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REPÚBLICA
PORTUGUESA
DIÁRIO DA CAMARÁ DOS DEPUTADOS
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(EXTRAORDINÁRIA)
EM 23 DE NOVEMBRO DE 1920
Presidência do Ex.mo Sr. Abílio Correia da Silva Marcai
Balíasar de Almeida Teixeira
Secretários os Ex.mos Srs.
António Marques das Neves Mantas
Sumário. — Abre a sessão estando presentes 31 Srs, Deputados. E lida a acta e dá-se conta do expediente.
Co DL a presença de 46 Srs. Deputados, abrc-sea inscrição.
Antes da ordem do dia.— O Sr. Eduardo de Sousa manda para a Me*a um requerimento com destino à Comissão de Guerra.— O Sr. Silva Garcez apresenta e justifica um projecto de lei sobre pesca, para que requer e urgência e dispensa do Regimento, que são concedidas. O projecto é aprovado se/n discussão, sendo a última redacção dis-penxada.
E aprovada a acta. São aprovados pareceres de última redacção.
Ordem, do dia. — Continua o debate 'político sobre a declaração ministerial do Gabinete 'Ia presidência do Sr. Álvaro de Castro. O Sr. João Camoesas, tendo ficado cum a palavra reservada na, sessão da véspera, conclui as suas considerações, seguindo-se os Srs. Mem Ver dial, Alves dos. Santos, Jorge Nunes e Afonso de Macedo, que fica com a palavra reservada.
O debate fica pendente.
Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata paro, o dia seguinte, à hora regimental.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Requerimentos.
Presentes os Sr8.:
Abílio Correia da Silva Marcai, Alberto Álvaro Dias Pereira. Alberto Ferreira VidaL
Alexandre Barfoedo Pinto dl© Almeida,
Álvaro Pereira Guedes.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Autónio Albino de Carvalho Mourão.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Bastos Pereira.
António da Costa Ferreira.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Dias.
António Francisco Pereira.
António Joaquim Granjo.
António Marques das Neves Mantas.
António Pires de Carvalho.
Augusto Dias da Silva.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Seve-rino.
Custódio Martins de Paiva.
Domingos Cruz.
Eduardo Alfredo de Sousa.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco Cotrim da Silva Garcês.
Francisco da Cruz.
Francisco da Cunha Rego Chaves.
Francisco José Fernandes Costa.
Francisco José Pereira.
Francisco de Sousa Dias.
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Diário da Câmara dos Deputados
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Águas.
João José fia. Conceição Oamoesas.
João Salema.
João Xavier Cainarato Campos.
Joaquim José de Oliveira.
Jpaquim Ribeiro do par valho
Jorge de Vasconcelos Nuues.
José António da Costa Júnior.
José Domingues dos Santos.
José Garcia da Costa.
José Grego rio de Almeida.
José Maria de Campos Melo.
José Maria do Vilhena Barbosa de Magalhães.
José Mondes Nunes Loureiro.
José Monteiro.
José do Oliveira Ferreira Dinis.
Júlio Gomes dos Santos Júnior.
Ladislau Estêvão da Silva Batalha.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Manuel Alegro.
Manuel José da Silva.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
MariaiiO Martins.
Mem Tinoco Ver dial.
Miguel Augusto Alves Ferreira.
Orlando Alberto Marcai.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de SanfAna e Silva.
Rodrigo Pimenta Massapina.
Tomás de Sousa Rosa.
Entraram durante a sessão:
Acácio António Camacho Lopes Cardoso.
Afonso de Macedo.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Álvaro Xavier de Castro.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Carlos Ribeiro da Silva.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António José Pereira.
António Maria da Silva.
António Pais Rovisco.
António de Paiva Gomes.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Carlos Olavo Correia, de Azevedo.
Custódio Maldonado Freitas.
Diogo Pacheco de Amorim.
Domingos Leite Pereira.
Estêvão da Cunha Pimeutel.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco José de Meneses Fernandes Costa.
Francisco Pinto da Cunha Liai.
Ilermano José de Medeiros.
Jacinto de Freitas.
Jnirae Júlio de Sousa.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João Mar j a Santiago Gouveia Lobo Prezado.
João de Orneias da Silva.
João Pereira Bastos.
Joaquim Aires Lopes de Carvalho.
Júlio Augusto da Cruz.
Júliç do Patrocínio Martins.
Liberato Damião Ribeiro Pinto.
Luís de Orneias Nóbivga Quintal. .
Manuel Eduardo da Costa Fragoso,
Manuel Ferreira da Rocha.
Nuno Simões.
Raul Leio Portela.
Vasco Borges.
Ventura Malhciro Roimao
Vorgílio da Conceição Costa.
Não compareceram os Srs.:
Adolfo Mário Salgueiro Cunha. - Afonso Augusto da Costa.
Alberto Carneiro Alves da Crnz.
Albino Pinto da Fonseca.
Albino Vieira da Rocha:
Alfredo Ernesto do Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo o Sousa.
Angolo de Sá Couto da Cunha Safc-paío Maia.
Antão Fernandes de Carvalho.
António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.
António Germano Guedes Ribeiro de Carvalho.
António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.
António Lobo de Aboim Inglês.
António Maria Pereira Júnior.
António dos Santos Graça.
Augusto Pires do Vale.
Augusto Rebolo Arruda.
Constâncio Arnaldo de" Carvalho.
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Sessão de 23 de Novembro de 1920
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco José Martins Morgado.
Francisco Manuel Coucoiro cia Gosta.
Henrique Ferreira do Oliveira Brás.
Henrique Vieira de Vasconcelos.
Jaime Daniel Leote do Rogo.
João Gonçalves.
Jofo Ribeiro Gomes.
Jolu Teixeira de Queiroz V az Guedes.
Joaquim Brandão.
Josó Barbosa.
José Gomes Carvalho de Sousa Varela.
Josó Mendes Ribeiro Norton de Matos.
Josó Rodrigues Braga.
Júlio César de Andrade Freire.
Lpor.anlo Josó Coimbra.
Lino Pinto Gonçalves Marinha.
Mannol de Brito Camacho.
Manuel Josó Fernandes Costa.
Manuel Josó da Silva.
Maximiano Maria de Azevedo Faria.
Pedro Gois Pita.
Raul António Tamagnini do Miranda Barbosa.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Viriato Gomps cia Fonseca.
Vitorino Heuriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guima rãos.
Xavier da Silva.
Às 14 horas e 30 minutos principia a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente : — Estão presentes 46. Sr. Deputados. Está aberta a sessão. Eram 14 horas ç 40 minutos. Leu-se a acta e deu se conta do seguinte :
Pedido de licença
Do Sr. Deputado Sá Cardoso — 30 dias. Concedidos. Comunique-se. Para a comissão de infracções e faltas.
Ofioios
Do Sr. Felisberto Alves Pedrosa, es-.Ministro do Interior, agradecendo aã provas do eoBfiidcíraçSo ue recofcieu çjp, Gfi-
raara durante o período em cj^e compareceu no Parta monto. Para a Secretaria.
Do Juiz Presidente do Tribunal do Comércio de Lisboa, pedindo a comparência, como testemunhas numa acção ordinária, dos Srs. Jorge Nunes e Dr. João 1'inheiro.
Recusada. Comunique-se que o Sr. João Pinheiro já não é Deputado.
Telegramas
Dos empregados da Camará Municipal de Portalegre, pedindo aprovação do projecto de lei, melhorando a. sua situação.
Dos empregados da, Cânaara Municipal de Olhão, pedindp para serem obrigadas as Câmaras Municipais do país a darem aos seus empregados ajuda de custo de vida, como o Estado.
Para a Secretaria.
Da Câmara Municipal das Caldas da Rainha, pedindo cópia do projecto de lei aprovado, referente ao Hospital daquela vila.
Duma comissão de republicanos de Belmonte, protestando contra a aplicação da lei n.° 1:040, que reforma o tenente da Guarda Republicana, Joaquim Vasco.
Dos terceiros oficiais, chefes da secção fiscal do Porto e Gaia, pedindo parecer favorável para um projecto apresentado pelo Sr. Deputado António Mantas.
Para a Secretaria.
Representação
Da Pomissao Contrai dos Alunos dá Faculdade de Medicina do Porto, pedindo modificação à Nova Reforma estabelecida pelo decreto n.° 4:652 de 12 de Julho de 1918.
Para a comissão de instrução Superior.
Requerimento -
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Antes da ordem do dia
O Sr. Eduardo de Sousa :—Pedi a palavra para enviar a V. Ex,a um requerimento do Sr. João Augusto Casanova Pinto, cujas razões s£Lo de ponderar.
Rogo a V. Ex.a a fineza de o lazer chegar à Comissão de Guerra, a fim de que ela o tome na devida consideração.
O requwimento vai por extracto r.o expediente.-
O Sr. Silva Garcês :—Pedi a palavra para mandar para a Mesa um projecto de lei acerca do exercício da indústria .da pesca, para, o qual peço que Y. Ex.a consulte a Câmara sobre se permito a. urgência e dispensa do Regimento.
As leis que estão em vigor, regulando a indústria da. pesca, impõem uma diminuta multa àqueles que usam, no exercício dela, de explosivos e matérias corrosivas, pouco se importando em pagar a multa, quando a pagam, pois a maior parte das vezes não correm esse risco.
Pelos motivos expostos, julgo justificado o meu projecto de lei e o meu requerimento.
Foi aprovado o requerimento e lido na mesa o prujectu que é o seguinte:
Projecto de lei
Artigo 1.° Será punido com prisão cor-reccional nunca inferior a três meses, e multa nunca inferior a 90$00, todo aquele que pescar com dinamite, ou qualquer outro explosivo, sulfato de cobre ou qualquer outra substância venenosa com que se mate peixe.
§ 1.° Serão considerados co-autores dos crimes previstos neste artigo, e punidos com as mesmas penas, todos aqueles que acompanharem os agentes dos mesmos crimes durante a execução deles.
§ 2.° Os cúmplices e encobridores dos ditos crimes serão punidos nos termos gerais estabelecidos pelo Código Penal.
§ 3.° As penas serão aplicadas em dobro se os crimes de que trata este artigo forem cometidos de noite.
Art. 2.° Uma terça parte das multas cobradas cm cumprimento da presente lei pertencerá a quem der, em juízo, ou perante as autoridades administrativas, conhecimento ou participação do facto criminoso j outra, terça parte será entregue
Diário da Câmara dos Deputados
às instituições de assistência o beneficência de cada concelho em cuja área tenham sido cometidos os crimes, preferindo os hospitais ; e a terça parto restante pertencerá ao Estado. . Ar. 3.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala, das sessões, 19 de Novembro do 1920. — Francisco Cotrim da Silva Garcês.
Foi aprovado sem discussão.
O Sr. Silva Garcês:—Requeiro a dispensa da leitura da última redacção. Foi aprovada.
O Sr. Presidente: — E a hora de se passar à ordem do dia.
Foi aprovada a acta e foi aprovado o expediente, que necessitava, para o ser, de número regimental.
Últimas redacções São aprovadas as seguintes:
Do projecto de lei n.° 287, que remodela a Escola Industrial «Gabriel Perei-
Dispensada a leitura da última redacção.
Remeta-se ao Senado.
Do projecto de lei n.° 372, que cria uma assembléa eleitoral no lugar de Da-fundo, freguesia, de Carnaxide, concelho de Oeiras.
Aprovada.
Remeta-se ao Senado.
ORDEM DO DIA
Continuação do debate sobre a declaração ministerial do gabinete da presidência do Sr. Álvaro de Castro.
O Sr. João Camoesas:—Antes de reatar as considerações que ontem iniciei nesta casa do Parlamento, eu devo, espontaneamente, ir ao encontro de dois equívocos, que importa desfazer desde já.
Aos meus ouvidos chegou o boato, que corre em certas esferas, de que em certa altura do meu discurso o Sr. Domingos Pereira tinha proferido palavras às quais eu respondera asperamente.
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sidade de sair da sala, fez a vénia de cumprimento usada em tais casos, e eu nesse momento, respondia a um aparte do Sr. Nóbrega Quintal. E já que me referi a S. Ex.a, devo dizer que não tive o menor intuito de ser desprimoroso, tanto mais que foi um galhardo corapa-'nheiro de lutas de tantos anos.
Todas as considerações que ontem tiAre a honra de produzir foram encaminhadas no sentido de lamentar que o Partido lle-publicano Português tenha vindo a ser a vítima de uma série de infundadas acusações e de uma injustiça política.
Mas felizmente os factos, com aquela eloquência singela mas empolgante de que costumam revestir-se, se encarregaram à saciedade de reduzir ao mais completo e absoluto desmentido as acusações feitas ao mesmo partido.
Aqueceu a minha palavra através dôsse debate, aqueceu, Sr. Presidente, porque Jiela tempestuava a indignação e a revolta, porque nela vibraA-a a, mágoa enorme, quási indefinível,- de muitos milhares de amigos da massa que engrossa e constitui as legiões da República, dos soldados que fizeram os heróis o que ficando no seu posto como ficaram, no emtanto eram apontados ao país, pela atitude dos que saíam, como menos republicanos, como menos capazes do sacrifício dos seus interesses particulares pelos altos e sagrados interesses da Pátria, apontamento, indicação absolutamente injusta, 'repito, e que já hoje ninguém em Portugal pode articular com êxito, com a esperança, longínqua sequer, de haver ouvidos de portugueses bem intencionados que lhe possam dar um momento de guarida.
Keferi-ineincidentalmcnte à constituição do Ministério ; ele era um facto palpitante.
Não tive ontem ocasião de apreciar e criticar todas as pessoas que o compõem; encontro-me à vontade para o fazer, embora nem todos os Srs. Ministros estejam presentes porque o Sr. Presidente do Ministério aqui se encontra.
Lá para o fim da bancada ministerial, deste ponto da sala em que mo encontro, numa meia penumbra que atenua as fisionomias, que as afasta, que as recua ato o passado, vejo, Sr. Presidente, dois Srs o Ministros que trouxeram da monarquia para. a República o hábito da dissi-
dência. Pois Srs. Ministros e Sr. Presidente, um deles que nos aparece arrancado ao seu fauteuil de Presidente da Associação Industrial Portuguesa para vir dirigir superiormente os interesses^ os destinos da agricultura portuguesa, com quanta sinceridade eu desejo que a sua acção como Ministro, na orientação que vai imprimir à lavoura do meu país, seja mais proveitosa para ele do que na direcção da sua própria lavoura. Sr. Presidente, permita-me V. Ex.a este aparto correctivo: as minhas palavras visam factos ou doutrinas, nunca me importam as pessoas. Devo a propósito dizer : o trabalho alheio é-me tam credor de respeito que, mesmo quando não concorde com éle? não deixo de respeitá-lo.
Este processo de nunca considerar pessoas senão pelos actos que praticam, de nunca considerar senão os factos, de nunca considerar senão as rotinas e opiniões, faz com que eu ande direito e tranquilo no meu caminho de político; faz com que eu considere que o meu adversário quando liai e bem intencionado é o melhor dos meus colaboradores.
A apreciação em que estão prosseguindo, não poderá jamais ser desviada, do terreno da livre, da desassombrada crítica, para o terreno mesquinho, om que não costumo entrar, de pequeninos dcs-peitos pessoais.
Sr. Presidente: o Sr. Ministro da Agricultura preside aos destinos da Associação Industrial Portuguesa. Ora eu não posso senão lastimar que se invoque como título de competência a circunstância de presidir a tal associação, visto que ela nos tem dado provas de ignorância sobre as regras que modernamente orientam as indústrias em todo o mundo.
Eu, que sou político, entendo que os homens do Governo devem ser recrutados no campo das actividades políticas.
Tenho visto que têm falhado todas as tentativas de intervenção de técnicos na política. Não posso, pois, deixar de me revoltar contra a entrada do Presidente da Associação Industrial nas cadeiras da governação do Estado, sem um passado político ([iio o recomendo e com um passado técnico que não é de molde a impO-lo ao nosso respeito como administrador.
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O Sr. Ministro das (Jolónias é mu político como nós.
Êsso teni inveterado o hábito da dissidência; trouxe-o da monarquia -para á liepública. A Câmara eOnhece-o também eònib ou, por isso úio dispenso de criticá-lo alongai lamente.
Não quero referir-me ali resto dos oú-t'ros Ministros, pois teria de falar dó Sr. Júlio Dantas ; e como já uma A-OZ aqui pratiquei uma irreverência, abstenho-i no de l lie lazer qualquer referência, ó somente direi (}iie é n maior íigúra da literatura do todos os tempos o ainda dos tempos presentes sob o aspecto d á literatura comercial.
Sr. Presidente: de. resto, ainda faltam duas pastas para preencher, e no meu espírito surge A dúvida-de qiie não vá dar-se, mais alguiiia scisão, a qual já anda na forja.
Sr. Presidente: eram .estas as considerações que eu tinha de produzir em relação à composição do' actual ministério..
Tenho nesse Ministério, amigos velhos e dedicados, não só no caiiipo pessoa] como no campo político em que combatemos quando foi cia propaganda. Para destacar um deles, ou lembrarei o Sr. Júlio Martins, o extraordinário almirante da mari-nlia portuguesa, que a vai fazer ressurgir com o auxílio e tradição dos velhos e heróicos marinheiros portugueses.
Como já disso, repito, homem contra homem no terreno da política.
Sr. Presidente: a constituição deste Ministério é ilcgalíssiniá. pois não tem maioria parlamentar ,quo o apoie. A declaração ministerial, escrita em género de literatura política, nada nos diz cm relação à maior parto dos problemas, deixando à margem os altos e extraordinários problemas que afectam riãò áó a vida de Portugal, más -do mundo inteiro! É escrita na mais flagrante ignorância da existência dó um problema económico e social; é escrita até sem uma palavra do taúi palpitante problema internacional'.
E já que falo neste aspecto, permita-me V. Ex.a que relembre à (.'amara alguns factos.
Creio eu — e se estou em erro S. Ex.a que emende—quê foi o Sr. Álvaro de Castro quem se pronunciou pela continuidade de pessoas que sobraçaram a pasta dos estrangeiro s.
Diário d A Câmara doo Deputado Ê
Pois bem, havendo duas vagas no Ministério, è sendo o Sr. Domingos Pereira, unia pessoa qlie rilinca nós deu conhecimento que" se interessasse pelos assuntos que hoje correm pela pasta dos Estrangeiros, é de estranhar que o nome do Sr. Melo Barreto hão figuro na composição do gabinete, o (MI não quero fom está referôn-cia contribuir para avolumar os boatos que circulam, sem dúvida para formar mais uiliá intriga.
Este Ministério, pelas circunstancias do minoria pa.rlaihentar, feito do t-bnconti-a-ção, inversa, encontra-se som cor definida.
E formado pelos IIOA?ÓS grupos ou partidos, apenas, sem correspondência com d opinião nacional.
O critério visado em Portugal tem sido sempre O de se fazer tjartido no GKUvêrrio' para atacar os outros partidos.
É vim aspecto interessantíssimo, cuja análise eu faço corajosamente, já porque' não sou homem de nieias palavras, já porque prefiro os adversários leais o declarados aos adversários disfarçados, encobertos, aiionimados numa Série de ardis e dê estratagónuis que abastardani a acção" política por não serem legítimos.
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só reapareceu, mas ainda surgiu mais forte do que era anteriormente, o a tal ponto que ocupou por duas vexes a magistratura suprema da República norte-amoricana. Aqiii mesmo em Portugal Gsse critério simplista se lançou ua mesuia tentativa infrutífera e contraproducente, íífectiva-mento, nunca como agora, o Partido .Republicano Português, a quo me orgulho de pertencer, teve tantas condições do vitalidade e de progresso. (Muitos apoiados}. Assim os seus órgãos supremos estão, neste momento, assegurando-se, dos instrumentos técnicos indispensáveis para que ôie seja um grande corpo colectivo em marcha.
Depois, os partidos quando nascem em volta de um homem, passam geralmente por uma fase meramente sentimental, que í az com que a sua evolução obedeça precisamente às mesmas leis da química.
Assim os partidos políticos em formação não podem ser designados com propriedade senão por facções. De facções saíram os representantes do actual Governo, com o único propósito de impedir a laboração dos partidos que fossem, de facto, autênticos organismos políticos. (Apoiados).
Veja V. Ex.% Sr. Presidente, e veja a Câmara como é realmente interessante a questão ministerial encarada sob o aspecto em que a acabo de pôr, e como eu tinha razão para preguntar o que vêm aí. ^Yein uma luta cega e desvairada d as facções contra os partidos? Se assim é, tjue tenham, ao menos a coragem do levantar bandeiras com galhardia.
Finalmente, eu não posso deixar terminar as minhas considerações sem me rofbrir ao que vem escrito na declaração ministerial, cujas'idoas foram arrancadas por subscrição às declarações ministeriais anteriores.
Leu.
Os partidos representam ligações políticas com autoridade e sabor, para resolver entre o Estado o a categoria profissional respectiva.
,jA fiscalização, da autonomia administrativa porque se não fez por meio do controle dos próprios interessados?
Não quero de maneira nenhuma demorar o debate, mas ainda não posso deixar de dizor quo no problema das entradas o (!í>\r>iMo diz •> meiHK descobrindo o ninis.
Assini o que importa é critério técnico na organização futura: a transformação dum instrumento do Estado que a prática tem demonstrado não estar absolutamente adaptado às necessidades do País. _
Princípios são para discutir. O primário é quo para se gastar dinheiro haja instrumento capaz, do fornia a quo esse dinheiro seja gasto produtivamente, nau como é hoje, prejudicial monto. (Apoiados).
Dir-so íuí quo esta declaração ministerial permitam-mo V. Ex.as a referencia, foi escrita pela mesma forma por que, a altas horas da noite, fatigado, causado do seii calvário, arrasado o gasto, um velho profissional da imprensa tom de arranjar um artigo -sobro problema quo não tivesse estudo conveniente. (A^Hjiados).
Más há niais: Vamos ao auxílio da. agricultura.
Seja-me lícito salientar que este Go-vêi^no, constituído por homens que deitaram abaixo o Sr. Granjo, em matéria do agricultura ou abastecimentos adopta perfeitamente as prerrogativas do Governo anterior; e, no oihtaiito, deitou abaixo Osse Governo. Era, bom, ora sério? Eu concluo pelos Srs. Ministros: não ératnos nós.
Esta ininha conclusão preferia-a eu, mas poderia ser feita por S. Ex.as nas pessoas que compõem o Gabinete.
Mas ainda ha mais, e vejo organismos que estariam já mortos como organismos económicos. Arem o espantalhp da estimulação, que em toda a parto do inundo se demonstra sor ineficaz.
E o mais interessante dos problemas agrícolas, como ausentismo.
Não devem as terras ser exploradas como os souteneurs exploram as mulheres.
O vital problema que exponho à consideração da Câmara é que a execução destas pensões seja dada a homens, em quo haja a faculdade de intervir na A'ida económica o financeira do País.
Em matéria do instrução e ensino, contempla-se também o mesmo estado de ignorância. Ignorância do improvisado Ministro quo ali se senta.
Pode fazui' muito bem ver00H. mas iiâo fará o desenvolvimento da instrução.
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Aqui há um homem que põe muito beni em verso os marqueses e marquesas dançando a gavotie, mas que não é capaz de atender a todos os problemas de carácter técnico da sua pasta, assunto que ó fundamental para a nossa vida nacional; o assim é que haArendo aqui nesta declaração ministerial um grande número de palavras acerca do ensino e da sua reorganização, poderemos exclamar: — j Santo Deus, quantos lugares se darão numa e;s-pócie de bodo à custa do Tesouro!
Fala-se aqui na reorganização do Ministério da Instrução.*
Em primeiro lugar, esse problema é considerado eni separíido, mas ele não pode ser considerado em separado do próprio problema cio ensino, porque o pro"-blema fundamental do ensino é a criação do professorado.
Sem. professores habilitados, qualquer diploma de acção moderna relativo ao Ministério da Instrução c às Universidades não se resolve o problema, e o problema da criação do professorado não ocorre ao espírito ilustrado do Sr. Júlio Dantas, porque S. Ex.íl pode muito bem fazer versos muito bonitos, mas não pode pensar, porque pensar ó que ó difícil.
j Então pela pasta da Marinha o programa ministerial é fantástico!
O Sr. Júlio Martins manifesta-se bem o homem do sul, como eu sou, que v« a água através das ribeiras; o mar, que na nossa meninice aparece-nos como o grande impulsionador da raça, quo nos tem feito grandes o pequenos.
O mar, para nós, é mais belo que para os homens da praia; em nossa fantasia é sempre grande.
Mas exactamente porque temos Gste conceito teórico do mar, -quando vamos à organização das cousas que lhe dizem respeito, somos teóricos também. E não é só teóricos, somos um tudo nadinha ignorantes das realidades. Assim por exemplo, esta passagem da declaração ministerial: «activará a vinda dos cruza-dores já adquiridos na Inglaterra».
Extraordinário! Colossal! Já lá estilo as equipagens para os receber, já estão, talvez; a caminho; mas vai um telegrama do f/rande almirante Júlio Martins, dizendo: venham depressa, quero uma festa para os receber, ainda sendo Ministro. (Risos).
Diário da Câmara dos Deputado»
Mas, nuiis: «estudará definitivamente a. situação dos nossos arsenais», j E fantástico ! Estudar definitivamente uma organização industrial, que é. segundo a técnica moderna, uni problema constante; que é uma cousa que nunca pode ser definitivamente resolvida, porque agora se inventa uma máquina, porque agora é o laboratório de fisiologia que dá um iiovo esclarecimento em relação ao emprego do trabalho do operário, etc., etc. j Oh! Sr. Júlio Martins! como V. Ex.a é tam grande que consegue tornar definitivo o que é de natureza inconstante!
Ainda mais: «dedicará toda a sua atenção ao problema da pesca». Sr. Júlio Martins, nós somos velhos amigos ;• por isso, se há pessoa a quem deseje ser agradável, é a Y. Ex.a Mas isto de dedicar toda a sua atenção a um problema que. pela ignorância dos seus antecessores, ainda não foi posto em equação, não cabe doutro cios limites da benevolência amiga. Realmente, Gsse problema tem. sido com-pletamento desprezado, e ele muito podia concorrer na sua solução para o barateamento da vida. (Apoiados). Com os pescadores que nós temos, que são heróicos na sua aventura pelo mar fora, sem quási elementos de defesa,; que são tam patriotas que ainda outro clia recusaram a riqueza do Brasil para não renegarem a sua Pátria (Apoiados)—se se tivesse olhado com um pouco de atenção para esse problema, muito só teria já concorrido para o desenvolvimento duma riqueza nacional; e era, então, cabida a frase da declaração ministerial. Todavia, ele tem sido resolvido brilhantemente lá fora. Kesolvou-o a Espanha, dentro do seu liberalismo económico, mas assim não procederá, de certo, o radical sr. Júlio Martins. Kesolvou-o a Inglaterra dentro das suas velhas fórmulas e tradições. Resolveu-o a França, defeituoso figurino que tanta s veze^ copiamos, e resolveu-o dotando os pescadores com os elementos necessários ao exercício da sua arte, o dando-lhos um corpo de técnicos em ordem a pôr, do colaboração, todo o esforço da especialidade ao serviço dessa indústria.
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Sessão dê 23 de Novembro de 1920
critério; cómoda, porque lhe permito ouvir a palavra daqueles que contradizem, para depois elaborar um conhecimento em relação ao problema, conhecimento que já devia vir elaborado aqui. (Apoiados).
Em todo o programa do Sr. Álvaro de Castro a que se quis chamar declaração ministerial é tudo vacuidade. (Apoiados). E ao cabo de se fazer um esforço formidável, o máximo esforço qno um homem pode fazer, compreendo-se que se está a discutir o vácuo, e o vácuo não se discuto, vorifica-se. (Apoiados).
Aos Srs. Ministros não lhes ambiciono a sucessão, nem quero que vão engrossar o já volumoso rol dos antigos Ministros da Eepública.
Vou terminar, e romanticamente, dizendo : a lenda antiga crê acreditar que os homens públicos da minha torra ainda tom alma e coração.
Pois bem:
Esses homens sairão dali amanhã, mas não sem terem sido lamentados pelos compatriotas; e esses homens serão capazes de se integrarem na única forma que convêm neste momento; na associação rigorosamente seleccionada, dos altos valores da República, sob a presidência de um homem que dê as garantias necessárias em matéria de política, sob a presidência de um homem que seja para a Pátria p que Clémenceau foi para a França em certa altura. Então não era só Clémenceau; era a França. Pois bem. Aramos procurar um homem, de quem o país inteiro possa dizer:
Ali está Portugal.
Vozes: — Muito bem.
Ú discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas as notas taquigráficas que lhe forem mviadas.
O Sr. Mem Verdial: — Entro neste debato sem ter podido infelizmente acompanha-lo até Oste momento. Mas, ainda que de longe, também as palavras no seu sentido se ouvem. Também o tumultuar das paixões só sente e também de longe esse tumultuar das paixões só seute- mais perturbador que na confusão imediata dos seus sons.
Do longo tambôm se apreciam essas pessoas como devidamente devem sor
apreciadas por quem de perto as conhecer.
Sento-se o choque, sente-se o tumultuar e a confusão de interesses que desaparecem, de interesses que não conseguiram efectivar-se e de outros que nasceram indevidamente.
Estranha atitude a destes combatentes; estranha atitude que se não fiima nos princípios e afirmações passadas l
Estranhas palavras que não podem ligar-se num coração absolutamente tonificante com as atitudes que de futuro hão-de seguir-se!
Existe no Poder a conjugação de três grupos desta- Camará.
jíO que é que existe na oposição? A oposição de dois grupos desta Câmara.
r;Sao partidos?
,;São partidos os que estão fora?
,; Têm princípios os que estão no Poder? Eu tenho princípios, e é em nome desses princípios que levanto a minha voz, representando os princípios de quem me elegeu. Não saio fora do caminho que me foi traçado, de acordo com as pessoas que me elegeram. Nesta conformidade absoluta" com os órgãos partidários que me elegeram, e que me dão a honra de apresentar-me como soldado e de que até hoje não me desviei, nem me desviarei j amai s um passo, porque acima de todos os homens, que nada valem, coloco os princípios que defenderei até o último alento da minha vida. Vejo no Poder antigos correligionários meus e antigos evolucionistas, homens que se reuniram contra o dezembrismo, homons que se juntaram para fazer a política da guerra, homens que se juntaram para defender a República. £ Tenho ou o direito de desconfiar deles? Mal irá quando essa descrença me entrar no coração, porque não estarei aqui senão os momentos inuispeiisá\'t!Í}< p ai1 a lançar a execração do meu repúdio contra a atitude dos políticos.
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Sou democrático. Estou ainda nesse Partido e nele Jiei-de continuar a estar através de tudo, reagindo porventura contra a sua atitude, rnas cá dentro.
Não sairei, mas não praticarei a cobardia de não dizer que os seus homens vão por errado caminho.
A política do Partido, essa faço-a eu, porque considero que a política do Partido é a realização dos seus princípios, e os meus princípios estão concordes com o programa partidário do grupo político a que pertenço.
Ponho de parte os interesses mesquinhos duma facção do meu Partido, e digo duma facção porque em toda a parte do mundo os partidos têm pequenas facções que querem .impor os seus interesses aos interesses partidários.
Eu vejo no Poder homens que, sendo tam somente sinceros dentro dos princípios republicanos, ainda conservam os princípios que sempre preconizaram.
Tanto basta para terem o meu inteiro apoio. Estão no Governo correligionários antigos e indivíduos que trabalharam no campo dos princípios e pontos idênticos aos meus. Porque hei-de repudiá-los? Pois não estamos nós aqui para a resolução de uma obra comum? Se estamos, para que nos degladia-mos? Apenas para deitar abaixo um Governo e substituí-lo por °outro ? Eu tenho combatido muitas vezes *os actos das pessoas, mas nunca as pessoas. Da sessão de ontem concluí que uma parte do partido democrático não apoia esta atitude, e fiquei com a convicção de que tenho muitos correligionários a aceitarem como bom princípio que é indispensável dar-se estabilidade ao Governo. Afirma-se que a declaração ministerial é o vácuo, e por outro lado afirma-se que isso não é verdade, pois é igual a todas as outras declarações! ^Então uuiemaeeitava-seo vácuo e hoje não se aceita? O Sr. Jorge limes: — (Em aparte) Tí bem achado! (Apoiados), Diário da Câmara doa Deputado O Orador:—Eu já tive ocasião de aqui dizer,, na ocasião própria, que não se deve deitar um Governo abaixo sem ôle tomar uma atitude de molde a que a Câmara não lhe pudesse dar apoio. Pois bem, o Partido Reconstituinte tem sido acusado de ser um Partido da direita, também com processos moderados. Está no Poder o Partido Reconstituinte, Por sua vez a esquerda está lá representada pelos seus aliados de ontem. Se a direita está representada pelos seus aliados da semana passada, a esquerda está representada pelos populares, que ainda há poucos dias eram os aliados dos democráticos. (? Porque é, portanto, que estando ali o Partido Popular, que lhe serviu de colaborador, cujos princípios aceitava porque eram os da esquerda, repudia agora esses princípios só porque são do Partido Popular e não são do Partido Democrático e Partido Socialista? E isto, Sr. Presidente: nós queremos as ideas da esquerda realizadas, mas há-de ser com Ministros. Os partidos da direita dizem o mesmo, nós queremos uma política à direita, mas havemos de ser nós Ministros, nós inteiros ou uma fracção de Ministro. Se o Governo foi constituído por esses Partidos ou'haja nesse Governo uma fracção de Ministro desses mesmos Partidos o Governo ó excelente, mas se nem Ministros nem fracção de Ministro, então o Governo ó adversário. Sr. Presidente, sob o ponto de vista geral, e é o aspecto que. tam somente quero encarar, sob o ponto de vista geral entendo que estão representadas no Poder as correntes tais como se têm afirmado dentro da Câmara dos Deputados. Q. Eu entendo que ó fundamental no nosso País a reorganização do ensino, e lamento que fosse uma voz do meu partido que se levantasse uma oposição a este respeito- Não discuto a competência do Sr. Ministro sem primeiro conhecer dos seus actos; mas pregunto eu: ^prometer a reorganização do ensino é, porventura um crime?
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Sessão dê 29 de Novembro de 1920
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educação para que reunam homens que façam uma política diferente desta. (Apoiados).
Eu gosto de atitudes definidas e claras. Para que há-de estar um Governo nas ca: deiras do Poder apenas uma ou duas semanas,, se nós sabemos que para alguma cousa de útil fazer a favor do País ele necessitava de quatro ou cinco meses?
Se há o propósito firme de o derrubar amanhã, derrubem-no já hoje.
Toda a gente que pensa e se julga competente nunca teve a coragem de afirmar que iria fazer uma obra de um momento para o outro. Os mais inteligentes são aqueles que dizem que precisam de pensar.
Sr. Presidente: se eu desejo para, mim tempo para reflectir e estudar qualquer obra particular, porque ó que não hei-de querer ôsse mesmo direito para os Ministros que tom de fazer uma grande obra? Parece-me que este meu raciocínio é o verdadeiro; todavia bom será que seja a oposição, os bem ansiados e os iluminados e de olhos no céu que sejam alcandorados àquelas cadeiras; mas é preciso que não venham o temporal e o raio que os desfaça, e que os seus exércitos destrocados, na precipitação da fuga, não se atropelem ua estrada por ser estreita.' Eu bem avisado andei para com a minha consciência^ dor-mi^ei hoje melhor sobre as minhas pala-A-ras, embora não vá de acordo com alguns membros do meu partido e desagrade ao Partido Liberal, que tentava derrubar o Governo.
• O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Alves dos Santos: — Sr. Presidente: não pedi a palavra para definir a minha atitude em face do Governo que se apresentou ao Parlamento, porque essa atitude já foi definida pelo Sr. Fernandes Gosta, que falou em nome do Partido Republicano Liberal, a que tenho a honra de pertencer.
Também não quoro fazer um exame circunstanciado e uma análise profunda da declaração ministerial, lida a esta Câmara pelo Sr. AK~aro de Castro-; todavia, ontondo quo é do meu dever aproveitar n oportunidade para fazor algumas con-
siderações que são sugeridas por esta declaração ministerial; e assim ficarei mais sossegado com a minha consciência e cumprirei uni dever.
Está acolá um Governo! Esse Governo apresenta-se com um programa para- go-A^ernar! A hora é amarga! A hora é incerta! A crise por que a nacionalidade passa é uma crise tremenda; é um desequilíbrio funesto da vida nacional. Dir--se-ia que a nacionalidade, havendo perdido o rumo, como um barco, a contar com a tormenta, navega num mar agitado, que pode subvertô-la, num instante. . .
As dificuldades com que lutamos são talvez um reflexo do caos em que se encontra o mundo, por virtude da Grande Guerra.
Há, eA'identemente, em todas essas di-"ficuldades uma cota parte que pertence ao desequilíbrio mundial. Mas, Sr. Presidente, deA7emos ter a consciência nítida da gravidade do momento, e das necessidades da Nação; e devemos aproximar essas necessidades das necessidades mundiais, e ver o que importa fazer para tirarmos das circunstâncias o maior proveito possível para o bem da Nação.
Perdõe-me a Câmara esta divagação, que as circunstâncias impõem.
Eu entro já no assunto para cuja explanação pedi a palavra.
A declaração ministerial não satisfaz a expectativa da Nação. Perdõe-me o Governo que o diga. Não direi que o seu programa represente positivamente o vácuo; mas pouco mais representará.
Vemó-nos em presença de banalidades e de lugares comuns. ..
Afirmações de carácter genérico, eis o mais que se encontra aí...
Desde a pasta das finanças, que ó o Gólgota de todos os governos, até a pasta da mísera instrução, não A^ejo no programa do Governo qualquer idea, qualquer promessa que mereça registo especial.
Em matéria de finanças até parece que o Governo apenas quis reeditar o que na «Política» escreveu Oliveira Martins...
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Sr. Presidente: reveste um carácter de extrema gravidade o facto de nEo ficar* moa sabendo o que o Governo pensa, em relação aos assuntos que correm pelas pastas do Interior, dos Estrangeiros, da Justiça, da Guerra e do Trabalho. Nada se diz cm relação aos negócios destas pastas e, todavia, ninguém ignora que para se levar a efeito uma obra de verdadeira reconstituição nacional, imprescindível é que a acção dos Ministros que sobracem essas pastas se exerça em colaboração com a acção dos Ministros das restantes pastas.
Chamo a atenção da Câmara para as considerações emitidas nesta declaração ministerial em relação aos ministérios do Comércio e da Instrução.
O Governo pode não ter ideas; O Governo pode ter ideas velhas de muitos" anos; mas o que não pode é ter ideas erróneas.
Toda a gente diz —é já banal— que é necessário aproveitar as forças que estão por explorar no País. É necessário aproveitar a energia hidráulica de que dispomos, para evitar a importação do carvão estrangeiro, que nos empobrece nos milhares cie cúuLois, cum que, todos os anos, temos de o pagar, lá fora. . .
O que diz a este respeito Q Governo que aí está? Qual é a sua política hidráulica?
^Declara que adopta porventura algum dos projectos de lei que a esta Câmara têm sido presentes, o meu, por exemplo, ou o do Sr. Velhinho Correia; ou que pretende fazer?
Ficamos sem o saber, por que o Governo não o diz!... Sr. Presidente: por isso mesmo 'que não desejo alongar muito as minhas considerações, passarei imediatamente a ocupar-me daquela parte da declaração ministerial que merece a minha particular atenção,'por isso mesmo que se»ocupa do assunto da minha especial competência e predilecção. Kefiro-me à pasta da Instrução. Lamento sinceramente que o Sr. Dr. Júlio Dantas, homem de excepcionais qualidades de inteligência, e de carácter, estrela de primeira grandeza nos recamados céus da nossa literatura e da nossa Diário das Câmara do» Deputados arte, figura de primacial destaque do nosso meio; venha, pela boca do Sr. Presidente do Ministério, apresentar à consideração do País uma obra que, por mais dum titulo, eu reputo nefasta, rotineira, e reaccionária; obra que não se coaduna com os interesses da República, nem com as necessidades da nossa escola e da nossa educação.. . S. Ex.a (desculpe-me a franqueza), parece desconhecer as necessidades do ensino, e bem assim as bases sobre que deve assentar ama reforma desse mesmo ensino, de modo a satisfazê-las. Há aqui palavras que não sei o que significam. Fala-se dum «estatuto geral do ensino». Neste século de liberdade, e depois da vitória da democracia contra o cezarismo, será vã toda a tentaviva que se fizer para centralizar, monopolizar e burocratizar o ensino. Não é de «estatutos» qno precisamos, e muito menos dum «estatuto gorai», que submeteria às mesmas regras todos os ramos de ensino, que tudo uniformizaria. Protesto contra essa orientação, porque ela não' cqnvôm aos interesses da República, e está fora 4o nosso tempo..», o peço que se me diga quais são, concreta-mente e em termos precisos, as ideas do Governo'sobre este assunto, que deve ser resolvido em primeiro lugar, pois que da solução dêlo 'é que resulta.rá a solução de muitos outros problemas. .. í O que é que o Governo entende por um «estatuto geral do ensino» ? óSerá uma lei orgânica de todo o ensino, desde o ensino universitário ao ensino infantil? ^Mas como será isso possível?
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As universidades têm progredido na razão directa da sua autonomia. Do que se carece, pois, não é de restrições às liberdades do ensino; mas de independência progressiva a conceder a todas as escolas . . .
Eu desejaria interpretar o pensamento do Governo num sentido que não implicasse a "ignorância que se pode supor, em matéria de tamanha magnitude, mas não sei como...
0 Parocc-me que a simples expressão «estatuto geral do ensino» denuncia, sem sombra de dúvida, o erro grave de orientação em que suponho laborar o Go-vôrno.
Eu sei que carecemos de rever a legislação do ensino e simplificá-la, estabelecendo as bases gerais duma organização racional do mesmo ensino; mas isso em .nada se há-de parecer com qualquer providência que pareça antes do século xvm do que do nosso tempo.
^Diga, portanto, o Governo o que é que entende pela expressão que tani iná-bihnonto empregou; e om que vai consistir essa reforma que anuncia?
<_ p='p' que='que' a='a' as='as' ou='ou' legislação='legislação' criou='criou' revoga='revoga' man='man' têm-nas='têm-nas'>
Não ignora o Governo qne o País gasta já. com essas escolas, alguns milhares de conlos anuais. . . £ Como proceder de modo a aproveitar esse dinheiro, fazendo-o frutificar? • ^ Pensa o Governo que se não deve desprezar o exemplo do estrangeiro, mas que também importa perder o costume de só copiarmos o qne se faz lá fora? f.Numa palavra, o que pensa o Governo realizar, em relação às obras ditatoriais de 1918 e 1919? £ Adopta os princípios pedagógicos duma ou doutra dessas revoluções? O Sr. Presidente do Ministério propõe-se resolver a «questão universitária». Chamo 13 a atenção de S. Ex.a para este ponto, a fim de que possa sobre ele dar-me uma resposta. , O Sr. Álvaro de Castro diz que vai resolver a questão universitária. O PÍIÍS não se contenta com palavras; exige factos. <_ p='p' n.='n.' lei='lei' a='a' governo='governo' ou='ou' mantêm='mantêm' _861='_861' revoga='revoga' o='o'> Esta questão é gravíssima e urge resolvê-la. Até agora, porém, nenhum Governo o conseguiu. Vem este Governo, e promete fazô-lo. Muito bem; eu felicito o Sr. Álvaro de Castro e digo-lhe qne pode coutar com a minha boa vontade c competência para o auxiliar nessa empresa; mas acautele-se S. Ex.a, porque tem, pelo menos, duas dificuldades a vencer : não ofender o princípio democrático da autonomia, e defender a República. E necessário não falar nem proceder, ao de leve, sobre este assunto. Urge resolver... e não simplesmente proferir palavras. (Apoiados). A solução da questão universitária há-de ser uma consequência do premissas que terão de ser postas, não só em relação ao ensino universitário, mas a todo o'ensino. Quero dizer que a solução da questão universitária não pode ser realizada, sem se reformar todo o ensino. A Universidade de Coimbra e as outras dnas mais novas universidades precisam não só de presidir à formação da nossa intelectualidade superior, mas têm de superintender também no ensino secundário. De resto, isto não é novo entre nós, c V. Ex.a, Sr. Presidente, sabe muito bem que em França o reitor da Universidade de Paris ainda é o inspector geral da academia e superintende cm todos os ramos de ensino. Por consequência, o que nós precisamos é primeiro quo tudo estabelecer premissas, mas para isso é necessário ter ideas, ter um plano; é preciso proceder com ordem e método, o não trazer para aqui apenas palavras vagas sobre um pretenso plano do ensino-nacional.
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iârio da Câmara do» Deputados
O programa ministerial tem, talvez, Oste merecimento: levantar estas quês toes. Não foi o Sr. Presidente do Ministério feliz nas expressões que escolheu para denunciar a orientação do Governo sobre esta importantíssima matéria. Creio que não ofenderei a justiça se disser que .esta declaração ministerial, em relação à pasta da instrução, não é unia cousa que esteja em harmonia com o nosso tempo; parece qiie foi feita, aqui há trinta anos, por um ilustre, ministro da instrução, que também foi uni poeta distinto, o é um dos nomes que pronunciamos com o maior respeito. Era também um grande literato; era também um grande escritor, também grande político; todos o conhecemos, foi o Visconde de Almeida Garrett. . . Mas, a essa hora, Garrett chegara do estrangeiro onde esteve homisiado, por questões políticas, e mostrava-se ao par de todas as ideas e conquistas do seu tempo.
Ao passo que, agora, o seu digno con-tinuador e emulo, por falta de observação e estudo, ainda, pela boca do Sr. Álvaro de Castro, nos vem falar dum «estatuto geral de ensino» ! ...
Pois eu convido o Governo a ler o livro de Garrett, porque lá se dão novidades, que iiào vêm na declaração ministerial. (Apoiados).
Tenho dito.
O Sr. Jorije Nunes: — Si1. Presidente: è'n estava ausente de Lisboa quando se constituiu este Ministério, mas tendo lido nos jornais a forma por que ele foi organizado, confesso que não tive só desalento, mas uma tristeza profunda, como português é como republicano. (Apoiados).
Não é, Sr. Presidente, porque eu veja no seu programa uma obra incaracterís-tica, como incaracterístico é esto Governo, não; é porque entendo que naqueles lugares é preciso ser coerente e não há coerência nenhuma nos homens que ali estuo. (Apoiados).
Se quisesse empregar uma frase pitoresca, diria que se não trata de itin Governo, mas de um galheteiro. (Riso), em que o azeite do Sr. Álvaro de Castro só mistura com o vinagre do Sr. Júlio Martins e que, por mais que se agite, nunca se combinarão.
Então neste momento pregunto a quem ocupa aqueles lugares, se estão realmente
no Poder os homens representando os princípios, de harmonia com as afirmações íeitas todos os dias na imprensa o no Parlamento.
O Sr. Afonso de Macedo: — Também V. Ex.!l já foi Ministro com o Sr. Júlio Martins.
O Orador:—Mas, quando o Sr. Júlio Martins foi meu colega no Ministério não. era o mesmo de hoje.
(J vSr. Afonso de Macedo: — O Sr. Júlio
Martins foi sempre o mesmo. (Apoiados no centro).
O Orador : — Estou na firme disposição de continuar o meu discurso, respondendo aos apartes, emquauto forem correctos e lógicos, mas, se não forem correctos, não consentirei a ninguém que me interrompa.
Sr. Presidente: O Sr. Álvaro de Castro, quando abandonou o Partido Democrático, reclamou-se de conservador, como a essência pura do conservnntísmo português. S. Ex.a. que é de um a incoerência contínua, é que está como político numa contradição permanente, no mesmo dia passou a declarar ao País que não era conservador, tendo-se já unia vez reclamado de conservador do Norte ao Sul. Porem, S. Ex.a, para ser coerente dentro da incoerência, no dia seguinte a alcunhar-se de conservador já rectificava as suas palavras no Parlamento podando, sendo conservador, aliar-se a. extremistas.
Apartes.
Não tenho receio dos radicalismbs dos extremistas, porquanto tenho sido mais radical que muitos extremistas que estão no Poder ê que de reaccionários têm dado exemplos a todas as horas.
Estou a recear dós extremistas do Ministério; não do seu radicalismo, inas do seu reaccioriárisnio.
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Seaêão de 23 de Novembro d* 1020,
l Então S. Ex.as não sabem que, ligando-se a extremistas, deixam de ser conserva dores V
•S. Ex/ls, não tendo maioria na Câmara, fatalmente não podiam manter as suas afirmações por mais de 24-horas e por isso hão-de desmontir-so a todo o momento.
S. Ex.as hão-de a estas horas estar ar. rcpendidos de terem entrado na aventura.
K com mágoa profunda quo eu vejo naquele Governo o Sr. JDoiningos Pereira, porque os laços de estima recíproca que nos ligam não se quebram facilmente.
Esse homem, por quem eu tenho uma consideração e um respeito sem limites, apreciando muito a sua ponderação, bom senso e tato político, se eu- pudesse — por minha honra o declaro — não o manteria no Governo nem cinco minutos.
Por inveja? Por vaidade V
Não; mas pelo conceito político em quo o tenho, que é nada, sendo muito, comparado com o conceito pessoal cm que perante mim está colocado.
Não quero com isto dizer que não sejam homens do bem os outros indivíduos quo compõem o Ministério; mas há homens dos quais o destino político me é absolutamente indiferente e outros há que, não sendo meus correligionários, são meus amigos pessoais e eu acompanho-os dia a dia na sua trajectória política.
Domingos Pereira, por uma errada visão política, não medindo o alcanço do seu acto e da sua atitude, acompanhou o Sr. Álvaro de Castro, e acompanhou-o para formar aquele Governo incaracte-rístico, que não sabemos se é extremista du conservador.
Temos de estabelecer um dilema, Sr. Presidente.
Ou o vSr. Álvaro de Castro contava com alguma cousa superior ao Poder Legislativo ou então não teria entrado nesta aventura.
Generosos somos nós ein conservarmos este Governo de pé nesta altura da sessão, quando nos sobejam razoes para o derrubarmos, pelo perigo quo Cio representa.
O Sr. Afonso de Macedo (interrompendo) : —Bem perigoso foi para a República o-;") de Dezembro, o eu nunca vi Y. Ex.a tara receoso drsse perigo como agora.
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O Orador: — O 5 de Dezembro faz-me lembrar o papão que alguns republicanos invocam sempre que querem tocar no republicanismo dos outros.
Mas eu pregunto se no Governo não há nenhum dezembrista.
Trocam-se apartes.
O Orador: — Sr. Presidente: eu não fui ainda revolucionário, mas desde quo mo conheço, pela palavra ou pela pena, eu tenho sempre feito as mais veementes demonstrações o afirmações de fé republicana, o não consinto por isso que alguns, pelo facto de terem pegado numa espingarda' ou numa bomba, aleguem que só eles são republicanos.
No emtanto, o facto do ter sido monárquico, de tor servido o dezembrismo, não é para mim mancha alguma, como não é a escopeta que redime esses homens, mas sim os seus actos e as suas virtudes. (Apoiados).
Eu, que sou dos primeiros da Câmara, porque desdp que há Câmaras republicanas aqui ocupo um lugar, tive ocasião de ver quem se senta numa daquelas cadeiras fazia parte da maioria do Sr. Sidó-nio Pais.
Bateu-se — dizem — - defendendo a República. Muito bem, o presto-lhe por isso a minha homenagem, ^uas não foi esse facto que o redimiu. Trocam-se vários apartes. Sussuro. O Orador: — Até agradeço estes protestos, porque basta considerar que é um partido inteiro, com marechais e soldados, contra mim, para que me dêem descanso, para prosseguir.
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se, e então se saberá, ern todos os campos, quem se deixou guiar pelas ideas ou pelo interesse. (Apoiados).
Nesse dia ó que a todos se fará justiça.
Já pertenci a quatro Ministérios e nào conto o quinto porque nina manifestarão de bons republicanos entendeu pôr bem desalojar-nos da Junta do Crédito Público. . .
Sussurro.
O Orador : — Mas, Sr. Presidente, quem já fez parte de quatro Ministérios já sabe também o que ó a escudela estendida e a isenção do político que pede cousas. Quando não é atendido, surge logo a afirmação de que o Governo é contrário aos interesses da Nação; se o servem, não será um soldado da legião que defende o Governo, mas, pelo menos, é uma das boas criaturas que, consultadas, sempre dizem: «O Governo não é de satisfazer, mas, em todo o caso, não é dos piores. . .». E ó, também, porque tenho esta prática, porque conheço os homens como os meus dedos, quando ouço os rouxinóis políticos pregando ó elixir do ressurgimento das finanças; da agricultura e/ até da marinha, cujo Ministro nos promete agora que vai assediar os fogueiros dos cruzadores adquiridos em Inglaterra, para apressar a sua marcha para Lisboa, quási me suponho em fronte do uma gaiola de canários. ..
Sr. Presidente: devo fazer uma declaração para se não estabelecer unia polémica escusada, atribuindo-me qualidades que neste momento não utilizo. Sou, é certo, sub-leader do Partido Liberal; ausentei-me das Câmaras durante algum tempo, passando umas horas numa distracção lícita como seja enifim. uma vida de campo, de oito dias, que me reconfortou, que rno fez muito bem. Voltando aos trabalhos parlamentares estou a analisar a constituição do actual Governo, não faiando em nome do meu Partido, mas, em meu nome pessoa], e como estou falando simplesmente em meu nome pessoal, farei referência s aos acontecimentos e factos, apreciando à luz da minha modesta inteligência e segundo o meu critério aquilo que anda neste momento no pensamento de todos que é a constituição daquele Govôrno, nas suas causas e efeitos.
Diário da Câmara dos Deputado»
• Não podia deixar de pedir a palavra porque nesta Câmara ninguém pode b( r insensível, indiferente, a um fenómeno desta natureza.
Vejo-os ali casadiuhos como pombos e poderia até com um dedo apontar o azeile, o vinagre, o vinagre, o azeite até completar o galheteiro, mas, não o faço; apenas lamento, e lamento então como português, como disso há pouco, antes mesmo de republicano, que esta aventura não pode durar, e não podo durar em virtude das afirmações feitas por aqueles homens fora o dentro do Parlamento.
Eu compreendia que o Sr. Álvaro de Castro, Presidente do Ministério integrado no pensamento do Sr. Dr. Júlio Martins, fizesse um acto de contrição, pusesse de parte o seu programa e então extremista puro, franco, declarado, tentasse uma experiência no nosso País e o Sr. Júlio Martins, que nada queria com as forças vivas no seu programa já qucre tudo, i e já quere tudo com esta cousa mirabo-. : lante, fantástica, duma série de rae"didas , financeiras que são certamente o pasmo de todos esses homens que lá fora, tais como ííitti, Lloyd George, ele., andam às arauhub para. arranjar dinheiro? nlmima cousa para o erário público.
^O que vemos no programa do Sr. Ministro das Finanças?
Reconhece a necessidade de medidas do alto alcanço financeiro, " apresenta aqui umas cousas sediças, sabidas por toda a-gente que lê um jornal, isto é, nenhuma outra cousa que não tenha sido já esboçada por outros Ministros a quem S. Ex.a vibrou duros golpes proclamando-se redentor, uma inteligência lúcida, uma alta competência. Reconhece-se, porém, a breve trecho, entrando no programa do Ministério das Finanças, que aquilo que S. Ex.a advogava não ó para o seu País.
Mas quem tiver a mais elementar e reduzida noção das suas rcsponsabilidades, ao ocupar aquelas cadeiras de D. JoSo V e que já foram ocupadas por Afonso Costa o outros, limita-se a assinar bilhetes do Tesouro em trabalhos dcjongletir, afim de evitar o rombo da nau do Estado.
. Todos nós sabemos que é preciso aumentar as receitas, mas o que é necessário é o modvs faciendi.
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espécie de harmonium reduzido à expressão mais simples.
Aqui tem V. Ex.a a grande obra redentora que o País aguardava, com sobressalto, do Sr. Ministro das Finanças.
Se o País e a República não perigassem, eu desejaria que o Governo ali estivesse muito tempo para se estatelar estrondosamente no meio da gargalhada geral!
Desde que o Sr. Presidente do Ministério fez a amande honorable de que não tinha feito um repto ao Parlamento, que desejava a sua eficaz fiscalização eu vejo que S. Ex.a já está arrependido de se ter sentado naquelas cadeiras.
O Sr. Orlando Marcai (em aparte):—^"Ê-le já lho confessou?
O Orador: — Não; mas leio-lho no rosto!
O Sr. Orlando Marcai:—V. Ex.!l 6 um psicólogo. ..
O Orador: — Não tenha dúvidas.
Risos.
Eu não sou um porta-voz de um partido que deseja o Poder, pois não tenho ambições políticas.
Não é necessário condenar o Governo, porque ele nas poucas palavras que tem proferido fez a sua condenação.
De duas, uma; ou o Sr. Presidente do Ministério quere governar com o Parlamento ou quere a ditadura; ditadura que nem o Parlamento nem a Nação consentem a ninguém!
No Governo temos os extremistas mascarados e temos os conservadores mascarados. Temos duas máscaras no Ministério. Eu cá eston para a luta neste campo, e V. Ex.íl, sr. Afonso de Macedo, no campo da batalha.
Risos.
Vários apartes.
O Orador : — E extremamente fácil ser portador duma arma.
O Sr. Afonso de Macedo: — V. Ex.a nem disso é testemunha. Vários apartes.
O Orador: - - Também não me aproveitei. Variou
Uma voz:—Mas V. Ex.* já foi Ministro várias vezes.
O Orador: — Sr. Presidente, eu estou analisando os actos do Governo. Já vimos os actos do Sr. Ministro das Finanças. Os actos do Sr. Ministro da Marinha limitam-se a apreciar a vinda dos cruza-dores...
Uma voz:—E melhor do que o arroz que nunca chegou.
O Orador: - - Essa questão do arroz pode ainda um dia trazer algumas explicações a esta Câmara.
O Sr. Francisco Cruz: — E então há-de fazer-se a história de muita pessoa. (Apoiados). \
O Orador: — Nessa ocasião eu pregun-tarei por essa famosa comissão de inquérito ao Ministério dos Abastecimentos, se ela tem cumprido o seu dever, só alguma cousa tem recebido o o que tem produzido. (Apoiados).
Então ver-se há.que o arroz não produz uma canja substancial, mas sim uma canja de restaurant barato.
Eu estou aqui a analisar a obra do Governo, e antecipadamente lho faria, emfim. o sacrifício dos meus aplausos e do meu voto, se ao menos tivesse a pequena idea de que não se desmentindo aquelos homens, eles alguma cousa de proveitoso, desmentindo-nos, fariam para o País.
O Sr. Pais Rovisco:
vida.
-Não tenha dú-
O Orador: — Mas porque não tenho dúvida sobre isso, é que eu, concluindo por aqui as minhas considerações, faço os mais ardentes e sinceros votos para que o Governo, som prejuízo de maior, abandone o mais rapidamente possível as cadeiras do Poder.
Tenho dito.
Muito bem, muito bem. O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir revistas as notas taquigráficas que lhe foram
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Diário da Câmara, dos Deputados
O Sr. Afonso de Macedo:—Sr. Presidente : não tinha idea absolutamente nenhuma de entrar no debato político quo está travado nesta Câmara em virtude da apresentação 4o Governo. O Sr. Jorge Nunes fez o favor de me levar a inscrever-me no debate, visto que ai g1 um a cousa disse que me impõe o dever de sacudir energicamente.
É o que vou fazer com aquela energia que eu sei pôr sempre nos momentos em que a República periga, e com aquela pouca energia que o Sr. Jorge Nunes sabe ter em certos momentos. .
Apoiados prolongados.
O Sr. Jorge Nunes disse que o Sr. Cunha Leal foi uma das criaturas sidouistas.
; Isso é absolutamente inexacto! (Apoiados}.
Aparte do Sr. Jorge Nunes.
O Orador (continuando}:—O Sr. Jorge Nunes disse que o Sr. Cunha Leal tinha estado dentro da maioria na Câmara si-doiiista.
E contra isto que eu protesto energicamente. (Apoiados).
O Sr. Cunha Leal esteve na Câmara sidonista pugnando sempre por aqueles que estavam nos cárceres do dezeuibris-mo. O Sr. Cunha Leal era a alma de republicano que defendia na Câmara todos os republicanos sinceros. Nessa, hora o Sr. Jorge Nunes não aparecia a defendê-los.
Isto revolta profundamente.
O Sr. Jorge Nunes (interrompendo): — £ V. I3x.a dá-me licença para lôr à Câmara um trecho do discurso do actual Ministro das Finanças na Câmara sidonista?
O Sr. .Deputado lê um trecho onde se elogia o Presidente Sidónio Pais.
De modo que o actual Ministro das Finanças, nesse momento, já combatia, não o Sr. Sidónio Pais, mas o resnl ante da sua obra. E agora pregunío a V. Ex.a se anteriormente a esta data havia minoria e se não havia uma Câmara organizada no Governo Civil.
O Orador: — Eu quero lembrar apenas o seguinte:
Na revolução de 5 de Dezembro, o capitão Cunha Leal; o grande republicano Cunha Leal, batia^se em França, contra a vonta.de de vários grupos políticos da
nossa terra, para salvar a honra da Pá tria e engrandecer a República.
O Sr. País Rovisco (em àpqrte): — Em-quanto O Sr. Jorge Nunes assinava aquela circular que nós conhecemos.
O Orador: — Creia V. Ex.:l que me admirou profundamente, que o Sr. Jorge Nunes trouxesse a esta Câmara qualquer cousa que se relacione com o dezuinbris-mo. S. Ex.a esqueceu-se das cousas principais; esqueceu se de que o dezenibrismò nasceu absolutamente de uma propaganda, a que foi estranho o Partido Popular, então Partido Evolucionista, e o Partido Democrático, porque nessa altura entravam para os quartéis papelinhos dizendo aos soldados que não fossem para o Matadouro, emquanto nós fazíamos a propaganda da guerra, para salvar a Pátria.
Essa revolução, gerou-se em antros de podridão e de ignomínia, e não posso admitir que depois do uma tirania destas, aparecesse um manifesto para a história do grande morto, pe'dindo dinheiro para Uma estátua, assinado polo Sr. Jorge Nunes.
Pois é esta individualidade que se levanta agora, para declarar quo o grande republicano Cunha Leal, é sidonista.
Sr. Presidente: antes de se proferirem certas palavras, era m.ujto preferível que se medissem.
O Sr. Jorge Nunes, por quçnn tenho pessoalmente a mais alta consideração, começou por dizer que estava fora de Lisboa, e que, quando teve conhecimento, de qu
S. Ex.a veio dizer-nos com aqu.ele ar gracil o risonho, que todos lh.P conhecemos, o seguinte: «Ao ter conhecimento da constituição do actual Governo, como republicano, enchi-me de tristeza».
Acredito Sr. Presidente!
S. Ex.a encheu-se de tristeza por ... por ver o Sr. Álvaro de Castro na presidência do Ministério. Encheu-se de tristeza por ver o Sr. Cunha Leal na pasta das Finanças.
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Se»«ão de 23 de Novembro de 1920
O Orador : — S. Ex.a Deão se encheu de l tristeza por ver a situação dezembrista.
Mas agora sim, porque vê ali os dois elementos que o combateram. (Apoiados).
O republicanismo do Sr. Álvaro de Castro não lhe merece confiança.
O Sr. Hermano de Medeiros: — Não ó isso, não é isso.
O Orador: — .Estou aqui a falar muito claramente. Sinto não ter por vezes, aquelas rajadas de oratória que vem das universidades, mas tenho a sinceridade da minha alma, que é tanto de respeitar como a carta de bacharel. (Apoiados).
O Sr. Jorge Nunes veio lançar o repto. Aceito-o; e agora tem de me ouvir. Há--de ouvir, e hci-de acabar por lhe demonstrar que S. Ex.a, que se encheu rle tristeza pela constituição deste Ministério, não se encheu do tristeza, e poderia até ter-se enchido doutra cousa, com a constituição do Ministério dezembrista.
ó que V. Ex.a Sr. Álvaro de
Porque Castro . .
O Sr. Presidente : — Advirto a V. Ex.a de que é a hora de encerrar a sessão.
O Orador: — Termino já, e pedirei a V. Ex.:i me reserve a palavra para amanhã.
Porque é que V. Ex.a Sr. Álvaro de Castro, que é uma grande alma, quis salvar a República, com a sua nobreza de republicano, nas alturas em que muito miserável fugira?
Porque é que essa alma repiiblicaua de Cunha Leal, esse peito palpitante de re-
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pnblicanismo foi a Santarém ver se, por acaso mesmo que morresse a República, ôle ficava ligado à história pátria duma maneira levantada?
Porque é que o Sr. Júlio Martins, soldado, foi a Chaves para sebatõr pela República, e evitar que ela se perdesse, e fazer com que o Sr. Jorge Nunes mais uma vez fosse Ministro? (Apoiados).
Devo agora agradecer as palavras do Sr. Jorge Nunes, que me deram ensejo de dizor estas cousas, e ao qual me ligara laços de amizade pessoal.
Reservo-me para continuar amanhã.
Vozes: —Muito bem.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo autor, guando restituir, revistas, as notas taquiyráficas que lhe foram enviadas
O Sr. Presidente: — Está encerrada a sessão.
Ordem do dia a mesma do hoje. Eram 18 horas e 10 minutos.
Documentos enviados para a Mesa durante a sessão
Requerimento
Requeiro que, pelo Ministério da Guerra me seja fornecida com urgência, cópia da sindicância aos actos de Joaquim de Carvalho Moreira, médico em Castelo de Paiva, ordenada pelo Ex."'° Ministro do Interior, em Abril de 1919 e realizada pelo Dr. Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro, sindicância que pelo Ministério do [nterior foi enviada ao da Guerra em Junho de 1919, com o ofício n.°344, L.°69. O Deputado, João Salema.
Expeça-se.