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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 84
EM 16 DE MAIO DE 1923
Presidência do Exmo. Sr. Tomás de Sousa Rosa
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Sebastião de Herédia
Sumário. — Abertura da sessão. Leitura da acta. Correspondência.
Antes da ordem do dia. O Sr. Leote do Rêgo justifica e envia para a Mesa uma proposta, para a qual pede urgência e dispensa do Regimento.
Usam da palavra, sôbre o modo de votar, os Srs. Almeida Ribeiro e Vítor Hugo de Azevedo Coutinho (Ministro da Marinha), senão concedida a urgência e a dispensa do Regimento requerida pelo Sr. Leote do Rêgo para a sua proposta.
Usam em seguida da palavra os Srs. Ministro da Marinha, Almeida Ribeiro e Carvalho da Silva, sendo aprovaria a proposta do Sr. Leote do Rêgo.
Usa da palavra para interrogar a Mesa, o Sr. Cancela de Abreu, respondendo-lhe o Sr. Presidente.
Entrando em discussão o parecer n.º 435, é aprovado na generalidade e na especialidade.
Usa da palavra, para interrogar a Mesa, o Sr. Carvalho da Silva. Responde-lhe o Sr. Presidente.
É lido na Mesa o parecer n.º 470.
Usa da palavra, para interrogar a Mesa, o Sr. Almeida Ribeiro, escondendo-lhe o Sr. Presidente.
É retirado da discussão o parecer n.º 470.
Usa da palavra o Sr. Tôrres Garcia que faz algumas considerações sôbre a Conferência Inter-parlamentar do Comércio, pedindo a êste respeito algumas explicações o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Responde-lhe o Sr. Domingos Pereira (Ministro dos Negócios Estrangeiros).
Usa da palavra, para explicações, o Sr. António Fonseca.
Volta a usar da palavra, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Leote do Rêgo usa da palavra para explicações, respondendo-lhe o Sr. Ministro da Marinha.
O Sr. Cancela de Abreu pede a palavra para um negócio urgente.
Consultada a Câmara é recusada a palavra ao Sr. Cancela de Abreu.
Ordem do dia. (continuação da discussão do orçamento do Ministério da Guerra). — Usa da palavra o Sr. Pires Monteiro, que troca explicações com o Sr. Presidente sôbre a ordem a seguir na discussão.
É pôsto à votação um requerimento do Sr. Agatão Lança.
Falam sôbre o modo de votar os Srs. António Maia, José Domingues dos Santos, António Fonseca, Pires Monteiro, Carvalho da Silva, Almeida Ribeiro e António Maia.
O Sr. Almeida Ribeiro requere a divisão em duas partes do requerimento do Sr. Agatão Lança.
É aprovado.
Efectuada a contraprova requerida pelo Sr. Cancela de Abreu com a invocação do § 2.º do artigo 116.º do Regimento confirma-se a aprovação.
É rejeitada a primeira parte do requerimento do Sr. Agatão Lança.
Efectuada a contraprova, verifica-se a aprovação.
É aprovada também a segunda parte.
Usa da palavra o Sr. Pires Monteiro para interrogar a Mesa.
Responde-lhe o Sr. Presidente.
Usa da palavra, para interrogar a Mesa, o Sr. António Fonseca, respondendo-lhe o Sr. Presidente.
Usam, consecutivamente, da palavra os Srs. Carvalho da Silva, Cancela de Abreu e António Maia.
Usa da palavra, sôbre o modo de votar, o Sr. Almeida Ribeiro; e, em seguida, a Câmara resolve que a limitação do tempo fixada pelas disposições regimentais para a discussão do Orçamento não é aplicável à discussão da proposta do Sr. Ministro da Guerra.
Usa da palavra o Sr. Pires Monteiro, fazendo largas considerações sôbre a proposta em discussão.
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Diário da Câmara dos Deputados
O Sr. Agatão Lança cada um requerimento para a Mesa.
O S. António Maia usa da palavra para interrogar a Mesa, respondendo-lhe o Sr. Presidente.
Antes de se encerrar a sessão. — O Sr. Cancela de Abreu protegia contra o atentado dinamitista que hoje se cometeu no Tribunal da Boa Hora.
Responde-lhe o Sr. Abranches Ferrão (Ministro da Justiça).
O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.
Abertura da sessão, às 15 horas e 15 minutos.
Presentes, 37 Srs. Deputados.
São os seguintes.:
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Alberto Ferreira Vidal.
Albino Pinto da Fonseca.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
António Alberto Tôrres Garcia:
ntónio Augusto Tavares Ferreira.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
António Resende.
António de Sousa Maia.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Augusto Pereira Nobre.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
João Baptista da Silva.
João Estêvão Águas.
João Pina de Morais Júnior.
Joaquim Dinis da Fonseca.
José António do Magalhães.
José Domingues dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sousa Coutinho.
Mariano Martins.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Sebastião Herédia.
Tomás de Sousa Rosa.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Albino Marques de Azevedo.
António de Mendonça.
António Pinto de Meireles Barriga.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur do Morais Carvalho.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
João José da Conceição Camoesas.
João Luís Ricardo.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim Serafim de Barros.
José Cortês dos Santos.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio Saque.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Abílio Marques Mourão.
Afonso Augusto da Costa.
Afonso do Melo Pinto Veloso.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto do Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto do Moura Pinto.
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Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Correia.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António Lino Neto.
António Maria da Silva.
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pires do Vale.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado Freitas.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim Costa.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Cruz.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José do Amorim.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José Luís Damas.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge de Barros Capinha.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Carvalho dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José Pedro Ferreira.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Lúcio de Campos Martins.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Alegre.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Góis Pita.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Fonseca.
Às 15 horas principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 37 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 15 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Ofícios
Do Senado, acompanhando seis propostas de lei:
Extinguindo um dos ofícios da comarca de Évora.
Para a comissão de legislação civil e comercial.
Tornando extensiva à Biblioteca de Évora a disposição do § único do artigo 8.º do decreto de 28 de Outubro de 1910 (lei de imprensa).
Para a comissão de instrução especial e técnica.
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Diário da Câmara dos Deputados
Criando uma assemblea eleitoral na freguesia de S. Manços, concelho de Évora.
Para a comissão de administração pública.
Alterando o artigo 35.º da lei n.º 88, de 7 de Agosto do 1913.
Para a comissão de administração pública.
Criando a freguesia de Calhetas, concelho da Ribeira Grande.
Para a comissão de administração pública.
Criando uma assemblea eleitoral na freguesia do Faial da Terra, concelho da Povoação.
Para a comissão de administração pública.
Do Senado, devolvendo com alterações a proposta de lei n.º 128 que isenta da lei de desamortização designados prédios pertencentes no Albergue dos Inválidos do Trabalho de Castelo de Vide.
Para a comissão de administração pública.
Representações
De vários padres do concelho de Gavião pedindo a aprovação do projecto do Sr. Lino Neto sôbre as reclamações dos católicos, em especial à liberdade do ensino religioso.
Para a comissão de negócios eclesiásticos.
Das mesas do irmandades da freguesia de Sande, concelho do Guimarães, idêntica à anterior.
Para a Secretaria.
Telegrafas aprovando as reclamações dos católicos
Da Irmandade de Sátão (Viseu).
Da Conferência de S. Vicente (Braga).
Da Junta de Paróquia do Ponte do Rol (Tôrres Vedras).
Do pároco e regedor do Molelos (Tondela).
Do centro católico da Sertã.
Do presidente da comissão executiva municipal da Sertã.
Do Sindicato Agrícola da Sertã.
Da junta do paróquia e regedor da Sertã.
Da junta e regedor de Amieiro (Vieira do Minho).
Do regedor de Raponha do Coa (Sabugal).
Da comissão paroquial, centro católico e junta da freguesia de Cividade (Braga).
Da junta do freguesia do Raponha do Coa (Sabugal).
Do regedor de Ruivos (Sabugal).
Do regedor o junta de Cumeada (Sertã).
Do Centro Católico da Sé (Braga).
Do regedor e junta de paroquia de Rio de Moinhos (Arcos de Valdevez).
Telegramas
Da Cooperativa Teixeiso, do Pôrto, pedindo a discussão do projecto referente às cooperativas.
Do professorado do Mafra, pedindo melhoria de vencimento.
Da Câmara Municipal de Ródão, reclamando contra o projecto fixando vencimentos a facultativos.
Antes da ordem de dia
O Sr. Leote do Rêgo: — Sr: Presidente: o recente naufrágio do vapor Mosâsmedes e o conhecimento que tenho, porque sou profissional de marinha, das deficiências que há no serviço de socorros a náufragos, levam-me a tomar alguns minutos à Câmara, para justificar uma proposta que vou apresentar.
Em todos os países marítimos, sobretudo depois dum congresso que se realizou em Londres, são obrigatórias estas disposições a bordo dos navios, para a segurança dos passageiros.
Assim, não há vapor, grande ou pequeno, que não tenha escaleres apropriados para o embarque dos passageiros, em caso de naufrágio, e que não tenha disposições muito interessantes para que êsse embarque se faça com toda a segurança.
Em Portugal há apenas umas leves indicações no regulamento das capitanias, que permitem que as autoridades marítimas possam visitar os navios mercantes e determinar até ti suspensão da viagem,
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quando os escaleres não se encontrem em condições de servir.
Qualquer de V. Ex.ªs que tenha embarcado num paquete estrangeiro, sabe que cada passageiro recebe à entrada a indicação do escaler em que terá do embarcar em caso do incidente; e a bordo há frequentemente exercícios, logo que o navio sai do pôrto, para que os passageiros se familiarizem com os passos que têm a dar para chegar à embarcação.
Todavia, apesar de o regulamento das capitanias trazer essas indicações, acontece, por exemplo, que na travessia do Tejo — que por vezes é perigosa, sobretudo quando há nevoeiro — o vapor do Barreiro, que pode transportar 400 ou 500 pessoas, tem um pequeno escaler que dará, quando muito, para 4 ou 5 pessoas. O vapor que faz a carreira entre Lisboa 6 Cacilhas e que tem lotação para cêrca de 200 pessoas, possui apenas um pequeno escaler que transportará 2 ou 3 pessoas.
Sr. Presidente: repetindo, devo dizer a V. Ex.ª e à Câmara que, depois duma conferência que houve em Londres, em todos os países marítimos se tomaram as devidas providências para obviar àquela deficiência.
Ainda há poucos dias, um paquete da Mala Real Inglesa, que demandava o pôrto de Lisboa encontrou na costa grande nevoeiro e entrou a barra com os escaleres fora do navio, suspensos nos turcos, perfeitamente preparados para receber os passageiros num caso de colisão.
Creio ter dito o bastante para justificar a minha proposta que vou mandar para a Mesa, e para a qual peço urgência dispensa do Regimento.
É a seguinte:
Proposta
A Câmara dos Deputados pensa que devem ser modificados com urgência os regulamentos das capitanias, em vigor, e do Instituto de Socorros a Náufragos no sentido do se exercer a mais eficaz fiscalização sôbre os meios de salvação a bordo dos navios da marinha mercante nacional, fixando preceitos, hoje em uso obrigatório em todas as marinhas do mundo. — Leote do Rêgo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
É lida na Mesa a proposta do Sr. Leote do Rêgo.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: ouvi com toda e atenção as palavras do Sr. Leote do Rêgo; e ouvindo-o, tive a impressão de que S. Ex.ª ia apresentar um projecto de lei.
Vejo, porém, que não se trata disso, e não compreendo o que S. Ex.ª pretende com a afirmação da Câmara.
Interrupção do Sr. Leote do Rêgo, que não se ouviu.
O Orador: — Bem, como se trata duma indicação para a revisão de regulamentos, nada tenho a opor.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Marinha (Vítor Hugo de Azevedo Coutinho): — Sr. Presidente: pedi a palavra para elucidar a Câmara, dizendo-lhe que foi nomeada uma comissão para apresentar todas as modificações ao actual regulamento das capitanias, especialmente na parte que diz respeito à segurança da navegação.
Essa comissão tem já os seus trabalhos adiantados; e logo que os apresente no Ministério respectivo, trarei à Câmara uma proposta nesse sentido.
Trata-se, na verdade, dum assunto que tem merecido a minha atenção, e que, repito, em breves dias trarei ao Parlamento.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi aprovada a urgência e dispensa do Regimento, requeridas pelo Sr. Leote do Rêgo.
O Sr. Ministro da Marinha (Vítor Hugo de Azevedo Coutinho): — Sr. Presidente: depois das declarações que acabei de fazer, não sei que mais se possa exigir na discussão dessa moção.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: pedi a palavra para ver BO consigo definir os efeitos da aprovação dessa moção.
Pelos termos em que está redigida, não é um projecto de lei, nem uma proposta de resolução.
É, apenas, a afirmação de que esta Câmara deve pensar na revisão dos re-
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gulamentos em vigor, no tocante a socorros aos náufragos. Nada mais.
Nestas condições, dou o meu voto à moção, acrescentando, porque me parece oportuno, que a votação dela não dá ao Ministro ou ao Govêrno quaisquer poderes novos sôbre a matéria de que se trata.
Interrupção do Sr. António Fonseca que não se ouviu.
O Orador: — Podem introduzir as alterações de carácter estritamente regulamentar, mas com a condição de não irem além disso.
Assim eu, aprovando a moção, não tenho o intuito de alterar as disposições em vigor sôbre a matéria.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi aprovada a proposta do Sr. Leote do Rêgo.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: pedi a palavra para preguntar a V. Ex.ª se já está impresso o parecer relativo à proposta do Sr. Ministro da Justiça, para que seja revista com urgência a tabela judicial.
O Sr. Presidente: — O parecer está a imprimir.
Foi lido na Mesa e aprovado sem discussão o parecer n.º 435.
É o seguinte:
Parecer n.º 435
Senhores Deputados. — A vossa comissão de administração pública é de parecer que merece a vossa aprovação a proposta de lei vinda do Senado pela qual se procura autorizar, a continuarem ao serviço até aos 75 anos os funcionários que, atingindo a idade de 70 anos, forem julgados aptos para isso por uma junta médica, e que no exercício das suas funções tenham dado provas de muita competência.
Esta proposta tem toda a razão de ser e o Estado só pode ser beneficiado com a sua transformação em lei, pois se há funcionários que se impossibilitam com a avançada idade, há outros que mesmo bastante idosos manifestam uma vitalidade absolutamente suficiente para poderem desempenhar as suas funções de funcionário público com competência, solicitude e zêlo pelos interêsses do Estado.
Sucederá isto com criaturas possuídas duma natureza privilegiada?! Será assim; mas, se assim é, justo é também que a lei a seu favor mantenha um privilégio idêntico, pois com êle não serão feridos interesses legítimos do ninguém e serão respeitados justos interêsses do Estado e dos seus bons servidores.
Sala das sessões da comissão de administração pública, 26 de Fevereiro de 1923. — Ribeiro de Carvalho — Custódio de Paiva — Alberto Vidal — Pedro Pita — Alfredo de Sousa, relator.
Senhores Deputados. — A vossa comissão de finanças tendo examinado a proposta de lei vinda do Senado com o n.º 363-D, verificou que da sua conversão em lei só pode resultar uma deminuïção de despesa, facto êste que só por si, quando não houvesse a grande determinante de ordem moral que lhe deu origem, justifica a sua aprovação.
Sala das sessões da comissão de finanças, 2 de Março de 1923. — Tomé de Barros Queiroz (com restrições) — F. G. Velhinho Correia (com declarações) — Joaquim Ribeiro — Alfredo de Sousa — A. de Portugal Durão — Lourenço Correia Gomes — Carlos Pereira — A. Crispiniano da Fonseca — Aníbal Lúcio de Azevedo, relator.
Proposta de lei n.º 363-D
Artigo 1.º A alínea b) do § 2.º do artigo 75.º do decreto n.º 5:847-A, de 31 de Maio de 1919, fica assim redigida:
Alínea b) Os funcionários que atingirem a idade de 70 anos serão mandados inspeccionar por uma junta médica, continuando ao serviço activo, até aos 75 anos, os que para êsse serviço forem julgados aptos, e que no exercício das suas funções tenham dado provas de muita competência.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrário.
Palácio do Congresso da República, 7 de Setembro de 1922. — José Joaquim Pereira Osório — Joaquim Manuel dos Santos Garcia — César Procópio de Freitas.
Projecto de lei n.º 171
Senhores Senadores. — No momento em que é da máxima conveniência evitar-se quanto possível todo o aumento de des-
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pesa, cabe perfeitamente alterar-se o disposto na alínea b) do § 2.º do artigo 75.º do decreto n.º 5:847-A, de 31 de Maio de 1919, permitindo-se que os funcionários do Ministério do Comércio e Comunicações, ao atingirem a idade de 70 anos, possam, com o voto favorável da junta médica, continuar no exercício das suas funções até os 75 anos.
É isto uma medida justa ainda pela circunstância de muitos dos atingidos possuírem nessa idade aquele vigor preciso para o cabal desempenho dos seus cargos, e é também equitativa, porquanto é o Ministério do Comércio e Comunicações o único que possui uma disposição tam draconiana como prejudicial aos interêsses do Estado.
Nestes termos, e convencido de que proponho uma medida da qual resulta uma importante economia para o Tesouro Público, tenho a honra de apresentar o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º A alínea b) do § 2.º do artigo 75.º do decreto n.º 5:847-A, de 31 de Maio de 1919, fica assim redigida:
Alínea b). Os funcionários que atingirem a idade de 70 anos serão mandados inspecionar por uma junta médica, continuando ao serviço activo, até os 75 anos, os que para êsse serviço forem julgados aptos.
Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrário.
Sala das Sessões do Senado, 12 de Julho de 1922. — O Senador, José Augusto Ribeiro de Melo.
Senhores Senadores. — A vossa comissão de obras públicas, tendo examinado o projecto de lei n.º 171, da autoria do Sr. Senador José Augusto Ribeiro de Melo, e tendo em atenção o que se tem dado na prática, pois é do conhecimento de todos que bastantes funcionários do Ministério de Comércio tiveram de ser aposentados por terem atingido a idade de 70 anos, ainda em magníficas condições físicas e intelectuais, é de parecer que seja aprovado o presente projecto de lei.
Lisboa, 25 de Julho de 1922. — Herculano Jorge Galhardo — Artur Octávio Rêgo Chagas — B. da Cunha Baptista — Medeiros Franco — Rodrigo Guerra Álvares Cabral.
Senhores Senadores. — Foi apresentado a esta comissão de finanças o projecto de lei n.º 171, da autoria do ilustre Senador José Augusto Ribeiro de Melo, que tem por fim ampliar o limite de idade para os funcionários do Ministério do Comércio e Comunicações, passando de 70 anos para 75, quando uma junta médica os julgar em condições de continuar no serviço até esta última idade.
O aspecto financeiro do projecto é de molde a ser aceito pela vossa comissão, porque representa uma economia importante para o Tesouro Público, sem prejuízo do serviço.
Felizmente, encontram-se alguns funcionários, que a lei tem pôsto fora do serviço, e que conservam as necessárias condições físicas para continuar no serviço activo ainda além dos 70 anos de idade, o que prova a resistência da nossa raça.
É pois a vossa comissão de finanças de parecer que merece ser transformado em lei o projecto de lei n.º 171.
Sala das Sessões do Senado, 28 de Julho de 1922. — Herculano Jorge Galhardo — Júlio Ribeiro — Nicolau Mesquita — José Joaquim Fernandes de Almeida — Francisco de Sales Ramos da Costa, relator.
O Sr. Presidente: — Vai entrar em discussão o parecer n.º 470.
O Sr. Carvalho da Silva (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: creio que há um equívoco sôbre o requerimento do Sr. Tôrres Garcia para a discussão do parecer n.º 490. S. Ex.ª requereu que êsse parecer fôsse discutido sem prejuízo dos oradores inscritos para antes da ordem do dia.
O Sr. Almeida Ribeiro (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: desejava saber de V. Ex.ª o que consta da acta acêrca dêste parecer.
O Sr. Presidente: — A acta não diz se a discussão deve fazer-se com o prejuízo dos oradores inscritos.
O Orador: — Desde que a acta não declare nada a êsse respeito, eu creio que V. Ex.ª devia consultar a Câmara sôbre
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se a discussão se deve efectuar com ou será prejuízo dos oradores inscritos.
O Sr. Mariano Martins: — O parecer foi indicado na ordem da dia sem prejuízo dos oradores inscritos. A Câmara deve recordar-se disso; e, portanto, excusa V. Ex.ª de submeter a interpretação dêste requerimento ao voto da Câmara.
Assim se resolveu.
O Sr. Tôrres Garcia: — Sr. Presidente: há tempos o Presidente desta casa do Parlamento, Sr. Sá Cardoso, lembrou à Câmara a conveniência que havia em que ela fizesse a indicação dos seus representantes à comissão interparlamentar do comércio e a Câmara aceitou o alvitre de S. Ex.ª para que a presidência ficasse incombida de concertar com os leaders dos partidos desta Câmara a escolha dos seus representantes.
Vejo agora nos jornais que partiram para essa conferência como representantes do Parlamento os Srs. Augusto de Vasconcelos, Senador, e Cunha Leal, Deputado, e mais outros senhores.
Quando o Sr. Cunha Leal vier novamente a esta Câmara, eu terei ocasião de dizer a razão por que acho extranho o que se passou à volta dêste facto. Neste momento limito-me a pedir ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros que me elucide sôbre os motivos que, levaram S. Ex.ª a convidar estas ilustres personalidades a irem até Praga.
Só o Sr. Cunha Leal está alheado dos trabalhos desta Câmara e no propósito firmo de não continuar a ser Deputado, não me parece que devesse ser indicado para ser nomeado.
Mas, como disse, reservei as minhas considerações para o momento oportuno; e esperando ser satisfeito nesta ânsia de esclarecimentos, aguardo as explicações do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Domingos Leite Pereira): — Sr. Presidente: a comissão interparlamentar do comércio do Parlamento português reüniu há tempo — não posso neste instante percisar o dia — numa sala do Congresso da República, para escolher de entre os seus membros aqueles que deviam ir representar o Parlamento à conferência interparlamentar do comércio que êste ano reúne em Praga.
Nessa reunião, a comissão interparlamentar do comércio fixou que por motivos necessários de economia deviam, êste ano ser reduzidos os representantes parlamentares a 5, apenas, e indicou individualmente os ilustres parlamentares que deviam representar-nos na conferência interparlamentar do comércio em Braga. E assentou-se ainda que os representantes extraparlamentares que costumam tomar parto nessa conferência não deviam êste ano ser subsidiados pelo Tesouro da Nação, mas pelas entidades particulares que deviam representar.
Depois disso, efectuou-se nova reunião da comissão interparlamentar do comércio. Nessa reunião, a que eu estive presente, não se tomou nenhuma deliberação por falta de número.
Limitou-se especialmente a trocar impressões sôbre a maneira como os nossos representantes à conferência de Praga deviam conduzir-se. Tratava-se de escolher os pontos sôbre que especialmente deviam incidir as attenções dos delegados portugueses. Nova reunião ficou aprazada, mas não chegou a efectuar-se pela mesma razão: falta de número.
A comissão interparlamentar do comércio não pode por conseguinte tomar novas deliberações. Ficou apenas assente que a representação portuguesa devia, como tinha sido apreciado na única reunião efectuada, ser constituída por cinco delegados, cujos nomes foram indicados som nenhuma intervenção — que não tinha razão de ser — do Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Disse o Sr. Tôrres Garcia que viu nos jornais que partiram para Praga os Srs. Senador Augusto do Vasconcelos e Deputado Cunha Leal, e outros senhores, a convite do Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O que posso dizer ao ilustre Deputado e à Câmara é que sei que os delegados portugueses que partiram para representar o Parlamento foram apenas os Srs. Senadores Augusto de Vasconcelos e Ernesto Navarro.
Mais nenhum.
O Sr. Augusto de Vasconcelos pertence, como a Câmara sabe, ao Partido Na-
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cionalista que infelizmente não tem tomado parte nos trabalhos parlamentares. E, como eu sabia que tinham apenas de partir para Praga os Srs. Senador Augusto de Vasconcelos e Ernesto Navarro, porque os três restantes membros do Parlamento, indicados pela comissão interparlamentar de comércio, por motivos individuais e particulares a cada um deles, estavam na resolução de não ir representar o Parlamento Português a essa conferência, foi-me comunicado que os dois restantes não partiam, por isso que o Sr. Augusto de Vasconcelos se julgava obrigado a não o fazer por virtude da atitude parlamentar do seu partido, e o Sr. Ernesto Navarro resolvera não ir sozinho a essa conferencia. Foi-me, então, preguntado se eu via algum inconveniente, como era reconhecido por vários dos membros da comissão interparlamentar de comércio, na falta da nossa representação.
Declarei que, precisando Portugal de se fazer lembrar nessa conferência internacional, e, sendo êste ano a primeira vez, em que possivelmente o Parlamento Português ficava sem representação, me parecia, realmente inconveniente que essa representação se não fizesse.
Nesta altura veio de novo a alegação, de que nenhum parlamentar nacionalista podia desempenhar-se dessa missão que era inerente à sua função parlamentar; mas que o directório do Partido Nacionalista, se acaso recebesse do Ministério dos Negócios Estrangeiros qualquer indicação que julgasse inconveniente o facto da conferência interparlamentar do comércio não ter êste ano representantes nossos, talvez autorizasse os membros parlamentares dêsse partido a seguirem para representarem o Parlamento na conferência de Praga.
O Sr. António Fonseca: — A comissão parlamentar é que fez essa sugestão? Quem fez essa sugestão?
O Orador: — A comissão, quando reüniu, tomou a resolução de ser constituído por cinco parlamentares.
O Sr. António Fonseca: — Eu desejava que V. Ex.ª me dissesse donde partiu a sugestão que foi apresentada ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Orador: — O que posso dizer a V. Ex.ª e à Câmara é repetir o mesmo que já disse: «foi da comissão interparlamentar do comércio».
Sr. Presidente: a comissão resolveu que havia de ter representante no Parlamento em Praga, e o Ministro só tinha uma cousa a fazer: era dar as facilidades precisas.
Suponho que isto bastará para satisfazer os desejos de V. Ex.ª
O orador não reviu.
O Sr. António Fonseca: — O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros afirmou à Câmara que tinha recebido uma sugestão para conseguir que o directório do Partido Nacionalista autorizasse membros do seu Partido a representarem o Parlamento Português na conferência de Praga. Eu desejaria que S. Ex.ª esclarecesse donde partiu essa sugestão.
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Domingos Leite Pereira): — Eu já disse a V. Ex.ª e à Câmara que foi da comissão interparlamentar do comércio que fizeram a pregunta.
O Orador: — O que eu desejaria, então, é que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros conseguisse do directório do Partido Nacionalista que sanasse o conflito que há tanto tempo se arrasta, assim como conseguiu que êsse directório permitisse que os seus membros fossem a Praga. Pois se conseguiu que êles fizessem êsse sacrifício de ir para terras estranhas representar nobremente o Parlamento, poderia conseguir também que elos viessem à Calçada da Estrela representar nobremente as suas funções parlamentares.
Bom seria que o Ministro que teve tam bom êxito, nas suas diligências, empregasse os seus esfôrços, e fizesse as suas démarches, como os Deputados independentes, embora oficiosamente, para sanar e resolver o conflito...
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Domingos Leite Pereira): — Eu desejo apenas rectificar ou esclarecer um suposto equívoco que o Sr. António Fonseca quis ver nas minhas palavras.
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Eu entendi que era inconveniente que o Parlamento não se fizesse representar. Não há contradição nenhuma.
O Sr. António Fonseca: — V. Ex.ª ao menos pode tranquilizar-nos, dizendo-nos que não foi nenhum dos que partiram para Praga que fez essa sugestão?
O Orador: — A comissão julgou inconveniente que êste ano não houvesse representação de Portugal na conferência interparlamentar do comércio em Praga. Não tenho obrigação de assistir a todas as reuniões da comissão, nem da é obrigada a convidar-mo para todas as reuniões.
O Sr. António Fonseca: — O Ministro dos Negócios Estrangeiros!
O Orador: — O Ministro não tem sempre que tomar parte nas reuniões da comissão.
Muitas vezes o Ministro não pode fazê-lo, porque muitas vezes tem de usar da palavra no Parlamento quando tem do comparecer a essa reunião.
Não tinha por consequência que preguntar à comissão se tinha reünido para considerar se havia inconveniente na representação à conferência de Praga.
Não resta dúvida de que é de toda a conveniência, realmente para a Nação, haver representação nessa conferência.
Esta representação é mais reduzida que todas as representações anteriores. Nunca esteve representado Portugal apenas por dois membros, como acontece êste ano.
Apoiados.
O orador não reviu.
O Sr. Leote do Rêgo: — Sr. Presidente: quando tive a honra do falar referindo-me ao projecto do viagem aérea que vai ser realizada pelos distintos oficiais de marinha, os jornais fizeram alusões ao final do meu discurso.
Eu disse estranhar que, tratando-se duma viagem de grande importância, o Parlamento não tivesse sido informado.
Está presente o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, e espero que S. Ex.ª me fará a honra de me dizer o que há sôbre a projectada viagem aérea.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Domingos Pereira): — Sr. Presidentes não pode o ilustre Deputado Sr. Leote do Rêgo mostrar estranheza pelo facto de a Câmara não ter conhecimento ainda da viagem de circunnavegação de que tanto se tem falado, o que é um projecto do Sr. comandante Sacadora Cabral.
Não podia mostrar estranheza, porquanto, só anteontem entrou no meu gabinete a proposta do ilustre oficial, sôbre estudos por êle feitos.
Essa proposta vai ser estudada pelo Ministro; e então será dado conhecimento à Câmara das intenções do Govêrno sôbre a viagem a realizar.
Não podia o Govêrno pronunciar-se sôbre um assunto que está em estudos e que só agora foram entregues pelo comandante Sacadura Cabral.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — O Sr. Cancela de Abreu pede para tratar, dm negócio urgente, do atentado dinamitista que acaba do dar-se no tribunal da Boa Hora.
É rejeitado.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Então não aprovam isto? É um atentado contra os próprios tribunais.
Uma voz: — Para que é isso?
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: desejo preguntar ao Sr. Ministro da Justiça se tomou providências contra o atentado que acaba de dar-se.
Peço a palavra para antes de se encerrar a sessão.
Requeiro a contraprova.
Feita a contraprova, foi o negócio urgente rejeitado.
O Sr. Presidente: — Vai entrar-se na ordem do dia.
Tem a palavra o Sr. Pires Monteiro.
O Sr. Pires Monteiro: — Pedia a V. Ex.ª me informasse sôbre só está em discussão o capítulo 1.º e conjuntamente a proposta do Sr. Ministro da Guerra e a moção do Sr. António Fonseca.
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O Sr. Presidente: — Quando foi pôsto em discussão êste orçamento apresentou o Sr. Ministro da Guerra uma proposta e o Sr. António Fonseca uma moção que estão também em discussão.
ORDEM DO DIA
O Sr. Pires Monteiro: — Sr. Presidente: Fui dos Deputados que tiveram a honra de assistir à sessão de ontem.
A sessão foi interrompida à meia noite e meia hora, porque não havia número para votar um requerimento apresentado pelo ilustre Deputado Agatão Lança.
O Sr. Agatão Lança: — Nesse requerimento pedia isso mesmo.
O Sr. Presidente: — Isso Sr. Deputado não fez requerimento nenhum.
O Orador: — Apelo para toda a Câmara para que mo diga se é ou não verdade o que afirmo.
Estamos sem saber se realmente a proposta do Sr. Ministro da Guerra e a moção do Sr. António Fonseca estão em discussão juntamente com o orçamento da Guerra.
Eu apelo para a memória de V. Ex.ª Por mais de uma vez na sessão de ontem se disse que estava em discussão o capítulo 1.º
O Sr. Presidente: — A acta diz o seguinte:
Leu.
O Sr. Agatão Lança formula um requerimento para que entre também em discussão a matéria da moção do Sr. António Fonseca.
O Orador: — Por consequência deve-se principiar por votar êsse requerimento.
O Sr. António Maia: — Sr. Presidente: o último Deputado que usou da palavra foi o Sr. António Fonseca sôbre o modo de votar o requerimento do Sr. Agatão Lança; portanto, o primeiro a usar da palavra deveria ser eu.
O Sr. Presidente: — Tem V. Ex.ª a palavra sôbre o modo de votar.
O Sr. António Maia (sôbre o modo de votar): — Quer seja votada a proposta do Sr. Ministro, quer seja aprovada a moção do Sr. António Fonseca, a minha moção não prejudica os intuitos do Sr. Ministro da Guerra.
O Sr. José Domingues dos Santos: — Sr. Presidente: entendo que a proposta, do Sr. Ministro da Guerra deve ser considerada como uma questão prévia; e desde que o é, deve ser discutida antes da moção.
Nestes termos o orçamento voltará à comissão; o depois, quando viera Câmara, é que é a altura de se demonstrar se foi ou não cumprida a lei.
O Sr. Presidente: — A proposta já foi enviada para a comissão.
Trocam-se àpartes.
O Orador: — Tenho notado que sempre que se trata de questões militares tudo se complica e sempre nas melhores das intenções se aumentam os quadros e a despesa.
Eu sei que e muito preciso fazer-se uma reorganização dos serviços militares, mas na devida oportunidade e não na discussão do orçamento.
Temos uma comissão encarregada de proceder à reorganização dos serviços militares; mas eu pregunto: a que propósito vamos nós proceder a uma nova reorganização?
A discussão dos orçamentos serve para cada Deputado apresentar as suas opiniões e mostrar o seu valor intelectual; mas parece-me que temos deslocado as questões, e que se ganharia tempo apresentando ùnicamente um orçamento à inglesa.
Apoiados.
O orçamento inglês reduz se a doze páginas, e nós temos um volume que leva meses a discutir, quando afinal não é nos orçamentos que podemos modificar os serviços que estão instituídos em leis.
Assim, creio que a proposta do Sr. Ministro da Guerra deve ir à comissão do Orçamento, e a proposta do Sr. António Fonseca deve ser considerada em momento oportuno, mas não agora.
Tenho dito.
O orador não reviu.
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O Sr. António Fonseca: — Sr. Presidente: algumas considerações que acabam de ser apresentadas nesta Câmara obrigam-me a tomar a palavra.
Essas considerações — devo dizê-lo — respondem melhor aos factos que quaisquer argumentos que eu apresentasse.
Fui eu quem apresentou antes de ninguém ao Sr. Ministro da Guerra e aos Deputados militares a circunstância de haver vários erros cometidos na proposta orçamental dêsse Ministério.
Mostrei a necessidade de pôr êsse orçamento em harmonia com as leis existentes; e foi por isso que S. Ex.ª propôs que o orçamento em vez de ser discutido baixasse outra vez à respectiva comissão.
A minha moção no estudo do orçamento não complica nada.
Ela limita-se a ser por escrito a tradução das considerações do Sr. Ministro da Guerra.
Eu tenho o direito do apontar os erros de cálculo e principalmente os erros do deminuïção que se encontram num orçamento.
Foi o que fiz na minha moção.
Na primeira parte da minha moção, eu quero mostrar que os quadros estão alterados, o que, portanto, deve a Câmara resolver fixá-los em conformidade com as leis vigentes.
Na segunda parte da minha moção, eu aponto a necessidade de inscrever os supranumerários respectivos existentes, que não tinham verba por onde se lhes pagasse.
Isto evita uma proposta nova, e pode ser feito no orçamento do Ministério da Guerra, gastando-se assim menos tempo.
A minha moção não é pois inútil contém doutrinas que são como os assuntos de todas as moções dêste Parlamento.
Também na minha moção exprimo o desejo de que o Sr. Ministro da Guerra apresente ao Parlamento as providências necessárias para reduzir os quadros do serviço permanente e para encurtar as despesas com o pessoal do Ministério da Guerra.
Àpartes.
O Orador: — Mas a minha moção deve ir à comissão de guerra ou à comissão do Orçamento — tem-se dito.
Àpartes.
Por último, devo declarar que para examinar se é justo e oportuno fazer-se a composição dos quadros, como propôs, o Sr. Tôrres Garcia, não sei que haja comissão mais própria do que a comissão de guerra.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Hoje tem razão.
O Orador: — Creia V. Ex.ª que eu raramente a tenho.
O Sr. Carvalho da Silva: — Apoiado.
Sr. Presidente: segundo o Regimento as primeiras cousas a votar são as moções.
Trocam-se àpartes e explicações entre o orador e o Sr. José Domingues dos Santos, simultaneamente.
Mas eu bem sei porque a maioria não quere votar a minha moção. É porque não quere dar à comissão de guerra nenhuma directriz.
É porque se julga que com isso pode ficar deminuída a comissão do orçamento.
É esta a razão, não há mesmo nenhuma outra.
Devo declarar que me é inteiramente indiferente que votem ou não a minha moção.
Enviando-a para a Mesa, senti que cumpri o meu dever. Fundamentei-a em números que publicarei para que o público saiba a razão do meu procedimento.
A maioria democrática entende que não deve considerá-la? Está no seu direito?
As democracias — continuo a sustentar — são o regime das maiorias. Não me importa que, a respeito de qualquer proposta minha ou qualquer questão levantada por mim, a maioria e as minorias tomem as atitudes que entenderem. Cada um toma a responsabilidade dos seus actos e o País os apreciará.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Pires Monteiro: — Sr. Presidente: não obstante as observações feitas há pouco pelo Sr. José Domingues dos Santos, ilustre leader do Partido Democrático, eu uso da palavra, porque, como militar que sou, me julgo com autoridade para abordar a questão. Não é meu intuito confundir a discussão.
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Disse o Sr. Domingues dos Santos que, havendo uma comissão encarregada de estudar e apresentar a reorganização dos serviços públicos, é inoportuno que na proposta do orçamento da guerra se esteja a pretender remodelar o exército, cousa que eu acho necessária, como disse na declaração do voto apensa ao parecer do orçamento.
Devemos lembrar-nos de que essa comissão ainda nada fez e é urgente que a remodelação do exército se faça. Se efectivamente essa comissão nada tem feito, a culpa não é do seu presidente, a quem todos prestamos sincera homenagem pela sua grande competência, pelo seu amor ao estudo, e pela sua dedicação ao prestígio parlamentar. Essa falta provém do mau funcionamento do regime da Câmara a que me honro de pertencer.
Não é segredo que as comissões parlamentares não funcionam nos termos que estão marcados no Regimento.
A reorganização dos serviços públicos não se pode fazer.
Com os fracos recursos que possuo, na sessão legislativa passada tive a honra de apresentar aqui a minha opinião sôbre o assunto, condenando a forma como se pretende remodelar os serviços do Estado. Referi, então, que a Inglaterra conseguira êsse trabalho, incumbindo um parlamentar de estudar e apresentar a reforma necessária.
Êsse parlamentar desempenhou-se de tal missão, obedecendo a uma única directriz que foi a de reduzir de 100 milhões de libras esterlinas o orçamento do Estado Inglês. Assim a Inglaterra conseguiu o equilíbrio orçamental.
Em Portugal não se consegue isso. Pelo contrário, o Parlamento só tem agravado todos os orçamentos, e especialmente o da guerra. É preciso que se diga isto.
Pelas leis n.ºs 1:239 e 1:250, que eu e outros parlamentares condenamos, foram feitas imensas promoções; e não veio ainda remédio para êsse mal. Eu apresentei um projecto respeitante à forma de se fazer as promoções, mas ficou na comissão de guerra, à espera da almejada organização do exército.
Como quere a Câmara modificar a situação actual, deixando correr o tempo sem nada fazer nesse sentido?
Eu tenho a convicção, aliás dolorosa, de que não fazemos uma obra decisiva e útil se não obrigarmos os Ministros, inclusivamente pela violência, a apresentar as medidas indispensáveis que possam servir de base a uma quanto possível perfeita organização dos serviços do Ministério da Guerra...
O Sr. José Domingues dos Santos: — A culpa não é só dos Ministros; a culpa é de nós todos.
O Orador: — A culpa é efectivamente de todos nós; dos Ministros, porque não sabem exigir da maioria que os apoia a colaboração necessária; da maioria que não coadjuva os seus Ministros; o das minorias que ou se alheiam dos trabalhos parlamentares ou procuram impedir por todas as formas o seu prosseguimento.
O Sr. Carvalho da Silva: — Não apoiado.
O Orador: — É exactamente a minoria monárquica a que menos tem sabido cumprir o seu dever. Dos seis Deputados que a compõem apenas três comparecem às sessões. Quere dizer: a minoria monárquica faz-se habitualmente representar por 50 por cento dos seus membros.
O Sr. Vitorino Godinho: — É porque os monárquicos julgam e com razão que estão excessivamente representados.
Risos.
O Sr. Carvalho da Silva: — Um Govêrno só pode estar nesse lugar quando tem os meios constitucionais para governar. Ora, quando um Govêrno tem uma maioria que, por desleixo, lhe não faculta êsses meios, essa maioria não cumpre o seu dever.
O Orador: — Sr. Presidente: terminando, devo declarar que não vejo necessidade de que o orçamento volte novamente à comissão de guerra.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Em primeiro lugar devo notar que mais de uma vez se prova quanta razão tinham as oposi-
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ções ao rejeitar a proposta do Sr. António Fonseca. Mais uma vez a discussão do Orçamento se atrapalha por causa duma proposta.
Se ontem, em lugar da proposta apresentada pelo Sr. Ministro da Guerra, S. Ex. a tem apresentado um requerimento, nada disso se tinha passado. Mas o Sr. Ministro não pôde fazê-lo porque não havendo número, isto é, estando a Câmara a funcionar nos termos da proposta do Sr. António Fonseca, não poderia fazer-se a consulta para a aprovação dêsse requerimento.
Assim se perdeu ontem inùtilmente mais uma sessão.
Foi a única maneira, embora não havendo numere, de a Câmara poder funcionar.
Sr. Presidente: do que não resta dúvida alguma é que o Orçamento não representa a verdade, está errado, o que é deveras para lastimar, pois é lamentável que se apresentem à Câmara orçamentos errados.
Lastimo profundamente o facto, que é verdadeiro, esperando assim que êle volte à comissão de guerra para o estudar e verificar.
A moção, pois, a meu ver, do Sr. António Fonseca, desta vez tem razão de ser, tanto mais quanto é certo que ela vem dar satisfação à opinião do País do norte ao sul, visto que ela tem por fim fazer com que sejam reduzidas as despesas públicas.
Estou certo, pois, de que a Câmara não deixará de votar a moção do Sr. António Fonseca, que representa uma indicação à comissão do Orçamento para ela assentar es seus trabalhos, dando nós nestas condições também o nosso voto à moção que S. Ex.ª mandou para a Mesa.
O Sr. Pires Monteiro: — Eu devo dizer a V. Ex.ª que, neste momento, não se se trata de dar o nosso voto à moção do Sr. António Fonseca; trata-se de a discutir.
Embora nós possamos concordar com a sua idea, poderemos, no emtanto, discordar com as suas disposições; e assim necessário se torna que a Câmara apresente o seu modo de ver sôbre o assunto.
O Orador: — V. Ex.ª com o seu àparte não veio senão reforçar a nossa opinião, o que eu muito lhe agradeço, tanto mais tratando-se de uma autoridade, como S. Ex.ª é, em assuntos militares.
Necessário se torna, repito, que a Câmara tome uma deliberação sôbre o assunto, a fim de que a comissão possa assentar os seus trabalhos.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: parece-me que a proposta enviada para a Mesa pelo Sr. Ministro da Guerra, em face do Regimento, é verdadeiramente uma questão prévia, tendo sido mandada para a Mesa pura ficar em discussão juntamente com o assunto que se discute, que é o capítulo 1.º do orçamento do Ministério da Guerra. É o que o Regimento diz a tal respeito.
A Câmara não pode de forma alguma, tomar uma resolução sôbre o orçamento, por isso que êle está errado, necessitando portanto de ser revisto.
É precisamente uma questão prévia, nem outra cousa pode ser, a meu ver.
O Sr. Ministro da Guerra propõe que a proposta orçamental volte à comissão do Orçamento para uma resolução, o que quere dizer que a Câmara não pode deliberar sôbre a proposta tal qual como ela está. Isto é uma questão prévia, repito, a não ser que a Câmara delibere o contrário.
Nesta altura estabeleceu-se larga discussão entre o orador e os Srs. António Fonseca e Domingues dos Santos que não foi possível reproduzir.
O Orador: — É uma questão prévia para todos os efeitos, segundo o meu modo de ver.
O Sr. António Fonseca: — V. Ex.ª com a autoridade que tem e como leader da maioria poderá levar a Câmara a pronunciar-se nesse sentido; porém, eu devo dizer em abono da verdade que não estou de acôrdo com S. Ex.ª
O Orador: — Não tenha V. Ex.ª dúvidas: é uma questão prévia nos termos do Regimento.
Dizia eu, Sr. Presidente, que, desde que da proposta do Sr. Ministro da Guerra resulte que a proposta orçamental não
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pode ser discutida, em quanto não for revista, em relação aos erros que contém, ela é uma questão prévia que se deve discutir com a proposta orçamental ou em separado, como a Câmara quiser, devendo ser votada antecipadamente porque é uma questão de forma de trabalho. Está na natureza da própria proposta que ela seja votada em primeiro lugar.
Votada ela — e imaginemos que é votada — resta saber só a moção do Sr. António Fonseca deverá ser votada logo a seguir à proposta do Sr. Ministro da Guerra ou mais tarde.
O Sr. António Fonseca: — Não pode deixar de ser votada imediatamente.
O Orador: — A moção do Sr. António Fonseca não tem o mesmo objectivo, o mesmo alcance da forma que tem a proposta do Sr. Ministro da Guerra. A moção de S. Ex.ª interessa à própria essência da proposta orçamental. Evidentemente essa moção tem de ser votada, mas precedendo a votação da proposta orçamental.
Parece-me, portanto, que o que há a fazer é votar-se como questão provia, que realmente é, a proposta do Sr. Ministro da Guerra; e quanto à moção do Sr. António Fonseca, à qual aliás não tenho dúvida alguma em dizer que presto a mais completa, a mais perfeita adesão, porque a li atentamente e estou inteiramente de acôrdo com ela, parece-me que não pode ser votada como questão prévia. Mas porque ela interessa, como já disse, à própria essência da proposta orçamental, deve ser votada antecipadamente a essa proposta.
Sr. Presidente: se V. Ex.ª me permite, vou dizer agora duas palavras, que são uma simples repetição do que já disse em resposta ao Sr. Pires Monteiro sôbre a questão da remodelação dos serviços públicos.
A comissão encarregada dêsse assunto tem o mesmo vício de funcionamento de todas as comissões parlamentares. Essa comissão tem duração até 20 e tantos de Junho; mas como temos entre mãos tarefas tam importantes que a lei lhe atribuiu, creio poder desde já declarar que será impossível que essa comissão dê até essa data conta dos seus trabalhos. Existirá ela, porventura, até aparecer o trabalho da sub-comissão?
Não o posso dizer com segurança; mas o que me parece é que o facto de estar êsse assunto afecto à, comissão não contraria de forma alguma a iniciativa ministerial paru que os Ministros apresentem todas as propostas que entenderem convenientes.
Parece-me que as duas cousas não colidem.
Não há lei alguma que diga que, emquanto existir uma comissão, os Ministros ficam privados de apresentar qualquer proposta para remodelação de quaisquer serviços dependentes do seu Ministério.
Não será possível, portanto, entender-se que a moção do Sr. António Fonseca, na parte em que recomenda ao Govêrno uma remodelação de quadros, brigue com quaisquer disposições legais. Entendo que as duas cousas não brigam; são perfeitamente compatíveis.
Repito: o facto de essa comissão demorar os seus trabalhos não quere dizer que o Govêrno ou qualquer Ministro não possa formular as propostas que quiser e quando entender.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. António Maia: — Sr. Presidente: quere-me parecer que a proposta do Sr. Ministro da Guerra não pode ser considerada como uma questão prévia. O artigo 109.º do Regimento diz:
«Em qualquer estado do debate poderá suscitar-se uma questão ou moção de ordem.
São moções de ordem: a questão prévia, o aditamento, a invocação do Regimento, a apresentação de propostas para eliminação, emendas, substituições ou aditamentos, e a proposta para se passar à ordem do dia».
No § único do artigo 101.º diz-se:
«Não serão submetidos à votação da assemblea os aditamentos, substituições, propostas e emendas atinentes a modificar os projectos ou pareceres em debate sem previamente serem sujeitos ao exame das comissões correspondentes, se os seus autores assim o reclamarem».
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No artigo 108.º diz-se como são classificadas essas propostas:
«Serão classificadas emendas as propostas que, conservando parto do texto da proposição que se discuto, restringirem, ampliarem ou modificarem a matéria principal.
Aditamentos — As propostas que contiverem matéria nova que só acrescento à proposição ou discussão, conservando a parte textual da proposta primitiva, mas ampliando-a, ou explicando-a.
Substituïções — As propostas que contiverem disposição diversa ou contrária àquela que se discute».
Parece-me, portanto, que a proposta do Sr. Ministro da Guerra terá de ser remodelada como uma emenda ou como um aditamento da discussão.
Uma voz: — Nem uma cousa nem outra.
O Orador: — Não sei porquê. Pode ser uma emenda porque tende a modificar o texto da proposta orçamental, ou então um aditamento da discussão.
Diz o § único:
«Se a classificação das propostas mandadas para a Mesa fôr impugnada, o Presidente deverá sôbre o caso abrir discussão».
Vamos agora ver o que o Regimento diz relativamente a questões prévias:
«Artigo 109.º — § 1.º A questão prévia dá-se sempre que um Deputado proponha que a assemblea, por qualquer motivo, não pode deliberar concernentemente à matéria que discute, e, sendo apoiada por cinco Deputados, considerar-se há admitida, entrará em discussão e será resolvida antes da questão principal».
A segunda parte é exactamente o que o Sr. Ministro da Guerra propõe, e pode ocupar o lugar da questão principal e discutida com o Orçamento.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se o requerimento do Sr. A gatão Lança.
O Sr. Almeida Ribeiro (sôbre o modo de notar): — Requeiro a discussão do requerimento do Sr. Agatão Lança em duas partes: a que se refere à proposta do Sr. Ministro da Guerra e a que diz respeito à moção do Sr. António Fonseca.
Foi aprovado.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º
Foi aprovado.
Sentados 48 Srs. Deputados, de pé 7.
Foram aprovadas as duas partes do requerimento do Sr. Agatão Lança, em prova e contraprova, requerida pelo Sr. Cancela de Abreu.
O Sr. Presidente: — Vai abrir-se uma inscrição especial.
O Sr. Pires Monteiro: — Eu desejaria que V. Ex.ª me informasse só as disposições especiais respeitantes ao Orçamento são aplicáveis à discussão desta proposta.
O Sr. Presidente: — Assim tem sido, visto referirem-se ao Orçamento.
O Orador: — Podendo apenas falar meia hora, então desisto da palavra.
O Sr. António Fonseca: — Eu desejaria saber se a discussão da proposta está sujeita às novas disposições regimentais.
O Sr. Presidente: — Assim se compreende.
O Orador: — Não compreendo; pois aqui não há capítulos, há uma proposta.
O Sr. Carvalho da Silva: — As alterações ao Regimento referem-se a capítulos do orçamento.
V. Ex.ª diz-me onde estão os capítulos na proposta do Sr. Ministro da Guerra?
O Sr. Presidente: — Não é capítulo nenhum; mas a norma adoptada tem sido sempre esta.
Vou, portanto, consultar a Câmara e farei o que ela me indicar, tanto mais
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que tenho dúvidas sôbre a interpretação do Regimento nesta parte.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu (para invocar o Regimento): — As alterações ao Regimento feitas no ano passado estabelecem no artigo 4.º as normas a aplicar.
Se se trata dum capítulo, aplica-se-lhe êste artigo. Fora dêste caso, também é escusado consultar a Câmara.
O Sr. Presidente: — A proposta do Sr. Ministro da Guerra foi apresentada a propósito do capítulo 1.º
O Sr. António Maia (para invocar o Regimento): — Sr. Presidente: a Câmara há pouco deliberou que a proposta apresentada pelo Sr. Ministro da Guerra devia ser considerada como uma questão prévia; o sendo assim ela ocupa o assunto principal e discute-se antes da ordem do dia.
É isto o que diz o § 1.º do artigo 109.º
Se só trata, portanto, duma questão prévia, a proposta do Sr. Ministro da Guerra tem do ser discutida como questão principal, antes da ordem do dia.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Supunha eu, Sr. Presidente, que V. Ex.ª tinha feito uma consulta à Câmara sôbre se à discussão da proposta do Sr. Ministro eram ou não aplicáveis as disposições do Regimento respeitantes à discussão do Orçamento, parecendo-me, portanto, que a essa consulta a Câmara tinha de responder, votando.
Se assim é, eu venho dizer a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que, embora me pareça difícil afirmar que a proposta do Sr. Ministro da Guerra é estranha ao Orçamento, não tenho dúvida em declarar, em nome dêste lado da Câmara, que concordo em que a discussão da proposta do Sr. Ministro da Guerra se faça como se ela não fôsse respeitante ao Orçamento.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vou consultara Câmara sôbre só entende ou não que à discussão da proposta do Sr. Ministro da Guerra devem ser aplicadas as disposições regimentais respeitantes à discussão do Orçamento.
Consultada a Câmara, resolveu negativamente.
O Sr. Pires Monteiro: — Sr. Presidente: começo por agradecer ao Sr. Almeida Ribeiro a interpretação que quis dar à forma como deve ser discutida a proposta do Sr. Ministro da Guerra.
Evidentemente, eu não sei nem está nos meus princípios fazer obstrucionismo; basta a circunstância de eu fazer parte duma minoria republicana que quero colaborar com toda a sua boa vontade nesta obra patriótica que temos de realizar e que consiste em dar ao Estado português, que é dar à República, uma legislação que lhe permita viver dentro da Constituïção.
Agradeço a maneira liberal como a maioria democrática encarou esta questão.
Reitero-lhe o meu sincero reconhecimento; porque tendo ouvido falar em ditadura democrática eu neste ponto e neste momento tenho a constatar que o Partido que tem maioria nesta casa do Parlamento não fez essa ditadura.
Se realmente a proposta do Sr. António Fonseca tem tido execução, a culpa é tanto da maioria como das minorias que não têm vindo em número suficiente para que as votações se possam efectuar. Conseqúentemente, Sr. Presidente, vendo que a maioria democrática quere realmente uma oposição sincera e não pretende sufocar esta insignificante oposição republicana, sinceramente republicana, como é a oposição que lho posso fazer, eu vejo confirmada a minha opinião do que realmente o Partido Democrático tem razão na orientação que seguiu quando só colocou fora do incidente parlamentar.
Sr. Presidente: é muito agradável ver que da classe civil se manifesta um grande interêsse pelas cousas militares e que pessoas do valor do Sr. António Fonseca tomam, parte importante no debate que se está travando.
O Sr. Ministro da Guerra veio propor que o orçamento volto ao estudo da comissão, porque estão errados muitos dos seus números.
Não tomarei por muito tempo a atenção da Câmara; e se levantei esta ques-
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tão foi para salientar êste facto: que a maioria não quere fazer ditadura democrática com o número de que dispõe nesta casa do Parlamento.
O actual relator do orçamento, por quem tenho muita consideração, já desempenhou êsse lugar há muitos anos.
Sem desprimor para S. Ex.ª, julgo que seria conveniente que os relatores dos orçamentos se revezassem.
Desta vez é mais decisivo o para êste facto chamo a atenção da Câmara e do Sr. Ministro da Guerra.
Disse o ilustre Deputado. Sr. Pinto da Fonseca, que é necessário ir para a frente, reorganizando os serviços do exército. Se bem que com menos violência, S. Ex.ª e ano passado disse a mesma cousa; mas não é pela discussão do orçamento que se reorganiza o exército. Durante um largo lapso de catorze meses, que vai decorrido desde a discussão dos orçamentos de 1922-1923, nada, absolutamente nada se fez pela parte do Govêrno que permitisse melhorar e exército. É certamente assim continuaremos, porque o Sr. Ministro da Guerra, que há já alguns meses ocupa êsse elevado cargo, ainda não pôde ou não quis conseguir da comissão, de guerra que ela dêsse os pareceres respectivos e que a maioria lhe concedesse o apoio necessário para que algumas medidas indispensáveis para o exército fossem aprovadas.
Não é segrêdo para o Sr. Ministro da Guerra, um técnico de excepcional competência, um oficial ilustre que aos serviços militares se dedica há muitos anos, que os problemas mais graves que devem prender à nossa atenção são o das promoções desordenadas que se têm feito e o da falta de instrução dos quadros, para o que não há a verba necessária, verba que não vemos incluída no projecto de orçamento que há-de ser discutido nesta Câmara.
Isto é que magoa todos aqueles militares que ao exército dedicam carinhosamente o seu interêsse e o seu estudo.
Se assim caminharmos, continuaremos nesta atonia mental, nesta atrofia moral em que temos permanecido há muitos anos.
Não devemos deixar que o exército que lutou nos campos da batalha, que sacrificou milhares de vidas em África e em França, continue sem que seja possível um melhoramento, sem que consiga obter um aperfeiçoamento para os seus organismos.
Não sou da opinião do Sr. Tôrres Garcia, quando diz que deviam ser empregadas medidas violentas contra aqueles que num dado momento não souberam cumprir devidamente as suas obrigações.
Passo uma esponja sôbre êsses factos; e tenho autoridade moral para o fazer, porque não há no meu passado cousa alguma que me possa manchar.
Intervencionista sincero, querendo que Portugal entrasse na guerra, aproveitei todas as oportunidades que se mo ofereceram para cumprir o meu dever.
Mas, Sr. Presidente, não acho que devamos estar constantemente a mexer no passado quando dele não pode vir uma luz mais resplandecente que ilumine o futuro.
O Sr. Tôrres Garcia: — Não apoiado.
O Orador: — O que é indispensável é melhorar o futuro, é que o Sr. Ministro da Guerra ou algum Deputado, por sua iniciativa, apresento aqui aquelas medidas necessárias para seleccionar os quadros: é que se trate de dar ao corpo de oficiais do exército aqueles elementos de estudo de que absolutamente carece.
A remodelação a que aludo na minha declaração de voto, apensa ao parecer que acompanha o orçamento do Ministério da Guerra — e para êste facto chamo a atenção do Sr. Ministro da Guerra e do Sr. relator do orçamento — apresenta-se-me de tal maneira simples que a julgo possível dentro das atribuïções do Poder Executivo.
Eu penso que, sem reorganização do exército, executando a actual lei orgânica, mas fazendo aquilo a que chamo administração, se pode conseguir realmente aquele objectivo que pretendemos.
O grande mal do exército está na dessiminação dos seus elementos.
Se o Ministério da Guerra, em lugar de no seu orçamento distribuir verbas por tantas e tantas unidades que estão dessiminadas pelo País, concentrar êsses efectivos, consegue realizar uma apreciável economia. Se, não falando em reorganizações, o Sr. Ministro, ao abrigo dum
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artigo — creio que o artigo 232.º — da lei orgânica, modificar a chamada Secretaria da Guerra, S. Ex.ª terá, também, conseguido assim sensíveis economias. O mesmo conseguirá S. Ex.ª, se tirar do seu projecto de orçamento a verba de 300 contos que ainda hoje está destinada a oficiais da reserva chamados ao activo.
E não se julgue que isto representa uma violência que vá tirar o pão a quem dele necessita, visto que os reformados que se acham ao serviço, em virtude das leis das subvenções, têm uma gratificação por de facto prestarem serviço.
Êsses 300 contos poderiam ser, por exemplo, destinados às escolas de repetição, que há tantos anos só não realizam.
É um alvitre que eu ouso lançar nestas desataviadas considerações que a proposta do Sr. Ministro da Guerra me sugere.
Mas há mais. Analisando o projecto de orçamento, o Sr. relator encontrará muitas modificações úteis a fazer.
Não precisa S. Ex.ª das minhas lições, nem são ideas absolutamente inéditas as que eu venho aqui apresentar.
S. Ex.ª tem em alguns dos orçamentos dos outros Ministérios uma norma mais razoável de discriminar a aplicação dos dinheiros públicos do que a adoptada para o Ministério da Guerra. No orçamento do Ministério da Guerra há fundamentalmente dois capítulos, o que trata do pessoal e o que se refere a material e solípedes.
Os estabelecimentos que existem no Ministério da Guerra têm as suas verbas divididas pelos dois capítulos; de forma que se torna impossível saber quanto se gasta em cada um dêsses estabelecimentos.
Lembrava que devia fazer-se o mesmo que se fez em outros Ministérios.
Não há legislação alguma que se oponha a esta orientação. Parece-me até mais fácil para a análise do Orçamento a organização que acabo de referir.
Mas há mais: no capítulo 1.º do artigo 2.º que se refere aos quadros do exército, estão servindo todos os quadros orgânicos e ainda os elementos que não existem realmente reünidos.
Interrupção do Sr. Pinto da Fonseca que não se ouviu.
O Orador: — V. Ex.ª vai procurar os outros orçamentos, e aí sabe-se qual a verba destinada a cada unidade.
Há a obra social do exército. Os quadros não estão incluídos no orçamento dêsse estabelecimento. Mas no capítulo 2.º — quadros permanentes do exército — não podemos discutir esta questão, e saber quanto custam os serviços de solidariedade do exército.
Não vinha prevenido para esta questão prévia.
Cumpro o meu dever de Deputado, o que faz com que V. Ex.ªs me estejam ouvindo falar no que respeita ao Ministério da Guerra.
Ora digam-me V. Ex.ªs, não é isto um absurdo?
Em 1911 — eu chamo para êste facto a atenção do Sr. Ministro da Guerra e ilustre relator da comissão do guerra — existiam ao serviço da Secretaria do Ministério da Guerra 79 oficiais e 39 amanuenses.
Pois quero a Câmara saber quantos existem hoje?
177 oficiais e 65 amanuenses.
Eu faço esta revelação, não porque me mova o mais insignificante despeito por essa secretaria; ao contrário, eu não tenho senão razões de reconhecimento, pois que, sempre que desejo quaisquer documentos, êles me são facultados com a máxima prontidão.
Mas a verdade é que uma tam complicada e extensa engrenagem burocrática é verdadeiramente inadmissível, porque não corresponde a quaisquer necessidades ou conveniências do exército.
A reforma da Secretaria do Ministério da Guerra impõe-se e impõe-se por tal forma que o Sr. Ministro da Guerra não pode estar à espera dessa fantástica reorganização que se vem anunciando há cinco anos e que deve ser o produto dos ensinamentos colhidos na Grande Guerra.
Eu sei que alguns Ministros são muitas vezes absorvidos por trabalhos violentos, tal a multiplicidade de assuntos por que têm de repartir as suas atenções, mas quere-me de há muito parecer que haveria maneira de modificar o funcionamento do Ministério da Guerra, de modo a dispensar os cuidados do Ministro nos assuntos de somenos importância.
Nós temos ido, nestes últimos tempos,
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de mal a pior, obstinados como estamos em não mudarmos de processos e de hábitos.
Eu sei que os mesmos fenómenos se produzem em outros, ou, melhor, em todos os departamentos do Estado; mas, por isso mesmo, é que eu vejo necessidade em arripiarmos caminho e seguirmos novas directrizes.
Há pouco ainda um homem público inglês afirmava que a única forma de reduzir e aniquilar a burocracia era suprimir os amanuenses. Creio que um tal princípio deve constituir uma óptima indicação ao Sr. Ministro da Guerra.
É preciso criar iniciativa, descentralizar funções e desburocratizar o exército.
Siga o Sr. Ministro da Guerra êste caminho com todo b desassombro e terá bem servido o seu País.
Sr. Presidente: há no exército português oito divisões militares. Eu sou de opinião que se devem manter essas oito divisões no continente da República. Mas essas oito divisões, segundo a moderna orientação francesa, devem constituir apenas regiões de recrutamento, de remonta e da mobilização, dividindo essas oito divisões ou circunscrições em quatro distritos de recrutamento, para adoptar os princípios de divisão dos trabalhos que tam excelentes resultados tem dado.
Não compreendo esta maneira de funcionar o Parlamento e esta maneira de os vários Ministérios não se entenderem, uns com os outros quando afinal o Estado é um único organismo.
Eu disse já a V. Ex.ª que manteria as oito divisões, mas a comissão de guerra desta Câmara poderia talvez reduzir uma ou outra.
O Sr. Ministro da Guerra também poderia reduzir o quadro de oficiais generais que são vinte, e que bastariam ser só doze.
Estou à vontade dizendo isto, porque não tenho as estrelas de general no meu punho.
Entendo que o Sr. Ministro da Guerra ou qualquer Sr. Deputado poderia usar da iniciativa de trazer a esta Câmara um projecto que reduzisse o quadro dos oficiais generais de vinte a doze, o que traria uma economia de 40 contos.
Será uma insignificância?
Mas muitas importâncias pequenas fazem uma grande soma.
Eu não estou a discutir o projecto que tenciono apresentar à Câmara em breve; mas quero ainda dizer ao Sr. António Maia que os generais que saem do quadro vão para a reserva.
Quanto ao Sr. Carvalho da Silva, desejo dizer que mais vale um quadro que seja activo declaradamente do que irrisòriamente inactivo.
Nós temos muitos indivíduos que não estão em condições já de trabalhar; e assim eu pediria ao Sr. Ministro da Guerra que deminua as divisões, podendo algumas ser núcleos de instrução para melhorar o exército.
Outras considerações desejo fazer, mas só com o fim de apreciar o orçamento do Ministério da Guerra.
Desde que a Câmara me permite fazer estas considerações, não as repetirei quando vier à discussão êsse orçamento. E com o que eu estou dizendo não se pode afirmar que estamos a perder o tempo.
Uma outra questão importante é a dos serviços do recrutamento.
Eu julgo que é possível suprimir os distritos de recrutamento e os regimentos de reserva, e ao Sr. Ministro da Guerra não será semelhante tarefa muito difícil, visto que êles não têm absolutamente nada que fazer, apesar dalguns dêles terem dois oficiais superiores, primeiro e segundo comandantes. De facto, Sr. Presidente, se o nosso exército fôsse aquilo que devia ser, êles teriam imenso que fazer.
Todavia, repito, suponho que o Sr. Ministro da Guerra pode não nomear mais oficiais para os regimentos de reserva, e fundi-los com os do activo, passando para êstes os serviços do arquivo, que, aliás, é a única função que aos de reserva compete.
Sr. Presidente: igualmente os distritos de reserva podem ser suprimidos, desde o momento em que êsses serviços, recrutamento, mobilização o remonta, passem a cargo dos regimentos do activo.
V. Ex.ª, Sr. Presidente, e a Câmara sabem que temos muitas e muitas comissões que nada fazem, não porque os membros que as compõem não tenham vontade de trabalhar, mas porque não têm elementos para trabalhar. Temos muitas comissões de estudo, mas a verdade é que as verbas que lhes são destinadas são exíguas.
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Porque é que o Sr. Ministro da Guerra não traz ao Parlamento uma medida para que essas comissões sejam reduzidas a uma?
Dir-me há o Sr. Ministro da Guerra que tem muitos oficiais e não sabia depois o que lhes havia de fazer.
Mas isto é a minha tese. Eu entendo que cada função do vê ter o número necessário de funcionários. Não deve ter de mais nem de menos.
Se tem funcionários de menos uma certa parte da função não se executa; se tem demais dá-se a confusão dessas funções.
Portanto, Sr. Presidente, a êsses oficiais seria dada uma situação como a de disponibilidade, que, estou convencido, muitos prefeririam.
Por que meio se há-de dar incitamento a esta organização?
Fazendo uma boa selecção, como consta do projecto que na sessão legislativa passada eu apresentei, e que ainda espera a apreciação da comissão de guerra, que a torna dependente da nova organização.
Mas o que tem a nova organização com a lei de promoções?
Entendo que o orçamento da Guerra deve ser remodelado.
É indispensável criar os organismos que assegurem o bom funcionamento do exército.
Os homens que vêm cumprir o seu primeiro dever cívico voltam às suas casas desiludidos.
A instrução é-lhes dada em más condições, porque não se tem feito a selecção dos instrutores, nem a coordenação de métodos.
Finalmente, o sorteio para o quadro permanente é uma cousa horrorosa, a ponto que já se negoceia com o serviço militar.
Eu fui um dos entusiastas defensores da organização de 1911; mas a verdade é que ela tem sido desvirtuada.
Desculpem V. Ex.ªs que eu fale dos meus projectos. Apesar de não serem aprovados, não estou arrependido de os ter apresentado, porque o ano passado apresentei um que fazia a redução da escola de recrutas e que jaz na pasta fatídica da reorganização do exército. Por êsse projecto uma grande deminuïção de despesa se fazia, e para êle chamo a atenção do Sr. Ministro da Guerra.
Por exemplo, não tendo o nosso exército grande número de cavalos, porque a verba para a sua compra é muito reduzida, desnecessária é uma larga encorporação de recrutas de cavalaria.
Sem desprimor para ninguém, é difícil fazer-se um estudo comparativo por falta de estatísticas.
Eu, Sr. Presidente, devo dizer que na Câmara já existe um projecto sôbre o assunto, da autoria do Sr. Ministro da Guerra, projecto êsse que, a meu ver, devia ser discutido e aprovado, visto que dele resultaria uma grande economia para o país.
Para isto, pois, chamo a especial atenção do Sr. Ministro da Guerra, esperando que S. Ex.ª adopte as medidas necessárias a que me referi, as quais têm por fim desenvolver a instrução militar, sem se estar a gastar importâncias excessivas.
V. Ex.ª sabe muito bom que actualmente não existe no país a chamada instrução militar preparatória; porém, o que é um facto é que a verba que foi inscrita no orçamento do ano passado para tal, e que anda por uns 27. 200$, teve outra aplicação.
Não existindo, pois, como não existe, essa instrução militar preparatória, eu pregunto o que é que se fez a êsse dinheiro.
Não existindo, pois, como já não existe, essa instrução militar preparatória, eu achava que era duma grande conveniência que a comissão do Orçamento transferisse essa verba para qualquer outra aplicação, como, por exemplo, a de premiar as sociedades de educação cívica, para o que fàcilmente se poderia elaborar um projecto de lei nesse sentido, o qual, estou certo, seria duma grande vantagem, e havia uma enorme economia para o orçamento do Ministério da Guerra.
Essa instituição, infelizmente, já não existe, tendo essa verba sido desviada dos verdadeiros fins altamente patrióticos a que ela se destinava. E assim eu sou de opinião, repito, que ela seja destinada ao fim a que acabo de me referir.
Esta é a minha opinião, para a qual chamo a atenção do Sr. Ministro da Guerra.
Dir-me há V. Ex.ª: mas que medidas adopta?
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Não é agora ocasião de omitir parecer a êsse respeito. Estou convencido, porém, de que medidas se podem tomar tendentes — e é êsse o meu objectivo — a garantir maior eficácia na instrução militar. Estou convencido de que, se houver vontade de trabalhar o houver sobretudo o grande intuito de bem servir o país, os interêsses da Pátria e o seu engrandecimento, só não houver a preocupação de criar inimizades, só se começar a selecção como se deve começar pela Escola Superior do Exército, joeirando, instruindo e educando, aperfeiçoando-se constante mente o organismo militar, em pouco tempo teremos modificado a estructura o carácter do exército, em pouco tempo deixaremos de ter a dolorosa impressão de ouvir pronunciar nesta Câmara — de ouvir a portugueses — que o exército vive por um favor daqueles que querem garantida a sua existência, perfeitamente anódina.
É necessário, Sr. Presidente, que nós criemos um organismo forte, é necessário que o exército compreenda e mostre a sua alta missão moral.
E não se diga que criada a Sociedade das Nações, nós, que somos um dos Estados signatários do pacto dessa Sociedade, podemos viver tranquilos; porque essa Sociedade, sabe-o V. Ex.ª e sabe a Câmara, impõe-nos deveres sobretudo mais pesados do que aqueles que derivam da nossa própria defesa, porque nos obriga a criar não só um organismo defensivo mas a ter um organismo pronto a correr onde seja necessário defender os outros societários. E êste o pacto da Sociedade; e, se assim é, sentir-nos-íamos envergonhados, quando chamados em socorro de qualquer dos nossos societários, não pudéssemos ter aqueles elementos que o exército o a armada devem fornecer para garantir a nossa independência e o prestígio da nossa bandeira.
Sr. Presidente, concretizando as minhas considerações o para finalizar, agradeço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, a toda a Câmara e muito especialmente ao Sr. Ministro da Guerra e ao Sr. relator do orçamento da guerra a atenção com que ouviram as razões e considerações que expus sôbre êste problema, que muito me interessa, que profundamente me apaixona, porque eu queria que o exército fôsse um organismo cheio de prestígio. Eu queria que ao exército não fossem lançadas constantemente estas afirmações que o desprestigiam, estas afirmações que o desmoralizam ainda mais, eu queria que ao exército não se pudesse dizer que tem conseguido constantemente promoções...
Eu queria que o orçamento do Ministério da Guerra fôsse profundamente modificado em certas formas concretas.
Desejaria que as verbas chamadas de despesa extraordinária fossem reduzidas ao mínimo indispensável.
Não compreendo que estejamos a fazer despesas extraordinárias, como as descritas no orçamento do Ministério da Guerra, que é absolutamente indispensável reduzir.
Para isto chamo a atenção do Sr. Ministro da Guerra.
O Sr. Ministro da Guerra poderá seguramente obter as informações necessárias que esclareçam a Câmara a respeito do instituto Social.
Até hoje ainda não sei qual é o critério que preside à distribuïção da verba de 350 contos.
Tendo no exército o serviço da assistência organizado, não se compreendo que vamos dar 350 contos para assistência.
Será pouco; mas são 350 contos que podiam reverter a favor da instrução do exército.
Há outro facto para o qual desejaria chamar a atenção de V. Ex.ª: é para a verba destinada a subsídio dó Instituto Social do Exército. Não temos necessidade de aproveitar os serviços dessa obra, más a verdade é que sendo uma obra de solidariedade para os mutilados, parece-me que não devia pesar no orçamento do Ministério da Guerra. Todos aqueles que são oficiais do exército poderiam concorrer para a manutenção dêsse estabelecimento.
Não compreendo que êste auxílio seja dado pelo Estado quando são os oficiais que dele se aproveitam.
Mas há mais, e chamo a atenção da Câmara para êste facto: as mensalidades que se pagam são pagas pelos oficiais que tem os seus filhos nesse estabelecimento, e em harmonia, com o aumento de vencimentos é indispensável aumentar essas mensalidades.
Para concluir chamo mais uma vez a
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atenção do Sr. Ministro da Guerra para o assunto das promoções. É indispensável estabelecer uma lei regularizando as promoções.
É necessário tornar o pôsto dependente da função.
Trocam-se àpartes e vários Srs. Deputados interrompem simultaneamente o orador.
Não há nada que justifique o estabelecimento do equiparações entre as diversas armas e serviços. Todos têm funções distintas.
Nunca em nenhum país se aplicou a lei de equiparações tomo sendo uma lei de interêsse geral.
Sabe V. Ex.ª, Sr. Presidente, e sabe o Sr. Ministro da Guerra que já um oficial do quadro auxiliar serve de norma de promoção para oficiais do estado maior.
Isto é um absurdo!
Tem-se mantido um tal estado de, cousas porque não tem havido a energia necessária para evitar semelhante descalabro.
O Sr. António Maia: — A culpa é da Câmara que vota as leis que dão lugar a isso.
O Orador: — A culpa é de nós todos. Os Ministros não têm por função ùnicamente fazer cumprir as leis.
Têm também por dever verificar os inconvenientes delas; e, quando vejam que inconvenientes há, devem trazer ao Parlamento as medidas necessárias para remediá-los.
Os Ministros devem aqui trazer as suas propostas de lei o reclamarem para elas a urgência necessária.
Era isto o que eu queria dizer à Câmara a propósito da proposta tam honesta, tara sincera e tam cheia do bons princípios, que o Sr. Ministro da Guerra trouxe ao Parlamento.
Eu não compreendo o funcionamento duma comissão parlamentar som que o Ministro assista às suas reuniões, para poder expor a sua maneira de pensar e produzir os argumentos que entende necessários.
Para que o País saiba como o Parlamento cumpro as suas obrigações, eu declaro mais uma vez que a comissão do Orçamento nunca reüniu.
Contra êste processo, que reputo absolutamente perigoso para as instituições parlamentares, eu levanto o meu protesto.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Agatão Lança (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: ou desejava que V. Ex.ª me informasse se, dando-se o caso do não haver agora número para votar o meu requerimento, êle é pôsto novamente amanhã à votação.
O Sr. António Maia (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: eu pregunto a V. Ex.ª se, hão havendo número para ser votado o requerimento do Sr. Agatão Lança, a sessão continua ou é encerrada.
O Sr. Presidente: — A sessão continuaria mesmo que não houvesse número para votações.
Tendo, porém, chegado a hora de conceder a palavra aos Srs. Deputados que a pediram para antes de se encerrar a sessão, fica para amanhã a votação do Sr. Agatão Lança.
Antes de encerrar a sessão
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: há certas ocasiões em que nós não podemos aqui dentro esquecer o que somos lá fora.
Vem isto a propósito de eu ter estranhado que houvesse magistrados dos tribunais e advogados que rejeitaram o meu pedido de negócio urgente, formulado há pouco a V. Ex.ª
Informara eu V. Ex.ª de que no Tribunal da Boa Hora se havia dado um atentado dinamitista.
Era natural que o Parlamento, atendendo às circunstâncias especiais dêsse atentado, lavrasse o seu protesto e reclamasse do Sr. Ministro da Justiça as providências necessárias.
Um ilustre magistrado e ainda alguns não menos distintos advogados entenderam que, por ser um monárquico que requerera essa urgência, era conveniente rejeitarem o requerimento.
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Sr. Presidente: do que não há dúvida é que, hoje pelas duas horas da tarde, em pleno tribunal da Boa Hora, que tem sentinelas à porta, e tem próximo o Govêrno Civil, foi praticado outro atentado dinamitista, do qual resultou ficarem muito danificados quatro cartórios.
Na verdade, Sr. Presidente, é um sintoma deveras alarmante e para êle chamo a atenção do Govêrno e especialmente do Sr. Ministro da Justiça, para que se tomem as necessárias providências e se chame a polícia à ordem, ao cumprimento dos seus deveres, para que se proceda a buscas, apreensões e até a prisão, se tanto fôr necessário, para evitar que se continuem dando atentados, como aqueles a que venho de me referir.
O que é lamentável é que a polícia não descubra nunca os bombistas, ou limite a sua acção, quando êles próprios são vítimas das explosões, a transportar o criminoso para a Morgue.
Mas o ponto gravo é que êste atentado foi levado a efeito dentro de um tribunal para fazer coacção sôbre os poderes do Estado no dia em que devia ser julgado um bombista.
Sr. Presidente: devo dizer, por informações que me deram, que a bomba empregada era de enorme potência, e certamente não era dirigida a êste ou àquele cartório, mas destinada a estabelecer o alarme dentro do tribunal.
Peço, pois, ao Sr. Ministro da Justiça o favor de me dizer quais as providências que vai tomar.
Igualmente, desejava fazer algumas considerações, estando presente o Sr. Ministro do Comércio; mas como S. Ex.ª não está, reservo-as para, outra ocasião.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Abranches Ferrão): — Sr. Presidente: como já é do conhecimento da Câmara, depois das palavras do Sr. Paulo Cancela de Abreu, foi hoje colocada uma bomba no Tribunal da Boa Hora, que explondindo, causou importantes estragos materiais em alguns cartórios, não havendo, felizmente, vítimas a lamentar.
Disse S. Ex.ª que é realmente estranho que na Boa Hora se tivesse produzido um acontecimento desta ordem, tanto mais que tem sentinelas e não seria fácil presumir que um atentado desta natureza se pudesse levar a efeito, sem que fôsse preso o indivíduo que o praticasse.
Todavia, a Câmara sabe que o Tribunal da Boa Hora tem uma porta para a Calçada de S. Francisco, onde não existe sentinela, sendo de presumir que a pessoa que deitou a bomba por ela tivesse saído.
Sr. Presidente: é êste um acontecimento, na verdade, lamentável; tanto mais que, certamente, essa bomba foi lançada para exercer coacção nos indivíduos encarregados de fazer funcionar a justiça e, possivelmente, no júri.
O que posso dizer à Câmara é que empregarei todos os esfôrços no sentido de ver se se consegue descobrir o autor dês-se atentado, para ser castigado.
Estou certo de que a polícia empregará todos os meios para descobrir os autores do atentado.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã à hora regimental, com a seguinte ordem do dia:
Antes da ordem do dia (sem prejuízo dos oradores que se inscreveram):
A de hoje.
Parecer n.º 470, que interpreta o artigo 32.º da lei n.º 1:355.
Ordem do dia:
A de hoje.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 45 minutos.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Pareceres
N.º 435, que dá nova redacção à alínea b) do § 2.º do artigo 75.º do decreto n.º 5:847-A, de 31 de Maio de 1919, sôbre limite de idade dos funcionários do Ministério do Comércio.
Aprovado.
Para o Sr. Presidente da República.
Da comissão do Orçamento, sôbre o orçamento do Ministério da Justiça.
Imprima-se com a máxima urgência.
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Da comissão de finanças, sôbre o n.º 423-B, que interpreta a lei n.º 1:368, de 21 de Setembro de 1922.
Imprima-se.
Da comissão de administração pública, sôbre o n.º 308-A, que cria uma assemblea eleitoral na freguesia de Arazede.
Para a comissão de legislação civil e comercial.
Requerimento
Requeiro que seja novamente presente à comissão de guerra a fim de seguir seus trâmites o parecer n.º 560, de 1920, arquivado nesta Câmara.
Em 30 de Abril de 1923. — Sá Pereira.
Junte-se ao processo e envie-se à comissão de guerra.
Refere-se à petição do capitão picador Salvador José da Costa.
O REDACTOR — João Saraiva.