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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
42.ª SESSÃO ORDINÁRIA DO 3.° PERÍODO DA 1.ª LEGISLATURA
1912-1913
EM 19 DE FEVEREIRO DE 1913
Presidência do Exmo. Sr. José Augusto de Simas Machado
Secretários os Exmos. Srs.
Jorge Frederico Velez Caroço
Eduardo de Almeida
Sumário.- Chamada e abertura da sessão. Leitura e aprovação da acta. Dá-se conta do expediente.
É admitida uma proposta de lei.
Antes da ordem do dia: O Sr. Alfredo Ladeira refere-se e comenta um telegrama doa operários de Gaia. Responde-lhe o Sr. Presidente do Ministério (Afonso Costa). Refere-se ao mesmo assunto o Sr. Costa Basto.
O Sr. Casimiro de Sá insta por documentos que pedira, respondendo-lhe o Sr. Presidente do Ministério (Afonso Costa).
O Sr. João de Meneses pede ao Sr. Ministro do fomento que se intêresse pelo projecto sôbre os adidos.
Usa da palavra o Sr. Presidente do Ministério (Afonso Costa), definindo a atitude do Govêrno perante diversas iniciativas do Parlamento.
O Sr. João de Meneses envia para a mesa uma nota de interpelação ao Sr Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Papéis enviados para a mesa: Requerimentos aos Srs. Pereira Vitorino e Cunha Macedo, e diversos pareceres de diferentes comissões.
Ordem do dia: Discussão do parecer n.º 62, que é aprovado sem discussão.
Continua em discussão o projecto de lei sôbre o pôrto franco. Usa da palavra o Sr. Ministro do Fomento (António Maria da Silva), que apresenta uma proposta.
Segue-se no uso da palavra o Sr. Correia Herédia (Ribeira Brava).
Apresenta diversas propostas o Sr. José Barbosa.
Volta a falar o Sr. Correia Herédia.
O Sr. José Barbosa retira a sua moção.
É aprovado o artigo 4.°
Entra em discussão a proposta de lei n.º 32. Falam os Srs. Baltazar Teixeira, Joaquim José de Oliveira, Matou Cid, Jorge Nunes, Sarros Queiroz e Pires de Campos, vendo a proposta rejeitada na generalidade.
Entra em discussão o projecto de lei n.° 46.
Usa da palavra o Sr. Afonso Costa, Presidente do Ministério, seguindo-se-lhe o Sr. Cunha Macedo, sendo aprovado que o projecto baixe à comissão.
Entra em discussão o parecer n.º 38.
Fala o Sr. Afonso Costa, Presidente do Ministério.
Usa da palavra o Sr. Machado Santos, a quem o Sr. Presidente do Ministério diversas vezes interrompe para responder, com permissão do orador.
É a sessão encerrada.
Abertura da sessão. - Às 15 horas e 5 minutos.
Presentes-75 Srs. Deputados.
São os seguintes:
Adriano Mendes de Vasconcelos.
Afonso Augusto da Costa.
Afonso Ferreira.
Alberto de Moura Pinto.
Alexandre Augusto de Barros.
Alfredo Balduíno de Seabra Júnior.
Alfredo Maria Ladeira.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Poppe.
António Amorim de Carvalho.
António Augusto Pereira Cabral.
António Barroso Pereira Vitorino.
António Joaquim Granjo.
António José de Almeida.
António José Lourinho.
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2 Diário da Câmara dos Deputados
António Maria de Azevedo Machado Santos.
António Maria da Cunha Marques da Costa.
António Pires Pereira Júnior.
António Silva Gouveia.
António Valente de Almeida.
Aquiles Gonçalves Fernandes.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Caetano Francisco Cláudio Eugénio Gonçalves.
Carlos António Calisto.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Casimiro Rodrigues de Sá.
Eduardo de Almeida.
Ezequiel de Campos.
Fernando da Cunha Macedo.
Francisco Correia Herédia (Ribeira Brava).
Francisco Cruz.
Francisco José Pereira.
Francisco Luís Tavares.
Francisco de Sales Ramos da Costa.
Gastão Rafael Rodrigues.
Gaudêncio Pires de Campos.
Helder Armando dos Santos Ribeiro.
Henrique José Caldeira Queiroz.
Henrique José dos Santos Cardoso.
João Barreira.
João Camilo Rodrigues.
João Duarte de Meneses.
João Machado Ferreira Brandão.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim José Cerqueira da Rocha.
Joaquim José de Oliveira.
Jorge Frederico Velez Caroço.
José Augusto Simas Machado.
José Barbosa.
José Bernardo Lopes da Silva.
José Bessa de Carvalho.
José Botelho de Carvalho Araújo.
José Cordeiro Júnior.
José Francisco Coelho.
José Jacinto Nunes.
José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Pereira da Costa Basto.
José Tomás da Fonseca.
José Tristão Pais de Figueiredo.
José Vale de Matos Cid.
Jovino Francisco de Gouvêa Pinto.
Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Gregório Pestana Júnior.
Manuel Pires Vaz Bravo Júnior.
Miguel de Abreu.
Miguel Augusto Alves Ferreira.
Pedro Alfredo de Morais Rosa.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Rodrigo Fernandes Fontinha.
Severiano José da Silva.
Tomé José de Barros Queirós.
Vítor José de Deus Macedo Pinto.
Entraram durante a sessão os Srs.:
Adriano Gomes Ferreira Pimenta.
Alberto Souto.
Alfredo Guilherme Howell.
Álvaro Nunes Ribeiro.
Américo Olavo de Azevedo.
Amílcar da Silva Ramada Curto.
António França Borges.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
Artur Augusto Duarte da Luz Almeida.
Augusto José Vieira.
Aureliano de Mira Fernandes.
Carlos Amaro de Miranda e Silva.
Carlos Maria Pereira.
Domingos Leite Pereira.
Emídio Guilherme Garcia Mendes.
Germano Lopes Martins.
Inocêncio Camacho Rodrigues.
João Carlos Nunes da Palma.
João Gonçalves.
João José Luís Damas.
Joaquim Brandão.
Joaquim Teófilo Braga.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António Simões Raposo Júnior.
José Maria Cardoso.
José Mendes Cabeçadas Júnior.
José Montez.
José da Silva Ramos.
Júlio do Patrocínio Martins.
Luís Inocêncio Ramos Pereira.
Manuel José da Silva.
Philemon da Silveira Duarte de Almeida.
Tiago Moreira Sales.
Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
Vitorino Henriques Godinho.
Não compareceram à sessão os Srs.:
Albino Pimenta de Aguiar.
Alexandre Braga.
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Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá.
Álvaro Xavier de Castro.
Angelo Rodrigues da Fonseca.
Angelo Vaz.
António Alberto Charula Pessanha.
António Albino Carvalho Mourão.
António Aresta Branco.
António Caetano Gelorico Gil.
António Cândido de Almeida Leitão.
António Maria Malva do Vale.
António Pádua Correia.
António de Paiva Gomes.
Carlos Henrique da Silva Maia Pinto.
Ernesto Carneiro Franco.
Fernando Baeta Bissaia Barreto Rosa.
Guilherme Nunes Godinho.
João Fiel Stockler.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José de Barros Mendes de Abreu.
José Carlos da Maia.
José Dias da Silva.
José de Freitas Ribeiro. José Perdigão.
Porfírio Coelho da Fonseca Magalhães.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Às 15 horas e ô minutos, presentes 75 Srs. Deputados, abre-se a sessão.
É lida e aprovada a acta, seguindo-se a leitura do
EXPEDIENTE
Ofícios
Do Senado, devolvendo a proposta de lei n.° 236-C, com alterações que lhe foram introduzidas, estabelecendo um regime administrativo autónomo no Arsenal do Exército.
Igualmente envia um exemplar do parecer da comissão de guerra.
Para a comissão de marinha.
Do Ministério do Interior, enviando duas cópias acêrca da nomeação de Casimiro de Almeida Barreto para administrador do concelho da Pampilhosa, e outra acêrca da demissão.
Para a Secretaria.
Do Senado, devolvendo a proposta de lei n.° 172-H, com as alterações que lhe foram introduzidas que tem por fim abrir um crédito extraordinário de 30.000 escudos a favor do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Igualmente envia um exemplar do parecer da comissão de finanças, seguido da proposta de lei já aprovada por esta Câmara.
Para a comissão de finanças.
Do Ministério da Justiça, enviando cópia dum ofício do ex-procurador régio junto da Relação do Pôrto, satisfazendo ao pedido do Sr. Jacinto Nunes.
Para a Secretaria.
Do Ministério das Finanças, satisfazendo ao requerimento do Sr. João Luís Ricardo, envia a cópia da nota da Direcção Geral das Contribuições e Impostos.
Para a Secretaria.
Telegramas
Aveiro. - Presidente Câmara Deputados. Lisboa.-Arauto Escolar interpreta sentimentos classe professorado primário protesta energicamente contra passagem administração ensino primário do Estado para câmaras municipais classe movimenta-se havendo já reuniões protesto lavram-se representações que baixarão breve Parlamento. = Redacção Arauto Escolar.
Para a Secretaria.
Vila Rial. - Exmo. Presidente Câmara Deputados.-Lisboa.-A Câmara Munici-3al desta vila roga a V. Exa. se digne designar dia para discussão do projecto de ei apresentado na sessão de 21 de Junho passado, pelo Sr. Deputado Jacinto Nunes, autorizando a mesma Câmara a lanar o imposto de 1 por cento sôbre o produto da venda de peixe, destinado a garantir um empréstimo para melhoramentos locais; a aprovação de tal projecto torna-se urgente para se principiarem êstes melhoramentos que a opinião pública reclama, tanto mais que projectos idênticos relativos a outros municípios, apresenta-los posteriormente, já tiveram aprovação da Câmara. Confiadamente esperamos que o mesmo não sofra mais demora que gravemente afectará interesses locais. = O Residente da Câmara, Manuel dos Reis Cruz.
Para a Secretaria.
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Gaia. - Presidente Câmara Deputados. - Lisboa. - União trabalhadores fluviais Pôrto e Gaia, em nome de duas mil famílias obreiras rio Douro, pede seja suspensa discussão projecto Leixões até enviar representação dentro breves dias obras Leixões em prejuízo rio Douro que adaptado serviria bem navegação e interesses Pôrto representam dispêndio inútil milhares de escudos, canfiamos V. Exa. facilitará nosso pedido evitando resolução precipitada sôbre tam importante assunto. - Comissão Defesa, João Augusto Silva = António Fernandes Cruz = Belmiro Figueiredo.
Para a Secretaria.
Segundas leituras
Foi admitida a seguinte proposta já publicada no "Diário do Govêrno":
Proposta de lei
Artigo 1.° O direito exclusivo do fabricar, em qualquer província, distrito ou ilha ultramarina, produtos duma indústria, poderá ser concedido a nacional ou estrangeiro, quando essa indústria não estiver sendo actualmente explorada no território a que a concessão houver do respeitar, ou quando numa indústria já em exploração só pretender introduzir processos novos, de reconhecida utilidade, susceptíveis do baratear, melhorar ou facilitar a produção, sendo, neste caso, o exclusivo restrito ao fabrico por tais processos.
Art. 2.° Juntamente ou não com o exclusivo do fabrico poderá, nos mesmos casos, ser concedida alguma das seguintes vantagens:
a) Importação livre dos motores, maquinismos, ferramentas, utensílios e materiais de construção necessários para as fábricas ou oficinas em que as indústrias houverem de ser exercidas;
b) Importação livre de matérias primas e mais artigos, não produzidos na província, mas necessários para a laboração das indústrias;
c) Isenção de contribuições directas pelo exercício das indústrias, e pelos terrenos e prédios urbanos de instalação das respectivas fábricas ou oficinas.
Art. 3.° O exclusivo do fabrico e qualquer das vantagens enunciadas no artigo 2.° só serão concedidas a quem se mostrar habilitado com os fundos e meios necessários para o empreendimento, e quando se provar que êste exige um capital de instalação não inferior a 5.000 escudos.
§ único. Só tratando-se de indústrias novas de reconhecida utilidade, e cuja instalação exija, provadamente, um capital não inferior a 100.000 escudos, poderão ser concedidas cumulativamente, com o exclusivo do fabrico, todas ou duas das vantagens referidas.
Art. 4.° A concessão do exclusivo dá somente direito ao fabrico dos produtos a que directamente respeita, não incluindo o monopólio de venda dêsses produtos nem o do fabrico ou venda de produtos similares, ainda que com aqueles tenham íntima relação. Analogamente restrita se entenderá a concessão de qualquer das vantagens enunciadas no artigo 2.°
Art. 5.° O exclusivo do fabrico não pode ser concedido por tempo excedente a dez anos, incluídas quaisquer prorrogações. Das vantagens do artigo 2.°, a primeira durará só pelo tempo prefixo, indispensável à instalação, as duas últimas por tempo não excedente a três anos.
§ único. Tratando-se de indústrias nas circunstâncias previstas no f único do artigo 3.°, o tempo de duração do exclusivo poderá ser elevado ao dobro, e as vantagens a) o c) do artigo 2.° poderão ser concedidas pelo prazo máximo de cinco anos.
Art. 6.° Os requerimentos de exclusivo ou dalgumas das outras vantagens aqui previstas serão apresentados na superior secretaria administrativa da província, distrito ou ilha em que a indústria nova ou aperfeiçoada dever exercer-se, e dêles compete conhecer ao governador da província, ouvidas as associações industriais ou comerciais da região, havendo-as, as repartições técnicas competentes, e o conselho do governo ou corpo que o substituir, sendo indispensável o voto afirmativo dêste último para as concessões por tempo superior a um torço dos máximos fixados nesta lei.
Art. 7.° Se o requerente for estrangeiro, o pedido será sempre instruído com a declaração autêntica, perante o cônsul da respectiva nacionalidade ou notário, de que o requerente se sujeita às leis e tribunais portugueses, em tudo que respeitar à concessão e ao exercício da indústria a que ela se referir, renunciando a qual-
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quer fôro fora da província ultramarina respectiva.
Art. 8.° Nenhum pedido de concessão terá seguimento sem que se mostre depositada, provisoriamente, em cofre público, à ordem do governador da província, quantia, ou valor real em títulos, não inferior a 2 1/2 por cento do capital necessário à instalação industrial, devendo o depósito, no caso de ser deferido o pedido, converter-se em definitivo, elevado, porêm, pelo menos, ao dobro, antes de passar-se o título de concessão.
Art. 9.° A importância do depósito definitivo é lixada, para cada caso, pelo governador da província, não podendo exceder a 10 por cento do capital de instalação. Garante todas as responsabilidades civis, criminais ou meramente administrativas dos concessionários, que serão de cada vez obrigados a restabelecê-la ou completá-la dentro do prazo fixado pelo governador, sob pena de caducar a concessão, e, findo o prazo desta, reverte para os concessionários, salvo o disposto no artigo 13.°
Art. 10.° Todos os pedidos de concessão podem ser contestados dentro dos trinta dias subsequentes à publicação dêles no Boletim Oficial da província, com fundamento na idoneidade ou carência de meios do requerente, ou em que as indústrias ou processos industriais visados não satisfazem às condições previstas nesta lei; as contestações, porêm, só suspendem o processo da concessão emquanto não forem julgadas improcedentes em primeira instância.
Art. 11.° Todas as contestações ou reclamações que ocorrerem no processo da concessão serão julgadas, com audiência contraditória dos interessados, pelo conselho de província ou tribunal que o substituir, e tanto do julgamento como dos despachos do governador, respeitantes à concessão e à sua subsistência ou caducidade, cabe recurso contencioso para o conselho colonial.
§ único. Para os efeitos dêste artigo, a falta de resolução ou despacho dentro dum prazo de vinte dias considera-se indeferimento e está sujeita ao mesmo recurso.
Art. 12.° O título patente duma concessão poderá ser anulado em acção perante o tribunal de comércio da capital da província ou distrito, ou da comarca a que
pertencer a ilha, em que a concessão dever aproveitar-se, com o fundamento de que as indústrias ou processos industriais não satisfazem às condições fixadas na presente lei.
§ único. O Ministério Público intervém obrigatoriamente nestas acções, as quais se reputarão prescritas pelo decurso de quatro meses entre a data do Boletim Oficial em que se anunciou a expedição da patente e aquela em que for acusada a última citação.
Art. 13.° As portarias e os títulos de concessão caducam, revertendo para a Fazenda Provincial os depósitos feitos:
1.° Se decorrerem trinta dias depois de publicada a portaria no Boletim Oficial sem que se mostre prestada a caução definitiva;
2.° Se decorrerem noventa dias depois da mesma publicação, sem que se tenha expedido o título patente e anunciado a expedição no Boletim Oficial;
3.° Se decorrerem seis meses depois dêste anúncio, sem estar começada a instalação industrial;
4.° Se a indústria nova ou aperfeiçoada não estiver estabelecida dentro do prazo subsequente marcado na portaria de concessão.
5.° Quando, salvo fôrça maior comprovada, a indústria deixar de ser exercida seguidamente por um ano ou, interpoladamente por dois, sendo de laboração permanente; por duas épocas seguidas, ou três interpoladas, sendo de laboração periódica;
6.° Se a empresa industrial for transferida sem autorização do governador da província;
7.° Nos demais casos previstos na lei.
Art. 14.° O concessionário das vantagens a) e b) do artigo 2.° desta lei, convencido de desviar, da aplicação industrial declarada, os objectos importados livres de direitos, será punido nos tribunais competentes pelo descaminho fiscal, incorrendo sempre nos máximos das multas aplicáveis e na perda da concessão.
Art. 15.° Os contraventores de exclusivos concedidos nos termos desta lei ficam sujeitos à responsabilidade civil e criminal dos contrafactores de novos inventos.
Art. 16.° O governador da província poderá fiscalizar por agentes seus, wescolhidos de entre os empregados no serviço
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provincial, o modo como os concessionários cumprem as obrigações inerentes à concessão, facultando-se a êsses agentes visitar as fábricas, armazéns ou oficinas, verificar a produção, e proceder a quaisquer investigações na escrita comercial dos mesmos concessionários.
Art. 17.° Cada um dos governadores da província fica autorizado a publicar, ouvido o conselho de Govêrno, ou corpo que o substituir, o regulamento necessário à execução desta lei. Aí, alem doutras providências, se regulará o modo de assegurar a prioridade relativa de requerentes diversos que pretendam introduzir uma mesma indústria; o inquérito e mais formalidades capazes de garantir a idoneidade dos requerentes ou cessionários e a exactidão das suas afirmações; o amplo direito de reclamação de quaisquer interessados; a publicidade dos requerimentos, contestações, despachos, depósitos, portarias e patentes de concessão; e os emolumentos a pagar pelas concessões e suas transferências, os quais constituirão receita pública com destino à despesa da fiscalização prevista 110 artigo antecedente.
§ único. Cada regulamento será submetido à aprovação do Govêrno, sem prejuízo da sua imediata execução.
Art. 18.° (Transitório). As indústrias ou aperfeiçoamentos industriais introduzidos de novo em qualquer província, distrito ou ilha ultramarina, há menos tempo que os prazos máximos fixados nesta lei, e que estiverem sendo explorados por um só empresário á data da publicação dela no Boletim Oficial, poderão ser concedidas pelo tempo que faltar, e nos mesmos termos, as vantagens aqui declaradas, se o interessado assim o requerer dentro de quarenta dias, depois de publicado o respectivo regulamento.
Art. 19.° Fica revogada a legislação em contrário.
Ministério das Colónias, em 17 de Fevereiro de 1913. = Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
O Sr. Alfredo Ladeira: - Desejo chamar a atenção de V. Exa., Sr. Presidente, para um telegrama, que acabo de receber da União dos Trabalhadores do Pôrto e Gaia, sôbre a discussão do projecto do pôrto de Leixões.
Eu não conheço o assunto, mas chamo a atenção do Sr. Presidente do Ministério e da Câmara, para a representação que êsses trabalhadores mandam.
Vou ler o telegrama:
Leu.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Na mesa foi lido um telegrama idêntico a essa representação.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - O Govêrno só resolve a questão com todas as informações. De forma que o Sr. Deputado poderá convidar a referida associação a que envie a sua representação para a mesa.
O orador não reviu.
O Sr. Costa Basto: - Em negócio urgente tencionava tambêm referir-me a êste mesmo assunto, pois que tambêm recebi um telegrama idêntico ao que foi recebido pelo Sr. Alfredo Ladeira, mas visto S. Exa. ter-se antecipado, e depois das palavras do Sr. Presidente de Ministério, não faço mais considerações.
O orador não reviu.
O Sr. Casimiro de Sá: - Haja bastantes dias que requeri, pelo Ministério das Finanças, uns documentos sôbre concursos do mesmo Ministério. Até hoje não me foram enviados, mas não há razão alguma que justifique essa demora.
Parece que serão abertos novos concursos, e, se se demora a remessa dos documentos, talvez já não tenham razão de ser.
Por isso, peco ao Sr. Ministro das Finanças que dê providências.
Os concursos, a que me refiro, são para segundos oficiais do Ministério das Finanças.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - No Ministério das Finanças há ordens terminantes para não demorar os documentos. Talvez os referidos por S. Exa. sejam muito extensos. Se, porêm, o ilustre Deputado quere dar-se ao incomodo de lá ir, eu darei ordem de lhos comunicarem, isto independentemente de os enviar à Câmara.
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Aproveito a ocasião para comunicar a todos os Srs. Deputados que, quando queiram ir ao meu Ministério, serão sempre bem vindos.
O orador não reviu.
O Sr. João de Meneses: -É para pedir ao Sr Ministro do Fomento que se interesse o mais possível, visto que S. Exa. aqui tratou do assunto, para que no Senado entre rapidamente em discussão o projecto relativo aos adidos (Apoiados). Tive notícias de que ontem êsse projecto havia ido parar à comissão de legislação. Como V. Exa. aqui se interessou muito por êle, o até me declarou que só nos correios dava uma economia de 70 contos de réis, e como nós temos de fazer economias, não digo para equilibrar o Orçamento já, mas para, preparar o seu equilíbrio, parece-me que chegou o tempo de não se gastar dinheiro inútilmente e de se fazer entrar na ordem toda a gente que está ao serviço do Estado, sobretudo aqueles que não trabalham e o exploram.
Peço a V. Exa. que envide todos os seus esforços para que mostre no Senado a necessidade dêsse projecto entrar o mais depressa possível em discussão.
Aproveito a ocasião de estar com a palavra, para preguntar ao Sr. Presidente se tem notícia dalgum projecto sôbre acumulações e incompatibilidades, porque tam bem é preciso que isso entre na ordem Não é só dizer se na Constituição que votaremos isso e não votarmos, e andarmos todos os dias a dizer que o vamos votar. No tempo da monarquia havia um par do reino, o Sr. Câmara Leme, que todos os dias andava a pedir êsse projecto; passaram a vida a trocar dele todos os governos monárquicos e exploradores do Tesouro. Parece-me agora ocasião de se tratar disso depressa; pode desiquilibrar as finanças dalguns exploradores, mas sempre concorre para equilibrar as finanças públicas.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Tenho a declarar a V. Exa. que há, realmente, um projecto sôbre acumulações.
O Sr. João de Meneses: - Peço a V. Exa. que faça o possível para que entre depressa em discussão.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Eu gosto de varrer a minha testada; nós não fizemos na nossa declaração ministerial referência ao projecto relativo a incompatibilidades e acumulações, porque sabíamos já que existia numa das comissões um projecto a êsse respeito, e tambêm porque do facto de suprimir acumulações e estabelecer incompatibilidades é preciso atender a que não resulte sacrifício orçamental. V. Exa. compreende muito bem que o facto de impedir que um indivíduo exerça dois lugares, deve dar, ordinariamente, aumento de despesa, pois é estabelecer dois ordenados de categoria que é só um, quando o indivíduo tem acumulações. Isso não quere dizer que estime que se mantenha o sistema das acumulações, que é tudo quanto há de mais odioso, anti-democrático e absurdo, mas que, quando se fizer a lei que impeça as acumulações e que obste á situação de incompatibilidades políticas e morais de qualquer ordem, é preciso estabelecer as regras necessárias, para que da aplicação da lei não resulte aumento de despesa; de contrário, cá estou eu para pôr o meu embargo, e a comissão deve ter êsse critério.
Há tambêm pendente um projecto relativo ao limite de ordenados; o Govêrno não estima nada melhor do que êsse projecto seja discutido e votado.
Está em vigor a lei de 1908, que põe como limite o máximo de 3 contos de réis, feitas todas as deduções, para qualquer funcionário.
No Ministério das Finanças e em todos os outros, essa lei cumpre-se rigorosamente, mas é ainda muito larga.
Compreende-se que para uns certos funcionários se deva deixar êsse limite, mas para outros deve existir um limite mais baixo.
Há funcionários do meu Ministério que desde o mês passado estão sem receber gratificações, porque já preencheram o seu máximo.
Computado o seu ordenado de categoria até o fim do ano, com os emolumentos que tem de receber, já atingiram o máximo, e ,esta medida suponho que se estende a todos, alfândegas, secretarias de finanças, sem excepção; só os que estão exceptuados pela lei de 1908 é que naturalmente
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podem sair dêsse máximo, o resto está tudo vigiado.
É preciso que esta medida se estenda ao Ministério e haja um só limite.
O limite, para todas as repartições, estipulado pela lei de 1908 parece-me natural.
Àpartes.
O Orador: - É preciso ser justo.
Quanto aos adidos, o Govêrno não só acompanha, com boa vontade, o projecto em discussão, mas ainda ontem, quando entrei no Senado êle estava em discussão, eu o acompanhei com boa vontade.
O Sr. João de Meneses: - Ainda falta uma lei: é o regulamento dos funcionários públicos.
O Orador: - Lá iremos.
Quando entrei para, o Ministério, ainda não estava concluído o trabalho da comissão. Poucos dias depois concluiu-se.
A todo o tempo, o Parlamento resolverá.
Estou convencido de que há-de haver base para a sua boa execução.
O funcionário mau, que aliás é uma classe bastante extensa, é um inimigo do Estado, está de lança em riste contra o Estado, está em frente do Estado como inimigo, procurando arrancar-lhe o mais que pode, trabalhar o menos possível, procurando desacreditá-lo e embaraçá-lo no seu esforço a favor de todo o país.
Ora isso há-de ser impedido pelo regulamento dos funcionários públicos e pelo apoio que a Câmara me der.
V. Exas. tem, como vêem, o Govêrno à sua disposição para todas as medidas de saneamento administrativo e de funcionários que sejam necessários, porque são realmente possíveis e legítimos, como são os que respeitam aos vencimentos, obrigações, incompatibilidades, adidos, limites de ordenados, tudo quanto contribua para a moralidade dos serviços públicos.
O orador não reviu.
O Sr. João de Meneses: - Mando para a mesa a seguinte
Nota de interpelação
Desejo interpelar o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros:
1.° Sôbre as negociações relativas ao projecto de tratado de comércio e navegação entre Portugal e a Inglaterra;
2.° Sôbre os boatos tendenciosos de que se tem feito eco em diversos jornais estrangeiros, relativos a pretendidas negociações entre a Inglaterra e a Alemanha respeitantes a interesses portugueses. = João de Meneses.
Mandou-se expedir.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à ordem do dia. Os Srs. Deputados que tenham papéis a mandar para a mesa, podem fazê-lo.
Documentos mandados para a mesa durante a sessão
Requerimentos
Requeiro que, pelo Ministério do Interior e com urgência, me seja enviada cópia dos seguintes ofícios:
a) N.° 120, de 19 de Julho de 1907, dirigido pelo Govêrno Civil de Viseu ao então Ministro do Reino.
b) N.° 284, de 11 de Setembro de 1907, dirigido por êste Ministério àquele Govêrno Civil.
c) N.° 85, de 30 de Setembro de 1908, dirigido pela 3.ª Repartição de Contabilidade àquele mesmo Govêrno Civil.
Mais requeiro que, pelo mesmo Ministério do Interior e tambêm com urgência, me seja enviada nota do Govêrno Civil de Viseu, referindo a importância como subsídio entregue já ao cofre de pensões da polícia civil daquele distrito e a importância que, nos termos em que êsse cofre foi criado, falta ser entregue. = O Deputado, Pereira Vitorino.
Mandou-se expedir.
Requeiro do Ministério da Justiça informações acêrca dos motivos que contribuem para a conservação, na Câmara de Braga, dum notário que, tendo sido secretário da Câmara Municipal daquela cidade, foi aposentado por surdez.
O nome dêste funcionário é, salvo êrro, José de Faria Machado. = Fernando da Cunha Macedo.
Mandou-se expedir.
Pareceres
Da comissão de finanças, concedendo, com as alterações introduzidas pelo Senado
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ao projecto de lei n.° 19, subsídio aos membros do Congresso.
Foi a imprimir.
Da comissão de finanças, sôbre a proposta de lei 235-D, sendo de parecer que se mantenha o voto da Câmara.
Foi a imprimir.
Da comissão de finanças, reconhecendo que a emenda introduzida no projecto de lei 88-B, relativa á venda de dois prédios do Estado, sitos na cidade do Pôrto, é de parecer que merece a vossa aprovação.
Foi a imprimir
Da comissão de colónias, tendo examinado o requerimento do capitão reformado, Alberto Carlos, é de parecer que seja enviado ao Ministério das Colónias.
Da comissão de finanças, acêrca da proposta de lei n.° 57-E, que autoriza o Govêrno a levantar um empréstimo destinado à construção de certas obras e à aquisição de material para os caminhos de ferro do Estado.
Foi admitida e enviada à comissão de legislação criminal, obras publicas e finanças, o projecto do Sr. Alfredo Seabra, autorizando o Ministério do Fomento a determinar ao Conselho Superior dos Caminhos de Ferro do Estado o mandar construir ou adquirir, por compra, carruagens próprias para transporte de presos nos caminhos de ferro.
ORDEM DO DIA
Primeira, parte
Discussão do projecto de lei n.° 62 É o seguinte:
O Congresso da República resolve:
A disposição do artigo 54.° do decreto de 25 de Dezembro de 1910 "mas não terá efeito em relação aos bens das sucessões já abertas", entender-se há como referida às sucessões abertas à data da sua publicação e não à data da sua entrada em vigor.
Foi aprovado sem discussão na generalidade e na especialidade.
O Sr. Fernando Macedo: - Requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se
dispensa a última redacção do projecto que acaba de ser aprovado, a fim de ser imediatamente enviado para o Senado.
Foi dispensada.
Segunda parte
Continuação da discussão do projecto de lei n.° 198 (porto franco)
O Sr. Ministro do Fomento (António Maria da Silva): - Não é necessário gabar a excelência da situação geográfica do pôrto de Lisboa que, se for completada materialmente, poderá modificar-se num dos maiores portos comerciais. Para isso, o que lhe falta, e até para ser incluído nos portos de primeira linha, onde se adoptaram os portos francos, é ser terminus de linha de navegação.
Se se resolver o problema da navegação para o Brasil, conseguindo armar navios com a bandeira nacional, estabelecendo a navegação entre Lisboa e os diferentes portos brasileiros e até da Norte-América, ter-se há a certeza absoluta de que a experiência que se vai fazer em Lisboa está completamente assegurada no seu êxito.
É sabido que nos portos francos se pode instalar um certo número de indústrias que não existem em Portugal, mas, por outro lado, é necessário atender a que algumas indústrias já existem, em Portugal, que podem ser prejudicadas pela introdução de iguais indústrias.
O problema é, pois, muito complicado e difícil de resolver, sendo necessário examiná-lo com o maior cuidado.
Pensando-se um bocadinho, ver-se há que, do estabelecimento do pôrto franco, em Lisboa, pode resultar um desequilíbrio de ordem económica.
Mas a estabelecer-se êle, o qual será o papel a desempenhar pelo Estado ?
Será o de facilitar a exportação para os portos da América do Sul e do Norte, tendo sempre era atenção a grande concorrência que farão aos produtos portugueses, os similares doutros países, os quais, em virtude dos seus fretes, custarem a terça parte do que custam os de Portugal, hão-de necessáriamente bater os nacionais.
O Govêrno deseja, por conseguinte, o estabelecimento do pôrto franco em Lis-
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boa, por o considerar como experiência, mas transige, nessa experiência, para estabelecer uma carreira de vapores nacionais para os portos americanos,
Se se resolver êste problema, poderá conseguir-se que o pôrto de Lisboa deixe de ser um pôrto de escala para ser um pôrto terminus.
O orador mostra em seguida como os fretes portugueses são excessivamente mais caros do que os dos portos de Hamburgo, Antuérpia e Havre. A água mineral nacional custa 33 por cento mais cara, no frete, do que expedida de Hamburgo para a América do Sul.
Os fretes dos vinhos finos, cognaes, licores, expedidos para Manaus, são 8,6 por cento mais caros do que nos portos citados; os dos tejolos 45 por cento mais caros; os do sabão 121,0 por cento, etc.
Êle, orador, entende, pelo que acaba de dizer, que o problema não pode ser estudado superficialmente; tem que haver um grande cuidado na regulamentação dessa lei, e foi por isso que o seu antecessor na pasta do Fomento resolveu que fôsse nomeada uma comissão para estudar o assunto.
Concluindo, deve declarar, em nome do Govêrno, que vai mandar para a mesa um novo artigo que deve ser metido depois do artigo 4.°
Deve tambêm dizer, em nome do Govêrno, que êste entende que o projecto deve ser aprovado tal como se encontra.
No entanto, o Govêrno está disposto a colaborar, com o máximo interesse, com os Deputados pela Madeira, a fim de ser apresentado um projecto de lei, em que se defendam os interesses daquela ilha, facilitando a saída dali de todos os produtos que se possam colher no seu solo, permitindo-lhe as vantagens da zona franca. Neste momento, porem, o Govêrno não pode aceitar as emendas apresentadas, ontem, pelo Sr. Ribeira Brava.
Proposta
Proponho a adição do seguinte artigo: 4.°-bis. O disposto nos artigos anteriores não obstará ao estabelecimento de qualquer entreposto ou zona franca comercial que porventura possa estabelecer-se dentro do pôrto de Lisboa, por efeito de ulterior convenção ou tratado internacional. = O Ministro do Fomento, António Maria da Silva.
Lida na mesa, foi admitida.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Correia Herédia: - Teve o desgosto de ouvir ao Sr. Ministro do Fomento que o Govêrno tira tudo aos Deputados pela Madeira e nada lhes dá.
A questão dos portos francos e zonas francas não lhe parece tam complicada como se afigura a S. Exa.
Folgará muito que o Govêrno adopte para a Madeira medidas que, embora, no nome, não tragam a zona franca, sejam, contudo, medidas indispensáveis para que aquela ilha possa prosperar e o seu comércio se engrandeça.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. José Barbosa: - Sr. Presidente: vou mandar para a mesa uma proposta e uns artigos aditivos.
São os seguintes:
A Câmara, considerando que o regime do pôrto franco para a Ilha da Madeira não está suficientemente estudado, resolve separar do projecto n.° 198 a emenda referente a êsse regime. = José Barbosa.
Foi retirada.
Artigo 4.° O regime fiscal dos armazéns gerais francos, estabelecido pelo decreto de 27 de Maio de 1912, não fica de modo algum alterado pelas disposições desta lei e poderá a todo o tempo ser pôsto em execução nos termos dos artigos 353.° a 357.° do referido decreto. = José Barbosa.
Artigo 4.°-B. É igualmente autorizado o Govêrno a adjudicar, por concurso, precedendo anúncios de cento e oitenta dias, a construção e exploração duma zona franca na Ilha da Madeira, nos termos das bases do artigo 3.° desta lei, devendo, porêm, o depósito prévio para o concurso ser de 10.000 escudos e não 50.000, como preceitua a base 5.ª = José Barbosa.
Artigo 4.°-C. A zona franca da Ilha da Madeira será no local julgado mais conve-
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niente por uma comissão técnica nomeada pelo Govêrno, para apreciar as propostas e aprovar os respectivos planos de obras, e a sua exploração não poderá ser concedida por mais de sessenta anos. = José Barbosa.
Artigo 4.°-D. Na zona franca da Ilha da Madeira são permitidas todas as operações de beneficiação, empacotamento e transformação dos géneros do arquipélago da Madeira, excepto o vinho ou outros produtos comerciais. = José Barbosa.
Artigo 4.°-E. Na zona franca da Ilha da Madeira haverá isenção de direitos para embarcar, desembarcar ou conservar depositados, por prazo nunca excedente a dois anos, quaisquer géneros que se destinem à beneficiação, ao empacotamento ou à transformação dos géneros produzidos no arquipélago da Madeira ou outros produtos comerciais.
§ único. Exceptuam se da isenção de direitos, estabelecida neste artigo, o cacau e o azeite não destinado a conservas. = José Barbosa.
Sr. Presidente: deploro que o Sr. Correia Herédia tenha ensarilhado armas e que tenha retirado desta luta, que podia trazer alguns resultados à Madeira.
Eu, como não sigo o processo de teimar numa palavra, tinha pensado em se obter uma fórmula intermediária, na qual o regime de armazéns gerais francos fôsse alargado para a Madeira.
Não querendo ensarilhar armas, já que fui levado a preparar uma solução aceitável para êste caso, eu envio para a mesa, como artigos aditivos, as disposições que exprimem o regime que defendo para a Madeira.
Agora tambêm posso dizer que a matéria já foi largamente debatida e estudada. Mando êstes artigos aditivos e sujeito-me, naturalmente, a sua rejeição, se, porventura, a Câmara entender que nem sequer êsses favores devem ser feitos à Madeira.
Bem fazia eu em pedir aos ilustres Deputados pela Madeira que não quisessem dar á zona franca da Madeira mais do que se concedia ao pôrto franco de Lisboa. É bom não querer de mais para se poder obter cousa alguma. Afinal de contas a Madeira, de que fui acoimado de inimigo, tem agora em mim um defensor, o único, porque os mais ensarilharam armas.
Mando para a mesa as minhas propostas. Nelas não dou o regime de pôrto franco, dou o dos armazéns gerais francos, e ponho um artigo final que nos garante contra os receios de possíveis prejuízos de carácter fiscal.
Leu.
O Sr. Correia Herédia (Ribeira Brava): - Declara que concorda com as propostas apresentadas pelo Sr. José Barbosa, por isso que, se não realizam o desejo dos Deputados, representantes da Madeira, procuram de certo modo atender as justas reclamações dos madeirenses.
Um dos assuntos para que mais especialmente chama a atenção da Câmara é para as dificuldades que assoberbam a navegação que tocar na Madeira, vinda do Pacífico, pelo canal do Panamá, e que na ilha se pode fornecer de refrescos. É preciso que essas dificuldades desapareçam, colocando-se a Madeira em igualdade de condições às do arquipélago das Canárias.
A Madeira tem de transformar a sua monocultura em outras culturas, e para isso precisa duma zona franca, onde se tratem as suas frutas, transformando-as em conservas e outros produtos.
Com as propostas do Sr. José Barbosa é possível conseguir-se a transformação da economia da Madeira, e, portanto, espera que se não levantem dificuldades, tanto mais que essas propostas não trazem encargos para as finanças do país.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Presidente: - Vão ser lidas as propostas que o Sr. José Barbosa apresentou.
Foram lidas e admitidas.
O Sr. Correia Herédia: - Sr. Presidente: requeiro que as propostas do Sr. José Barbosa, relativas á Madeira, sejam mandadas à comissão de finanças para dar o seu parecer com a possível urgência.
Foi aprovado.
O Sr. Correia Herédia: - Requeiro tambêm que seja interrompida a discussão do
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projecto de lei n.° 198 até que a comissão apresente o seu parecer sôbre as propostas do Sr. José Barbosa.
O Sr. Brito Camacho: - Devo observar que isso é uma proposta.
O Sr. Álvaro Poppe: - Sr. Presidente: não há dúvida nenhuma que as proposta do Sr. José Barbosa são umas propostas de aditamento, e por consequência estão incluídas na doutrina do artigo 107.° do Regimento que diz o seguinte:
Leu.
Portanto entendo que se deve continuar na discussão do projecto n.° 198, porque os aditamentos só podem ser votados depois de aprovada ou rejeitada a matéria sôbre que foram apresentados quando não ficaram prejudicados por essa votação.
O Sr. Presidente: - Vai votar-se, em primeiro lugar, uma moção do Sr. José Barbosa.
O Sr. Carlos Olavo: - S. Exa. retirou essa moção.
O Sr. Presidente: - S. Exa. ainda não a retirou.
O Sr. José Barbosa: - Requeiro que se consulte a Câmara sôbre se permite que eu retire a minha moção.
É aprovado.
São aprovadas as propostas do Sr. José Barbosa, aprovando-se em seguida os artigos 5.° e 6.°, sem discussão.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para entrar em discussão, o
Projecto de lei n.° 32
Artigo 1.° Fica suprimido o § único do artigo 42.° do decreto de 26 de Maio de 1911.
Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário. = José Vale de Matos Cid.
Lê-se na mesa e entra em discussão o artigo 1.º
O Sr. Baltasar Teixeira: - Não concordo com cate projecto de lei, nem com o parecer da comissão.
Parece-me que se deve manter, por útil e necessário, o que está estabelecido no § único do artigo 42.°, do decreto com fôrça de lei de 26 de Maio de 1911, isto é, que os secretários de finanças não possam exercer funções no mesmo concelho ou bairro por mais de seis anos.
Porque se os há, absolutamente honestos e êsses felizmente constituem a maioria, outros há que o não são.
E todos nós sabemos muito bem, Sr. Presidente, que a amovibilidade é um dos meios de fiscalização de que usam os Estados para com os funcionários a quem incumbe a missão mais delicada e de maior responsabilidade.
É geralmente aplicada aos juizes; tem-no sido ainda aos secretários de finanças, que por vezes exercem tambêm funções de juizes. E as outras funções que exercem, são de tal importância e responsabilidade que justificam a disposição do § único do artigo 42.° do decreto de 26 de Maio de 1911, que o projecto de lei em discussão pretende revogar.
A certeza de que o exercício de funções num concelho é temporário e que, decorrido um lapso de tempo, terá de abandonar a repartição a um outro que deve conhecer dos actos praticados pelo seu antecessor, será incontestavelmente, Sr. Presidente, um incentivo para o de intenções menos nobres proceder com correcção.
A inamovilidade dos secretários de finanças, de funções multíplices e delicadíssimas, roubaria ao Estado um dos meios mais eficazes e ao mesmo tempo baratos e menos vexatórios, para conhecer da honestidade e proficiência dessa importante classe de funcionários.
Longe de desejar a derrogação de tam salutar princípio, antes queria, Sr. Presidente, que de se tornasse extensivo a outros funcionários, sem esquecer os inspectores de finanças.
Eis porque entendo que o § único do artigo 42.°, deve ser conservado.
Tenho dito.
O Sr. Joaquim de Oliveira: -Dou o meu voto ao projecto e, a meu ver, com toda a razão.
Não é necessário o § único do artigo 42.° do decreto de 26 de Maio de 1911, visto que os regulamentos disciplinares impedem que os funcionários de finanças cometam irregularidades.
Por isso a comissão de finanças enten-
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deu que devia dar parecer favorável ao projecto de lei n.° 32.
Por tudo isto, a comissão de finanças entende que êste projecto merece ser aprovado.
O orador não reviu.
O Sr. Matos Cid: - Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar que apresentei o projecto em discussão, porque o § único do artigo 42.° do decreto de 26 de Maio de 1911 é prejudicial aos interesses do Estado.
O orador não reviu.
O Sr. Jorge Nunes: - Não tencionava discutir o projecto de lei; mas se a princípio, sabendo que se tratava de secretários de finanças, eu concordava com S. Exa. agora discordo.
De facto há um perigo na muita permanência, pelo conluio que se pode fazer entre os exactores de fazenda e o contribuinte, mas se essa permanência pode dar lugar a fraudes, o facto é que tambêm os serviços públicos podem ser bem melhor administrados depois dos seis anos, e vou dizer a razão porquê.
O artigo do projecto não se refere apenas a secretários de finanças, mas a todos os funcionários do Ministério das Finanças.
V. Exa. sabe que a cobrança do real de agua se faz por média ou por avença, e pregunto eu: desde que não tenham uma larga permanência no concelho os fiscais de impostos, como é que êsses homens podem conhecer o movimento da indústria, do comércio, para depois não serem enganados constantemente quando fizerem as avenças?
Esta razão parece-me de peso, porque assim os fiscais dos impostos chegados a um concelho, desconhecendo em absoluto o movimento de cada um dos contribuintes, muito naturalmente depois, na medida da sua esfera de acção, concorrem para que aqueles possam alcançar uma avença favorável.
Nestas condições, êstes fiscais, depois duma larga permanência junto dêsses homens, mais facilmente conhecem o seu movimento comercial e podem defender melhor os interesses do Estado.
Mas dizem-me que o projecto nada tem que ver com êsses funcionários, mas como êle necessáriamente tem de ser regulamentado e como eu tenho ouvido dizer que é necessário tambêm que se obriguem depois dum determinado prazo a transferir dum para outro concelho êsses empregados de finanças, eu estou a ver que na regulamentação dêste projecto incluem-se tambêm êsses funcionários.
Mas se esta razão era de peso, quanto aos fiscais de impostos, parece-me que tambêm milita a favor dos secretários de finanças, pois se é certo que quem fiscaliza directamente não é o secretário de finanças, mas o fiscal dos impostos, o que é facto é que a principal figura, o funcionário que resolve essa questão, não é o fiscal dos impostos, mas o secretário de finanças, e desde que caia num concelho ás escuras, sem conhecer nada do que se passa no f meio, ao fim de seis anos, quando pode já S conhecer alguma cousa, é que o Estado lhe diz: você tem de abandonar esta repartição que conhece, para ir lançar-se noutra que para si pode ser um caos.
E, assim, se nós por um lado podemos ver que há apenas o propósito na aplicação de tal parágrafo, do decreto de 26 de Maio, de defender os interesses do Estado, evitando conluios ou negligências da parte do funcionário, e para êsses lá estão as penas disciplinares; se nós não tornarmos obrigatória a sua transferência, podemos aproveitar os serviços dos funcionários que, com longa permanência no concelho, poderão conhecer melhor das suas necessidades.
O orador não reviu.
O Sr. Barros Queiroz: - A reforma dos serviços externos do Ministério da Fazenda de 26 de Maio de 1911 determina no seu artigo 42.° o seguinte:
Leu.
Neste artigo 42.° o Govêrno Provisório teve o intuito de evitar que os secretários de finanças fossem perseguidos pelos caciques das localidades, não podendo ser transferidos por simples pedidos ou influências locais, mas apenas por processo disciplinar ou depois de decorridos seis anos.
Mas como esta inamovibilidade de secretários de finanças poderia, por seu turno, tornar êstes em caciques das localidades, fez-se, em contra partida, a obrigação de no fim de seis anos serem transferidos para outro concelho.
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É um princípio de moralidade. Todos nós sabemos que no tempo da monarquia o escrivão de fazenda era a vítima ou o agente do cacique local. Ou cedia ou era transferido imediatamente.
Êste artigo, portanto, vem pô-los ao abrigo de toda e qualquer influência dêsses caciques.
O que se pretendeu tambêm evitar, repito, foi que a sua longa permanência os tornasse caciques, visto que criando família e interesses no concelho, poderia prejudicar o Estado pelas suas relações com os contribuintes.
Portanto acho moralizador o § único do artigo 42.° do decreto de 26 de Maio de 1911, sendo êste o motivo porque não assinei o parecer da comissão de finanças que deu opinião favorável ao projecto do Sr. Matos Cid.
Entendo que a Câmara pratica um mau acto, e prejudicial para a administração pública, se votar o projecto do Sr. Matos Cid.
Tenho dito.
O Sr. Pires de Campos: - Não ouvi as considerações feitas pelo Sr. Baltasar Teixeira, que foi o primeiro orador que falou neste assunto; informado, porem, do que S. Exa. disse, devo declarar que concordo absolutamente com o seu modo de pensar, visto que o princípio estabelecido na lei é dos mais importantes.
Toda a gente sabe que êsse princípio está há muito tempo estabelecido no Poder Judicial.
É um princípio moralizador, visto que êsses empregados de finanças, criando família, clientela, etc., passam a ser os régulos das terras onde vivem.
Posso afirmar a V. Exa. que duma terra sei eu em que um secretário de finanças, sendo-lhe pedida a anulação de três meses de contribuição, porque se tratava dum amigalhaço, concedeu-lha seis meses.
Termino declarando que rejeito o projecto em discussão.
O orador não reviu.
O Sr. Jorge Nunes: - Não me convenceram as razoes aduzidas pelo Sr. Barros Queiroz e por uma razão muito simples, porque não é por estar apenas seis anos num concelho que um funcionário de finanças pode ser correcto no desempenho das suas funções.
Por êsses funcionários não serem correctos no antigo regime, não se segue que tambêm na República continuem a proceder da mesma forma.
Portanto não se deve invocar êsse argumento.
Repito que a pouca permanência dos funcionários de finanças nos seus lugares pode fazer com que êles, desconhecendo os contribuintes, o que êles possuem, e o seu respectivo movimento, não possam evitar que o Estado fique prejudicado pelos contribuintes.
Um outro argumento de peso que aqui ouvi foi estabelecer-se o paralelo entre juizes e secretários de finanças, como se estas duas funções não fossem diametralmente opostas.
Assim, o secretário de finanças, se é certo que tem de se limitar ás disposições da lei para as fazer cumprir e executar, tem a maior parte das vezes de conhecer os contribuintes, ao passo que os juizes tem de conhecer apenas o meio do tribunal e para saber se o réu cometeu ou não o crime de que e acusado não vem fora do tribunal averiguar cousa alguma para fazer juízo da questão.
Assim, Sr. Presidente, cada um fica com. as suas opiniões.
Não tencionava de forma alguma referir-me a êste projecto e muito menos discuti-lo, porem, não quis que se dissesse que êle tinha sido votado, aceitando toda a Câmara a sua doutrina como boa.
Tendo dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: - Como não está mais nenhum Sr. Deputado inscrito vou pôr o projecto à votação na generalidade
É rejeitado.
O Sr. Joaquim José de Oliveira: - Requeiro a contraprova.
Procedendo-se à contraprova, deu o mesmo resultado.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para entrar em discussão, o projecto de lei n.° 45. É o seguinte:
Artigo 1.° Os sargentos ajudantes e primeiros sargentos da guarda fiscal, tendo
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bom comportamento, provada aptidão, menos de quarenta e cinco anos de idade e nove ou mais anos de serviço efectivo na mesma guarda, dos quais três pelo menos a partir da promoção a primeiros sargentos, tem direito ao ingresso em segundos aspirantes no quadro do pessoal aduaneiro a que se refere o decreto de 27 de Maio de 1911 que reorganizou as alfândegas.
§ único. Para os efeitos dêste artigo, os sargentos que desejem ter ingresso naquele quadro declara Io hão por escrito, todos os anos até l de Dezembro inclusive, organizando-se em face destas declarações uma lista por ordem de antiguidades que será publicada no dia 31 do mesmo mês.
Art. 2.° Por cada três vagas que de futuro se dêem no quadro dos segundos aspirantes das alfândegas, as primeira e terceira serão respectivamente providas em conformidade com o disposto nos artigos 108.° e 111.° (transitório) do decreto de 27 de Maio de 1911, e a segunda por um sargento da guarda fiscal, quando reúna as condições exaradas no artigo 1.°
§ 1.° Sempre, porêm, que não haja indivíduos que possam ser providos nos lugares de segundos aspirantes nos termos dos citados artigos 108.° ou 111.° (transitório), as vagas que por êles deviam ser preenchidas, sê-lo hão umas e outras pelos sargentos da guarda fiscal.
§ 2.° O ingresso dos sargentos da guarda fiscal no quadro dos segundos aspirantes das alfândegas será regulado pela maior antiguidade dos oferecidos, em face da lista a que se refere o § único do artigo 1.°
Art. 3.° Os sargentos da guarda fiscal que forem providos nos lugares de segundos aspirantes das alfândegas teia os mesmos vencimentos e encargos, e gozam as mesmas vantagens que os aspirantes de igual categoria providos por concurso, seguindo no quadro aduaneiro a sua promoção em harmonia com a legislação vigente.
Art. 4.° Aos sargentos da guarda fiscal que transitarem para o quadro aduaneiro, nos termos dêste decreto, ser-lhes há contado, para efeitos de aposentação, todo o tempo de serviço prestado na referida guarda e no exército.
Art. 5.° Os sargentos da guarda fiscal, providos nos lugares de segundos aspirantes das alfândegas, serão para todos os efeitos considerados alferes milicianos.
Art. 6.° Fica revogada a legislação em contrário.
É pôsto em discussão na generalidade.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Sr. Presidente: o projecto que V. Exa. acaba de pôr em discussão tem parecer favorável da comissão de finanças, assim como tem parecer favorável da comissão de guerra. Não se diz, porêm, nem no relatório que precede o projecto nem em nenhum dêstes pareceres, que está nomeada uma comissão, encarregada de fazer a remodelação, dos serviços alfandegários.
O assunto, como a Câmara compreende, é da maior gravidade. É preciso que o pessoal que faz serviço na alfândega possua as condições técnicas necessárias para bem saber desempenhar o seu lugar. E ainda que possa merecer e deva merecer o voto da Câmara uma idea como esta ou outra análoga, visto que já houve uma experiência que não se sabe bem o resultado que teria dado, embora o relatório faça as melhores referências aos sargentos da guarda fiscal que, segundo afirmam os autores dêste projecto, fizeram excelente serviço como funcionários alfandegários, todavia o Govêrno entende que um assunto dêstes não pode resolver-se sem que a comissão encarregada de fazer a remodelação dos serviços alfandegários dê um parecer decisivo sôbre o assunto, a fim de que o Ministro possa bem aquilatar uma medida desta ordem que respeita a um serviço tam importante que está a seu cargo.
Com a minha indicação de não se discutir já êste projecto, eu não tenho o propósito de dizer que as comissões que deram o seu parecer sôbre êle não tenham uma idea precisa e assente sôbre esta matéria.
Dir-se há até que eu, como Deputado, devia ter já colhido os elementos indispensáveis para orientar o meu voto, mas V. Exa. e a Câmara compreendem que a minha situação de Deputado é muito diferente da situação que desempenho como Ministro e como tal ainda não tive tempo de estudar o assunto.
Ora a comissão que foi encarregada de estudar os diversos assuntos alfandegários está estudando êste de que se trata, e espero dentro em breve trazer à Câ-
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mara o resultado dos seus trabalhos. É, porem, preciso que ninguêm tenha a idea de que eu quero entravar êste projecto. Não. Se eu me convencer que os seus ilustres proponentes tem razão, será com muito prazer e gostosamente que me associarei à sua idea; e se há razão com a qual concordo absolutamente é a de que os sargentos da guarda-fiscal devem merecer a simpatia como funcionários íntegros do Estado.
Eu não posso, pois, ter o propósito de enterrar o projecto ou fazer desaparecer o bocadinho de probabilidade que êle tem de ser considerado viável. O que eu quero acentuar é que, como Ministro, ainda não me sobrou tempo para examinar êste assunto sob o ponto de vista da reorganização dêstes serviços, mas apenas eu tenha uma opinião fundamentada sôbre os serviços alfandegários, tomo o compromisso de trazer à Câmara ou de apresentar à Comissão de Guerra...
O Sr. Balduíno Seabra: - Eu tenho a observar a S. Exa. que a comissão de guerra não pode pronunciar-se sôbre êsse assunto, visto que os sargentos da guarda fiscal iam prestar serviços num Ministério estranho ao da Guerra.
O Orador: - Entretanto, ou essa idea é boa, e nós só temos vantagem em aceita Ia, ou ela é má, e por isso bastante razão tenho eu para que o Parlamento se habilite a pronunciar se.
O que eu proponho - e suponho que há-de ter a votação de toda a Câmara - é que o projecto baixe à comissão de finanças, em especial, para que o Parlamento se pronuncie depois sôbre as bases e elementos de estudo que o Govêrno apresentará.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Fernando de Macedo: - Sr. Presidente: é sabido que contra a classe dos sargentos da guarda fiscal, aos quais diz respeito o projecto de lei em discussão, por mim apresentado nesta Câmara e assinado por outros ilustres colegas, se move uma guerra atroz, no sentido de obstar â sua entrada no quadro do pessoal interno das alfândegas.
Não é questão de hoje: é questão antiga, e eu tenho a certeza de que se a comissão encarregada da reforma dos serviços alfandegários, a que o Sr. Ministro das Finanças se referiu, for organizada com pessoal do quadro aduaneiro, o seu parecer nunca poderá ser favorável à entrada dos sargentos nesse quadro, não obstante o Sr. Ministro das Finanças dizer que a comissão está encarregada de estudar e remodelar os serviços a fim de todos se dotarem com pessoal habilitado e competente.
Sr. Presidente: o decreto de 27 de Maio de 1911, ao fixar as condições de admissão ao concurso para segundos aspirantes, diz no seu artigo 108.°:
"Artigo 108.° Os lugares de segundos aspirantes serão providos por concursos de provas públicas, salvo o disposto no artigo 111.° (transitório)".
Mas o que nos diz o artigo 111.° (transitório ? Vejamos:
"Artigo 111 ° (transitório). Por cada três vagas que se derem na classe dos segundos aspirantes, a terceira será preenchida pelo escriturário das alfândegas do quadro especial transitório a que se refere a secção viu, que satisfaça ás condições preceituadas no artigo 207.° e que há mais tempo se encontre prestando serviço privativo do quadro interno aduaneiro".
Passemos a examinar o artigo 207.° para se avaliar das condições a que devem satisfazer os tais escriturários do quadro especial transitório:
"Artigo 207.° Os empregados a que se refere o artigo 203.° que contarem à data dêste decreto, ou vierem ulteriormente a completar, quinze anos de serviço privativo do quadro interno das alfândegas, com zelo, provada aptidão, e não tenham sofrido pena disciplinar superior a advertência, poderão ser nomeados segundos aspirantes do quadro aduaneiro, se assim o requererem e depois de aprovados em exame especial para tal fim prestado e perante o júri dos concursos".
Mais nos diz ainda o artigo 203.°:
"Artigo 203.° Os empregados do tráfego e adventícios que à data dêste decreto es-
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tiverem prestando, há mais dum ano, serviço próprio do quadro interno, e que assim o requeiram no prazo de sessenta dias, constituirão um quadro especial de escriturários das alfândegas, etc.".
Conjugando agora êstes três artigos e fazendo dêles a sua análise, chegamos à conclusão de que no quadro dos segundos aspirantes dão ingresso escriturários do quadro especial transitório, que por seu turno são recrutados de entre os empregados do tráfego e adventícios - depois de aprovados em exame especial.
Mas que exame é êste? É pregunta que fica sem resposta, sendo eu levado a crer que apenas se lhes exigirá leitura corrente, escrita e qualquer operação elementar.
E sabe a Câmara por quem é constituído êste pessoal do tráfego? Di-lo o artigo 360.° e sua tabela viu, pela seguinte ordem hierárquica:
Chefes, ajudantes, escriturários, fiéis de armazém, condutores de máquinas, fogueiros, fiéis de balança e auxiliares.
São êstes os funcionários que constituem o pessoal do tráfego e que tem entrada no quadro dos segundos aspirantes.
Mas vejamos ainda quem são os adventícios; diz assim o artigo 368.°:
"Artigo 368.° A nomeação de auxiliar não poderá recair em indivíduo estranho, emquanto houver adventícios com bom comportamento e que estejam nas condições de exercer as funções daquele cargo, preferindo se o mais antigo, podendo tambêm recair as nomeações em praças da guarda fiscal que actualmente prestam serviços especiais nas redes das alfândegas".
Da doutrina dêste artigo se infere que os adventícios é a camada imediatamente inferior aos auxiliares, com habilitações ignoradas e onde se vão recrutar aqueles.
Que habilitações - responda-me agora a Câmara - poderá ter um fogueiro ou um fiel de armazém para ingressar no quadro dos segundos aspirantes?
Mas há mais, Sr. Presidente.
O decreto de 27 de Maio de 1911 elevou até os vencimentos ao pessoal interno, dizendo-se, no relatório que antecede o citado decreto, que eram exiguamente estipendiados. Não há dúvida que os vencimentos são exíguos; mas os vencimentos de categoria.
Mas sabe a Câmara quanto é que no ano passado se distribuiu de emolumentos pelo pessoal interno? 300 por cento sôbre os vencimentos! É com o aumento progressivamente crescente dos rendimentos alfandegários, daqui a 10 anos quanto se virá a distribuir?! E que participação tem o pessoal da guarda fiscal nos emolumentos ? Absolutamente nada!
É lamentavelmente estranho, que o pessoal da guarda fiscal amasse com o seu suor e muitas vezes com o seu sangue o bolo enorme que o pessoal interno das alfândegas come, sem que a mais insignificante parcela desta verba colossal vá aliviar os encargos daquela prestimosa classe, as genuínas abelhas obreiras, cujos sacrifícios são pagos com a mais negra das ingratidões.
E sabem V. Exas. porque é que o pessoal interno se opõe ou procura opôr-se à concessão do benefício a que êste projecto de lei diz respeito?
É preciso que se diga tudo, custe o que custar e a quem custar: É porque os sargentos da guarda fiscal, que antigamente ingressavam como terceiros aspirantes no quadro das alfândegas, categoria que foi extinta pela última reforma, iam em companhia daquela cópia de conhecimentos, daquela honestidade e daqueles hábitos de rígida disciplina, que só ela por si tem dado nome à corporação.
É porque, devido a essa disciplina, e demais qualidades, alguns funcionários das alfândegas não se atreviam a praticar certas traficâncias ao lado dos seus colegas oriundos da guarda fiscal. Daqui, a guerra atroz a que me tenho referido e que ninguêm ignora.
Sr. Presidente: tendo cortado a sequência das minhas considerações relativas ás condições de admissão no quadro dos segundos aspirantes, não posso deixar de esclarecer a Câmara acêrca das habilitações exigidas ás praças de pré da guarda fiscal para ascender ao pôsto imediato, a fim de que V. Exa. a8 possam fazer um juízo seguro da justiça que êste projecto de lei encerra.
O Regulamento para o provimento dos postos vagos, desde segundo cabo até sargento ajudante da guarda fiscal, inserto na Ordem do Exército n.° 17 (1.ª série) de
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12 de Novembro de 1909, diz no seu artigo 29.°:
Art. 29.° Para a prova escrita dos primeiros cabos e para os exames dos segundos e primeiros sargentos, será, para cada posto, formulado pulo respectivo júri um ponto único sôbre cada uma das matérias abaixo designadas, o qual deve compreender:
Para primeiros cabos:
1.° Aritemetica a).
2.° Serviço fiscal b).
a) ...
b) Obrigações de soldado e primeiro cabo nas diversas situações em que podem achar-se consignadas no a Manual para o serviço das praças de pré" e nos "Boletins da guarda fiscal ou da Administração Geral das Alfândegas", de preferências as relativas ao serviço desempenhado na respectiva circunscrição.
Para segundos sargentos:
1.° Aritmética a).
2.° Escrituração b).
3.° Serviço militar c).
4.° Serviço fiscal d).
a) ...
b) ...
c) ...
d) Obrigações inerentes aos comandantes de pôsto nos diversos ramos de serviço fiscal consignadas no "Manual para o serviço das praças de pré" e nos "Boletins da guarda fiscal ou da Administração Geral das Alfândegas".
Para primeiros sargentos:
O ponto para primeiros sargentos compreenderá as matérias citadas para o pôsto de segundo sargento, incluindo na alínea a) regra de companhia e juros simples, e na alínea d) obrigações tambêm inerentes aos comandantes das secções.
§ 1.° O ponto para primeiros cabos constará de quatro presuntas, sendo duas sôbre aritmética e as outras duas sôbre serviço fiscal.
§ 2.° O ponto para segundos e primeiros sargentos constará de dez preguntas, sendo cinco em serviço fiscal e uma em cada um dos outros serviços.
§ 3.° O ponto para segundos e primeiros sargentos, e especialmente para êstes, deverá conter nas preguntas sôbre serviço fiscal, pelo menos, duas sôbre exemplos de serviço de contencioso, na parte respeitante a apreensões, instrução de processos, julgamento, recursos, arrematação de mercadorias apreendidas e distribuição do seu produto e das muitas.
Daqui já a Câmara vê que o primeiro cabo já possui conhecimentos sôbre serviço aduaneiro, e que ao primeiro sargento se lhe exigem todos os necessários para instruir até seu final julgamento, e com contestação, qualquer processo por contrabando, descaminha de direitos ou transgressão dos regulamentos fiscais, o que nem todos os funcionários do interno saberão fazer.
Vejamos agora as matérias contidas só no "Manual para o serviço das praças de pré", aprovado por decreto de 23 de Agosto de 1888, na parte respeitante ao serviço fiscal e aduaneiro:
"Atribuições e deveres gerais dos comandantes dos postos fiscais e dos cabos e soldados - Serviço nos postos fiscais da raia - Serviço nos postos fiscais do litoral - Serviço aduaneiro nos postos fincais da raia habilitados a despacho - Serviço aduaneiro nos postos de registo da raia - Serviço nos postos fiscais destinados à cobrança do imposto de pescado - Serviço nas linhas de circunvalação - Serviço nos caminhos de ferro - Naufrágios - Arrojos e objectos achados no fundo do mar - Serviço nos portos, rios, enseadas e ancoradouros-• Serviço nos rios confinantes-Circulação de mercadorias nacionais ou nacionalizadas- Buscas, varejos e apreensões - Distribuição das multas e produto das tomadias".
A tudo isto seguem-se aqui no Manual duas compactas páginas, onde se encontram relacionados os modelos de autos, participações, requisições, passes, bilhetes de despacho, etc., que seria fastidioso ler, e que constituem a grande sciência à qual só são acessíveis os funcionários do interno.
Estas são as matérias consignadas no Manual. O que será agora a legislação contida nos o Boletins da Guarda Fiscal" ou da "Administração Geral das Alfândegas"? A Câmara poderá avaliar.
São verdadeiro os tratados que os concorrentes necessitam condensar no cérebro, pois que o § 2.° do artigo 32.° do regula-
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mento já citado diz que o presidente do júri não consentirá que os candidatos recorram a livros, cadernos ou quaisquer outros pontos que lhes sirvam de auxiliares, ao passo que o decreto de 27 de Maio de 1911, ao referir-se à forma como deve ser regulada a prestação das provas para o concurso dos segundos aspirantes, esta foi no seu artigo 135.° que o júri providenciará para que, em lugar apropriado na sala, esteja a legislação que possa ser precisa para consulta dos candidatos.
Reparem V. Exas. nesta diferença de tratamento, e na enorme e desmedida vantagem concedida a êstes privilegiados funcionários.
Atendam ainda a que os sargentos da guarda fiscal acumulam todo o serviço do contencioso com o comando dos seus postos, e às vezes até de secções, cujo comando pertence em regra a oficiais, e digam-me se não foram tratados com desumanidade pelo Govêrno Provisório.
Mas isto ainda não é tudo.
Se passarmos em revista o relatório que precede o decreto de 27 de Maio, vamos encontrar períodos verdadeiramente curiosos, que são uma contradição absoluta do texto da lei.
Assim, diz-se:
"Passam as alfândegas a ter uma organização que somente com pessoal válido, competente e de atribuições definidas pode dar resultados verdadeiramente profícuos".
Mas o pessoal do tráfego e adventícios podem ascender ao aspirantado sem exigências de validez e apenas com um exame especial que ninguêm sabe o que seja!
Onde só encontram fixadas condições de idade e habilitações?
"E por esta forma se chegou â situação actual de se encontrarem prestando as funções que são próprias do quadro interno antigos empregados fiscais das câmaras municipais, empregados da fiscalização marítima, pessoal da guarda fiscal, dos impostos, da antiga fiscalização dos tabacos, das antigas companhias braçais das alfândegas de Lisboa e Pôrto, do tráfego e adventício ou assalariado; no quadro do tráfego, em substituição de empregados com atribuições próprias das suas categorias, indivíduos estranhos sem competência legal para as exercerem".
Condena-se portanto no relatório a miscelânia de funcionários de diversas proveniências, constata-se que no quadro do tráfego existem indivíduos estranhos sem competência legal, mas permite-se que êste mesmo pessoal incompetente possa ascender ao aspirantado.
"Com o ingresso, no quadro interno, de parte dêstes indivíduos que transitoriamente ficam constituindo um quadro especial de escriturários das alfândegas, satisfaz-se tambêm uma justa e antiga pretensão que êles tinham".
Mas não será imensamente mais justa a pretensão dos engeitados sargentos da guarda fiscal?
Ou a pretensão daqueles senhores foi atendida por imposição dos mesmos, segundo consta?
"Entendeu-se, e com isto se deferiu as pretensões do pessoal, que se deviam fundir aquelas três categorias em duas únicas;- eram as três categorias de aspirantes - uma pouco numerosa, que serviria para curta aprendizagem nas cousas aduaneiras; - esta é a dos segundos aspirantes - e a outra..."
Cá temos outra vez mais as pretensões do pessoal, dando-nos e impressão de que se fez aquilo que êle quis que se fizesse.
Por êste período do relatório se vê que o quadro dos segundos aspirantes é pouco numeroso e serve para uma curta aprendizagem nas cousas aduaneiras.
Porque se não aproveitaram então os sargentos da guarda fiscal, que passam 18 e mais anos na aprendizagem das cousas aduaneiras, podendo portanto ingressar no quadro dos segundos aspirantes com todos os conhecimentos necessários ao cabal desempenho dos seus deveres profissionais?
Bemaventurados os fiéis de armazéns e adventícias que com uma curta aprendizagem em segundos aspirantes ficam doutores em contencioso!!
"Sem esquecer que os diversos cargos devem ser preenchidos por pessoal de inteira competência, e que a forma mais democrática de a afirmar ainda consiste na prestação de provas orais e públicas em um concurso a todos aberto, em determi-
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nadas condições, não pode, contudo esquecer tambêm que não seria de inteira justiça, no momento actual, subordinar todas as promoções à exigência do concurso; e, transigindo nesta parte com o que se considera direitos adquiridos, a todas as categorias se permitiu acesso, mais ou menos restrito, por meio de antiguidade".
Eu peço agora toda a atenção da Câmara para a doutrina expressa no artigo 126.° do decreto de 27 de Maio, que diz:
"Artigo 126.° Nos concursos para aspirantes haverá uma só prova por escrito, sôbre dois pontos, um teórico outro prático, tirados à sorte".
Vejam V. Exas. em que consiste a, forma unais democrática a que alude o relatório que antecede o citado decreto e as inconveniência que presidiu à sua elaboração!!
Mas ainda nesta última parte do relatório se diz que se "transigiu com o que se considera direitos adquiridos".
Em que época o pessoal do tráfego e adventícios teve direitos ao acesso dentro do aspirantado?
Mediria bem o legislador o alcance desta asserção?
E não seriam direitos adquiridos a garantia disfrutada pelos sargentos ajudantes e primeiros sargentos da guarda fiscal de poderem ingressar no quadro dos antigos terceiros aspirantes?
Sr. Presidente, já não tenho esperança que êste projecto possa vingar, muito principalmente por contar com a animosidade permanente, incessante e antiga do pessoal das alfândegas contra a guarda fiscal; e para provar o que deixo dito haja em vista a perseguição que se tem movido contra o comandante da 1.ª companhia da circunscrição do norte, que já foi chamado a Lisboa para se defender de infames e torpes acusações formuladas por determinados funcionários da alfândega do Pôrto.
Conheço o carácter dêsse oficial e sei bem quanto êle e cumpridor dos seus deveres, sendo esta a causa determinante das infâmias em que procuram envolver o seu nome, acusando-o de preseguir os soldados republicanos.
É uma falsidade revoltante.
Êste oficial nunca esteve filiado em partido político algum e creio não o estar ainda hoje, mas a República pode contar com êle, como comigo mesmo.
E essa guerra atroz, é sem tréguas!
Ainda agora mesmo recebi uma carta em que se me declara que se procura exonerar êsse capitão do serviço da guarda fiscal.
Isto é repugnante, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente do Ministério (Afonso Costa): - V. Exa. pode dizer-me o nome dêsse capitão?
O Orador: - Sim senhor. É o capitão António da Graça Ferreira.
Êste oficial é aquele que sendo, como subalterno, comandante da secção de Matozinhos, envidou prodigiosos esforços para o descobrimento dum grande contrabando de ceriais no qual não ia feito só o despachante; havia no negócio alguém do pessoal interno da alfândega, como é óbvio.
Tenho dados para provar o que afirmo, se for preciso.
É daqui que vem o grande ódio do pessoal interno à guarda fiscal, e eu tenho a absoluta certeza de que êle há-de envidar os mais extraordinários esforços para iludir o próprio Ministro, para que o acto de justiça, que eu aqui defendo, não possa conseguir-se.
Em face, pois, das declarações do Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças, nada mais tenho a dizer, porque a vontade de V. Exa. de harmonizar os trabalhos da comissão que está encarregada de remodelar os serviços aduaneiros, pessoal e condições a que deve satisfazer para o bom funcionamento dos serviços, é de todo o ponto justa; mas não dou por mal empregado o tempo que gastei com estas considerações, porque tenho a certeza de que elas terão calado no ânimo de S. Exa. e que, com a exposição dos factos que eu aqui apresentei, talvez S. Exa. mais habilitado fique a fazer justiça aos sargentos da guarda fiscal, que passam a vida em risco constante para bem zelar os interesses da Fazenda Nacional e da República.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Requeiro a V. Exa. Sr. Presidente, que seja consultada a Câmara sôbre se concorda em
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que o projecto baixe à comissão, até que eu lhe possa fornecer os esclarecimentos recebidos da grande comissão encarregada de organizar o projecto de reforma dos serviços aduaneiros.
Isto tem por fim habilitar-me e habilitar a Câmara a proceder como for de justiça e não se embaraçar o projecto.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para entrar em discussão, o parecer n.° 38, referente ao projecto de lei n.° 406-H, sôbre amnistia.
Leu-se na mesa. É o seguinte:
Artigo 1.° Que em todos os foros e instâncias sejam trancados os processos que respeitam a crimes e delitos políticos ou religiosos, cometidos até esta data, fazendo-se sôbre êles perpétuo silencio.
§ único. Para os efeitos dêste artigo deverão cessar, desde já, todas as investigações de carácter judicial, militar ou policial.
Ari. 2.° Que os agentes e acusados dos crimes e delitos mencionados no artigo 1.°, cumprindo pena ou sujeitos a prisão preventiva, sejam imediatamente restituídos à liberdade.
Art. 3.° Que seja revogada a legislação em contrário.
O Sr. Presidente: - Está em discussão na generalidade.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Sr. Presidente: o Govêrno concorda com o parecer da comissão de legislação criminal que considera a aprovação do projecto do Sr. Deputado Machado Santos como inoportuna.
Mais entendo dever declarar que o Govêrno, quando a oportunidade chegar, não precisará que ninguêm lhe lembre êsse direito e ao mesmo tempo êsse dever de dar a amnistia a quem a mereça (Apoiados), reservando-se, por consequência, para apresentar um projecto de amnistia na hora própria, mas sem ser absolutamente igual e sem reservas absolutamente para ninguêm, como estabelece o projecto do Sr. Machado Santos. Apresentará um projecto amoldado às circunstâncias de cada caso, como as circunstâncias do país provavelmente aconselharão que se faça, para que essa amnistia seja considerada pelo Parlamento.
No momento presente, porêm, o Govêrno discorda in limine da aprovação de qualquer projecto de amnistia. Julgo tambêm dever dizer que o Govêrno não vê absolutamente inconveniente algum, mas tambêm não vê vantagem, quer interna, quer externa, na discussão actual dêste projecto (Apoiadas).
O orador não reviu.
O Sr. Machado Santos: - Nos últimos anos de existência do antigo regime o espírito público estava por tal forma divorciado da monarquia, que, quando em 5 de Outubro a República foi proclamada e a todos os cantos do país essa notícia foi transmitida, não houve quem a não recebesse com alegria, e não lhe dêsse a sua adesão.
Depois disso, triste é recordar êsses factos, é que se deram alterações da ordem, provocadas Apelas tentativas duma contra revolução. Êstes são os factos.
Quando pediu ao Sr. Presidente de Ministros para que assistisse a esta sessão, contava com que S. Exa. repetisse o nobre gesto que teve na Assemblea Constituinte, quando deu o seu voto a um projecto idêntico a êste.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Observa que, se então, como agora, os tribunais ainda estivessem procedendo a averiguações, tambêm lhe não daria o seu voto.
O Orador: - Pois o delito duns, a que então se deu a amnistia, era, em seu entender, maior do que o de agora, porque então ainda não se tinha dado a incursão.
Como S. Exa. sabe, existem nas prisões do Estado inúmeros indivíduos, alguns sem culpa formada.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Objecta que não está nenhum preso á ordem do Govêrno; todos estão entregues aos tribunais.
O Orador: - Conta que tendo pedido ao anterior Ministro da Justiça, Sr. Correia
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Lemos, que dêsse a casa por homenagem a uma senhora de setenta e um anos, que estava presa em Braga, êsse Sr. Ministro lhe dissera que sim, mas que no dia seguinte lhe declarara que tal não podia fazer, por estar entregue aos tribunais militares.
Pediu-lhe, então, que interviesse junto do Sr. Ministro da Guerra para que fizesse essa concessão, mas a resposta foi tambêm de que nada podia fazer, porque essa senhora estava entregue aos tribunais militares, e neles não podia ter, interferência. Isto mostra que os Ministros da República não tinham fôrça para intervir...
O Sr. Álvaro Poppe: - A lei é que não lho permitia.
O Orador: - Mas essa lei é inconstitucional, porque há tempo de guerra e tempo de paz e agora estamos em tempo de paz.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa):- Observa ao orador que, se S. Exa. julgava conveniente que se dêsse homenagem a essa senhora, a única cousa que tinha a fazer era apresentar nesta Câmara o respectivo projecto de lei. O Govêrno é que não lha podia dar nem tam pouco o tribunal, porque a lei não lho permitia.
Pode ter-se compaixão, mas não é com compaixão que se governam os países.
O Orador: - É um facto que quis citar, mas ninguêm ignora que há indivíduos presos, quási há um ano, sem culpa formada.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Explica que o Govêrno, desde 10 de Janeiro em que assumiu o poder, tem dado as precisas ordens para que os julgamentos se apressem, e deve tambêm dizer que uma grande parte dos indivíduos que estão presos o devem aos seus advogados, que lançaram mão da chicana para protelar os processos. São mal intencionados.
O Orador: - Talvez não, porque avolumando o número de prisioneiros nas cadeias, é possível que mais facilmente consigam do Parlamento a amnistia.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - O resultado é exactamente o contrário, porque o Parlamento não precisa seguramente cometer uma desigualdade. Não é justo que êsses indivíduos, porque são ricos, se eximam ao julgamento, e os outros, porque são pobres, a êles tenham sido submetidos.
O Orador:-Não sabe se todos êsses indivíduos são ricos, mas o que pode dizer é que ainda há dias foi ao presídio do castelo de lá. Jorge visitar um oficiai, que foi um verdadeiro implantador da República, e viu que êle tinha sete crianças na miséria. Não sabe se todos são ricos; o que sabe, é que nas cadeias, na Penitenciária, há pobres, analfabetos.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Afonso Costa): - Declara que na Penitenciária só estão os que foram julgados, e que os outros são quási todos ricos.
O Orador: - O seu projecto abrange todos, monárquicos e republicanos, pobres e ricos. É absolutamente igual, e por isso não hesitou em o apresentar.
Não foi por todos aplaudida a amnistia concedida pela monarquia aos implicados no 8 de Janeiro? Pois porque se há-de recusar esta?
Lamenta que o Govêrno não concorde com o seu projecto, pois tem a certeza de que cora a sua aprovação o Govêrno da República encontraria mais facilidades na sua acção, e que por todo o país, no dia em que ela fôsse votada, ecoaria um grito de alegria, como em 5 de Outubro.
O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.
O Sr. Presidente: - Como estão inscritos os Srs. Deputados António José de Almeida, Jacinto Nunes, Sá Pereira e Júlio Martins e faltando apenas cinco minutos para a hora de se encerrar a sessão, vou marcar a sessão para amanhã, á hora regimental, com a seguinte ordem do dia:
1.ª Parte:
74 (15 pertence). Código Administrativo.
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2.ª Parte:
38. Amnistia.
8. Alterações no orçamento do Ministério das Finanças.
24. Reorganização administrativa de Moçambique.
339. Cobrança de foros pelos corpos administrativos.
56. Primeiros e segundos oficiais do Ministério das Finanças.
177. Alienação de terrenos na posse do Ministério da Guerra.
395. Sôbre caça e direitos de caçar.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 15 minutos.
O REDACTOR = Sérgio de Castro.