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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 107
(NOCTURNA)
EM 13 DE JUNHO DE 1923
Presidência do Ex.mo Sr. Tomás de Sousa Rosa
Secretários os Ex.mos Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Luís António da Silva Tavares de Carvalho
Sumário. — Abre a sessão com a presença de 43 Srs. Deputados.
É lida a acta da sessão anterior.
O Sr. Presidente declara não haver número para votar o capitulo 7.º do orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros, cuja discussão terminou na sessão diurna.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu pede para que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeirar (Domingos Pereira) declare, se lhe autoriza o exame de documentos relativos à nomeação do cônsul Ribeiro de Melo.
O Sr. Presidente declara que só pode tratar-se da discussão do Orçamento.
O Sr. Ministro responde afirmativamente aos desejos do Sr. Cancela.
Como ninguém peça a palavra sôbre os capítulos 8.º e 9.º do orçamento, consideram-se discutidos.
Passa-se à discussão do orçamento do Ministério das Finanças, capitulo 12.º, que se considera discutido por ninguém pedir a palavra sôbre êle.
Sôbre o capitulo 13.º o Sr. Correia Gomes apresentou uma proposta.
O capítulo 14.º considera-se discutido com uma proposta do Sr. Correia Gomes.
Sôbre o capitulo 15.º ninguém pede a palavra. Considera-se discutido.
Sôbre o capitulo 16.º usam da palavra os Srs. Tôrres Garcia, Agatão Lança, Estêvão Águas e Correia Gomes sôbre a acção e vencimentos da guarda fiscal.
Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte à hora regimental.
Abertura da sessão, às 22 horas e 13 minutos.
Prementes à chamada, 43 Srs. Deputados,
Responderam à chamada os Srs.:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Alberto Ferreira Vidal.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo da Silva Castro.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Dias.
António Maria da Silva.
António Pais da Silva Marques.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Resende.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Carlos Cândido Pereira.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Domingos Leite Pereira.
Francisco Dinis de Carvalho.
Jaime Júlio de Sousa.
João Estêvão Águas.
João José da Conceição Camoesas.
João Pina de Morais Júnior.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim Serafim de Barros.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
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Diário da Câmara dos Deputados
José Mendes Nunes Loureiro.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Marcos Cirílo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Paulo Cancela de Abreu.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Tomás de Sousa Rosa.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio Saque.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Entraram durante a sessão os Srs.:
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
José Domingues dos Santos.
José de Oliveira Salvador.
Vitorino Henriques Godinho.
Não compareceram à sessão os Srs.:
Abílio Marques Mourão.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Afonso Augusto da Costa.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Jordão Marquês da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto do Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Correia.
António Ginestal Machado.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Lino Neto.
António de Mendonça.
António de Paiva Gomes.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado Freitas.
David Augusto Rodrigues.
Delfim Costa.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cruz.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Germano José de Amorim.
Hermano José de Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Daniel Leote do Rêgo.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge Barros Capinha.
Jorge do Vasconcelos Nunes
José António de Magalhães.
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José Carvalho dos Santos.
José Cortês dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José Pedro Ferreira.
Júlio Gonçalves.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel do Sousa Coutinho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo da Costa Menano.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Góis Pita.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomé José de Barros Queiroz.
Valentim Guerra.
Vasco Borges.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Fonseca.
O Sr. Presidente (às 22 horas): — Vai proceder-se à chamada.
Procedeu-se a chamada a que responderam 43 Srs. Deputados.
O Sr. Presidente (às 22 horas e 15 minutos): — Está aborta a sessão.
Vai-se ler a acta.
Leu-se a acta.
O Sr. Presidente: — Não há número para votar.
Vai entrar-se na ordem da noite.
ORDEM DA NOITE
Continuação da discussão do orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: Sr. Presidente: à face dos factos passados na sessão da tarde, e que convém explicar, eu pedia a V. Ex.ª o favor de preguntar ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros se S. Ex.ª me autorizava a ir amanhã ou depois ao seu Ministério, a consultar os documentos relativos ao caso do cônsul Ribeiro de Melo, quer quanto à sua nomeação e demissão, quer quanto a abonos feitos.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — O assunto a que V. Ex.ª se referiu nada tem com a discussão do Orçamento.
V. Ex.ª podará pedir ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros para consultar os documentos que quiser no seu Ministério, mas eu não posso dar a palavra ao Sr. Ministro para lhe responder, visto que agora só a posso conceder sôbre o capítulo 7.º
Visto que ninguém pede a palavra, está discutido o capítulo 7.º
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai entrar em discussão o capítulo 8.º
Como ninguém pede a palavra, está encerrada a discussão sôbre êste capítulo, ficando a votação para quando houver número.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros pediu a palavra para me responder.
O Sr. Presidente: — Eu não posso dar a palavra a S. Ex.ª senão sôbre a discussão do Orçamento.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — V. Ex.ª não quere que eu vá ao Ministério dos Negócios Estrangeiros consultar êsses documentos.
Não é preciso mais nada.
O orador não reviu.
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O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Domingos Pereira): — Sr. Presidente: eu peço desculpa a V. Ex.ª por ter pedido a palavra para responder ao Sr. Cancela de Abreu.
Sei perfeitamente que não está em discussão o assunto que na sessão da tarde foi debatido nesta Câmara, mas em todo o caso desejava declarar que não tenho dúvida de pôr à disposição de S. Ex.ª os documentos referentes ao Sr. cônsul em Coritiba.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Está em discussão o capítulo 9.º
Como ninguém pede a palavra, considera-se discutido.
Está encerrada a discussão do orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Continua em discussão o orçamento do Ministério das Finanças.
Entra em discussão o capítulo 12.º
Como ninguém pede a palavra, considera-se discutido.
Vai discutir-se o capítulo 13.º
O Sr. Correia Gomes: — Mando para a Mesa uma proposta de alteração ao artigo 13.º
Entrou em discussão o capítulo 14.º
O Sr. Correia Gomes: — Mando para a Mesa uma proposta sôbre o capítulo 14.º
Como ninguém pedisse a palavra, considerou-se discutido.
Entrou em discussão o capitulo 15.º
Como ninguém pediu a palavra, considerou-se discutido e entrou em discussão o capítulo 16.º
O Sr. Tôrres Garcia: — Sr. Presidente: tenho de fazer um certo número de considerações acêrca dos serviços da guarda fiscal e das suas obrigações, e isto dentro do critério que aqui tenho expendido, de que é necessário que o Govêrno tome medidas que demonstrem o interêsse que êle põe nas suas providências para melhorar a situação em que Portugal se encontra, relativamente ao preço elevadíssimo de todos os géneros indispensáveis à alimentação, porque ninguém ignora que a Espanha está hoje sendo um elemento perturbador dentro da nossa economia doméstica, visto absorver tudo quanto a nossa terra produz, de maneira que pouco ou nada aproveitamos do desenvolvimento que em Portugal tem tido a indústria agrícola e manufactureira.
Se alguma cousa se tem feito no campo da indústria pecuária, se muito se tem desenvolvido a agricultura, se muito se tem feito no sentido de arrancar à terra uma maior produção, no emtanto, não há dúvida nenhuma, Sr. Presidente, de que o País nada disso tem aproveitado.
Se as nossas indústrias têm mobilizado capitais e energias para aumentarem e para afirmarem essa produção, certo é que o País pouco ou nada tem aproveitado.
Tudo é absorvido pela Espanha, que hoje goza em face de nós duma valorização de moeda que lhe permite vir a Portugal comprar tudo o que necessita, deixando-nos à míngua do indispensável para a nossa vida.
E se é certo que as «pesetas» traduzidas em escudos podem trazer uma melhoria de vida nas povoações fronteiriças, não o é menos que essa melhoria não se tem acentuado.
Na fronteira há uma falta de boa organização ou duma boa adaptação dos serviços da guarda fiscal nas actuais condições.
A organização dessa guarda foi feita numas circunstâncias absolutamente diferentes das de hoje; essa organização foi feita quando as nossas circunstâncias eram iguais às da Espanha.
Portanto, Sr. Presidente, perante os lídimos representantes da Nação, eu faço os mais sinceros e ardentes votos para que à guarda fiscal se dê uma organização eficaz em relação às nossas necessidades económicas, isto é, às facilidades da vida em Portugal.
Ainda o ano passado, quando votámos a supressão do imposto de consumo, se deu com essa medida um grande reforço à guarda fiscal que operava nas povoações fronteiriças, mas a verdade é que êsse reforço não impediu que não continuasse a sair tudo quanto em Portugal se precisa.
Levámos para a fronteira toda a guarda fiscal que guarnecia a circunvalação de Lisboa e também a que guarnecia a linha do circunvalação terrestre do Pôrto,
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e isso devia ter produzido um aumento de efectivos na fronteira.em mais de 1:000 homens, retorço que me parecia atinente a fazer-se sentir imediatamente com eficácia nos respectivos serviços.
Eu sei que as instalações da guarda fiscal ao longo da fronteira são o que há de mais deficiente; eu sei que a situação e disposição dos postos obedeceram à antiga circunvalação, situação que também prejudica a boa fiscalização da guarda fiscal.
Mas já estamos nesta situação há dois ou três anos, e tempo era de, pouco a pouco, visto que depressa não se pode fazer, dadas as pequenas disponibilidades do Tesouro, ir adaptando o serviço da guarda fiscal na fronteira às novas necessidades dêsse serviço.
Sr. Presidente: eu espero que as necessidades do serviço da guarda fiscal sejam atendidas, que as condições sejam melhoradas, que a República viva da dedicação inexcedível dessa fôrça armada, que através dos tempos tem marcado na vida da República uma situação absolutamente purificante.
Ela tem à sua frente o nosso ilustre colega o coronel Sr. Estêvão Águas, que dedica toda a sua atenção a êsses serviços; dedica-lha com todo o amor, e com as qualidades de bom republicano e patriota, que é, há-de trabalhar sempre nesse sentido.
A guarda fiscal, mantendo as tradições no serviço da fronteira, colaborará eficazmente para que a nossa situação económica e condições de vida de cada um de nós seja melhorada.
Eu quando, tenho de aplaudir, aplaudo, mas também quando sôbre a minha análise caem suspeitas, protesto e não procuro adicionar à minha atitude senão a justiça.
Por isso eu faço justiça às intenções do comandante da guarda fiscal e ao Sr. Ministro das Finanças, seu chefe supremo, e faço também justiça ao zêlo e dedicação prestados pela guarda fiscal.
Mas tenho de verificar que na prática há a fazer mais alguma cousa: é preciso que ela empregue toda a sua actividade para que a Espanha não possa vir buscar tudo quanto nos é preciso, melhorando a situação de um país, que embora seja amigo, e da nossa muita consideração, não podemos consentir que nos leve aquilo que nos faz imensa falta.
Preferiria ter no País uma superabundância de alimentos, do que deixá-los sair pela fronteira para receber milhares de pesetas.
Sr. Presidente: evidentemente que mais alguma cousa tinha a dizer sôbre êste capítula e, se é certo que eu reputo deficiente o serviço prestado pela guarda fiscal, tenho a declarar que julgo de necessidade que êsses serviços sejam melhorados.
A última reforma que se fez parece que apenas teve em vista arranjar situação para um certo número de oficiais, majores e tenentes-coronéis, que estavam condenados a viver no estado maior da sua arma.
Sr. Presidente: quando se discutir o orçamento do Ministério da Guerra, eu hei-de fazer aqui a distinção entre o número de oficiais que estavam normalmente no estado maior das armas emquanto esteve vigente a organização de 1911, e demonstrarei que no critério ultimamente seguido predominou o propósito de fazer promoções à la diable.
Evidentemente que isto representa o propósito de fazer promoções à la diable, e dar a todos os promovidos uma situação à custa da criação de novos lugares, porque, se se não criassem êsses lugares, êles teriam de ser colocados no estado maior das armas, e não receberiam a gratificação de comando.
Eu já tenho aqui dito que essas criaturas devem em determinada altura, quando vêem que o Estado não lhes pode pagar mais, darem-se por satisfeitas com os seus galões e não insistirem pelos comandos.
A guarda fiscal, que viveu durante largos anos dentro da máxima eficiência com as suas circunscrições e com um certo número de companhias, adstritas a essas circunscrições, tendo um coronel à frente de cada uma, tem hoje o coronel comandante chefe, tem três comandantes de batalhão e tem três segundos comandantes de batalhão.
Isto não é devido às necessidades de serviço da guarda fiscal, mas sim à necessidade que tem havido, não para o Estado, mas para os pretendentes, de criar situações para as dar aos oficiais promo-
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vidos desmedidamente e fora das necessidades do serviço.
Dada a dispersão dos postos e a natureza do serviços da guarda fiscal, a unidade, não direi tática, porque essas tropas não têm senão secundariamente situações táticas, deve ser a companhia.
A unidade que para a infantaria é o regimento, para a artilharia o grupo, etc.. deve ser para a guarda fiscal a companhia.
O capitão é que superintendo em todos os serviços de especialidade que estão a cargo da sua companhia, vela pela disciplina, vela pela boa execução dos serviços e por tudo aquilo que diz respeito às prerrogativas de capitão comandante de companhia.
Há necessidade de agrupar essas companhias e batalhões para lhes dar uma maior eficiência?
Não julgo isso necessário.
Tendo nós arredado a guarda fiscal das barreiras do Lisboa e Pôrto, deviamos voltar às circunscrições, tendo à frente de cada uma delas um oficial superior para efeitos disciplinares.
Hoje, apesar de termos criado os primeiros e segundos comandantes de batalhão, nós verificamos que não há uma maior eficiência nos serviços da guarda fiscal, porque em toda a parte e regista o facto de passarem para Espanha manadas de gado bovino e toda a classe de contrabando, verificando-se igualmente que o serviço na zona marítima de Lisboa e Pôrto não tem melhorado.
Há muito tempo que eu venho referindo-me a esta anomalia de sucessivas reformas na classe militar, tendo apenas em vista criar lugares para neles colocar oficiais do exército, que hoje deveriam ter apenas uma única situação, que era a de estarem no estado maior da sua arma.
Eu faço justiça à guarda fiscal, frisando a sua dedicação pela República e afirmando que ela se encontra abandonada por todos aqueles que deviam colaborar no seu serviço.
Temos uma organização da guarda republicana que acompanha a organização da guarda fiscal em todos os concelhos fronteiriços, mas o que é facto é que eu ainda não vi que essa guarda republicana tenha auxiliado ou procurado auxiliar eficazmente o serviço da guarda fiscal nesses concelhos, embora isso tenha sido recomendado e tenha havido instruções do Sr. Ministro do Interior e do comando da guarda republicana.
Devia-se estabelecer na fronteira uma verdadeira faixa que funcionaria como «terra de ninguém» em tudo o que fôsse sujeito ao fisco. Quem se aproximasse dessa zona sofreria as conseqüências do todos aqueles que se atreviam a pisar a «terra de ninguém» na guerra europeia.
Fazendo conjugar os esfôrços da guarda fiscal com os da guarda republicana e com todas as autoridades administrativas, poderia limitar-se muitíssimo o contrabando e impedir que a Espanha fôsse o cancro que nos corrói as entranhas.
Leva-se para Espanha tudo o que é necessário à nossa vida, provocando a alta de preços, e fazendo-se especulações comerciais, chegando se ao ponto de agentes espanhóis virem a Lisboa, Pôrto e Coimbra comprar existências inteiras de géneros, géneros que no dia seguinte faltam às populações, provocando altas exageradas de preços, facto êsse que não se daria se não existisse essa procura realizada por agentes da Espanha.
O comércio, Sr. Presidente, não tem pátria nem conhece outro interêsse que não seja a sua burra (Apoiados), o eu entendo que não se pode fazer distinção entre o espanhol que oferece um certo numero de pesetas por 1 quilograma de açúcar e o português que vai levar ao espanhol êsse açúcar.
O comerciante português não hesita em entregar ao estrangeiro, desde que melhor lho paguem, o género que é necessário à alimentação nacional.
É para lamentar altamente que a ânsia do ganho tenha evitado que o comerciante estabeleça um diferencial de preço, tanto mais que o espanhol compra por insignificante preço os géneros portugueses.
E a ganância bruta o animal da maioria dos comerciantes. Se assim não fôsse, o comerciante português de há muito que teria estabelecido um preço de venda para portugueses e outro preço de venda para espanhóis.
O comerciante, em geral, medo tudo pela mesma bitola, e tem conseguido iludir o melhor policiamento da raia portuguesa. E eu, que acredito (e confesso
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sinceramente) nas boas intenções do Sr. Ministro das Finanças e do Comandante da Guarda Nacional Republicana, hei-de continuar a reclamar aqui mais enérgicas e severas providências para atenuar o mal que venho apontando. E direi que tenho mais confiança no Sr. Ministro das Finanças e comandante da guarda republicana que em quaisquer outros governantes que façam parte ou provenham de outras facções ou partidos republicanos. Eu não posso admitir, Sr. Presidente, que êste Govêrno, que tem tradições gloriosas atrás de si, não queira ainda aumentá-las empregando os seus esfôrços para uma melhoria de vida.
O Sr. Presidente: — V. Ex.ª tem apenas dois minutos para terminar as suas considerações.
O Orador: — Terminarei dentro dos dois minutos.
Falta-me apenas uma última consideração, e é que o soldado da guarda fiscal, a quem aumentámos há pouco os vencimentos, não tem estado naquela situação financeira que permita é exigir-se-lhe o que êle deve possuir — um grande zêlo e uma rigorosa disciplina. Êles são homens como nós o têm que pensar o bem-estar das suas famílias e na educação dos seus filhos.
Dê-se à guarda fiscal tudo quanto seja preciso para bem desempenhar os seus serviços; dê-se-lhe até todo o produto das apreensões; dê-se maior competência fiscal aos comandantes de secção, do maneira a organizarem o serviço diário de patrulhas, de observação e de vigia.
O Sr. Estêvão Águas: — Deus nos livrasse se não houvesse isso.
O Orador: — Não há regulamentos, não há praxes militares, não há normas nem teoria de qualquer natureza, na sciência militar, que não incida modernamente na iniciativa livre o consciente dos chefes.
Um exército que não atribua ao seu chefe toda a iniciativa, está morto.
O Sr. Presidente: — Deu a hora.
O Orador: — Vou terminar, fazendo votos para que todos estos serviços sofram a influência benéfica da nossa acção, a fim de que êles sejam melhorados.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Agatão Lança (sôbre a ordem): — Sr. Presidente: em obediência ao Regimento começo por mandar para a Mesa a minha moção do ordem.
Sr. Presidente: uma câmara republicana, num estado republicano, não pode nunca olvidar os serviços prestados por uma corporação, cujos sentimentos republicanos e patrióticos são sobejamente conhecidos do País, não só desde a vigência do novo regime, mas também afirmados exuberantemente nos tempos do regime deposto.
Aqueles que, como eu, são republicanos desde sempre; aqueles que, como eu, compulsando a história do movimento republicano do País, não desconhecem, nem podem esquecer, sem grande ingratidão, os sentimentos republicanos e patrióticos que sempre têm animado essa prestimosa corporação, que é a guarda fiscal.
Já em 1891, ao estalar o primeiro movimento republicano em Portugal, os dirigentes dêsse movimento, êsses homens a quem os mesmos sentimentos republicanos animavam, se manifestavam.
Depois vimos a guarda fiscal ser um esteio fiel, indefectível e forte da República; vimo-la em 5 de Outubro de 1910 irmanar-se com a marinhe, a quem se devem em primeiro lugar as novas instituïções; vimo-la, depois de proclamada a República, prestar-lhe serviços inestimáveis na defesa das fronteiras portuguesas, sempre vigilante nos cumes das serras e sempre pronta a batalhar contra os inimigos da República que, esquecendo as suas qualidades do portugueses, não vacilaram em armar os seus braços em país estranho para depois tentar derruir o regime.
A êsse propósito recordo um homem a quem o Govêrno actual indevidamente castigou, apesar de estar absolutamente dentro dos regulamentos disciplinares, dentro da boa moral e no bom sentido de defender os sacrossantos interêsses do Tesouro.
Essa figura épica e sempre gloriosa é a do Sr. Afonso de Cerqueira.
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Recordo também com saüdade o glorioso general comandante da expedição ao sul de Angola e que se chamou Pereira de Eça.
A guarda fiscal em todos os movimentos em que tem sido necessário defender a República contra as investidas dos monárquicos, defender a República na sua natureza intrínseca da Constituïção que a rege, esteve sempre ao lado da patriótica e republicana corporação da marinha portuguesa.
Nunca posso esquecer, o bem novo era então, quando se deu a revolta do 14 de Maio, que vai agora esquecendo, mas que foi a última afirmação da fé republicana feita pelo povo, em prol da República pura, com que sonharam os propagandistas, aqueles homens puros e sacrossantos que me ensinaram a ser republicano.
Não me podem esquecer as primeiras palavras dêsses guardas que, abeirando-se dos navios de guerra que estavam no Tejo, e mesmo do Arsenal de Marinha, o quando as sentinelas que estavam vigilantes lhes preguntavam «quem vem lá?", êsses guardas, dedicados e com a fé no seu coração nos destinos da República, êsses homens respondiam: «é a guarda fiscal que está ao seu lado, disposta a dar-lhe a sua última gota de sangue, em prol dos mais nobres e patrióticos sentimentos republicanos".
O mesmo sucedeu com o dezembrismo, quando o Govêrno da República, que por vezes tam ingrato tem sido para a corporação da guarda fiscal, esquecendo sobretudo de lhe dar aquilo que sob o ponto de vista moral é necessário para poder corresponder à confiança que a Nação nela deposita, êsses mesmos homens invadiram o Arsenal de Marinha, e formaram ao lado dos marinheiros.
E lá foram através das colunas, à direita de movimentos que alguns dos nossos elementos do estado maior organizaram, sendo os únicos que até final da tarde, tristemente memorável, mas até certo ponto heróica de 7 de Dezembro, se mantiveram firmes no seu pôsto.
Eu não me posso esquecer, quando já,o meu sangue corria, que vi entre os valentes marinheiros soldados da guarda fiscal que, pelos seus anos de serviço, pelo que o seu corpo tinha sofrido, mereciam e tinham todo o direito ao sossêgo.
Quem superficialmente olhe e analise êste capítulo em discussão, por um simples golpe de vista poderá julgar exagerada esta verba.
O Sr. Estêvão Águas: — A verba ainda é exígua.
O Orador: — Só quem não fôr até ao âmago das questões é que o julgará exagerado, mas quem estudar bem as questões reconhecerá quanto é exígua a verba para poder satisfazer às necessidades e manutenção da vida.
Uma das causas da desvalorização da moeda são os nossos vizinhos espanhóis, que nos levam tudo, sem que nós façamos qualquer lei de forma a obstar a que isso se dê.
Sr. Presidente: ninguém ignora que através da nossa fronteira se faz o mais descarado, contrabando.
Há pessoas que se revoltam contra a benemérita corporação da guarda fiscal, dizendo que ela se deixa subornar por qualquer espanhol ou galego.
Ora, Sr. Presidente, eu, que tenho a honra de também possuir um galão que por nada deixarei denegrir, devo dizer que não acredito nesse exagero que as más línguas proclamam aos quatro ventos.
Demais, dá-se ainda o caso de a guarda fiscal, bem como a guarda republicana e a corporação da armada nacional, terem sido ora melhoradas, o se não ganham para viver desafogadamente, ganham, no emtanto, o preciso para viverem sem privações e sem terem de recorrer a meios estranhos e pouco dignos.
Sr. Presidente: a guarda fiscal é constituída por pouco mais de 4:000 homens, número mais que insuficiente para guarnecer devidamente ás nossas fronteiras. A guarda fiscal cumpre o seu dever dentro daqueles limites humanos e daqueles limites materiais em que é possível cumprir-se o dever.
Todos nós sabemos que há postos na fronteira que distam uns dos outros 12 e 15 quilómetros, e que são apenas guarnecidos por três ou quatro homens. Como exigir, pois, que se faça uma fiscalização rigorosa?
Portanto, Sr. Presidente, estou dentro da minha moção, proclamando o dever de
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a Câmara prestar a sua homenagem àquela republicana corporação, e reclamando dos Poderes Legislativo e Executivo as necessárias medidas para que os electivos da guarda fiscal sejam aumentados de modo a que ela possa cumprir dignamente o seu dever.
O Sr. Tôrres Garcia, ilustre parlamentar que me antecedeu no uso da palavra, meu velho o querido amigo, espírito de eleição, alma pura de republicano, homem sempre com a necessária coragem moral para dizer todas as verdades, para proclamar o que é justo o para fustigar, sem receio de quem quer que seja, aquilo que merece reprovação, referiu-se, e muito bem, à falta de ordens emanadas do Ministério do Interior, à falta de ordens emanadas do comando geral da guarda republicana, para que êsse organismo exerça uma acção mais intima, de maior coesão com os serviços da guarda fiscal.
Não deve ser extranho para ninguém que nós, membros do Poder Legislativo, que temos o dever de defender e velar os interêsses do País e o prestígio da República, chamemos a atenção do Sr. Ministro do Interior para que S. Ex.ª dê as providências necessárias a fim de que essa acção de comunhão de serviços se realize duma maneira mais activa e mais eficaz.
Sr. Presidente: eu sei que não tenho o direito de roubar muito tempo à Câmara sôbre um assunto dêstes, mas também sei que o meu dever de republicano e de patriota me impõe que aqui defenda sempre o que é justo e honesto, e que tende a aumentar o prestígio da República e a eficiência das corporações que por ela se batem nas horas de dura incerteza e ansiedade.
Por isso, pagando o Estado aos seus funcionários dignamente, tem o direito de exigir que êles o sirvam com dignidade.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Estêvão Águas: — Sr. Presidente: não posso despir-me da minha qualidade de comandante da guarda fiscal para agradecer aos meus colegas as palavras amáveis, mas de inteira justiça, que à corporação sob o meu comando dirigiram.
O Sr. Tôrres Garcia, com a competência e brilho costumados, encarou a questão sob o ponto de vista administrativo, fiscal, orgânico e disciplinar.
Tem S. Ex.ª muita razão quando se referiu às necessidades da guarda fiscal sob todos êsses aspectos, para que ela possa cumprir a sua missão dentro do Estado republicano.
A guarda fiscal necessita duma profunda remodelação para que tenha uma perfeita e definitiva posição como organismo importante que é.
Disse S. Ex.ª que a organização em batalhões, tal como está em vigor, só se explicava pela necessidade de colocar um maior número de oficiais. Devo dizer a S. Ex.ª que ela não teria obedecido a êsse princípio improdutivo, mas à necessidade de centralizar os serviços que estão a cargo da guarda fiscal num comando, visto a prática ter demonstrado que as companhias independentes, como sucede, mis ilhas, de guarda fiscal apenas têm o nome.
Já que me referi à guarda fiscal das ilhas, deixe-me V Ex.ª dizer que o seu armamento é antiquado e não serve para nada, pois ainda está armada com a espingarda Snyder, crendo até que não poderão servir-se das respectivas munições, tam velhas elas são.
Pedidos têm sido feitos para que outro armamento se lhes distribua, mas... não há dinheiro para o adquirir.
O efectivo da guarda fiscal é aproximadamente de 4:900 homens, distribuídos por todo o continente e ilhas.
Êste efectivo é insuficiente para todo o serviço.
Nestes termos, eu pregunto como se pode fazer uma fiscalização eficaz?
Como se pode obstar a que se não faça contrabando?
Havendo postos que se acham distanciados entre si de 10 a 14 quilómetros, tendo como guarnição três ou quatro praças, em regiões montanhosas e na raia sêca, como se pode tornar eficiente uma verdadeira e absoluta vigilância?
Como, se por uma pequena dobra de terreno pode realizar-se o criminoso acto de contrabando?
O que nos vale são as instruções particulares que se dão e que eu não posso aqui revelar.
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Para confirmar a insuficiência de efectivo basta dizer que em 1886, por ocasião do cordão sanitário, numa área em que actualmente se encontram 2:300 praças da guarda fiscal, estavam 30:000 homens do exercito.
Os soldados, podia dizer-se, quási estavam de mãos dadas, nessa ocasião, e ainda assim fazia-se contrabando. Agora, com um efectivo tam deminuto, e uma área tam grande, como é possível não se fazer contrabando?
Agora, que quási toda a gente se fez negociante?!
Carecemos de aumentar o pessoal da guarda fiscal, mas sobretudo carecemos que se estabeleçam postos intermédios entre os postos actuais para uma fiscalização, não digo completa, mas mais perfeita, na nossa fronteira.
Uma fiscalização que seja mais regular e mais eficiente do que a que actualmente existe.
Lembremo-nos de que a linha actual dos postos foi estabelecida para obstar ao contrabando de fora para dentro, e que hoje procuramos evitar precisamente o contrário.
Mas como remediar tam grande mal, se são necessários muitas centenas de contos para a construção?
É exígua a verba orçamental para construções.
Tam exígua, que mal chega para construção do pequeninos postos ou guaritas. 100 contos!!!
Isto não dá para conservar os actuais postos, quanto mais para construir outros.
As verbas são insuficientíssimas, deficientíssimas para os serviços a que são destinadas.
100 contos para adquirir prédios e para construção de quartéis é verdadeiramente impossível.
Labora-se num grande êrro quando se procura saber o número de apreensões efectuadas pela guarda fiscal. É um critério erróneo.
A guarda fiscal, como qualquer outro corpo de polícia e fiscalização, não foi criada para fazer apreensões, mas sim para evitar, pela sua presença e existência que se faça o contrabando.
É claro que tem de aplicar a lei logo que apareça o delito.
Seja-me permitido informar a Câmara que, durante os primeiros nove meses do actual ano económico, o valor das apreensões correspondentes aos autos levantados e julgados na guarda fiscal, não contando com aqueles que são julgados nos postos aduaneiros, sobe a 2:500 contos.
Junte-se a esta cifra o valor correspondente ao aumento do custo dos géneros iguais aos que deixaram de sair do País; e veja-se depois quam produtiva é a acção da guarda fiscal.
Foi alguma cousa importante, confessemos, em nove meses do corrente ano económico, a cifra que acabo de revelar à Câmara, e não menos a acção da fiscalização.
A guarda fiscal gasta e consome como toda e qualquer corporação; mas ternos de atender que a guarda fiscal produz o que nem todas as corporações conseguem realizar.
Fala-se em que a guarda fiscal deixa passar o contrabando; ela só tem de executar as leis; e quando as leis têm malhas por onde o contrabandista pode passar, não há guarda fiscal nem qualquer, outra corporação que possa apertá-las.
Ao serviço dêsse rendoso modo de vida, bastante ruinoso para aqueles que o sentem a toda a hora nas despesas que têm a fazer, há muita gente a quem tais malhas convém.
Temos, por exemplo, o contrabando de gado, a que o Sr. Tôrres Garcia fez referência.
É uma verdadeira legião de indivíduos ao seu serviço, desde os guias até aos advogados.
Sr. Presidente: se não houvesse decretos por cujas malhas podem passar os contrabandistas, com certeza que seria menor o contrabando de gado.
Aperte-se a zona perigosa, decrete-se que sejam os concelhos limítrofes e não as freguesias que constituam a zona de protecção económica, e verá S. Ex.ª e verão a Câmara e o País se o contrabando de gado deminui ou não. Tivemos o exemplo quando houve um decreto que criou essa zona perigosa, dos concelhos limítrofes, e que só viveu durante dois meses.
Foi um pavor, Sr. Presidente, que se apossou de toda essa gente. Todos recla-
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Sessão de 13 de Junho de 1923
mavam contra êle. Isto era suficiente para nos provar â sua proficuidade.
Foi tal o pavor que até mim, dentro desta casa, chegaram propósitos do o considerarem inconstitucional. Mas passados dois meses, quando êsse decreto foi modificado, não mais se falou na inconstitucionalidade de semelhantes diplomas.
Sr. Presidente: aproveito a ocasião para agradecer à Câmara o aumento de vencimentos concedido à guarda fiscal pela lei n.º 1:423, aumento que, devo dizer, é insuficiente.
Todos nós reconhecemos êsse facto e o próprio Sr. Ministro das Finanças o reconheceu nesse dia em que foi discutido, acrescentando que, na primeira oportunidade, modificaria o Coeficiente para poder elevar os vencimentos a um ponto regular.
Oxalá S. Ex.ª não se esqueça dessa promessa e que, brevemente, quando tiver de decretar os coeficientes por virtude da lei que acabamos de votar, S. Ex.ª se lembre que tem de aumentar êsse coeficiente às praças da guarda fiscal, cabos e soldados, que efectivamente estão ainda insuficientemente pagos. É necessário atender a que as dificuldades da vida vão sendo cada vez maiores e que, a continuar-se com o coeficiente actual, amanhã ou passados dias, a corporação da guarda fiscal se encontrará em piores circunstâncias do que se encontrava antes da aprovação da lei n.º 1:423.
Também aproveito a ocasião para pedir ao Sr. Ministro das Finanças para concordar com a apresentação de qualquer proposta, no sentido de se tornar mais densa a linha de fiscalização, criando-se postos intermédios; e habilitando-se com a verba precisa não só para a sua construção, como também para a aquisição do material de guerra a que no princípio das minhas considerações fiz referência.
Dê-se à guarda fiscal aquilo de que carece para o bom desempenho do serviço que lhe está cometido.
Bem sei que isso monta a muitas centenas de contos; mas sei também que, de sobejo, é saldada toda essa despesa.
Sr. Presidente: cumprido assim o meu dever, e agradecendo aos Srs. Tôrres Garcia e Agatão Lança as palavras de elogio e de justiça que, na minha pessoa, à guarda fiscal, que me orgulho de comandar, dirigiram, termino o meu pobre discurso por pedir à Câmara que se lembro sempre, quando fôr apresentado qualquer projecto relativo à guarda fiscal, que essa corporação tem prestado e presta os mais relevantes serviços ao País.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O Sr. Correia Gomes (relator): — Sr. Presidente: está em discussão o capítulo 16.º do orçamento de despesas do Ministério das Finanças e que s e refere à guarda fiscal.
O Sr. Tôrres Garcia referindo-se a êste capítulo citou a insuficiência da guarda fiscal para fiscalização da fronteira.
É facto que o número existente de praças da guarda fiscal é hoje, como foi sempre, insuficiente para a fiscalização da fronteira, mas o que torna insuficiente toda a fiscalização, e porque tudo passa para Espanha, é a desvalorização da moeda portuguesa, que favorece a passagem por contrabando aos nossos produtos, o que só evitaríamos se estabelecêssemos na fronteira um cordão de guardas fiscais.
Nada podemos fazer em quanto se mantiver a desvalorização da moeda.
O remédio está precisamente em praticar actos que façam com que a moeda se valorize e provocar a abundância de produtos nossos que são indispensáveis à vida e á alimentação.
O Sr. Agatão Lança também se referiu às dotações para a guarda fiscal.
Eu devo dizer a S. Ex.ª que já aqui foi dito pelo Sr. Estêvão Águas que esta Câmara tem reconhecido tanto os serviços patrióticos e republicanos da guarda fiscal que ainda há poucos dias votou um projecto especial aumentando os vencimentos às praças dessa corporação.
Êsse aumento de vencimentos que a Câmara ainda não há muito votou, aumento necessário para poderem fazer face à carestia da vida, foi o reconhecimento do Parlamento aos serviços prestados pela guarda fiscal ao País e à República.
Sr. Presidente: na verdade nenhum ataque foi feito a êste orçamento do Ministério das Finanças, muito principalmente no que diz respeito a êste capítulo que se discute, tendo-se apenas dito que as
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verbas são insuficientes; mas, Sr. Presidente, insuficientes são todas as receitas para satisfazer as necessidades do País, pois a verdade é que as receitas são inferiores às despesas indispensáveis às necessidades do País.
Como de facto nenhum ataque foi feito a êste capítulo, ou termino por aqui as minhas considerações, congratulando-me com a acção exercida, visto que ela não foi de ataque, mas sim de simples reparo no que diz respeito a despesas.
Tenho dito.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão será amanhã à hora regimental com a seguinte ordem de trabalhos:
Antes da ordem do dia (com prejuízo dos oradores inscritos).
Parecer n.º 530, que abre um crédito de 388.350$ a favor do Ministério da Instrução e os que já estavam dados (n.ºs 497, 501, 522-A, 524 e 515) empréstimo para construção da Escola Industrial do Infante D. Henrique.
(Sem prejuízo dos oradores que se inscrevam):
Pareceres n.ºs 458, 350, 305, 378, 353, 160, 284 e 493.
Ordem do dia:
Parecer n.º 411-I, Orçamento do Ministério dos Estrangeiros.
Parecer n.º 411-J, orçamento do Ministério das Finanças.
Parecer n.º 411-M, orçamento dos correios.
Parecer n.º 302, acôrdo com a companhia dos Tabacos.
Parecer n.º 385, sôbre o preenchimento de vacaturas da Direcção Geral das Contribuïções e Impostos.
Parecer n.º 196, que cria o Montepio dos Sargentos.
Parecer n.º 442, que considera em vigor os artigos 10.º e 11.º da lei n.º 415.
Projecto do Sr. Francisco Cruz.
Está encerrada a sessão.
Eram 24 horas.
O REDACTOR — Sérgio de Castro.