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REPÚBLICA PORTUGUESA
CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 125
EM 11 DE JULHO DE 1923
Presidência do Exmo. Sr. Afonso de Melo Pinto Veloso
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário. — Respondem à chamada 43 Srs. Deputados. É lida a acta, que adiante se aprova com número regimental, e dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Ministro do Comércio (Vaz Guedes) manda para a Mesa uma proposta de lei.
O Sr. Constâncio de Oliveira troca explicações com o Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva) acêrca da eleição municipal o, realizar no concelho de Mafra.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu trata da organização da pauta de jurados na comarca de Anadia e de uma apreensão no Pôrto de medalhas de Nossa Senhora da Conceição com laços azuis e brancos.
Respondem os Srs. Ministros da Justiça (Abranches Ferrão) e das Finanças (Vitorino Guimarães).
O Sr. Cancela de Abreu replica.
Ordem do dia. — O Sr. Mariano Martins requere que entre em discussão a proposta de lei de receita e despesa, sendo aprovado o requerimento.
O Sr. Mariano Martins manda propostas para a Mesa, que são admitidas.
Usa da palavra o Sr. Carvalho da Silva, respondendo o Sr. Ministro das Finanças.
É aprovada a generalidade.
O Sr. Mariano Martins manda para a Mesa propostas de artigos novos, que são admitidas.
São aprovados os artigos 1.º, 2.º e 3.º, salvas as emendas.
São aprovados os artigos novos.
O Sr. Francisco Cruz protesta contra a forma por que se fez a discussão, respondendo o Sr. Mariano Martins, e voltando a falar o Sr. Cruz na parte referente à organização dos caminhos de ferro.
Usa da palavra para explicações o Sr. Ministro do Comércio.
Fala o Sr. Francisco Cruz.
É aprovado o artigo novo, sendo dispensada a última redacção.
O Sr. Almeida Ribeiro faz um requerimento de prorrogação da sessão e sôbre a ordem dos trabalhos a discutir. É aprovado.
O Sr. Carvalho da Silva troca explicações com o Sr. Presidente do Ministério acêrca da recomposição ministerial.
Usam da palavra os Srs. Cunha Leal, Almeida Ribeiro e Carvalho da Silva.
Nomeia-se a deputação para assistir aos funerais do poeta Guerra Junqueira.
Continua o debate sôbre a interpelação do Sr. Cunha Leal, usando da palavra os Srs. Jaime de Sousa e Aires de Ornelas, sendo admitidas as suas moções.
Suspende-se a sessão às 19 horas e 15 minutos, reabrindo às 21 e 65 minutos,
Entram em discussão as emendas do Senado sôbre a melhoria de vencimentos aos funcionários públicos.
Ficam votada», tendo usado da palavra os Srs. Cancela de Abreu, Carlos Pereira, Mariano Martins, Viriato da Fonseca, Ministro das Finanças, Adolfo Coutinho, Ferreira de Mira e Francisco Cruz.
Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Última redacção. Propostas de lei. Pareceres.
Abertura da sessão às 15 horas e 25 minutos.
Presentes 43 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 64 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.

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Diário da Câmara do» Deputados
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Ferreira Vidal.
Américo da Silva Castro.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Ginestal Machado.
António Pais da Silva Marques.
António de Sousa Maia.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Cândido Pereira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado Freitas.
Delfim do Araújo Moreira Lopes.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Estêvão Águas.
João de Ornelas da Silva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
José Cortês dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Martins.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Pedro Góis Pita.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Sebastião de Herédia.
Valentim Guerra.
Vergílio da Conceição Costa.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Abílio Marques Mourão.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Albino Marques de Azevedo.
António Correia.
António Dias.
António Lino Neto.
António Maria da Silva.
António de Paiva Gomes.
António Pinto de Meireles Barriga.
António Vicente Ferreira.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Pires do Vale.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Custódio Martins de Paiva.
David Augusto Rodrigues.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Cruz.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Hermano José de Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
Jaime Pires Cansado.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
José Pedro Ferreira.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Matias Boleto Ferreira de Mira.

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Sessão de 11 de Julho de 1923
Paulo da Costa Menano.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Tomé José de Barros Queiroz.
Vasco Borges.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Afonso Augusto da Costa.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António de Mendonça.
António Resende.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco da Cunha Rege Chaves.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Germano José de Amorim.
Jaime Duarte Silva.
João Baptista da Silva.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Jorge de Barros Capinha.
José Domingues dos Santos.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Duarte.
Manuel de Sousa Coutinho.
Maximino de Matos.
Nuno Simões.
Paulo Limpo de Lacerda.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Ventura Malheiro Reimão.
Pelas 15 horas e 25 minutos, com a presença de 43 Sr s. Deputados, declarou o Sr. Presidente aberta a sessão.
Leu-se a acta e o seguinte
Expediente
Ofícios
Da Câmara Municipal de S. Vicente (Madeira), aprovando as reclamações católicas.
Para a Secretaria.
Da Câmara Municipal de Lousa, secundando a Câmara de Santarém, dispensando as câmaras de vários encargos.
Para a comissão de administração pública.
Do Ministério da Guerra, respondendo ao ofício n.º 502, relativo ao requerimento do Sr. Pires Monteiro.
Para a Secretaria.
Telegramas
Das Câmaras Municipais de Feira e de Aljustrel, pedindo para ser votada a lei das percentagens municipais.
Do Sindicato Agrícola de Almodóvar, secundando a representação da Associação de Agricultura Portuguesa.
Da direcção dos empregados do comércio, de Monção e Associação dos Empregados do Comércio de Viana do Castelo, pedindo a anulação da contribuição industrial.
Para a Secretaria.
Antes da ordem do dia
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Vaz Guedes): — Mando para a

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Mesa uma proposta, para a qual peço urgência.
A proposta de lei vai adiante por extracto.
O Sr. Constâncio de Oliveira: — Peço a atenção do Sr. Presidente do Ministério para as considerações que vou expor.
Em Novembro do ano passado realizaram-se eleições municipais em todo o país. Sucedeu, porém, que em todos os concelhos que constituem o círculo de que sou representante neste Parlamento o Partido Democrático perdeu as eleições.
Ora, sendo as antigas vereações compostas, na maioria, por cidadãos filiados nesse Partido, compreende-se fàcilmente quanto desgostoso ficou por ter sido vencido nas últimas eleições.
E então o que fizeram os seus correligionários dos três dêsses concelhos?
Falsificaram, as actas duma assemblea eleitoral de cada um dêstes três concelhos, mie são Oeiras, Sintra e Mafra, e, com tal expediente, os processos eleitorais teriam de ser enviados à Auditoria Administrativa, continuando os antigos Vereadores a permanecer nas suas cadeiras municipais.
A Auditoria Administrativa foi de parecer que se repetissem as eleições nessas três assembleas, sendo êsse parecer confirmado depois pelo Supremo Tribunal Administrativo.
Como na assemblea da Amadora, do concelho de Oeiras, o Partido Democrático visse que venceria a eleição, esta repetiu-se.
Mas nos outros dois concelhos, como o dito Partido receava perder, a convocação para a repetição do acto eleitoral nas respectivas assembleas foi protelado durante muito tempo, tendo sido por fim fixado o dia 1 do corrente para a sua realização*
Nas vésperas, porém, dêsse dia, o Sr. Presidente do Ministério mandou fazer um adiamento para os fins de Agosto. Eu tenho pelo Sr. Presidente do Ministério a máxima consideração; conheço S. Ex.ª do tempo da propaganda, em que nós verberávamos asperamente os processos empregados pelos monárquicos para nos arrebatarem dos lugares que legitimamente conquistávamos por meio das eleições.
Creio bem que S. Ex.ª não desejaria colaborar ou sancionar actos idênticos àqueles que tanto censurou.
O Sr. Presidente do Ministério forçado, porém, pelas imposições dos seus correligionários, daqueles dois concelhos, deixa-se arrastar por êles, esquecendo-se do que disse no tempo da propaganda.
Um único pedido faço, porém, vae Sr. Presidente do Ministério: é que não torne a mandar fazer novos adiamentos, a fim de que essas eleições se realizem, finalmente, no dia para que estão agora convocadas.
Tenho dito.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Afirmo a V. Ex.ª que o acto eleitoral não será de novo adiado.
V. Ex.ª sabe que depois da portaria se deram uns casos em que eu tive de intervir, por causa de cereais, e o que é facto é que êste estado de cousas não pode continuar, e o que afirmo é que o acto eleitoral se efectuará no dia marcado.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Constâncio de Oliveira: — Agradeço as explicações de V. Ex.ª, bem como a promessa de que as eleições nos concelhos, de Sintra e Mafra não serão mais uma vez proteladas.
Não posso, porém, deixar de dizer que a justificação que o Sr. Presidente do Ministério deu para o adiamento do acto eleitoral não tem razão de ser.
A questão relativa ao abastecimento de farinhas foi um pretexto falso.
Não havia outra razão senão o desejo dos actuais edis, se manterem agarrados às cadeiras da vereação.
Um outro pedido ainda faço: é que, quando, finalmente se realizarem êsses actos eleitorais, o Sr. Presidente do Ministério dê as providências necessárias para que garanta a Uberdade de voto, e não sejam, portanto, impedidos de exercer o seu direito de voto aqueles cidadãos que se apresentarem nas assembleas eleitorais para tal fim.
Não posso esquecer que na assemblea dá Amadora se fizeram as maiores pressões sôbre os eleitores e ameaças contra os nossos correligionários, aos quais, por

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fim, nem deixavam permanecer na sala onde se realizou o acto eleitoral.
São factos que nós, republicanos, por forma nenhuma podemos tolerar, para honra e prestígio do regime.
Tenho dito.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Chamo a atenção do Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos para o seguinte: em algumas comarcas do país e nomeadamente na comarca de Anadia foram cometidas as maiores irregularidades na organização das pautas do júri criminal.
Para o recenseamento dos jurados criminais prescreve a lei, e nomeadamente a portaria n.º 700, de 5 de Julho de 1916, que se mandem ouvir e convocar para as reuniões destinadas a organizar as pautas as respectivas juntas de freguesia, a fim de darem as informações que se referem à lei de 1855.
V. Ex.ª talvez não ignore que a grande maioria dos cidadãos da comarca da Anadia são monárquicos. Os que não são monárquicos pertencem quási todos ao partido nacionalista. São muito poucos os democráticos.
Pois dá-se a circunstância curiosa de a pauta do júri, para o ano futuro, ser constituída quási exclusivamente por democráticos! Êste facto deriva de irregularidades e abusos cometidos pelas autoridades que intervieram no assunto e de certa negligência do juiz da comarca. O chefe democrático local, que é advogado, influirá no caso.
Os réus escolhem-no para seu defensor para terem garantida a benevolência dos correligionários dele que constituem o júri.
O facto, como V. Ex.ª vê, é extremamente grave e está causando grande indignação em toda a comarca.
Espero que o Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos tomará providências, ordenando um inquérito e fazendo cumprir a lei.
Peço agora a atenção do Sr. Ministro das Finanças para um caso original.
Uma casa comercial do Pôrto que negoceia em artigos religiosos mandou vir do estrangeiro umas medalhas de Nossa Senhora da Conceição.
Destas medalhas umas tinham um laço de esmalte com as cores azul, e branca e outras um laço com as cores verde e
branca. A cor azul e branca é a cor simbólica de Nossa Senhora. Pois a alfândega do Pôrto julgou ver nos emblemas com as cores azul e branca intuitos políticos, e receou que com êles se pensasse em proclamar a monarquia no Pôrto, e por isso mandou apreender as medalhas.
Passam talvez pela alfândega do Pôrto bombas e armas, mas as medalhas é que não podem passar!
Isto é irrisório e mostra bem o facciosismo e a intolerância do Sr. Tamagnini Barbosa, director da alfândega.
Peço ao Sr. Ministro das Finanças o favor de me dizer qual a disposição de lei em que se baseou para concordar com a apreensão destas medalhas e impedir que fossem entregues à casa comercial destinatária.
Custa-me a crer que o Sr. Ministro das Finanças, que é uma pessoa ponderada, dêsse uma ordem desta natureza. Naturalmente o seu despacho foi devido a sugestão do Sr. Tamagnini Barbosa.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — Devo informar o ilustre Deputado Sr. Cancela de Abreu que dei o meu despacho ao abrigo de uma disposição legal. Essas medalhas eram encimadas pela coroa da monarquia com as cores azul e branca, constituindo símbolos do extinto regime. Portanto é fora de toda a dúvida que essas medalhas eram mais representativas de propaganda monárquica. do que de propaganda religiosa.
Apoiados.
Não resta dúvida que o que se quis foi ostentar as cores da antiga bandeira. Vê-se isso bem claramente.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Poderiam mandar devolver as que tivessem a coroa, e só essas.
O Orador: — O que importa são as cores, que eram com o fim de simbolizarem a antiga bandeira.
O orador não reviu
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Abranches Ferrão): — Vou mandar averiguar como os factos se passaram e farei justiça de forma a atender tudo quanto fôr razoável.
O orador não reviu.

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O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Discordo inteiramente do Sr. Ministro das Finanças. O -Sr. Ministro não podia fundamentar legalmente o seu despacho. As cores azul e branca são também as cores dos emblemas de Nossa Senhora da Conceição. Só o susto do Sr. Ministro das Finanças e o facciosismo do Sr. Tamagnini Barbosa é que puderiam levar à conclusão de que se queria lembrar as cores da antiga bandeira.
O» Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — Sr. Presidente: o caso a que S. Ex.ª se refere da importação de medalhas de Nossa Senhora da Conceição, não é tam inofensivo como se lhe afigura.
E. que houve também o pedido de um despacho, que em presença de dúvidas da alfândega eu mandei suspender nos termos da lei, de umas medalhas com a efígie de Nossa Senhora, tendo no reverso escritas as palavras Deus e Rei.
Não me parece que a alguém possa restar dúvidas de que não haja quaisquer intuitos políticos com a sua importação.
Creio, pois, que razão teve a alfândega do Pôrto em levantar as dúvidas que apresentou.
Se as medalhas a que S. Ex.ª se referiu foram importadas apenas com intuitos de propaganda religiosa, a casa importadora terá toda a facilidade em despachadas, inutilizando as fitas azuis e brancas.
Se a Câmara aprovar qualquer disposição, anulando o que dispôs a lei que tive de aplicar para suspender o despacho, seguirá livremente o despacho de tais medalhas. Isso é com a Câmara. Se ela entender que assim deve fazer, que o faça. Eu é que não posso deixar de proceder como procedi, visto que não me convenço de que na verdade não se trata de símbolos da extinta monarquia.
Tenho dito.
O orador não reviu.
ORDEM DO DIA
O Sr. Mariano Martins (em nome da comissão do Orçamento): — Requeiro que a proposta de lei de receita e despesa para 1923-1924 entre imediatamente em discussão.
O Sr. António Maia (para interrogar a Mesa): — O Sr. Ministro da Guerra já está no edifício da Câmara?
O Sr. Presidente: — Não me consta. Seguidamente é aprovado o requerimento do Sr. Mariano Martins.
O Sr. Presidente: — Está em discussão a proposta dê receita e despesa.
O Sr. Mariano Martins: — Sr. Presidente: os números que se encontram na proposta ministerial de receita e despesa são concernentes à previsão das receitas feita na ocasião em que o Sr. Ministro das Finanças apresentou essa proposta ao Parlamento, e à fixação das despesas computadas na mesma ocasião.
Na discussão parlamentar êsses números foram rectificados o a comissão do Orçamento fez um apanhado completo das rectificações feitas, e nessa conformidade mando para a Mesa as rectificações das contas consignadas nos artigos 1.º, 2.º e 3.º da propostas.
O orador não reviu.
Foram lidas na Mesa e admitidas.
O Sr. Carvalho da Silva: — No dia 11 de Julho está a discutir-se nesta Câmara, para ser votada, a lei de meios, infringindo-se assim a letra expressa da Constituïção.
Mais uma vez se prova a falta de respeito que há na República pela lei fundamental do País.
Mas, Sr. Presidente, não vale a pena levar muito tempo a discutir isso que se chama «lei de meios», porquanto já todos nós chegámos à conclusão de que o Orçamento do Estado não passa de um amontoado de números que não correspondem à verdadeira situação do País.
Assim é que as diferenças cambiais estão calculadas no Orçamento para uma depreciação de 1:500 por cento, quando, a verdade, é que essa depreciação anda por 2:300 por cento.
Isto mesmo foi salientado pela minoria monárquica, quando da discussão do Orçamento, mas a Câmara não quis atender ao que então dissemos.
A uma conclusão poderemos, porém, chegar, fazendo o confronto da receita cair

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culada (705:000 contos) com a receita dos anos anteriores.
É a de que uma enorme carga de tributos pesará sôbre o País, o que irá concorrer para o agravamento da vida.
j E é ainda nestas circunstâncias que o Sr. Ministro das Finanças nos anuncia novos impostos!
Contra, isso protestamos.
Pelo que respeita às despesas, interessante será também o confronto que se faça dos encargos da dívida pública actuais com os dos anos transactos, para se ver como vai a galope o aumento dêsses encargos, a que teremos de juntar os do novo empréstimo que o Sr. Ministro das Finanças nos apresentou como sendo um dos melhores elixires para a melhoria cambial, e que o Sr. Velhinho Correia defendeu porque — disse-o S. Ex.ª — uma vez aprovado êsse empréstimo o câmbio passaria para a casa dos 4, pois de contrário seria uma operação ruinosa.
Ora como o câmbio não passou para a divisa 4, antes se tem firmado no ponto baixo dos últimos tempos, não deve restar dúvida de que tal medida é ruinosa.
Estamos já com a prova de que a minoria monárquica falava com toda a razão quando afirmava que o empréstimo seria prejudicial para o País.
A maioria não quis compreender isso, e entendeu que devia votar som atender a qualquer razões. Agora aí tem a sua obra e ainda as consequências não estão de todo evidenciadas.
Demonstra-se, além disso, que as esperanças que o Sr. Ministre das Finanças depositava nos resultados da sua tam acariciada operação não tinham razão de ser, pela impossibilidade em que S. Ex.ª se encontra de lançar no mercado os títulos do novo empréstimo, títulos que estão já a ser vendidos abaixo do preço por que foram emitidos, e que hão-de ainda atingir um preço de tal forma inferior que hão-de tornar a operação verdadeiramente ruinosa.
O Sr. Ministro das Finanças em face da situação que criou com tanto carinho, há-de ter já chegado à conclusão de que não poderá lançar êsses títulos no mercado.
Afirmou-se na imprensa que a minoria monárquica, combatendo a proposta de empréstimo, estava levando a cabo uma obra altamente nociva aos interêsses da Nação, porque nesse empréstimo se via, então, o processo seguro de melhorar as condições de vida.
Aí estão os factos a demonstrar quem estava na verdade e quem estava no êrro. Sr. Presidente: não vale a pena, visto que nada já se pode remediar, estar a perder tempo na discussão desta proposta. O papel de representante do País é evitar, quanto possível, a votação de medidas ruinosas para a economia nacional. Isso fizemos nós dêste lado da Câmara. Como homens de ordem, não hesitámos, ao tratar-se da proposta de empréstimo, em empregar todos os esfôrços no sentido de evitar a sua aprovação e até as violências com que a maioria pretendia fazê-la passar.
Não nos esqueceram ainda os termos violentos com que a própria minoria nacionalista se referiu à nossa enérgica oposição durante o seu abandono desta sala.
Os factos, porém, vêm felizmente provar que a minoria monárquica tem sobejos motivos para se não dar por arrependida da patriótica atitude que tomou. Tenho dito. O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Gruimarães): — Poucas palavras pronunciarei em justificação da proposta em discussão, porquanto toda a Câmara reconhece a urgência que há na sua votação, dadas as dificuldades que advêm para a administração pública do facto de não estar ainda aprovada a chamada lei de meios.
Até êste momento não foi ordenada qualquer despesa por conta do actual ano económico. Na devida altura o ilustre relator do Orçamento terá ocasião de apresentar à Câmara uma proposta pela qual o Govêrno ficará ilibado da responsabilidade de ter feito nestes dias o pagamento dos juros da dívida, pagamento que se efectua por meio de operações de tesouraria.
Quanto às outras questões que o Sr. Carvalho da Silva abordou, eu terei ocasião de responder na devida oportunidade. Não quero, porém, deixar de dizer desde já que a diferença entre o Orçamento dêste ano e o do ano económico

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passado não representa de forma alguma uma nova sobrecarga para o contribuinte. Em relação à situação cambial, devo dizer muito ràpidamente a S. Ex.ª que podemos afirmar que há dez meses para cá temos o câmbio estabilizado.
Esta situação não nos dispõe mal e isso poderá S. Ex.ª verificar se se der ao cuidado de examinar as tabelas de todos os outros países sôbre o mesmo assunto.
Em Portugal pode dizer-se que há uma melhoria, pequena é facto, mas uma melhoria relativamente a outros países com maiores recursos do que nós, como por exemplo a França, a Bélgica e a Itália.
Devo no emtanto dizer que esta situação de agora se relaciona com dois casos, um dos quais diz respeito à remodelação do convénio com a França, que na verdade veio trazer uma grande perturbação económica ao nosso país, e a segunda causa é a queda do franco que, na verdade, está exercendo uma grande influência na economia nacional, pois a verdade é que a exportação tem deminuído extraordinariamente.
Quanto ao empréstimo, eu devo dizer a S. Ex.ª que êle ainda não pode ter exercido benefícios, pois a verdade é que só ontem começou a entrar o produto dêsse empréstimo nos cofres do Estado.
Quanto ao lançamento de títulos no mercado, êsse é um assunto em que o Ministro das Finanças, eu ou o que vier, terá de pensar.
Eu estou absolutamente convencido que a situação cambial actual há-de ser melhorada, podendo o Govêrno então lançar no mercado os títulos dos outros quatro milhões por intermédio do Banco de Portugal e de harmonia com a cotação em vigor, e assim o juro não deverá ser tam elevado como o actual.
Eu estou absolutamente convencido que o ilustre Deputado Sr. Carvalho da Silva há-de concordar comigo num ponto, isto é, de que melhor é pagar juro do que aumentar a circulação fiduciária., pois a verdade é que esta havia de trazer encargos muito superiores para o Estado do que o empréstimo pela forma como êle foi realizado.
Não é agora esta a ocasião mais própria para desenvolver êste assunto, pois a verdade é que teremos mais oportunidade para o ventilar, visto que estou
pronto a tratar dele com S. Ex.ª ou qualquer outro Sr. Deputado que, porventura, deseje usá-lo nesta casa do Parlamento.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Mariano Martins: — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa umas propostas que se destinam a ser introduzidas na lei de receitas e despesas.
Não vou fazer uma larga justificação delas, por isso que a simples leitura das mesmas basta para a Câmara poder ficar suficientemente elucidada.
Trata-se na primeira destas propostas de um bill de indemnidade dado ao Govêrno para se justificar até certo ponto os pagamentos que se fizeram, e que não podiam deixar de se fazer, por isso que essas importâncias são abonadas diàriamente.
A segunda proposta refere-se a vários militares que prestaram serviços em vários Ministérios, como, por exemplo, nos de Marinha, Colónias e Estrangeiros, cujos pagamentos devem ser feitos pelo Ministério da Guerra, o que até certo ponto é de toda a justiça e simplifica muito os serviços.
A terceira proposta diz respeito a um funcionário que está prestando serviços no. Ministério das Finanças, deve haver vinte anos, o qual tem prestado relevantíssimos serviços, mas que está prestes a ter que abandonar êsse lugar por ter de ser nomeado juiz de 1.ª instância.
Desta forma legaliza-se a situação, não perdendo assim o Ministério das Finanças um funcionário que é competentíssimo e que tem prestado relevantes serviços.
Pela quarta proposta legalizam-se todas as despesas que se fizeram no ano económico de 1920-1921.
A quinta proposta destina-se a autorizar o Govêrno a abrir os créditos necessários pura fazer os pagamentos com essas despesas.
A sexta e última proposta visa a autorizar o Govêrno a fazer o pagamento de todas as despesas resultantes da remodelação dos serviços nos caminhos de ferro.
Tenho dito.
O orador não reviu.

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O Sr. Presidente: — Não está mais ninguém inscrito, vai votar-se.
Os Srs. Deputados que a aprovam na generalidade queiram levantar-se.
Foi aprovada.
O Sr. Presidente: — Entra em discussão na especialidade.
Vai ler-se o artigo 1.º
foram aprovados, sem discussão, os artigos 1.º, 2.º e 3.º, e os artigos novos da comissão do Orçamento, salvas as emendas.
O Sr. Mariano Martins: — Mando para a Mesa um artigo novo para que seja revogada a legislação em contrário.
foi aprovado o artigo mandado para a Mesa pelo Sr. Mariano Martins.
O Sr. Francisco Cruz: — Lamento que nas propostas que vêm para a Mesa não sejam incluídas as disposições que devem conter tais propostas ou projectos.
Aqui faltava um artigo revogando a legislação em contrário.
É mais uma das causas, merco da forma como correm os trabalhos parlamentares.
Aqui há disposições novas, e entre elas uma que se refere à proposta do Sr. Ministro do Comércio e Comunicações, sôbre um assunto que a meu ver deve ser tratado mais demoradamente quando me referir à interpelação do Sr. Cunha Leal.
Direi ao Sr. Ministro do Comércio e Comunicações que, estando na Mesa uma proposta de remodelação dos serviços públicos, é de estranhar S. Ex.ª venha legislar sôbre um assunto de tam magna importância.
Neste momento levanto o meu mais veemente protesto contra a forma como isto se faz, porque é fundamentalmente desonesto.
É um acto absolutamente condenável sob o ponto de vista moral, e sob o ponto de vista legal, e ainda sob o ponto de vista dos interêsses do Estado.
Sr. Presidente: de lamentar é que os homens que ocupam aquelas cadeiras nem sempre olhem bem alto, deixando mesquinhos interêsses para lazer uma obra útil e proveitosa; mas quando tratar do assunto do debate político, provarei
que houve imoralidade e ilegalidade, ficando feridos os interêsses do Estado.
Protesto, pois, contra esta forma de legislar; e creiam que não perdem pela demora.
A apreciação dessa regulamentação exige que seja vasta e imparcial, porquanto acima de tudo, eu que não represento só o meu partido, mas que sou republicano de sempre, quero a República dignificada.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Mariano Martins: — Pedi a palavra para fazer algumas considerações em virtude das que foram produzidas pelo Sr. Francisco Cruz.
Disse S. Ex.ª que esta proposta veio sub-repticiamente à apreciação da Câmara.
Os Deputados não fizeram nenhum reparo, quando fiz as minhas considerações. Ficaram todos ajuizando de qual o valor da proposta.
Mas chamou-se a atenção da Câmara para a proposta do Sr. Ministro do Comércio e Comunicações publicada posteriormente, tendo o Govêrno ficado autorizado a fazer essa despesa dos caminhos de ferro.
Disse também S. Ex.ª que a reforma era ilegal. Não me parece que o seja.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações estava autorizado por leis anteriores a fazer essa reorganização.
Disso também que era desonesta, e esta foi uma palavra que me feriu.
Bastava esta reforma ser feita por um republicano, homem honesto como é o Sr. Queiroz Vaz Guedes, para não poder ser uma obra desonesta, mas sim honesta. E lastimo que S. Ex.ª, sem ter feito um estudo sôbre essa reforma, a classificasse de desonesta.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Francisco Cruz: — Tinha prometido referir-me mais detidamente ao assunto; mas bastava a mais elementar e insignificante apreciação do assunto para ver que era ilegal essa reforma. O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações, que tam. apressadamente quis legislar sôbre um assunto de tanta magnitude, cometeu um acto fora de lei, não aguardan-

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do a lei que deve reorganizar os serviços públicos.
Apoiados.
Hei-de mostrar à Câmara quanto é ilegal esta reforma.
Basta afirmar à Câmara que se criam lugares do adidos sem haver direitos, para provar que é imoral e desonesto.
Um outro Govêrno que não fôsse êste, um outro Govêrno que tivesse a noção exacta do que valem a moralidade e os interêsses do País, não faria uma cousa destas.
Prometo, Sr. Presidente, trazer à Câmara a prova do que afirmo, e termino dizendo que não conheço o Sr. Vaz Guedes como velho republicano.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Queiroz Vaz Guedes): — Sr. Presidente: perante um ataque que é feito à reorganização dos Caminhos de Ferro do Estado, em ocasião em que êsse ataque é inteiramente inoportuno, porque acêrca da lei do meios estamos, apenas consignando nela a maneira de poderia ser satisfeitos os encargos resultantes da reorganização, ou vejo-me obrigado a dar umas explicações para que a Câmara não fique com a impressão de que houve da minha parte vontade de legislar de sobreposse.
Sr. Presidente: o artigo 36.º da lei n.º 1:335, indicado aliás rio relatório da reorganização, determinava peremptòriamente que os serviços. autónomos se comprimissem dentro da respectiva receita. Quando tomei posse da minha pasta, no dia 9 de Janeiro, dizendo a disposição da lei que ela devia ser aplicada desde Janeiro, eu em 9 de Janeiro não podia já dar execução a essa disposição da lei n.º 1:335, porque nada havia feito. Como tal, os caminhos de ferro tinham de continuar vivendo à sombra dos subsídios do Estado, entrando por isso o Sr. Ministro das Finanças numa situação de ilegalidade, para a qual só agora encontrou o respectivo bill da proposta de lei que melhora os vencimentos dos funcionários públicos. Para remediar ainda a situação dos caminhos de ferro havia as verbas consignadas no Orçamento, apenas impossibilitadas na sua aplicação, uma vez que
havia uma disposição de lei que a proibia terminantemente nesse sentido. Em todo o caso fiz todos os esfôrços para poder em tempo oportuno dar execução ao disposto no artigo 36.º, e devo notar que êste artigo 36.º da lei n.º 1:335.º foi inscrito na respectiva lei como uma aspiração, talvez inexeqüível, mas interessante, porque me parecia interessante enveredar pelo caminho dos serviços industrializados se bastarem pelas suas receitas, sem o que mais se desacreditariam, tendo, porventura, de passar pára a posse de particulares.
Apoiados.
Parecia-me, portanto, defensor como sou da ideia de que a administração do Estado é absolutamente conveniente, porque é a única que não precisa de retribuir o capital com bónus especiais, revertendo por isso todo o lucro para benefício do material e pessoal, parecia-me, portanto, conveniente dar urgente aplicação ao artigo 36.º da lei n.º 1:335. Por consequência, quando o ilustre relator da lei o ano passado mo apresentou êsse artigo, eu disse que o considerava uma aspiração, mas que o queria ver tornado uma realidade.
Tinha sido, depois da revolução triste de 19 de Outubro, dissolvido o conselho dos caminhos de ferro de que eu fazia parte, e tendo-se perguntado se podia haver recurso dessa dissolução, pela Procuradoria Geral da República foi dito que não. Nestas condições, eu nunca mais voltei aos caminhos de ferro, mas fiz o possível por apressar a reorganização, porque tinha sido nomeada uma comissão administrativa com os encargos não só de. administrar interinamente os negócios dos mesmos caminhos de ferro, mas de elaborar uma reorganização.
Essa comissão era composta pelos seguintes Srs.: engenheiro César Ferreira, a cuja competência técnica nada há que dizer, Rosa Mateus e Artur Mendes. Foram-lhes concedidos sessenta dias para apresentarem a reorganização, prazo que foi depois prorrogado por insuficiente, e os caminhos de ferro continuaram vivendo num regime transitório, em que podiam continuar a viver, mas que era necessário que terminasse em virtude do artigo 36.º da lei n.º 1:335.
Chegado então ao Poder, imediatamente tomei conta da reorganização, e co-

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mecei a fazê-la discutir pela forma que me pareceu mais adequada, atendendo ao «eu conteúdo, e, como dêsse conteúdo resultava uma abolição de 3:125 lugares dos quadro anteriores, foi-me dito que se por acaso eu quisesse fazer uma discussão geral da reorganização ela nunca mais seria publicada, porque haveria tais prejuízos de direitos adquiridos que não seria possível fazer isso. Concordei, mas deixei na lei uma válvula para todo o pessoal que quisesse reclamar sôbre direitos adquiridos, válvula que me permitia atender ou não essas reclamações, conforme fossem ou não de justiça. Nestas condições e depois de ter consultado jurisconsultos de todos os lados da Câmara, e até jurisconsultos de fora dela, e depois de ter até tornado pública perante a Câmara a minha intenção, porque a respeito do orçamento do Ministério do Comércio eu mesmo informei do que ia fazer, visto que era a única maneira de dar satisfação a um preceito legal, expedi a reorganização, o expedi-a quando já tinha visto na nova lei que regula os vencimentos dos funcionários públicos um artigo que diz que é mantida em toda a sua integridade a disposição do artigo 36.º da lei n.º 1:335.
Eu invoco o testemunho da Câmara inteira, e pregunto se não era obrigação do Ministro proceder da forma como procedi, cumprindo uma disposição que a Câmara tinha tomado e que mantinha.
É êste um ponto sôbre o qual não pode haver duas opiniões.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Francisco Cruz: — Sr. Presidente; é verdadeiramente lamentável a resposta do Sr. Ministro do Comércio. S. Ex.ª não consegue justificar, nem de leve, aquilo a que eu chamei uma cousa ilegal, imoral e desonesta.
Declarou S. Ex.ª que tinha obtido da Câmara uma autorização para remodelar os serviços dos caminhos de ferro do Estado; mas toda a gente sabe que há mais de três meses que está pendente da discussão do Parlamento uma proposta de lei relativa à reorganização dos serviços públicos, na qual, evidentemente, estão incluídos os caminhos de ferro do Estado.
Eu chamo às cousas o que elas são, e por minha honra declaro que jamais eu seria capaz de voltar, no caso de S. Ex.ª, àquele lugar.
Nunca a minha cerviz se baixou seja a quem fôr para uma indignidade.
Após o desgraçado movimento de 19 de Outubro, praticaram-se nos caminhos de ferro verdadeiros latrocínios, pois era rara a mercadoria em trânsito que chegava ao seu destino. Ora todos êsses delinquentes deviam ser afastados. Até hoje, porém, ainda não vi que isso se tivesse feito.
Grande parte dos funcionários dos caminhos de ferro do Estado fica na situação de fiscal de si mesmo, e aqueles que há muitos anos estavam dentro dos quadros vão para a rua ou ficam adidos.
Basta esta circunstância para demonstrar que essa reorganização é desonesta.
Mas há mais.
A indisciplina é fomentada por que alguns dos indivíduos que são reconduzidos ao serviço vão ocupar uma situação inferior à, daqueles que eram seus subordinados.
Sr. Presidente: quando tratarmos da discussão da proposta de reorganização dos serviços públicos, eu terei ensejo de. mais largamente me referir a êste assunto, demonstrando com mais argumentos ainda a razão que me assiste de classificar a reorganização dos caminhos de ferro do Estado como uma cousa imoral e desonesta.
Se houvesse uma lei de responsabilidade ministerial, alguns dos Ministros que têm passado pela pasta do Comércio talvez não estivessem, como estão, em liberdade.
Com exemplos desta ordem, como é que pode exigir-se que haja disciplina?
Eu faço justiça a todos, e o meu coração deseja a República dignificada, e assim protesto contra toda a obra anti-patriótica que fira os interêsses da Nação; e pregunto qual será a obra que se possa sustentar quando não represente os interêsses do País!
Àpartes.
As considerações do Sr. Ministro do Comércio e Comunicações só serviram para o prender a um torniquete donde não pode sair.
Tenho dito.
O orador não reviu.

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O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: a celebrada reorganização dos caminhos de ferro merece um largo debate nesta Câmara.
Ando coligindo os elementos necessários para apreciação do decreto ultimamente publicado. Não perde o Sr. Ministro do Comércio com a demora.
É curioso que, estabelecendo-se o princípio escandaloso da criação de lugares importantes numa organização de serviços, S. Ex.ª não tivesse uma palavra de resposta para o Sr. Francisco Cruz.
E tam estranha é essa criação de lugares, que até se inventou um lugar para determinado indivíduo, que é nem mais nem menos do que um graduado outubrista.
Àpartes.
Vou fazer com que o Sr. Ministro diga as razões que o levaram a proceder assim.
Sr. Presidente: é extraordinário que o Sr. Mariano Martins tenha apresentado o seu artigo, sabendo S. Ex.ª que a lei de meios só pode estabelecer as receitas e despesas do Estado.
Àpartes.
Um tal artigo não podia ser apresentado.
E à sombra de que princípio vem o Sr. Mariano Martins transferir para o Estado os encargos pesadíssimos a que o artigo se refere?
O Sr. Mariano Martins (interrompendo): — Há a lei do 14 de Julho de 1913.
Àpartes.
O Orador: — Seria assim se não se tratasse de serviços autónomos.
Tenho dito.
O Sr. Mariano Martins: — Sr. Presidente: pela segunda vez vou repetir a afirmação, já feita, de que a Câmara teve conhecimento pleno do artigo novo que foi lido na Mesa.
Sé alguns Srs. Deputados não ouviram é porque não, se interessaram no assunto, porque êsse artigo não foi apresentado sub-repticiamente.
Àpartes.
Posso apresentar testemunhas do facto, pois que alguns Srs. Deputados o votaram.
De resto, Sr. Presidente, não traz êsse artigo nenhuma novidade.
Todos sabem também que os regulamentos e decretos do Poder Executivotêm execução provisória em quanto não» forem vistos pelo Parlamento.
Êsse artigo tem ligação com a lei de meios, como vou provar.
A Câmara sabe que a lei de meios que se votou se refere aos serviços autónomos.
O que é necessário é fazer um ajustamento entre o orçamento dos serviços autónomos o as verbas que se vão pagar; isto independentemente do direito que o Poder Legislativo tem de alterar, de modificar como entender os actos do Poder Executivo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Como não esta mais nenhum Sr. Deputado inscrito, vai votar-se.
Pôsto à votação, o artigo novo foi aprovado.
Documentação
Propostas de artigos novos
Artigo 4.º São relevados o Govêrno e os agentes do Poder Executivo da responsabilidade em que incorreram autorizando e efectuando pagamentos, desde 1 de Julho do 1923 até a publicação da presente lei, do despesas orçamentais consideradas inadiáveis respeitantes ao corrente ano económico de 1923-1924, em conta dos saldos de fundos, de ordens ou de autorizações relativas ao ano económico findo, devendo a legalização dêsses pagamentos realizar-se mediante as necessárias ordens devidamente classificadas nas correspondentes verbas descritas nos orçamentos votados para o mencionado ano económico de 1923-1924, e expedidos pelas repartições de contabilidade competentes. — O Deputado, Mariano Martins.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Artigo 5.º Continua em vigor, em referência ao ano económico do 1923-1924, o disposto nos artigos 4.º e 5.º da lei n.º 1:278, de 30 de Junho do 1922.
§ 1.º Á liquidação o ordenamento das despesas do que trata o artigo 5.º da lei

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n.º 1:278, de 30 de Junho de 1922, será porém efectuada em conta do ano económico de 1921-1922 e das verbas que forem inscritas no orçamento de harmonia com o § 3.º dêste artigo.
§ 2.º Só poderão ser liquidadas e ordenadas ao abrigo do § 1.º as despesas anteriores ao ano económico de 1921-1922.
§ 3.º Fica o Govêrno autorizado a proceder à abertura, no Ministério das Finanças, com as devidas formalidades legais e a favor do mesmo Ministério, dos créditos especiais que forem julgados necessários para a execução do disposto neste artigo e seu § 1.º — O Deputado, Mariano Martins.
aprovado.
Para a comissão de redacção.
Art. 6.º O juiz auditor do Ministério das Finanças a que se refere o § único do artigo 2.º do decreto com fôrça de lei de 14 do Janeiro do 1911, e bem assim o § único do artigo 36.º da lei de 9 de Setembro de 1908, poderá ser um juiz de 1.ª ou 2.ª instância. — O Deputado, Mariano Martins.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Art. 7.º A partir do ano económico de 1923-1924, os oficiais do exército de terra e mar, reformados ou do reserva, que percebem, no todo ou em parte, as suas pensões de reforma e melhorias por diferentes Ministérios, passam a ser abonados somente pelo da Guerra, ficando o Govêrno autorizado a transferir, com as formalidades legais, para êste Ministério, &s verbas que se encontrem descritas nos orçamentos de outros Ministérios destinadas àqueles oficiais. — O Deputado, Mariano Martins.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Artigo.º Fica o Govêrno autorizado a efectuar no orçamento dos Caminhos de Ferro do Estado para o ano económico de 1923-1924 as necessárias rectificações e alterações de conformidade com as disposições constantes do decreto n.º 8:924, de 18 de Junho de 1923.
§ 1.º A partir de 1 de Julho de 1923 o pagamento dos vencimentos e melhorias
dos empregados colocados fora dos quadros dos aludidos caminhos de ferro por virtude do mencionado decreto constituirá encargo do Estado, ficando para êste fim o Govêrno autorizado a abrir no Ministério das Finanças os créditos necessários a favor do Ministério do Comércio e Comunicações.
§ 2.º O pagamento dos vencimentos e melhorias aos empregados a que se refere o parágrafo anterior fica dependente da remessa mensal de um exemplar da correspondente folha à Repartição da Direcção Geral da Contabilidade Pública, que funciona junto do Ministério do Comércio e Comunicações.
§ 3.º À medida que os empregados colocados fora dos quadros por efeito do citado decreto n.º 8:924 passarem à situação de reformados, o Estado dará à caixa de reformas e pensões dos mesmos caminhos de ferro a subvenção correspondente às melhorias a que êles tiverem direito, deixando essa subvenção de ser satisfeita logo que a situação dos Caminhos de Ferro do Estado assim o permita. — O Deputado, Mariano Martins.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
Proponho o seguinte artigo novo:
Artigo 10.º Fica revogada a legislação em contrário. — M. Martins.
Aprovado.
Para a comissão de redacção.
O Sr. Mariano Martins: — Requeiro dispensa de leitura da última redacção.
Foi dispensada a leitura.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se concorda que até às dezanove horas e meia, hora normal do encerramento da sessão, se discuta a interpelação do Sr. Deputado Cunha Leal, o que em sessão prorrogada até à meia noite se discutam as emendas que o Senado introduziu no projecto referente aos vencimentos do funcionalismo público e o projecto referente ao regime cerealífero.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: permita V. Ex.ª que em primeiro lugar eu estranhe a circunstância nova

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de, emquanto está a efectuar-se- na Câmara um debate político, em que há a votar uma moção de desconfiança, o Govêrno pretenda sujeitar-se à discussão de diversos assuntos sem previamente se definir a atitude da Câmara; quere dizer, é o Govêrno a querer continuar naquelas cadeiras sem saber se tem ou não a confiança política da Câmara.
É um sistema novo.
De estranhar é também que se dêsse a substituição de um Ministro sem o Sr. Presidente do Ministério vir à Câmara declarar as razões dessa substituição.
Em toda a parte o Presidente do Ministério nunca deixa de ter com o Parlamento a consideração que lhe é devida, participando factos desta natureza.
Saiu o Sr. Ministro da Marinha e foi substituído pelo Sr. Ministro da Agricultura; pois o Sr. Presidente do Ministério ainda não teve a atenção precisa com a Câmara de lhe comunicar êsse facto.
Lavrando o meu protesto, entendo que o Govêrno não pode manter o prestígio do Poder sem que primeiro a Câmara defina se mantém ou não a confiança política a êsse Govêrno, para êste saber se pode ou não continuar nas cadeiras do Poder.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério, e Ministro do Interior (António Maria da Silva): — Sr. Presidente: como é sabido de toda a Câmara que a razão por que o Sr. Ministro da Marinha saiu foi porque o Senado lhe deu os seus votos para a sua nomeação de Alto Comissário da Província de Moçambique, sendo nomeado o Sr. Ministro da Agricultura para substituir S. Ex.ª interinamente.
Como a Câmara sabe, está pendente da discussão parlamentar um projecto sôbre reorganização de serviços públicos e que num dos seus artigos consigna a doutrina da extinção dos Ministérios da Agricultura e Trabalho, e assim o Govêrno não podia assumir a responsabilidade do provimento definitivo dessa pasta sem estar liquidado êsse assunto.
Não se trata, pois, dum caso político da nomeação dum Ministro para uma pasta que se encontrava vaga; trata-se de uma nomeação interina, não podendo, portanto,
haver da minha parte a mais leve sombra, de desconsideração para com o Congresso, porque fazendo eu parte dêsse mesmo Congresso, seria desconsiderar-me a mim, próprio.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ganha Leal: — Sr. Presidente t quando ontem eu declarei em, nome do meu partido que votaríamos qualquer prorrogação de sessão, e, até a interrupção do debate político, para se discutir a questão do funcionalismo, quis evitar uma especulação que, se andava fazendo com a fome dêsse mesmo funcionalismo. Não é, porém, a mesma cousa. Trata-se dos destinos do funcionalismo ou da questão cerealífera, porque a verdade é esta é incompreensível que o Sr. Ministro da. Agricultura queira discutir a questão cerealífera antes de liquidada a questão política.
Parecia-me que toda a pressa que a maioria quisesse pôr, trabalhando até em sessões prorrogadas para que o debate político se concluísse, era legítima, mas não é legítimo discutir assuntos que são absolutamente a prova, pelas votações que se fizerem da nossa confiança na capacidade política do Govêrno, antes de liquidada a questão de confiança.
Assim, se V. Ex.ªs querem dividir o requerimento em duas partes, uma para que o debate político se prolongue até as dezanove horas e meia e a outra para que a sessão continue às vinte e uma horas, a fim de ser discutida a questão do funcionalismo, nós votaremos êsse requerimento. Mas se se quiser antepor à questão do funcionalismo a questão cerealífera, nós rejeitaremos tal requerimento».
Tenho dito.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: ao fazer o meu requerimento, para. que se discutissem as questões do funcionalismo e do regime cerealífero, não tive o menor intuito de ligar os destinos de um assunto aos do outro. São duas cousas absolutamente distintas.
Quisemos apenas que a seguir a uma se discutisse a outra, para aproveitarmos o tempo.
De resto a questão do funcionalismo será discutida ràpidamente e em seguida

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tratar-se há da discussão do regime cerealífero, que é uma questão económica, do mais alto interêsse, e que pode até resultar numa questão de ordem pública.
Nestes termos, não posso deixir de insistir no meu requerimento.
O orador não reviu.
O Sr. Cunha Leal: — Sr. Presidente: parece-me que não foi compreendido o meu argumento de que o Govêrno não sabe se tem a confiança desta Câmara, e que pôs claramente a questão de confiança.
Nós não podemos aceitar a questão cerealífera como um dos motivos da minha interpelação, para pôr em relevo os favoritismos concedidos à moagem.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: as explicações do Sr. Presidente do Ministério não podem colhêr de maneira nenhuma quanto à interinidade ou não interinidade da nomeação de um novo Ministro.
Nunca houve uma nomeação de Ministros com o Parlamento aberto, sem que ao Parlamento fôsse disso dado conhecimento.
Contra isso protestamos nós. Se era má, se era triste a situação do Sr. Ministro da Agricultura perante esta Câmara, mais triste fica sendo essa situação em ter permitido a sua nomeação, embora interina, para a pasta da Marinha, que não é uma pasta que se pretenda eliminar, como acontece com as pastas da Agricultura e do Trabalho. Não tem portanto justificação alguma a explicação do Sr. Presidente do Ministério.
Com relação à marcha dos trabalhos parlamentares, devo dizer que não se compreende que o Govêrno sem conhecer a sua situação, isto é, sem saber se ainda tem ou não tem a confiança da Câmara, pretenda que se continue na discussão das suas propostas, podendo no emtanto abrir-se uma excepção para a proposta referente ao funcionalismo, que há muito devia estar votada, e que se ainda não conseguiu aprovação, tem sido simplesmente por culpa do Govêrno e da maioria.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai votar se o requerimento do Sr. Almeida Ribeiro.
O Sr. Cunha Leal (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª que consulte a Câmara sôbre se permite que o requerimento do Sr. Almeida Ribeiro seja dividido em duas partes: a primeira relativa à prorrogação da sessão para a votação do projecto referente aos vencimentos do funcionalismo, e a segunda relativa à prorrogação da sessão para a discussão do regime cerealífero.
Consultada a Câmara, resolveu afirmativamente,
Posta à votação a primeira parte do requerimento do Sr. Almeida Ribeiro foi aprovada.
Posta à votação a segunda parte do mesmo requerimento foi igualmente aprovada.
O Sr. Cunha Leal: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º Fez-se a contraprova.
O Sr. Presidente: — Estão sentados 51 Srs. Deputados e de pé 39. Está portanto aprovada a segunda parte do requerimento do Sr. Almeida Ribeiro.
Posta à votação a acta foi aprovada sem discussão.
O Sr. Presidente: — Como o Sr. Ministro do Comércio enviou para a Mesa uma proposta de lei criando um imposto ferroviário, e para a qual pediu urgência, voo consultar a Câmara sôbre se concede a referida urgência.
Consultada a Câmara) resolveu afirmativamente.
O Sr. Presidente: — Devendo realizar-se no próximo sábado o funeral do grande poeta Guerra Junqueiro, a Câmara dos Deputados far-se-há representar não só pela Mesa, como pela seguinte deputação:
Estêvão Águas.
Bartolomeu Severino.
Crispiniano da Fonseca.
Lopes Cardoso.
Carlos de Vasconcelos.
Constâncio de Oliveira.
Morais Carvalho.
Lino Neto.
Agatão Lança.
Para a Secretaria.

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O Sr. Presidente: — Continua no uso da palavra sôbre a interpelação do Sr. Cunha Leal o Sr. Jaime de Sousa.
O Sr. Jaime de Sousa: — Sr. Presidente: reatando as minhas considerações de ontem, contínuo a dizer a V. Ex.ª que me sinto em sérios embaraços para responder ao ilustre Deputado Sr. Jorge Nunes, porquanto S. Ex.ª que ordinariamente, com a sua forma parlamentar de sempre demonstrar as suas afirmações, de sempre provar com factos as suas acusações aos Govêrnos, desta vez S. Ex.ª causou-me uma completa desilusão.
Procurei em Tão em toda a brilhante exposição de S. Ex.ª uma prova, um facto concreto do qual pudesse inferir-se que é justa a ordem de despejo que S. Ex.ª deu ao Govêrno, e que tenha qualquer fundamento a afirmação de que o Govêrno não tenha cumprido nenhum dos compromissos a que se tenha obrigado.
O Sr. Jorge Nunes foi tam longe que chegou quási a convencer-nos de que o Govêrno não tinha, razão para abandonar as cadeiras do Poder, porquanto S. Ex.ª chegou a afirmar que, dos Govêrnos que se sucederam, a melhor presidência tem sido a do Sr. António Maria da Silva.
Daqui se conclui que o mandato do despejo era apenas floreado de retórica, sem nenhum outro significado que não fosse uma aspiração para que o Govêrno deixasse as cadeiras do Poder para ser substituído por figuras militantes e eminentes do seu partido, que estão à altura de ocupar aquelas cadeiras com brilho. Todavia, uma afirmação S. Ex.ª fez que causou certa impressão na Câmara, e foi um tal ou qual ressentimento pela atitude da imprensa para com o seu partido em questões em que êle tem estado envolvido. Ligando esta afirmação com outra que li num jornal da noute, da autoria dê um marechal do Partido Nacionalista, eu concluo que creio que não pensei mal quando me convenci de que os estadistas portugueses não têm a noção certa do que seja a imprensa de um país, que é uma fôrça muito mais poderosa do que todas as outras fôrças que influenciam no equilíbrio social.
É Portugal talvez o único país do mundo em que os seus estadistas estão divorciados da imprensa, quando entre os homens de Estado e a imprensa deve haver uma perfeita harmonia, não só na imprensa nacional, mas também na estrangeira, porque hoje não há uma imprensa dêste ou aquele país, mas uma só imprensa.
Hoje a imprensa é uma.
O Sr. Jorge Nunes: — É um trust do pensamento...
O Orador: — Sim, é um trust do pensamento que tem necessidade de ser orientado sôbre tudo quanto se passa, e a dentro do qual se encontra localizada uma das maiores responsabilidades dos homens de Estado modernos e conscientes.
Entre nós o contacto entre a imprensa e os homens públicos não existe. Existe sim uma outra cousa que lhe é quási absolutamente oposta: o mutismo, o mu-iisino sistemática que impede que essa imprensa só esclareça e elucide sôbre as questões que dizem respeito à vida administrativa do País. E é exactamente porque êsse mutismo existe e é exactamente porque existe a ignorância de todas essas questões, que o jornalismo se vê forçado muitas vezes a lançar-se no campo da fantasia, fantasia que nem sempre, infelizmente, é útil aos interêsses do Estado.
Desta falta de contacto entro os homens públicos e a imprensa resulta o paradoxo que representa o divórcio completo entre o Estado e a opinião pública do País. Somos a única nação do mundo onde se tem a idea de que o Estado é qualquer cousa de diferente da própria nação; que Cio é, até, o inimigo.
Mas, Sr. Presidente, não é só aos homens do Estado a quem incumbe procurar e manter êsse contacto; êsse trabalho incumbe também a todas as pessoas que podem de futuro gerir os negócios públicos; incumbe não só aos partidos do Govêrno, mas também aos partidos de oposição.
Sr. Presidente: eu não quero alongar-me em considerações sôbre o assunto, que é vasto e se presta a largas divagações.
Mas não convém fazer a confusão sôbre uma questão que é clara. Deixemo-la ficar por aqui.

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Veio ainda o Sr. Jorge Nunes tratar «da famosa questão dos lucros ilícitos, o novamente se pretendeu confundir essa questão.
Abordando êste assunto, eu devo dizer que se outra virtude não teve o decreto sôbre os lucros ilícitos, teve ao menos a de nos trazer dois ensinamentos. Mostrou-nos, por um lado, que é possível, por actos derivados de disposições de lei, meter na ordem os especuladores. Por outro lado, mostrou-nos que os Govêrnos, armados com instrumentos de lei, para chamar à ordem os especuladores, encontram contra êles uma fôrça grande, que é o propósito firme de uma parte, porventura mínima, da magistratura judicial, «m não colaborar nos intuitos patrióticos do Estado, do meter na ordem os especuladores.
Vozes: — Não apoiado.
Orador: — E isto tam verdade que nenhum dos que foram apanhados com a bôca na botija — permita-se-me o plebeísmo da frase — sofreram a mais leve condenação.
Poderei estar só ao fazer esta afirmação, mas isso pouco me importa, pois embora veja estarem todos contra mim, eu não sei esconder as minhas opiniões: exponho-as sempre com toda a sinceridade e torno a responsabilidade delas.
Sr. Presidente: deploro que se fizesse completo silêncio sôbre o decreto de lucros ilícitos o mais deplorarei se o decreto foi rasgado.
Depois o ilustre Deputado versou a questão financeira. Falou na situação cambial e na do decreto chamado das exportações.
Eu fui um dos parlamentares que estiveram ao lado do Sr. Jorge Nunes, quando S. Ex.ª fez a sua interpelação ao Sr. Ministro do Comércio de então, que era o Sr. Lima Basto. É que eu também discordava em alguns pontos do decreto das exportações, visto que as disposições estabelecidas no decreto eram inaceitáveis e mão honravam em cousa nenhuma a visão administrativa do Ministro.
Assim é; nesse decreto havia uma alínea referente a frutos verdes e, como as frutas verdes, são mandadas à consignação, não há cambiais. Fiz ver o êrro ao Sr. Ministro e êle concordou comigo, mas disse que não alterava o decreto.
Aqui tem V. Ex.ª o que foi a minha acção nesse assunto.
O Sr. Jorge Nunes, com o brilho do costume, atacou o projecto, mas o que ô certo é que depois de ser pôsto em execução nós estamos a verificar quais tem sido os seus efeitos na situação financeira do País.
Eu vou ler alguns resultados dêsse decreto.
No ano de 1922 pagou em ouro um milhão o oitocentas mil libras.
Continua a leitura.
Segundo informa a inspecção de câmbios, 00 por cento das quinhentas mil libras correspondem à exportação do vinho do Pôrto e cortiças.
É isto, não tendo ainda as notas dos postos, quanto à tributação da marinha mercante, mas que não estará longe de nove milhões de libras.
Mas devemos fazer justiça ao decreto sôbre exportações, que não é uma originalidade do Sr. Lima Basto.
Na Alemanha, em 1921, já havia a lei que obrigava ao depósito de cambiais para. exportação.
E não é êste o único país em que isto sucede.
Portanto, feita justiça ao decreto e levantadas as acusações feitas pelo ilustre Deputado, mostremos agora as consequências do decreto das exportações.
A compra de trigo no estrangeiro pode computar-se grosso modo em um milhão o quinhentas horas.
Há, portanto, um desequilíbrio permanente do qual o Estado não pode libertar-se, emqnanto durar o regime do pão político e regime cerealífero vigente, que o Govêrno emprega todos os esfôrços para extinguir.
O Estado, por intermédio das instituições bancárias, tem que solver êstes encargos, o impõe ao Govêrno uma atenção permanente o vigilante de todos os dias, para impedir a especulação que é do toda a parte e que se não pode. evitar.
Êstes são os factos que desejava apontar à Câmara o cujas conclusões são de molde a tranquilizá-la sôbre a maneira como o Govêrno está preparado para agir em face da situação financeira.
O principal elemento a influir nessa si-

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tuação é essencialmente o factor confiança; e é para êsse factor que desejaria chamar a atenção dos que me escutam, sôbre a confiança dos cidadãos na acção dos Govêrnos em matéria financeira.
Muitos elementos não o quererão ver, mas há uma tal ou qual estabilização da divisa cambial do escudo.
Essa estabilização, relativa embora, é reconhecida dia a dia, e é devida à influência da confiança que se estabeleceu quanto à forma como o Govêrno tem dirigido os serviços públicos, num acentuado desejo de equilibrar o Orçamento do Estado, trazendo à Câmara todos os elementos indispensáveis para que êsse equilíbrio se produza, e ainda pela maneira que acentuei na minha moção, tendo sabido manter a ordem pública, que é de todos os factores aquele o que influi mais para a confiança pública.
Posta assim a questão, não quero alongar mais as minhas considerações.
Desejarei apenas citar ainda as acusações feitas pelo ilustre Deputado a determinada acção do Govêrno, quanto ao uso de autorização para a reforma dos Caminhos de Ferro do Estado.
A questão levou algum tempo a desenrolar, e estaria porventura deslocada, mas com a minha curiosidade de parlamentar, que desejo conhecer as questões, e sem desejar meter a foice em seara alheia, fui ver quais os fundamentos da acusação.
Foi no propósito, que reputo honesto, de cumprir a lei que o Parlamento votou, que o Govêrno, pela pasta do Comércio e Comunicações se considerou obrigado à reorganização.
Então pregunto: tendo a lei determinado que se façam os regulamentos e instruções necessárias para cumprir essa mesma lei, houve um acto ilegal em se cumprir a lei?
Se é a lei que determina num artigo que diploma especial regulará as suas despesas e o respectivo quadro, como pode ser acusado o Govêrno, que está autorizado por uma lei, de ter praticado um crime?
Mas ainda há o artigo 47.º, § 3.º, da Constituïção, código que todos deviam conhecer, mas que como há muita gente que nunca a leu, eu vou ler o que diz êsse h.º 3.º do artigo 47.º para esclarecimento da Câmara.
Deve pois o Govêrno promulgar tudo quanto é necessário para que as leis sejam executadas, e em face disso eu pregunto se o Govêrno não podia promulgar a reorganização dos Caminhos de Ferro do Estado, conforme a lei e a Constituïção.
Também o ilustre Deputado se referiu a um incidente sucedido na Câmara acêrca da discussão da nova reforma cerealífera apresentada pelo Sr. Ministro da Agricultura, mas não faço considerações sôbre o assunto, pois que êle será posta na ordem das discussões, de aqui a algumas horas, e assim julgo preferível esperar essa ocasião para dizer o que entendo.
Vou terminar as minhas considerações, porque a mais nenhum assunto S. Ex.ª se referiu, e eu nada mais quis fazer que expor a minha maneira de ver acêrca da resolução tomada pelo Govêrno a respeito dos Caminhos de Ferro do Estado, estando convencido que a Câmara achará que êle andou bem e lhe dará a sua aquiescência.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Aires de Ornelas: — Sr. Presidente: cumprindo os preceitos regimentais, mando para a Mesa a moção de ordem.
Sr. Presidente: tocando só em pontos restritos a minha moção, não significa isso que eu esteja de acôrdo com a política do Govêrno nos outros pontos referidos na interpelação do Sr. Cunha Leal.
Simplesmente a razão é que neste lado da Câmara dividimos o trabalho e eu encarreguei-me dêstes pontos, e o Sr. Carvalho da Silva, com a proficiência que a Câmara já conhece, tratará dos restantes.
Nós ouvimos sempre o Sr. Cunha Leal com o maior interêsse, pelo menos eu, não só pela forma como S. Ex.ª argumenta, mas sobretudo pelo estudo que S. Ex.ª revela na apreciação dos vários assuntos que trata, o que faz com que muitas lições se colham no que S. Ex.ª diz.
Referiu-se S. Ex.ª ao problema religioso, e parece que procurou mostrar divergências na apreciação dessa questão, entre os nossos colegas da minoria católica e êste lado da Câmara.
Há certamente equívoco.

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E um lugar comum dizer que a Igreja tanto vive numa república como numa monarquia, vivendo talvez melhor numa república.
O que caracteriza um regime é o espírito da sua legislação.
Ora, Sr. Presidente, eu não creio que seja lícito duvidar de que o carácter da legislação republicana de Portugal em relação à Igreja é anti-religioso. ^E em que é que êle se baseia? Baseia se no espírito chamado laico, quer dizer, na laicização da escola, da família, do Estado, emfim, porque o Estado, segundo essa doutrina, não conhece Deus e prescinde, portanto, da sua existência.
Sem ir procurar muito longe quem p. ossa guiar os católicos em tam larga matéria, sem fazer fácil alarde de erudição acêrca da religião católica, eu reporto-me apenas à última encíclica de Pio XI, porque é a última e, portanto, mais próxima dos acontecimentos, e ainda porque eu não conheço nos últimos trinta anos documento algum pontifício que de uma maneira mais positiva, categórica e formal, condene os erros do laicisismo e, por consequência, imponha a todos os católicos a obrigação de combaterem êsses erros, para que, segundo a forma do Pontífice, o reinado de Cristo seja instituído sôbre a terra. Não se admirem V. Ex.ªs que eu me exprima assim, porque sou católico, apostólico romano.
Mas quais são as modalidades dessa acção? Aqui é que haverá talvez diferença entre as atitudes do ilustre partido católico e aquele que eu tenho a honra de representar.
Há uma doutrina que entende que o problema pôsto assim, isto é, colocado como a verdadeira essência do regime, pelas suas próprias declarações, visto que é o mesmo regime que declara intangível a lei que regula as relações entre o Estado e a Igreja, entende que o problema é político e, portanto, o ataque político é' a sua consequência.
Há outra doutrina, porém, que entende que não é assim, que não é necessário atacar o regime, mas que é preciso procurar dentro dele a evolução do problema.
A primeira doutrina tem sido discutida por muitos publicistas, e ainda ultimamente um publicista francês das esquerdas
a versou, mas tem chamado também a atenção de teólogos eminentes.
Não se aconselha por ela o princípio de os católicos irem para a rua lazer revoluções, isso mesmo é condenado por Sua Santidade Pio XI, mas entende-se que o problema pode ser atacado politicamente. Tal tem sido e é a nossa atitude, o que não quere dizer que façamos da religião política; e, por conseguinte, à objurgatória inflamada do Sr. Presidente do Ministério de que nunca faria política da religião, eu responderei que não fazemos isso, mas procedemos como entendemos sem receber lições de ninguém.
Apoiados da extrema direita. Mas fazemo-lo com a convicção plena de que dentro dêste regime, e isto emquanto não vier um desmentido, nunca se poderá dar satisfação aos católicos.
Nós, Sr. Presidente, não fazemos, repito, da religião, política, mas estamos absolutamente convencidos de que dentro dêste regime, em virtude da sua legislação, impossível será serem satisfeitas, as reivindicações dos católicos.
Nós ainda não há muito que tivemos aqui a experiência do que acabo de expor à Câmara, quando o ilustre Deputado e meu amigo, Sr. Lima Neto, se mostrou surpreendido com a resposta que lhe foi dada pelo Sr. Ministro da Justiça.
Eu devo dizer francamente à Câmara que surpreendido ficaria eu, dada a maneira como penso, se o Sr. Ministro da Justiça lhe tivesse dado outra resposta que só veio confirmar a minha maneira de pensar sôbre o assunto.
Vou agora referir-me ao segundo ponto; porém, como não desejo fatigar a atenção da Câmara, tanto mais estando nós numa sessão prorrogada como estamos, eu vou procurar falar, como dizia o meu ilustre amigo e falecido par do reino General Dantas Baracho, por uma forma sintética, resumindo ao mínimo as minhas considerações.
Referiu-se, Sr. Presidente, o ilustre Deputado Sr. Cunha Leal à aliança basilar com a Inglaterra.
É evidente, Sr. Presidente, e ninguém o poderá contestar, que a política nacional tem de ser absolutamente de acôrdo com a Inglaterra; (Muitos apoiados), mas Sr. Presidente, o que é um facto é que a política inglesa tem sofrido muitas modi-

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ficações, e de tal ordem, que ela hoje é muito diferente do que era antigamente.
O ponto de vista actual da Inglaterra relativamente a reparações é de facto hoje muito diferente, e é por isso, Sr. Presidente, que eu dizia que o meu desejo era que por parte do Govêrno Português 5e fizesse, nesta questão, o que fez o Govêrno Francês, isto é, expondo à Câmara claramente o assunto.
Era isto que eu desejaria que se fizesse entre nós, tanto mais que se trata dum assunto que muito nos pode interessar, muito principalmente no que diz respeito aos nossos domínios e em especial à província de Moçambique.
Assim se foi vivendo até que a França, não podendo suportar um tam grande desembolso, resolveu recorrer a quantias do pagamento alemão.
Não podemos — eu, pelo menos, não o farei-entrar neste momento na apreciação das razões que cabem a cada uma das partes em conflito. Limito-me, por isso, tam somente a apontar a divergência de pontos de vista entre êsses dois países e a salientar o isolamento da Inglaterra.
Em face dêsse acentuado isolamento, qual é, qual tem sido a nossa atitude?
Eu creio que esta minha pregunta se justifica perante o silêncio que caracteriza os processos por que se orienta a nossa política internacional, tanto mais que nós estamos habituados a ver que na Câmara Francesa o Presidente do Ministério, que é incontestavelmente um dos homens públicos mais notáveis da Europa, se apressa, sempre que tal se impõe, a apresentar às comissões parlamentares a situação em que o seu país se encontra.
Porque não segue o Govêrno português o mesmo critério no que diz respeito aos problemas cuja solução nos interessa?
E preciso definirmos a nossa atitude, porque. não sabemos ainda como acabará a crise que a Europa atravessa.
Tudo isto constitui uma razão para que o espírito de quem se interessa por êstes assuntos não veja com grande clareza as questões postas em debate.
A forma por que têm sido defendidos os interêsses da Nação é de molde a exigir do Govêrno declarações mais claras
e mais precisas do que as que já fez ao afirmar que o seu procedimento se adaptaria inteiramente às decisões da conferência de Spa, a menos que o Sr. Presidente do Ministério, segundo as doutrinas de Einstein, tenha eliminado o tempo. Eu cito Einstein, mas devo dizer que não percebo nada das suas doutrinas, no que me não sinto apoucado, uma vez que o sábio ilustre que é Gago Coutinho me confessou um dia nada perceber de tam transcendentes concepções.
Mas, passemos agora a analisar a situação sul-africana, sendo de atender o que a tal respeito escreve um jornal transvaliano, definindo a sua orientação e dando um exemplo que nos interessa directamente.
Nos seus termos, o que escreve êsse jornal altera por completo a situação em que dantes se baseava a aliança inglesa, porque, exercendo-se antigamente como um meio de influência e acção nos seus domínios coloniais, que eram domínios subordinados, desde que êsses domínios estão para com a Inglaterra num perfeito pé de igualdade o caso muda muito de figura.
Nestas condições, eu creio que não seria demais preguntar se a Inglaterra teria qualquer interferência nas nossas relações com a União Sul-Africana.
Eu desejaria que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros saísse do seu mutismo habitual, elucidando a Câmara sôbre êste ponto.
O mutismo do Govêrno revela-se nas cousas mais comezinhas.
Ainda há pouco o meu ilustre amigo Sr. Carvalho da Silva fez referência à nomeação do novo Ministro da Marinha, nomeação que, efectivamente, se efectuou sem que o Govêrno tivesse dado sôbre o caso qualquer informação à Câmara.
Consta, também, oficialmente, que já foi proposta ao Senado a nomeação do Sr. Azevedo Coutinho para Alto Comissário da nossa província do Moçambique.
Não sei se essa nomeação está já feita ou não; mas a verdade é que todos nós ignoramos o motivo da substituição do Sr. Brito Camacho nesse cargo.
Desmereceu S. Ex.ª da confiança do Govêrno, tantas vezes afirmada?
Foram razões do saúde que determi-

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naram o Sr. Brito Camacho a nSo voltar a reassumir as suas funções de Alto Comissário?
Creio que não, felizmente, porque S. Ex.ª tem vindo normalmente à Câmara.
Houve alguma manifestação da colónia contra S. Ex.ª?
Segundo me consta a manifestação que surgiu, o que levou a comissão de vigilância dos interêsses nacionais em Moçambique a pedir a sua demissão, foi justamente contra a nomeação do Sr. Azevedo Coutinho.
E a êste propósito eu não compreendo como pode fazer-se uma nomeação contra as indicações expressas da colónia.
Eu falo com tanta mais imparcialidade, quanto é certo que nenhum dos nomes indicados deixava de ser de republicano militante.
Havia colonos, muito conhecidos, com grande prática do serviços no ultramar, e o Govêrno, pasmando por cima deles, foi escolher uma pessoa de toda a respeitabilidade, é certo, que tem certamente prestado muito bons serviços ao País, mas que, na ocasião precate a colónia parece não querer para Alto Comissário, visto que, repito-o, a comissão de vigilância dos interêsses de Moçambique se dissolveu, declarando que o fazia em vista de não terem sido seguidas as suas indicações.
Também é Gste um ponto do silêncio em que vimos vivendo continuamente.
Referiu-se ainda o Sr. Cunha Leal à administração de Angola em termos que deixam certas apreensões sôbre o que tem sido essa administração.
É um dos usos do regime a criação de entidades absolutamente intangíveis.
É absolutamente intangível a entidade que teni dirigido todas as nossas relações possíveis o imagináveis com as nações estrangeiras desde o Congresso da Paz.
Desconhecemos também as razões pelas quais o Alto Comissário de Angola continua gastando como gasta, sem que a sua administração possa ser discutida no Parlamento, faculdade esta que, aliás, nos é permitida pela própria lei que criou os Altos Comissários.
De super-homens estamos nós cansados, porque, como homens, todo» estamos sujeitos a errar, e melindra que se pretenda colocar alguém na situação de infalível.
Como representantes da Nação assiste-nos o direito a apreciarmos os actos públicos seja de quem fôr.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O orador não reviu.
Foram lidas e admitidas as moções dos Srs. Jaime de Sousa e Aires de Ornelas.
O Sr. Presidente: — Devia seguir-se no uso da palavra o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros; mas como S. Ex.ª não terá tempo de concluir as suas considerações nos poucos minutos que faltam para suspender a sessão, reservo-lhe a concessão da palavra para amanhã.
Moções
A Câmara, reconhecendo que a obra do Govêrno não satisfaz as aspirações da maioria católica do país, não tranquiliza a opinião pública quanto à defesa dos direitos de Portugal na questão das reparações e deixa sem solução os mais graves problemas coloniais, continua no ordem do dia. — Aires de Ornelas.
Admitida.
A Câmara dos Deputados da República Portuguesa, considerando que o Govêrno durante todo o tempo que tem dirigido os negócios públicos procurou fazer uma política de conciliação entre as diversas correntes da sociedade portuguesa, o de harmonia para todos os elementos partidários, aspirando a um entendimento com o qual só poderá lucrar o país e o regime.
Considerando que o Govêrno se tem esforçado no sentido de realizar uma administração útil, baseado na mais estrita economia, comprimindo as despesas quanto possível e tomando as necessárias disposições para que fossem aumentadas as receitas;
Considerando que, por iniciativa dêste Congresso, o Parlamento votou um novo sistema tributário e várias outras propostas destinadas a produzir o indispensável equilíbrio das contas do Estado;
Considerando que, nas questões de política externa, o Govêrno procedeu com elevado critério e acêrto, realizando acôrdos e realizando vantagens, que traduzem importantes elementos de melhoria para a economia nacional;

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Considerando que, nos assuntos respeitantes às colónias, o Govêrno tem seguido indefectívelmente uma política de, respeito às leis orgânicas e basilares da sua administração, constatando que elas são cumpridas, defendendo os princípios nelas contidos e acautelado os direitos e deveres da nossa soberania;
Considerando que, apesar das frequentes tentativas dos inimigos da ordem para perturbarem esta, o Govêrno tem conseguido mante-la inalterável; e
Verificando que o seu programa contém uma série do medidas de largo alcance para o país, que urge converter em lei:
Reconhece não haver lugar a modificar a orientação política seguida até agora pelo Govêrno na gestão e defesa dos altos interêsses da Pátria e da República, e passa à ordem do dia. — Jaime de Sousa.
Admitida.
O Sr. Presidente: — Para substituírem, na lista dos representantes desta Câmara sãos funerais do grande poeta Guerra Junqueiro, os nomes dos Srs. Ginestal Machado e Lopes Cardoso, nomeio os Srs. Dinis de Carvalho e Agatão Lança.
A sessão será reaberta às 21 horas e 30 minutos, prefixas.
Está suspensa a sessão.
Eram 19 horas e 15 minutos.
O Sr. Presidente (às 21 horas e 55 minutos): — Está reaberta a sessão.
Vão ler-se, para entrarem em discussão, as alterações introduzidas pelo Senado à proposta de lei relativa à melhoria de vencimentos dos funcionários públicos.
Foi aprovado o § 1.º do artigo 20.º da Câmara dos Deputados.
Foi aprovada a alteração introduzida pelo Senado ao artigo 3.º da Câmara dos Deputados.
Foi aprovado o artigo 4.º da Câmara dos Deputados e rejeitada a alteração introduzida pelo Senado.
Foi lido na Mesa o parecer da Comissão de Finanças da Câmara dos Deputados sôbre o § 4.º do artigo 4.º
O Sr. Viriato da Fonseca: — Sr. Presidente: êsse processo da comissão de finanças foi um lapso. O Senado não fez emenda nenhuma ao § 4.º do artigo 4.º
Portanto, êsse parecer é como se não existisse. Deve ficar o que veiu do Senado.
Foram aprovadas as alterações do Senado aos artigos 5.º e 6.º da Câmara dos Deputados.
Foram lides na Mesa o § 1.º do artigo 5.º e a alteração introduzida pelo Senado ao mesmo parágrafo.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: mais uma vez declaro a V. Ex.ª e à Câmara que a minoria monárquica é contrária ao subsídio aos parlamentares. E se é contrária ao subsídio por maioria de razão é contrária ao aumento constante do parágrafo em discussão.
Regosijamo-nos com que, no Senado, não tivesse vingado o parecer da Secção, que propunha que para parlamentares fôsse aplicado o multiplicador 15.
Realmente bradava aos céus que aos funcionários fôsse aplicado o coeficiente 10 e aos parlamentares o coeficiente 15, com a agravante de serem os próprios interessados a legislar a seu favor.
Antigamente, e creio que mesmo já dentro do regime republicano, quando se legislava em matéria de subsídio dos parlamentares, era para ter aplicação na legislatura imediata e não na própria. Compreendia-se, portanto, até certo ponto que esta legislatura, terminando o seu mandato daqui a dois anos, legislasse sôbre esta matéria para a legislatura imediata. Mas talhar, com a própria mão, aquilo que vai reverter em nosso proveito, não faz sentido, e muito menos querendo-se aplicar aos parlamentares um coeficiente superior ao aplicado para os funcionários públicos.
Não pode ser.
O Sr. Artur Brandão: — Porque é que S. Ex.ª tem recebido o subsídio?
O Orador: — Tenho-o recebido porque a lei me arbitra.
Mas posso garantir a V. Ex.ª que não gasto a menor parcela dele em meu proveito pessoal. Ofereço-o especialmente a instituições de beneficência.
Acho também imoral que os Deputados que são funcionários públicos não recebam o subsidio e optem pelos orde-

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nados para se livrarem dos descontos pelas faltas às sessões.
Àpartes.
O Orador: — Sei que há excepções, e há quem seja contra semelhante prática.
Antes da crise de 1892 existia o subsídio, mas muito limitado.
Quando porém chegou aquela hora da crise, aliás em nada comparável à pavorosa situação de hoje, porque se reconheceu que o exemplo dos sacrifícios devia vir de cima, o subsídio foi suprimido por decreto do Sr. Dias Ferreira.
Agora, que a crise é verdadeiramente aterradora, faz-se precisamente o contrário; aumenta-se o subsídio!
É isto admissível? É isto moral? Não é.
Tenho dito.
O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: a minoria monárquica, logo no início desta legislatura, cultivando aquela popularite populacioni que com tanto esmero carinho costuma cultivar, trouxe a esta Câmara um projecto no sentido de acabar com os subsídios.
Quere dizer, a minoria monárquica sabia que tal projecto nem poderia sequer ser aceito na Mesa, porque era constitucional receber os subsídios, e sabia que o que havia de fazer era uma proposta no sentido de esta baixar a qualquer coisa de ínfimo, de insignificante, o não trazer um projecto que sabia de antemão que não podia ser admitido.
Isto, Sr. Presidente, não chega a ser sério.
Eu, Sr. Presidente, entendo que a emenda do Senado devia ser votada de preferência ao artigo proposto por esta Câmara, porquanto o artigo proposto nesta Câmara deixaria dúvidas se os parlamentares queriam o seu subsídio aumentado ou não, e que tinha de ser feita uma. interpretação que eu julgo que tinha de o ser à priori, que a Câmara dos Deputados tinha reconhecido que o subsídio dado aos seus membros não chegava para que êles se pudessem manter em Lisboa, em ordem de frequentarem esta Casa do Parlamento.
Os argumentos que o Sr. Paulo Cancela apresentou são de ordem a entender-se que é preciso que se tenha a convicção de estar a falar numa assemblea de pessoas absolutamente tapadas, para os apresentar, porque aqui foram votadas as leis tributárias, e então o Sr. Paulo Cancela não se levantou daquele lado da Câmara a dizer que as leis tributárias se não nos aplicavam porque eram votadas por nós, e que se iam aplicar somente aos nossos filhos, porque, como S. Ex.ª diz, o subsídio votado agora só devia começar a ser recebido na próxima legislatura.
Devia haver essa. fácil coragem, que ainda a princípio se iniciou no Senado, quando se pretendeu fazer vingar o coeficiente 15; devia haver a coragem de se votar aquilo que se entendesse que os parlamentares precisavam.
Então, se queriam chegar a essa economia aparente, tivessem a fácil coragem de votar qualquer coisa pela qual as faltas fossem descontadas. Mas como infelizmente o Parlamento é, na sua maioria, constituído por funcionários públicos, êles bem sabem que podem deixar de frequentar as sessões, porque não sofrem descontos nos seus vencimentos. E já que não houve a honesta coragem de votar um subsídio suficiente para que os parlamentares possam frequentar assiduamente o Parlamento, porque não há também a coragem de voltar ao regime antigo da selecção de aptidões, arranjando um Poder Legislativo composto apenas de homens ricos?
De contrário só há uma causa a fazer: votar a emenda do Senado sem medo de que á minoria monárquica diga que os leagisladores votaram subsídios para si próprios, visto que para nós próprios votámos, também todas as leis de contribuições.
Eu espero ainda, Sr. Presidente, ver õ Parlamento ter a fácil coragem de votar, aperfeiçoado ou modificado, o projecto do Sr. Francisco Cruz, ou de proceder de harmonia com o critério que venho de expender.
Vozes: — Muito bem, muito bem.
O orador não reviu.
O Sr. Mariano Martins: — Quando pedi a palavra, foi para responder às considerações do Sr. Cancela de Abreu, mas tendo ouvido também o Sr. Carlos Pereira, verifiquei com surpresa que S. Ex.ª discutindo a proposta do Senado, dissertou também sôbre se os Deputados que

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são eventualmente funcionários públicos devem ou não receber os seus vencimentos ou receber os seus subsídios como parlamentares. Quere dizer, o Sr. Carlos Pereira quis estabelecer um antagonismo entre os Deputados que são empregados públicos o os que o não são.
Tal atitude é-me absolutamente desagradável.
Mas tendo pedido a palavra para responder ao Sr. Cancela de Abreu, devo dizer que não recebo subsídio, porque recebo o vencimento de funcionário.
Se não recebesse vencimento pela minha função de militar, o subsídio como parlamentar não me aquentava nem me resfriava, porquanto me encontro, felizmente, numa situação que me permite dispensar êsse subsídio.
Eu tenho tanta autoridade para falar ao assunto como qualquer pessoa que se não encontre na minha situação, e devo dizer que o subsídio parlamentar é absolutamente necessário a qualquer democracia com instituições parlamentares como as nossas, nas quais possam estar representadas todas as classes da sociedade.
E em nome dos princípios democráticos que eu entendo quê deve ser dado subsídio aos parlamentares, e isto em antagonismo com os princípios monárquicos, invocados há pouco pelo Sr. Cancela de Abreu.
Só em 1891 ou 1892, quando Dias Ferreira, com as suas medidas de salvação pública, reduziu as despesas públicas, ficando muita gente a braços com a miséria, foi cortado o subsídio aos parlamentares.
Um indivíduo para exercer as suas funções parlamentares convenientemente tem de abandonar os seus negócios particulares, e se os capitalistas e os grandes proprietários e agricultores podem com facilidade abandonar os mesmos negócios, já não acontece o mesmo aos empregados do comércio,, aos trabalhadores do campo, aos operários das oficinas, porque os patrões certamente os não dispensariam nas horas em que o Parlamento funcionasse.
Se êsses homens tiverem de abandonar as suas funções particulares para desempenharem as ocupações parlamentares, como ò hão de fazer se o Estado lhes não abonar o respectivo subsídio?
Em França, na Alemanha, na Inglaterra e na Itália o partido socialista está representado no Parlamento por operários que tiveram de abandonar as suas ocupações para desempenharem as funções parlamentares. Como se poderiam manter convenientemente sem o respectivo subsídio?
Devo dizer também que em todos os países, onde a vida tem encarecido depois da guerra, se tem reconhecido a necessidade de aumentar os ordenados aos funcionários e, na mesma proporção, os subsídios aos parlamentares.
Mais, Sr. Presidente: no Parlamento inglês o subsídio é de 200 libras e foi ainda há pouco apresentada uma proposta elevando-o a 400 libras, que não sei só foi aprovada, mas que em todo o caso demonstra que foi ali reconhecida a necessidade de aumentar o subsídio em virtude do aumento do custo da vida? apesar de a Inglaterra ser dos poucos países que entraram na Guerra onde o custo da vida pouco aumentou.
Nesta conformidade, eu entendo que a proposta que veio do Senado deve ser aprovada.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Congressistas que aprovam a redacção do Senado tenham a bondade de se levantar.
O Congresso aprovou.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § único do artigo 116.º do Regimento.
Feita a contraprova, aprovaram 63 e rejeitaram 8 dos Congressistas, ficando? portanto, aprovada.
É aprovada a redacção do § 2.º do Senado.
Entra em discussão outro parágrafo.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Peço ao Sr. Ministro das Finanças o favor de emitir a sua opinião acêrca dêste parágrafo.
A Câmara dos Deputados tinha decidido que o aumento fôsse arbitrado a partir da data em que a proposta fôsse aprovada, e o Senado votou que fosse dada a partir de Janeiro.
Não quero discutir a necessidade desta

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alteração, mas parece-me que os encargos que traz são importantes, e seria interessante que o Sr. Ministro das Finanças dissesse o que pensa a êste respeito. Os que entendem que realmente não há muita razão para dar o aumento desde Janeiro partem do principio de que, embora se reconheça a necessidade de se aumentar os vencimentos ao funcionalismo, êste aumento, a partir de Janeiro, pode parecer a muita gente um exagero. Eu não sou dos que pensam assim, mas entendo que não devemos votar êste parágrafo sem saber se o Tesouro pode com o encargo, sem que o Sr. Ministro das Finanças nos diga em quanto calcula o aumento. Se o Sr. Ministro das Finanças declarar que o encargo não é demasiado e que o Tesouro pode comportá-lo, não terei dúvida em dar o meu voto à alteração do Senado.
Viriato da Fonseca: — Em referência às considerações apresentadas pelo ilustre Deputado Sr. Cancela de Abreu, sôbre o montante da despesa que resulta da aplicação das disposições desta lei, desde o mês de Janeiro, tenho de dizer o seguinte: S. Ex.ª está em êrro, e o montante da despesa com as modificações introduzidas não representa, de modo algum, aquela enormidade que a muitos se afigura.
Nesta lei há dois regimes para a concessão das melhorias, ou pelo coeficiente 10 e percentagens, ou então pelo multiplicador 10 sôbre os vencimentos de 1915.
O primeiro regime, o do coeficiente 10, já o podemos considerar como sendo lei, porquanto tudo quanto a êle respeita já foi aprovado pelas duas Câmaras, não tendo havido divergências, e uma das suas disposições é que seja aplicado desde Janeiro.
Como se vê, êsse assunto já não tem de ser considerado nesta discussão.
Resta o outro regime, o do multiplicador, e êsse é o que está em discussão. À primeira vista poderá parecer que a despesa, aplicando-o desde Janeiro, deverá ser espantosa, mas tal não acontece, como passo a provar.
Tal regime determina que a todos os funcionários, a quem pelo regime. dos coeficientes e percentagens compitam vencimentos inferiores ao décuplo do que percebiam em 1915, se abonará êste décuplo, que passará a constituir o seu vencimento melhorado.
Estudando atentamente o assunto, vê-se que na classe civil estão nessas condições os funcionários desde segundo oficial para cima e na classe militar de major para cima. Mas um segundo oficial tem já quási o décuplo de 1915 e, portanto, a diferença a receber desde Janeiro é muito pequena; para os primeiros oficiais também a diferença, um pouco maior que a dos segundos, ainda é relativamente pequena.
Nestas duas classes é que há o maior número de funcionários, mas como o que terão a receber é muito pouco, o integral desta despesa é insignificante.
A diferença, porém, torna-se maior para os chefes de repartição e muito maior para os directores gerais, mas então o número dêsses funcionários reduz-se a bem pouco e a despesa integral, em absoluto, também não é grande.
Na classe militar dá-se a mesma cousa. À medida que vai crescendo o pôsto desde major, maior vai sendo a diferença entre os vencimentos calculados pelos dois regimes, mas em cada pôsto vai-se reduzindo consideràvelmente o número de oficiais, e nos generais, onde a diferença é na verdade grande, o número é muito reduzido, donde resulta. que a despesa total não é muito grande.
Se considerarmos, além disso, que uma parte dessa despesa tinha de ser forçosamente feita, visto que todos êsses oficiais já tinham o direito de receber pelo coeficiente 10 desde Janeiro, veremos que o acréscimo de despesa pagando-se-lhes desde então pelo multiplicador 10 não dá aquela despesa fabulosa que a muitos assustava, não passando dalgumas centenas de contos.
Outra circunstância há a atender e é que, tendo-se pago a sargentos e a outras classes várias melhorias desde Janeiro, não faz sentido, não é justo que aos i estantes funcionários e oficiais do exército se não pague desde a mesma época a melhoria que lhes corresponde.
E para terminar direi que êste projecto de lei foi iniciado em Fevereiro, devendo ser discutido nesse mês ou quando muito em princípios de Março, e o funcionalismo público não tem culpa que mil inci-

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dentes diversos, levantados nesta Câmara, tivessem demorado a sua discussão já depois de findo o ano económico, só vindo a ultimar-se em meados de Julho.
Tenho dito.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — O ilustre Deputado Sr. Viriato da Fonseca já respondeu ao Sr. Cancela de Abreu, e efectivamente era quem de direito o devia fazer.
Como a Câmara sabe, o Govêrno não tem responsabilidade alguma na aplicação desta lei. A única objecção em que tenho de responder a S. Ex.ª é sôbre o quanto da despesa que resulta da aplicação desta lei, que deve resultar uma despesa aproximada de 32:000 a 33:000 contos, que já foi votada na Câmara dos Deputados, e creio que também pelo Senado; podíamos dizer que a despesas mais importante já está discutida.
Quanto à parte que manda reduzir ao mínimo do dez vezes os vencimentos, já o Sr. Viriato da Fonseca teve ensejo de responder; essa despesa é muito menor em relação à que já está votada.
Efectivamente aproveitam com isto os de maior escala: começa no pôsto de major e a despesa a fazer com a aprovação desta proposta deve ir a 6:000 ou 7:000 contos anuais, o que é uma diferença muito pequena em relação ao que já se encontra votado.
Devo dizer a V. Ex.ª que, embora seja contra os aumentos, eu voto esta emenda do Senado por parecer efectivamente de justiça e equidade, e muito principalmente por ter já o Parlamento votado o aumento de vencimento a vários funcionários, dando em resultado que há efectivamente indivíduos de hierarquia inferior que estão recebendo vencimentos superiores.
O Sr. Cancela de Abreu: — Agradeço ao Sr. Viriato da Fonseca e ao Sr. Ministro das Finanças os esclarecimentos que deram à Câmara, nomeadamente quanto à aplicação retroactiva das subvenções, e folgo de ter pedido êsses esclarecimentos porque me convenci da justiça da emenda em discussão, dando-lhe, por isso, o meu voto.
O orador não reviu.
Pôsto à votação o parágrafo, tal como veio do Senado, é aprovado.
É aprovada a eliminação do § 4.º
É aprovada a emenda do Senado ao § 5.º
Foi lido na Mesa e seguidamente aprovado, sem discussão, o § 6.º do Senado, foi lido na Mesa o § 7.º (novo) do Senado e aprovado sem discussão.
O Sr. Ferreira da Rocha: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.º do artigo 116.º
Procede-se à contraprova e à contagem.
O Sr. Presidente: — Rejeitaram 40 Srs. Deputados e aprovaram 39.
Está rejeitado.
Entra em discussão o artigo 7.º
Foi lido no Mesa.
O Sr. Mariano Martins: — Se bem que me seja profundamente desagradável entrar na discussão do primitivo artigo 7.º do projecto, que foi eliminado pelo Senado, sou forçado a fazê-lo porque, não tendo havido nenhuma discussão no Senado, quer na secção, quer na sessão plenária, eu estou sem saber a razão pela qual aquela Câmara fez essa eliminação.
O artigo 7.º tem a seguinte história. O artigo 2.º da lei n.º 1:355 determinou que os emolumentos percebidos na polícia fossem quintuplicados, mas determinara também que os funcionários da polícia não recebessem em emolumentos quantia menor da que recebiam em 1921. Desta maneira, pela lei n.º 1:355 os funcionários da polícia ficavam numa situação extravagante em relação a emolumentos. Êles constituem um percebimento variável, conforme a sua cobrança, todavia, passam para os funcionários da polícia a ser vencimento fixo, isto com prejuízo da parte que o Estado pode receber.
Pelo artigo 7.º do projecto passavam êsses emolumentos a ser divididos em partes iguais para os funcionários e para o Estado.
Havia também para os funcionários da polícia uma melhoria resultante da deminuïção das receitas do Estado, mas, como era incompreensível que os oficiais da polícia tivessem dois emolumentos, foi essa a razão por que fui encarregado por pessoa

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que tinha competência para isso de estudar o assunto, a qual pessoa se louvou no meu trabalho:
Sr. Presidente: como fui eu que apresentei a modificação que o Senado eliminou, venho dizer à Câmara as razões que me levaram a fazer essa modificação.
Desejei estabelecer um justo equilíbrio entro os interêsses do Estado e os interêsses dos funcionários de polícia, que até aí tinham direito a emolumentos, e então, estudando a questão, verifiquei o seguinte: pela lei n.º 1:355, e em virtude da qual tinham sido aumentados os vencimentos dos funcionários da polícia, foram quintuplicados os emolumentos cobrados na polícia, quintuplicação que constituía receita do Estado e que era para fazer face às despesas resultantes da lei n.º 1:355; dá-se, porém, o caso de que nessa lei foi introduzido um princípio que não considero razoável, e foi aquele que determinou que os funcionários da polícia não poderiam perceber emolumentos numa quantia inferior à que recebiam em 1921.
Não se compreendia que sendo os emolumentos uma receita variável se fôsse tornar fixa essa receita, e então do meu estudo resultou o seguinte: é que em 1921 dos emolumentos cobrados na policia uma receita importante era a dos emolumentos cobrados pelo porte de arma, receita que em 1922 já ali não existia.
Quando a Câmara, pois, estava a supor que o excedente da multiplicação da tabela de 1918 seria receita do Estado, verificou-se agora que o pensamento que a Câmara teve foi por assim dizer modificado pela introdução de um princípio novo, em que o excedente, que devia ser receita do Estado, passou a ser receita dos funcionários da polícia, quere dizer, mantêm-se os emolumentos de porte de arma como se realmente existisse ainda essa receita cobrada pela polícia.
Então, Sr. Presidente, entendendo que realmente devíamos voltar à genuïnidade do projecto primitivo, e entendendo que aos funcionários da polícia deviam ser garantidos êsses emolumentos em conformidade com a legislação vigente, tendo só direito aos emolumentos constantes do decreto de 1918, menos a cobrança dos emolumentos de porte de arma, entendendo ainda que a quintuplificação dêsses emolumentos devia ser receita do Estado, nessa conformidade redigi o artigo 7.º do projecto, p elo qual o Govêrno é autorizado a actualizar a tabela de 1918, dando-se assim aos funcionários da polícia uma nova receita que até ali não tinham, para assim fazer face às receitas que lhes tiraram, como as do porte de arma.
Êsse princípio foi consignado no § 2.º
Os emolumentos que tinham em 1918 eram quintuplicados.
Àpartes.
Desses emolumentos uma parte era receita do Estado.
Tendo assinado vencido o parecer da comissão de finanças, quis explicar a razão por que modifiquei o projecto primitivo da Câmara dos Deputados no artigo 7.º que se encontra em discussão.
Pelo que fica dito vê-se que êsse artigo tem toda a razão de ser.
A comissão de finanças desta Câmara aceitou a modificação feita pelo Senado, mas não encontro no parecer explicação alguma.
Muito desejaria que o Sr. Ministro das Finanças dissesse as razões que o levaram a aceitar a proposta vinda do Senado.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Adolfo Coutinho: — Sr. Presidente: as considerações feitas pelo Sr. Mariano Martins sôbre o artigo 7.º da Câmara dos Deputados obriga-me a usar da palavra.
Pela lei que reorganizou a polícia os emolumentos foram quintuplicados»
Àpartes.
Mas essa lei não dava percentagem alguma.
Àpartes.
Não se estabelece uma percentagem fixa.
Pelo artigo 7.º da Câmara dos Deputados os funcionários de polícia não ficam a receber aquilo que recebiam pela lei referida.
Parece que seria razoável eliminar o artigo 7.º como tinha vindo do Senado.
Assim os funcionários de polícia não ficariam em situação pior do que estava no artigo da Câmara dos Deputados.
Àpartes.
Tenho dito.
O orador não reviu.

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O Sr. Presidente: — Vai votar-se a eliminação da proposta vinda do Senado.
Foi aprovada.
O Sr. Mariano Martins: — Requeiro a contraprova.
Procede-se à contraprova.
O Sr. Presidente: — Em vista das dúvidas que existem na Câmara, vai repetir-se a votação.
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Não pode ser; a votação foi bem clara.
O Sr. Presidente: — Eu peço aos Srs. Deputados o favor de ocuparem os seus lugares, a fim de se poder proceder à votação.
Pausa.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que confirmam a eliminação feita pelo Senado, queiram levantar-se.
Estão de pé 28 Srs. Deputados e sentados 44.
Está, pois, rejeitada a eliminação do Senado.
Vai ler-se o artigo 8.º da Câmara dos Deputados.
O Sr. Viriato da Fonseca: — Sr. Presidente: pedi a palavra ùnicamente para esclarecer a Câmara, que a emenda do Senado deve ser aprovada, a meu ver,, porquanto o que se achava estabelecido, relativamente aos vencimentos dos funcionários reformados e na situação de reserva, era na verdade irritante.
A emenda do Senado tem toda a razão de ser, razão por que eu entendo que ela deve ser aprovada por esta Câmara.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que aprovam a emenda do Senado, queiram levantar-se.
Foi aprovada.
O Sr. Presidente: — Vai ler-se o artigo 1.º
Foi lido.
O Sr. Viriato da Fonseca: — Sr. Presidente: pedi a palavra para declarar à Câmara que entendo que êste introduzido pelo Senado deve ser aprovado, pois a verdade é que êle tem toda a razão de ser.
Creio que isto é de todo o ponto justo, razão por que entendo que a Câmara o deve aprovar.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que aprovam o artigo novo introduzido pelo Senado, queiram levantar-se.
Está aprovado.
O Sr. Sousa da Câmara: — Requeiro a contraprova.
Feita a contraprova, verificou-se que o artigo tinha sido aprovado.
Foi aprovada a substituição do artigo 11.º da Câmara dos Deputados.
Entrou em discussão o artigo 12.º do Senado.
O Sr. Viriato da Fonseca: — Devo esclarecer a Câmara que êste artigo é apenas uma emenda de redacção.
Foi aprovado o artigo 12.º do Senado.
Entra em discussão o artigo 14.º do Senado.
O Sr. Viriato da Fonseca: — Trata-se dos serviços autónomos, os quais já se devem bastar a si próprios com as receitas que têm, mas ficam isentados os caminhos de ferro do Estado; mas como a lei saiu depois do ano económico, foi extensiva a todos e daí veio a emenda do Senado.
O orador não reviu.
Foi aprovado o artigo e rejeitadas as emendas do Senado.
Entrou em discussão o artigo 16.º
O Sr. Vitorino Godinho: — Parece-me que bem faria a Câmara rejeitando a emenda que veio do Senado, pois é necessário que esta verba se mantenha para os serviços de estatística, como por exemplo o do censo e os de comércio e navegação, que necessitam dessa verba.
As alfândegas não possuem o pessoal necessário para fazer êste trabalho, e, portanto, é necessário que a Repartição de Estatística mande pessoal para lá, a fim de fazer êsses trabalhos.

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Para que todos os trabalhos se ponham em dia julgo indispensável a aprovação da proposta tal como foi da Câmara dos Deputados, rejeitando-se, pois, a emenda do Senado.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Mariano Martins: — Sr. Presidente: tal qual o Sr. Vitorino Guimarães, eu sou de opinião que deve ser rejeitada esta emenda do Senado.
S. Ex.ª defendeu os trabalhos extraordinários no serviço que êle conhece; eu vou defender êsses trabalhos num serviço que conheço também de perto, em virtude das relações que tenho tido com êle na minha função de relator do orçamento das receitas.
Refiro-me ao serviço da Contabilidade Pública, onde tenho passado muitas noites em companhia do pessoal. Sei que os serviços da contabilidade se encontram atrasadíssimos, primeiro porque se acabaram os trabalhos extraordinários e em segundo lugar porque, em virtude da lei n.º 971, que não permite que se façam nomeações de pessoal, existem lá muitas vagas.
Na Repartição de Contabilidade Pública centralizam-se todos os serviços do despesa e receita do Estado, o que é um trabalho muito volumoso e muito maçador, que mesmo o pessoal normal não consegue fazer nos períodos normais de trabalho.
Desta maneira, os quatro meses para trabalhos extraordinários que estão consignados na proposta da Câmara dos Deputados são os absolutamente necessários para se poder, dentro do ano económico, pôr em dia os serviços.
Muitas vezes, nos estudos que fiz na Direcção da Contabilidade, pedia uns determinados elementos e não mós podiam dar porque não estavam catalogados nem arquivados por falta de tempo e de pessoal.
Eu sou contrário aos trabalhos extraordinários, mas reconheço que êles são necessários em relação aos serviços de contabilidade. Por conseguinte, entendo que bem faz a Câmara em rejeitar a emenda do Senado.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Vai votar-se.
É rejeitada a emenda vinda do Senado ao artigo 17.º ido da Câmara dos Deputados.
É aprovada a, emenda do Senado ao § 1.º do mesmo artigo 17.º
É aprovada a emenda do Senado ao artigo 18.º ido da Câmara dos Deputados-
É rejeitada a emenda do Senado ao artigo 19.º ido da Câmara dos Deputados.
Foram lidas e postas à discussão e aprova as seguintes redacções do Senado:
Do artigo 19.º
Do artigo 21.º. parágrafos únicos dos n.ºs 7.º e 9.º
Substituïção do artigo 22.º e o seu § único.
Artigo 23.º
Artigo 24.º e o § único.
§ 2.º (novo) do artigo 25.º e § 3.º
Artigo 26.º
Artigo 27.º e seu § único.
Artigo 29.º, § único.
Foi rejeitado o artigo 28.º (novo).
Foi lido e pôsto à discussão o artigo 30.º (novo).
O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: parece-me inteiramente deslocada a matéria dêste artigo no projecto em discussão, porque êste tende ùnicamente a fixar as subvenções ao funcionalismo público.
Autorizar por um simples artigo o Sr. Ministro das Finanças a preencher trezentas vagas de funcionários do seu Ministério, embora restringindo as promoções a funcionários já existentes, não me parece assunto para ser tratado numa proposta desta natureza.
Eu tinha notado que a pressa manifestada pelo Sr. Ministro das Finanças, para que lhe fôsse dada autorização para nomear êstes funcionários, desaparecera.
Vê-se agora que havia plano preconcebido introduzir aqui sub-reptíciamente êste artigo.
Porque é que a Câmara dos Deputados não tratou dêste assunto?
Não posso deixar de estranhar o facto de se introduzirem no Senado disposições desta natureza, e que podiam ser introduzidas logo na Câmara dos Deputados, para se evitar que nós numa discussão rápida, como a que estamos fazendo, sejamos for-

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çados a votar sem ter os elementos necessários para apreciar o assunto. Contra êsse facto protestamos.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — É curioso o facto de eu ter de repetir aqui, ao Sr. Paulo Cancela, o que já disse na outra Câmara em resposta a um ilustre Senador monárquico.
Acho estranhas as palavras do digno Deputado, porque S. Ex.ª ignora o que se passou na outra casa do Parlamento e não conhece a lei que se está discutindo, pois, de contrário, não viria aqui dizer que esta lei só devia tratar de subvenções, quando ela está mal justamente por a subvenções se referir.
Esta proposta baseia-se em outra que aqui apresentou o Sr. Presidente do Ministério.
De maneira que, Sr. Presidente, se de alguma cousa esta proposta deve tratar é justamente do que diz respeito aos funcionários dependentes do Ministério das Finanças.
Se alguma cousa aqui está mal, é justamente êste enxerto relativo a subvenções.
Ora eu devo afirmar mui peremptòriamente à Câmara que há cinquenta ou sessenta repartições de finanças que ainda não abriram os seus cofres para a recepção das contribuições porque não há empregados bastantes e com categoria suficiente.
E quando se vem reclamar contra a nomeação de empregados, que são absolutamente precisos, verifica-se a ignorância dos reclamantes.
Toda a gente deve saber que a nomeação de empregados não depende do arbítrio do Ministro.
A lei determina concretamente a forma de fazer as nomeações e não se podem resolver de momento todos os defeitos da organização fiscal.
Eu não dispenso a aprovação da parte da lei respeitante aos funcionários do Ministério das Finanças; insto pela sua rápida aprovação. A minha intenção é preencher as vagas dentro do próprio quadro, sem meter ninguém de fora. A forma de serem admitidos novos empregados tem de ser muito ponderada, e não é fácil aproveitar os adidos para o preenchimento dos lugares. Os oficiais do finanças não se fazem de um momento para o outro.
Um aspirante de finanças tem uma hierarquia? inferior à de um terceiro oficial. Seria o funcionário de mais baixa categoria que eu encontraria, e com certeza que não aceitaria, nem me parece que o Govêrno possa obrigar um funcionário duma determinada categoria a exercer um lugar duma categoria inferior àquela que êle tem.
Eu não posso deslocar um primeiro oficial do Ministério das Finanças ou de qualquer outro Ministério, pois seriam êsses que teriam categoria para dirigir uma repartição de finanças de um concelho de 1.ª classe, porquanto êsse lugar reclama um grande conhecimento dêsses serviços e uma grande prática.
E posso dizer que para encontrar um funcionário que tivesse os requisitos necessários para exercer um cargo dêsses houve grandes dificuldades, porque não se pode entregar uma repartição de finanças a qualquer funcionário, quanto mais a um adido.
Não atender a isto é ter um grande desprendimento pelos interêsses do País.
Devo frisar que a irregularidade que se está dando na cobrança dos dinheiros públicos não é por culpa do Ministério das Finanças, mas sim do Parlamento, porque há nove meses que eu venho reclamando contra o estado a que se chegou.
Creio mesmo que só com grandes dificuldades é que eu poderei abrir a cobrança no próximo mês de Outubro.
A maior parte das repartições de finanças estão entregues a aspirantes. Assim sucede com a de Mafra.
Mas preguntar-se há: Como resolver o caso? Resolve-se com as promoções. Isso é violento, porque há alguns aspirantes que desempenham bem essas funções; mas o que eu não posso é obrigar um funcionário com 300 e tantos escudos a deslocar-se duma terra, para outra, a fim de prestar serviço nessa terra, quando o vencimento que se lhe dá não chega para jantar todos os dias.
Para resolver a questão não basta esta autorização, e é por isso que logo que a Câmara dos Deputados termine com a discussão da proposta de lei sôbre os tabacos, que é deveras urgente, eu instarei para que seja alterada a ordem do dia e que a primeira proposta a discutir seja a

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que se refere à forma de prover os lugares da Direcção Geral dos Impostos, porque será então o momento oportuno de dizer qual é a melhor maneira de organizar êsses serviços, pois parece-me que foi um grande êrro juntar a fiscalização com a direcção.
Reconheço que é quási impossível dirigir uma secção de finanças como a do Pôrto e ao mesmo tempo estar encarregado da fiscalização do país inteiro.
É curioso observar o resultado do imposto de transacção, por exemplo em concelhos vizinhos, de população mais ou menos igual. Vê-se que num dêles o rendimento expresso foi de 10 contos por mês e no outro de 70$! É que no que rendeu 10 contos está um secretário de finanças e no outro um aspirante provisório, nomeado antes da remodelação dos serviços públicos.
Àpartes.
O Orador: — Não se procura empregar mais gente sem necessidade. Feitas as promoções e suprimidos os trezentos lugares de fiscais, ficam bastantes fiscais a mais; o critério que tenho a seguir é abrir um concurso nas Direcções de Finanças, entre êles, para aspirantes.
É de toda a justiça isto, porque muitos dêsses funcionários têm trabalhado, com uma grande dedicação.
O Sr. Ferreira de Mira: — Sr. Presidente: afirmou o Sr. Ministro das Finanças as dificuldades em que se encontra para realizar em devido tempo a cobrança de impostos.
Disse-o S. Ex.ª e acredito, partindo a afirmação de quem vem. E acreditá-lo-ia mesmo se o não dissesse, porque, quando se discutiram as propostas de finanças nós já tínhamos notado ao Ministro das Finanças de então, Sr. Lima Basto, que um dos resultados dessa reforma tributária era, realmente, um aumento de funcionalismo público.
Por consequência, eu compreendo muito bem que o Sr. Ministro das Finanças necessite de aumentar o pessoal das Repartições de Finanças.
Porque é que êste lado da Câmara tinha relutância em aprovar o artigo tal como vem do Senado?
É pela maneira vaga de redacção.
Nos termos dêste artigo pode, realmente, o Sr. Ministro das Finanças pegar num sargento da Guarda Republicana e pô-lo no lagar de chefe de repartição de finanças.
Mas, agora, inteiramente descansados com as declarações do Sr. Ministro das Finanças, de que as promoções se farão ùnicamente nos termos da lei geral de promoções, nós não temos dúvida em dar aprovação à proposta tal como vem redigido pelo Senado.
Quanto à economia que o Sr. Ministro das Finanças diz ir fazer com a deminuïção do quadro dos fiscais de impostos, eu julgo que tal se não dá, porque S. Ex.ª vai fazer dêsses funcionários aspirantes e promover êsses outros. Não há, portanto, deminuïção.
E natural que haja aumento de despesa, mas êsse aumento compreendemos nós desde que foi votada a lei tributária.
Por consequência quero eu dizer que não tenho dúvida em dar aprovação ao artigo do Senado.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Francisco Cruz: — Sr. Presidente: tem razão o Sr. Ministro das Finanças quando lamenta que a situação do quadro dos funcionários das contribuições e impostos e outros das finanças esteja no estado em que se encontra.
Eu, Sr. Presidente, desejo chamar a atenção de S. Ex.ª para a situação dalguns funcionários que já há muito prestam serviço nas repartições de finanças, e que ainda não estão nomeados, apesar de fazerem concurso.
Desejaria, portanto, que o Sr. Ministro das Finanças, atendendo aos bons serviços feitos por êsses funcionários, perfilhasse uma moção que eu mandaria para a Mesa.
Êsses funcionários estão a fazer serviço interinamente, têm boas informações das repartições, e não é justo que funcionários que têm dado boa conta de si sejam prejudicados.
Desejava saber o que o Sr. Ministro das Finanças pensa sôbre êste assunto.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro das Finanças (Vitorino Guimarães): — Não há dúvida de que o ilustre Deputado tem toda a razão, mas

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a verdade é que eu não posso com esta autorização satisfazer ao desejo de S. Ex.ª, por que os empregados a que se refere não têm a categoria de funcionários do Estado.
Trata-se de uma questão a atender de futuro, mas não agora, por meio da restrita autorização que é dada.
O orador não reviu.
Pôsto à votação o artigo, é aprovado.
São sucessivamente aprovados, sem discussão, os artigos 31.º e 32.º
Entra em discussão o artigo 33.º (novo).
O Sr. Mariano Martins: — Chamo a atenção do Sr. Presidente do Ministério, por que na impossibilidade do Sr. Ministro das Colónias vir ao Parlamento, é S. Ex.ª quem o representa.
Quando foi da discussão da lei que melhorou a situação dos funcionários do exército e da armada, eu tinha obrigação de saber, pelo conhecimento que tenho do assunto em consequência do lugar que desempenho no Conselho Colonial, que isso vinha trazer às colónias uma grande perturbação de ordem financeira.
Em Timor, Macau e Índia os vencimentos dos funcionários são liquidados em patacas e rupias, moedas de prata que têm valor de ouro. Daí resulta uma grande anarquia, que já obrigou os governadores a aumentar os vencimentos dos funcionários públicos.
Mas podia fazer-se uma lei nova, e é para isso que eu convido V. Ex.ª, Sr. Presidente do Ministério, a trazer aqui uma disposição para que esta lei se não possa aplicar aos vencimentos dos funcionários militares que estão no ultramar, porque êsses funcionários vão tirar uns vencimentos de nababo.
E não é só isso; é que essa disposição vai dar uma perturbação financeira e social que é necessário evitar.
Peço, pois, ao Sr. Presidente do Ministério que convide o Sr. Ministro das Colónias a trazer ao Parlamento uma proposta de lei, para que esta disposição não seja aplicada aos funcionários militares de terra e mar que estão nas colónias.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi aprovado o artigo 34.º
Foi lida e aprovada a tabela do Senado.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanha às 14 horas, com a seguinte
Ordem do dia — 1.ª parte:
A de hoje, menos a proposta de receitas e despesas.
2.ª parte:
A de hoje.
Está encerrada a sessão.
Eram 0,40 horas.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Última redacção
Do projecto de lei n.º 472, que autoriza a Câmara Municipal de Oliveira de Frades a vender ou aforar os seus terrenos baldios dispensáveis ao logradouro público.
Dispensada a última redacção.
Remeta-se ao Senado.
Propostas de lei
Dos Srs. Ministros das Finanças e do Comércio, criando o imposto ferroviário na importância de 6 por cento sôbre as receitas do tráfego nas linhas férreas do continente.
Aprovada a urgência.
Para a comissão dos caminhos de ferro.
Para o «Diário do Govêrno».
Do Sr. Ministro da Guerra, considerando mutilados da guerra os militares abrangidos pela alínea a) do artigo 6.º da lei n.º 1:170, de 21 de Maio de 1921.
Para o «Diário do Govêrno».
Pareceres
Da comissão de finanças, sôbre o n.º 552-A, que fixa a melhoria de vencimento a abonar ao pessoal da Imprensa Nacional que execute trabalhos extraordinários.
Imprima-se.
Da comissão de administração pública sôbre o n.º 550-B, que cria uma assemblea eleitoral em Chança, concelho de Alter do Chão.
Para a comissão de legislação civil e comercial.
O REDACTOR — Herculano Nunes.

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