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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 88
EM 25 DE NOVEMBRO DE 1919
Presidência do Exmo. Sr. Domingos Leite Pereira
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
António Marques das Neves Mantas
Sumário. - A sessão abre com a presença de 48 Srs. Deputados. Lê-se a acta, que é aprovada quando há número regimental. Pedem a palavra sôbre a acta os Srs. Plínio Silva, Jorge Nunes, António Maria da Silva, Pais Rovisco, Álvaro de Castro, Vasco de Vasconcelos, Costa Júnior, António Granjo e Pacheco de Amorim. À excepção do primeiro e do quarto, os oradores ocupam-se do incidente que levou a afastar-se, na sessão anterior, o Sr. Domingos Pereira, Presidente da Câmara, que todos desejam que regresse ao seu lugar. O Sr. Presidente nomeia uma comissão, por proposta do Sr. Álvaro de Castro, para procurar o Sr. Domingos Pereira, e interrompe a sessão. Reaberta, já sob a presidência do Sr. Domingos Pereira, o Sr. Presidente agradece à Câmara a alta prova de estima e consideração que lhe deu, e promete continuar a cumprir os seus deveres. Em ' seguida dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. - O Sr. Ramada Curto manda para a Mesa um projecto de lei sôbre câmbios, justificando-o. Responde-lhe o Sr. Ministro das Finanças (Rêgo Chaves). - O Sr. Álvaro de Castro manda para a Mesa a substituição dum parecer. - São autorizadas a reúnir-se durante a sessão as comissões de finanças e administração pública. - O Sr. António Granjo ocupa-se do problema da viação no norte do país e do aproveitamento das quedas de água.
Ordem do dia. - Continua em discussão o parecer n.° 178. Usa da palavra o Sr. Nuno Simões, que propõe um aditamento ao artigo 2.° - Lê-se um requerimento do Sr. Plínio Silva, que é rejeitado. - O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Sá Cardoso) responde ao Sr. Nuno Simões, cuja proposta é aprovada em contraprova.
Antes de se encerrar a sessão. - Os Srs. Orlando Marçal e Raúl Portela chamam a atenção do Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior para várias ocorrências, respondendo-lhes o chefe do Govêrno. - O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a imediata com a respectiva ordem do dia.
Abertura da sessão às 16 horas e 12 minutos.
Presentes à chamada 65 Srs. Deputados.
São os seguintes:
Adolfo Mário Salgueiro Cunha.
Afonso de Macedo.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Álvaro Pereira Guedes.
Álvaro Xavier de Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Albino de Carvalho Mourão.
António Albino Marques de Azevedo.
António da Costa Ferreira.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Dias.
António Francisco Pereira.
António Joaquim Granjo.
António José Pereira.
António Maria da Silva.
António Marques das Neves Mantas.
António Pais Rovisco.
António Pires de Carvalho.
António dos Santos Graça.
Augusto Dias da Silva.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Custódio Maldonado de Freitas.
Diogo Pacheco de Amorim.
Domingos Cruz.
Domingos Frias de Sampaio e Melo.
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2 Diário da Câmara dos Deputados
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco Cotrim da Silva Garcês.
Francisco José Pereira.
Francisco de Pina Esteves Lopes.
Henrique Ferreira de Oliveira Brás.
Hermano José de Medeiros.
Jaime da Cunha Coelho.
Jaime Júlio de Sousa.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Águas.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim Brandão.
José António da Costa Júnior.
José Gregório de Almeida.
José Maria de Campos Melo.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Monteiro.
José Rodrigues Braga.
Ladislau Estêvão da Silva Batalha.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel José da Silva.
Manuel José da Silva.
Mariano Martins.
Maximiano Maria de Azevedo Faria.
Nuno Simões.
Orlando Alberto Marçal.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Raúl Lelo Portela.
Tomás de Sousa Rosa.
Vasco Borges.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Vergílio da Conceição Costa.
Ventura Malheiro Reimão.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Acácio António Camacho Lopes Cardoso.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Alexandre Barbedo Pinto de Almeida.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Amílcar da Silva Ramada Curto.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Lôbo de Aboim Inglês.
António de Paiva Gomes.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso
Augusto Pires do Vale.
Custódio Martins de Paiva.
Domingos Leite Pereira.
Domingos Vítor Cordeiro Rosado.
Eduardo Alfredo de Sousa.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco da Cruz.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco de Sousa Dias.
João Gonçalves.
João José Luís Damas.
João Pereira Bastos.
João Xavier Camarate Campos.
Joaquim José de Oliveira.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Domingos dos Santos.
José Garcia da Costa.
José Maria de Vilhena Barbosa de Magalhães.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Júlio Augusto da Cruz.
Júlio do Patrocínio Martins.
Liberato Damião Ribeiro Pinto.
Luís de Ornelas Nóbrega Quintal.
Manuel do Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Afonso Augusto da Costa.
Alberto Álvaro Dias Pereira.
Albino Vieira da Rocha.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Antão Fernandes de Carvalho.
António Aresta Branco.
António Bastos Pereira.
António Carlos Ribeiro da Silva.
António Germano Guedes Ribeiro de Carvalho.
António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.
António Maria Pereira Júnior.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Rebêlo Arruda.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Estêvão da Cunha Pimentel.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
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Francisco José Martins Morgado.
Francisco José de Meneses Fernandes Costa.
Francisco Luís Tavares.
Francisco Manuel Couceiro da Costa.
Helder Armando doa Santos Ribeiro.
Jacinto de Freitas.
Jaime de Andrade Vilares.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
João Henriques Pinheiro.
João José da Conceição Camoesas.
João Lopes Soares.
João Luís Ricardo.
João de Ornelas da Silva.
João Ribeiro Gomes.
João Salema.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Gomes Carvalho de Sousa Varela.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
Leonardo José Coimbra.
Lino Pinto Gonçalves Marinha.
Manuel Alegre.
Manuel José Fernandes Costa.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mem Tinoco Verdial.
Miguel Augusto Alves Ferreira.
Raúl António Tamagnini de Miranda Barbosa.
Vítor José de Deus de Macedo Pinto.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Xavier da Silva.
Às 15 horas e 5 minutos principiou a chamada.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 48 Srs. Deputados. Está aberta a sessão. Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 15 minutos.
Foi lida a acta.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Estão presentes 65 Srs. Deputados. Está em discussão a acta.
O Sr. Plínio Silva (sobre a acta): - Sr. Presidente: não posso deixar de lamentar e manifestar a minha estranheza por na acta, acabada de ser lida, não; se fazer a mínima referência a um ligeiro incidente produzido ontem nesta Câmara, no final da sessão, quando eu, autorizado pelo Sr. Pais Rôvisco (a quem havia sido concedida a palavra), a interrompê-lo, preguntava a êste meu ilustre colega se tinha recebido da parte dos cidadãos que compõem o círculo n.° 33, pelo qual ambos havíamos sido eleitos, seguindo o mesmo programa político, qualquer manifestação que significasse ratificação de Confiança, apoiando assim a atitude de S. Exa., que, abandonando o Partido Republicano Português, se ligava ao Grupo Parlamentar Popular.
Refiro-me ao assunto, Sr. Presidente, não pelo valor ou importância que o incidente em si teve, mas porque entendo que, tratando-se duma afirmação de princípios, devo, com a responsabilidade que sôbre mim pesa, dizer a V. Exa., à Câmara, ao país inteiro, que nos ouve e julga, o que penso sôbre pontos que reputo basilares na forma política que nos rege. Nós todos, Sr. Presidente, devemos, sempre que as oportunidades sé nos ofereçam, falar claro e mesmo provocar reciprocamente declarações para que a Nação fique perfeitamente habilitada a apreciar os actos dos seus representantes e á segui-los ou repudiá-los.
Interrogando o Sr. Pais Rovisco, eu desejava saber se o meu ex-correligionário tinha recebido qualquer indicação que representasse para mim um voto de desconfiança por parte dos eleitores do meti partido.
O Sr. Álvaro Guedes (interrompendo): - Nós aqui somos representantes da Nação e não dos eleitores.
O Orador: - Já esperava êsse argumento, e a êle me ia referir mesmo sem o àparte de V. Exa. Conheço bem o § 1.° do artigo 7.° da nossa Constituição:
"Os membros do Congresso são representantes da Nação e não dos colégios que os elegem".
Concordo em absoluto com esta sã doutrina, mas não compreendo que ela possa ser invocada para justificar a passagem, seja de quem fôr, dum para outro agrupamento parlamentar, deixando de defender o programa político que apresentou aos eleitores, e que, por êles aprovado, originou a eleição. E parece-me, Sr. Presidente, que tenho sempre procedido nes-
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ta casa do Parlamento por forma a demonstrar que tenho cumprido integralmente a disposição do citado artigo, tomando no maior interêsse e pondo em primeiro lugar os assuntos que se referem ao bem da Nação.
Mas entendo, Sr. Presidente, que não tenho o direito, em minha consciência, de abandonar o partido pelo qual fui eleito para me filiar num outro, e se um dia, porventura, me não satisfizer o programa que sigo, devo honradamente apresentar a renúncia ao meu mandato.
Vozes: - Não apoiado! Não apoiado!
O Orador: - Eu penso desta forma e tenho o direito de manifestar livremente a minha opinião. Aliás eu reconheço a V. Exas. a liberdade de pensarem de modo absolutamente contrário. Se todos víssemos as questões pelo mesmo prisma, naturalmente não haveria a divisão em partidos! Alêm disso, pelo respeito que devo a mim mesmo e à Câmara, eu apenas afirmo qual seria o meu procedimento, sem que pretenda obrigar, seja quem fôr, a imitá-lo. Ao país, únicamente, compete julgar-nos.
Sr. Presidente: não posso deixar de apreciar as conseqùências que se dariam se aceitássemos o princípio de que, escudados no artigo citado da Constituição, podemos mudar livremente de opiniões dentro da Câmara, como quiséssemos e entendêssemos.
Não, Sr. Presidente, deixemo-nos de sofismas e interpretemos as palavras com inteligência e sinceridade. É clara a disposição constitucional. Ela diz que nós, uma vez eleitos, não devemos tratar dos interêsses únicos dos que nos elegeram, isto é, dos que pertencem ao nosso agrupamento político, mas sim, passando a ser representantes da Nação, devemos cuidar de tudo que a ela se refira sem outro objectivo ou preocupação que não seja o bem geral.
Suponha V. Exa. que eu amanhã, por capricho ou fantasia, me lembrava de separar-me da maioria democrática e passava a arvorar-me apóstolo dum programa que não existe no espírito dos cidadãos portugueses. Achava V. Exa. bem?
Não, Sr. Presidente, eu não o podia honradamente fazer, pois, se tal fizesse, apenas me representaria a mim mesmo, e qualquer membro do Congresso, ao transpor aquela porta, consubstancia em si muito mais que as suas únicas ideas, e não tem essa liberdade que alguns membros desta Câmara querem invocar. É lá fora que defendemos os nossos programas e, uma vez êles sancionados pelos cidadãos que cá nos mandam, a êles ficamos intimamente ligados.
Vozes: - Apoiado! Não apoiado!
O Orador: - Sr. Presidente: a admitir-se como boa a doutrina contrária a esta, o supondo, por momentos, que êsse bom povo português nos não vinha correr daqui para fora a pontapés imediatamente, nós poderíamos amanhã passar a ser monárquicos, por exemplo, e vibrar um golpe traiçoeiro e infame na Pátria Portuguesa. Não, Sr. Presidente, não pode ser. A minha doutrina deve ser a sã doutrina. Mas, Sr. Presidente, não quero roubar tempo precioso à Câmara, e mesmo julgo inútil insistir, pois estou certo do que todas as consciências dos meus presadíssimos colegas estão aplaudindo o meu pensamento.
Não posso, porêm, terminar sem me referir tambêm a algumas frases aqui ontem proferidas e que chegaram aos meus ouvidos.
Sr. Presidente: se o Sr. Pais Rovisco provar que eu não represento nesta Câmara mais do que uma cotterie, de quem quer que seja, sem princípios nem ideais, que o diga sem subterfúgios, pois se assim é eu sei bem o caminho que hei-de seguir.
O Sr. Afonso de Macedo: - O que se disse foi que isso era um assunto para um congresso partidário e não para a Câmara dos Deputados.
O Orador: - Perdão! Declarou ontem nesta sala o meu colega e amigo, e digo amigo, Sr. Presidente, porque eu me não deixo obsecar por divergências políticas para quebrar laços de amizade, declarou o Sr. Pais Rovisco que eu estava neste lugar com os seus votos, e citou até o concelho de Sousel.
O Sr. Pais Rovisco: - Não disse nada disso!
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O Orador: - Desculpe V. Exa., mas creio bem que não fui só eu a ouvir tais declarações. Talvez V. Exa. se não recorde, o que me não surpreende em virtude do estado de nervosismo em que se encontrava.
Eu tenho aqui a acta da nossa eleição para demonstrar que na afirmação do Sr. Pais Rovisco alguma cousa há de verdade, mas parece-me que, felizmente, êsses votos de que S. Exa. parece com efeito dispor não foram em mim lançados. Analisando essa acta nota-se êste facto inexplicável: é que sendo eu e o Sr. Pais Rovisco candidatos no mesmo círculo e pelo mesmo partido, S. Exa. teve 1:173 votos, o nosso colega Vergílio Costa, candidato evolucionista, 957, e eu 832, vindo, pois, pela minoria com uma diferença, para menos, do Sr. Kovisco de 341, e batendo o candidato sidonista apenas por 83 votos. Não julgo necessários comentários, pois as conclusões a tirar são evidentes, não restando a mínima dúvida de que os votos do Sr. Pais Rovisco foram para seu uso próprio.
E já que a êste caso fui obrigado a referir-me, não posso deixar de ler à Câmara, para sua elucidação, o que sôbre êle dizia um jornal da oposição, em 13 de Maio, após a eleição:
"O facto do Deputado Plínio ter sido eleito pela minoria, sendo democrático, deve-se à habilidade eleiçoeira do governador civil, que mobilizou polícia e enviou listas a funcionários com sobrescritos timbre governo civil de Portalegre e serviu-se de todos os meios para derrubar a oposição, visto os evolucionistas não terem fôrça alguma neste distrito, excepto nos concelhos de Avis e Monforte".
Sr. Presidente: eu, pessoalmente, não tenho um voto, e isso, a meu ver, muito me honra; os votos em mim lançados não são meus, são, sim, do Partido Republicano Português, composto de honrados e dignos cidadãos livres que apoiam a política dêsse partido.
Mas púnhamos ponto na questão, terminando por declarar solenemente à Câmara, ao país inteiro: se o Sr. Pais Rovisco provar no Parlamento, na imprensa, não importa onde, que eu não sou aqui um legítimo representante do círculo n.° 33, pela fôrça política própria do Partido Republicano Português, pelas suas ideas e princípios, não hesitarei um momento em renunciar ao meu mandato o deixar aberta uma vaga nesse círculo, para ser de novo disputada livremente.
Tenho dito.
O Sr. Jorge Nunes: - Sr. Presidente: ontem, antes de se encerrar a sessão, deu-se um incidente comigo, que hoje me levou a pedir a palavra sôbre a acta.
Eu procuro sempre ser o mais correcto possível, ainda mesmo quando as circunstâncias me forçam a ser violento.
A Câmara procedeu ontem comigo duma forma que me levou a abandonar a sala. Nesse acto não houve nem podia haver o menor propósito de ofender o Sr. Presidente desta Câmara, que sempre mo mereceu toda a admiração e maior consideração e por quem tenho o maior respeito. Por motivo nenhum êle podia convencer-se de que da minha parte havia o menor propósito de o melindrar.
S. Exa. foi sempre o Presidente que as oposições desejam: um homem imparcial, recto e cumpridor dos seus deveres.
Para o facto, que me magoou, o Sr. Presidente em nada concorreu. S. Exa. cumpriu apenas as prescrições regimentais, e não tenho senão de louvá-lo por isso.
Faço esta declaração para que a minha atitude não seja diferentemente interpretada.
O Sr. António Maria da Silva (sobre a acta): - Sr. Presidente: no final da sessão de ontem, antes de se encerrar a sessão, o Sr. Manuel José da Silva pediu à Câmara para continuar no uso da palavra, embora excedesse o período reservado a cada orador.
O meu presado amigo Sr. Jorge Nunes prolongou as suas considerações, mas ficou magoado por não poder usar da palavra durante o período de tempo necessário para a sua exposição.
S. Exa. excitou-se levemente, e êste facto pesou sôbre o seu espirito, e por forma tal que manifestou o seu desgosto em face do que julgou ser uma incorrecção da parte da maioria desta casa do Parlamento.
Ninguêm, e muito menos S. Exa., pode ter a preocupação de que dêste lado da Câmara não há por S. Exa. aquela ele-
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vada consideração à qual tem feito sempre jus. E, demais, a maioria não teve ocasião de se pronunciar sôbre o pedido de S. Exa. para continuar no uso da palavra.
Só um exagero da sua parte é que podia levá-lo a supor que tinha havido da nossa parte qualquer intuito de descortesia.
Disse S. Exa. que os seus reparos não podiam envolver a nobre e prestigiosa figura do nosso Presidente, e disse muito bem.
Em face das explicações dadas, creio que o incidente deve estar sanado em termos que muito honram S. Exa. e o Presidente desta casa do Parlamento.
O orador não reviu.
O Sr. Pais Rovisco: - Antes de se encerrar a sessão, ontem, o Sr. Plínio Silva, em àparte, preguntou-me se eu tinha ouvido a opinião dos meus eleitores sôbre a minha atitude nesta casa do Parlamento.
S. Exa. quis hoje reforçar o seu aparte.
Sr. Presidente: o Sr. Plínio Silva, pelo que disse, tanto ontem como hoje, quási não merece resposta, porque o que disse não parece partir dum indivíduo que tem a obrigação de ter a responsabilidade daquilo que diz.
S. Exa. sabe muito bem que os Deputados, à face da Constituição, são da nação e não do círculo por onde são eleitos, e o acto eleitoral é secreto, os Deputadas eleitos não sabem se os que os êles geram foram democráticos, socialistas, ou liberais, ou qualquer outra corrente política, e, sendo assim, eu vim a esta Câmara, onde tomei assento no lugar que, em minha consciência, entendi dever tomar.
Mas fui eu eleito com votos do Partido Democrático, como diz o Sr. Deputado Plínio? É uma interrogação, e se o Sr. Plínio Silva foi eleito com votos do Partido Republicano Português, o mesmo não posso eu dizer, porque entre mim e o Sr. Plínio Silva há a diferença de trezentos e tantos votos, e então eu pregunto a S. Exa. a que partido político pertence a diferença de votos que tive sôbre S. Exa.?
Sou levado a dizer pelo que conheço do eleitorado de Elvas que pertenceu não ao Partido Republicano Português, mas a outras correntes políticas.
Posso talvez afirmar, sem talvez incorrer em êrro, que não. foram os votos do Partido Republicano Português que deram origem a que o Sr. Plínio Silva aqui viesse, porque os votos que teve no concelho do Sousel não foram dados ao Sr. Plínio Silva, foram dados porque démarches foram feitas junto do eleitorado do concelho de Sousel para que votasse no Sr. Plínio Silva.
Não é verdade que eu dissesse que êsses votos eram meus. O que disse é que eram de amigos meus.
Mas se assim é, seguindo a doutrina sua, o Sr. Plínio Silva tem no seu partido o seu leader o Sr. António Maria da Silva que seguiu precisamente o mesmo caminho, pois, sendo independente, um belo dia passou para as cadeiras do partido radical.
Àpartes.
Numa palavra para terminar. Sem ofensa para o Sr. Plínio Silva, são tam faltas do senso as suas palavras que quási não merecem resposta, e se respondo é pela muita consideração que tenho tido por. S. Exa.
Eu posso tomar a atitude que entendo quando voto nesta Câmara e não vou preguntar aos meus eleitores da forma que querem que vote.
Os meus eleitores têm confiança em mim e deram-me plena liberdade para eu votar como entendo.
Foi, nestas condições, que eu tomei a minha atitude de ontem.
Tenho dito.
O Sr. Álvaro de Castro (sobre a acta): - Pedi a palavra, Sr. Presidente, para falar a propósito do incidente hoje levantado pelo Sr. Jorge Nunes. Depreendi, com prazer, que se houve um equívoco na sessão passada, sessão a que não estivo presente, o Sr. Jorge Nunes manifestou nobremente a sua alta consideração e o seu grande respeito pelo Presidente desta Câmara, Sr. Dr. Domingos Pereira, e o Sr. António Maria da Silva, em nome da maioria, manifestou igualmente o respeito e a consideração que a maioria tem sempre imerecidamente tributado ao Sr. Dr. Domingos Pereira no exercício do delicado cargo da Presidência onde se tem
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havido de forma tam digna e alevantada que conquistou honrosamente as simpatias de todos os lados da Câmara. (Apoiados).
Notei com estranheza que esta sessão se iniciou sem estar na Presidência o seu indispensável Presidente, crendo mesmo que S. Exa. não se encontra no edifício do Parlamento, o que me faz supor que S. Exa. se afastou precisamente pelos motivos que fizeram surgir hoje o incidente a que me referi. Mas a manifestação produzida nesta Câmara prova exuberantemente que o Sr. Dr. Domingos Pereira deve continuar na Presidência e que daqui para o futuro, se tanto fôr possível, mais facilitaremos, numa obediência que não oprime ninguêm, a sua delicada função, observando-se estritamente a letra do Regimento.
Nestes termos, eu proponho para que V. Exa. encarregue uma comissão composta de membros desta Câmara, para ir perante o Sr. Dr. Domingos Pereira convencê-lo a que volte a assumir a Presidência onde todos o desejam ver imediatamente.
(Muitos apoiados).
O orador não reviu.
O Sr. Vasco de Vasconcelos (sobre a acta): - Sr. Presidente: associo-me gostosamente à proposta apresentada pelo Sr. Álvaro de Castro, pela simples razão de que o Sr. Dr. Domingos Pereira é merecedor por todos os títulos desta homenagem que a Câmara vai fazer.
Se o conflito, nos primeiros momentos, podia ter uma má interpretação, depois das explicações liais e sinceras prestadas pelo Sr. Jorge Nunes e pelas palavras aqui proferidas, de todos os lados da Câmara, está naturalmente esclarecido e simplificado.
Cumpramos, pois, êsse grato dever para todos nós. E garanto a V. Exa. que da parte dos meus amigos políticos há a maior satisfação em se sujeitar à obediência que o Sr. Álvaro de Castro preconizou, facilitando a missão de presidenciar ao Sr. Domingos Pereira, figura indispensável para o bom e regular funcionamento desta Casa. (Apoiados).
O orador não reviu.
O Sr. Costa Júnior: - Sr. Presidente: em nome da minoria socialista desta Casa do Parlamento, associo-me com todo o entusiasmo à proposta apresentada pelo Sr. Álvaro de Castro. E uma homenagem que a Câmara dos Deputados presta ao Sr. Dr. Domingos Pereira, e S. Exa. é bem merecedor dela, pela maneira imparcial como tem dirigido os trabalhos e a boa vontade que sempre tem mostrado para cumprir o Regimento.
Vozes: - Muito bem.
Apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. António Granjo (sobre a acta): - Sr. Presidente: associo-me igualmente com todo o prazer, em nome dos meus amigos políticos, às considerações feitas pelos ilustres oradores que me precederam. E faço-o tanto mais gostosamente quanto é certo que me prendem ao Sr. Dr. Domingos Pereira relações de velha amizade, tendo por S. Exa. a maior admiração pelas suas qualidades de republicano e de homem público, que se fez conduzir na presidência desta Câmara por forma a merecer esta alta prova.
A homenagem que a maioria lhe presta é justíssima; e por parte da minoria liberal representa mesmo um dever. (Apoiados).
Se V. Exas. entenderem que o que vou propor não vai contra o Regimento, proponho que a sessão se interrompa até que a comissão regresse depois de ter cumprido a sua missão. (Apoiados).
Mando para a Mesa a minha proposta:
Proponho que a sessão seja suspensa até regressar a comissão nomeada com a noticia dos resultados da sua deligência junto de S. Exa. o Sr. Presidente da Câmara. - António Granjo.
O orador não reviu.
O Sr. Pacheco de Amorim: - Associo-me às homenagens ao Sr. Dr. Domingos Pereira, Presidente desta Câmara, pela maneira como sempre tem exercido o seu alto cargo.
É em seguida aprovada a acta.
São lidas, admitidas e aprovadas as propostas dos Srs. Álvaro de Castro e António Granjo.
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O Sr. Presidente: - Em virtude da resolução da Câmara, nomeio a seguinte comissão para ir procurar o Sr. Dr. Domingos Pereira:
Álvaro de Castro.
António Granjo.
Júlio Martins.
António Maria da Silva.
Costa Júnior.
Pacheco de Amorim.
Baltasar Teixeira.
Está interrompida a sessão.
Eram 16 horas e 5 minutos.
Pelas 17 horas e 10 minutos assume a presidência o Exmo. Sr. Dr. Domingos Pereira, sendo reaberta a sessão.
O Sr. Presidente: - Ao reabrir a sessão, cumpre-me agradecer à Câmara a alta prova de consideração e estima que acaba de me dar.
O incidente que determinou a minha atitude não teve, com efeito, e por ,si só, uma gravidade que pudesse justificar cabalmente a resolução por mim tomada; mas na convicção, que se formou no meu espírito, de que eu não correspondia já à confiança que o Presidente deve inspirar a todos os lados da Câmara, entendi que o único caminho que tinha a seguir era apresentar a renúncia ao meu cargo. Fi-lo com a sinceridade absoluta, com o propósito firme de a manter, sem qualquer reserva ou resentimento em relação aos motivos do incidente e ao ilustre Deputado e meu querido amigo com quem êle se deu.
Reassumo as minhas funções para corresponder à vontade expressa e unânime da Câmara, e faço uma vez mais a afirmação de que neste lugar procurarei sempre corresponder à confiança que em mim ela deposita, e me esforçarei, como até aqui, por desempenhar o meu cargo com imparcialidade, cumprindo desta forma o meu dever.
Vozes: - Muito bem. Muito bem.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Pedidos de licença
Do Sr. Alberto Jordão, comunicando o pedido do seu colega João Ribeiro Gomes de 30 dias.
Do Sr. Hermano de Medeiros, comunicando o pedido do seu colega Francisco Luís Tavares de 30 dias.
Do Sr. Adolfo Salgueiro e Cunha comunicando o pedido do seu colega António Carlos Ribeiro da Silva de 10 dias.
Do Sr. António A. Marques Guedes, comunicando o pedido do seu colega Manuel Alegre de 15 dias.
Do Sr. Ribeiro de Carvalho, comunicando que por motivo de doença não tem comparecido e pedindo mais 8 dias de licença.
Do Sr. Tomás de Sousa Rosa, pedindo 8 dias de licença com princípio em 26 do corrente.
Do Sr. Bastos Pereira, pedindo mais 10 dias.
Concedido.
Comunique-se.
Para a comissão de infracções e faltas.
Do Sr. Maldonado Freitas, pedindo licença para o dia de hoje.
Concedido.
Para a comissão de infracções e faltas.
Representações
Da classe do professorado primário, apresentando várias considerações e conclusões acêrca do quadro do pessoal do 'Instituto do Professorado Primário.
Para a Secretaria.
Para a comissão de instrução primária.
Das classes patronais, advogando o princípio d a liberdade do comércio e livre trânsito de mercadorias e a maior fiscalização nas exportações clandestinas.
Para a Secretaria.
Para a comissão de comércio e indústria.
Da Federação Portuguesa dos Empregados no Comércio de Lisboa, sôbre as 8 horas de trabalho.
Para a Secretaria.
Para a comissão de trabalho.
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De presos na cadeia de Santa Cruz de Coimbra, pedindo urna amnistia ou que lhes seja dado o devido destino.
Para a Secretaria.
Para a comissão de legislação criminal.
Dos funcionários de todas as categoria8 dos correios e telégrafos, contra a aplicação da lei n.° 718 e sôbre a contagem de tempo para aposentação.
Para a Secretaria.
Para a comissão de comércio e indústria.
Telegramas
Dos funcionários de justiça das comarcas de Pombal e de Albufeira, solicitando a aprovação da nova tabela de emolumentos dos funcionários judiciais.
Para a Secretaria.
Ofícios
Do Sr. Ministro das Finanças, remetendo publicações pedidas pelo Sr. Deputado Campos Melo.
Para a Secretaria.
Do Ministro do Comércio, comunicando em resposta ao ofício n.° 813, que o assunto a que êle se refere não diz respeito àquele Ministério.
Do secretário geral da Northern Peace Union, solicitando que o presidente da Comissão Parlamentar de Paz indique qual a língua que deve ser usada internacionalmente.
Para a Secretaria.
Para a comissão para apresentar o parecer sôbre o Tratado de Paz.
Admissão
Projectos de lei
Dos Srs. Deputados Álvaro Guedes e Afonso de Macedo, autorizando a Câmara Municipal de Tôrres Vedras a desviar a importância da venda de foros municipais para canalização de águas.
Para a Secretaria.
Admitida.
Para a comissão de administração pública.
Do Sr. Deputado José Monteiro, sôbre constituição de sociedades para compra de máquinas agrícolas.
Para a Secretaria.
Admitido.
Para a comissão de agricultura.
Do Sr. Deputado Brito Camacho, ampliando o Conselho de Arte Nacional e dando nele representação a dois delegados do Parlamento, dois do Govêrno e dois representantes de cada uma das diferentes entidades.
Para a secretaria.
Admitido.
Para a comissão de instrução especial e técnica.
Antes da Ordem do dia
O Sr. Presidente: - O Sr. Ramada Curto pediu a palavra para um negócio urgente: Apresentação dum projecto de lei sôbre câmbios.
É aprovada a urgência.
O Sr. Ramada Curto: - Agradeço à Câmara a gentileza de me conceder a urgência pedida.
Podia justificar esta urgência no intervalo havido para tratar do assunto, mas sôbre êle recaía parecer urgentemente, e a Câmara não estaria habilitada a saber as razões que me levaram a fazer êste requerimento. Por isso pedi a palavra para negócio urgente, prometendo à Câmara não abusar da sua gentileza.
A iniciativa que tomei tem apenas o intuito de fazer obra construtiva. Podia enviar uma nota de interpelação, e viria para aqui com muitas cousas... O Sr. Ministro das Finanças responder-me ia com toda a competência e teríamos perdido algumas horas sem resultado aproveitável.
Tenho já pontos de vista sôbre êste assunto, porque oficialmente tomei conhecimento dêle, quando tive a honra do ocupar a pasta das Finanças.
O meu ponto de vista sôbre o assunto é que o Estado tem do intervir na regularização dos câmbios. Neste ponto sou coerente com a doutrina do partido socialista, a que tenho hoje a honra de pertencer, que defende a intervenção do Estado no jôgo das relações económicas. Está provado que aquelas teorias de in-
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dividualismo fizeram o seu tempo e hoje já se entende que se deve bulir na arca santa dos princípios individualistas.
Está hoje completamente posta de parte a doutrina que não permitia a intervenção do Estado nos actos sociais. Esta doutrina é hoje um facto constatado em Portugal.
Em Portugal, o Estado tem descurado a sua intervenção na questão cambial. Assim, em 1914, ao rebentar o conflito europeu, não se tentou sequer nada que representasse por assina dizer uma provisão de guerra, drenando para os nossos mercados o ouro português, prometendo ao país defender os seus interêsses, abastecer o país. Não se contraiu, o que seria uma solução, um empréstimo de 4, 5, ou 6 milhões de libras nos mercados externos, o que fácilmente se obteria. Tendo entrado na guerra, em virtude dos nossos Compromissos de aliança com a Inglaterra, tínhamos direito, dada a nossa situação financeira o a nossa precária reserva de ouro, a pedir o auxílio dos banqueiros estrangeiros, realizando um empréstimo. Todos os países pediram aos tesouros das Brandos nações. Só Portugal nunca pediu nada. Entrou no conflito europeu completamente a descoberto, som reservas em ouro, para fazer face ao problema cambial. Não vou historiar qual tem sido a pavorosa descida do câmbio. A divisa Londres, em relação ao dinheiro esterlino, desde 1911, vem de 49/16, libras a 4$48 - até a divisa actual - 23 e 3/8. E mais descerá, porquanto tudo importamos. Só de carvão precisaremos importar enorme quantidade, o que representará uma drenagem de ouro na importância de 90 mil contos. Temos de importar cereais, etc., e por isso não se poderá prever até que ponto se deslocará a nossa balança comercial, até onde irá a nossa situação cambial.
Não quero ser pitonisa de malheur... mas lamento os homens que estão nesse lugar;
Todavia, o Estado pretendeu em 28 de Setembro de 1914, por meio duma junta reguladora, intervir nos câmbios.
Não tenho elementos para não Considerar essa juntei, um mero expediente, sem nenhuma acção sôbre o mercado cambial. A intervenção do Estado nunca se poderá fazer sentir na lei natural da oferta e da procura.
Quando passei pela pasta das Finanças um dos meus primeiros actos foi chamar à Direcção Geral da Fazenda Pública, ou seja à Caixa Geral do Tesouro; todas as cambiais dos Transportes Marítimos, formidável receita que, para nós, foi a única cousa que nos ficou da guerra. Ao mesmo tempo tive o ensejo, pôr felicidade e não pelos meus méritos, de poder fazer o contrato com a Agência Financial do Rio de Janeiro. Pensava combinar estas duas operações, visto que contava com o que me poderia vir do tal contrato. Felizmente para o país, êsse contrato fala hoje por si.
Êle excedeu toda a expectativa. Por êsse contrato havia a garantia dum fornecimento médio de setecentas e tantas mil libras; pois já hoje está em mais de três milhões de libras.
Todavia o Govêrno, quando encontrasse solução melhor, poderia rescindir o dito contrato com um aviso prévio de seis meses, possibilidade que ficou ressalvada nele.
Êle excedeu a minha própria espectativa. Calcularia três a quatro milhões de libras durante o ano económico, mas nunca a importante cifra de três milhões de libras que se atingiram já em cinco meses. Isto é muito lisonjeiro, embora tenhamos de notar que uma tal situação deriva um pouco do estado cambial da nossa moeda em relação à praça do Rio de Janeiro. Mas a verdade é que, só por aquele contrato, julguei assegurar o pagamento do cupão externo.
Sr. Presidente: hoje, que já não sou Ministro, não venho adoptar o mesmo ponto de vista que adoptaria se estivesse no Ministério. Êste meu projecto de lei não traz a solução que eu daria ao problema cambial se continuasse com as rédeas do poder nas mãos.
Por mera felicidade, durante a minha curta passagem pela pasta das Finanças nunca vi a divisa cambial descer à situação de hoje.
O Sr. Ministro actual é menos feliz.
Não admira, porêm, visto que o Govêrno nunca teve o cuidado de pôr uma barreira, a valer, nas importações. Elas fazem-se sem tem nem som. Quando aumentei as sobretaxas alfandegárias, julguei que tal facto constituiria uma medida meramente económica. Nunca pensei
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que a loucura portuguesa de gastar chegasse a vencer aquela barreira.
Adoptei semelhante medida como uma barreira económica. Mas, Sr. Presidente, os valores mentais, morais e económicos portugueses estão tam trocados, que aquilo que fiz por critério económico redundou numa maravilha fiscal.
Importam-se pianos de cauda, jóias, sedas, tudo! E, ao passo que em todas as nações se olha a sério para êstes magnos problemas, em Portugal nada se faz. Mercê de nada se fazer, a balança comercial agravou-se, e daí a formidável queda dos câmbios.
Calculo bem as dolorosas e trágicas horas que o meu querido amigo o Ministro das Finanças tem passado.
Ainda o outro dia, como último recurso, como derradeiro expediente, tam aflitiva e angustiosa é a situação financeira que o país atravessa neste momento e tam difícil achou S. Exa. solvê-la, que não hesitou em chamar ao seu gabinete a alta finança para lhe dizer com verdadeira aflição, com humildade, num tem quási implorativo: Senhores, façam o favor, tenham a bondade, queiram ter a gentileza, porque eu sou um rapaz simpático, uma boa creatura e um Ministro cheio de patrióticas intenções, de baixar o preço das mercadorias, pela mesma forma que eu poderia adoptar amanhã chamando a minha casa o bacalhoeiro para me vender o bacalhau mais barato! (Risos).
S. Exa. declarou já - eu sei - com uma honestidade e um desassombro que muito o honram, que ia intervir na questão com energia.
Oxalá S. Exa. assim proceda, que bem urge.
É necessário que se saiba que existem em Lisboa 10.000 libras que saem dos Bancos, de manhã, para entrarem à tarde. É nesta giga-joga, nestes descaminhos misteriosos, que reside a especulação.
Quando Ministro das Finanças eu chamei a colaborar comigo um determinado banqueiro, sem ter jamais a preocupação do que porventura a opinião maledicente poderia atribuir-me, tam acima de ruins suspeições estava a minha consciência, a quem vendi 100.000 libras com u promessa doutras 100.000 se acaso conseguisse obter uma melhoria de câmbio. Efectivamente a praça de Lisboa assusta-se com tam pouco que no outro dia só com 50.000 libras a divisa melhorou meio ponto. Depois saí do Ministério e nada mais sei.
Tudo isto são, porêm, expedientes. Todavia não se pensou ainda em evitar a saída do ouro levado dos Bancos pelos negociantes estrangeiros, à semelhança do que lá fora se tem feito. Em França, o Sr. Kibot, logo no comêço da guerra, chamou os principais financeiros com os quais acordou em evitar a drenagem do ouro.
Em Portugal, levianamente, lamentavelmente, criminosamente (Apoiados), não se fez nada de forma a evitar que essa drenagem se fizesse.
Para terminar, Sr. Presidente, devo declarar que eu não pretendo com o projecto que tenho a honra de submeter à esclarecida apreciação desta assemblea, realizar o meu programa de ex-Ministro das Finanças, mas apenas colaborar no sentido de se regularizar e normalizar quanto possível a nossa situação cambial. Êsse programa só o pode executar, dominando o problema, o Sr. Ministro das Finanças.
Sr. Presidente, limito-me a mandar para a Mesa êste projecto que não leio porque o Regimento não me permite, e para o qual requeiro urgência.
Foi aprovada a urgência.
O discurso na integra, revisto pelo orador, será publicado quando forem devolvidas as notas taquigráficas.
O Sr. Rêgo Chaves (Ministro das Finanças): - Sr. Presidente: pedi a palavra para responder ao Sr. Ramada Curto sôbre as considerações que acabou de fazer a respeito da nossa situação cambial.
Entende S. Exa. que neste momento, visto que somente foi votada a urgência para o projecto de lei agora apresentado, eu tenha naturais melindres em expor até o detalhe as combinações e as medidas que adoptei para fazer face à nossa situação cambial. Entretanto, sempre direi alguma cousa, principalmente acêrca do projecto de lei do Sr. Ramada Curto.
Teve S. Exa. a amabilidade de me chamar ao seu lugar e me ler o seu projecto de lei, o qual, desde já digo, quer venha a ser aprovado, quer venha a ser rejei-
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tado, tem evidentemente toda a utilidade, porque é uma iniciativa e uma colaboração efectiva que S. Exa. dá, neste momento, ao país.
Mas disse S. Exa. ainda agora, que eu tinha pedido, quási suplicado...
O Sr. Ramada Curto: - Foi uma expressão de rectorica; não laça V. Exa. caso disso!
O Orador: - Mas disse V. Exa. que eu tinha pedido â alta finança do país o favor do, emfim, beneficiar a situação cambial, não somente por simpatia para comigo, mas por um sentimento patriótico, que eu entendo que têm obrigação de ter todos os portugueses. (Apoiados). Ora eu, entretanto, devo dizer a V. Exa. que não consultei apenas a alta finança; no meu gabinete não estiveram apenas os banqueiros de Lisboa e Pôrto: estiveram tambêm representantes da Associação Comercial, da Associação dos Legistas, da Associação Industrial e vários outros indivíduos, que me prestaram o favor de trocar impressões comigo e ião informarem do que se passava no mercado, o que é muito difícil saber a um Ministro, como V. Exa. já teve ocasião, decerto, de verificar. Eu consultei todos êsses indivíduos, mas a nenhum dêles, porêm, implorei uma benesse, a sua protecção o que pedi foi que aqueles que, porventura, tinham qualquer influência no mercado, dissessem o que pensavam a respeito da situação financeira do país.
O Sr. Ramada Curta: - É que há uns, sabem-os nós todos, são os naturais inimigos dos Ministros das Finanças; são os especuladores em câmbios!
O Orador: - Estou absolutamente convencido disso. Mas compreende V. Exa. que me era útil a opinião de todos. E tive justamente nessa reunião quem se falasse com verdadeiro patriotismo. Alêm disso, foi uma base de estudo que eu fui colhêr, com essa medida que tomei, e que me serviu para firmar a minha opinião, e me serve agora para apreciar o projecto de lei que V. Exa. apresentou. (Apoiados).
Nós não devemos pensar só em fazer leis., aqui no Parlamento, sem nos importamos do meio, em que elas, vão ser aplicadas. E muito útil que nós façamos sondagens nesse meio.
O Sr. Ramada Curto: - V. Exa. arrisca-se um dia a partir a sonda!
O Orador: - Talvez; mas fico conhecendo melhor os adversários com quem tenho de lutar. E o que é facto, é que tem importância conhecer o meio onde as leis vão ser aplicadas, porque, desde que êsse meio seja hostil, as leis não dão o resultado desejado.
E embora eu vá, possivelmente, concordar com alguns princípios do projecto de lei apresentado por V. Exa., eu estou absolutamente convencido do que êsses princípios são absolutamente impraticáveis no meio em que vão actuar.
V. Exa. há pouco disse, e muito bem, que é semelhante à jogatina que se faz nessos clubes de Lisboa o jôgo do câmbio. Ora o Govêrno não pode fazer mais para evitar o jôgo do câmbio do que aquilo que faz para reprimir a jogatina, e tanto assim que são absolutamente proibidas as operações da praça.
Eu não quero manifestar desde já se vou aprovar ou não o projecto do Sr. Ramada Curto, o portanto longe de mim dizer que não dou o meu voto a uma cousa que ainda não foi por mim estudada convenientemente, com aquela atenção precisa e indispensável a um assunto desta natureza.
O que eu digo é que foi pena queV.Ex.a não tivesse de princípio apresentado a sua idea, porque, conjugados os nossos esfôrços, podia ser que a esta hora alguma cousa existisse já a êsse respeito.
Referiu-se tambêm o Sr. Ramada Curto à operação das 300:000 libras. Essa medida foi de facto proveitosa, por isso que em resultado dela conseguimos aumentar as nossas disponibilidades e obter uma melhoria cambial.
Naquele momento em que quis intervir no mercado com as 300:000 libras, os meus intuitos eram fornecer sucessivamente essas libras até o ponto de se acabar com a especulação que havia, especulação que tem por vezes maior influência do que o próprio desiquilibrio do nosso balanço de contas.
O Sr. António Fonseca: - V. Exa. dá-me licença? Há ainda um factor mais
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grave que V. Exa. não citou e que o Sr. Ramada Curto esqueceu: é que, poise ter desvalorizado a nossa moeda e não havor confiança nela e no Estado, não há hoje mercado maior do que o da compra de fundos estrangeiros e tudo isso se paga em libras. Espero, no emtanto, que o Sr. Ramada Curto, que não deixou de se inspirar nas medidas adoptadas lá fora, não deixará tambêm de regular quer a compra de cambiais, quer tambêm a dos valores estrangeiros.
O Sr. Ramada Curto: - Quando Ministro, opus uma tenacíssima resistência à cotação na Bolsa dos fundos brasileiros...
O Orador: - Estabeleceu-se na praça um alarme que se não justificava, chegando-se a falar em bancarrota, como se porventura nós estivéssemos próximo de qualquer cousa parecida.
O Sr. António Maria da Silva: - As palavras já perderam entre nós o seu significado. O pior é que o continuam mantendo para aqueles que lá fora as lêem e traduzem.
O Orador: - É certo; continuamos a dar aos nossos inimigas as piores armas.
Dizia eu que o intuito que motivou a medida relativa às 300:000 libras foi o de se acabar com a especulação. Actuar-se ia durante certo tempo para depois se repetir o golpe, de modo que ao terceiro golpe a especulação tivesse receio.
O Sr. Ramada Curto: - Isso só era possível quasi confidencialmente, e digo quási porque, como V. Exa. sabe, no Ministério das Finanças é dificílimo guardar-se um segredo.
O Orador: - O que foi passível a V. Exa. fazer com 100:000 libras não poderia eu fazer eficazmente agora nem talvez com um milhão.
O Sr. Ramada Curto (interrompendo): - O único defeito que lhe encontro é ter sido feita publicamente essa operação.
O Orador: - Eu reconheço que para actuar no mercado sôbre o câmbio ora necessário mais de um milhão de libras.
O Sr. Ramada Curto (interrompendo): - Mas V. Exa. tem cambiais em depósito?
O Orador: - O Estado tem neste momento grandes dificuldades. O Estado tem garantido o pagamento do cupão de Janeiro e Junho e não tem necessidade de vir ao mercado comprar cambiais.
A primeira partida de trigo está paga e posso dizer a V. Exa. e afirmar à Câmara que o Estado lucrou.
O Sr. Ramada Curto (interrompendo): - Ainda bem! Não faz mal que da lei não se cumpra um bocadinho.
O Orador: - A lei foi integralmente cumprida. O contrato ibi feito por tal forma que grandes vantagens vieram para o Estado. Não me preocupa que o câmbio esteja a 10, a 20 ou 23. Como V. Exa. compreende, eu não posso dizer mais do que disse.
O Sr António Fonseca (interrompendo): - V. Exa. quási que disse tudo.
O Orador: - Mas V. Exa. não sabe qual a taxa.
O Sr. António Fonseca: - Se V. Exa. disse que lhe não interessava o câmbio, quer êle estivesse a 10, a 20 ou 23, então foi feito a câmbio fixo.
O Orador: - Acho de toda a conveniência que se discuta com urgência o projecto do Sr. Ramada Curto, e então poderei ser mais longo nas manhas considerações, o que neste momento, não posso fazer Agora não posso dizer que o Estado não tem na sua mão maneira de impedir a especulação.
O Sr. António Fonseca: - V. Exa. disse há pouco que tinha um projecto da natureza do projecto do Sr. Ramada Curto?
O Orador: - Não senhor. Tenho realmente pontos de vista sôbre êsse assunto, mas espero fazer muito melhor.
O orador não reviu.
O Sr. Ramada Curto: - V. Exa. sabe quanto deu o vintemzinho dos tabacos?
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O Sr. António Maria da Silva: - Ah! Bela taxa de guerra.
O Sr. Álvaro de Castro: - Mando para a Mesa um projecto de lei assinado pela comissão de colónias e comissão constitucional, para substituir o parecer n.° 155 da. revisão constitucional.
O Sr. Pina Lopes: - Peço a V. Exa. ase digne consultar a Câmara sôbre se permite que as comissões de finanças e administração reunam imediatamente para tratar dum assunto urgente.
Foi autorizado.
O Sr. António Granjo: - Sr. Presidente: peço a atenção dos Srs. Ministros para o que vou dizer e rogo-lhes o favor de o comunicarem ao titular da respectiva pasta porque corre o assunto.
A Associação Comercial de Braga enviou uma representação a propósito da constrição do caminho de ferro de Braga a Monção, e entre as vias férreas que são necessárias para o desenvolvimento do país esta é uma delas.
Nessa representação chama-se a atenção do Sr. Ministro de Comércio para um projectado caminho de ferro de via reduzida de Braga a Chaves.
Dá-se actualmente uma circunstância que, porventura, não teria ainda acudido à lembrança do actual titular da pasta, e é que no fim do ano próximo deveria começar a ser aproveitada a energia hidro-electrica das quedas de água de Lindoso, e, porventura, no fim do próximo ano deveria estar concluída a estrada ordinária de Braga a Chaves. Essa estrada atravessa uma das regiões minhotas mais ricas sob o ponto de vista agrícola, e atravessa a região de Trás-os-Montes, a mais rica do país sob o ponto de vista da riqueza minéria.
As quedas de água de Lindoso oferecem energia mais que suficiente para abastecer as indústrias do Pôrto, e, porventura, para ocorrer num ou noutro ponto mais importante do consumo e a iluminação, e seria pelo menos conveniente que, desde já o Govêrno pensasse em estabelecer sôbre essa estrada que vai de Braga a Chaves, um comboio eléctrico, que seria, porventura, o único caminho de ferro em Portugal que dêsse um rendimento superior ao juro de capital empregado.
Só a energia dessas quedas de água fácilmente poderá desenvolver essa região de Trás-os-Montes, riquíssima em volfrâmio, estanho, etc., e que até agora está impossibilitada de adquirir o seu desenvolvimento por virtude de absoluta falta de transportes.
Barroso é uma das regiões mais interessantes sob o ponto do vista do turismo, em que se conservam os costumes regionais em toda a sua pureza.
Peço, portanto, a V. Exa. que transmita ao Sr. Ministro do Comércio as considerações que acabei de fazer.
O orador não reviu.
O Sr. Sá Cardoso (Presidente do Ministério e Ministro do Interior): - Transmitirei ao Sr. Ministro do Comércio as considerações de V. Exa.
O Sr. Presidente: - Vai passar-se à ordem do dia.
O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira do Azeméis): - Alvitrava a V. Exa. que, faltando ainda quinze minutos para que os oradores usem da palavra antes da ordem do dia, talvez V. Exa. pudesse conceder-lhes a palavra, que a Câmara certamente não levaria a mal.
O Sr. Presidente: - Não posso submeter o alvitre de V. Exa. à consideração da Câmara.
ORDEM DO DIA
Parecer n.° 178
O Sr. Nuno Simões: - Na discussão da generalidade dêste projecto, o Sr. Brito Camacho afirmou, e muito bem, o princípio democrático de que as funções civis só por civis devem ser desempenhadas. E em seguimento da afirmação de S. Exa. nesta casa foi dito que podia constituir um perigo, e não o constituindo importava sempre melindres, o facto de junto do Chefe de Estado haver quem pudesse dispor de influência em favor de qualquer aspiração militar menos justa, como no tempo da monarquia sucedia com a casa militar do rei.
Pois a mais importante situação junto do Chefe de Estado é a de Secretário Ge-
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ral da Presidência da República, justo sendo por isso que se lhe dê caracter inteiramente civil.
Da falta dêste carácter têm já derivado inconvenientes que é necessário de qualquer modo corrigir.
Nestes termos, gostaria de ver como republicano de princípios consignar nesta reforma dos serviços de Secretaria da Presidência da República o princípio de que o lugar de Secretário Geral deve ser exercido por pessoa estranha ao exército e à armada.
De resto, esta minha opinião não constitue princípio novo, pois que o Sr. Brito Camacho já teve ensejo de afirmar a necessidade de dar carácter civil a toda organização de regime democrático.
Nestas condições, mando para a Mesa a seguinte
Proposta
Proponho que ao artigo 2.° se acrescente: "devendo ser exercido por individualidade estranha ao exército ou à armada" e que em harmonia com êste princípio se alterem os parágrafos do mesmo artigo. - Nuno Simões.
O discurso será publicado na integra quando o orador haja devolvido as notas taquigráficas.
O Sr. Presidente: - Vai ler-se um requerimento mandado para a Mesa pelo Sr. Plínio Silva.
Leu-se na Mesa. É o seguinte:
Requeiro que a sessão seja prorrogada de uma hora, tempo durante o qual esteve suspensa.
Sala das Sessões, 25 de Novembro de 1919. - Plínio Silva.
Vozes: - Ora, ora, ora! Não pode ser!
Consultada a Câmara, foi rejeitado o requerimento.
O Sr. Sá Cardoso (Presidente do Ministério e Ministro do Interior): - Sr. Presidente: não posso concordar com a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Nuno Simões.
Não vejo a razão por que se quere impedir que os oficiais do exército e da armada possam exercer o lugar de secretário geral da Presidência da República. Evidentemente que se êsse lugar fôsse exclusivo dos oficiais, tambêm não concordava.
A verdade, porêm, é que o Presidente da República pode ser um militar e desejar ter como secretário geral um indivíduo da sua classe. Para que impedi-lo, pois?
O Sr. Presidente: - Não há mais ninguêm inscrito. Vai votar-se.
Foi rejeitada a proposta do Sr. Nuno Simões.
O Sr. Afonso de Macedo: - Requeiro a contraprova.
Feita a contraprova, verificou-se ter sido aprovada.
Foi aprovado o artigo 2.° sôbre a emenda.
O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão o artigo 3.°
Leu-se na Mesa.
O Sr. Plínio e Silva (para invocar o Regimento): - Invoco o artigo 21.° do Regimento.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Não sei a que propósito invoca S. Exa. o artigo 21.° do Regimento. Êste artigo não foi transgredido.
O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis): - É tam transcendente a invocação, que nem o Deputado invocador a sabe justificar.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Presidente: - Vou dar a palavra aos Srs. Deputados que a pediram para antes de se encerrar a sessão.
O Sr. Orlando Marçal: - Pedi a palavra para chamar a atenção do Sr. Presidente do Ministério para um telegrama que acabo de receber do presidente da Câmara Municipal de Valongo, que faz parte do meu círculo.
Trago-o ao conhecimento de S. Exa.. porque êste assunto se me afigura de muita gravidade, a fim de que S. Exa. se digne dar imediatas providências para que o povo republicano do concelho não seja vexado pelas impertinências seja de quem fôr.
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O Sr. Sá Cardoso (Presidente do Ministério e Ministro do Interior): - Já depois de estar na Câmara recebi um telegrama análogo ao que recebeu o Sr. Deputado. Ignoro p que se passa em Valongo, onde a política anda um pouco acesa de parte a parte e por isso não admira que se tenham cometido alguns actos extraordinários.
O Sr. Domingos Cruz (interrompendo): - A politiquice, antes.
O Sr. Orlando Marçal (interrompendo): - Se, V. Exa. me dá licença, direi que se não trata de politiquice. Posso referir a V. Exa. casos curiosos.
O Orador: - Faça V. Exa. o favor de responder às palavras que pronuncio e não ao que diz outro Sr. Deputado. Disse política, o que é muito diverso.
O Sr. Raúl Portela: - Pedi a palavra, para chamar a atenção do Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior, para um facto que reclama enérgicas e imediatas providências de S. Exa., porque representa um desprestígio para a República.
Trata-se nem mais nem menos de estar à testa da administração do concelho de Tábua um indivíduo que está pronunciado e que é o proposto do recebedor de Oliveira do Hospital. Êste funcionário não honra a República, só serve para a desprestigiar e não honra S. Exa.
Êsse administrador do concelho só se mantêm mercê de influencias políticas, ou mercê de influências que vão até junto do Sr. Presidente do Ministério, as quais o obrigam a manter à testa da administração do concelho um funcionário que está sob a alçada da justiça.
Reputo absolutamente verdadeiro êste facto, porquanto quem me informou era incapaz de faltar à verdade.
Q Sr. António Granjo (interrompendo): - Êsse funcionário foi pronunciado sendo administrador do concelho. Depois do pronunciado afiançou-se, porque o delito admitia fiança. Está, portanto, pronunciado com fiança e ao mesmo tempo exerce as funções de administrador de concelho.
O Orador: - Quere dizer: êsse funcionário está desempenhando funções de grande importância política que o inibem de responder perante a justiça, pondo-se assim ao abrigo da justiça que devia impender sôbre a sua cabeça.
Chamo pois a atenção do Sr. Ministro do Interior sôbre êste facto, esperando que tome as mais imediatas providências.
O Sr. Sá Cardoso (Presidente do Ministério e Ministro do Interior): - Sr. Presidente: ouvi com atenção as considerações feitas pelo Sr. Raúl Portela o vou mandar averiguar doa factos que S. Exa. referiu, pois não se pode admitir um funcionário nas condições que S. Exa. apontou.
O Sr. Presidente: - A próxima sessão é amanhã, 26, à hora regimental, e com a seguinte ordem do dia:
Proposta de lei que autoriza o Govêrno a contrair um empréstimo de 5.405:842$13 para pagamento da dívida do Estado à Câmara Municipal de Lisboa, e todos os pareceres da ordem do dia de hoje.
Está levantada a sessão.
Eram 19 horas.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Pareceres
Das comissões de legislação civil e comercial e legislação criminal sôbre a proposta de, lei n.° 174-A do Senado, impondo determinada multa àqueles que possuam géneros estragados, deterioradas e açambarcados ou escondidos.
Para a Secretaria.
Imprima-se com urgência.
Pa comissão de finanças sôbre o projecto n.° 244-H dos Srs. Lúcio de Azevedo e Vergílio Costa, tornando extensiva aos indivíduos aposentados ou na inactividade que exerçam funções docentes a disposição da lei n.° 226 de 30 de Junho de 1914.
Para a Secretaria.
Imprima-se.
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Da terceira comissão de verificação de poderes, julgando válida a eleição e proclamando Deputado pelo círculo n.° 48-S. Tomé e Príncipe, o cidadão Júlio César de Andrade Freire.
Para a Secretaria.
Da comissão de agricultura, sôbre o projecto n.° 239-C do Sr. Jorge Nunes autorizando o Govêrno a ceder à Misericórdia de Salvaterra de Magos a madeira para a construção duma praça de touros.
Para a Secretaria.
Para a comissão de faianças.
Da Comissão do Orçamento, sôbre o Orçamento do Ministério do Comércio.
Para a Secretaria.
Imprima-se.
Apenso ao parecer n.° 155.
Substituição ao projecto de lei apresentado com o parecer n.° 155 pela comissão de revisão constitucional, modificando o regime político e administrativo das colónias portuguesas.
Para a Secretaria.
Imprima-se com urgência.
Projecto de lei
Do Sr. Amílcar Ramada Curto, proibindo a compra e venda de numerário estrangeiro.
Para a Secretaria.
Aprovada a urgência.
Para a comissão de finanças.
Porá o "Diário do Govêrno".
Requerimentos
Requeiro que pela Presidência da Câmara me seja facultado exame ao processo do sindicância feita aos funcionários do Congresso, nota dos recursos apresentados pelos arguidos e informação do estado actual do referido processo.
Sala das sessões, 25 de Novembro de 1919. - Hermano de Medeiros.
Para a Secretaria.
Para a comissão administrativa.
O REDACTOR - Avelino de Almeida.