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REPÚBLICA
DIÁRIO DA CÂMARA
PORTUGUESA
S E S S A. O
EM l DE NOVEMBRO DE 1922
Presidência do Ex.rao Sr. Domingos Leite Pereira
Secretários os Ex.mos Srs.
Sumário.— É aberta a sessão com a presença de 42 Srs. Deputados.
Antes da ordem do dia.— Entra em discussão aparecer n.° 57, usando d a palavra os Srs. Joaquim Ribeiro, Maldonado de Freitas, Pedro Ferreira, Carvalho 'da Silva, Carlos Pereira, Ribeiro de Carvalho e Pedro Pita. É aprovada a acta.t
O Sr. Pedro Pita, tm negócio urgente, justifica um projecto de lei interpretativo acerca das rendas de casa.
O Sr. Carvalho da Silva pronuncia-se sobre o assunto, usando da palavra para explicações.
Ordem do dia.— Continua o debate político, usando da palavra o Sr. Nuno Simões.
Entra em discussão o parecer suspendendo as .imunidades parlamentares ao Sr. Cortês dos Santos. f
É aprovado, depois de usarem da palavra os Srs. Vergilio Costa, que apresenta uma moção, Crispiniano da Fonseca, Carvalho da Silva e An- ' tónio Maia.
Ê lida na Mesa uma nota de interpelação. Prossegue o debate politicq, usando da palavra o Sr. Sá Cardoso.
Antes de se encerrar a sessão. — Usam da palavra os Srs. Maldonado de Freitas, Ministro das Finanças ( Vitorino Guimarães), Carvalho da Silva e Presidente do Ministério (António Maria da Silva).
O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte para o dia imediato, com a respectiva ordem do dia.
Abertura da sessão às 15 horas e 20 minutos.
Presentes 42 Srs. Deputados.
São os seguintes:
Adriano António Crispiniano da Fonseca. Albano Augusto de Portugal Durão.
Baltasar de Almeida Teixeira João Orneias da Silva
Alberto Ferreira Vidal. Alberto Jordão Marques da Costa. Albino Pinto da Fonseca. Alfredo Rodrigues Gaspar. António Augusto Tavares Ferreira. António Correia. António Maria da Silva. • António País da Silva Marques. António de Paiva Gomes. António de Sousa Maia. Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro. Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pires do Vale.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas. 0 Fernando Augusto Freiria.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
JoSo Luís Ricardo o
Toão de Orneias da Silva.
Joaquim Ribeiro d© Carvalho.
José António de Magalhães.
José Domingues dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho. . Luís da Costa Amorim.
Manuel Ferreira da Rocha.
Mariano Martins.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
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Diário da Câmara dos Deputados
Paulo da Costa Menano.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Sebastião de Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriatq Qomes da Fonseca,
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Afonso de Melo Pinto Velop.o.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Ginestal Machado.
António Joaquim Ferreira da, Fonseca.
António Lino Neto.
António Vicente Ferreira1.
Artur Morais de Carvalho.
Augusto Pereira Nobre.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Eugênio Rodrigues Aresta.
Francisco Cruz.
Francisco da Cunha Rego Chaves.
Francisco Dinis íje Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Hermano José de Medeiros.
João Pedro de Almeida Pessanha.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
José Marques Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mário de Magalhães Infante.
Pedro Gois Pita,
Rodrigo José Rodrigues. Vasco Borges. Vergílio Saque.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Correia da Silva Marcai.
Abílio Marques Mourão.
Adolfo Augusto de Oliveirí:, Ooutinho.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Orneias e Vasconcelos.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Leio Portela.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sonsa.
Amadeu Leite de VasconceLos.
Américo da Silva Castro.
António Abrauches Ferrão.
António Alberto Torres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Dias.
António de Mendonça.
António Resende.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Alberto Camacfro Lopes Cardoso.
Artur Brandão. '
Bartolomeu dos Mártires Sousa Seve-rino.
Carlos Eugênio de Vasconcelos.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Coelho do Amurai Reis.
Francisco Manuel Homem Cristo. '
Germano José de Amorim.
Jaime Daniel Leoíe do Rego.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Águas.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
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Sessão de l de NovernbrQ de 1&22
José Carvalho dos Santos. José Cortês dos Santos. José Joaquim Gomes fie Yilhena. Josó Mendes Ribeiro Norton de Matos. José Novais de Carvalho Soares Medeiros.
Josó de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo Jqsé Coimbra.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel de Britp Camacho.
Manuei Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira de Matos $osa.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Spusa Coutinnp.
Mariano Rocha Felguejras.
Mário Moniz Pamplona Ramps..
Maximiano de Matos.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulp Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Plínio Òctávio de Sant'Ana^e Silva.
Teófilp Maciel Pais Carneir-p.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
Vitorino EÇenriques Godinhp.
Às lõ horas principiou afazer-aea chamada.
Q Sr. Presidente—Estão preseptes 42 Srs. Peputados.
Está aberta a s,essão.
Vai ler-se a acta.
Eram lõ horas. 6 lõ miniito.s.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Ofícios
Do juiz inspector 4ps Serviços, Jiidjciais., pedindo, a pomparêncja Concedido. Comunique-se.- Para a cp.miss$Q de infcaçg$es e faltas. Do presidente da Sociedade de Geografia, convidando S. Ex.a p Sr. Presidente da Câmara e unia deputação a assistirem hoje, às 21 horas e 30 minutos, à conferência dos ilustres aviadores Gago Coutinho e Sacadura Cabral. Para a Secretaria. Da Federação Académica de Lisboa, pedindo a inclusão^na ordem do dia do parecer n ° 301. Para a Secretaria. Da Câmara Mum'cipal de Figueiró dos Vinhos, enviando uma representação. , Para a Secretaria. Pedidos de licença Do Sr. Jpsé Joaquim Gpmes de Vilhe-na, 10 dias. Do Sr. Paulo Menano, 2 dias. Concedido. Comunique-se. Para a comissão de infracções e faltas. Representação Da Câmara Municipal de Figueiró dos Vinhos, representando contra as disposições do decreto n.° 8:444. Para a comiss&o de agricultura. Antes da ordem do dia O Sr. Presidente: — Vai entrar em discussão P parecer n.Q 07. Ê lido. Parecer n.° 67 Senhores Deputados.-^- A vossa comissão de administração pública, tendo estudado o projecto de lei n.° 39-E, e bem assim o processo de referendum que o justifica e fundamenta, é de parecer que ele merece a vossa aprovação, porquanto em conformidade com a lei os povos a quem a criação da freguesia respeita mostraram já estar nas condições de pedir a aprovação 4a alteraçãp adminis.trativa qiie tem em vista. Sala das sessões da cpmissêio de administração pública, 26 de Abril dp 1922.— Abílio Marcai — J. Costa Qonçalves—Al' berto Vidal — João Vitorino Mealha— Custódio de Paiva, relator.
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Diário da Câmara dos Deputados
Projecto de lei n.° 39-E
'Benhores Deputados. — Considerando que uma boa divisão administrativa não pode ser obra exclusiva das determinações de um único poder central; e antes
Considerando que nele dificilmente se podem sentir e apreciar- com rigor as vantagens ou desvantagens da orgânica dessa divisão; e
Considerando que os povos como mais directamente interessados nela, por factores diversos, a devem determinar; e
Considerando que a legislação republicana instituiu e garantiu aos povos a faculdade de participação na orgânica administrativa;
Considerando que dessa faculdade se usou nos termos legais, como se mostra do respectivo processo junto:
Temos a honra de sujeitar à aprovação do Poder Legislativo o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.° São desanexados da freguesia de São Simão de Litem, do concelho de Pombal, do distrito de Leiria, os lugares ou povoações de Albergaria dos Doze, Cariaria, Castelo da Gracieira, Cavadinhas, Serradinho, Chão de Graia, Eguins, Fonte da Mata, G-aia, Gracieira, Ladeira, Mata, Murzeleira, Poços, Pontinhas, Ruge-Agua, Vale das Éguas, Vale de Pomares, Venda de S. José, Vidoeira, e Viiiveiro, e com eles é criada uma freguesia com a denominação de «Albergaria dos Doze» e sede nesta povoação.
Art. 2.° É revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões da Câmara dos Deputados, 6 de Abril de 1922.— José Pedro Ferreira—Carlos Cândido Pereira.
O Sr. Joaquim Ribeiro (para um requerimento'}:— Requeiro que seja posta em discussão, conjuntamente, a criação da freguesia de Eiachos, concelho de Torres Novas, que tem-parecer favorável.
O Sr. Maldonado de Freitas: — Em
Abril de 1921, foi-me enviada da Albergaria dos Doze uma representação assinada pela Junta da freguesia.
Queria-se que essa representação servisse de base para a apresentação de um projecto de lei a esta Câmara, a fim de
ser criada a freguesia de Albergaria dos Doze, ao que me" opus, porquanto ela não vinha na forma legal nem linham sido observadas as disposições da lei n.° 621_, havendo ainda povoações .que não desejam fazer parte da nova freguesia.
Portanto, sinto-me muito à vontade neste caso, pois apesar de haver interessados nela que me apoiaram politicamente eu não quis servir de intermediário.
Tempos depois foi apresentado nesta Câmara um projecto anexando várias,povoações à freguesia de Albergaria dos( Doze, e os interessados, tendo conhecimento di? apresentação deste projecto, enviaram a esta Câmara uma representação autêntica assinada por indivíduos que, sabendo ler e escrever, não estavam no emtanto nas condições • de assinarem o referendum, por não serem eleitores.
Nestes termos, justo édeesiperar que a deliberação desta Câmara seja pela criação da referida freguesia mas qae a sua área não abranja povoações que dela não queiram fazer parte.
Acontece ainda, Sr. Presidente, que a nova freguesia fica com elementos suficientes para manter a sua autonomia, porquanto a Albergaria dos Doze tem bastante população, comércio e indústria.
Sr. Presidente: espero, pois, que a Câmara vote favoravelmente, rnas q-ue não cometa o atropelo de obrigar a fazer parte dela povoações e lugares que tal não desejam.
A propósito, recordo o barulho que levantou a criação da freguesia de Vale de Cavalos, a luta que por esse motivo se travou entre os partidos, e ainda hoje essa questão não está solucionada.
Para terminar direi que espero, repito, que a Câmara tome uma deliberação justa, equitativa e bem republicana.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pedro Ferreira:— Sr. Presidente: o projecto de lei que vai criar a freguesia de Albergaria dos Doze,, com a anexação de algumas povoações da freguesia de S. Simão de Litém, foi assinado por mim e pelo Sr. Carlos Pereira, e enviado para a Mesa acompanhado de toda a documentação exigida pela Lei.
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Sessão de Í de Novembro de 19É2
seu parecer favorável ao referido projecto.
Sr. Presidente: este facto, só por si, dispensava-me e ao Sr. Carlos Pereira de defendermos o projecto, mas, visto que o Sr. Maldonado de Freitas pretende contrariá-lo, apresentando-uma representação assinada por um diminuto número de habitantes de alguns lugares que vão ser anexados, eu vou fazer algumas considerações para demonstrar que a criação da referida freguesia representa um acto de justiça, tanto sob o ponto de vista jurídico como sob o ponto de vista político. -.
Sr. Presidente : eu posso afirmar a V. Ex.a e à Câmara que esses indivíduos foram levados a esse protesto por suborno, pois só assim se explica que venham protestar contra as suas próprias conveniências e interesses.
Sr. Presidente: a criatura que subornou esses indivíduos foi o padre de S. Simão, porque criando-se a freguesia civil, é também criada a eclesiástica, e ele receia que os seus interesses sejam cerceados.
As povoações cuja maioria vem agora protestar contra a sua inclusão na nova freguesia de Albergaria dos Doze pediram, por unanimidade, há proximamente um ano, aos prelados da diocese de Leiria para fazerem parte duma freguesia eclesiástica com sede em Albergaria, para onde tem excelentes meios de comunicação, ao passo que para S. Tiago de Li-téni nem sequer estão ligadas por caminhos vicinais. Também essas povoações ficam a muito menor distância de Albergaria, terra de importância muito superior a S. Simão de Litém, pois que é muito comercial e possui estação de caminho de ferro, estação telégrafo-postal,. escolas oficiais, etc. Esses protestos são, além de tudo o mais, incorretos.
Sr. Presidente : na incoerência destes habitantes está também o Sr. Maldonado, de Freitas, pois S. Ex.a, em 1921, pro-poz à Câmara exactamente o- contrário; pediu a transferência da sede da freguesia de S. Simão de Litém, para Albergaria dos Doze.
Veja V. Ex.a com que autoridade vem o Sr. Deputado pedir o que agora pede. (Apoiados).
Termino afirmando que a não aprova-
ção deste projecto de lei constituiria um triunfo para a reacção e uma humilhação para os republicanos. (Apoiados).
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: temos a prova evidente do que vão ser as eleições administrativas que se. vão realizar neste País, pois começam o a aparecer estes projectos.
O Sr. Pedro Ferreira:—Este projecto já foi apresentado há um ano.
O Orador: — O argumento apresentado pelo Sr. Pedro Ferreira não serve, pois só agora ó que se procura discutir esses •projectos para serem aprovados ou rejeitados, conforme convier, vendo-se por aqui até onde chegarão as violências do próximo acto elaitoral, violências que os monárquicos nunca usaram, pois até consentiram comícios duma propaganda cujas consequências nós hoje estamos a sentir, num país cuja ordem social está ameaçada.
Sr. Presidente: este é talvez o início da obra que se projecta, e em que tanto se fala, do adiamento das sessões legislativas.
" O Sr. João Camoesas (interrompendo):— Não acho muito correcto S. Ex.a estar a afirmar o que não sabe se se realizará.
O Orador: — O Sr. João Camoesas dá-nos assim a garantia de que, pelo menos, S. Ex.a a isso se oporá. A opinião do Sr. João Camoesas tem para nós o maior valor, já pela consideração que temos por S. Ex.a, que é muita, j á porque tem lugar de destaque no seu partido. (Apoiados).
Dentro em poucos dias nós vamos ver S. Ex.a levantar-se da sua cadeira e ir sentar-se na cadeira ministerial, como homenagem até a sua autoridade.
Nós não podemos dar o nosso voto ao projecto que se discute, e não será sem o nosso protesto que serão empregados processos de coacção, processos que se não devem empregar a quinze dias das eleições por forma a deminuir por completo o sentido do voto. (Não apoiados). (Apoiados).
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ÍMfio da Câmara dós tieptltadoi
O Sr. Carlos Pereira : — Vou ser muito breve. '
Um dia o Sr. Maldonado de Freitas, que tanto respeito mostra pela lei n.° 621, pareèe ter dito na Câmara que não se atendia o pedido dos povos daquela região, pedido que se traduz no projecto em discussão, porquanto se iião tinham cumprido as formalidades da lei n.° 621.
Mas o Sr. Pedro Ferreira disse à Câmara que o Sr. Maldonado de Freitas tinha apresentado um projecto para a anexação da freguesia de Albergaria dos Doze com todos os lugares da freguesia de S. SimUo.
Sr. Presidente: disse o ilustre Deputado Sr. Carvalho da Silva que Mo concordava com o projecto, por isso que estava vendo como hão-de correr as eleições.
Ora eu devo dizer, Sr«> Presidente, que o Sr. Carvalho da Silva, que costuma ser sempre tam meticuloso, foi desta vez um tanto ou quanto precipitado-, pois, se assim não fosse, teria visto a data em que foi apresentado esse projecto, e bem assim visto a data em que foi feito o referendum que esses povos fizeram, guiados pelo grande republicano que se chama o Sr. Jacinto Nunes.
Aqueles povos,-Sr. Presidente, cumpriram todas as formalidades legais.
Também o ilustre Deputado Sr. Carvalho da Silva chegou a afirmar que eu havia pedido a urgência e a dispensa do Eegimento para que o projecto entrasse desde já em discussão, quando é facto que eu me limitei apenas a pedir a urgência que foi votada pela Câmara, tanto mais quanto é certo que este projecto já por duas vezes tem estado na ordem do dia.
" Sr. Presidente : eu entendo que se não deve de modo nenhum prejudicar os interesses destes povos, e, assim, espero que a Câmara dê à sua aprovação ao projecto que está em discussão.
Tenho dito.
O orador não reviu*
O Sr. R beiro de Carvalho: — Sr. Presidente : dois ilustres Deputados se manifestaram tfontra o projecto que está em discussão: o Sr. Maldonado de Freitas, q le fiilou sobre a comodidade dos povos, e o Sr. Carvalho da Silva, que pretendeu
mostrar as conveniências políticas republicanas sobre a criação da nova freguesia.
Prova-se que a comodidade dos povos está exaêtamètite em quê esses lugares pertençam à freguesia que se pretende criar, por isso que eles estão próximos dela, tendo vias de comunicação, o que não acontece eoni outras.
Sr. Presidente: oâ povos dos lugares a cjue o iltistre Deputado se referiu con-còricordarám com a sua transferência para a úova freguesia que agora s-e pretende criar; porém, eu não sei se êies amanhã não virão dizer que não concordam e depois mais tarde que concordam novamente.
Assuntos destes, Sr. Presidente, não se podem levar como brincadeira de crianças.
Tanto sei eu que os povos dessa freguesia concordam hoje com essa mudança, como. saberia amanhã da í;ua discordância.
Falou o' Sr. Carvalho da Silva nas conveniências políticas de momento, inas, Sr. Presidente, não vejo onde possam estar essas conveniências de republicanos, pois a sede eleitoral continua sendo a mesma.
Vou terminar, pedindo desculpa a V. Ex.a de far tomado tempo à Câmara com um assunto tam pouco interessante para o país.
O orador nâà reviu.
O Sr. Pedro Pita: — A resolução soberana desta Câmara em fazer discutir, antes da ordem do dia, este assunto, deu--me a impressão de que se tratava da salvação nacional ou dum elixir para o equilíbrio orçamental, tal foi o calor que se tomou noste debate.
Orãj Sr. Presidente, creio que houve uma certa precipitação na discussão.
Eu vejo, de facto, que na Mesa existe um processo de referendum em que uns indivíduos, embora não sejam eleitores, sabem ler e escrever, e esses protestaram.
A Câmara bem sabe os conflitos que estes assuntos de mudança de freguesia têm levantado e que por esse facto nós devemos ponderar bem estes assuntos.
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Sessão de l de Novembro de 192è
campo têm determinadas crenças que temos de respeitar; uma susceptibilidade mais apurada, tanto mais quando os lerem nessas crenças e ideas. •
Em todo o caso há que atender aos prejuízos, chamemos-lhe assim, desses indivíduos, sobretudo quando não haja necessidade imperiosa para o não fazer.
Deve-se, tanio quanto possível, respeitar esse desejo deixando-os estar onde se encontram.
De resto sabe V. Ex.a que essas criaturas estão ligadas por laços de consciência à tradição.
Mais ainda, estão ligadas por esses laços que os prendem muitas vezes mais próximo do templo onde realizaram actos solenes da sua vida e de que têm as mais gratas recordações.
Não é apenas por um requerimento votado à Ia diable, com uma pressa que se não compreende, no momento em que tantos outros assuntos urgentes é necessário discutir, que se deve aprovar este projecto.
Não foi para isto que o Parlarnenlo republicano procurou rodear de cautelas a criação de freguesias, estabelecendo-se o referendum para que houvesse a garantia de que as populações concordavam com essa criação.
Sr. Presidente: a idea do legislador ao estabelecer o referendum foi para garantir aos povos a sua situação.
Estamos no período eleitoral.
O Sr. Pedro Ferreira (interrompendo);— Um projecto tam pouco importante e que leva tanto tempo a discutir.
O Orador:—E assunto que comecei a tratar e que tenho de concluir.
Sr. Presidente: dizia eu que atendendo ao modo como está organizado o recenseamento eleitoral é fácil verificar 'que pode ser iludido, como agora foi, o intuito de quem procura rodear de todas as cautelas projectos desta natureza, criando uma nova freguesia.
O Sr. Presidente: — Devo.prevenir V. Ex.a que são horas de se passar à ordem do dia e assim se V. Ex.a quiser poderá ficar com a palavra reservada para a sessão de amanhã.
O Orador: — Nesse caso ficarei com a palavra reservada para amanhã.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que aprovam a acta, queiram levantar-se.
foi aprovada.
O Sr. Presidente: —O Sr. Pedro Pita deseja tratar em negócio urgente do assunto referente às rendas de casas.
Os Srs. Deputados que autorizam, queiram levantar-se.
Foi autorizado.
O Sr. Pedro Pita: — Sr. Presidente: relativamente ao assunfo ontem aqui levantado pelo Sr. Sá Pereira, o Sr. Carvalho da Silva apresentou o seu modo de pensar sobre o artigo 2õ.° da lei n.° 1:368.
Sr. Presidente : a convite do Sr. Carvalho da Silva tive o prazer de o interromper; porém, num dado momento S; Ex.a disse-me que quem estava com a palavra era ele, razão porque eu resolvi então tratar hoje do assunto, antes da ordem do dia? a fim 'de justificar a minha maneira de pensar que é bem diferente da de S. Ex.a
Já sei Sr. Presidente que terei de ouvir de S. Ex.a que a minha maneira de pensar não pode ser jurídica; porém, eu não posso deixar de dizer que é provável que eu não tenha um critério jurídico, mas o critério de S. Ex.a e de proprietário.
O Sr. Carvalho da Silva:—V. Ex; dá--me licença que o interrompa.
O Orador: — Hoje falo eu.
Poderá, Sr. Presidente, repito, o meu critério não ser jurídico, porém, o Sr. Carvalho da Silva é o Padre, Filho e Espírito Santo da Associação dos Proprietários.
O meu desejo, Sr. Presidente, é dar á esta lei uma interpretação que não possa oferecer dúvidas a quem tenha de a aplicar.
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Diário da Câmara dos Deputados
entidades para demonstrar que nem todos pensam pela cabeça do Sr. Carvalho da Silva, eu fui hoje encontrar no jornal A Pátria, uma circular da Direcção Geral de Contribuições e Impostos dando a esta disposição de lei precisamente a mesma interpretação que eu lhe tenho dado. E, notem V. Ex.as, essa interpretação parte duma entidade a quem tal interpretação mais prejudica; ó que acima de quaisquer prejuízos ou de quaisquer interesses essa repartição do Estado coloca a exacta e honesta interpretação da lei.
A alcavala dos 30 por cento surge depois disto, ao procurar-se tornar esta disposição de lei elástica. De resto se cada um começar a interpretar a lei como entender não sei a que poderemos chegar; a Câmara pode muito bem prevê Io.
Mas há mais; ó que da interpretação desta lei pode resultar justamente aquilo que se pretende evitar: o aumento discricionário das rendas de casa cujas consequências podem ser para. o critério de muitos inquilinos a perda da casa. Ora não foi este o intuito do Parlamento ao elaborar uma tal disposição da lei.
Eu pretendo apenas que esta disposição de lei tenha a interpretação que eu lhe dou, mas porque se não lucra nada em que ela seja interpretada consoante os desejos de cada um, porque eles não podem obrigar a quem tiver de julgar, um único caminho se impõe: o de o Parlamento promulgar uma lei interpretativa. Não se diga, como erradamente afirmou o Sr. Carvalho da Silva, que se trata duma lei nova.
Não, esta' lei está por tal forma redigida que se torna absolutamente indispensável publicar uma outra lei simplesmente interpretativa. Trata-se, pois, duma lei interpretativa e não duma lei nova.
De facto se nós lermos com cuidado a disposição do artigo 25.°, havemos de chegar à conclusão de que a circular da Direcção Geral das Contribuições e Impostos teve o condão de dar à lei em questão aquela interpretação que ela realmente comporta e que estava no ânimo • da Câmara ao votá-la.
Determina-se no artigp 25.° qual o critério a seguir para determinar o rendimento colectável dum prédio. E é notável que se partiu, ao fazer esta lei, por um caminno ' oposto. E então como se
toda a disposição não estivesse incluída no mesmo artigo, uma metade serve para achar o rendimento colectável, mas a outra metade não serve.
Se o artigo 25.° dissesse «pelos seguintes termos» eu ainda admitiria que se pusesse em dúvida que os parágrafos deste artigo não estivessem abrangidos nesta disposição, mas desde que se feia em «preceitos» tal dúvida não pode subsistir.
Quem conhece uma matriz predial sabe que tem a considerar nela três colunas: uma para o rendimento ilíquido, outra para a percentagem a' abater e a terceira para o rendimento colectável. •
Ora se na alínea a) do artigo 25.° o legislador quisesse significar que era ao rendimento colectável que se tinha de atender, não repitiria a palavra «rendimento» como repete nesta disposição que diz: «Tomar como rendimento colectável o rendimento que constar da matriz, etc.» Esta palavra «rendimento» assim escrita aqui, é o rendimento ilíquido.
E manifesto que o legislador se refere ao rendimento ilíquido.
Depois diz-se: multiplica-se por 2,0 ou 3,5 conforme se trate de habitação ou casa comercial ou industrial.
Mas as leis fiscais atribuíram sempre aos. proprietários uma determinada percentagem isenta de tributação para com essa diferença eles fazerem face aos encargos de conservação dos prédios, e porque os 10 por cento atribuídos pelas leis anteriores eram reconheèidamente uma insignificância, atendendo ao aumento de mão de obra e do material, o legislador estabeleceu então a doutrina do ,§ 2.°
E axiomático em direito que todas as leis têm de ser interpretadas por modo a não conduzireta ao absurdo, devendo ser interpretadas em conjunto as disposições de uma mesma lei ou de várias leis.
Desde que se procura fisar o rendimento colectável dos prédios é certo que o rendimento colectável ó alguma cousa que só se encontra depois de abatida determinada percentagem para os encargos de conservação da propriedade, temos que a interpretação dada à lei pelos senhorios dá lugar a que estes comam a dois carrinhos.
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Sèà&âo de í de Nobeiriihrò dê Í&22
era simplesmente a de 2,5 e 3,5j isto ó toais uln argumento para demonstrar que não podia ser o intuito da Câmara senão o de dar somente os de 2,5 e 3,5 pata faculdade do alimento aos senhorios.
Veio é certo, e ainda este é um argumento para que chamo a atenção da Câmara, a faculdade de os senhorios poderem aumentar as rendas para permitir ao Estado O aumento das suas contribuições. Deste modo nós ternos de concluir imediatamente que esse aumento só pode ser o bastante para os proprietários poderem sofrer um agravo nas suas contribuições. Nada mais. E nestas condições ainda a minha interpretação é a que me pareço mais em harmonia com a lógica.
Mas o Estado reconhece que não é justo descontar-se apenas 10 por cento para o senhorio fazer face a certos encargos, e diz então que em vez de 10 são 30 por cento o que se desconta.
£ Portanto, como se fazem as operações?
Para se pedir a renda, deduzem-se estes 30 por cento do rendimento ilíquido do proprietário e O resultado multiplica-sé poios coeficientes apontados na lei; v Para se pedir a contribuição, dedúzem--se também os &0 por cento do rendimento ilíquido do proprietário e aplica-se ao resultado as porcentagens estabelecidas 'na tabela da contribuição predial aumentadas de 2,5 ou 3,5. jlsto é tudo quanto há de mais simples! (Apoiados).
Mas é manifesta a oportunidade para a apresentação dum projecto de lei quê intérprete, como a Constituição determina, esta disposição legal, e é tam manifesta que no momento em que eu chego à conclusão das minhas considerações, os apoiados da maioria dos Deputados presentes me demonstram que eu estou do lado darazão(J-/?oiacfos), quere dizer que há uma forte corrente a favor duma certa interpretação.
; Nestas condições, não querendo protelar "o dgbate político, vou mandai* para a Mesa um projecto de lei para o qual peço ,apenas a urgência, solicitando, contudo, da comissão de legislação civil e criminal quê rapidamente se pronuncie sôbise ele, para que ele rapidamente só possa tranâ-formàr em lei, evitando as falsas interpretações .que já por aí correm. (Apúiadvs).
Tentiõ dito.
O orador wãô feViw.
O Sr. Carvalho da Silva (para explicações):— Sr» Presidente: o Sr. Pedro Pita fez váriaâ alusOcs àâ considerações que fiz ontem na Câniàrã/é até Só Ex.a afirmou que elas talvez fossem baseadas num critério de proprietário.,
Devo dizer a S. Ex.a que as minhas considerações são sempre formuladas como Deputado e independentemente de qualquer cousa qua eu lá fora seja. Aliás, eu também poderia, dizer a S. Ex.a que as suas considerações são formuladas coln o Critério dê inquilino.
Más foi com profunda admiração que eu 'ouvi S. Ex.a formular as acusações mais graves 'éontra os senhorios pelo facto de eles quererem aumentos correspondentes à única interpretação dá lei, e foi taiíi grande" á minha admiração quanto é certo que iiãb me esqueceram ainda as palavras sinceras de S. Ex.a quando ao discutir-se o projecto de M das expropriações por utilidade pública âe indignou contra as disposições bdlchlâvistas da lei do inquilinato.
A minha imparcialidade leva-íne, pois, à falar com toda a autoridade neste assunto, e devo dizer ao Sr. Pedro Pita que aquilo a qUe S* Ex.a chama uma interpretação da lei não ó senão b contrário do que a lei diz.
S. Ex.a sabe que ainda ontem num ior-nal de Lisboa foi publicada uma entrevista com ò Sr. Ministro da Justiça, ò qual me dava absoluta razão. E há nesta Câmara um Sr. Deputado cuja autoridade em assuntos jurídicos todos reconhecem, è o Sr. Almeida Kibeiro, que muito desejaria ouvir.
Emfim, o Sr. Pedro Pita sustentou unia interpretação qoe é absolutamente contrária ao que está estabelecido na lei, mas estou até em dizer a S. Ex.a que, se se estabelecer o seu critério, ficam mais be-, neficiados os proprietários do que com a minha interpretação. •
Não pôde haver .duvida que é o produto de Í914 ritajli))ltèatlo por 2,5 por cento quê ê 6 nótfò rendimento èolèétâvel. 1 SHàshWó.
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Diário da Câmara do* Deputado*
O Orador: — Este assunto é da maior importância e é para lamentar que a Câmara não lhe queira dar atenção.
Eu, emquanto exercer o meu mandato, não deixarei de prestar a minha atenção a estes assuntos.
^.partes.
O Sr. Presidente: — O projecto ainda não está em discussão.
O Orador:— Não estou a discutir o projecto, mas a responder unicamente às referências que fez o Sr. Pedro Pita às minhas afirmações, e estou usando da palavra com o mesmo direito com que S. Ex.a dela fez uso.
De mais, Sr. Presidente, veio hoje publicada nos jornais uma nota errada da Direcção dos Geral dos Impostos, que se permite legislar em contrário ao que determinou o Parlamento, e é triste que essa Direcção Geral dos Impostos tenha mós trado tanta incompetência no que diz respeito a impostos.
O açtigo 2õ.° é bem claro sobre o que ó rendimento colectável e não pode oferecer lugar a dúvidas.
Podem os Deputados aceitar dogmàti-camunte que é preciso legislar contra esta ou aquela classe, mas podem também ficar sabendo que faltam ao seu dever, por isso que este lhes dita a obrigação de prestarem todo o seu cuidado aos assuntos de importância que lhes são .confiados para discutir.
Eu vou terminar, mas antes desejo chamar a atenção do Sr. Ministro das Finanças para o facto de ter vindo hoje nos jornais um verdadeiro decreto da Direcção Geral dos Impostos, e que representa um verdadeiro atropelo à lei vigente.
Peço a S. Ex.a que me elucide sobre se se trata realmente duma resolução definitiva ou se o caso está dependente doutra resolução que haja acerca deste assunto. ^ Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pedro Pita (para explicações):— Sr. Presidente : pedi a palavra apenas para declarar à Câmara que a casa em que habito foi por mim alugada em 1919, e que por conseguinte sou insuspeito a de-• fender a doutrina que há pouco expendi.
O 'facto de conhecer a opinião do Sr. Carvalho da Silva não implica a obrigação de a seguir, e, discordando dela, apresentei as razões do meu modo de ver.
Foi aprovada a urgência para o projecto do Sr. Pedro Pita.
O Sr. Carlos Pereira:—Roqueiro a dispensa do Regimento para o projecto cuja urgência acaba de ser concedida, sem prejuízo do debate político.
Rejeitado (mi prova, foi finalmente aprovado em contraprova este requerimento.
O Sr. Presidente : — Vai passar-se à ORDEM DO DIA
Continuação do debate político
O Sr. Nuno Simões:—Sr. Presidente: tive de suspender ontem as minhas considerações, na altura em que principiavn a ocupar-me da já agora célebre entrevista de Miramar.
Não discuto o êxito pessoal do ilustre jornalista que realizou essa entrevista, nem tam pouco o êxito do jornal que a publicou.
A Câmara dos Deputados importa menos esse êxito do que as afirmações feitas por Sua Majestade Afonso XIII, algumas das quais não devem ser para o Governo da República novidade, visto que em 1918 já o Ministério dos Negócios Estrangeiros tinha notícias de palavras pronunciadas por esse monarca, aliás pouco diferentes daquelas que o Sr. Dr. Augusto de Castro teve ocasião de referir no Diário de Noticias.
Por inconfidência e indiscreção jornalística, não do Ministério dos Negócios Estrangeiros, foi publicada uma entrevista de carácter confidencial entre o encarregado dos negócios de Portugal e o rei de Espanha, tornando-se públicas algumas declarações do soberanc espanhol, que coincidem em grande parte com aquelas que o Diário de Noticiou há pouco publicou.
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Sessão de l de Novembro de 1922
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O soberano espanhol escolheu para fazer as suas declarações o momento menos indicado para isso: escolheu exactamente a ocasião em que estava fora do país o nosso chefe do Estado^ e em que o Sr. António José de Almeida recebia no Brasil as homenagens de todas as nações da América do Sul.
Ninguém desconhece a velha e legítima ambição do soberano espanhol de receber na Argentina a demonstração de amizade que o Sr. Presidente da República teve a honra e a fortuna de ver rendida à sua pessoa e ao seu país.
Apesar disso, depois das circunstâncias que o Sr. Álvaro de Castro pôs em relevo ontem, o Governo Português entendeu que devia chamar a uma conferência o ilustre jornalista que tinha tido a entrevista com Sua Majestade .Afonso XIII.
Essa conferêucia só se compreenderia se de facto o ilustre jornalista tivesse participado antes de fazer essa entrevista que a ia realizar.
Mas, se as circunstâncias em que a entrevista se realizou merecem ser ponderadas, as afirmações do soberano espanhol não podem deixar de ser discutidas no Parlamento Português, porque elas, podendo conter intenção política, contêm evi-dentemeute também disfarçadas ameaças, que o país não pode ouvir nem ler sem a necessária e legitima repulsa.
O Sr. Álvaro de Castro repudiou já ontem, nos termos mais alevantados e patrióticos, as palavras com que o soberano espanhol entendeu dever intrometer-se* na política nacional, em que entendeu dever dar conselhos a nós que os podíamos receber de todos'os portugueses, mas que os não receberemos nunca ;de quem é menos -indicado para definir o interesse nacional.
(Apoiados).
O Rei de Espanha referiu-se a problemas em aberto entre os dois países, pouco faltando para acusar o Governo Português e a nação portuguesa de não terem resolvido a questão das quedas de água do Douro.
Entretanto ninguém desconhece em Portugal que a comissão que há pouco mais de um ano esteve em Madrid não foi certamente por falta de boa vontade do Governo Português, dos bons desejos do Go-vêrao Português, quo nfio resolveu o aã-
s unto, que deixou definido em termos de poder ser resolvido.
Vem a propósito da questão das tjue-das da água do Douro afirmar que se tem discutido muito as frases atribuídas ao Sr. Sanchez Guerra numa festa em Salamanca, frases que deram como resolvido o pleito das quedas de água do Douro.
.Não deixou o Governo Português de responder aos receios e reservas que certos jornais adversários do regime formularam, declarando que o Governo Português era inteiramente estranho —e não podia deixar de o ser— a qualquer desígnio secreto.
Não é difícil fazer justiça às intenções dos homens que estão no Governo, porque os erros quê eles têm cometido, podem carecer de sanção política mas não exigem que se invoque o patriotismo para poder acusar.
Sr. Presidente: o soberano espanhol abordou outras questões, não aquelas que realmente estão em aborto e dependam apenas da boa vontade do Governo espanhol — não aquelas que o Governo Espanhol há muito devia ter resolvido, se tivesse sinceramente vontade de manter com Portugal as afectuosas relações que as palavras apregoam— mas que os factos inteiramente desmentem,
Dir-se há que o soberano espanhol não tinha de se pronunciar sobre essas questões, porque dependem apenas do Governo Espanhol. Se assim é, a que vom o alarido que se ÍPZ em todo o país, dando como salvador da nação portuguesa o rei de Espanha? (
Porém, se assim é, a que vem a referência oficiosa que foi feita ao auxílio que a Espanha podia trazer sob o ponto de vista financeiro?
Mas se assim é, porque ó que o soberano espanhol se referiu a uns problemas e não se referiu a outros?
Sr. Presidente: sou dos que entendem que um país, como o nosso, e no momento da crise que atravessa, não pode evidentemente recusar, sem os reconheci-, mentos que lhe são devidos, auxílios que outro país pretenda fazer, sincera, leal e francamente.
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ÍHárío âa Câmara ífoj Deputado»
vemêjjcia.s a respeito da ordem públicae;m Portugal. Os próprios jornais espanhóis publicaram as iiptíci^s niajs, tendenciosas a raspeÀtq dg, ordeni pública no nosso País,; '"
Corço se cGmpr-e,encle e.ntãq esja amiza-: de que é, ta,m forte. g\ie consegue as simpatias çtcf próprios que 'nyas horas de amargura duvidam da.s atitudes da Espanha?
Entendo qu.e devemos estreitar com a Espauha as melhores relações. Os países tratam-se, de igual para iguaL Temos de nianter através de tuçlo não só a nossa independência, como a np.ssa sqber&-nia.
Sua Majestad^ q rei de. Espanha^ não falou, aj^aaas, nas qu.edas pie água do Dou-rp. Tçato^ da questão, (Ia pesca e tratou-a eni terrnps qu§ não, deixam çlúyida s.ô^re o conceito que o soberano espanhol tem a respeito do que. sejam os nossos direitos e do que sejain. as, pre.tensões do s.eu. país.
O facto é que, no Algarve, ao lerem*as declarações de Afqnsq 2£Iií, lembraram p belo dito de. que era fócit resolver q pro-ble.uia da pesca p,ara Sua Majestade, desde que noa lhe, ^ss^m^s o, ppixe e a Es_-p.anha se preparasse para p, comer...
Já nem a águ.a fria nos (Já. . „
Q que sucede j ój que os inter0§ses do piais e p;S interesses, portugueses são a^-soluíamente, Divergentes, dos interesses âs.-pauh^is, e, como/tal, têm ^e, p.pçtinuar a afirmar se através de tu^p. •
^ucede cpm esta questão, o que acontece com outras questõeà que demapdam na yerdade a atenção ^qs Miçiistros 0 que até agora, mevçê de circun.stan.cias.! que ppr certo o Qpvêrnp Èsp.atihql es.quece, não só não tiveram solução^ vt\a& estão ajup^a miiitp longe de a ter, porque n.em seqiier se desenb,py, íla parfe dqs espanhóis a boa vontade dum§ atitude nesse septido.
Sr. Presidente: a nçxssa política econó-n^ica interna,çioaal cprueça a, atingir unia agudeza, que não po^e çp.usentir mais de-íongas. e começo a supar que as próprias diligências do Sr. íi|iuistrp. dos Negócios Estrangeiros são já exíguas e in.suliçieia-tess. .
Es,!am,ps, a pou.cp tem.pp da extinção do Tratado çpm a Inglaterra.
Q. açôrdq eom, a A^ÇUWka terminou e
o. Tratadq com. a França tambéni terminou.
Apenas temos p Tratadp com qrlrigla-terra. Se a situação do País continuar a Desafogar-se, se & situação capabial pontie-nuar melhor, decerto sçria chegado q momento de essa política se fazer contra todas as dificuldades e emb,ar,*iços.
O último acordo económico co.m a França fez-se em termos, embora yantajpsps, precários para os nossos pnireitos.
Julgo que se estão tratando de negociações para o novo tratado com. a França.
Se assim não fosse, quando o tratado terminasse, teríamos de voltar à prorrogação d,q acordo, o que nã.ft resolve, q problema, e §& cria ui^a, situaçiiq tam desvantajosa para.nós çonip parti os. npssos direitos.
Sr. Presidente: q Sr. Ministro o^os Es-. trangeirp,s vai ter, com certeza, pcasiãp de dizer à Câmara não só o que tem.' sido os meses da gerência e a srça acção era matéria de, política interDa.cional, mas tam.bém. quais são os seus propósitos e ps $p Governo, porque, a Kaçãa Aãp está disposta a cpAS.ontir por mais tem.po que esta questãq s^ja adiada.
Sr. Pr^^i^ente : a viagem do. Sr. Presidente da Eepública a.P B.rasil iniciando negp.çiações para um tratado de camérr cio ainda nãq fpi aqui tratada e eu nãq quero pe4ir aq S.r. Ministrp dos Negócios Eatrapgeirqs que diga & Câmara p,s ter-m.os em que se encontram essas negocia-ções^ embora entenda que a postiça dp, silêncio nãq deve ser adqptada, pois em qutrqs países hoje tal não ímcede e os tratados de çquiérçiq stp. Discutidos em comíciqs e enj jpr^aj.s, cqmq aconte.çe em ^spap.^a. Jíu não qu.erp levar p S,r. T^i-nistrp dos Negócios Estrangeiros a prq-nunciar palavras que sejam comprometedoras, ma.s é, líçitq chamar a atenção do Governo para esse. tratado, pois as nos-sa.s cptón,ias e^tãq alargadas eani ise^ çõ.es qye se vão. dar a produtos dq Brasil porque tamb.ém existem, aas nossas colónias.
Eu nã;0. deixp 4e prestar justiça ao Sr. Ministro, dos Negócios. Estrangeiros pelq.s esforços que tejtn. empregado, mas, direi que & preçisq dar u-nidiade ao a.ssujalíP.
Cpm respeito, ao, pr.ftbieia^ das repara--co.es nã.a s,e tem resolvido .na.da,
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E,u preguntp, ao Governo em que condições estão essas reparações ?
^ Qual é o critério à,o Governo ?
<_ p='p' estabelece='estabelece' que='que' lei='lei' a='a' é='é' qual='qual' critério='critério' _='_' o='o'>
è^o Gp.vêrno quem primeiro se utiliza^?
£ÈEU q a® altura entram os partícula, rés 2
£ Como ó que pé estabelecem as relações entre os particulares e o Qpvêrnp Português ?
Têm pasmado os mes,es, e q Governo £ãp definiu; nada. jjstá f u,do ainda por ré/: solver.
^s comissões estão trabalhando pelQs dqçumentos qua já existjam1 mas, falta definir o crité.ria do Governo.
Repita, merecem cpnsideração, asj di-ligêftcjas çlo S.r. Ministra dos Negócios ÈíjtraAgeirp.s, ma,s. é precisa tambéni que S,, $x./ venha explicar certas nojneações que se dizem ilegítimas, pois, o {^r» MÍ-nÍ8,trp, tiftha prometido, não u>sar dos. direitos que lhe, tinham si4p conferidast o que ftãp, aconteceu relativamente a certps (Jespachos.
$ precisp; que p Sr. Ministro, nos, $ga. 9 que lia par-a prestígio, da,Kepúbíica e do, País,.
É lamentável ter (ta 3-eus.ar o Sr. l^it, nistrp. dos Negócios Estrangeiros, mas não. faço. acusa.çfies em termo,^ vagas.
São, e&ta§ as cpnsiderações que por agora entô.p$p. fazer relativas à acção çle S,'È^
3.r, Presid.e.nte: o. Sr. Álv§ro de Castra ma^iidQft para a Mes,^ uma moção em que convida p, Governo a re,compor-se
'Sr, Pr-e.sideate: essa. solução, e^pera-^ p. País., e espera-a pprque; tem a convicção, que da obra do actual Governo há m,u]-to.s acto.s que necessitam de sanção política.. .
. Tein-se dis.cutidp m\\itp a ins.tebÀlidade ministerial, mag a prebjema da. instabiU-4ada ministerial é o da política, portar guesa. Jt^ n.eces.sár-io, qv^e. assim o çp.ni-preenda, cx GQvêiftp, e a maioria.
Nãp temoa Yatxtaigem em d.ar ^Qes^traft-, gekí> a impressão qu.e, estagno % inens^lr mente dispostos a mudar de Ministério^.
O. novo Miaistérip não ^elxarji, de. ser OPnstitftída com a^ presidência d.Q actiija^ o que será garan.ti.al p.e.raato Q estraQge.i-. ro. c^ue a. obra cpmeç^4a p.e^o Grovêíno
continuará^ Caindo a.lguna dos seus membros.
Assim, u solução praçlama^a pelo Sr. Álvaro de Castro corrfiS:ponde aps desejos do País para que se continue à obra c,o.m.pçada.
Mas é necessário que certos valores, inúteis. 4asa.pareçan} da política, pprtijgue-sa e, por niais paraploxa.1 que pareça, esses valovès, surgem comp sendp elementos de acçãp. .
Sr. Presirleíite: desejo chamar a atenção dp, Sr. Presidente do Ministério para um facto que eu reputo da maipr gravidade p,ara- ai vida deste Gpv^np QU, de qualquer outra Gavêrna pelo motivo de perturbação que pode produzir.
Re%o-me à deminuiçãa de responsab^li-^ades que se veçft de fazer em relação, aas implica^OiS. nas acpnteciTOentas de 19 de Outubro.
Hiag^ém duvida 4a b.oa vo.ntade 4o Go-yêrno e e,u e§tp,u ccrtq qu,e ele tem eni-p.reg-adq todos o.s seu,s esforços para al>re-viar o juígamei^tp d.êsses, apusaç^Qs, n,ias começa-se a_ recear que ês.ses esforças, sejam infrutíferas perante p,s embaFaço.s que lhe têm sido levantados.
Há um o.u.trp aspectp da questão política que; eu desejo frisar: é a questão do jogo. Em Ljs|?oa Q todos os dias^ à sombra dp, iogot se coniete-m os m.ais hediondos crinjeSo
Ò jSr. Presidente d° MiP^J®^0 &1® ^ olhar para estas questões que ftão são mínimas porque esta situação não convém a nenhum Governo.
Termino as minhas considerações, que não v são de oposição ao Gavêrno e que têm apegas a intepção 4® analisar serenamente a questão, e mas.trar a absoluta ne-cessi4.ade 4^> Qmft recampqsição ministerial para Q prosseguimento da obra que o Govfirnp teni querido executar ex.pnrgan-4o-a dos defeitos que a acpmpanh,a. . Tenha 4Í*o-
O orador não reviu.
O Sc. Crispiniana fa Fonseca;— Eeqi^ei-rp, qv\e e^tr,^ já ©ca diaeus.são PI parecer da cpmiss,ãp gueçr^, acerca de um pficiô do comandante da l.a ^YÍ^°/Bap^ $ 8U^* penslQi 4aa i;Çftuni4a40s. parl^nientares, ao S,r-. Ço.r-t^a dos S.ant^s.
J?oj, l$o na Mçao» çenda posto em dk-vussão. . . ' ,-
$e38ão, d$ l $e ±fovçn$ra de W$
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Diário da Câmara do» Deputados
Parecer n.° 344
Senhores Deputados.—Reclama o Sr. Cortês dos Santos contra a autorização, dada por esta Câmara, que manteve a sua prisão como implicado nos crimes de 19 de Outubro, e pede que tal autorização seja retirada.
As vossas comissões de legislação criminal e de guerra, vencidas em sessão conjunta, e depois de informadas por um seu vogal quo para tal fiui foi ao Tribunal Militar examinar o respectivo processo, apuraram que o Sr. Cortês dos Santos é acusado de haver tomado parte no movimento revolucionário de 10 de Outubro e de, sendo uni dos organizadores desse movimento e tendo conhecimento dos boatos que corriam acerca de projectados atentados pessoais, não haver tomado as providências necessárias para evitar o cometimento desses atentados.
Apreciados e devidamente pouderados os fundamentos da prisão, entendem as vossas comissões de legislação criminal e de guerra que eles não são do natureza a dever manter-se o afastamento do Sr. Cortês dos Santos, do exercício do seu mandato.
•Julgam, pois, as vossas comissões de legislação criminal e de guerra que merece ser atendida a reclamação do Sr. Cortês dos Santos, sem prejuízo, evidentemente, do ulterior seguimento do processo para a necessár;a averiguação de quaisquer responsabilidades.
Sala das sessões das comissões, 25 de Agosto de 1922.—António de Sousa Maia (com a seguinte declaração: dou o meu voto por já haver um parlamentar em idênticas circunstâncias a quom foi concedida a liberdade)—f. C. Rego Chaves— Amadeu Leite de Vasconcelos — António Resende (vencido) — A. Crispiniano da Fonseca (vencido) — Joaquim 3fatos — Baptisfa da Silva — Leio Portela (vencido) — Albino Pinto da Fonseca — Alberto da Rocha Saraiva, relator.
O Sr. Vergilio Costa : — O parecer em discussão não está de acordo com a deliberação tomada por esta Câmara nem com o artigo 18.° da Constituição.
Não tem esta Câmara de pronnnciar--se sobre as praxes criminais, mas apenas acerca da questão moral, e se sobre este assunte já toniou deliberações.
Não compreendo porque as vai modificar.
Sobre o assunto mando para a Mesa a seguinte
Moção
Considerando que a Câmara, quando sujeita à questão do artigo 18.° da Constituição, não tem de apreciar do processo nom de quaisquer provas referentes à acusação do Deputado pronunciado, inas apenas do grau de desonra do crime imputado, isto é:
Considerando que a Câmara tem, apenas, a considerar se reputa o Deputado arguido indigno ou não de continuar colaborando nos seus trabalhos, durante o prosseguimento do processo, e. portanto, se deve ou não ser suspenso;
Considerando que, no caso de não ser resolvida a suspensão, deve a Câmara decidir se o processo prossegue no intervalo das sessões ou depois de findas as funções do arguido;
Considerando que a expressão «intervalo das sessões» significa o prazo de horas que vai duma sessão diária à sessão diária do dia seguinte como claramente resulta do: Regimento da Asscmblea Nacional Constituinte, título 3.°, capítulos 1.°, 2.° e 3.° do actual Regimento desta Câmara nas disposições paralelas; da comparação do artigo 18." com o artigo 17.° da Constituição, onde o legislador, para significar idea diversa empregou, cuidadosamente, expressão diferente «período das sessões»; e, até, da linguagem consagrada no Parlamento que diz, por exemplo, «a comissão de tal reúne no intervalo das sessões», para significar o espaço que vai desde o encerramento da sessão de hoje até a abertura da sessão de amanhã;
Considerando que, nestes termos, o artigo 18.° sujeitou à decisão da Câmara,. no caso de não suspensão, se o processo deve prosseguir apenas depois de findas as funções do arguido ou se os seus termos, dependentes da presença pessoal deste, devem ser realizados no intervalo das horas das sessões, a fim de o Deputado não ser impedido de comparecer a estas;
Considerando que a Câmara já decidiu não reconhecendo a necessidade da prisão do Deputado Cortês dos Santos; -
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mação da culpa, a acusação não se modificou ;
Considerando que a Câmara já declarou que o arguido não era indigno de continuar colaborando nos seus trabalhos;
Confirmando o seu anterior critério e adaptando-o à letra e espírito do artigo 18.° citado, a Câmara entende:
que não deve ser suspenso o Deputado Cortês dos Santos;
e que o seu processo deve prosseguir normalmente, de modo, porém, que todos os termos, autos e diligências, em que a presença pessoal do arguido seja necessária, tenham lugar no intervalo' das sessões.
Sala das sessões da Câmara dos Deputados, l de Novembro de 1922. — O Deputado, Vergiho Costa.
O Sr. Crispiniano da Fonseca: — Sr. Presidente: não cheguei a compreender bem as considerações que o ilustre Deputado Sr. Vergílio Costa acaba de fazer; parece me, porém, que o que S. Ex.a deseja é que a Câmara resolva tam somente autorizar a continuação dos termos do processo no intervalo das sessões, sem a suspensão de funções por parte do Sr. Cortõs dos Santos.
Entendo "que tal deliberação não deve ser tomada, porquanto o artigo 18.° da Constituição refere se à suspensão relacionada com o andamento do processo, porque uma e outra cousa estão intimamente ligadas.
Não se suspendendo o Deputado, não pode o processo seguir regularmente os seus trâmites.
O Sr. Vergilio Costa: — Não é isso o que d;z o artigo 18.° V. Ex.a loia-o bem e verá que não é essa a interpretação que se deve dar.
O Orador: — Entendo que a presença do acusado junto do tribunal é absolutamente necessária para o andamento do processo; de resto, parece-me ser esse o o desejo de toda a Câmara.
Escusado era esclarecer, mas acentuo mais uma vez que a comissão não indagou das razões ou valor das provas que levaram o tribunal a pronunciar o Sr. José Cortês dos Santos; nós não cura-
mos saber disso, não queremos nem desejamos sabe Io, seria uma grave ofensa ao Poder Judicial e até à própria Constituição.
Éecebemos uma comunicação do Sr. general comandante da l.a divisão, em que dizia que o Sr. Cortês dos Santos era por ali acusado de cumplicidade num crime de homicídio voluntário.
O Sr. António Maia: — A que corresponde a pena maior.
O Orador: — Nesses termos comunicava à Câmara, ?a fim de que o Sr. Cortês dos Santos fosse suspenso das suas funções.
Perante o facto da pronúncia, sem mesmo se atender ao crime de que S. Ex.a era acusado, julgou a comissão que não podia deixar de dar o seu parecer para essa suspensão e ainda para que o processo continuasse durante as sessões e em qualquçr intervalo.
E, a propósito deste assunto, direi que entendo que intervalo de sessões é o que vai duma sessão legislativa à outra, nos termos do artigo 11.° da Constituição, e não o simples intervalo das sessões diárias.
Seja qual for, porém, a interpretação, que neste caso não importa saber, nós autorizamos que o processo prosseguisse durante qualquer intervalo, seja qual for, atendendo simplesmente ao ponto de vista moral e ao interesse público.
Parece me que a Câmara resolverá bem suspendendo o mesmo ilustre Deputado das suas funções, não como-acto ad odium evidentemente., mas em cumprimento dum dever. Prestigiar-se há assim e ao Poder Judicial.
Tenho dito.
O Sr. Carvalho da Silva : — Sr. Presidente : pedi a palavra para declarar, em nome deste lado da Câmara, que damos o nosso voto ae parecer da comissão de legislação criminal.
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ftiâno âa Vfimvrá anta
involuntário, não podendo ter, portanto, prisão preventiva; o Sr. Cortes dos Santos e^a acusado de cumplicidade no crime de homicídio voluntário, a que corresponde pena maior, tendo, portanto, prisão preventiva.
Entendo que à Câmara hão tem de apreciar se O Sr. Cortês doa Santos é Ou não digno de tomai* parte nos trabalhos da Câmara; isso é uma atribuição do Po-dõr Judicial, em que a Câmara nada tem de intervir e em que de maneira alguma deve intrometer-se. Desde que o Sr. general coinandantp da divisão pede a suspensão das imunidades parlamentares de S. Éx.a...
O Sr. António Maia: — O Sr. comandante da divisão não pede a suspensão das imunidades parlamentares do Sr. Cortês dos Santos; para se cumprir o disposto no artigo 18.° da Constituição, comunica à Câmara que o Sr. Cortês dos Santos está pronunciado em tais e tais crimes, tendo a Câmara apenas de resolver sobre o artigo 18.° da Constituição^ isto é) sobre s© o processo pode continuar no intervalo das sessões ou só de* pois da suspensão do arguido.
O Orador;—A Câmara tem de resolver sobre dois aspectos : o aspecto jurídico e o aspecto moral. Sobre o aspecto jurídico, a Câmara está autorizada a suspender as funções do Sr* Cortês dos Santos; sob o aspecto moralj não pode tomar qualquer deliberação que vá impedir ou pfõtelar por qualquer forma o já do-ínorado julgamento dos crimes de 19 de Outubro*
Não quero com estas minhas palavras fazer qualquer acusação ao Sr, Cortês dos Santos, porque, repito, não é a esta Câmara que compete afirmar se S. Ex.a é ou não digno de fazer parte dela, mas o que compete a esta Câmara é facilitar à acção da justiça para que o julgamento dê S. Ex.A se faça com a maior (brevidade, assim como todos os julgamentos relativos aos crimes de 19 de Outubro.
Entendo ètt que ninguém mais do que S. Es.81 deve querer que todos esses julgamentos se façam o mais rapidamente possível. O Sr. Cortês dós Santos não quero, não pode qUérôr dó maneira algu^ iffia acobertar-se à sombra das imunida*
dês parlamentares para fazer demorai* o julgamento do crime que lhe é imputado; por consequência entendo que a Câmara, não só como princípio á adoptar em acusações como esta formulada ao 3r. Cortês dos San toa, mas porque até perante todo o mundo a Câmara precisa provar quê quere, que deseja por todas as? maneiras qUe à justiça exerça a sua acção sobre pessoas acusadas de crimes como àquele de que Sj Ex.a é acusado.
Entendo que a Câmara ficava mor ai -mente muito mal colocada sé não autorizasse imediatamente á áaspensÊo dasimu-liidades parlamentares do Sr. Cortês dos Santos, para que a justiça possa exercer aquela acção que é exercida contra, todas as pessoas acusadas de crimes como S. Ex.tt
Tenho dito.
O orador não revitt.
O Sr. António Maía:—Sr. Presidente! apenas duas palavras.
Quando a Câmara deu autorização para que o Sr. Cortês dos Santos continuasse no exercício das suas funções, ainda S< Ex.a não estava pronunciado; porém-, aparece agora a pronúncia, pela qual o Sr. Cortês dos Santos está incurso nutíi crime a que corresponde pena maior, e eu pregunto- se a Câmara- não tem obrigação moral de suspender S. Ex.3
No caso de o Sr. Cortês dos Santos ser ilibado, voltará a esta Câmara, e no caso de ser condenado, o Paiiain ento cumpriu o seu dever.
Era isto íjue tinha a dizer.
Tenho dito.
O orador não reviu.
É lida na Mesa e seguidamente rejeitada, a moção apresentada peto Sr. Vergilio Costa.
E lido o parecer das comissões de legislação criminal e de guerra, e seguidamente aprovado.
È lida Uma nota dê interpelação do Sr. Ferreira da Rtocha ao Sr. Presidente do Ministério.
Ê a seguinte:
Nota de interpelação
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a actos praticados com fins de política partidária e executados com manifesta violação da lei.— ferreira da Rocha. Expeça-se.
- O Sr. Sá Pereira: — Sr. Presidente: ao iniciar as minhas considerações desejo dizer à Câmara que me escuta e ao Governo que não há da minha parte o mais pequeno propósito de hostilizar o Governo nem criar-lhe dificuldades.
Filiado no Partido Democrático, amigo pessoal do Sr. Presidente do Ministério, eu não quero faltar à disciplina partidária, nem dar razões de espécie alguma para que S. Ex.a, pessoalmente, se possa julgar melindrado comigo.
Há, porém, um ponto que eu nunca abandonei, não abandono nem nunca abandonarei, no decorrer da minha vida, qual ó o de, seja qual for a situação política do meu país, dizer sempre aquilo que julgo ser a verdade.
Sr. Presidente: as minhas considerações resumem-se a pedir a atenção do Governo para alguns dos mais gravíssimos problemas nacionais, que precisam de pronta solução.
As minhas considerações são como que a sequência do que havia a dizer, se porventura se tivesse realizado a interpelação que anunciei ao Governo.
Sr. Presidente: um dos problemas mais graves da vida nacional é o da carestia da vida, que a toda a gente está assoberbando, e continua a ter um caminho que não é dos melhores para a sociedade portuguesa.
O Governo tem empregado o melhor dos seus esforços para atenuar essa crise, e algumas das medidas têm já dado resultado, pois o câmbio melhorou bastante.
Todavia, verificamos que, apesar disso, o custo da vida aumenta cada vez mais.
O Governo começou por fazer sentir aos exportadores que tinha mudado de intenção, e, se não fez tudo, esíou convencido de que o Governo nesse ponto procederá até onde for preciso para melhorar o actual estado de cousas.
Sr. Presidente: devo dizer ao Governo que sinto que no interregno parlamentar não tivesse sido resolvida a malfadada questão do pão.
Sabe V. Ex.a que pelo que se legislou continuamos precisamente naquela situa-
ção que eu havia previsto quando se dis- -cutiu a questão cerealífera; continuo a ter precisamente a mesma opinião, opinião que não teve o Governo.
Sustentei sempre que os dois tipos de pão não davam resultado apreciável, dizendo as razões e os motivos por que assim pensava.
Eu sei, e posso dizer que o sei por experiência própria, que em Lisboa a quantidade de pão que se fabrica não chega para o consumo público, e, pior do que isso, o que se fabrica além de não chegar é de uma qualidade péssima, impossível de servir para alimentação.
Alegou-se aqui na Câmara que não se decretava .o tipo único porque ele sairia de tal maneira caro que se tornaria incomportável para a bolsa do consumidor pobre, e decretou-se por isso o regime "de dois tipos de pão.
Pregunto: . Sr. Presidente: não estou tratando este assunto porque tenha o propósito de atacar o Governo pois não quero criar-lhe quaisquer dificuldades, o meu desejo é que se romedeie este estado de.cousas para evitar tragédias como aquela a que assistimos há pouco, ou porventura maiores. Eu sei que o Governo tem força, que pode usar da força contra qualquer nova desordem que se possa desencadear; mas, Sr. Presidente, devo dizer a V. Ex.a, com toda a franqueza e sinceridade que se -me confrange a alma quando vejo que há um Governo que necessita de usar da força contra o povo quando esse povo reclama pão mais barato. Eu sei que essas reclamações se prestam a muita especula • cão, ma.s é triste que se forneçam elementos para que essa especulação se faça.
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Diário áa Câmata dos Deputaàoà
verdadeiramente espantosas de que tive conhecimento, algumas que V. Ex.a já conhece e outras que se não conhece, vai conhecer.
Sr. Presidente: uma das cousas graves que eu verifiquei naquela nossa rica província mas cujo povo tem uma vida verdadeiramente miserável porque a riqueza é para aqueles que têm a fortuna de serem ricos e que podem exportar o figo, a amêndoa, a alfarroba e principalmente a conserva, exportação que naquela nossa província se' está fazendo em larga escala.
Basta que eu diga a V. Ex.a que no Algarve o pão mais barato que ali se encontra ó a l $40 cada quilograma, vendendo se já cm algumas províncias a USO.
Eu pregunto se j os pobres e humildes trabalhadores da região algarvia não têm tanto direito a alimentar-se de pão como os trabalhadores das outras regiões do país.
Estou convencido de que o Governo vai providenciar no sentido de atenuar a crise do Algarve, especialmente pelo que diz respeito às classes trabalhadoras.
A questão do pão, que infelizmente já nos tem dado tantos desgostos, continua, mau grado nosso, a estar na ordem do dia, e agora tenho diante de mim um documento que é grave para o Governo, e, sobretudo, para o Sr. Ministro da Agricultura, porquanto se fazem ali afirmações que não podem -passar sem reparo.
Sr. Presidente: estou absolutamente convencido de que não há nenhum Ministro da República que tenha faltado ao respeito que deve à lei. Mas nós precisamos de entrar em vida nova. Não me dou por satisfeito, embora tonha muita consideração, estima e respeito pelo meu ilustre correligionário e companheiro de círculo, o Sr. Ministro da Agricultura, com um simples desmentido; exijo mais alguma cous.a. Quando aparecem cousas desta natureza ein público, quem as escreve tem de entrar na cadeia para dar uma satisfação à República e à sociedade.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Sil-
va):— Já disse ao meu ilustre colega d^ pasta da Justiça que é necessário quanto antes publicar-se uma lei chamando à responsabilidade os escribas que se permitem a liberdade de insultar os homens públicos, lançando-lhes os epítetos mais afrontosos e as mais aviltantes calúnias.
O Orador; — Coin efeito este estado de cousas não pçde continuar, povque a opinião pública quando lê cousas destas fica convencidíssima de que elas representam a expressão da verdade.
Várias vezes tem sido aqui discutida a aplicação da lei contra os assambarcado-res.
A verdade, porém, é que essa lei não se aplica, e tanto .assim que passam-se meses sem que alguém seja chamado à responsabilidade por virtude dela. Quere dizer: «os assambarcadores- desapareceram» !
Infelizmente não é assim; o que se dá é a falta de aplicação da lei.
Como já disse aqui quando se tratou da questão do pão, não temos aqueles funcionários que deveríamos tar para o desempenho de determinado número de funçõr-s.
S. Ex.a o Sr. Presidente do Ministério vai dizer-me: «Eu não tenho crlpa disso, pois não posso tornar honesto quem ó não seja».
Mas eu lembro a conveniência de serem tomadas quaisquer medidas a tal respeito.
Lembro que na Bélgica se estabeleceu o controle. E uma medida que dá resultados. Mas não se pense que se formos estabelecer entre nós também um controle devam ser feitas novas njmoações. Podem ser aproveitados os funcionários que já existem.
O Governo publicou no interregno parlamentar o decreto n.° 8:-{44, a que já ontem se referiu o mou amigo e brilhante parlamentar Sr,, Ginestal Machado.
Com a franqueza que me caracteriza, devo dizer que semelhante decr3to é tudo quanto há de mais utópico.
Fala o decreto em «lucros excessivos» e deixa, pelo artigo 6.°, o.reconhecimento da existência do semelhantes lucros ao critério dos agentes do Ministério Público ou das pessoas que se queixam.
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sivo, necessário só torna ver a factura para se conhecer do custo da fazenda.
Eu queria que a fiscalização necessária para se executar tal decreto estivesse a cargo de funcionários superiores nomeados pelo Governo, que verincas-sem as escritas.
Mas há ainda a notar que há nisto cousas muito complexas.
É que pode não ser excessivo o lucro de 50 por cento num determinado artigo, e o de 20 por cento, por exemplo, noutros artigos ser excessivo.
Um outro caso grave é o que diz- respeito ao funcionalismo, pois o meu desejo. Sr. Presidente, é que o funcionalismo seja bem pago, de lorina a poder passar uma vida desafogada; mas exigindo-se-lhe o rigoroso cumprimento dos seus de\eres, pois a verdade é que este actual estado de cousas não pode de maneira nenhuma continuar.
Há uma enorme quantidade de funcionários que não produzem absolutamente nada, ,e assim temos um funcionalismo barato, que na realidade custa caríssimo ao Estado.
Apoiados.
Eu, Sr. Presidente, tenho relamado instantemente pela solução deste assunto, e não deixarei de o fazer, se bom que seja o primeiro a reconhecer que a culpa não é dos homens que se sentam naquelas cadeiras, isto ó, da sua falta de competência ou honestidade, mas sim da sua falta de e lergia.
Ainda não há muito, Sr. Presidente, que eu tive conhecimento do um facto que reputo da máxima gravidado, qual seja o que diz respeito a um péssimo funcimá-rio que pediu uma licença de dez dias i|ue lhe foi negada,; tendo-lhe sido concedida mais tarde por um Ministro q.ue nau faz parte deste Gabinete.
Já vê V. Ex.a e a Câmara que desta forma não há meio do haver disciplina.
Não há da minha parte nenhuma má vontade contra o Governo, tanto mais qi;anto é certo que os membros que o ccmpõem, fazem parte do Partido a que tenho a honra de pertencer.
Sabe V. Ex.a também' muito bem que não é permitido o jogo de a/ar: porém, está-se jogando por todo esse país fora.
Isto a meu ver ó de uma grande gravidade, pois a verdade é que não se respei-
tando assim o Código Penal relativamente ao jogo, nós não o podemos impor para outros crimes que se cometam.
Desassonibradamcnte, sem escrúpulos nem vergonha, rasgam-se a cada passo e em toda a parte, as disposições expressas do Cudigo Penal.
As autoridades calam-se e consentem, mas eu como Deputado da nação, não posso deixar de protestar veementemente em nome dos princípios que inalteràvel-mente têm sido defendidos pelo Partido Republicano Português a que me honro de pertencer, contra, um tam flagrante e condenável desrespeito às leis da República.
Apoiados.
Têm-se dado casos por esse país fora bastante comprovativos da incúria das autoridades, perante o cumprimento das disposições do Código Penal; a Câmara certamente os conhece tam bem como eu.
Eu sei, por exemplo, que num concelho do Algarve um determinado indivíduo que tinha sido já repetidas vezes roubado, ao pretenderem roubá-lo, novamente agrediu um dos banqueiros, por tal forma, que grossa desordem se estclbelecetí, havendo tiros a torto e a direito.
Pois muito bem, serenada a contenda pela autoridade, o jogo continuava pouco tempo depois tranquilamente.
Noutra localidade do Algarve, um correligionário meu foi mais longe e teve o desplante de decretar na sua jurisdição nem mais nem monos do que o monopólio do jogo (Kisos), permitindo apenas a determinadas casas o exercício do jogo.
V. Ex.as riem-se, mas o caso não é para rir. uma vez que estão em causa o prestígio da autoridade e o bom nome da República.
Trazendo este assunta ao Parlamento, íuço-o como já disse, em obediência a princípios que,' sendo os do rneu Partido, são igualmente os meus; mas faço-o também para manter aquela autoridade indispensável para acusar os Governos das opo-sições quando naquelas cadeiras não souberem ou não quiserem fazer respeitar a leiv
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Diário da Câmara aos Deputado»
Nós temos que encarar este problema como um problema de ordem moral.
Nós não viemos para a Kepública para cobrir a crápula.
i Nós somos republicanos para moralizar os costumes da sociedade!
Eu trabalhei sempre pela República, e não estou arrependido disso, mas para que ela não tivesse pontos de contacto com aquilo que foi a monarquia, principalmente nos seus últimos anos.
Eu quero uma Eepública honrada, e no dia em que me convencer que a Eepública é tam boa como a monarquia, tenho de ser tam seu adversário, como o tenho 'sido da monarquia.
Apoiados.
Sr. Presidente: para um outro ponto chamo a atenção do Governo.
Em Lisboa, como não é de admirar, existem por toda a parte fábricas destinadas a falsificar os géneros de alimentação pública.
Pregunto ao Governo se as autoridades já tomaram as indispensáveis medidas para que essas fraudes não continuem.
Falsifica-se tudo, até os produtos farmacêuticos, como de resto há muito se falsifica o vinho,
E toda a gente sabe que ele é falsificado nos vastos armazéns do Poço do Bispo, mas só as autoridades competentes parecem ignorá-lo.
Ainda para um outro ponto quero chamar a atenção do Governo.
Ê o seguinte: deram-se casos gravíssimos na administração pública, aparecenim dezenas, centenas, posso dizer milhares de ladrões que se apossaram por várias formas dos dinheiros públicos.
É um verdadeiro calvário: são os Transportes Marítimos, Bairros Sociais, já se fala em Armazéns Reguladores, etc.
E eu tenho dê constíitar com tristeza que ainda não está ninguém preso por causa disso.
Isto é perfeitamente um Pinhal da Azarabuja, pior do que aquele pinhal de que era partidário o Sr. Carvalho da Silva, quando ele se destinava a roubar-nos as eleições.
ftisos.
Ora é preciso tomarem-se medidas enérgicas contra os delapidadores dos dinheiros públicos, e isso foi uma cousa que a monarquia nunca fez.
Eu sei que o Sr. Presidente do Ministério pode dizer-me, e com verdade, que estão correndo as sindicâncias e que só após serem conhecidos os seus, resultados pode proceder.
E eu digo que não basta esperar pelos resultados, o melhor é proceder já, prendendo provisoriamente os culpados.
Sr. Presidente: os ladrões andam pela cidade impunes, e o Estado tem perdido centenas de contos e até hoje não se procedeu contra eles.
Nós temos que moralizar a sociedade portuguesa.
Nós chegámos a uma situação em que não há respeito por ninguém, nem pelo Governo, nem pela própria polícia.
Sr. Presidente: ainda no outro dia todos nós tivemos conhecimento do facto de um indivíduo se ter alcançs.do em 800 contos, e ser apenas afiançado em 100 contos.
Deu-se um alcance de 50 contos no Hospital de S. José, e o respectivo tribunal absolveu quem o tinha praticado.
Parece-me tempo de pôr cobro a este estado de cousas, que só pode concorrer para a desmoralização o desprestígio da sociedade portuguesa.
jii positivo que as congrega jões religiosas estão restabelecidas em Portugal.
Há mais de seis meses, que um amigo meu me pediu para levantar esta questão na Câmara, e não o quis fazer, julgando que o Governo tomaria providências, mas não as tomou.
As informações que eu tenho são de pessoa idónea, e sei que em Espinho e em Cintra há congregações religiosas, e um nosso correligionário que foi Deputado às Constituintes e Senador, o Sr. For-tunato da Fonseca, disse que em Portugal há mais congregações religiosas do que em tempo algum.
O Governo sabe as consequências que isto pode trazer, se não se tomarem providências, o que pode obrigar o povo a ter que tomar qualquer resolução.
;Eu hei-de sempre reclamai: essas providências, e quando aqui não o pudesse fazer recorreria à praça pública!
Eu combato todas as revoluções, mas não as condeno quando são para restabelecer a Constituição.
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Não quero que se persiga ninguém que vai às igrejas ; mas obrigue-se toda a gente a estar dentro da lei.
Não quero agredir ninguém e sou o primeiro a condenar que alguém vá a uma igreja praticar qualquer desacato; entendo, todavia, que não pode, à face da lei, obrigar-se qualquer pessoa a ir à missa, e consia-me qu3 ainda não há muito tempo uma forca de marinheiros íoi obrigada a assistir a uma missa campal, em S. Mar-tinho do Porto, facto este que podia ter trazido sérias consequências.
Sr. Presidente: eu desejo ardentemente que o Sr. António Maria da Silva conti-nui a ser Presidente do Ministério, não posso mesmo ter outro empenho; mas, como disse o Sr. Ginestal Machado, numa passagem do seu discurso, eu também não desejo que se faça política de habilidades.
Quero os campos extremados.
Se nós estamos no poder para cumprirmos o nosso programa, não precisamos de perseguir ninguém, e não devemos, de forma alguma, fazer a chamada política das direitas.
Não tenhamos a excessiva generosidade que tivemos quando o Partido Liberal esteve no Governo, porque vimos bem que o resultado dessa generosidade foi a revolução de 19 de Outubro, e não queiramos outra revolução.
É preciso dizer a toda a gente que cumpra o seu dever, mas também é indispensável que o Poder Executivo mereça toda a confiança àqueles que representam a maioria da nação.
Sr. Presidente: ajudei a proclamar a República e sem quebra dos meus princípios, que hoje são tam profundamente socialistas como eram então, devo dizer que, quando vejo que a República não tem aquele espírito de rectidão e verdadeira democracia, sinto-me inclinado para essa legião que se chama anarquia.
Quando vejo a humanidade cada vez mais miserável, eu sinto-me revoltado, não por mini, mas por esses desgraçados que vejo sofrer cada vez mais.
Vou terminar, Sr. Presidente; porém, antes de o fazer, desejo formular um apelo ao Sr. Presidente do Ministério.
V. Ex.a deve ter já conhecimento do relatório enviado pelo Sr. Governador Civil de Beja, sobre o que se passa nas Minas de AljustreL
S. Ex.a, apesar de conservador, veio de lá horrorizado, e eu peço ao Sr. Presidente do Ministério que.não deixe morrer aquela gente de .fome.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Maldonado de Freitas: — Sr. Presidente : a lei sobre imposto de transacções dispõe, no n.° 4»° do artigo 3.°, que estão isentos daquele imposto aqueles actos praticados por qualquer espécie de comércio' que estejam sujeitos a tabelas fixadas pelos corpos administrativos ou pelo Governo.
O caso de que vou tratar interessa à classe farmacêutica, a qual vende produtos sujeitos a tabelas que foram aprovadas em Agosto do ano passado, sem que até hoje tenham sido revistas, apesar das diferenças de câmbio.
Acontece também que há produtos que não estão tabelados pelo Governo, como sejam as especialidades farmacêuticas, mas que não saem da alfândega sem que o seu preço seja fixado para os efeitos do selo, a que estão sujeitos por virtude do decreto de Maio de 1919, que manda estabelecer um selo proporcional ao custo da especialidade.
Sr. Presidente: este selo foi votado nesta Câmara para fazer face aos encargos que o Estado tinha para a construção da Faculdade de Farmácia, cujo quantitativo era aproximadamente de 500 contos.
Sucede que até hoje já foram cobrados mais de 1:200 contos, e ainda a cobrança continua, agravando assim o preço das especialidades e evidentemente o público que tem de pagar um selo cada vez mais aprovado pela circunstância do câmbio.
Como V. Ex.a sabe as especialidades farmacêuticas estão sujeitas a tabelas aprovadas pelo Governo e nestas condições parece que estão isentas do imposto de transacção.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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Diário da Câmqra doit
(lp e o resultado desse estudo eu trarei à Câmara para o apreciar.
O Sr. Carvalho da Silva: — No concelho do Barreiro foi preso um indivíduo que andava distribuindo um folheto doutrinário que tem o nome do editor, nas condições exigidas pela lei.
Pois esse homem que esteve preso à ordem da autoridade do Barreiro —talvez seja algum daqueles a que se referiu o Sr. Sá Pereira — depois veio para o governo civil dando eqtrada no calabouço.
Chamo a atenção do Sr. Ministro do Interior para este facto que representa um atentado contra a lei.
O orador nqo reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e tro do Interior (António Maria da Silva):— PQSSQ informar -V. Ex.a de que a pessoa a que se referiu já se encontra em liberdade.
O Sr. Presidente:—A próxima sessão é amanhã, 2, hàor a regimental, com a seguinte ordem do dia:
Antes da ordem:
Parecer n.° 57, que cria a freguesia de Albergaria dos Doze.
Ordem do dia:
Pebate político.
Projecto de lei n.° 372, que interpreta o artigo 2õ.° da lei n.° 1:268, de 21 de Setembro de 1922.
• Pareceres n.08' 211, 302 e 135, já dados para a ordem.
Pareceres n.08 74, 79, 89, 95, 114, 141, 165, 174, 195, 199, 208, 213, 276, 279, 3Í8, 339, 343, 355, 698-N, 709-B, 242, Iâ7, 142, 176, 184, 198, 267, 311, 320, que criqm assembléas eleitorais.
Est4 encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 25 minutos.
Documentos enviados para a mesa durante a sessão
Projectos de lei
PQ Sr. António Muia. permitindo aos alunos de medicina da Universidade de Coimbra que tenham requerido exame de anatomia do. 2.° ano a frequência no 3.°
ano, provando ter sido aprovados nos restantes exames daqijole ano. Para o «Diário do Goi-êmo».
Dos Srs. Pedro Pita, Carlos Pereira e Paulo Menano, permitindo, em designados termos, que os proprietário:? de prédios urbanos elevem as respectivas rendas..
Aprovada a urgência e .dispensa do Regimento.
Para a ordem do dia.
Parecer
Das comissões de legislação criminal e da guerra, mandando suspender o Sr. José Cortês dos Santos do exercício do seu mandato, por se achar pronunciado em relação aos acontecimentos de 19 de Outubro.
Aprovado.
Comunique-se.
Requerimentos
Requeiro que me sejam fornecidos, com toda a urgência, os seguintes esclarecimentos :
1.° O motivo por que não foi posta em execução a loi n.° 1:350, de 13 de Setembro de 1922 ;
2.° Se a aplicação dessa lei tem dado lugar a dúvidas, por que motivo ela não foi submetida à apreciação do Congresso da República,, a quem, nos termos da Constituição, compete fazer leis e interpretá-las.
Requeiro também que, pelo mesmo Ministério, me seja. enviada, com toda a urgência, uma cópia de todo o processo sobre a aplicação da lei n.° l :350 aos oficiais da armada em comissões especiais, ao abrigo do artigo 116.° do decreto de 14. de Agosto de 1922.
Em l- de Novembro de 1922. — Prazeres da Costa.
Expeça-se.
.Requeiro que, pelo Ministério do Trabalho, me seja fornecida, com a possível urgência, cópia das conclusões da^ sindicância instaurada ao administrador do hospital das Caldas da Rainha, Custódio Maldonado de Freitas, e do respectivo despacho ministerial.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, l de Outubro de 1922.— Carlos Pereira.
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Para efeitos duma interpelação de que junto mando nota, requeiro que, pelo Ministério do Interior, me soja facultado, para exanie, o processo relativo à dissolução da Câmara Municipal de Montale-gre e portarias relativas à anulação do recenseamento deste concelho.
l de Novembro de 1922.— Ferreira da Rocha.
Requeiro que, pelo Ministério do Comércio, me seja facultado, para exame, o processo relativo à suspensão das obras
que por expropriação por utilidade pública a Câmara de Mondini de Basto esteve já executando.
l de Novembro de 1922.— ferreira da' Rocha.
Expeca-se.
Roqueiro que, pelo Ministério das Finanças, me seja . facultada a sindicância feita aos serviços fiscais de Sabrosa.
l de Novembro de 1922.— Ferreira da Rocha.
Expeça-se.