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REPÚBLICA

PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO IsT-0

EM 17 DE MAIO DE 1921

63

Presidência do Ex.mo Sr. Abílio Correia da Silva Marcai

Secretários os Ex,mof Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira António Marques das Neves Mantas

Sumário.— Abre a sessão com a presença de 30 Srs. Deputados. Leitura da acta. Correspondência.

Antes da ordem do dia. — O Br. Eduardo de Sousa, em nome da comissão de inquérito parlamentar ao extíntn Ministério dos Abastecimentos^ manda para a Mesa um relatório da mesma comissão, pedindo a sua publicação no «Diário do Governo».

O Sr. Godinho do Amaral chama a atenção da Sr. Ministro das Finanças para o facto de não terem ainda recebido os seus vencimentos os propostos dos tesoureiros de finanças.

Responde-lhe o Sr. António Maria da Silva (Ministro das Finanças).

O Sr. Ladislau Batalha faz algumas considerações bôbre os incidentes provocados pela greve dos funcionários públicos de S. Tomé.

Responde-lhe o Sr. Álvaro de Castro (Ministro da Guerra).

O Sr. Domingos Cruz dirige uma pregunta ao Governo sobre os boatos que correm sobre alteração da ordem pública.

Responde-lhe o Sr. Ministro da Guerra.

Volta a usar da palavra o Sr. Domingos Cruz.

É aprova Ia a acta.

A Câmara concede uma licença ao Sr. Alberto Jordão e resolve que seja publicado o relatório apresentado pelo Sr. Eduardo de Sousa.

1." parte da ordem do, dia. — Entra em discussão o parecer n." 752. É aprovado na generalidade.

Aprova-se em seguida o artigo i.° sem discus-io.

Jsam da palavra sobre o artigo 2." os Srs. João |'ar e Rego Chaves,

António da Fonseca (Ministro do Comer' a urgência t a dispensa do Regimento roposta de lei de protecção à marinha fional.

palavra, sobre o modo de votar, o» Magalhães e Ministro do Comér-

cio, e em seguida è aprovado o requerimento do Sr. Ministro.

São autorizadas a reunir durante a próxima sessão diversas comissões.

O Sr. Barbosa Magalhães manda prra a Mesa um parecer da comissão de legislação cicil e comercial.

Por parle da mesma comissão o Sr. Evaristo de Carvalho manda para a Mesa um parecer.

Suspensa a discussão do parecer n." 7'52,prossegue a do parecer n.° 635-H. U*a da palavra o Sr. Barbosa de Magalíiães mandando para a Mesa um projecto de lei que fica em discussão.

Segue-se no uso da palavra o Sr. Rego Chaves, que apresenta uma moção e fica com a palavra reservada para a sessão seguinte.

2.a parte da ordem do dia.— (Continuação da discussão do orçamento do Ministério da Agricultura).

O Sr. Jorge Nunes, que ficara com a palavra reservada, conclui as suas considerações.

O Sr. Presidente suspende a sessão para reabrir às 21 horas e 30 minutos.

Reaberta a sessão, usa da palavra o Sr. Cunha Leal, que termina enviando para a Mesa uma moção.

E admitida.

Seguem-se no uso da palavra os Srs. Portugal Durão (Ministro da Agricultura) e António Maria da Silva (Ministro das Finanças). , O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.

Abertura da sessão às 15 horas e lô minutos.

Presentes à chamada 06 Srs. Deputados. São os seguintes:

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Diário da Câmara do& Deputados

Angelo de Sá Couto da Cimha Sampaio Haia.

Aníbal Lúcio de Azevedo.

António Albino de Carvalho iVJoiirão.

António Albino Marques de Azevedo.

António Augusto Tavares Ferreira.

António da Costa Ferreira.

António da Costa Godinho do Amfral.

António Francisco Pereira.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António José Pereira.

António Luís de Gouveia Prestes Salgueiro.

António Maria da Silva.

António Marques das Neves Mantas.

António Pires de Carvalho.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Custódio Martins de Paiva.

Domingos Cruz.

Domingos Leite Pereira.

Eduardo Alfredo de Sousa.

Estêvflo da Cunha Pimentel.

Evaristo Luís das Neves Ferreira de Carvalho.

Francisco da Cunha Rego Chaves.

Francisco José Pereira.

Francisco Manuel Couceiro da Costa.

Francisco Manuel Homem Cristo.

Francisco Pinto da Cunha Leal.

Jacinto de Freitas.

Jaime da Cunha Coelho.

Jofto Cardoso Moniz Bacelar.

João Gonçalves.

João de Orneias da Silva.

JoAo Xavier Camarate Campos.

Joaquim Aires Lopes de Carvalho.

José António da Costa Júnior.

José Garcia da Costa.

José Gregório de Almeida.

José Maria de Campos Melo.

José Mana de Vilhena .Barbosa ae Ma

José Mendes Nunes Loureiro.

José de Oliveira Ferreira Dinis.

José Rodrigues Braga.

Ladislau Estêvão da Silva Batalha.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Luís Augusto Pinto de Mesquita Carvalho.

Manuel Alegre.

Manuel José da Silva.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Plínio Octávio de SanfAna e Silva.

Raul António Tamagnini de Miranda Barbosa.

Rodrigo Pimenta Massapina. Vasco Guedes de Vasconcelos. Viriato Gomes da Fonseca.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Acácio António Camacho Lopes Cardoso.

Alberto Ferreira Vidal.

Américo Olavo Correia de Azovcdo.

António de Paiva Gomes.

Bartolomeu dos Mártires Sousa Seve-rino.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

Francisco Alberto da Costa Cabral.

Francisco da Cruz.

Inocêncio Joaquim Camacho Rodrigues.

João Estêvão Aguas.

João Luís Ricardo.

João Pereira Bastos.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José Domingues dos Santos.

José do Vale de Matos Cid.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel Ferreira da Rocha.

Mem Tinoco Ver dial.

Raul Leio Portela.

Tomás de Sousa Rosa.

Vasco Borges.

Vitorino Máximo de Car;valho Guimarães.

Xavier da Silva.

Srs. Deputados que não comparece-ram à sessão:

Afonso Augusto da Costa. Afonso de Macedo. Afonso do Melo Pinto Veloro. Alberto Álvaro Dias Pereira. Alberto Carneiro Alves da Cruz. Alberto Jordão Marques da Costa. Albino Pinto da Fonseca. Albino Vieira da Rocha. Alexandre Barbedo Pinto de Almeida. Alfredo Ernesto de Sá Carcloso. Alfredo Pinto de Azevedo e Socsa. Álvaro Pereira Guedes. Antão Fernandes de Carvalho. António Bastos Pereira. António Cândido Maria Manso.

António Carlos Ribeiro

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Sessão de J7 de Maio de J9'J1

António Dias.

António Germano Guedes Eibeiro do Carvalho.

António Joaquim Granjo.

António Joaquim Machado do Lago Corqueira.

António Lobo de Aboim Inglês.

António Maria Pereira Júnior.

António Pais Rovisco.

António dos Santos Graça.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Augusto Dias da Silva.

Augusto Joaquim Alves dos Santos.

Augusto Pereira Nobre.

Augusto Rebelo Arruda.

Constâncio Arnaldo de Carvalho.

Custódio Maldonado de Freitas.

Diogo Pacheco de Amorim.

Domingos Vítor Cordeiro Rosado.

Francisco Coelho do Amaral Reis.

Francisco Cotrim da Silva Garços.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Francisco José Fernandes Costa.

Francisco José Martins Morgado.

Francisco José de Meneses Fernandes Costa.

Francisco de Sonsa Dias.

Helder Armando dos Santos Ribeiro.

Henrique Ferreira de Oliveira Brás.

Henrique Vieira de Vasconcelos.

Hermano José de Medeiros.

Jaime de Andrade Vilares.

Jaime Daniel Leote do Rego.

Jaime Júlio de Sousa.

João José da Conceição1 Camoesas.

João Josó Luís Damas,.

João Maria Santiago Gouveia Lobo Prezado.

João Ribeiro Gomes.

João Salema.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

Joaquim Brandão.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Ribeiro de Carvalho,

José Barbosa.

José Gomes de Carvalho Varela.

José Mendes Ribeiro Norton de Matos.

José Monteiro.

Júlio Augusto da Cruz»

Júlio César de Andrade Freire.

Júlio Gomos dos Santos Júnior.

Júlio do Patrocínio Martins.

Leonardo José Coimbra.

Liberato Damiâo Ribeiro Pinto.

Lino Pinto Gonçalves Marinha.

Luís de Orneias Nóbrega Quintal.

Manuel de Brito Camacho.

Manoel José Fernandes Costa.

Manuel Josó da Silva.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Mariano Martins.

Maximiano Maria de Azevedo Faria.

Miguel Augusto Alves Ferreira.

Nuno Simões.

Orlando Alberto Marcai.

Pedro Gois Pita.

Ventura Malheiro Reimão.

Vergílio da Conceição Costa.

Vitorino Henriques Godinho.

Pelas 15 horas, com a presença de 30 Srs. Deputados, declarou o Sr. Presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta e o seguinte

Ofícios

Do Ministério das Finanças, acompanhando 180 exemplares dos Desenvolvimentos das Receitas e Despesas para 1.921-1922 dos Serviços Autónomos dos Caminhos de Ferro do Estado, Correios e Telégrafos, Porto de Lisboa e Serviços Florestais, para serem distribuídos pelos Srs. Deputados.

Para a Secretaria.

/

Do Ministério das Finanças, ponderando que, a bem do interesse nacional, seja introduzido na nova pauta um artigo especial para locomotivas com um direito baixo.

Para a comissão de comércio e indústria.

Telegramas

Da Associação Industrial Portuense, protestando contra o projecto do Sr. Deputado Eduardo de Sousa sobre isenção de contribuição à Empresa Técnica Publicitária.

Para a Secretaria.

Da Associação Comercial de Guimarães, pedindo a revogação da lei n.° 999. Para a Secretaria.

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Diário da Câmara dos Deputados

Representação

Da comissão delegada dos revolucionários civis de 5 de Outubro de 1910, pedindo que a esses revolucionários sejam concedidos direitos e regalias semelhantes às já concedidas aos militares.

Para a comissão de petições.

Antes da ordem do dia

O Sr. Eduardo de Sousa: — Sr. Presidente: em nome da comissão deinquórho parlamentar ao extinto Ministério dos Abastecimentos, tenho a honra de mandar para a Mesa o primeiro relatório que esta comissão entendeu dever enviar ao Congresso da República para dar conhecimento dalguns resultados a que a dita comissUo chegou.

Sr. Presidente: este documento nSo ó o relatório total, pois a comissão entende melhor enviar estes relatórios parciais.

Não leio este documento, nem será lido na Mesa, por ser muito extenso e ter 25 páginas.

Tenho a honra de enviar para a Mesa, pedindo toda a urgência da sua publicação no Diário do Governo. Rogo aVEx.* indique consultar a Câmara nesse sentido.

O orador não reviu.

O Sr. Godinho do Amaral:—Continuo recebendo várias reclamações das propostas de tesourarias de finanças de Viseu que desdo Outubro de 1920 não recebem os seus vencimentos.

Chamo a atenção de V. Ex.a para este caso e peço providências.

O Sr. Ministro das Finanças (António Maria da Silva):— Devo dixer a V. Ex.a que já há alguns dias chamei a atençiio do funcionário superior do meu Ministério que trata desse assunto, que me deu a resposta seguinte: Mo têm chegado a Lisboa as folhas de todos os distritos.

Eu disse que era bom insistir para que viessem, a fim de não serem prejudicados os outros funcionários.

Tenho dito.

O Sr. Ladislau Batalha: — Era meu desejo usar da palavra quando estivesse presente o Sr. Ministro das Colónias. Na ausência de S. Ex.a, porém, como vejo

representantes, portadores de pastas do Ministério, usarei da palavra.

Mais de uma vez na minha vida, em escritos e aqui dentro do Parlamento, tenho afirmado que, se nas terras do património ultramarino já não existe escravatura, ainda não está extinto o regime da escravidão.

E é exactamente para isto que chamo a atenção de S.al Ex.as

Não está na minha intenção irrogar a menor censura ao Sr. Ministro das Colónias que não se acha presente, e que eu sei perfeitamente que não está de acordo, nem sequer aceita e muito o contraria tudo quanto de iníquo continua a passar--se em certas colónias por:uguesas. Em todo o caso, cumpre-me chamar a atenção do G-ovêrno para factos anormais e indecorosos para a NaçãD portuguesa que estão ocorrendo na província de S. Tomé e Príncipe.

Deu-se uma greve de funcionários naquela província. N&o discuto, nem por um momento, se têm ou não direito os funcionários públicos de fazer greves.

Não discuto a razão ou :ião razão que eles tinham para assim proceder. Ponho de parte tal assunto.

O facto, ó que a greve deu-se e deu-se •em virtude de reclamações de certa e determinada gravidade e até precisamente talvez preparada e sugerida pela incorrecção do governador de S. Tomé.

Ora esta greve foi feita pelo pessoal menor branco e indígena; não houve, porém, a menor tentativa de solucionar e agitar, como ó frequente nas greves. Não obstou contudo a que fosse dispersada violentamente à pranchada e por outros meios insólitos e desprezíveis.

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tíessão de 17 de Maio de J921

ainda subsistem entre nós deploráveis vícios do passado, dos quais há urgência de nos regenerarmos.

A Junta dos Indígenas formulou ao próprio Ministro, num documento que publicou e que me foi ontem enviado, as seguintes queixas que são deveras dignas de ponderação.

Queixa-se a Junta de que as notícias, enviadas ao S.r. Ministro das Colónias foram tendenciosas, visto que de parte dos indígenas nunca se esboçou o menor gesto contra as propriedades europeias.

As suas queixas são necessariamente justas. Os indígenas —infelizmente para eles — ainda não têm o desenvolvimento necessário para se queixar por modo eficaz com que se façam valer contra as prepotèncias europeias. Por isso, devido à absorpção dos europeus, os indígenas têm cada vez menos terras na sua própria terra, invadida pelos brancos. Isto indigna e revolta, num século om que a humanidade chega a debater-se om guerras cruentas de horror, em nome dum suposto restabelecimento do império da liberdade e da justiça.

iQuando deixarão as sociedades humanas de viver do logro e da mentira!

A segunda queixa formulada ó a seguinte:

«Que tendo sido gravemente feridos e mortos vários indígenas, S. Ex.a o governador não enviou, como lhe competia, ao Ministro a mais pequena notificação sobro este lamentável facto».

Mas, há mais do que isto. Por cartas recebidas de fontes fidedignas, tenho o profundo desgosto de informar a Câmara de que nos hospitais de S. Tomé recusaram--se a tratar dos feridos indígenas, que tiveram de seguir, escorrendo sangue, a recolher-se aos patrícios. Passa-se isto em S. Tomo, no ano da graça de mil novecentos e vinte um!

Então não lhe chamem província ultramarina, mas centro de escravidão portuguesa, para que ao menos não continuemos a viver no doce engano, de alma ledo e cego que nos faz supor liberais.

A terceira -queixa é a seguinte:

«Que para evitar o conhecimento da verdadeira causa da greve e seus sangrentos pormenores, mandou S. Ex.a (o Governador) confiscar e violar as correspondências que nos foram enviadas pelo vapor Beira.

Isto foi outro crime que, para honra do nosso país, necessitado ser sindicado. Se por acaso o que aqui se encontra escrito for falso, devem os caluniadores ser castigados. Mas desde já posso assegurar a minha convicção de que estas afirmações são verdadeiras, pois qne tenho recebido cartas particulares de fontes várias, todas unânimes sobre o assunto.

Queixa-se mais a Junta dos Indígenas, entre outras cousas :

«Que a detenção dos directores do jornal A. Liberdade teve unicamente por fim impedir ou prejudicar a sindicância há muito reclamada pelo mesmo jornal contra as arbitrariedades da Curadoria».

Sr. Presidente: é bom não esquecer a forma como estão sendo espoliados os indígenas de S. Tomé, no rosto do seu já reduzido património. Principiam a viver como estrangeiros na sua própria terra!

Todos nós sabemos que o indígena tem uma forma típica de cultivar e que o europeu tem outra. ^Pois sabem V. Ex.as como estes procedem, tirando partido da circunstância?

Mandam por apaniguados seus, de noite, e a malas horas, fazer plantações de café, cacau, etc., em terrenos limítrofes pertencentes aos indígenas, e quando estes se queixam é nomeada uma comissão de brancos, que já estão combinados sobre o assunto, e logo dizem no seu relatório, não ter o indígena razão, porquanto as plantações, estão feitas.. . à europeia!

Isto é extraordinário, Sr. Presidente! Os brancos poderiam simular a plantação ao sistema nativo; mas preferem invadir as terras dos indígenas plantando à moda dos brancos, para lhes servir de provas de que os terrenos são seus.

a Queixa-se ainda mais a Junta contra arbitrariedades praticadas pela Curadoria.

Ah! Sr. Presidente, eu sei bem o que é a curadoria dos indivíduos sujeitos à tutela pública, já porque, em'tempos, dela fiz parte, e pouco tem mudado até hoje, já porque tenho seguido esta questão com todo o cuidado de que é merecedora.

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Diário da Câmaia dou Deputados

«Que tendo-se recusado os polícias indígenas a fazer fogo sobre a multidão, e tendo lealmente deposto as armas, foram, não só humilhados, como barbaramente mortos alguns».

É claro que recusar-se a fazer foge ó sempre militarmente uma insubordinação, mas também mandar fazer fogo contra grevistas não é menos extraordinário.

Torna-se indispensável que aprendamos a defender Portugal e a República, melhor do qne até aqui tomos sabido fazer. Não deixemos ir por diante a degenerescência a que estamos assistindo, e que tanto compromete os destinos da Nação.

E depois queixamo-nos das campanhas dos chocolateiros ingleses. Bem sei que por detrás dessa, campanha estão interesses ilegítimos e é possível que seja tudo mentira. Mas para que o seja de facto e o possamos desmentir eficazmente, tornemos impecável a nossa administração colonial e não consintamos os pequenos déspotas ou caciques coloniais.

A entidade de quem os indígenas de S. Tomé se queixam, tem q nome de Eduardo Nogueira de Lemos. E médico e proprietário da Eoça de Campolide que dizem ter sido formada à custa das plantações dos indígenas!

Parece que ali se dava o triste exemplo de virem depois as tais comissões a dizer que estava tudo bem, porque as plantações eram do tipo europeu!. . .

Nestas minhas expressões não há, a menor censura ao portador da pasta das Colónias, pois tenho a convicção de que muito o contrariam estas cousas. Mas chamo a atenção dos Srs. Ministros presentes, para que comuniquem ao Sr. Ministro das Colónias as queixas que formulo. E necessário que a sindicância a fazer sobre o assunto estudo estas minhas queixas que, repito, não são formuladas contra o Sr. Ministro.

Chamo, pois, a atenção de S. Ex.a, para o que se passa em S. Tomé.

O Sr. Ministro da Guerra (Álvaro de Castro) : — Pedi a palavra, para dizer a V. Ex.a que ouvi com atenção as considerações do ilustre Deputado, Sr. Ladis-lau Batalha, e que as transmitirei ao meu colega das Colónias.

O Sr. Domingos Cruz : — N"os últimos dias a imprensa tem-se feito eco de boa tos sobre presumidas alteraçòes da ordem pública. Por outro lado, as forças públicas tem estado de prevenção, segundo tenho sabido por conversas.

Parece-me que o país assiste com ansiedade a estes boatos. Por isso desejaA-a que alguém dos ilustres Ministros presentes pudesse informar o país-sem prejuízo daquelas reservas que S. Ex,as entendam usar ao falar neste assunto, o que muito conviria, porque a opinião pública não pode estar sujeita a estes constantes boatos alarmantes que prejudicam a economia nacional.

O Sr. Ministro da Guerra (Álvaro de Castro): — Ouvi as palavra;; pronunciadas polo Sr. Domingos Cruz. a propósito dos boatos de que se tem feito eco a imprensa sobre alteração da ordem pública. Devo informar V. Ex.a, Sr. Presidente c toda a Câmara, de que estou inteiramente convencido, de que não haverá nenhum movimento nesta hora que venha perturbar a vida da República. Declaro peremptoriamente. Estou convencido, nem por sombras posso acreditar que haja republicanos tão dementados que venham criar mais um momento de perigo para a República, contribuindo para uma desorganização que não só viria avolumar as enormes despesas do Estado, mas criar também novas e sangrentas perturbações.

De resto — afirmo o bem alto — como Ministro da Guerra estou convencido de que a força armada corresponderá ao apelo do Governo, mantendo a ordem e a legalidade constitucional, se houver alguém que pretenda alterá-la,

K já agora, Sr. Presidente, solicitado pelo Sr, Domingos Cruz a declarações precisas, que de bom grado presto; alguma cousa mais direi.

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Sessão de li de Maio de 1921

ordens do Governo. O estratagema é pouco hábil e é fácil de desmascarar.

Por inim, orgulho-me de poder afirmar com a dignidade que ponho em todos os meus actos, que não há quem, conhecendo o meu passado inteiramente contrário a tudo quanto seja alterar a normalidade da República constitucional, possa honestamente convencer-se de que eu dê alento a um atentado contra a constituição qualquer que ele seja.

Já por vezes, infelizmente, tenho tido necessidade de colaborar para que essa normalidade se recuperasse, restabele-' cendo-se o domínio da lei e o respeito pelos princípios que consubstanciam a vida legal da República. Só por má fé ou por demência se poderia julgar--nae capaz de me associar a um acto violento que, ferindo a Constituição,' iria abalar a República nos seus "alicerces, trazendo, para a sua história, um novo ciclo doloroso.

(Apoiados gerais).

K o meu escrúpulo, Sr. Presidente, foi sempre tam meticuloso, em tal matéria, que, restabelecida a Constituição, jamais eu aceitei a participação do poder em Governos revolucionários.

Sempre me bastou a consoladora certeza de ter contribuído com o meu esforço para a restauração da normalidade constitucional,

Posso afirmar à Câmara que saberei conduzir em todas as emergências, todos os defensores da República ao verdadeiro campo, mas dentro da legalidade, combatendo com firmeza, vigilantemente, todos aqueles que trouxessem à República mais uma hora difícil, cujas consequências não sei. ninguém sabe até onde a poderiam levar.

Tenho dito.

Vozes : —Muito bem!

O Sr. Domingos Cruz:—Folgo em ter provocado as palavras do Sr, Ministro da Guerra que devem ter tranquilizado todos os espíritos.

Não era necessário que S. Ex.a falasse de si, porque o seu passado e a sua obra são garantias suficientes de que ó um in-defectível defensor dos preceitos constitucionais.

Foi aprovada a acta.

Foi lida na Mesa e autorizada a publicação no «Diário do Governo» do relatório da comissão de inquérito ao Ministério dos Abastecimentos.

ORDEM DO DIA

"Primeira parte

Entrou em disciissâo o parecer n'° 762. É o seguinte:

Parecer n.° 762

Senhores Deputados.— A vossa comissão de finanças, examinando o projecto de lei n.° 200-C, da autoria do ilustre Deputado Sr. Domingos Cruz, é de parecer que ele tem pontos de íntimo contacto com a proposta de lei n.° 38-C, do ex--Ministro das Finanças Sr. Rogo Chaves, e que a matéria nele versada, sendo de inteira justiça e não trazendo aumento de (Jospesa porque não há alargamento de quadros, se pode encerrar em dois novos artigos a introduzir na citada proposta de lei, que teve o parecer n.° 46, e cuja redacção tem a honra de propor que seja a seguinte:

Art. 5.° Aos actuais. praticantes da Direcção Geral da Contabilidade Pública é garantida a nomeação de terceiros oficiais sem dependência de concurso, e por ordem de antiguidade, nas vacaturas que forem ocorrendo, quando tenham bom comportamento e boas informações prestadas pelos directores dos serviços de contabilidade.

Art. 6.° O acesso aos lugares de terceiros oficiais da Secretaria Geral do Ministério das Finanças e das Direcções Gerais de Contabilidade Pública, Fazenda Pública e Estatística será feito por concurso, e aos lugares de segundos e primeiros oficiais será feito, alternadamente, por concurso e antiguidade.

§ único. Exceptuam-se do disposto neste artigo, quanto ao acesso a terceiros oficiais, os praticantes mencionados no artigo anterior.

Deve por isso o artigo 5.° da proposta passar a ser o artigo 7.°, com a mesma redacção.

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Diário da Câmara dos Deputados

marães — Molheira Reimão—Aníbal Lúcio de Azevedo (vencido) — Ferreira da Rocha—José de Almeida (vencido)—J. M. Nunes Loureiro — Alberto Jordão — Raul Tamagnini, relator.

Projecto de lei n.° 200-C

Senhores Deputados. — Considerando que os praticantes de todas as Direcções Gerais do Ministério das Finanças, com excepção dos da Contabilidade, são promovidos à categoria de terceiros oficiais, por ordem de antiguidade, sem dependência de concurso, como determina o decreto com força de lei n.° 5:524, de 8 de Maio de 1919, que reorganizou os serviços do referido Ministério;

Considerando que aos antigos contratados da Direcção Gemi da Contabilidade Pública, que ingressaram no quadro dos praticantes da mesma Direcção Geral, por determinação do § 2.° do artigo 25.° do citado decreto n.° 5:524, lhes é garantida a promoção a terceiros oficiais, sem dependência de concurso, por ordem de antiguidade;

Considerando que só aos praticantes da Direcção Geral da Contabilidade Pública que não estão nas condições dos antigos contratados ó imposta a obrigação de concorrerem aos lugares de terceiros oficiais, dentro do prazo de dois anos, a contar da sua nomeação, findo o qual serão demitidos;

Considerando que semelhante desigualdade, dentro dos funcionários da mesma categoria e da mesma Direcção Geral, constitui uma flagrante injustiça;

Atendendo a c^ue os praticantes da Direcção Geral da Contabilidade Pública são todos velhos e dedicados republicanos, que à causa da República tom prestado os mais relevantes serviços com o sacrifício da própria vida:

Tenho a honra de submeter ao vosso esclarecido critério o à vossa nunca desmentida fé republicana o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Aos actuais praticantes da Direcção Geral da Contabilidade Pública é garantida a nomeação de terceiros oficiais, sem dependência de concurso e por ordem de antiguidade, nas vacaturas que forem ocorrendo, quando tenham exemplar comportamento e boas informações

prestadas pelos directores dos serviços do contabilidade.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões, 21 de Outubro de 1919.— Domingos da Cruz.

Parecer n." 46

Senhores Deputados.— A vossa comissão de finanças, apreciando a proposta de lei n.° 38-C, é de parecer qus deve merecer a vossa aprovação, pela conveniência que há em centralizar, nas atribuições do Ministro, a nomeação, colocação e transferência dos- funcionários dependentes da Direcção Geral das Contribuições e Impostos.

O artigo 2.° destina-se a remediar um lapso do decreto n.° 5:524, de 8 de Maio findo, que no seu artigo 3.° fixou em cinquenta e sete, o número de serventuários, quando já existiam sessenta ao serviço.

Os artigos 3.° e 4.° vêm reparar pequenas injustiças, sempre inevitáveis em diplomas de tamanha magnitude, como é o deqreto n.° 5:524, acima citado.

Sala das sessões da comissão de finanças, 4 de Agosto de 1919.- — Vitorino Guimarães - Alberto Jordão Marques da Costa— J. M. Nunes Loureiro — Aníbal Lúcio de Azeredo — António Maria :'a Silva— Augusto Rebelo Arruda — Antinio José ferreira.— Álvaro de Casiro—F. de Pina Lopes, relator.

Proposta de lei n.° 38-D

Considerando que não é possível desde já efectivar-so a ré vis-ao das reformas dos serviços públicos decretados anteriormente u 11 do Maio de 1919;

Considerando que a experiência demonstra tornar só necessário proceder desde já a algumas modificações que harmonizem os princípios então decretados com a prática da sua execução: tenho a honra de vos apresentar a seguinte proposta de lei:

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ças, pertencem exclusivamente ao Ministro das Finanças.

Art. 2.° É fixado em sessenta o número de serventuários que constituem o quadro do pessoal menor do Ministério, nos termos do artigo 3.° do decreto n.° 5:524, de 8 de Maio de 1919.

§ 1.° Todo o pessoal menor do Ministério, qualquer que -seja a direcção geral ou serviço a que pertença, fica directamente subordinado ao respectivo chefe para os efeitos do serviço geral comum a todo o Ministério.

§ 2.° Ao pessoal menor e dos quadros tipográfico e telefónico, de que trata o artigo 3.° do decreto com força de lei n.° 5:524, de 8 de Maio de 1919, são extensivas as disposições consignadas para os serventuários e restante pessoal menor nos artigos 8.° e § 2.° do artigo 91.° do mesmo decreto.

Art. 3.° A disposição do artigo 95.°, do decreto n.° 5:524, não é aplicável àqueles funcionários dependentes do Ministério das Finanças que, sendo-o já à data do mesmo decreto, venham por qualquer forma a ser compensados dos prejuízos ou esquecimento que esse decreto lhes trouxe. /

Art. 4.° Os quatro empregados contratados da Direcção Geral da Estatística à data da nomeação dos actuais praticantes, serão providos por antiguidade nas primeiras quatro vagas de terceiros oficiais.

Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 29 de Julho de 1919. — O Ministro das Finanças, Francisco da Cunha Rego Chaves.

Foi lido na Mesa e aprovado na generalidade.

Entrou na discussão .na especialidade, sendo aprovado o artigo 1.° sem discus-

O Sr. Presidente: — Entra em discussão o artigo 2.°

Foi lido na Mesa.

/

O Sr. José Bacelar:—Este projecto traz um aumento de despesa e creio que nflo se poderá discutir sem que esteja presente b actual Ministro das Finanças.

O Sr. Rego Chaves: — Confesso que não reparei que na ordem do dia estava dada para a discussão de hoje uma proposta de lei que apresentei quando Ministro das Finanças.

Esta proposta tem três fins especiais, o primeiro é aquele de que trata o artigo 1.° já aprovado.

O segundo ponto é o que diz respeito ao chefe do pessoal menor que apenas tem sob as suas ordens um diminuto pei-soal.

Esta proposta tinha oportunidade na altura em que foi feita e não me parece que o pessoal tenha perdido quaisquer direitos.

E uma nova formatura que permitia evitar ao Ministro das Finanças um certo número de atritos, relativamente a Esses sessenta serventuários.

O artigo 4.° trata de quatro empregados contratados da Direcção Geral da Estatística.

Eu explico a V. Ex.a o que sucedeu:

Havia na Direcção Geral da Estetística quatro empregados contratados antes de 10 de Maio de 1919.

Nessa data o Sr. Ramada Curto, então Ministro das Finanças, fez a remodelação da Direcção Geral da Estatística e nomeou doze praticantes, esquecendo-se que dentro dessa Direcção Geral havia quatro empregados, com muito mais habilitações e não atendendo a que a esses indivíduos devia ser assegurado o lugar na Direcção Geral da Estatística.

A dontrina do artigo 4.° era a única que remediava esta situação, porque garantia a entrada desses quatro empregados à frente dos doze que tinham sido nomeados.

Levantaram-se atritos no Ministério das Finanças entre os quatro e os doze empregados, mas eu cheguei a ter esperança, em Setfmbro de 1919, de fazer passar esta proposta de lei nesta Câmara, o que, infelizmente, não consegui, causando-me por isso grande espanto que hoje tal proposta estivesse na ordem do dia.

Fui à Mesa indagar quem teria requerido a sua discussão, e soube, segundo me disseram, que nenhum Deputado havia feito pedido especial para Ôsse fim.

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jectos de grande alcance, outros de pequena monta.

O Orador: — Satisfaz-me a explicação de V. Ex.a, mas realmente era para ruim um ponto importante saber quem teria feito esse pedido, porque ea queria conhecer o heróico defensor desta proposta que eu nunca consegui arrancar à Câmara emquanto fui Ministro das Finanças.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca): — Sr. Presidente ? aproximadamente em 15 ou 16 de Dezembro de 1920 eu apresentei a V. Ex.* Uma proposta de lei destinada a proteger a agricultura e a indústria.

Essa proposta foi enviada às comissões competentes, estando actualmente sujeita à. apreciação das comissões de agricultura, comércio é indústria, e finanças da Câmara dos Deputados.

Mas sei, tambénl, que a despeito de todos os esforços empregados pelo relator dessa comissãOj o Sr. Lúcio de Azevedo, e de toda a boa vontade da Mesa para que a essa proposta fosse dado o respectivo parecer, nem sequei- tem sido fácil reunir a referida comissão por falta de número;

Posteriormente apresentei à Câmara nina proposta tendente a estabelecer a protetíção à marinha mercante nacional nos mesmoií moldes em que a pretendi estabelecer à indústria e à agricultura.. Como, porém, a protecção a dispensar à indústria e à agricultura demanda um estudo do "certo modo demorado e a protecção a dar à marinha mercante é absolutamente urgente, eu sou forçado a alterar a ordem cronológica que primitivamente tinha inar-cado a essas minhas duas propostas, pedindo à Câmara para apreciar esta última na sessão de amanhã^ antes da ordem do dia,

Ainda não há muito tempo a Companhia Nacional de Navegação anunciou em todos os jornais de Lisboa & suspensSo de todas as carreiras para a África Orientai; e os Transportes Marítimos encon-tram-se numa situação de tal forma deplorável em relação a essa mesma carreira que os levará a suspendê-la, igualmente, dentro em breve. A Câmara compreende, sem necessidade de maiores explicações

da minha parte, os gravíssimo;? inconvenientes que de tais suspensões -podem resultar não só para as nossas possessões desse lado da África, mas aindu e principalmente para o continente da República, que por esta forma ficaria privado de comunicações marítimas com algumas das suas principais colónias.

Por outro lado tem.-se verificado "que a maior parte das companhias estrangeiras, que estabeleceram carreiras para a África Oriental, têm recebido dos seus países subsídios de tal maneira fabilosos que torna impossível qualquer concorrência por parte das nossas empresas de navegação.

A Holanda ainda há bem poaco tempo estabeleceu para as companhias de navegação, que façam tais carreiras, um subsídio de alguns milhões de florins. Igual política têm seguido outros países, nomeadamente a França e a Inglaterra. .Se nós não procedermos por igual forma, arriscar-nos hemos a ver dentro em pouco todos os navios da nossa marinha mercante amarrados no Tejo.

Sr. Presidente: essa proposta, portanto, tem não só uma oportunidade, mas também uma. urgência que é absolutamente inadiável, e tratando-se come se trata duma proposta que visa a estabelecer uma protecção útil aos nossos portos, e a criar uma receita calculada em 8:000 contos.

Parece-me.que tendo esta proposta sido bem recebida por parte de tocas as pessoas interessadas, a Câmara fazia bem considerando-a rapidamente, prescindindo do parecer da comissão, visto o seu relator, o Sr. Mariano Martins, estar ocupado com o relatório do orçamento das receitas para o ano económico futuro,

Por todas estas razões, entendo que a Câmara dos Srs. Deputados prestaria realmente um serviço útil ao país votando o meu requerimento.

Peço, portanto, a V. Ex.a o favor de consultar a Câmara sobre se consente que, antes da ordem do dia de amanhã, se comece a discussão pela proposta de protecção à marinha mercante e portos nacionais ; e quo nesse requerimento fique expresso que não quero com isso criar dificuldades aos trabalhos da ordem do dia.

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tender. Mas, não posso deixar, em face das circunstâncias absolutamente graves que está atravessando a marinha mercante, e .quanto ao seu futuro, não posso deixar de ligar o meu futuro também ao meu requerimento.

t) Sr. .Domingos Cruz: — f.Mas V. Èx.*, Sr. Presidente) interrompeu a discussão do outro projecto que se estava discutindo?

O Sr. Presidente: — De facto está interrompido.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca) : — O Regimento permite aos Ministros apresentarem requerimentos, e portanto, .interromperem .a discussão.

Õ Sr. Domingos Cruz: — Não ó bem isso que o Regimento permite.

.0 Sr. Barbosa de Magalhães: — Este lado da Câmara está absolutamente de acordo com o Sr. Ministro do Comércio quanto à importância e urgência da proposta sobre a marinha mercante.

Não Íiá dúvida nenhuma de que é preciso, absolutamente indispensável, discutir com a maior pressa essa proposta; simplesmente V. Èx.a e a Câmara compreendem que a mesma importância da proposta nos faz pensar no facto dela vir à discussão sem parecer das respectivas comissões.

Parece-me que se poderá auxiliar a idea do Sr. Ministro do Comercio com a observância dum preceito que não só é regimental, mas, principalmente, contribui, para que essa proposta possa ser votada com maior conhecimento de causa pela Câmara.

A minha idea e dela só pode haver vantagens para o íim.que S. Ex.a tem em vista, a minha idea seria que essas comissões reunidas em sessão conjunta dessem o seu parecer a essa proposta em dois dias, sendo depois discutida antes da ordem do dia.

Essa proposta é bem complexa e vindo à discussão sem parecer, levará mais tempo a apreciar pela Câmara do que se viesse já com os respectivos pareceres.

Assim parece-me que pode vir à Câ-

mara no fim de dois dias já com os competentes pareceres j ficando o caso. resolvido e o Sr. Ministro das Finanças cíJm a garantia de que a sua proposta será discutida.

Desejaria muito que S. Ex.a concordasse com este meu modo de ver.

Tenho dito.

O Sr.. Ministro do Comércio è Comunicações (António da Fonseca): — Sr; Presidente: folgo muito, comt aã considerações do Sr* Barbosa de Magalhães que cm nome do Partido Democrático declara que deseja discutir a minha proposta.

Eu não tenho dúvida^ tal é o meti espírito de conciliação, em propor, a fim de que a minha proposta fique inais bem estudada, quê as comissões reunam em sessão conjunta para dar o seu parecer.

As comissões serão ouvidas dentro 'de quarenta e oito horas.

Fácil será fazer um parecer em quarenta e oito horas. V. Ex.a que advoga esta idea, certamente conseguirá uma reiínião das comissões; é eu, pela minha partej presto-me a dar às comissões todos os esclarecimentos em qualquer ocasião que sejam necessários.

O Sr. Barbosa de Magalhães (interrompendo}:— Não sei se as comissões terão tempo para dar o seu parecer em qua-. renta e oito horas, porque a Questão não é simples.

Apartes.

O Orador: — Esse tempo chegaria para as comissões se quiserem dar os seus pareceres. Se não for dado o parecer^ então a proposta deverá ser discutida sem .ele.

O Sr. Barbosa de Magalhães (interrompendo] : — Se a proposta fosse mais simples, as comissões podiam dar facilmente parecer; mas a proposta não é simples. São três comissões que têm de reunir em conjunto para a discutir, e pode dar-se o caso de, passadas as quarenta e oito Horas, não haver parecer. Assim teria depois de fazer-se a. discussão sem parecer.

O Orador:—Eu desejo que a questão seja discutida. .;

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com ou sem parecer, discussão essa que deverá ser dada para antes da ordem do dia e aí se conservar até final, sem prejuízo da ordem do dia. O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que aprovam o requerimento feito pelo Sr. Ministro do Comércio, para quo seja dada para discussão na sexta-feira, antes da ordem do dia, a proposta sobre a marinha mercante, com ou sem parecer, tenham a bondade de se levantar.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que autorizam que as comissões de finanças, comércio e marinha reunam amanha durante a sessão pelas dezasseis horas queiram levantar-se.

Está concedida.

O Sr. Barbosa de Magalhães: —Sr. Presidente: pedi a palavra por parte da comissão de legislação e comercial, para mandar para a Mesa um parecer sobre umas emendas do Senado relativas ao projecto de remissão de foros, para o qual peço urgência, visto a natureza do assunto.

O Sr. Evaristo de Carvalho: — Sr. Presidente : pedi a palavra, por parte da comissão civil e comercial, para mandar para a Mesa um parecer sobre a proposta de lei n.° 712-B da autoria do Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que concordam em quo entre amanhã em discussão o parecer apresentado pelo Sr. Barbosa de Magalhães, queiram levantar-se.

Foi aprovado.

O Sr. Presidente: — Vai prosseguir a discussão do parecer n.° 635-JrI, sobre o qual ficou com a palavra reservada o Sr. Barbosa de Magalhães.

O Sr. Barbosa de Magalhães: — Sr. Presidente: vai para três meses que fiquei com a palavra reservada para continuar as minhas considerações sobre este assunto que diz respeito a contribuição de registo.

Vários acontecimentos políticos se produziram pelo que foi substituído o titular da pasta das Finanças; mas, Sr. Presidente, se eu então felicitei o Sr. Ministro das Finanças de então, apresentando o seu projecto, com o qual disso concordar, relativamente a algumas das suas disposições, hoje não posso deixar de felicitar igualmente o actual titular da pasta das Finanças por ter desejado qoe ele continue a ser discutido, se bem que não concorde com algumas das alterações que ele sofreu, pois, parece-me que outras podiam ter sido apresentadas, mas de uma maneira geral.

Sr. Presidente: disse da outra vez que concordava absolutamente com este projecto por isso que ele vinha criar receitas para o Estado e vinha também conseguir um imposto que por todos os motivos era efectivamente daquelee que deviam ser preferidos.

Essa proposta deu no emtanto lugar a um largo debate nesta Câmara, não só pela elevação das taxas da contribuição de registo que nela se fixavam, mas ainda e principalmente, porque nela se encontrava uma disposição pela qual se dizia que o Estado passava a ser herdeiro, conforme preceituava o seu artigo 3.°

Eu tive ocasião de dizer então que esse preceito do artigo 3.° representava uma violência escusada, quer sob o ponto de vista jurídico, quer fiscal.

Era um puro engano dizer-se que o Estado passava a ser herdeiro, pois tal não se dava, e para raim o alcance da proposta estava na elevação das taxas, apresentando-se o sistema progressivo, e eu sustentei então que se devia aproveitar a oportunidade para se ir mais longe e fazer uma remodelação na nova legislação civil sobro direito sucessório.

Era de justiça continuar a obra do Ministro das Finanças de então. É de toda a conveniência fazer uma reforma de direito necessário e assim se consegue uma obra social.

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projecto que é de toda a conveniência para os interesses do Estado.

A família, a sua constituição é hoje muito diferente do que era dantes; e o direito necessário deve acabar em 4.° grau om lugar de ser em 6.° grau.

Não há hoje razão ou motivo para-se conservar 'o ô.° grau de parentesco; pois assim vai beneficiar-se parentes que muitas vezes nem se conhecem ou até que estão de relações cortadas. A vida da família é hoje muito diferente do que era antigamente.

Mas, para que esta proposta possa ter a sua verdadeira eficácia, é preciso combiná-la com uma outra disposição que também inclui nesta proposta, e segundo a qual o indivíduo que faleça sem ter deixado herdeiros até esse grau, não pode dispor, em testamento, de mais de metade da sua fortuna. Há aqui, Sr. Presidente, uma restrição à liberdade testamentária; mas eu já tive ocasião do mostrar à Câmara qual a evolução jurídica que se tem operado neste sentido, e como esse princípio da liberdade- de testar está profundamente abalado, e tem de sofrer todas aquelas restrições que o interesse público exigir.

Estas restrições são muito inferiores às que em outros países mais adiantados existem; e V. Ex.a e a Câmara compreendem que isto não prejudica a actividade do indivíduo, emquanto ele a pode exercer, mas vai simplesmente recair sobre a disposição dos seus bens, para depois da sua morte.

Diz-se que isto tira o incentivo para o indivíduo trabalhar, para acumular haveres, visto que, grande parte deles, vão para o Estado, ligando-se também este argumento à elevação das taxas da contribuição de registo.

Simplesmente, Sr. Presidente, dá-so a estas considerações uni valor muito maior do que aquele que tem. E dá-se, porque colocamo-nos dentro da situação em que vivemos, não estudando propriamente o assunto, e não vendo que as disposições são modificáveis através dos tempos.

i Mas, Sr. Presidente, nós temos tantos e tantos exemplos de pessoas que acumulam fortunas sem terem às vezes herdeiros! Eu acho até que esse incentivo é maior desde que o indivíduo tenha efectivamente a idea de querer deixar aos seus

herdeiros os bens necessários, para que eles tenham uma situação desafogada.

A conclusão natural é que esse indivíduo que trabalharia como dez para deixar tanto como dez, amanhã trabalhará tanto como vinte para deixar tanto como vinte.

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de contos com o sustento dos presos e que ao mesmo tempo se estejam a ièchar as pprtas dos hospitais e asilos àqueles que preeisam dos BOCOJLTOS módicos, àqueles órfãos pequenos desgraçados que precisam de entrar para ôsses estabelecimentos, a fim de receberem a necessária educação, dando isso em resultado que em lugar de serem amanhã indivíduos úteis ao seu país, serão outros tantos criminosos e indivíduos prejudiciais à sociedade? - Não pode ser; e se o Estado não pôde pOr de banda essas suas obrigações de fornecer a instrução, a educação, e, dar assistência a todos que dela precisam é necessário que também demos ao Estado os meios necessários a fim de occorrer a essas mesmas necessidades. Fez-se isso por esto projecto de contribuição de registo visto que se aumentam as receitas do Estado e faço-o pelo projecto que tive a honra de mandar para a Mesa visto que se restringe a ordem da sucessão legitima. Nesse meu projecto estabelecia então seguindo até o conselho ou antes a idea de alguns jurisconsultos e ainda para mellior poder concretizar qual o fim que tenho em vista com esse projecto, que todos esses fundos, todos esses bens que pela aplicação rdo projecto adviriam para o" Estado, reverteriam para o fundo da assistência pública.

V. Ex.aa compreendem que isso seria até dispensável porque desde que esses bens entrassem na Fazenda Nacional, o Estado poderia dar-lhes qualquer aplicação, mas., como disse, entendo que isso devia ficar consignado para que Osses bens possam ter assim uma devida aplicação, e ainda porque, infelizmente para nós, não entrámos nesse caminho que julgo absolutamente necessário e urgente de comprimir as despesas públicas ao indispensável e de fazer aquela obra de saneamento e moralidade que reputo absolutamente preciso no actual momento.

É que não há mesmo o direito de exigir grandes sacrifícios, é que não há o direito de vir fazer esta» restrições que se fazem aos direitos até agora garantidos aos indivíduos se não for para uma obra de sã e moral administração pública, que, infelizmente não se tem podido realizar.

Todos reconhecemos que o Estado faz despesas, imensissimas despesas que são

inúteis e algumas delas até prejudiciais; todos nós reconhecemos que ha lugares em que se podem fazer grandes cortes no nosso Orçamento de despesa sem prejudicar os serviços públicos e até melhorando alguns deles.

Quando da outra vez falei tive ocasião de indicar à Câmara alguns exemplos que eram bem frisantes.

Não quero rememorá-los agora e só estimarei que a propósito da discussão do Orçamento sejam apresentada» propostas para que, sem demora, essas reduções de despesa se possam fazer.

Sr. Presidente; eu' sei que* há quem sorria perante esta doutrina. Também sei-que há quem a combata, mas também sei que há quem a aprove e, principalmente, quem a aprova é o país; são aqueles a quem vamos pedir pesados sacrifícios.

Esses é que exigem que efectivamente, as despesas se reduzam ao míaimo e que se faça, imediatamente uma otra que ninguém pelo menos em alta voz, pode atrever-se a contesta-la, O que também é preciso é que não deixemos-que essa obrava ficando adiada dia a dia; antes"se deverá procurar que essa obra tenha uma imediata realização.

Sr. Presidente, ainda há dias o Sr. Tomé de Barros Queiroz com toda a sua autoridade mostrou que essa necessidade é impreterível, e que devíamos entrar por esse caminho. Também já ds há muito não só eu; como várias pessoas do meu-partido, temos vindo propagando porque essa obra se faça.

Ainda não foi começada, mas é preciso que exactamente emquanto se discute o Orçamento, se vá fazendo tudo quanto possível seja para que a compressão de despesas seja uma realidade.

Só assim é que nós teremos autoridade para irmos pedir mais sacrifícios ao contribuinte. Só assim é que poderemos ficar em condições do podermos fazer aquelas operações financeiras que são necessárias para a regularização da situação que atravessamos.

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procure adiar também essa outra obra que consiste em dar recursos ao Estado de que ele absolutamente carece. E preciso que não se laça depender essa obra de quaisquer circunstâncias que possam dar-se porque isso só servirá para entravar a marcha no caminho que se tem de seguir. E certo que em voz alta todos dizem que é preciso pagar mais. Mas, Sr. Presidente, sempre que se apresentam propostas que tenham esse objectivo, aparece uma oposição sistemática que sob várias aparências tem por fim prejudicar o fim em vista. E certo que essas propostas nem sempre vêm elaboradas por forma a merecerem o nosso completo aplauso, mas para as melhorar é qae existem as comissões desta Câmara e é que se faz a discussão no Parlamento.

jíi nestes termos que venho intervir na discussão da proposta da contribuição de registo, não só para lhe dar abertamente o meu voto, mas ainda para concorrer para que ela fique o mais perfeita possível.

Sr. Presidente: já da outra vez que falei, tive ensejo de dizer que discordava com a elevação das taxas, mantendo-se o sistema progressivo. Não quiz então entrar em larga discussão sobre o mapa constante da proposta do Sr. Ministro das Finanças, Cunha Leal. Simplesmente fiz uma ou outra observação e tenho pena de que essas observações não fossem agora atendidíis pelo actual Sr. Ministro das Finanças.

Uma dessas minhas observações dizia respeito ao limite mínimo que se estabelecia para que a contribuição pudesse recair sobre as transmissões. Outra era relativa ao limite máximo para a fixação da porcentagem.

Por esse mapa começavam a pagar contribuição as heranças superiores a cin-coonta escudos. Por outro lado na coluna última do mapa estabelecia-se a percentagem máxima em relação até 500 contos.

Eu disse que mo parecia que o mínimo de 50 escudos era qu-asi uma irrisão nas circunstâncias actuais. Hoje com a depreciação da moeda, 50 escudos não é nada. Em meu entender disse, esse limite devia subir para, ao menos. 250 escudos.

Que o limite dos 500 contos era também fraco e devia e-íevar-se até 1:000 contos.

Não tendo discutido o mapa da autoria do Sr. Cunha Leal, também não tenho de discutir o que é apresentado agora pelo Sr. António Maria da Silva, tanto mais que este é ainda mais simples quê o primeiro. Simplesmente notarei que relativamente à contribuição por título oneroso me não repugna aceitar qualquer progressão. Eu sei, é certo, que em mui-, tos espíritos existe a preocupação de que o estabelecimento de laxas por titulo oneroso retrai de certo modo as. transacções, mas a verdade é que eu sou de opinião contrária. Poderá nos primeiros momen tos notar-se, efectivamente, uma tal ou qual retracção, mas poqdo tempo depois essas transacções, principiam a fazer-se regularmente.

De resto, se nós atendermos à forma jjor que estão organizadas as matrizes, teremos ocasião de. verificar que o encargo que daí resulta não* é exagerado, visto que na totalidade dos casos os contratos por título oneroso se realizam por preços muito inferiores ao valor real. Como as desigualdades são maiores quanto maior for o valor da propriedade, o sistema progressivo seria além disso um meio de reparar as injustiças que resultam da fíiá organização dessas matrizes.

Uma das disposições da proposta do Sr. Cunha Leal que mais celeuma levantou nesta Câmara foi o artigo &.°, e por isso o Sr. Ministro das Finanças propõe a sua eliminação, à qual eu dou inteiramente o meu voto.

Sr. Presidente: sob o promisso de venda tem havido uma grande confusão na nossa legislação. O projecto introduzido na lei de 1899 foi julgado indispensável, sob o ponto de vista fiscal, para impedir os abusos que havia cie se fazer promis-sos de venda que nunca sê cumprem para evitar o pagamento da contribuição de registo; mas como isto não fosse o bastante, o Sr. Inocêncio Camacho na sua proposta de Outubro de 1920 preceituou qae não se chegando a realizar o contrato esfava--se dentro da nossa legislação civil que regula a indemnização par# o caso de haver signa!, estabelecendo que em nenhum caso a contribuição de registo seria restituída.

Agora não se confunde um direito fiscal com a lei civil.

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pode ser muita lógica, estabelece-se que, se por qualquer circunstância não se realizar a venda, não só não se restitui a contribuição, mas ainda mais uma vez a contribuição sobre ela incide como se uma nova transmissão se tivesse dado.

Isto é «ma obra de violência sem necessidade, porque admitindo que era lógica, n$o se trata de evitar um abuso, 'mas apenas de beneficiar o Estado.

Não se compreende que depois de se ter restringido o direito civil se imponha ao contribuinte uma contribuição sobre uma cousa que não se pode considerar transacção, pois se a venda não se chegou a realizar não há razão nenhuma para que se exija uma nova contribuição de registo.

E para isto que eu chamo a atenção do Sr. Ministro das Finanças, a fim de eliminar este artigo 8.°, que se procurou adoçar com o § 1.° e 2.°

Outras considerações eu tinha de fazer, mas reservo-me para quando se discutir na especialidade.

Desejaria assim considerações concretas do í$r. Ministro das Finanças a fim de que este assunto fique claramente definido.

É necessário que o contribuinte pague, mas que ele saiba o que tem a pagar e saiba a lei em que vive, e não o pode saber sem um diploma completo. Não o sabe com a legislação espalhada em várias leii, o que dá lugar a que os agentes do fisco possam lançar mão das mais extraordinárias interpretações para cair sobre o contribuinte e tornar mais vexatória a contribuição de registo.

Necessário é que a compilação da legislação da contribuição de registo se faça, e para isso bom será que a Câmara defina qual a sua idea e os princípios que deseja manter, para que depois não haja resoluções arbitrárias por parte dos Governos que porventura venham a intervir nessa obra.

A Câmara compreende qne ó um trabalho esse bastante difícil e até melindroso, tanto mais que os erros serão bastante prejudiciais para o contribuinte, pois que o contribuinte não tem defesa efectiva nas nossas leis, e desejaria que tivesse, p afã que só pagasse o que deva pagar ao Estado.

Só se deve exigir aquilo que ó justo,

sem as violências que estamos habituados a ver. Portanto, a proposta do Sr. Ministro das Finanças merece a minha simpatia e só desejaria que esta Câmara aprovasse esta lei de modo que ela seja de forma bem clara, de modo a evitar injustiças, e que a autorização fosse dada de modo a não ser aproveitada para se Afazerem vexames.

Posto isto, termino as minhas considerações renovando o meu pedido para que a proposta que mandei para a Mesa seja discutida juntamente com a que está em discussão, não fazendo porém parte desse projecto, porque é um diploma diferente.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra quando o orador haja devolvido as notas taquigráficas.

O Sr. Rego Chaves: — Em obediência - ao regimento, mando para a Mesa a seguinte moção de ordem:

Moção

A Câmara dos Deputados, reconhecendo a necessidade de com a maior urgência habilitar o Poder Executivo com leis que promovam o equilíbrio orçamental do Estado e garantam o progresso económico e financeiro do País, e considerando da maior oportunidade a discussão da proposta de lei relativa à'contribuição de registo, continua na ordem do dia.

Salas das Sessões, em 17 de Maio de .1921.—Francisco do Cunha Rego Cha-

Sr. Presidente: não tencionava pedir a palavra sobre a ordem na discussão da proposta sobre contribuição de registo; pedia-a não pelo prurido de querer apresentar uma moção, mas como maneira de garantir um lugar dentro da inscrição, já bastante numerosa.

Várias vezes me tenho referido ao facto da inscrição ser verdadeiramente avultada pela oposição, não sendo possível o ordenamento metódico dos oradores que atacam ou defendem a proposta om discussão, havendo sempre .oradores sucessivos contra ou a favor, como efer-riu o iár. António Granjo.

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mente, da maior oportunidade: é uma velha contribuição que o contribuinte aceita bem; e está portanto, perfeitamente no ânimo de todos, representando uma parcela no que diz respeito à contribuição de registo por título gratuito, de bens para cuja criação o herdeiro em nada contribuiu.

O Estado necessita de promover o equilíbrio orçamental, e não pode dispensar'-se de ir a esta fonte de receita para obter o aumento que deve atingir ciíra importante.

É esta uma proposta das mais delicadas que temos a discutir. (Apoiados).

E necessário que haja justo equilíbrio nas suas disposições para que não vá impedir o desenvolvimento económico do País, e mesmo não vá contra velhos hábitos e costumes estabelecidos que são lei.

A parte mais importante ó evidentemente aquela que diz respeito à graduação das taxas, e para esse ponto vou dirigir, principalmente a miaha atenção. . É absolutamente necessário que todos que entraram na discussão da generalidade da proposta digam desde já o que pensam sobre a especialidade, pois que as emendas a fazer não são de fácil e rápida apreciação e tem de haver coordenação.

A contribuição de registo pode ser por título gratuito ou por título oneroso. Foi pelo Sr. Ministro das Finanças perfeitamente caracterisado já cada um destes dois pontos, admitindo uma progressividade de taxas na contribuição por título gratuito, prescrevendo-se para a contribuição . de registo por título oneroso —e muito bem— uma taxa constante, pois o carácter das duas contribuições é perfeitamente diverso.

Fixou o Sr. Ministro das Finanças a taxa de 10 por cento para a contribuição de registo por título oneroso. Foi esta a taxa por mim projectada quando Ministro das Finanças e deixei-a consignada numa proposta de lei que mais tarde o Sr. Pina Lopes perfilhou.

Difere,"portanto, a proposta de emenda do actual Ministro das Finanças em absoluto da proposta do Sr. Cunha Leal, que estabelece uma progressividade de taxas na contribuição de registo por título oneroso, entre 9 e 16,5 por cento.

Sr. Presidente: a taxa estabelecida de 10 por cento já na minha proposta, já na

do actual Ministro das Finanças, é o termo médio das taxas para a contribuição por título oneroso estabelecido em 1918.

Mas se passarmos agora ao extracto da proposta apresentada pelo Sr. Ministro das Finanças, e especialmente sobre as taxas da contribuição de registo por título gratuito, nós temos de examinar com toda a atenção a proposta apresentada pelo Sr. Cunha Leal e bem assim a proposta do Sr. Pina Lopes, e fazer mesmo o seu estudo comparativo como este gráfico que construí e que tenho sobre a minha carteira.

O orador fez várias considerações sobre o gráfico.

O Sr. Ministro das Finanças apresentando a sua proposta de emenda não reparou nas variantes que existem entre a proposta apresentada pelo Sr. Cunha Leal e a do Sr. Pina Lopes, pois que de uma proposta para outra pode haver importantes diferenças de interpretação.

O Sr. Cunha Leal definia em absoluto qual era o valor da transmissão, que era" representada pela letra V na sua proposta, conforme consta do artigo 1.°

Porém, pela proposta do Sr. Ministro das Finanças, 'o valor da transmissão não é fixado nitidamente e o texto da sua proposta pode prestar-se a interpretações diversas.

. O Sr. Leio Portela:—Eu peço desculpa para dizer a V. Ex.a que na lei do Sr. Cunha Leal nem sequer estava bem definido o ponto de vista a que V. Ex.a se está referindo, o que é a meu ver um grande inconveniente.

O Orador: — O Sr. Cunha Leal tinha agravado as taxas, mas o facto é que na proposta actual de emendas àquela há variante de redacção que pode induzir erro.

O Sr. Presidente:—É a hora de se passar à ordem do dia.

Seg-uncla, parte

Continuação da discussão do orçamento do Ministério da Agricultura

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daménte repetir os pòntoj» mais importantes.

. Já sou parlamentai* antigo c só- agora pela .primeira vez assisti a nina discussão entre dois ministros, cada um com o sou critério diferente.

É uma questão qUe se poderia explorar; itiás iiao d faço. Não basta defender a doutrina do bota a baixo, isso é unia tarefa fácil, mas não devemos demolir.

Nos hão pretendemos contestar a necessidade de .estabilizar os serviços pú-blieds, nlàs estabilizar os serviços públicos não o poderemos conseguir do modo como 'quer fazê-lo o Sr. Ministro das Finanças.

Já ontem tive ocasião de d izer q ue dessa proposta não resulta a economia dam centavo, e ela acenas importa uma declaração vaga de que é necessário comprimir as desposeis^ reduzindo a duas as direcções do respectivo Ministério, com a mesma facilidade corn quê podia reduzidas a quatro ou a uma.

Diz O Sr. Ministro das Finanças que se rediiz pára duas direcções com a mesma facilidade com que eu as elevei de número.

Eu fui encontrar chefes de repartições com atribuições tam largas como os directores dos Miniâtéíiós, e eu fui dar os vencimentos correspondentes à categoria dos serviços que tinham de desempenhar, que na maioria eram de natureza técnica, estando à frente desse Ministério, que é técnico, funcionários técnicos, e não po-deúdo por isso terem Uma categoria inferior a outros directores dos vários Ministérios, que aliás têm uma preparação menos demorada do qtie as desses directores.

Í)é modo que S. Ex.a podia referir-se ao número dê direcções, mas não podia dizer que aumentei^os vencimentos dos respectivo^ funcionários pois que o que eu fiz foi igualar categorias.

Eti já fui ditador duas vezes, e podia ter feito reformas nos respectivos Ministérios, porque fui para isso solicitado muitas vezes; mas não o fiz.

•Neste País-cria-se muitas vezes a função para o indivíduo e procura-se uma função para-determinado cavalheiro.

O que se dá nos Ministérios dá-se em todos os serviços públicos^ e isso é realmente o que se chama uma funçanata, ú começar por esta casa.

Dizia-me ontem um colega meti, UIL. espírito do bastante elevação nesta Câmara, digno de toda a consideração, que nesta Câmara há duas classes de Deputados, uns que são funcioiiários públicos, outros qUe o não .silo.

Alguns liSo vêm à Câmara porcfue são funcionários e não vão à Repartição porque são Deputados, rna$ recebem os seus vencimentos.

Aqdeles que não são funcionários sofrem o desconto do subsídio se não vêni à Câmara, emquanto que os que são f u h ciouários não sofrem descontos alguns.

Há também alguns Srs. Deputados que recebem por esta Câmara a diferença dos seus vencimentos parft o subiiídio e qud não sofrem descontos tatnbém.

Isto também carece duma medida especial, para que tudo isto se ponha num pôde igualdade moral.

O Sr. Ministro atirou-se aos homens públicos que o antecederam, como S. Tiago aos mouros.

Suponho que S. Ex.a reconhecendo os erros próprios, começou por no-los confessar e só então se encheu de autoridade para exigir dá Câmara uma f rovidôncia da qual resultasse para a sua obra e dos outros a sanção devida e na devida oportunidade.

O Sr. Ministro -das Finanças caiu, é quando digo caiu não me refiro, evidentemente, à sua queda do Ministério, porque é meu desejo que durante muitos anos e bons "S. Ex.a não desminta a frase já hoje de todos conhecida do ifeu ilustre Presidente, de que pelo menos cinco anos estará no Poder.

Que enorme prazer ou sentirei vendei o Sr. Bernardino Machado durante cinco anos na Presidência do Ministério, acolitado pelo Sr. Ministro dás Finanças, meu velho amigo, pára que S. Ex.a ponha em prática os seus pontos de vista, que não são precisamente, nem cousa aproximada, os seus pontos de vista de ontem. Pela boca morre o peixe, e S. Ex.a quási que ia morrendo ontem.

O Sr. Ministro das Finanças atacou tudo e todos porque reformaram, porque nomearam, porque pejaram as repartições públicas de inúteis.

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nem um só, pode lançar impunemente a pedra a outro.

P Sr. Ministro das Finanças começou por dizer que nas reformas deste e daquele serviço tinha feito cumprir sempre rigorosamente as prescrições constitucionais porquanto sem a sanção da Câmara nada fez. Mas S. Ex.a reorganizou o Ministério do Trabalho.

O Sr. Ministro das Finanças (António Maria da Silva): -— Com a sanção do Paria mento.

O Orador: — Já disse e repito, pela boca é que S. Ex.a há-de morrer; o Parlamento fixou as repartições e serviços mas não fixou o número, nem qualidade nem o ordenado dos funcionários, e aqui é que está o busilis.

£ Que me importa que o Parlamento crie os serviços, os indique e esboce, se isso para as finanças publicas nada ó comparado com a legião de funcionários que S. Ex.a possa ter lá metido?

Eu sei que não pode ser nunca simpática a posição dum Ministro das Finanças e sobretudo num país arrumado em que toda a gente se permite fazer a crítica dos homens e das cousas com a mesma facilidade com que fumam um cigarro. Sei que ó extremamente melindrosa a situação do Ministro das Finanças num país como o nosso, sem recursos, que cada vez se vê mais assediado por exigências de toda a ordem, em que toda a gente lhe pede dinheiro e em que todo o mundo lhe nega um centavo.

Não vou portanto fazer uma oposição violenta a todas as propostas que o Sr. Ministro das Finanças traga à Câmara no sentido de melhorar a situação do tesouro público e de moralizar a administração do Estado. Todavia o que eu não posso consentir é que se tomem atitudes quási de irritação para com todos, atribuindo-lhes propósitos e responsabilidades que, em parte, cabem a S. Ex.a melhor do que a ninguém. A verdade é que S. Ex.a como Ministro tem feito positivamente o mesmo que todos os outros Ministros, e como leader dum partido, se, porventura, a política tem feito deste País um país desgraçado como frequentemente se afirma, a S. Ex.a se deve imputar com justa e indiscutível razão a maior culpabilidade.

Efectivamente o Sr. António Maria da Silva tem sido nestes últimos tempos o verdadeiro árbitro de toadas as situações políticas e, por consequência, comparti-cipante de todas as responsabilizadas criadas.

Governa-se um pouco com as oposições, diz-se. Mas não; o que se faz é deixar de governar. Governa-se, sim, mas ó com as maiorias, e as maiorias têm pertencido invariavelmente ao partido democrático, do qual o Sr. Ministro das Finanças ó uma das mais conceituadas figuras.

O procedimento do Sr. Ministro das Finanças no presente momento não foi nada hábil. Se S. Ex.a porventura procurou despertar a atenção da Câmara, levando-a a aprovar a sua proposta, não consegue o seu intento. Mas se a proposta de S. Ex.a, reflectindo as desinteligências existentes no seio dum gabinete, não representa mais do. que uma casca de laranja, não é esta a ocasião oportuna para de tal nos ocuparmos.

Seja, porém, como for, o certo ó que a atitude de S. Ex.a e posteriormente a do Sr. Ministro da Agricultura constituem um caso verdadeiramente inédito na nossa política. E então nós, que desempenhamos apenas um papel de fiscalização e não pesamos nas deliberações da Câmara, chegamos a esta situação embaraçosa.

E mesmo difícil chegar a concretizar uma opinião, porque somos obrigados a tomar partido e até ao ponto de, mesmo dentro do Governo, ter de aprovar uma parte e reprovar a outra.

Eu não me deixo levar na velha cantiga de que ó preciso reformar e comprimir, porque é preciso ver primeiro o que se vai reformar e o que se vai comprimir. Porque já estou habituado a que quando se trata de organizar e comprimir, nem se organiza nem se comprime cousa nenhuma.

Por via de regra quem mais padrinhos tem para ser funcionário público, mais incompetente é.

Se amanhã a comissão resolve reduzir os quadros, os menos competentes é que lá ficam e os habilitados vêm cá para fora.

Todos nós '" temos compadres, somos sentimentais e temos coração e não podemos resistir ao empenho.

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das despesas, porque estas trazem violências e injustiças.

(jQuem assegura a ordem pública no ^crís? A guarda republicana e a polícia, (. 'eio eu; mas a guarda republicana também representa um papel de importância-Tio caso de luta com o estrangeiro, pelo menos na hipótese de um ataque. £ Portanto eu pregunto que necessidade temos nób de ir buscar tanto homem à caserna, ao comércio e à indústria? Só se é para justificar esses milhares de oficiais que existem.

Creio que isto representa uma economia, com manifesta vantagem para o País e grande satisfação para esses homens que são chamados numa época em que a Pátria já deles não carece. .Mas, há mais ainda, Sr. Presidente. Temos a nossa Ks-cola de Guerra aberta para fazer oficiais, quando a toda a gente ouvimos dizer que há oficiais em demasia para a nossa força em soldados e para a pequenez do País. principalmente agora que, depois da guerra, chamámos ao activo oficiais milicianos. <_ com='com' aberta='aberta' a='a' de='de' e='e' apoiados.='apoiados.' ou='ou' quatro='quatro' ks-cola='ks-cola' h='h' guerra='guerra' p='p' cinco='cinco' fechamos='fechamos' por='por' frequência='frequência' havemos='havemos' não='não' continuar='continuar' anos='anos' porque='porque'>

£ Com respeito ao Colégio Militar que, .sem dúvida alguma, é um verdadeiro estabelecimento modelo sob o ponto de vista pedagógico, por que razão o não havemos de conservar aberto apenas para o ensino liceal, encerrando-lhe completamento as portas como ponto de passagem para o exército? Aqui é que, realmente, dovemo? fazer reformas e compressões de desposas, mas vendo os efeitos da nossa obra. Agora, ir a um Ministério onde se despendem vinte ou trinta mil contos, desorganizar serviços, cometer violências e praticar injustiças, para, no fim de contas, se economizarem uns duzentos contos — isso é que é uma compressão de despesas que eu não posso compreender.

O Sr. Ministro das Finanças na sessão de ontem quási que fez ironia sobre aquelas ideas quê muitos têm do que ó indispensável aplicar neste país processos cm voga, e desde há muito, na América do Norte, e que produzem um êxito seguro.

E então S. Ex.a, que também já foi Ministro da Agricultura, veio dizer-nos que a fantasia americana não é de forma alguma adaptável ao nosso país, porque, se

lá pode ser frutuosa, em Portugal de fan-" tasia não poderia passar.

Ora, Sr. Presidente, o que se faz na América poder-se-ia fazer em Portugal e pena é que entro nós se não faça o que lá se tem feito.

£ Mas porque razão se não faz?

Porque nós não temos elementos de trabalho, nem elementos de preparação, nem campos experimentais, e aiudí, porque os tais conselhos técnicos a que o Sr. Ministro das Finanças se referiu se acham inteiram enti; deslocados.

Eu também sou pelos consslhos técnicos, mas quero-os na província. E aí que eu quero que a sua acção se exerça. Quero também na província os campos de experiências e não em cantei::os e vasos na Ajuda e que, quando se preceda a sondagens para pesquisas de água, se procure a terra do sul, onde tanta falta faz, e não se vá para uma terra de constituição como a da Ajuda, de basalto, onde a sonda trabalha sem descanço o a água não aparece.

O Sr. Ministro das Finanças (António Maria da Silva): — <_ p='p' a='a' de='de' culpa='culpa' e='e' é='é' quem='quem' _='_'>

O Orador: — «;E do quem é a culpa?— pregunta o Sr. Ministro das Finanças. Não ó minha, não é dos burocratas, mas dos engenheiros que, tendo-lhes sido entregue uma sonda e conhecendo já a constituição dum terreno, deviam ter sido os • primeiros a aconselhar o seu uso no sul, porque da primeira vez que com ela tr'a-balharam deviam emprega Ia com uma certeza quási absoluta de êxito.

É que estes serviços técnicos só convêm em Lisboa. Ninguém quero sujeitar se à província, visto que lá não lia Martinho nem Brasileira, nem há Chave de Ouro, e outras casas -afamadas, não há nada disso.

Nemháeoscovilhice política permanente, que é o gozo da maior parte dos espíritos elevados da nossa terra.

Sr. Presidente : lá não se come tam bom como em Lisboa, sofrem-s o outras agruras, e põe-se mais à prova o saber década um, e muitas vezes os mais categorizados nos serviços públicos postos à prova tem de fazer-se deles juízo bem diverso, bem pouco lisonjeiro.

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jornal lhes atribuirá o que, de facto, não possuíam.

Os jornais são também um factor maior, concreto, no nosso país; porque o jornal coin extrema facilidade íaz do nada um estadista.

^E quantas vezes um homem de valor porque níío é da convivência ou porque, emfim, só recolhe mais e se afasta, quantas vezes ele passa despercebido a essa imprensa?

Do forma que quando a imprensa insulta a República e a Eepública se queixa, a imprensa está a bem. Neste ajuste de contas, neste desmanchar do feira, a imprensa tem uma cota parte de responsabilidade.

Eu queria que o Sr. Ministro das Finanças ao apresentar a proposta tivesse tirado à- Câmara a impressão, pelo menos, do que não vinha fazer proposta ad odium.

Antes de limitar a sua acção ao Ministério da Agricultura, quereria que o Sr. Ministro das Finanças nos viesse dizer já a indicação da reforma de todos os serviços públicos, porque assim, embora o Sr. Bernardino Machado afiance que está no poder cinco anos, quem me garante que o Sr. Ministro das Finanças não aplique o mesmo tratamento ao Ministério da Guerra que aplica ao da Agricultura?

Deveria fazer obra justa e igual para todos.

Dever-se-ia comprimir as despesas, aplicando o princípio a todos os Ministérios. Não só apenas, duma forma rigorosa, quási destruir o Ministério da Agricultura.

Não lhe regatearia os louvores.

Siv Presidente: estou de antemão convencido que depois do que ficou registado o Sr. Ministro das Finanças já modificou o seu papel de homem que dá, doa a quem doer.

Eu já estou habituado a ver que os Governos da natureza deste, de concentração, ainda que tenham ao leme uma figura como a do Sr. Bernardino Machado, são—releve-me V. Ex.a o termo, que vai sem ofensa,—uma espécie do mercado da praça da Figueira: todos têm o propósito de vender o seu peixe em prejuízo dos colegas. Não há unidade na apresentação de medidas, nem uniformidade na defesa das mesmas; e assim, no dia em que um Ministro apresenta e de-

fende um ponto de vista, o seu colega apresenta uma opinião contrária e defende-a também, cada um deles fazendo fin-capé no seu objectivo. Foi o aue sucedeu ainda ontem, entre o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Ministro da Agricultura.

A Câmara'tem de optar por um ou pelo outro, destes Ministros, porque chega à' conclusão dê nJlo saber o que o Governo quer.

Há duas opiniões em conflito. Se a Câmara vota o ponto de vista do Sr. Ministro das Finanças, eu pregunto em que situação fica o Sr. Ministro da Agricultura; mas se o ponto de vista do Sr. Ministro da Agricultura é aceito pela Câmara, o Sr. Ministro das Finanças em que situação fica colocado?

Eu não sei como o Governo vai resolver esta questão, a menos que intervenha nela o Sr. Bernardino Machado.

Em quanto o Sr. Presidente do Ministério não intervicr nesta contenda, mostrando uma solução que a todos agrade dentro do Governo, o conflito continua latente e a crise está aberta, ainda que ye-ladamente ao Parlamento.

O Sr. Presidente do Ministério, absorvido pelos seus inúmeros afazeres, que lhe dão água pela barba, está alheio à questão.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Bernardino Machado): — V. Ex.a está a fazer afirmações, sem as fundamentar em argumentos concretos.

Eu desejava saber em que é que V. Ex.a se funda para dizer o que está afirmando.

O Orador : —V. Ex.a apela para mim e por isso eu vou explicar-lhe mais detalha-damente as razões que me autorizam a fazer estas declarações.

O Sr. Ministro das Finanças, só com a responsabilidade do seu nome, vem a esta Câmara e apresenta a opinião de que o Ministério da Agricultura deve ter só duas Direcções Gerais.

Em seguida o Sr. Ministro da Agricultura declara que esse ponto de vista é erróneo, discordando absolutamente dele e sustentando o seu ponto de vista que é absolutamente contrário ao do seu colega.

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O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Beruardino Machado): — É simples. O Sr. Ministro das Finanças, sob o ponto de vista financeiro, disse a sua opinião que é no sentido de se fazer o máximo das reduções. O Sr. Ministro da Agricultura, sob o ponto de vista técnico, há-de falar. Finalmente lião-de chegar a acordo.

(Risos).

O Orador:—Aqui temos tudo explicado.

A Câmara poderia dizer que eu já estava a explorar unia situação de desacordo entre o Sr. Ministro das Finanças e o Sr. Ministro da Agricultura, para estabelecer mais fortemente a desarmonia ministerial; mas felizmente o Sr. Presidente do Ministério facilmente apreendeu o que sé passava e com aquela fraternidade que lhe é peculiar, mostrou logo a forma de tudo se arrumar.

São apenas duas teses. Uma posta pelo Sr. Ministro das Finanças, outra posta pelo Sr. Ministro da Agricultura.

O que resulta?

Resulta que ficaremos todos de acordo, mas sem se saber o que se quere. . j Ainda bem que estamos todos mais uma vez de acordo!

(Risos').

O Sr. Presidente do Ministério o Ministro do Interior (Bernardino Machado): — E por isso que o Ministério há-de durai-os tais cinco anos.

O Orador: — Desde que o Ministério há-de durar cinco anos, já todos poderemos viver descançados.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (Bernardino Machado): — Será um susto para muita gente, mas é um bem para o país.

O Orador:—Estou convencido disso.

Estamos na discussão do orçamento do Ministério da Agricultura, mas a verdade é que até agora o que se tem discutido é a proposta do Sr. Ministro das Finanças.

Quando se discutir o orçamento na especialidade eu também hei-de dizer o que entender, mas uma cousa devo acentuar:

é que sendo também do número daqueles que entendem que ó indispensável comprimir as despesas, eu hoje discordo da proposta do Sr. Ministro das Finançss, porque, como bem disse o Sr. Presidente do Ministério, ela não passa duma tese.

Não se vê em tal proposta nenhuma cousa de que resulte diminuição de despesa num centavo sequer, como já disse.

Ela simplesmente manifesta a, opinião de que deverão ser reduzidas a duas as direcções gerais do Ministério da Agricultura.

^Mas quais ?íío as que deveu, desaparecer? Ninguém sabe.

Não sei com qual o Sr. Ministro das Finanças simpatisa mais.

A este respeito eu pregunto a V. Ex.a:

Não vejo aqui um único artigo que se refira ao assunto.

Desde que no Ministério da Agricultura existe um secretário geral e um director geral,V.Ex.asestão a vero que resultará.

Como V. Ex.as vêm, a proposta diz apenas que ôles ficam adidos, nada dizendo relativamente aos seus Tencimen-tos, pelo que facilmente se pode concluir que eles ficam adidos recebendc os seus ordenados apenas de categoria.

Interrupção do Sr. Ministro das Finanças que se não ouviu.

O Orador; — Eu devo dizer francamente que um Ministro das Finanças não devia responder assim.

Não se diz aqui nada, absolutamente nada a tal respeito.

Aqui não se diz que ele deve receber este ou aquele vencimento, e ass!m eu devo dizer que não há nem pode haver dúvidas sobre o ponto de vista a que eu já tive ocasião de me referir.

V. Ex.a compreende muito bem que quási sempre se resolvem os assuntos a favor do reclamante, e o reclamante neste caso é o funcionário.

Não resta dúvida de que o assunto naturalmente terá de ser resolvido a favor da parte mais fraca, e a parte mais fraca é neste caso o funcionário.

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O Sr. Ministro das Finanças ha-de aproveitar todos os meios para não pagar e poder guardar nos cofres do Estado importâncias que deviam de lá sair.

Eu devo dizer francamente que considero isto uma manha de merceeiro, o que se não pode admitir de forma nenhuma adentro da República.

Vamos, Sr. Presidente, entrar na apreciação do orçamento do Minis tário da Agricultura na especialidade, e assim te-reinos ocasião de verificar como serão aplicadas várias taxas.

Infelizmente, Sr. Presidente, quando nós devemos reforçar as verbas de material, r-eduzimo Ias à expressão mais simples, porque hoje o Estado não ganha para pagar aos seus funcionários. Mas isso não ó defeito exclusivo do Ministério da Agricultura, é um mal que ataca todas as administrações, e que não é um resultado da obra da República, mas uma consequência ló"gica dos hábitos deste povo, que, embora tivesse mudado de regime, não mudou de educação.

Sr. Presidente: eu não sei até que horas V. Ex.a tenciona manter a sessão aberta, porque desejo fazer a análise do orçamento do Ministério da Agricultura na sua especialidade, e não quero ...

O Sr. Presidente: — O que está em discussão é a generalidade.

O Orador : — Sr. Presidente: eu quero fazer com cuidado a análise desse orçamento, porque tendo passado por esse Ministério, tive ocasião de reconhecer quão valiosos são os serviços prestados por todos os seus funcionários, e quanta importância tem a sua obra de regeneração, extensiva a todo o país, porque há-de ser por aquele Ministério que podemos fazer unia obra grandiosa quê honre a República e os seus processos.

Mas, Sr. Presidente, sinto-me entristecido, ao ir iniciar o estudo de um orçamento que não sei se será já cousa morta, ou se, pelo contrário, irei apreciar um documento que não é mais do que a concretização duma obra a realizar.

En devo confessar que o Sr. Presidente do Ministério procurou tranquilizar-me, afastando absolutamente a idea duma crise ministerial, mostrando que estava assente uma solução airosa para o Ministério, e

portanto resolvido o conflito entre o Sr. Ministro das Finanças e o da Agricultura. Mas, apesar dessa declaração, eu ainda neste momento não sei se a boa doutrina prevalecerá, e, conseqúentemente, se valerá a pena estudar este asíunto com a atenção que lhe quero dedicar.

Aguardo a resolução da Câmara, a propósito da proposta do Sr. Ministro dos Finanças, para continuar a apreciar este documento, quando se entrar na discussão na especialidade.

Tenho dito.

O discurso será publicado na íntegra, quando o orador haja devolvido as notas taquigráfi.cas.

O Sr. Presidente: — Está interrompida a sessão, para recomeçar às 21 horas e 30 minutos.

Eram 19 horas.

O Sr. Presidente: — Está reaberta a sessão.

Eram 22 horas e 20 minutos.

O Sr. Cunha Leal: — Estranho que o Sr. Ministro das Finanças não esteja presente ; e, por isso, hesito em falar sem a presença de S. Ex.a, pois tenho de apresentar uma moção que diz respeito à proposta do mesmo Sr. Ministro.

O Sr. Presidente:—Está presente o Sr. Ministro da Agricultura.

O Orador: — Sr. Presidente, com grande pasmo meu, depois do que o Sr. Ministro das Finanças aqui disse, estranho que S. Ex.a aqui não esteja (Apoiados).

Talvez V. Ex.a pelo telefone pudesse avisar S. Ex.apara aqui vir, pois não falo sem "a presença de S. Ex.a

Pausa.

Entra na sala o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Presidente:—Pode V. Ex.a continuar no uso da palavra.

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Moção

A Câmara dos Deputados, atendendo a que o Sr. Ministro das Finanças, pela apresentação da sua proposta da remodelação dos serviços do Ministério da Agricultura, interpretou as aspirações do país no sentido de que, fazendo-se, na discussão do Orçamento, os cortes indispensáveis em despesas consideradas excessivas, esta discussão sirva para alguma cousa de útil, manifesta-lhe o seu aplauso e passa à ordem do dia.

Sala das Sessões, 17 de Maio de 1921, o Deputado — Cunha Leal.

Sr. Presidente, não me impede o facto de serem dez c meia e estarem presentes pouquíssimos Deputados da nação e só agora chegar o Sr. Ministro das Finanças, que já por duas vozes manifestou a sua indignação, que tocou as raias da loucura, nada disso mo impede de apresentar a moção de aplauso ao Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças (António Maria da Silva):—Circunstâncias independentes da minha vontade impediram--me de estar aqui às nove e meia. Espero que V. Ex.a e a Câmara me desculpem.

O Orador:—Agradeço as palavras do Sr. Ministro das Finanças..Eu sei que os homens públicos em geral têm muito que fazer; mas eu é que não podia falar sem ,a presença de V. Ex.a

Tenho muito prazer em mandar para a Mesa a minha moça1 o e sinto que estejam presentes* tão poucos Srs. Deputados.

Li a moção mandada para a Mesa pelo Sr. Domingos Cruz, e concordo com ela, do principio ao fim. And/i-so por aí reclamando a discussão do Orçamento, e eu pregunto à conscióncia dos poucos que me escutam se a discussão do Orçamento ó para as pessoas que a reclamam uma cousa quiçá tão importante como a discussão dos micróbios que existem nas notas de meio tostão.

Eu creio que, para a maioria das pessoas que reclamam a sua discussão, como para a maioria dos .Deputados que aqui faltam, ela tem a mesma importância. Para mim não tem, e eu declaro a V. Ex.a 3 aos poucos assistentes que nesta sala se encontram que, posto em face do dilema, ou a discussão do Orçamento serve para

alguma cousa, ou ela serve simplesmente para verificar se as verbas cst£,o bem inscritas, se tivermos de optar peia segunda hipótese, eu requererei que" se ponha o maço dos orçamentos em cima da mesa, e o Sr. Presidente, calçando a luva, solenemente nos diga : ,; Aprovam e:n conjunto todos os orçamentos que aqui estão V Eu por mim, declararei que os votD integralmente.

Sr. Presidente, a discussão dos orçamentos serve para mais alguma cousa do que verificar a exactidão das verbas inscritas pelas repartições dos diferentes Ministérios, de acordo com os leis em vigor. E a não ser assim estamos a perder um tempo precioso, porque cada hora de sessão no fParlamejito custa mais do 500es-cudos. E perder muito tempo e muito dinheiro num trabalho absolutamente inglório.

Verificar a exactidão das verbas inscritas, não é nada.

Sc querem que o Orçamento signifique qualquer cousa, uma vez apravado, se querem que ele represente o sentir geral cia Nação, tem do se fazer em todos os Ministórios aquilo que nobremente o Ministro das Finanças quore fazer no da Agricultura: cortar aquilo que representar despesas inúteis.

De modo que, Sr. Presidente, em resumo, eu não posso deixar de aplaudir a idea do Sr. Ministro das Finanjas, ainda que possa discordar' dela nos seus detalhes. Poróin, entendo que ao começar-se a discussão dos orçamentos, pelo do Ministério da Agricultura, ó prec;!so que se marque uma atitude. A disctissão do Orçamento serve para se modificar a contextura das despesas do Estado, e para indicar o caminho a seguir no.que respeita às verbas nele inscritas. A não ser assim, é melhor o Sr. Presidente calçar a luva, colocar em cima da meua os orçamentos e dizer que são todos aprovados duma vez.

Porque concordo em absoluto com a moção do Sr. Domingos Cruz, eu entendo do meu dever marcar numa outra m oçâo, que não é só minha, porque representa o sentir do Partido Popular, aquilo que sentimos a respeito da discussão cío orçamento.

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Menos do que uma moção de aplanso ao Sr. Ministro das Finanças e menos do quê um aspecto episódico das nossas lutas políticas, a moção que em nome do meu Partido0tenho a honra cie mandar para a Mesa serve, principalmente, para definir claramente a situação.

Poucas pessoas possuem como eu, nesta hora em que é indispensável cada um dizer da sua justiça, tanto direito a ter ressentimentos do ex-leader do partido democrático e actual Ministro das Finanças. Repito-o de novo porque entendo que o devo. fazer sentir, não para fazer sobressair uma pretendida atitude de generosidade da minha parte, mas para estabelecer um confronto que não pode deixar de ser interessante.

Comprima S. Ex.a as despesas, cumpra a sua promessa, ponha em execução .os seus princípios; não será o Partido Popular que lhe irá embaraçar a sua acção. Estamos resolvidos a aprovar tudo quanto S. Ex.a nos apresente no sentido dessa compressão, e tão resolvidos que nem sequer nos preocuparemos com a forma por que S. Ex.a tencione proceder a essa compressão.

Eu não quero saber se o Sr. Ministro das Finanças seguo ou não os meus pontos de vista em matéria financeira; quero apenas saber se S. Ex.a aumenta ou não as receitas, diminui ou não as despesas. Isso ó que me interessa. Eu, por mini, dígo-o sem segundo sentido, honradamente, como republicano que ama a República acima de tudo menos a Pátria, estou disposto a dar todo o apoio à obra de redução de despesas tão preconizada por S. Ex.a

Não lhe farei perder um segundo em apreciações de qualquer natureza, e tanto assim que estou disposto a pedir a todos os membros do Partido Popular o sacrifício dos seus princípios, neste ponto.

JtLi não será S. Ex.a quem sairá daquela cadeira arrastado por votações ineptas de todos nós. Estará ali amarrado, amarrado àquela cadeira, para cumprir o que prometeu no seu lugar de Deputado, porque os homens públicos só se dignificam quando cumprem no poder o que na oposição prometeram. Nada mais lho exigimos senão que faça alguma cousa om defesa desta terra, que aumente as receitas — não queremos saber como— e que

comprima as despesas, não nos interessa por que forma. S. Ex.a apresenta uma proposta e nós aprovamo-la cegamente. Preciso de fazer esta afirmação na presente hora em nome das minhas convicções, porque ou tantas vezes ali senti a falta do apoio do Sr. António Maria clã Silva, achar-me ia ma-1 com a minha própria consciência se dôste lugar procedesse para com S. Ex.a pela mesma fornia por que S. Ex.a procedeu para comigo.

Sr. Presidente: a questão está posta em termos claros. Não representa nesta luta nobre e honradamente estabelecida eotre os Srs. Ministros da Agricultura e Finanças uma escolha entre S. Ex.as Nada temos que conhecer a esse respeito, pois que acreditamos que tam nobres são as intenções do Sr. Ministro das Finanças como as do Sr. Ministro da Agricultura, cada um deles defendendo o seu ponto de vista.

Portugal é uni país de impressões. Nós somos capazes de fazer uni movimento em volta do folhetim ao Barràbás ou de qualquer Bibi que apareça no momento e do andar pelas lojas de barbeiro à espera de que nos entreguem um bilhete permitindo-nos fazer a barba de graça. Temos este defeito: somos caracterizadamente um país de impressões. Estabelece-se contra os Ministros que queriam aumentar as receitas uma campanha: a campanha da compressão das despesas. Mas, quando ocupava a cadeira de Ministro das Finanças, eu dizia a mim mesmo: Se eu quizesse apontar à Nação os serviços inúteis dos funcionários A, B ou C, para acabar com os respectivos cargos, far-se--ia em relação à compressão das despesas campanha idêntica à que se está fazendo sôbre"o aumento das receitas. Numa conferência que tive ensejo de fazer na Sociedade de Geografia declarei isto mesmo. A lei n.° 1:040 pôs fora do exército cerca de 600 oficiais, e, apesar da campanha da redução das despesas, logo o país se revolveu num movimento de sentimentalismo, lamentando as famílias desses oficiais, e ainda hoje o Senado se ocupa da lei n.° 1:040.

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Maria da Silva, o que é que nos espera se a sua tentativa não for levada a cabo? vSe o Sr. Ministro das Finanças fracassar, se S. Ex.a se não aguenta, se não é apoiado fortemente pela Câmara, que esperanças poderemos nós ter de regeneração nacional?

Se a tentativa falha, mal vai para nós, porque não é o Sr. Ministro das Finanças apenas a vítima, como eu fui. Somos todos nós.

Porque assim penso, e já uma vez das cadeiras do poder clamei a redução das despesas, eu quero dizer qual ó a minha forma de pensar.

Tinha eu chegado há pouco de França quando em Portugal se criou o Ministério da Agricultura. Portanto assisti um pouco à nascença desse organismo e sei que lentamente, pouco a pouco, chefes de repartição se transformavam em directores gerais, com os respectivos vencimentos.

Isto não tem grande importância para o Orçamento do Estado, mas o que é certo é que hoje quási desapareceu a hierarquia no funcionalismo, chegando as classes de cima a viverem na miséria.

,; Teremos nós a coragem de os discutir? Não; porque as condições de vida estão de tal forma que a vida nessa sentimentalidade não consentiria essa violência.

E devemos reparar noutra cousa. O Ministério da Agricultura surgiu e cresceu das forças vivas.

É no Ministério da Agricultura que existe um grande luxo, um excesso de grande burocracia, um respeitável número de directores gerais, como não há em qualquer outro Ministério.

Fernandes de Oliveira, que foi escolhido pelos próprios agricultores como seu Ministro, não pode subsistir. Este Ministério,. onde têm estado na sua maioria represen-tautes das forças vivas, é*acuele que se instalou mais luxuosamente, com maior exibição de directores gerais —e de lamentar é que os seus directores gerais não tenham manto bordado a ouro, de maneira que de manhã fosse presenciada a entrada solene para o seu Ministério desses directores gerais— é o primeiro por onde devem começar as economias. E por isso deve ser simplesmente suprimido.

O Ministério da Agricultura cresceu tam rapidamente, com um tal desenvolvimento de burocratas, com um luxo asiático de funcionários, que logo de começo se fez para ele a nomeação de oito directores gerais que com o Secretário Q-etal perfazem o número de 9.

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Eis porque, além de todas as outras razões, no meu espírito colheu a idea do Sr. Ministro das Finanças, concretizada na proposta ontem apresentada com o fim de diminuir despesas.

Mas esta supressão de despesas não basta. Não teria importância se ficássemos por aqui.

Precisamos de comparar as previsões orçamentais das receitas com as despesas que se antolham.

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Por conseguinte isto, só, não tem-importância. O que importa é o seguinte:

Num país em que as associações comerciais,'industriais e de agricultura gritam todos os dias e a todas as horas que é preciso fazer a compressão de despesas, devendo começar pelo Ministério da Agricultura, devemos dar-lhe o prazer de cortar o luxo que essas forças vivas estabeleceram no Terreiro do Paço. E não devemos perder o ensejo que se nos oferece. Se não soubermos aproveitar esta ocasião, não teremos nunca mais direito de dizer aos outros que, de facto, queremos a compressão das despesas. E é preciso acentuar que a supressão apenas desta despesa, em face do problema nacional, não é nada.

A compressão das despesas só pode ser importante no Ministério da Guerra e da Marinha; mas essa compressão de despesas exige uma remodelação tani pro-profunda na vida orgânica do exército e da armada que eu duvido de que o Parlamento tenha" coragem para tanto na época agitada que decorre.

(Apoiados).

Poderíamos reduzir a quatro as oito divisões que temos, remodelando profundamente o nosso exército.

(jQuem pede a compressão de despesas? A Associação de Agricultura. O Parlamento que responda, apoiando calorosamente essa associação e diga que vai reduzir essa despesa luxuosa do Ministério da Agricultura.

Concordamos com ela. Pede-se reduções? Óptimo! Damos-lhe o nosso apoio como damos o nosso apoio a todos os cortes que o Sr. Ministro das Finanças quiser fazer.

Se S. Ex.n morrer não há-de ser às nossas mãos, há-dò ser às mãos das pes-soos que ali o levaram.

Mas, dizia eu, é de facto necessário que isto não pare aqui. Não sei quais são as opiniões do Sr. Ministro da Guerra a este respeito. Lembro-me apenas que quando estive no Ministério disse a S. Ex.a, criatura que nos merece todo o respeito, que era necessário para tranquilidade deste País e ainda porque as associações comerciais, industriais e agrícolas só querem pagar quando comecem os cortes, que era necessário, repito, fazer qualquer cousa no Ministério da Guerra, fazer uma

nova reorganização do exército que lhe permitisse com a maior economia fazer reduções de despesa.

ji( meu ardente desejo que S. Ex.a esteja estudando o assunto para quando chegarmos à discussão do orçamento do Ministério da Guerra, S. Ex.a trazer qualquer proposta no sentido de fazer reduções de despesa; porque não se concebe que um país como o nosso tenha uma força pública que lhe esteja gastando quási metade das suas receitas.

É preciso que olhemos para isso, é preciso que liguemos a nossa atenção a êsso problema, S. Ex.a tem obrigação de mandar estudar o assunto por intermédio dos corpos dirigentes do exército, e o Parlamento, ouvido a sua opinião, tem o dever de pronunciar-se sobre ele.

Mas, há no próprio Ministério da Agri-crltura um problema que é gravíssimo o eu falo nele porque é preciso.

Não argumento, mas parece que S. Ex.a quer cortar na receita correspondente aos 30:000 contos.

Essa despesa está no orçamento desde os tempos em que começou a guerra, para acudir à crise das subsistôncias.

Acerituou-se que nós perdemos 30 por cento.

Para uma verba de despesa na importância de 45:000 contos consignámos em contrapartida 10:500 contos.

Para acudir à crise das subsistências durante a guerra, consignámos no orçamento 10:000, 15:000 contos, mas essa desposa avolumou-so a 160:000, com a acquisição de 200:000 toneladas de trigo. Por isso temos de aumentar duas vezes essa verba. . Ninguém se importa com isto.

O Sr. Costa Júnior já explicou a natureza desta, verba.

E preciso que a Câmara se pronuncie a respeito disto, para o efeito da sua política de trigos.

A comissão do orçamento precisa de ouvir o Parlamento.

O Ministério das Finanças abre uni crédito de 30:000 contos, para pagamento de trigos.

• A Direcção -Geral da Fazenda Pública nunca mais só lembra do inscrever essa verba. v

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l)iârio da Câmara dos Deputados

se tem comprado 200:000 toneladas de trigo.

Direi mais uma vez. Para que as contas do Estado joguem, é preciso quo se inscrevam como despesa as verbas correspondentes às despesas. (Apoiados).

Se queremos continuar a política dos trigos, calcule-s e o déficit de trigos em 200:000, 800:000 toneladas e outras dês-pesas com a aquisição dos trigos, porquanto devemos calcular que perdemos 30 ou 40 por cento, ou ainda mais, 50 ou 80 por cento, e inscrevamos no respectivo orçamento a verba necessária para esta despesa com os trigos.

Todos os Ministros das Finanças têm resistido à tentação de inscrever a verba com o aumento necessário; outras vezes, como quando se procedeu à elaboração do orçamento que se discute, diz-se ser preciso mudar a política de trigos, e nada se faz.

Se vamos bruscamente aumentar o preço do p3.o, provocaremos uma reacção por parte dos que comem pão à custa do Estado.

Com a elevação do preço do pão provocaremos uma revolta popular.

Por outro ludo, se aumentarmos em 100 por cento o preço do pão, os funcionários vítimas do aumento de preço do pão, formularão novas reclamações sobre aumento de vencimentos.-

Reduzir a despesa equivale a aumentar a receita correspondente.

Não há despesa alguma que não tenha a contrapartida de receita.

Tem de inscrever-se essa contrapartida.

O Sr. Costa Júnior: — A comissão quis que a Câmara estabelecesse a_sua regra o que se deve seguir em questão de trigos. Assim essa verba teria -de ser aumentada ou diminuída.

É uma hipótese apenas essa.

O Orador: — O Sr. António Granjo como leader do Partido Liberal e conhecedor da matéria agrícola, defensor estrénuo do princípio de liberdade do comércio, uma moção sua defendida, encontra-se em circunstâncias de decretar essa liberdade de comércio.

Com a liberdade de comércio todos os preços duplicaram pelo menos. Haja em vista o que se passou, por exemplo, com

o azeite; unia voz que desapareceu a tabela era vendido a quatro e a cinco escudos.

O Sr. António Granjo proclamou quo se elevariam os salários.

Esquecia-se dos funcionários públicos que também comem e o Estado não está em condições de lhes pagar em relação ao aumento desordenado dos géneros.

S. Ex.a veio aqui um dia e numa moção que apresentou à Câmara proclamou a liberdade do comércio.

,;Como é que, por exemplo, para o pão se pode decretar a liberdade do comércio se a respectiva indústria declara não estar apta a comprar o produto para a sua la-boração ?

,;Como é que se poderá concluir que o preço do pão vai ser decretado sem prejuízo para o Estado?

Se o Estado vai marcar dia a dia o preço do pão, com as variações, cambiais, o Estado não estará ao abrigo de prejuízos.

^Se amaohã o trigo for para 500 xelins, vamos pôr o preço de cada cuilograma de trigo a 1$80?

O problem-a é complexo.

A Câmara precisa marcar ao Ministro da ^Agricultura uma atitude deJinida.

K preciso marcar se S. Ex.a deverá mesmo ante todos os riscos de perturbação da ordem, de greves que poderão atingir o próprio funcionalismo públÍ20, seguir aberta e francamente o caminho da liberdade de comércio, sem se deixt.r margem no orçamento para esses prejuízos.

S. Ex.a não precisa de Sancho Pança para o acompanhar, mas eu eslou pronto a servir-lhe de escudeiro para satisfazer a falada compressão de despesas.

As associações pedem compressão de despesas, faz-se a compressão de despesas.

Noutro ponto nós podemos estar de acordo e talvez que seja uma maneira de conciliar os dois Sr s. Ministros. — Fazemos a compressão de despesas e degolamos alguns dos directores gerais.. . Eealmente, onze directores gerais a inventarem despachos, deve ser demais. ;Eu jáastivocom quatro e chegavam! Que fará com onze!

Noutro ponto ainda pode a Câmara pronunciar-se a favor do Sr. Ministro da Agricultura.

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Havia enteio um assunto a estudar. Eu não venho trazer de novo à tela da discussão o caso da Agência Financial, mas não há dúvida que ele tem para nós uma importância capital. Por virtude da aquisição do trigo, o Estado tem de ir à praça comprar cambiais.

Pregunto : — ^ é o Estado que continua a comprar trigo? ^Estará a moagem preparada para isso?

O Sr. Costa Júnior (interrompendo]: — Se V. Ex.a dá licença, eu leio a moção do Sr. António Granjo, que tenho aqui.

Leu.

O Orador: — Eu agradeço a V. Ex.a a leitura da moção, que me veio relembrar os seus termos.

Kla era muito comprida e a minha curta inteligência não pôde abranger tudo...

Mas de liberdades de comércio estamos nós farto s.. Liberdade de comércio implica liberdade do venda de produto, e, portanto, liberdade de marcação do preço.

A outra questão a estudar, ia eu dizendo, é se o Estado quere continuar a ser o comprador de trigo. O Estado já hoje não recebe as libras necessárias; tem de ir à praça.

No caso da compra do trigo ser entregue a outra entidade, tem de haver as naturais cautelas para que o público não venha, afinal, a ser lesado.

Vinha tudo isto a propósito de dizer que acerca da discussão do orçamento do Ministério da Agricultura se levantam vários problemas.

Quanto a compressão de despesas, o Sr. Ministro das Finanças tem o nosso voto a ela fixado.

De modo que, voto pleno, confiança plena.

Sobre o pão é necessário que o Governo diga se quero perder mais ou não.

Vou terminar.

Esta discussão deve ser feita com toda a serenidade, e o Partido Popular não deseja1 criar embaraços â quem quer que seja.

É lida a moção.

É admitida.

O Sr. Ministro da Agricultura (Portugal Durão): — Diz S. Ex.a que deu o sou

apoio à proposta do Sr. Ministro das Finanças relativa às alterações a fazer no Ministério da Agricultura, porque elas representam a efectivação do seu programa.

Pela minha parte, devo dizer que sou partidário da redução das despesas. Mas S. Ex.a caiu numa contradição, porque disso que da proposta não resultava a compressão de despesas porque se não iria pôr ninguém, na rua.

O Sr. Cunha Leal: — Disse dessa mesma cadeira que isso era medida útil para daqui a seis anos, mas que era preciso começar.

O Orador: — Observou S. Ex.a que seria curioso ver chegar pelas onze horas da manhã directores gerais do meu Ministério envoltos nas suas capas de arminhos.

O que eles ganham não chega para tanto.

Mas fala-se em os reduzir.

E eu pregunto: £ qual o critério em que se fundam para preconizar essa redução?

Nunca porém isso dava diminuição do despesa, porque elos continuariam pesando no orçamento.

O Sr. Vasco Borges: — Este critério é aplicado a todos os Ministérios.

Não se trata duma medida ad odium, E para todos.

O Sr. Aníbal Lúcio de Azevedo: — É

aplicar a lei n.° 971, e mais nada.

O Orador : — Obedecendo a esta orientação de comprimir as despesas, eu tive o cuidado de nomear uma comissão com o fim de estudar a forma de se aumentar o preço do pão de maneira que o Estado deixasse de perder a verba quo estava perdendo com o fim de fornecer pão barato às populações de Lisboa e Porto.

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Para estabelecer esse preço comercial do pão ó evidentemente indispensável atender às circunstâncias de momento. Seria preferível ir-se aumentando a pouco e pouco. De resto, se a situação cambial se modificar, ele automaticamente se pode reduzir.

Disse S. Ex.a que uma compressão de despesas nestas condições é uma compressão platónica. Eu não concordo. Estou absolutamente convencido de que essa compressão se pode realizar.

O Sr. Cunha Leal:—Assim até Platão comprimia as despesas.

O Orador: — Mesmo sem aplicar a doutrina de Platão pôde o TransvaaL realizar uma grande transformação económica.

O nosso país c um país velho, e tem enormes quantidades de terrenos incultos.

Se V. Ex.as rne vierem pôr ôsle problema: £ devo o país produzir trigo ou não? Eu direi que isso é uma questão aparte.

Porém o nosso país tem elementos para, pola sua agricultura, produzir géneros capazes de se transformarem eu ouro, e sem termos de exportar ouro para ocorrer ao nosso déficit cerealífero. Ora para quo^nós possamos ter trigo em Portugal, nilo é preciso produzir trigo. Pelos géneros que nós exportássemos receberíamos em troca trigo, sem termos de exportar ouro.

Com respeito cá redução da verba para a crise económica, eu acompanho inteiramente o Sr. Cunha Leal.

É necessário primeiro que tudo que a Câmara defina positivamente a sua política, e só então é que podemos fixar esta verba. Reduzi-la a 30:000 contos som mais estudos é uma pura fantasia.

Com respeito à redução proposta pela comissão ela é apenas de 246 contos.

Estando no orçamento inscrita a despesa de 30:246 contos, e sendo 30:000 contos para a crise económica, fica portanto a economia proposta para o Ministério da Agricultura reduzida a 246 contos.

Quando se tratar da discussão na especialidade eu terei ocasião de dizer quais as direcções que entendo que se devem

conservar, e que julgo indispensáveis para o bom funcionamento de todos os serviços.

'O discurso será publicado na íntegra quando o orador haja devolvido as notas taquigráficas.

O Sr. Ministro das Finanças (António Maria da Silva):—Ele, orador, já pediu desculpa ao Sr. Cunha Leal e â Câmara da sua demora em vir à Câmara para a discussão deste orçamento.

Posto isto, deve repetir as suas afirmações produzidas na sessão nocturna de ontem e que foram contestadas depois pelo Sr. Jorge Nunes. Não é porque isso lhe traga algum relevo; não c porque ele, orador, queira fazer melho: do que os outros, não. E apenas para que tudo fique esclarecido.

Dissera ontem que as fórmulas que tinha tido a honra de referendar e que eram da sua iniciativa, todas elas tinham sido versadas pelo Parlamento.

Uma, a denominada lei n.° 26, a lei da agricultura; anteriormente a lei das estradas, depois a lei dos caminhos de ferro, a do porto de Leixões, a lei das minas, o crédito agrícola e várias outras.

Não pode portanto ninguém afirmar que o seu procedimento era porventura igual, em qualquer momento, ao de outras pessoas.

Isto também não representa apouca-mento para essas pessoas, mas Lpenas o seu intuito de esclarecer bem o» factos.

Posto isto vai fazer agora referência à lei n.° 494 que criou o Ministério do Trabalho.

Embora a proposta fosse uma idea muito geral, tinha contudo todos os artigos necessários. E se não foi discutida nesta nem na outra Câmara, e se passou apenas com simples declarações da parte de alguns membros do Parlamento por virtude da força das circunstâncias daquele momento, ele, orador, não tem culpa alguma do que se discutisse ou deixasse de discutir. Ele, orador, tinha cumprido o seu dever.

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Os Srs. Jorge Nunes e Ferreira da Rocha disseram que o projecto apresentado sobre redução de despesas era vago. Não é tam vago que não possa ser atingido por quem tiver os conhecimentos e a prática de legisladores. Só não compreende quem não quero.

Por aquelas razões a que já se referiu, toda a gente reconhece que não pode deixar de haver uma direcção geral.

Cm país como o nosso, que tem de colocar os seus produtos no estrangeiro, é preciso que tenha um,serviço devidamente montado.

Já disse na sessão passada que tinham ingressado no Ministério da Agricultura serviços que pertenciam ao Ministério dos Abastecimentos.

Mas, por mal de todos os pecados, meteram no Ministério da Agricultara os funcionários que vieram do Ministério dos Abastecimentos, funcionários que eram filiados no Partido Liberal; e aqui na Câmara uma das vozes que só levantaram no Parlamento contra o ingresso destes funcionários no Ministério da Agricultara era do Partido Liberal.

É notório que depois de Monsanto o número de funcionários aumentou extraordinariamente, com a criação de novos serviços, agravando consideràvelmente as finanças públicas, E absolutamente indispensável arripiar caminho. Os serviços têm de ser remodelados por forma que traduzam uma palpável redução de despesas. Sem isso, não é possível resolver a situação que aflige o país, nem é possível exigir do contribuinte aquilo que há necessidade de lhe pedir.

A sua proposta reduzindo a duas direcções gerais os serviços do Ministério da. Agricultura obedece a essa orientação.

Não há juanoira de nos impormos perante o país senão fazendo economias.

Toda a gente neste país exige dinheiro sem olhar para a situação do Tesouro, parecendo que não tem a noção do momento que se atravessa. A hora é de sacrifícios, mas para todos

O orador declara que não quis fazer política nem quis fazer um discurso. Devo dizer ao Sr. Jorge Nunes que ao apresentar a sua proposta não o determinou nenhuma má vontade para quem quer que fosse. Não o move qualquer ódio a qualquer pessoa que desempenhe o lugar de

director geral. Xão tem ódio a ninguém; e, quando o tivesse, nunca se aproveitaria do seu lugar para o satisfazer.

Além disso, o funcionário a quem S. Ex.a se queria referir foi quando ele orador teve a honra de gerir a pasta da Agricultura em 1913, um dos seus melhores colaboradores ; e reconhece que ele é um dos funcionários mais trabalhadores.

Mas é realmente ridículo que um país tam pequeno tenha tantos directores gerais ; directores em duplicado para o mesmo serviço.

Se a sua proposta se refere só ao orçamento do Ministério da Agricultura é porque só o orçamento do Ministério da Agricultura está em discussão. Isso não quere dizer que ela não seja extensiva ao Ministério dos Estrangeiros, como a qualquer outro quando se realize essa discussão.

Quem lá fora ler o que se passa nesta, casa do Parlamento, e que muitas vezes não vem com aquele desenvolvimento que era para desejar, podo imaginar que ele orador não preza a agricultura do seu país, quando pelo contrário entende que se deve aumentíir quanto possível a produção e que o Estado deve ajudar, no que puder, o seu desenvolvimento.

Ele orador já explicou à Câmara as razões porque entende que duas Direcções Gerais são suficientes. Quando apresenta qualquer proposta à consideração da Câmara pesa-a sempre antes de a apresentar.

Não se pode abstrair da opinião pública, embora muitas vezes ela ande transviada.

S. Ex.a o Sr. Cunha Leal sabe bem quanto custa no nosso país, quer aumentar as reco't.-.i quer comprimir as despesas.

Se esta proposta não tivesse outro mérito bastava o da sondagem feita ao Parlamento. E deve dizer que essa sondagem nSo podia ter melhores resultados.

Verificou-se no decorrer da discussão que todos acham de imprescindível necessidade reduzir as despesas e aumentar as receitas,

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Diário da Câmara dos Deputado t

O Sr. Cunha Leal (interrompendo}:—E esse alguém tem o dever de se sustentai-no Poder por uma razão muito simples: para que se não creia que deixando o Poder preparara apenas uma transição para a oposição.

O Orador: — Nunca fugiu à responsabilidade dos seus actos. Nunca o afugentam as palavras sejam de quem for. Procura sempre cumprir o seu dever, o julga que ó uma situação mais degradante para um homem público conservar-se no Poder quando vê que não pode cumprir o seu dever, do que sair desse mesmo Poder, porque então maiores serviços poderá prestar.

O Sr. Cunha Leal: — Quando eu estive nesse lugar uns quatro meses, tive ocasião de anunciar ao país que o câmbio devia melhorar o podermos íazer alguma cousa. Neste momenso faltou-me o apoio. Eu sei como é dolorosa a falta desse apoio; e por isso não quero que S. Ex.a a siuta.

Tem-se procurado dizer que há gran-dss iniquidades. Algumas existem de facto. E a verdade perante os factos é que sendo o regime democrático, nem toda a gente o compreende.

Não se lamenta; simplesmente lamenta que não se cortem algumas verbas, embora sejam incluídas no capítulo material.

A redução de quadros não é tam simples, não é tam fácil de resultados, como parece a -muitos e mesmo a alguns parla-mentares;

Não. É que cada adido que vai ocupar uma vaga no serviço de outro Ministério, liberta logo o orçamento durante o primeiro ano.

jii vulgar dizer-se em Portugal que os contribuintes não estão dispostos a dar mais dinheiro para se aumentarem os quadros dos funcionários.

Ele, orador, é de opinião que se deve acabar de vez com esta lenda e que se deve seguir o caminho que indicou, isto é, fazer-se a vontade a todos aqueles que têm de pagar. E a este propósito recorda-se de uma frase do seu velho e bom amigo, o Sr. Afonso Costa, que dizia que se devia ter respeito pelo eminente contribuinte. Assim, ter respeito pelo eminente contribuinte, é fazer-lhe ver que o que ele

tem de pagar ó para atenuar em parte o grande déficit que nos assoberba e não para esbanjamentos.

Ainda não há muito foi ôle, orador, instado por várias pessoas para que umas criaturas de uma determinada r3partição fossem classificadas como ^segundos oficiais, dizendo-lhe que isso não traria aumento de despesa para o Estedo, pois que isso apenas representava uma honraria.

Quere dizer : agora pediam apenas isto; mas depois natural era que viessem pedir os ordenados correspondentes a segundos oficiais, que, com a subvenção que actualmente existe para os funcionários, representava uma honraria um pouco cara.

Aqui tem, pois, a Câmara as razões que o levaram a apresentar o projecto que se encontra em discussão.

Ele, orador, poderá ser atacado e discutido, muito principalmente por todos aqueles que não gostam deste projecto e que possam ser atingidos por ele; porém a sua opinião é de que se torna absolutamente necessário fazer e imediatamente aquilo que é mester que se faça e que é de justiça.

Diz isto com toda a sinceridade, estando certo de que o Sr. Ministro da Agricultura será o primeiro a fazer-lhe justiça e a acreditar que quando fala é sempre com sinceridade.

Ele, orador, revolta-se contra este sistema de alterações constantes nos serviços públicos, pois que até já se 1êm -feito e desfeito organizações de Ministérios sem se saber o ver se elas dariam resultados. (Apoiados).

O país nada tem ganho com isso.

Incomodou-se o Sr. Ministro da Agricultura por parecer que havia na proposta do orador uma má vontade, não contra 3. Ex.a, mas contra os serviços do seu Ministério, visto que esta sua proposta não se referia a outros serviços, e só aos do Ministério da Agricultura.

Procedeu assim porque a proposta existente não lhe dava garantias e já tinha o •precedente da lei n.° 971-

Apartes.

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Já tinha afirmado, e mais tarde afirmou-o por escrito neste projecto, que era necessário ser justo nas despesas.

Gastam-se milhares de contos com o exército, e ele, orador, pregunta a todos os que têm graduações militares se estão convencidos de que os sacrifícios que se fazem, gastando as verbas, correspondem à utilidade dos respectivos organismos militares.

As despesas que se fazem com o Ministério da Guerra é necessário adiá-las para daqui a alguns anos. E o mesmo se dá a respeito doutros Ministérios.

Será necessário gastar tais verbas, mas não é esta a oportunidade.

Elo, orador, disse também que não fazia sentido não respeitar organismos já anteriormente existentes.

Disse também que não concordava com a reorganização das cadeias, e disse até que seria melhor qne c regime das cadeias fosse qualquer cousa útil ao país, quer por trabalhos públicos feitos, quer por outro qualquer modo.

Afirmou também que era necessário dar orientação diferente a vários Ministérios, como, por exemplo, ao Ministério do Comércio.

Entendia, e entende sempre, que o nosso país é pequeno para ter tantos Ministérios.

(j Mas será um crime dizer isto, e será, dizê-lo, um apoucamento das pessoas que o escutam? &E não o terá já dito daquelas bancadas como Deputado ?

Como bem disse o Sr. Cunha Leal, os homens públicos só se dignificam quando não têm quarenta opiniões diversas no mesmo dia.

Eram estas as explicações que tinha de dar à Câmara. Antes de ter a trabalhar a seu lado o actual Sr. Ministro da Agricultura, já ele, orador, havia marcado o seu modo de ver nesta obra de compressão de despesas, em que todos devem andar empenhados. Todos, absolutamente todos, devem facilitar a execução dessa obra. *

Não basta dizer que o Ministro das Finanças tem a responsabilidade por um diploma como ó o Orçamento, que tem simplesmente de vir ao Parlamento fazer o papel de cortar aqui e acolá. E necessário também que o Ministro emita a sua opinião..

Ele, orador, tem trabalhado. Do seu trabalho já alguma cousa de bom tem resultado para o país. Afirma-o sem receio de desmentidos.

Mercê da confiança que tem inspirado o Ministério de que faz parte, têm ingressado algumas quantias nos cofres do Estado.

Quando se dizia que ele, orador, não teria do aumento da circulação fiduciária recursos para além de Maio, pode afirmar que, estaudo em 17 de Maio, ainda há o bastante para viver bem mais tempo do que o calculado.

Se o câmbio não está na divisa 10, não é isso^ devido à situação económica do país. É devido a vários factores.

Ele, orador, tem envidado todos os esforços para não ir à praça comprar cambiais, e às afirmativas feitas pelo Sr. António Granjo deve dizer que isso se deu principalmente no tempo de S. Ex.a

Vai terminar, mas dirá que vamos por mau caminho, pois, - infelizmente, toda a gente pede aumento de despesas, mas ninguém pensa em criar receitas. Pedem--Ihe constantemente aumento de despesas,

U discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando restituir, revistas, as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã. A ordem do dia é a seguinte:

Antes da ordem do dia: Parecer n.° 679 (alterações do Senado), suspendendo a aplicação do decreto de 24 de Maio do 1919.

Ordem do dia (primeira parte): A de hoje.

Segunda parte: A de hoje.

Está encerrada a sessão. Eram 24 horas e 10 'minutos.

Documentos enviados para a Mesa durante a sessão

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rais até o 4.° grau, inclusive, por direito civil, observada a ordem legal, e, na falta destes, ao Fundo da Assistência Pública.

§ único. São aplicáveis, neste caso, as disposições dos artigos 689.° a 694.°, inclusive, do Código do Processo Civil, sendo o Fundo da Assistência Pública representado pelos agentes do Ministério Público.

n.rt. 2.° Quando o autor da herança faleça sem deixar descendentes, ascendentes, cônjuge sobrevivo ou colaterais até o 4.° gran, inclusive, uma torça parte da sua herança será adjudicada ao Fundo de Assistência Pública, ainda que o autor da herança tenha disposto, por testamento ou por doação mortis causa, de toda ela, ou de mais do que as restantes terças partes, sendo em tais casos reduzidas proporcionalmente as respectivas disposições da doação ou do testamento.

§ único. No caso previsto neste artigo haverá sempre inventário, em que o Fundo de Assistência Pública será representado, para -o exercício de todos os direitos o obrigações que, como herdeiro, ao Estado competem, pelo agente do Ministério Público.

Art. 3.° Fica revogada a legislação om contrário.

Sala das sessões da Câmara dos Deputados, 14 de Dezembro de 1920.— O Deputado, Barbosa de Magalhães.

Admitido.

Da comissão de administração pública, sobre uma representação da Junta de Freguesia de Fragoso, relativa a divisão de baldios da referida freguesia.

Para a comissão de legislação civil e comercial.

Das comissões de legislação civil e comercial, sobre o n.° 712-B, que melhora a situação dos magistrados e oficiais de justiça.

Para a comissão de -finanças.

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministério das Finanças, me seja fornecida, urgentemente, a seguinte informação:

Em que data foi transmitida pelo mesmo Ministério e neste pela Direcção Geral das Alfândegas às alfândegas do Pôr-to e ilhas adjacentes a doutrina da circu-

lar do Ministério da Justiça, n.° 438, L. 61, do 7 de Setembro de 1920.

Sala das sessões da Câmara dos Deputados, 17 de Maio de 1921. —O Deputado, Raul Tamagnini.

Expeça-se.

Pedido de licença

Do Sr. Alberto Jordão, dois dias (16 e 17 do corrente).

Concedido. *>*

Comunique-se.

Para a comissão de infracções e faltas.

Pareceres

Da comissão de instrução especial e técnica, sobro o n.° 671-B, cue autoriza a admissão a designado pessoal agregado nos museus nacionais regionais.

Para a comissão de -finanças.

Da mesma, sobre o n.° 763-B, que converte numa escola de comércio e indústria a Escola do Artes G' Ofícios do Aveiro (aula comercial), que se denominará «do Fernando Caldeira»:

Para a comissão de finanças.

Da comissão de instrução primária, sobre o n.° 599-K, que reduz os subsídios à Associação de Escolas Móveis c Jar-dins-E«colas João de Deus.

Para a comissão de finanças.

Da comissão de administração pública, sobre o n.° 778-B, que cede 3in favor da Câmara Municipal de Portalegre o direito e acção que o Estado possa ter sobre o terreno denominado Marradas das Freiras.

Para a comissão de legislação civil e comercial.

Da mesma, sobre o n.° 778-C, que autoriza a câmara de Marvão a transferir a sua sede para Portagem.

Para a comissão de finanças.

Primeiro relatório da comissão parlamentar de inquérito ao extinto Ministério dos Abastecimentos e Transportas.

Porá o «Diário do Governo».

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