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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 45
EM 7 DE MARÇO DE 1923
Presidência do Exmo. Sr. Alfredo Ernesto de Sá Cardoso
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário. — Respondem à chamada 53 Srs. Deputados.
Procede-se à leitura da acta e do expediente.
Antes da ordem do dia. — Usam da palavra para explicações os Srs. Sousa Rosa, Carlos de Vasconcelos e Homem Cristo.
O Sr. Ministro da Guerra (Fernando Freiria) apresenta uma proposta de lei para a qual pede urgência, que a Câmara concede.
O Sr. Carvalho da Silva usa da palavra para explicações, respondendo o Sr. Presidente.
O Sr. Hermano de Medeiros, em negócio urgente, protesta contra a velocidade dos automóveis nas ruas de Lisboa.
O Sr. Ministro da Instrução Pública (João Camoesas) promete transmitir as suas considerações ao Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior.
Aprova-se o parecer n.º 409, depois de usar da palavra o Sr. Cancela de Abreu.
Ordem do dia. — Entra em discussão a proposta do empréstimo, usando da palavra o Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães) e Carvalho da Silva.
Na segunda parte é discutido o orçamento, usando da palavra os Srs. Manuel Fragoso e Tôrres Garcia.
Antes de se encerrar a sessão. — Usam da palavra os Srs. Ministro das Colónias (Rodrigues Gaspar), Carlos de Vasconcelos e Carvalho da Silva.
O Sr. Presidente encerra a sessão e marca para, o dia imediato sessões diurna e nocturna.
Abertura da sessão às 15 horas e 18 minutos.
Presentes 53 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 46 Srs.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Correia.
António Ginestal Machado.
António de Paiva Gomes.
António Resende.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
João Baptista da Silva.
João José da Conceição Camoesas.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João Salema.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
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Joaquim Serafim de Barros.
José Carvalho dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mário de Magalhães Infante.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Tomás de Sousa Rosa.
Tomé José de Barros Queiroz.
Ventura Malheiro Reimão.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriques Godinho.
Entraram durante a sessão os Srs.:
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Moura Pinto.
Alberto Xavier.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Lino Neto.
António Mendonça.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Brandão.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Pires do Vale.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Bernado Ferrreira de Matos.
Carlos Cândido Pereira.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Martins de Paiva.
Domingos Leite Pereira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Cruz.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Duarte de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João Estêvão Águas.
João Luís Ricardo.
João Pina de Morais Júnior.
Joaquim Dinis da Fonseca.
José António de Magalhães.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
Juvenal Henrique de Araújo.
Lúcio de Campos Martins.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel de Sousa Coutinho.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Paulo da Costa Menano.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Vasco Borges.
Vergílio Saque.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Não compareceram os Srs.:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Abílio Marques Mourão.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Lelo Portela.
Alberto da Rocha Saraiva.
Álvaro Xavier de Castro.
António Albino Marques de Azevedo.
António Dias.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Artur de Morais Carvalho.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Maldonado Freitas.
Delfim Costa.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Duarte Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José Luís Damas.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
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Sessão de 7 de Março de 1923
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge Sarros Capinha.
Jorge de Vasconcelos Nanes.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Mariano Martins.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo Limpo de Lacerda.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Valentim Guerra.
Vergílio da Conceição Costa.
Pelas 15 horas e 20 minutos, com a presença de 53 Srs. Deputados, declarou o Sr. Presidente aberta a sessão.
Leu-se a acta.
Leu-se o seguinte
Expediente
Ofícios
Do Senado, comunicando ter rejeitado as alterações desta Câmara à proposta que manda passar carta de oficiais pilotos e de oficiais maquinistas a determinados indivíduos.
Para a comissão de marinha.
Do Ministro do Trabalho, acompanhando os orçamentos, daquele Ministério, da Casa Pia e da Provedoria da Assistência Pública.
Para a comissão do Orçamento.
Representação
Dos assistentes do Instituto Superior Técnico, pedindo para que lhes seja aplicada a doutrina do artigo 2.º do decreto n.º 8:488, de 17 de Novembro de 1922.
Para a comissão de finanças.
Telegrama
Dos empregados da Câmara da Feira e da administração do concelho de Campo Maior, pedindo equiparação de vencimentos.
Para a Secretaria.
Admissões
Projecto de lei
Do Sr. João Águas, aplicando a doutrina do decreto de 8 de Julho de 1913 e respectivo regulamento, referentes aos alunos do Colégio Militar, aos alunos externos do mesmo colégio.
Para a comissão de guerra.
Última redacção
Projecto de lei n.º 391
Que mantém a sindicância aos Transportes Marítimos do Estado.
Dispensada a leitura da última redacção.
Remeta-se do Senado.
Antes da ordem do dia
O Sr. Sousa Rosa: — Pela muita consideração que tenho pela Câmara, sou obrigado a explicar o que comigo se passou é que foi aí narrado por um Deputado.
Em primeiro lugar, agradeço ao Sr. Ministro da Guerra as palavras de deferência que teve a meu respeito, manifestando a confiança que me dispensa para o comando que exerço.
Só à minha chegada, ontem, no rápido do Pôrto, onde estava retido por motivo de serviço, é que, por um amigo, soube o que aqui se passara.
Devo dizer que tenho 40 anos de serviço militar, 35 nas fileiras, exercendo comandos há 8 anos, que não são 8 dias, tenho estado sempre arregimentado, sou conhecido na praça como se costuma dizer, não tenho fortuna, nunca roubei nada a ninguém.
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Em 1919 fui chamado pelo Sr. Helder Ribeiro a assumir o comando da 3.ª divisão, sendo-me apresentada uma relação de oficiais para transferências. Continuaram todos na 3.ª divisão, até que, mais tarde, faltando oficiais em outras unidades, foram transferidos.
Eu encontrei roubos em infantaria n.º 18, onde foi feita uma sindicância por Sousa Dias, que deu lugar, a transferências de oficiais, à condenação dum sargento a pena maior, sendo outro condenado a presídio militar com baixa de pôsto e outro a 165 dias de prisão correcional. O tesoureiro tinha perdido 30 contos.
Em artilharia n.º 6, cavalaria n.º 9 e metralhadoras houve vários casos de indisciplina, mas que com toda a justiça foram apreciados, sendo as respectivas sindicâncias feitas por coronéis que são comandantes das unidades.
Há um caso referente a um tenente que se diz ter sido castigado por não ter cumprimentado um capitão. Não é verdade. O homem estava à paisana e não comprimentou o capitão, que estava fardado, mirando-o do alto a baixo, e depois apresentou queixa contra o capitão, faltando a verdade e querendo que o capitão fôsse castigado; isso é que fez com que o tenente fôsse castigado com 5 dias de prisão disciplinar.
Foi para a segunda instância o processo e deu o mesmo resultado; o tenente apelou para o Ministro da Guerra, que não despachou.
É verdade que há oficiais que não podem ir à 3.ª divisão. O alferes Matos Cordeiro é acusado de praticar actos de escroquérie. O tenente Almeida e outros, que são elementos de indisciplina, vão para lá promover desordens e planear revoluções, e eu sei os dias e as noites que passo para assegurar a manutenção da ordem na área da minha divisão. Não podemos estar à mercê de quem pretende promover revoluções.
Apoiados.
Referiu-se também o mesmo Deputado a um outro tenente que foi castigado, e com toda a razão, pois andando de ronda passeava abraçado a um marinheiro e ao cabo da ronda. Foi castigado com 20 dias.
Há um caso picaresco em que entra uma bailarina.
Sr. Presidente: eu tenho um filho que é homem de bem e um militar brioso.
Um dia, meu filho, que estava no quartel de cavalaria n.º 9, pedia-me pelo telefone um automóvel e eu julguei que lhe tivesse sucedido qualquer desastre; fui imediatamente ao campo de corridas onde já êle não estava, vindo a encontrá-lo num terreno junto ao quartel. Estava ali também uma mulher metida numa maca.
O que havia eu de fazer?
Atirar a mulher para a valeta?
Êstes assuntos no Pôrto são discutidos num meio muito restrito, como se fôsse a Praça da Batalha, a Rua de Santa Catarina e a Praça da Liberdade.
Eu soube que havia de receber uma carta de uma emprêsa, queixando-se de que determinado tenente a havia defraudado em 400 e tantos escudos.
Logo que cheguei ao quartel general, mandei chamar o comandante e preguntei-lhe se sabia alguma cousa.
Respondeu-me que não, é então disse-lhe que era conveniente que participasse para o quartel general o facto, antes de receber a comunicação da emprêsa, a fim de êle ficar fora da questão.
Pois, Sr. Presidente, êle nem sabia redigir a participação, e tive eu de a escrever, o que, deu margem a que alguém tirasse uma fotografia do documento, com o fim de me difamar.
Não sei porquê.
Parece-me que expliquei tudo o que se passou.
Com respeito ao homem que proferiu tais palavras, devo dizer que é o denunciante do movimento de 31 de Janeiro...
O Sr. Homem Cristo interrompe o orador com àpartes, estabelecendo-se na Câmara agitação e sussurro que não permitem ouvir as últimas palavras proferidas pelo orador.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Peço a atenção da Câmara.
Eu não ouvi as palavras que V. Ex.ª proferiu, porque o barulho que se fazia na sala não permitia que elas chegassem até mim.
Por consequência não me refiro concretamente a esta ou àquela palavra, porque as não ouvi.
Todavia, se V. Ex.ª proferiu qualquer
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palavra que seja ofensiva da Câmara, peço-lhe o favor de a retirar.
Vozes: — Mas a Câmara não foi agravada.
O Sr. Presidente: — Não se trata de a Câmara ser ou não agravada.
Há palavras que não podem ser aqui proferidas.
Apoiados.
Apelo para o Sr. Sousa Rosa, para que, se pronunciou qualquer palavra ofensiva, a retire.
O Sr. Homem Cristo: — Peço a palavra para explicações.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Carlos de Vasconcelos.
O Sr. Homem Cristo: — Eu pedi a palavra para explicações.
O Sr. Presidente: — Estavam já inscritos dois Srs. Deputados, para explicações.
O Sr. Homem Cristo: — Parece-me que não!...
O Sr. Presidente: — Parece-lhe que não?...
V. Ex.ª não tem o direito de duvidar de mim.
O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Sr. Presidente: ontem tinha pedido a presença do Sr. Ministro das Colónias, para antes de se encerrar a sessão, a fim de chamar a atenção de S. Ex.ª para determinados factos de administração colonial.
S. Ex.ª, que estava presente, retirou-se sem que ao menos se lembrasse de incumbir o Sr. Ministro das Finanças de apresentar ao Deputado, que no exercício do seu mandato lhe queria apresentar factos de interêsse público, o motivo da sua retirada.
Tomei como uma desconsideração feita à minha pessoa e lavrei o meu protesto contra o procedimento do Sr. Ministro das Colónias.
Mas, na minha justa indignação, eu devo confessar que me excedi, e excedi-me, querendo considerar como uma ofensa pessoal, o que indubitavelmente não pode ser considerado senão como uma desconsideração ao Parlamento.
Considero, pois, como não ditas as palavras que aqui proferi, quando disse que, como homem, chamaria S. Ex.ª ao campo em que a minha dignidade ficasse mantida.
Retiro-as porque o levantamento de questões pessoais nesta Câmara só serve para a desprestigiar.
No emtanto, o que fica de pé é o facto, que aqui dentro, não devo encarar senão sôbre o aspecto parlamentar.
Sr. Presidente: eu não ia tratar de assuntos que fossem de tal forma melindrosos que o publico não pudesse dêles tomar conhecimento.
Quando qualquer assunto é melindroso, costumo procurar particularmente o Sr. Ministro das Colónias, e pedir-lhe as devidas providências, o que aliás ainda há pouco tempo aconteceu, como V. Ex.ª sabe.
Sr. Presidente: o Sr. Ferreira da Rocha disse há tempo que o Parlamento não se devia imiscuir na vida colonial, contentando-se a imprimir, por meio de interpelações, etc., uma directriz à acção dos Ministros, fiscalizando-a, nos termos das leis.
Infelizmente a prática tem demonstrado que as interpelações pouco resultado dão, ou nenhum, porque o Sr. Ministro, não se dá por habilitado a responder, e quando qualquer Deputado, no legítimo uso de um direito, pede a comparência do S. Ex.ª, êle retira-se deixando o Parlamento em choque.
Mas não é de extranhar; em cheque estamos e em cheque continuaremos.
Sr. Presidente: eu fui daqueles que na sessão legislativa passada, defenderamos interêsses do funcionalismo, e tive a honra de, em nome do Partido a que pertenci, dar todas as facilidade ao Govêrno para melhorar, com urgência, a situação do funcionalismo.
Tenho, pois, autoridade para hoje protestar, com a maior veemência, contra o procedimento que ontem tiveram centenas de funcionários, vindo para as galerias da Câmara manifestarem-se com os pés e tossindo, querendo exercer uma lamentável coacção contra o poder Legislativo.
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Isso se fez, sem que o Govêrno impedisse essa manifestação, que desprestigiou o Parlamento, tirando-nos autoridade para tratarmos da situação miserável do funcionalismo.
É por isso, Sr. Presidente, que mais razão ainda tenho quando afirmo que estamos em cheque!
Das palavras que acabo de proferir, eu procurei pôr, Sr. Presidente, a máxima sinceridade para que elas bem pudessem constituir o justo desagravo da ofensa que ontem me foi feita, como parlamentar.
Desde que os membros do Poder Executivo patenteiam tam claramente o seu deprêzo pelo Poder Legislativo, nós não temos razão de aqui estar.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Homem Cristo: — Sr. Presidente: a minha frase de há pouco parece-me que não, que tanto susceptibilizou V. Ex.ª, quando é certo que V. Ex.ª ouviu quási com indiferença as infâmias que se pronunciaram contra mim, não teve o propósito de pôr em dúvida nem o carácter nem a rectidão de V. Ex.ª Eu quis com da mostrar apenas a possibilidade de V. Ex.ª se ter equivocado. Parece-me que não, isto é, afigura-se-me que fui eu que pedi a palavra primeiro, antes do Sr. Carlos de Vasconcelos, não tendo, aliás, sido ouvido por V. Ex.ª Que há nisto de extraordinário ou de ofensivo para V. Ex.ª? V. Ex.ª interpretou-o noutro sentido. Mas o que V. Ex.ª não pode negar é que ela também podia ter a interpretação que lhe estou dando, que era, na verdade, a que estava no meu pensamento, e que eu teria desde logo explicado, se V. Ex.ª, como era natural e deveria ter feito, me preguntasse o que eu queria dizer. Mas V. Ex.ª não o fez, irritou-se contra mim, e a Câmara, que não me vê com simpatia, apressou-se a fazer côro com V. Ex.ª Ora começarei por declarar duma maneira terminante, para que não haja ilusões, que nem sou tolo para que não saiba o que hei-de dizer, nem tenho medo de palmatoadas, que na minha idade, já não metem medo a ninguém.
Pôsto isto, devo também declarar que, quando ante-ontem apreciei nesta Câmara algumas das muitas arbitrariedades cometidas no exercício das suas funções pelo comandante da 3.ª divisão do exército, não saiu da minha bôca uma única injúria contra êsse homem, como o demonstra a circunstância de eu ter sido ouvido sem interrupção e sem ser chamado à ordem por V. Ex.ª Limitei-me a analisar os seus actos sôbre factos concretos e documentos, estigmatizando-os com a energia que me impunha o meu dever. E destruiu êle, agora, porventura, as minhas acusações e argumentos? Não. Onde não respondeu com injúrias, tentou atrapalhar, chegando a faltar à verdade redondamente.
Assim, disse que era falso haver sido o tenente Alberto Joaquim Correia castigado com cinco dias de prisão disciplinar por não ter tirado o chapéu, na Rua Trinta e Um de Janeiro, em domingo gordo, a um capitão. Mas V. Ex.ª, Sr. Ministro da Guerra, tem em seu poder o processo, e eu não só peço, mas exijo, que V. Ex.ª o traga à Câmara, para se ver se fui eu que fiz uma acusação falsa, se é êsse homem que não hesita em vir aqui faltar por essa forma à verdade, julgando que se defende. Por mim, torno a dizer, repito, e bem alto, que foi por êsse único motivo que o tenente Correia foi castigado, embora na redacção do castigo se invoque também, — como em parte carregada de polícia boçal -, a circunstância secundária, e resultante do próprio facto, de o tenente Correia ter apresentado a sua queixa fora do prazo legal e sem fundamento. É muito boa, sem fundamento!
Quanto à espionagem do filho do comandante da divisão, eu não vim dizer aqui que êle era pròpriamente o que se chama um espião. O que eu fiz foi ler a carta que êle escreveu ao tenente Alberto Joaquim Correia e tirar-lhe lògicamente as conclusões. Que diz a carta? Vou lê-la novamente. A carta diz:
Exmo. Sr. Alberto Joaquim Correia. — Em resposta à carta do V. Ex.ª tenho a dizer-lhe «que tendo sido», como ajudante do Exmo. General, «encarregado de vários serviços confidenciais, que como a palavra indica não são do molde a poder-se dar dêles informações a alguém, soube aquilo mesmo que V. Ex.ª diz constar-lhe de que eu fui informado». E mesmo
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que assim não fôsse V. Ex.ª não tem o direito de esperar de mim qualquer denúncia ou nomeação de terceiro para tomar responsabilidades, pois é cousa que eu nunca deleguei em ninguém. E isto que lhe posso comunicar. As ordens V. Ex.ª se subscreve, etc.
Ora, se os serviços confidenciais de que o comandante da 3.ª divisão encarregou-o alferes Rosa eram ver com quem conversavam e se reuniam os camaradas do mesmo alferes na guarnição do Pôrto, positivamente êsses serviços eram serviços de espionagem.
Pregunto aos meus maiores inimigos daquele lado da Câmara, que aplaudiram as injúrias do Sr. Sousa Rosa, se, em consciência, há lògicamente outra conclusão a tirar.
E que os serviços de que o comandante da 3.ª divisão encarregou seu próprio filho eram ver com quem conversavam e se reuniam os oficiais da guarnição do Pôrto, não há a menor dúvida. Confessa-o o alferes Rosa.
O tenente Correia pregunta-lhe se efectivamente as suas informações eram que êle, tenente, se reunira na Rua do Almada com elementos outubristas, populares e bolchevistas, ao que êle, alferes, responde sem rebuço: «Sim, senhor».
Está, portanto, a espionagem, por confissão espontânea do próprio alferes Rosa, e, em face de documentos indiscutíveis, comprovada.
Eram ao menos verdadeiras as informações que dela resultaram? Não, eram falsas.
Cometeu-se um acto desonroso, contrário à dignidade da profissão das armas, para vitimar um inocente, com uma vida honesta e altos serviços à sua Pátria. O tenente Correia, seguro da soa Inocência, reclamou os nomes dos indivíduos que tais informações haviam dado ao alferes Sonsa Rosa. Êste, entrincheirando-se com os deveres que impõe o Regulamento disciplinar, no que toca a confidenciais, deveres de que só então se lembrava, havendo-os esquecido quando andou, entre amigos, assoalhando o facto, nega-se a declará-los.
O tenente Correia, em vista disso, pode legitimamente e altivamente um inquérito, insistindo em que o castiguem se porventura forem verdadeiras as acusações que lhe fazem, ou o ilibem em caso contrário.
Êsse inquérito é-lhe negado.
Quem duvida então, quem pode duvidar de que êle, perseguido pelo ódio pessoal do comandante da 3.ª divisão, é vítima duma arbitrariedade? Ódio pessoal, arbitrariedade, que vão até o ponto de se lhe impedir que veja os seus filhos no leito, gravemente enfermos, e a sua sogra depois de morta.
Falou o Sr. Sousa Rosa, naquele seu propósito, que já citei, de embrulhar tudo, num tenente que se embebedava. Mas qual tenente, se não me referi a êsse caso? Não me referi, nem sei de tenente que se embriagasse. Ficou fora das minhas referências mais êsse incidente, se é que existiu, entre os muitos que se têm dado na área da 3.ª divisão militar.
O da bailarina, sim, êsse é que eu tratei. E dá-nos êsse homem por razão suprema do seu escandaloso proceder o facto de ser pai! Não negou que a bailarina tivesse quebrado uma perna no picadeiro de cavalaria n.º 9. Não negou que êle fôsse lá vê-la e que a fizesse transportar na maca do regimento para o hospital. Alegou só, boçalmente, que não havia de deitar a mulher a uma valeta e que era pai.
E aqui temos um general comandante duma divisão que não hesita em confessar que perdoa todos os atentados e todos os crimes aos oficiais seus subordinados quando são seus filhos, e que é para os outros, que não são seus filhos, não só implacável, mas até da mais revoltante arbitrariedade! E continua êste homem a comandar! Êle achou a mulher com a perna partida, e, para não a deitar a uma valeta, fê-la transportar, na maca do regimento, ao hospital. Mas que estava fazendo a mulher no quartel? Mas quem a deixou lá entrar. Mas como partiu ela a perna?
Que a mulher era bailarina não se contesta. Ia então dar lições de dança aos oficiais? Ia fazer piruetas diante do sargentos, cabos e soldados? E foi a dar lições de dança e a fazer piruetas que quebrou a perna?
O quartel tem a sua guarda do polícia, tem o seu oficial de dia, tem o seu pessoal de serviço, que é numeroso. Quem deixou lá entrar essa mulher? Quem a
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deixou dar lições de dança, fazer piruetas ou montar nos cavalos do Estado? Quem é o responsável? Isto caiu na orgia mais escandalosa.
Quanto à denúncia do 31 de Janeiro — êsse homem acusou-me de denunciar o 31 de Janeiro — isso só me faz rir, afinal. Como se neste país houvesse necessidade de denunciar revoluções, conhecidas por todos os Govêrnos uns poucos de dias antes delas rebentarem. Quem as denuncia são os próprios conspiradores com a sua insensatez e a sua leviandade.
V. Ex.ª, Sr. Presidente, que andou metido no 31 de Janeiro, e que é um velho republicano, sabe como as cousas se passaram. V. Ex.ª não é, como muitos dos que estão dentro desta sala, um adventício da última hora. Desses que vieram para a República para comer, emquanto eu passei parte da minha vida de terra em terra e metido nas cadeias.
Fui denunciante do 31 de Janeiro e continuei, com Teofilo Braga, Manuel de Arriaga, Jacinto Nunes, Bernardino Pinheiro e Azevedo e Silva a fazer parte do directório!
E a merecer a confiança de todas as figuras eminentes do partido republicano, que depois disto me deram provas de maior consideração!
Ainda êsse homem, que me acusa, andava de calças curtas, já eu era perseguido como republicano. Verdade seja que os monárquicos nunca me fizeram o que êle e o Ministro da Guerra fizeram ao tenente Correia e outros oficiais defensores e sustentáculos das instituições que nos regem.
Em 1881, quando êsse homem estava longe de, sequer, pensar em Republica, fundava eu em Aveiro um centro republicano. O governador civil do distrito, sem a tirania dêstes republicanos adventícios da última hora, não relatou ao Govêrno toda a verdade, limitando-se a dizer que, tendo eu influência sôbre os elementos republicanos de Aveiro, era de boa prudência fazer-me sair dali, onde estava com licença. O Ministro da Guerra assim fez. Não fiquei, porém, impedido de voltar pouco depois a gozar novas licenças naquela cidade.
Em 1888, quando a maior parte dos republicanos de agora ou não eram nada ca mamavam na teta da monarquia, houve em Aveiro uma grave questão, conhecida pela questão das irmãs da caridade, que teve oco, largo eco, em todo o País. Dum lado estavam os reacionários com a família Barbosa de Magalhães, do outro lado estava eu com o elemento liberal e os republicanos. Porque é uma cousa interessante que ali, como em muitas outras partes, os republicanos andaram numa luta perpétua com os especuladores que dão agora as cartas na República.
Nós, os velhos republicanos, é que passámos para êles a ser maus republicanos, e elos, os comedores da monarquia, é que passaram a ser a síntese e o símbolo da República.
Houve uma eleição, e, na véspera, eu, considerado seu elemento decisivo, fui outra vez mandado sair de Aveiro, onde estava, de novo, com licença.
Corrido o escrutínio, a família Barbosa de Magalhães foi derrotada em toda a linha. Tamanha era contra ela a indignação pública que o avô do actual Sr. Barbosa de Magalhães, que era o governador civil, só no meio de 2 esquadrões de cavalaria, pôde recolher a sua casa, do Govêrno Civil. Emquanto o pai do Sr. Barbosa de Magalhães, para não ser morto, e em quanto lhe não chegava, também a êle o auxílio da fôrça pública, se barricava numa sacristia.
Proibiram-me, porém, os govêrnos monárquicos, a mim, republicano, que voltasse a gozar novas licenças em Aveiro? Não.
Essa glória estava reservada para a República, para esta República, que, sancionando as últimas arbitrariedades e abusos do general Sousa Rosa, até proíbe que oficiais republicaníssimos, como peito coberto de condecorações ganhas no campo da batalha, cheios de serviços à Pátria e ao regime, visitem seus filhos enfermos e seus pais moribundos.
De resto, e voltando ainda à denúncia do 31 de Janeiro, devo dizer que não estou expondo isto para justificar ou ganhar títulos de. republicano, porque, bem alto o declaro, tanto me importa que me chamem monárquico como que chamem republicano. A uns e outros não devo senão perseguições. Primeiro perseguiram-mo os monárquicos, fazendo-me andar de terra em terra e pela cadeia, emquanto êsse Sousa Rosa estava comodamente
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anichado em Lisboa. Êle e outros, que são agora os mandões da República. Depois perseguiram-me, mais ferozmente, os que, tendo mamado como monárquicos na teta da monarquia, passaram a mamar como republicanos na teta da República.
Não é debaixo para cima que eu olho para êstes senhores, mas de cima para baixo, com superioridade, sem se recear em campo nenhum.
Tenho as minhas mãos limpas. Há quarenta e três anos que milito na imprensa e há perto de quarenta que sustento um combate cerrado, sozinho, um contra todos, contra toda a casta de especuladores. Sem que ninguém me possa acusar dum acto de chantage, de sujar no interêsse vil as minhas mãos limpas. Ao contrário, pus sempre acima dos meus interêsses e dos interêsses das facções os altos è superiores interêsses do País. De tal forma que se eu não sou abertamente contra a República, é porque não vejo melhor saída na monarquia. As formas de Govêrno são para mim absolutamente secundárias. Sempre o disse. Os povos são felizes com todas as instituições. Com todas são felizes e com todas são infelizes, porque a felicidade ou infelicidade das nações não depende das formas de Govêrno, mas de circunstâncias várias, e em especial do grau maior ou menor, mais perfeito ou menos perfeito da educação pública.
O País, também sempre o disse, não estava preparado para a República, porque a propaganda republicana antes e depois de 1910 foi uma propaganda dissolvente e jamais uma propaganda educativa.
Desse modo a República tornou-se uma desgraça nacional, de efeitos ruinosos, de efeitos negativos.
Não apoiados.
E se eu não estou daquele lado da Câmara (apontando para a direita) não julguem que é por me sentir glorioso e honrado entre os defensores do regime, mas porque não vejo melhores garantias entre os monárquicos, tam incapazes e corruptos como os republicanos. É uma crise nacional que atravessamos e não uma crise de regimes.
Vou concluir.
Disse o comandante da 3.ª divisão que seu filho me pediria rigorosas contas. Não tenho medo nenhum do seu filho. Fique-o sabendo. Não tenho medo nenhum do seu filho!
Mas contas de que?
Pois chega a tanto a audácia desta gente?
Contas a um Deputado porque tirou conclusões lógicas das próprias palavras do tal filho?
E tendo dito que a culpa, ainda assim, não era do filho, mas do pai, seu comandante, e sôbre quem pesam as responsabilidades do comando?
Isto chegou a uma vergonha extrema!
Pois que venha o filho, mas que o pai se saiba, ao menos, de futuro, defender, e o Ministro da Guerra, cumprida a sua obrigação, proceda contra êle.
Tenho dito.
O Sr. Ministro da Guerra (Fernando Freiria): — Declaro a V. Ex.ª e à Câmara, em resposta às considerações do Sr. Carlos de Vasconcelos, que o Sr. Ministro das Colónias, meu ilustre colega, e apesar de não ter assistido a essa sessão, e não ter conversado com S. Ex.ª, não continuou na Câmara por motivo urgente, e não por menos consideração pelo Sr. Deputado, não tendo podido assim dispensar a S. Ex.ª a atenção devida aos representantes do Poder Legislativo.
Da parte da Câmara, não pode haver nada que a melindre, porque nem na sua intenção poderia existir o mínimo desprimor ou melindre para com S. Ex.ª
Apesar de o meu colega, que muito me honra de ter ao meu lado no Ministério, nada me ter dito, entendo, dever pronunciar estas palavras.
Aproveito a ocasião de estar com a palavra, para mandar para a Mesa uma proposta para a qual peço a urgência.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: li num jornal que ontem, depois de ter vindo ao Parlamento a comissão de funcionários, V. Ex.ª havia conferenciado com os representantes de todos os lados da Câmara, acêrca da reclamação dos referidos funcionários, para se resolver a atitude a tomar quanto a essa reclamação.
Como V. Ex.ª sabe, e fazendo justiça
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à lealdade que caracteriza V. Ex.ª, devo afirmar que nenhuma conferência houve em que tomasse parte qualquer representante dêste lado da Câmara.
Não temos, portanto, responsabilidade nenhuma, absolutamente nenhuma na, atitude tomada acêrca das reclamações do funcionalismo.
Apoiados.
Só, quando da proposta apresentada pelo Sr. Lourenço Correia Gomes, afirmámos, e afirmamos hoje ainda, que ao Govêrno compete apreciar essa questão, porque é o Govêrno que tem na sua mão os elementos precisos para que à questão possa ser resolvida.
Isto dissemos então, e dizemos hoje.
Foi dado o prazo de 15 dias para á comissão apresentar o seu parecer, e ainda o não apresentou.
Não é nossa á responsabilidade de qualquer atitude que a Câmara possa vir à tomar sôbre êste assunto.
Era esta declaração que tinha a fazer à Câmara acêrca da noticia dos jornais.
A minoria monárquica não tem responsabilidades da atitude que possa vir a tomar-se sôbre esta questão.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Conferenciei apenas com os leaders dos Partidos que têm representação na comissão de finanças.
Não convidei todos os lados da Câmara a uma conferência.
O Sr. Hermano de Medeiros deseja falar, em negócio urgente, dos acidentes da cidade de Lisboa, que ocasionaram mortes e casos graves.
É concedida a autorização.
O Sr. Manuel Ribeiro: — Não é com prejuízo da ordem do dia.
O Sr. Presidente: — Sem prejuízo da ordem do dia.
O Sr. Hermano de Medeiros: — Desde muito tempo que Lisboa está infestada de uma espécie de veículos que abusam extraordinàriamente do excesso das grandes velocidades, ocasionando isso desastres e muitas vezes mortes nas ruas de Lisboa.
Sr. Presidente: a semana passada, um automóvel do Estado matou na Rua do Ouro, por excesso de velocidade, um comerciante da nossa praça e uma pobre senhora que era o amparo de sua família, tendo a noite passada sido atropelado também na Avenida um polícia que estava no desempenho dos seus deveres.
Estes casos, Sr. Presidente, estão-se dando quási todos os dias em Lisboa, e contra êles protesto, visto que temos obrigação de zelar pela vida do cidadão.
Espero pois que o Govêrno tome as devidas providências, como o caso requere, visto que êste estado de cousas não pode continuar assim.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Instrução (João Camoesas): — Sr. Presidente: ouvi com a máxima atenção as considerações feitas pela ilustre Sr. Hermano de Medeiros, e transmiti-las hei ao Sr. Presidente do Ministério, que é igualmente Ministro do Interior, por onde correm os serviços de segurança pública.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: — Faltam apenas cinco minutos para se entrar na ordem do dia; porém, se a Câmara estivesse de acôrdo, poderia entrar em discussão o parecer n.º 409, que tem apenas dois artigos.
O Sr. Presidente: — Visto, a Câmara estar de acôrdo, vai ler-se o parecer n.º 409, para entrar em discussão.
Foi lido e seguidamente aprovado na generalidade senti discussão.
É o seguinte:
Parecer n.º 409
Senhores Deputados. — A vossa comissão de comércio e indústria, tendo feito o exame e estudo dás reclamações da Associação Comercial do Pôrto, do Centro Comercial do Pôrto e da Associação Comercial de Lojistas, de Lisboa, que representaram no Sentido de as mercadorias de origem alemã, em trânsito ou armazenadas nas alfândegas à data da caducidade do acôrdo comercial com a Alemanha, deverem ser despachadas ao abrigo do regime alfandegário vigente durante aquele acôrdo, entende que tal pedido deve merecer a atenção da Câmara,
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afigurando-se-lhe justo e de elementar justificação.
Pelo que resolve apresentar a vossa esclarecida atenção o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º As mercadorias de procedência alemã que em 6 de Dezembro de 1922 se encontravam armazenadas nas alfândegas, e as que vinham em trânsito, ficam sujeitas ao regime que vigorou durante o acôrdo comercial com a Alemanha que terminou naquela data.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das sessões da comissão de comércio e industria, 6 de Fevereiro de 1923. — Anibal Lúcio de Azevedo — José Domingos dos Santos — F. G. Velhinho Correia — António Fonseca (com declarações) — Carlos Pereira, relator.
Senhores Deputados. — A vossa comissão de finanças, tendo examinado o parecer n.º 409, da vossa comissão de comércio e indústria, sôbre as reclamações que lhe foram presentes, nada tem a opor.
Sala das sessões da comissão de finanças, 7 de Fevereiro de 1923. — Tomé de Barros Queiroz — F. G. Velhinho Correia. — Cunha Leal — Mariano Martins — Aníbal Lúcio de Azevedo — Lourenço Correia Gomes — Joaquim Ribeiro (vencido) — Carlos Pereira, relator.
O Sr. Presidente: — Vai ler se, para entrar em discussão, o artigo 1.º
Foi lido.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: parece-me que podemos dar o nosso voto ao parecer em discussão, tanto mais que êle tem por fim regularizar a situação das mercadorias alemãs, e o assunto já tivesse sido reclamado pela Associação Comercial.
Aproveito, Sr. Presidente, á ocasião para dizer a V. Ex.ª á que deve haver um ano que pedi, pelo Ministério das Finanças, cópia duns documentos que dizem respeito ao assunto, mas que até hoje me não foram enviados.
Como não estou disposto, Sr. Presidente, a reclamar quási todos os dias por escrito, insto com V. Ex.ª no sentido de que êsses documentos me sejam enviados, e termino declarando que dou o meu voto ao projecto em discussão.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que aprovam o artigo 1.º queiram levantar-se.
Foi aprovado, sendo em seguida aprovado sem discussão o artigo 2.º
O Sr. Nunes Loureiro: — Peço a V. Ex.ª o obséquio de consultar a Câmara sôbre se dispensa a leitura da última redacção.
Foi aprovado.
O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Peço a V. Ex.ª o obséquio de consultar a Câmara sôbre se permite que entre em discussão antes da ordem do dia; e sem prejuízo dos pareceres que estão dados para antes da ordem e sem prejuízo também dos oradores inscritos, o parecer n.º 205.
Foi aprovado.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que aprovam a acta queiram levantar-se:
Foi aprovada.
ORDEM DO DIA
O Sr. Presidente: — Vai entrar-se na ordem do dia. Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — Sr. Presidente: antes de entrar pròpriamente nas considerações que desejo fazer sôbre a proposta de lei que autoriza o Govêrno a realizar um empréstimo, devo dizer que, se ontem não pedi a palavra para responder ao ilustre Deputado e meu particular amigo o Sr. Barros Queiroz, foi de acôrdo com êle.
Efectivamente não falei ontem, como era meu dever, por me encontrar um puco fatigado; porém não deixei de ter a atenção que devia para com S. Ex.ª, tanto mais quanto é certo que tenho pelo Sr. Barros Queiroz muita consideração, pelas suas qualidades, pelo seu carácter e pela sua inteligência.
Sr. Presidente: se bem que e Sr. relator já tivesse respondido, em parte, às considerações feitas pelo ilustre Deputa-
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do, Sr. Barros Queiroz, eu vou, no emtanto, pela muita consideração que tenho por S. Ex.ª, procurar responder a todos os pontos a que S. Ex.ª se referiu.
Devo dizer que estou absolutamente de acôrdo com algumas considerações feitas pelo Sr. Barros Queiroz, muito principalmente na parte que diz respeito à situação financeira do Estado.
Um dos pontos a que S. Ex.ª se referiu foi aos perigos que podem resultar da circulação fiduciária.
S. Ex.ª combateu enèrgicamente a política que se tem feito nesse sentido, e eu, Sr. Presidente, não posso deixar de dizer que nesse ponto também estou inteiramente de acôrdo com S. Ex.ª
Se assim não fôra, eu não traria esta proposta ao Parlamento.
Também não posso deixar de estar de acôrdo com o ilustre Deputado Sr. Barros Queiroz, quando S. Ex.ª descurou a administração do Estado, por não ter em seguida à guerra, tratado de empréstimos e de impostos. Foi, de facto, um êrro não se ter lançado mão dêsses meios para ocorrer às despesas do Estado, mas V. Ex.ª sabe a relutância que havia em toda a parte do país para se poder levar a efeito um empréstimo interno, visto que os empréstimos externos ainda mais difíceis se tornavam, havendo só o recurso ao imposto.
Disse o Sr. Barros Queiroz que estava excedida a capacidade tributária...
O Sr. Barros Queiroz: — Não foi bem assim. O país pode pagar mais, mas o imposto de transacções é que não rende o que V. Ex.ª imagina.
O Orador: — Então não tomei bem os apontamentos.
Vejo que estamos de acôrdo, o que sucede sempre com homens de bem e de boas intenções, que pensam bem servir o país e melhorar as condições da administração pública.
Sendo absolutamente contrário ao alargamento da circulação fiduciária, mas não podendo de forma alguma resolver dum momento para outro a situação financeira do País, eu não podia escolher outro caminho que não fôsse o empréstimo.
O Sr. Cancela de Abreu achou muito extraordinário que o Ministro das Finanças viesse dizer no relatório que antecede a sua proposta orçamental que para a política da inflação ninguém podia inclinar-se dando assim a entender que ela era uma política antipatriótica. Eu não tenho, porém, essa opinião. Outros países maiores do que o nosso o têm seguido e entre êles a Alemanha que tem procurado por todas as formas desvalorizar a sua moeda, e certamente ninguém, deixará de reconhecer que nesse país existem estadistas de incontestável valor e patriotismo.
Não há dúvida de que a política de deflação seria a mais aconselhável, mas para a seguir seria necessário fazer entrar no País grandes quantidades de ouro e todos sentem as enormes, quási invencíveis, dificuldades que neste momento obstam à realização dum empréstimo externo em ouro.
Sr. Presidente: entrando pròpriamente na análise das considerações feitas pelo ilustre Deputado Sr. Barros Queiroz, devo lembrar que a primeira questão levantada por S. Ex.ª dizia respeito à emenda por mim apresentada à minha própria proposta. Ora se eu apresentei essa emenda foi simplesmente, para pôr termo à discussão que no seio da comissão se havia levantado em face da possibilidade de os encargos que adviriam do empréstimo atingirem números inaceitáveis.
Rebati e continuo a rebater êsse modo de ver por estar convencido de que um tal empréstimo só é possível desde que o Parlamento confie absolutamente no homem que ocupar esta cadeira, partindo do princípio de que ninguém neste lugar seria capaz de aceitar exigências que ultrapassassem os limites do que é razoável e legítimo.
Apresentou depois o Sr. Barros Queiroz os perigos que resultam dêste empréstimo e voltou, por isso, à defesa da sua idea, a idea de que é preferível um empréstimo em ouro.
Sr. Presidente: devo dizer a V. Ex.ª que acho hoje muito difícil êsse empréstimo em ouro, a não ser com um juro muito elevado.
Mas o que é certo é que êste empréstimo em discussão é um dos primeiros passos para uma melhoria do câmbio.
Têm-me chamado optimista, mas eu não desesperei da situação do País porque a
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nossa nacionalidade tem atravessado graves crises e tem sempre ressurgido, é, só isso se der, certamente o empréstimo trará todas as vantagens.
Não é meu intuito um fim reservado, todos o sabem; o que eu pretendo é provar porque disso estou convencido, que êste empréstimo é aquele que no momento mais convém.
A sua execução não é impossível, desde que haja alguma boa vontade e confiança.
Creio que esta proposta seria mais útil aprovada tal como eu a trouxe à Câmara.
Sabe V. Ex.ª que logo na primeira sessão em que apresentei esta proposta disse que os encargos podem ser de 7 3/4, e ainda hoje tenho a mesma opinião.
Entretanto, se tiver a triste sorte de me manter muito tempo neste lugar, ainda empregarei todos os esfôrços para que êsses encargos não excedam 7 1/2, o que é possível dentro dos limites estabelecidos pela proposta.
Sr. Presidente: falou S. Ex.ª o Sr. Barros Queiroz em realizar êste empréstimo em ouro, e a um câmbio médio do último trimestre. Eu discordo desta opinião, porque assim ficaria o juro sempre tam elevado como era na ocasião da emissão, e seriam muito maiores os encargos do Estado. Continuo ainda hoje a pensar, nesta fé em que estou, de que a nossa situação financeira há de melhorar, de que o modo de ver que apresento ainda é o melhor.
Mas S. Ex.ª criticou também a proposta do empréstimo por causa da especulação a que ela pode dar lugar. Efectivamente, essa especulação pode destruir os efeitos benéficos da proposta, mas lá estamos outra vez no mesmo ponto: é que não há confiança no Ministro; ou parte-se do princípio de que quem aqui está não olha com o devido cuidado para os interêsses do País.
Eu marco realmente o câmbio do dia da emissão — e é isso que no entender de muitos pode dar lugar a especulação — mas êsse dia não será escolhido pelos especuladores, mas pelo Govêrno.
De resto, êsse dia será o da fixação dos prospectos para a emissão; e com o empréstimo ouro, como aconselham o Sr. Barros Queiroz e outras pessoas, — e se fôsse externo eu estaria de acôrdo com S. Ex.ª — parece-me que os inconvenientes seriam os mesmos, não podemos evitar de forma nenhuma a especulação, e então talvez com mais intensidade, porque permitiriam lucros maiores.
Sr. Presidente: devo dizer que estou de acôrdo com o meu antagonista no ponto em que S. Ex.ª diz que esta operação tem de ser feita com muita prudência e cuidado.
A minha concordância com êsse modo de ver já eu a salientei aqui várias vezes; é preciso realmente haver o máximo cuia dado e prudência, e eu farei por ter ambas as cousas.
Não terei inteligência suficiente para isso, mas quanto a cuidado e zêlo em servir a República posso ser igualado, mas não excedido.
Apoiados.
Referiu-se depois o Sr. Barros Queiroz ao artigo 4.º da proposta, que é o que autoriza a emissão: e realização dos títulos que caucionam os empréstimos do Banco de Portugal, e mostrou-se S. Ex.ª muito alarmado com esta autorização, servindo-se destas palavras: «que assim o Govêrno ficava com uma autorização que o Parlamento não podia permitir, porque era ruinosa, visto que o Govêrno quási podia vender ao desbarato todos os títulos».
Efectivamente, o que eu vejo é que S. Ex.ª não está animado do mesmo espírito de fé e confiança que eu estou.
S. Ex.ª, embora não o queira dizer, está muito pessimista, e assim é que é levado a admitir que podia estar aqui um cidadão tam mau que pensasse em vender por todo o preço, para se livrar de dificuldades, aqueles títulos.
Em quando digo pessimista, não quero de modo nenhum dizer derrotista.
O pessimismo é filho do nosso temperamento; por mais que queiramos não podemos todos ver as cousas de igual maneira.
Às vezes pessoas animadas dos mesmos intuitos de bem servir o país vêm as questões de modo diversos.
Ainda a propósito do artigo 4.º, parece-me que S. Ex.ª falou nuns artigos publicados no jornal O Mundo, cuja autoria S. Ex.ª me atribuiu.
Devo dizer que não são da minha autoria êsses artigos; teria muito orgulho
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em os escrever, porque estão bem feitos, mas a minha vida é tam apensionada que não me dá tempo para escrever em jornais.
Falou ainda S. Ex.ª, a propósito dêste parecer, do fundo de cambiais.
Sabe S. Ex.ª que êsse fundo de cambiais foi estabelecido em virtude de uma lei que determinou que revertessem para o Estado 50 por cento do valor das nossas exportações.
Essa lei foi da iniciativa do Sr. Portugal Durão, antigo Ministro idas Finanças e nosso colega ilustre; mas reconheceu-se que a essa lei alguma cousa faltava.
Referiu-se também S. Ex.ª à proposta de emenda da alínea c) apresentada no parecer.
Também devo dizer que todas estas emendas que o Sr. relator introduziu na proposta de acôrdo comigo são ùnicamente para facilitar uma conclusão, porque eu continuo a ser mais partidário da proposta tal qual a apresentei, excepto quanto à data fixada, que pode ser ou não a da proposta, mas qualquer outra.
Mas questões há que, por serem contratuais, não basta que sejam apenas apoiadas por uma das partes, tem que o ser por ambas as partes.
Entretanto, se a Câmara entender que não é conveniente admitir esta emenda, poderá deixar ao Ministro a liberdade de procurar encontrar uma melhor cláusula que garanta os interêsses do Estado.
Também S. Ex.ª teve ocasião de falar no fundo de amortização.
Ainda que S. Ex.ª não precise do meu testemunho, eu não quero deixar de corroborar as suas palavras.
Embora o contrato com o Banco traga a minha assinatura, a minha intervenção nele foi muito pequena, porque quando tomei conta da pasta encontrei já os trabalhos necessários quási concluídos, e êles eram da autoria do Sr. Barros Queiroz.
Referiu-se depois S. Ex.ª ao artigo 9.º da proposta, que é o que autoriza o Govêrno a emitir bons de moeda.
Mostrou-se S. Ex.ª alarmado, dizendo que parecia ser intenção do Govêrno só fazer uma nova circulação de notas em Portugal, ficando assim a haver duas circulações.
Permita-me V. Ex.ª que lhe diga que não sendo exageradas essas circulações, e é o caso, não vejo perigo de maior nisso.
Na Itália, por exemplo, quando lá estive, existiam essas duas circulações, e nunca vi que lá houvesse a menor hesitação por parte de alguém, em receber, quer notas do Banco emissor, quer cédulas do Estado.
E sabe-se que lá essas cédulas chegam até a quantia de 10 liras e circulam em grande quantidade.
Mas não é o caso: o Govêrno não tem idea de fazer uma emissão de notas, mas apenas quere fazer uma emissão duma moeda especial.
Talvez não agrade a palavra bons, mas foi exactamente êsse o nome que se lhe deu em França.
Refiro-me à moeda de níquel, feita com uma liga de cobre, que em França representa 4/2, 1 e 2 francos, moeda esta que foi muito bem recebida pelo público.
O que eu posso garantir a V. Ex.ª é que logo que seja aprovada essa proposta se poderá começar a pagar a cunhagem dessa moeda, visto que já se tem procedido a vários trabalhos e deligências nesse sentido.
O próprio director da Casa da Moeda, Sr. Lúcio de Azevedo, já me disse que logo que fôr votada essa proposta abrirá concurso para a cunhagem, o que não levará muito tempo, podendo em seguida, começar a cunhagem da moeda.
O que se não pode fazer, porém, é tirar da circulação, as notas de $50 e 1$, por isso que elas são necessárias para os trocos.
Relativamente ao assunto que diz respeito ao Banco de Portugal, e que se prende com o artigo 9.º da proposta, sou de opinião que não há nada que faculte ao Banco de Portugal o direito que êle julga possuir.
O Banco de Portugal só pode emitir papel-moeda, estando eu, portanto, neste ponto, inteiramente de acôrdo com as considerações feitas pelo ilustre Deputado o Sr. Barros Queiroz.
Parece-me ter respondido às considerações feitas pelo Sr. Barros Queiroz, não querendo, todavia, terminar sem agradecer à comissão de finanças, e em especial ao seu presidente, a forma carinhosa como me trataram quando lá fui.
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Devo ainda dizer que não encontrei da parte da comissão má vontade de qualquer espécie, mas somente critérios divergentes, que tenho a certeza são tam bons como o meu, porque todos desejam o melhor possível servir o país.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: o Sr. Ministro das Finanças, ao iniciar o seu discurso, começou por declarar que ia responder ao seu querido amigo pessoal Sr. Barros Queiroz.
Razão tinha S. Ex.ª para assim dizer.
O Sr. Barros Queiroz, que é uma pessoa especializada em assuntos financeiros, ao discutir esta série de propostas, que representam o parecer n.º 424, tratou-as com um carinho inexcedível.
O Sr. Barros Queiroz: — Quem se tratou com carinho foi o Ministro.
O Orador: — É que, Sr. Presidente, as pessoas bem intencionadas, como o Sr. Barros Queiroz e o Sr. Ministro das Finanças — a quem presto neste momento as homenagens da minha muita consideração pessoal — levam a sua paixão política até o ponto de se deixarem cegar pela dêles a dum regime.
Sr. Presidente: estamos a discutir uma sério de autorizações ao Govêrno. Para quê?
Para reformar os contratos com o Banco de Portugal, por forma a que êle possa substituir as inscrições que estão a caucionar os empréstimos do Banco, por um novo perigo, que é a emissão sucessiva de títulos dêste empréstimo, sem um limite marcado.
Estamos a discutir um empréstimo, ou seja uma operação de crédito, que é mais uma operação de descrédito dadas as condições em que é feito.
Tenho ouvido dizer ao Sr. Barros Queiroz e ao Sr. Ministro das Finanças que a política financeira seguida durante a guerra foi verdadeiramente desastrada, relativamente aos alargamentos excessivos da circulação fiduciária.
Têm V. Ex.ªs razão, não há dúvida. Mas ainda hoje o Sr. Ministro das Finanças veio confessar que se não lançaram mão dum empréstimo externo foi porque era impossível, e porque o empréstimo interno era condição indispensável para evitar o aumento da circulação fiduciária.
Isto mostra a péssima administração do Estado.
Que prova mais irrefutável do descrédito da República que esta de se fazer da circulação fiduciária, do seu sucessivo alargamento, a fonte principal dos rendimentos do Estado?
Diz-se que êste empréstimo vai fazer recolher parte das notas em circulação. Ora o Sr. Ministro das Finanças foi mais verdadeiro do que o relator.
Porque é que se lança o empréstimo?
Para cobrir uma parte do deficit da gerência presente, como quási confessou o Sr. relator. S. Ex.ª é o próprio que diz que o empréstimo não chega para saldar o deficit. Ora isto é apenas para lançar poeira nos olhos do país.
Não pode um empréstimo melhorar a situação cambial sem que se faça entrar ouro no país, sem deminuir a circulação fiduciária.
Então para que serve isto?
Se não é um benefício, o que vem a ser?
É um aumento dos encargos do Estado.
Então o Sr. Barros Queiroz, por quem tenho a maior consideração, esqueceu tudo isto?
Esqueceu que êste empréstimo encobre um extraordinário perigo para o país?
Não viu S. Ex.ª que dele pode resultar a conversão da dívida flutuante de 6 por cento a 14 ou 15 por cento?
São estas as medidas de salvação pública que se anunciam?
Mais ainda: êste empréstimo vai desvalorizar todos os títulos particulares. Êste empréstimo é um imposto lançado sôbre as fortunas particulares.
E para que é isto? Para se continuar na voragem criminosa em que temos vivido.
Êste empréstimo vem mostrar que os homens da República com medo de se queimarem em um maior alargamento fiduciário, lançam mão de todos os recursos.
Querem viver mais algum tempo, embora para o conseguirem, prejudiquem o futuro do país.
Sr. Presidente: o Sr. Barros Queiroz no seu discurso, referindo-se à substituição das inscrições que caucionam a emissão do Banco, por títulos dêste emprésti-
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mo, disse que era bom que tal se fizesse, para desaparecerem essas inscrições que são o documento comprovativo de passadas bancarrotas. Mas a verdade é que têm sido aproveitadas pela República, e só depois de uma bancarrota, não declarada oficialmente, mas reconhecida por todos e declarada aqui com toda a hombridade pelo Sr. Portugal Durão, não havendo quem compre êsses títulos devido à sua desvalorização, é que se lembram de fazer à substituição.
Êsses títulos tinham a nódoa duma bancarrota, que os desvalorizou em 30 por cento. Num título de um conto, passou a ser de 21$ o juro que era de 30$.
Por isto era bom, na opinião do Sr. Barros Queiroz, substituir êsses titulos.
O quê será então uma bancarrota, embota não declarada oficialmente, que reduziu- de 21$ para $70 o valor dos juros dêsses títulos?
Isto é que é uma bancarrota que envergonha.
Nós vimos que, ao discutir-se o Orçamento, fica deserta a Câmara, porque os Srs. Deputados não se interessam pelo mais alto diploma do País.
Sr. Presidente: apresentado o Orçamento dêste ano pelo Sr. Ministro das Finanças, arranjando na melhor das intenções, eu sei, um deficit para que o País não possa ver a situação aflitiva em que se encontra, S. Ex.ª vem então, optimista, dizer que precisamos de determinadas medidas para ocorrer à situação. Até agora temo-nos servido da circulação fiduciária, da dívida flutuante e dos Impostos para ocorrer dó alguma maneira ir remendando esta situação pavorosa em que o País vai a desfazer-se, já não obriga, porém nem a dívida flutuante, nem os impostos, nem à circulação fiduciária se então, Sr. Presidente, o que é que se vem dizer?
Diz-se que é preciso recorrer a empréstimos pára saldar uma pequena parte dos deficits, para procurar remediar uma situação em que o País já não vive, mas só arrasta.
E para isso o que se faz?
Vem apresentar-se um projecto de empréstimo para saldar parte do deficit, empréstimo que não remedeia do maneira alguma o acabamento da circulação fiduciária, que não faz recolher uma só das notas em circulação, empréstimo que simplesmente vem aumentar os encargos do Estado, tornando-se ainda mais insustentável a situação do País aumentando-o naquilo que representam os encargos próprios dêsse empréstimo.
Sr. Presidente, não conheço nada que mais defina a situação do perdulário, chegando ao máximo das suas extravagâncias, das suas impensadas e loucas despesas, lançando mão de todos os processos em que até não falta a autorização para vender as suas pratas, como os fidalgos arrumados.
Sr. Velhinho Correia: V. Ex.ª ri-se da situação, pois eu não me rio.
Sr. Presidente: examinando os documentos e os números que acabo de citar a V. Ex.ª e à Câmara vejo que os impostos têm aumentado duma maneira espantosa, têm aumentado por forma a esgotar-se por completo a capacidade tributária do País.
Onde quer o Sr. Ministro das Finanças e o Parlamento, se votar esta monstruosidade, êste crime extraordinário, não querendo, aliás, com isto magoar quem o propõe, porque sei ter sido na melhor das intenções, mas, cego pela sua paixão política, onde quer o Parlamento, repito ir buscar maiores receitas para ocorrer â aumentos de encargos, se o País já não pode viver com os que tem?
É o próprio Sr. Ministro das Finanças quem no seu relatório diz que é preciso hão recorrer mais demasiadamente ao empréstimo porque êle vem pesar demasiadamente no Orçamento, podendo criar-se uma situação ainda pior que a que atravessamos. Isto é evidente; não oferece a mais leve contestação.
Sr. Presidente: urge primeiro pára poder salvar êste País diminuir os suas despesas, equilibrar os receitas com as despesas.
O Sr. Presidente: — Como são horas de se passar à segunda parte da ordem do dia, pregunto a V. Ex.ª se deseja terminar o seu discurso ou ficar com a palavra reservada.
O Orador: — Peço a V. Ex.ª que me reserve a palavra para a próxima sessão.
O orador não reviu.
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O Sr. Presidente: — Fica V. Ex.ª com a palavra reservada.
Vai passar-se à segunda parte da ordem do dia.
Tem a palavra o Sr. Manuel Fragoso.
O Sr. Manuel Fragoso: — Sr. Presidente: nos precisos termos do Regimento começo por enviar para a Mesa a seguinte moção de ordem:
Moções
A Câmara, verificando que a proposta orçamental em discussão está elaborada segundo os moldes usuais, que são, de resto, os previstos na legislação de contabilidade pública, actualmente em vigor;
Atendendo a que na mesma proposta se contêm os esclarecimentos indispensáveis para a sua apreciação;
Considerando que a circunstância de as dotações dos chamados serviços autónomos e a aplicação dessas dotações constarem de mapas ou tabelas especiais não obsta a que a situação financeira dêsses serviços possa ser ampla e rigorosamente verificada, nem permite afirmar-se que êles estão excluídos do Orçamento Geral do Estado, de que aqueles mapas e tabelas são aliás anexos;
Considerando que a previsão de liquidação de despesas resultantes da guerra no futuro ano económico é inteiramente justificada:
Resolve respeitar a questão prévia, e continua na ordem do dia. — O Deputado, Manuel Fragoso.
Sr. Presidente: compreendo que seja vista com certa estranheza a minha intervenção neste debate. É de facto a primeira vez que abordo um assunto de ordem financeira; resta-me, porém, a consolação de ter a certeza de que às mais altas notabilidades financeiras do país já aconteceu, a seu tempo, a mesma cousa.
Dentro, pois, duma inferior mentalidade, que sou o primeiro a reconhecer, mas dentro também dum direito que ninguém pode contestar, permita V. Ex.ª e permita a Câmara, na sua costumada benevolência, que eu produza as minhas considerações não só em volta do campo árido e desolado dos números, mas também um pouco através do seu prisma político, que foi a determinante de muitas das considerações dos Srs. Deputados da oposição e que foi também, sem dúvida, a origem, a fonte certa da espalhafatosa questão prévia do Sr. Alberto Xavier, ilustre Director da Fazenda Pública.
Sr. Presidente: eu sei que às oposições cabe o papel de fiscalização e crítica dos actos governamentais; é uma praxe estabelecida que os portugueses especialmente acarinham e conservam com amor, e é talvez por isso que a política portuguesa assume por vezes o aspecto duma obra teatral. Tudo ou quási tudo parece obedecer à disciplina rigorosa de aturados e cuidadosos ensaios, e é assim que muitas vezes as oposições tomam o papel de atacantes à obra governamental.
Bem poderíamos nós talvez, nas circunstâncias de gravidade melindrosa que decorrem, mudarmos um pouco de processos escolhermos outros autores ou levarmos o nosso sacrifício patriótico ao ponto de abandonarmos o teatro.
Admitindo, porém, os factos como êles são, era necessário apenas, o que me pároco não ser muito, um nadinha de patriotismo, um tanto de sinceridade e ainda fórmulas correctas, atitudes nobres e dignas dentro duma discussão que, pela sua importância, deve ser uma discussão correcta e levantada.
É, Sr. Presidente, nestes termos que procurarei falar, até mesmo examinando em si o nos seus intuitos, dum indiscutível facciosismo político, a questão prévia do Sr. Alberto Xavier, de resto, dentro dos moldes do ilustre Deputado, seu autor.
Deixemos, no emtanto, a apreciação dêsse assunto para mais tarde, porque havemos de o justiçar convenientemente, e passemos uma rápida vista de olhos sôbre o que foi o debate parlamentar em referência aos números apresentados pelo Sr. Ministro das Finanças e pelos Srs. Deputados da oposição que brilhantemente intervieram neste debate.
S. Ex.ª o Sr. Ministro das Finanças trouxe-nos aqui uma receita computada em 674:076 contos e uma despesa calculada em 813:414 contos, prevendo assim um deficit para o ano económico corrente de 139:000 contos. Com êstes números não se conformaram os oradores das ban-
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cadas das direitas, e S. Ex.ª o Sr. Barros Queiroz competência indiscutível, eminente figura do nacionalismo, com a correcção que lhe é peculiar; chamou a êsses números artificiosos, e, fazendo os seus cálculos e previsões, chegue à conclusão de que o deficit provável será de 300:000 contos.
Eu pregunto se as oposições e o país devem acreditar nos números de S. Ex.ª, porque não se hão-de acreditar no artifício dos números com que S. Ex.ª jogou?
Mais tarde os factos dirão quem tem razão; e há-de verificar-se, é o meu patriótico optimismo que o afirma, o que já se verificou quanto aos deficits previstos para 1920-1921 e 1921-1922, com os quais se pretendeu estabelecer o pavor no país, e que finalmente se viu que eram exageradas as consequências que se anunciavam.
Pregunto: para que continuamos num processo e sistema que a ninguém traz vantagem, nem ao país, nem aos partidos da República, nem a ninguém? Para que continuar a espalhar às mãos cheias a semente, bem nacional, de descrença e de pavor?
Não; deixemos essa triste tarefa a quem de direito. Deixemos a César, nós os republicanos, o que a César pertence, e para o meu caso o César de que estou tratando será o Sr. Carvalho da Silva. Que a sua respeitabilíssima calva me perdoe, porque nesta comparação não há desprimor para com S. Ex.ª
O irrequieto e fogoso representante das fileiras monárquicas de toque, a seu gosto, o carrilhão já desafinado do derrotismo nacional, julgando fazer assim, num êrro de visão que à sua inteligência não desculpo, o jôgo dos seus correligionários.
Sr. Presidente: a maiores vôos se abalançou o Sr. Carvalho da Silva, e assim nos seus cálculos reinadios — permita-me V. Ex.ª a expressão, que não será muito parlamentar, mas que me é exigida pelas suas convicções monárquicas. — deu ao deficit para a gerência de 1923-1924 proporções fantásticas, qualquer cousa como mais de 500:000 contos, nada mais, nada menos. E lamentando o pouco tempo de que dizia dispor para discutir, apreciar e criticar o Orçamento Geral do Estado, chamou-lhe um orçamento-burla. Ora as palavras não tem em todas as bôcas a mesma significação: é preciso atender às circunstâncias em que são proferidas e à sua origem. Também pessoalmente não há nas minhas palavras desprimor para S. Ex.ª, e S. Ex.ª vai ver: esta palavra burla, aplicada ao Orçamento, pouca significação pode ter e há que desculpar-se atendendo a que ela foi trazida aqui por um representante dum regime falido, onde abundaram as mais conhecidos, os mais autênticos, os mais famosos, os mais fraudulentos esbanjadores de contas do Estado que até hoje sé têm visto sôbre a terra.
Apoiados.
O País ainda não os esqueceu, e as minhas palavras vão, decerto, encontrar eco na opinião pública, que se lembra muito bem dos factos praticados pelos homens das batidas de S. Ex.ª
É que, quanto às previsões orçamentais dos Srs. Ministros, os deficits podem servir sempre; na razão directa do antagonismo político, aos seus adversários.
Isto, Sr. Presidente, significa nada mais, nada menos, que nós estamos ainda demasiadamente empoeirados de velharias em matéria de ataque político; que as oposições se servem ainda hoje de armas muito primitivas e, porventura, até de armas já muito desacreditadas. Foi assim em todos os tempos. Quere V. Ex.ª um exemplo?
Ainda há dois dias aqui foi notado pelo Sr. Velhinho Correia que, em 1913, o Sr. Afonso Costa, ao tempo Presidente do Ministério e Ministro das Finanças, veio a esta casa o anunciou um Orçamento elaborado em condições de que resultava um superavit.
Era o produto dum trabalho de rara energia, de rara dedicação, de muita inteligência, de muito boa vontade e patriotismo, era uma autêntica glória da Republica, era a expressão do cumprimento duma promessa que todos os republicanos tinham feito e que a República finalmente honrava. Pois apesar de todos estes predicados, imediatamente a política enviesada da maldade e inveja negou êsse facto, que mais tarde o tempo veio a confirmar, facto que ainda hoje contestam, mas só contestam aqueles que não querem ver, os que sistemàticamente só sabem negar. Em Portugal nega-se sempre.
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Na sua brilhante exposição, inteligente e justamente ouvida com toda a atenção por parte da Câmara, o Sr. Afonso de Melo referiu-se ao facto da Sérvia ter já realizado, após a guerra, o seu grande empréstimo externo, acrescentando S. Ex.ª que os sérvios tinham ido até o sacrifício de hipotecar todos os seus pôrtos. Pregunto eu se era possível era Portugal realizar uma operação semelhante. Creia que não, porque em Portugal há muitos interessados na crise que atravessamos, e que êles próprios ajudam a fazer.
Em Portugal ninguém procura aperfeiçoar, ou ajudar qualquer iniciativa, condenar é muito mais fácil, e é por isso que em Portugal toda a gente condena.
Saiamos dêsses processos ou perdemo-nos todos.
Sr. Presidente: entremos agora um pouco na matéria da questão prévia do Sr. Alberto Xavier. Ela é, com sinceridade o afirmo, uma obra modelar de habilidade política oposicionista, à moda antiga, e é uma consequência inteligente duma digressão intelectual pelos assuntos financeiros internacionais, especialmente dos assuntos financeiros que dizem respeito às três grandes democracias que são a Inglaterra, a França e a América do Norte.
E, antes de continuar, permita-me a Câmara que eu afirme, entre parêntesis, que o Sr. Alberto Xavier, ilustre Director Geral da Fazenda Pública, tem de há muito o raro hábito de manifestar as suas opiniões em discordância aberta com todos os titulares da pasta das Finanças, não só dentro desta casa do Parlamento, mas até lá fora na imprensa; S. Ex.ª tem, ainda, o raro segrêdo de trazer aqui, a propósito de nada e a despropósito de tudo, velhas frases campanudas que já fizeram época, mas que presentemente estão inteiramente demodadas e desacreditadas.
De facto, os considerandos da moção do Sr. Alberto Xavier são como a manga de presunto que um costureiro caprichoso se lembrasse de introduzir nos corpos justos de agora.
Depois S. Ex.ª fez uma exposição de princípios democráticos com os quais todos nós concordámos, e mais abaixo exige do Govêrno, especialmente do Sr. Ministro das Finanças, que traga ao Parlamento todos os cálculos, todas as previsões, todos os documentos oficiais sôbre os quais foi elaborado o Orçamento Geral do Estado.
Se nós fôssemos a admitir a doutrina, desta questão prévia nós meteríamos ombros a uma emprêsa que não mais teria fim.
É, então, o Sr. Alberto Xavier afirma que pouco lhe importa a disposição para lamentar que manda votar o Orçamento até 15 de Março, porque, diz S. Ex.ª, para a não observância de tal preceito não existe qualquer sanção, esquecendo-se assim de que para êle como para nós todos a máxima sanção que, existe é a sanção da opinião pública.
Apoiados.
Não é, pois, de aprovar a questão provia do Sr. Alberto Xavier, não só pelas suas consequências dilatórias, mas ainda porque se nela há qualquer intuito de verdade, está do tal forma diluído que se confunde fàcilmente com pouco discretos intuitos de obstrução.
Lamento que o Sr. Alberto Xavier não tivesse indicado o resultado a que, porventura, tenha chegado com o estudo doa seus números, pois gostaria de avaliar, por êle a sinceridade do entendimento dos grupos que compõem o Partido Nacionalista, fazendo o confronto com os números apresentados pelo Sr. Barros Queiroz.
O Sr. Alberto Xavier não concretizou números. Apenas fez a pregunta sôbre se o deficit seria de 300:000 contos, de 500:000 contos, ou mesmo de 700:000 contos.
Por cerimónia S. Ex.ª não respondeu a pregunta.
A verdade, porém, é que S. Ex.ª se mostra mais inclinado a acreditar que o deficit seja efectivamente no valor de qualquer dos citados números, do que nos números apresentados pelo Sr. Ministro das Finanças.
Solenemente S. Ex.ª declarou que desejava que as previsões fossem a expressão rigorosa da verdade.
Deve S. Ex.ª perdoar-me o eu lhe dizer que não compreendo como exigir rigorismo absoluto em números que são de previsão.
Só milagrosamente, especialmente no caso do Orçamento do Estado, êsses números poderão coincidir com a expressão da verdade.
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Sr. Presidente: o Sr. Alberto Xavier manifestou-se pelo princípio da unidade orçamental, para que mais fàcilmente pudessem ser verificadas as contas do Estado. Tem, talvez, S. Ex.ª razão.
Mas o que não conseguiu provar, porque não o provou, foi que se tornasse impossível fazer uma verificação capaz dos números do Orçamento, apresentados pela forma como o são.
Alargou-se, todavia, S. Ex.ª em considerações sôbre a matéria, e até, com espanto nosso, promoveu, não sei se por distinção, se por antiguidade ou ainda por actos de bravura em campanha, os serviços da Manutenção Militar, dependentes do Ministério da Guerra, à categoria de serviços autónomos, o que não é exacto.
Referiu-se S. Ex.ª ao facto das despesas serem previstas com o ágio do ouro a 1:500 por cento, não se conformando com isso, não omitiu, não julgando que o tenha feito propositadamente, que as receitas também foram calculadas na mesma base.
Insurgiu-se também contra o facto de as despesas feitas com as conferências de Bruxelas e de Génova serem levadas à rubrica de «despesas da guerra».
Ora essas conferências foram consequência da paz e a paz uma consequência da guerra; estão bem, portanto, naquela rubrica as despesas realizadas nas citadas conferências.
O Sr. Alberto Xavier a certa altura do seu discurso afirmou que só o Sr. Ministro das Finanças possui os elementos precisos para a elaboração do Orçamento.
Então eu pregunto: como é que S. Ex.ª admite todos os números menos os indicados pelo Sr. Ministro?
Sr. Presidente: com muita sinceridade e com certa solenidade, eu afirmo que o Sr. Ministro das Finanças é um grande republicano que possui uma larga e valiosa folha de serviços prestados à República, e é pessoalmente tam honesto, tam trabalhador, tam inteligente o tam honrado, que honra e dignifica a própria República.
O relatório e os números do Sr. Ministro foram apresentados, e a Câmara os apreciará.
Sr. Presidente: eu também sou partidário de maiores economias, também não me conformo fàcilmente com o excessivo luxo de certos serviços, mas tenho a opinião de que essa regeneração tem de ser feita por todos.
É uma obra que há-de ser exigida a todos os portugueses, é a nação que há-de exigi-la, e perante essa exigência, eu afirmo que todos os homens públicos, por maior que seja o seu talento, apagar-se hão dentro do círculo luminoso dos interêsses sagrados e soberanos da nação.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem, muito bem.
O orador foi muito cumprimentado.
O orador não reviu.
É lida e admitida a moção do Sr. Manuel Fragoso.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º
Feita a contraprova, verificou-se estarem de pé 54 Srs. Deputados e sentados 2.
O Sr. Tôrres Garcia: — Sr. Presidente: agradeço a deferência do Sr. Cancela de Abreu, cedendo-me a palavra nesta altura, e obedecendo às praxes regimentais, envio para a Mesa a minha moção.
Sr. Presidente: sou um português e republicano que nunca colaborou em quaisquer campanhas derrotistas, feitas. à volta da administração das instituições que perfilho e defendo e essa qualidade de português e republicano impõe-me acima de tudo o dever de dizer a verdade, doa a quem doer, doa mesmo ao meu sentimento de republicano.
Não vou fazer um discurso sôbre matéria orçamental.
Venho depor, como acabou de depor o ilustre Deputado Manuel Fragoso, que nos autos disse nada.
Eu afirmei, Sr. Presidente, quando se debateu nesta Câmara a questão de haver ou não utilidade na discussão da generalidade do Orçamento, que isso era uma inutilidade, porque o Orçamento Geral do Estado não é mais do que uma tabela de despesas obrigatórias, constituída ao abrigo dos artigos 15.º e 16.º do decreto de 8 de Maio de 1919, que não permite que a Câmara remodele a obra tra-
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zida pelo Sr. Ministro das Finanças, e a que nós, mais para aqui, mais para ali, mais discurso, menos discurso, temos de dar o nosso assentimento.
É portanto de uma inutilidade completa.
Dentro desta Câmara sou um Deputado que não tem obrigação de defender nem direitas nem esquerdas, o na minha moção afirmo que o Partido do Govêrno está impossibilitado de realizar a obra de regeneração financeira do Estado, há tanto tempo falada, porque tem uma organização exclusivamente política que se não compadece com a natureza das soluções que urge adoptar e que são sobretudo de ordem económica, e como êle estão todos os Partidos da República e pela mesma razão fundamental.
A questão mais importante a debater aqui não é uma questão de números, mas a da apreciação do fundamento, da organização dos Partidos dentro da República.
Êsses Partidos estão separados por questões políticas, muitas das quais tiveram origem em questões pessoais, e já vamos longe de mais para termos somente preocupações políticas.
A declaração dos direitos dos homens, foi feita em 1889.
O direito das liberdades já está assegurado; a liberdade religiosa é um facto, e a própria existência do regime está assegurada por doze anos de lutas vitoriosas contra os seus adversários.
Portanto há que pôr em face dos problemas sociais, que são económicos, uma base fundamental de organização económica.
A falta de correspondência entre a natureza dos problemas e das soluções que nos propomos dar-lhes, é que estabelece a confusão e nos faz andar todos à copita em busca duma solução para o problema financeiro e económico, cujo extrato nada mais é do que o Orçamento Geral do Estado, sem nada conseguirmos de útil e de inteligente.
Eu ouvi, quando foi da ascenção dêste Govêrno ao Poder, dizer ao Sr. António Maria da Silva, com toda a fé, que ia regenerar as finanças públicas e, de entre as medidas apontadas por S. Ex.ª, figurava como primacial a nova organização dos serviços públicos.
A Câmara sabe que essa discussão foi feita exclusivamente sob o ponto de vista político, por todos os Partidos, sem quererem ir ao fundo nacional da questão, porque pessoas de natureza política a isso se opuseram.
Todavia temos o remédio na nossa mão, pondo de parte a questão política, estreita e apertada, e explorando o campo da organização económica das sociedades modernas.
Êsse remédio consistia em decretar reformas sábias sôbre o direito de associação, de maneira a disciplinar e a agregar os indivíduos segundo as suas profissões.
Só depois é que os agrupamentos de carácter político iriam à procura do apoio dessas classes, quando realmente se dispusessem a realizar uma obra de verdadeira regeneração nacional, e assim teriam assegurado o apoio que agora lhes falha, e a continuidade de acção que agora não é possível.
É assim que sentem orientado a política na Inglaterra, na América, e ultimamente na França.
Nós continuamos a ter organismos de ordem teórica, sem lhes sabermos tirar qualquer proveito útil para a nossa, regeneração.
Adiante me referirei à organização de alguns serviços públicos, para provar a minha afirmação.
Ou se criaram serviços sem correspondência nas necessidades nacionais ou se diluíram serviços indispensáveis por múltiplos organismos que por completo os anarquizaram e inutilizaram.
E tudo isto foi feito por mero interêsse das facções políticas e por todas elas.
De maneira que, Sr. Presidente, a minha moção não é uma agressão ao Partido Democrático, mas uma apreciação de carácter geral e que se fundamenta e prova pelo Orçamento do Estado.
Desta forma nós não podemos realmente discutir com conhecimento do causa o Orçamento Geral do Estado, a meu ver. Como correcção, podíamos e devíamos dividir o Orçamento em duas partes. A primeira respeitante a pessoal, que seria exclusivamente apreciada na especialidade, e a segunda, concernente a dotações dos serviços, que seria discutida na generalidade e na especialidade.
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À volta desta discussão se abordariam os grandes problemas, como a reforma do ensino, a organização do exército, a indústria transportadora, etc., etc.
É assim, Sr. Presidente, conforme já tive ocasião de ver, que se faz na América, na Inglaterra e até na França.
Mas é absolutamente, indispensável, Sr. Presidente, dizer isto e fazer estas afirmações no Parlamento, pois a verdade é que não vejo dentro da Câmara, permita-se-me a frase, ninguém que encare êste problema como êle deve ser encarado; trata-se apenas de questões de pouca importância, dando a todos, os momentos motivos para sermos mal considerados pelo País, e sermos agredidos um pouco justamente, embora aparentemente, pelos nossos adversários, que são os monárquicos.
Assim, Sr. Presidente, nós temos hoje aqui, apresentado pelo Sr. Ministro das Finanças, um Orçamento que é a repetição do apresentado em 1921-1922, e bem assim dos anos anteriores.
Amanhã, Sr. Presidente, com o coeficiente 12, que necessàriamente tem de ser dado ao funcionalismo publico, e mais tarde talvez aumentado para o coeficiente 15 ou 16 as cousas hão-de chegar a um estado verdadeiramente fantástico, por isso que não houve o cuidado de pôr os serviços dentro daquilo que era exigido, pelo menos, pelas necessidades do País.
A verdade, Sr. Presidente, é que mantemos hoje uma organização que não corresponde em nada às necessidades do País, nem às disponibilidades financeiras de que o mesmo País dispõe.
Torna-se necessário, Sr. Presidente, fazer uma política de reduções, deminuindo os serviços e não criando administrações gerais autónomas, pois, de contrário, não poderemos realizar aquilo de que necessitamos.
Eu vejo em toda a costa portuguesa todos os pôrtos entregues a serviços autónomos: o pôrto de Lisboa, o Douro, o Pôrto, Vila do Conde, Figueira da Foz e Aveiro.
Para que servem os serviços da Administração Geral de Hidráulica?
Todos êstes serviços, metidos dentro duma Direcção Geral, serviriam o País, promovendo o desenvolvimento e fomentando a riqueza nacional. Com um corpo de engenheiros muito reduzido fez-se em tempo muito mais e melhor.
O Sr. Velhinho Correia (interrompendo): — Eu reformei o Ministério do Comércio e suprimi mais de 400 lugares, e posso afirmar que é impossível nesse Ministério reduzir mais.
O Orador: — Mas V. Ex.ª agora não está em causa.
Continuando, eu afirmo que nada se tem feito para aliviar o Estado dos serviços fabris, que não devem estar a seu cargo.
No Ministério do Comércio, no da Guerra e no da Marinha há serviços de carácter industrial e fabril que lá não deviam estar.
No orçamento do Ministério da Guerra estão inscritas verbas para serviços fabris na importância de 6:000 contos.
Para quê?
Para manter um Arsenal do Exército que, afinal, fornece tudo mais caro do que a indústria particular. Pode alegar-se que se mantém. por e para a segurança do Estado. Mas a Alemanha, que foi uma potência militar de primeira grandeza, não teve receio de entregar a manufactura dos seus canhões a uma fábrica particular, a fábrica Krupp.
A França também entregou a sua indústria de guerra a emprêsas particulares, como, por exemplo, à fábrica Saint-Eliem. Mas nós, que queremos fingir de endinheirados, temos um Arsenal do Exército sem podermos apetrechar um exército, e um Arsenal de Marinha sem termos navios para navegar; não temos nada!
Temos, sim senhor, temos uma verba de 2:000 contos para férias do pessoal do novo Arsenal, que para nada serve.
Ternos os caminhos de ferro; outro cancro que nada justifica que continuo na posse de Estado. E tudo isto são instalações da indústria do ferro. Como seria simples proceder à organização duma grande emprêsa que, tomando à conta dela todas estas instalações, tomasse a peito a realização do problema siderúrgico em Portugal!
Eu explico: temos todas as companhias de caminhos de ferro do país com oficinas próprias; ora podia-se constituir uma
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grande o única emprêsa ferroviária que atacasse de frente não só o problema da viação, mas o da indústria do ferro, aproveitando os nossos minérios que são eminentemente aptos para sofrerem o tratamento electro-metalúrgico.
O Sr. Afonso de Melo: — Ainda agora se vão gastar 3:000 libras-ouro para a instalação duma oficina no Barreiro.
O Orador: — Eu ia referir-me a êsse facto. Mas há outros sintomas de má administração. Os serviços fabris do exército, por exemplo, ferem fundo a economia do exército. Viemos da guerra e realizámos ainda mais um serviço fabril: o Parque Automóvel Militar, cuja missão, segundo se diz, é a da reparação e construção de material destinado ao uso particular, isto é: mais uma emprêsa de carácter nitidamente particular que o Estado foi chamar a si, para nada lhe servindo os exemplos anteriores.
Temos ainda um Ministério da Instrução Pública que em Portugal nada realiza e nada produz, e que só para melhorias de ordenados traz inscrito no Orçamento Geral do Estado a quantia fabulosa do 72:000 contos. E não vejo nada, como medidas preparatórias do Govêrno, como não verei amanhã doutro, que tenda à melhoria de situação neste capítulo da administração pública. Continuaremos a ter escolas em cada terra com o mesmo quadro de disciplinas e a mesma função, tudo a formar a cultura geral que se julga indispensável para cada cidadão, sem haver uma tentativa de concentração, para se reduzir tudo a um corpo central para essa educação geral, mas com ramificações de secções especiais destinadas ao desenvolvimento das vocações também especiais de cada indivíduo. Relativamente à nossa população, nós somos o país que tem mais universidades. E cada universidade tem o mesmo quadro orgânico de disciplinas, de forma que a frequência dispensa-se, quando em toda a parte se procura concentrar, tendo as universidades funções diferentes, sem procurarem destruir-se umas às outras.
Em todo o tempo, em Portugal, se ensinou física em duas cadeiras de curso superior, hoje temos seis cadeiras de física; e para quê, Sr. Presidente? Pode hoje chegar-se a saber tanto como antigamente, mas não se sabe mais.
Tudo isto é ainda devido à política de pseudo expedientes de que tem enfermado a administração da República.
Sr. Presidente: houve apenas em Portugal um estadista, um homem de finanças, que conseguiu entravar essa acção; êsse homem foi o Sr. Afonso Costa, foi êle quem venceu o vício da organização do seu partido porque se impôs às tendências nefastas, às tendências exageradamente burguesas, que havia dentro do seu partido.
O espírito de iniciativa que êsse estadista impôs na sua obra desapareceu, não e fácil renová-lo e andamos agora aqui perfeitamente a jogar a cabra-cega lançando remendos sôbre remendos sem se saber já qual a cor natural do tecido primitivo.
Temos agora o Ministério da Guerra: 139:000 contos de despesa.
Sr. Presidente: eu já fui militar, tenho a máxima consideração pela instituição militar portuguesa; eu sei ou pelo menos antevejo o prestígio de que deve ser revestida essa instituição para que ela moral e materialmente possa ter influência nos casos em que é pedida a sua intervenção a favor da salvação pública, mas o que sei de sciência certa porque vi quando lá estive e tenho observado depois de sair e que ao meu republicanismo não repugna dizer, e que ao meu patriotismo se impõe que diga, é o declarar francamente que o exército português, se representa ainda alguma cousa na ordem moral, na ordem material é um zero.
Houve um Ministro da Guerra que veio aqui declarar no discurso da sua posse que só ia ocupar aquela pasta para prestigir o exército. E vêmo-lo manter organizações perfeitamente dispensáveis, mantendo um regimento dê artilharia de obuses de campanha com um quadro excessivo tendo apenas uma bôca de fogo, mantendo um regimento de artilharia de campanha com excessivo pessoal tendo apenas uma bataria.
Na artilharia de costa e na artilharia de guarnição quadros enormes para guarnecer peças Krupp, sem recuperadores nem freios, que só servem para fazer fogo com pólvora preta, sem valor militar algum.
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Nós mantemos, ainda, tantas outras organizações militares que não têm qualquer utilidade adentro da orgânica militar.
Nós vemos que, ainda o ano passado, se permitia a promoção de dezenas de oficiais de administração militar, atribuindo a uma mera disposição orçamental, fôrça de decreto orgânico do exército (Apoiados). Disse-se que as promoções provocadas pelas leis n.ºs 1:350 e 1:359 foram feitas sem prejuízo para o Estado e houve até um nosso ilustre colega que levou toda a tarde a demonstrar que os oficiais promovidos ainda perdiam dinheiro...
O Sr. Pinto da Fonseca: — Eu procurei demonstrar que havia apenas uma diferença de 1$ por mês.
O Orador: — Nunca ninguém, desde 1918, se lembrou de alargar os corpos de administração militar; só agora em 1922, depois da guerra e quando o País atravessa uma crise assustadora, é que se lembram de aumentar os quadros...
O Sr. Presidente: — Comunico a V. Ex.ª que faltam cinco minutos para encerrar a sessão.
O Orador: — Vou terminar. Levaria, porém, horas seguidas para demonstrar quanto é banal a promessa do Sr. Ministro da Guerra, dêste ou doutro que ali esteja, quando dizem que vão prestigiar o exército.
Não vão.
Eis o parecer da Procuradoria Geral da República à consulta do Sr. Ministro da Guerra:
Leu.
A consulta afirma que aos oficiais só é devido o sôldo correspondente ao pôsto que tinham anteriormente e o Sr. Ministro da Guerra manda pagar pelo pôsto imediato.
Faz S. Ex.ª promoções a esmo pela última Ordem do Exército e manda pagar aos promovidos desde Julho, o que é novo nesta matéria.
Não está presente o Sr. Ministro da Guerra, ficando com a palavra reservada por êste motivo, porque desejo demonstrar claramente que a política que deve fazer-se dentro do exército para manter e aumentar o seu prestígio não é seguramente o que S. Ex.ª tem usado.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. Ministro das Colónias (Rodrigues Gaspar): — Sr. Presidente: tive hoje conhecimento dum incidente passado ontem aqui, antes do encerramento da sessão, e estou certo que foi puramente um equívoco.
Recebi a educação suficiente para respeitar todos, e manter também a minha dignidade. Os anos e a experiência têm-me colocado em situação de não ser necessário que alguém me dê lições de boa educação.
Ontem vim a esta Câmara, com muita urgência, conferenciar com o meu colega das Finanças, e com tanta urgência que nem pude esperar pelo final da sessão, para mais demoradamente conversarmos.
Emquanto aqui estive um Sr. Deputado pediu a palavra para quando estivesse presente o Ministro das Colónias.
Eu vou colocar-me perante princípios, o só perante êles é que regulo as relações entre os diversos elementos da sociedade.
O facto de um Deputado pedir a palavra para quando esteja presente um Ministro não implica evidentemente uma condição de usar da palavra, nem é uma obrigação de estar o Ministro.
Já, pelo menos uma vez, sucedeu que, tendo eu ouvido o Sr. Carlos de Vasconcelos pedir a palavra para usar dela na presença do Ministro das Colónias, eu tive o cuidado de dizer a S. Ex.ª que não podia manter-me aqui porque motivo urgente de serviço reclamava, então, a minha presença no Ministério, mas que faria todo o possível por voltar à Câmara ainda a tempo de poder ouvir S. Ex.ª
Cumpri e voltei e aqui estive.
Portanto, bem demonstra êste meu proceder que, a par dos princípios que defendo, uso da máxima atenção para com qualquer dos meus colegas nesta Câmara.
Nestas condições o facto da minha reti-
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rada não pode implicar qualquer falta de consideração.
Creio ter explicado à Câmara a minha atitude.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O orador não reviu.
O Sr. Carlos de Vasconcelos (para explicações): — Agradeço, como parlamentar, as explicações que o Sr. Ministro das Colónias teve a amabilidade de apresentar à Câmara.
Devo confessar que tais explicações me satisfizeram em absoluto.
O assunto para que eu queria a atenção do Sr. Ministro das Colónias é o seguinte:
Houve um concurso na agência de Angola para oito agrónomos. Tendo aparecido três concorrentes, dois foram providos e o terceiro não o foi, ao que se diz, pelo simples motivo de ser um rapaz de côr.
Se se trata duma questão de raças não é essa uma razão que possa ser atendida.
Nós temos um império colonial vastíssimo cujos habitantes são, na sua quási totalidade, indivíduos de côr.
A acção portuguesa tem-se mantido pela suavidade, dos seus processos e pela forma bondosa como se tem tratado os indígenas. E se lá fora somos acusados de demasiadamente humanitários para com o indígena, é absolutamente necessário que aqui na metrópole, onde não há o perigo duma absorpção de raça, se não sancione um indeferimento dum justo direito dum cidadão com o pueril fundamento de que êsse funcionário é de côr.
E isto exactamente, quando a França exerce uma intensa acção negrófila, que a vai colocando em situação absolutamente invejável perante as populações negras, até da América do Norte.
O químico ilustre Duarte Silva, um caboverdeano de côr, foi professor na Sorbonne e na Escola Central de Paris, e uma estátua há pouco erigida perpetua na capital do mundo a intelectualidade dêsse homem de côr.
Hoje só o carácter e a ilustração podem ser base para a diferenciação dos indivíduos.
O caso a que me referi é um acinte e de tristes consequências, o que havia de suceder forçosamente se êsse boato continuasse a ser propalado: os 2:000 estudantes das colónias que se encontram em Lisboa veriam a inutilidade de qualquer curso que completassem, visto que a sua côr lhes impedia o exercício de qualquer actividade superior.
Eu sei que na Idade Média eram perseguidos os judeus; mas não queiramos nós fazer a mesma cousa em relação aos pretos, em pleno século XX.
Em toda a parte nós vemos os homens de côr, quando são inteligentes, exercerem os seus cargos em absoluta igualdade com os outros homens, qualquer que seja a sua raça.
Em geral só invocam a superioridade da sua côr aqueles que não têm outra superioridade com que se imponham.
Apoiados.
Eram simplesmente estas as considerações que eu queria fazer, pedindo para elas a atenção do Sr. Ministro das Colónias, tendo a certeza de que S. Ex.ª fará com que os princípios que devem corresponder à nossa acção, sempre afirmada, de colonizadores sejam mantidos e respeitados.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem!
O Sr. Ministro das Colónias (Rodrigues Gaspar): — Devo dizer ao ilustre Deputado Sr. Carlos de Vasconcelos que desconhecia completamente o assunto a que V. Ex.ª se acaba de referir; porém vou tomar conhecimento do facto, podendo V. Ex.ª estar certo que justiça há-de ser feita.
Nós temos visto que realmente a questão da côr nada tem com a questão de merecimentos.
Pode V. Ex.ª estar certo, repito, que vou tomar conhecimento do facto, podendo-lhe garantir que justiça há-de ser feita.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: pedi a palavra para pedir a V. Ex.ª o obséquio de transmitir ao Sr. Ministro do Comércio que desejaria muito
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Diário da Câmara dos Deputados
que S. Ex.ª estivesse presente amanha ao período destinado antes de se encerrar a sessão, para tratar de um assunto relativo à Exploração do pôrto de Lisboa.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã à hora regimental, sendo a ordem do dia a seguinte:
Antes da ordem:
Interpelação do Sr. Álvaro Xavier de Castro ao Sr. Ministro das Colónias.
Ordem do dia:
1.ª parte — Parecer n.º 424 (Empréstimo interno);
2.ª parte — Parecer n.º 302 (Acôrdo com a Companhia dos Tabacos) e parecer n.º 225 (Pensão de reforma às praças da guarda fiscal.
O Sr. Presidente: — Haverá também sessão nocturna que deve começar às 21 horas e 30 minutos com a seguinte
Ordem da noite:
Discussão e votação na generalidade dos orçamentos;
Parecer n.º 411-(a) (Orçamento do Ministério do Interior).
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 40 minutos.
Documentos enviados para a Mesa durante a sessão
Proposta de lei
Do Sr. Ministro da Guerra, acrescentando no artigo 59.º do Regulamento Disciplinar do Exército em seguida às palavras «suas vezes fizer» as seguintes «e generais inspectores».
Aprovada a urgência.
Para a comissão de guerra.
Pareceres
Da comissão de guerra, sôbre o n.º 428-A que suprime o artigo 4.º da lei n.º 1:340, de 1922, acêrca de equiparações e limite de idade de oficiais.
Para a comissão de finanças.
Da comissão de comércio e indústria, sôbre o n.º 336-B, que isenta de direitos o papel para a impressão da História da Colonização Portuguesa no Brasil.
Para a comissão de finanças.
Da comissão de guerra, sôbre o n.º 375-C, que abre um crédito de 3. 600$ a favor do Ministério da Guerra para despesas com a comissão parlamentar do inquérito ao mesmo Ministério.
Para a comissão de finanças.
Da mesma, sôbre o n.º 401-B, que dispensa de designadas provas para promoções os oficiais que, durante a guerra, foram graduados no pôsto imediato para comandarem.
Para a comissão de finanças.
Da mesma, sôbre o n.º 408-A, que considera em vigor os artigos 10.º e 11.º da lei n.º 415 até se modificar o recrutamento dos oficiais para infantaria, cavalaria e artilharia de campanha.
Para a comissão de finanças.
Da comissão de finanças, sôbre o n.º 423-C, que permite fazerem exames finais os alunos matriculados condicionalmente em qualquer curso superior, que estejam em designadas condições.
Imprima-se.
Requerimentos
Requeiro que, pelo Ministério da Guerra, me sejam enviados, com a possível urgência, os seguintes documentos respeitantes ao tenente, miliciano de cavalaria António Inocêncio de Carvalho:
1.º Nota-do assento como oficial;
2.º Nota do assento como praça de pré;
3.º Cópias das ordens de transferência, como praça de pré, dos regimento de cavalaria n.º 4 para cavalaria n.º 5 e dêste regimento para cavalaria n.º 9;
4.º Cópia da reclamação que fez, como praça de pré, sôbre a ordem de licenciamento e despacho que teve;
5.º Cópia da ordem regimental n.º 230 do regimento de cavalaria n.º 4, relativa ao dia 18 de Agosto de 1914;
6.º Indicação da data da convocação pára frequentar a Escola Preparatória de Oficiais Milicianos;
7.º Se foi ou não avisado para tomar parte nos concursos para segundo sargento do quadro permanente, que tiveram lugar a seguir à data de 18 de Agosto de 1914, — João E. Águas.
Expeça-se.
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Sessão de 7 de Março de 1923
Requeiro que, com a maior urgência, me seja enviado o processo referente ao ex-alferes miliciano da arma de infantaria Alberto Higino da Ponte e Sousa. — O Secretário, A. Garcia Loureiro.
Expeça-se.
Requeiro que, com a maior urgência, me seja enviado o processo referente ao tenente de cavalaria n.º 9, Francisco Mataria da Silva. — A. Garcia Loureiro.
Expeça-se.
O REDACTOR — Herculano Nunes.