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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 145
(EXTRAORDINÁRIA)
EM 27 DE SETEMBRO DE 1923
Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
Carlos Eugénio de Vasconcelos
Sumário. — Aberta a sessão com a presença de 45 Srs. Deputados, é lida a acta e dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia. — O Sr. Nuno Simões chama a atenção do Govêrno para a situação da imprensa no que diz respeito à importação do papel.
Responde-lhe o Sr. Ministro da Justiça (Abranches Ferrão).
O Sr. Sá Pereira pede providencias contra o juiz da comarca de Ponte do Lima.
Responde-lhe o Sr. Ministro da Justiça.
Aprovada a acta da sessão anterior, o Sr. Presidente interrompe a sessão por não estar presente o Sr. Ministro das Finanças (Velhinho Correia).
Reaberta a sessão, o Sr. Ministro das Finanças conclui a exposição das razões de haver trazido à Câmara as suas propostas financeiras, para as quais requere urgência e uma limitação de prazo, quanto à discussão.
Postas à admissão, usaram da palavra sôbre o modo de votar os Srs. Carvalho da Silva e Almeida Ribeiro, o primeiro dos quais requere votação nominal.
Aprovado.
Procedendo-se à chamada, verifica-se que aprovaram a admissão 64 Srs. Deputados contra 4 que a rejeitaram.
O Sr. Nuno Simões requere que o requerimento do Sr. Velhinho Correia seja dividido em duas partes.
Aprovado.
Aprova-se a urgência.
Sôbre o modo de se votar a limitação do prazo, usam da palavra os Srs. Cunha Leal e Ministro das Finanças, que é autorizado a retirar a segunda parte do seu requerimento, depois de terem usado da palavra os Srs. Mariano Martins, Carvalho da Silva e Fausto de Figueiredo.
O Sr. Carvalho da Silva usa da palavra acêrca da recomposição ministerial.
O Sr. Presidente comunica o falecimento do Padre António de Oliveira, inspector dos serviços das Casas de Reforma de Menores, e tece o elogio do extinto, propondo que se exare na acta um voto de sentimento.
Foi aprovado por unanimidade, depois de falarem os Srs. Ministro da Justiça, Almeida Ribeiro, Baptista da Silva, Paulo Menano, Carvalho da Silva, Dinis da Fonseca e Meireles Barriga.
São lidas algumas substituições.
Antes de se encerrar a sessão. — O Sr. António Correia chama a atenção do Govêrno para irregularidades cometidas num acto eleitoral.
Responde-lhe o Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a imediata com a respectiva ordem.
Abertura da sessão às 15 horas e 30 minutos.
Presentes 45 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 32 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Ferreira Vidal.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António Pais da Silva Marques.
António Resende.
António de Sousa Maia.
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Diário da Câmara dos Deputados
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Custódio Martins de Paiva.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Salema.
Joaquim Brandão.
José António de Magalhães.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
José de Oliveira Salvador.
José Pedro Ferreira.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Nuno Simões.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Sebastião de Herédia.
Vergílio Saque.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Amaro Garcia Loureiro.
António Correia.
António Lino Neto.
António Pinto de Meireles Barriga.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Bartolomeu dos Mártires Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado Freitas.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Pires Cansado.
João José da Conceição Camoesas.
João Vitorino Mealha.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Carvalho dos Santos.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Manuel de Brito Camacho.
Tomé José de Barros Queiroz.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Srs. Deputados que não compareceram à sessão:
Abílio Marques Mourão.
Afonso Augusto da Costa.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Albano Augusta de Portugal Durão.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Alberto Lelo Portela.
Alberto de Moura Pinto.
Alberto da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Álvaro Xavier de Castro.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Américo da Silva Castro.
Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.
António Albino Marques de Azevedo.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
António de Mendonça.
António de Paiva Gomes.
António Vicente Ferreira.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur Brandão.
Artur de Morais Carvalho.
Augusto Joaquim Alves dos Santos.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Carlos Cândido Pereira.
David Augusto Rodrigues.
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Delfim do Araújo Moreira Lopes.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Cruz.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Germano José de Amorim.
Jaime Duarte Silva.
Jaime Júlio de Sousa.
João Estêvão Águas.
João José Luís Damas.
João Luís Ricardo.
João de Ornelas da Silva.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge de Barros Capinha.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Marques Loureiro.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Júlio Gonçalves.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel Duarte.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Manuel de Sousa Coutinho.
Manuel de Sousa Dias Júnior.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães Infante.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Maximino de Matos.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Rodrigo José Rodrigues.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Tomás de Sousa Rosa.
Valentim Guerra.
Vergílio da Conceição Costa.
Viriato Gomes da Fonseca.
Às 15 horas e 15 minutos principiou a fazer-se a chamada.
O Sr. Presidente: — Estão presentes 45 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Vai ler-se a acta.
Eram 15 horas e 30 minutos.
Leu-se a acta.
Deu-se conta do seguinte
Expediente
Telegrama
Dos oficiais de justiça da comarca de Pôrto de Mós, pedindo melhoria de situação.
Para a Secretaria.
O Sr. Presidente: — Vai entrar-se no período de antes da ordem do dia.
O Sr. Nuno Simões: — Sr. Presidente: sou dos que pensam que, em face do carácter de gravidade e urgência que se procurou dar à convocação do Parlamento, a Mesa se deveria ter privado de utilizar o período chamado «antes da ordem do dia», para que todo o tempo da sessão se pudesse consagrar, à discussão das propostas de finanças e à apreciação daqueles planos de govêrno que os Srs. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças, e principalmente êste último, reputassem absolutamente indispensáveis para a salvação do país.
Mas, Sr. Presidente, dado que V. Ex.ª, interpretando o pensamento da Câmara, entende que êsse período deve existir, não quero deixar de me aproveitar dele, pedindo ao Sr. Ministro da Justiça a fineza de transmitir ao seu colega das Finanças as considerações que vou fazer.
Sr. Presidente: li nos jornais da manhã de hoje, porque não foi possível aperceber-me ontem do envio, para a Mesa, da proposta a que êles se referem, que o Sr. Ministro das Finanças havia mandado para a Mesa uma proposta de lei referente aos direitos sôbre o papel para jornais.
Não julgue a Câmara que vou tratar êste assunto pro domo mea, porquanto os lucros que tiro do jornalismo são nulos. Faço o jornalismo que é preciso fazer para as pessoas que se interessam pela
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vulgarizarão das ideas, mas sem quaisquer benefícios materiais.
Sr. Presidente: o Sr. Ministro das Finanças não necessitava de mandar para a Mesa qualquer proposta, porque a autorização que foi concedida pelo Parlamento para reformar o nosso estatuto aduaneiro permite-lhe, sem qualquer deliberação da Câmara, resolver o assunto.
Estão esgotados os seis meses de implantação provisória da pauta, e ao Sr. Ministro das Finanças compete, ouvindo as informações do conselho aduaneiro, considerar devidamente todas as reclamações e todos os pedidos que lhe sejam dirigidos no sentido de corrigir os defeitos da pauta primitiva.
Sr. Presidente: peço ao Sr. Ministro da Justiça que transmita ao seu colega das Finanças as minhas considerações e lhe faça. crer, em nome dos interêsses da imprensa, que são os interêsses da República e do país, que é necessário evitar a falência da industria da imprensa em Portugal.
Não há o direito de, num país como o nosso, condenar a imprensa por um capricho, o estou certo que o Sr. Ministro das Finanças, ouvindo as informações que o Sr. Ministro da Justiça lhe transmitirá, vai resolver o assunto, tanto mais quanto é certo que termina hoje o prazo dos seis meses.
Sr. Presidente: apelo para o Govêrno, certo de que são injustas as acusações que me têm sido dirigidas.
O Govêrno não tem pelo jornalismo aquela consideração que é obrigado a ter por um dos instrumentos da cultura dêste país.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Justiça (Abranches Ferrão): — Pedi a palavra para dizer a V. Ex.ª que transmitirei ao Sr. Ministro das Finanças as considerações de V. Ex.ª e para afirmar que o Govêrno tem pela imprensa a máxima simpatia, e que creio a verdadeira imprensa um autêntico poder do Estado, com mais fôrça que os próprios poderes do Estado constituídos e organizados. Dentro de uma democracia não se pode governar sem imprensa. Fique V. Ex.ª certo de que o Govêrno atenderá a essa situação pela melhor forma.
O orador não reviu.
O Sr. Sá Pereira: — Chamo a atenção do Sr. Ministro da Justiça para os factos graves e anormais que se estão dando na comarca do Ponte do Lima.
Sou informado de que o juiz gasta o tempo em que devia exercer a sua ocupação a jogar a batota, comprometendo as causas que correm pela comarca.
Estou certo de que o Sr. Ministro das Finanças vai providenciar, e ponho nas mãos do S. Ex.ª a carta que me enviaram.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (Abranches Ferrão): — Tenho a dizer ao Sr. Sá Pereira que eu, como Ministro da Justiça e dos Cultos, quási não exerço poder disciplinar sôbre a magistratura do país e só o Conselho disciplinar jurídico pode tomar conhecimento dessa queixa que envolve factos graves. Prometo ràpidamente castigar o culpado, se forem verdadeiras as afirmações da carta.
O orador não reviu.
ORDEM DO DIA
É aprovada a acta.
O Sr. Presidente: — Como não está presente o Sr. Ministro das Finanças, interrompo a sessão até S. Ex.ª chegar.
Eram 15 horas e 55 minutos.
O Sr. Presidente: — Está reaberta a sessão.
Eram 16 horas e 10 minutos.
O Sr. Ministro das Finanças (Velhinho Correia): — Acabo do saber que a sessão foi interrompida por eu não estar presente. Tinha pedido para me avisarem o peço desculpa á V. Ex.ª e à Câmara por ter feito esperar.
Sou informado de que o Sr. Nuno Simões fez referências a propósito duma proposta que eu mandei para a Mesa.
O Sr. Nuno Simões: — Devo declarar a V. Ex.ª que eu não tinha conhecimento da proposta.
O Orador: — Não posso no momento presente reformar as pautas aduaneiras. Tem de continuar o regime anterior, e
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dispensar-se à imprensa toda a protecção, pois ela é indispensável num regime democrático.
Continuando as minhas considerações, vou explanar à Câmara o que é a proposta que tive a honra de submeter ao estudo do Congresso.
O primeiro problema que me interessa é o funcionalismo e, sem resolver êsse problema, não posso tratar dos impostos.
De maneira alguma podia sustentar a doutrina de que os funcionários públicos estão muito bem pagos e que os seus vencimentos excedem as necessidades da hora presente. Não é exacto isso.
Como se podem realmente fazer economias é reduzindo os quadros, simplificando os serviços, remodelando os Ministérios, de maneira que não haja duplicação de serviços, serviços desnecessários.
Há que fazer uma remodelação nos serviços públicos mais económica, mais harmónica com a vida da Nação.
Entendo, porém, que fazendo o Estado uma grande despesa com as classes inactivas, não recebo o Estado dêsses funcionários compensação que se veja. Entendo que se deve estabelecer uma taxa compensadora das despesas que o Estado faz em matéria de reformas e pensões, sôbre todos os vencimentos dos funcionários. Assim o Estado teria uma compensação nas despesas que tem com as classes inactivas.
O que se despende com os funcionários públicos, em vencimentos, é de cêrca de 400:000 contos. Bastaria uma taxa de 6 por cento para o Estado realizar uma economia com as classes inactivas de cêrca do 24:000 contos.
Sôbre a remodelação dos serviços públicos e redução de quadros tenho especial autoridade, porque num determinado momento da minha vida política, encontrando-me com uma autorização para remodelar os serviços do Ministério do Comércio e Comunicações, de que era Ministro, em virtude da lei n.º 197, fiz a remodelação dêsses serviços, suprimindo mais de 300 lugares, desde os mais altos da burocracia aos menos elevados, em termos do não deixar ninguém na miséria, em termos de sanear os serviços, ficando os funcionários fora do quadro, de maneira que tem sido assimilados pelos serviços próprios do Ministério.
Segundo a proposta que tenho a honra de apresentar ao Parlamento, ficarão na disponibilidade todos os funcionários que não sejam indispensáveis aos serviços públicos, depois de remodelados e saneados devidamente todos êsses serviços.
Os funcionários disponíveis constituiriam uma reserva para preencher todas as vagas que no futuro se pudessem dai-nos serviços públicos.
Assim atingiria o fim de se poder fazer uma remodelação dos serviços públicos, sem deixar na miséria os servidores do Estado.
Proponho que os arsenais e os serviços industriais do Estado possam transitar para a indústria particular o sejam realmente industriados, segundo o meu critério, aqueles que o possam ser sem prejuízo da defesa nacional.
Proponho igualmente que se reforme o pessoal dos arsenais, reduzindo-o estritamente às necessidades dêsses organismos e em harmonia com as verbas para materiais.
Tenho também especial autoridade para assegurar ao país que as palavras que estão na proposta não serão uma promessa vã, mas uma promessa que me sinto com coragem de realizar.
Também em 1920, quando fui Ministro do Comércio, me encontrei com mais de 300 empregados nos diferentes serviços que não serviam para cousa nenhuma, que não prestavam serviço algum e que gastavam aos cofres públicos o melhor de algumas dezenas de milhares de contos em algumas obras do Estado, e continuando a obra do meu antecessor, que já havia despedido muitos dêsses servidores, num total de 500 a 600 indivíduos, despedi êsses 300 operários.
Entendo que a obra de assistência a fazer não devo ser feita nos serviços do Estado, mas nos serviços próprios da Assistência.
Não compreendo que se mantenham arsenais, e serviços que estão servindo de pretexto para a manutenção de numerosos operários que não têm que fazer.
Entrando pròpriamente na parte da minha proposta que se refere a impostos, devo dizer a V. Ex.ª e à Câmara que fico muito aquém. O que vem na minha proposta é a diversidade do impostos, no intuito de corresponder às circunstancias
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especiais em que se encontra o país, um país desorganizado que não tem cadastro da propriedade e em que os serviços de impostos deixam muito a desejar.
A idea do imposto único não tem razão de ser, não se explica. É na variedade do imposto, na diversidade de contribuintes que se pode encontrar uma compensação para as injustiças que só se poderão reduzir pela aplicação de determinadas taxas.
Sr. Presidente: as receitas previstas no orçamento económico andam por 700 mil contos, porém essas receitas não são realizáveis, razão por que eu incluí numa das alíneas das minhas propostas aquela parte prevista e não realizável, respeitante ao ano económico corrente, de serem pelo Estado pedidas de novo ao contribuinte.
Isto, Sr. Presidente, não é novo, é matéria corrente em França e em outros países, pois a verdade é que não faz sentido calcularem-se refeitas para fazer face a determinadas despesas e que não sejam realizáveis.
Sabem V. Ex.ªs muito bem que há dois impostos, o imposto de cotização e o imposto de repartição, os quais, se têm vantagens, têm também defeitos, sendo, no emtanto, o imposto do repartição aquele que mais vantagens oferece, pois a verdade é que se realiza com mais facilidade e o seu produto entra mais fàcilmente nos cofres do Estado.
O imposto de repartição, a meu ver, é mais justo do que o de cotização, visto que êste depende de uma organização administrativa especial e, além disso, da moralidade dos funcionários que tem de tratar do assunto, havendo mil circunstâncias a atender e a considerar a êste respeito.
O que é um facto é que as receitas foram calculadas numa cifra muito inferior ao que deviam ser, dada a riqueza do país.
Disse eu que as receitas totais previstas no orçamento económico corrente são de 700:000 contos, quando as receitas do ano económico de 1913-1914 foram de 68:000 contos.
Calculando, hoje, só um milhão de contos para a propriedade rústica, urbana e industrial, está muito além dos 700:000 contos que se pedem para todas as contribuições directas do Estado.
É esta, Sr. Presidente, a razão por que eu digo e afirmo que em Portugal mal se pagam os impostos.
O Sr. Carvalho da Silva: — Não apoiado.
O Orador: — O que eu dizia a V. Ex.ª é que a indústria em Portugal não paga o que devia pagar isto é, o que pagam as indústrias nos outros países.
Sr. Presidente: continuando na análise da minha proposta, eu passo a referir-me à base 5.ª na qual proponho o lançamento de um imposto extraordinário transitório de 24:000 contos a multiplicar pelo coeficiente da carestia da vida, imposto êste que estou certo há-de dar os resultados desejados, fazendo-se uma política activa e intensa.
Trata-se, Sr. Presidente, de um imposto e não de um empréstimo, pois a verdade é que, se se tratasse de um empréstimo, pois cousas teriam de mudar um pouco, visto que as circunstâncias eram diferentes.
O Sr. Fausto de Figueiredo: — V. Ex.ª prevê a amortização completa do empréstimo num período do três anos?
O Orador: — Eu explico a V. Ex.ª
Eu entendo, Sr. Presidente, que, emquanto se não reorganizar o sistema tributário do país, temos absoluta necessidade de lançar mão dêstes recursos.
Eu já disse que não pretendo lançar um empréstimo, mas sim um imposto e mais nada.
A razão de ser desta operação é porque o Tesouro Público tem necessidades imediatas que têm de ser atendidas, sob pena de se desarranjar toda a máquina administrativa do Estado.
Proponho o restabelecimento do imposto sôbre a cerveja e da tributação sôbre o álcool.
São impostos conhecidos que foram suprimidos e não sei a razão porque isso se fez, mas foi, quanto a mim, uma resolução errada.
Não se deviam pôr de parte êsses impostos, que davam rendimento bastante e cuja cobrança, demais, não custava nada ao Estado, pois era paga pelos próprios contribuintes.
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Não se deviam pôr de parte êstes impostos que existem em toda a parte.
Há em Inglaterra o imposto sôbre o álcool, sôbre o açúcar e sôbre o chá, e êles existem em todos os países da Europa, porque as necessidades dos Estados são tara imperiosas que não dispensam essas receitas.
Num país vinícola como o nosso, um imposto sôbre a cerveja não prejudica os nossos interêsses.
A venda da cerveja em Lisboa e Pôrto é uma cousa grandiosa, não sendo, portanto de razão desprezar êste imposto.
Sr. Presidente: seguindo a análise das minhas propostas, chego à proposta relativa ao privilégio das pólvoras físicas.
Portugal é um país que ainda tem livre o fabrico das pólvoras.
Não quero afirmar que nesta proposta está a salvação do Portugal, mas ela faz parte dum conjunto de medidas.
Num país que tem um sistema tributário como o nosso, deve haver muitas taxas, para haver maior produtividade.
Estamos longe do ideal, em matéria de impostos, do imposto único.
Sr. Presidente: é agora ocasião de dizer alguma cousa sôbre a base 7.ª, que se refere às fábricas de sabão.
No fundo esta proposta visa a estabelecer um imposto sôbre o respectivo consumo.
Não é também novo êsso imposto.
No princípio do constitucionalismo êsse imposto existia.
Não proponho aqui nem o monopólio nem o exclusivo. Esta indústria fica em regime absolutamente livre; simplesmente a coloco em circunstâncias especiais, resultantes dos factos actualmente existentes.
Esta indústria está monopolizada e constitue verdadeiro potentado na nossa vida económica, sem que o Estado aufira daí o mínimo benefício ou o menor lucro.
Pretendo lançar uma pequena tributação sôbre o sabão, sôbre o petróleo e sôbre o açúcar, à semelhança daquilo que já se faz em França, na Inglaterra e em outros países.
Fazendo incidir sôbre o sabão um imposto de 5 por cento nos preços actuais, o Estado pode realizar de 10:000 a 15:000 contos, que não são pagos pelo consumidor, mas sim por aqueles que obtêm lucros exagerados e inadmissíveis.
Não ignora a Câmara que a primeira indústria de sabão do nosso pais tem dado os dividendos mais extraordinários, dividendos que são pagos em ouro, chegando a atingir 400 por cento e mais, sem a mínima comparticipação do Estado.
Eu não estabeleço um exclusivo, vista que fica de pé o regime de liberdade; o que faço é lançar um tributo que permite realizar uma grande receita para o Estado, sem de qualquer maneira atingir o consumidor, mas sim aqueles indivíduos que realizaram nessa indústria lucros que não seriam permitidos em outra nação.
E se assim é relativamente ao sabão, pelo que se refere aos adubos há um propósito inteiramente diferente da minha parte.
Tenho o propósito de intervir no comércio dos adubos, mas de maneira a conseguir que a lavoura obtenha os adubos por preços harmónicos com as suas legítimas necessidades.
Sr. Presidente: a base 8.ª visa a estabelecer uma tributação extraordinária sôbre os lucros das emprêsas industriais, quando êsses lucros excedam determinados limites.
É simplesmente sôbre êsse excesso que o Estado obteria uma comparticipação da quarta parte.
É bem modesto o meu propósito em comparação com o que se faz em outros países, onde as indústrias nem por isso deixam de desenvolver-se, como na Bélgica, onde existe um imposto pesadíssimo sôbre os lucros excessivos.
As indústrias têxteis tiraram ultimamente1 lucros de 200 e 300 por cento sôbre o capital, cotando os preços, não pela concorrência, produção ou mão de obra, mas pelos preços ingleses, que são muito mais sobrecarregados de impostos.
Por isso essas indústrias dão aos seus accionistas 200 e 300 por cento.
Ora eu pregunto se não há o direito de pedir alguma cousa a êsses potentados?
As indústrias de conservas de peixe têm dado lucros de 100 por cento; a indústria do calçado tem dado lucros superiores a 100 por cento; a indústria cerâmica ganha o que quero; a indústria de serração de madeiras dá lucros superiores a 150
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por cento; e a moagem não sei o que dá, mas o que é certo é que os seus capitais chegam para tudo neste país, menos para comprar as matérias primas necessárias à sua laboração.
A êste propósito eu contarei à Câmara um caso interessante que se passou comigo:
Um dêstes potentados subiu ao Ministério das Finanças e pediu-me que lhe financiasse determinadas operações.
Eu respondi que não tinha dúvida nenhuma nisso, mas com a condição de me ser mostrado o balancete, para ver se o potentado em questão necessitava realmente do auxílio do Estado.
Pois o que é certo é que êsse indivíduo nunca mais me apareceu!
Àpartes.
Não são só estas indústrias que estão em tais condições.
A maior parte das grandes indústrias coloniais estão nessas condições e posso referir-me à indústria do açúcar.
Ainda hoje vi que a rama do açúcar de Angola tem os seguintes preços que vou ler:
Leu.
A indústria do papel está nas mesmas condições, e muitas outras que não teria fim citar.
Pregunto, pois, se, dadas as condições do Tesouro, é demais pedir às indústrias que quando façam lucros em tais proporções dêem alguma cousa para o Estado?
Não haverá o dever e o direito de pedir nina parte para o Estado?
Não é isto digno, lógico e indispensável?
O Sr. Brito Camacho (interrompendo): — Isso faz com que o consumidor tenha tudo mais barato?
O Orador: — O que não faz é com que não possa ser mais barato, mas ou aceitarei as emendas justas que V. Ex.ª queira apresentar.
Não tenho a pretensão de fazer uma obra perfeita e apenas apresento umas bases para impostos.
Sr. Presidente: vou agora referir-me à indústria de seguros em Portugal.
Proponho que essa indústria continue a ser exercida em Portugal só em certas condições e com participação do Estado.
Não é meu propósito favorecer quem quer que seja, e só estabeleço princípios gerais.
Não estabeleço um regime do favor, mas um regime de interêsse para o Estado, com uma participação nas receitas.
Não se trata de números fantasiosos, mas de cálculos elaborados pacientemente e por forma a resistirem a todos os ataques.
Proponho-me também fazer o saneamento bancário.
Apoiados.
Eu sei que contra mim se vão levantar as mais cortantes acusações e se hão-de criar os mais resistentes obstáculos. Não importa; eu seguirei resolutamente o meu caminho.
A situação em que nos encontramos é que não pode honestamente manter-se.
Há Bancos com um capital reduzidíssimo que dão lucros quási inacreditáveis...
O Sr. Brito Camacho: — Com autorização dos Govêrnos.
O Orador: — Há uma casa bancária, cujo nome não cito...
O Sr. Nuno Simões: — Diga, diga; numa questão destas não pode haver segredos.
O Orador: — Há uma casa bancária, por exemplo, que tendo o capital do 300 contos, distribui 1:000.
Pode dizer-se, duma maneira geral e sem receio de desmentido, que a função dos bancos não é hoje a de receber depósitos, mas sim a de exercer a especulação e por vezes uma especulação escandalosa e desenfreada.
A última das minhas bases estabelece alguma cousa de novo em matéria orçamental, de forma a acabar com um regime cuja manutenção seria para o Estado verdadeiramente incomportável.
Devo ainda dizer que, apesar das minhas propostas, o Govêrno não se desinteressa dos importantes problemas da contribuição de registo, dos tabacos e dos fósforos.
Termino, Sr. Presidente, reproduzindo as palavras que pronunciei ao iniciar o meu discurso. Foi a política do empréstimo que me trouxe até êste lugar. A
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finalidade dessa política — a valorização do escudo — não será possível atingi-la se não nos apressarmos a sanear a vida administrativa do Estado.
A minha proposta tem êsse objectivo; em. meu entender é chegado o momento de acabar com os suprimentos no Banco de Portugal.
Devo, por último, dizer a Câmara que a responsabilidade das propostas que apresentei é inteiramente minha. Para elas requeiro a urgência para que possam entrar em discussão na próxima segunda-feira ainda que sem parecer.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Vozes: — Muito bem.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: salvo melhor opinião, parece-me que as propostas do Sr. Ministro das Finanças não podem ser aceitas pela Mesa por inconstitucionais. Veja-se o n.º 4.º do artigo 26.º da Constituïção.
Não há nenhum caso mais em que a Constituïção permita que o Parlamento vote a autorização pedida, mormente em matéria de impostos, tratando-se ainda de lançar sôbre o país impostos os mais extraordinários, tratando-se duma proposta que não deve mesmo ser considerada, e sem desrespeito para com o Sr. Ministro das Finanças, a quem pessoalmente não quero ser desagradável, mas porque essa proposta é apenas um documento capaz de, depois de apresentado, representar o abandono imediato das cadeiras do poder do Ministro que a apresente. E V. Ex.ª, Sr. Presidente, não pode, em face dos termos da Constituïção, admitir essa proposta sequer.
O orador não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: o Sr. Carvalho da Silva acaba de trazer a esta Câmara uma opinião que lá fora teve já uma vez ou outra uma corta popularidade: a Constituïção só admitir que em dois casos apenas o Poder Legislativo de autorização ao Executivo: no caso de empréstimo e no de guerra.
Esta opinião, porém, não corresponde àquilo que está legislado na Constituïção nem na prática constitucional de agora, nem do regime anterior.
A Constituïção, designadamente no seu artigo 27.º, refere-se, dum modo geral, a autorizações concedidas pelo Legislativo ao Executivo, mas não se considera que sejam exclusivamente as autorizações para empréstimos o para fazer a guerra, porque a Constituïção, num outro artigo, reconhece e estabelece, duma maneira positiva, que o Poder Legislativo pode delegar no Executivo determinadas atribuïções.
É uma disposição expressa da Constituïção, artigo 77.º, se me não engano, reconhece expressamente o exercício do Poder Executivo com função do Legislativo. O Legislativo pode realmente autorizar o Executivo a tomar medidas e providências, o que não seria normal sem essa autorização.
É isto que se tem praticado em todas as legislaturas desde que há República e o Código constitucional que nos rege.
O Sr. Carvalho da Silva: — V. Ex.ª dá-me licença?
O Orador: — Pois não...
O Sr. Carvalho da Silva: — V. Ex.ª, em primeiro lugar, tem toda a autoridade que já lhe tem sido reconhecida nesta Câmara. Tem toda a autoridade sôbre êste assunto quando, é claro, não é dominado pela paixão política.
Um ponto há sôbre que pedia a V. Ex.ª me dêsse elucidação e à Câmara.
O artigo 36.º, n.º 3.º, da Constituïção diz:
Leu.
Pregunto se V. Ex.ª, com toda a sua autoridade, entende que também êste artigo da Constituïção não impede absolutamente que, em matéria de impostos, o Parlamento delegue no Poder Executivo; se não é ao Congresso realmente que compete discutir e votar êsse assunto.
O Orador: — Se V. Ex.ª pede a minha opinião, em face do que tem legislado o Congresso, direi que não. A Constituïção não proíbe o Poder Legislativo de delegar no Executivo esta função.
Isto é o que está legislado dentro do princípio das boas normas de legislação e prática constitucional.
Diz «privativamente» essa lei.
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Infelizmente não somos capazes de fazer obra tam perfeita que não seja indispensável atender às imperfeições da nossa própria obra para resolver os inconvenientes que surgem de momento.
O Sr. Carvalho da Silva: — Então não é privativo.
O Orador: — Não é a paixão política que neste momento me domina. Não tenho dúvida de dizer à Câmara algumas emendas que se me afiguram conforme o que o Sr. Carvalho da Silva pretende fazer vingar, fora do ambiente político.
O Sr. Carvalho da Silva: — Aí, sim.
O Orador: — Também tive ocasião de pretender sustentar algumas vezes que a Constituïção só permitia autorizações nesses dois precisos termos, mas Depois reconheci que, mesmo na opinião de autoridades estranhas ao ambiente político, que assim não tem sido praticado nem seguido invariavelmente. Assim tem sido até reconhecido em jornais scientíficos, que não tenho agora aqui, mas ainda há bem pouco tempo assim foi sustentado num Boletim da Faculdade de Direito por um professor distinto, cujas convicções políticas ignoro se são republicanas. Sustentou proficientemente esta opinião.
Posso afirmar, sem paixão política, que a Constituïção nos permite estas autorizações.
Assim respondo às objecções apresentadas pelo Sr. Carvalho da Silva, a quem agradeço as palavras amáveis que me dirigiu.
A sua proposta, portanto, é absolutamente improcedente.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Requeiro votação nominal para a admissão das propostas do Sr. Ministro das Finanças.
Foi aprovado.
Feita a chamada disseram «aprovo» 64 Srs. Deputados e «rejeito» 4, sendo, portanto, aprovada a admissão.
Disseram «aprovo» os Srs.:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Alberto Ferreira Vidal.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Amaro Garcia Loureiro.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Abranches Ferrão.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Correia.
António Ginestal Machado.
ntónio Pais da Silva Marques.
António Pinto de Meireles Barriga.
António de Sousa Maia.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Maldonado de Freitas.
Delfim Costa.
Domingos Leite Pereira.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Dinis de Carvalho.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Hermano José de Medeiros.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João José da Conceição Camoesas.
João Salema.
João Vitorino Mealha.
Joaquim Brandão.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José António de Magalhães.
José Carvalho dos Santos.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Mendes Nunes Loureiro.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Nuno Simões.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
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Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.
Sebastião Herédia.
Tomé José de Barros Queiroz.
Vasco Borges.
Ventura Malheiro Reimão.
Vergílio Saque.
Vitorino Henriques Godinho.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Disseram «rejeito» os Srs.:
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
António Lino Neto.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Joaquim Dinis da Fonseca.
O Sr. Presidente: — Vou pôr à votação o requerimento que foi apresentado pelo Sr. Ministro das Finanças para que seja concedida a urgência para a discussão da proposta que está entregue à deliberação da Câmara e para que seja discutida a mesma proposta na próxima segunda-feira, com o respectivo parecer ou sem êle.
O Sr. Nuno Simões (sôbre o modo de votar): — Requeiro que a Câmara seja consultada sôbre se permite que o requerimento do Sr. Ministro das Finanças seja dividido em duas partes: uma a que respeita à urgência e a outra a que respeita a fazer-se a discussão da mesma proposta na segunda-feira, com ou sem parecer.
O Sr. Presidente: — Vai votar-se o requerimento do Sr. Nuno Simões. Pôsto à votação, foi aprovado. Seguidamente foi aprovada a urgência.
O Sr. Presidente: — Vai votar-se a segunda parte do requerimento do Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Cunha Leal (sôbre o modo de votar): — Sr. Presidente: o Sr. Ministro das Finanças não quis pedir a dispensa do Regimento para a sua proposta; seria isso, talvez, motivo para lhe apresentarmos os nossos agradecimentos, se porventura o que S. Ex.ª deseja e requereu não equivalesse a essa dispensa do regimento.
Ninguém, poderá, honestamente, habilitar-se, até segunda-feira, para a discussão da proposta que foi apresentada pelo Sr. Ministro das Finanças, e nestas condições solicitar que a proposta entre em discussão na próxima segunda-feira, mesmo sem parecer, é a mesma cousa que pedir a dispensa do Regimento.
Em virtude disto, a atitude da minoria nacionalista não pode ser outra que não seja a de rejeitar a proposta.
Mas, Sr. Presidente, quere parecer-nos que o Sr. Ministro das Finanças, quando apresentou ao Parlamento esta rapaziada financeira (Risos), não quis mais do que provocar uma atitude de furibundo ataque contra uma cousa que os não merece; e, Sr. Presidente, seria curioso, exactamente porque êsse ataque não é merecido, verificar se uma vez calada a oposição sôbre a proposta do Sr. Ministro das Finanças, que em nosso entender nenhum Govêrno deveria apresentar, pois que ela não visa senão a suprimir toda a acção do Parlamento, e deixando-se o caso entregue à consciência do Ministro, haveria a ousadia de converter essa proposta em lei do país.
A minoria nacionalista ainda não resolveu sôbre que caminho devia seguir, mas talvez seja a atitude do silêncio a que mais convenha ao país e a ela própria.
A minoria nacionalista tam acusada, como o foi a propósito da proposta do empréstimo, de entravar a marcha da governação pública, de não deixar fazer a salvação do país, a minoria nacionalista tam enxovalhada por essas acusações, talvez esteja na disposição de entregar o pleito à exclusiva análise da maioria.
Se o Sr o Ministro das Finanças veio aqui com o propósito de fazer acreditar que do Parlamento existe quem queira impedir que se discutam quaisquer propostas, engana-se.
Há-de S. Ex.ª arcar com a responsabilidade daquilo que inventou o que tam apressadamente quere ver aprovado.
Nestas condições, vamos rejeitar a proposta; separaremos a nossa responsabilidade da dos que a aprovam.
A obra do Sr. Ministro das Finanças é o complemento da ruína a que tem sido levado o país.
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O Sr. Ministro das Finanças (Velhinho Correia): — A razão do requerimento que fiz filia-se nas condições financeiras do país. Compreendo, todavia, que seja necessário um maior prazo para que todos se possam habilitar a discutir a minha, proposta, muito embora ela não contenha detalhes...
O Sr. Cunha Leal: — A base 4.ª diz:
Leu.
Vê-se, pois, que é uma cousa inconstitucional.
Eu só indo às repartições de finanças posso saber, posso fazer um juízo seguro.
Como posso eu analisar, se os números que vêm no Orçamento não servem?
O Orador: — Se fôsse ocasião, eu responderia a todos os pontos do Sr. Cunha Leal; mas só direi que não há inconstitucionalidade.
Eu só transfiro para aqui o sistema usado em França.
O Sr. Cunha Leal: — V. Ex.ª não me percebeu, ou pelas condições acústicas da sala ou por minha insuficiência.
Leu.
Isto significa que o Orçamento das receitas votado pelo Parlamento está errado, e que V. Ex.ªs querem que produza determinada quantia, pelo que aqui escreveram ao acaso.
Como é que V. Ex.ª quere que nós saibamos quais são as receitas que temos que multiplicar?
Nem mesmo V. Ex.ª sabe qual é o coeficiente por que há-de multiplicar.
O Orador: — Eu sei bem o que hei-de aplicar, e, como já disse, não tenho mais que fazer senão seguir o regime que é corrente em França.
E afinal não é mais do que um princípio justo e legal.
Eu pedi a palavra para V. Ex.ª submeter à Câmara a rectificação do meu requerimento no sentido de a comissão de finanças dar o seu parecer o mais ràpidamente possível, pois tenho a máxima urgência, o não tenho tempo para esperar muitos dias por êsse parecer, sendo necessário que em cinco ou seis dias parecer seja presente à discussão, pois o país não pode esperar mais.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Mariano Martins: — Pedi a palavra para explicações a fim de declarar, como relator do orçamento das receitas, que os números que aí se encontram me foram fornecidos pela repartição competente.
Digo isto para desfazer a má impressão que poderiam ter causado as palavras do Sr. Cunha Leal, quando afinal eu pus todo o cuidado nas verbas inscritas nesse orçamento.
O Sr. Presidente: — Parece-me que depois das palavras do Sr. Ministro das Finanças não são precisas mais explicações.
O Sr. Carvalho da Silva: — Passam-se nesta Câmara as cousas mais extraordinárias, como seja esta da proposta do Sr. Ministro das Finanças, que o Sr. Cunha Leal chamou «rapaziada financeira».
Não há o direito de, tendo obtido o voto e a confiança dos eleitores, vir ao Parlamento fazer votar de afogadilho uma monstruosidade desta ordem, sem dar tempo a que o país reclame.
Sr. Presidente: é velha norma do Sr. Ministro das Finanças actual querer assim votar propostas, e lembro-me ainda de entrevistas dadas pelo Sr. Velhinho Correia, no ano passado, quando nesta Câmara se discutiam as propostas de finanças, dizendo que ia apresentar um requerimento para que elas fossem votadas sem discussão.
Êste facto demonstra, sem querer de nenhuma forma ser desagradável ao Sr. Ministro das Finanças, que S. Ex.ª não tem competência para exercer êsse cargo. Quem tivesse a mais leve sombra de competência não apresentaria estas propostas nem diria o que S. Ex.ª tem dito, ontem e hoje. Tem-se perfeitamente a impressão de que, sendo uma pessoa inteligente e com qualidades de trabalho, não conhece absolutamente nada de matéria tributária.
Basta esta circunstância, Sr. Presidente, para não deixarmos, sem o nosso mais
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veemente protesto, que se discuta êste assunto em cinco ou seis dias.
Sr. Presidenta: numa só cousa o Sr. Ministro das Finanças tem razão, e essa é que as suas propostas, não têm discussão.
De facto, Sr. Presidente, elas são uma cousa inacreditável, e eu posso garantir à Câmara que o efeito que elas produziram lá fora foi de tal ordem, que a permanência do Sr. Velhinho Correia naquela cadeira representa um mal extraordinário para o país.
O Sr. Ministro das Finanças não tem competência para exercer o lugar — e digo isto com muito desgosto — e por êsse motivo torna-se um perigo enorme para o país.
Sr. Presidente: não quero tomar muito tempo à Câmara; basta frisar uma das objecções feitas pelo Sr. Velhinho Correia, para ver que S. Ex.ª não pensou cinco minutos, sequer, no trabalho que aqui apresentou. Refiro-me à afirmação de S. Ex.ª dizendo que era constitucional a autorização referente a adicionais.
Pregunto: Que noção tem um Ministro que diz que importa apenas saber o quantitativo, e não o que cabe á cada contribuinte?
Que respeito e que competência são êstes?
Sr. Presidente: disse o Sr. Cunha Leal que a minoria nacionalista trataria dêste assunto de uma forma sucinta.
Ora eu devo declarar que a minoria monárquica há-de empregar todos os seus esfôrços para que o Sr. Ministro das Finanças abandone aquelas cadeiras, e o Parlamento não vote propostas desta ordem, que são uma verdadeira monstruosidade.
Para terminar, desejo acentuar que folguei imenso que o Sr. Cunha Leal, em nome da minoria nacionalista, tivesse achado inconstitucional a referida proposta.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Fausto de Figueiredo: — Sr. Presidente: quem aceita a responsabilidade de assumir as cadeiras do Poder deve ter o bom senso de nem ao do leve sequer desprestigiar o Parlamento e os homens que dêle fazem parte.
Sr. Presidente: a atitude do Sr. Ministro das Finanças, a quem eu sou o primeiro a reconhecer qualidades de inteligência e faculdades do trabalho, neste assunto não é de louvar, pois teve o mau senso de num assunto desta importância e magnitude desejar que as suas propostas sejam discutidas e apreciadas num prazo determinado, dando assim razão às apreciações feitas pelo Sr. Carvalho da Silva.
S. Ex.ª deseja que as suas propostas sejam apreciadas e discutidas pela comissão de finanças num prazo de três dias, tendo chegado a dizer que se assim não fôr solicitará do Parlamento que elas sejam aqui discutidas mesmo sem parecer da comissão de finanças.
O desejo de S. Ex.ª é na verdade uma monstruosidade, de mais a mais num assunto desta natureza.
Sr. Presidente: eu sou dos que entendem que de facto são necessários sacrifícios, dando-se ao Estado aquilo que natural e honestamente se deve dar, mas tratando-se do assunto com inteligência, com reflexão e com muita ponderação.
Nenhum dêstes factores, Sr. Presidente, infelizmente, se pretende adoptar para com as propostas apresentadas pelo Sr. Velhinho Correia actual titular da pasta das Finanças, as quais modificam por completo toda a nossa vida tributária, tocando em assuntos em que o Sr. Ministro da Justiça tem obrigação de intervir e dizer de sua justiça.
A meu ver, Sr. Presidente, não há somente que consultar a comissão de finanças, mas também a comissão de legislação, não sendo, portanto, admissível que assuntos desta importância e desta magnitude se possam apreciar dum momento para o outro.
O Sr. Ministro das Finanças (Velhinho Correia): — Eu já pedi para que fôsse retirado o meu requerimento.
O Orador: — Faz V. Ex.ª muito bem pois assuntos desta natureza e desta magnitude não se devem apreciar de ânimo leve e muito menos sem o parecer da respectiva comissão.
Vozes: — S. Ex.ª já retirou o seu requerimento.
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O Orador: — Eu tenho, Sr. Presidente, muita consideração por todos e muito especialmente pelo, Sr. Almeida Ribeiro; porém, devo dizer que, não tendo sido ainda retirada essa proposta, razão de ser tem as considerações que estou fazendo sôbre o assunto.
Termino dizendo que não se deve estipular o prazo de cinco a seis dias para propostas desta natureza e que se deve contar com todos aqueles que têm de colaborar neste assunto, que na verdade é duma grande magnitude.
Tenho dito.
O orador não reviu.
Foi autorizado o Sr. Ministro das Finanças a retirar a segunda parte do seu requerimento.
O Sr. Presidente: — Peço a atenção da Câmara.
Está aberta uma inscrição sôbre a apresentação das propostas do Sr. Ministro das Finanças.
Parece-me, porém, que, desde que elas foram para a comissão, não têm lugar as considerações que os Srs. Deputados inscritos tencionavam fazer.
O Sr. Carvalho da Silva: — V. Ex.ª dá me licença. Sr. Presidente?
Há seguramente um equívoco da parte de V. Ex.ª Estava em discussão a solução da crise, foi sôbre ela que usou da palavra o Sr. Ministro das Finanças, mandando para a Mesa as suas propostas, mas a discussão continua.
O Sr. António Maia (para interrogar a Mesa): — V. Ex.ª, Sr. Presidente, informa-me se a ordem dos trabalhos não é a mesma que está inscrita na nota que se encontra perto da Presidência?
O Sr. Presidente: — Sim, senhor.
O Orador: — Então parece-me que o debate político não deve ter lugar por já ter terminado.
O Sr. Presidente: — Sôbre as declarações do Sr. Presidente do Ministério inscreveram-se vários Srs. Deputados, sendo o último a falar o Sr. Ministro das Finanças. Na altura em que S. Ex.ª usava da palavraa inscreveu-se ainda o Sr. Ginestal Machado, e depois vários outros, creio que a propósito do discurso do Sr. Ministro.
Por consequência, julgo terminado o debate político.
S. Ex.ª não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: há manifestamente um equívoco da parte de V. Ex.ª, porque, quando se acaba qualquer discussão, V. Ex.ª declara que não há mais ninguém inscrito. Tal afirmação não foi feita, e, portanto, o debate não pode considerar-se terminado.
O Sr. Presidente: — Vou dar a palavra aos Srs. Deputados que se inscreveram sôbre êste assunto.
O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: explicando a solução da crise, o Sr. Presidente do Ministério disse que o Sr. Ministro das Finanças, como de resto é norma parlamentar, apresentaria o seu plano. S. Ex.ª assim fez, e porque desejo responder a algumas das suas afirmações, peço a sua atenção.
Já há pouco tive ocasião de declarar, e o Sr. Ministro das Finanças será o primeiro a fazer-me justiça, que longe de ter qualquer empenho de ser desagradável a S. Ex.ª, pelo contrário, desejaria muito ser-lhe agradável; mas S. Ex.ª, cujas qualidades de inteligência e de trabalho sou o primeiro a reconhecer que noutra pasta poderiam ser úteis ao país, na gerência da pasta das Finanças são tudo quanto há de mais prejudicial aos interêsses nacionais, como até hoje tem sido comprovado duma maneira sem precedentes.
Vozes: — Isso é gastar tempo em palavras inúteis!
O Orador: — V. Ex.ª, sempre que a minoria monárquica trata dalgum assunto importante, declaram que estamos a gastar tempo sem utilidade para o país.
O Sr. Ministro das Finanças, afirmou que no nosso país não se pagava aquilo que se paga em outros países, e nomeadamente citou a contribuição predial de Lisboa.
Vozes: — Isso não é nada; são palavras e só palavras!
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O Orador: — V. Ex.ªs não querem que eu diga o que vou afirmar. Querem impedir-me de o fazer por êsse meio, mas não o conseguem.
Nas propostas do Sr. Ministro das Finanças há entre outras cousas as seguintes:
Leu.
Interrupções.
Não posso continuar sem que haja sossego.
Não querem ouvir; mas hão-de ouvir.
Interrupções.
É de tal ordem a situação do Sr. Ministro das Finanças, que á maioria não quere, de nenhuma maneira, que eu fale para dizer o que são as propostas que S. Ex.ª pretende sejam aprovadas.
Uma das propostas do Sr. Ministro das Finanças é a que se refere à propriedade rústica.
Novas interrupções.
Pausa do orador.
Diz assim:
Leu.
Sabem V. Ex.ªs que modificações se têm feito já em matéria de contribuições, quanto ao rendimento colectável predial o rústico.
Compare-se o que era êsse rendimento colectável em 1910 com o que se pretende que seja hoje.
Vou apresentar um exemplo do que pagava, em média, o proprietário rural em 1910, o do que êle hoje vai pagar pela proposta do Sr. Ministro.
Imaginemos um proprietário rural que em 1910 tinha um rendimento colectável de 3. 000$.
Os que tinham êste rendimento, o Sr. Ministro considera-os como tendo um rendimento colectável de 100. 368$.
Pela proposta do Sr. Ministro das Finanças, terá de pagar nada menos de 31. 377$530(5) por ano, quem em 1910 pagava 658$66, o que significa que a sua contribuição passa a ser 52 vezes maior. Mas o Sr. Ministro das Finanças, não contente com isto, ainda nas suas propostas diz:
Leu.
Não estaremos, pois, longe da verdade dizendo que a lavoura vai pagar, em média, 80 vezes o que pagava em 1910 e que as sociedades anónimas ou por cotas terão do pagar mais de 100 vezes.
É perante um saque desta ordem, feito ao país, que a maioria não julga o assunto importante e não quere ouvir o que se diz dêste lado da Câmara, o único que está a combater sinceramente a permanência nefasta do Sr. Ministro das Finanças naquelas cadeiras.
Disse o Sr. Ministro das Finanças que os outros países pagam mais do que nós. Vou provar-lhe quanto está em branco em tudo o que diz respeito a assuntos tributários e como desconhece por completo o a b c dêstes problemas. Não tem para o seu cargo a mais leve sombra de preparação.
Sussurro.
V. Ex.ªs não querem ouvir porque são verdades o que eu estou dizendo e que muito interessam ao país.
O Sr. Manuel Fragoso: — V. Ex.ª está a abusar da palavra, pois está discutindo um assunto que não está em discussão, e só o Sr. Presidente, por gentileza, lho permite.
V. Ex.ª está fazendo o seu artigo para o Correio da Manhã.
O Orador: — Vejo que V. Ex.ª lê o Correio da Manhã, e reconhece que tenho razão.
O Sr. Manuel Fragoso: — Eu não reconheço nada, eu não disse isso.
O Sr. Presidente: — Peço ao Sr. Manuel Fragoso que não interrompa o orador; V. Ex.ª não está no uso da palavra.
O Sr. Manuel Fragoso: — Se eu fôsse presidente, já tinha retirado a palavra a V. Ex.ª
O Orador: — Já vejo que não posso dar o meu voto a V. Ex.ª quando se propuser a Presidente desta Câmara.
Mas, aproveitando êste intervalo em que os Deputados da maioria parecem querer abafar a minha voz para que o país não conheça as verdades e não saiba o que de monstruosamente inacreditável se encontra nas propostas em discussão, vamos continuar na análise severa do mostrengo...
Sussurro.
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O Orador: — A Câmara continua a não me querer ouvir, mas eu hei-de fazer-me ouvir, embora, como monárquico, reconheça que não há nada que mais aproveite a minha causa do que o desprestígio que a maioria, com a sua atitude, acarreta para o Parlamento.
O que se faz em França, na Bélgica, na Itália e em outros países do mundo é bem diferente do que deseja o Sr. Ministro das Finanças.
Não continuarei falando emquanto o Sr. Ministro das Finanças não se dignar ouvir o que eu digo.
Para a minha causa muito aproveita a atitude do Sr. Ministro das Finanças.
Uma voz: — Qual é a causa de V. Ex.ª?
O Sr. Manuel Fragoso: — É uma causa perdida e já esquecida.
O Orador: — É com profundo desgosto que vejo, ao mesmo tempo, o pais em ruína o a maioria tratando dos assuntos mais importantes sem a menor preocupação, como se fôsse constituída de rapazes de escola.
Que vergonha para um regime que assim está representado!
Trocam-se vários àpartes.
Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª que chame a atenção do Sr. Ministro das Finanças para o que estou dizendo.
O Sr. Presidente: — Chamo a atenção do Sr. Ministro das Finanças.
O Sr. Ministro das Finanças (Velhinho Correia): — Cá estou ouvindo.
O Orador: — Sr. Presidente: dizia eu...
Sussurro.
Dizia eu e já o provei, mas não me querem ouvir, que, não podendo o Sr. Ministro das Finanças sair de forma airosa da situação em que se encontra, procura todas as formas, mesmo as desairosas, para ocultar a situação em que o país se encontra.
Eu hei-de provar que propostas como estas são de tal ordem, que um rapaz das escolas, sem conhecimento das cousas financeiras, não se atreveria a subscrevê-las.
Assira, o Sr. Ministro das Finanças, multiplicando o rendimento colectável da propriedade rústica por 16, vai fazer o confisco da propriedade rústica em Portugal, e S. Ex.ª não sabe o que multiplica por 16.
A prova é que S. Ex.ª na sua proposta, diz que o coeficiente da contribuição predial passa a ser tal, e não sabe que o que está a multiplicar não é o coeficiente da contribuição predial, mas o rendimento colectável.
S. Ex.ª vem apresentar uma proposta desta ordem e não sabe o que se deve multiplicar.
A contribuição incide sôbre vinte vezes o rendimento colectável, e assim S. Ex.ª vai alcançar com a sua proporá os resultados que vou mostrar à Câmara.
Tomemos por exemplo um lavrador que tenha em 1910 certo rendimento e façamos a respectiva operação.
Teremos assim o seguinte:
Leu.
Quere dizer, S. Ex.ª com a sua proposta arranja o modo de êste lavrador ser colectado por uma fortuna de 270. 000$.
Em que cabeça cabe que o Parlamento possa aprovar uma proposta que não é mais que o confisco da propriedade particular!
Vamos a ver, Sr. Presidente, por exemplo, uma herança de um pai para um filho, que em 1910-1911 pagava apenas 2 por cento sobre 60. 000$ ou seja 1. 200$, o que vem a pagar hoje por estas propostas:
Leu.
Terá de pagar, como a Câmara vê, nem mais nem menos do que 169 vezes mais do que pagava em 1910, isto para uma fortuna média, calculada em 60. 000$.
Sr. Presidente: é na verdade uma verdadeira monstruosidade que se pretenda, lançar um imposto desta ordem.
O Sr. Manuel Fragoso: — V. Ex.ª chega à conclusão de que todos os ricos são pobres.
O Orador: — Eu, na verdade, não sei discutir êstes assuntos de ânimo leve, porém, o que eu posso dizer a S. Ex.ª é que um país que tem sido administrado como o nosso, haja vista o grande número
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de funcionários que existiam no Ministério do Trabalho e que existem noutros Ministérios, e o que aconteceu com os pavilhões no Rio de Janeiro, etc., não tem razão alguma para lançar impostos desta ordem, pois não se compreende que se vá arrancar a fortuna dos particulares para sustentar êsse grande número de funcionários que existem.
O Sr. Manuel Fragoso: — As propostas do Sr. Ministro das Finanças começam justamente por tratar dêsse assunto.
O Orador: — O que o Sr. Ministro das Finanças aqui nos disse foi que não desejava tirar os ordenados a êsses funcionários, pois o que se pretendia era criar um stock, foi este mesmo o termo de que se serviu, de funcionários; e assim eu devo dizer que para sustentar um stock de funcionários não há o direito de se ir arrancar a fortuna dos particulares.
Eu compreendo muito bem que S. Ex.ª o Sr. Ministro das Finanças não queira ouvir estas cousas, pois, se ouvisse, não teria outro caminho a seguir senão o de abandonar aquele lugar, onde manifestou a mais completada mais inexcedível das incompetências, apresentando ao Parlamento umas propostas que são uma cousa que se não compreende.
Se bem que a situação dos proprietários urbanos seja aflitiva, como todos sabem, é o Sr. Ministro das Finanças que vem propor ao Parlamento um imposto, que é na verdade uma monstruosidade, que não tem classificação.
Sr. Presidente: passando agora à contribuição industrial, recordarei ter dito o Sr. Ministro das Finanças que lá fora se paga mais do que entre nós.
Está S. Ex.ª completamente enganado quando faz semelhante afirmação, pois a verdade é que em. França o imposto complementar sôbre os lucros é de 10 por cento para o Estado.
Em França a taxa é apenas de 8 por cento e os primeiros 7. 200$ não pagam nenhuma contribuição, o que torna a taxa ainda mais insignificante. Pois, sendo já hoje mais pesada a contribuição no nosso país do que em França e na Bélgica, o Sr. Ministro das Finanças vem lançar sôbre o comércio e sôbre a indústria uma série extraordinária do impostos que, apresentando uma verdadeira monstruosidade, farão com que os preços dos produtos aumentem consideràvelmente. E tudo isto para quê? Para sustentar as clientelas da República e para que a República pague aos seus defensores sem se importar com a situação em que o país se encontra.
Não quero que a Câmara suponha que estou já a discutir desenvolvidamente as propostas do finanças. Não, todavia, não as largarei do mão emquanto o Sr. Ministro das Finanças se sentar naquelas cadeiras, pois que êsse é o meu dever de representante da Nação, tendo muito orgulho em que seja êste o único lado da Câmara que se opõe a essas propostas. Discuti-las hei, se chegarem a ser discutidas, mas, antes da ordem do dia, continuarei sempre a provar o que são para, que a Câmara veja qual é o seu dever.
Tenho dito.
O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos devolver as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Presidente: — Peço a atenção da Câmara.
Nem ontem nem hoje, a propósito da comemoração dos parlamentares falecidos, fiz uma referência especial ao falecimento do Padre António de Oliveira, inspector dos serviços de protecção a menores. Aproveito, pois, esta ocasião para propor à Câmara que seja lançado um voto de sentimento pela morte dêsse benemérito eclesiástico.
O Sr. Ministro da Justiça (Abranches Ferrão): — Sr. Presidente: como Ministro da Justiça e em nome do Govêrno, associo-me ao voto proposto por V. Ex.ª pela morte do Padre António de Oliveira, que era um homem modesto, mas cuja obra, sobretudo pelo seu apostolado, pode bem dizer-se que foi formidável.
Quási que vivia exclusivamente para a obra a que se dedicara e pela qual os poderes constituídos tiveram sempre o máximo carinho.
A morte do Padre António de Oliveira representa uma verdadeira perda nacional e no seu lugar dificilmente êle poderá ser substituído. No emtanto, e esta é a
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melhor homenagem que poderá prestar-se à sua memória, continuarei a empregar todos os meus esfôrços para que a sua obra continue a desenvolver-se, porque ela honra, também, os esfôrços da própria República.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: pedi a palavra para, em nome dêste lado da Câmara, me associar ao voto de sentimento proposto por V. Ex.ª pela morte do Padre Oliveira cuja obra eminentemente social é um testemunho notável, de dedicação e zêlo.
E, pois, de toda a justiça que recordemos a sua memória com respeito e com apreço o rendamos homenagem às suas qualidades e virtudes.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Baptista da Silva: — Sr. Presidente: associo-me ao voto proposto por V. Ex.ª pela morte do Padre Oliveira. Como director da polícia de investigação do Pôrto, desde 1914, eu tive ocasião de ver os esfôrços que êle empregava sempre na regeneração dos menores.
Infelizmente, êsses esfôrços não frutificaram tanto quanto êle desejava, porque os recursos prestados por parte do Estado eram na verdade mesquinhos.
Assim, na Tutoria da Infância do Pôrto, não podem estar internadas mais de 30 a 40 crianças, porque as receitas são insuficientes; e então, sucede que um rapaz que é preso pela primeira vez e enviado à Tutoria fica muito surpreendido quando o mandam em liberdade em vez de o afastarem da vadiagem. Preso a segunda e a terceira vez acontece-lhe o mesmo e está um criminoso feito.
Nestas circunstâncias, lembro ao Sr. Ministro da Justiça que no próximo orçamento do seu Ministério procuro obter maiores dotações para essas casas de protecção à infância, porque só assim se poderá evitar a vadiagem infantil, principalmente em Lisboa e Pôrto. Se assim se não fizer, as Tutorias passarão a ser mais escolas de crime do que de regeneração moral.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Paulo Menano: — Sr. Presidente: pedi a palavra para, em nome dêste lado da Câmara, me associar ao voto de sentimento proposto por V. Ex.ª pela morte do Padre Oliveira, essa extraordinária figura a quem se está prestando homenagem.
Todos nós devemos guardar na nossa alma, como homenagem a êsse prestimoso cidadão, o culto pela sua memória, porque êle bem o merece. Êle foi um bom. Dedicou-se de alma e coração à regeneração de menores, e deu a êsses serviços tudo quanto podia dar da sua extraordinária bondade.
Louvando-me nas palavras do Sr. Baptista da Silva, aproveito o ensejo para dizer que há uma necessidade absoluta de continuar a obra que êle com tanto carinho defendeu, para evitar a propagação do crime que vai aumentando dia a dia.
É preciso que quanto antes se dê o máximo incremento à obra de assistência infantil por que o falecido tanto pugnou, de modo a poder demonstrar-se que o regime ampara todos os valores que carecem dêsse amparo para caminhar com segurança na vida.
E, porque se trata duma homenagem justa e merecida, eu tenho muita honra em me associar a ela, pronunciando algumas palavras do preito e consideração pela memória do ilustre extinto.
O orador não reviu.
O Sr. Carvalho da Silva: — Em nome dêste lado da Câmara, associo-me ao voto de pesar pelo falecimento do padre Oliveira.
O Sr. Dinis da Fonseca: — Em nome da minoria católica, associo-me ao voto de sentimento proposto pela Mesa.
O padre Oliveira foi incontestavelmente uma figura de destaque no nosso meio acanhado e egoista, que deixou atrás de si uma valiosa obra de trabalho em prol da regeneração da infância.
A melhor maneira de prestar à sua memória uma homenagem condigna é, sem dúvida, mantendo e aperfeiçoando essa obra.
Mas o que tem feito o Estado nesse sentido até hoje?
De que espécie de repressão tem lan-
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çado mão para impedir os espectáculos degradantes e desmoralizadores, como, por exemplo, o cinematógrafo?
Ao lado dos estabelecimentos oficiais existem os estabelecimentos particulares. Uns e outros merecem protecção, pôsto que, em meu entender, o Estado deveria de preferência auxiliar os estabelecimentos existentes a criar estabelecimentos novos.
Terminarei dizendo que toda a regeneração que porventura só intente, geral ou particular, será imperfeita e não vingará, havendo apenas dinheiro.
É preciso que ela seja intelectual e moral.
Mas não basta ainda isto.
A regeneração dos menores representa em todos os países que se ocupam dêste problema a intervenção do factor religioso, único de que se tira o ensinamento conveniente.
É absolutamente inútil, impossível, fazer obra profícua, eficaz, sem o factor religioso. É o único necessário e admissível.
Dizendo único, não quero dizer exclusivo. O que digo é que o factor religioso é indispensável. Todo o trabalho de ordem moral e económica, desacompanhado do factor religioso, é imperfeito.
O Govêrno tem de dar liberdade social para que o problema infantil seja eficazmente resolvido.
Não basta dinheiro, é preciso dar liberdade para que o factor religioso, quer no campo moral quer no intelectual, possa produzir efeito na regeneração dos infantes que estão embrenhados no crime.
É isto que espero seja tomado em consideração, pelo Govêrno e duma maneira especial pelo Sr. Ministro da Justiça, de quem chamo a atenção e a cujas boas intenções me apraz prestar o meu preito de homenagem.
O orador não reviu.
O Sr. António Barriga: — Comovidamente me associo à proposta apresentada por V. Ex.ª pela morte do padre Sr. Oliveira, que de longa data conheci dedicando-se à obra de regeneração dos menores.
O padre Oliveira até o seu último momento lutou e pugnou pela sua obra, fazendo sempre por desenvolver a protecção aos menores, procurando regenerá-los e não encarcerá-los em cadeias.
Por todos os motivos é digno da nossa maior consideração e respeito e por isso eu, em meu nome pessoal, me associo a esta homenagem.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Em vista da manifestação da Câmara, considero aprovada a proposta.
Antes de se encerrar a sessão
O Sr. António Correia: — Como não está presente o Sr. Presidente do Ministério e Ministro do Interior, chamo a atenção do Sr. Ministro da Justiça, a fim de S. Ex.ª transmitir as minhas considerações, que são de revolta pelos factos imorais e escandalosos que por êsse país se passam, nomeadamente em Ancião, por causa da eleição municipal, que ultrapassa tudo quanto se praticou no tempo da monarquia. Peral e Azambuja, últimas machadadas no antigo regime, ficam ainda muito longe do que agora se passa, para vergonha dêste Govêrno, que há dezoito meses tem feito o caos neste país e que vive pelo favor das oposições, que têm querido demonstrar que desejam a estabilidade ministerial.
É inacreditável o que se passa em Ancião, no distrito de Leiria, que tem como governador civil um homem que tem recebido as maiores injúrias nos jornais e que não chamou o jornalista a prestar contas.
Sr. Presidente: dizem os jornais que para julgar os casos da eleição do Ancião foi nomeado juiz auditor pessoa que está processada por abusos praticados nessa assemblea.
Pregunto: com que consciência o Sr. Ministro do Interior, consciência que deve ser bem fraca, julga que pode assim manter o prestígio da República em actos eleitorais e garantir os votos aos eleitores?
É vergonhoso o que se passou nessa eleição de Ancião, e tais factos não estão muito longe dos escândalos praticados no tempo da monarquia.
O Sr. Ministro do Interior não leu certamente o relatório que foi feito por pessoa de sua confiança, e, se o leu, ainda,
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apesar disso, mantém como administrador do concelho uma criatura que não devia interferir no processo instaurado.
Interrupção do Sr. Pedro Pita que não foi ouvida.
O Orador: — Por tais factos não admira que amanhã um gatuno seja nomeado para julgar as roubalheiras de qualquer eleição.
Àpartes.
Não desejaria eu, como republicano, que por prestígio da República, apesar dos agravos feitos a nos todos pelo Govêrno, casos dêstes viessem ao Parlamento.
Espero ainda que o bom senso do Sr. Presidente do Ministério faça com que S. Ex.ª ponha termo a esta onda de ilegalidades e escândalos.
Àpartes.
Se o Sr. Presidente do Ministério não queria que no Parlamento uma voz de Deputado se levantasse protestando contra esta ignominia, devia ter escutado a opinião do sen secretário Sr. Pinharanda e apressar-se a demitir, não só o administrador no concelho, mas também o governador civil que foi conivente de tam escandalosa pouca vergonha.
Trata-se dum assunto em que está envolvida a moralidade do regime, e eu prometo não mais me calar a êste respeito, em quanto o Govêrno não der uma satisfação cabal à opinião pública que está justamente alarmada.
O Sr. Ministro da Justiça, que é um homem inteligente e que procura em todos os actos da sua vida pública dar ensinamentos de moralidade, certamente que não permitirá, com a sua aquiescência, que esta situação permaneça por mais tempo.
Conservar como juiz auditor, para julgar determinada eleição, uma pessoa que está incursa em sanções severas do Código Penal, por poucas vergonhas, por traficâncias e por desmandos, é o cúmulo!
Em nome do respeito que devemos a nós próprios e às instituições republicanas, em nome da moralidade pública e da honra do regime, eu peço ao Sr. Ministro da Justiça que chame a atenção do Sr. Presidente do Ministério para o facto que venho do apontar, a fim de que todos nós possamos, neste país, proferir a palavra justiça, como o exigem os nossos sentimentos de republicanos, neste momento feridos e maguados por êste escandaloso acontecimento.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro da Justiça (Abranches Ferrão): — Sr. Presidente: respondendo ao Sr. António Correia, declaro que ao Sr. Presidente do Ministério comunicarei as considerações que S. Ex.ª acaba de fazer.
Visto que o ilustre Deputado se referiu duma maneira geral à acção do Govêrno no tocante a fraudes eleitorais, eu devo dizer que isso de que S. Ex.ª se queixa não é mais nem menos do que a resultante da nossa deficiente educação cívica. São cousas que se passam seja qual fôr o partido que esteja no poder. Só seria justificada a indignação de S. Ex.ª contra o Govêrno, se êste, uma vez conhecedor de quaisquer irregularidades, não procurasse opor-se-lhes. Ora eu, que estou no Govêrno na qualidade de independente, posso, livre de qualquer suspeita de facciosismo, declarar que tenho sempre visto da parte do Sr. Presidente do Ministério todo o cuidado, em não consentir a prática de quaisquer actos que possam constituir um atropelo aos direitos de cada um.
Quando das eleições em Sintra, o Sr. Presidente do Ministério mandou ali um delegado seu fiscalizar o acto eleitoral, visto lhe haverem comunicado que se esperavam certas fraudes. Felizmente não se deram e tudo correu com a maior legalidade.
A vontade do Sr. Presidente do Ministério é tal, para que tudo corra dentro da maior justiça e imparcialidade, que foi S. Ex.ª quem me manifestou todo o desejo em que o juiz de Santa Cruz, que estava na metrópole em gozo de licença e que aqui desejava ficar, voltasse para lá, para que não se dissesse, depois dos casos relatados nesta Câmara pelo Sr. Pedro Pita e por outros Srs. Deputados, passados na Madeira, que o Govêrno não queria que se fizesse justiça.
Quem assim procede, mostra patentemente que quere cumprir bem o seu dever.
Apoiados.
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Quanto ao caso que o Sr. António Correia verberou, de ter sido nomeado juiz auditor um administrador de concelho processado criminalmente, só tenho a dizer que, se não há êrro de informação e as cousas se passam como chegaram ao conhecimento de S. Ex.ª, êsse juiz não ficará no lugar por muito tempo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã à hora regimental, com a seguinte ordem do dia:
Parecer n.º 596, autorizando a Câmara de Chaves a contrair um empréstimo.
Pareceres n.ºs 212, 412, 356-A, 286-A e 294, da ordem que estava dada.
Parecer n.º 302, alterações do contrato da Companhia dos Tabacos.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 35 minutos.
Documentos enviados para a Mesa durante a sessão
Propostas de lei
Do Sr. Ministro das Finanças sôbre remodelação dos serviços públicos e restrição ou proibição de importação de géneros.
Aprovada a urgência.
Para a comissão de finanças, já para o «Diário do Govêrno».
Do mesmo, mantendo para o papel de jornais importado desde 28 de Agosto do corrente ano, a taxa de um décimo de milavo por quilograma.
Aprovada a urgência.
Para a comissão de comércio e indústria, já para o «Diário do Govêrno».
Declarações de voto
Declaro, em nome do Grupo Parlamentar Nacionalista, que aprovámos a admissão da proposta do Sr. Ministro das Finanças, somente, porque não é praxe parlamentar rejeitar a simples admissão dos projectos ou propostas de lei.
Sala das Sessões, 27 de Setembro de 1923. — Cunha Leal.
Para a acta.
Rejeito, por entender que as propostas, na sua parte principal, envolvem matéria inconstitucional e inadequada à solução da crise nacional do momento.
Em 27 de Setembro de 1923. — António Lino Neto.
Para a acta.
Declaro que rejeito, porque a proposta tem matéria que reputo inconstitucional e inadequada à solução da crise nacional de momento, mas aprovaria a admissão de parte dela se porventura oportunamente se tivesse feito a competente separação das matérias.
Sala das Sessões, 27 de Setembro de 1923. — Joaquim Diniz da Fonseca.
Para a acta.
Apesar de lhe parecer discutível a constitucionalidade da admissão desta proposta, aprovo-a, visto entender que é indispensável e urgente, neste momento, dar ao Govêrno os meios necessários para fazer face à grande crise económica e financeira que assoberba o país.
Lisboa, 27 de Setembro de 1923. — Júlio de Abreu.
Para a acta.
Declaro que admiti a proposta do Sr. Velhinho Correia, mas ressalvando o meu juízo sôbre a constitucionalidade de algumas das suas bases e sôbre a proficuidade de grande parte das medidas propostas.
Sala das Sessões da Câmara dos Deputados. — António Pinto Barriga.
Para a acta.
Substituïções
O Grupo Parlamentar Democrático indica o Sr. Amadeu de Vasconcelos para, na comissão de finanças, substituir o Sr. Velhinho Correia durante o impedimento deste. — Pelo Grupo, Almeida Ribeiro.
Para a Secretaria.
Proponho para a comissão de finanças, em substituição do Sr. Joaquim Ribeiro, o Sr. Tôrres Garcia. — Dinis de Carvalho.
Para a Secretaria.
O REDACTOR — Avelino de Almeida.