nome dos sagrados interesses da nacionalidade portuguesa, que temos obrigação de respeitar e honrar, a fim de mostrarmos ao mundo civilizado que a República não esquece os seus deveres, considerando como o primeiro de entre êles o de reivindicar a vernaculidade da língua nacional, como penhor sagrado da nossa autonomia e do esplendor da nossa querida e outrora tam gloriosa Pátria.
Vozes: - Muito bem, muito bem!