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REPÚBLICA

PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSO

EM II DE JANEIRO DE 1921

Presidência do Ex.mo Sr, Abílio Correia da SilYa Marcai

fialtasar de Almeida Teixeira

Secretários os Ex.mos Srs,

António Marques das Neves Mantas

Sumário.—Abre a sessão com a presença de 34 Senhores Deputados. É lida a acta, que se apro-.va1 quando se verifica haver número regimental. Dá-se conta do expediente.

Antes da ordem do dia.— O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis} tratei das condições precárias em matéria de vencimentos dos funcionários judiciais e do cumprimento da lei de indemnizações devidas por efeito da revolução monárquica. Manda para a Mesa um projecto de lei. Responde e Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal). — O Sr. Eduardo de Sousa trata de uma nota oficiosa do Ministério do Comércio, desejando ouvir a esse respeito o respectivo Ministro. Responde o Sr. Ministro das Finanças. Tornam a usar da palavra os Srs. Eduardo de Sousa e Ministro das finanças. — O Sr. Viriato da Fonseca trata da crise económica do arquipélago de Cabo Verde, protestando centra a falta de providências eficazes por parte dos poderes públicos. — O Sr. Campos Melo mostra a necessidade de se discutir determinado parecer.

É requerido pelo Sr. Barbosa de Magalhães que na sessão seguinte, antes da ordem, se discuta o parecer referente aos quadros administrativos. O requerimento é aprovado.

Ordem do dia. — Continua no uso da palavra sobre a questão da Agência Financial no Brasil o Sr. Ministro das Finanças, que conclui o seu discurso.

Responde o Sr. Raul Portela, depois do qual o Sr. Hermano de Medeiros requere, e é aprovado, que se considere matéria de ordem o negócio urgente em debate.

Replica o Sr. Ministro das Finanças, seguindo--se o Sr. Ferreira da Rocha, que fica com a palavra reservada.

Antes de se encerrar a sessão. — O Sr. Ministro do Comércio f Paiva Gomes) responde às considerações do Sr. Viriato da Fonseca sobre a crise de subsistências em Cabo Verde.

Encerrasse a sessão, marcando-se a imediata para o dia 17.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Projecto de lei dos Srs. Pais Rovisco e Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis}.

Abertura da sessão às 14 horas e 55 minutos.

Presentes à charlada 67 Srs. Deputados.

Srs. Deputados presentes à abertura da sessão.

Abílio Correia da Silva Marcai.

Afonso de Macedo.

Alberto Jordão Marques da Costa.

Albino Pinto da Fonseca.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio e Mala.

António Albino de Carvalho Mourão.

António Albino Marques de Azevedo..

António Augusto Tavares Ferreira.

António da Costa Godinhp do Ama ral.

António Dias.

António Francisco Pereira.

António Joaquim Granjo.

António Maria da Silva.

António Marques das Neves Mantai

António Pires de Carvalho.

Augusto Dias da Silva.

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Diário da Câmara do& Deputados

Augusto Pereira Nobre.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Bartolomeu dos Mártires Sousa. Seve-rino.

Custódio Martins de Paiva.

Domingos Cruz.

Eduardo Alfredo de Sousa

Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.

Francisco Alberto da Costa Cabral.

Francisco José de Meneses Fernandes. Costa.

Francisco José Pereira.

Francisco Piato da Cunha Leal.

Francisco de Sousa Dias.

Jaime da Cunha Coelho.

Jaime Daniel Leote do Eêgo.

João Cardoso Moniz Bacelar.

João Estêvão Águas.

João de Orneias da Silva.

Joaquim Brandão.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José António da Costa Júnior.

Jor,é Maria de Campos Melo.

José Maria de Vilhena Barbosa Magalhães.

José Mendes Nunes Loureiro.

José Monteiro.

José de Oliveira Ferreira Dinis.

José Rodrigues Braga.

Júlio do Patrocínio Martins.

Ladislau Estêvão da Silva Batalha.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.

Manuel Alegre.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel Ferreira da Rocha.

Manuel José da Silva.

Manuel José da Silva.

Mariano Martins.

Maximino Maria de Azevedo Faria.

Mem Tinoco Verdial.

Nuno Simões.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Plínio Octávio de SanfAna e Silva.

Raul Leio Portela.

Rodrigo Pimenta Massapina.

Vasco Borges. .

Ventura Malheiro Reimão.

Vergílio da Conceição Costa.

Viriato Gomes da Fonseca.

Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Entraram durante a sessão os Sr s:

Afonso de Melo Pinto Veloso. Alberto Ferreira Vi dal. Álvaro Xavier de Castro. Aníbal Lúcio de Azevedo. António Joaquim Ferreira da Fonseca. António José Pereira. António de Paiva Gomes. Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso. Augusto Rebelo Arruda. Carlos Olavo Correia de Azevedo. Custódio Maldonado de Freitas. Domingos Leite Pereira. Francisco da Cunha Rego Chaves. Helder Armando dos Santos Ribeiro. Hermano José de Medeiros. Inocôncio Joaquim Camacl" o Rodrigues. João Gonçalves.

João José da Conceição Camoesas. João Maria Santiago Gouveia Lobo Prezado.

João Pereira Bastos. Joaquim Ribeiro de Carvalho. José Domingues dos Santos. Júlio Augusto da Cruz. Liberato Damião Ribeiro Pinto. Manuel de Brito Camacho. Marcos Cirilo Lopes LeitILo. Vasco Guedes de Vasconcelos.

Não compareceram os Srs.:

Acácio António Camacho Lopes Cardoso.

Afonso Augusto da Costa.

Alberto Álvaro Dias Pereira.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Albino Vieira da Rocha.

Alexandre Barbedo Pinto de Almeida.

Alíredo Ernesto de Sá Cardoso.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

Álvaro Pereira Guedes.

Antão Fernandes de Carvalho.

António Bastos Pereira.

António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.

António Carlos Ribeiro da Silva.

António da Costa Ferreira.

António Germano Guedes Ribeiro de Carvalho.

António Joaquim Macha.do do Lago Cerqueira.

António Lobo de Aboim Inglês.

António Maria Pereira Júnior.

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António dos Santos Graça.

Augusto Pires do Valo.

Coiistâncio Arnaldo de Carvalho.

Uiogo Pacheco de Am o rim.

Domingos Vítor Cordeiro Rosado.

Estêvão da Cunha Pimentol.

Francisco Coelho do Amaral Kois.

Francisco Cotrim da Silva Garcês.

Francisco dá Cruz.

Francisco 'Gonçalves Velhinho Correia.

Francisco José Fernandes" Costa.

Francisco José Martins Morgado.

Francisco Manuel Couceiro da Costa.

Henrique Ferreira de Oliveira Brás.

Henrique Vieira de Vasconcelos.

Jacinto de Freitas.

Jaime de Andrade Vilares.

Jaime Júlio de Sousa.

João José Luís Damas.

João Luís Ricardo.

João Ribeiro Gomes.

João Salema.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

Jo«1o Xavier Camarate Campos.

Joaquim Aires Lopes de Carvalho.

Joaquim José de Oliveira.

José Baibosa.

José Garcia da Costa.

José Grogório de Almeida.

José Mendes Ribeiro Norton de Matos.

Júlio César do Andrade Freire.

Júlio Gomes dos Santos Júnior.

Leonardo José Coimbra.

Lino Pinto Gonçalves Marinha.

Luís de Orneias Nóbrega Quintal.

Manuel José Fernandes Costa.

Miguel Augusto Alves Ferreira.

Orlando Alberto Marcai.

Pedro Gois Pita.

Raul António Tamagnini do Miranda Barbosa.

Tomás de Sousa Rosa.

Vitorino Henriquos Godinho.

Xavier da Silva.

Pelas 14 horas e 40 minutos procedeu-se à chamada, Pausa.

O Sr. Presidente: — Estão presentes 34 Srs. Deputados. Está aberta a sessão. •

Eram 14 horas e 65 minutos.

Leu-se a acta e foi lido o seguinte Expediente

Pedidos de licença

Carta do Sr. Ferreira Dinis, pedindo em nome do Sr. Pedro Gois Pita, licença de quinze dias.

Para a Secretaria.

Concedido.

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Telegramas

Da Câmara Municipal de Cezimbra, solicitando imediata discussão e aprovação .do projecto de lei do Sr. Maldonado de Freitas, que concede aos funcionários municipais iguais subvenções às dos funcio-, nários do Estado.

Para a Secretaria.

Dos oficiais de justiça das comarcas de Armamar, Coimbra e Penela, solicitando a urgente aprovação do parecer n.° 617.

Para a Secretaria.

Dos funcionários administrativos- dos concelhos de Vila Pouca de Aguiar, Lagos, Freixo de Espada à Cinta, Vimioso, Vila Real de Santo António, Mesão Frio, Aljesur, Barrancos, Aveiro, Almodóvar, Sabrosa, Alcácer do Sal, Oliveira do Bairro, Lourinhã, S. Brás de Alportel, Faro, Odemira, Arruda, Beja, Vila do Bispo, Sever, Sines, Cezimbra, Lisboa, S. Tiago do Cacem, Arouca, Castro Verde, Feira, Ovar, Azambuja, Moncorvo,-Oeiras, Aná-dia, Lousa, pedindo rápida aprovação do projecto de lei do Sr. Maldonado de Freitas, concedendo aos funcionários municipais, subvenções iguais às dos funcionários do Estado.

Para a Secretaria.

Ajudantes escrivão comarca Penafiel pedem a V. Ex.a os bons auxílios no sentido de serem atendidas suas reclamações, equiparando-os aos seus colegas Porto e Lisboa. — Urbano Barreto, escrivão, ajudante.

Para a Secretaria.

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Diário da Câmara dos Deputados

tido seja ordenado imediato pagamento indemnizações cujos processos estejam julgados e sentenças em poder comissão central respectiva. — Barros Pires, Gabriel Pereira, Alfredo Vaz. Para a Secretaria.

O Sr. Presidente: — Vai entrar-se nos trabalhos antes da ordem do dia.

Antes da ordem do dia

O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis): — Chamo a atenção do Sr. Ministro das Finanças, visto que o assunto diz respeito à pasta de S. Ex.a

Tenho em meu poder várias reclamações das vítimas do movimento monárquico no Norte.

Os processos das indemnizações já estão concluídos, mas até hoje não foi dado provimento ao recurso, e os clamores são gerais a esse respeito no Norte. Peço s, V. Ex.a providências neste sentido.

Aproveito estar no uso da palavra par^ mandar para a Mesa um projecto que vai também assinado pelo meu colega Pais Rovisco e que diz respeito à magistratura.

A Magistratura Judicial tem-se portado por uma forma digna de louvor na crise que temos atravessado, quando outros funcionários do Estado têm reclamado, porventura com justiça, mas com uma energia que merecia castigo. (Apoiados do Sr. Eduardo de Sousa}.

Deus nos livre que a amargura entre nas funções da justiça.

Na sessão passada foi votada uma proposta, convertida na lei 1:001, em que a magistratura é vexada.

Quando foi das subvenções diferenciais, o ministro de então, o Sr. Inocêncio Camacho, concordou com o que se propunha, mas nada fez.

Um desses documentos é do meu conhecimento, e me permite pôr em confronto os ordenados percebidos tanto pelo delegado do Procurador da Republica, como pelo juiz, com o de outros funcionários de categoria inferior. Assim, nós vemos que um delegado do Procurador da República, de l.a, 2.a ou 3.a classe, recebe vencimentos inferiores ao de um canteiro, ao chefe da cozinha e da lavandaria d D Hospital da Universidade de Coimbra, e aos inspectores de círculos escolares, para

os quais se exigem habilitações insufícien-tíssimas.

O Sr. Alves dos Santos (interrompendo):— Quando são nomeados por um simples despacho ministerial.

O Orador:—Decerto V. Ex.a não ignora que até há pouco tempo a única habilitação para inspector era ter sido professor de instrução primária durante cinco anos de serviço, e que o .vencimento é de 295$00, ao passo que um delegado de l.a classe percebe 148$00.

Sr. Presidente, todos os países procuram criar à sua magistratura uma situação de nobreza e isenção, menos em Portugal, onde se tem feito o contrário. O Parlamento apreciará o projecto que mando para a Mesa, e tenho pena de não ver presente o Sr. Ministre da Justiça, para lhe dizer que, S. Ex.a tem a obrigação moral de olhar para os seus subordinados, e de seguir o mei; projecto, a fim de que as comissões respectivas se pronunciem urgentemente, para dar rápida solução ao caso.

O projecto não está completo, e as simples palavras de que o fiz acompanhar não bastam para a sua justificação, mas reservo-me para o fazer na ocasião em que ele entrar em discussão.

Sr. Presidente, tive apenas a preocupação de fazer trabalho útil. & Consegui-lo hei por completo? Não o posso afirmar.

Contudo, devo informar que estou disposto a aceitar todos os alvitres no sentido de que o projecto seja melhorado, não trazendo grande aumento de despesa, porque tanto eu como o meu querido camarada Pais Rovisco tivemos a preocupação de criar para o Estado as receitas precisas para que o aumerío seja insignificante. Compete, pois, à Comissão de Finanças averiguar da economia do projecto, e à Câmara ponderar até que ponto se poderá fazer justiça à magistratura, sem grande encargo parado Estado.

Tenho dito.

O orador não reviu.

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quicas, no Norte. Tomá-la hei em consideração e averiguarei o que há de justiça nessas reclamações.

Transmitirei, ao Sr. Ministro da Justiça as considerações de S. Ex.a no sentido de que seja melhorada rapidamente a situação da magistratura.

Sei que a sua situação é precária, e as palavras de S. Ex.a representam apenas para a magistratura judicial uma questão de reparação e de justiça.

Sr. Presidente, este Governo está disposto a aceitar reclamações quando feitas dentro da ordem e da lei, e se da parte delas houver justiça, nenhuma oposição a elas fará. Porém, como ó um assunto que diz respeito à pasta da Justiça, transmitirei ao seu titular as considerações de S. Ex.a

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Eduardo de Sousa: — Tinha-me eu inscrito ontem, antes da ordem do dia, para quando estivesse presente o Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior, porquanto desejava tratar com S. Ex.a de certos factos que parecem de perseguição à imprensa. Como S. Ex.a não está presente, eu peço a V. Ex.a, Sr. Presidente, para manter essa inscrição do meu nome na lista respectiva, para quando S. Ex.a se dignar comparecer nesta Câmara.

No entanto, já que estou com a palavra, permita V. Ex.a, embora não esteja presente o Sr. Ministro do Comércio, que eu chame a atenção do Sr. Ministro das Finanças para as considerações que vou fazer, rogando-lhe a fineza de aos comunicar àquele seu ilustre colega no Governo.

Sr. Presidente, no Primeiro de Janeiro, do Porto, de 24 do mês passado, e que tenho aqui presente, deparei com surpresa com uma nota oficiosa que, aliás, também vi publicada na imprensa de Lisboa, e na qual se explica que, se o Sr. Ministro do Comércio negara certos documentos à Comissão de Inquérito dos Transportes Marítimos, fora porque entendia que esse inquérito não era dos Transportes Marítimos, mas aos actos do Sr. Estêvão Pimentel, que o requeria.

Disse eu, Sr. Presidente, que vi com surpresa a publicação desta nota oficiosa

do Ministério do Comércio, porquanto tinha sido declarado aqui, nesta casa do Parlamento, pelo antecessor do Sr. António da Fonseca, o Sr. Velhinho Correia, que a sindicância aos actos do Sr. Estêvão Pimentel, e por este requerida, a tornaria extensiva aos actos do Conselho de Administração da farinha Mercante Nacional.

Eu, Sr. Presidente, não tenho de apre-ciarj nem quero neste momento, os motivos que levaram o Sr. Estêvão Pimentel a requerer essa sindicância; apenas quero rememorar o estranho facto, revelado aqui pelo Sr. Velhinho .Correia, quando Ministro do Comércio, de ter encontrado grandes dificuldades para encontrar um juiz idóneo para proceder a essa sindicância depois que ele determinou que ela sé tornasse extensiva aos serviços dos Transportes Marítimos, devendo eu ainda acrescentar que tal declaração serviu para que em alguns jornais se dissesse que tãt) estranho facto bem denotava que se tratava de fazer uma boycottage a tal sindicância. Repugna-me dar crédito a tal afirmação, a que apenas me refiro a título documental.

"Conjugando, pois, estes factos, Sr. Presidente, com o que se lê na nota oficiosa a que aludo, não se compreende porque é que o actual Ministro do Comércio, Sr. Dr. António da Fonseca, se nega a enviar a essa comissão de sindicância os documentos que ela pedia, declarando que a sindicância era apenas aos actos do Sr. Estêvão Pimentel. Eealmente este facto é estranho, e de molde a ser devidamente esclarecido perante o Parlamento. Assim, pois, desejava eu que o Sr. Ministro do Comércio viesse à Câmara dizer as razões por'que publicou esta nota oficiosa.

Comunicando, portanto, o Sr. Ministro das Finanças ao seu colega do Comércio estes meus breves reparos, terá merecido o meu agradecimento.

Tenho dito.

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Diário da Câmara do& Deputados

Permito-me não levar em muito crédito a notícia do jornal, talvez porque os jornais andam sempre mal informados e dão crédito às primeiras notícias que aparecem. Isto não significa de forma nenhuma menos consideração para com aquelas honradas pessoas — os trabalhadores da imprensa— que ganham dia a dia, hora a hora, a sua vida num trabalho honesto, servindo a publicidade. Significa que pelo desejo de dar notícias, muitas vezes os jornais dão crédito às primeiras notícias infundadas que aparecem.

Repito. Transmitirei ao Sr. Ministro as suas considerações.

Não posso deixar de dizer que tenho a pleDa certeza de que são infundados os receios do Sr. Eduardo de Sousa, porque o Sr. Ministro do Comércio não é homem para lançar o manto protector sobre desmandos, ou sobre crimes. Se houver crimes ou irregularidades, o Sr. Ministre mandará averiguar acerca deles. Se houver determinações do Ministro do Interior, só por altas razões, o Sr. Ministro deixará de cumprir a não ser 'pela antecipada certeza, de que eram infundados os receios do Ministro.

Cabe-me apenas manifestar a minhf, absoluta confiança na maneira como o Sr. Ministro encaminhará o assunto sobro o qual chamou a atenção o Sr. Eduardo de Sousa, e a S. Ex.a declaro que farei sciente o Sr. Ministro do Comércio das; observações que trouxe a esta Câmara,

O orador não reviu.

O Sr. Eduardo de Sousa: — Agradeço ao Sr. Ministro das Finanças a promessa que me fez de transmitir ao seu colega do Comércio as considerações por mim há pouco expendidas.

Aproveitou S. Ex.a o ensejo para defender calorosamente esse seu colega no Governo, o qual, por sinal, de nenhum modo ataquei, porquanto me limitei a pedir que S. Ex.a viesse aqui explicar as razões que o tinham determinado à publicação da nota oficiosa a que me referi e que aqui tenho presente.

Disse eu que jornais houve que, devido à declaração do Sr. Velhmho Correia relativa à dificuldade em encontrar um juiz para a sindicância, pois que do Ministério da Justiça o informou de sucessivas recusas, tiraram dahi talvez um pouco preci-

pitadamente a ilação de que se tratava de íazer a boycottage dessa sindicância. Ora, Sr. Presidente, eu fui precisamente o primeiro a declarar também que me repugnava aceitar tal interpretação ao facto.

Eu era absolutamente incapaz de vir a esta Câmara lançar insinuações sobre quem quer que seja. Fui ainda o primeiro a afirmar que o Sr. Estêvão Pimentel, que não vejo presente, requerendo uma sindicância aos seus actos, D fizera decerto, por melindres de ordem moral que seguramente muito o devem lionrar e sobre os quais eu não tinha que fazer, nem quero fazer a mais ligeira apreciação.

A minha estranheza, e creio ter sido muito explícito neste particular, versou apenas sobre os termos da nota oficiosa e sobre a determinação de restringir-se aos actos do Sr. Estêvão Pimentel uma sindicância cujo âmbito o Sr. Velhinho Correia, quando Ministro do Comércio, entendeu dever ampliar além dos limites em que ela fora requerida pelo mesmo Sr. Estevão Pimentel. Não vejo, portanto, motivo para esse ardente calor empregado pelo Sr. Ministro das Finanças na defesa dum acto do sou colega da pasta do Comércio que eu não ataquei, mas sobre o qual, no meu legítimo direito de Deputado, me limitei a pedir esclarecimentos.

Estou certo de que o Sr. Ministro do Comércio se devidamente £,visar)o pelo Sr. Miuistro das Finanças, como a S. Ex.a pedi, não deixará de vir a osta Câmara justificar os motivos do seu procedimento neste caso e que eu espero ssrão completos e categóricos.

Tenho dito.

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Sr. Presidente: polcas palavras porque não estamos aqui evidentemente para nos zangarmos.

Ouvi as palavras do Sr. Eduardo de Sousa que muito respeito, como respeito todos os Srs. Deputados.

Não devo S. Ex.a estranhar que aproveitasse o momento, que não era para tratar duma questão, ruas duma simples pregunta, para manifestar a minha absoluta certeza de que o Sr. Ministro do Comércio tinha procedido agora, como sempre, em harmonia com os altos interesses da Pátria e da República.

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de Sousa; prestei apenas uma homenagem às -altas qualidades do Sr. Ministro do Comércio, e mais nada.

Por consequência, manifestando ao Sr. Eduardo de Sousa que não tive intuitos de dizer que S. Ex.a tivesse acusado o Sr. Ministro do Comércio, julgo poder reservar para mim o direito de prestar a homenagem que preitei e que não pode constituir uma acusação para ninguém.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Viriato da Fonseca : — Sr. Presidente: desde de ontem que me inscrevi para fazer algumas considerações perante o Sr. Ministro das Colónias.

S. Ex.a não está presente porventura devido aos seus muito afazeres, nem está" presente nenhum outro Sr. Ministro, e por isso peço a V. Ex.a, Sr. Presidente, que comunique a S. Ex.a'as minhas considerações.

De há muito que venho reclamando nesta Câmara e na imprensa medidas urgentes e acertadas para a atenuação da pavorosa crise de subsistências que avassala a nossa província de Cabo Verde.

Aqui tive ocasião de dizer que, apesar da calorosa campanha que na imprensa se tem levantado a favor dos famintos dessa colónia, recorrendo à caridade pública para diminuir a intensidade desse mal e evitar que se registassem milhares de vítimas dizimadas pela fome, isso não bastava, pois que a crise era geral e só espalhara por todo o arquipélago, devendo durar, pelo menos, um ano até as próximas colheitas que se realizam em Dezembro.

Disse também que era necessário e essencial o concurso dos poderes públicos, adoptando-se medidas enérgicas e eficazes, levadas a efeito com tenacidade, método e energia.

Os sucessivos ministros, que ultimamente têm ocupado a pasta das colónias, respondendo às minhas solicitações, prometeram cuidar do assunto, não descurando as medidas que fossem necessárias, tendo afirmado até que ordens tinham já sido dadas para o regular abastecimento de Cabo Verde, em géneros alimentícios e em transportes.

Com profunda mágoa porém, se verifica que, como consta dos jornais e das

notícias que da colónia me foram endereçadas, essas medidas não foram integralmente cumpridas, dando lugar a lacunas imperdoáveis e perigosas, que podem trazer, como terrível resultado, a morte pela fome de milhares de portugueses, em território português! .

É triste o que se passa, Sr. Presidente.

E triste fazer tal verificação e eu, na minha qualidade de Deputado eleito por essa colónia, dolorosamente protesto contra ttal e tam censurável procedimento.

E o nosso sistema de empata; é a terrível e medonha burocracia que desde os membros do Terreiro do Paço até os confins das nossas colónias as mais longínquas, faz emperrar, enervar, anestesiar as mais salutares iniciativas, os mais dedicados esforços.

E, no emtanto, emquanto a burocracia distende os nervos e se dispõe morosamente a mexer-se, lá, na ilha de S. Tiago, já baquearam na sepultura bastantes vítimas e nas outras ilhas não tardará que os cadáveres, em abundância, apareçam pelos campos, estradas e serranias daquela infeliz colónia!

,;Queni há aí que se não sinta altamente condoído, por tam grande infortúnio?

Só a burocracia, no seu atavismo crónico, do dulce far niente se não comove, se não sensibiliza. .

Eazão tinha eu, Sr. Presidente, quando em tempo escrevi num jornal um artigo que poço licença para ler à Câmara, na parte relativa.

(Leu].

«Consta também que S. Ex.a o Sr. Ministro, tomando em consideração a gravidade do assunto, determinou ou vai determinar que de Angola sejam enviado* mensalmente algumas centenas de toneladas de milho para Cabo Verde c. bem assim arroz da Guiné.

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dupla qualidade de filho da colónia e dela legítimo representante no Congresso da Eepública, a fim de que a orientação tomada por S. Ex.a o Sr. Ministro se traduza em actos concretos, rápidos e eficazes e não seja, porventura, perturbada por qualquer fornia na sua acertada execução».

Isto dizia eu, Sr. Presidente, em Março do ano passado, e razão tinha eu para então dizer o que nesse artigo expus. Como que previa o que mais tarde havia de acontecer.

Sendo estranho e condenável o que se está passando com a crise de Cabo Verde, apelo para o Governo, para esta Câmara e principalmente para o Sr. Ministro das Colónias, para que se envidem todos os esforços, para que se empreguem todos os meios tendentes ao socorro imediato e inadiável daquela pobre gente. (Apoiados).

Espero igualmente, Sr. Presidente, que o Sr. Ministro das Colónias empregue toda a energia, toda a sanção penal para aqueles que, por.inércia, maldade ou con--denável egoísmo, não cumpram os deveres oficiais e os de humanidade, tal como aconteceu há pouco com o pessoal da máquina de um dos vapores da Empresa dos Transportes Marítimos do Estado, que insólita e brutalmente só negou a ir. com o seu vapor, às .diferentes ilhas, fazer uma necessária e urgente distribuição de mantimentos, apesar das ordens quo tinha recebido nesse sentido.

Para Gstes, pois, eu peço o maior rigor da lei.

Certo de que o Sr. Ministro das Colónias^ pelo conhecimento que tenho do seu altruísmo e patriotismo, não deixará de, envidar todos os meios ao seu alcance, no sentido de que aquela aflitiva situação seja melhorada, e se procuro debelar ou pelo menos atenuar a intensidade da crise, termino por aqui as minhas considerações sobre tam grave e momentoso assunto, aproveitando a ocasião, como Deputado eleito pela província de Cabo Verde, e dela natural, para apresentar o meu caloroso e profundo reconhecimento a todos os que nesta triste emergência, a têm procurado socorrer, salientando a imprensa do meu país e muito em especial o Diário de Noticias, que pela sua nobre e caridosa ati-

tude, tem dedicado toda a sua boa vontade em prover de remédio a essa calamidade que se alastra por uma colónia portuguesa e onde milhares de portugueses (quanto sofre o meu coração ao ter de pronunciar estas palavras!) estão ameaçados de morrer brutal e miseravelmente, dizimados pela fome inclemente. Tenho dito.

Vozes:—Muito bem.

O Sr. Campos Melo:—P'3di a palavra para pedir a V. Ex.% Sr. Presidente, o obséquio de me dizer s 3 o parecer u.° 617 já se acha impresso e distribuído.

O Sr. Presidente : — <_ à='à' que='que' a='a' refere='refere' ministérios='ministérios' dos='dos' reorganização='reorganização' é='é' ex.a='ex.a' serviços='serviços' o='o' p='p' se='se' diz='diz' vários='vários' v.='v.' parecer='parecer' respeito='respeito' _='_'>

O Orador: — Não senhor; o parecer a que me refiro é o que diz respeito à situação dos oficiais de justiça.

Peço a V. Ex.a a fineza d<_3 que='que' com='com' de='de' trata='trata' instar='instar' uma='uma' do='do' fim='fim' classes.='classes.' mais='mais' justiça='justiça' se='se' por='por' para='para' respectiva='respectiva' das='das' ordem='ordem' parecer='parecer' rapidamente='rapidamente' a='a' prestimosas='prestimosas' praticado='praticado' dado='dado' soja='soja' em='em' o='o' p='p' acto='acto' este='este' uni='uni' comissão='comissão' favor='favor' isso='isso' possível='possível' dia='dia'>

O orador não reviu.

O Sr. Presidente : — Devia, agora discutir-se o projecto do Sr. Plínio Silva, mas não estando presente o Sr. Ministro 'da Guerra, que ontem me informou ser--Ihe absolutamente impossível comparecer à sessão antes da ordem do dia, por motivos de serviço inadiáveis, entendo que tal projecto não poderá agora entrar em discussão.

Havendo número regimental, aprovou-se a acta sem discussão, e deu-se conta do resto do expediente que, -nos termos da respectiva rubrica, necessitava de deliberação da Câmara.

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Sr. Maldonado de Freitas, relativamente aos funcionários administrativos.

Essa .discussão começou mas não foi concluída, tendo ficado com a palavra reservada o Sr. Alves dos Santos.

Desejava, por isso, que a Mesa me elucidasse sobre o motivo por que essa discussão não continua, e, no caso de ser preciso, eu requeiro a V. Ex.a que consulte a Câmara no sentido de continuar a ser discutido o referido projecto, que ó de absoluta justiça, atendendo a que vai beneficiar uma classe de funcionários que bastante merecem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente:—Na última sessão do mós de Dezembro foi realmente resolvido conceder-se a esse projecto de lei a urgência e dispensa do Regimento, e nessas circunstâncias ele entrou em discussão, tendo o Sr. Alves dos Santos ficado com a palavra reservada.

Mas como apareceram outros assuntos de maior importância na sessão de ontem, não se prosseguiu nossa discussão. No entanto eu marcarei esse projecto para ordem do dia de amanhã.

O Sr. Barbosa de Magalhães:—Peço então a V. Ex.a, Sr. Presidente, que consulte a Câmara sobre se permite que esse projecto entre em discussão amanhã, antes da ordem do dia.

O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis): — Sr. Presidente: fui eu um dos deputados que mais pugnaram para que este projecto fosse dado para discussão, e por isso sou bem insuspeito ao usar da palavra. Assim, eu direi que o •votar-se o requerimento do Sr. Barbosa de Magalhães equivale a não se votar cousa alguma, pois V. Ex.a há-de ter constatado que no espaço de tempo reservado para antes da ordem é raríssimo encontrar-se número preciso para tomar deliberações, de forma que acho mais lógico que o projecto entre .em discussão 'na ordem do dia de amanhã. -

O orador não reviu.

O Sr. Barbosa de Magalhães (sobre o modo de votar}: — Sr. Presidente: desejo simplesmente salientar que a Câmara já votou a urgência e dispensa do Regi-"

mento para esse projecto, cuja discussão já foi iniciada antes da ordem do dia. Entendo por isso que o meu requerimento só poderá ter significado de manter uma deliberação já tomada. O orador não reviu.

- Foi aprovado o requerimento do Sr. Barbosa de Magalhães.

ORDEM DO DIA

Discussão respeitante à Agência Financial

O Sr. Presidente: — Vai passar-se à ordem do dia. Continua no uso da palavra o Sr. Ministro das Finanças.

. O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Sr. Presidente e Srs. Deputados : não irei fazer uma longa recapitula-ção das generalidades que ontem bordei a propósito da questão da Agência Financial.

Procurei esboçar o quadro dentro do qual eu colocarei as afirmações do Sr. Leio Portela, para que toda ,a Câmara pudesse avaliar da sua infantilidade, para que toda a Câmara pudesse avaliar daquela ligeireza com que se abordam assuntos da natureza deste nesta casa do Parlamento. Mas não posso deixar de frisar, pelo eco e retumbância que o caso teve,. aquelas minhas afirmações fundamentais. E que se procurou fazer nesta questão uma obra de puro jesuitismo nacional; é que se procurou colocar o Ministro das Finanças diante de um dilema: ou não se defender, ou dizer cousas inconvenientes para o interesse e critério do Estado.

Vi o que dizem os jornais, aqueles jornais que são feitos, repito mais uma vez, não pelos trabalhadores da imprensa, em cujo número eu me englobo, creaturas respeitáveis que do jornalismo fazem a sua vida e a sua profissão, mas os jornais feitos pelas empresas comerciais, que tentem servir-se dessa arma sagrada que deve ser o jornalismo, para defenderem negócios tantas vezes pouco consentâneos com os interesses sagrados desta terra.

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julgava que o Governo deveria amarrar a. comissão de finanças e os leaders dos partidos a essa resolução que era fundamental.

Não pôde; pela circunstância de haver férias e por outras que me foram ponderadas, dar-se cumprimento a este meu desejo.

Não pôde mesmo o Ministro das Finanças assistir às conversações com os leaders dos partidos; o Ministro das Finanças, que não está aqui para defender os interesses de A ou de B, mas simplesmente para defender os interesses da nação, levou a sua intransigência a não procurar nem querer ter conversas com o próprio representante do seu partido, que ele convocou para ser ouvido nessa hora. E não estando presente o leader do Grupo Popular, o chefe do mesmo partido, que faz parte do Governo, eu tive o cuidado de indicar, como era de justiça, pelas suas altas qualidades e pela posição excepcional que ocupa dentro do Partido Popular, o Sr. Vasco de Vasconcelos, que eu sabia ser partidário da denúncia do contrato da Agência Financial; e procurei ainda mais não mo avistar com S. Ex.a, para que ninguém pensasse que eu pretendia de qualquer forma violentar a opinião que S. Ex.a formava a respeito da denúncia ou não denúncia do contrato do Banco Português do Brasil com a Agência Financial.

• Não ouvi S. Ex.a, não o procurei! Mas as palavras que S. Ex.a porventura proferiu diante dó Sr. Presidente do Ministério, e que eu não perguntei quais foram e que ainda hoje ignoro, são aquelas que S. Ex.a quis dizer na livre opinião que forma sobre a questão; ,não foram influenciadas por palavras minhas.

Assim procedi e assim sempre quis proceder ao .longo de toda esta questão.

Mas não contente cm querer ouvir antecipadamente a opinião da comissão de finanças, depois de realisado o acto de denúncia e antes de me vir aqui defender, eu pretendi na própria hora em que irreflectidamente e lesando os interesses do Estado e da Eepública o Sr. Leio Portela levantou aqui esta questão, eu pretendi que a comissão de finanças se pronunciasse sobre as vantagens ou inconvenientes do facto de ser abordada uma questão para a qual eu tinha de trazer

todas as misérias da vida do Estado, porque andando cousas no ar, ou entendia que para me defender tinha de dizer a verdade absoluta acerca da questão da Agência Financial.

Não me quis, porém, ouvir a comissão de finanças. Indignadamente o Sr. António Maria da Silva, com gestos de De-móstenes e indignações de osasião, não quis, como presidente da comissão de finanças, convocar a mesma comissão; e por si só, sem ouvir a comissão, porque não teve tempo de a ouvir, S. Ex.a quis para si a responsabilidade de não a convocar— achando insólito que mn ministro acusado e que precisava de se defender, e para cuja defesa tinha de pronunciar palavras que não queria proninciar, mas que entendia que homens de bem como os da comissão de finanças podiam ouvir, para depois virem à Câmara dizer que o Ministro das Finanças não poiia de facto proferir todas as palavras que era necessário proferir—achando insólito que eu quisesse ouvir a comissão de finanças sobre circunstâncias e factos que julgava necessário serem do conhecimento da mesma comissão.-

Portanto, antes da resolução tomada pelo Conselho de Ministros acerca da denúncia do contrato da Agência, Financial, antes e depois, eu quis ouvir a comissão de finanças, para me sujeitar ao^seu vere-dictum; e declaro que não considero como homens de honra aqueles que depois deste facto ousaram dizer isto, que já apareceu na imprensa: «que o ministro procedeu impensadamente dizendo aquilo que não devia dizer».

Declaro antecipadamente que aqueles que tiverem a coragem de repetir essa frase bem pouco prezam a sua própria honra, quando assim levianamente tratam a honra alheia.

E posto este facto, sem alteração de nervos e sem impulsos meridionais, eu passo a responder às considerações infantis do Sr. Leio Portela.

Tive ocasião de tomar notas do dir-curso do Sr. Leio Portela, e .:omo alguns jornais tiveram cuidado de registar alguns pontos do discurso de S. Ex.a, eu servir-me hei dos meus apontamentos e do relato desses jornais.

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Principiarei pelo relato do Século, que bem se pode considerar o órgão oficioso, não de um partido, mas de todos aqueles que me atacam!

Vamos ver o que ele diz.

Como é agradável ver tais afirmações!

O Sr. Leio Portela (interrompendo}: — j As mesmas que V. Ex.a tem feito l

O Orador:—O homem que aqui está, se não tivesse esta tribuna para se defender, seria um homem deitado ao mar por quantos canalhas existem nesta terra! . '

Isto é a defesa da minha honra e do Parlamento, a quem eu quero como a mim próprio. Mas S. Ex.a não lhe quere tanto como eu, e eu vou explicar porquê.

Porque esse amor ó o amor a um Parlamento condenado à morte.

Ora, dizia eu o seguinte: um dia houve alguém que alarmado com dois contratos ruinosos, prejudiciais aos interesses do País, o do trigo e o do carvão, eixo em torno do qual se moveu toda esta questão, houve alguém que veio aqui ao Parlamento dizer o seguinte:

«Esses contratos são nulos porque ofendem o Poder Legislativo». ,'

E disseram esses poucos que, assistidos por muitos, atacaram os contratos do trigo e do carvão, que eram esses con-•tratos que haviam de amarrar o Poder às clientelas da Rua dos Capelistas. (Muitos apoiados).

Disse-se então: aPara ,que um Contrato seja válido, é preciso que aqueles que contratam possam dispor das verbas necessárias para contratar».

Para que eu possa contratar 200.000 toneladas de carvão, ó necessário que no Orçamento haja um crédito especial expressamente aprovado pelo Parlamento ou existam as verbas necessárias para fazer esse contrato.

Não dispunha o Poder Executivo das verbas, necessárias para fazer os contratos do trigo e do carvão; exorbitou, comprometendo-se a pagar quantias para as quais não estava autorizado; exorbitou, e houve deputados que protestaram. Mas não foi o Sr. Leio Portela que saiu à estacada por sua dona defendendo esse contrato, foram os outros, os que estão da banda de cá; foram esses que sabiam muito bem que durante as férias parla-

mentares toda a onda de lama que estra-vazava lá fora, havia de ser lançada sobre os homens que tinham tido .a coragem de atacar a alta finança. (Muitos apoiados}.

Não! Não foi o Sr. Leio Portela; foram estes que defenderam a intangibili-dade dos seus direitos; e no emtanto os jornais que defendiam aqueles que atacam o Ministro das Finanças clamavam em altos brados contra o Parlamento da República, e foi preciso que. esse Ministro viesse aqui falar para que o Parlamento se mantivesse, intangível .e para que os homens dos contratos ruinosos, nãp, pegassem no Parlamento e. o atirassem à enxurrada. • <_. p='p' i='i'>

Poderemos nada ~ter; mas pelo menos temos boa memória, um pouco de confiança em nós próprios e muito,, muito amor pela verdade e pela nossa terra. E assim, aqui estaremos sempre prontos a defender o Poder Legislativo; quando V. Ex.as o quiserem fechar-, aqui encontrarão alguém para defender as suas imu-nidades. E encontram-no sem necessidade de golpes de estado, sem necessidade de outra cousa que não seja a força suficiente para se defender dos ataques de quem quer que seja que o pretenda ferir naquilo que ele tem de mais caro: a sua honra.

t Mas, paladino da intangibilidade do Poder Legislativo, em; frente de mim que tanto na-imprensa, como no próprio Parlamento, tenho sido um defensor indefec-tível dêss« Poder, não! porque eu não lhe reconheço autoridade para tanto, Sr. Leio Portela!-(Muitos-apoiados). Eu, nem ao menos defendi os contratos dos trigos e do carvão!

Mas, continuemos. Fez-se a afirmação de que nós nãp votámos.em tempos a generalização do debate sobre a questão da Agência Financial, quando tal foi proposto, creio que o ano passado, pelo Sr. . Leio Portela. Desta vez o Ministro das Finanças abandonaria o seu lugar se houvesse alguém que, apoiando-o, se opusesse à generalização do debate. (Muitos apoiados). .

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se os não mata a todos como o espanhol, não os teme, nem os receia.

Há temperamentos para tudo...

O Sr. Alves dos Santos: — Apoiado!

O Orador: — Até para dar o apoiado que V. Ex.a acaba de dar!

Mas, desta vez, eu posso assegurar que o Ministro das Finanças abandonará o seu lugar se não for aprovada a generalização do debate, porque »ò assim, como já dizia o Sr. António Granjo, os ódios de olhos chispando lume que eu. vejo em volta de mim, e cujo sinistro ranger de dentes eu pressinto, poderão manifestar-se em toda a sua plenitude.

Lá fora podem discutir com a navalha mas aqui tem de sor mais devagarinho.

Terceiro argumento e afirmação do Sr. Leio Portela. Esto argumento é digno de respeito e ponderação. É um argumento que se refere à soberania e devemos sempre respeitar a soberania.

Disse o Sr. Leio Portela que a soberania é indivisível e inalienável, e que nessas circunstâncias a Agência Financial, inalienável e indivisível, visto que é soberana, não podia passar a outras mãos que não fossem as do Estado ou de alguém que com ele estivesse em íntimas relações, verbi çjratia a Caixa Geral de Depósitos ou o Banco de Portugal.

Eu tenho sempre receio, pelo muito respeito que por elas tenho, das opiniões dos jurisconsultos. Ainda não há muito tempo levei uma verdadeira trepa, sob o ponto de vista jurídico, do Sr. Mesquita Carvalho, que é um dos nossos mais ilustres jurisconsultos — digo isto sem qualquer sombra de ironia.

Portanto, eu tenho sempre medo dos palavrões, e assim o Sr. Leio Portela, com os seus três palavrões, esmagou me na verdade. Então eu, com medo que o Sr. Eamada Curto, apesar de ser também jurisconsulto, tivesse dado também uma facada na soberania, fui ler o contrato do Banco Português do Brasil com o Estado, e vi que a tal soberania, indivisível e inalienável, não tinha sido ofendida, pois o que há no contrato, claro e simples, ó apenas a afirmação de que a uma entidade que vivia num terceiro andar, mal instalada e desconhecida de todos, uma empresa lhe fornece casa, fazendo um certo

número de despesas, mantendo pessoal de acordo com o Estado, pondo as suas agências e as suas casas ao serviço dessa mesma entidade. Não há nada ao contrato que tire à Agência Financial c seu carácter de soberania e, portanto, os outros tais atributos de inalienabilidaie e indivisibilidade, que tanto assustaram o Sr. Leio Portela.

De facto, apenas há uma troca de serviços. Não aliena, pois, o Estido a soberania da Agência; o Estado fica com a sua Agência metida dentro das paredes dum Banco fiscalizado como o Estado entende e com pessoal nomeado de acordo com o Estado.

A terceira afirmação feita pelo Sr. Leio Portela é a seguinte:

«A Agência Financial foi criada por um diploma com força de lei, e s.ó outro diploma idêntico a poderá anular».

Procurando justificação para este argumento, fico pasmado.

A Agência Financial foi criada por um acordo feito entre o Governo português e o Governo brasileiro. É um acordo que vem do tempo do Império.

Os serviços de tal agência foram regulamentados pelo Governo português, em 1889 e depois, em 1901, tendo sido ouvido sempre o Governo brasileiro. No primeiro regulamento íoram introduzidas pro-Ifundas alterações, pelo Governo brasileiro ; no segundo regulamento nenhumas alterações introduziu.

Quando o Sr. Eamada Curto fez o contrato que é da sua autoria, corno Ministro das Finanças, não se estabeleceu nenhum regulamento; não podia mesnio ser feito novo regulamento.

Tinha de se respeitar o regulamento aprovado pelo consenso dos Governos português e brasileiro. Os serviços estabelecidos pelo contrato levado a efeito pelo ex-Ministro das Finanças, Sr. Ramada Curto, tinham de ser feitos de acordo com os regulamentos em vigor. Não havia que fazer novo regulamento.

Quando se diz que a Agência funciona mal, porque não foram regulamentados os seus serviços, eu afirmo que s 3 havia que respeitar e seguir os regulamentos em vigor-

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que n?ío quiseram ouvir-me, lanço a responsabilidade da minha afirmação.

Lamento que se tenha saído para. for a dum acordo internacional e eonseqiiente-inente tenham sido praticados alguns actos que eu não deveria apreciar em público. Sou porém forçado a afastar-me dessa orientação, visto que, sendo atacado na minha honra, tive de trazê-los aqui, à Câmara.

Já hoje me dizem nos i ornais que eu deveria pôr a Agência nos seus devidos termos de funcionamento.

i Se tal fizesse, fechá-la-ia!

Se me colocasse a dentro do que é a interpretação literal dos regulamentos, a Agência não chegava a mandar 10 mil libras. Os fundos dos consulados de todo o mundo, remetidos para Portugal não vão além daquela quantia; os títulos portugueses colocados no Brasil não rendem hoje cousa nenhuma.

A quarta afirmação do Sr. Leio Portela é esta:

«Contraíu-se um empréstimo avultado; só o Poder Legislativo o podia fazer».

i Que pruridos de legalidade!

! Que confusão diabólica entre suprimentos ou simples empréstimos, que são, e foram sempre, considerados como operações de tesouraria e empréstimos com consignação de rendimentos!

£ Quando o Sr. Afonso Costa contraiu com o Banco de Inglaterra o empréstimo ou suprimento do 2 milhões de libras, trouxe essa operação à consideração da Câmara ?

O Sr. António Maria da Silva: — \ Tinha a lei n.° 373! Pausa.

O Orador:— j Isso.. . não tem resposta! O Sr. Mariano Martins:—Porquê?!

O Orador: — Esse «porquê?» ficava talvez melhor na boca do Sr. António Maria da Silva. Mas eu satisfaço a curiosidade. Não tem resposta porque S. Ex.as devem saber que tal operação, como a do empréstimo de 400 mil libras com o Banco de Portugal, são simples operações do Tesouro, que não têm de vir ao Parlamento. E a própria Constituição da Repú-

blica que no seu artigo 26.° autoriza esta doutrina.

De resto, os empréstimos sobre a dívida fundada só por intermédio da Junta de Crédito Público podem ser feitos.

É estranho que um antigo Ministro das Finanças venha dizer-nos que foi devido à lei n.° 373 que o Sr. Afonso Costa deixou de trazer à Câmara a operação relativa ao Banco de Inglaterra, a que há pouco aludi.

O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis): — A afirmação feita pelo Sr. António Maria da Silva não é absolutamente para estranhar, visto que ao abrigo dessa lei n.° 373 chegaram a ser autorizados exames de instrução primária.

O Orador: — Até se há-de autorizar a transportar alguns vivos para o Panteão.

Risos.

Reconhecida assim como intempestiva a interrupção feita pelo Sr. António Maria da Silva, leader de um dos partidos que apoiam o Governo, reconhecido também que não tinha razão nenhuma de ser aquele simpático auxílio que lhe deu o Sr. Mariano Martins, quando preguntou: porquê?...

O Sr. Mariano Martins:—Dizendo V. Ex.a que a interrupção do Sr. António Maria da Silva não tinha resposta, parece-me natural que eu preguntasse: porquê ?

De facto, o partido de que o Sr. António Maria da Silva é leader apoia o Governo, mas a verdade é que alguns dos Ministros o hostilizam.

Agitação.

O Orador:—Vou continuar. Nada tenho com ataques de histerismo que cada um possa ter. •

Prosseguindo na análise do discurso do Sr. Leio Portela, vou entrar na parte talvez mais substanciosa das considerações produzidas por S. Ex.a

Preguntou o Sr. Leio Portela quais seriam as razões da denúncia do contrato de 1919, e referiu-se a irregularidades.

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Eu vou ler um trecho que creio que é do cronista financeiro do Diário de Noticias que nessa época era o Sr. Emidio da Silva.

Os 24 mil contos a que se refere andam à roda de 50 milhões de libras, nias se V. Ex.a multiplica 5 por 17 e divide por 14 dá, pouco mais ou menos, 6 milhões de libras. Isto é, com o mesmo dinheiro antes se poderia comprar aproximadamente 6 milhões!

A Agência Financial' não era conhecida no Kio de Janeiro, era apenas um dos pequenos veículos do ouro do Brasil. Se S. Ex.a quiser poderá saber qual foi o ouro vindo do Brasil por intermódic doutros bancos.

V. Ex.a quere uma prova?

Na primeira semana do funcionamento da Agência publicaram-se anúncios tendenciosos que tinham por fim desviar os saques dessa agência.

Quere isto dizer que, movidos pela consciência, os bancos não aproveitaram os serviços da agência.

Seria bom que o Sr. Leio Portela averiguasse quantas transferências se fizeram sem ser por intermédio da Agência Financial.

A seguir V. Ex.a consulto Anselmo de Andrade, Salazar de Sousa • e Fernando Silva.

Antes da guerra, .o Brasil mandava para cá 5 milhões de libras e nessa épocí. havia *só uma agência,' no Kio; depois, instalaram-se nas grandes cidades do Brasil, e as transferências aumentaram, muito e em pouco a Agência Financial tomava a si o monopólio de todos os recursos feitos em ouro.

Não afirmo que não se tivessem dado irregularidades, porém, essas irregulari-dades tanto se podiam dar com um banco como com outro, mas não o afirmo sem ter dados seguros, pois não o posso fazer de ânimo leve; pois se eu tivesse a certeza eu daria o lugar condigno que podia ser uma cela da Penitenciária.

O Sr. Leio Portela teve conhecimento dum documento que positivamente foi roubado!

Quanto à especulação tanto se podia dar com um banco como com outro.

Esta cláusula é fundamentada e só tem um defeito : .é ser excessiva nente cautelosa dos interesses do Estado.

A denúncia fez-se nos ter .nos daquela circular que foi roubada!

A outra pregunta do Sr. Leio Portela fica prejudicada pelas considerações que já tive a honra de produzir.

Agora vamos à análise feita pelo Sr. Leio Portela à célebre circular.

O mínimo de um milhão e oitocentas mil libras, da remessa de ouro do Brasil, foi o que primeiro mereceu os reparos financeiros do Sr. Leio Portela.

Disse S. Ex.a que eu cometi o erro de procurar aumentos!

Não tem razão S. Ex.a dnda mesmo levando o caso para o lado jocoso.

Eu não quero mesmo, levando a questão para o lado jocoso, em que ela merece ser tratada, dizer a S Ex.a que o pôr o seu raciocínio em co idições de o levar até ao último extremo deve resultar equivalentemente ao seguinte: que convém reduzir ao mínimo, forque o máximo, o que convinha, eri reduzir a zero. ..

E fechar a Agência Financial.

O Sr. Leio Portela: — Apoiado!

O Orador: — Nesta altura intervém a voz amável do Sr. Leio Por rela. S. Ex.a disse um apoiado. Significa, parece-me, que S. Ex.a não tem receio de me acompanhar nesse meu raciocínio. Fechar a Agência Financial. Nada. Este raciocínio de adjudicar os serviços da Agência Financial pode levar aos mais profundos erros, desde que o máximo tanto se refere à Caixa Geral de Depósitos, como ao Banco de Portugal, como a qualquer outra instituição. E claro que o que é bom paru o Banco Português no estrangeiro é igualmente bom para o Banco de Portugal, ou para a Caixa Geral de Depósitos, de onde se deve concluir legitimamente que não há razão para ter uma Agência Financial.

O Sr. Leio Portela, ao qua parece, devia procurar exclusivamente isto:

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permitir lutar com outros estabelecimentos que, transferindo ouro do Brasil para Portugal, tinham vantagens mais compro-.vadas, do que as que possuía a Agência Financial.

. O que S. Ex.a deve procurar sabor é se realmente do Brasil vem mais ou menos um milhão, do que antigamente vinha pela Agência Financial.

Vinha 1.500:000 libras, mas pareee-mo que há oscilações de mais de 700:000 U-,bras,.de um ano para o outro, nas remessas da Agência Financial muito antes da guerra.

, Por consequência o número que S. Ex.a demonstrou, de 1.800:000 libras, ó elevado.

«íComo foi essa prova? <_ que='que' de='de' estado='estado' razões='razões' agência='agência' financial='financial' intermédio='intermédio' brasil='brasil' do='do' diminuiu='diminuiu' mãos='mãos' por='por' às='às' ouro='ouro' das='das' afirmar='afirmar' não='não' a='a' e='e' chegavam='chegavam' importância='importância' levar='levar' o='o' p='p' podem='podem' da='da' remessas='remessas'>

Vamos tirar a grande prova.

Como naturalmente o ouro não deixou de vir do Brasil, por intermédio de outros Bancos, o que não era transferido pela Agência Financial, porventura, iria para .outras mãos o que era desviado do Estado.

Ora aqui está a minha resposta: as 1.500:000 libras iria comprá-las à praça.

Arrepiou o Sr. Leio Portela a importância para 1.200:000 libras, o limite que ficava nesse intercâmbio ao Banco Português do Brasil.

. Um novo raciocínio do Sr. Leio Portela : os Bancos teriam de ir à praça comprar 1.200:000 libras que iriam emprestar ao Estado.

Este é o raciocínio de S. Ex.a

Declaro a S. Es.a para que as suas carnes sintam os arripios patrióticos dos grandes momentos, que não sou dos que se arrepiam com a idoa do que o contrato da Agência Financial de novo viesse a cair nas mãos do Banco Português do Brasil, mas declaro também a S. Ex.a que se um Banco português tomasse conta do caso, em circunstâncias nenhumas êsso Banco poderia comprar na praça 1.200:000 .libras, mas sim por meio dum empréstimo ou suprimento.

Comprá-las na praça é absurdo, porque teríamos de ir à praça buscar esse dinheiro o que faria baixar a divisa cambial imediatamente.

O Estado poderia comprá-las em melhores condições. Tem de se entregar nas mãos do diversos Bancos; mas ter de ir comprar na praça essas libras é inconveniente para o Estado pela baixa da divisa cambial.

Mas, repito, não reputo impossível poderem obter-se lá fora.

Reputou o Sr. Leio Portela uma veleidade marcar um limite mínimo para os tomadores de saques.

Não é preciso isso.

Em 1919, tomou um de 1:600 contos para o Banco Ultramarino de Portugal.

Ora imaginemos: se o Estado desse limite máximo a cada tomador de saques podia tomar duma vez, para o que seriam precisos 600 tomadores.

Havia um limito de 1. conto de réis. Um tal .excesso do zelo na defesa dos interesses do Estado facilmente se verificaria que era um erro, uma tal cláusula.

Não foi por ter defendido os interesses do Estado. O erro está em querer defendê-los demais.

Sobre os bilhetes do Tesouro o Sr. Leio Portela disse coisas maravilhosas.

Afirmou S. Ex.a que os bilhetes do Tesouro são pagos em escudos.

Mas vejamos: Ou as pessoas possuidoras de bilhetes têm já escudos e então .tomam-nos nos Bancos, ou não têm escudos e por isso compram-nos à custa da moeda brasileira e compram-nos em ouro.

Os escudos não se inventam, nem existe . no Brasil nenhuma fábrica de escudos, porquanto v3o longe os tempos em que, segundo disse Camilo Castelo Branco, o Brasil se fornecia de notas falsas que de Portugal iam no fundo das pipas.

Não. tendo escudos, têm de comprar escudos. São entregues em moeda brasileira para a compra de escudos, e essa moeda brasileira são libras sobre Londres.

O Sr. Leio Portela, querendo descobrir cousas maravilhosas, considera urn perigo a transferência de dinheiro do Brasil para Portugal, aproveitando a baixa do câmbio.

Se todo o dinheiro brasileiro pudesse ser transferido para Portugal, aproveitando-se a baixa do nosso câmbio, considerava-me-feliz, ao contrário de S. Ex.a

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O Orador: — Considero estranho fenómeno esta afirmação de S. Ex.a

Estranhou S. Ex.a que eu marcasse um limite máximo, um afastamento para a quantidade de bilhetes do Tesouro que o Banco Brasileiro ou a Agência Financial haviam de considerar nas suas mãos.

E preguntou: ^50 para mais, ou para menos ?

Se marcasse um limite máximo para mais...

Arrepia-o a idea de que num momento Portugal tenha de pagar 50 por cento dos 'bilhetes do Tesouro em circulação.

Numa crise financeira grave não admira que se mantenha um limite para os bilhetes do Tesouro.

Tinha de estabelecer esta condição.

Por último o Sr. Leio Portela declarou que na cláusula do meu contrato o limite traria temíveis consequências.

Vejamos a cláusula 14.a do contrato do ' Sr. Ramada Curto.

Poderia o Governo dar o contrato por terminado no fim de cada ano, podendo ser denunciado o contrato por uma das partes contratantes. Quere dizer .que o contrato reconhece que tanto o Estado como o Banco Português do Brasil, terminados cinco anos, podem evidentemente denunciar o contrato.

Não há portanto o prolongamento infinito do contrato, como dizia o Sr. Leio Portela.

Isso não tem razão de ser.

Preguntou S. Èx.a se o Banco Português do Brasil aceitou a denúncia do contrato que eu lhe estabeleci.

Não 'sei o que S. Ex.a quero significar com isáo.

Se quere significar que ele protestou contra a denúncia, çleclaro que o Banco Português do Brasil protestou, e declaro também que o Ministro das Finanças põe de parte o seu protesto.

Se é isso que quere saber, aqui tem '•'V. Ex.a a resposta.

Por último quero dizer a V. Ex.a uma cousa: espalharam os jornais vários boatos tendenciosos, de há muito tempo, pretendendo condenar-me .pelas pessoas que tudo mandam nesta terra.

Condenaram-me por várias cousas, e uma delas era a minha impulsividade, tam apregoada nas gazetas.

Outra, a questão da Agência Financial.

Cada qual disse o que qui».

Eu esperei tranquilamente L, minha hora.

No primeiro Conselho de Ministros em que o assunto foi tratado todos os Ministros, com excepção do Dr. João Gonçalves— e faço esta declaração, que não é inconfidência, autorizado — declararam concordar com a denúncia do contrato.

O Ministro das Finanças declarou que se não fora as campanhas dos jornais, consideraria um crime a denúncia do contrato antes de ter a certeza de que o Banco aceitaria aquela cláusula mediante a qual os interesses do Estado ficam acautelados, e poderia impedir que este assunto tivesse uma repercussão que me 'pudesse colocar mal perante o Brasil.

Declarei isto, e declaro-o aqui porque tenho orgulho das minhas opiniões.

Perante uma questão de crdem moral sou o primeiro a propor qu») o contrato seja denunciado.

Dei o meu voto, e tenho o prazer de constatar que os outros Ministros, na sua 'maioria, votaram comigo ptda denúncia do contrato. ' •

• Abrir-seria concurso.

O Conselho de Ministros deu-me um voto de confiança para proceder eu como entendesse. Assim me foi declarado em Conselho, e o Conselho de Ministros pela sua grande maioria assim mo declarou. Não tive, portanto, dúvida alguma em afirmar aquilo que em público afirmei.

Não quero prender ninguém à responsabilidade dos actos que pratico; posso com ela. Não preciso de ninguém que me auxilie, nem na minha queca, se algum dia tiver de cair, orgulhoso sempre, de cabeça erguida, sem • estar manietado a ninguém, sem ter conversado com ninguém, sem ter feito conchavos com jornalistas para anavalhar porvenmra camaradas meus.

Nunca procurei prender ninguém às minhas responsabilidades, e se algaém me quisesse dar a sua solidariedade, eu seria o primeiro a dizer aquilo que disse rio primeiro Conselho de Ministros, porqtíe não queria que o meu chefe nesta onda.ale lama com que procuravam envolver o Ministro das Finanças nem sequer os seus pés fossem tocados. Não queiro nem preciso de solidariedade de ninguém.

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solidariedade, simplesmente preguntava ao Conselho de Ministros se eles, que eu julgava, que considerava, como tendo dado^ toda a sua confiança, para resolver a questão como entendesse, continuava a dar-me essa confiança porque se não eu nem mais uma hora queria continuar neste lugar. Respondeu o Conselho de Ministros que me dava essa confiança, e por isso fiquei, por isso escrevi uma carta para os jornais, cuja explicação aqui fica.

Sr. Presidente e meus senhores: repito o que ontem disse, termino hoje como ontem, orgulhoso de mim próprio, nunca descendo ^a querer fazer como os reptis que sobem às vezes muito alto rastejando mas sempre com a coluna vertebral muito direita. Eu, que nunca soube curvar-me para beijar a mão de ninguém, nem para limpar as botas de ninguém, orgulhoso de mim próprio, homem em toda a acepção da palavra, seguro de mim próprio, a bem, com a minha consciência, homem de honra, declaro que cometi um crime "pela primeira vez na minha vida: transigi; transigi quando denunciei o contrato -da Agencia Financial, transigi por cobardia, transigi por um momento, hesitei perante a onda de lama, mas, meus senhores, em-quanto for homem público, emquanto continuar, que continuarei porque sou filho de pais pobres mas 'honrados, emquanto continuar a ser o mesmo homem de honra aqui juro a V. Ex.as que nunca mais tran-sijo, esta foi a última vez e esta vez me serviu de lição.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Leio Portela: — Sr. Presidente: quis S. Ex.% o Sr. Ministro das Finanças, tirar esta discussão do tom sereno, do tom tranquilo e plácido em que eu a quis colocar, para a levar para o campo um pouco da violência, um pouco da insinuação. ..

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Sr. Presidente: chamo a atenção de V. Ex.a para as expressões do Sr. Deputado 'que está no uso da palavra. Afirmou S. Ex.a que eu quis levar esta questão para a campo da insinuação.

Peço a S. Ex.a que explique as suas palavras.

O Orador:^-Sr. Presidente: sou suficientemente ponderado para saber as pa-Javras que profiro, e quando digo que S. Ex.a ao proferir um discurso em resposta às minhas considerações tinha desviado a questão do campo sereno em que a coloquei para o campo da violência e da insinuação, quis constatar que- S. Ex.a, em vez de responder estritamente às minhas considerações, se referiu em todo o seu discurso à campanha que na imprensa se fez, como se porventura eu fosse aqui o eco dessa ou de qualquer campanha.

Eu quis, Sr. Presidente, constatar que S. Ex.a o Sr. Ministro das Finanças, em vez de responder às minhas considerações, se referiu em todo o seu discurso a várias questões, deixando de pé toda a minha argumentação. (Apoiados}.

Eu devo declarar que nas considerações que fiz procurei defender os interesses do Estado, e nada mais, pois não admito nem ao Sr. Ministro das Finanças nem a ninguém que possam supor que .eu venha para aqui defender interesses de terceiros. (Muitos apoiados).

O Sr. Presidente:—Eu devo declarar à Câmara que não chamei a atenção do ilustre Deputado Leio Portela, por isso que entendo que a palavra insinuação não é desprimoro sã do Parlamento, visto que ela tanto se pode empregar relativamente a referências boas, como más, e depois das declarações que acaba de fazer o Sr. Leio Portela, ainda mais convencido fiquei de que procedi bem.

O Orador: — Sr. Presidente: não me acusa a consciência de ter feito quaisquer considerações menos desprimorosas para o Sr. Ministro das Finanças, sendo o meu empenho apenas demonstrar que o procedimento havido com o assunto da Agência Financial é bastante ruinoso para os interesses do Estado,

Levantei a questão, tendo o máximo cuidado em não prejudicar os interesses do Estado nem ofender a honra fosse de quem fosse.

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O Orador:—Mas que finanças?

O Sr. Ladislau Batalha: — As finanças,

e não digo mais nada.

O Orador:—Pois perdeu V. Ex.a uma boa ocasião de estar calado.

Sr. Presidente: portanto, quando eu levantei a questão, ]evantei-a convencido, como ainda estou, de que prestei um grande serviço ao meu país. (Apoiados}.

Entendeu então o Sr. Ministro das Finanças que não podia responder e apelou para que fosse convocada a reunir a comissão de finanças, para justificar o seu procedimento; porém, entendeu a Câmara, e muito bem, que tal se não fizesse, de forma a que o Sr. Ministro pudesse dizer ao Parlamento tudo o que liavia sobre o assunto.

O que é verdade, Sr. Presidente, é que as palavras do Sr. Ministro não corresponderam à gravidade do assunto, tendo ficado de pé tudo quanto eu disse sobre o mesmo.

Sr. Presidente: teria, é certo, muita gravidade; teria, é certo, uma enorme importância, quando S. Ex.a começou a fazer a historia da Agência Financial, se S. Ex.a nos dissesse quais eram os benefícios. Uma vez que se iam infringir os limites dessa concessão, nós, Estado Português, poderíamos correr o risco de perder esse benefício, de perder ossas benesses.

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal) :—<_ p='p' os='os' eram='eram' benefícios='benefícios' quais='quais' v.='v.' ex.a='ex.a' compreendeu='compreendeu' não='não'>

O Orador : — Sr. Presidente : eu verifico que em relação à Agência Financial existe, na verdade, um benefício e uma concessão, e isso foi trazido ao meu conhecimento pelo próprio ofício do agente financeiro enviado para o Ministério das Finanças, e que sei estar isento de impostos.

É assim um benefício, e da nossa parte só merece gratidão ao Governo Brasileiro. Mas, Sr. Presidente, jamais eu consentiria, com o meu voto que, embora eu considere esse benefício sob esse ponto de vista, isto é, sob o ponto de vista material de relativa importância, não sancionaria com o meu voto que qualquer Go-

verno português saísse fora das atribuições, fora dos limites que regulam e administram a Agência Financial para, à sombra dela, se vender a pele do urso.

Sr. Presidente: teve ocasião o Sr. Ministro das Finanças de declarar que, an-, tes do contrato da Agência Financial, a. importância ouro que vinha para Portugal orçava por 20:000 contos, ou seja perto de 5 milhões de libras, e, contudo, Sr. Presidente, a Agência Financial, que já existia, não era o transmissor dêsso caudal de ouro. É certo que existe o argumento de que, por virtude desse contrato, todo esse ouro do Brasil não vai passar às mãos dos particulares, porque vem servir os interesses do Estado.

Em relação a isso é que discordo do Sr. Ministro das Finanças, porque essas libras chegam ás mães do Estado demasiadamente caras para que o Estado continue a ficar com elas por êsso preço.

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leai): — £ Comprava-as mais baratas na praça ?

O Orador:: — Sr. Presidente: mostrei, quando abriu este debato, que à sombra deste contrato, e não à sombra da Agência Financial, à sombra do artigo 3.c desse contrato, se fazia e exercia uma especulação, que vem estrangulando o país, que vem estrangulando a nossa economia; S. Ex.a não negou que essa especulação se fazia, e até. disse que ela se fazia, apontando numa relação }uais eram aqueles que, à sombra dessa, cláusula, exerciam e faziam essa especulação.

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Eu ' disse que era possível fazer-se, não afirmei que se fazia.

O Orador:—E exacto. Eu sustentei essa minha dúvida e declarei que à sombra dessa cláusula se podia fazer essa especulação.

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essa operação, e eu estou de acordo absolutamente, porque o Estado compra por preços melhores do que sendo as compras feitas em Londres.

E essa a razão por que eu, neste assunto, sustento esta opinião.

Entretanto, contestei, e sobre essa cláusula fiz incidir as minhas principais considerações, sobre que, nos termos estabelecidos na cláusula 3.a, o Estado era um constante comprador, fazendo já sobre estas compras grande especulação desde há já bastante tempo.

Referiu-se o Sr. Ministro das Finanças às dificuldades do Tesouro.

S. Ex.a mostrou o rosário de amarguras que se traduziriam em milhares de contos.

Não necessitava S. Ex.a fazer o estendal das misérias do Estado para mostrar que a melhor forma de comprar libras era por meio da Agência Financial, e não pela compra na praça.

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Eu esperava fazer um empréstimo e com ele resolveria as dificuldades imediatas, e também pensava no futuro, e quando V. Ex.a rne viesse substituir porventura, no que teria muito prazer, encontraria com que resolver as futuras dificuldades.

O Orador: — Nunca tive osso desejo, mas o que S. Ex.a acaba de dizer não justifica que viesse fazer o estendal do dificuldades em que o Estado só encontra.

Entrado na apreciação das considerações que apresentei, S. Ex.a como ma-gister dixit apreciou-as com um pouco de ironia, como que pegando-lhe com as pontas dos dedos e soprando as- faria desaparecer.

Assim, começou por se referir h afirmação que fiz de que este contrato só podia ser feito pelo Poder Legislativo.

Para afirmar isso apresentei razões e argumentos que, sou forçado a dizer, S. Ex.a não compreendeu.

Apresentei o argumento de que derivando de uma concessão de um Governo estrangeiro, do G-ovêrno Brasileiro, o Estado exercia essa concessão por um acto de soberania.

Por consequência, dizia eu que o Estado só podia exercer as funções de agência,

derivadas dessa concessão, por um serviço público criado pelo respectivo órgão que é o Poder Legislativo. Dizia eu ainda que a soberania é indivisível e não pode ser alienada e que, portanto, não podia ser delegada em nenhuma instituição particular, e muito menos ainda ser adjudicada. S. Ex.a confundiu a soberania do Estado com a da Agência Financial, e então respondeu-me...

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — O que eu disse foi que a Agência mantinha absoluta autonomia e que o contrato ...

O Orador: •— S. Ex.a deve ter verificado que eu não o interrompi uma única vez durante o seu discurso, tendo-o ouvido com a maior paciência. Espero, pois, que em relação ao meu S. Ex.a não deixará de usar de idêntica paciência.

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Não supunha que iria exaltar S. Ex.a

O Orador: — S. Ex.a é que se exaltou, o não eu.

Mas, continuando, o Sr. Ministro das Finanças, confundindo a soberania do Estado com a da Agência Financial, vem dizer, pegando no contrato de 1919 : «Mas, por esta cláusula, a Agência continua soberana. £ Porque é então que se arrepiam as carnes patrióticas do Sr. Leio Portela, quando diz que a soberania está afectada, que não pode ser dividida nem alienada?». E que S. Ex.a, como eu já disse, confundiu a soberania do Estado com a da Agência, que quere dizer autonomia, independência : Soberania do Estado é cousa completamente diferente.

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o que criou a Agência Financial e que estabeleceu a matéria de direito substantivo, e ainda é um diploma com força de lei porque, embora seja uui decreto, foi feito à sombra de uma autorização dada ao Governo de então por uma carta de lei daquele ano. Nestas circunstâncias, não compete ao Poder Executivo alterar ou modificar as disposições desse diploma, visto que só o Poder Legislativo possue competência para o fazer. (Apoiados).

Já vê S. Ex.a, Sr. Presidente, como eu fui mal compreendido, e daí as erradas respostas do Sr. Ministro das Finanças, ou então S. Ex.% porque na verdade as minhas observações eram irrespondíveis, entendeu por melhor e mais conveniente para a sua defesa fingir que as não compreendia.

Disse ainda S. Ex.a que eu não tinha razão absolutamente nenhuma quando, ao reforçar as minhas considerações no sentido de reivindicar para o Parlamento a competência o a autoridade para realizar um contrato como aquele que S. Ex.a queria levar a efeito, afirmava que tanto era o Parlamento que devia determinar as condições em que esses serviços deveriam ser adjudicados, que S. Ex.a numa das cláusulas estabelecia um empréstimo, e, nos termos da Constituição, só ao Poder Legislativo compete autorizar o Poder Executivo a realizar empréstimos o determinar as respectivas condições. Argumentou S. Ex.a que se não tratava de uni empréstimo, mas dum suprimento; todavia, eu, que já pela natureza da operação não tinha dúvida absolutamente nenhuma de que ela tinha de ser autorizada polo Poder Legislativo, facilmente o constatei, porque na própria cláusula estabelecida para o concurso S. Ex.a chama-lhe empréstimo, como depois lhe chama suprimento.

Trata-se, evidentemente, de um empréstimo, e, por consequência, nos termos do-artigo 26.° da Constituição, só pode ser autorizado pelo Parlamento.'

Depois, quis o Ministro demonstrar, como reforço da sua argumentação, que se havia feito o mesmo que o Sr. Afonso Costa quando realizou uma operação em Inglaterra. Eespondeu-lhe o Sr. António Maria da Silva que o Sr. Afonso Costa o podia fazer porque para isso estava autorizado, e então, como último recurso, alegou que se tratava duma operação de

tesouraria, visto que era um empréstimo flutuante.

E conhecido de todos os tratadistas financeiros e toda a gente sabe o que é uma dívida flutuante: é uma antecipação de receita, mas que se tem de liquidar dentro do próprio ano financeiro, e, nos termos das cláusulas em que se estabelece esta condição do empréstimo de á' 1.200:000, mão se trata de um empréstimo de dívida flutuante, mas dum empréstimos em designação jurídica, visto que a liquidação se tem que fazer em cinco anos., Este prazo ultrapassa o ano financeiro/e a dívida flutuante, embora dela se tenhe, abusado e tenha servido para cobrir iéficits, não foge àquela regra, porque se liquida ao fim de seis meses, não obstaite por simples reformas, visto que a reforma corresponde a uma liquidação.

Razão, pois, tinha eu quando reinvindi-cava para o Parlamento o direito de chamar a si esta questão e deeidi-la como entendesse, e negava ao Poder Executivo e ao seu Ministro das Finanças atribuição para o fazer.

Referiu-se seguidamente S. Ex.a à crítica que eu houvesse feito sobre as razões que o teria levado à denúncia do contrato. Apresentei eu como primeira razão a circunstancia de porventura existirem quaisquer irregularidades ou .o não cumprimento do contrato por parte do outro contratante, o Banco PortuguCs no Brasil.

Nem por isso tal argumento pode deixar de ser uma razão, se o Sr. Ministro das Finanças tivesse de denunciar o contrato.

Disse S. Ex.!l que não sabia se se tinham cometido irregularidades, que podia que se tivessem cometido, e nessa ocasião leu à Câmara unia relação de vários Bancos e pessoas.

Tenho a declarar ao Sr. Ministro das Finanças que seja que Banco for, seja que pessoa for, desde que S. Ex.a fizer um inquérito e se apurem irregularidades, castigue sem piedade, implacàvelmente; seja quem for, repito. Eu não estou aqui senão para pedir isto, só isto e mais nada. O que eu quero é defender os; interesses do Estado, e não convêm ao Estado semelhantes bases.

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Não eram estas as razões por que S. Ex.a com certeza manteve nas condições do concurso todas as cláusulas do contrato de 1919.

Tomei conhecimento das condições do concurso por meio dum jornal, vendo qual era a sua primeira condição.

Para defesa do Estado devia-se comprar menos, partindo eu do princípio de que as libras que o Estado comprava lhe ficavam por um preço verdadeiramente exorbitante, pois eram adicionadas duma tremenda especulação, concluí logicamente que o que convinha era comprar o mínimo de libras...

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal: — Zero.

O Orador: — Zero, sini, porque eu quero a anulação do concurso.

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Zero digo eu a tudo isto! Sussurro nas galerias.

O Sr. Presidente: — Tenho a prevenir as galerias de que lhes não permito a mais leve interrupção.

O Orador:—A seguir analisei a cláusula segunda, a que se refere ao empréstimo de 1.200:000 libras, a propósito da qual- eu tive ocasião de acentuar que esse empréstimo, caso se pudesse realizar pela forma como o Sr. Ministro das Finanças preconizava, só conviria aos interesses do Estado e à economia nacional, se ele, porventura, fosse realizado por um Banco estrangeiro, porque, então-, o ouro não seria arrancado à nossa praça, pois viriaK de fora, o que altamente beneficiava os interesses do Estado.

Nessa altura eu fiz a pregunta se o Sr. Ministro das Finanças entendia que a adjudicação dos serviços da Agência devia ser feita a um banco estrangeiro, ou a um banco nacional, pois eu entendia que se essa adjudicação fosso feita a um banco nacional, este empréstimo seria ruinoso para a economia nacional porque esse banco não teria outra forma de arranjar 'esse dinheiro senão arrancando-o à nossa praça, colocando-a assim em piores circunstâncias do que aquelas 0111 que já hoje se encontra.

Eu tive então ocasião de dizer a S. Ex.a que se acaso tinha tido a veleidade de impedir a especulação, o não conseguiria...

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — y. Ex.a conhece-a.

O Orador:—E V. Ex.a adivinha-a.

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Neste lugar só costumo dizer aquilo que sei.

O Orador : — Limitando a importância dos saques à quantia de dez contos, obrigar-se-ia o Banco Nacional Ultramarino a arranjar tantos associados quantos fossem precisos. Mas, S. Ex.a colocava-se por esta forma entre Scylla e Charybdes, ou limitando a importância dos saques, ou não usando dessa faculdade para ter dinheiro em Londres.

Depois referi-me aos bilhetes do Tesouro e mostrei a pouca inteligência, a pouca firmeza de redacção, a pouca clareza dessa cláusula, porquanto eu não via nela estipulada a sua taxa de juro. Afirmei então, que uma das razões que me levavam a ter apreensões era exactamente a de eu julgar que S. Ex.a não teria possibilidade de colocar bilhetes do Tesouro no Brasil senão por uma taxa diferente da estabelecida em Portugal.

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Antes de V. Ex.a se referir ao assunto, eu expedi uma circular em que dizia que os bilhetes do Tesouro tinham as mesmas características que os omitidos no tempo do Sr. Inocêncio Camacho.

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Portanto, as razões que eu apresentara ficam inteiramente de pé, não lhes tendo S. Ex.a sequer feito referência.

Veio V. Ex.a declarar que os õ por ccuto são para mais e não para menos.

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal) (interrompendo): — Eu não declarei isso, declarei o contrário.

O Orador: — Como V. EX.* fez um concurso secreto...

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal) (interrompendo):—Eu bem disse que V. Ex.a estava trabalhando com dados que não eram concretos.. .

O Orador:—Pode se dar o seguinte: esse banco fixa a importância de 25 mil contos e depois, como tem a margem de 5 por cento, pode tomar mais 25 mil contos e exigir o pagamento de mais 5 por cento. Desta forma o Estado ver-se há nas mesmas dificuldades e com os mesmos amargos de boca.

Assim teríamos agravado a situação do Tesouro com esta operação, que é ruinosa.

Por último referi-me à cláusula do direito de renúncia anual, ficando o Estado amarrado durante cinco anos. E, nessa ocasião, disse eu que o contrato se poderia considerar indefinido, porque não considerava o direito que na cláusula anterior se lhe marcara.

Por aqui se vê que o Sr. Ministro das Finanças não conseguiu destruir um só argumento por mini apresentado, pois todos eles estão de pé quando provei que este contrato é ruinoso para o Estado, porque mau era também o contrato de 1919.

De pé também ficam as razões e argumentos que apresentei, quando reivindicara para o Parlamento o direito de discutir este assunto.

-De pé fica a razão e o argumento que aduzi, quando disse que o Poder Executivo querendo chamar a si a resolução deste assunto, cometeu um abuso de Poder porque invadiu as atribuições do Poder Legislativo.

Não me pesa na minha consciência o remorso de ter concorrido para colocar esta questão fora do âmbito de elevação

em que ela devia ser colocada, presidindo à sua discussão a maior placidez ; mas o Sr. Ministro das Finanças intendeu que à forma correcta por que eui tinha levantado a questão, devia responder com objurgatórias e discursos infamados. Em resposta às minhas considerações serenas entendeu S. Ex.a trazer a debate os contratos do trigo e do carvão do Governo transacto, e tudo o mais que não se relacionava com esta questão. Ora mal andará o Sr. Ministro em não querer discutir com serenidade e placidez esta questão, que é primordial para os interesses do JEstado e que afecta tam gravemente a economia do País, porque eu seguindo aquela linha geométrica que S. Ex.a me quis citar, para me mostrar como a queda do câmbio se tinha efectuado, verifiquei que essa linha geométrica, longe de descer quando S. Ex.a me indicou, desce precisamente quando se realizou o contrato da Agência Financial, o desce precipitada e rapidamente.

Assim no ano de 1915-1916 o'câmbio oscilou entre 34/3G. No ano de 1916-1917 q câmbio oscilou entre 31/35- No ano de 1917-1918 o câmbio oscilou entre 3%2-No ano de 1918-1919 o câmbio oscilou entre 30/3g. Mas vem o ano cê 1919, e o câmbio quo estava a 30 em Julho, mês em que se realizou o contrato, a breve trecho se encontra nos nossos dias a 6.

Desta forma, Sr. Presidente, convencido como estou que este contrato tem estrangulado a economia nacional e tem lesado os interesses do Estado, eu quis chamar a atenção desta Câmara para ele para que fosse discutido com serenidade e não com objurgatórias, porque mesmo assim o Sr. Ministro das Finanças não poderá demonstrar as razões que teve para proceder como procedsu. (Apoiados). E porque eu reputo esse caudal de ouro quo nos vem da Agência Financial, e que tem beneficiado o Estado nos momentos de aflição e de agrura, por que tem passado, como um pesado sacrifício para o próprio Estado, eu julgo que devemos terminar com esse tam caro sacrifício para os interesses do Estado e da economia nacional.

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tendo, cuido que um contrato desta natureza deve ser anulado. (Apoiados}.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra quando o orador restituir, revistas as notas taquigrâficas que lhe f oram enviadas.

Não foram revistos pelos oradores que os fizeram, os «apartes» intercalados no texto.

O Sr. Hermano de Medeiros (para um requerimento):—Eequeiro que seja consultada a Câmara sobre se permite que se generalize o debate a respeito da questão da Agência Financial, e que seja considerada matéria de ordem.

Foi aprovado.

O Sr. Ministro das Finanças (Cunha Leal): — Não vou responder em largas considerações ao Sr. Leio Portela. Está S. Ex.a tam candidamente, tam ingenuamente convencido das suas razões, que eu desisto de o desiludir.

Há, porém, duas afirmações de S. Ex.a que eu não quero deixar passar em claro.

Uma delas traduz uma estranha teoria sobre dívida flutuante.

Na opinião de S. Ex.a nós, que temos uma dívida flutuante muito superior ao quantum das receitas, não deveremos considerar como tal o excedente desse quantum.

S. Ex.a confunde lamentavelmente.

O que S. Ex.a certamente quis significar é que seria de boa política financeira evitar que a dívida flutuante exceda naturalmente as receitas que se antecipam.

Infelizmente não se pode seguir sempre essa norma. Assim sucede que a dívida flutuante ó hoje, em todos os povos, superior de facto às receitas normais; disto deriva a necessidade de consolidar de vez em quando essa dívida.

Insisto no meu ponto de vista.

O Poder Executivo tem o direito de fazer operações de crédito.

É o que diz a Constituição.

Foi nestes termos que me considerei habilitado a fazer o empréstimo de 1.500:000 libras.

A outra afirmação é a que se refere à queda do câmbio.

Pelo que S. Ex.a disse, lógico é que concluamos que em todos^ os países em que simultaneamente se produzir idêntico

facto, deve ter existido uma Agência Financial.

Ora a verdade é que a queda brusca do câmbio, observada em toda a parte, foi devida à circunstância de logo após o armistício terem sido feitas largas especulações por todos aqueles que, num optimismo que nada justificava, pensavam que os câmbios iam melhorar.

Mas para não lhe tirar ilusões, deixo que S. Ex.a continue em atribuir a causa do mal à Agência Financial. Não quero prejudicar o sossego das suas convicções.

Nada mais direi, tanto mais que as palavras de S. Ex.a não destruíram a minha argumentação.

S. Ex.a declara de pé a sua argumentação. Está bem. Como a Câmara está necessitada de estátuas, alvitro que essa argumentação seja colocada no lugar destinado a uma delas.

Tenho dito.

O discurso será publicado na íntegra, quando o orador, restituir, revistas, as notas taquigrâficas que Ifie foram enviadas.

O Sr. Ferreira da Rocha: —Sr. Presidente : entro neste debate ainda sob a impressão das primeiras palavras que disse o Sr. Ministro das Finanças ao responder ontem ao meu ilustre colega Sr. Leio Portela.

Impressionaram-me muito as palavras de S. Ex.a, pela idea que continham e talvez pela forma que S. Ex.a lhes deu, forma que, como sempre, S. Ex.a sabe dar às suas palavras, porventura procurando-lhe aqueles efeitos de que a sua oratória é capaz e que mais impressionam, portanto, aqueles que o ouvem. Mas, pelas ideas mesmo, as suas palavras eram suficientes para me impressionar.

Estou ainda a ouvir dizer a S. Ex.a: «quando um homem se eleva acima um pouco da craveira média, ele há-de ter sempre o quarto de hora de assalto».

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sobrenaturais, gigantes em tudo, na inteligência, no valor, na força e em todas as qualidades que caracterizam os homens. E tendo lançado esses indivíduos pela vida fora, anos depois havia na humanidade um pequeno núcleo de gigantes física e intelectualmente, o que obrigou todos os outros homens ajuntar-se, para os matar, na caça aos gigantes, que era este mesmo o título desse livro.

Lembrei-me que S. Ex.a o Sr. Ministro das Finanças estava vendo esse episódio., em que ele era o gigante e os outros os homens pequenos para o caçarem, para o matarem, porventura para lhe retirarem aquelas qualidades que o haviam, por juste motivo, colocado naquele lugar. E como eu tinha de entrar neste debate, porque-desejava nele entrar na minha qualidade de Deputado, porventura como homem pequeno, quis desde logo afirmar a S. Ex.y que pode ele ter subido acima da craveim média, que eu não o quero discutir.

Não quero, pelo meu ataque à forma' como S. Ex.a procurou resolver o caso da Agência Financial do Eio de Janeiro, que S. Ex.a ou alguém possa ver com a minha entrada na discussão o quarto de hora de assalto. Pare S. Ex.a o relógio em-quanto eu falar, porque durante o tempo .em que eu estiver usando da palavra não há esse quarto de hora.

Eu não quero ver a craveira de S. Ex.a senão para respeitar "aquilo que ela possa ter de alto e nunca para fazer descer essa craveira até à minha pequena altura.

E, no intróito das minhas considerações permita-me V. Ex.a, Sr. Presidente, que eu acrescente às já proferidas algumas outras palavras.

Tendo o Sr. Ministro das Finanças, em resposta ao meu ilustre camarada Sr. Leio Portela, afirmando por várias vezes e feito várias referências a Bancos que especularam com a Agência Financial do Eio de Janeiro, e tendo citado propositadamente os nomes de alguns desses Bancos; havendo-se S. Ex.a ainda referido a infames insinuações e acusações que de lá fora partem e com as quais eu nada tenho; eu quero fazer sentir a S. Ex.a que, entrando neste debate, não me faço eco dessas campanhas de facínoras a que S. Ex.f

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Eio de Janeiro se poderam ter aproveitado.

Eecusando, pois, o papel de defensor de qualquer dessas instituições, como eu me recusaria a encabeçar no1 Sr. Ministro das Finanças o mesnio papel a respeito de quaisquer outros Bancos que a Agência Financial possa prejudicar, eu discuto a questão como Deputado. Faço o mesmo que fez o Sr. Leio Portela e espero que o Sr. Ministro das Finanças me responda como Ministro das Finanças apenas.

Nem uma cousa, nem outra.

Como simples Deputado, aproveitando--me, porventura, das informações dessas bocas, dessa imprensa, a parte que S. Ex.a o Sr. Ministro das Finanças f.tribui a responsabilidade e autoria directa,, aquilo que houver de útil à minha argumentação, fazendo mesmo o aproveitamento das verdades que, no momento da disputa, disseram, porventura, mn ao outio quanto ao mesmo contrato, aproveitando só o que é do utilidade para o Estado.

Discutirei nestes termos, li este o meu instinto nesta discussão.

Atento o carácter desta discussão, necessariamente trará a irritação, que não quero de forma alguma quo exista em tudo aquilo que disser a respeito deste assunto.

Entrando propriamente no assunto em discussão, começo por dividir as razões que teve o Sr. Ministro das Finanças para denunciar o contrato com a Agência Financial, e procurar substituí-lo por uni novo contrato fruto da adjudicação.

Julgo assim sintetizar todlos os argumentos aduzido? por S. Ex.a

As razões - são de dinheiro, de dívida quanto à situação da Agência Financial do Eio de Janeiro, e à possibilidade do Estado poder sobre ele livremente contratar. Púnhamos para depois a razão da necessidade de dinheiro, embora ela tenha impressionado o ânimo do Ministro.

Começou em primeiro lugar pela dúvida sobre o direito do Estado denunciar um contrato daquele género, que levou S. Ex.a a procurar fazer, não um contrato secreto, porque não o poderiL fazer, mas um concurso secreto, no intuito de evitar discussão.

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vêrno Português com a aquiescência do Governo Brasileiro, para fazer operações de tesouraria, transferência de fundos, otc., e pagamentos do Estado Português no Brasil.

Devo confessar que nos textos escritos nada mais há a concluir de que outra cousa não é, senão o Estado Português não tinha o direito de, por intermédio da Agência Financial, estabelecer uma instituição bancária destinada a transferir de Portugal fundos dos súbditos.

De facto é isto que resulta dos textos escritos. E é justo admitir que o Governo Brasileiro não consentisse.

Não, Sr. Presidente, na verdade eu não posso deixar de reconhecer esse consentimento do Governo Brasileiro, deixando que aquela Agência fizesse, desde a sua instalação, não podendo ter disso a menor dúvida, transferência para Portugal de dinheiros pertencentes a súbditos portugueses residentes no Brasil.

Não há maneira alguma de o Governo Brasileiro ignorar tal facto, que era do conhecimento público.

Podemos, Sr. Presidente, admitir que o Governo Brasileiro se recusasse sempre o fazer esse facto num documento escrito; mas ignorá-lo, não.

O Governo Português não pode deixar de reconhecer tal facto, isto é, que o Governo Brasileiro tacitamente consentiu sempre na transferência de dinheiros de súbditos portugueses residentes no Brasil, para Portugal, tendo-o sempre feito com conhecimento de causa.

Assim eu não tenho receio de quaisquer discussões sobre o assunto; isto é, os receios e os melindres manifestados pelo Sr. Ministro das Finanças do Governo Brasileiro retirar a faculdade de para Portugal se transferirem fundos dos súbditos portugueses residentes no Brasil.

Não vejo, pois, razão para os receios manifestados pelo Sr. Ministro das Finanças, repito.

O Governo Brasileiro não impedirá a remessa de dinheiros para Portugal, de súbditos portugueses residentes no Brasil.

E assim, Sr. Presidente, o Governo Brasileiro, que consentiu em que fosse criada a Agência Financial no Rio de Janeiro, não desejará que o Governo Português mantenha no Brasil uma institui-

ção bancária de especulação, concorrendo assim com instituições bancárias portuguesas, concorrendo de Jfacto com estabelecimentos bancários existentes no Brasil.

O Governo Brasileiro não desejará tal, e nós portugueses, acima de tudo, parlamentares e homens públicos, não podemos deixar que se cumpra integralmente um contrato que está em vigor, pois que os Governos não podem nem têm meios de violar contratos desta natureza.

O que eu devo declarar à Câmara é que contratos desta natureza a que me venho de referir não se podem fazer secretamente.

Essa razão não pode justificar um concurso secreto para um acto desta natureza, e se alguma cousa ela justifica, se alguma cousa nos pode fazer compreender, é certamente que a Agência Financial no Rio de Janeiro deixasse de constituir uma instituição particular para passar a ser uma instituição do Estado Português.

O Sr. Presidente: — Como se aproxima a hora de encerrar a sessão e ainda tenho de conceder a palavra ao Sr. Ministro das Colónias, que a pediu para antes de se encerrar a sessão, pregunto a V. Ex.a se deseja terminar já o seu discurso ou ficar com a palavra reservada para amanhã.

O Orador: — Se V. Ex.a me permite, fico com a palavra reservada para a próxima sessão.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Presidente: — Fica V. Ex.a com a palavra reservada.

antes de se encerrar a sessão

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esse estado de cousas. As dificuldades são grandes como em toda a parte e só hoje consegui enviar para Cal>o Verde L importância de 200 contos para satisfazer às necessidades mais instantes.

Tenho feito esforços para que a verba relativa a trânsito de telegramas ali fique, porque isso é uma receita que por lei compete a Cabo Verde e lhe tem sido regateada. Ou seja Ministro das Colónias, ou tenha assento na Câmara dos Deputados, hei-de procurar aproximar essa verba da verdade. Sobre essa verba planeava eu um empréstimo que subiria a uma importância de certo modo avultada e que iria resolver o problema de Cabo Verde, não por uma forma transitória, mas para de futuro.

Estou certo de que a situação grave que Cabo Verde atravessa se agravará cada vez mais, não podendo contar com melhores dias, mas devo informar que das outras colónias tenho recebido provas de auxílio de envio de recursos por forma que nos honram muito.

Assim, de Angola foram oferecidas cento e vinte toneladas para Cabo Verde e de Moçambique duzentas toneladas.

Devo também dizer que por atenção da Companhia Nacional de Navegação foram concedidas sessenta toneladas.

O assunto não tem sido desprezado, mas é um assunto delicado e que apresenta grandes dificuldades, sendo a prin-• cipal a falta de dinheiro.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Viriato da Fonseca: — Sr. Presidente : em face das declarações do Sr. Mi-

nistro das Colónias, agradeço em meu nome e no dos habitantes de Cabo Verde a boa vontade de S. Ex.a, e como deputado por aquele círculo rejubilo pelo interesse que S. Ex.a mostra por aquela província.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente:—A próxima sessão é amanhã à hora regimental com a seguinte ordem de trabalhos:

Antes da ordem do dia:

A de hoje, o projecto de lei n.° 6230-D, que determina que as câmaras municipais concedam aos seus empregados a ajuda de custo de vida a que se refere o artigo 7.° do decreto n.° 7:088.

Ordem do dia :

A de hoje.

Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas e 50 minutos.

Documentos enviado? para a Mesa durante a sessão

Projeoto de lei

Dos Srs. António Pais Koviseo e Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis), fixando provisoriamente, os ordenados mensais aos magistrados judiciais do Ministério Público.

Publicado no «Diário do Governo*.

Volta para ser submetido a. admissão.

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