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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 29

EM 9 DE FEVEREIRO DE 1917

Presidência do Exmo. Sr. Alfredo Ernesto de Sá Cardoso

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
Alfredo Soares

Sumário. - Feita a chamada, abre a sessão com a presença de 35 Srs. Deputados. É lida a acta da sessão anterior, e depois aprovada, sem discussão, por 68 votos. Dá-se conta do expediente, É admitida uma proposição de lei. O Sr. Portocarrero de Vasconcelos manda para a Mesa, em nome da comissão de guerra, um projecto de lei, para o qual é reconhecida a urgência. O Sr Jorge Nunes refere-se à questão dos transportes marítimos, a propósito da recente interpelação do Sr. António Macieira. O Sr. Jaime Cortesão usa da palavra acêrca de afirmações feitas pelo Sr. Alfredo de Magalhães, na interpelação que há pouco tempo realizou. Falar para explicações, o Sr. Alfredo de Magalhães. È incluído na próxima ordem do dia um projecto de lei acêrca do Tribunal de Transgressões.

Ordem do dia. - Continuação da interpelação do Sr. Alfredo de Magalhães ao Sr. Presidente do Ministério (António José de Almeida), acêrca da política geral do Govêrno e dos acontecimentos de Dezembro. Usa da palavra o Sr. Malva do Vale. Segue-se no uso da palavra o Sr. Júlio Martins, justificando a moção que envia para a Mesa. Fala a seguir o Sr. Simas Machado, justificando a moção que apresenta, e terminando pela leitura das declarações do bloco parlamentar. É prorrogada a sessão até se votarem as moções apresentadas. Usa da palavra o Sr. Alexandre Braga, justificando a moção que envia para a Mesa. Fala o Sr. Moura Pinto, justificando a moção que apresenta. O Sr. Presidente (Sá Cardoso) dirige algumas palavras àquele Sr. Deputado. O Sr. Presidente interrompe a sessão até as 22 horas. Reaberta, usa da palavra o Sr. Júlio Martins. Segue-se no uso da palavra o Sr. Eduardo de Sousa. Para explicações, fala o Sr. Malva do Vale. É dada a palavra ao Sr. Costa Júnior, que não se acha presente. Usa da palavra o Sr. Ramada Curto. Usa a seguir da palavra o Sr. Vasconcelos e Sá, que envia para a Mesa a moção, que justifica. Fala o Sr. Simões Raposo1 que justifica a sua moção. Para explicações, usa da palavra o Sr Presidente do Ministério e Ministro das Colónias. A Câmara autoriza o Sr. Júlio Martins a retirar a sua moção. É rejeitada a moção do Sr. Simas Machado, dando a contraprova o mesmo resultado. É aprovada a moção do Sr. Alexandre Braga, considerando-se prejudicadas as outras moções. E a sessão encerrada.

Documentos enviados para a Mesa.-Projecto de lei do Sr. Alfredo Ladeira, relativo aos serviços f abris do Arsenal da Marinha; outro do Sr. Lopes Cardoso, acêrca do pôsto zootécnico de Miranda do Douro, e outro do Sr. Fernandes Rêgo, acêrca dos tenentes auxiliares do serviço naval.

Notas de interpelação do Sr. Costa Júnior ao Sr. Ministro da Justiça, e do Sr. António da Fonseca ao Sr. Ministro da Guerra.

Requerimento do Sr. Costa Júnior.

Pareceres das comissões de guerra, finanças, saúde e assistência pública e agricultura.

Abertura da sessão às 14 horas e 40 minutos.

Presentes à chamada - 68 Srs. Deputados.

São os seguintes:

Abílio Correia da Silva Marçal.
Alberto de Moura Pinto.
Albino Pimenta de Aguiar.
Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Maria Ladeira.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

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2 Diário da Câmara dos Deputados

Alfredo Soares.
Amílcar da Silva Ramada Curto.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Albino Carvalho Mourão.
António de Almeida Garrett.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Corroía Portocarrero Teixeira de Vasconcelos.
António Marques das Neves Mantas.
António Miguel do Sousa Fernandes.
António de Paiva Gomes.
Armando da Gama Ochoa.
Artur Duarte de Almeida Leitão.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Casimiro Rodrigues de Sá.
Custódio Martins de Paiva.
Domingos da Cruz.
Domingos Frias de Sampaio e Melo.
Domingos Leite Pereira.
Eduardo Alberto Lima Basto.
Eduardo Alfredo de Sousa.
Eduardo Augusto de Almeida.
Ernesto Júlio Navarro.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Coelho do Amaral Reis (Pedralva).
Francisco da Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco José Pereira.
Francisco do Livramento Gonçalves Brandão.
Francisco de Sousa Dias.
Francisco Xavier Pires Trancoso.
Henrique Vieira de Vasconcelos.
Jaime Zuzarte Cortesão.
João Barreira.
João Canavarro Crispiniano da Fonseca.
João Carlos do Melo Barreto.
João Crisóstomo Antunes.
João Elísio Ferreira Sucena.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Pedro de Sousa.
João Tamagnini de Sousa Barbosa.
João Teixeira Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim José de Oliveira.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Alfredo Mendes de Magalhães.
José António da Costa Júnior.
José Augusto Simas Machado.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Júlio do Patrocínio Martins.
Luís de Brito Guimarães.
Luís Carlos Guedes Derouet.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Firmino da Costa.
Manuel Martins Cardoso.
Mariano Martins.
Pedro Alfredo de Morais Rosa.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Pedro Virgolino Ferraz Chaves.
Sérgio da Cunha Tarouca.

Entraram durante a sessão os Srs.:

Abraão Maurício de Carvalho.
Adelino de Oliveira Pinto Furtado.
Afonso Augusto da Costa.
Albino Vieira da Rocha.
Alexandre Braga.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
António Alberto Charula Pessanha.
António Aresta Branco.
António Augusto Fernandes Rêgo.
António Caetano Macieira Júnior.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António José de Almeida.
António Maria Malva do Vale.
António Maria da Silva.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Augusto da Costa.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto José Vieira.
Augusto Luís Vieira Soares.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Francisco José Fernandes Costa.
Francisco de Sales Ramos da Costa.
Gastão Correia Mendes.
Gastão Rafael Rodrigues.
Germano Lopes Martins.
Guilherme Nunes Godinho.
Hermano José de Medeiros.
João de Deus Ramos.
João Gonçalves.
João Luís Ricardo.
João Pereira Bastos.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José António Simões Raposo Júnior.
José Augusto Ferreira da Silva.
José Barbosa.
José de Barros Mendes de Abreu.
José Bessa de Carvalho.
José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães.

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José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Manuel da Costa Dias.
Manuel Gregório Pestana Júnior.
Tomás de Sousa Rosa.
Urbano Rodrigues.
Vítor Hugo de Azevedo Coutinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Não compareceram à sessão os Srs.:

Adriano Gomes Ferreira Pimenta.
Alberto Xavier.
Álvaro Poppe
Amadeu Monjardino.
Angelo Vaz.
António Augusto de Castro Meireles.
António Barroso Pereira Vitorino.
António Caetano Celorico Gil.
António Cândido Pires de Vasconcelos.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Dias.
António Firmo de Azevedo Antas.
António Maria da Cunha Marques da Costa.
António Maria Pereira Júnior.
António Medeiros Franco.
António Pires de Carvalho.
António Vicente Marçal Martins Portugal.
Armando Marques Guedes.
Augusto Pereira Nobre.
Bernardo de Almeida Lucas.
Ernesto Jardim de Vilhena.
Francisco Correia de Herédia (Ribeira Brava).
Gaudêncio Pires de Campos.
Helder Armando dos Santos Ribeiro.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
João Baptista da Silva.
João de Barros.
João Cabral de Castro.
João Catanho de Meneses.
João Lopes Soares.
José Augusto Pereira.
José Botelho de Carvalho Araújo.
José de Freitas Ribeiro.
José Maria Gomes.
José Mendes Cabeçadas Júnior.
Levi Marques da Costa.
Manuel Augusto Granjo.
Raimundo Enes Meira.
Rodrigo José Rodrigues.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Vitorino Henrique Godinho.

Procede-se à chamada. Eram 14 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 35 Srs. Deputados. Está aberta a sessão. Vai ler-se a acta.

Leu-se a acta.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 68 Srs. Deputados. Está em discussão a acta.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como ninguêm pede a palavra, considero-a aprovada. Vai ler-se o seguinte

Expediente

Pedidos de licença

Do Sr. Deputado João Soares, solicitando quinze dias de licença. Para a Secretaria. Concedido. Comunique-se. Para a comissão de infracções e faltas.

Do Sr. Deputado António Dias, solicitando cinco dias de licença. Para a Secretaria. Concedido. Comunique-se. Para a comissão de infracções e faltas.

Do Sr. Deputado António de Almeida Garrett, solicitando que lhe sejam relevadas as faltas dadas às sessões.

Para a Secretaria.

Para a comissão de infracções e faltas.

Representações

Do Sr. Camilo do Carmo Machado, tenente reformado, revolucionário de 31 de Janeiro de 1891, solicitando que a Câmara autorize o Exmo. Presidente do Conselho Tutelar do Exército de Terra e Mar a passar, do 4.° grupo para o 3.°, o seu filho, o aluno 330, Augusto do Carmo Machado.

Para a Secretaria.

Para a comissão de guerra.

Do Sr. Carlos Eduardo de Figueiredo Fama, escriturário de 1.ª classe do quadro das obras públicas, em serviço na 1.ª Direcção dos Serviços Fluviais e Ma-

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rítimos, pedindo ao Sr. Presidente da Câmara que lhe sejam pagos os vencimentos em dívida desde 1 de Julho de 1914 a 24 do Outubro de 1915.

Para a Secretaria.

Para a comissão do Orçamento.

Telegrama

Sindicato professores primários Portugal pede V. Exa. tome em consideração representações dirigidas Parlamento pela assemblea do delegados professorado todo o país, realizada 30 Novembro e 1 Dezembro 1910, lei 427 e revogação artigos 2.° e 3.° lei 584. - Presidente Direcção, Domingos Cunha.

Para a Secretaria.

Ofícios

Do Sr. Sub-Secretário do Ministério das Colónias, comunicando à Câmara não poder ser satisfeito o pedido do Sr. Deputado Casimiro de Sá, por não existir naquele Ministério o solicitado por S. Exa.

Para a Secretaria.

Do Sr. Ministro da Guerra, enviando à Câmara a nota das importâncias pagas por automóveis, pelo fundo de transportes no ano civil de 1916, conforme requerimento do Sr. Deputado Henrique de Vasconcelos.

Para a Secretaria.

Do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeires, enviando à Câmara determinados esclarecimentos solicitados pelo Sr. Deputado Costa Júnior.

Para a Secretaria.

Do Sr. Sub-Secretário do Ministério das Colónias, enviando à Câmara determinados documentos, conforme pedido do Sr. Deputado Francisco Xavier Pires Trancoso.

Para a Secretaria.

Do secretário da comissão de instrução primária o secundária, o Sr. António Augusto Tavares Ferreira, comunicando que a comissão n3.o reuniu juntamente com a comissão especial e técnica, pelo motivo da maioria dessa comissão não ter comparecido.

Para a comissão de infracções e faltas.

Do Sr. Ministro do Fomendo, enviando à Câmara a colecção da obra Portos de Portugal, de Adolfo Loureiro, conformo pedido do Sr. Deputado Pedro Alfredo de Morais Rosa.

Para a Secretaria.

Do mesmo Sr. Ministro, enviando à Câmara as seguintes obras: Portugal au point de vue agricole e Portugal Vitícola,

Para a Secretaria.

Do mesmo Sr. Ministro, enviando à Câmara determinados documentos, solicitados pelo Sr. Deputado Sérgio da Cunha Parouca.

Para a Secretaria.

Do Sr. Sub-Secretário do Ministério das Finanças, enviando cópias dos decretos n.ºs 2:977 e 2:978, publicados no Diário do Govêrno n.° 20, de 5 do corrente mês, sendo o primeiro da quantia de 6.000)$i e o segundo da de 33.450$61, a favor do Ministério da Marinha, e destinados respectivamente a reforçar o capítulo 7.°, artigo 31.° do orçamento daquele Ministério para o corrente ano económico e à aquisição de material que substitua o que foi cedido a diversas estações oficiais.

Para a Secretaria.

Para a comissão de finanças.

Do Sr. Presidente do Senado, comunicando a esta Câmara ter sido enviado à Presidência da República o projecto de lei desta Câmara, n.° 24-A de 1914, que passe a freguesia de Covelo de Paiva, do concelho de S. Pedro do Sul, para o concelho de Arouca.

Para a Secretaria.

Da Associação Comercial de Lisboa, participando aprovação duma moção acêrca dos transportes.

Para a Secretaria.

Para a comissão de comércio e indústria.

Foram admitidos à discussão, depois de devidamente consultada a Câmara, os seguintes projectos de lei:

Artigo 1.° O Posto Zootécnico de Miranda do Douro será estabelecido nos terrenos cedidos para êsse fim, pela Câmara Municipal de Miranda do Douro, denominados Lombadas, Malcarga, Malhada

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ou Malvade, Canada dos Cerrados, Vale da Fonte, com o seu prolongamento no Vale de Angueira, até a estrada municipal.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.- O Deputado, Lopes Cardoso.

Para o "Diário do Govêrno".

Senhores Deputados. - O decreto n.° 2:423, de 2 de Junho de 1916, que remodelou o quadro dos oficiais auxiliares do serviço naval estabeleceu, no seu artigo 11.°, uma flagrante injustiça para esta prestimosa classe, fixando-lhes em 8 anos o tempo mínimo de permanência em segundos tenentes para poderem ser promovidos a primeiros tenentes.

A lei de 28 de Abril de 1913 fixa em 4 anos o tempo mínimo de permanência para todas as classes.

No exército igual tempo é exigido e não se abre excepção alguma para os oficiais oriundos da classe dos sargentos. Desta forma ficaram os seus camaradas da armada numa situação vexatória, não se lhes levando em conta o avultado número de anos que lhes foram precisos para atingirem o pôsto de guarda-marinha.

Não se compadece o regime, Senhores Deputados, com excepções desta natureza. É bem digna a classe dos sargentos da armada de, ao ingressar na corporação dos oficiais, gozar ali das mesmas regalias, porque tambêm os mesmos deveres lhe são impostos.

Banir, pois, da legislação tudo que represente medidas de excepção é um princípio que vós não deixareis de aceitar, seguindo o que no exército está estabelecido e que há pouco ainda se repetiu para os oficiais práticos da guarda fiscal. Nestes termos, tenho a subida honra de submeter à vossa apreciação o seguinte

Projecto de lei

Artigo 1.° Os segundos tenentes auxiliares do serviço naval são promovidos a primeiros tenentes por antiguidade e na vacatura no quadro da sua classe quando, alêm das condições gerais fixadas no capítulo 6.° do decreto de 14 de Agosto de 1892, tenham, pelo menos, quatro anos de permanência no posto.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário. - O Deputado, Fernandes Rêgo.

Admitido.

Para a comissão de finanças.

Leu-se na Mesa uma nota de interpelação do Sr. Costa Júnior ao Sr. Ministro da Justiça sôbre a falta de julgamento relativo às transgressões.

Antes da ordem do dia

O Sr. Portocarrero de Vasconcelos (por parte da comissão de guerra): - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa um projecto de lei e dois requerimentos com o parecer da comissão, sendo um dêles para arquivar e outro com vista ao Sr. Ministro da Guerra.

O Sr. Alfredo Ladeira: - Sr. Presidente: envio para a Mesa um projecto de lei, pelo qual só pretende regularizar a forma de promoção dos escriturários do Arsenal de Marinha. Devo dizer a V. Exa. que êste projecto conta com o voto do Sr. Ministro da Marinha, com quem já falei sôbre o assunto, e, portanto, peço para êle a urgência.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que concedem a urgência para o projecto de lei que o Sr. Deputado Alfredo Ladeira acaba do enviar para a Mesa, tenham a bondade de se levantar.

Foi concedida.

O Sr. Jorge Nunes: - Sr. Presidente: não assisti à sessão em que se iniciou a interpelação do Sr. António Macieira aos Srs. Ministros da Marinha e do Trabalho, por motivo de doença; mas, se estivesse presente nessa ocasião, teria pedido a palavra para repelir algumas das considerações que S. Exa. fez, segundo o que leio no extracto do seu discurso. É o que agora faço!

Sr. Presidente: quando numa das últimas sessões eu tratei da questão dos transportes marítimos, tive apenas em mim mostrar ao país até que ponto a obra do Govêrno estava sendo contrária aos seus interesses; e contra o que o Sr. António Macieira declarou, não me moveram, ao tratar dêsse assunto, quaisquer interesses políticos partidários, mas apenas os intuitos de esclarecer uma situação cada vez mais obscura, e ainda mais obs-

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cura depois da interpelação realizada por S. Exa.

Eu não encarei, sob o ponto de vista financeiro, o problema. O Sr. Afonso Costa é que, no seu regresso de Londres, não tendo nada de simpático a recomendar o acto da operação que lá realizou, nos veio dizer que essa operação tinha sido feita dum modo felicíssimo; e eu, ao tratar da questão dos transportes, mostrei exuberantemente que só os navios ex-alemães tinham sido requisitados, para facilitarem as nossas relações económicas com o estrangeiro, nem ao menos êsse aspecto da operação realizada pelo . Sr. Afonso Costa no-la recomendava, porquanto se tem provado que ela foi ruinosa deveras para o país. Dir-se-hia que o Sr. Afonso Costa declarou que não tinha realizado um negócio da China, tendo, contudo, afirmado que realizou uma boa operação, que, de mais a mais, tem condições imperativas para as duas partes. A êsse ponto já respondi, indicando mesmo que tinha sérias dúvidas sobro se essas condições imperativas não obrigarão apenas uma das partes.

O Sr. António Macieira, portanto, bem melhor andaria se na sua interpelação procurasse fazer uma dissertação sôbre a nossa importação e exportação e a questão dos vinhos, em vez de lançar suspeitas sôbre as minhas intenções políticas e tirar ilações das minhas palavras. (Apoiados). Eu queria que S. Exa. estivesse presente, porque lhe queria preguntar se se pode fazer um paralelo entre a casa furness, que está administrando os nossos barcos, e as emprêsas portuguesas, quando é certo que essa empresa inglesa se forneço do carvão em Inglaterra, e as nossas têem de o comprar em Portugal, o que lhes fica à razão de 72 xelins a tonelada!?

Mas ainda há mais!

Aos barcos que se dispensaram à Empresa Portuguesa, exige-se 12 por conto para o seguro, e, segundo li hoje num jornal, isso representa para um barco de 5:000 toneladas, com todas as outras despesas, um encargo de 96 contos, superior ao frete que o barco pode alcançar.

Não disse o Sr. António Maria da Silva que o Estado inglês segurou os barcos que nós dispensámos à casa Fumes apenas por 1 por cento.

E, como se vê, uma enorme diferença, e constitui uma valiosa operação para a casa inglesa.

Mais ainda. Um barco português leva 25$ de frete por transportar uma tonelada de açúcar para Portugal e quere V. Exa. saber quanto recebe um vapor inglês pelo mesmo serviço? 58$.

E fala-se da excelência da operação que nós fizemos!

Porque não entregámos os barcos a homens do métier, que saberiam aproveitá-los?

O Estado não quere cobrar apenas as despesas, quere encontrar nos barcos uma fonte de receita para encobrir os males da sua administração.

Êste assunto dos transportes marítimos tem sido completamente descurado pelo Govêrno.

Acham-se no Tejo barcos descarregados há três meses e aptos a tomarem carga e seguirem ao seu destino, e nesta altura, em que não temos transportes para carregar cêrca de 4:000 pipas de vinho, para desafogar o nosso mercado, êles continuam imobilizados no Tejo, quando tam facilmente os podiamos aproveitar! Eu precisava fazer esta declaração para que não ficasse sem protesto a interpelação do Sr. António Macieira.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Vozes: - Muito bem.

O Sr. Jaime Cortesão: - Sr. Presidente pedi a palavra unicamente para esclarecer um incidente havido, numa das últimas sessões desta Câmara, entre mim e o Sr. Alfredo de Magalhães.

S. Exa. insinuou, no último dos seus discursos, que eu fora inimigo das actuais instituições; chegou mesmo a haver no espírito dalguns Srs. Deputados a suspeita de que eu fora monárquico.

Felizmente, o Sr. Alfredo de Magalhães esclareceu o caso, dizendo que eu professara ideas libertárias, mas dizendo isso, o que não nego, S. Exa. insinuou mais: que não podia de maneira alguma conspirar comigo, porque eu era inimigo do regime. Nessa ocasião fiz algumas observações que tendiam a demonstrar o contrário.

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Quero esclarecer S. Exa., para minha honra e para honra desta Câmara.

Afirmei e continuo a afirmar que cons-1 pirei com o Sr. Alfredo do Magalhães no movimento do 28 de Janeiro.

Nessa ocasião confirmaram as minhas palavras os Srs. Afonso Costa, Germano Martins, Pestana Júnior, Domingos Pereira, Joaquim de Oliveira, Pires de Carvalho, Adriano Pimenta e outras pessoas que não pertencem a esta Câmara, como os Srs. Leonardo Coimbra, Caldeira Scevola, Rómulo de Oliveira e Bartolomeu Severino, e poderia invocar até, se ainda fossem vivos, os testemunhos de Henrique Cardoso o João de Freitas.

O meu papel nesse movimento não for tam pequeno, que não fôsse eu o escolhido para vir a Lisboa tratar de todos os assuntos que diziam respeito ao comité revolucionário de então, para daí em diante trabalhar ao lado de republicanos. E até quando chegou a Revolução de 5 do Outubro, emquanto o Sr. Alfredo de Magalhães não sabia da revolução que estava tramada, eu era preso, encerrado num calabouço e pôsto em liberdade só depois da revolução triunfante.

Era êste esclarecimento, que eu queria dar à Câmara.

Não sou das pessoas que julgam que as opiniões políticas devem ser imutáveis, pela mesma razão que a inteligência e a vida são cousas que se transformam continuamente, mas desde que não fui inimigo das instituições, quero deixar bem aclarado êste facto, o faço-o por minha honra e em atenção à Câmara.

O Sr. Alfredo de Magalhães tem mostrado nos últimos dias ser tam contraditório e versátil, que não julgo uma exigência, nem da razão, nem da honra, perder o tempo em mais explicações.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Vozes: - Muito bem.

O Sr. Alfredo Magalhães: - Sr. Presidente : duas palavras apenas. A mim não me parece que, neste momento, a atenção do país incida sôbre a personalidade do Sr. Jaime Cortesão.

O país atravessa um dos momentos mais críticos da História. A minha interpelação foi posta nesta Casa do Parlamento nos termos mais alevantados e patrióticos, (Apoiados), mas o Sr. Presidente do Ministério, não podendo responder às acusações concretas que eu formulei, desviou-as procurando demonstrar que eu tinha sido conspirador.

Quanto ao Sr. Jaime Cortesão eu devo dizer a V. Exa. e á Câmara, pela muita consideração que a Câmara me merece, que não quis de maneira nenhuma ser desprimoroso para com aquele Sr. Deputado.

O Sr. Jaime Costesão: - Empregou termos que a outra coisa não tendiam.

O Orador: - Êste incidente...

O Sr. Francisco Cruz: - O que o Sr. Cortesão quis foi um atestado de revolucionário civil!

O Orador: - ... não tem nenhum a importância e eu quero simplesmente dizer ao Sr. Jaime Cortesão que certamente não me fiz compreender bem nas palavras que proferi. Eu não disse de modo nenhum que o Sr. Jaime Cortesão era inimigo das instituições; o que eu disse é que, tanto quanto podia conhecer S. Exa., no Pôrto tinha tido ocasião de verificar que o Sr. Jaime Cortesão era um acérrimo propagandista de ideas libertárias e evidente mente inimigo dos partidos burgueses. E diferente. E nem sei qual o momento preciso em que o Sr. Jaime Cortesão começou a prestar os tais serviços que considera relevantes, e que eu não contesto, à ideia republicana, pela qual, como toda a Câmara sabe e não preciso de o repetir, tenho combatido desde 1890 som desfalecimento de uma só hora, dum só dia.

E como o país, Sr. Presidente, espera sobretudo que o Sr. Presidente do Ministério aproveite a sessão de hoje para rebater as afirmações que fiz durante a minha interpelação, no que elas tem de concreto e que jogam e implicam muito gravemente com o seu futuro, destino e com a sua posição neste tremendo conflito da Europa, faço votos, e comigo evidentemente toda a Câmara, para que a sessão decorra hoje com aquela compostura, com aquele aprumo e com aquela serenidade que são próprios da gravidade dos assun-

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tos que foram objecto da minha interpelação.

Tenho dito.

Apoiados.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se na Mesa um requerimento sobro o qual vou consultar a Câmara.

Leu-se na Mesa um requerimento do Sr. Costa Júnior para que fôsse marcada para a ordem do dia, da próxima sessão a discussão do parecer n.º 416, sôbre o urgente desdobramento dos tribunais das transgressões de Lisboa.

A Câmara aprovou.

O Sr. Presidente: - Vai entrar-se na ordem do dia. Os Srs. Deputados que tiverem papéis a mandar para a Mesa, podem fazê-lo.

Documentos mandados para a Mesa

Projecto de lei

Artigo 1.° E extensiva aos escriturários da Administração dos Servidos Fabris do Arsenal de Marinha, admitidos posteriormente ao decreto de 22 de Maio de 1911, a doutrina contida no artigo 1.°, do decreto do 24 de Julho de 1912. que estabeleço que as promoções à classe imediata sejam feitas metade por antiguidade e metade por concurso.

§ único. Continuam em vigor as restantes disposições do decreto de 24 de Julho de 1912.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário. - O Deputado, Alfredo Maria Ladeira.

Aprovada, a urgência.

Para a comissão de marinha.

Notas de Interpelação

Desejo interpelar o Sr. Ministro da Guerra, sôbre a situação criada pelo decreto n.° 2:498, aos funcionários e empregados civis do Estado e dos corpos administrativos durante o serviço militar a que forem obrigados. - O Deputado. António da Fonseca.

Para a Secretaria.

Desejo interpelar o Sr. Ministro da Justiça sôbre a falta de julgamento relativa às transgressões do géneros alimentícios. - O Deputado, Costa Júnior.

Para a Secretaria.

Requerimentos

Requeiro que, pelo Ministério do Interior, me seja enviada, por intermédio da Delegação do Saúde do distrito de Lisboa, uma relação dos processos de falsificação de géneros alimentícios, colhidos em Lisboa (com exclusão dos referentes a leite), relativos aos anos de 1910-1916 e 1916-1917, especificando o género, data da colheita, local do estabelecimento, nome do proprietário, falsificação (nociva ou não). Data da remessa para juízo e quaisquer outras observações que julguem necessário mandar-nos. Peço isto com a máxima urgência, pois que tenho de tratar na Câmara um assunto que se refere a falsificações do géneros alimentícios. - O Deputado, José António da Costa Júnior.

Requeiro a V. Exa. só digne consultar a Câmara sobro se admite que seja dado para a ordem do dia da próxima sessão o parecer n.° 416, relativo ao urgente desdobramento do Tribunal das Transgressões do Lisboa, continuando o mesmo parecer a ficar no ordem do dia, até ser discutido. - O Deputado, José António da Costa Júnior.

Para a Secretaria.

Pareceres

Da comissão de agricultura, sobro o projecto de lei n.° 553-G, de iniciativa dos Srs. Ministros do Fomento, da Instrução Pública o do Trabalho, autorizando o Govêrno a adquirir anualmente máquinas ou instrumentos agrícolas, para os postos agrários e zootécnicos, campos experimentais e de demonstração e escolas do agricultura.

Para a comissão de finanças.

Da comissão de finanças, sôbre o projecto de lei da iniciativa do Sr. Ministro das Finanças, autorizando o Govêrno a arrendar à condessa de Tomar, por 3.100$ anuais, um prédio do Largo de Trindade Coelho.

Para a Secretaria.

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Da comissão de saúde e assistência pública, sôbre o projecto de lei n.° 458-A, obrigando os sargentos e equiparados dos quadros activos do exército de terra e mar, em determinadas circunstâncias, a inscreverem-se sócios do Montepio Oficial.

Para a Decretaria.

Para a comissão de guerra.

Da comissão de finanças, sôbre o projecto de lei n.° 541-I, da iniciativa do Sr. Ministro das Finanças, estabelecendo que fique a cargo do Estado o seguro de todos os seus bons, criando-se para êsse fim, no Ministério das Finanças, um "Fundo de Seguros do Estado".

Da comissão de guerra, sôbre a petição do Sr. José Carlos Saraiva, sub-chefe de música n.° 188-A da 3.ª divisão de reformados do ultramar.

Para a Secretaria.

Para a comissão de finanças.

O Sr. Malva do Vale: - Começa por declarar que apesar de sentir a impressão, vinda da atmosfera violenta que se respirou nas últimas sessões, de ser necessário fazer testamento antes de usar da palavra, não tem a intenção de ofender ninguêm, seja qual for a sua posição no Parlamento, e dito isto entrará no debate por que alguma cousa de anormal se deu nas bancadas da Câmara que julga necessário explicar, embora a mudança do centro, onde estava, para a direita, onde se encontra, não represente para êle, orador, e para os que o acompanharam alteração quanto às suas afirmações políticas, pois continuam a defender o programa do Partido Evolucionista.

Não se fez rogado para expor à Câmara a razão dos acontecimentos.

Quando foi da chamada União Sagrada todos os Deputados que constituem o grupo evolucionista mostraram-se completamente em desacordo com a maneira como essa união era feita, pois dizendo em toda a parte o Sr. Afonso Costa e o Partido Democrático que a revolução do 14 de Maio tivera por fim efectivar a participação de Portugal na guerra europeia, desde que feita a declaração de guerra o Ministério entendia que devia partilhar as responsabilidades do Govêrno com o Partido Evolucionista. era sua opinião que, dando êsse partido quatro Ministros ao prestígio do Sr. Afonso Costa, nada mais era necessário para a preparação para a guerra, visto que em guerra se não podia entrar por não haver armas, nem artilharia, nem exército, assunto em que trabalharam afanosamente os Srs. Ministros da Guerra e da Marinha que, por êsse facto, não podiam ser substituídos.

Desde que assim se fizesse, o chefe do Partido Evolucionista ficava de fora, ajudando o Ministério com o seu conselho, explicaria ao povo a razão da guerra e o Govêrno iria assim até onde pudesse ir durante alguns meses, e cansado que fôsse o Sr. Afonso Costa e gasto que estivesse êsse Govêrno, aceitaria então o Sr. António José do Almeida o encargo de formar gabinete.

Se S. Exa. assim tivesse feito teria podido resolver hoje importantes problemas de carácter internacional e conseguiria a formação dum grande partido conservador, assumiria o direito de dissolução e dormiria descansado porque todos lhe dariam o concurso do seu esforço, resgatando, ao mesmo tempo, longos anos de minoria e de sacrifício.

Não quis S. Exa. fazer assim, e declarou que entrava sacrificado na União Sagrada. Protesta contra tal. S. Exa. entrou nessa União muito à vontade e apenas sacrificou o seu partido sem nenhuma vantagem para o país, tanto mais que lançara, não havia muito, terríveis suspeitas sobro o Sr. Norton de Matos e contra o Sr. António Maria da Silva, e não receava ir ser chefe dum Ministério em que ambos entravam, e cujos planos de Govêrno pertenciam ao Sr. Afonso Costa. Assim, o Sr. António José de Almeida não é o chefe do Govêrno, mas um prisioneiro da maioria.

Conhece-o desde criança e nunca acreditaria que S. Exa. aprovaria uma lei de excepção como a que foi sujeita ao Parlamento para reprimir uma revolução não contra as instituições, mas contra o Govêrno, como S. Exa. foi o primeiro a confessar, porque um tal diploma não se coaduna com o seu passado de Coimbra e com as suas constantes afirmações de tolerância. Se S. Exa. fôsse ainda o chefe do Partido Evolucionista sentir-se-ia aí

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livremente em vez de ser um democrático miliciano.

Trocam-se apartes.

Nestas condições, afigurou-se-lhe que o partido estava absolutamente morto, e a sua missão de paz entre a família portuguesa e de constituição duma República para todos estava acabada, sem glória.

Dir-se há, segundo crê, que, numa tal conjuntura, os evolucionistas deveriam ir para um congresso do seu partido, e aí empenharem os seus esforços para que o partido voltasse à orientação primitiva, e desviá-lo do mau caminho que êle ia a trilhar. Um facto independente da sua vontade, e ainda resultante da situação do Sr. António José de Almeida, evitou que assim se fizesse.

Quando, na sessão de 18 de Dezembro, entrou na Câmara, vinha ainda resolvido a dar o seu apoio ao Sr. António José de Almeida, embora reconhecesse que êle ia por mau caminho, e disse ao secretário do grupo parlamentar evolucionista que não queria entrar na discussão a respeito da atitude do partido em face da lei contra os revoltosos de 13 de Dezembro, que conhecia apenas da leitura feita perante a Câmara, porque ela lhe repugnava. Foi-lhe dito que o Sr. António José de Almeida declarara, terminantemente, que, se êle entrasse no grupo. S. Exa. não entraria.

Em face disto pregunta à esquerda da Câmara se qualquer Deputado democrático, em igualdade de circunstâncias, sofreria um tal insulto e continuaria a sentar-se nas bancadas dêsse partido.

Outro foi o procedimento do Sr. Afonso Costa para com aqueles dos seus correligionários que não votaram essa lei, e que ainda hoje se encontram no mesmo lugar. Não lhe consta que o Sr. Afonso Costa os insultasse.

Como se isso não bastasse, continua a ler em todos os números da República censuras de Homem Cristo, a quem o Sr. António José de Almeida dá toda a autoridade, encabeçando-as com palavras de atenção. Ainda no último número lhes chama bêbedos, oradores de banquetes e tribunos de café-concêrto.

Pregunta a toda a Câmara se qualquer homem honrado podia continuar, sem protesto, das bancadas do partido almeidista.

Reflectindo maduramente, dirigiram êle, orador, e os seus amigos uma carta ao Sr. António José de Almeida, que pede licença para ler à Câmara, e na qual o mais exigente não pode encontrar quaisquer ofensas ao chefe. Crê que nenhum homem honrado era capaz de sair de um tal incidente de maneira mais altiva e mais honesta.

A resposta a essa carta foi o insulto e, sabendo que o partido almeidista, a convite do seu chefe, tinha feito uma reunião para a qual êle, orador, e os seus amigos não haviam tido convite, dirigiram-se aos unionistas e independentes, criando uma plataforma à sombra da qual se fôsse formar um grande partido conservador.

O orador faz ainda largas considerações e, constantemente entrecortado por apartes, termina declarando que, para evitar perturbações na esquerda, não lerá um artigo da República em que se diz que a maioria é composta de homens sem escrúpulo.

O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas taquigráficas.

O Sr. Júlio Martins: - Em harmonia com as prescrições regimentais, mando para a Mesa a minha moção de ordem, que é concebida nos seguintes termos:

Moção

A Câmara, satisfeita com as afirmações do Govêrno, passa à ordem do dia. - Júlio Martins.

Foi admitida.

Sr. Presidente: é difícil responder às considerações que a Câmara acaba de ouvir a propósito duma interpelação sôbre política geral do gabinete, numa época tam extraordinária como é esta, quando nos encontramos em guerra e com problemas internos bastante graves e difíceis de resolver, sendo de lamentar que nós, representantes da nação dum país em guerra, estejamos perdendo o tempo, permita-me V. Exa. e o orador que me antecedeu, o termo, em lavarmos roupa suja, o que seria natural na assemblea geral dum partido, mas jamais no Parlamento da República neste momento supremo em que

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a Pátria está em perigo e os filhos do povo se estão batendo!

Se um Govêrno houvesse de cair pelas afirmações que tem sido feitas por aquele lado da oposição parlamentar, que não é bloco, mas antes um mosaico parlamentar, constituído por criaturas que pensam de diferentes maneiras sôbre os problemas amidos, êsse governo seria eterno porque nunca poderia sair das cadeiras do poder.

O Sr. Malva do Vale não foi nunca partidário da União Sagrada, mas está há mais de nove meses calado, dá votos de confiança política ao Govêrno, assiste Impassível á oposição feita pelo grupo republicano unionista, e o Sr. Malva do Vale senta-se, nas bancadas evolucionistas dando apoio à política do Govêrno (Apoiados).

Escusava o Sr. Malva do Vale, escusa alguém, pois de vir para o Parlamento revolver os assuntos passados; vir para o Parlamento revolver o que os jornais dum lado e de outro disseram no fogo das paixões políticas, homens contra homens (Apoiados da esquerda).

Todos nós sabemos que nos exaltamos e apaixonamos sinceramente, de cada um dos lados, na luta dos princípios e na luta contra os homens! Sabemos até mesmo que houve cousas entre homens públicos, que,- em ocasiões normais de política, jamais poderiam esquecer. Sabemos tudo isso; mas tambêm o país não desconhece, tambêm não desconhece ninguêm, que a guerra nos foi declarada (Apoiados).

Também não desconhece ninguêm que a Pátria o a República estavam em perigo e ora necessário congregar-se o esforço máximo de todas as vontades e esquecer, no momento supremo para a sua tonalidade portuguesa, todas as paixões, para irmos construir o alicerce seguro da raça e da República (Apoiados). Pois bem! Os homens públicos da República esquecem os agravos mútuos; unem-se numa obra patriótica, e o Sr. Malva do Vale, dentro das bancadas do seu partido, assiste impassível à União Sagrada, com a qual não concorda! Vêem V. Exa. a evolução mental do Sr. Malva do Vale!...

O Sr. Malva do Vale: - V. Exa. não está na verdade! Eu fui ter com o Sr. António José de Almeida, antes dele entrar para êste Ministério e disse-lhe: "V. Exa. não faça Govêrno, não faça a União Sagrada!"

O Orador: - Nós acabamos de ouvir que o Sr. Malva do Vale não era partidário da União Sagrado, e que, se esteve calado durante nove meses, só vindo hoje aqui protestar contra ela, é porque julgou bastante ter exposto ao chefe do seu partido a sua opinião contrária à União Sagrada.

O Sr. Malva do Vale disse que o acompanharia se estivessem no poder mais evolucionistas.

Eu pregunto: a União Sagrada não será da mesma forma mantida estando o Partido Evolucionista representado no Govêrno como está actualmente?

Dizia o Sr. Malva do Vale que a União Sagrada devia efectuar-se para que alcançasse o seu fim, o sen objectivo, que era fazer a nossa participação na guerra, acalmando as paixões políticas, congregando os esforços de todos os portugueses, e, numa mesma unidade de vistas, preparar o reorganizar o nosso exército.

O Sr. Malva do Vale foi o próprio a dizer - e nisso exalça a obra do Govêrno - que no princípio da conflagração europeia nós não tínhamos absolutamente nada, sob o ponto de vista do problema da guerra.

Se o Sr. Ministro da Guerra fazia a nossa preparação militar, se o Partido Evolucionista, estando na União Sagrada, ia manter o Sr. Norton de Matos na pasta da Guerra, dando-lhe mais fôrça para êle poder intensificar a nossa participação na guerra, como se justifica que o Sr. Malva do Valo venha apresentar a obra do Govêrno e a União Sagrada como sendo cousas absolutamente incoerentes?

Deduzam V. Exas., Srs. Deputados, a conclusão que quiserem.

O Sr. Malva do Vale disse que não podia estar a colaborar connosco, porque nós representamos, para os republicanos e "evolucionistas" - que já o não são - uma traição ao sou partido.

Sr. Presidente: o Partido Republicano Evolucionista tem seguido sempre a mesma linha de conduta, pondo acima dos seus interesses partidários, pondo acima

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dos interêsses pessoais dos membros que o compõem, os interesses da República e os interesses da Pátria.

E, Sr. Presidente, estando em luta acesa com o Partido Democrático, num período em que eu combatia vivamente os partidários do Sr. Afonso Costa, preparando-se um movimento revolucionário nos quartéis, eu estive ao lado do Sr. Afonso Costa, encontrando lá já o Sr. Malva do Vale.

O Sr. Malva do Vale: - V. Exa. há pouco tempo penitenciava-se disso num artigo que escreveu para a imprensa...

O Orador: - E eu e os Srs. Afonso Costa, Malva do Vale e Fernandes Costa, porque reconhecíamos o perigo que corria a República, a degradar-se o princípio da disciplina militar, esquecemos os nossos ódios, as nossas paixões, o fogo do nosso ataque e fomos dar a nossa colaboração republicana ao Partido Democrático, nosso inimigo de sempre, e, naquele momento, não transigimos com os nossos princípios.

Interrupção do Sr. Maria do Vale, que não foi ouvida.

O Orador: - S. Exa. não diz a verdade, S. Exa. não leu o artigo. O que afirmei nesse artigo e afirmo agora é que, passado o perigo revolucionário, eu estava no meu pôsto contra o Partido Democrático. Dizia nesse mesmo artigo que se fôsse o Sr. Brito Camacho que se sentasse nas cadeiras do poder, lhe daríamos o nosso apoio.

Quere V. Exa. saber como foi interpretado êsse acto? Nas colunas dos jornais unionistas éramos alcunhados com nomes bem desagradáveis, e em panfletos, que correram anónimos, os nomes dos Srs. Malva do Vale, Fernandes Costa e o meu eram degradados corpo e infamemente. Quere dizer. Sr. Presidente, que nós. num período normal, sob o ponto de vista interno e externo da nossa vida republicana, a ferro e a fogo com o Partido Democrático, esquecemos inteiramente as nossas paixões políticas para colaborarmos numa obra inteira e completamente republicana. E não estou arrependido dêsse acto, nem jamais me arrependerei.

Se procedemos assim, foi do harmonia com a orientação do nosso partido. Pregunto se há alguêm que, de bom grado, não leve isto à couta de bons princípios republicanos? Numa hora em que a República estava em perigo e em que as condições nacionais eram cheias de apreensão, os homens da República não deveriam esquecer todos os agrados para se unirem na mesma obra de regeneração nacional? (Apoiados). Mas, Sr. Presidente, a guerra declarou-se e o Govêrno ante vê-se no poder.

O Sr. Malva do Vale, nos longos meses da obra governamental, dá-lhe o seu apoio, dá-lhe a sua solidariedade e reconhece que é indispensável a acção governativa do Ministério. Mas surge um belo dia uma conspiração no país, a conspiração de 13 de Dezembro, que o Sr. Malva do Vale aqui proclamou como um crime contra a República.

O Sr. Malva do Vale: - E proclamo.

O Orador: - Está feita a nossa participação na guerra, as tropas que se revoltam são tropas mobilizadas. Estão no Tejo os transportes para que elas embarquem. A honra da Pátria está no período mais intenso da sua afirmação nacional. Êsse crime repugna aos olhos de todos os que sentem vibrar a alma nacional. (Apoiados). Êsse movimento pode desonrar para sempre a vida da República. (Apoiados).

O Govêrno vem à Câmara e diz-lhe que precisa duma medida excepcional de fôrça para se manter com honra e com prestígio; e a Câmara, confiando nas palavras honradas do Sr. Presidente do Ministério, reconhecendo, embora, que a lei é de carácter excepcional e sai um pouco fora das praxes jurídicas, mas representava o instrumento sem o qual o Govêrno não podia governar, votou essa lei, que no dizer dos Deputados que abandonaram o Partido Evolucionista e se sentam nas bancadas inferiores do unionismo...

Trocam-se apartes.

Sussurro.

O Orador: - Se foi em nome dos princípios que V. Exas. não puderam dormir com a sua consciência tranquila, pregun-

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to: onde estavam os princípios quando V. Exas. aqui votaram a pena de morte?

Grande sussurro.

Tumulto.

O Orador: - Tambêm estava dentro dos princípios o Sr. Malva do Vale quando teve de fugir na rua.

Trocam-se apartes.

O Sr. Malva do Vale: - É mentira! Tanto não fugi que cheguei a levar seis pedradas.

Levanta-se tumulto.

O Sr. Presidente: - Peço ordem.

Apartes.

O Sr. Malva do Vale: - Que miséria!

O Orador: - Miséria é V. Exa. vir colocar a questão nos termos em que a colocou.

Continuam os apartes.

O Sr. Presidente: - Peço aos Srs. Deputados o obséquio de não interromperem o orador, aliás vejo-me obrigado a interromper a sessão.

O Orador: - Pelos conselhos de S. Exa., o Sr. António José de Almeida não devia entrar na constituição do gabinete da União Sagrada. S. Exa. devia continuar a sua acção política fora das bancadas ministeriais, quando na própria declaração de guerra que a Alemanha nos fez se indicava o nome do chefe do Partido Evolucionista como uma das causas da declaração de guerra. O Sr. António José de Almeida devia ir para a situação cómoda que S. Exa. lhe indicava. Não o entendeu assim S. Exa. e a verdade é que hoje a maneira de ver do Sr. Presidente do Govêrno se associa inteiramente a opinião republicana evolucionista do seu partido que está incondicionalmente ao lado de S. Exa.

Trocam-se apartes.

O Orador: - Estou ansioso por ouvir as declarações do bloco sôbre a constituição do célebre partido conservador, a que se referiu o Sr. Malva do Vale, porque certamente o país deve esperar muito dá beleza do elixir que os dissidentes evolucionistas foram levar ao Partido Unionista!

Todos nós julgávamos que o Sr. Alfredo de Magalhães falava em nome do bloco. Qual não foi, porêm, a nossa surpresa ao ouvirmos o Sr. Vasconcelos e Sá declarar mui solenemente que não, acrescentando logo que o bloco havia sido constituído por um aglomerado de homens que podiam pensar o que quisessem sôbre os problemas fundamentais de interesse nacional e - esclareceu S. Exa. - até sobro o problema da guerra havia quem fôsse contra a guerra, outros a favor e ainda outros que não eram pró nem contra!...

Francamente declaro que estou ansioso por ouvir as declarações dêsse decantado partido conservador.

O Sr. Malva do Vale, numa interpelação sôbre a política geral do Govêrno, limitou-se a final a tocar em assuntos que, quando muito, só tinham cabimento numa assemblea geral do Partido Evolucionista (Apoiados).

S. Exa. escusava, pois, muito bem de estar a cansar a Câmara a tomar tempo com a explanação dêsses assuntos perante o Congresso da Nação, visto que em família é que a contenda podia ser resolvida.

O Sr. Malva do Vale: - Mas V. Exa. está a cair na mesma!

O Orador: - Perdão! Isto é para que não fique a impressão do que nós não aceitamos a questão em todos os pontos em que a ponham (Apoiados).

S. Exa. veio ler a esta Câmara a carta que mandaram ao chefe do Partido Evolucionista, mas essa carta, note S. Exa., é a condenação de quem a subscreveu.

O Sr. Malva do Vale: - Vamos a ouvir!

O Orador: - Afirmam S. Exas. na sua carta que estão com o programa do Partido Evolucionista e que o seu chefe é que o rasgou e esfarrapou, abjurando os princípios que por sua honra se tinha obrigado a manter. Então em que situação ficam S. Exas. quando já deram um voto de confiança ao Govêrno presidido por êsse chefe de partido?!

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O Sr. Malva do Vale: - Porque é que êle não buscou entender-se connosco?

Vozes: - Sempre a interromper! Isto e sabatina?

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Malva do Vale que não interrompa d orador. As interrupções só podem ser feitas com o consentimento do orador.

O Orador: - Êles estão dentro do partido ; dizem ao chefe do partido que êle se tinha comprometido por sua honra a manter os princípios dêsse partido e que faltou inteiramente a êles.

Êles passam êste diploma ao chefe do partido. Cies são indivíduos disciplinados e por o serem passaram para dentro do bloco,, mas por outro lado o chefe de parte que esfarrapou. Êsses meemos princípios, recebia um voto de confiança dos seus acusadores! Onde há lógica? Onde há coerência e orientação? Não vejo. E se assim é, se não foi em virtude dos princípios feridos, eu pregunto quais foram as razões fundas, as razões fortes e imperativas que determinaram a sua actual atitude política e se o Govêrno, um perigo que já hoje é nacional, o Govêrno, que já hoje faz a desarmonia na família portuguesa, no dizer de S. Exas., não era o mesmo que geria os negócios públicos até 18 de Dezembro, data até à qual S. Exas. estiveram inteiramente do lado dele?!

Quais são os motivos desde 13 de Dezembro para cá, quais são os actos que cavaram um abismo tam fundo entre nós e os homens que hoje se sentam nas bancadas miionistas e que ainda ontem se encontravam aqui apoiando o Govêrno? Se são questões de mero partidarismo, não se debatem aqui dentro do Parlamento nem com o Govêrno; se são questões de mero personalismo político, não se deve com elas gastar tempo ao Parlamento, numa interpelação de política geral que nenhuma relação tem com êsses acontecimentos.

No emtanto, o Sr. Malva do Vale, nas suas afirmações, quis tirar conclusões que não são viáveis.

Afirmou-se num jornal que o Partido Republicano Evolucionista não era um partido onde só compravam e vendiam consciências, mas tal afirmação não podia ser dirigida a S. Exas. porque, fazemos-lhes justiça, nós conhecêmo-los.

O Sr. Vasconcelos e Sá: - E os insultos eram connosco?

O Orador: - Não o penso, e pela minha parte posso afirmar que não. O Sr. Malva do Vale assim o quis dar a entender agitando o jornal, mas não o conseguiu demonstrar. Assim, apesar das palavras do Sr. Alfredo de Magalhães, nas suas explicações a propósito da afirmação do Sr. Jaime Cortesão, que disse que o seu desejo era que esta sessão parlamentar decorresse grande e em harmonia com as responsabilidades da hora presente, a Câmara viu que não foi positivamente do nosso lado que a discussão se desviou para assunto de mera trica política que devia ser tratado de preferência num congresso partidário.

Sr. Presidente: o Sr. Deputado Malva do Vale afirmou há dias que esta Câmara era uma Câmara de valentões e que era necessário ter feito testamento para nela usar da palavra, e eu, terminando as minhas considerações, devo declarar que não fiz testamento, mas que nem por isso deixei do falar.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para ser submetida à admissão, a moção do Sr. Júlio Martins.

Leu-se na Mesa e foi admitida.

O Sr. Simas Machado (sobre a ordem): - Sr. Presidente: em harmonia com as disposições regimentais passo a ler a minha seguinte

Moção

A Câmara, certificando-se de que as palavras do Govêrno mio justificam os seus actos, passa à ordem do dia. - O Deputado, Simas Machado.

Foi admitida.

Foi rejeitada.

Sr. Presidente: quando hoje entrei nesta Câmara estava disposto única e exclusivamente a ler as declarações de blo-

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co, honra que desde já mo cumpro agradecer a todos os Deputados dêste lado da Câmara, mas as afirmações do Sr. Júlio Martins obrigam-me a entrar neste debate político levantado pela interpelação do meu ilustre amigo o Sr. Alfredo de Magalhães.

Sr. Presidente: acho extraordinário que se diga que nós vimos para aqui lavar a roupa suja e não tratamos de alto as graves questões que se relacionam com a política geral do Ministério, quando é certo que eu e os meus amigos políticos fomos desconsiderados por um acto parlamentar do Sr. Presidente do Ministério.

Cumpre-nos o dever de nesta Câmara protestar contra as afirmações feitas pelo Sr. António José de Almeida.

Sr. Presidente: nós divergimos única e exclusivamente numa questão de princípios.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: eu disse aqui nesta Câmara um dia que não votaria, nos termos em que estava redigida, uma proposta do amnistia porque a achava pequena, miserável è ratinhada e porque receava que os ossos de meu pai rangessem de cólera por ver que seu filho nesse lugar votava uma tal proposta!

Se assim eu tinha procedido, como havia de votar o projecto apresentado pelo Sr. Ministro da Guerra, sendo êle a negação de todos os princípios democráticos e liberais?

Se eu fizesse, desconsiderava-me perante esta Câmara.

Isso não, não, e não!

Se meu pai, velho soldado da liberdade, que por ela tanto padeceu, quer nas prisões, quer batendo-se como herói desde a Vila da Praia até à Asseiceira, se à sombra da sua memória eu procedesse doutra maneira, então é que eu ti" nhã modo que, êle me amaldiçoasse do outro mundo; e entre essa maldição e a do Sr. António José de Almeida - prefiro esta última. E porque procedi assim, em harmonia com a minha dignidade e com o respeito pelos princípios que toda a minha vida advoguei, o Sr. António José do Almeida afrontou-me na minha dignidade, mio aqui no Parlamento, onde eu tinha cometido o pretenso crime, mas lá fora, onde eu não tinha voz, onde eu não me podia desafrontar. Em que lugar, pois, eu, membro desta Câmara, havia de protestar contra as palavras de S. Exas.! (Apoiados).

O Sr. Júlio Martins: - Indicando um centro do partido, e lá resolvia a questão!

O Orador: - Aqui é que ou mo devia defender, porque sou Deputado da Nação, e fui atacado nessa qualidade. (Apoiados da direita).

Trocam-se mais apartes.

O Orador: - Sr. Presidente: entrei para o Partido Evolucionista e tenho a convicção profunda de que, em quanto nele estive, procedi com toda a lialdade para com o meu chefe. Mas se por acaso eu quis transformar o partido em balcão, se eu quis negociar com êle, ah! Sr. Presidente, então esmaguem-me com as provas disso mesmo! (Apoiados da direita).

E provável que não estivesse na intenção de ninguêm ofender-me na minha dignidade ou honra, mas o que não é provável, porque é certo, é que as palavras pronunciadas pelo Sr. Presidente do Ministério nossa célebre reunião do centro evolucionista produziram sensação profunda entre alguns parlamentares desta casa, o entre muitos indivíduos dos partidos políticos, na suposição de que, realmente, nós quiséssemos jogar com interesses e negócios dentro do próprio partido. (Apoiados).

Sr. Presidente: eu não votei, nem aprovei a proposta de lei de S. Exa. o Sr. Ministro da Guerra, já o disse, porque isso repugnava aos meus princípios. Eu queria que êste meu país procedesse como a França, onde há dois dias, num dos números de L'homme enchainé, Clemenceau, com grande orgulho, dizia que o seu país atravessava toda a tremenda crise que o perturba, sem pôr em prática uma única lei de excepção! (Apoiados).

O Sr. Alfredo de Sousa: - É outro povo!...

O Orador: - Outro povo, não! Não diga V. Exa. isso! Não rebaixe o povo português! (Apoiados).

Uma voz: - O que há lá é outros Govêrnos!

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O Orador: - Do que se trata efectivamente, é dos Govêrnos ; mas veja V. Exa. que a declaração do nosso Govêrno foi terminante.

Veja V. Exa. que a declaração do Govêrno foi terminante, porquanto nos disse aqui que não podia governar sem ela.

Eu declarei ao Sr. António José de Almeida - e V. Exa., Sr. Presidente, estava presente quando S. Exa., chegando aqui, nos leu o projecto - que não votava aquele projecto nem que naquela cadeira de Ministro da Guerra se sentasse Frei Bartolomeu dos Mártires, porque eu não admito que o futuro dum homem esteja nas mãos dum outro homem. Há os tribunais para julgar.

Disse-se aqui que eu era contra a União Sagrada. Com aquela Maldade que me caracteriza tenho a declarar a V. Exa. que não gostei da União Sagrada, mas, que. desde que a maioria do meu partido a votou, me sujeitei a ela, emquanto não foi de encontro aos princípios que eu defendia e oram meu timbre. Eu gosto muito de ver a forma como algumas pessoas se referem à União Sagrada. Ah! Sr. Presidente, eu posso afirmar a V. Exa., não "com uma diferença de quarenta e oito horas, mas apenas com uma diferença dalguns minutos, que aqueles que mais a defendem agora eram aqueles que mais contra ela só pronunciaram. Combatiam-na, o combatiam-na à outrance, e em quatro horas, em menos tempo talvez, mudaram por completo de opinião.

É certo que nós, Deputados, hoje dissidentes do Partido Evolucionista, aprovámos um voto de confiança do Govêrno. Aprovámo-lo, e, nisso, só demos uma prova de disciplina partidária, tanto mais que a resolução tinha sido há dois dias. Aprovamos êsse voto de confiança, sim, como hoje nas mesmas circunstâncias, o votaríamos, porque, sobretudo, somos homens de disciplina e patriotas.

Desde o momento em que nós não podíamos continuar a dentro do Partido Evolucionista, porque o nosso chefe nos empurrava para fora dele, nós, que reconhecemos a necessidade de que todas as forças oposicionistas se reunam para constituir uma forma de fiscalização à acção governativa, que faça com que a lei se cumpra e que ninguêm, nesta Câmara, nem fora dela se coloque superior a ela (Apoiados), reunimo-nos aos Deputados unionistas e independentes, exactamente para se constituir essa força.

Digam o que quiserem acêrca do bloco; o que posso garantir a V. Exa. e à Câmara é que o orienta o desejo de ver a Pátria levantar-se e a República prestigiar-se. (Apoiados).

Sr. Presidente: termino por aqui as minhas considerações, porque não quero por forma alguma abusar da paciência da Câmara, e peço agora licença para ler as seguintes declarações, em nome do bloco:

"As razões políticas que levaram o Sr. Deputado Malva do Vale a afastar-se do Partido Evolucionista determinaram igual procedimento por parto dos Srs. Deputados Vasconcelos o Sr. Eduardo Augusto de Almeida, Casimiro de Sá, Gonçalves Brandão e Simas Machado.

Reconhecido que o sou isolamento, embora lhos permitisse o desempenho honesto do seu mandato, tornaria a sua acção parlamentar menos eficaz, os Deputados que se afastaram do Partido Evolucionista, procuraram entender-se com os Deputados independentes e com os unionistas, chegando-se assim à formação dum bloco parlamentar que se propõe, numa honesta convergência de esforços, alevantar o prestígio do Parlamento, e pelo exercício da função legislativa, servir o melhor possível os interesses do toda a ordem do país.

No que diz respeito a política internacional, os Deputados que formam o bloco procederão do modo a não estorvarem a efectivação de quaisquer compromissos tomados em nome da Xá cão, o a honrá-los, sendo Poder.

Não abdicam todavia, do direito que lhes assisto de, em sessões públicas ou secretas, fazerem o oxame e a crítica dos factos concernentes a essa política, a qual sendo, de sua natureza, uma política do imperiosas reservas, não pode ser uma política de mistério. Os Govêrnos do vem à Nação conta de tudo quanto em seu nome fazem, o pois que sobre ela recebem os encargos que os Govêrnos criam, justo e necessário é que a informem do quanto afecte os seus interesses e implique com os seus destinos.

Os Deputados que formam o bloco, considerando que é indispensável intro-

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duzir na Constituição da República o princípio da dissolução, que é da substância do regime parlamentar, esforçar-se hão, na mais larga medida em que puderem fazê-lo, por conseguir esta alteração constitucional, única maneira de evitar que o despotismo dum partido se consolide, e que nenhum protesto seja eficaz contra êsse despotismo senão a insurreição.

Em todas as questões que não forem própriamente de natureza política, os Deputados do bloco farão o seu exame e entrarão na sua discussão, cada qual conforme o seu critério, esforçando-se por que a obra legislativa seja o mais possível útil.

Fiscais severos da execução da lei e da aplicação dos dinheiros públicos, os parlamentares do bloco proporão, quando o julgarem conveniente, comissões de inquérito parlamentar, a quaisquer actos ou serviços de administração, exigindo que em relação a tais comissões se respeite o moralizador princípio da representação das minorias, e dando-lhes as necessárias faculdades para fazerem as investigações que houverem por convenientes.

Os Deputados do bloco, no propósito de prestigiarem o Parlamento, e bem servirem a República, não permitirão que seja postergado o mínimo dos seus direitos, não votarão leis de excepção, nem darão ao Poder Executivo outras autorizações que não sejam as que são expressas na Constituição.

Fora do Parlamento os Deputados do bloco esforçar-se hão por que se organizem, politicamente as classes conservadoras, de modo a tornar-se possível uma grande fôrça de Govêrno, que assegure a ordem pelo respeito de todos, sem exclusão das autoridades, à lei estabelecida; efective a tolerância de todas as opiniões, em política e em religião, e garanta o exercício de todas as liberdades lícitas, acautelando ao mesmo tempo todos os legítimos interesses.

É admitida a moção do Sr. Simas Machado.

O Sr. João Crisóstomo: - Requeiro a prorrogação da sessão até se liquidar o assunto.

Foi aprovado.

O Sr. Hermano de Medeiros: - Requeiro a contraprova.

Feita a contraprova, deu o mesmo resultado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra sôbre a ordem o Sr. Alexandre Braga.

O Sr. Alexandre Braga: - Sr. Presidente: em obediência ao Regimento, manda para a Mesa a seguinte

Moção de ordem

A Câmara, satisfeita com as declarações do Govêrno, passa à ordem do dia. - Alexandre Braga.

Admitida.

Aprovada.

Sr. Presidente: quando a interpelação do Sr. Alfredo de Magalhães foi anunciada tive a impressão, e creio que igualmente a tiveram todos os que tem assento nesta casa, de que ela corresponderia, de par com uma crítica serena, elevada e correcta, de apreciação aos actos de administração colectiva do Govêrno, à primeira manifestação política do neo-unionismo, congraçado imprevistamente por uma corrente de conservantismo de improviso, em que eu ingenuamente quis acreditar, nascido não apenas de despeites e de personalismos vaidosos, mas duma natural e sincera, embora tardia, contrição de consciência, dos que se não sentiam bem numa atitude política que a cada passo contrariavam pelos seus actos, pelo seu procedimento, pelas suas intenções, quer as doutrinas partidárias, quer ainda as correntes de opinião que cada um dos novos conservadores livremente escolheram a dentro dos partidos e das opiniões apresentadas nesta casa.

Tinha, pois, havido o convencimento de que essa interpelação seria a primeira manifestação política do bloco, cujos intuitos e finalidade seriam feitos pelo primeiro orador do agrupamento que tomasse a palavra para discutir a política geral do Govêrno e, o que é mais, sôbre os acontecimentos que deram causa à formação dêsse agrupamento político.

A constituição do grupo político que forma, neste momento, a direita da Câmara, embora amassado com elementos heterogéneos e disparatados, a meu ver,

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se não corresponde a uma corrente de opinião, traduzindo o querer, a vontade e aspiração de qualquer parte organizada do país, tinha ao menos a vantagem, tinha até a utilidade de extremar nitidamente os campos, assinalando por maneira inconfundível o lugar que cada um livremente escolhera.

Mas os partidos não são obra feita, como os gabões do Clemente, para se ajustarem a todas as estaturas, porque o país, o seu espírito conservador, jamais se deixaria embair por um simples rótulo inexpressivo, abrigando sob a sua designação os elementos mais destrutivos e demolidores da disciplina, que a política portuguesa tem gorado dentro da República, deslocando todas as tendências de solidez e equilíbrio que são absolutamente indispensáveis à vida política de todos os povos civilizados.

Êsses elementos, assim postos ocasionalmente em contacto, se se não repeliram desde a primeira hora e ao primeiro choque, como as electricidades de sinais contrários, foi porque se esforçaram por amaciar atritos, por atenuar divergências, de maneira a procurarem conciliar as doutrinas e confissões políticas ainda na véspera irredutíveis e antagónicas, para. aproveitando os rótulos esparsos de confissões políticas irreconciliáveis, com êles tecerem uma bandeira de cor definida, a cuja sombra pudessem viver em boa paz e boa harmonia os restos isolados e dispersos das velhas doutrinas e das antigas confissões políticas ainda ontem antagónicas e irreconciliáveis.

Grande foi, portanto, a minha surpresa, Sr. Presidente, ao ver que o Sr. Alfredo de Magalhães, desenvolvendo a sua interpelação ao Govêrno, sôbre política geral e ainda especialmente sôbre os acontecimentos de 13 de Dezembro, acontecimentos que, como já disso, se hão-de considerar como os que conrretamente provocaram a formação do novo agrupamento político, o Sr. Alfredo de Magalhães, dizia eu, falava em seu nome pessoal, reduzindo o debate às proporções duma mera opinião irritada e ao limitado ângulo que lhe foi talhado pelos seus correligionários da. última hora, que não quiseram honrá-lo com a sua confiança.

O Sr. Alfredo de Magalhães merecia sem dúvida, ser perante a Câmara o intérprete das opiniões, dos designios e das aspirações do bloco em que S. Exa. se encontra.

De maneira que, Sr. Presidente, nós assistimos ao espectáculo de ver que o bloco não desce à liça, porque aqueles que ontem viviam sob diversa telha, em contradição e discórdia, continuam a viver, em desarmonia absoluta, mas debaixo do mesmo teto.

Sr. Presidente: era meu dever vir aqui expressar as razões e os motivos que me determinaram a restringir a minha resposta - que representa a da maioria desta casa - às reduzidas proporções políticas do discurso do Sr. Alfredo de Magalhães.

Êste Sr. Deputado inverteu a ordem os termos dessa interpelação, por isso que, segundo fora anunciado, a sua interpelação era, primeiro, sôbre a política geral; em segundo lugar, sôbre os acontecimentos de 13 de Dezembro.

S. Exa. inverteu, como disso, os termos dessa interpelação e eu segui-lo liei na minha resposta.

Relativamente aos outros oradores que se seguiram no uso da palavra ao Sr. Alfredo de Magalhães, responder-lhes hei respectivamente, visto que S. Exas. de tudo se ocuparam, menos do que se discute.

Eu começarei por frisar, desde já, que o Sr. Alfredo de Magalhães, ocupando-se dos acontecimentos de 13 de Dezembro último, limitou-se exclusivamente ao que êsses acontecimentos tem de pessoal para o ilustre Deputado, se exceptuarmos aquelas rápidas e fugidias referências que-S. Exa. fez a Xavier Esteves, a Agrebom e a um pobre agiota, como S. Exa. lhe chama...

O Sr. Malva do Vale: - ... que foi preso automaticamente...

O Orador: - A inaudita violência, o inconcebível abuso de que o Govêrno foi acusado - e que fez com que Xavier Esteves arrancasse melodramáticamente o colarinho e a gravata para se dar o aspecto dum autêntico scelerado- resume-se na afirmação de que a êsses prisioneiros, Xavier Esteves e Agrebon, foi negada a satisfação do desejo que exprimiram, de fazer um trajecto de automóvel da estação de Campolide ao Govêrno Civil.

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O Sr. Malva do Vale: - Essas é que são as respostas concretas...

O Orador: - Eu não tenho o direito de proceder com menos correcção para com o Sr. Alfredo de Magalhães do que para qualquer outro Deputado, deixando sem resposta as acusações feitas ao Govêrno, deixando de opor argumentos àqueles de que S. Exa. se serviu, e que, se constituem uma futilidade como acusação, a culpa não é minha. Eu cumpro o meu dever, não querendo deixar de pé nenhuma das acusações, embora fúteis, infantis e infundadas, que aqui se fizeram ao Govêrno.

O Sr. Alfredo de Magalhães formulou esta acusação. Simplesmente S. Exa. se esqueceu de nos dizer qual a forma porque êsse transporte se realizou, quais as humilhações ou vexames a que porventura foram sujeitos os prisioneiros durante o trajecto que pretendiam fazer em automóvel, sendo no entretanto certo e seguro, - pelas próprias afirmações de S. Exa. - que a polícia teve desde logo o cuidado de os fazer sair em Campolide e não na estação do Rossio, possivelmente para os furtar às humilhações que para êles podiam representar o trânsito naquelas condições de prisioneiros, pela parte mais concorrida, que é a parte central da cidade.

Igualmente se esqueceu de nos dizer em que dia e hora se realizou essa chegada a Campolide, porque se nós soubéssemos que êsse dia e essa hora coincidiam com a hora e dia em que o trânsito de automóveis e carruagens foi proibido ou reduzido, veríamos que se apresentavam já factos que não podiam ser resolvidos por um simples agente de polícia, sem que as medidas adoptadas pelo Govêrno para a tranquilidade pública pudessem ser desrespeitadas.

Portanto, o que está estabelecido, o que fica de pé, são: a cortezia, a correcção e a delicadeza com que todos se portaram para com o Sr. Alfredo de Magalhães, desde o Juiz de Investigação Criminal, desde o Sr. Leote da Bêgo, que atendendo à situação do detido, o cercou de atenções e considerações, até a extrema amabilidade de todos os oficiais e praças da marinha, a quem o Sr. Alfredo de Magalhães não regateou, no seu discurso, os seus agradecimentos e a sua comovida gratidão. (Apoiados).

E certo que o Sr. Alfredo de Magalhães se referiu, como tratando-se duma violência sem nome, dum inqualificável abuso, aos factos que versou, relativamente à prisão do Sr. Agrebon. No meu espírito, e creio que no de todos quantos escutaram S. Exa. ficou a impressão de que êsse indivíduo tinha sido demitido do seu lugar, para se colocar nele um reaccionário feroz, um inimigo da República. Devo dizer, contudo, a S. Exa. que ou avançou uma afirmação inexacta ou está mal informado! Não houve demissão do Sr. Agrebon, porque êle simplesmente foi transferido de lugar, facto que podia ter feito o Sr. Ministra do Trabalho por conveniência de serviço! Nem sequer foi deslocado da terra em que reside! Trata-se da deslocação duma comissão de serviço, para outra, até mesmo dentro do edifício dos correios. (Apoiados). É uma das muitas falsidades de libelo acusatório que o Sr. Alfredo de Magalhães desenrolou nesta casa!

O Sr. Alfredo de Magalhães: - V. Exa. dá-me licença de me explicar? O Sr. Domingos Agrebon foi, logo depois da sua prisão, demitido da comissão em que estava, sendo essa comissão dada a outro funcionário, que, segundo a lei, não a pode desempenhar. (Apoiados da direita).

O Sr. Ministro do Trabalho e Previdência Social (António Maria da Silva) (interrompendo): - Eu queria tratar directamente com o Sr. Alfredo de Magalhães dêste caso do Sr. Agrebon; V. Exa., Sr. Alexandre Braga, dá-me licença?!

O Orador: - Perfeitamente!

O Sr. Ministro do Trabalbo e Previdência Social (António Maria da Silva): - Devo dizer ao Sr. Alfredo de Magalhães que o funcionário que foi colocado no lugar do Sr. Agrebon, foi lá colocado como o seria outro qualquer e nas condições em que lá estava o Sr. Agrebon!

O Orador: - Então, já o Sr. Alfredo de Magalhães vê que não houve demissão alguma, mas simplesmente transferência dum serviço para outro. (Apoiados da esquerda e do centro).

Do que se trata apenas é duma simples transferência que, em qualquer situação

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normal ou anormal, e, em quaisquer condições, é sempre de direito, sem necessidade de qualquer fundamento. Isto pelo que diz respeito às acusações formuladas pelo Sr. Alfredo de Magalhães e relativas aos Srs. Xavier Esteves e Domingos Agrebon. Portanto, a própria acusação de S. Exa. converteu-se em defesa e justificação do Govêrno.

Se houve, de facto, como S. Exa. afirma, uma falsa denúncia, ela, no entretanto, não conduziu o Govêrno a praticar o abuso de conservar demoradamente o homem em prisão, e assim que o equívoco se desfez, êle foi restituído à liberdade.

Relativamente à prisão do Sr. Alfredo de Magalhães, devo dizer que a lamento, pelo seu passado de propagandista republicano, em que trabalhei juntamente com S. Exa. apesar de ter declarado que nunconspirara.

Não admira que a polícia o tivesse prendido, desde que S. Exa. declarou que sempre fora solicitado para tomar parte nas várias tentativas revolucionárias que tem havido. Por isso a polícia quis saber se o Sr. Alfredo de Magalhães interviera no movimento de 13 de Dezembro.

Devo dizer, para elucidar a Câmara, que em qualquer outro país, de mono r benignidade de costumes, e onde essa mesma benignidade não fornecesse continuamente pretextos e incentivos para as repetidas tentativas revolucionárias, o Sr. Alfredo Magalhães estaria ainda preso e seria julgado. Com estas palavras não quero dar o direito de pensar que, dentro desta Câmara, tivesse havido quem quer que fôsse que se regozijasse com a prisão de S. Exa.; S. Exa. não teria o direito de pensar que eu, que assim falo. com isso me regozijasse; pelo contrário, como disse, a prisão de S. Exa. penalizou-me profundamente, porque as ocasionais divergências de opinião não podem jamais fazer esquecer as relações de verdadeira e sincera amizade que nos ligaram e que S. Exa. entendeu dar por não subsistentes.

Mas a verdade é a verdade. Em qualquer outro país havia mais que suficientes provas judiciárias para S. Exa. ser submetido a julgamento.

Áparte do Sr. Malva ao Vale, que não foi ouvido.

Eu tenho a observar ao Sr. Malva do Vale que estou disposto a não ouvir as interrupções que se me fazem propositadamente. S. Exa. falou por falar, no intuito de fazer barulho, confusão, tumulto, mais nada. S. Exa. não ouviu ainda as minhas razoes; não tem, portanto, o direito de estar a fazer oposição a razoes ainda não produzidas. Ouça-as e discuta-as depois (Apoiados).

Desse lado da Câmara mais duma vez se tem afirmado que pouco percebem de leis. Bem se vê. Se o Sr. Malva do Vale conhecesse a lei não tinha a imprudência de pronunciar as palavras que pronunciou.

O Sr. Vasconcelos e Sá: - Êle há lá lei!...

O Orador: - Houve bastantes razoes e suficientes fundamentos para que um despacho de pronúncia fôsse elaborado, inculpando o Sr. Alfredo de Magalhães. Vejamos:

O Sr. Alfredo de Magalhães confessou que foi sempre procurado, desde 5 de Outubro de 1910, para todas as tentativas de movimentos revolucionários. Outro tanto não aconteceu com muitos de nós. Por certo que o critério pessoal relativamente àqueles que são habitualmente solicitados para intervirem em movimentos dessa natureza, não será o mesmo relativamente àqueles outros que não são convidados, nem para tumultos ou arruaças, nem para movimentos revolucionários, mas que, ao contrário, são considerados como alheios, pelo seu feitio, pelas suas opiniões partidárias, pelas suas afirmações, quer particulares, quer públicas a tais movimentos.

O Sr. Alfredo do Magalhães, invariavelmente solicitado para êsses movimentos, tinha de receber essa solicitação por forma directa ou em conferência com os chefes do movimento, ou por forma indirecta, quer por escrito, quer por emissários ou representantes dêsses revolucionários.

Logo, para as autoridades deveria considerar-se como criatura suspeita o Sr. Alfredo de Magalhães, por lhe solicitarem sempre a sua cooperação para êsses movimentos e do estar sempre ao facto de

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que êsses acontecimentos se iam produzir, porque a par dêles era posto.

Apesar dêstes antecedentes, que por si só bastavam para legitimar uma suspeita, o Sr. Alfredo do Magalhães confessou que foi procurado, dois ou três dias antes de estoirar o movimento de 13 do Dezembro, pelo Sr. Machado Santos, com quem teve a conferência que aqui nos relatou. Êstes factos, adicionados aos antecedentes, obrigaram, necessáriamente a polícia a estar de sobreaviso, e esta em determinado momento o deteve.

Foi o Sr. Alfredo de Magalhães prevenido de que estava indicado para fazer parte do Govêrno a constituir sendo-lhe distribuída a pasta das Colónias, e até agora não me consta que S. Exa. protestasse contra êsse facto. Admitindo mesmo que, por parte do Govêrno do meu país, tivesse havido qualquer excesso contra o Sr. Alfredo de Magalhães, isso deveria ser para êle pessoalmente menos grave do que o ser o seu nome incluído num documento falsificado, abusando-se da sua boa fé, não se fazendo mesmo caso de qualquer recusa, se S. Exa. a formulou. E se o Sr. Alfredo de Magalhães ainda até agora, não pronunciou, que eu saiba, uma única palavra do indignação contra o acto abusivo que contra êle se praticou, incluindo-se o seu nome sem sua autorização, sem seu desejo ou sem sua vontade num suplemento burla ao Diário do Govêrno, é lícito acreditar que um tal procedimento constitue e tinha necessáriamente de constituir um novo indício contra a possível comparticipação de S. Exa. no movimento que se projectava.

O Sr. Vasconcelos e Sá: - O Sr. Ministro da Guerra tambêm lá estava incluído!

O Orador: - S. Exa., na conversa havida com o Sr. Machado Santos, segundo as suas próprias declarações, aconselhou êste senhor a que se servisse do Sr. Coelho de Carvalho, como intermediário, para que êste, procurando o Sr. Presidente da República, fizesse junto dele uma diligencia tendente a ver se se poderia ainda evitar o movimento.

Mas há mais. O Sr. Alfredo de Magalhães declarou, duma forma terminante, embora pelas suas palavras se não conclua que o dissesse a Machado Santos, que não poderia jamais entrar no movimento por o julgar extremamente perigoso numa ocasião destas, podendo mesmo arrastar à guerra civil e até à perda da nossa autonomia pela intervenção estrangeira. E, no entretanto, a recusa de S. Exa. a participar no movimento, a recusa de S. Exa. a fazer parte do Govêrno que do movimento revolucionário sairia, se em algum, momento foi formulada, é tam frouxa e débil que o seu nome apareceu no Diário do Govêrno-burla. Sendo S. Exa. prevenido pelo Sr. Álvaro Poppe, quando ainda estava em liberdade, não dá um passo, nem pronuncia uma palavra para alijar a responsabilidade do acto e negar que tivesse dado a sua autorização.

Áparte do Sr. Malva do Vale, que não se ouviu.

Não respondo aos apartes porque sou surdo, mas, mesmo que os ouvisse, não responderia.

Nas declarações do Sr. Alfredo de Magalhães há a asseveração de factos manifestamente inexactos, e só isso bastaria para tirar a todas as afirmações de S. Exa. todo o possível grau de credulidade. S. Exa. afirmou que jamais havia conspirado na sua vida.

Essa declaração, sabe-o hoje o país, não é verdadeira.

S. Exa. conspirou no tempo da monarquia, uma e muitas vezes, como está averiguado por factos indiscutíveis, apesar da insistência com que nesta Câmara procurou desdizer a verdade esmagadora, afirmada por tantos que, quer directa, quer indirectamente, tiveram conhecimento dos seus actos de conspiração.

Só esta afirmação de S. Exa., em contrário do que se prova, tira todo o grau de credulidade a tudo quanto S. Exa. diz na sua interpelação, que, sem dúvida, seriam causas suficientes para estabelecer as provas iniciais que a lei exige para a pronúncia.

Mas, nas declarações do Sr. Alfredo de Magalhães, há qualquer cousa de mais grave ainda.

S. Exa., como já tive ocasião de referir, declarou que não tinha tomado parte no movimento de 13 de Dezembro, que, disse S. Exa. podia arrastar o país à

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guerra civil e até à perda da sua autonomia pela intervenção estrangeira.

Quem era o iniciador e o dirigente dêsse movimento?

O Sr. Machado Santos.

Todavia, o Sr. Alfredo de Magalhães, sabendo que êsse homem teimou em fazer um movimento que podia levar o país à perda da sua autonomia, não deixou de fazer o elogio dêsse homem, do seu carácter e de enaltecer os seus sentimentos perante os representantes da Nação, reunidos nesta casa do Parlamento!

Mas mais ainda: S. Exa., sabendo a que funestas consequências podia arrastar essa obra. como a da perda da nossa autonomia, sabendo que êsse movimento era extraordinariamente perigoso, e, portanto, devendo ser repelido por todo o bom patriota, S. Exa. não duvidou em concluir as suas primeiras considerações dizendo que êsse movimento, que, na sua opinião, nos podia levar à perda da nossa independência, só há-de fazer, sejam quais forem as providências e medidas de repressão do Govêrno, porque êsse movimento, ainda que anti-patriótico, é destinado a tirar esto Govêrno do poder!

Eu não assisti, jamais na minha vida, ao desfiar de tam desastradas incoerências, de tarn inconcebíveis contradições, como aquelas que surprêsamente ouvi sair da boca do Sr. Alfredo de Magalhães, que, arrastado pela sua paixão, se esqueceu de que num momento dêstes, solene, grave e decisivo para a nacionalidade, que é de nós todos, por detrás de nós está o país e naqueles lugares todos os Ministros são os signos representativos da defesa da Pátria, da necessidade do seu engrandecimento, da indispensável necessidade de todos os bons portugueses, em vez de procurarem diminuir o seu prestígio e a sua acção proveitosa e útil para o país, que não é dum só homem, que não pertence a nenhum partido, mas que deve viver com igual afecto dentro do coração e alma de todos os portugueses, procurarem ao contrário levantar as suas energias, não indicando como protesto as mais nobres e dignas das questões, as questões que mais profundamente interessam à vitalidade da nação, para simplesmente com elas mascararem os seus ocultos intuitos e fazerem por detrás delas a mais mesquinha, a mais inadmissível e a menos patriótica de todas as políticas (Apoiados da esquerda)!

Sr. Presidente: o Sr. Alfredo de Magalhães, na ordem das suas considerações, referiu-se a pretendidas ilegalidades da sua prisão! Assim disse S. Exa. que tinha sido preso quando ainda o Parlamento não tinha autorizado o Govêrno a proceder a prisões de Deputados. S. Exa. disso que pouco percebia de leis. É certo! Mas S. Exa. sabe. apesar do seu precário conhecimento das disposições aplicáveis por lei, que existe na nossa Constituição um artigo, que é o 17.°, que diz o seguinte:

Leu.

Ora o Sr. Alfredo de Magalhães ficou muito surpreso por ser detido quando jantava no seu hotel, e tirou daí í actos, que pretendeu tornar hilariantes, dizendo que era o seu flagrante delito juntar no seu hotel. Há, porêm, um artigo na nossa Novíssima Reforma Judiciária, que define o que seja flagrante delito. Diz assim:

Leu.

Então, Sr Alfredo de Magalhães, nu hora em que foi preso no seu hotel, distribua-se ou não pelos quartéis, entro as praças da guarnição de Tomar e por outros lugares, o Diário do Govêrno - burla, em que V. Exa., sem protesto nenhum seu, aparecia como Ministro? Se se distribuía, creio e não a ninguêm pode restar dúvidas de que se estabelecia o flagrante delito, em que êsse facto ora um dos elementos constitutivos. Estava-se fazendo espalhar, não só num lugar, mas em vários, a notícia, a que se queria ligar a autoridade dum Diário do Govêrno que para êsse fim foi falsificado, de que havia um novo Ministério de que fazia parte o Sr. Alfredo (b Magalhães como Ministro das Colónias, sem que S. Exa. tivesse tido um instante para desmascarar os embusteiros, apesar de, pelas suas próprias afirmações, já ter conhecimento de que o facto se estava dando (Apoiados).

No Ministério-burla, e sem que S. Exa. houvesse praticado o menor acto demonstrativo de que não colaborava em um tal movimento, o nome de S. Exa. aparecia, sem que pelo contrário houvesse uma manifestação do que protestava por qualquer forma contra êle, como aliás até hoje não protestou.

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Vem portanto esta pregunta:

Mas se o movimento tivesse triunfado, S. Exa. estaria, ainda que por pouco tempo, investido na pasta das colónias? Aceitaria ou não o lugar que lhe marcavam e que ainda não declarou se aceitava?

Quanto ao tempo em que S. Exa. esteve preso, o Sr. Presidente do Ministério já deu resposta a todas as conseradições apresentadas pelo o Sr. Alfredo de Magalhães, e eu notei, permita-se-me a expressão, que é correcta, embora de feição popular, que S. Exa. abespinhou-se pela natureza da resposta do Sr. Presidente do Ministério.

Mas a resposta foi perfeita e S. Exa. tomou essa atitude porque não é homem de leis, não sabe de direito, e assim tirou conclusões erradas. O Sr. Alfredo de Magalhães, tendo sido preso, fez referências a um Deputado evolucionista; ao Sr. Machado Santos, ao Sr. Simas Machado e ao Sr. Coelho de Carvalho, pelo menos.

S. Exa. devia saber que u lei. de maneira positiva exige que se façam investigações e que era indispensável fazer investigações sôbre as referências que S. Exa. apresentara a A, B, ou C e se elas tinham fundamento.

Necessariamente essas investigações demandavam um certo tempo, de mais, amais num processo em que havia dezenas de presos a serem ouvidos e a fazer as necessárias e indispensáveis confrontações, a ouvir as numerosas testemunhas indicadas pelos numerosos acusados, o que tudo demandava um trabalho pormenorizado e de muitos dias que habilitasse a justamente serem restituídos à liberdade os que o devessem ser.

V. Exa. não esteve preso 30 dias, como disse, mas só durante o tempo que decorreu desde que V. Exa. prestou declarações em face do Sr. Juiz de Investigação até que foi pôsto em liberdade.

Passemos agora, Sr. Presidente, à parte da interpelação do Sr. Dr. Alfredo Magalhães, que versou sôbre a política geral do Govêrno.

Disse o ilustre Deputado, nas suas primeiras considerações, que era absolutamente indispensável terminar com êste regime de mistérios e de silêncio, em que o Govêrno nega ao Parlamento toda a sua acção fiscalizadora, não se pondo assim em nenhuma espécie de contacto com a Nação, de que está arredado e de que e"tá divorciado.

Sr. Presidente: eu amo e respeito o regime parlamentar, com um amor, se não superior, pelo menos igual àqueles que aqui, estrondosa e por vezes espectacúlosamente, proclamam a sua paixão, a sua ternura pelo respeito e pela observância das regalias parlamentares.

Em nenhum momento da minha vida eu me encontrei ao lado daqueles que, em tantos lances, tem procurado ferir com os golpes mais traiçoeiros, mais decisivos e mais destruidores as regalias parlamentares.

Jamais! Mas eu entendo que dentro dum regime parlamentar, há, primeiro que tudo, a respeitar os princípios que êsse regime para si próprio livremente talhou como disciplina. E emquanto os Parlamentos existirem, êles terão do falar invariavelmente pela voz e pelo voto da sua maioria.

Eu não nego o princípio de que as minorias tem sempre o direito do protesto; mas nego veementemente o direito que as minorias querem arrogar-se, de, em nome da pretendida defeza de regalias que querem atribuir-se, terem por objectivo esmagar e calcar as regalias dos outros.

Fala-se muito numa habilidosa frase em que se quere afirmar que os votos da maioria podem transformar-se por vezes numa verdadeira tirania, a dentro dos Parlamentos. Mas esta afirmação é feita por aqueles que querem que a vontade de todos seja apenas submetida à sua vontade pessoal; afirmam-no aqueles que contra o princípio estabelecido dentro dos regimes parlamentares da supremacia do número, querem suprir a falta de predomínio dentro duma Câmara, com esta argumentação, quando é certo que êles não souberam conquistar da Nação a decisiva corrente de opinião pública que os levasse a serem escolhidos como seus representantes.

E então querem destruir o princípio fundamental da vida dos Parlamentos, arvorando em face da maioria a tirania do tumulto, da desordem, da perturbação, para procurarem suprir aquilo que da Nação não podem obter pelos seus erros, pela sua detestável orientação, fazendo com

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que a confiança dos eleitores se lhes negue e não os traga aqui.

Nós representamos aqui toda a Nação, mas emquanto nós, maioria, formos maioria, é o nosso voto que há-de prevalecer. De maneira que as acusações de meia dúzia de pessoas não podem ter significação que iluda nem engane aqueles que me estrio escutando, que a todos nos julgam e que amanhã, de novo, lhes negarão a sua confiança para no-la atribuir.

O Sr. Alfredo de Magalhães terminou por censurar o Govêrno pelo anunciado projecto de ir êle fazer pelo país a propaganda política, pondo-se assim em contacto com o povo, quando essa propaganda é necessária, não para o Govêrno, mas para todo o país, para todos os patriotas que sinceramente desejam, de todo o coração, ver os seus compromissos solucionados com honra.

Mas o que é certo, Sr. Presidente, é que o Sr. Alfredo de Magalhães compreendeu bem que num momento desta natureza, de perigo e alarme para a Nação inteira, o país não suportaria que alguêm viesse levantar dentro do Parlamento questões do mesquinha política, e quis por isso mascarar a sua interpelação com um assunto que tem um interesse vital para a Nação, e assim veio falar-nos em possíveis e imaginários perigos quanto à nossa província do Moçambique.

S. Exa. seguiu o caminho mais perigoso e condenável trazendo à discussão do Parlamento um tal assunto, não como fariam aqueles que sinceramente estremecessem, no receio de que amanhã a nação se pudesse encontrar com uma tam ruinosa contingência, dando fôrça ao Govêrno, dando-lhe aplauso, dando-lhe incentivo, declarando-lhe firmemente que todos, como um só homem, se colocariam ao lado dele; mas, antes, fazendo-lhe insinuações as mais infundamentadas e perigosas no seu intuito e na finalidade a que visavam.

Podia esperar-se isto de quem, como S. Exa., diz conhecer a situação da nossa província, de quem, como S. Exa., tem as responsabilidades de haver já desempenhado as altas funções de governador de Moçambique, de quem, como S. Exa., tem no passado um nome que lhe empresta autoridade e prestígio? Felizmente os receios por S. Exa. formulados, como teve ensejo de pôr em releve o Sr. Presidente do Ministério, não tem o mínimo fundamento.

Mas o que é certo, como disse, é que é êste problema o aspecto mais grave da interpelação de S. Exa., porque nos dá a medida dos processos que porventura estão dispostos a seguir os que compõem hoje a direita da Câmara, não hesitando em simular que agitam problemas de interesse vital para toda a nacionalidade para encobrir as discussões tumultuarias que pretendem.

Quanto ao que foi dito pelos Srs. Malva do Vale e Sim as Machado, vejo-me forçado a pedir a S. Exas. desculpa de lhes não responder, porque o facto é que S. Exas. nada disseram nem a respeito de política geral do Govêrno, nem a propósito dos acontecimentos de 13 de Dezembro; S. Exas. limitaram-se a derimir e a discutir os motivos, as causas, as razões, as determinantes que os levaram a afastar-se do Partido Evolucionista.

Nada tenho com essas questões caseiras, partidárias, que nada me parece que interessem nem à Câmara nem à Nação.

Nas palavras do Sr. Malva do Vale houve entretanto uma referência a que me cumpre responder.

O Sr. Malva do Valo quis fazer acusações ao Sr. António José de Almeida e à maioria a propósito da União Sagrada; queria S. Exa. recordar palavras excessivas, termos e expressões por S. Exa. classificados do afrontosos que haviam sido pronunciados ou escritos, quer pelo Sr. António José de Almeida, quer pelo órgão do Partido Evolucionista.

Com muita serenidade, e só porque a isso sou forçado, responderei a S. Exa. em poucas palavras. Aquilo que hoje S. Exa. tanto estranha, não o estranhava há poucos dias, porque se conservava dentro do Partido Evolucionista.

Já depois da União Sagrada, que S. Exa. aplaudiu, procurava, com o melhor do seu esforço, alcançar a aproximação dos dois partidos políticos que S. Exa. entendia que deveriam, pelo seu próprio amor, pelo seu próprio pundonor e decoro, esquecer todos os excessos das paixões pessoais e partidárias para darem, neste momento, à República e à Pátria uma ga-

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rantia da sua defesa. Era isto o que S. Exa. entendia há poucos dias.

Hoje, por motivos que não quero apreciar, por motivos que eu posso mesmo desconhecer e que quero mesmo desconhecer, S. Exa. mudou do pensar e aquilo que lia meia dúzia de dias S. Exa. considerava indispensável para a salvação do país, para o bem e para a felicidade da Pátria, na conjuntura grave e difícil que ela atravessa, deixa de ter agora a decisiva conveniência e a indispensável necessidade que tinha de realizar-se, para que nós todos, com honra, com desassombro, com elevação e com desinteresse déssemos à Pátria o que ela tem direito de nos exigir. Vejo que S. Exa., ao realizar-se a União Sagrada, não teve a compreensão do alcance que ela tinha e da necessidade patriótica que a ditava. Nós, os que trabalhamos por ela e que nos decidimos honrada e nobremente a admitir que tudo, em face do primacial interesse da Pátria, fôsse nada, que os mais duros excessos de ataque e os mais fundos agravos fossem generosamente esquecidos em sacrifício do holocausto à Pátria, cumprimos aquilo a que nos obrigámos nessa hora.

Mostremos, sem que no entretanto nenhum de nós saia do seu campo político e deixe de conservar em toda a sua acção a sua dignidade política e pessoal, que tudo esquecemos, porque uma só cousa lembra: - que uma hora chegou em que o interesse da Pátria exige de todos os portugueses unidade, harmonia e acção conjunta de vontade e decisão de vencer e triunfar!

Em esta hora tremenda para as liberdades, não deve haver divergências nem scisões políticas, e isso sempre proclamámos e proclamamos ainda, e bem desejaríamos que a nossa vontade trouxesse à mente perturbada de muitos a convicção, a persuação, a certeza de que só poderão nesta hora, como bons portugueses, proceder como nós procedemos, dando todos as mãos como irmãos de armas, unidos na mesma fileira impenetrável e invencível para escudar com os nossos votos, apoiar com os seus aplausos e fortalecer com o seu prestígio e fôrça os que se sentam nas cadeiras do Poder, venham êles donde vierem, seja qual for a sua proveniência partidária, porque nesse lugar representam o símbolo duma Pátria que a nós cumpre ajudar a salvar! (Apoiados).

Mais nada.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. João Camoesas: - Em nome da comissão de agricultura, imitido para a Mesa um parecer.

O Sr. Presidente: - Como o Sr. Deputado Malva do Vale pediu há pouco a palavra para explicações, não tenho dúvida em lha conceder, no caso de S. Exa. se comprometer a ser muito breve nas suas considerações.

O Sr. Malva do Vale: - Se V. Exa. se não opõe, acho preferível falar no fim do discurso do Sr. Moura Pinto, caso ainda subsista a razão que me levou a pedir a palavra.

O Sr. Presidente: - Esse alvitre não me satisfaz, pois no outro dia afirmou-se que eu, a respeito dum pedido de palavra para explicações feito pelo Sr. Jorge Nunes, a não podia conceder senão antes de se encerrar a sessão e fora da matéria em discussão.

Por isso acho preferível consultar a Câmara se V. Exa. deve usar da palavra desde já, ou no final da sessão.

O Sr. Malva do Vale: - Desisto da palavra.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se, para ser admitida à discussão, a moção do Sr. Alexandre Braga.

Leu-se e foi admitida.

O Sr. Moura Pinto: - Em cumprimento das disposições regimentais, visto falar sôbre a ordem, manda para a Mesa a seguinte:

Moção

A Câmara, considerando que o Poder Executivo violou a Constituição prendendo membros do Poder Legislativo fora dos casos ali expressos, continua na ordem do dia. - O Deputado, Alberto Moura Pinto.

Admitida.

Prejudicada.

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26 Diário da Câmara dos Deputados

Vai fazer no dia 15 um mês, diz o orador, que anunciou a sua interpelação acêrca da sua prisão, quando dos acontecimentos de 13 de Dezembro passado; e pôsto que para ela não tivesse pedido documentos, nem o sr. Presidente do Ministério dêles preciso para justificação das violências que o sou governo cometeu, ainda lhe não foi marcada. Não está. disposto a esperar mais tempo; e porque na interpelação que decorre cabe e se ajusta o sou caso, aproveita a ocasião para acêrca dele interrogar o chefe nominal do Govêrno, dispensando o espectáculo duma sessão privativa, não se vá dizer que o orador pretende gastar o tempo duina sessão a um Govêrno que o tem aproveitado de tal arte, que o País se encontra a caminho da fome! Gastar tempo a um Parlamento em que a maioria, para melhor o aproveitar e nada lazer, deu ao seu Govêrno as mais abusivas autorizações, autorizações para tudo, até mesmo para violar as leis, as liberdades e a Constituição! Não terá nas suas palavras modéstias falsas e só não quere ter injurieis, tira as justas violências de quem esteve privado da sua liberdade e se não preocupa com que se diga que êle vai tratar do caso pessoal da sua prisão. Êle, orador, entende que a sua pessoa, dentro de uma República Parlamentar, tem situação diversa da de simples cidadão e, se a respeito de cidadãos portugueses vexados, perseguidos ou presos, tem levantado a sua voz de defesa o protesto nesta Câmara, a sou próprio respeito usa de igual direito, engrandecido com a circunstância do ser um deputado da Nação, eleito por um círculo de gente honrada, e que truncilha, e que nele depôs em horas de oposição, sem coação, nem suborno, uma porção de soberania nacional igual á do qualquer Deputado honestamente eleito e bem mais sincera e verdadeira que aquela artificial soberania que o episódio sangrento de 14 de Maio, por acaso, por medo ou corrupção, depôs nas maus de alguns Senhores Deputados da maioria. O sou caso não é o vulgar caso pessoa mas sim o caso do Poder Legislativo afrontado, amesquinhado e perseguido pelos réus a quem um juís honrado e severo incomoda.

Por isso, usando da palavra na Câmara, para tratar da inqualificável violência sôbre si, como cidadão e como Deputado, exercida pelo Poder Executivo com a mais estranha das complacências por parte do Poder Legislativo, as primeiras palavras, que, perante o País, i para quem fala, ali profere, são dirigidas ao presidente da Câmara, que é o mesmo que presidiu á memorável sessão do dia 14 de Dezembro. Não pretende com elas fazer uma ofensa, mas faltaria a um dever e não exerceria um direito, se não deixasse consignado, nos diários do Parlamento português, a singular atitude dum seu Presidente, para que melhor se grave na memória dos seus contemporâneos e para admiração dos vindouros, quando por êles e a frio seja feita a história das cousas assombrosas que em Portugal se passaram em tam tormentosa fase da vida nacional. Lembra os factos e rememora a atitude de S. Exa. quando, depois das francas e honradas afirmações dele orador, sôbre a sua nenhuma comparticipação no movimento revolucionário, pretendia retirar-se da Câmara e, no átrio do Palácio do Poder Legislativo, por cujo prestígio e dignidade S. Exa. tinha de vela f, dois esbirros do Poder Executivo, ou, melhor, do Sr. Norton do Matos, se preparavam para sem delongas e cortezias diversas das usadas para criminosos comuns, lhe lançarem, a garra policial a êle orador, representante da Nação por votos honestos e conscientes, e que, perante a Nação, nesta sala, como lugar que ainda reputava lugar próprio, acabara de fazer desassombradas e francas declarações da sua inocência!

A iniquidade e a estúpida inutilidade do acto infame que se ia praticar, a afronta que êle representava para si, como homem que honradamente dissera da sua justiça: o vexame inflingido ao Poder Legislativo, do qual era membro, levaram-no a vir referir o caso á sua Câmara, convencido de que o desvairado raceiosismo duns, o ódio verde e cego de poucos e a docilidade de muitos, reagiriam nobremente virilmente, numa brusca solidariedade, feito de respeito pelo Poder que representavam, de camaradagem que é vulgar sentimento entre homens cultos que convivem o mesmo ambiente durante anos, de espirito de classe que não falta às humildes classes compostas de homens humildes, abstraindo já da consi-

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deração que deviam merecer declarações que, acêrca de factos de consciência, um Deputado da Nação fazia peranto êle, fácil como seria demonstrar ao outro dia que êsse homem faltara à verdade, e, como tal, não só não evitaria ser preso, mas ficaria para sempre desonrado, para sempre inutilizado nas suas públicas afirmações!

Há seis anos Deputado e Deputado depois do nunca assaz glorioso 14 de Maio, êle, orador, cometeu a imperdoável ingenuidade de julgar que o seu procedimento honesto e liai refrearia ruins paixões e impedida que elas fossem até o escárneo mais pungente que êle conhece, qual seja: o de homens, agremiações e, acima de tudo, poderes do Estado, se deprimirem o escarnecerem a si mesmo! E para que tal não acontecesse e para que ao menos à violência se tirasse o que nela havia de monstruosamente inconstitucional - requereu que a sua prisão se fizesse a dentro e com as formalidades que a Constituição exige parei um acto de tamanha transcendência e gravidade política.

Formulou o meu requerimento verbalmente. Êste requerimento era inspirado na razão que acaba de indicar e ainda noutra que neste momento não deve nem mesmo quere ocultar. Absolutamente inocente, êle pretendia tambêm evitar que a estúpida e inútil violência se consumasse, atirando-o para o montão das injustas prisões a elo, orador, que não exerce a profissão de mártir à sôbre posse, que não tenciona fazer-se aprovar revolucionário civil de intentonas partidárias, nem explorar essa perigosa casta republicaria demagógica no que ela tenha de fome, de ignorância, de falsa coragem ou até de inquieta e doentia bravura, para à sua sombra manter o seu lugar, melhorar a sua situação ou sequer inutilizar iniciadas sindicâncias aos seus actos, burlando depois pobres diabos, convertendo-os em novo perigo das instituições, ou porque a decepção os azede ou porque a corrupção os transforme em raivosos cães de donos sem escrúpulos, por conta dos quais ficam a morder!

Era bem humano, exclama, êsse fortíssimo desejo de fugir ao montão das injustas prisões, fonte dos maiores ódios, dos mais implacáveis rancores que nesta desditosa Pátria se estorcem e trazem a gente portuguesa enraivecida, não sendo um clamoroso inferno somente porque uma dolorosa cobardia nuns, o receio do pão de cada dia noutros, e uma calculada dissimulação na maior parte fazem com que, nesta terra desventurada, cada um oculte o seu ódio e o vá mordendo, emquanto espera a hora propícia da vingança. País em delírio êste, onde o Sr. Afonso e o seu partido dizem que espalharam a Bondade e o Sr. António José de Almeida diz que fez a Concórdia!...

Nesta hora e neste país quem há ali que lhe possa levar a mal que êle - inocente - procurasse fugir duma prisão monstruosamente feita, onde só iria buscar justificação para a sua maneira de sentir acêrca de homens públicos - transformando assim tais sentimentos, que porventura teriam em si a transitória duração que as paixões políticas, em certa medida, tem na alma dos políticos- em ódio profundo, o ódio que nasce da injustiça, ódio desta vez sagrado, visto que êle orador, é dos que entendem que as prisões injustas, ilegais e grosseiras, sem qualquer reparação moral às vítimas, lhes dão o sagrado direito de odiar? Quem podia exigir-lhe que voluntariamente caminhasse para essa espécie de Calvário iníquo, donde se resurge ardendo em sede de justiça e na ânsia de exterminar malfeitores conscientes? Por isso tambêm êle formulou o seu requerimento no sentido de ser autorizada a sua prisão, a fim de pôr a Câmara perante a responsabilidade da sua resposta.

E fez mais ainda, porque com alevantada nobreza e dando um vivo exemplo de respeito pelo Poder Legislativo, do seu lugar disse ao Sr. Presidente da Câmara que, se o Govêrno ou algum Ministro lhe garantisse que contra êle, orador havia provas ou somente indícios jurídicos da sua culpabilidade, êle, orador, depunha nas mãos da Câmara, por intermédio de S. Exa. o seu mandato, resignando-o, para que a violência que se consumasse o atingisse apenas como cidadão e não fôsse ultrage e vilipêndio do Poder Legislativo.

Que o Govêrno vexasse um cidadão, pouco importaria aos homens que se sentam naquelas cadeiras, mas que o Govêrno enxovalhasse um Deputado, isso já devia interessar ao próprio instinto de conservação do Parlamento!

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O Sr. Presidente indicou-lhe que formulasse o requerimento por escrito. Êle, orador, obedeceu e S. Exa. pô-lo à votação. Mas eis que. debaixo, esta Câmara que o queria preso mas que não queria assumir a responsabilidade da prepotência do Executivo, encontrou alguém que afeito a hábeis interpretações regimentais, com voz imperiosa, impôs que o requerimento do orador era sim proposta e não requerimento, de forma a abrir regimentalmente o alçapão por onde se sumisse a clara e franca afirmação da maioria, sôbre se sim ou não entendia que êle, orador, devia passar, da sala do Poder Legislativo, às mãos dos esbirros do Sr. Norton de Matos e daí às do carcereiro Sr. Leote do Rêgo, tambêm Deputado da Nação.

O Sr. Presidente, que antes classificara o seu papel de requerimento, ouvida a voz tempestuosa dêsse outro Deputado da Nação, consultou a Câmara que, sendo para êstes efeitos somente a maioria, o classificou de proposta, fugindo depois às responsabilidades pela sua não admissão! Esta foi a atitude de S. Exa. e êle, orador, faltaria ao que deve a si próprio e ao país se a não rememorasse, hoje que S. Exa. preside a esta sessão. S. Exa. é pois o presidente que o deixou prender depois das suas honradas afirmações! Em obediência ao Regimento, permitirá S. Exa. que êle continui invocando a Presidência.

Sr. Presidente: há que definir a attitude da maioria.

Seria horrível se não tivesse encontrado nesta Câmara, alêm dos seus partidários, uma dúzia de Deputados de consciência altiva e nobre resistência que, corajosamente, votaram o seu papel como requerimento. Para êles o seu eterno reconhecimento e a sua maior consideração.

A atitude da maioria foi singular e única em parlamentos do mundo, excepção feita da Alemanha, da Áustria, da Turquia e da Grécia, onde os governos prendem os Deputados que os incomodam porque clamam a verdade! Depois das suas declarações na sessão de 14 de Dezembro, e que êle, orador, expontâneamente viera fazer à Câmara, quando já sabia que o ódio do Govêrno o farejava para presa e quando - se não estivera inocente - poderia ter fugido, como quere a maioria que êle aprecie e julgue o seu procedimento? Ou ela não acreditou as suas afirmações e êle fica com o direito de a considerar na conta em que todo o homem honrado considera quem lhe faz a afronta de o não acreditar acêrca de factos íntimos e próprios, ou êle, orador, tem o direito de supor que a consciência da maioria se julgava capaz de iludir o Parlamento e a Nação, em conjuntura análoga, e o juízo que daqui deriva não é diverso do que êle, orador, tem o direito de formular na primeira hipótese. Não há que sair disto: ou a maioria o menosprezou, ou se menosprezou a si própria. Êle, orador, sabe que a maioria afirmara que o quis menosprezar. Tanto melhor se assim for, porque então não negará ao orador igual direito.

Mas porque foi preso?

Se o Sr. Alexandre Braga, defensor de tanta causa infeliz, e hoje acusador de pessoas que deviam merecer-lhe o maior respeito, fôsse o Ministro que o tivesse mandado prender, diria êle, orador, que fora preso... por palpite?

Mas, assim, como se explica?

O seu nome não figurava no Diário do Govêrno da revolução, que tem sido a pedra em que o Govêrno amola a sua justificação relativamente a outros Srs. Deputados e a outros presos; nenhum acto extorno da sua vida em Lisboa o indicava envolvido no mistério duma conspiração, como ao diante mostrará, quando falar do seu interrogatório! Se o Poder Executivo fôsse dignamente exercido e não fôsse a inconsciência, a incompetência, o desvario, a aventura, o crime que lisonjeia hordas estúpidas ou aceleradas, poder que pretende servir-se de autoridade como os caceteiros de profissão se servem de cacetes na confusão duma feira, teria ponderado a gravidade política, a alta importância moral que resultaria de obrigar um faccioso e acomodando parlamento a deprimir-se a si próprio, violando a Constituição e autorizando a prisão, por lotes, dos seus membros, abrindo assim um monstruoso precedente que amanhã será seguido, sabe Deus por que espécie de tiranetes que o país ainda tenha de suportar depois da saída dos que para aí estão!

Prender Deputados, sem indícios tam seguros, dirá: sem provas tam cabais que,

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sob honra, o Ministro pudesse garantir à Câmara a necessidade e justeza dessas prisões, ou é querer mostrar o Poder Legislativo na mais degradante subserviência, ou é permitir que em certos momentos Ministros vingativos e maus, e vê-se que os há com ruins sentimentos, possam exercer represálias sôbre os seus juizes ou libertarem-se da sua fiscalização... prendendo-os. É a mais indigna burla do sistema constitucional! Prender Deputados!

Por muito que esta República de União Sagrada seja só República porque a má vontade dos monárquicos teime em lhe chamar o mais típico exemplar desta forma de governo; República porque, os republicanos alheios ao mesquinho conúbio de dois partidos que sagradamente se odeiam e desprezam, tem na alma uma viva fé no regime, como forma de governo, uma cada vez mais fervorosa esperança de o modificar consoante as necessidades e aspirações do país; República, porque democráticos e almeidistas a acham, os primeiros a forma ideal de governarem, os segundos a única forma de fingirem ser governo, dentro da assistência política da dinastia Costa; por muito que esta sombra de República a uns infanda pena, a outros provoque o ódio e a outros desperte o medo, sendo para certos o regime do seu mais eficaz proveito; por muito, emfim, que esta malaventurada República seja o que para aí está - pretendendo ela simular de regime parlamentar, o ser Deputado, por mais que se queira lisongear a baixa igualdade dos clubs suspeitos, é alguma cousa diversa da simples situação de vulgar cidadão, nos tempos que correm, aos riscos duma sombra de suspeita ou duma infamo denúncia do primeiro "patriota" que pertença à bem alimentada "fauna dos defensores"!

Se o regime quere simular aparências de parlamentar, tem de aceitar, como indiscutível condição, a inviolabilidade relativa aos seus representantes, demarcada na Constituição, inviolabilidade que a independência dos poderes, o bom senso e próprio instinto de conservação manda riam respeitar até o máximo que as conveniências políticas exigissem.

Porque se não procedeu para com Deputados com essa rudimentar cautela?

Porque se recorreu ao grosseiro e falso embuste duma proposta de lei a breve trecho repelida até pela maioria e, depois, se recaiu na vilíssima chicana do flagrante delito?

O flagrante delito!

Tocará dentro em breve nessa tosca e torpe armadilha, destinada a enganar no país quem, sôbre ser incauto, fôsse ainda estúpido!

Porque foi preso?

Era preciso ao Govêrno criar à União Republicana uma situação de comprometida no passado movimento, pois que nas refalsadas calúnias de exportação para o estrangeiro, se diria que o movimento fora feito a soldo do já celebrado ouro alemão e, assim, mais uma vez, correria mundo o germanofilismo do seu partido.

A perfídia já está gasta dentro do país, como fita a que somente assistem, hoje, uma claque, sempre a mesma e conhecida, e mais alguns comparsas dos que vão gozando as vantagens de se ter modificado em seu proveito um velho anexo português acêrca do pão do nosso compadre, e que mais adequadamente se dirá agora: dos bens dos nossos inimigos grossa quantia aos nossos amigos.

Era preciso, repete, exportar a calúnia para o estrangeiro e, para tanto, vá de lhe servir o prato saboroso, a peça comprovativa de um Deputado unionista preso, porque o Govêrno sabe o profundo respeito que há nos países civilizados pelas garantias dos cidadãos, o alto prestígio de que gozam os representantes do povo e o pundonor e brio com que os Poderes Legislativos dêsses países guardam e defendem a sua independência e imunidades. E como lá se não concebe a desbragada invasão de poderes que há neste mal aventurado país, dificilmente se acreditaria que o impudor, aqui, chegasse ao ponto de se prenderem Deputados sem fortíssimos indícios, sem provas quási completas.

Depois o Govêrno tambêm sabia que da calúnia alguma cousa ficaria e pelo Ministério dos Negócio Estrangeiros, que devia estar abonado, se completaria a torva e sinistra missão de desacreditar em terras estrangeiras, portugueses, republicanos e até mesmo um partido do regime!

O ser unionista foi, pois, uma das mais fortes razões da sua prisão!

O medo foi outra razão.

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30 Diário da Câmara aos Deputados

O medo do Govêrno era grande e o medo é um conselheiro, porque homens ou Govêrnos com medo, são capazes de tudo, desde a fuga até o crime - e neste Govêrno há homens que muito devem temor a hora da justiça!

Mas era preciso tambêm intimidar o país, mostrar a todas as consciências revoltadas que o Poder não tem freio nem escrúpulos!

Poder que não respeita o direito, a justiça, a forma do processo e que pela Constituirão tem o maior despreso. precisava objectivar o seu descaro, prendendo os próprios representantes da nação, de maneira que, cada cidadão e cada consciência, sentissem que nesta República de União Sagrada nada há que seja sagrado.

É o impudor do supremo abuso!

Enxovalhar tudo, crenças, opiniões, partidos, homens, como em certas regiões infelizes, infestadas por malfeitores, êstes tudo assolam e nada poupam para viverem do terror, paralisando energias e reacções na defesa!

Poder Executivo absorvendo todos os Poderes, manejando o Legislativo-maioria sem uma rebeldia - injuriando ou pretendendo corromper as que altivamente surjam e prendendo as minorias que incomodem, êsse sombrio Poder Executivo mediu bem a grandeza do atontado perante o país, onde quere governar explorando o pavor como um apache.

Há no Govêrno quem sinta êsse prazer sinistro de tudo amarfanhar e depois - em fúria do tiranete e com atitudes napoliónicas, estudadas em estampas baratas - se voltar para a nação em ar de desafio. E se para alguns Srs. Deputados as razões foram certas razões das que apontou, para êle, orador, ainda havia outra: era o ódio pessoal-ódios que ali se sentam nas cadeiras do poder.

Dalguns nem valo a pena falar, são antigos e anteriores à sua carreira de parlamentar o êle, orador, só quere dar conta ao país dalguns que tenha provocado no honrado exercício do seu mandato.

O país sabe qual foi a sua atitude na célebre e misteriosa questão do incêndio do Depósito de Fardamentos, a sua atitude dentro da comissão de inquérito, a sua atitude na Câmara no debate que a tal respeito se levantou.

Mas o país ignora e êle. orador, diz-lho agora, que foi êle que na passada sessão, quando do bodo final dos últimos dias, impediu - sim, foi êle que o impediu, exclama! - que se convertesse em lei, um projecto em que, à sombra duma obra de alta justiça ao tenente-coronel Massano de Amorim, valente soldado de guerras do África, se pretendia fazer aprovar uma disposição que dispensaria os Ministros militares do tirocínio num pôxto, quando em exercício na pasta!

Ao país e aos seus eleitores, afirma, porem, que não modificará, por ter sido preso, os seus processos de oposição, em harmonia com os ditames da sua consciência.

É o momento, em seu entender, de fazer a história da sua prisão, e, como não tem tempo para escrever as suas memórias e não teve a oportunidade nem a vocação de certo estadista eminente que, no tempo da monarquia, em três ou quatro dias de detenção, escreveu longas memórias do cárcere, permita-se-lhe que na Câmara, e como Deputado da Nação, refira a sua passagem pelas várias prisões durante catorze dias.

Seguiu do Paramento para bordo, passando pelo Arsenal de Marinha, onde encontrou o Sr. Leote do Rêgo, tambêm Deputado da Nação, olímpico potentado desta desventurada República, episódico dono duma infeliz marinha do guerra, pequena, pobre e bem digna de melhor sorte. Não se dirigirá a êle com a violência a que tinha direito por motivos que a Câmara respeitará, mas não podia deixar em absoluto silêncio, como Deputado, uma entidade oficial que peza como chumbo na alma da Nação.

Daí foi para bordo do seu navio, onde, deve dizer em abono da verdade, foi tratado com toda a deferência pelos oficiais dêsse comando. As tantas da noite. 11 horas talvez, depois de 3 horas de cativeiro ali, foi entregue ao comandante da Limpopo, valente oficial e bondoso coração, a quem deixa, naquela Câmara, a expressão do seu profundo reconhecimento. Dois dias depois recebeu êsse navio ordem de fazer viagem de vigilância e "enjoo" para fora da barra, viagem em que sentiu o propósito de ser vexado e agravado, porque era, acima de tudo, uma violência inútil e escusada, que, ten-

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do sido exercida sôbre êle, o foi sôbre outros. Vexame, violência e agravo contra todos os preceitos legais, demonstrando a prepotência e o nenhum cuidado dos carcereiros com a vida e sossego dos presos que lhes estão confiados. Talvez quem dava essas ordens pensasse que êle reclamaria no sentido de a evitar, desconhecendo, sem dúvida, que, por maiores que fossem os riscos ou a incomodidade, nunca faria a tal respeito qualquer reclamação.

Não engrandece êsse risco porque, se não pretende certidão de vítima, tambêm não quere ser considerado e reconhecido como herói, mas a verdade é que houve. pelo menos, uma situação absolutamente ilegal, um propósito de fazer correr os presos por incomodidades abusivas e dispensáveis. E, se insiste neste incidente, é porque o mesmo se fez ao irmão de Machado Santos e não sabe a quem mais se tem feito.

Pretendia o Sr. Leote do Rêgo fazê-lo enjoar? Esqueceu-se o comandante da divisão naval de que quem, como êle o como todo o país, tem no Parlamento, e lá fora, vivido sob o Govêrno da União Sagrada... já não enjoa facilmente.

Transitou depois dêsse navio para bordo do S. Gabriel, e é seu dever afirmar ali, para que fique consignado indelevelmente, que encontrou lá espíritos cultos e corações generosos, que trouxe no coração como amigos, o que o leva a lamentar que êste país seja tam desditoso e tam insensatamente governado que ainda não tenha dado à nossa marinha de guerra os meios justos para cumprir uma missão que fácil e nobremente ela saberia desempenhar. Passadas horas era metido dentro dum vapor do Arsenal, e conduzido para o vapor Bastilha, para interrogatórios. Menos feliz do que o Sr. Alfredo de Magalhães e outros presos a quem se concedeu a justa deferência, que S. Exa. aqui agradeceu, de lhe pouparem o vexame inútil, mas humilhante e miserável, de o meterem dentro duma escolta, deve essa amabilidade ao Sr. Ministro da Guerra e não sabe, nem quere saber, a qaem mais, porque espera ser-lhe grato toda a vida; e, debaixo de escolta, com muitos marinheiros e muitas baionetas, como um preso perigoso, foi conduzido para bordo do vapor Porto. Como devia estar contente, que singular prazer devia sentir êsse homem, o Sr. Norton de Matos, sabendo que naquela hora êle, orador, caminhava entre uma escolta com todos os companheiros duma revolução... em que não entrara!

Teve aí ocasião de verificar o tratamento que se dava aos presos, e se pode garantir ao país que não era mau, é ... "porque não era nenhum"! Estavam ali alguns presos que o vapor do Arsenal recolhera, quando nem sequer tinham acabado de almoçar, desde as 10 horas da manhã; eram 8 da noite e ainda não tinham jantado, e ninguêm lhes veio preguntar por tal. Não havia, pois, que dizer mal da comida! Foi então que êle, orador, e o Sr. Dr. Reis Santos e outros abriram uma subscrição modesta, para com o seu produto pagarem com que essa gente pudesse comer. Depois, e por deferência especial dum amigo, cujo nome não cita para não o indicar à vingança do Govêrno, foi retirado dessa sala com o Sr. Dr. Réis Santos e transferido para outra sala onde estavam os tremendos conspiradores, seus colegas nosta Câmara, Alfredo de Magalhães, Tamagnini Barbosa e outros tambêm de qualidade e igualmente muito perigosos... O cuidadoso receio de que entre si trocassem impressõe?, se entendessem uns com os outros acêrca dos segredos da conspiração e engendrassem as mútuas defesas, era tanto, que estiveram em "absoluta comunicabilidade" e sem a menor vigilância.

A repugnante força da nossa culpabilidade! A incomunicabilidade para êle, orador, só veio depois do seu interrogatório! E é chegado o momento de falar acêrca das provas contra si aduzidas. Ora o Sr. Presidente do Ministério deve ter ali o seu depoimento, que até hoje lhe não foi entregue, apesar de há dias o ter requerido e de ter mais direito, como Deputado, a usar dos documentos que vem à Câmara do que mesmo um membro do Poder Executivo. O seu depoimento, é seu, é a sua maior defesa, é o seu melhor ataque contra a inqualificável violência da sua prisão e contra a odienta duração do seu cativeiro.

S. Exa. não tem o direito de lho negar e não lho negará, e por isso daquele lugar lho pede. Não o quere ver sujeito às torturadas interpretações de S. Exa. e

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que, como remate depois, lhe aconselhe posturas históricas, inúteis para êle que as não pretende nem procura. Não deseja correr o risco de lapsos de memória estrondosamente aproveitados para efeitos de conhecida argumentação e retórica.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias (António José de Almeida): - Em verdade tenho aqui o depoimento do Sr. Deputado Moura Pinto e não tenho duvida em confiar-lho.

Uma voz da direita: - Pois se aquilo que êle traz não é uma pasta, é um cartório da Boa Hora!

O Orador: - Agradece e acrescenta: vai, pois, ler à Câmara o seu interrogatório. Devo dizer préviamente que foi com a mais absoluta tranquilidade que respondeu, aquela tranquilidade de quem estava seguro da sua inocência e seguro mesmo do quem nem com má fé conseguiriam engendrar-lhe culpabilidade. Mas o seu interrogatório é o fruste interrogatório, que não há o direito de fazer a um Deputado da nação, que, para ser preso, devia ao menos ter contra si a sombra duma prova que constituísse um perigo para o Poder. Mostrará à Câmara que espécie de cousas lhe preguntaram, ociosas e infantis, cousas inúteis que tanto podem ser preguntadas a um cabo de polícia, como a um sargento reformado.

As respostas quis que fossem escritas sob sua honra, porque se não reputava arguido e queria depois considerar os seus acusadores homens que mentiam, homens desonrados! Mas nem o próprio Govêrno o reputava com culpabilidade. Era tudo uma mesquinha farça de baixas e repugnantes conveniências políticas e de ódio torvo e mau. E que o Govêrno e, muito especialmente, o Sr. Ministro da Guerra, apenas o queriam preso e vexado, tirando em seguida dessa inconfessável violência os lucros duma vesga política!

O Govêrno sabia que êle não tinha culpabilidade e entre as assersões já apresentadas, vai contar à Câmara um facto que o demonstra:

Um seu companheiro de desdita, homem honrado, ouviu, depois do interrogatório dele orador, uma conversa entre o juiz de investigação e um agente militar qualquer, digníssimo representante do Sr. Norton de Matos na tarefa de violar as liberdades públicas, os direitos dos cidadãos e o prestígio do Poder Legislativo.

Não se referirá às pessoas porque da sua tribuna do Parlamento nem sequer as vê e só vê o Govêrno que tem ali na sua frente e que é o único responsável. Êsse juiz afirmara ao tal agente policial militar, e naturalmente com pesar, que êle não tinha nenhuma culpabilidade, que contra si nenhum indício havia. E o testemunho dêste juiz, se em verdade êle manifestou esta impressão, devia ser insuspeito, porque é êle um magistrado de tal quilate que. referindo-se à abusiva prisão de João de Deus Guimarães, escreveu para público uma carta, depois dêste cidadão solto pela evidente demonstração da sua inocência, em que professa a assombrosa doutrina que passa a ler à Câmara: "em meu entender, as suspeitas que sôbre êste senhor recaem, embora não juridicamente provadas, tem todo o fundamento".

Exclamações da direita da Câmara.

O Sr. Brito Camacho: - Parece um juiz miliciano!

O Orador: - Juiz da certeza moral, êste juiz de direito deve ser considerado como um valioso elemento pelo Poder Executivo!

Mas vê que há no seu depoimento uma parte que o Sr. Presidente de Ministério traz sublinhada e que é a que se refere à declaração de que o seu partido não podia ter interferência nesse movimento por conveniências de ordem internacional. E se êle, orador, tem dentro do seu partido lugar que o inhibe de ir de encontro a resoluções desta magnitude, a não ser abandonando-o, porque não foi logo pôsto em liberdade depois de tam lógicas declarações e de tam terminantes provas de inocência?

O Sr. Dr. Alfredo de Magalhães esteve preso 34 dias porque no dizer do Sr. Presidente de Ministros se embrulhou - o termo é calão policial e usou-o S. Exa. - no seu interrogatório lido e explorado neste Parlamento. E o Sr. Alexandre Braga, que hoje veio preparado para a Câmara, como advogado da acusação oficioso, por parte do Sr. Presidente de Mi-

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nistros contra o Sr. Alfredo de Magalhães, entre várias possibilidades de intenção criminosa dêste meu distinto colega e prezado amigo, apontou tambêm as que podiam derivar do seu interrogatório, fazendo assim uma paciente acusação... pelo método Dolivais, ou seja pelo cálculo das probabilidades!...

Mas então êle, orador, porque esteve preso mais onze ou doze dias depois do interrogatório? Também porque se embrulhou?

Mesquinha comédia em que a maldade aparece sem disfarce! Manigância jurídica igual à safada, deslavada e inútil manigância do flagrante delito! É que em Portugal, há certo tempo a esta parte, a jurisprudência govcrnativa abre e funciona como navalha de ponta e mola, e sentem-se-lhe os estalinhos fadistas quando tranquilamente passados junto às escuras esquinas desta horrível política. O país não se ilude, porêm, com êstes flagrantes delitos próprios, como já disse, para iludir apenas quem, sendo incauto, ainda por cima seja estúpido. De resto, para que era então precisa ao Govêrno a autorização inconstitucional que êle veio solicitar à sua complacente Câmara, no sentido de lhe permitir novas prisões e sancionar as já feitas de Deputados da Nação?

Diz o artigo 17.° da Constituição:

"Nenhum Deputado ou Senador poderá ser ou estar preso, durante o período das sessões, sem prévia licença da sua Câmara, excepto em flagrante delito a que seja aplicável pena maior, etc...".

Ora, em primeiro lugar a Constituição serve-se da palavra nenhum. Portanto a cada Deputado corresponde uma autorização e o Govêrno vinha pedir autorização para um lote de Deputados. Em segundo lugar, se o Govêrno se julgava como tendo em seu favor o flagrante delito, para que vinha solicitar essa arma inqualificável e inconstitucional, destinada somente a amesquinhar o Poder Legislativo?

Flagrante delito o nosso!

Veja-se então o que é flagrante delito, segundo a Novíssima Reforma Judiciária:

Diz o artigo 1:020:

"Flagrante delito é aquele que se está cometendo, ou se acabou de cometer sem intervalo algum. Reputa-se tambêm flagrante delito o caso em que o delinquente, acabando de perpetrar o crime, foge do lugar dele, e é logo contínua e sucessivamente seguido pela Justiça ou por qualquer do povo".

Há, portanto, no artigo duas partes a considerar: a definição do que seja flagrante delito e a sua aplicação ou execução. E agora interessa-nos saber como é que o flagrante delito se executa ou aplica? Para isso temos de presumir um determinado número de elementos que é indispensável definir o fixar: - um crime, uma pessoa, que pode ser alguém do povo, que surpreenda a prática do acto delituoso e, tendo-a surpreendido, intervenha dando voz de preso ou, logo que o crime se perpretou, acto continuo e insistentemente, persiga o seu agente. Entram, pois, pelo menos, os seguintes requisitos: um crime, um agente dêste, e uma terceira pessoa, tudo, mas absolutamente tudo, ligado no que respeita ao espaço e ao tempo.

Sem isso não há, não pode haver flagrante delito!

Uma revolução em Tomar, o Sr. Costa Júnior na cama, o Sr. Alfredo de Magalhães no seu hotel, o Sr. Tamagnini Barbosa em sua casa, êle, orador, neste Parlamento, tendo dormido, na noite do dia da revolução, no Estoril, tendo passado parte da noite e parte da manhã em camaradagem com o Sr. Jorge Nunes, seu companheiro até Lisboa e até êste Parlamento, à hora habitual da sessão, e sem que ninguêm o seguisse a partir da sua saída ou sequer da sua entrada em Lisboa! Isto flagrante delito? Em que parlamento de pretos, consoante a diplomática expressão com que ao Parlamento da União Sul Africana se referiu ontem aqui o Sr. Presidente do Ministério? Porque não deu o Govêrno a singela resposta - e ainda teria uma sombra de nobreza - de que cometeu o acto brutal só porque o quis cometer, e preferiu ir buscar ao lixo das rabulices esta artimanha sem inteligência e sem escrúpulo?

Não julga ter falado assas de si, como Deputado da Nação, mas entende ser agora o momento asado de falar acêrca de Machado Santos e pode ali fazê-lo com palavras muito sinceras e de absoluta im-

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parcialidade, porque a êste homem público não o liga nenhuma funda amisade e apenas boas relações que já teve mesmo interrompidas.

Êsse homem que esforçadamente defendeu o Sr. António José de Almeida nos dias que os democráticos lhe semearam de enxovalhes e perigos, que o Sr. Almeida uniu ao seu infortúnio, quando explorou eleitoralmente a derrota de Pimenta de Castro, tinha bom o direito de ser considerado de forma diversa daquela a que os relatos parlamentares de vários jornais fazem referência e que ainda não sofreram rectificação.

Vai referir-se a palavras que são atribuídas ao Sr. Ministro da Guerra, considerando o Sr. Machado Santos em termos tais que é sen dever dizer no Parlamento, em sua defesa, aquilo que, como homem honrado, não pode calar acêrca doutro homem honrado, quaisquer que sejam as suas opiniões políticas e a situação em que hoje êle se encontre.

Diz o Século do dia 16 de Dezembro, edição da noite:

O orador lê as passagens em que o Sr. Ministro da Guerra declara não querer pronunciar o nome de Machado Santos porque êle lhe sujaria os lábios e lhe atri' bui o roubo do cofre do regimento.

Ora, Machado Santos, exclama, é um vencido e tudo poderá perder, mas a honra, essa não a perdeu. É tambêm possível que tudo pretendam roubar-lhe e que tudo lhe roubem, mas a direita da Câmara, recordando o homem heróico da Rotunda e sabendo que êle entrou ali e de lá saiu na manhã de 5 de Outubro com êsse património, não consentirá que ninguêm lho roube.

Vai, pois, ler um recibo, formal desmentido a quaisquer afirmações sôbre a sua falta de probidade pessoal.

O orador lê o recibo que "A Luta" publicou em "entête",

Quero dizer - continua o Sr. Moura Pinto - que o regimento de infantaria n.° 15, ao sair de Tomar, levava o dinheiro que à conta dêsse regimento estava, mas levava-o, deixando Machado Santos e os demais oficiais ligada ao acto a sua responsabilidade, e, no regresso a Tomar, o dinheiro era integralmente entregue ao conselho administrativo. Neguem-se a Machado Santos qualidades de visão política e êle que se defenda, mas não se lhe neguem qualidades de honra, porque todos o defenderemos, pôsto que Machado Santos, na sua infelicidade, seja daqueles homens públicos que têm a ventura, que nem todos têm, de, sendo um homem honrado, o país inteiro acreditar que êle o é.

O recibo está ali às ordens: que o conteste quem se sentir com fôrça para tanto.

Assim, houvesse recibos e documentos doutras contas públicas!

Mas, como se tem falado ali, por parte do Govêrno e várias vezes, na relativa liberdade de Machado Santos, a liberdade, claro está, compatível com a situação dos presos dentro dos navios e até dentro de certas prisões - a menos que só não queira exercer sôbre êles a violência escusada ou a tortura por prazer- dirá em verdade o que ela tem sido.

Abstrai já do facto assombroso de se mandar o homem, que ninguêm pode esquecer ter sido o herói autêntico duma Revolução Nacional, para bordo do navio onde estava o seu maior inimigo, interventor ocasional duma luta civil em que só surgiram a degladiar-se republicanos, e pô-lo ali, em frente dele e sob o seu domínio. Para quê? Só para deprimir, se para humilhar.

Ora, a bordo do Vasco da Gama o Sr. Machado Santos esteve privado longos dias de conversar com qualquer pessoa. a não ser nos termos duma carta que o seu advogado, o Sr. Dr. José Montez, lhe dirigiu e que passa a ler à Câmara.

O orador lê a demonstração da mais rigorosa incomunicabilidade.

Finalmente - diz - terminou êste suplício moral com a transferência, há dias ordenada, para outro navio, mas ainda hoje o rigor da incomunicabilidade - privação de sair do seu camarote, sentinelas à vista e o restante cortejo de dispensáveis Arexames, continua a exercer-se sôbre S. Exa., como prova com um período duma carta sua que lê à Câmara.

Leu.

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Acha estranho que isto se passe sendo Presidente do ^Ministério o Sr. António José de Almeida. Se isto se passasse num Ministério da presidência do Sr. Afonso Costa, ainda admitia, porque êste homem público teve sempre ideas muito extravagantes e muito mias acêrca de presos e suas comodidades; mas no Ministério de quem andava quebrando lanças pelos sagrados princípios e se armara paladino da Bondade, criando pelo país fora a mais assombrosa lenda da sua própria bondade, é assombroso e causa vertigens ! Fantástica lenda, à sombra da qual tem podido viver como político, e que ainda levará seu tempo a desfazer por completo, porque neste desditoso país não há maior fôrça que a fôrça adquirida, mesmo quando é absurda, mesmo quando repousa numa falsa ilusão! E no Govêrno da presidência do Sr. António José de Almeida e da sua decantada bondade, que surgiram as mais odiosas leis de excepção, no Govêrno dele, que outrora contra elas disparou tam retumbantes tropos e anátemas nos dias duma larga e trovejante oposição. Êle, que após o 14 de Maio escrevia uma vibrante en-tête no seu jornal, tam vibrante que dir-se-ia ser sincera e como um grito vindo do coração, deixa que se apresente por parte do Govêrno uma odiosa, a mais odiosa lei de excepção votada em qualquer tempo no Parlamento Português. Eis a entête, que passa a ler à Câmara:

"Em nome da liberdade! Em nome da Constituição! - Na madrugada de ontem saiu a barra o aviso Cinco de Outubro, conduzindo para Ponta Delgada o General Pimenta do Castro, o Coronel Goulart de Medeiros, o almirante Xavier de Brito e o fundador da República, Machado Santos.

"Estes cidadãos não puderam despedir-se das suas famílias; nem sequer preveni-las. Sem preparativos, sem recursos, talvez só com o fato que tinham no corpo, é possível que êles próprios não saibam ainda a estas horas o destino para que os levam..."

Sabem porventura os presos actuais que destino lhe reserva, para que ponto do território do continente ou das colónias os remeterá o Govêrno do Sr. António José de Almeida?

"Para que mandaram assim três Ministros do Govêrno transacto, para um destino que a lei não determina, e a que os tribunais os não condenaram, sem culpa formada, no escondimento e no silêncio contra o direito das gentes? Parece ser uma ironia perversa da Constituição, tiranizando mil vezes mais do que a "ditadura" que só foi deitada a baixo com fins eleitorais".

Ouça o país: O Sr. António José do Almeida, reputava a tirania nascida do 14 de Maio, mil vezes pior que o da "ditadura". E o "14 de Maio" que hoje serve e cobre como salvadora política nacional, reputava-o então como um crime de baixos fins eleitorais!

"A bordo dum navio, talvez no seu porão, sem delito que se conheça, som motivo que se saiba, na ignorância da família, na cumplicidade duma madrugada silenciosa, é mandado para o desterro em nome da República o homem que fez essa República. E, no propósito de o escárneo ser maior, escolheram para seu instrumento de ignomínia e expiação o barco que se chama "Cinco de Outubro!"...

Agora o herói de 5 de Outubro está a bordo do navio do comando de Leote do Rêgo!

"O 14 de maio, como um felino, saltou sôbre a Rotunda lacerando com as garras o símbolo da glória republicana. Que maiores destroços fará êle ainda? Onde chegarão o seu desatino e a sua raiva?... Para que supremas desgraças nos arrebatará porventura?...

"Lamartine, descrevendo a fuga de Rouget do Lisle, autor da "Marselhezax", que ia sendo perseguido através das montanhas do Jura, por bandos armados que cantavam o mesmo hino, exclamou; "A Revolução dementada já não conhecia a própria voz". Ao ser mandado pela barra fora, sem culpa nem delito, e em nome da República, o fundador da mesma República, eu, observando todo o delírio da hora presente, tenho o direito de exclamar: "Esta Pátria desceu a tamanha desgraça que já não sabe onde pulsa o coração.

"Quedo-me surpreso o varado de espanto. Percebo que a pena me vai cair da mão. £ Pressinto que empalideço; de colora ou de dor? De ambas as cousas, porque desejar, neste momento, que a mi-

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nha indignação fôsse suprema para aniquilar tanta injustiça e as minhas lágrimas iam purificadoras, que pudessem resgatar perante a civilização esta vergonha sem nome". - António José de Almeida.

Depois pregunta o orador: onde há na scelerada lei de Dezembro passado, respeito pelo direito das gentes? Onde o respeito por a forma de processo no que ela tem de sagrado? Desde a privação do advogado que o réu queria escolher até a infâmia, sem nome, da privação das testemunhas de defesa? Onde o respeito pelas vítimas que continuam réus até mesmo depois - assombro sem igual! - de como arguidos, demonstrarem a sua inocência e serem absolvidos?

Preguntava o Sr. Presidente do Ministério, nas passagens que acima leu, para onde nos levaria mais o 14 de Maio. Para onde nos levava ainda mais exclama o orador. Para êste horror de União Sagrada, para êste Govêrno que para aí está e para a aprovação duma lei amaldiçoada.

Lei ofensiva dos altos sentimentos de humanidade, dos mais rudimentares princípios de direito e da Constituição, essa é uma lei do Govêrno do Sr. António José de Almeida!

E S. Exa. quando, na sessão passada, receitou ao seu ilustre amigo Sr. Dr. Alfredo de Magalhães atitudes políticas e posturas históricas, pretendeu notar-lhe contradições nas suas públicas afirmações. Foi por lapso de memória, porque a vida política de S. Exa. é um rosário de contradições: S. Exa. esquece a água raz e o chumbo derretido que aconselhou às populações do norte contra os conspiradores monárquicos; esquece que daí a dias pedia ampla amnistia, que, quando Govêrno na União Sagrada, não teve a coragem de fazer triunfar; esquece as arestas da Lei da Separação que nunca deixou enunciar ao seu partido quais fossem, e algumas das quais a União Republicana pôs como condição para um honesto Govêrno nacional, sem em S. Exa. encontrar apoio.

Mas S. Exa. foi o mais enxovalhado homem público, por banda do democratismo, quando êste, na fúria de organizar partido, não hesitava nos processos! S. Exa. foi o acusador dêste partido, acusador duma violência tamanha que foi parar à agressão das pessoas. E assim da acusação ao partido dos escândalos estava a breve trecho no conflito com o Sr. Afonso Costa e não virá êle, orador, ler ali passagens de insultos mútuos, salvo se atacado, for forçado a defender-se com uma energia em que procurará então sobrelevar o ataque. Escusa, pois, o Sr. Afonso Costa, exclama o orador, de estar tomando as contrariadas e falsas atitudes de quem tem de simular que já se não tempos e de que águas passadas não movem moinhos, porque há cousas que lembram sempre e a União Sagrada tem realmente o paradoxal aspecto de pessoas e partidos que sagradamente se odeiam e sacrilegamente se afirmam reunidos em torno do Altar da Pátria!

S. Exa. foi tudo isto e somente lerá do jornal do Sr. Presidente de Ministros, afastadas as injúrias, aparto em que êle na sua visão política, em Junho de 1914 reputava o Sr. Afonso Costa como germanófio, que pretendera mudar o eixo da nossa política internacional... para Berlim, para assim demonstrar que a sua coerência é tam grande e a sua visão é tam boa que teve do reconhecer que o Sr. Afonso Costa não tinha afinal mexido no eixo e que foi em Portugal a primeira vítima de germanofilismo.

S. Exa., por denúncia do Sr. António José de Almeida, tem tamanha mobilidade de visão política que é a contradição permanente e difícil acompanhá-lo na sua vida pública.

Assim é que três ou quatro dias antes do seu sacrifício no altar da Pátria, quem poderia ainda supô-lo a caminho da União Sagrada, ouvindo-se então os seus mais íntimos amigos e correliginários? O seu sacrifício devia ter sido muito grande mas acha-o incompreensível, confessa-o. Só porque lhe foi armado todo um scenário grandioso, um altar adequado às circunstâncias, uma maravilhosa sessão histórica? Mas compreende-se lá que S. Exa. não visse que atrás dêsse altar se ocultavam sacerdotes sacrílegos que se iam rindo do sacrificado e das oferendas? Pois não via toda a gente que o Sr. Almeida e o seu partido não vinham nem salvar nem valer a uma Pátria, mas sim salvar e valer a um partido que sentia um abismo, aberto e a ruína ali a dois passos?

É então que S. Exa. tudo esquece: partido e princípios, votando-se sôbre a

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sua chefia e com a sua presença na Câmara, a odiosa lei da pena de morte que depois não pôde assinar por estar, por acaso, sem dúvida, ausente de Lisboa no dia da assinatura. Dizendo-se companheiro de Pimenta de Castro e afirmando-se com êle dolorosamente vencido, traz ao Parlamento uma amnistia de "meia-dose" em que fica ainda punido e considerado criminoso o companheiro da véspera, com o qual se declarara solidário, protestando liquidar a sua vida política ao mesmo tempo que êle, dando assim S. Exa. a ambicionada sanção de crime a um acto político que só os democráticos consideravam como tal, a ambicionada sanção que o partido democrático mais podia desejar, porque tal sanção partia dum cúmplice que, mais feliz que o outro que vive no exílio, se encontrava no Poder.

Depois, vem a lei de censura, e já não vale a pena falar da odiosa forma de a aplicar. Mas S. Exa. não respeita a soberania da Nação ou só a quere consultar quando lhe convenha. Assim, foi que adiou as eleições municipais porque elas eram... eleições perdidas, privando o país das suas regalias municipais com o inoportuno e grotesco pretexto de que submarinos alemães andavam em águas territoriais, quando isso acontecia já há largos meses. E agora que a Alemanha com mais violência afirma, numa ameaça tremenda, que os vai usar até ao extremo da mais requintada e desumana maldade, eis que, com espanto, dentro da sua teoria acêrca dos perigos eleitorais dos submarinos, se fala já em que o Govêrno da presidência de S. Exa. vai fazer eleições suplementares de Deputades e eleições municipais!

E S. Exa. não quere saber da sua própria contradição, o seu Govêrno não abandona as cadeiras em que se senta, depois do adiamento anterior, para ver se se desta forma pode ainda insuflar sangue novo ao seu almeidismo e se fabrica uns tantos Deputados que reponham as suas minguadas fileiras em termos de parecer que ali estará depois um partido, à custa da assistência política da já falada dinastia Costa.

Uma voz da esquerda: - Que V. Exas. criaram em 1913.

O Orador: - Quando o chefe evolucionista, quando S. Exas. tiveram medo de ser Govêrno, porque o honesto apoio que a União deu ao Sr. Afonso Costa, foi oferecido pelo partido do orador, poucas horas antes, ao Sr. António José de Almeida, que até foi a Luta agradecê-lo!

Assim, o Sr. António José de Almeida vai até o "sacrifício" de fazer eleições municipais e de Deputados, a despeito de submarinos! É o Sr. Afonso Costa a querer fazer o milagre de Santo António? Mas, creia, Sr. Afonso Costa, exclama o orador, V. Exa. esfacelou o partido do Sr. Almeida e a sua fôrça já não chega para lho recompor. V. Exa. partiu-lhe a cantarinha e já não é fácil juntar-lhe os pedaços. O Sr. Almeida deu o que tinha a dar, salvou o Partido Democrático na hora trágica duma ruína eminente! Foi o pendão da União Sagrada, que o país nunca compreendeu e que nunca perdoará, porque, entre outras calamidades, o tem às portas da fome. O Sr. Almeida é, neste momento, um ponto fraco - quem tal diria - para o Govêrno do Sr. Afonso Costa, porque o país compreende perfeitamente êste homem público, o É eu feitio atrabiliário; compreende perfeitamente os processos do Partido Democrático, resultantes dum tal chefe, com todos os atropelos, violências e aventuras; e até muitos, ou por temperamento, ou... por medo engrossam as fileiras demagógicas! Mas, Santo Deus, o país não entende o Sr. António José de Almeida conservador do dia de ontem, jacobino do dia de hoje, e, era quanto que o Sr. Afonso Costa infunde medo aos tímidos e aos poltrões, do Sr. Almeida ninguêm, absolutamente ninguêm tem medo e do seu partido ninguêm já compreende, nem a necessidade, nem a utilidade. Disse.

O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas taquigráficas.

Leu-se e foi admitido a moção do Sr. Moura Pinto.

O Sr. Presidente: - Eu desejava dizer a V. Exa., Sr. Moura Pinto, que ouvi com toda a atenção as palavras que V. Exa. me dirigiu no início do seu discurso, e fiquei satisfeito por ver que V. Exa. só me pôde arguir de excesso de tolerância.

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V. Exa. viu que eu apresentei aqui o seu requerimento, cumprindo os preceitos regimentais, de que timbre de não me afastar: e, nesse espírito de tolerância, submeti à provação da Câmara as considerações de V. Exa., dizendo, contudo, que não se tratava dum requerimento, mas duma proposta.

Foi, pois, em resultado duma votação da Câmara, que a sua proposta não teve seguimento.

Por minha parte, julgo ter cumprido integralmente os preceitos regimentais, dos quais, devo afirmar mais uma vez, timbrarei sempre em não me afastar. (Apoiados).

A sessão está interrompida até as 22 horas.

Eram 20 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 22 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Martins.

O Sr. Júlio Martins: - Sr. Presidente: eu tinha pedido a palavra a V. Exa. no momento em que o Sr. Deputado Simas Machado, em nónio do bloco parlamentar das direitas, vinha ler à Câmara, para que o país o ouvisse, a sua epístola de S. Paulo aos fiéis conservadores dêste país.

Eu tinha dito, no primeiro discurso que hoje proferi, que estava ansioso por ouvir o programa, das direitas parlamentares, que neste momento se tinham organizado pura vir fazer ao Govêrno uma guerra intransigente, uma guerra a todo o transe.

Ouvi com atenção as declarações do Sr. Simas Machado, que afirmou que o bloco se constituíra para estabelecer a unidade ò disciplina parlamentares.

Sr. Presidente: nós temos visto hoje a disciplina e a unidade parlamentares, nas constantes interrupções feitas por aquele grupo aos oradores que estavam no uso da palavra.

Nós já ficámos sabendo, por aqui, o programa do bloco, relativamente à disciplina!...

Mas afirmou-se mais, Sr. Presidente, que o bloco, nas questões internacionais, - não sei se apanhei bem a frase que concretiza o pensamento de S. Exa. - não poria obstáculos, não combateria.

Sr. Presidente: numa época em que todos os partidos da República tem de ser zeladores dos nossos compromissos internacionais; numa época em que por uma questão de facto e não virtualmente, já nos encontramos como participantes na guerra, o bloco não estorvará, - é êste o termo, - a resolução dos nossos compromissos internacionais.

Isto. Sr. Presidente, quer dizer, - e é preciso que S. Exa. o definam -, que o bloco parlamentar não auxiliará o Govêrno, com todas as suas forças, na resolução dêsses problemas.

Não estorvar. Sr. Presidente, não significa de modo algum colaborar o eu pregunto aos Srs. Deputados da dissidência evolucionista, ligados a todos os compromissos internacionais, ligados aoGo^6rno que defenderam, qual é hoje a sua atitude dentro do bloco parlamentar?

O Sr. Malva do Vale: - A mesma que era dantes.

O Orador: - Sr. Presidente: é preciso, não só não estorvar, mas auxiliar o Govêrno em todos os compromissos internacionais.

Mas há ainda mais:

O bloco parlamentar propõe-se defender a dissolução parlamentar. É preciso que saibamos que o Partido Republicano Evolucionista tem no sou programa êsse princípio e ainda não abdicou dele. Agora o que êste partido entende é que não é êste o momento para se agitarem questões de lana caprina, porque interesses mais altos nos chamam a atenção.

Nós combatemos sempre pelo princípio da dissolução, não dos programas e partidos, mas do Parlamento, defendendo-a intransigentemente.

Mas, Sr. Presidente, porque a guerra veio sôbre nós, só na Pátria pensamos, e em nada mais.

Propõe-se o bloco parlamentar defender a dissolução do Parlamento. Também o Partido Republicano Evolucionista tem no seu programa a dissolução parlamentar e não abdica dela.

A situação difícil do país não se compadece, porem, com a resolução dos pro-

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blemas que interessam aos partidos políticos.

Nas circunstâncias do país, com soldados a baterem-se, ou preparando-se para se baterem, pregunto o que será a chamada das forças conservadoras, para a constituição do núcleo do partido conservador, quando hoje vemos os representantes dos partidos radicais tomarem parte nos Govêrnos dos países em guerra. Na Inglaterra liberal, ciosa de todas as regalias individuais, vêem-se os mais acérrimos conservadores erguerem no alto dos escudos o revolucionário Lloyd George. Na liberal Inglaterra faz-se a mobilização de fábricas, indústrias e minas. Na Áustria e Hungria e na Alemanha faz-se a mobilização de todos os membros da nação e na própria França estabelecem-se medidas de carácter nacional.

Se o decantado bloco parlamentar que andou na imaginação de toda a gente, para realizações concretas, é aquilo que afirma o Sr. Brito Camacho, só descortino intuito de perturbar a obra do Govêrno actual e de todos que no Poder se encontrem.

Continua a dizer-se que o Govêrno está estabelecendo pelo país inteiro o pavor e a demagogia. Não quero seguir, sôbre o assunto, a mesma orientação que alguns Srs. Deputados seguiram; lembro-me das circunstâncias em que nos encontramos, mas se quisesse referir-me a um consulado que foi violento, porque êle vinha ainda infiltrado de paixões políticas, iniciadas dentro dos partidos, preguntaria: quem foi que, no Parlamento, ergueu a sua voz contra actos verdadeiramente condenáveis? Foi o Partido Unionista que apoiou, inteiramente, o consulado do Govêrno de então, que se colocou ao lado do Partido Evolucionista para protestar energicamente contra êsses actos? Não, Sr. Presidente. Quem foi que, no Parlamento, ergueu a sua voz para protestar contra a agressão, em plena rua, na pessoa dum general do nosso exército?

Toda a Câmara se deve recordar que fui eu, em nome do Partido Evolucionista, quem levantou êsse protesto. £ Qual a atitude da União Republicana em face dos princípios da lei, quando aqui se debateu a conspiração republicana de 27 de Abril?

Então, Sr. Presidente, estávamos numa situação normal, não havia guerra, não estávamos nas circunstâncias angustiosas em que nos encontramos.

A situação do Sr. Malva do Vale, no bloco, não deve ser uma situação extremamente agradável.

Isto é somente para dizer que em circunstâncias normais a mão jamais se tinha feito; mas as circunstâncias de guerra obrigam os homens, não só em Portugal, mas em toda a parte, a unirem-se para a defesa dum princípio que é o da defesa da Pátria e da República.

Mas, Sr. Presidente, eu fiquei ainda agora surpreendido com uma afirmação feita pelo Sr. Moura Pinto, quando fez a exposição dum assunto que seria objecto duma interpelação ao Govêrno. Disse S. Exa. que o Govêrno, por uma razão de ódio contra S. Exa., tinha um interesse enorme, espantoso, de envolver nos acontecimento6; de 13 de Dezembro o Partido Unionista e que daí resultara a prisão de S. Exa.

Oh! Sr. Moura Pinto: eu tenho a absoluta certeza que da parte do Govêrno não há ódio contra S. Exa.;

O Sr. Moura Pinto: - Isso é acreditar de mais!

O Orador: - Mas quere S. Exa. ver onde a polícia se podia fundar para desconfiar que o Partido Unionista estivesse intrometido no movimento? Ouça o Sr. Malva do Vale, porque lhe diz respeito.

O Sr. Malva do Vale afirmou, na sessão de 18 de Janeiro de 1916, o seguinte:

Leu.

O Sr. Malva do Vale: - Leia mais!

O Orador. - Não preciso ler mais.

O Sr. Malva do Vale: - Leia o resto!

O Orador: - S. Exa. quere que leia? Leio.

Leu.

S. Exa. julga culpados os unionistas e acusa o Govêrno por não desfazer a campanha dos mesmos. No espírito de S. Exa. está ou não a convicção de que esta resolução foi originada pelos unionistas? Ao espírito esclarecido de quem mo ouve deixo o juízo das palavras que acabei de ler.

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Sr. Presidente: o Sr. Malva, do Vale, em se lhe apontando as suas contradições, parece uma menina histórica que não pode estar calada.

Mas, Sr. Presidente, eu ia seguindo as considerações feitas pelo Sr. Moura Pinto.

S. Exa., a certa altura do seu discurso, voltou-se para o Sr. Afonso Costa e disse-lhe: "Sr. Afonso Costa, o Sr. Presidente do Ministério não tem já valor político, tire do Govêrno o Partido Evolucionista, que está desmantelado, porque os grandes elementos dêsse Partido saíram para o bloco, e o Partido Evolucionista não tem o apoio do país, porque êsses elementos o levaram para o bloco".

Sr. Presidente: quer-se, pois, dizer que o Sr. António José do Almeida, politicamente, não vale já nada no país, e o que se pretende é só ter valor um partido do Sr. Brito Camacho, e mais nada.

Mas, Sr. Presidente, é tal esta preocupação que, propondo-se o Govêrno a fazer uma semana patriótica e ir perante os povos dizer qual a situação do país, quais os sacrifícios que serão necessários pedir ao povo para manter íntegra a honra da Pátria e da República, S. Exas. não se manifestam, e só pensam, nas adesões daqueles que jogam as cartas às noites com as famílias na província, e em eleições para chamarem essas forças conservadoras para a constituição dêsse grande partido que há-de salvar as batatas dêste país.

Risos.

Toda a preocupação de S. Exas. é o Govêrno ir para as eleições.

Ora o Govêrno não pensa assim, e se assim pensasse deveriam S. Exas. acompanhá-lo na sua idea, porque êle é neste momento, a representação dum partido conservador e dos princípios dos homens patriotas dêste país.

O Sr. Moura Pinto, que diz que o seu partido representa tudo isso, devia estar satisfeito pelas declarações do Govêrno a respeito da consulta ao país; porêm, S. Exas. dizem representar as forças vivas do país!

Mas, Sr. Presidente, o bloco, apesar de se dizer que tem no seu grémio todos os bispos e homens ricos do nosso país, o bloco ainda, mesmo assim, vive aterrado com a idea de que o Govêrno podia pensar na realização das eleições.

O Sr. Malva do Vale: - Essa é boa. Com que então êsse Govêrno é eterno?

O Orador: - Quando êle cair, V. Exa., Sr. Malva do Valo, há de ser chamado imediatamente para constituir Ministério, por que V. Exa. tem dado, de há uns tempos a esta parto, provas inconfundíveis.

Em todo o caso ou dir-lhe hei que só V. Exa. começa a interromper os conservadores como está a interromper-me, escangalha o bloco.

Mas, Sr. Presidente, argumentou o Sr. Moura Pinto, evocando uma época muito anterior à guerra, com as dissidências, com as incompatibilidades políticas que existiram entre os Srs. Drs. Afonso Costa e António José do Almeida. S. Exa. foz até alusões a extractos do jornais...

O Sr. Moura Pinto: - Eu ainda não aludi a tudo...

O Orador: - Mas do que S. Exa. disso pode deduzir-se o seu pensamento.

O Sr. Moura Pinto veio lembrar êsses factos.

Toda a gente sabe que houve incompatibilidades profundas entro êstes dois chefes de Partido, toda a gente sabe que nós combatemos apaixonadamente o Partido Democrático; mas tambêm não há ninguêm que ignoro, - e aí é que ostá a grandeza dos políticos em Portugal, - que acima das paixões do meio, no momento em que a guerra surge e que nós somos afrontados por uma nação forte e grande que calcou o direito das gentes, houve a nobreza de gesto dêsses homens que esqueceram absolutamente tudo, unindo-se no princípio sagrado da defesa da Pátria e da República.

(Apoiados).

Aparte do Sr. Malva do Vale, que não foram ouvidos.

O Sr. Presidente: - Peço ao Sr. Deputado Malva do Vale o obséquio de não interromper o orador.

Continuam os apartes.

O Orador: - Dizia ou, Sr. Presidente, que o Sr. Deputado Moura Pinto esqueceu-se da situação anormalíssima em que nos encontramos, esqueceu-se de que neste momento o país não olha para os meros

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incidentes parlamentares que aqui se debatem e que podiam e deviam ser discutidos nas assembleas partidárias ou nos centros com vários patronos.

Dizia eu, Sr. Presidente, que o país há-de julgar-nos a todos neste momento, olhando para quem se propõe fazer a disciplina parlamentar e a conjugação dos elementos conservadores, afirmando os princípios de liberdade e tolhendo aos oradores a liberdade dos seus raciocínios. Dizia eu, Sr. Presidente, que o Parlamento neste momento se devia entreter com questões mais graves, com questões de mais alta importância.

O país fará a distinção entre aqueles que assim procedem e os que neste momento esqueceram por completo todos os ódios do passado, votando ao esquecimento as paixões políticas que lançaram as almas numa profunda luta de princípios políticos.

Eu direi ao país que nos encare a todos e que pregunte à inteligência daqueles que se dizem intelectuais neste país, se é assim, desta forma, com a constituição dêste bloco, com incidentes de lana caprina, que se vem dizer ao Govêrno que ali está que saia das cadeiras do poder, que se vá embora sem se saber para onde e sem S. Exas. terem fôrça para constituir Govêrno.

Sr. Presidente: a argumentação de factos passados!

Veja V. Exa. qual é o programa do bloco, qual é o programa em que êle se fundamenta para vir atacar a obra do Govêrno!

Oh! mas isso demonstra a incompetência de ordem governativa que germina no cérebro do decantado bloco, porque pode o país preguntar aos meus correligionários de ontem, o que fez êste Govêrno depois de 18 de Dezembro, em que êles lhe votaram uma moção de confiança, para que êles, de lança em riste, ao lado dos seus inimigos de outrora, estejam no mosaico parlamentar protestando agora! (Apoiados).

Jamais nós, os evolucionistas, deixaremos de ser solidários com aqueles que estão no poder, e não o deixaremos de estar se soar a hora da derrota; e se alguns porventura tivemos lugares no tempo de Pimenta de Castro, caindo o Govêrno, entregámos os lugares, o que não sucede com muitos do bloco, que, depois do 14 de Maio, ficaram com os mesmos lugares!

Trocam-se apartes.

O Sr. Vasconcelos e Sá: - V. Exa. dá-me licença?

Eu quero dizer a V. Exa., felicitando-me por estar então em África, que o Partido Evolucionista deu ao Ministério Pimenta de Castro, depois dele caído, o seu apoio.

Quero lembrar a V. Exa. o que se deu com o livro dêsse general, que por um irmão de V. Exa. foi defendido no Senado, a propósito dêsse livro que se considerava germanófilo.

O Orador: - V. Exa. vai ouvir!

A publicação dêsse livro fez-se depois do 14 de Maio. Ora, nós aqui o que afirmámos é que desde o momento que estivemos ao lado dêsse Govêrno nas horas do triunfo, não era nas horas de derrota que o abandonávamos. (Apoiados do centro).

Sr. Presidente: já mais de uma vez afirmámos aqui que tudo quanto é o passado, antes da guerra, neste momento não o conhecemos; é para nós uma cousa esquecida, uma cousa morta.

Mas quanto ao bloco, organizado dentro dos princípios da guerra, quando o bloco organizado com o país em crise, numa crise pavorosa, que é de resto a crise de todos os países, em guerra, que é de resto a crise de todos os países neutrais até, que é a crise de todos os países fortes, ricos e grandes, veja V. Exa. para onde nos leva a sua organização. (Apoiados).

Veja V. Exa., Sr. Presidente, para onde nos leva a argumentação primitiva do bloco!

Coloquem S. Exas. a questão à altura do momento em que nos encontramos, coloquem S. Exas. a questão na situação em que o país se debate, e verão que a assistência aos que combatem pela honra da Pátria e da República não deve ser o estendal de misérias políticas que, neste momento, se estão debatendo.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Vozes: - Muito bem.

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O Sr. Eduardo de Sousa: - As alusões do Sr. Malva do Vale aos artigos do República, de que tem a honra de ser director, obrigam-no a usar da palavra.

Critica que S. Exa. viesse ao Parlamento analisar e citar o que se escreveu no República. Reivindica a responsabilidade das ideas expendidas no jornal que dirige, como procede sempre em todos os actos da sua vida.

O orador faz em seguida a justificação dos artigos, a que se referira o Sr. Malva do Vale, lendo vários artigos publicados nos jornais A Luta e República.

O discurso será publicado na íntegra quando o orador restituir as notas taquigráficas.

O Sr. Malva do Vale (para explicações): - Sr. Presidente: se eu li a esta assemblea o jornal A República, foi porque êle vinha, dia a dia, transcrevendo artigos do Homem Cristo.

O Sr. Dr. António José de Almeida tem o hábito de ler todos os dias o jornal que representa a sua opinião e eu estranhei que S. Exa. consentisse em que se publicassem nesse periódico artigos chamando homens sem escrúpulos e capazes de tudo, aos indivíduos da maioria, que o apoiam, e que, com êle, formam a União Sagrada.

Eu não sei a razão porque e Sr. Eduardo de Sousa se irrita e se abespinha sempre que eu falo.

S. Exa. conhece alguma cousa da minha vida particular ou pública que possa merecer censura?

O Sr. Eduardo de Sousa: - Eu não tenho nada com a vida de V. Exa.

Vozes: - Ordem! Ordem!

O Orador: - Eu estou dentro da ordem! Parece-me impossível que a maioria, que consentiu que eu usasse da palavra para explicações, já esteja, a mesma maioria que o permitiu, a querer tirar-me a palavra! (Apoiados). Eu não sou papão! Não meto medo a ninguêm! ;Risos).

Estou a dar explicações e a preguntar, porque os senhores parece que estão irritados comigo, só alguém conhece qualquer cousa da nimba vida particular ou pública que mereça censura?

O Sr. Presidente: eu quero terminar dizendo que era fácil acabar com todos os equívocos desde que o Sr. António José de Almeida declarasse que a maioria é honrada, composta de homens honrados, e o Sr. Eduardo de Sousa tambêm, e se filiasse com êsse seu colega no Centro Democrático! (Risos).

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ramada Curto: - Sr. Presidente: o actual debate político tem por origem uma modificação das forças parlamentares em presença nesta casa do Parlamento.

A fórmula política da União Sagrada, que uma exigência imperiosa da opinião pública impôs aos dois chefes dos grandes partidos da República, e que êle patriótica e nobremente aceitaram com o auxílio entusiástico dos seus partidários, contrapunha-se apenas uma outra torça política organizada, que representava uma minoria política do Congresso. Essa torça política era a União Republicana! Mas, num determinado momento, isto é, depois dos deploráveis acontecimentos do 13 do Dezembro do ano passado, em que o Govêrno entendeu ser necessário, para jugular êsses acontecimentos, que, na boca de todos os homens que tem assento nossa Câmara, eram considerados prejudiciais para os interesses da Pátria, apresentar ao Parlamento uma lei de excepção, deu-se uma modificação nas forças parlamentares, de que resultou os unionistas o os Deputados evolucionistas dessidentes dessa tal lei de excepção, organizarem um bloco de oposição ao Govêrno, bloco que levantou êste debate político.

Como eu tambêm fui contrário a essa lei de excepção, reconhecida como necessária pelo Govêrno para jugular o deplorável movimento de 13 de Dezembro, entre neste debate a fim de fixar a minha orientação política dentro desta casa do Parlamento.

Se fui intransigente quanto à aprovação da proposta apresentada pelo Sr. Ministro da Guerra, para julgamento dos implicados no movimento de 13 de Dezembro; é porque entendi que ela consignava princípios absolutamente injustificados pelas razões que expôs o Govêrno. Mas, a despeito disso, continuo fiel à for-

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mula da União Sagrada, pois estou convencido que ela representa, para todos os portugueses, um dever imperioso imposto pela consciência da nação (Apoiados da esquerda e do centro).

Passou-se, porêm, nessa fórmula uma crise grave, que vem a ser que os homens que, inspirando-se em altas razões da opinião pública, tinham dado a sua aprovação à União Sagrada, simplesmente por um pequeno acto, decidiram passar-se para o lado contrário, sem, parece, terem conhecimento das suas responsabilidades (Apoiados).

Sr. Presidente: eu quero fixar a minha situação como Deputado que discutiu a proposta, de lei apresentada pelo Sr. Ministro da Guerra para julgamento dos implicados nos últimos acontecimentos de 13 de Dezembro. Então manifestei a minha discordância a respeito dos preceitos que ela consignava, por entender que êles eram absolutamente injustificados, e ainda para fixar a minha atitude quanto à intransigência na aprovação dessa proposta, a fim, de mostrar que, a despeito disso, me mantenho fiel à fórmula da União Sagrada, pois estou convencido, repito, de que ela representa, para todos os portugueses, um dever imperioso, imposto pela consciência da nação.

A discordância que então manifestei foi apenas quanto à oportunidade e justificação dessa lei.

Confesso, Sr. Presidente, que uma profunda mágoa se apoderou do meu coração. A ocasião não é para fazermos retórica, a ocasião não é para fáceis tiradas de eloquência barata, a ocasião é para que todos nós, que temos, neste momento, a consciência das responsabilidades que nos impendem, falemos desassombradamente e com sinceridade, deixando apenas que o nosso espírito se ilumine unicamente pelo amor do futuro da nossa Pátria (Apoiados).

O espectáculo que a vida política da Nação está dando a si própria e à Europa, não é de molde a emparelhar com o que em outros parlamentos se tem passado, em que as oposições dão sempre ao Govêrno sugestões fortes de patriotismo para prestígio do regime. Antes da alteração do equilíbrio das forças políticas desta casa do Parlamento, por virtude da proposta de lei que combati, eu verifiquei que entre dois partidos, cheios de agravos recíprocos, como disseram alguns Deputados da oposição, tinha havido um momento em que, diante da causa suprema da vida da Nação, os homens que a êles pertencem, com aplauso unânime do país se tinham dado as mãos para congraçar todas as forças políticas? em defesa da Pátria e da República e que só aqueles que quisessem desempenhar urna acção dissolvente é que poderiam esquivar-se no impreterível dever de irem ocupar as cadeiras do poder.

Deu-se a constituição do bloco parlamentar, que pretende pesar na vida política da Nação e verifiquei que êle fez umas vagas declarações. Não é só a Nação que as não conhece, não é só a Nação que as não compreende e que as não pode apreciar, é tambêm a própria Câmara.

A Nação desconhece os homens que fazem parte do bloco. Quaisquer que sejam os seus rasgos de eloquência e as facilidades do momento, há, entre êles, um absoluto e completo divórcio.

Daí deriva que o primeiro dever que o bloco parlamentar que se constituiu teria de cumprir perante o país, era fundamentalmente o de dizer o que pensa do mais grave e do mais alto dos problemas que interessam neste momento à consciência nacional, isto é, o que pensa o bloco sôbre a nossa atitude na conflagração europeia.

O bloco diz apenas o que não podia deixar de dizer, porque se o não fizesse seria a condenação imediata perante a Nação e perante o Parlamento: limita-se a aceitar as responsabilidades contraídas pela Nação em relação às outras nações aliadas. Eu julgo ver nestas palavras:- "contraídas pela Nação", - um campo aberto a todas as insinuações apaixonadamente políticas que fazem com que ainda hoje seja possível discutir em Portugal, se devemos ou não estar em guerra! (Muitos apoiados).

Eu julgo ver nessas palavras a reserva dum direito de que o bloco amanhã no poder lançará mão para alterar a situação de Portugal dentro do conflito europeu.

A União Republicana, que, é p único partido que entra no bloco, declarou que se devia dar à Inglaterra tudo o que ela nos pedisse, mas aquilo que lhe pudés

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semos dar; o esta declaração é rodeada de tal reserva e de tal cautela, de uma tam especiosa, e pormenorizada minuciosidade, que eu queria amanhã que os parlamentares que sustentam a opinião daquele partido me dissessem perante o país se entendem ou não que a atitude cheia de inteligência dos estadistas da República, para entrarmos no conflito europeu, que a nossa comparticipação representava uma conta corrente perante o futuro e que era uma garantia da nossa independência.

É êste o problema que se agita em Portugal: dum lado, os homens comodistas; do outro, os homens animados dum grande ideal e cheios de coragem que disseram à Nação, que os compreendeu, que era absolutamente necessário marcar, como nação independente, o nosso lugar no mais formidável conflito que a história da humanidade conhece.

Esto é que é o problema fundamental; o mais, tudo que seja a apresentação de críticas especiosas aos actos do Govêrno, porque um Ministro fez ou não fez o que devia fazer e que era mais útil para a nação, não é o que nos deve preocupar.

E êste o problema que a nação vê, - o da independência e da vida nacional, - o é por isso que todos os debates que V. Exas., dêsse lado da Câmara, levantam nesta casa, resultam inanes para a opinião do país, porque êle os não conhece, porque desconfia dos senhores.

É por isso que eu digo que hoje a confiança de todos os republicanos que tem assento nesta Câmara, é para os que realizem uma obra útil e prestigiosa.

A fórmula da União Sagrada que está representada no Poder, não pode ser considerada imortal.

Todos os homens públicos se gastam, e tem de se afastar dos representantes das forças políticas que os elevam por momentos à alta situação governativa.

Mas quando alguém, chamado ás responsabilidades do Poder pelo Chefe do Estado, não queira compartilhar do Govêrno, é necessário que se saiba porque êsse indivíduo foge a êsse mandato, porque o problema político neste momento não comportará qualquer tibieza ou qualquer duplicidade moral.

Êste momento é unicamente para tratar de interesses do país, sendo preciso reconhecer que êste momento, que é formidável, não é para debates de jongleries de palavras de mera retórica, e ainda mais: êsses jogos de palavras e de casos pessoais, amesquinham, parecendo que V. Exas. estão convencidos de que neste momento não há portugueses que estão combatendo por honra da Pátria e derramando por ela o seu sangue. (Apoiados).

E querem V. Exas. que alguém possa comungar nas vossas ideas, quando ninguêm vê, quando a nação não vê, não sente que V. Exas. generosamente se tenham colocado no formidável ímpeto da vossa alma de patriotas, na obra redentora que é necessário fazer?! Como se explica o movimento de 13 de Dezembro, que V. Exas. julgaram perigoso, e os elogios para aqueles que o praticaram, feito aqui na Câmara por V. Exas.?! (Apoiados).

Sr. Presidente: se eu entrei neste debate foi para fazer estas ligeiras considerações, que fixam a minha orientação nesta casa do Parlamento. Qualquer Govêrno que queira governar fazendo tábua rasa de todas as mesquinhices da política, êsse tem o meu apoio! Só combaterei aquele que fizer mesquinha política, não tendo que apresentar melhor! (Muitos apoiados da esquerda e do centro).

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Vasconcelos Sá (sobre a ordem): - Sr. Presidente: tambêm eu, como o ilustre Deputado que me precedeu no uso da palavra, fazia firme tenção de não entrar neste debate, a não ser que quaisquer palavras proferidas por quem de direito, na resposta às interpelações que lhe fossem formuladas, me forçassem neste debate a entrar. Foi o que sucedeu! Agora que vi o ilustre Deputado da maioria, Sr. Ramada Curto, o qual sentiu o debate em má situação para o Govêrno, acudir-lhe rapidamente com a sua retórica, eu não podia deixar de explicar à Câmara a minha atitude, para lhe tirar algumas preocupações que tanto mal lhe parecem fazer.

O Sr. Presidente: - Pedia a V. Exa. a fineza de ler a sua Moção, conforme determina o Regimento.

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O Orador: - Também eu me esquecia de ler a Moção, do mesmo modo que o Sr. Alexandre Braga; mas fazia tenção do a mandar para a Mesa no- final das minhas considerações.

A minha Moção, porêm, é de oposição ao Govêrno, o diz o seguinte:

Moção

A Câmara, considerando que o Govêrno não realiza a missão que lhe compete, continua na ordem do dia. - A. Vasconcelos e Sá.

Admitida.

Prejudicada.

Sr. Presidente: êste bloco insignificante, que de nada vale, faz, contudo, tanta aflição aos ilustres deputados da maioria, que vem S. Exas. para aqui dizer ou pretender insinuar que até a nacionalidade corre perigo, com a nossa oposição. Estranho caso! Estranho contraste para uma agremiação que se diz ser tam insignificante, e tam pouco importante! (Apoiados).

O ilustre Deputado, Sr. Presidente, que nesta Câmara falou e votou contra a lei de excepção, que com grande desgosto meu aqui foi defendida pelo ilustre Presidente do Ministério, parece-me que agora, ao fazer uma tam grande defesa do Govêrno, não se recorda que o combateu tenazmente a quando da apresentação da lei de excepção que deu origem à formação do bloco. Não se recorda tambêm que o Sr. Presidente do Ministério disse, respondendo a um ilustre Deputado, que êle o Govêrno nunca tinham lançado a discórdia na sociedade portuguesa, e foi para público que S. Exa. falou e como Presidente do Ministério, cousa de que muita gente parece esquecida! Disse mais S. Exa., ao defender essa abominável lei de excepção, que ela era um sacrifício preciso, que nem magoava os princípios mas apenas as fórmulas!

Aqui têm V. Exas. o acto mais extraordinário de política atractiva feita fora do Parlamento contra deputados que votaram, no seu pleno direito, contra uma lei que não era necessária!

E tenho saudades do tempo em que, daquelas bancadas, eu combatia, ao lado do Sr. António José de Almeida, as leis de excepção que o Partido Democrático propunha quando das incursões monárquicas!

Mas, Sr. Presidente, é preciso que em Portugal acabe, do uma vez para sempre, êste hábito da maioria, que, quando alguém lhe reprova o seu modo de pensar, quando alguém a contraria, chama aos seus contraditares germanófilos e não patriotas!

Ai de quem tiver ideas contrárias às do Govêrno, porque será, com palavras exageradamente entusiásticas, classificado de perturbador!

Sr. Presidente: é extraordinário que êste Govêrno, - a que os órgãos da imprensa, de maior publicidade, chamam incompetente, - é extraordinário que êste Govêrno, para mascarar a sua incompetência, venha dizer que aqueles que o combatem são menos patriotas, são menos sérios nas suas acções, porque é menos sério aquele homem que defendia a nossa intervenção na guerra, e que parece agora que a combate.

O Sr. Ramada Curto: - Esta censura - se assim se lhe pode chamar - não e dirigida aos homens do Partido Evolucionista, mas talvez se dirija à atitude da União Republicana.

O Orador: - A União Republicana não precisa que a defendam, mas eu alguma cousa hei-de dizer a V. Exa. a êsse respeito e a êsse propósito.

Eu teria, se mo quisesse alongar em considerações, acusações concretas a fazer a nêste Govêrno, mas agora limito-me a protestar contra o uso exagerado da palavra "Pátria", como se não fossem patriotas senão aqueles homens que se sentam nas cadeiras governamentais e a maioria que apoia os seus actos! (Apoiados).

Sr. Presidente: eu vim há pouco de África o prezo-me de ser um português que muito ardentemente defendo a minha Pátria, - apesar de eu nada valer, - aqui ou na guerra. E sinto-me honrado de estar ao lado da União Republicana, porque eu tenho respeito por todas as ideas.

Foi a única razão porque o bloco fez essa declaração. Os compromissos tomados em nome da Nação seriam todos respeitados pelos homens que estivessem no poder.

Trocam-se apartes.

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E como o abuso que se está fazendo da palavra "Pátrias, como se só houvesse patriotas nos membros do Govêrno e da maioria! Protesto indignadamente contra esta exploração verbal!

Tinha ainda muitas cousas para dizer, mas não quero alongar-me em considerações a estas noras da noite.

Não quero, porem, deixar do lembrar ao Govêrno que se não esqueça do olhar parca o problema económico, para que, depois da guerra. Portugal se não encontre numa situação desesperada, e não continue descurando, por completo, muitos problemas de fácil resolução o que nos hão-de custar bem caros, por descurados agora serem.

Isto dizia eu há oito meses e hoje são todos os agricultores e comerciantes das duas costas a pedir providências ao Govêrno. Parece que o Sr. Presidente do Ministério considera de somenos importância o problema dos transportes marítimos das colónias.

Faço notar êste facto pela circunstância do Sr. Presidente do Ministério ser ao mesmo tempo Ministro das Colónias. Como seria fácil, nesta questão de política geral, S. Exa. ter resolvido o problema por outra forma.

O que nós vemos é que a atenção do Govêrno para o problema dos transportes marítimos é de tal ordem que até aprovou em Conselho de Ministros o projecto de navegação para o Brasil, servindo-se para isso de vários navios ex-alemães. Quere dizer: o Govêrno não julgava êsses navios necessários para a navegação para as nossas colónias!

Ainda hoje um distinto agricultor de Moçambique nos vem dizer, no Século, que há quatro meses que os navios da Empresa Nacional de Navegação não tocam em Quelimane.

O Sr. Presidente do Ministério, naturalmente, ignora o que êste facto representa em prejuízos irremediáveis para a metrópole e para Quelimane. Só da Zambózia saem em açúcar, fibras, amendoim, borracha, milho, etc., cêrca de 40:000 toneladas por ano das 80:000 e 90:000 que são a produção da província de Moçambique.

Devido à incúria do Govêrno está-se a acumular borracha e açúcar nas colónias. O Govêrno deixou que navios como o Adelaide, que se encontrava em Loanda em Junho, - um barco de mais de 9:000 toneladas, com magníficas instalações frigoríficas e que era um dos navios que os alemães empregavam para ir à Austrália buscar carnes congeladas, - fôsse cedido à casa Marshall. Um navio como êsse era indispensável. E eu sei que êle não serviu para o que devia servir.

Na Zambézia encontram-se cargas e cargas acumuladas desde há muito tempo, estragando-se lentamente, porque não há armazéns para as reter, e se amanhã os agricultores não pagarem ao Estado as suas contribuições, se o indígena não pagar o imposto de palhota, se o nosso comércio paralisar - eu preguntarei quem era mais prudente: se aqueles que apenas olham para a guerra, se os que a tempo e horas lembraram estas questões para se solucionarem como deviam.

Sr. Presidente: a causa que deu origem a eu combater êste Govêrno foi a lei que o Sr. Ramada Curto não votou, e bastante admirado fiquei em ouvir hoje o mesmo Sr. Deputado falar em compromissos de honra, sofismando tudo com a sua eloquência de advogado e contrariando a sua anterior atitude.

O orador não reviu.

O Sr. Simões Raposo (sobre a ordem): - Sr. Presidente: em obediência às disposições regimentais, vou ler e mandar para a Mesa a minha moção de ordem.

Moção

A Câmara, convencida da indispensabilidade de se manter a União Sagrada, passa à ordem do dia. - Simões Raposo.

Admitida.

Prejudicada.

Na sessão da tarde fiz tenção de usar da palavra neste debate porque julgava indispensável dizer a V. Exa., à Câmara e ao país o que eu, evolucionista, pensava a respeito do incidente parlamentar aqui levantado. Pela sequência do debate e depois de ter feito uso da palavra, na sessão da noite, o leader do meu partido, Sr. Júlio Martins, via-me dispensado de fazer as minhas declarações.

Porém, novos argumentos e novas asserções foram trazidas à discussão e eu voltei à minha primitiva tenção, isto é, falar.

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Eu, Sr. Presidente, vou encurtar o mais possível as minhas considerações pelo adiantado da hora, porque a Câmara já está fatigada e eu pouco ou nada posso acrescentar; se não fôsse o que se julga o cumprimento dum dever, eu não entraria no debate, nem usaria da palavra, mas desde que os Deputados que abandonaram os seus lugares no centro pretendem firmar a sua atitude política e justificar a sua nova orientação dentro do bloco por uma discordância entre a nossa atitude passada e a presente, eu vou expor as minhas ideas.

O aspecto político que resulta da atitude assumida por êsses meus antigos correligionários, êsse, sim, tem de ser definido perante o país, uma vez que S. Exas. entenderam que deviam da tribuna parlamentar afirmar a sua nova atitude.

Dizem S. Exas. que continuam a ser sempre defensores como foram dêsse programa.

Ora, desde que fazem essa afirmação, nós, evolucionistas, que nos mantivemos em volta do nosso chefe e no partido, deixamos de ter essa coerência política que S. Exas. querem para si. Eu tenho, portanto, que mostrar ao país que não é assim e que não estamos nessa situação de incoerência.

O Sr. Malva do Vale leu umas passagens do nosso programa partidário, mas o programa do Partido Evolucionista não se contêm apenas nessas passagens, e é preciso notar que êle não é só êsse programa que foi aprovado no congresso do partido em 1913, porque êsse programa é apenas um programa de reivindicações, mas o programa está tambêm diluído em vários documentos e discursos proferidos pelo nosso chefe, com a sanção de todos os parlamentares e políticos do Partido Evolucionista, em vários actos públicos.

S. Exas. dizem, como o acaba de repetir o Sr. Vasconcelos e Sá, que a razão que os fez afastar da União Sagrada, para, por patriotismo, combaterem o Govêrno, foi discordarem da negregada lei com que o Govêrno se quis munir para evitar que se propagassem os actos de rebelião contra a Pátria, actos anti-patrióticos que não tiveram repercussão. Mas essa parte diz respeito ao Poder Judicial, e essa declaração foi o prólogo das afirmações que em seguida foram feitas nestas palavras que vou ler:

Leu.

Ora nós, evolucionistas, mantivemos a opinião manifestada no nosso programa, relativamente ao Poder Judicial, que a lei votada em nada contraria, lei que julgamos necessária.

Portanto, esta disposição do programa do Partido Evolucionista em nada ficou alterada.

Mas fica o espirito dêsse programa alterado, pois não se devem admitir leis de excepção, diz-se.

Eu tambêm sou contra as leis de excepção.

Sempre fui contra a pena de morte, mas declarei nesta Câmara que não combatia essa lei por achar que o momento actual é o mais grave.

Podem V. Exas. dizer-me: mas lá está a sua incoerência! Não; é que nós estamos numa ocasião não excepcional, mas única; numa ocasião em que o país está em guerra, e que está em guerra contra um combatente que fez táboa rasa de todos os princípios, pôs do lado todas as convenções, abandonou por completo e fechou os olhos até aos mais elementares princípios de direito (Apoiados);

Por conseguinte, eu tenho de combater êsse inimigo da minha Pátria, duma maneira única e vencê-lo seja como for (Apoiados).

E, desde que eu faço parte duma nacionalidade que constituía, sim, o verdadeiro bloco contra êsse inimigo comum, eu tenho só de fazer uma cousa: é fazer com que o meu país honre os seus compromissos para tentar realizar a parte que lhe foi distribuída na obra dos aliados (Apoiados).

Esta é a razão por que eu votei essa lei do Sr. Ministro da Guerra, assim como amanhã votarei todas as leis que o Govêrno entender necessárias trazer a esta casa para honrar os compromissos da Nação, que são mais que os próprios princípios (Apoiados).

Dizem V. Exas. que estão dentro dos princípios evolucionistas! Pois não há um só documento, não há um só discurso ou um só acto público do Partido Evolucionista que não exare esta afirmação categórica, o Partido Evolucionista foi criado para integrar numa mesma idea a Pá-

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tria e a República, não sobrepondo nada acima da Pátria e da República! Esta é uma afirmação categórica; e assim, quando o partido apoiou a ditadura de Pimenta de Castro, - e muitos que me escutam sabem o que eu pensava a tal respeito! - até nessa mesma ocasião o partido dizia que se aliaria até aos seus mais ferozes inimigos para salvar a Pátria e a República, isto quando ainda não se tinha declarado a guerra a Portugal e quando não se estava numa situação tam importante, para o nosso país, como a de hoje (Apoiados).

Ora se os princípios do Partido Evolucionista são como digo, - e nenhum dos ilustres Deputados será capaz de contestar estas afirmações, porque eu tenho aqui diferentes documentos e textos, que não leio para não fatigar a atenção da Câmara! - eu demonstrarei que, não só pela boca do ilustre Presidente do Ministério e chefe do partido, mas tambêm pela boca dos seus oradores, desde o mais até ao menos categorizado, a idea da Pátria e da República sobrepõe-se a tudo, absolutamente a tudo. E até para confirmar o que acabo de dizer, e de certa maneira para responder a uma das arguições com que pretenderam atingir o nosso chefe de partido os Deputados que saíram das nossas fileiras, e que com ela se querem estribar para justificarem a sua atitude actual, lembrarei um discurso pronunciado pelo chefe do partido num dos centros da capital. Essa passagem não se referia a S. Exas., porque era a reprodução duma afirmação anteriormente feita.

E depois terminava com estas palavras:

Leu.

Ora aqui está, Sr. Presidente, em que se resumem todas as ofensas feitas pelo chefe do Partido Evolucionista contra aqueles partidários. E dar-lhes a liberdade de pensarem como entenderem, reservando para si a mesma liberdade de pensamento. Há ainda outra passagem em que S. Exas. se julgavam atingidos e é aquela em que se dizia que o Partido Evolucionista não era balcão. Mas eu devo dizer que essa afirmação foi empregada não para criticar os actos de S. Exas., mas outros actos e para fazer a declaração de que S. Exas. estão convencidos, como nós estávamos tambêm convencidos, de que o Partido Evolucionista não se manteve até ao dia em que S. Exas. estiveram ao nosso lado, nem se mantêm, depois de S. Exas saírem, como partido para especulações políticas.

O Sr. António José de Almeida disse uma vez, com a coragem própria de todos os seus actos políticos, que quem quisesse vir para o Partido Evolucionista com segundos sentidos era melhor que para êle não viesse.

Sr. Presidente: não quero alongar-me em mais considerações, mas permita-me a Câmara que lho diga que sou daqueles homens que não falseiam as intenções do ninguém. Costumo sempre fazer justiça a todos, e, portanto, estou convencido de que S. Exas., abandonado o Partido Evolucionista, julgam que estão servindo a Pátria e a República.

Assim como faço essa justiça a S. Exas., tambêm S. Exas. tem que me fazer a justiça de acreditar que eu, defendendo a minha maneira de pensar, o faço inspirado nos meus princípios e com o mesmo amor à República e à Pátria.

Já eu combatia pela República há muitos anos, já tinha colaborado com vários correligionários meus, quando ainda não tinha relações pessoais com o Sr. Dr. António José de Almeida.

O meu amor à Pátria e à República era o mesmo e não vem da amizade pessoal que eu dedico a S. Exa.

Assim como S. Exas. tem o direito de combater êste Govêrno e criticar a sua obra, eu tenho o direito de o elogiar e de exalçar essa mesma sua obra, com todo o calor que entendo e que devo usar.

Foi admitida a moção do Sr. Simões Raposo.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Colónias (António José de Almeida) (para explicações): - Sr. Presidente: são poucas as palavras que vou pronunciar, e essas mesmas tem, simplesmente, o intuito de explicações, para não ficar sombra de dúvida sôbre alguns pontos.

Não é com intuito agressivo que dirijo as minhas palavras; de certo não tenho que agredir ninguêm, nem dentro da Câmara tenho com quem combater, por que todas as doutrinas e princípios que ex-

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pandi em dois longos discursos, em que respondi ao interpelante Sr. Alfredo de Magalhães, permanecem intactos e de pé. Sei que da direita da Câmara diferentes oradores tentaram, por vezes, deformar e perverter o significado das minhas palavras, mas imediatamente da esquerda ou do centro se soltaram vozes eloquentes que fizeram a demonstração formal do que êles não estavam na razão e na justiça.

Nem isso seria preciso, porque julgo tam fora da lógica os argumentos apresentados que a defesa estava feita, pela flagrante eloquência dos factos, contra a qual nada pode vencer. (Apoiados).

Entretanto, alguns pontos foram versados que carecem de ser explicados duma maneira clara, para que sôbre êles não fique pairando, sequer, sombra de dúvida.

Falou-se em questão de princípios e disse-se que alguns Deputados tinham entrado para o bloco, porque os princípios a isso os levaram.

Logo o Sr. Simões Raposo falou para fazer a demonstração de que, de facto, aquela lei trazida ao Parlamento em nada, absolutamente, tinha obscurecido o fulgor admirável, que caracteriza sempre as doutrinas do programa do Partido Evolucionista.

Se quisesse fazer a demonstração de que aquela lei, embora dura e áspera, só era trazida porque a isso me obrigava a fôrça das circunstâncias; se houvesse necessidade de demonstrar que ela estava dentro dos princípios, podia citar o facto, talvez ainda não conhecido da Câmara, que se passou em Inglaterra - já citada quando se disse que na Inglaterra e no seu Parlamento, tudo se podia discutir largamente -, porque na mesma hipótese procedeu-se na revolta da Irlanda, com mais severidade e com mais violência e as asperezas foram até o ponto da crueldade.

A forma como em Portugal se procedeu, comparada com a forma porque procedeu êsse país, é absolutamente benigna.

Para lá não foram precisas leis de excepção por que se adoptou um procedimento de excepção e logo no princípio da guerra o Parlamento Inglês autorizou o Govêrno a publicar as leis que quisesse contra a lei fundamental do Estado e que reconhecesse indispensáveis à segurança da nacionalidade em perigo.

Por isso o chefe do Partido Evolucionista no congresso do seu partido e em toda a parte dirá sempre que esteve dentro dos princípios.

Na Inglaterra sucede ainda uma cousa simples, cuja informação tenho de fontes oficiais e diplomáticas. A sombra das autorizações dadas pelo Parlamento, o Govêrno Inglês, mal rebentou a conflagração da Irlanda, nomeou para lá um homem com poderes absolutos, e que ficou conhecido pelo ditador da Irlanda, e êsse homem, de visu, por um simples inquérito, feito por êle só, condenou uns poucos de revoltosos à morte, depois dum julgamento sumário condenou outros, e ainda agora estão nas prisões, esperando julgamento, sem saber quando hão-de ser julgados, grande número de indiciados que já poderiam estar julgados se mais rapidamente corressem os seus processos.

Portugal está em guerra, Inglaterra está em guerra; nem uma nem outra nação tem os seus territórios invadidos, e a Inglaterra, clássica nos princípios e nos direitos, teve de saltar por cima de direitos e de princípios, para defender, como entendeu, a honra da nacionalidade e os interesses da pátria britânica; o facto não é, portanto, tam estupendo que deva levantar clamores, simplesmente tratando-se duma lei ali trazida e defendida por mim, para vigorar apenas durante o tempo da guerra, o que mais mostra que o seu carácter de excepção é excepcionalíssimo. (Apoiados repetidos).

Outro ponto que desejo tocar é o que se refere à situação do meu partido, ainda que a êsse respeito não queira dizer mais do que foi dito pelos Srs. Júlio Martins e Simões Raposo. Afirmo que o meu partido está ali como agremiado político; não me esqueço um momento dele, da sua unidade, da sua fôrça, do seu prestígio e do seu brio, mas não me compete tratar o assunto ali na Câmara ou fora dela emquanto êle não for tratado no congresso do partido.

Quanto à situação do Sr. Machado Santos, a propósito do qual se leram palavras que eu tinha escrito em tempos, quando a bordo do aviso õ de Outubro êle ia pelas águas do Tejo alêm em direcção aos Açores, folgo que essas palavras tivessem sido trazidas para o Parlamento, porque, quando se afirmava

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há pouco que devia inúmeros favores políticos ao Sr. Machado Santos, se fica sabendo agora que êle tambêm alguns me deve, e, quando mais tarde a crítica imparcial falar, poder-se há avaliar o procedimento dêsse homem, hoje preso em virtude de acontecimentos bem conhecidos, e acêrca do qual, depois que está preso, não saíram dos meus lábios quaisquer palavras que pudessem magoar a sua situação de vencido, o que, atentando contra o Govêrno da República, se colocou na situação dum criminoso político. Acrescento, contudo, que o Sr. Machado Santos, a quem nunca chamei aquilo que outros, que agora o defendem, lhe chamaram, e que tam calorosamente já defendi no Parlamento, tambêm da sua parte deve uma atenção, que nem todos praticariam, para com êle. sobretudo depois dele ter dirigido a meu respeito, no seu depoimento, as palavras que dirigiu, chamando-me o chefe dum Govêrno de concussão, de peculato e de crime, porque declarei logo, com assentimento do todo o Govêrno, que, se a acção do Govêrno a respeito dele e dos revoltosos de 13 do Dezembro houvesse do retirar a êsse homem a pensão que lhe foi votada no Parlamento, não transigiria, um momento sequer, com isso, porque não queria bulir nessa lembrança da República para com êle.

Tenho ainda um esclarecimento a dar.

No en tête da Republica que escrevi a propósito de Machado Santos há um ponto que hoje não traduz inteiramente a verdade.

Supus que Machado Santos ia preso para os Açores e nesse sentido escrevi; mas não era assim. Mais tarde o Sr. José de Castro afirmou que êle tinha sido retirado de Lisboa para evitar qualquer atentado contra êle, mas que chegado aos Açores ficou com liberdade completa para ir para onde quisesse.

Um outro ponto a que desejo, tambêm, referir-me, é o que diz respeito às minhas relações com o Sr. Afonso Costa e ao acto de conciliação que se produziu entre os dois. Congregámo-nos, fizemos as pazes, para empregar a terminologia, vulgar, porque expontâneamente, num momento de gravíssimo perigo para a nacionalidade, entendemos ser nossa obrigação de portugueses assim o fazer. Se o acto que praticámos tivesse sido cometido antes de declarada a guerra teria sido um acto desonroso para qualquer de nós; feito depois de declarada a guerra europeia seria ainda menos nobre e talvez indecoroso; mas praticado com a expontaneidade com que o foi, depois de se ter declarado a guerra da Alemanha a Portugal, foi um acto nobre na acidentada vida pública. (Muitos apoiados). Não nos juntámos um ao outro para partilharmos do mesmo banquete, nem para irmos à esconjura nos mesmos interesses; encontramo-nos os dois para irmos para o alto da mesma tribuna pregar ao povo a sua salvação e a sua redenção e para subirmos ambos, com a pesadíssima carga dos encargos da administração pública, a dolorosa encosta ao cimo da qual suponho estar a salvação de Portugal.

Houve lutas apaixonadas e furiosas entre os dois - assinalou-o o Sr. Júlio Martins com verdade profunda; não há ninguêm que não se lembre dessas lutas em que palavras sangrentas se trocaram; todos as tem ainda, porventura, na sua recordação; somente se apagaram da memória de dois homens. Temos ideas políticas diferentes, continuamos separados em muitos pontos como antigamente, mas retirámos as ofensas pessoais para nos podermos ligar um ao outro para a defesa do país; nisto não fiz mais do que seguir aquela linha de conduta que sempre segui.

Quando o Sr. Manuel de Arriaga me pediu que me reconciliasse com o Sr. Afonso Costa disse-lhe que não, mas acrescentei que quando a nacionalidade estivesse em risco eminente esqueceria tudo e não seriam só os meus amigos que ao lado do Sr. Afonso Costa defenderiam a República; seria eu tambêm que, varrendo da minha memória recordações antigas, viria ao lado dele ocupar o meu pôsto de honra.

Isto consta duma mensagem que o meu Partido enviou ao Sr. Manuel de Arriaga e veio publicada nos jornais. No Congresso do meu Partido fiz mais tarde igual declaração e não houve, então, ninguêm que ficasse sentado e não aplaudisse essas palavras em que ia toda a sinceridade da minha alma.

Efectivamente, quando chegou o momento do perigo, imediatamente aceitei um lugar ao lado do Sr. Afonso Costa. Também quando para responder ao Sr. Alfre-

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do de Magalhães citei palavras suas duma carta publicada em jornais não o fiz para lembrar velhas questões, mas para rebater arguições de S. Exa.

Tenho a obrigação restrita do dizer, neste momento, estas palavras para que bem claramente entrem na consciência da Nação. Vim para êste lugar trazido por um impulso de honra, e mais tarde a História, quando apreciar a minha vida política, há-de levar-me em conta, para desconto dos meus erros, a declaração honrada o sincera do meu procedimento.

O Sr. Vasconcelos e Sá: - Notarei que o Sr. Presidente do Ministério nada disse a respeito das preguntas que formulei a propósito da questão colonial, a mais importante de todas.

O Orador: - Não quis envolver no assunto as cousas de África em que S. Exa. falou, esperando que delas trate, como disse, em melhor oportunidade. Devo, entretanto, dizer que as cousas não tem estado tam desamparadas que em Novembro e Dezembro não viessem mais 60:000 a 70:000 toneladas de carga, e se de Quelimane nada tem vindo é porque as necessidades da guerra fizeram com que navios que deviam ir para o norte tivessem de seguir para o sul.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação das moções que se encontram na Mesa.

O Sr. Júlio Martins: - Sr. Presidente: peço a V. Exa. o obséquio de consultar a Câmara sôbre se permite que eu retire a minha moção.

Foi autorizado.

Leu-se na Mesa a moção do Sr. Simas Machado, que foi rejeitada.

O Sr. Moura Pinto: - Requeiro a contraprova.

Verificou-se o resultado antecedente, rejeitando a moçào 60 Sr s. Deputados, e aprovando-a 12.

Leu-se a moção do Sr. Alexandre Braga, sendo aprovada.

O Sr. Presidente: - Tendo sido aprovada a moção do Sr. Alexandre Braga, ficam, conseqùentemente, prejudicadas todas as outras.

A próxima sessão realiza-se na segunda-feira, às 14 horas, com a seguinte ordem do dia:

Continuação da interpelação do Sr. Deputado António Caetano Macieira Júnior aos Srs. Ministros da Marinha e do Trabalho, sôbre os transportes terrestres e marítimos, nas suas relações com as necessidades económicas do país;

Parecer n.° 564, da comissão de legislação civil o comercial, propondo a constituição duma comissão para apreciar a proposta de lei n.° 529-B;

Parecer n.° 494, criando as milícias coloniais;

Parecer n.° 236, reintegrando no sou lugar o aspirante telégrafo-postal João Rodrigues Ferreira;

Parecer n.° 360, aumentando um parágrafo ao artigo 444.° da reorganização do exército, de 25 de Maio de 1911;

Parecer n.° 464, substituindo alguns artigos do capítulo 3.° do decreto com fôrça de lei de 28 de Maio de 1911, que reorganizou o exército metropolitano;

Parecer n.° 433, autorizando a Câmara Municipal do concelho de Sines a lançar o imposto de 1 por cento sôbre o valor das mercadorias a exportar pelo seu pôrto;

Parecer n.° 435, autorizando a Câmara Municipal do concelho de Sines a lançar o imposto de 1 por cento sôbre o valor do peixe vendido nas lotas de terra e mar que se realizem no seu concelho;

Parecer n.° 556, reduzindo o quadro dos professores dos liceus de Rodrigues de Freitas e de Passos Manuel, e aumentando o de Gil Vicente;

Parecer n.° 416, criando na comarca de Lisboa o 2.° juízo do transgressões e execuções.

Está encerrada a sessão.

Era 1 hora e 20 minutos.

O REDACTOR - Afonso Lopes Vieira.

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