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REPÚBLICA
PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOSU)EPUTADOS
IsT. 27
EM 23 DE FEVEREIRO DE 1921
Presidência do Ex.mo Sr. Abílio Correia da Silva Marcai
Baltasar de Almeida Teixeira
Secretários os Ex.mos Srs.
António Marques das Neves. Mantas
Sumário. — Abre. a sessão com a presença de 33 Srg. Deputados.
E lida a acta.
Dá-se conta do expediente.
Procede-se a segunda chamada, mas como no seu prosseguimento se verifique haver número para seguirem os trabalhos, independentemente de votações, entrâ-se na parte da sessão
Antes da ordem do dia. — O Sr. Leote do Sego desiste da palavra que pedira para diversas considerações.
O Sr. Francisco José Pereira apresenta e justifica um projecto de lei, para que requere urgência.
O Sr. Santos Graça pede que seja posto em. discussão o projecto de lei n." ÕU3-B, sobre crédito marítimo.
O Sr. Sá Pereira reclama contra violências que diz terem sido praticadas por dois agentes da policia de segurança do Estado, terminando pela apresentação de uma proposta de inquérito, para que requere urgência e dispensa do Regimento.
O Sr. Raul Tamagnini pede providências referentes ao expediente da Alfândega do Porto.
O Sr. José Monteiro Manda para a Mesa um teleprama referente aos termos em que se está fazendo a passagem por barcas no Rio Guadiana.
O Sr. Ladislau Batalha produz várias considerações políticas e económicas a propósito do projecto referente à magistratura judicial.
Continua a discussão, na generalidade, do pa-•recer n." 641-A, referente ao adiamento da encor-poração de recrutas, tendo usado da palavra os Srs. Viriato da Fonseca e António Granja, que tinha ficado com a palavra reservada da sessão da véspera.
E^aprovada a acta.
Em «negócio urgente», o Sr. Leote do Rego propõe, e é aprovado, que se dirija uma saudação ao Sr. Brito Camacho, que no dia 24 segue para Moçambique, na qualidade de comissário régio.
O Sr. Brito Camacho agradece, e faz as suas despedidas ao Parlamento.
A proposta do Sr. Rego associam-se, pelos diversos partidos políticos, os Srs. Camoesas! Antó-
nio Granja, Pereira Bastos, Ladislau Batalha Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis) e Bartolomeu Severino, que propõe, sendo aprovado, que, se nomeie uma deputação para representar a Câmara no seu embarque — deputação que é nomeada pela Presidência.
Entra em discussão, sendo votada a urgência e a dispensa do Regimento, a proposta de lei autorizando a satisfação das despesas públicas no próximo mês de Março.
É aprovada, com dispensa de última redacção, tendo usado da palavra os Srs. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis), Gr anjo e Rego Chaves.
O Sr. João Bacelar requere que na sessão imediata entre em discussão uma proposta de lei do Sr. Ministro da Justiça, de abertura de crédito.
O Sr. Eduardo de tiousa insta pela discussão do projecto de lei referente aos hospitais.
Entre os Srs. Ladislau Batalha e Presidente trocam-se explicações acerca do projecto referente à magistratura judicial.
E rejeitada a proposta, acima referida, do Sr. Sá Pereira.
O- Sr. Santos Graça requer que seja posto em discussão o parecer criando o crédito marítimo.
Prossegue a discussão do parecer n." 641-A, usando da palavra os Srs. Pereira Bastos, Plínio Silva, que apresenta e justifica uma moção de ordem, que é admitida, e Heldtr Ribeiro, que fica com a palavra reservada.
Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Projectos de lei. — Parecer.— Requerimentos.
Abertura da sessão às 14 horas e 40 minutos.
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Diário da Câmara dos Deputados
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Abílio Correia da Silva Marcai.
Afonso de Macede.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Albino Pinto da Fonseca.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia. .
António Albino de Carvalho MonrAo.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António da Costa Ferreira.
António da Costa Godinho do Amaral.
António Dias.
António Francisco Pereira.
António Joaquim Granjo.
António José Pereira.
António Lobo de Aboim Inglês.
António Marques das Neves Mantas.
António Pais Ro visco.
António Pires de Carvalho.
António dos Santos Graça.
Augusto Pires do Vale.
Augusto Rebelo Arruda.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Seve-rino.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Maldonado de Freitas.
Custódio Martins de Paiva.
Domingos Cruz.
Eduardo Alfredo de Sousa.
Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.
Francisco da Cunha Rego Chaves.
Francisco José Pereira.
Francisco de Sousa Dias.
Jaime da Cunha Coelho.
Jaime Daniel Leote do Rogo.
João Oardoso Moniz Bacelar.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
João de Orneias da Silva.
João Pereira Bastos.
Joaquim Aires Lopes de Carvalho.
Joaquim Brandão.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António da Costa Júnior.
José Maria de Campos Melo.
José Maria Vilhena Barbosa de Magalhães.
José Mendes Nunes Loureiro.
JQSÓ Monteiro.
José de Oliveira Ferreira Dinis.
José Rodrigues Braga.
Júlio Augusto da Cruz.
Júlio Gomes dos Santos Júnior.
Ladislau Estêvão da Silva Batalha.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Pragoso.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel Josó da Silva.
Manuel Josó da Silva.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Pedro Gois Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Raul António Tamagnini de Miranda Barbosa.
Rodrigo Pimenta Massapina.
Vasco Guedes de Vasconcelos.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputado» que entraram durante a sessão:
Acácio António Camacho Lopes Cardoso.
António Maria da Silva.
Francisco Manuel Couceiro da Costa*
Helder Armando dos Santos Ribeiro.
Hermano José de Medeiros.
João Estêvão Águas.
João José Luís Damas.
Josó Domingues dos Santos.
José Gregório de Almeida.
Júlio do Patrocínio Martins.
Manuel Alegre.
Raul Leio Portela.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
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Sessão de 23 de Fevereiro de 1921
Pereira Guedes.
Álvaro Xavier de Castro.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
Antão Fernandes de Carvalho.
António Bastos Pereira.
António Cândido Maria Jordão Paiva Manso.
António Carlos Eibeiro da Silva.
António Germano Guedes Ribeiro de Carvalho.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Joaquim Machado do Lago Cerqueira.
António Maria Pereira Júnior.
António de Paiva Gomes.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Augusto Dias da Silva.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Constâncio Arnaldo de Carvalho.
Diogo Pacheco de Amorim.
Domingos Leite Pereira.
Domingos Vítor Cordeiro Eosado.
Estêvão da Cunha Pimentel.
Francisco Alberto da Costa Cabral.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Cotrim da Silva Garcês.
Francisco da Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco José Fernandes Costa.
Francisco José Martins Morgado.
Francisco José de Meneses Fernandes
Francisco Manuel Homem Cristo. Francisco Pinto da Cunha Leal. Henrique Ferreira de Oliveira Brás. Henrique Vieira de Vasconcelos. Inocêncio Joaquim Camacho Rodri-
Jacinto de Freitas.
Jaime de Andrade
Jaime Júlio de Sousa.
João Gonçalves.
João Maria Santiago Gouveia Lobo Prezado.
João Ribeiro Gomes.
João Salema.
João Teixeira íle Queiroz Vaz Guedes.
João Xavier Camarate Campos.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
José Barbosa.
José Garcia da Costa.
José Mendes Ribeiro Norton de Ma-tos.
Júlio César de Andrade Freire. Leonardo José Coimbrã. Liberato Damião Ribeiro Pinto* Lino Pinto Gonçalves Marinhaé Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.
Luís de Orneias Nóbrega Quintal. Manuel José Fernandes Costa. Maxímiano Maria de Azevedo Faria. Mem Tinoco Verdial. Miguel Augusto Alves Ferreira. Nuno Simões. Orlando Alberto Marcai. Tomás de Sonsa Rosa. Vitorino Henriques Godinho. Xavier da Silva.
Ás 14 horas e 40 minutos, começa a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente (às li horas e õô minutos):— Responderam à chamada 83 Srs. Deputados. Está aberta a sessão. Vai ler-se a acta.
Foi lida a acta.
O Sr. Presidente:—Vai ler-se o
Ofícios
Do Ministério das Finanças, remetendo uma reclamação dos industriais e operários de trabalhos artísticos em vidro.
Para a comissão .de finanças.
Do Ministério da Instrução Pública, remetendo as informações requeridas pelo Sr. António Mantas.
Para a Secretaria.
Do Ministério da Justiça e dos Cultos, remetendo uma exposição do Administrador e Inspector Geral das Pensões sobre alimentação de presos indigentes.
Para a comissão de legislação civil e comercial.
Do Ministério das Finanças, pedindo autorização à Câmara para que o Sr. António Maria da Silva possa depor como testemunha no processo de sindicância ao Director Geral de Fazenda Pública.
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Diário da Câmara do» Deputados
Do Juiz Presidente do Tribunal do Comércio de Lisboa, pedindo autorização para o Sr. Jorge de Vasconcelos Nunes ali depor como testemunha.
Para a Secretaria. Arquive-se.
Da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, remetendo passes nas suas linhas para os Srs. Prazeres da Costa e Sá Cardoso.
Para a Secretaria.
Do Ministério das Finanças, remetendo a proposta de lei que autorizou o Governo a despender o duodécimo orçamental relativo ao mês de Março próximo futuro e pedindo para ser admitida com ur gência à discussão da Câmara.
Para a Secretaria.
Requerimento
De Alberto Carlos Cristiano, 2.° sargento de Infantaria de reserva n.° 2, pedindo para continuar a servir no Colégio Militar como civil contratado.
Para a comissão de guerra.
Telegramas
Do Centro Comercial do Porto, pedindo a suspensão da lei n.° 1:096, de 28 de Dezembro próximo passado.
Para a Secretaria.
Da Câmara Municipal de Tomar, pedindo que seja mantido o imposto ad valorem.
Para a Secretaria.'
Do Vice-Presidente do Município de Mértola, pedindo providências ao Sr. Ministro de Marinha por o Capitão do Porto de Vila Real ter mandado amarrar barcos que a Câmara possui para comodidade do público, por não estarem matriculados.
Para a Secretaria.
São admitidos os seguintes projectos de lei, já publicados no «Diário do Govêmov:
Do Sr. Pedro Pita, .esclarecendo o artigo 3.° da lei n.° 903, de 24 de Outubro de 1919.
Para a comissão de legislação civil e comercial.
Do Sr. Pedro Pita aplicando à Secretaria da Administração do Conselho do Funchal o disposto no artigo 20.° da- lei n.° 532, de 17 de Maio de 1919, e dando--Ihe a diuturnidade de serviço.
Para a comissão de administração pública.
O Sr. Presidente:—Estão presentes 43 Srs. Deputados. Vae entrar-se nos trabalhos de:
Antes da ordem do dia
O Sr. Leote do Rego: — Sr. Presidente: as considerações que eu desejo fazer hoje queria que fossem ouvidas pedos Srs. lea-ders nesta Câmara; e como, infelizmente, se dá a circunstância de S. Ex.as estarem em serviço à hora da abertura desta sessão, eu desisto por agora das minhas considerações.
O orador não reviu.
O Sr. Francisco José Pereira: — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa um projecto de lei, que pretende remediar a falta, que existe na nossa legislação, de dar completamente aos condenados reabilitados a justa reparação do dano que lhes foi causado.
Sr. Presidente: parece-me que a aprovação deste projecto de lei representaria por parte do Parlamento um acto de justiça. Realmente, quando se dá o caso de se averiguar, findo um processo condena-tório, que os réus estavam, efectivamente, inocentes, é triste que mesmo assim eles sejam obrigados ao pagamento das custas e selos do processo, e mais ainda —que não possam reclamar dos culpados uma indemnização do dano que lhes foi causado. Este projecto de lei tende a evitar essa injustiça, e por isso peço a V. Ex.a que consulte a Câmara sobro se concede para ele a urgência.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Santos Graça: — Sr. Presidente; pedi a palavra para solicitar de V. Ex.a que na altura competente ponha à discussão o projecto de lei n.° 503-B.
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/Sessão de 25 de Fevereiro de 1921
sido dados aos poveiros regressados do Brasil os elementos de trabalho necessários ao desempenho da sua profissão. Os poveiros, pelo seu gesto patriótico, foram recebidos em Portugal com muitas festas e simpatias; mas não basta: ó necessário dar-lhes o que eles precisam para trabalhar em Portugal', e isso só se pode fazer estabelecendo o crédito marítimo no nosso país.
Não há mesmo razão para que Portugal esteja a importar.por ano 30:000 a 40:000 contos de peixe, quando os pescadores portugueses podem muito bem colher quantidade de peixe equivalente, ou ainda mais, para que passemos a ser exportadores.
Portanto, peço a V. Ex.a que na altura competente ponha à discussão e votação o projecto de lei n.° 503-B, que cria o crédito marítimo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Sá Pereira: — Sr. Presidente: mal podia eu calcular que tendo ontem nesta Casa do Parlamento ouvido tratar dum assunto grave, como seja o do espancamento, nos governos civis, dos presos por delitos sociais, assunto versado pelo meu ilustre colega Sr. Manuel Fragoso, eu tivesse de pedir a palavra para me ocupar hoje precisamente do mesmo assunto.
Chamo a atenção de V. Ex.a e da Câmara para um facto que se deu e que considero gravíssimo.
. A noite passada foi assaltada a casa de um cidadão por agentes que se dizem da polícia de segurança do Estado, um deles chamado Serra e outro chamado Oliveira. Esses pretensos agentes assaltaram a casa desse cidadão, remexeram tudo e espancaram-no, e, o que ó mais grave, tendo alguém corrido à esquadra da polícia mais próxima a pedir auxílio, foi-lhe respondido pelo chefe da polícia presente que não queria intervir, porque não queria contacto nenhum com a policia de segurança do «tacho», expressão que me garantem ter sido empregada por esse funcionário.
. Veja V. Ex.a a que desgraçada situação se chegou!
A polícia de segurança do Estado serve para assaltar casas de cidadãos, es-
pancá-los e ameaçá-los de morte com pistolas aperradas a desgraçados de 17 anos!
Apelo porá V. Ex.a e para todos os lados da Câmara. Estou convencido de que dentro desta casa do Parlamento não há absolutamente -ninguém que se torne solidário com similhantes factos.
O que se está passando neste momento é atentatório das autoridades da República contra a honra dos seus homens. (Apoiados).
Protesto contra o que se está passando com os agentes da polícia de segurança do Estado, que se embriagara para praticarem aotos desta natureza. (Apoiados].
Não me limitarei a formular o meu pro-.testo em termos violentos.
Seria pouco. Entendo que o caso é bastante grave, para ficar simplesmente em palavras.
Precisamos apurar o que há de verdadeiro a respeito das acusações que tem feito o jornal A Batalha.
Por isso mando para a Mesa a seguinte
Proposta,
Proponho que seja nomeada uma comissão de inquérito parlamentar, com representação de todos os lados da Câmara, para apurar o que há de verdade nas graves acusações feitas nesta casa do Parlamento à polícia de segurança do Estado.
Lisboa, 22 de Fevereiro de 1921. —#á Pereira.
Só assim tornaremos efectivas as rés* ponsabilidades do que está sucedendo.
Mando a minha proposta para a Mesa, pedindo a V. Ex.a que a submeta à deliberação da Câmara, quando haja número.
E semelhante estado de cousas não pode continuar. E uma situação semelhante à do dezembrismo, em que cidadãos pacíficos eram espancados no governo civil e nos calabouços das prisões de Lisboa.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquihráficas que lhe foram enviadas.
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Diário d* Câmara do*
Acentuarei que o caso que vou tratar é de extrema gravidade, principalmente para o norte do País. Não admite delongas. •
E mister que o Governo intervenha, ou a entidade a quem directamente compete tratar deste assunto o faça rapidamente, para que este 'estado de cousas não continue, pois que afecta, como disse, enor-memente os interesses de uma parto do País.
Trata-se de um assunto já ventilado nesta casa do Parlamento há de haver aproximadamente quatro meses. É o desprezo a que está votada a alfândega do Porto. Quem diz alfândega, diz os interesses do comércio e da indústria de todo o norte.
De há muito que essa casa fiscal, que é a segunda do País, se encontra absolutamente desprovida de tudo o que é necessário para o serviço de descarga e arrecadação de mercadorias. Como se não bastasse esse desleixo da direcção geral das alfândegas, como se não bastasse a incúria dos ministros que têm sobraçado a pasta das finanças, veio agravar a situação- o incêndio que se deu no dia 26 de Agosto e que destruiu os três barracões destinados a arrecadação de mercadorias pesadas e matérias inflamáveis e aquele que se utilizava como depósito de material da alfândega.
Desde 26 de Agosto até hoje, não obstante a enorme acumulação de mercadorias dentro das barcas e navios que ali se encontram, não deu a mais pequena providência no sentido de fazer substituir esses barracões, permanecendo as mercadorias descarregadas nos cais, ao sol e à chuva, sujeitas lamentavelmente a deterioração, o que constitui um verdadeiro crime.
Sendo a descarga efectuada por um guindaste eléctrico, este não pode funcionar, assim como os monte-cargas, sem a energia que lhes ó fornecida pelos serviços municipalizados do gás e electricidade.
Encontra-se a Câmara Municipal em situação pouco satisfatória, sob o ponto de vista financeiro, e não pode permitir que pagamentos de* contas que lhe são devidas se protele de qualquer forma. Assim tem ele instado com a Direcção da Alfândega do Porto, para que lhe seja satisfeito o débito que ó superior a 8:800 escudos, datando uma parte deste de 1919.
Debalde a Direcção da Alfândega do Porto tem instado com o Director Geral das Alfândegas para promover o pagamento dessa importância, mas S. Ex.a tem permanecido mudo e quedo como um penedo. S. Ex.a não promove de maneira nenhuma esse pagamento, simplesmente por politiquice,—porque é preciso que se diga a verdade—p ar a que £,s responsa-bilidades vão a quem toquem, e é que a Direcção da Alfândega do Porto, acaba de receber da Câmara Municipal uma comunicação dizendo que, se aio ao dia 28 deste mês não for satisíeito o débito, cortará a energia eléctrica e o gás à Alfândega!
Sr. Presidente, como V. Ex.a vê, isto terá como resultado a paralisação dos serviços de carga e descarga, e o que ó bem evidente também é que essas responsabili-dades vão incidir sobre o Director, o qual, como acabo de mostrar, não tem culpa nenhuma do que sucede. E se dúvida houvesse estão aqui os documentos que o provam plenamente.
Ê preciso que o Sr. Ministro das Finanças dê ordens terminante» nesse sentido. Mas como não há na ocasião Ministro efectivo, mas simplesmente interino, eu apelo para V. Ex.a, para que, em nome da moralidade dos serviços públicos, acabe com este gâchis tremendo de sermos governados e administrados por monárquicos, e que quem sobraça interinamente a pasta das finanças dê as suas ordens para que tal facto se não consuma, isto é, que a Câmara não leve a eleito o corte da energia eléctrica à Alfândega do Porto, facto este que a realizar-se teria tão funestas consequências que nem se podem prever.
Triste é dizer que serviço3 desta magnitude se encontrem à mercê» da primeira creatura que por ódio pessDal e político se lembra de levantar todos os estorvos, e promover todos os entraves àqueles que pretendem cumprir o seu dever e desempenhar o sen cargo como lhes compete.
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fSessão ãc 23 de Fevereiro de 1921
esta situação lamentável, que é uma vergonha para todos nós e para a Republica. Tenho dito.
O Sr. José Monteiro: — Sr. Presidente: recebi do Sr. Presidente da Câmara Municipal de Mértola um telegrama no qual diz que o capitão do porto de Vila Real de Santo António mandou amarrar umas barcas que aquela câmara municipal tinha no Guadiana para fazer a travessia de uma margem para a outra.
Diz o mesmo telegrama que o fundamento da apreensão é o facto de as barcas não estarem matriculadas como determinam as leis marítimas; mas o que é verdade é que a Câmara Municipal de Mértola possui aquelas barcas há 50 ou 60 anos, sem que nunca as tivesse matriculado. Apesar da Câmara estar na disposição de fazer a matrícula, o capitão do porto, no entanto, mantém as suas ordens. Diz mais o telegrama que os barqueiros particulares levam muito dinhero pelas passagens, o que tem levantado justa indignação do povo daquela localidade, receando-se até que possa haver qualquer alteração de ordem pública.
Não estando presente o Sr. Ministro da Marinha, peço a V. Ex.a a fineza de transmitir as minhas considerações e o texto deste telegrama a S. Ex.a, a fim de dar as ordens necessárias para que acabe semelhante estado de cousas.
E preciso que as barcas continuem a fazer a passagem de um lado para o outro sem prejuízo de serem matriculadas como é da lei.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taguigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Ladislau Batalha:—Serei muito breve.
Tenho de me referir, ainda que rapidamente, às reuniões que vão realizar os magistrados e empregados de justiça.
Antes de o fazer, porém, sejam-me permitidas umas ligeiras observações como intróito.
Vamos entrar no trigésimo oitavo Ministério da República. Não sei a altura em que isso vai, mas- o parto está muito difícil. A apresentação é má*
Os operadores, ao que parece, estão
com receio de empregar o fórceps, em virtude do nervosismo de que se acham atacados.
Há uns bons dez anos que este facto anormal se dá. Os Ministérios caem e sobem sem motivos conhecidos nem declarados.
Isto não deve continuar assim porque só pode conduzir a resultados desastrosos.
O trabalho do Parlamento tem sido nulo. Os orçamentos não se discutem, votando-se apenas duodécimos.
Fala-se em dissolução, sem se lembra* rem que atravessamos uma crise grave. A estas horas não há Orçamento, conti" nuando a viver-se' do expediente desastroso dos duodécimos.
As diversas nuances partidárias têm conduzido a este estado de cousas,
Os Ministérios sucedem-se com a maior frequência, atingindo já um carácter de escândalo nacional.
É uma situação vergonhosa para a República e para a Nação.
Se alguém tem iniciativa e pretende fazer cousa acertada, a sua tenacidade esbarra contra os maiores obstáculos: a sua obra não se completa porque é combatida sem se conhecer das suas qualidades boas ou más.
Para que cousa útil não vá para diante . logo aparecem as cascas de laranja em que fatalmente há que escorregar.
Nestas contínuas intermitências que determinam a instabilidade dos Ministérios, agrava-se de instante a instante a mo-rigeração nacional, que já deixa muito a desejar, graças aos germes históricos que actuam e apressam o advento de tam precário estado de cousas.
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tes para o seu procedimento— o Sr. Alfredo da Silva não foi preso, nã,o obstante os boatos que correram sobre a sua prisão. Pediu-se o cumprimento das disposições legais, exigiu-se um mandato imperativo e oficial e o Sr. Alfredo da Silva não foi preso.
Naturalmente, se se tratasse do qualquer desgraçado que para matar a fome de seus íilhos roubasse um pão, a estas horas já se teriam cometido todas as violências e arbitrariedades imagináveis, sem protesto! Mas não ; tratava-se de um envenenador da saúde pública, de um alto negociante, de um potentado, e tal prisão não se efectuou! £ Trata-se, quiçá, dum caso isolado, duma excepção? Não'.Casos semelhantes dão-se a todo o momento. É a protecção descarada e criminosa dos poderes públicos a todos quantos, na ânsia de enriquecer, especulam com a miséria do povo, a desgraçada, a eterna vítima.-
E contra todos estes factos que eu pró testo energicamente, que eu me insurjo violentamente. A libra fechou ontem a 5 4/4j amanhã estará a 4 e dentro em pouco teremos mergulhado no abismo.
Dizia eu há pouco, Sr. Presidente, que no dia 8 se realizariam dois congressos do Poder Judicial: um, dos oficiais de justiça, outro dos magistrados...
Esboça-se assim-um movimento que, a dar-se, surtirá efeitor desastrados e vergonhosos para a República.
O Poder Judicial é autónomo e independente pela Constituição. A República incumbe proporcionar-lhe todos os meios de tornar efectiva a sua autonomia e independência.
Aliás também o Judicial se verá forçado a enveredar pelos torpes atalhos da prevaricação.
Eis o que cumpre evitar a todo o transe.
E assim, Sr. Presidente, se os magistrados tomassem uma dura resolução, entregando ao Sr. Presidente da República os seus diplomas por não poderem viver em Portugal, isso seria uma das maiores vergonhas dos últimos tempos da República.
É preciso, Sr. Presidente, que se trate aqui, e quanto antes, da questão, mesmo com parecer ou sem ôle.
Sei, Sr. Presidente, que o respectivo projecto está na comissão, não sabendo,
porém, se ela já deu ou não o seu parecer; porém torna-se necessário, repito, que o assunto seja aqui tratado, e quanto antes.
Se bem que as nossas sessíies, Sr. Presidente, se não possam realizar por em-quanto na nossa sala, por ela se encontrar actualmente em obras, eu não tenho dúvida, logo que haja número, em propor que seja marcada sessão para amanhã, a fim de se tratar do assunto.
Torna-se necessário que o Parlamento se ocupe quanto antes da questão e olhe a sério para a triste situação em que se encontra o corpo judicial da República.
Tenho dito.
Continua a discussão, na generalidade, do parecer n.° 641-A, referente ao adiamento da encorporação de recrutas.
O Sr. Viriato da Fonseca: — Sr. Presidente : na minha qualidade de militar e como membro da comissão de guerra desta Câmara, entro neste debate, não para trazer á consideração dos Srs. Deputados maior soma e melhor qualidade de argumentos dos que já foram apresentados pelos meus ilustres colegas os Srs. Américo Olavo e Pereira Bastos, mas tam somente para definir a minha atitude e esclarecer o meu voto acerca do importantíssimo assunto que se discute e que tanto interessa à nossa nacionalidade.
Os argumentos apresentados por aqueles dois ilustres Deputados são de peso, e julgo que devem impor-se sobremaneira à consideração desta Câmara,, de forma a ela não dar o seu voto a um projecto que prejudicaria profundamente a essência e o modo de ver da nossa instituição militar.
Não venho, Sr. Presidente, discutir aqui a necessidade da existência dos exércitos permanentes na época actual.
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e conservar todo o material de guerra, e também porque as sociedades, tal como estão constituídas,, e sobretudo a nossa, parece-me que ainda não atingiram aquele brilhante e utópico estádio de civilização, progresso, bem-estar e solidariedade que porventura dispensará a existência dos núcleos militares permanentes.
As paixões humanas, as ambições, os desequilíbrios sociais são e serão ainda por muito tempo a origem de questões violentas a derimir entre os povos, e, a meu ver, por emquanto utopia é supor-se que elas poderão ser resolvidas, no seu constante entrechocar por veredictum de tribunais internacionais ou de ligas de nações.
Os precursores de tais doutrinas ainda hão-de atravessar ínuitos ciclos de progresso e evolução até que sejam realizadas as suas aspirações, se é que elas se realizarão algum dia!
É certo que todos os povos se encontram horrorizados com as peripécias que se deram na Grande Guerra e com as consequências dela e, portanto, reputam como uma das mais justas aspirações o desarmamento geral; mas o facto é que estamos muito longe da efectivação de tam sublime idea, pois vemos que todas as nações se armam até aos dentes para o que der e vier. Portanto os exércitos, o militarismo são cousas que têm de existir, infelizmente, durante muito e muito tempo, e não nos é dado antolhar a futura época em que a organização militar deixará de pesar nos orçamentos das várias nações. Essa aspiração ó como que uma linha as-simptótica que j amais encontrará a curva que define a trajectória progressiva da humanidade.
Posto isto, e não devendo Portugal, que deseja ser uma nação livre e independente, deixar de ter um exército, maior ou menor, consentâneo com os seus recursos e necessidades, de admirar é que se pretenda dar um golpe tam estranho nas nossas instituições militares desorganizando-as profundamente, tais são, como bem o demonstrou o Sr. Pereira Bastos, as consequências inevitáveis da doutrina do projecto que se discute.
Trouxe-se também à nossa consideração o argumento de que a incorporação de recrutas era prejudicial neste momento em que tanto se necessita da intensifica-
ção agrícola, visto que por virtude dela se arrancariam à agricultura grande número de braços de que ela tanto carece.
Ora este argumento cai em todos os tempos, em todos os lugares e em todas as situações, e eu não tenho visto que em qualquer parte se tenha modificado o recrutamento militar, atendendo a semelhante alegação.
O que eia vejo é que a emigração no nosso país é apavorante e aumenta dia a dia, desoladoramente, o que vem demonstrar-me que os braç@s dos trabalhadores portugueses não encontram na sua terra aquela aplicação que tam necessária lhes era, tendo que ir em terras estranhas, sabe Deus com que sacrifícios e através que desventuras, angariar os meios de satisfazem às suas mais instantes necessidades.
Daqui se conclui que à terra portuguesa não faltam braços para o trabalho, mas verifica-se infelizmente que falta trabalho para esses braços.
Será por falta de braços que temos tantos terrenos incultos, tantas minas por explorar, tantas quedas de água a aproveitar, tantos caminhos de ferro a construir, tantas energias a tirar do estado latente em que estão?
Eu julgo que outras são as causas disto, destacando eu de entre elas a desorganização social, a incúria e o retraimento do capital. Não é, pois, de aceitar a alegação de que a incorporação dos recrutas, chamando um certo número de mancebos ao^serviço militar, em cada ano e em curto período vá prejudicar o desenvolvimento intensivo da agricultura, contrariandp, o aumento de produção.
Não colhe também, a meu ver, a alegação de que, tendo os serviços militares de sofrer profunda modificação, devido aos ensinamentos da grande guerra, a instrução que actualmente damos ao soldado é improfícua por absoluta e não tem as características que a nova s ciência militar impõe.
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em métodos e em processos scientíficos. Em segundo lugar essa sciêneia deverá referir-se principalmente à técnica de conjunto, à tática, à estratégia e à organização de novos serviços, mas não virá, por certo, influir essencialmente nos processos de instrução preparatória de recrutas, que tem por fim trasformar um 'homem num soldado, adaptá-lo a essa nova vida onde ele vai ser a molécula, a parcela de corpos, com mais complicada estrutura, onde aqueles novos processos melhor e mais convenientemente se aplicarão.
A instrução do recruta é uma preparação elementar essencial, que pouco ou nada variou com os ensinamentos da Grande Guerra.
Os pequenos defeitos, as pequenas omissões que aqueles ensinamentos tenham posto a nu, devem inegavelmente ser modificados ou extirpados, mas daí a propor-se, que se adie, sine die, a instrução dos recrutas, o que equivaleria a anulá-la para sempre, é medida não só contraproducente e atentatória dos interesses militares, que o mesmo é dizer, dos da pátria, como também inútil e precária, por não ter aplicação directa e essencial na instrução dos recrutas.
Sobre a questão económica ventilada, por haver redução de despesas com a aplicação do princípio preconizado no projecto, nada digo, visto que ela já foi claramente explicada nesta Câmara pelos oradores que me precederam.
Não desejo cansar mais a atenção da Câmara, repetindo argumentos já expostos e por isso vou concluir afirmando que em face do que foi dito pelos Srs. Américo Olavo e Pereira Bastos, distintos militares e nossos prezados colegas, e ainda pelas considerações que acabo de fazer, a Câmara compreenderá bem que eu jamais poderia dar o meu voto a este projecto..
Tenho dito.
O Sr. António Granjo:—r Sr. Presidente: dizia eu ontem que só muito tardiamente se tinha travado nesta Câmara uma discussão sobre a política militar, felicitando --me, no emtanto, por que essa discussão corresse nos termos mais elevados, manifestando-se por parte dos oradores que a trataram a maior competência e patriotismo. Dizia eu, também, que já era tempo de pensarmos em modificar a actual
organização do exército, e que não havia necessidade para tanto de esperarmos os relatórios que os estados-maiores dos países beligerantes houvessem de publicar; e que mal andaríamos se estivéssemos à espera deles, porque só muito tarde eles seriam publicados, e só muito tarde os respectivos estados-maiores chegariam às definitivas conclusões a tirar c.êsses documentos. Creio eu que os relatórios dos estados-maiores russo e japonês só apareceram bastantes anos depois de terminada a guerra russo-japonesa, e os relatórios do conflito que termino'! pela vitória dos aliados serão—pareco-me—não só mais importantes quanto ao número e à qualidade das operações, mas ainda muitíssimo mais importantes "pela jnatu-reza dos novos processos táticos, pela qualidade e importância do novo material utilizado, e por outras razões ainda que são conhecidas de todos.
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O Sr. Plínio Silva referiu-se a meio de ataque que teve na última guerra um papel primordial e que no' nosso exército é inteiramente desconhecido: os tanques.
Creio que no nos,so exército nenhum oficiai se encontra especializado nó uso dessa arma, que é tam eficaz, quer sob o ponto de vista da ofensiva, quer sob o ponto de vista de revoluções internas. E tanto assim que o Governo inglês mandou para a Irlanda o seu esquadrão de tanks.
A grande arma defensiva é a artilharia de trincheira, sobre a qual nós não temos ainda nenhuma organização.
E absolutamente necessário criar um corpo de aviação comandado por um oficial superior, que a essa arma dedique os seus esforços e estados e que ofereça as qualidades necessárias de organizador e disciplinador para fazer dessa arma a quinta arma e dar a todos os portugueses a segurança que, pelo menos, temos a fiscalização das fronteiras.
Na hipótese de uma guerra com a Espanha, nós, sem o corpo de aviação, não temos tempo de fazer a mobilização de uma única divisão.
O Sr. Pereira Bastos quis justificar a actual organização do exército pelo facto de terem preparado os 110:000 homens que foram para a França e para a África.
Eu assisti à mobilização, e fui também mobilizado; assisti à forma como foram apresentados os nossos soldados, e estou convencido de que S. Ex.a considera como amargura na sua vida o facto de as circunstâncias terem impedido a sua ida para a guerra, pois a análise de visu ter--Ihe-ia dado melhores ensinamentos do que a leitura do relatório.
Eston convencido que é uma amargura da sua vida.
Mas eu digo, por mim, e pelo que vi, que se havia alguma cousa que condenasse essa organização, era a forma atri-biliária por que se fez a nossa mobilização, por que se fez o embarque e o desembarque e por 5que se organizaram as nossas forças no front.
Sr. Presidente: entendo que não é patriota aquele que oculta a verdade ao seu país (Apoiados), como entendo que é dos erros passados nização organizada; era uma desordem ordenada, ordenada, quanto a mim, porque apenas havia algumas ordens a dar. Mas não era apenas isso. Os franceses, quando se referiam ao nosso exército, empregaram esta expressão : — Pás d'admiuistration mílitaire. De facto o nosso corpo de exército, o nosso corpo expedicionário, à sombra da organização actual, teria perecido de fome e de frio, não teria guardado durante os longos meses que guardou as trincheiras, se não fosse a organização militar inglesa. Ainda, Sr. Presidente, é tempo de perdermos o receio de nos referirmos à necessidade de reduzir os efectivos do exército. (Apoiados}. Que me importa ter 8 divisões, se não tenho um único regimento? (Apoiados). Urge, por meio do estado maior, fazer um estudo profundo e cuidadoso dos novos elementos estratégicos. Creio que o nosso célebre triângulo estratégico está mais valorizado que nunca, obrigando-nos a cuidados e despesas a que não nos podemos furtar de forma alguma. As relações prováveis de certos países que se fizeram durante a guerra ou que se fizeram já depois da guerra e todos estes elementos estratégicos têm de ser levados em conta, visto que se não pode partir da hipótese que de na Europa não haverá uma guerra isolada, mas visto que partimos da hipótese que uma guerra entre os pequenos países desencadeará uma guerra mundial. Creio, e comigo está de acordo a maior parte dos oficiais superiores com quem tenho conversado sobre o assunto, creio que chegou a ocasião de reduzirmos as nossas divisões a metade, preparando cuidadosamente as quatro divisões, criando-se o corpo de aviação; dando aos serviços técnicos especializados, quer na artilharia a pé, quer na infantaria, uma educação cuidada que ó indispensável ministra-lhes. É preciso aumentar os quadros das armas especializadas, mas nunca na infantaria e cavalaria, que é preciso diminuir. i Não se pode estar a ministrar instrução de artilharia com uma simples peça!
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Não quero fazer qualquer crítica depreciativa sobre o parecer do estado maior do nosso exército, que o Sr. Pereira Bastos ontem leu à Câmara, mas devo dizer que não são desrepeitosas nem descabidas as palavras ontem proferidas pelo Sr. João Camoesas.
É possível, Sr. Presidente, que na Inglaterra, na América e possivelmente na Alemanha e no Japão, países onde a educação física é cuidada com especial carinho, no qual está incluída a instrução militar preparatória; é possível, digo, que se possa fazer um soldado num período inferior a dois meses. Mas não é isso realizável em Portugal.
. Fui soldado de cavalaria e oficial de infantaria, e verifiquei que o nosso soldado nem ao menos desarticulado estava.
É preciso prepará-lo com esforços inauditos, quer sobre gimnástica, quer sobre musculatura, e até nos regimentos há sargentos e cabos que se dedicam a esse ponto de vista.
Em Portugal não é possível ministrar a instrução a um soldado em 40 dias, e e então a pregunta do Sr. Plínio Silva tem toda a razão de ser. A proposta apresentada pelo Sr. Plínio Silva merece uma larga discussão, não só por ter sido orientada pelo espírito estudioso de S. Ex.% mas também porque tem uma grande oportunidade. Creio eu, Sr. Presidente, que já houve antes da guerra uma proposta semelhante a esta e que na ocasião foi aprovada pelo Sr. Pereira Bastos, precisamente para se fazer a mobilização do nosso corpo expedicionário, invocando até razões de economia. Sr. Presidente: o caso tem, além do aspecto técnico que foi já tratado por ilustres militares pertencentes a esta Câmara — e na discussão desse aspecto eu não quero entrar— um aspecto legal que é preciso pôr em foco. Se é certo que o Sr. Ministro da Guerra não pode, em face da lei, modificar as datas da encorporação e modificar os pé ríodos de instrução, a Câmara tem de considerar esse aspecto legal da questão, se não para lhe dar uma sanção política, visto que ela não tem cabimento pelo facto de o Governo estar demissionário, ao menos para legalizar esse acto. Em todo o caso, é lamentável que os Governos se permitam decretar fora das suas atribuições, e sempre que isso aconteça eu lavrarei nesta Câmara o meu protesto, não aplicando ao acto a respectiva sanção penal, apenas porque não disponho nem da força parlamentar nem de autoridade para o fazer. A rejeição pura e simples da proposta do Sr. Plínio Silva não equivale à legalização do acto ditatorial do Sr. Ministro da Guerra, e por isso compete-nos averiguar a forma por que esse ac;o deve ser legalizado. Chamo para isto a atenção daqueles que têm defendido íi proposta. Se os mancebos amanhã chamados a encorporarem-se no regimento ficarem em suas casas, ainda que as autoridades competentes instaurem os respectivos processos, eles poderão defender-so com êxito nos tribunais. De resto, os quartéis não comportam as duas encorporações que se pretendem fazer, e porventura tirar-se hão sortes para se saber os que devem ou não receber instrução militar, ou então dar-se há ordem às juntas de freguesia para se apurar o menor número de mancebos possível. Este ponto, que é de carácter moral, acho,-o também muito importante, porque entendo que não podemos recusar a nenhum cidadão português os moios de ensino e acção para defender a ;3ua pátria. Parece-me, pois, Sr. Preside ate, que se deve refletir maduramente sôtre o caso, não devendo tomar uma resolução precipitada. Ainda eu estou convencido de que a acumulação de mancebos dentro dos quartéis trará dificuldades de carácter técnico que são para ponderar. Creio, Sr. Presidente, que pouco valor terão as razões apresentadas de que as despesas já estão feitas para esta encorporação. São de valor e para considerar as razões apresentadas pelo ilustre Deputado o Sr. Pereira Bastos sobre esse ponto de vista, e assim eu entendo, repito, que se não deve tomar uma resolução precipitada.
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projecto de lei apresentado pelo Sr. Plínio Silva por o julgar mais razoável, tanto mais que é certo que S. Ex.a já declarou que a aprovação desta proposta pode dar lugar a injustiças e a situações de desfavor, sendo eu de opinião que se devem tomar +odas as medidas para se evitar essas injustiças.
Quaisquer outras considerações que eu haja de fazer, as farei quando se discutir a proposta do S. Ex.a, e por isso direi à Câmara que ligo uma grande importância a assuntos de carácter militar, por mínimos que me pareçam ser, quer sob o ponto de vista financeiro, quer sob qualquer outro ponto de vista, pois que são para rnim neste momento os problemas máximos.
É preciso, Sr. Presidente, que nós não nos esqueçamos da paz universal que se vai realizar, na qual se tratará do desarmamento.
Sr. Presidente: se é certo que a Inglaterra e a América do Norte passaram desde logo os seus efectivos a um número -egual, ou um ponco superior, aos que tinham antes da guerra, não é menos certo que estas duas nações estão tratando de aumentar as suas esquadras, e aumentando-as por forma a já se prever uma próxima guerra naval.
Por todas estas razões, eu entendo que o estado maior se não devia limitar a dar um parecer nos termos em que o deu, apenas olhando para a questão financeira pois ele, no meu entender, devo estudar profundamente a reorganização do nosso exército em harmonia com as novas condições criadas pela guerra e bem assim em harmonia com o papel que tenhamos a desempenhar, qner sob o ponto de vista da nossa situação no continente, quer sob o ponto de vista das nossas colónias, pois quer queiramos ou não teremos de entrar nessa próxima guerra, como tivemos de entrar na guerra que acabou.
Eu quis, Sr. Presidente, apenas defender os meus pontos de vista, esperando que os profissionais tratem do assunto de forma a que não tenhamos amanhã de atirar aos quatro ventos aquilo que estamos a fazer.
Tenho dito.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas,
O Sr. Presidente:—Está em discussão a acta.
Os Srs. Deputados que a aprovam queiram levantar-se.
Está aprovada.
O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Leote do Rego para um negócio urgente.
O Sr. Leote do Rego : — Sr. Presidente: devendo partir amanhã para Moçambique o- Sr. Brito Camacho, Alto Comissário nessa província, eu proponho que se consigne um voto de saudação a S. Ex.a, em que vá, por parte de todos os seus colegas desta Câmara, toda aquela consideração que eles têm por S. Ex.a e a confiança absoluta de que ele saberá desempenhar-se como ó devido do seu cargo. (Muitos apoiados}.
Há muitos anos que não mantenho relações pessoais com o Sr. Brito Camacho, nem eu sei já porqu«.
Há muitos anos que nos não estendemos as mãos; isso, porém, nada quere dizer. Tive, porém, sempre uma grande consideração pela inteligência de S. Ex.a e pelo seu grande patriotismo.
Eu tenho pela província de Moçambique um grande amor. Quando lá cheguei pela primeira vez, Moçambique era ainda uma aldeia, e a cidade da Beira não existia sequer. Durante as minhas, viagens eu fui vendo surgir, pouco a pouco, grandes cidades, grandes portos e grandes melhoramentos, tudo obra de portugueses: de capitais, de energias e de sold.a-dos portugueses. Moçambique pode hoje considerar-se a nossa maior glória com-tomporânea.
Eu fui companheiro de António Enes nas suas viagens a Moçambique; percorri a província toda e por lá deixei —posso dizê-lo com orgulho— alguns pedaços da minha carne. Não admira, pois, que eu tenha por essa província todo o carinho e todo o amor.
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Fazendo os meus votos por que S. Ex.a obtenha o maior êxito na sua acção go-vernativa, eu manifesto o meu pesar de não poder voltar a Moçambique comandando qualquer pequena canhoneira a verificar o esforço de portugueses doutros tempos, esforço que o alto espírito de S. Ex.a há-de constatar com profunda emoção, e a fazer tremular a nossa bandeira em todos os recantos onde ela infelizmente tam poucas vezes aparece.
Vozes:—Muito bem, muito bem.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Brito Camacho:—Não é positivamente por acaso que eu me encontro aqui, quási à hora de partir para Moçambique. Eu não podia retirar-me sem ter vindo a esta casa do Parlamento, ondo mo honro de ter assento, significar, senão tam publicamente pelo menos como eu entendia dever fazê-lo, a todos os meus colegas que me têm honrado, uns com a sua amizade, outros com a sua. consideração, os meus sinceros agradecimentos por todas as provas de estima recebidas, e ainda para lhes assegurar que, longe daqui, com eles trabalharei patriótica e devotadamente pela República.
Vindo hoje ao Parlamento pela última, vez até o meu regresso, longe estava eu de ouvir as palavras que acaba de proferir o Sr. Leote do Eêgo, e por isso mesmo eu tenho de agradecê-las, e agradeço--as com a maior comoção.
Eleito Comissário pela outra Ca s n do Parlamento, mal pareceria que eu aproveitasse esta circuntância fortuita para dizer à Câmara o que tenciono fazer como Alto Comissário da província do Moçambique. Soria talvoz, uma gentileza para esta Camará, mas podia ser um dis-primor para a outra que me elegeu, e na qual não tenho voz. Suponho, porém, quo me fazem a justiça de acreditar que ou não levo para a província de Moçambique nenhumas ambições de nome, nenhumas ambições de fortuna ou de relevo político, mas tam somente o desejo bem sincero e bem profundo de prestar ao meu país algum pequeno, mas eficaz serviço. (Aptia-
t/Otf).
Disse o Sr. Leote do Rego que são grandes, imensas, as dificuldades que vou encontrar na administração às. província.
Suponho que S. Ex.a nEo exagerou, mas tanto quanto uma boa vontade pode fazer para resolver tais dificuldades, eu espero que a Câmara acreditará que eu farei tanto quanto puder. (Apoiados). A competência, essa é apenas una hipótese admitida pelo Senado que me elegeu, e pelo Poder Executivo que fez a indicação do meu nome. (Não apoiados).
Sr. Presidente: já que tive de usar da palavra, e visto que se interromperam os trabalhos em que a Câmara estava para se tratar da minha pessoa, eu quero dizer com absoluta sinceridade que se levo para Moçambique uma grande confiança nos destinos do meu país e nos da República, eu levo também para lá uma g;?ande preocupação pelo dia de amanhã. (Muitos apoiados). E se eu sentisse, Sr. Presidente, — e nunca fui mais sincero em momento algum da minha vida! — se eu sentisse que a minha presença aqui podia de qualquer forma e medida contribuir para a resolução das tremendas dificuldades da hora presente, a Câmara far-me-hia a justiça de acreditar que eu renunciaria a tudo, e ficaria! Mas convenço-me de que a minha presença aqui, não sendo um estorvo, .não é, contudo, essencial, e que a província de Moçambique tem a ganhar, não com uma competência que mão tenho, (Não apoiados), mas com uma grande boa vontade inspirada no mais alto patriotismo. Os meus votos são para que, ainda em viagem, te.nha a notícia de que a crise política se resolveu duma r.ianeira satisfatória para todos, e que nós entramos de vez num caminho de administração e de elevada política, que, infelizmente, apenas por intermitências, temos tido desde 1910 a esta parte. (Apoiados). E não é por falta de vontade e dedicação patriótica que isso se dá, mas por um vício psicológico de quo alguns político? mal só apercebem, tanto mais que as circunstâncias ainda não foram bem difíceis e duma agudeza tal quo a muitos tenha tornado evidente o que para muitos outros é, há muito, da mais clara evidência.
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suponho que neste momento sobretudo as grandes colónias de África podem contribuir largamente para a regeneração da Metrópole sob o ponto de vista geral, mas com a indispensável condição de que a Metrópole queira regenerar-se. (Apoiados). Não vai nisto censura a ninguém, mas quero dizê-lo à Câmara, porque o facto é bem sintomático e justifica graves apreensões. .Nomeado Alto Comissário de Moçambique e tomando posse do meu lugar em 3 de Novembro, eu, que tenho de resolver graves problemas de administração, alguns dos quais de carácter internacional, parto amanhã para Moçambique sem ter tido com os Governos do meu país um momento de coversação.
Repito: não vai nas minhas palavras a mais pequena censura a quem quere que seja, mas apenas a constatação, dum facto profundamente lamentável, que eu desejo denunciar ao País na esperança que dessa denúncia resulte um pouco de contrição, para que ele jamais se possa repetir.
Os Altos Comissários têm largos poderes que lhes dão as leis, mas se eles, no exercício das suas funções, não procederem inteiramente de harmonia com a Metrópole, breve as colónias se transformarão em domínios cesaristas, o que seria grandemente prejudicial para a Metrópole e para as próprias colónias. (Apoiados).
Por isso mesmo eu não desejava partir de Lisboa sem ter com o Governo da Metrópole aquele entendimento que é indispensável haver entre quem governa superiormente e quem governa subsidiariamente. Infelizmente não o posso fazer. Pensei ainda em demorar a minha partida por alguns dias, mas em Portugal ó difícil contar por dias o tempo que duram as crises políticas, e demais começava já a correr com certa insistência que os Altos Comissários das províncias ultramarinas não passavam de Altos Comissários no Terreiro do Paço. Resolvi por isso não adiar a minha partida.
Terminando, Sr. Presidente, agradeço novamente ao Sr. Leote do Rego as palavras generosas e amáveis que me dirigiu e à Câmara a condescendência que teve em me permitir usar da palavra. A todos, a todos sem distinção de partidos com quem mantenho relações de amizade, ou simples relações de camaradagem, republicanos e patriotas como eu, protesto
o meu reconhecimento pela sua benevolência, na certeza de que encontrarão sempre em mini um colaborador dedicado e cheio de boa vontade na obra que par-lamentarmente tiverem de realizar.
O orador foi cumprimentado por todos os lados da Câmara.
O orador não reviu.
O Sr. João Camoesas: — Em nome do Partido Republicano Português associo--me gostosamente às palavras que acaba de pronunciar o Sr. Leote do Rego a propósito da próxima partida para Moçambique do Alto Comissário dessa província, o Sr. Brito Camacho. •
Apesar de todas as divergências havidas por vezes nesta Casa do Parlamento, deste lado da Câmara nunca se deixou de prestar justiça às altas qualidades de S. Ex.a, quer como republicano, quer como patriota, digno de ser apontado como exemplo (Muitos apoiados), e que. soube sempre pôr toda a sua cultura, toda a sua inteligência e todo o seu esforço ao serviço da renovação nacional.
Folgo em o constatar, falando num dos três homens que o movimento republicano trouxe às primeiras filas da vida política do meu país. Folgo de constatar que a dez anos da implantação da República esses homens se encontram na mesma situação de fortuna, um pouco mais abalados da sua saú^e, é certo, mas com a mesma decisão para porem ao serviço duma causa que é a da regeneração nacional toda a sua inteligência, saber e dedicação.
Que o seu desinteresse, abnegação e capacidade de trabalho sejam um exemplo para todos nós, são os votos com que eu quero terminar as minhas palavras neste momento.
Muitos apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. António Granjo:—Sr. Presiden-. te: parecia-me dispensável proferir também algumas palavras, em meu nome e no do Partido Republicano Liberal, acerca do Sr. Dr. Brito Camacho, que amanhã parte a desempenhar o elevado cargo de Alto Comissário da província de Moçambique.
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de nesta Câmara afirmar que a maior figura do Parlamento é o Sr. Dr. Brito Camacho; e parecia-me dispensável que o meu partido a este propósito alguma cousa dissesse, porque é sabido que o primeiro lugar dentro dele pertence a S. Ex.a pelos seus altos serviços prestados à República, pela sua culta inteligência, por ser o mais antigo parlamentar e ainda porque, tendo gerido a pasta do Fomento no Governo Provisório., deu as mais cabais provas de competência go-vernativa.
Mas, Sr. Presidente, também é certo que mal me pareceria que, prestando-se esta homenagem ao Sr. Brito Camacho, eu não usasse da palavra para lhe significar mais uma vez a consideração e dedicação que por S. Ex.a tem o seu partido e a minha pessoa. (Muitos apoiado*).
O orador não reviu.
O Sr. Pereira Bastos: — Sr. Presidente: o Partido de ReconstituTção .Nacional encarrega-me de dizer a V. Ex.a e à Câmara, com toda a sinceridade, que se associa a todas as palavras que foram proferidas pelos oradores que ma precederam com respeito ao Sr. Brito Camacho.
Todos nós temos a íntima convicção e a certeza absoluta de que o Sr. Brito Camacho, como Alto Comissário de Moçambique, marcará uma nova época para o ressurgimento nacional e n ma nova era de prosperidades para essa nossa província ultramarina.
Fazenda esta declaração em nome do meu partido, peço licença também para, em meu nome pessoal, dirigir estas palavras ao meu velho amigo e ilustre mestre Sr. Brito Camacho.
O orador não reviu.
O Sr. Ladislau Batalha: — Sr. Presidente: encarrega-me o Partido Socialista' por via da sua minoria aqui representada, de Mar a propósito da partida do Sr. Brito Camacho para Moçambique.
O Partido Socialista incondicionalmente dá a sua aprovação à feliz escolha que se fez da pessoa do Sr. Brito Camacho para aquele cargo, independentemente de liberdade de opinião que o nosso partido, representado na comissão de colónias, tivesse revelado em tese.
A maior parte dos colegas ,da comissão,
quando se tratou de discutir a conveniência ou não conveniência dos Altos Comissários, tratando-se dessa lei, sabem a nossa atitude em tam grave assunto.
Já tivemos Altos Comissários, e do vice-reis está a história portuguesa cheia. Mas, se em tese não aceitamos nem por princípio os Altos Comissários, a verdade ó esta: toda a dúvida resulta-nos principalmente de não termos a certsza de que tais logares sejam sempre preerchidos por possuidores daquela honestidade, que temos a certeza será o apanágio do Sr. Brito Camacho no exercício deste alto cargo. (Apoiados).
Quando um Alto Comissário é revestido de honestidade e alto carácter, como sucede com o Sr. Brito Camacho, a causa está bem confiada.
Nós socialistas confiamos que a defesa dos nossos interesses em Moçambique está o melhor entregue possível.
Em Portugal não tínhamos neste momento pessoa que fosse capaz de ir desempenhar tam alta missão.
O nosso sentimento não pode compreender senão que as colónias sejam rigorosamente províncias, e não humilhadas dependências da Metrópole. Só assim se devem tratar as colónias, com carinho. Muitas vezes me tenho aqui referido a isto. Neste momento, repito, ninguém haveria mais competente do que S. Ex.a para se desempenhar da missão qua lhe está confiada. Há exemplo dum Alto Comissário que exerceu brilhantemente esse c£.rgo, não sendo colonial, e prestou os melhores serviços : foi António Enes. Trabalhou muito pelo desenvolvimento da província.
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Fazendo nossas todas as frases encomiásticas e de grande justiça pronunciadas nesta Casa, confiamos em que S. Ex.a, sem ser uni colonial, achará valiosa compensação a tal falta nas altas qualidades e faculdades de que dispõe para o estudo. E é isto o mais preciso para hoje se fazer uma boa e inteligente administração colonial.
Unanimemente estamos concordes na escolha do Sr. Brito Camacho para Alto Comissário de Moçambique.
Ouvi com atenção a grandeza das suas palavras referindo-se à situação que Portugal atravessa neste momento, o que ó deveras significante para o sou carácter. S. Ex.a retira-se da sociedade republicana confiado em que comecemos a ter juízo.
Assim o desejo eu também, e creio que todos nós.
O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis): — Sr. Presidente: em meu nome e em nome da representação parlamentar do Partido Republicano Popular, é com o mais vivo prazer que me associo à proposta de saudação apresentada pelo Sr. Leote do Rego.
Sr. Presidente: somos insuspeitos procedendo assim.
Na pessoa do Sr. Brito Camacho temos estado desdo a proclamação da República em completa discordância, mas a S. Ex.;t, porém, nos tem prendido sempre uma ai tíssima consideração, filha, para uns da muita amisado que a S. Ex.a dedicam, para outros pelo muito respeito ae seu profundo patriotismo e talento, que nós lhe reconhecemos. ~
Numa terra em que todos se reputam valores, o Sr. Brito Camacho é, por voto unânime, um verdadeiro valor, valor moral, valor intelectual, valor político e valor r parlamentar.
E, pois, com pena que vemos partir um parlamentar como S. Ex.a, cujo ensinamento e inteligência à Câmara dos Deputados faz muita falta. Mas — e esta nota ó que desojo acentuar— com S. Ex.a vai a nossa esperança de que, lá fora, servirá para garantir os interesses nacionais, e o prestígio do País e da República. Com S. Ex.a vai toda a nossa esperança, e também um pouco da alma nacional, pois apesar desta hora sor bastante abalada, pola descrença em quási todos os homens
públicos, e em quási todos os partidos, nós esperamos confiantes de que melhores dias virão para a República.
Assim, eu folgarei que o Sr. Brito Camacho, ao voltar ao seio da Câmara dos Deputados, do seu regresso de África, tenha de constatar para satisfação de todos nós, que a sua acção foi profícua, como é mester.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Bartolomeu Severino: — Sr. Presidente, o Grupo Parlamentar Dissidente não podia deixar partir o Sr. Brito Camacho sem as • suas saudações, que não representam de facto um cumprimento banal, mas a expressão sincera da muita admiração que têm pelo seu profundo patriotismo e pelas suas qualidades invulgares de jornalista, do homem inteligente e de parlamentar distinto.
Não são portanto palavras sem significado e sem sentimento as que profiro, porque se não pudesse dizer-lhas abertamente, a outro incumbiria essa missão. Parte S. Ex.a numa alta missão de serviço da República e do PÍIÍS, para outro ponto da terra portuguesa, onde vai aplicar todo o seu esforço e todo o seu talento, e só esta razão justifica que o deixemos arredar de uma Casa como esta, onde tem sido um dos mais distintos ornamentos e uma das mais altas figuras.
Sr. Presidente, não podia, pois, esta Câmara deixar partir S. Ex.a sem se lhe dizerem estas palavras sinceras, levando na hora do seu embarque, mais uma vez, a certeza de que estão com S. Ex.% que o admiram, e que muito esperam do seu esforço patriótico, todos os seus colegas do Parlamento.
Proponho portanto que a Câmara vá amanhã, à hora do embarque do Sr. Brito Camacho, por uma sua delegação, dospe-dir-se do S. Ex.a (Apoiados}.
E uma prova justa e merecida; é uma homenagem que se presta enternecida-mcnte e com muito respeito. (Apoiados).
Vozes: — Muito bem. O orador não reviu.
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bem como a saudação feita ao Sr. Brito Camacho. Vai pois nomear-se a delegação.
O Sr. Brito Camacho: — Agradeço aos ilustres Deputados a maneira afectuosa como se me dirigiram e as palavras imerecidas pronunciadas a meu respeito
A todos o mento.
O orador não reviu.
meu reconhecido agradeci-
0 Sr. Presidente : — Vai ler-se a proposta de duodécimos mandada para a Meza pelo Sr. Ministro das Finanças.
Leu-se, foi admitida e entrou em discussão na generalidade, sendo aprovada a urgência e dispensa do Regimento.
Proposta de lei
Continuando sem aprovação o Orçamento Geral do Estado para o ano económico de 1920-1921 e tornando-se necessário habilitar o Governo com as autorizações necessárias para ocorrer ao pagamento das despesas públicas no próximo mês de Março, tenho a honra de apresentar a seguinte proposta de lei:
Artigo 1.° É o Governo autorizado a despender, no mês de Março de 1921, até a quantia de 36:170.618089 para ocorrer ao pagamento das despesas dos serviços públicos, relativas ao ano. económico de 1920-1921, de conformidade com as propostas orçamentais para o referido ano económico, tendo, porém, em consideração as alterações apresentadas ao Parlamento pelos Ministros das Finanças em sessões de 26 de Fevereiro e 12 de Abril de 1920 e as provenientes da publicação de leis ainda não atendidas nas referidas propostas e do aumento de dotações resultantes do agravamento de encargos para o bom e regular desempenho dos serviços públicos.
§ único. A importância a que este artigo se refere é distribuída pelos diversos Ministérios da seguinte forma:
Ministério das Finanças. Ministério do Interior . Ministério da Justiça. . Ministério da Guerra . Ministério da Marinha .
Soma e segue . . .
10:546.441060
3:326.402069
567.101060
5:056.374036
2:251.658077
21:747.979002
Transporte.....21:
Ministério dos Negócios Estrangeiros.....
Ministério do Comércio e Comunicações.....2:
Ministério das Colónias. .
Ministério da Instrução Pública ........
Ministério do Trabalho. .
Ministério da
Agricultura
747.979002 185.371072
253.770068 387.927023
982.321038 928.623074 225.593020
26:711.586097
Art. 2.° A liquidação das despesas do ano económico de 1920-192 L, emqnanto vigorar a autorização a que se refere o artigo anterior, não está sujeita a cabimento no duodécimo das somas dos artigos e capítulos das propostas orçamentais para o referido ano económico, uma vez que não seja excedida a importância global relativa a cada Ministério.
Art. 3.° E o Governo autorizado a abonar, no mês de Março de 1921, as subvenções e as ajudas de custo de vida estabelecidas aos funcionários civis e militares, os subsídios e compensações para melhoria de alimentação e para fardamento às forças militares de terra e mar, o aumento de rações a dinheiro às praças da armada e o reforço para despesas com propostos e mais empregados das tesourarias da Fazenda Pública e execuções fiscais, a que se referem os decretos n.os 6:448, 6:475, 6:479 e 6:480, respectivamente de 13, 27 e 29 de Março, e n.os 6:524, 6:952, 7:022, 7:033 e 7:191, respectivamente de 10 de Abril, 21 e 29 de Setembro, 4 de Novembro e 11 de Dezembro de 1920, e bem assim as compensações para fardamento e gratificações à polícia de que tratam o artigo 4.° e seu § único da lei n.° 1:097, de 29 de Dezembro de 1920.
Art. 4.° Os abonos a que se refere o artigo anterior são fixados, em relação ao próximo mês de Março de 1921, nas seguintes importâncias:
Ministério das Finanças. . Ministério do Interior . . Ministério da Justiça. . . Ministério da Guerra . . Ministério da Marinha . . Ministério dos Negócios Estrangeiros .....
2:500.000000 1:208.329014 120.000000 1:400.000000 639.999025
25.703053
Soma e segue ....
5:894,031092
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Transporte .....
Ministério do Comércio e Comunicações ....
Ministério das Colónias. .
Ministério da Instrução Pública ........
Ministério do Trabalho . .
Ministério da Agricultura
5:894.031092
1:400.000000 20.000000
1:500.000000 345.000^00 300.000000
9:459.031092
§ único. A despesa de que se trata será classificada na despesa extraordinária dos Ministérios.
Art. 5.° Para fazer face às despesas extraordinárias resultantes da guerra, que haja a satisfazer no mês de Março de 1921, de conformidade com o artigo 1.° da lei n.° 856, de 21 de Agosto de 1919, fica o Governo autorizado a despender até a quantia de 333.0000, correspondente ao duodécimo respeitante àquele mês, da respectiva verba inscrita na proposta orçamental para o Ministério das Finanças, para o referido ano económico de 1920-1921.
Art. 6.° Continua o Governo autorizado ^a alterar, segundo as conveniências urgentes do serviço e por meio de decreto publicado no Diário do Governo e por todos os Ministros assinado, a? verbas orçamentais das propostas dos diferentes Ministérios, para o corrente ano económico, sem contudo exceder a soma das importâncias fixadas para cada um dos Ministérios na presente lei e nas leis n.os 997, 1:004, 1:070, 1:078, e 1:097, respectivamente de 30 de Janho, 31 de Julho, 30 de Outubro, l e 29 de Dezembro de 1920.
§ único. As propostas orçamentais do ano económico de 1920-1921 consideram--se reforçadas com as importâncias correspondentes a uma sexta parte das quantias a despender no segundo semestre do referido ano económico, constantes dos mapas anexos aos decretos publicados em harmonia com o artigo 5.°, da lei n.° 1:078, de l de Dezembro de 1920.
Art. 9.° Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das-Sessões da Câmara dos Deputados, 23 de Fevereiro de 1921.—Líber ato Damião Ribeiro Pinto.
Está conforme.— Direcção Geral da Secretaria do Congresso da República, em 23 de Fevereiro de 1921. —O Director Geral, João Cai-los de Melo Barreto.
O Sr. Manuel José da Silva (Oliveira de Azeméis): — Sempre que à Câmara tem sido trazido por parte do Governo, e por falta de aprovação do orçamento, um pedido de duodécimos, o Partido Popular tem manifestado o seu profundo desgosto. {Apoiados}.
E am facto verdadeiramente lamentável que, passados dois anos depois de firmado o armistício, e quando todos os países têm procurado fazer as suas reformas de après Ia guerre, dando o balanço às suas necessidades, é - de lamentar que Portugal, que tinha mais necessidades e obrigação do que qualquer outro país, de pôr perante o mundo cl.ira e iniludivel-mente da sua situação financeira, até hoje não tenha procurado fazê-lo.
Vivemos há cinco anos em regime de duodécimos e autorizações que aos outros pode dar a impressão, pela certa, de que somos um país que não se sabe governar.
O Parlamento da República, e não é esta a altura de averiguar a quem cabem as responsabilidades, preocupando-se com questões minúsculas, de campanário por vezes, tem votado ao mais completo desprezo a sua política financeira.
Estamos hoje vivendo na ignorância completa, quási todos, da situação do Tesouro Público português.
Não temos até hoje feito um plano de acção económica definida, um estudo e balanço das nossas necessidades, a averbação meticulosa das possibilidades, para vermos quais as fontes possíveis de recursos, onde possamos ir buscar os elementos para fazer face a essas necessidades.
Tem-se abusado do processo da circulação fiduciária, estabelecido para cobrir os deficits orçamentais.
A consequência de tal política é estar tudo agravado dia a dia, e se as dificuldades são hoje enormes, amanhã sê-lo hão ainda mais. (Apoiados).
Mas o próprio Ministro das Finanças pode avaliar da extensão do déficit.
Este é o país, pode dizer-se, das cousas raras.
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Diário da Gamara dos Deputadoi
Em Portugal até se vê este facto: dar--se uma crise parcial num Gabinete pela saída do seu Ministro das Finanças e fazer-se o preenchimento dessa vaga, sem que ao Parlamento o Ministro que a vai ocupar venha dizer quais os seus pontoa de vista em matéria de finanças, qual o seu p]ano de acção financeira! Diz-se que a razão por que se deu este facto está na circunstância verdadeiramente anormal de ter de se preencher a vaga de uma pasta por um Ministro dum Governo que está demissionário. Mas a única conclusão a tirar deste facto verdadeiramente extraordinário é aquela que eu tirei do início: vivemos no país das cousas raras.
Em Portugal temos problemos comple-xíssimos a encarar, e um dos mais com-plexosj, pelo somatório enorme de factores que nele intervêm, é o problema cambial. Num momento em que aos Governos incumbe encarar de frente problemas complexos como ó porventura o problema cambial, vemos que é preenchida interinamente a pasta das Finanças por um membro do Ministério dimissionário. Isto, Sr. Presidente, só fica devidamente classificado dizendo-se que é verdadeiramente assombrosa a vertigem com que os câmbios descem, as manobras que de instante a instante se fazem na praça, revelações ainda ontem trazidas a esta Câmara pela boca do ex-titular da pasta das Finanças, Sr. Cunha Leal. Essas revelações dão a todos nós a corteza, impõem a todos nós a convicção e o reconhecimento de que ó absolutamente necessário que na pasta das Finanças se não sente qualquer, mas um verdadeiro valor, e não interinamente, mas duma forma efectiva.
O ex-titular da pasta das Finanças, Sr. Cunha Leal, referiu ontem à Câmara este íacto verdadeiramente assomboso, e que se não fosse a notória falta de sensibilidade teria conseguido levantar um movimento enorme por parte da Câmara.
Disse S. Ex.a que na praça, e aproveitando a convicção em que os elementos da finança estavam de que ao Governo era necessário, para se cobrir das quantias de que carece, adquirir um montante grande de libras, estava a ser feita, por empregados de bancos que têm relações com o Estado, uma altíssima especulação. E para quê? Para amanhã, quando o Estado tiver necessidade de ir adquirir íi
praça, e por intermédio díisses bancos que com o Estado têm relações, as cambiais precisas para se cobrir, os elementos a eles afectos já tenham na mão essas cambiais com as quais negociarão largamente. Em presença deste facto, que não pode ser, e não é decerto do desconhecimento da Câmara, urgia imediatamente a presença do Sr. Ministro das Finanças para que dissesse ao País que providências tinham sido tomadas, talvez ontem mesmo.
O momento que passa não se compadece com esta morosidade.
O Partido Eepublicano Popular não pode recusar-se a votar a proposta de duodécimos, porque a reputa absolutamente necessária para a vida do Governo, mas, ao dar o seu voto de aprovação, não pode deixar também de manifestar perante a Câmara e perante o país o seu profundo desgosto em ver que a dois anos depois de firmado o armistício não tenhamos feito ainda a discussão dum orçamento. Representa também um enorme desejo do Partido Republicano Popular que as Câmaras que constituem o Congresso da República, em vez de se preocuparem com pequeninos nadas, dando ao País a impressão de que estamos em Bisâncio, em vez de estudar projectículos de campanário, estudar o mais importante dos problemas que ó o Orçamento, porque implica com a vida geral do Pais.
Tenho dito.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas,
O Sr. António Granjo: — Sr. Presidente: por parte do grupo parlamentar do Partido Republicano Liberal mais uma vez quero manifestar a necsssidade que há de se discutirem os orçamentos. É indispensável que entremos em vida nova.
E lamentável, como muito bem disse o Sr. Manuel José da Silva, que a dois anos do armistício não tenhamos discutido um orçamento. Mester ó que essa discussão se faça.
Votamos o duodécimo soíi) a pressão das circunstâncias, mas esperamos que o novo Governo se apresse a lazer discutir o Orçamento.
Tenho dito.
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O Sr. Rego Chaves: — Sr. Presidente: não reeditarei novamente as considerações que já tive ocasião de fazer nas vezes que se têm discutido na Gamara dos Deputados projectos de duodécimos; reservarei, e o Partido de Reconstituição Nacional reservará também, para momento oportuno quaisquer considerações sobre a elaboração dessas propostas de duodécimos.
O Partido de Keconstituição Nacional deseja que o novo Governo promova a rápida aprovação do Orçamento Geraldo Estado, como único meio de regularizar a sua administração.
É realmente para lamentar que há dois anos vivamos sem o Orçamento do Estado, embora esse documento tenha sido apresentado à Câmara o mais possível dentro dos prazos a que a lei, obriga.
Parecia-me, portanto, conveniente que em todos nós se radicasse a idea de que o próximo mês de Março não findará sem que o Orçamento Geral do Estado fique discutido e aprovado. Outras medidas há de maior urgência e importância para a vida administrativa da República que se não compadecem com as delongas que costuma haver nas discussões dos orçamentos e na discussão de mil e um pro-jectículos que não interessam à vida do País.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: —Os Srs.Deputados que aprovam o projecto na generalidade queiram levantar-se.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente:—Vai entrar em dis-cusssão na especialidade.
Tendo em seguida sido jiostos em discussão os artigos L°, 2.°, 3.°, 4.°, 5.°, 6.°, § único do artigo 6.° e artigo 7.°, foram os mesmos aprovados sem discussão.
O Sr. Mariano Martins: — Peço a V. Ex.a o obséquio de consultar a Câmara sobre se dispensa a última redacção para o projecto que acaba de ser aprovado.
Consultada a Câmara) resolveu afirmativamente.
O Sr. Presidente:—Eu devo participar à Câmara que a comissão nomeada para
se ir despedir do Sr. Brito Camacho é composta, além da Mesa, pelos seguintes Srs. Deputados ^Ferreira da Rocha, Leote do Rego, João Águas, Ladislau Batalha, Américo Olavo e Bartolomeu Severino.
O Sr. João Bacelar: — Eu peço a V. Ex.a o obséquio de submeter à. apreciação da Câmara o meu requerimento para entrar amanhã em discussão, mesmo sem parecer, a proposta de lei da autoria do Sr. Ministro da Justiça, abrindo um crédito a favor do mesmo Ministério.
O Sr. Eduardo de Sousa:—Eu desejava que V. Ex.a me pudesse dizer quando é que continua em discussão o projecto n.°,599-H, que trata dos hospitais.
E necessário que esse projecto seja discutido com a máxima urgência.
O orador não reviu.
O Sr. Ladislau Batalha: — Sr. Presidente : pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte
Requerimento
Requeiro que na sessão de amanhã, 24, seja dado para «antes da ordem do dia» o projecto que trata dos interesses judiciais, quer já tenha parecer ou não.
Lisboa, 23 de Fevereiro de 1921.— Ladislau Batalha.
O Sr. Presidente: — Eu devo dizer a ~V. Ex.a que a Câmara tomou ontem uma resolução a esse respeito.
A Câmara deliberou que, logo que haja parecer impresso, ele seja dado imediatamente para discussão.
Ó Sr. Presidente:—Vai ler-se a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Francisco José Pereira, para a qual pediu urgência.
Consultada a Câmara resolveu afirmativamente.
O projecto de lei vai adiante por extracto. .
O Sr. Presidente:—Vai ler-se a proposta mandada para a Mesa pelo Sr. Sá Pereira.
Foi rejeitada.
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O Sr. Sá Pereira: — Requeiro a contraprova.
Confirmou-se a rejeição.
O Sr. Santos Graça: —Peço a V. Ex.a que dê para ordem do dia de amanhã o projecto n.° 503-B.
O Sr. Presidente:—Vai continuar em discussão o projecto n.° 641-A, e tem a palavra o Sr. Pereira Bastos.
O Sr. Pereira Bastos: — Sr. Presidente: foi com a maior satisfação que assisti ao discurso proferido pelo Sr. António Granjo, que manifestou não só a sua já conhecida qualidade de homem público e de homem de estado, como também a qualidade de um profissional completo.
O seu discurso, porém, tem duas partes, uma que se refere à actual organização do exército, e a outra que se refere à proposta em discussão, e as suas considerações a esse respeito vieram reforçar aquelas que eu já tinha feito nesta Câmara.
Disse S. Ex.a que nós não podemos esperar pelos relatórios dos exércitos aliados, porque isso levará ainda muito tempo, para proceder à reorganização do nosso exército.
Eu já disse ontem aqui por mais de uma vez que reconheço a necessidade de se começar a organizar o nosso exército ; porém, entendo que não é este o momento oportuno para se fazer isso de ânimo leve.
Não quero dizer com isto que se espere pelos relatórios dos exércitos aliados, pois que não há dúvida que isso leva ainda muito tempo.
Acho eu que essas alterações devem ser feitas sem pôr de parte por completo o que está feito, por isso que, tendo tido a consagração da guerra, não é justo quo, de ânimo leve se ponha de parto, repito, o que está feito, simplesmente pelo prazer -de apresentar um trabalho novo.
S. Ex.a referiu-se ainda àquilo que viu fazer na mobilização.
Sr. Presidente: a organização não tem culpa dos defeitos que a mobilização acusou.
As experiências de mobilização que deviam ter sido feitas por ocasião das escolas de repetição não se fizeram sempre;
houve apenas três anos em que essa experiência se fez, e cousa curiosa, no ano em que, justamente, se queria dar início à nossa preparação para a guerra deixaram de se fazer as escolas de repetição com o pretexto de se não ir para a guerra. Se os nossos concidadãos que em caso de guerra são chamados às fileiras tivessem tido a necessária instrução militar, não se teriam manifestado certamente os defeitos consideráveis que o Sr. António Granjo viu.
Mas, há mais; essas experiências de mobilização que eram as escolas de repetição não tinham unicamente por fim encaminhar os militares no seu dever, mas tinham também o fim de modificar o procedimento das nossas autoridades civis que, por via de regra, em questões militares são dum completo e absoluto desprendimento.
Posso garantir a V. Ex.£> e à Câmara que a maior parte das faltas cometidas pelas praças licenciado^ não são da sua responsabilidade mas da responsabilidade das autoridades civis que chegam por vezes a não afixar os próprios editais que os comandantes das unidades lhes transmitem já prontos, editais que já vão prontos e a que apenas falta a goma para colocar nos sítios respectivos. Portanto todos esses males, todos esses defeitos que S. Ex.a viu por ocasião da mobilização não são da culpa da organização mas da falta de exercício, de treino* e de muitas outras cousas que se dão num país onde a gente que sabe ler os editais que se publicam é muito pouca.
Reíeriu-se também S. Ex.a aos processos novos de combate que certamente podem ter influído, e hão-de influir, naquilo a que nós profissionais chamamos tática, mas, na parte orgânica, não influiu na maneira como se .mobilizai-am efectivos tanto em França como cá.
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Disse eu ontem, e S. Ex.a parece que constatou esse facto com certa admiração, que nas futuras alterações se torna necessário desenvolver os especialistas, levando esse desenvolvimento a uma conclusão oposta àquela a que o Sr. Plínio Silva chegava, qual era a de que seria aumentar os quadros. E que, Sr. Presidente, eu chamo quadro a todos os especialistas , e tam especialista é o oficial que tem funções de comando, como o sargento, como os simples soldados que têm determinados serviços a desempenhar, como os homens da aviação, os condutores de automóveis, os metralhadores, cujas especialidades já existiam na organização e que a última guerra revelou deverem ser ser desenvolvidas. Ninguém, portanto, poderá recrutar estes especialistas, se não houver um pessoal suficientemente numeroso que se demore nas fileiras o tempo necessário não só para se fazer a selecção, como para se aperfeiçoarem os seleccionados.
Disse, também, o Sr. António Grranjo que um dos factos que se tinha constatado no última conflito foi de que, se não fosse a administração militar inglesa, o nosso exército teria passado fome. Não posso, Sr. Presidente, aceitar esta afirmação assim; por isso que todos sabem que desde o início ficou assente que a administração que havia de servir o exército português era a administração ingleso, de modo que, não se tendo posto à prova a nossa administração militar em todos os seus escalões, não sei como se possa concluir que ela não estava à altura de desempenhar o seu papel.
Estou intimamente convicto de que, se porventura se tivesse dado à nossa administração militar o encargo completo de fornecer ao exército português tudo quanto respeita aos serviços de alimentação e fardamentos, ela havia de empregar todos os esforços para, dentro dos recursos quê lhe tivessem sido prestados, bem cumprir a sua missão. (Apoiados).
Sei, por ouvir contar, que algumas deficiências houve. Elas, porém, não se deram por culpa da administração militar portuguesa ou inglesa, mas de um serviço que havia à retaguarda, e foi assim que por vezes a organização dos transportes prejudicou completamente os planos do estado maior, de tal maneira que, estando'
tudo preparado para o embarque, unidades houve que foram aos pedaços.
O Sr. António Granjo: — <_ de='de' nossos='nossos' estavam='estavam' português.-o='português.-o' lição.='lição.' parte='parte' _.as='_.as' do='do' dá-ine='dá-ine' pessoais='pessoais' sempre='sempre' tirar='tirar' adminis-ção='adminis-ção' em='em' va='va' todas='todas' serviços='serviços' eu='eu' as='as' está='está' licença='licença' qualidades='qualidades' militar='militar' seja='seja' que='que' foi='foi' dessa='dessa' respectiva='respectiva' brio='brio' ex.='ex.' oficial='oficial' _='_' a='a' os='os' e='e' português='português' devíamos='devíamos' guerra='guerra' qualquer='qualquer' oportunidade='oportunidade' demonstrou='demonstrou' o='o' p='p' produzidas='produzidas' minhas='minhas' deficiência='deficiência' significar='significar' deficientemente='deficientemente' considerações='considerações' quis='quis' organizados='organizados'>
O Orador:—Referiu-se ainda o Sr. António Grranjo à necessidade de redução de divisões. Isto não interessa completamente às condições básicas da nossa organização, nem também é um assunto que apresente melhoria ou não de uma organização. O número de divisões não pode ser arbitrariamente estabelecido. A organização baseia-se em que todos os cidadãos são soldados quando for preciso, de maneira que o número de divisões, de regimentos tem de ser aquela que convenientemente enquadra as possibilidades militares da nação. Se tivermos em paz o esqueleto demasiadamente reduzido, teremos que, à pressa, fazer tudo, absolutamente tudo, na ocasião em que for necessário pôr o exército em pé .de guerra.
Um aparte que não se ouviu do Sr. Ma-nuelJosé da Silva (Oliveira de Azeméis).
O Orador: — O Sr. Manuel José da Silva, interrompendo-me, apresentou agora, como grande argumento, como consideração de grande valor o facto de que não há uma companhia que tenha todos os artigos de que precisa, mas a organização não tem nada com o haver ou não haver artigos, pois que isso não é uma questão de organização, mas de material e de dinheiro.
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ítiéri* d*
A nossa organização de 1911 não fala em material, nem o tinha de fazer, porque pertence ao Poder Legislativo fornecer ao Executivo os meios necessários para que essa organização pudesse funcionar rapidamente como era preciso. Porém, circunstâncias de várias ordens impediram que essa organização pudesse ter os seus efeitos.
São, pois, repito, duas questões coin-pletamente diferentes, porque se vamos a fazer uma organização, neste momento, tomando por base os meios de acção de que podemos dispor, então, Sr. Presidente, eu não posso continuar as minhas considerações .. .
O Sr. Presidente:—Peço a atenção da Câmara.
O Orador: — Sr. Presidente: eu dizia que não podia continuar as minhas considerações, desde que me pusessem a questão como parece aqui se pretendeu fazer, isto ê, tomar como base para uma organização, apenas o material de que podemos dispor.
O Sr. Presidente:—Era tal o barulho que se fazia na sala, que não pude compreender as palavras de V. Ex.a, e por isso chamei a atenção da Câmara.
O Orador :—Por isso repeti o que tinha dito.
Mas há mais, Sr. Presidente, nós assistimos ao seguinte facto: é que tendo nós as tais 8 divisões, e tendo mandado para França um corpo de exército, que corresponde a duas, nós assistimos à rapidez que houve em promoções e que foram provenientes exactamente da necessidade que havia de promover rapidamente aos postos superiores, a fim de termos oficiais em condições de entrarem na guerra.
Devo também dizer à Câmara que a a campanha que se fez naquela ocasião, contra a, quantidade de oficiais que foram à junta, era tudo quanto havia de mais justo, porque nessa altura foram reformados por atacado aqueles que tinham de ser reformados às doses.
Como muito bem disse o Sr. António Granja £ como é que, numa guerra mundial ou numa guerra particular não se pode pôr em acção^todos os efectivos a
que ela nos pode obrigar, se aão tivermos, desde o tempo de paz, um núcleo de unidades que possa colocar êíse desdobramento em condições aceitáveis?
S. Ex.a disse que a guerra não voltará tara cedo. Eu estou convencido de que isto foi prosa celestial, e que, pelo contrário, estou convencido de que a f atura guerra já está engatilhada.
A nossa independência de 1640 foi extraordinariamente influenciada, coadjuvada, sob todos os pontos c:e vista, pela guerra dos 30 anos, constituindo mesmo um seu episódio. Na guerra de sucessão de Espanha, que foi uma guerra europeia, tivemos de entrar^ como nr. dos 7 anos entre a Áustria e a Alemanha, como na da Eevolução, como na napoleónica, e, finalmente, na grande guerra todos reconhecem que não podíamos deixar de tomar parte. (Apoiados).
^Como havemos nós de partir do princípio de que as divisões devem ser duas ou três, quando não se sabe ás condições em que porventura amanhã teremos de entrar em campanha, qual será o teatro da guerra ?
Eu não disse nada que se oponha a tocar na organização. Simplesmente o que desejo frisar bem é que seria da maior inconveniência estar a fazer modificações profundas sem o estudo das estações técnicas que á esses trabalhos dão o melhor do seu esforço e sem sabarmos bem a orientação daqueles países que estão em condições de fazer experiências.
Aludiu o Sr. António Granjo aos curtos períodos de instrução. Não M dúvida d© que se reconhece que têm de ser aumentados porque há que ensinar mais alguma cousa ao soldado, mas, assim, cairemos de novo na questão de dinheiro e de material, por isso que, evidentemente, não podemos ensinar essas cousas novas sem que tenhamos o respectivo material de ensino que é, ao mesmo tempo, material de combate e de guerra. Se todos têm dito — e é verdade — que se torna mester comprimir as despesas, cue em consideração tem de se sobrepor a qualquer outra, ^ corno é que poderemos ter esperanças de vir a haver esse material?
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$essão de 23 de fievoreiro de
O Orador: — Disse agora o Sr. Aguas, em aparte, e eu peço licença para o repetir: façam-se reduções, mas não se fechem as portas.
Igualmente o Sr. António Q-ranjofalou da educação física. Não sou orador, não sei empregar mais de uma palavra para expressar uma idea, não sei fazer longos discursos, como também não me habituo a ouvi-los, mas parecia-me ter dito ontem o bastante para mostrar que tenho pela educação física a maior consideração, tendo tido até ° ensejo de me referir a certos factos passados pelo Ministério da Instrução, como seja o de haver funcionários encarregados dos respectivos serviços e para eles não existir material.
A gimnástica não pode ser de forma alguma o cansaço. Pelo contrário, deve dirigir-se a lição sem a fadiga.
É esta a razão, certamente, -porque o Estado Maior propôs para se cortar. Alguma cousa era preciso cortar. Cortou-se, portanto, no tempo destinado à educação física. O relatório do Estado Maior manifesta claramente e lamentou-se de ter feito o corte por questões de ordem financeira. Disse o Sr. António Granj o que eu tinha concordado... O Sr. António Gr anjo {interrompendo}:— Não vale a pena discutir esse facto. O Orador: — É um engano. Houve necessidade de licenciar em 14 de Maio. Em 1914 houve escola de recrutas, e em 1915. Em 1916... O Sr. Plínio Silva (interrompendo): — Houve necessidade de licenciar algumas unidades. O Orador:—Perfeitamente. Só algumas unidades. Em 1916 houve escola de recrutas. Houve outra em Torres Vedras. Foi por atacado. Em 1917 entrámos na guerra e houve escola de recrutas. Em 1918... não estava em condições de me encarregar de cousa alguma. Em outros anos houve acontecimentos políticos, não havendo maneira de organizar esta escola. Não me lembro também se se-deixou de fazer escola de repetição. O Sr. António Granjo:—Foi a proposta apresentada pelo Sr. Afonso Costa, ou defendida. O Orador:—Não me recordo. Na certeza, porém, de que não houve nenhuma situação ou caso que pudesse ter o aspecto de encerrar essa escola. Posso garantir que a instrução se havia de fazer. Estou, porém, no campo da hipótese. Custa-me aceitar que V. Ex.a esteja tam equivocado. Poderia, emfim, por qualquer circunstância imperiosa ter concordado com alguma pequena modificação quanto à incorporação. O que jamais poderei ter feito é concordar com o adiamento èine die da escola de recrutas. Eu não esqueço que vivo num país em que não se trabalha senão de rasgão. Ou há um movimento de entusiasmo e vai tudo por diante, ou então, não sendo assim, nada se faz. Não há persistência. Não há a fria coragem, não há a fria intenção sem grandes discursos, que consiste em fazer com que os homens encarregados de executar \irna determinada cousa tenham tanta vontade daqui a um ano como tinham no início do seu objectivo. Votado agora o adiamento, há-de haver depois grandes dificuldades em voltar a chamar os mancebos às fileiras. Eles hão--de contar com novos adiamentos. Sr. Presidente: o Sr. António Granjo, na segunda parte do seu discurso, veio com as suas considerações reforçar as que eu já havia feito. Reconheceu S.Ex.aque não é conveniente aprovar o projecto do Sr., Plínio Silva. É este o ponto principal da discussão. Peço, portanto, à Câmara que me desculpe o eu ter divagado em considerações alheias ao projecto. Sr. Presidente: não posso deixar de acompanhar o Sr. António Granjo no apelo que S. Ex.a fez à Câmara, quando chamou a atenção dela para as questões militares.
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fiiário da Câmara dos Deputados
tos militares nesta Câmara, nem sempre ela ó tratada, ou, pelo menos, ouvida com o cuidado com que realmente esta o tem sido.
Faço votos por que o Parlamento do meu país não esqueça as palavras do Sr. António Granjo, aqui proferidas, lembrando-se bem que não é na ocasião do perigo, na ocasião em que a guerra estala, > que devemos criar exércitos.
Poderemos receber nessa ocasião, duma potência aliada, o material de guerra que necessitemos e ela nos possa fornecer; e temos, Sr. Presidente, de constatar que, infelizmente, em todas as campanhas que têm havido nos tempos modernos, em que temos sido arrastados à guerra, tem sempre sucedido essa circunstância. São os nossos aliados que fornecem o material de guerra, e até —cousa triste!— por vezes são os aliados que nos fornecem os generais.
Mas, Sr. Presidente, o que eles não podem fornecer são os nossos soldados. E, para que eles estejam em condições de poderem fazer uso desse material, é necessário que no tempo de paz aprendam tudo quanto podem aprender e se preparem tanto quanto possam para que o material não seja uma cousa nula para
Kenovando o meu voto para que não seja votada pela Câmara este projecto, eu tenho a certeza que se pratica um acto patriótico e de segurança para a Kepú-blica.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando restituir, a? notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
Os apartes não foram revistos pelos oradores que os fizeram.
O Sr. Plínio Silva:—V. Ex.a Sr. Presidente, informa-me quanto tempo tenho para usar da palavra?
O Sr. Presidente:— Tem V. Ex.l< vinte e cinco minutos.
O Orador:—Vou ser muito breve pars, que também a solução seja breve.
Houve uma parte das minhas considerações que nenhum orador refutou, e & que o Sr. António Granjo em especiai
se referiu; diz respeito à ilegalidade das ordens dadas pelo Sr. Ministro da Guerra.
Uma vez reconhecido pela Câmara que este facto não foi refutado por nenhum dos oradores que atacaram o projecto, acho que o Poder Legislativo não pode deixar de afirmar essa opinião. Por isso mando para a Mesa uma moção que passo a ler:
Foi lida no Mesa e admitida a seguinte
Moção
A Câmara dos Deputados, considerando que as ordens dadas por S. Ex.a o Sr. Ministro da Guerra demissionário, relativamente à Escola de Recrutas no ano de 1921, alterando a sua duração e datas de encorporação, estar fora das suas atribuições, pois que assuto de Tal natureza é da exclusiva competência do Poder Legislativo, considera-os nulos o de nenhum efeito. —Plínio Silva.
O Sr. Helder Ribeiro: — Sr. Presidente: fazia tenção de entrar no debate em discussão, acerca de um projecto que sob o ponto de vista militar é absolutamente errado e falso, embora orientado pelo desejo de atender às circunstâncias difíceis do Tesouro. Só por esse lado se justifica sua apresentação; mas, ao fazer tenção de entrar nesse bebate, mal eu supunha que apareceria o facto estranho de se apresentar, quási no fim da discussão e quando o apresentante desse projecto afirmava ia ser breve porque a matéria estava discutida, uma moção de censura a um acto do Sr. Ministro da Guerra, exactamente no momento em que S. Ex.a está demissionário.
O Sr. Plínio Silva:—Nada tem uma cousa com outra. O Sr. Ministro já deu o exemplo de abandonar a sua cadeira de Ministro para vir discutir como Deputado. Podia ter vindo aqui.
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Sessão de 23 de Fevereiro de 1921
numa discussão que é absolutamente técnica, uma moção de carácter político, e exactamente quando se julgava que a discussão era apenas inspirada no desejo de conciliar as circunstâncias da defesa militar com as circunstâncias aflitivas do Tesouro. É nesse momento que alguém vem censurar —pasme a Câmara!— um Ministro que foi ao encontro dessa idea, não indo, contudo, até o princípio da destruição da força armada. (Apoiados). l Foi o Ministro ao encontro dessa idea estabelecendo como medida transitória no ano corrente a redução do tempo de instrução dos recrutas, e quere-se censurar esse mesmo Ministro por esse facto!...
Mal vão aqueles, Sr. Presidente, que na hora presente, em que os desorientados, numa errada concepção, clamam que o equilíbrio do nosso Orçamento advirá da aniquilação da força armada, apresentam uma moção política "contra um acto dum Ministro que foi ditado pelas circunstâncias de querer conciliar as necessidades do Tesouro com as necessidades da força armada.
Mas não procurou o apresentante da moção ver ou prescrutar as razões por que o Sr. Ministro da Guerra tomou as suas medidas. Se o Sr. Deputado reparasse na época em que se devia de fazer a encor-poração dos recrutas, notaria a impossibilidade em que o Sr. Ministro se encontrava de trazer ao Parlamento 'qualquer medida para evitar essa encorporação. Ela «devia de fazer-se na primeira quinzena .de Janeiro, as ordens tinham de ser dadas nesse sentido com a atecedência devida; era necessário,,pois, que qualquer alteração que se fizesse na época da encorporação dos recrutas, fosse determinada e comunicada com o tempo preciso. Mas o Parlamento encontrava-se fechado e qualquer resolução era necessário toma-la imediatamente, mesmo porque a querer-se fazer a redução das despesas, isso só teria um eficaz efeito adiando-se as escolas de recrutas, sim, mas para depois reduzir o seu -tempo de duração, o que não daria prejuízos para a instrução militar, desde que as escolas fossem adiadas para a época do color, em que se podem aproveitar ao máximo os dias de instrução.
De maneira que a medida, a ser tomada nas condições dum Ministro que queria
atender às necessidades do Exército, mas ao mesmo tempo às circunstâncias precárias da Nação, só o podia ser. da forma por que o foi.
Se se fosse a esperar a reabertura do Parlamento, isso somente redundaria num grande prejuízo para os serviços militares, bem como para os mancebos a instruir, acrescentando ainda as despesas que o Estado seria obrigado a fazer com transportes.
• Era este o critério da compressão das despesas públicas, reduzindo ao mínimo todas aquelas que fossem julgadas dispensáveis.
O Exército ó uma fOrça útil e necessária a que a República tem recorrido já por várias vezes e de que a Pátria se tem servido para manter íntegro o seu território e prestigioso o seu nome. Não se pode, por isso, culpar o acto do Ministro que não fez mais do que traduzir o pensamento dominante da Câmara e os desejos de todo o País. Sendo assim é absolutamente lamentável que se pretende lançar a nota política num simples acto de administração, e tanto mais lamentável isso é quanto é certo que esse acto íoi o único que um Ministro consciencioso poderia praticar.
Além disso, o Sr. Ministro^ da Guerra não procedeu arbitrariamente ao fixar o tempo de duração das Escolas de Recrutas, visto que o caso foi resolvido de harmonia com o conselho de quem era competente e tinha autoridade para -o dar: o Corpo do Estado Maior. Foi esta corporação que indicou até onde devia ir essa redução, embora lamentando que as precárias condições do Tesouro a tal obrigassem.
Parece-me ter colocado o questão nos seus devidos termos, e se o fiz por uma forma por vezes acalorada e enérgica não foi porque o autor da medida em discussão seja o Sr. Álvaro de Castro. Fosse ele quem fosse, eu estaria pronto a defendê-lo por essa iniciativa absolutamente louvável e inteiramente adaptada às circunstâncias do momento.
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Diário da Câmara d*t
Lamento, mais uma vez, que o Sr. Plínio Silva, que nesta casa do Parlamento, no mais apreciável dos propósitos, tem apesentado por várias vezes determinadas opiniões sobre questOes militares., com as quais em geral eu tenho, aliás,, discordado, tivesse posto a nota política num acto administrativo, que inteiramente satisfez as aspirações de todos nós.
V. Ex.a sabe que o Estado Maior do Exército chegou a umas certas e determinadas conclusões, enviando para as diferentes comissões técnicas as ordens necessárias para que essas comissões estudassem a melhor forma de dar a instruçãD nas diferentes unidades; como V. Ex.a também sabe, essas comissões técnicas mandaram os seus relatários exprimindo o seu ponto de vista e que 6sse ponto de vista obedecia aos princípios que tenho defendido nesta Câmara, isto é, reduzir a instrução fazendo a máxima compressão de despesas.
Aparte do Sr. Plínio Silva, que não se ouviu.
O Orador: — O projecto que está em discussão é o adiamento indefinido da en-corporação de recrutas.
Sr. Presidente: ainda relativamente à moção apresentada pelo Sr. Plínio Silva devo dizer que a Câmara não pode votar essa moção porque, como disse, ela constitui um voto de censura a si própria. O Sr. Ministro da Guerra praticou um acto administrativo que foi legítimo, que foi justo; o acto de S. ~Ex.a é um daqueles em que se afirma duma forma categórica o desejo, da parte do Poder Executivo, de colaborar com o Poder Legislativo na compressão das despesas.
Permite a Câmara que eu reconheça, quando se fala em compressão de despesas, que onde elas se têm realizado de forma a corresponder aos desejos da Câmara, tem sido da parte do Ministério da Guerra; oxalá que em todos os Ministérios se procurasse com o mesmo carinho comprimir todas as despesas como se tem feito no Ministério da Guerra.
O Sr. Presidente : — Como faltam apenas 5 minutos para se encerrar a sessão, pregunto a V. Ex.a se deseja terminar as suas considerações ou ficar com a palavra reservada para a próxima sessão.
O Orador: — Se V. Ex.a mo permite, fico com a palavra reservada.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Plínio Silva não reviu o seu aparte.
O Sr. Presidente:—Fica V. Ex.a com a palavra reservada para a próxima sessão que se realiza amanhã, à hora regimental, na sala da Câmara dos Deputados, sendo a ordem dos trabalhos a seguinte :
Antes da ordem do dia:
A de hoje.
Ordem do dia:
A de hoje e mais: proposta de lei n.° 615-H, que constitui na tesouraria da Administração Geral das Prisões um fundo permanente de 30 contos destinados ao pagamento antecipado de fornecimentos efectuados por administração directa; parecer n.° 547, que cria uma caixa de crédito marítimo.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Projectos de lei
Do Sr. Francisco José Pereira, alte rando a lei de 3 de Abril de 1896. Aprovada a urgência.
Para a comissão de legislação civil e comercial.
Dos Srs. João Camoesas o Custódio de Paiva, determinando a forma de julgamento de réus ausentes.
Para o «.Diário do Governo».
Parecer
D.a comissão dê negócios eclesiásticos, sobre o projecto de lei n." 581-A, que trata da cedência do passal da Freguesia de Barcelos à Junta da mesma Freguesia.
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Requerimentos
Sequeiro que, pelo Ministério das Colónias, me sejam fornecidos os seguintes documentos:
Cópia do ofício n.° 19, de 16 de Julho de 1918, do Governo Geral do Estado da índia, que cobria o requerimento do director das Obras Públicas daquele Estado-em que pedia a anulação da portaria n.° 259-G; copias das informações das repartições por onde transitou esse requerimento; e cópia da declaração de voto do vogal do Conselho Colonial, Manuel Nunes de Oliveira, acerca do parecer do mesmo Conselho sobre o referido requerimento ;
Idem da exposição do engenheiro Caetano Marques de Amorim, dirigida ao director dos serviços centrais do Ministério das Colónias, referente à sindicância que lhe foi ordenada como director das Obras Públicas do Estado da índia; e da informação da Repartição acerca da mesma exposição e despacho que neles recaíram.
Idem do ofício n.° 370, de 25 de Novembro de 1918, do Governo Geral do Estado da índia, referente à nomeação doL coronel Ferreira Marques para director interino das Obras Públicas daquele Estado, das . informações da Repartição e do despacho ministerial que nele recaiu.
Idem do requerimento do engenheiro Caetano Marques de Amorim, de l de Janeiro de 1919, telegramas do mesmo de 11 e 22 de Março, dos do Governador e a ele expedidos e informações, despachos e parecer do consultor do Ministério a que deram origem.
Sala das Sessões, em 23 de Fevereiro
de 1921. — O Deputado, Viriato Gomes da fonseca. Expeça-se.
Requeiro que pelo Ministério do Comércio e Comunicações me sejam fornecidas as seguintes notas:
Das estradas a cargo do Estado dos concelhos de Alcácer do Sal, Alcochete, Aldeia Galega do Ribatejo, Almada, Barreiro, Cezimbra, Grândola, Moita do Ribatejo, Santiago do Cacem, Seixal, Setúbal e Sines, e quais as importâncias com que foram dotadas, para a sua conservação, no corrente ano económico;
Das estradas que, tendo sido dotadas, já têm troços em reparação e quais;
Nominal dos chefes de conservação, cabos e cantoneiros em serviço nas mesmas estradas, com a designação das áreas onde desempenham o serviço da sua especialidade ;
Dos vencimentos destes chefes de conservação e salários dos cabos e cantoneiros, assim como as ajudas de custo e subvenções a que tenham, direito.
Em 22 de Fevereiro de 1921. — Luís A. da Silva Tavares de Carvalho.
Expeça-se.
Reqneiro que, pela Direcção Geral das Contribuições e Impostos, me seja fornecida, com a maior urgência, cópia de todos os depoimentos que serviram para a sindicância ordenada contra Domingos Cardoso, sub-inspector das Contribuições e Impostos, e bem assim o relatório e conclusões do funcionário encarregado dessa sindicância.
Em 23 de Fevereiro de 1921. —O Deputado, António dos Santos Graça.
Expeça-se.