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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 1

EM 3 DE DEZEMBRO DE 1918

Presidência do Exmo. Sr. António Lino Neto

Secretários os Exmos. Srs.

Francisco dos Santos Rompana
João Calado Rodrigues

Sumário. - Abre a sessão com a presença de 91 Srs. Deputados. São introduzidos na sala e tomam assento os Srs. Deputados Francisco José Fernandes e Francisco Veloso. São lidas as actas das duas últimas sessões, o Sr. Aires de Ornelas, por parte da minoria monárquica, declara que, por motivo da solenidade que a Câmara resolve imprimir à sessão pela vitória dos aliados, se abstêm de fazer as considerações que a leitura da acta da sessão do dia 4 de Novembro lhe sugere, propondo-se fazê-las na sessão seguinte, com o que concorda o Sr. Almeida Pires, por parte da maioria.

São aprovadas as actas.

O Sr. Presidente discursa sôbre a vitória dos exércitos aliados, propondo votos de congratulação e saudação, e sôbre o mesmo assunto usam seguidamente da palavra os Srs. Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros (Egas Moniz), Almeida Pires, Aires de Ornelas, Pinheiro Torres, Calado Rodrigues, Celorico Gil, Cunha Lial, Joaquim Crisóstomo, Adelino Mendes, João de Castro e Carlos da Maio. O Sr. Ventura Reimão apresenta um proiecto de lei e é aprovada uma moção do Sr. Almeida Pires com um aditamento do Sr. Adelino Mendes.

Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte.

Documentos mandados para a Mesa. - Projecto de lei. Justificação de faltas.

Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:

Adelino Lopes da Cunha Mendes.
Adriano Marcolino de Almeida Pires.
Afonso José Maldonado.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Castro Pereira de Almeida Navarro.
Alberto Dinis da Fonseca.
Alberto Malta de Mira Mendes.
Alberto Pinheiro Torres.
Alberto de Sebes Pedro de Sá e Melo.
Alexandre José Botelho de Vasconcelos e Sá.
Alfredo Machado.
Alfredo Marques Teixeira de Azevedo.
Alfredo Pimenta.
Álvaro Miranda Pinto de Vasconcelos.
Aníbal de Andrade Soares.
António Bernardino Ferreira.
António Caetano de Abreu Freire Egas Moniz.
António Caetano Celorico Gil.
António Faria Carneiro Pacheco.
António Ferreira Cabral Pais do Amaral.
António Hintze Ribeiro.
António Lino Neto.
António Luís da Costa Metelo Júnior.
António Maria de Sousa Sardinha.
António dos Santos Jorge.
Armando Gastão de Miranda e Sousa.
Artur Augusto de Figueiroa Rêgo.
Artur Mendes de Magalhães.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Camilo Castelo Branco.
Carlos Alberto Barbosa.
Carlos Henrique Lebre.
Carlos José de Oliveira.
Domingos Ferreira Martinho de Magalhães.
Duarte de Melo Ponces de Carvalho.
Eduardo Fernandes de Oliveira.

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Eduardo Fialho da Silva Sarmento.
Eduardo Mascarenhas Valdez Pinto da Cunha.
Egas de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral.
Eugénio Maria da Fonseca Araújo.
Fernando Cortês Pizarro de Sampaio e Melo.
Fernando de Simas Xavier de Basto.
Francisco António da Cruz Amante.
Francisco de Sousa O ornes Veloso.
Francisco Joaquim Fernandes.
Francisco José da Bocha Martins.
Francisco Maria Cristiano Solano de Almeida.
Francisco Miranda da Costa Lobo.
Francisco Pinto da Cunha Lial.
Francisco dos Santos Rompana.
Francisco Xavier Esteves.
Gabriel José dos Santos.
Jerónimo do Couto Rosado.
João Baptista de Almeida Arez.
João Baptista de Araújo.
João Calado Rodrigues.
João Henrique de Oliveira Moreira de Almeida.
João Henriques Pinheiro.
João Monteiro de Castro.
João Tamagnini de Sousa Barbosa.
Joaquim Crisóstomo da Silveira Júnior.
Joaquim Faria Correia Monteiro.
Joaquim Isidro dos Reis.
Joaquim Nunes Mexia.
Jorge Couceiro da Costa.
José Adriano Pequito Rebelo.
José Alfredo Mendes de Magalhães.
José Augusto de Melo Vieira.
José Augusto Moreira de Almeida.
José de Azevedo Castelo Branco.
José Cabral Caldeira do Amaral.
José Caetano Lobo de Ávila da Silva Lima.
José Carlos da Maia.
José João Pinto da Cruz Azevedo.
José de Lagrange e Silva.
José Luís dos Santos Moita.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José Vicente de Freitas.
Luís Filipe de Castro (D.) (Conde de Nova Goa).
Luís Nobreza de Lima.
Manuel Maria de Lencastre Ferrão de Castelo Branco. (Conde de Arrochela).
Manuel Pires Vaz Bravo Júnior.
Mário Mesquita.
Maurício Armando Martins Costa.
Pedro Augusto Pinto da Fonseca Botelho Neves.
Pedro Joaquim Fazenda.
Pedro Sanches Navarro.
Rui de Andrade.
Vasco Fernando de Sousa e Melo.
Ventura Malheiro Reimão.
Vítor Pacheco Mendes.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Alberto da Silva Pais.
Henrique Ventura Forbes Bessa.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Abílio Adriano Campos Monteiro.
Albano Augusto Nogueira de Sousa.
Alfredo Augusto Cunhal Júnior.
Alfredo Lelo.
Amâncio de Alpoim Toresano Moreno.
António de Almeida Garrett.
António Augusto Pereira Teixeira de Vasconcelos.
António Duarte Silva.
António Luís de Sousa Sobrinho.
António Miguel de Sousa Fernandes.
António dos Santos Cidrais.
António de Sousa Horta Sarmento Osório.
António Tavares da Silva Júnior.
António Teles de Vasconcelos.
Domingos Garcia Pulido.
Duarte Manuel de. Andrade Albuquerque Bettencourt.
Eduardo Augusto de Almeida.
Eduardo Dario da Costa Cabral.
Eugénio de Barros Soares Branco.
Eurico Máximo Carneira Coelho e Sousa.
Fidelino de Sousa Figueiredo.
Francisco Aires de Abreu.
Francisco de Bivar Weinholtz.
Francisco da Fonseca Pinheiro Guimarães.
Francisco José Lemos de Mendonça.
Gaspar de Abreu e Lima.
João José de Miranda.
João Ruela Ramos.
Joaquim Madureira.
Joaquim Saldanha.
Jorge Augusto Botelho Moniz.
José de Almeida Correia.

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José Augusto Simas Machado.
José Eugénio Teixeira.
José Feliciano da Costa Júnior.
José Féria Dordio Teotónio.
José de Figueiredo Trigueiros Frazão, (Visconde do Sardoal).
José Jacinto de Andrade Albuquerque Bettencourt.
José das Neves Lial.
José Nunes da Ponte.
José de Sucena.
Justino de Campos Cardoso.
Luís Ferreira de Figueiredo.
Luís Monteiro Nunes da Ponte.
Manuel Ferreira Viegas Júnior.
Manuel José Pinto Osório.
Manuel Rebelo Moniz.
Miguel de Abreu.
Miguel Crespo.
Serafim Joaquim de Morais Júnior.
Silvério Abranches Barbosa.
Tomás de Aquino de Almeida Garrett.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Procedeu-se à chamada.

O Sr. Presidente (às 15 horas e 15 minutos): - Estão presentes 91 Srs. Deputados, número suficiente para a Câmara funcionar.

Está aberta a sessão.

Constando-me que estão nos corredores da Câmara os Srs. Deputados Francisco Joaquim Fernandes e Francisco Veloso, convido os Srs. Deputados Moreira de Almeida, Calado Rodrigues, Pinheiro Torpes e José Henrique Pinheiro, a introduzirem S. Exa. na sala.

Foram introduzidos e tomaram assento.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura da acta da sessão de 4 de Novembro.

Foi lida a acta.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

O Sr. Aires de Ornelas: - Sr. Presidente: a Leitura da acta, que acaba de ser lida na Mesa, sugeriu-me, naturalmente, um certo número de observações, mas consta-me que a sessão de hoje é dedicada a comemorar um dos actos mais solenes da humanidade, qual é a vitória nossa e a dos aliados na grande guerra em armistício.

Nestas condições, e em homenagem à união que nesta casa se deve sempre manifestar em ocasião de celebração nacional, entendo, como os moas colegas dêste lado da Câmara, que melhor caberia a explanação dessas observações numa sessão de carácter mais reservado e, por isso, lembrava-me de solicitar de V. Exa., Sr. Presidente, que na próxima sessão desta Câmara pudesse, então, fazer as observações que por motivos de ordem internacional eu não desejaria fazer agora.

O orador não reviu.

O Sr. Marcolino Pires: - Sr. Presidente: pedi a palavra parra declarar à Câmara que a maioria concorda com o modo de ver apresentado pelo Sr. Aires de Ornelas, isto é, que a sessão de hoje seja destinada a comemorar a vitória dos aliados. Aqui dentro somos todos portugueses e, por isso, em nome dêste lado da Câmara, declaro que estamos resolvidos a liquidar, na próxima sessão, o incidente a que S. Exa. se referiu.

O orador não reviu.

Foi aprovada a acta da sessão de 4 de Novembro.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à leitura da acta da sessão de 7 de Novembro.

Lida na Mesa, foi aprovada sem discussão.

O Sr. Presidente: - Impõe-se, manifestamente, à consideração da Câmara um facto extraordinário e sem precedentes na história da humanidade, qual o da vitória dos aliados na grande guerra mundial que teve o seu início em 1914.

Essa vitória ora em tudo profundamente portuguesa; foram armas nossas que brilharfam mais uma vez ao sol da glória; foram povos da nossa raça que se ergueram na maior epopeia de todos os séculos; foram almas levantadas de todos os recantos da terra que, juntas com as nossas, impuseram, mais uma vez, o império da justiça, o triunfo da civilização moral.

Creio, portanto, estar no ânimo da Câmara um voto de congratulação por tam glorioso acontecimento e ainda a consa-

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gração exclusiva desta, sessão a demonstrações especiais que melhor assinalassem o significado dêsse voto.

Em tais demonstrações cabia o primeiro lugar aos queridos soldados portugueses que, depois de se terem batido com valentia pela sua gente e pela sua terra, caíram mortos nos campos da batalha da África e da Europa. A êles é devida a nossa profunda saudade, reconhecimento e respeito. Ficam, bem, na sua auréola de glória, dentro da história de Portugal, história que é uma maravilha de génio da civilização humana. Bemdita seja, pois, sempre a memória dos nossos heróicos soldados que a morte ceifou!

Ocorre tambêm uma saudação muito especial aos denodados combatentes que sobreviveram à guerra, ao glorioso exército português de terra e mar.

Soube sacrificar-se, mais uma vez, pela nossa Pátria, honrando-a por toda a parte onde foi necessário batalhar, onde se tornou preciso derramar sangue. (Apoiados).

Glória, pois, aos valentes de Portugal! (Apoiados).

De mesmo modo está, por certo, no coração da Câmara uma saudação aos povos aliados, nossos amigos, aos seus esforçados exércitos e aos seus Govêrnos. (Apoiados).

Para êles, mais uma vez, a afirmação da nossa simpatia, do nosso reconhecimento, e da nossa solidariedade. (Apoiados).

Nos altos destinos em que temos vindo, Portugal foi sempre um desinteressado paladino de todas as cruzadas do direito e do progresso. Entre os grandes impérios que têm surgido na história, o império português sobrelevou & todos em abnegação de motivos; consumimo-nos pela vida fora a propagar a fé e a implantar os princípios fundamentais da moderna civilização europeia. Dizem-no bem alto os Lusíadas. E, por isso, êsse luminoso poema não é só um grande poema da nossa raça, é tambêm um grande poema da humanidade.

A nossa colaboração na guerra mundial, que felizmente acaba de ter o seu fim, não faz senão confirmar as tradições da nossa lialdade e amor aos princípios.

Deus tem-nos protegido sensivelmente!

A vitória, que nos coroou, é tam formidável de transformações e consequências progressivas que os povos, espantados, voltam-se para o sobrenatural, olhando o céu, em reconhecimento pela nova ordem de cousas. É ver a atitude de Wilson; é ver a atitude de Lloyd George; é ver a atitude dos mais consagrados representantes da actual situação mundial...

São forças morais que reagem para levantar à sua maior altura o carácter humano.

Por isso, eu não ficaria bem com a minha consciências se dêste lugar, onde me ergueu a bondade de todos, e com as responsabilidades que êle me impõe, não soltasse, no mais solene momento da história do mundo, a minha voz, como síntese dum sentir comum e como eco da grande alma nacional, em acção de graças e louvores à Providência; sim, à Providência que regula a marcha assombrosa dos séculos, segura dentro das suas balisas os mares agitados, e das dobras do seu manto misterioso nos sustem a nós, pequeninos, na contemplação das miragens infinitas de todos os grandes ideais.

Glória, pois, a Deus nas alturas e paz aos homens, na terra, de boa vontade!

O Sr. Egas Moniz (Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros): - Em nome do Govêrno associo-me às palavras pronunciadas por V. Exa., de que a nossa comemoração neste momento seja, em primeiro lugar, dirigida aos mortos que nos campos de batalha, em África, em França e no mar tam alto levantaram o prestígio do nome português; que as nossas saudações sejam dirigidas aos nossos valorosos soldados e valentes marinheiros que souberam tam alto erguer o nome da Pátria; que as nossas saudações sejam dirigidas a êsses soldados de Portugal que tam bem o representaram nesta luta, que acabou pela vitória dos aliados!

Êsses soldados tinham alguma cousa de grande, e épico, abandonando as suas aldeias, atravessando os mares através de todos os perigos, para, em terras estranhas, combaterem, em nome do seu país, pela causa do Direito, da Democracia e da Liberdade!

Que as nossas saudações sejam dirigidas a êsses heróicos marinheiros, tam he-

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róicos e grandes que ainda na última luta do caça-minas Augusto de Castilho, quando fizeram frente a submarinos, mostraram um valor, desprendidos da vida, que os vincula na história.

Que as nossas saudações se dirijam, em summa, a todos aqueles que, pela sua acção ou até pela sua propaganda, concorreram para a situação internacional que hoje disfrutamos.

Feitas estas saudações aos portugueses, eu quero, em primeiro lugar e em nome do Govêrno, saudar os chefes dos Estados das nações aliadas, e em segundo lugar os povos ao lado dos quais estivemos irmanados nesta luta homérica como V. Exa. muito bem disse, sem exemplo na história.

Há homens que nesta luta se mostraram de tal forma, e a alguns dêles já V. Exa. se referiu, que eu não quero por minha parte tambêm deixar do mencionar: Lloyd George, Clemenceau e Wilson.

Lloyd George é a síntese dum povo, a cuja tradição estamos ligados desde o início da nossa monarquia, pois a história diz que portugueses e ingleses combateram juntos quando da conquista de Lisboa. A nossa aliança com a Inglaterra vem de longe, e mais uma, vez a afirmámos quando do início da guerra, pois que desinteressadamente nos pusemos ao seu lado. Lloyd George sintetiza e simboliza êsse grande povo inglês. Saído das extremas esquerdas, a sua individualidade aumenta de prestígio e chegou a tal culminância, Sr. Presidente, que hoje pode dizer-se desassombradamente é um dos homens que, desde que se conhece a história da Inglaterra, mais alto nela se colocou.

Lloyd George simboliza uma parte da vitória. Foi devido à sua tenacidade intemerata, ao seu génio organizador, à sua indomável vontade que o triunfo se tornou uma realidade.

Um outro, Sr. Presidente, a quem eu quero neste momento fazer uma referência especial, é o chefe do Ministério francês, a Clemenceau, le trembleur de ministères. Foi êle que fez tombar para sempre as hostes inimigas na mais imprevista e colossal derrota de que há memória na história.

Clemenceau saiu do Parlamento, foi ali que se criou, foi ali que viveu. E, na hora precisa, quando se julgou que era indispensável um homem de pulso e de energia, êle levantou a França aos tempos heróicos dos séculos mediavais.

Não posso neste momento, como membro do Govêrno, deixar do fazer uma referência especial a essa altíssima individualidade, a êsse grande Ministro, a êsse grande dominador, a quem todos em França e no mundo inteiro fazem a justiça de colocar ao lado do grande Foch, a causa principal da vitória dos aliados.

Sr. Presidente: há uma outra individualidade que marcou na história, neste momento, o cujo nome se perpetuará para sempre através de todos os séculos. Refiro mo ao Presidente Wilson, essa alta individualidade que, encarnando bem o espírito nacional, meio aventureiro e sempre decidido a favorecer a causa da liberdade, da democracia e da justiça, pôde conseguir que o seu país, com a aprovação unânime do Congresso, viesse participar da luta duma maneira dicisiva, que fez baquear o dragão teutónico. Wilson, com a sua vontade de forro, dominou os submarinos e conseguiu fazer desembarcar em França 10:000 homens por dia.

Sr. Presidente: tambêm não devemos esquecer os outros que estiveram ao nosso lado.

A Itália, que nos combates aos Alpes, tanto se distinguiu em prol da causa justa dos aliados.

A Grécia, tam cheia de tradições, e que se colocou outra vez à altura da sua história, pois que Venizelos, com a sua vontade, conseguiu passar por cima dum rei que, por circunstâncias especiais de parentesco, desejava, pelo menos, a neutralidade da Grécia.

Venizelos, pôde fazer erguer o seu país e fazê-lo gozar das vantagens que são concedidas aos vencedores.

Da mesma forma nós devemos saudar o Brasil, o nosso irmão, que tanto auxiliou, no pelo sul americano, a causa dos aliados, e o Japão, que tanto concorreu, pelo seu esforço, para o desideratum da vitória.

Eu quero falar-lhes ainda da Sérvia, dêsse pequeno povo, mas glorioso, onde a tragédia da guerra foi mais intensa do que em qualquer outra parte, porque ao lado do ataque da metralha grassou uma das mais graves epidemias de que há memória nos tempos modernos. Tam grande

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ela foi que naquela trágica retirada, que mais tarde há-de ser aproveitada pelos dramaturgos, houve uma enfermaria onde morreram todos os doentes, e onde, querendo saber-se do médico dessa secção, foi êle procurado e encontrado morto debaixo do leito. Esta foi a tragédia mais empolgante de toda a guerra.

Há ainda outros dois grandes povos que temos do admirar pela sua combatividade: o Montenegro e a România. Uma outra nação resta a que desejo fazer uma especial referência. A Rússia. A Rússia, Sr. Presidente, a respeito da qual há pouco ouvi na frase que quero relatar à Câmara.

Um russo, meu amigo, expressou-se desta forma: "Hoje, entre as famílias dos aliados, não há nenhuma que não tenha um morto a deplorar, mas na família das nações aliadas o morto é a Rússia". E vi então que algumas lágrimas caíram rápidamente pelas suas faces.

Sr. Presidente: a Rússia deu o sacrifício do cêrca de cinco milhões de homens; contudo a desordem veio lançá-la na pior das anarquias. Que nos sirva isso de exemplo, e que o princípio da ordem seja sempre aquela pelo qual se orientem, todos os Govêrnos (Apoiados), e que sirva de norma a todos os homens que se interessem pela administração pública.

Sr. Presidente: deixarei pura o fim um País, para o qual quero ter palavras muito particulares e muito especiais. E para a Bélgica, que foi o supremo sacrificado. E para a Bélgica, que deu um grande exemplo de solidariedade humana. que jamais pode ser ultrapassado. É para o seu Rói, o extraordinário Rei Alberto. É para a Rainha da Bélgica, essa pequenina e encantadora figura feminina, que tem hoje a admiração de todos, sem distinção de crenças políticas.

Quero dizer a V. Exa. e à Câmara que a Bélgica, êsse pequeno país, de um grande povo, merece uma consideração especial de todos nós.

Sr. Presidente: não quero alongar-me muito, porque sei que estão inscritos muitos oradores, e por isso não mo refiro aos outros países que tiveram uma acção menos intensa, quer em África, quer no mar, quer em França.

Sr. Presidente: eu vou concluir, pois, mas não sem manifestar o desejo que tenho de que a proposta de V. Exa. - e isso está decerto no ânimo de todos nós - seja aprovada por aclamação, e que disto se dê conhecimento a todos os parlamentos dos países que tomaram parte neste lausperene de justiça, liberdade e de democracia. A todos êsses países a nossa homenagem, e aos seus exércitos, às suas marinhas de guerra, a todos aqueles que combateram nestes quatro anos, a todos aqueles que se esforçaram para que a vitória fôsse o que realmente foi.

O orador não reviu.

O Sr. Almeida Pires: - Sr. Presidente: pedi a palavra, em nome da maioria, para me associar com o mais vivo entusiasmo e o mais íntimo prazer à saudação que V. Exa. propôs às nações aliadas, por virtude da espantosa vitória sôbre os impérios centrais.

Sr. Presidente: eu assisti, como espectador, à memorável sessão aqui realizada em Agosto de 1914, e ainda mo recordo da comoção profunda que de todos se apoderou, quando o Parlamento Português, num momento de angústia o de incerteza para todos, se declarou ao lado da Grã-Bretanha. Parece que naquela ocasião uma onda de entusiasmo só apoderou de todos, chegando até as galerias, aclamando-se a França e a Inglaterra e Portugal, que desde essa hora de incertezas e de dores ia entrar no grande conflito. E para isso não esperou que a sorte fôsse próspera, pois desde os primeiros momentos os seus soldados pelejaram nessa luta gigantesca, de que não não há memória doutra igual nos anais da história. Terrível momento foi êsse para uma nacionalidade! Terrível momento êsse, mas todos compreenderam que mais valia a morte do que a desonra!

Nós provamos assim que os tratados não eram para, nós farrapos de papel!

Os nossos soldados pelejaram valentemente em França e em terra de África nesta luta grandiosa (Apoiados'), dando para essa vitória o sangue de seus corações.

Nem outra cousa poderia ter acontecido, Sr. Presidente, porque, como S. Exa. disse há pouco e muito bem, Portugal foi sempre um pioneiro do progresso e da civilização, e não podia manter-se indiferente nessa peleja estupenda, em que se joga-

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vam os destinos das nações pequenas, em que a Justiça e o Direito lutavam contra a opressão e contra a tirania.

Sr. Presidente: nessa peleja inaudita, a Alemanha não tinha somente por fim estrangular a França, aniquilar a Inglaterra - estava em jôgo a sorte das pequenas nacionalidades, que o império alemão pretendia esmagar.

Encontraram-se nessa luta gigantesca raças diversas, mas ainda desta vez não nos desamparou o Deus das batalhas, surgindo a apoiar-nos as figuras prestigiosas de Wilson, Clemenceau, Lloyd George e Hei Alberto da Bélgica, a par de muitos outros, e afinal ruiram tronos seculares.

Sr. Presidente: vencida a Alemanha, uma nova hora de liberdade e democracia se nos apresenta, o justo é que o Parlamento Português, honrando as suas tradições, preste as suas homenagens mais calorosas, as suas saudações mais efusivas a todas as nações que deram o seu esforço, o seu sangue, os seus filhos em prol da democracia, da civilização e da liberdade, sendo de suprema justiça que nessas homenagens sejam englobados aqueles que se sacrificaram e morreram.

Glória, pois, aos exércitos aliados, glória ao exército português, e glória, finalmente, aos mortos, que, - segundo a frase de Clemenccau - são os eternos conselheiros dos vivos. (Muitos apoiados).

O orador foi cumprimentado por todos os lados da Câmara.

O orador não reviu.

O Sr. Aires de Ornelas: - Sr. Presidente: é com sentimento profundo da honra que me cabe como leader da minoria monárquica nesta Câmara, que eu me levanto para usar da palavra. Comemora-se uma das grande" passagens da história do mundo e da humanidade; comemora-se uma vitória na qual se jogou a existência duma civilização inteira; comemora-se o triunfo dos aliados, aos quais nos ligam e nos prendem as gloriosas tradições da história portuguesa.

Sr. Presidente: não se deve admirar a Câmara de que a minha primeira saudação vá para quem tam alto manteve a honra e o prestígio desforças de torra e mar: para o soldado português. Não há muito que alguém vindo da frente me contou que naquelas unidades que bateram o record de presença nas trincheiras - porque lá estiveram onze meses - um oficial de ronda preguntava a um soldado, dêsses em quem visivelmente se notava ter chegado ao limite de resistência das forças humanas, se podia continuar ali.

Resposta do soldado; "Oh meu alferes, isto não é homem; isto é só coraje!

Não conheço frase mais admirável: uma raça que tem homens desta têmpera, de quem saem expressões destas não pode perecer!

Mando, pois, direito a minha saudação aqueles artilheiros que morreram abraçados às peças, quando atacados pelas massas alemãs, sacrificando assim a sua vida heróica e épicamente, cobrindo com os seus peitos o caminho de Calais.

Vai tambêm, Sr. Presidente, a minha saudação à memória dos heróis do caça minas Augusto de Castilho,, que num rasgo de intemerata bravura souberam manter as tradições gloriosas do nosso passado.

São factos dêstes que fazem sentir ainda hoje nas caliginosas trevas da política portuguesa alguns clarões de esperança e alguma visão do futuro.

Depois de falar em nós vai no dia de hoje a nossa primeira saudação à, nossa mais antiga, mais velha e tradicional aliada portuguesa a Gran-Bretanha. (Apoiados).

Ao Rei Jorge, o grande soberano dessa grande Nação, cabem boje os versos que o poeta dos Lusíadas dirigiu ao Rei de Portugal do seu tempo:

Vós poderoso Rei, cujo alto império
O sol logo em nascendo vê primeiro,
Vê-o depois no meio do hemisfério
E quando morre o deixa derradeiro!

Muito alto subiu a fôrça da tradicional instituição que êle representa durante esta guerra, reunindo em volta de si os domínios do Canadá, da Austrália, da Nova Zelândia, e a Grande União Africana, essas grandes nações de amanhã!

Porque ninguêm definiu a guerra melhor que o kaiser quando há poucos meses, celebrando o aniversário da sua subida ao trono, disse ser a luta entre o conceito germânico e o conceito anglo-saxónio.

O que era o conceito alemão no governo das sociedades mostra-o o atro-

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pêlo de todos os direitos feitos durante a guerra; o que é o conceito anglo saxónio dizem-no essas nações filhas do império britânico, cujo alicerce é o respeito das liberdades civis e direitos individuais sem os quais não há sociedade humana possível.

Por mercê de Deus venceu êste último conceito!

Sr. Presidente: não pode sofrer diminuição por não ser citada em primeiro lugar a França imortal, a primeira entre as nações beligerantes, tanto pelo seu esforço como pelo seu sofrimento.

Não há nada na civilização latina que não nos toque de perto, e sem querer servir-me de um lugar comum, que diz ter todo o indivíduo duas pátrias, a sua e a França, nunca se pode deixar de reconhecer a influência que a França, como atalaia da civilização cristã e latina, tem exercido na vida portuguesa.

A França deu provas de uma resistência que a muitos deixou surpreendidos, pois muitos dos que viajam só a conhecem pelo boulevard e pelos cabarets de Montmartre.

Mas ela soube sempre conservar o seu exército por uma organização especial fora e acima de toda a política partidária, mantendo intacta as mais gloriosas tradições da história militar, e apresentar hoje uma plêiade de chefes como os marechais Joftre, Foch e Petain!

Poucos episódios são mais comoventes do que o que se passou nessa manhã de 25 de Março, em volta do Hotel de Ville da pequena cidade de Doulons. Chegavam às 9 da manhã os automóveis conduzindo o Presidente Poincaré, Clemenceau o depois Petain o Foch para o rendez-vous ajustado com o comando britânico.

As horas iam passando e cada um, segundo o seu temperamento, passeiando no jardim; Petain, tranquilo, com a impassibilidade que é seu carácter; Foch, mais nervoso, como que impaciente por vencer, sacudia com a chibata as pedras do caminho, como Bonaparte em Marengo, quando esperava a divisão Desaix.

A impaciência era, porêm, já grande; o Estado Maior inglês não aparecia; às onze horas apeou-se emfim Douglas Haig do seu automóvel.

Clemenceau vai direito a êle e diz:

- "Os senhores querem a paz amanhã, ou a vitória?

Haig respondia que os exércitos britânicos estavam prontos a continuar a lutar.

- Então é o comando único! - exclamou Foch.

Entrou-se no hotel de Ville e pouco depois estava redigido o documento sancionando êsse facto para a breve trecho mudar a face da guerra.

O que daí resultou está na memória de todos; ninguêm esqueceu a arte que presidiu ao restabelecimento estratégico, o que foi o ataque de Magin sôbre Couseilles e finalmente a admirável manobra que fez ruir a célebre linha de Hindenburgo; uma vitória como não há memória na história.

Depois da França, a Bélgica. Quiseram pagar-lhe com dinheiro a honra: unida em volta do seu Rei, repeliu a afronta e sacrificou quanto humanamente é possível. Hoje está rediviva e o grande-Rei Alberto é aclamado à entrada em Gand pelos socialistas vermelhos.

Também um deputado radical socialista aclamava outro dia o Rei de Itália em sessão do Parlamento; é que a grande casa de Sabóia acabou a realização do grande idial da união italiana.

A nação italiana tambêm as nossas saudações.

E antes de concluir, para eu não tomar mais tempo à Câmara, não posso deixar de dirigir as mais calorosas saudações à nação que afinal veio para a guerra por ser nossa irmã, à obra prima da nossa colonização - o Brasil. Foi Rui Barbosa - e como portugueses devemos disso orgulhar-nos - quem melhor que ninguêm soube definir os idiais latinos em jôgo neste conflito e quem mais elevadamente soube fazer a apologia do Direito, violado pela agressão alemã. E faço votos por que esta casa possa sempre testemunhar a união de todos os portugueses perante os momentosos problemas que se vão decidir na próxima conferência da paz.

Tenho dito.

O Sr. Pinheiro Torres: - Em Junho de 1916 eu tive a honra de tomar parle em uma sessão célebre, realizada nesta cidade em homenagem à Bélgica martirizada

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e à suprema encarnação da sua alma heróica.

Sinceramente eu exclamava então: - Creio na vitória dos aliados, como creio em Deus! E a minha esperança, Sr. Presidente, não foi abalada, como nunca foi abalada a minha confiança.

Venceram as nações aliadas, e, com elas nós vencemos tambêm. Nesta hora saùdemo-las com unção e fé, curvando-nos perante a causa do direito e da justiça triunfantes.

Podemos ufanar-nos de termos servido a causa da civilização, da cultura da raça latina, a causa suprema da pátria.

Que orgulho deve ser o nosso de nos batermos ao lado da Inglaterra invencível, alma mater das liberdades públicas, nossa velha aliada, ao lado da qual obtivemos a vitória!

Com que profundo afecto o sangue português se derramou por essa pátria, que tem sido o maior guia do caminho progressivo dos povos.

Não posso deixar de saudar a América do Norte, com a qual estivemos em comunhão do ideais êsse admirável país, que tam rapidamente improvisou um exército para o trazer à guerra da Europa!

Prestemos homenagem à Itália, como é da nossa obrigação, falando da Itália e de Roma, não devemos esquecer que o espectáculo singular, que é o de todas as nações da Europa, mesmo aquelas que mais desafectas se mostravam à Igreja, só acercarem do Sumo Pontífice, que não tinha torça material, mostrando assim que a primeira fôrça do mundo residisse num homem, de cuja boca saíram as primeiras palavras de paz, e cuja justíssima indignação fulminou todas as misérias morais.

Não podemos nem devemos esquecer tambêm o Brasil, nossa irmã, cujas alegrias são as nossas e cujos dores são partilhadas por nós igualmente (Apoiados).

Não devemos esquecer igualmente a Bélgica (Apoiados). Não há nação, cuja lição seja mais proveitosa, cujo exército seja mais valente e heróico. O exemplo da Bélgica mostra que não há povos pequenos. O povo belga provou neste transe que é mais glorioso de todos os povos, o que uma nação não vale pela população que acumula, mas sim pelas virtudes que a enobrecem (Muitos aplausos).

Pregunto: o qne seria dos países pequenos sem o sacrifício da Bélgica, e o que seria do mundo sem o seu sacrifício?

A consciência universal não podia ser indiferente que êsse país marrasse; mas êle triunfou, felizmente.

Ao esfôrço dele jantemos o nosso, e deve dizer-se que, relativamente aos nossos minguados recursos, êsse esforço foi supremo.

Entramos aia guerra um pouco aventureiramente, sacrificando-nos com uma generosidade e com uma alegria que iguala o valor da nossa raça.

Combatemos nas trincheiras até morrer. Os nossos soldados conquistaram simpatias pela sua bravura e pela sua bondade. Sacrificamo-nos com os aliados, mas triunfamos com êles. Em Lille entramos vitoriosos como pioneiros da justiça, e estabelecemos a continuação histórica de espalhar pela terra as ideas cristãs que Wilson apregoa na sua famosa mensagem, fazendo curvar perante Deus todas as bandeiras dos aliados numa manifestação de fé nunca vista. Glorifiquemos essa fé do homem que é o representante duma Nação das mais poderosas do mundo, a mesma fé que tomou heróicos tantos dos nossos irmãos e que torna suave a memória da morte de dantes deles.

Devemos evocá-los, e êles que venham para nos inspirar, para nos ensinar que devemos sacrificar-nos pelos interesses nacionais nestas lutas políticas; êles que venham insuflar o seu espírito para resolvermos os tremendos problemas da Guerra.

Sr. Presidente: feito êste silencio que sucedeu ao troar dos canhões e ao fragor do maior conflito do mundo, é preciso que nos concentremos para aproveitarmos das lições da guerra. Pouco enxerga quem vê nesta guerra apenas uma simples luta económica.

A humanidade não caminha apenas a par dos interessas materiais; são a fé e a crença que iluminam a sua marcha.

Verificou-se que o homem tinha errado pondo de parte o passado, pois que um povo só caminha guiando-se pelas suas tradições e pelo seu pensamento religioso:

Se a democracia venceu deve declarar que o radicalismo falia.

Todo o mundo tinha os olhos fitos em Foch, êsse homem "que as fichas, radicais tinham pôsto em segundo plano; e êsse

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grande homem foi individualmente a maior garantia da vitória.

E Clemenceau é grande, maior do que nunca, quando reconhece os erros da sua política laica.

E neste princípio que a política portuguesa se deve estribar se quisermos fazer política e obra nacional.

Se passarmos para as necessidades concretas, encontraremos o Congresso da Paz, para o qual nos devemos preparar, indo a êle com uma unidade moral que possa defender os interesses vitais do país!

Neste momento vai, convictamente, toda a minha indignação contra aqueles que tentaram lançar o país na anarquia! Eu quisera neste momento sintetizar o ódio sagrado que tenho a essa gente, que não hesitou em lançar num dos maiores crimes a pátria portuguesa.

O problema social é um problema supremo, e é necessário que junto do mundo dos trabalhadores nós concorramos nesta hora, a fim de estudar as suas necessidades e tentar a sua resolução, e se eu me detive demasiadamente neste ponto, Sr. Presidente, é porque entendo que esta sessão devia ser mais do que uma sessão de saudação, pois que neste momento é nosso intuito dizer ao país que compreendemos muito bem o nosso dever e que zelamos os interesses nacionais, que é o mesmo que dizer que continuamos a obra dos nossos mortos heróicos e santos, que afirmaram o direito sagrado da nossa autonomia. Disse.

Apoiados.

O discurso será publicado, revisto pelo orador, quando êle restituir as notas taquigráficas que lhe forem enviadas.

O Sr. Calado Rodrigues: - Sr. Presidente: nunca no Parlamento Português decerto se efectuou uma sessão solene como esta. Nós temos tido no Parlamento sessões brilhantíssimas em que os aspectos mais graves da vida portuguesa e as questões políticas mais importantes se têm debatido.

Aqui sé tem levado a eloquência ao mais elevado grau da sua intensidade, aqui se têm consagrado heróis, aqui se têm vitoriado nações, homens e ideas. Mas, Sr. Presidente, nunca certamente se vitoriou no Parlamento Português um facto tam solene como êste que se comemora hoje: a vitória da Liberdade e da Democracia, a vitória da Justiça e do Direito.

Eu queria que neste momento surgissem; aqui, se fôsse possível ressuscitá-las, essas grandes figuras do Parlamento Português: Almeida Garrett, José Estêvão, José de Alpoim e tantos outros que iluminaram o Parlamento com a sua palavra brilhantíssima. Eu queria que êsses grandes oradores aqui estivessem, cooperando com os oradores que tam brilhantemente falaram, nesta consagração que é a consagração máxima de todos os tempos.

Fecharam-se a última vez as portas desta casa quando a vitória era para nós apenas Tinia coisa provável. Abrem-se hoje sôbre um mundo novo, criado pela vitória decisiva.

Há mais luz nesta casa, porque há mais luz nos nossos corações. A luz que nos? vem da Liberdade triunfante, do Direito restabelecido, da Justiça dominadora, do triunfo decisivo da raça latina.

E bem podemos tomar para nós uma parcela dessa luz, fazendo ao mesmo tempo a consagração das nações aliadas, e a consagração da nossa lialdade, porque nós, Sr. Presidente, soubemos cumprir com lialdade os nossos pactos internacionais, soubemos manter-nos ao lado da Inglaterra nossa amiga e aliada secular. Cumprimos o nosso dever unidos a essa grande Inglaterra que nos deu um dos mais bolos exemplos de fôrça de que reza a história, dessa grande Inglaterra que, nos quatro anos de luta, soberanamente afirmou o seu poderio imenso, a sua actividade prodigiosa, a sua tenacidade admirável, as suas inexcediveis qualidades de organização e sobretudo a sua inteligentíssima orientação colonial, mixto de energia e tolerância, que fez com que a Inglaterra tenha sabido manter durante séculos o maior império do mundo, conservando sob o seu domínio tantos milhões de homens separados por tam fundas divergências de costumes, de crenças, de tradições.

É êste o maior elogio da Inglaterra e muito honrados nos devemos sentir tendo entrado na guerra ao lado dessa nação gloriosa. Mas, só cumprimos um dever para com a Inglaterra, cumprimos sobretudo um dever para connosco próprios. Nós procedemos com lialdade e - repito - agora que aqui se faz a consagração dos

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aliados, temos o direito, temos o dever mesmo, de fazer a consagração da lialdade com que Portugal soube cumprir os pactos internacionais, batalhando ao lado da Inglaterra como lho impunha o mais elementar dever.

Tomando parte nessa luta em que venceram o direito e a justiça, nós partilhamos dessa glória conquistada pelo heroísmo dos aliados, partilhamos dessa luz que vem da liberdade, dessa liberdade que só ergue triunfante nas terras de França, que se ergue nos explendores da vitória dessa França nobilíssima e grande, da França de Jeanne d'Arc, da França da Revolução, da França do Marne. A alma da França com toda a sua doçura, com todo o seu heroísmo está dentro dêstes quatro pontos cardeais: Jeanne d'Arc e Foch; Lourdes e o Marne.

A França deu exemplos grandiosos de heroicidade; os campos do Marne revolvidos pela metralha, as ruínas gloriosas de Soissons, de Arras, de Verdun e de tantas outras cidades destruídas, são os grandiosos testemunhos de que a França soube cumprir o seu dever. Ao falar no Marne, nessa batalha que decidiu da sorte do mundo, que fez triunfar a justiça o a liberdade contra a autocracia e contra o militarismo, não posso deixar de lembrar essa nação heróica que é a Bélgica, essa Bélgica que, afinal, nós podemos considerar como a nação que preparou a vitória. Quando a invasão alemã talou as terras da Bélgica, quando uma onda de opressão o de martírio procurava esmagar êsse povo nobilíssimo, se não fora o heroísmo da Bélgica ter-se-hia liquidado a liberdade do mundo; o mundo não teria vencido a autocracia militarista.

Por isso devemos saudar, entre todas as nações aliadas, a Bélgica heróica, a Bélgica do Rei Alberto, a Bélgica do burgo-mestre de Anvers, a Bélgica do cardeal Mercier, dessa grande figura que pode considerar-se o mais brilhante apóstolo da fé e do patriotismo; a Bélgica heróica e mártir que conquistou o direito à maior consideração do mundo.

Depois da Bélgica, merece referência especial a Itália, essa Itália à qual nos ligam tantos laços, desde os laços religiosos até os laços políticos e literários.

Os laços religiosos que nos ligam à Itália derivam da circunstância de ser Roma a sede do catolicismo que é a religião da maior parte dos portugueses.

Mas não só pelos laços religiosos nós estamos ligados à Itália. Também a ela nos ligam os laços políticos não só apertaram, sobretudo, quando a Itália deu a Portugal uma princesa da casa de Sabóia, para rainha. Não fica mal a ninguêm invocar, aqui, com todo o respeito, a memória dessa princesa que é bem o símbolo do infortúnio supremo.

Por igual nos unem à Itália os laços literários, que sobretudo se apertam quando se abrem para o mundo os esplendores da Renascença. Assim, Sr. Presidente, nós que não pudemos dominar a nossa apreensão fundíssima quando as tropas inimigas desembocaram no Veneto e chegaram às portas da rainha do Adriático, nós que tememos, então, pela sorte da Itália, não podemos deixar de manifestar-lhe a nossa admiração pelo esforço grandioso com que ela contribuiu para o triunfo comum e a nossa congratulação por a vermos, emfim, realizar o sonho luminoso do Irridentismo, o sonho dos heróis do Risorgimento.

E, Sr. Presidente, basta-nos ler êsse belo livro de Jean Alazard A Itália e o conflito europeu, para ficarmos com a certeza absoluta de que a Itália cumpriu o seu dever, tomando a atitude que tomou, ao lado das nações aliadas.

Outra nação merece especial referência. É a República dos Estados Unidos da América do Norte. Esta grande nação deu-nos exemplos surpreendentes do tenacidade, de trabalho, de actividade.

Os Estados Unidos que são o país das invenções maravilhosas, da actividade ordenada, e que são uma nação grande, mesmo nos campos da literatura e da arte, dão-nos tambêm os mais solene" exemplos políticos, sobretudo com essa brilhante galena de Presidentes que vêm desde Washington, o campeão da independência, até Wilson, o arauto dos direitos do mundo.

Os Estados Unidos entraram na guerra, como factor considerado do poder decisivo, e assim mais ficaram merecendo a nossa admiração.

Devemos destacar ainda para esta consagração as nações que não mandaram contingentes para a guerra, mas que es-

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tiveram de alma e coração ao lado dos aliados.

De entre essas nações destaca o Brasil (Apoiados) que merece a maior das nossas simpatias e uma saudação muito especial, porque o Brasil, que é a obra mais brilhante da nossa civilização, colocou-se devotadamente no lado dos aliados.

Vou terminar, mas antes, quero repetir que, com esta consagração dos aliados, fazemos tambêm a consagração da lialdade com que soubemos cumprir os nossos pactos internacionais.

Devemos tambêm lembrar os mortos, que caíram no campo de batalha ou que ficaram sepultados nos mares. tendo contribuído para a vitória com o seu heroísmo.

Disso Le Bon, no seu livro Hier et demain, que a batalha do Marne foi ganha, principalmente, pelos mortos.

E se, como afirma Le Bon, nessa batalha estivaram os mortos de Tolbiac, de Bouvines, do Marengo e de todas as glórias passadas da França, tambêm os mortos da nossa galeria tantas vezes secular do glórias estiveram a animar o heroísmo dos nossos soldados em muitos feitos gloriosos desta guerra.

Também muitos soldados nossos regaram com o seu sangue as torras mártires donde surgiu o clarão esplêndido da vitória. Devemos saudá-los aqui com um carinho especial, devemos elevar a nossa Mima numa saudação muito recolhida, cheia de enternecimento e de admiração para com êsses que morreram pela Pátria, e saudando, com todo o acolhimento do que as nossas almas sejam capazes, êsses que pela Pátria morreram, devemos partir dêsse instante de recolhimento, de meditação para pensarmos serenamente em todas as necessidades desta Pátria e procurar solvê-las o melhor que nos seja possível.

Tenho dito.

O Sr. Celorico Gil: - Sr. Presidente: no jornal O Dia, de 27 de Fevereiro de 1912, vinha o seguinte telegrama:

"Faro, 25. - No hotel, o Sr. Deputado Gil brindou à Inglaterra, afirmando que o poro português a venerava e odiava a Alemanha".

Comentário dêste mesmo jornal:

"Haverá de certo êrro nesta informação: um Deputado não poderia para saudar Sir Arthur Harding e a Inglaterra, deixar de dizer que o povo português... odiava a Alemanha"!

Sr. Presidente: o que eu disse num jantar para que tire a honra de ser convidado pelo Sr. Ministro inglês, Sr. Arthur Harding, foi que na hora do perigo, na hora grave para a Inglaterra, seria Portugal a única nação da Europa que estaria no seu pôsto ao lado da sua velha aliada, e assim foi, Sr. Presidente, que nas horas mais difíceis, nas horas mais amargas dessa luta tremenda que acabo de terminar, Portugal se pôs incondicionalmente ao lado da Inglaterra, nas, horas trágicas de Verdun.

Em 1913, ao discutir-se nesta casa o orçamento do Ministério da Marinha, eu disse ao Sr. Presidente do Ministério, de então, que empenhasse tudo quanto quisesse para armar 400:000 homens, para que no momento próprio, e que não leria longe, fossem auxiliar a Inglaterra.

O que ou desde logo garanti, é que êsses 300:000 ou 400:000 homens, eram soldados de primeira ordem.

Sr. Presidente: quem assim só mostrou desde logo amigo dos aliados, não podia deixar de levantar a voz nesta sessão, como o estão fazendo na homenagem à nossa velha aliada, a Inglaterra.

Sr. Presidente: vejo nuvens pesadas no horizonte do nosso país, vejo sombras terríveis a pairarem sôbre a nossa pátria digna de melhor sorte.

Preguuto, porque razão os comandantes dos navios de guerra surtos no Tejo, sobretudo o comandante do couraçado inglês Active, cumprimentou Portugal e o Govêrno português e não foi a Belém cumprimentar o Chefe do Estado?

Isto é imensamente grave!

Vêm comandantes de navios de guerra das três poderosas nações aliadas e os respectivos comandantes vão cumprimentar o Chefe de Estado e apenas um mandou o seu secretário deixar um cartão ao Sr. Ministro da Marinha.

Sr. Presidente: num jantar oficial dos comandantes dêsses navios brindou-se Portugal, o povo português e o nossa

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exército de terra o mar e nem uma palavra houve para o Chefe do Estado.

Para o Chefe de Estado do meu país!

Isto dá vontade de chorar!

O corpo diplomático deu um banquete para solenizar a victória dos aliados, e só o Ministro de Itália tentou referir-se ao Chefe de Estado do nosso país, não sendo acompanhado pelos restantes convivas.

Porque é que êste heróico e liberal povo de Lisboa fez as manifestações ruidosas a que todos nós assistimos antes da guerra vencida e até nas horas amargas de Verdun e agora, neste momento, quando essas manifestações eram de esperar, não ouvimos um só viva sequer?

Em Abrantes pretendeu-se fazer uma manifestação aos aliados, mas o administrador do concelho não a permitiu.

Pareço que nos estamos manifestando, mas positivamente não vejo o povo português acompanhar-nos ou preceder-nos, e por uma razão simples, porque os homens que haviam de manifestar-se com autoridade moral, uns estão presos, outros andam a monte e ainda outros estão no exílio.

Sr. Presidente: por êste andar, sou forçado a concluir que não temos representantes na Conferencia da Paz, ou que, se os tivermos, os respectivos delegados serão indicados pelos Govêrnos aliados, sem atenção pelo Govêrno Português. Ainda há pouco os aliados mandaram prender em terras portuguesas um Deputado monárquico, sem deferência nenhuma para o nosso Govêrno nem para os monárquicos.

Saudei aqui, desde a primeira hora, a valentia única dos soldados franceses e a heroicidade dos belgas, pizados pelo pé alemão. Garanti, antes e depois da guerra, com a minha palavra, a coragem dos soldados e marinheiros portugueses. Escuso, portanto, de estar fatigando a atenção da Câmara com cousas que todos conhecem, por as terem ouvido ou lido. Quero unicamente, consoante com as minhas ideas e princípios e com a sinceridade que me caracteriza, levantar vários vivas:

Viva Portugal!

Viva a República Portuguesa!

Viva a Inglaterra!

Vivam os países, corporações e indivíduos que acompanharam a Inglaterra no esmagamento dos impérios centrais!

Êstes vivas foram secundados por toda a Câmara.

O Sr. Cunha Lial: - Sr. Presidente: é triste confessá-lo: somos gente sem fé, sem manifestações de entusiasmo sincero e caloroso, dêste entusiasmo que tem as suas raízes no coração e que do coração sobe aos lábios. Veja V. Exa. o exemplo desta sessão, que deveria ser histórica e que se arrasta para aí, monótona e triste, sem interesse, como se as palavras que se dizem viessem exclusivamente dos lábios e nada traduzissem do que nos vai por dentro da alma.

Aqui, como lá fora, não se sentiu a vitória dos aliados, porque os homens que hoje dirigem os nossos destinos nunca tiveram fé nessa vitória, confiança nos destinos de um Portugal maior, o a descrença e a desesperança transmitiram-se de alto a baixo, lançando na apatia um povo naturalmente sentimental e capaz de todos os entusiasmos e vibrações.

Sonhou-se entre os nossos governantes com a vitória da Alemanha. E, por isso. a derrota do colosso germânico caiu-lhes em cima da cabeça como um balde de água fria, que os deixou melancólicos, inertes, tremendo diante do facto consumado como diante duma fantasmagoria de Hoftmann.

Sr. Presidente: Feita esta observação associo-me do fundo de alma às saudações propostas por V. Exa.

Mas, com a independência e o desassombro de que uso sempre nos actos da minha vida, permita-me V. Exa. que junte uma outra saudação, bem sentida e bem portuguesa, àqueles homens que efectivaram a nossa intervenção na guerra, acto dum alcance político incalculável e que um membro desta casa ousou alcunhar de crime não sei quantas vezes secular. Foi tam transcendental êsse acto que, apesar desta situação ter feito em um ano todo o possível para nos fazer perder as vantagens internacionais que dele derivavam, ainda hoje em dia estamos percebendo os resultados duma adesão franca, aberta e a tempo, à causa dos aliados.

Sr. Presidente : os homens que souberam ligar os nossos destinos aos dos vencedores de hoje, foram já nesta casa vili-

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pendiados por aqueles que talvez a estas horas, nos segredos das chancelarias, sejam acusados de traidores à causa dos aliados.

Lamento o facto, como lamento que intransigências políticas, levadas demasiado longe por um mesquinho espírito de ordem, tenham a pouco e pouco lançado Portugal em convulsões que tem dividido os portugueses por ódios que cavaram fundo.

A melhor prova de sinceridade que poderemos dar aos aliados é mostrar-lhes que nos procuramos aproximar lialmente daqueles bons republicanos que lhes levaram até os campos de batalha da Europa o concurso pequeno mas entusiástico duma legião de bravos.

Não lhes dêmos a impressão de que a nossa sinceridade é nenhuma e que só forçados aplaudimos os actos daqueles que pela causa sagrada da Liberdade, do Direito e da Justiça deram o seu sangue.

Ainda hoje alguém aqui lembrou aquela façanha do bravo Carvalho Araújo, um dos tais odiados democráticos, morrendo nosso pôsto de honra, serenamente, como um herói antigo.

Carvalho Araújo saiu de Lisboa convencido de que, a haver um recontro com um submarino, o pobre Augusto de Castilho estava destinado a desaparecer. Assim o escreveu antes do partir. Nem por isso deixou de se interpor entre o submarino e o vapor que protegia, preferindo a morto ao não cumprimento dum dever que era um sacrifício.

Pois sabe V. Exa. como lhe pagaram a grandeza dêsse sacrifício? Dias depois da sua morte, uns agentes brutais da policia revolviam-lhe a casa, sem esquecer os colchões da cama em que repousava a sua esposa doente, à procura da hidra revolucionária, à procura da prova com que pudessem enxovalhar a memória de um autêntico herói, a uma terra onde há tantos heróis de pacotilha. Pobre Carvalho Araújo! Ao menos repousa longe, no seio das águas, onde não chega, o rumor destas façanhas dos partidários da ordem!

Mas levantemos por momentos os olhos dêste pântano em que se afundam os nossos homens públicos. Há quem tenha encarado a derrota da Alemanha sob aspectos completamente opostos. Uns dizem que ela significa um movimento para as esquerdas, outros entendem que ela quere dizer um retrocesso para as direitas. Já de todas estas opiniões nós tivemos hoje aqui representantes. Para mim esta guerra foi bem a guerra do Direito contra a Força, a guerra da Civilização, criação, convergente de todos os esforços, contra a civilização, criação divergente duma casta, militarista e autocrática. A derrota da Alemanha significa que nunca mais ninguêm deve pensar em resistir ao impulso dum ideal cujas raízes bebem a vida no sub-solo da história. E esta derrota rasga à humanidade novos horizontes.

Não mais se pensará que o aumento da potência da produção, condição essencial para o aumento do bem estar dos povos, se poderá obter à custa do reforçamento da autoridade patronal, por meio duma disciplina férrea a essa noção terá de substituir-se a de que tal resultado se deva conseguir pela socialização crescente dos instrumentos do produção, com tendência para o desaparecimento da instituição patronal.

Preparar docemente a transição, retardá-la tanto quanto possível, sem lhe procurar opor barreiras rígidas, que a vaga destrua e arraze, tal deve ser o papel dos políticos na hora presente. Só assim se poderá conseguir que os homens de amanhã adquiram, a pouco e pouco, a consciência da sua missão e que o abalo a sofrer não lance as sociedades DOS braços dum bolchevikismo, imbecil, sangrento e destruidor.

Em que peze a muitos dos que, forçados, aplaudem a vitória da Enteide, longe vai o tempo do cacete de D. Miguel, cuja reviviscência esporádica só pode acarretar, como consequência, a perturbação e o caos social. O cacete de D. Miguel levou-o o kaiser para a Holanda, escondido nas dobras do seu capote; e a gente só conseguirá pôr-lhe ainda a vista em cima, se Clemenceau o expuser nos Inválidos, quando extraditar o kaiser.

Creiam todos os adoradores de homens que os homens passam e que os actos sociais os dominam e subvertem, quando em lugar de lhes seguirem o impulso, os homens, como D. Quixote, a esbracejar contra um moinho de vento, se lhes pretendem opor.

Os políticos de força só têm um destino: cair pela fôrça. Assim têm, de facto,

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caído em Portugal todos os tiranos que o acaso armou dum cérebro que, em lugar de elaborar idcas, só deita cá para fora murros. Assim tem caído por êsse mundo de Cristo, nestes abendiçoados quatro anos de lutas e martírios, todos os que procuravam entravar a marcha das correntes mundiais. Algum lucro se havia de tirar dêsse cataclismo, dêsse pesadelo duma noite horrível, cujas trevas a liberdade conseguiu emfim dissipar. Hoje só os loucos não vêem que os que se não adaptam morrem.

É preciso que nos convençamos de que a Alemanha foi derrotada e partamos do princípio de que temos obrigação moral de orientar a nossa política interna em harmonia com tal facto. (Apoiados).

E preciso que mostremos aos aliados que não queremos ter espécie nenhuma de solidariedade com as criaturas que, directa ou indirectamente, tiveram relações ou traficaram no sentido de auxiliar o inimigo (Apoiados).

E preciso que esta casa, com esta saudação aos aliados, faça a solene afirmação de que procurará apurar todas as responsabilidades dos homens que no seu seio são apontados como traidores á causa dos aliados a fim de ilibar os inocentes e castigar os culpados, se culpados houver. (Apoiados).

Está proso um membro desta Câmara, sob esta, tremenda acusação. Que o Govêrno nos dê na próxima sessão explicações claras e francas sôbre os motivos que determinaram tal prisão. Queremos saber se se trata dum equívoco ou se êsse homem deve ser amarrado ao poste da infâmia. Saudados os portugueses intervencionistas e as nações aliadas, e a não poderia, e para tal recebi comissão dum grupo de oficiais desta Câmara, deixar de saudar os soldados portugueses que lá por fora tam bem souberam honrar o nome e a tradição portuguesa. Alguns dêsses pobres legionários por lá ficaram, por êsses campos razões da França. Para eles a minha saudade infinita e as lágrimas sinceras dum português. Para os vivos, com o meu entusiasmo, os votos por que regressem brevemente a esta querida ferra de Portugal!

O Sr. Joaquim Crisóstomo: - Sr. Presidente: associo-me com o mais íntimo entusiasmo, à proposta de V. Exa. sôbre as homenagens a prestar à vitória das nações aliadas, que com tanto sacrifício e ardor souberam lutar pela nobre causa da justiça e do progresso.

Em nome dos sagrados princípios da Liberdade e da Razão era absolutamente necessário contrapor-se uma barreira sólida e firme às desmedidas ambições da Alemanha, que se propunha dominar o mundo inteiro pelo terror dos seus exércitos e das suas esquadras. Reuniram-se assim as grandes potências da Europa, não por espírito mesquinho, acanhado e vil de vingança e ódio, mas unicamente inspiradas por um elevado ideal, pelo desejo de manter a paz, a ordem e a harmonia dos povos.

Na luta enorme, leonina, travada, em que, como todos nós o sabemos, o inimigo usou e abusou de processos o mais desliais e infames, não houve uma só hora, um só instante de desfalecimento ou incerteza por parte das nações aliadas. Todas essas nações, à excepção da Rússia, procuraram identificar-se numa inteligente acção comum, dando assim o seu hércules esforço, um extraordinário exemplo de abnegação e de coragem.

A Bélgica, invadida e assolada por uma horda de bandidos, jamais desanimou, lutando sempre com a maior coragem e ardor pelas suas prerrogativas de nação livre* e independente. A França, desvastada tambêm pelos exércitos invasores, lutou com o mais sublime heroísmo para defender as suas gloriosas tradições de Liberdade e de Justiça. A Inglaterra, bloquiada por uma legião de submarinos que deslialmente atacavam a sua marinha mercante, preparou-se rapidamente e com a firmeza própria dos seus habitantes, estabelecendo um plano grandioso: o plano redentor das nações pequenas, das nações fracas e oprimidas.

Perante tais factos, reveladores dos mais profundos sentimentos humanitários e altruístas, impõe-se o preito da nossa homenagem, o culto da nossa admiração.

A vitória dos aliados sintetiza a emancipação dos povos oprimidos. É a vitória do Direito e da Justiça, a alvorada de luz bela e prometedora que há-de acompanhar os estados pequenos, mas bem organizados, à realização das suas aspirações de perfectibilidade.

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Vou terminar, mas, como os meus ilustres colegas que me precederam, entendo que devemos prestar homenagem à França, à Bélgica, à Inglaterra, a Portugal e tantas outras nações que colaboraram, fiéis aos mesmos princípios, aos mesmos dogmas e aos mesmos cultos, pelo esmagamento do militarismo, e sobretudo da autocracia alemã.

Tenho dito.

O Sr. Adelino Mendes: - Sr. Presidente : não é intenção minha fazer um discurso, nem alongar mais esta sessão, que gostaria muito que tivesse decorrido com muitíssimo maior brilho e muitíssimo mais entusiasmo. Entretanto, Sr. Presidente, parece-me que não seria justo que saíssemos daqui sem que prestássemos o mais ardente culto a uma das forças que mais contribuíram para que a causa dos aliados tivesse o imenso e desejado triunfo que ela acaba de alcançar. Quero referir-me, Sr. Presidente, à obra extraordinária de esforço, de fé e de coragem que a Imprensa aliada exerceu em todos os países aliados. (Apoiados).

Foi a imprensa, Sr. Presidente, que, quando a fé entre os povos que se batiam, parecia diminuir, decrescer e apagar-se, conseguiu que essa fé se mantivesse cada vez mais firme e mais ardente e levasse os povos ao triunfo que êles alcançaram, depois de tanto tempo de luta e de tantos sacrifícios realizados, sacrifícios êsses que, por vezes, chegaram a confundir se com o martírio...

Sr. Presidente: foram os grandes apóstolos do jornalismo, foi Clemenceau, foi Vorthelife e foram tantos outros que nunca se cansaram de dizer à gente dos seus uaíses, e a todos os que a seu lado lutaram, que uma cousa havia a fazer: era vencer contra tudo, vencer apesar de tudo. E quando os Govêrnos hesitavam, era a imprensa que os fazia Marchar, era a imprensa que eliminava os homens que mio sabiam cumprir os seus deveres, apontando ao mesmo tempo os homens que haviam de levar os exércitos e os povos à vitória definitiva.

Entretanto, na frente da batalha, ao lado dos exércitos que se batiam, indo onde mais longe iam os combatentes, correndo todos os riscos, vendo estalar junto de si as granadas, deixando-se matar como os próprios militares, havia uma plêiade de jornalistas repórters, cujo encargo era dizer a todo o mundo aliado como os soldados de Direito e da Justiça morriam pela causa que tinham de fazer triunfar.

Há nos jornais dos países que constituem o bloco anti-alemão, existem nos jornais que contribuíram para que a tirania prussiana caísse, páginas imortais, que são outras tantas e epopeias que nunca deixarão que se esqueça todo o sangue que se verteu, para que os povos pequenos continuem a poder dizer-se livres.

Sr. Presidente: tive a honra de ver estalar junto de mim as granadas alemãs. O que fiz não foi nada, porque não passei como correspondente de guerra, era um diletanti.

Faço esta declaração para que se não julgue que falo pró domo mea. Vi entretanto como os meus colegas exerciam, com uma devoção que ia até o fanatismo, a sua profissão. E que todos êles tinham, acima de tudo, o dever de manter na retaguarda o entusiasmo da devoção pelos exércitos cujos feitos celebravam. Fui companheiro de Barfini e de Tudesca. Percorri, com Oliva, os campos de batalha da Picardia. E ainda hoje, Sr. Presidente, recordo com dorida comoção a alma gentilíssima de Serge Bissat, varado por uma bala alemã poucos dias depois da tomada, pelos ingleses, do Monte de Messias. Quem não julgará, pois, justíssimas quantas homenagens se prestarem àqueles que se bateram com o pensamento e com a pena, para que nós hoje possamos exultar de contentamento ao vermos desfeito para todo o sempre o pesadelo alemão?

E, assim, Sr. Presidente, depois de prestar essa homenagem àqueles que, servindo-se dos jornais, dêles fizeram armas tremendas contra os nossos inimigos, quero propor que às saudações por V. Exa. propostas, se junte uma outra, bem calorosa, a todos os jornalistas das nações aliadas, que se bateram intemeratamente para que a vitória mais bela, a mais deslumbrante, viesse, cedo ou tarde, a pertencer-nos. (Apoiados).

O Sr. João de Castro: - Sr. Presidente: pedi a palavra sôbre a ordem e, nestas circunstâncias, obedecendo a uma dis-

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posição do Regimento, princípio por declarar a minha moção.

Leu.

Julgo, Sr. Presidente, que me não será preciso tomar à Câmara muito tempo e lazer um longo discurso para justificação da moção que acabo de ler, porquanto eu sou de opinião de que não é apenas com palavras que mostramos compreender o grande significado da vitória dos aliados, tornando-se antes mais necessário que os nossos actos e as nossas resoluções correspondam de facto ás nossas palavras.

É indispensável que, consagrando a causa da Liberdade, do Direito, e da Justiça, não fiquemos numa situação que é manifestamente contraditória dos princípios pelos quais no campo de batalha lutaram os aliados.

Tendo perante nós, a resolver, o importantíssimo problema da paz, é absolutamente preciso que todos os nossos esforços e cuidados se congregem para que êsse problema seja para nós solucionado de harmonia com os interesses nacionais, procurando-se não a colaboração dalgumas oligarquias, mas a colaboração efectiva de todas as forças políticas, de todas as correntes da opinião pública, de todos os portugueses, tornando-se de igual modo imprescindível que se preparem as cousas por forma a se tornar essa colaboração um instrumento concretamente útil, dando-se atenção a reclamações cuja solução é absolutamente urgente e inadiável.

Não se pretenda ver nas minhas palavras uma intenção que não seja absolutamente conciliatória, porque não será, sem dúvida, preciso lembrar a todos - principalmente aos conservadores - que esta época é absolutamente transformadora, formidavelmente revolucionária, havendo o mais alto interesse para todos em evitar que a colisão entre as correntes conservadoras e as correntes democráticas tenha um aspecto cruel, um aspecto violento.

Portanto julgo que haverá conveniência em fazer calar todos os ódios, e que todos se juntem em volta desta obra em que nós todos temos que colaborar com todo o nosso esforço, boa vontade e inteligência.

Termino as minhas considerações agradecendo a atenção da Câmara.

Antes, porêm, permita V. Exa. que eu dirija uma saudação em especial aos soldados indígenas, que se bateram nos campos de batalha de África, quando tantos outros fugiram.

Feito êste apelo, eu devo declarar à Câmara que estou pronto a fazer tudo aquilo que se julgue de beneficio para bem do nosso país.

O orador não revia.

O discurso será publicado, revisto pelo orador, quando êle restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

Moção de ordem

A Câmara dos Deputados, em nome dos altos ideais da democracia, exprime o seu voto, para que a vitória das nações aliadas marque com a queda de todas as autocracias o início duma nova era tutelada apenas pelo direito e estabilizada pela liberdade;

Confia em que a República Portuguesa saberá reintegrar o país e as colónias na grande obra da construção da humanidade e para isso reconhece como condição essencial e imprescindível a paz interna que só poderá preparar-se:

1.° Pela revogação imediata de todas as leis de excepção promulgadas por motivo da guerra;

2.° Reconhecimento aos indígenas de todos os direitos de cidadãos portugueses;

3.° Por uma ampla amnistia que abranja todos os delitos políticos e sociais;

4.° Pela satisfação progressiva das reclamações justas dos operários.

O Deputado, João de Castro.

Para a Secretaria.

O Sr. Carlos da Maia: - Sr. Presidente: Falo pela primeira vez nesta legislatura, e por isso envio a V. Exa. as minhas saudações pelo elevado cargo que está ocupando.

E ousadia levantar a voz neste momento, depois de terem sido proferidos discursos tam brilhantes.

Sou homem de acção e marinheiro, não possuo a facilidade oratória que seria necessária para exteriorizar a minha alegria neste momento. Mas falo, porque eu fui um homem que arrisquei a minha vida e a minha situação pela democracia, e, portanto, enche-me de alegria a vitória dos

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18 Diário da câmara dos Deputados

aliados, que representa o triunfo assinalado dos meus ideais.

Ninguém com justiça poderá esquecer que aos radicais se deve a propaganda da nossa participação na guerra.

Por último eu curvo-me reverente perante a memória daqueles que pereceram na guerra e perante os dirigentes de iodas as nações e exércitos aliados.

Honra às nações aliadas!

Disse.

O orador não reviu.

O Sr. Pedro Fazenda: - Sr. Presidente: Abstenho me de justificar a minha proposta visto que me parece que está no ânimo de toda a Câmara.

Leu.

Visto o seu carácter urgente peço dispensa para ela.

O Sr. Malheiro Reimão: - Sendo a primeira vez que uso da palavra, cumpro o dever de saudar V. Exa. Associo-me de todo o coração às saudações aqui votadas.

A hora já vai adiantada, e unicamente pedi a palavra para mandar para a Mesa um projecto de lei, consignando determinada regalia aos militares que tomaram parte na guerra.

Restrinjo a minha consideração, dizendo simplesmente que os soldados portugueses que lá fora combateram ao lado dos exércitos aliados merecem de nós todos que lhe paguemos uma dívida de gratidão, que contraímos para com êles, que aumentaram mais uma página à história de Portugal.

Êste projecto está assinado por vários Deputados. Para êle peço a urgência e dispensa do Regimento. Espero que a Câmara o aprovará, compensando de algum modo os trabalhos duríssimos que os soldados portugueses passaram lá fora.

Vozes: - Muito bem.

O orador não reviu.

O projecto foi lido na Mesa.

O Sr. Moreira de Almeida: - Pedi a palavra para fazer uma aclaração em nome dêste lado da Câmara. Nós sabemos, que os intuitos do projecto constituem uma homenagem muito justa e muito merecida por quem tanto honrou o nome português.

Porém, o projecto é bastante complexo; contêm dez artigos, que nós apenas ouvimos ler na Mesa.

Algumas dessas disposições afectam direitos criados. Ora isto não pode ser votado assim de repente pela Câmara.

Não sei o que o Govêrno pensa dêste projecto.

Não é intenção dêste lado da Câmara protelar a sua discussão. Mas nós entendemos que êle devia ser enviado com urgência à comissão de guerra, que daria o seu parecer e assim melhor o poderíamos discutir. A minoria monárquica entende que êsse projecto encerra uma alta intenção patriótica, mas entende, tambêm, que melhor seria estudá-lo e discuti-lo depois dêsse estudo, o que de certo era bom para todos.

O orador não reviu.

O projecto vai adiante por extracto.

O Sr. Egas Moniz: (Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros): - O Govêrno aceita com entusiasmo o projecto do Deputado Sr. Malheiro Reimão, Mas atendendo às considerações apresentadas pelo Deputado Sr. Moreira de Almeida, considera-as judiciosas. Como aliás o deputado proponente nos disse, a urgência não queria significar que seja votado imediatamente, mas foi requerida somente para não ter de ir para o Diário do Govêrno, etc.

Nestas condições parece-me estar de acôrdo toda a Câmara, e o Govêrno sente-se muito satisfeito por estar assim tudo de harmonia neste assunto.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Marcolino Pires: - Sr. Presidente: pedi a palavra, para declarar a V. Exa. e à Câmara que a maioria vê com toda a simpatia o projecto apresentado pelo Sr. Deputado Malheiro Reimão, mas o facto dêste lado da Câmara votar a dispensa do Regimento, não quere por forma nenhuma significar que o projecto entre em imediata discussão e se vote tambêm desde já.

A votação dêste lado da Câmara apenas quis evitar a publicação do projecto no Diário do Govêrno, mas não que êle não fôsse submetido a um ponderado es-

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Sessão de 3 de Dezembro de 1918 19

tudo nas respectivas comissões, para depois a Câmara o apreciar devidamente.

O orador não reviu.

A Câmara, sendo consultada resolve que o projecto vá às comissões, e em seguida, aprova a seguinte:

Moção

A Câmara dos Deputados, considerando que a sessão de hoje deve constituir uma homenagem às nações aliadas e aos seus gloriosos exércitos, resolve enviar as saudações mais calorosas aos Parlamentos dessas nações e levantar a sessão. -O Deputado, Almeida Pires.

Para a Secretaria.

Aprovado.

O Sr. Adelino Mendes: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte

Aditamento

Proponho que esta Câmara saúde a imprensa dos países aliados e preste a sua homenagem a todos os jornalistas que se bateram, quer com a pena, quer com as armas na mão, sem esquecer os que morreram pela vitória dos exércitos que derrotaram a Alemanha. - Adelino Mendes.

Para a Secretaria.

Aprovado.

O Sr. Presidente: - A próxima sessão realiza-se amanha, sendo a ordem do dia a seguinte:

Eleição da Mesa e eleição de comissões.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão

Projecto de lei

Assinado por quinze Srs. Deputados, e apresentado pelo Sr. Deputado Malheiro Reimão, criando uma medalha destinada a todos os militares que permaneceram pelo menos durante seis meses na zona de operações de guerra, e às guarnições dos navios que fizeram serviço por igual tempo fora dos portos, e concedendo tambêm determinadas regalias aos mesmos militares.

Para a Secretaria.

Publique-se no "Diário do Govêrno".

Justificação de faltas

Dos Srs. Deputados Serafim Joaquim, de Morais Júnior e Vasco Fernando de Sousa e Melo, comunicando que por doença e motivo justificado, respectivamente, não podem comparecer à sessão de hoje.

Para a Secretaria.

Para a comissão de infracções e faltas.

O REDACTOR - Sérgio de Castro.

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