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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 36

EM 14 DE FEVEREIRO DE 1924

Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da silva

Sumário.— Procede-se à chamada, à qual respondem 46 Srs. Deputados.

Procede-se à leitura da acta. Dá-se conta do expediente, que tem o devido destino.

São admitidas proposições de lei já publicadas no «Diário do Govêrno.

Antes da ordem do dia.— O Sr. Carlos de Vasconcelos refere-se à ausência do Sr. Ministro da Agricultura.

Trata-te também do modo como trabalha a comissão de colónias.

O Sr. Paulo Menano interroga a Mexa.

O Sr. Carlos Olavo pregunta se vêm hoje à Câmara os Srs. Ministros da Instrução e da Guerra. O Sr. Presidente responde.

Entra em discussão a proposta das estradas O Sr. Ministro do Comércio requer a dispensa da leitura do parecer. Aprovado. Usa da palavra o Sr. Plínio Silva, que fica com, a palavra reservada.

Usa da palavra o Sr. Norton de Matos acerca dos serviços de publicidade da provinda de Angola.

O Sr. Presidente nomeia uma deputação para receber o Presidente da República no seu regresso do Pôrto.

Usa da palavra o Sr. Cunha Leal. O Sr. Norton de Matos volta a usar da palavra para explicações.

Aprova-se a acta e expediente sujeito a deliberações.

O Sr. Carvalho da Silva, em negócio urgente, quere tratar do preço e qualidade do pão. É rejeitada a urgência. O Sr. Paulo Cancela de Abreu requere contraprova e invoca o § 2.º do artigo 116.º Rejeitam 80 e aprovam 27 Srs. Deputados.

Ordem do dia.— Continua em discussão a proposta de autorização para sustar medidas de aumento de despesa. Usa da palavra o Sr. Cunha Leal, que fica com a palavra reservada. Seguem se os Srs. Morais de Carvalho, Carvalho da Silva, Paulo Cancela de Abreu, Joaquim Ribeiro, Carvalho da Silva, Ferreira da Mocha, que apresenta

uma proposta substituindo a artigo, em discussão, da autoria do Sr. Almeida Ribeiro. Na admissão da proposta, do Sr. Ferreira da Rocha, o Sr. Paulo Cancela de Abreu requere a contraprova e invoca o § 2.º do artigo 116.º Não há número. Procede-se à chamada.

Respondem os Srs. Deputados.

Admitem 52 e rejeita 1.

Encerrada a sessão.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Um parecer. Substituição na Comissão de Orçamento.

Abertura da sessão às 15 horas e 37 minutos.

Presentes à chamada 46 Srs. Deputados.

Entraram durante a sessão 35 Srs. Deputados.

Srs. Deputados que compareceram à abertura da sessão:

Abílio Correia da Silva Marçal.

Alberto Ferreira Vidal.

Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

Américo da Silva Castro.

Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António Mendonça.

António Pais da Silva Marques.

António Resende.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Augusto Pires do Vale.

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2 Diário da Câmara dos Deputados

Baltasar de Almeida Teixeira.

Carlos Eugénio de Vasconcelos.

Constando dê Oliveira.

Delfim de Araújo Moreira Lopes.

Delfim Costa.

Francisco Pinto da Cunha Leal.

Hermano José de Medeiros.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

João Cardoso Moniz Bacelar.

João de Ornelas da Silva.

Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

José Mendes Nunes Loureiro.

José Mendes Ribeiro Norton de Matos.

José Pedro Ferreira.

Lourenço Correia Gomes.

Lúcio de Campos Martins.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Luís da Costa Amorim.

Manuel Alegre.

Manuel de Brito Camacho.

Manuel Ferreira da Rocha.

Mariano da Rocha Felgueiras.

Paulo da Costa Menano.

Pedro Góis Pita.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Plínio Octávio de Sant’Ana e Silva.

Tomé José de Barros Queiroz.

Ventura Malheiro Reimão.

Vergílio Saque.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Adolfo de Augusto de Oliveira Coutinho.

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Aires de Ornelas e Vasconcelos.

Alberto Lelo Portela.

Álvaro Xavier de Castro.

Amaro Garcia Loureiro.

António Correia.

António Lino Neto.

António de Paiva Gomes.

António Pinto de Meireles Barriga.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.

Bernardo Ferreira de Matos.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

Custódio Martins de Paiva.

Francisco Dinis de Carvalho.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

João José da Conceição Camoesas.

João José Luís Damas.

João Pina de Morais Júnior.

Joaquim Dinis da Fonseca.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José Carvalho dos Santos.

José Cortês dos Santos.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel de Sousa Coutinho.

Mariano Martins.

Mário de Magalhães Infante.

Matias Boleto Ferreira de Mira.

Paulo Cancela de Abreu.

Sebastião de Herédia.

Vergílio da Conceição Costa.

Viriato Gomes da Fonseca.

Vitorino Henriques Godinho.

Srs. Deputados que não compareceram à sessão:

Abílio Marquês Mourão.

Afonso Augusto da Costa.

Albano Augusto de Portugal Durão.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto Jordão Marques da Costa.

Alberto de Moura Pinto.

Alberto da Rocha Saraiva.

Alberto Xavier.

Albino Pinto da Fonseca.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

Aníbal Lúcio de Azevedo.

António Abranches Ferrão.

António Albino Marques de Azevedo.

António Dias.

António Ginestal Machado.

António Maria da Silva.

António de Sousa Maia.

António Vicente Ferreira.

Armando Pereira de Castro Lança.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Artur Brandão.

Augusto Pereira Nobre.

Carlos Cândido Pereira.

Custódio Maldonado de Freitas.

David Augusto Rodrigues.

Domingos Leite Pereira.

Eugénio Rodrigues Aresta.

Fausto Cardoso de Figueiredo.

Feliz de Morais Barreira.

Fernando Augusto Freira.

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Sessão de 14 de Fevereiro de 1924 3

Francisco Coelho do Amaral Reis.

Francisco Cruz.

Francisco da Cunha Rêgo Chaves.

Francisco Manuel Homem Cristo.

Germano José de Amorim.

Jaime Duarte Silva.

Jaime Júlio de Sousa.

Jaime Pires Cansado.

João Baptista da Silva.

João Estêvão Águas.

João Luís Ricardo.

João Pereira Bastos.

João Salema.

João de Sousa Uva.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

João Vitorino Mealha.

Joaquim Brandão.

Joaquim Ribeiro de Carvalho.

Joaquim Serafim de Barros.

Jorge Barros Capinha.

José António de Magalhães.

José Domingues dos Santos.

José Joaquim Gomes de Vilhena.

José Marques Loureiro.

José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.

José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.

José de Oliveira da Costa Gonçalves.

José de Oliveira Salvador.

Júlio Gonçalves.

Júlio Henrique de Abreu.

Juvenal Henrique de Araújo.

Leonardo José Coimbra.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Manuel Duarte.

Manuel de Sousa da Câmara.

Manuel de Sousa Dias Júnior.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Maxímino de Matos.

Nuno Simões.

Paulo Limpo de Lacerda.

Pedro Augusto Pereira de Castro.

Rodrigo José Rodrigues.

Teófilo Maciel Pais Carneiro.

Tomás de Sousa Rosa.

Valentim Guerra.

Vasco Borges.

Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

O Sr. Presidente: — Estão presentes 46 Srs. Deputados.

Está aberta a sessão.

Vai ler-se a acta. Eram 15 horas e 35 minutos.

Leu-se a acta.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Ofícios

O Senado, comunicando a rejeição, da proposta de lei n.° 67, que institui uma comissão parlamentar para apresentar as bases de uma organização dos exércitos de terra e mar, Para a comissão de guerra.

Idem, do n.° 620, que manda aplicar à verba de 100.000$ à reconstrução da parte destruída pelo incêndio no ex-convento de Cheias.

Para a comissão de guerra.

Idem, do n.° 619, que concede seis meses para serem liquidados os despachos, processados nas alfândegas, dos direitos de importação de maquinismos para emprêsas industriais legalmente constituídas.

Para a comissão de finanças.

Da Associação Comercial de Barcelos acompanhando a cópia de um ofício ao Sr. Presidente do Ministério, sôbre a greve do pessoal dos Correios e Telégrafos.

Para a Secretaria.

Do juiz da 2.ª vara de Lisboa, pedindo autorização para depor como testemunha, o Sr. Carlos Olavo.

Recusado.

Telegramas

De lavradores de várias freguesias do concelho de Ovar, protestando contra cobrança do fundo de viação e turismo.

Para a Secretaria.

Dos lavradores dos concelhos de Ovar e Estarreja, protestando contra o imposto de licenças (decreto n.º 9:131),

Para a Secretaria.

Pelas 15 noras e 10 minutos principiou a fazer-se a chamada.

Da Associação Comercial dos Lojistas e da Câmara do Comércio de Lourenço

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4 Diário da Câmara dos Deputados

Marques, pedindo, a aprovação do contrato de empréstimo para Moçambique. Para a Secretaria.

Da polícia de Viana do Castelo, pedindo a aprovação da proposta de melhoria de vencimentos.

Para a Secretaria.

Admissões

São admitidas as seguintes proposições de lei, já publicadas no «Diário do Governo»;

Propostas de lei

Do Sr. Ministro do Comércio, conferindo o título de engenheiro auxiliar aos diplomados com qualquer dos cursos especiais dos institutos industriais ou outros equivalentes.

Para a comissão de instrução especial e técnica.

Dos Srs. Ministros das Finanças e Agricultura, considerando em vigor o artigo 11.° do decreto n.° 9:060, que não permite novos impostos sôbre trigo, centeio e milho.

Para a comissão de agricultura.

Dos Srs. Ministros das Finanças e Marinha, extinguindo o imposto da taxa progressiva sôbre o rendimento das artes de pesca.

Para a comissão de pescarias.

Do Sr. Ministro da Guerra, autorizando o Govêrno a proceder à reorganização geral do exército.

Para a comissão de guerra.

Projecto de lei

Do Sr. Tôrres Garcia, autorizando a Misericórdia de Tentúgal a vender designados prédios.

Para a comissão de administração pública.

O Sr. Presidente: — Vai entrar-se no período de antes da ordem do dia.

Antes da ordem do dia

O Sr. Carlos de Vasconcelos (para explicações}: — Sr. Presidente: na penúltima sessão, no período de antes de se encer-

rar a sessão, e estando presente o Sr. Ministro da Agricultura, pedi a S. Exa. o obséquio de comparecer na Câmara no período de antes da ordem do dia para tratar de um assunto urgente, para o qual já enviei para a Mesa uma nota de interpelação.

Ontem não houve sessão, mas em todo o caso estive cá até ás 5 horas, e não me consta que S. Exa. tivesse vindo ao Parlamento.

Eu não quero dizer que se trate de uma desconsideração ao Poder Legislativo; mas o que é verdade é que não podemos estar à espera indefinidamente que S. Exa. cumpra uma disposição regimental, a fim de eu poder tratar de um assunto que não pode ser protelado.

Aproveito o ensejo de estar no uso da palavra para comunicar a V. Exa. que o trabalho da comissão de colónias é absolutamente inútil e improfícuo, porque não são distribuídos os processos, acontecendo até que o anterior presidente e o actual, parece que por parti pris, ou por sistema, se abstêm de mandar distribuir os processos que estão na comissão.

Nestas condições, peço a V. Exa. que risque o meu nome daquela comissão, para que não tenha responsabilidade da inércia que já dura há dois anos.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Paulo Menano (para interrogar a Mesa): - Desejava que V. Exa. 8 me informasse se não estava marcado para entrar em discussão uma proposta do Sr. Ministro do Comércio e Comunicações com prejuízo dos oradores incritos ou a inscrever.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — V. Exa. tem razão, mas por em quanto não há número para deliberações.

S. Exa. não reviu.

O Sr. Carlos Olavo: — Desejava que V. Exa. me dissesse se os Srs. Ministros da Instrução Pública e da Guerra vêm hoje à Câmara.

O Sr. Presidente: — A Mesa não tem informações a tal respeito.

Pausa.

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O Sr. Presidente: — Vai entrar em discussão a proposta de lei das estradas. É a seguinte:

Senhores Deputados.—Apesar dos esfôrços sucessivamente realizados no Ministério do Comércio e Comunicações depois da publicação do decreto n.° 7:037, de 17 de Setembro de 1920, que criou a Administração Geral das Estradas e Turismo, e o respectivo Fundo, tem de reconhecer-se que a nossa política de estradas não entrou de nenhum modo naquela fase de realizações imediatas que as circunstâncias há muito vêm exigindo.

Publicada em 28 de Novembro de 1921 a lei n.° 1:238, cuja proposta tivéramos a honra de apresentar nesta Câmara, estavam obtidas, com aplauso de todos os interessados, não só as receitas necessárias à execução dos trabalhos, como o regime financeiro que ia permitir assegurar-lhes o preciso desenvolvimento.

Circunstâncias diversas, em que avultam as dificuldades inerentes a um problema desta magnitude, e as precárias condições impostas a todas as grandes realizações pela situação monetária, pela instabilidade política, etc., impediram por largo tempo, o início de uma obra cujos resultados seriam precisamente dos mais próprios para nos levar ao caminho do desafogo económico.

Em 20 de Setembro de 1923, pretendendo sair dêste estado de cousas, o Govêrno publicava o «Regulamento para Cobrança e Arrecadação do Fundo de Viação e Turismo», no qual, actualizando as receitas, foram multiplicadas pelo coeficiente 3 as taxas de licença e do imposto de trânsito, estabelecidas na citada lei.

Realizadas estas receitas, algumas das quais entraram e outras vão entrar brevemente em cobrança, impõe-se-nos dotar o país com uma legislação que permita à Administração Geral das Estradas e Turismo abandonar a limitada acção que tem exercido até agora, e atacar, emfim, o problema da grande reparação e conclusão da rede, com a decisão e a largueza que os interêsses nacionais reclamam.

Embora estejam fixados os meios financeiros e os processos técnicos e administrativos que devem adoptar-se nesta grande tarefa, torna-se necessário definir

os princípios gerais que hão-de norteá-la, imprimir-lhe ordem e método, actualizar e alargar o seu âmbito financeiro, e garantir-lhe todas as facilidades em relação a material e pessoal de modo a assegurar-lhe a máxima eficiência.

Tal é o objectivo da presente proposta de lei.

Começa a proposta por fixar o regime financeiro, muito mais largo que o previsto na lei n.° 1:238, como as circunstâncias do momento o exigem, para a realização dos fins em vista.

No artigo 1.° estabelecem-se as rubricas do Orçamento Geral do Estado que dizem respeito à Administração das Estradas e perfazem um total de 30:000 contos, -dos quais- 20:000 representam o rendimento atribuído às receitas do Fundo de Viação e Turismo e os restantes 10:000 a participação directa do Estado.

A necessidade de retribuir condigna-mente os serviços essenciais dos cantoneiros e cabos, por forma a assegurar a indispensável conservação e polícia das estradas, levou a fixar a dotação da respectiva verba em 6:500 contos, que bastarão se se aprovar o artigo 13.° da proposta. A dotação de estradas municipais devidamente classificadas, que, conglobada com a das outras estradas fora da rede era apenas de 80 contos, será concedida sob a forma de subsídios, na importância anual de 750.000$, em termos de efectivar a realização da rede municipal, impulsionando a iniciativa dos municípios.

A verba preponderante é, porém, a de 22:500 contos, destinada à reparação e construção de estradas a cargo do Estado. No intuito de amplificar ainda o alcance prático de uma tal soma, em acordo com a urgência das obras e com o seu elevado custo quilométrico, estabelece-se o recurso ao crédito por um sistema que, salvas as proporções, é o estabelecido na lei n.° 1:238.

Dêste modo, em cada um dos dez anos a que respeita o plano financeiro, a Administração Geral das Estradas levantará por empréstimo uma soma crescente que junta à referida verba de 22:500 contos, depois de nela descontada a correspondente anuidade da operação, virá perfa-

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6 Diário da Câmara dos Deputados

zer um total disponível de 30:500 contos.

O artigo 3.° prescreve a distribuição desta importância pelas diferentes obras de reparação e construção. Projecta-se a realização dêstes trabalhos em larga escala (artigos 10.° e 11.°) com o recurso a grandes empreitadas de trabalho mecânico de elevado rendimento, distribuindo-as equitativamente por todo o país. Destinam-se 23:000 contos ao custeio de grandes reparações, e 5:000 contos ao rápido acabamento das comunicações, cuja falta mais se faz sentir. Como garantia da eficaz aplicação destas verbas, como segurança de que se abandonará, em relação a elas, o velho e deplorável sistema de pulverização, o artigo 5.° preceitua que não poderão ser despendidas antes de entrar em plena execução o decreto orgânico da Administração Geral, sem que pelo seu Conselho Geral esteja aprovado o plano anual de trabalhos e sem que, de um modo geral, se dó integral execução ao sistema que esta lei estabelece.

Para atender a obras de menor importância, que, sendo úteis, não poderiam incluir-se no sistema das grandes empreitadas e ao mesmo tempo para fazer sentir em todo o país o esfôrço que é preciso realizar, mantém-se a verba de 800 contos para a conclusão de lanços, e inscreve-se a de 1:700 contos para a reparação de pequenos troços.

Ao esquema financeiro, cujas linhas gerais ficam esboçadas, acrescenta a proposta algumas medidas do mesmo carácter, obtendo-se importantes receitas cuja especial consignação é a melhor justificação das providências que se propõem.

No sistema geral dos transportes, as linhas ferroviárias e a rede de estradas são interdependentes e completam-se. Nada mais justo do que solidarizar, portanto, os respectivos interêsses. Com êsse fim se propõe no artigo 6.° a imposição duma percentagem de 3, 2,5 e 2 por cento sôbre os preços das passagens nas diversas classes e de 2 por cento sôbre o custo de transporte de mercadorias em caminhos de ferro. Avaliando em 250:000 contos a receita anual de toda a rede ferroviária, a aplicação da taxa mínima leva a prever uma produtividade de 5:000 contos. A proposta consigna 30 por cento

desta receita à construção e reparação de estradas de acesso às estações ferroviárias, e os restantes 70 por cento ao subsídio pejo Estado, em metade, das obras urgentes de alargamento e melhoramento das gares para facilidades de carga e descarga.

No mesmo artigo são criadas taxas fixas e percentagens sôbre gasolina, óleos de lubrificação, automóveis, pneumáticos e outros pertences que serão cobradas juntamente com os direitos de importação. As receitas a obter dêstes impostos, podendo avaliar-se com segurança em 2:500 contos, consignam-se especialmente ao reforço das verbas atribuídas às estradas de turismo e grande trânsito automóvel, que devam ser construídas ou reparadas com emprego de pavimentos aperfeiçoados.

Para assegurar uma metódica continuidade à execução dum plano de obras em que serão despendidos os importantes recursos que acabam de ser expostos, propõe-se no artigo 9.° a aprovação, a título provisório, do plano de estradas organizado nos termos da lei de 22 de Fevereiro de 1913, o qual se encontra já nesta Câmara, e virá substituir o plano de estradas actualmente em vigor, manifestamente antiquado e sem adaptação às necessidades presentes. Prevê-se, ao mesmo tempo, a revisão, em curto prazo, de que já o novo plano carece, e bem assim a elaboração do plano de estradas municipais, complementar do primeiro, em obediência às disposições vigentes.

É sôbre êste plano geral de estradas que serão lançados anualmente os planos de execução das indispensáveis obras de reparação e construção. Mas tanto para fiscalização dos trabalhos, adjudicados por empreitada, como para execução daqueles que se fizerem directamente, carece a Administração Geral de ter completos os seus quadros de pessoal, obviando assim a um dos inconvenientes que tem sido mais sensível para cabal desempenho das suas funções. É a finalidade do artigo 8.° da proposta.

Finalmente a função nitidamente social da estrada, como factor económico, e o carácter de inadiável urgência que êste problema reveste entre nós levaram

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Sessão de 14 de Fevereiro de 1924 7

a incluir na proposta diversas providências tendentes a facilitar a execução dos trabalhos e a restringir os respectivos encargos, apelando para a colaboração de todos numa questão que a todos interessa.

Não é outra a justificação do artigo 7.°, que institui para as estradas do Estado o regime do imposto de trabalho.

Em idênticos princípios assentam: o artigo 13.°, que fixa a gratuitidade de extracção dos materiais, com ressalva dos prejuízos dos proprietários; o artigo 14.°, que nega o efeito suspensivo ao recurso aos tribunais sôbre expropriações; o artigo 15.º, que manda considerar a valorização dos prédios a expropriar, ou simplesmente confinantes, por efeito da abertura de novas estradas; e o artigo 16.º, que prevê os futuros alargamentos das estrias em acordo com as disposições da moderna legislação estrangeira.

Dalgumas disposições, notavelmente do artigo 5.° da proposta, se concluí o formidável trabalho que se impõe ao Poder Executivo e aos seus órgãos para conseguir que, a partir do começo do próximo ano económico, possam iniciar-se os trabalhos de reparação e construção indispensáveis para acabar definitivamente -uma situação que representa, a par duma ruína, uma vergonha nacional. Lícito é esperar que o Poder Legislativo, fazendo-se eco do clamor unânime da Nação, coloque o Govêrno em condições de atacar com segurança êste grave e momentoso problema, votando com a máxima urgência as providências que dando ao Poder Executivo a possibilidade de o resolver lhe darão também toda a responsabilidade se o deixar sem solução.

Por tudo o exposto temos a honra de submeter à apreciação da Câmara dos Deputados a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.º O produto das receitas cobradas em execução da lei n.° 1:238, de 28 de Novembro de 1921, e decreto n.° 9:131, de 20 de Setembro de 1923, com excepção das que nesses diplomas têm consignação especial aos serviços do Turismo é demarcação de estradas, até a importância anual de 30:000 contos, será

considerado como receita geral do Estado, em compensação das verbas que serão inscritas no Orçamento de despesa do Ministério do Comércio e Comunicações, pela forma seguinte:

[Ver valores da tabela na imagem]

Administração Geral — Despesas diversas

Conservação e polícia de estradas a cargo do Estado

Subsídio à Câmara Municipal de Lisboa para conservação da nova área da cidade

Subsídio à Câmara Municipal do Pôrto para conservação da nova área da cidade

Reparação e construção de estradas a cargo do Estado e serviço de empréstimos

Subsídios para construção e reparação de estradas municipais devidamente classificadas

Art. 2.° Para o fim de intensificar o serviço de reparação e construção da rede das estradas fica o Govêrno autorizado a contrair, de preferência na Caixa Geral de Depósitos, e mediante a criação de títulos de dívida pública, se fôr necessário, um empréstimo da importância de 132:550.000$; levantada em prestações anuais, pela forma seguinte:
[Ver valores da tabela na imagem]

§ 1.° A verba de 22:500.000$ inscrita no artigo anterior desdobrar-se há anualmente em duas, sendo uma igual à soma dos encargos, a pagar no ano económico, dos empréstimos a que se refere êste ar-

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8 Diário da Câmara dos Deputados

tigo e a outra a diferença desta para a totalidade da verba.

§ 2.° Se o juro dêstes empréstimos fOr superior a 7 por cento ao ano, a verba de 22:500.000$, referida no artigo anterior, será acrescida da diferença entre a anuidade de cada empréstimo calculada a 7 por cento ao ano, em trinta semestralidades, e a que houver de ser paga em harmonia com as condições do respectivo contrato.

Art. 3.° A importância de cada prestação do empréstimo, acrescida da parte da verba para reparação e construção que ficar livre depois de satisfeitos os encargos de juros e amortizações a que está adstrita, será aplicada anualmente pela forma seguinte:

[Ver valores da tabela na imagem]

Conclusão de lanços de estradas por pequenas empreitadas e administração

Reparação de pequenos troços de estradas

Grandes trabalhos de construção

Grandes trabalhos de reparação

Art. 4.° As importâncias que constituem -a dotação da Administração Geral das Estradas e Turismo serão entregues a esta em duodécimos.

Art. 5.° O Govêrno não poderá despender qualquer quantia das verbas de 5:000 e 23:000 contos destinadas a grandes trabalhos de construção e reparação, respectivamente, sem ter previamente regulamentado o decreto n.° 7:037, de 17 de Outubro de 1920, e dado integral execução ao disposto no § 2.° do artigo 10.° desta lei.

Art. 6.° São criados os seguintes impostos:

1.° De 3, 2,5 e 2 por cento sôbre o preço das passagens em caminhos de ferro em 1.ª, 2.ª e 3.ª classe, respectivamente;

2.° De 2 por cento sôbre o preço de transporte de mercadorias indicado na respectiva carta de porte;

3.° De $20 por cada quilograma de gasolina;

4.° De $10 por cada quilograma de óleos minerais médios;

5.° De 30$ por cada aro de borracha maciça, com ou sem aro de ferro, para camiões e veículos semelhantes;

6.° De 250$ por cada automóvel, com excepção dos destinados a ambulâncias e ao serviço de incêndios;

7.° De 2 por conto sôbre os direitos de importação de peças separadas, não especificadas, de automóvel, de caixas para automóveis completas ou em peças separadas e de tiras de borracha colada em tecidos para reparação de câmaras de ar e protectores de borracha;

8.° De 10$ por cada câmara de ar;

9.° De 20$ cor cada protector de borracha, com ou sem tecidos, para rodas de veículos.

§ 1.° Do produto dos impostos mencionados nos n.ºs 1.° e 2.°, 30 por cento serão destinados à reparação e construção de estradas de acesso a caminhos do ferro, atribuindo-se o restante ao alargamento e melhoramento de gares, cujas obras serão custeadas pelo Estado e pelas e Companhias ou Administração dos Caminhos de Ferro do Estado, em partes iguais.

§ 2.° O Govêrno poderá, em cooperação com as entidades a que se refere o parágrafo anterior, aplicar os fundos para alargamento e melhoramento de gares ao serviço de empréstimos das quantias necessárias para os mesmos fins.

§ 3.° O produto dos impostos referidos nos n.ºs 3.° a 9.°, que serão cobrados pelas Alfândegas, destinar-se há a reforçar as verbas atribuídas a estradas de turismo que se reparem ou construam com pavimentos aperfeiçoados.

Art. 7.° É aplicável à construção e reparação das estradas do Estado o artigo 17.° da lei de 6 de Junho de 1864, fixando-se em 10 quilómetros a distância a que se refere o § 4.° do mesmo artigo.

Art. 8.° Fica o Govêrno autorizado a preencher as vagas existentes nos quadros do pessoal técnico de obras públicas e do pessoal auxiliar da Administração Geral das Estradas e Turismo, bem como a efectuar as promoções necessárias para completar êstes seus quadros, nos termos da actual organização.

§ 1.° As vagas de apontadores de 2.ª classe e de serventes do serviço externo serão preenchidas por jornaleiros ao abrigo da lei n.° 50, de 15 de Julho de 1913, emquanto os houver.

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Não havendo jornaleiros, os lugares de serventes serão preenchidos por funcionários adidos de igual ou semelhante categoria.

§ 2.° As vagas do pessoal do quadro privativo serão preenchidas por funcionários adidos de igual categoria.

§ 3.° Os serviços de contabilidade, cuja direcção, nos termos do artigo 10.° do decreto com fôrça de lei n.° 7:037, de 17 de Outubro de 1920, pertencerá a um contabilista contratado, serão desempenhados por funcionários da 8.ª Repartição da Direcção Geral da Contabilidade Pública.

Art. 9.° É aprovado provisoriamente o plano geral das estradas de 1.ª e 2.ª ordem do continente da República, organizado em harmonia com as disposições do artigo 1.° e seus parágrafos, e do artigo 8.° da lei de 22 de Fevereiro de 1913, o qual fica fazendo parte integrante desta lei.

§ 1.° Continuam a cargo do Estado as estradas que o estão actualmente mas que ficam fora do plano a que se refere êste artigo.

§ 2.° O Govêrno mandará fazer urgentemente, por forma a estarem ultimadas dentro de dois anos, a revisão do plano aprovado por êste artigo e a elaboração do plano de estradas municipais, nas condições e pela forma prescrita na legislação em vigor, tendo em especial atenção o disposto no § 5.° do artigo 1.° da lei de 22 de Fevereiro de 1913.

Art. 10.° Os grandes trabalhos de reparação serão realizados nos termos do artigo 24.° do decreto n.° 7:037, de 17 de Outubro de 1920, dividindo-se para êsse efeito o país em três zonas, correspondentes às três direcções referidas no artigo 11.° do mesmo decreto.

§ 1.° A Administração Geral das Estradas e Turismo organizará anualmente um plano de reparações a realizar em cada zona, submetendo êsse plano à aprovação do conselho geral da mesma administração.

§ 2.° A organização dos planos anuais de reparações e a sua aprovação superior, a elaboração das condições técnicas, administrativas e financeiras das grandes empreitadas, os concursos e contratos que para os grandes trabalhos de repara-

ção houverem de realizar-se, bem como os empréstimos a que se refere esta lei, deverão estar concluídos e realizados no dia 30 de Junho de cada ano.

Art. 11.° Aos grandes trabalhos de construção são aplicáveis as disposições do artigo anterior, devendo no emtanto dispensar-se a divisão por zonas das respectivas verbas disponíveis, sempre que elas possam ser absorvidas em cada ano por uma única estrada.

Art. 12.° Os subsídios para estradas municipais que u Govêrno concederá pela verba de 750 contos referida no artigo 1.° às câmaras que os solicitarem, serão de importância igual à que estas tiverem inscrito no seu orçamento para as respectivas obras, com exclusão das expropriações, mas não poderão em caso algum exceder 10.000$ anuais por cada lanço.

§ 1.° A entrega às câmaras do subsídio autorizado far-se-há à medida que se forem realizando as obras, não podendo ser entregue de cada vez importância superior a 50 por cento do custo dos trabalhos realizados.

§ 2.° Na distribuição anual dos subsídios terão preferência os lanços dotados no ano anterior. Depois de concluídos os lanços dotados, terão preferência em cada ano os lanços das câmaras que no ano anterior não tenham obtido nenhuma dotação.

Art 13.° Nenhum proprietário de prédios rústicos poderá recusar-se a dar gratuitamente ao Estado as águas disponíveis dos seus prédios e a pedra e as terras que lhe forem requisitadas para a conservação, reparação e construção de estradas, bem como a autorizar gratuitamente as servidões e ocupações temporárias que forem indispensáveis para os mesmos fins. O Estado, porém, iademnizará os proprietários pelos prejuízos que nos respectivos prédios tiver causado a extracção e transporte de pedra e das terras ou a servidão e a ocupação estabelecidas, bem como o custo da extracção e trabalho da pedra que fôr requisitada de qualquer pedreira e já estiver extraída.

§ único. O valor das indemnizações a que se refere êste artigo será fixado por acordo entre o Estado e os proprietários, ou por árbitros, na falta de acordo.

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Art. 14.° Nas expropriações por utilidade pública para a construção e reparação de estradas o recurso aos tribunais, nos termos da lei de 26 de Julho de 1912 e regulamento do 10 de Fevereiro de 1913, não suspende a execução dos trabalhos para que é feita a expropriação.

§ único. Na falta de acordo entre a entidade expropriante e o expropriado, o juiz da comarca, a requerimento daquela, mandará proceder imediatamente a uma vistoria a parcela a expropriar, nomeando dois peritos se o expropriado não quiser nomear nenhum.

Art. 15.° Nenhum pagamento devido por virtude da expropriação será feito sem que na importância definitivamente fixada, como preço dos terrenos expropriados para construção de estradas, seja descontada uma quantia correspondente, ao maior valor que, para o prédio restante, resulta da construção que se efectua.

§ 1.° Os proprietários dos prédios rústicos ou urbanos que não forem expropriados, mas que ficam confinantes com a estrada que se constrói, ficam sujeitos ao pagamento, por uma só vez ou em prestações, de uma quantia correspondente ao maior valor dado ao seu prédio pela construção da estrada.

§ 2.° O cálculo dos maiores valores, a que se refere êste artigo e o parágrafo anterior, será feito em separado no mapa das expropriações dos projectos de estradas, deverão fixar-se definitivamente a sua importância por árbitros, na falta de acordo com o expropriado.

Art. 16.º É proibida a construção de prédios urbanos a uma distância inferior a três metros contados desde a aresta exterior da valeta das estradas nacionais de 1.ª e 2. ordem e seus ramais.

§ único. Dentro da área actual das povoações a construção a uma distância inferior à definida nêste artigo carece do licença especial da Administração Geral das Estradas e Turismo.

Art. 17.° Fica o Govêrno autorizado a regulamentar as disposições desta lei e do decreto n.° 7:037, de 17 de Outubro de 1920, bem como a rever todos os regulamentos respeitantes à viação ordinária, podendo codificar num único diploma todas as disposições a ela respeitantes.

Art. 18.° Fica revogada a legislação em contrário.

Sala das Sessões da Câmara dos Deputados, 12 de Fevereiro de 1924.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca): — Como a proposta tem vários artigos e para os Srs. Deputados terem, dela conhecimento, eu vou mandar para a Mesa alguns exemplares para V. Exas. os compulsarem, e portanto requeiro a dispensa da leitura.

Foi aprovado.

O Sr. Plínio Silva: — Sr. Presidente: o assunto que vou tratar é de tal magnitude que estou certo de que todos os Srs. Deputados me darão a honra de dispensai a sua atenção para as considerações que vou fazer.

Sr. Presidente: creio bem que pela forma como tenho procurado colaborar desde 1919, em que tive a honra de pela primeira vez ser eleito Deputado, por uma forma bem característica mostrei o interêsse que me tem merecido todos os assuntos de caracter económico, e assim eu tenho trabalhado sinceramente na resolução de vários problemas, como são caminhos de ferro, portos e estradas, e ainda sôbre o magno problema dos Transportes Marítimos.

Tudo isto me dá direito a esperar que os meus colegas reconheçam em, mim o melhor desejo de colaborar no problema das estradas, assunto que pela minha profissão me apaixona.

Infelizmente a orientação seguida na pasta do Comércio não tem sido a melhor (Apoiados), pois para essa pasta deviam ser escolhidos técnicos: e não tem acontecido assim.

Pode dizer-se que, depois de 1913, nunca mais até hoje se publicou nada que com isso se parecesse.

Sr. Presidente: eu vejo me obrigado a fazer esta declaração, não constituindo esta um desprimor para ninguém, podendo até afirmar que os meus propósitos são os mais honestos possíveis.

A minha atitude deu origem a que várias pessoas procurassem fazer uma especulação, apontando-me como uma criatura que se negava a colaborar neste problema com o interêsse que seria para desejar.

Eu não vou ler o que disse na sessão

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de 15 de Março de 1921, mas se V. Exas. quiserem dar-se ao trabalho de ver o que eu disse o a resposta que Sr. Ministro do Comércio de então — o mesmo de hoje — me deu, terão ocasião do constatar a razão de ser das minhas afirmações.

Há muita gente que tem imenso interêsse em resolver definitivamente o problema das estradas. Mas por muito grande que seja o interêsse dessas pessoas pela rápida e eficaz solução dêsse problema, êle não é maior do que o meu; será quando muito, igual.

Posto isto, parece-me que estou inteiramente em condições de atacar esta questão.

Foi em 1921, quando Ministro do Comércio o Sr. António da Fonseca, que apareceu uma proposta fazendo entrar em efectivação o imposto de viação e turismo, que era considerado como e ponto fundamental da criação das receitas indispensáveis à manutenção dos encargos resultantes da solução dêste problema.

Acompanhei então o Sr. Ministro do Comércio na discussão dessa proposta. Mas S. Exa. naturalmente aborrecido das minhas observações, respondia invariavelmente que era necessário aprovar a sua proposta.

Não faltou, sobretudo na imprensa, quem, com os melhores propósitos, secundasse os desejos do Sr. Ministro do Comércio, convencido de que o problema da reparação e conservação das estradas ia entrar numa fase efectiva de realizações. Infelizmente, não obstante em 28 de Março de 1921 ter sido promulgada a lei n.° 1:238, nós encontramo-nos presentemente numa situação sensivelmente pior que a do então.

Prova isto que as afirmações produzidas pelo Sr. Ministro do Comércio, insistindo na aprovação da sua proposta, não correspondiam de facto ao que se esperava.

E é de lamentar que tendo sido a cobrança do imposto de trânsito a base estabelecida para a resolução de qualquer operação financeira, esta proposta tinha sido aprovada sem que os indispensáveis regulamentos fôssem estabelecidos.

Passaram-se assim bastantes meses, e o ano passado, quando se discutia a proposta orçamental do Ministério do Comércio, o Sr. António da Fonseca, como Deputa-

do, apresentou novamente uma proposta no sentido de modificar-se a lei n.° 1:238; todavia não estava ainda regulamentada essa lei, e cão obstante aquela proposta ter merecido o «concordo» dos Ministros das Finanças e do Comércio, a Câmara reconheceu que era essencial e indispensável que antes de mais nada se procedesse à regulamentação da lei n.° 1:238, procurando fazer-se a cobrança do imposto nela fixado.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca): — Já estava...

O Orador: — Peço desculpa. Não estava, nessa data. A lei foi regulamentada em 20 de Setembro de 1923. Isto passava-se em Agosto. Foi devido às instâncias empregadas pela Comissão de Obras Públicas e Minas que o Sr. Ministro do Comércio de então se convenceu de que era necessário, regulamentar a lei. Por uma deferência, especial que a Comissão de Obras Públicas e Minas teve para com o Sr. Deputado António da Fonseca, e para acelerar a regulamentação, a Comissão apresentou um projecto de lei para que as taxas da lei n.° 1:238 fossem multiplicadas pelo coeficiente 3.

Pareço que se reconheceu então que era necessário que uma medida saísse do Poder Executivo para modificar as taxas da lei citada, e nesse sentido a comissão de obras públicas e minas apresentou uma proposta de harmonia com êste critério.

Devo dizer que tendo sido encarregado por aquela comissão de estabelecer um acôrdo entre os diversos lados da Câmara, no sentido de realmente só elevarem as taxas, todos se manifestaram no mesmo desejo, discordando, porém, do coeficiente 3, e havendo quem entende-se ser preferível fazer-se urna revisão da tabela do imposto, por isso que para algumas taxas seria exagerado aquele coeficiente, e para outras seria, porventura, diminuto.

Assentou-se então em que se discutisse o projecto, a fim de na sua discussão se alterar a tabela por maneira a ficar estabelecida sob uma base absolutamente equitativa.

Verificou-se, porém, que o regulamento publicado em 20 de Setembro de 1923, pelo Ministro do Comércio de então, ha-

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via modificado completamente as taxas, determinando-se a multiplicação pelo coeficiente 3.

Não compreendo como foi possível ao Poder Executivo alterar de tal forma as tabelas, tanto mais quanto é certo que o Parlamento tinha considerado o problema e reconhecido a necessidade de apresentar um projecto de lei para o resolver.

O que se verifica é que a lei n.° 1:238 de nada serviu e que só em 20 de Setembro de 1923 se publicou o respectivo regulamento.

Não quero atribuir sôbre êste caso nenhuma responsabilidade ao actual Sr. Ministro do Comércio, mas...

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca): — Em vista do que S. Exa. acaba de dizer, parece que, se quisesse, poderia acrescentar mais cousas. {Mas a verdade é que não acrescenta, porque não pode!...

O Orador: — É êsse o meu objectivo.

Tendo eu já manifestado ao Sr. Ministro do Comércio que não obstante os seus bons propósitos e os nossos a lei n.° 1:238 não tinha resolvido o problema, S. Exa. disse que se porventura não fôsse esta instabilidade governativa constante e se S. Exa. tivesse continuado no exercício do seu lugar, imediatamente teria providenciado para que o regulamento fôsse publicado e a cobrança fôsse efectiva.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca): — A lei foi discutida aqui, quando eu fui Ministro do Comércio, lugar que deixei no dia 21 da Maio de 1921. A lei só foi publicada em 28 de Novembro de 1921, e o primeiro regulamento que esta lei teve foi em 20 de Setembro de 1923.

Se S. Exa. juntar ao esquecimento do Poder Executivo, quanto à questão das estradas, a desvalorização da moeda, que não estava nem podia estar prevista na lei, encontra o Sr. Plínio Silva a explicação do facto do seu insucesso.

O Orador: — O que eu constato é que a lei não deu os resultados que se esperavam, devendo declarar também que as leis não podem estar dependentes das

pessoas que se encontram na gerência de certas pastas.

Sei que o Sr. António Fonseca não tem responsabilidades em que os regulamentos não fossem publicados; mas S. Exa. não deve tornar a execução da lei dependente da sua acção própria. E eu não compreendo que as entidades a quem o assunto estava afecto, uma vez publicada a lei n.° 1:238, não tivessem, possivelmente sem interferência do Ministro, providenciado no sentido de essa lei ser regulamentada, secundando assim o interêsse que o Parlamento e o Sr. Ministro do Comércio tinham manifestado

Ai de nós, Sr. Presidente, se o Poder Legislativo está a fazer leis cuja execução se torne dependente das pessoas que gerem a pasta do Comércio!

Apoiados.

Digo isto para afirmar que não se pode de forma alguma atribuir ao Poder Legislativo, como é costume fazer-se por toda a parte, o não andamento dos assuntos de interêsse nacional.

Friso êste ponto não só em meu nome, mas, estou certo, no de todos os meus ilustres colegas dêste lado da Câmara.

Apoiados.

Realmente, não se pode estar constantemente a atribuir culpas e responsabilidades ao Poder Legislativo nem ao Poder Executivo, na solução de certos problemas que nós, todos, procurámos, de facto, solucionar.

Os outros organismos que deixam de secundar a nossa acção é que são os responsáveis, visto que não manifestam às leis o respeito que lhes deviam merecer.

Eu não pretendo incriminar o Sr. Ministro do Comércio de não ter a lei n.° 1:238 produzido efeito, constato apenas o facto. E se as notícias dos jornais são verdadeiras, como creio, e pensando como pensava em 1921, podemos elaborar uma lei que, sem a acção do Sr. António Fonseca na pasta do Comércio, nos conduza aos mesmos resultados ineficazes.

Isto porventura não tem sido encarado pelos titulares da pasta do Comércio no período que decorreu de 1921 até hoje da mesma maneira, e eu peço a atenção da Câmara para o facto de ter havido neste período três aspectos distintos na solução do problema das estradas. E parece-me

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que o Parlamento não pode nem deve desinteressar-se de os conhecer em todos os seus detalhes.

Entendo que esta proposta devia ser cuidadosamente estudada pelas comissões várias e, segundo a minha opinião, a proposta do Sr. Ministro do Comércio não se devia limitar apenas a ser estudada pela comissão de obras públicas e comissão de finanças, mas devia possivelmente ir a outras comissões, como a de legislação civil e outras.

Quero mostrar que realmente houve três critérios distintos neste lapso de tempo, e que o Parlamento não pode deixar de os conhecer em todos os seus detalhes e minúcias.

Sr. Presidente: além do critério do Sr. António Fonseca sob o ponto de vista do organismo que deve exercer estas funções, e que está caracterizado tanto numa como noutra proposta, nós encontramos no parecer n.° 135, sôbre a proposta do lei da autoria dos Srs. Ministros de então, Lima Basto e Portugal Durão, um critério absolutamente diferente.

Tanto o Sr. Ministro do Comércio de então, como o Sr. Portugal Durão, sôbre o organismo que deve exercer essa função essencial, o renunciaram-se num sentido absolutamente contrário ao seguido pelo Sr. António Fonseca.

Ora, costumando eu ser coerente com as minhas afirmações e opiniões, V. Exa. compreende que eu, procurando estudar os assuntos com cuidado, não posso abstrair do parecer que em 7 de Julho de 1922 a comissão de obras públicas e minas elaborou.

Entendo que o Sr. Ministro do Comércio não devia deixar na sua actual proposta de lei de fazer uma referência a êste parecer sôbre a iniciativa dos Srs. Lima Basto e Portugal Durão, e digo isto porque S. Exas., tiveram o cuidado, praticando um acto de justiça, de se referir ao Sr. António Fonseca, dizendo até que desde 1916-1917 para cá foi S. Exa. o único que apresentou uma proposta de lei no sentido de resolver completamente o assunto.

O Sr. António Fonseca conhece muito bem êsse parecer, porque, se a Câmara estudar a proposta de lei actual e o parecer de então, constatará que o artigo 1.° da proposta dos Srs. Lima Basto

e Portugal Durão é palavra por palavra o artigo 9.° da proposta de S. Exa., e além disso os §§ 1.° e 2.° que se seguem ao referido artigo 9.° são na sua essência a doutrina do artigo 2.° daquela proposta.

Vê-se, portanto, que o Sr. António Fonseca conhece muito bem a proposta de lei que então foi apresentada.

E estão V. Exas. na presença, na generalidade, de dois aspectos importantes dêste problema.

Mas, no termo da gerência do Sr. Queiroz Vaz Guedes, o problema apareceu por uma forma diferente também. Eu não vim às sessões nessa ocasião, mas pelo relato dos jornais tive conhecimento que êsse Sr. Ministro encarava o problema das estradas por uma forma completamente diferente das anteriormente apresentadas, o lembro-me que na imprensa algumas pessoas se referiram, até por uma forma ofensiva, debaixo do ponto de vista geral, ao critério de S. Exa.

Sr. Presidente: não conheço êsses documentos.

Creio que o Sr. Queiroz Vaz Guedes quando Ministro disse, em resposta a uma pregunta que lhe foi feita pelo Sr. Cunha Leal, que havia qualquer proposta sôbre estradas e outras havia também em estudo.

Eu creio que deve interessar êste assunto e que êste caso merece estudo.

Apoiados.

Não conheço senão o que vinha nos jornais.

Mas entendo que as comissões se devem pronunciar sôbre êste problema, e não devem deixar do ser facilitados todos os documentos para que realmente o assunto seja encarado sôbre todos os aspectos.

É preciso estudar criteriosamente as propostas apresentadas.

Pelos documentos obtidos na repartição competente, colhi os elementos necessários para estabelecer os cálculos que não há no relatório do Sr. António Fonseca;

De facto, pôsto que nessa proposta o assunto não esteja detalhadamente desenvolvido, era indispensável ter conhecimento não só do número preciso de estradas a reparar e a construir, mas do preço médio das reparações e construções.

Se V. Exa. se der ao cuidado de tomar conhecimento do relatório que precede o

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parecer de 1921, discutido nesta Câmara, e proposta posteriormente apresentada pelos Ministros de então Portugal Durão e Lima Basto, encontra cousas inexplicáveis.

Encontramos diferenças como esta: ao passo que a proposta Portugal Durão e Lima Basto traz o plano detalhado, indicando o número de quilómetros construídos e a construir, se V. Exa. fôr apreciar o relatório do Br. António Fonseca encontra qualquer cousa como 6:600 quilómetros, quando o número de quilómetros a conservar é de 13:404. O Sr. António Fonseca em 1921, quando Ministro, propunha para conservação e polícia de estradas 2:250 contos.

Não compreendo como é que se vão encontrar três verbas completamente distintas!

É interessante fazer a comparação do relatório que precede a proposta do Sr. António Fonseca com a proposta apresentada pelo Sr. Lima Basto.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca) (interrompendo): — V. Exa. na p. 2 do relatório encontra as razões das divergências.

O Orador: — Eu não estou a comparar a proposta de V. Exa. com a de 1921 sem entrar em consideração com a proposta do Sr. Lima Basto; o que eu pregunto é se V. Exa. sabe explicar a diferença entre as três propostas, quando o objectivo é o mesmo.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca) (interrompendo): — Na proposta do Sr. Lima Basto não se faziam alterações, e hoje fazem-se. É que é!

O Orador: — Isso é uma afirmação dogmática.

V. Exa. sabe que o pior é o transporte do material.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações {interrompendo}: — O que eu posso garantir a V. Exa. é que os cálculos estão feitos com todo o rigor, ao contrário do que V. Exa. julga; no entanto, devo dizer que se a pedra tiver de ser paga

pelo sistema actual, natural será que essa verba não chegue.

O Orador: — V. Exa. quer que lhe diga naturalmente se deve ou não pagar a pedra, isso, porém, é com V. Exa., tanto mais que é V. Exa. que tem a obrigação de defender a sua proposta.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu (interrompendo): — O Sr. Ministro do Comércio pretende reparar cinco mil quilómetros de,estradas com pedra que lhe deverá ser entregue por vários particulares.

Isto representa até certo ponto uma violência, conforme eu mais tarde demonstrarei à Câmara; no entanto devo dizer que S. Exa. não poderá contar senão com alguma pedra de alguns particulares da Beira, pois de outros pontos creio que não haverá pedra em quantidade para fornecer o Estado de forma a elo poder mandar reparar cinco mil quilómetros de estradas.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações: — O que é que V. Exa. quere: deseja que eu mande vir a pedra do estrangeiro?

O Sr. Presidente: — Devo prevenir o ilustre Deputado Sr. Plínio Silva que são horas de se passar à ordem do dia, e assim se S. Exa. quer poderá ficar com a palavra reservada para a sessão de amanhã.

O Orador: — Nesse caso peço a V. Exa. o obséquio de me reservar a palavra para a sessão de amanhã.

O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

Os «àpartes» não foram revistos pelos oradores que os fizeram.

O Sr. Presidente: — Está em discussão a acta.

O Sr. Norton de Matos: — Peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Tem V. Exa. a palavra.

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O Sr. Norton de Inatos: — Sr. Presidente: eu li em diversos jornais o extracto da sessão de terça feira, na parte principalmente que se refere ao incidente que foi aqui levantado em virtude dumas palavras proferidas pelo Sr. Cunha Leal, relativamente a uns folhetos do propaganda sObre a província de Angola, e vi num deles, o jornal O Mundo, que aquele Sr. Deputado proferira uma frase, que por qualquer circunstância não chegou aos meus ouvidos na ocasião em que foi proferida, se é que o foi, o daquela maneira.

Eu declarei nessa ocasião o que vou ler à Câmara.

Foram estas as palavras que aqui proferi.

Leu.

O Sr. Cunha Leal respondeu-me nos termos referidos no citado jornal.

Se estas frases tivessem chegado assim aos meus ouvidos, eu teria pedido imediatamente ao Sr. Cunha Leal o favor de as explicar e de as justificar.

Vim ontem à Câmara, mas quando aqui cheguei já a sessão estava encerrada por falta de número, sendo eu também um dos culpados dessa falta de número.

Aqui estou hoje, e tenho de solicitar de V. Exa., Sr. Presidente a subida fineza de pedir ao Sr. Cunha Leal aquelas explicações e a justificação das palavras que pronunciou.

A Câmara não poderá deixar de reconhecer o meu pleno direito neste procedimento.

Apoiados.

E para tomar mais forte êsse direito, visto que também aqui proferi palavras violentas, eu devo ser o primeiro a justificar a violência dessas minhas palavras.

Vou ser muito breve, mas levarei alguns minutos na minha justificação.

Julgou o Alto Comissário de Angola absolutamente necessário montar naquela província um serviço de publicidade o de propaganda, que fizesse chamar a atenção do País e do mundo para aquela colónia portuguesa, que mostrasse claramente o esfôrço da civilização o progresso que a nossa raça ali está tam notavelmente realizando, que atraísse para essa colônia, funcionários, operários e colonos, e que chamasse também os capitais indispensáveis para fomentar as grandes riquezas

latentes naquele importantíssimo domínio português.

Foi presente primeiro ao Conselho do Govêrno e depois ao Conselho Legislativo uma proposta neste sentido, e é assim que no orçamento figura uma verba importante para êsse serviço.

Julgo absolutamente necessárias despesas desta natureza, e tenho a declarar que continuarei a fazê-lo emquanto estiver em situação de poder dar ordens nesse sentido.

Os serviços de propaganda de Angola principiaram em 1921, poucos meses depois da minha chegada à província. Devo confessar à Câmara, como já declarei ao Sr. Ministro das Colónias em documento confidencial, que nesses trabalhos não se seguiu a minha orientação no sou início.

Tomei, por isso, as providências convenientes para organizar êsse serviço e pê-lo segundo a minha orientação como tenho feito a todos os outros serviços da província.

Êsse serviço de informação e publicidade não é secreto, como o têm provado os factos.

São documentos dados à publicidade para figurarem nas contas da província. O facto, até, de êsses documentos estarem nas mãos de qualquer pessoa, mostra que não são documentos secretos, mas sim documentos que estão à vista, para deles, quando necessário. &e prestar contas a quem de direito.

Devo aqui referir que o Alto Comissário de Angola se vê embaraçado para satisfazer o requerimento do Sr. Cancela de Abreu, pois o processo foi roubado, e o ilustre Deputado o que pode fazer é pedi-lo ao Sr. Cunha Leal, visto que S. Exa. já disse que o tinha.

Eu lamento que em serviços públicos apareçam casos escuros como êste, de se roubarem documentos de repartições públicas.

O que acabo de dizer justifica as palavras que no outro dia proferi, num momento de exaltação, mas que não retiro.

Pronunciei as palavras «quadrilha de ladrões», e devo justificar essas palavras.

Os roubos de documentos na província de Angola têm sido muitos, e se alguns, como os actuais, não têm maior importância, outros há que a têm, como são os internacionais, que podem, fazer mal ao

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País, e que são roubados por alto preço, ouvindo eu já dizer, que por um se deram 2õ contos de réis.

De longa data que esta campanha contra o Alto Comissário de Angola está mobilizando enormes capitais.

Não é a primeira vez que isto me acontece em campanhas contra mim, e eu sabia, que se tinham roubado documentos nas repartições de finanças da província de Angola.

Na Agência Geral de Angola deu-se por falta de documentos, e no gabinete do Alto Comissário de Angola e gabinete de trabalho roubaram-se outros, a maior parte deles de carácter particular, muitos dôles de carácter íntimo—cartas de família.

Até do quarto da casa em que habito em Angola me foram roubados documentos, uns mais ou menos do carácter geral de serviço público, mas que eram cartas particulares, que em parto foram lidas nesta Câmara pelo Sr. Cunha Leal.

Em 7 ou 8 de Dezembro do 1917 foi, como a Câmara sabe muito bem, assaltada e roubada a minha casa particular na cidade de Lisboa. Rebuscou-se tudo: correspondência íntima e documentos de determinado carácter público.

Tudo que havia, de mais sagrado, como cartas da minha mocidade, muitas escritas por pessoas de minha família estão nas mãos do quem as roubou, como na mãos de quem roubou estas cartas, uma delas dirigida ao Sr. Brito Camacho.

De mais tenho dito. Os que roubaram êsses documentos fazem grande favor do os publicar, porque deles resultará honra e prestígio para o meu nome, porque do meu nome está neles a minha defesa.

Como é impossível que um homem só possa fazer êstes roubos e em tantos lugares diferentes, por isso proferi as palavras «quadrilha de ladrões».

Está explicada a minha frase violenta, mas justo me parece e merecido que o Sr. Cunha Leal explique as referências ontem aqui feitas, só é que proferiu as palavras que foram publicadas.

Vozes: — Muito bem.

O orador foi muito cumprimentado.

O discurso será publicado na íntegra, revisto pelo orador, quando, nestes termos restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Presidente: — Devendo chegar daqui a meia hora à estação do Rossio, de regresso do Pôrto, o Sr. Presidente da República, nomeio uma deputação composta, além da Mesa, dos Srs. Paulo Menano; Delfim Cosia o Américo Olavo, que irá esperar S. Exa.

Tem a palavra o Sr. Cunha Leal, sôbre a acta.

O Sr. Cunha Leal: — Sr. Presidente: pela muita consideração que tenho pela Câmara, vou explicar as minhas palavras que, aliás, de explicação não carecem.

No meio de um àparte o Sr. Norton de Matos, ilustre Deputado, muito exaltado, referiu-se a uma «quadrilha de gatunos» que roubava cartas, e eu, em resposta, e no mesmo tem, referi-me a uma «quadrilha de ladrões» que rouba a Nação.

O que há a explicar nestas duas afirmações?

O que tenho é de documentar e demonstrar; mas como isso mo levaria longe, eu entendo que é melhor reservar isso para a interpelação que vou realizar e que o Sr. Presidente já teve a gentileza de marcar para quarta-feira.

Então farei a demonstração de que existe, porventura, uma quadrilha de ladrões organizada para roubar a Nação. Mais nada a êste respeito. Mas, Sr. Presidente, como eu gosto sempre de falar claro, e como eu, quando quero atacar alguém, sei pronunciar o nome, das pessoas, não me ocultando nunca atrás de subterfúgios, tenho, para descanso da Câmara, de lhe comunicar que não será ela nem nenhum dos seus membros visados pela minha afirmação.

Q Sr. Norton de Matos aludiu a uma questão que eu também, detalhadamente, tratarei quando fizer a minha interpelação— os gastos com a publicidade feita pela província de Angola.

Li já aqui alguns documentos e sôbre êsses documentos lidos o Sr. Norton de Matos bordou como quis, como entendeu, os seus comentários.

Novas verbas gastas nesta matéria serão por mim comunicadas à Câmara na próxima quarta-feira, mas quanto aos documentos já por mim lidos eu quero dar à Câmara a explicação do motivo da minha atitude.

Aludi a essa questão porque estranhei

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que se fizesse menos a publicidade dos recursos da província de Angola do que a defesa, paga, do seu Alto Comissário.

Documentei nessa ocasião a minha afirmativa, lendo os artigos que correspondem aos números exibidos.

Agora para não estar a repetir tudo, o que seria maçar a Câmara, eu vou ler apenas alguns dos artigos para que a Câmara veja se é honesto que a província de Angola os tenha pago.

Vieram em dois números do jornal O Mundo, e num telegrama publicado no mesmo jornal.

Pregunto à consciência da Câmara se não estranha que todos êstes louvores tivessem custado à província de Angola a verba de 7.560$!

Em verdade parece-me que tudo isto ao que pode importar não é à propaganda dos recursos de Angola, ao fim de atrair colonos, à propaganda destinada a evitar a saída do braços, à propaganda com o fim de atrair capitais para uma terra portuguesa.

O que eu li não foi para censurar ninguém, senão, talvez, o jornal que pedia, para reclamar uma tam alta figura como o Sr. Norton de Matos, tanto dinheiro para êsse fim.

Foi a única cousa que eu então afirmei, mas que na próxima quarta-feira me proponho demonstrar com todo o desenvolvimento.

V. Exas. hão-de então ver que há ladrões de vária espécie e, entre êles, os que fazem desaparecer das repartições públicas documentos que podiam incomodar certas personalidades.

Trago, fornecido gentilmente pelos próprios que fizeram o relatório, algumas cópias dêste, e V. Exas. terão a curiosidade natural de mo enviar para que eu justifique as minhas afirmações e para que eu possa dizer, de facto, que, sem acusar nenhum dos membros que compõem a Câmara dos Deputados, existe porventura em qualquer parto do território português uma quadrilha do ladrões, quadrilha de ladrões que, segundo a afirmação do Sr. Norton de Matos, foi de qualquer forma desmascarada por uma outra quadrilha de ladrões de documentos.

Mas os ladrões da quadrilha que rouba documentos para identificar outros ladrões têm uma atenuante para o seu próprio

acto, o atenuante tam grande que até foi reconhecida pelo Sr. Afonso Costa, quando, ainda na vigência da monarquia, se serviu no Parlamento do uma carta particular, carta de carácter particularíssimo, embora absolutamente inofensiva, como arma tremenda contra o regime monárquico.

O Sr. Afonso Costa julgou desmascarar certas personalidades envolvidas numa negociata, e eu, a quem foram facultados determinados documentos, julgo do meu dever utilizá-los para desmascarar uma quadrilha de ladrões.

Que querem V. Exas. que eu faça?

Que os deite fora?

Que os não leia para não manchar a minha vista com tal leitura, e continuarem os quadrilheiros a roubar à vontade?

Usei dos documentos e hei-de usar dê-los como puder, souber e entender, honrando-me mesmo por me servir deles.

Não sei se há quem pague documentos por 25.000$, mas o que eu garanto é que não produzirei uma única afirmação que não possa provar.

E assim, nunca direi que qualquer cousa foi paga por 25.000$ senão quando tiver a prova na minha mão.

Nunca me servirei de calúnias. O que puder documentar, documentarei. Analisarei os relatórios, alguns dos quais desapareceram do Ministério das Colónias, e servir-me-hei da minha inteligência, pouca que seja, para tirar conclusões sôbre a maneira como têm sido administradas as nossas províncias ultramarinas. E são os relatórios oficiais que hão-de servir de justificação das minhas palavras. Servir-me-hei, sim, de documentos roubados, ou não, quando tratar de desmascarar quem quer que seja.

Aos outros direi que quando me acusarem, se sirvam também de documentos, roubados ou não, para provar as suas afirmações.

Tenho dito.

Apoiados.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestas condições, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Norton de Matos: — Sr. Presidente: declarou o Sr. Cunha Leal que as palavras que proferiu na sessão de terça-

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18 Diário da Câmara dos Deputados

-feira passada não se referiam a nenhum dos membros desta casa do Parlamento. Isso me basta; de resto, fui eu o primeiro a pedir há pouco, como outrora, em tempos bem tristes, que todos os documentos qu me dissessem respeito fossem publicados.

Vozes: — Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — As declarações feitas pelos dois ilustres Deputados figurarão na acta e, portanto, julgo liquidado o incidente.

S. Exa. não reviu.

Nesta altura, foi posta a acta à votação, sendo aprovada.

O Sr. Presidente: — Chamo a atenção da Câmara.

O Sr. Carvalho da Silva deseja ocupar-se, em negócio urgente, do preço e qualidade do pão que vem sendo vendido ao consumidor. Vou, pois, consultar a Câmara sôbre se reconhece a urgência pedida.

O Sr. Carlos de Vasconcelos (para interrogar a Mesa): — Para poder votar com consciência, pregunto a V. Exa., Sr. Presidente, se o Sr. Ministro da Agricultura, que é a única pessoa competente para dar explicações sôbre o assunto, se encontra no edifício do Congresso.

O Sr. Carvalho da Silva (para explicações): — Tratar-se de assuntos urgentes sem a presença dos Srs. Ministros a quem êles respeitam tem-se feito já por mais de uma vez. Ainda não há muitos dias que isso só passou com um negócio urgente apresentado pelo Sr. Vasco Borges. Não me oponho, porém, a que seja convidado o Sr. Ministro da Agricultura a assistir às minhas considerações.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Em resposta à pregunta formulada pelo Sr. Carlos de Vasconcelos, tenho a informar S. Exa. que o Sr. Ministro da Agricultura não se acha presente no edifício do Congresso. Informo também que nenhum dos Srs. Ministros presentes está habilitado a

dar esclarecimentos precisos sôbre a questão de que o Sr. Carvalho da Silva se deseja ocupar-

S. Exa. não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: — Há mês e meio que quero tratar da questão do pão, e não há forma de o fazer!

O orador não reviu.

Consultada a Câmara sôbre a urgência, foi esta rejeitada.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova.

O Sr. Carvalho da Silva: — A questão do pão é o maior escândalo da República! É a moagem quem manda!

O orador não reviu.

O Sr. Carlos Olavo: — Escândalo é palavra monárquica! Não existe na República!

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: — Escândalo, escândalo!

O orador não reviu.

O Sr. Jorge Nunes: — Estão muito contentes com o pão!

O orador não reviu.

Trocam-se vários apartes.

Procedeu-se à contraprova.

O Sr. Presidente: — Rejeitaram 30 Srs. Deputados e aprovaram 27.

OEDEM DO DIA

Continua a discutir-se o parecer n.° 649 (autorização ao Governo para suster medidas que importem aumento de despesa).

O Sr. Cunha Leal: — Sr. Presidente: na última sessão estava concluindo as minhas considerações relativas ao artigo apresentado pelo Sr. Almeida Ribeiro, e dizia eu que essa proposta, visando apenas à forma de aplicar parte da circulação fiduciária, não podia de forma alguma dar o efeito que se pretendia.

Eu quero ainda frisar que os quatro decretos que vêm alterar a situação estabelecida foram publicados com uma precipitação notável, e o mais que podem fazer é irritar as boas normas do direito, e

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Sessão de 14 de Fevereiro de 1924 19

que o seu fim se poderia conseguir por outra forma, que o Sr. Ministro das Finanças não quis.

A redução dos juros do empréstimo de 6 1/2 por cento podia-se alcançar por outros meios, mas o Govêrno não meditou muito no que fez.

O empréstimo foi de 4 milhões de libras.

Com a redução o Estado vai poupar 630 contos.

Acredita o Sr. Ministro das Finanças na melhoria do câmbio?

Se assim é, porque arrepiou a consciência da Nação para conseguir já uma receita que será de 630 contos, que é muito dinheiro, mas que não é nada para o crédito nacional?

Acreditando o Sr. Ministro das Finanças na melhoria do câmbio, tinha maneira diferente de conseguir o mesmo resultado, como vou dizer.

Bastava lançar mais títulos na praça, o não seria necessário grande quantidade para promover a queda do papel.

Baixando o papel o Govêrno declarava que tomava os títulos à cotação da média da última semana.

Poucos títulos teria de trocar, e o juro seria ainda remunerador.

Simplesmente, se a, questão fôsse conduzida por outra forma, ninguém seria prejudicado, nem afectado o crédito nacional.

Por esta forma gritante, eu cuido que o Sr. Ministro das Finanças colhe muito menos resultados e alarma a consciência da Nação.

Não merece a pena continuar a alongar-me em considerações sobreposta matéria, porque eu tenho a impressão de que estamos num daqueles estados do espírito ao qual se pode aplicar aquela velha frase de «deixar correr o marfim». Ninguém se importa absolutamente com cousa nenhuma.

Creio que não mereço realmente a pena estai a perder o meu latim, não com ruins defuntos, porque V. Exas. são excelentíssimos vivos, mas porque parece terem os ouvidos tapados e não só incomodam com argumentos.

Eu creio que o Sr. Presidente do Ministério já pôs a questão do confiança na reunião da maioria, e, portanto, todas as minhas palavras são perdidas.

Cumpram-se os fados, mas não sem o meu protesto, e como êle é insuficiente para obrigar o Sr. Ministro das Finanças a arrepiar caminho, eu só tenho de cumprimentar S. Exa. e de lho desejar que não tire maus resultados da sua tam apressada legislação.

Faço isto, não para que o Sr. Presidente do Ministério me agradeça, mas para que, se da sua obra resultar alguma melhoria, eu como republicano e português me possa regozijar com isso.

Estão assim terminadas as minhas considerações.

Não tornarei a falar sôbre o assunto, e oxalá que de todas estas aventuras o País alguns resultados haja de colhêr.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: o artigo novo enviado para a Mesa pelo Sr. Almeida Ribeiro, impondo certas penas do Código Penal aos membros do Poder Executivo, quando ponham em circulação notas um número superior ao limite legal parece-me não ter cabimento numa proposta de autorização dada pelo Poder Legislativo ao Executivo para cortar as despesas do Estado.

Sr. Presidente: embora eu não acredite na eficácia das sanções propostas pelo ilustre leader da maioria, não serei eu também quem se proponha a combatê-la, quando o uso que o Sr. Presidente do Ministério acaba, de fazer da autorização anterior foi absolutamente inconstitucional, uso que se consentira nos quatro espantosos decretos publicados no Diário do Govêrno do dia 13 dêste mês.

Nossa outra autorização, o Parlamento tinha dito ao Poder Executivo que podia tomar aquelas medidas que directamente pudessem influir na situação cambial. E vai então o Sr. Presidente do Ministério, à sombra desta autorização, fez publicar no Diário do Govêrno quatro espantosos decretos, um dos quais é a declaração da bancarrota feita pelo Govêrno.

Porque, se vêm cercear os juros nos portadores dos títulos e não se esperou pela melhoria?

Por isso dizia eu que bem fazia o leader da maioria pondo restrições a uma autorização por forma que o Govêrno não pudesse saltar fora dela.

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O Govêrno ficou autorizado a tomar as providências que directamente visassem à melhoria cambial, e à sombra dessa autorização vai dar poderes ao Sr. Ministro do Interior para mandar para fora do território português todo aquele que ao citado Ministro se afigure que está fazendo especulação cambial.

Parece que foi o destino que fez com que esta lei viesse aqui em 13 de Fevereiro, mas esta pior do que a do 13 de Fevereiro, porque a outra da mesma data atirava para fora do reino os anarquistas, mas que tivessem sido condenados pelo Poder Judicial, e nesta não é necessário nenhuma decisão do Poder Judicial: basta a vontade suprema do Ministro do Interior!

Sr. Presidente: se uma disposição de igual natureza fôsse já lei do País no tempo em que o Govêrno da presidência do Sr. António Maria da Silva fez os aumentos ilegais de circulação fiduciária que aqui foram verberados, e designadamente por êste lado da Câmara, os autores dêsses aumentos ilegais de circulação estariam incursos na disposição desta lei, que o Sr. Almeida Ribeiro propõe que se vote agora.

Sr. Presidente: mas de que nos valem na realidade toda a boa vontade, toda a intenção benemerente do Sr. Almeida Ribeiro para acautelar os interêsses do Estado e para tratar de impedir o aumento ilegal da circulação fiduciária, para tentar impedir que se criem mais notas além daquelas que estão autorizadas por lei? Pois não poderá amanhã, novamente, o Govêrno, dizendo-se no uso de qualquer das autorizações concedidas ou à sombra de qualquer outra autorização que lhe lembro vir pedir ao Poder Legislativo e que êste generosamente lhe concederá, não poderá então o Govêrno, repito, decretar, embora contra a lei expressa da autorização, qualquer disposição autorizando-se a si próprio a aumentar a circulação fiduciária?

Pois não vemos nós que por fôrça da lei votada nesta Câmara em Novembro do ano passado, isto é há cêrca de três meses, era o Govêrno obrigado a reduzir de um têrço até Junho de 1924 o aumento de circulação então autorizado e a acabar com êle por completo até Julho de 1925, e que não obstante o Govêr-

no por um simples decreto se desembaraçou dessa obrigação que lhe havia sido imposta pelo Poder Legislativo, e de facto tornou a circulação das notas superior àquela que o Poder Legislativo queria que fôsse?

De que nos serve, portanto, esta disposição proposta pelo Sr. Almeida Ribeiro a cujos generosos, a cujos morais intuitos presto homenagem, mas que será letra morta perante um Govêrno que tenha da responsabilidade dos seus actos e dos melindres da situação na mesma opinião que a que tem aquele que se senta nas cadeiras do Poder?

De que serve, pois, essa disposição, quando vemos que as autorizações que o Poder Legislativo pretende limitar, que a autorização que lhe foi concedida há cêrca de quinze dias, determinando expressamente que o Govêrno só poderia decretar aquelas providências que directamente se prendessem com a especulação cambial, servem ao Govêrno de pretexto para publicar os quatro espantosos decretos, um dos quais, como há pouco disse, dá ao Ministro do Interior o direito de mandar residir em Timor qualquer indivíduo sem qualquer espécie de julgamento, por sumário que seja, desde que se lhe afigure que êsse determinado indivíduo faz especulação cambial?

Sr. Presidente: é realmente triste, é realmente desolador para portugueses terem de chegar à conclusão que ditou as últimas palavras do discurso do Sr. Cunha Leal.

A sensibilidade do País, a sensibilidade pública encontra-se combalida, tantos têm sido os atropelos à lei, tantos têm sido os escândalos que não há acto nenhum por mais violento que seja, por mais ofensivo das normas que o Poder Legislativo ditou, não há nenhum acto, repito, que consiga comover a consciência nacional, que consiga impressionar êste povo, que parece que já morreu, que com cousa alguma se indigna, que com cousa alguma se exalta.

Sr. Presidente: vote a Câmara, se assim o entender, a nova proposta do artigo novo enviada para a Mesa pelo Sr. Almeida Ribeiro, mas, tenho a certeza, certeza que pelo menos para mim existe, porque a triste realidade dos factos isso mo impõe, que nem o papão da cadeia,

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nem o papão dos artigos do Código Penal que o Sr. Almeida Ribeiro invoca no seu. artigo novo, nem isso será bastante para evitar novos aumentos de circulação fiduciária, nem isso será inibitório de se continuar seguindo êste caminho que só não nos leva à bancarrota porque ela já existe, segundo as declarações do relatório de um dos decretos publicados há dias.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: como podemos nós discutir um pedido de autorização do Sr. Presidente do Ministério, se S. Exa. não está presente?

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca): — Já me declarei habilitado a responder a êsse assunto.

O Orador: — Ainda bem que o Sr. Ministro do Comércio se considera habilitado a responder a esta questão, para que S. Exa. me diga se, quando há dias se discutia a autorização para o Govêrno legislar sôbre assuntos que dissessem respeito a câmbios, se poderia entender que o Govêrno interpretaria essa autorização para legislar pela forma como legislou nos quatro decretos, um dos quais veio declarar ao Puís a bancarrota a que a República o levou.

Porque a verdade é esta.

O Govêrno veio declarar a bancarrota faltando aos compromissos que tomou com os portadores do novo Fundo Consolidado, e não quero ao discutir êste artigo estar a ocupar-me da situação em que fica a maioria desta Câmara, cuja responsabilidade tremenda, quando da apresentação e discussão do empréstimo rácico aqui afirmava ao País que estávamos em circunstâncias maravilhosas, que o Estado havia de pagar sempre aos portadores dos títulos os encargos que se comprometera a pagar.

Só falta ver que a maioria desta Câmara se julgue com a autoridade para condenar a oposição dêste lado da Câmara, pois que perdeu a mais leve sombra de

autoridade para apreciar os actos dêste lado da Câmara.

A República levou o País à bancarrota, porque não pode ser outro o fim de uma série de desregramentos de administração que há anos se vêm fazendo.

Apoiados.

Mas quero circunscrever-me ao assunto em discussão e chamar a atenção da maioria contra o alargamento da circulação fiduciária, que outra cousa não trará um dos decretos do Sr. Ministro das Finanças.

A proposta do Sr. Almeida Ribeiro de modo nenhum vai restringir a faculdade 3 de o Govêrno aumentar a circulação fiduciária.

Pela convenção de 29 de Dezembro de 1922, que foi levada a efeito com o Banco de Portugal, era absolutamente legal o banco poder emprestar ao Govêrno us quantias em escudos correspondentes às cambiais que entravam para constituir fundos de reserva.

Pelo decreto n.° 9:425, artigo 1.°, sucede que o Govêrno levantará as cambiais, mas não fica obrigado a repor os escudos que tinha recebido do banco, de forma que, sem determinação clara, o Govêrno tem maneira de aumentar, se quiser, a circulação fiduciária e sem que a proposta do Sr. Almeida Ribeiro vá constituir um travão para êsse aumento de circulação fiduciária.

O Govêrno diz que aumenta a circulação fiduciária, mas fá-lo à sombra da lei e continua lançando notas.

Os esclarecimentos referentes ao facto são publicados no fim de cada ano, e os Governos alargam a circulação fiduciária como querem, como entendem, o sem que o País tenha o direito de saber qual é o estado da circulação fiduciária; mas o País é uma entidade que não marca e a República, para se agüentar mais algum tempo, não hesita em o levar à bancarrota. E continua num caminho de descalabro, até que um dia o País, acordando desta situação, se levanto e mostre aos homens que se sentam naquelas cadeiras, mostre a êste regime implantado em 5 de Outubro de 1910, para nossa infelicidade (Não apoiados), que não está disposto a continuar nesta administração perdulária, que o leva à ruína e à desgraça.

Não apoiados.

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A maioria da Câmara anda lá fora dizendo às comissões políticas que não quero o alargamento da circulação fiduciária mas eu direi, e é preciso que as comissões políticas o saibam, que a maioria vai votar uma autorização para um alargamento de circulação fiduciária que agravará o custo da vida, levando o País a uma situação de que não poderá sair.

Vários apartes.

O Sr. Carlos de Vasconcelos: — V. Exa. com as suas palavras não faz senão mal ao País.

Vários àpartes.

Vozes: — Ordem, ordem.

O Orador: — A permanência do Govêrno naquelas cadeiras representa um verdadeiro ultrage ao Parlamento...

O Sr. Carlos de Vasconcelos: — Isso é prestar um bom serviço ao País!

O Orador: — Verdadeiros serviços ao País presta quem o não engana.

Êste lado da Câmara orgulha-se cada vez mais em pertencer a uma causa cujos partidários, acusados de traidores, têm sido obrigados a andar pelo exílio porque não quiseram compartilhar a responsabilidade da bancarrota a que os Srs. levaram o País.

Termino, Sr. Presidente, lembrando novamente a Câmara que o que se vai votar não passa, mau grado o artigo novo do Sr. Almeida Ribeiro, de uma autorização para o Govêrno alargar ilimitadamente a circulação fiduciária.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Os àpartes não foram revistos pelos oradores que os fizeram.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Sr. Presidente: vou ser breve porque a Câmara deve estar já detidamente esclarecida pelas posições, que não pela maioria, cujo Parlamento se transferiu para o Ministério do Interior. Da maioria aqui só há autómatos votantes.

A discussão é para o Ministério do Interior, onde à porta fechada lhes é fácil fazer afirmações que não se atrevem a dizer aqui. Mas era aqui nesta casa do

Parlamento para que todo o País ouvisse que essas afirmações se deviam fazer...

O Sr. Carlos Olavo: — Isso é o que V. Exas. queriam.

O Sr. Carvalho da Silva: — Isso é o que devia ser. Não querem dar contas ao País porque estão tratando de o liquidar.

O Orador: — A situação é esta: um Govêrno que não faz caso do Parlamento e um Parlamento que não faz caso de si próprio.

Mas o que o País precisa de saber é a razão que leva a maioria a sancionar os actos do Govêrno.

Fazem parte dessa maioria jurisconsultos distintíssimos, e eu muito gostaria que êles me, dissessem se à sombra de uma autorização para regulamentar os câmbios se podem modificar fundamentalmente os estatutos de uma instituição bancária, e, ainda, em que lei se baleia o Govêrno para expulsar do País, sem processo, os indivíduos que especulam com câmbios.

As medidas bolchevistas do Govêrno favorecem, mais do que quaisquer outros factores, a especulação cambial. È de tal forma que eu pregunto se a primeira pessoa a quem devia ser aplicada a pena de expulsão é, ou não, o Sr. Álvaro de Castro.

É também de 13 de fevereiro êsse decreto, e eu pregunto se êle merece comparação com a famosa lei da mesma data que tanto indignou os republicanos.

Então o Govêrno julga, porque tem a seu lado a imprensa da moagem, que pode contar com o apoio do País?

Então o Govêrno julga que é essa a imprensa que traduz a opinião do país.

Então é zelar os interêsses do estado atropelar as ideias

áfe^p é zelar ps 4etQrêsses 4pE^taclp ,9,trppelar as-lei^ e PS pripcípips íjindamen-tais 4as 4i?.P09iÇ9es 408 'Rftpsps códigps ?

ú-Untao 4efQR4e.F W •iote.r^gsgs. dp $s-.ta4p é faze,r ecpgpmia^.^ ap mes^mp tempp a^s veçjjas para a ins,peç5|lp ^os vários quadrpsí1 ' •

^E mpral q«e p pr^prip ^autpr 40 4e.-,cr6,tp se intradorza assim .jip çpngejjjp fiscal 4p Pancp de JPqrtugal?

Sr. Presidente: parece-me que p Jíftíg 4eye estar cpnvçncidp 4^ que a sua situa-çãp se re^plve tinicamente com largag medida^ de fomentp.acqn^panfcadas 4e efica-z^s .çedu^ões 4e. plespesaa.

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Qi4rlf> fo Cjfewwa faf Deputadot

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Sessão de 14 de fevereiro de 1924 23

Quais foram as medidas de fomento até agora apresentadas pelo Govêrno?

Apenas uma proposta sôbre estradas e essa mesma eu demonstrarei a V. Exas. o que representa.

Disse o ilustre Deputado Sr. Barros Queiroz, republicano honrado a quem prestamos justiça, que as medidas do Govêrno eram de bolchevismo puro, e que o seu procedimento é análogo ao do Govêrno dos soviets para com os Bancos russos.

Chamar, portanto, bolchevista a êste Govêrno e bolchevistas às suas medidas é estar em boa companhia, até de Deputados republicanos.

Evidentemente que é preciso reduzir despesas, mas estas não se reduzem suprimindo comarcas e o contencioso administrativo. Não se reduzem despesas vendendo umas parelhas de cavalos que o Sr. Presidente da República ofereceu, ou uma fábrica de electricidade.

A primeira economia que se impunha era a de invalidar os célebres trinta suplementos ao Diário do Govêrno de 10 de Maio de 1919.

O Sr. Joaquim Ribeiro: — V. Exa. esquece-se do que fez a traulitânia!...

O Orador: — V. Exa. demonstra isso e depois discutiremos.

O Sr. Joaquim Ribeiro: — O Conselho Superior de Finanças declarou que os prejuízos causados pela traulitânia foram superiores a 1:000 contos.

O Orador: — O que os monárquicos nunca fizeram foi faltar aos compromissos que tomaram perante o País.

O Sr. Carvalho da Silva: — Apoiado.

Quando é que a monarquia pediu dinheiro emprestado em determinadas condições e depois faltou ao estipulado?

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António da Fonseca) (interrompendo): — A monarquia fez pior, porque chegou até a suspender os pagamentos.

V. Exas. conhecem mal a história da vida pública.

Apoiados.

Ordem! Ordem!

O Sr. Carlos Olavo: — Sr. Presidente: V. Exa. não deve permitir que o Sr. Cancela de Abreu esteja a falar sôbre um assunto que não está em discussão!

O Sr. Presidente: — V. Exa. já ontem chamou a minha atenção para os oradores que falam largamente em assuntos que não estão na ordem da discussão. Eu devo dizer que quem está neste lugar deve garantir a liberdade de discussão. Se o Sr. Deputado se ocupasse de assuntos, manifestamente impertinentes, o moa dever era intervir, mas vejo que se ocupou de assuntos que se relacionam com a discussão. Posto isto, eu desejo que V. Exas. me reconheçam o direito de interpretar o Regimento.

O Sr. Carlos Olavo (para explicações): — Ninguém mais do que eu faz justiça à isenção com que V. Exa. preside aos trabalhos, o que não quere dizer que eu não tenha razão quando reclamei.

Se se tratasse da discussão na generalidade, estava bem, mas tratando-se da especialidade, a mataria em discussão é restrita à proposta do Sr. Almeida Ribeiro e mais nada.

Tenho dito.

O Orador: — É para lamentar que o Sr. Carlos Olavo faça obstrucionismo.

O Sr. Ministro do Comércio, que é uma pessoa estudiosa, será pela discussão de agora a crise de 1892 e que as medidas de Dias Ferreira foram de carácter geral, e não uma operação como esta que se trata.

Mas, dizia eu, quero colaborar com o Govêrno numa parte: é que realmente se faça uma redução de despesas eficaz, o que representa no caso sujeito centenas de milhares de contos. O Govêrno quero reduzir despesas? Eu vou pô-lo à prova com o artigo novo que vou mandar para a Mesa, para provar que nós queremos fazer reduções, mas reais e em verbas que sejam significativas. Não é estar a cortar os juros aos pobres subscritores do empréstimo, enquanto os lords no Pôrto gastara à larga! Estamos na República dos lords. Para haver autoridade para reduzir as despesas é necessário que os lords acabem, fazendo despesas pelos cofres do Estado ou pelos cofres das câmaras mu-

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nicipais, porque são sempre despesas do País.

Apoiados da direita.

No Pôrto gasta-se à larga; aqui cortam-se os proventos aos subscritores do empréstimo em condições que eu não posso definir pelo respeito que tenho pela Câmara.

O meu artigo destina-se a revogar 76 decretos publicados nos celebres 30 suplementos ao Diário do Govêrno. Êsses célebres suplementos trouxeram a lume 379 decretos, ocupando 804 páginas do Diário do Govêrno e esgotando, até, os números dos caixotins da Imprensa Nacional; e assim é que, tendo de recorrer-se às letras, aparece-nos um decreto com esta numeração estranha: V V V...

O Sr. Carvalho da Silva: — E o País viu, viu, viu!... (Risos).

O Orador: — E há outro que é o número 5:887 O O O...

O Sr. Carvalho da Silva: — E o País está a fazer é sôbre isto tudo! (Risos).

O Orador: — Pois examinando todos êsses decretos, eu tirei dos 379 aqueles cuja anulação agora já não produzia efeito, e por isso escolhi 76 que pela sua matéria e importância do assunto que tratam estou convencido, fazendo contas de cabeça, como, aliás, o Sr. Ministro das Finanças as faz, porém com a diferença que estas são da minha cabeça e as de S: Exa. & são da cabeça de outros, trarão uma grande economia para o Estado desde que sejam revogados.

Se o Govêrno está animado do propósito de fazer economias verdadeiras, tenho a certeza que êle, pela boca do Sr. Ministro do Comércio, nos vai dar o seu voto ao artigo novo que mando para a Mesa.

Agora, Sr. Presidente, começa a segunda série que é composta com duas letras do alfabeto.

Depois entram as três letras do alfabeto.

Agora temos as quatro letras do alfabeto.

O Sr. Tôrres Garcia (interrompendo): — Todos nós conhecemos isso, e lastimamos bastante.

O Orador: — Se V. Exa. o lastima tem ocasião para se pronunciar a nosso favor.

Ainda não pára aqui, porém, está quási no fim por isso que então já não havia mais letras nos caixotins da Imprensa Nacional. E acaba aqui, Sr. Presidente, nos L L a série dos 379 decretos publicados pelo Govêrno da presidência do Sr. Domingos Pereira, pessoa por quem pessoalmente tenho a maior estima e consideração, que hoje ocupa a pasta dos Negócios Estrangeiros e que por infelicidade sua desde que entrou para o Govêrno se encontra doente.

Ora, Sr. Presidente, dêstes decretos infelizmente têm responsabilidade todos os partidos da República, sem excepção, assim como os maiores vultos chamados independentes da República, como por exemplo o falecido António Maria Baptista.

Parece-me que o Govêrno pode realmente fazer reduções, aceitando êste artigo novo que vou mandar paca a Mesa.

Eu bem sei que o Sr. Ministro do Comércio, que é muito inteligente, me vai dizer que é escusado o meu artigo, por isso que o Govêrno já tem autorização para o fazer.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António Fonseca): — Apoiado.

O Orador: — Porém como natural é que não tenha coragem para liquidar essa enorme obra da República, a que se referem êsses trinta exemplares do Diário do Govêrno, a que me tenho referido, eu assim dou ensejo ao Govêrno para acabar de vez com essa enorme quantidade de funcionários que entraram para os Ministérios sem concurso, para o que poderá tornar responsável o Parlamento.

O Govêrno, aceitando êste meu artigo novo, pode perfeitamente reduzir, e muito, as despesas, melhorando a situação.

Mas o País já se não deixa levar por balelas.

O País sabe que essa atoarda, lançada ontem, o foi com o propósito de, no caso do câmbio hoje se ter agravado, se dizer que tinham sido os inimigos do Governo que tinham pretendido, como já se insinuou no Século, combater a sua acção, promovendo o agravamento do câmbio.

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Sr. Presidente: mando para a Mesa o meu artigo novo, confiado em que a Câmara lhe dará o seu voto, mostrando assim que colaboramos com o Govêrno quando êle se disponha a fazer qualquer cousa útil.

Tenho dito.

O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.

O Sr. Carlos Olavo (para um requerimento): — Sr. Presidente: requeiro a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre se dispensa a leitura na Mesa do artigo novo apresentado pelo Sr. Paulo Cancela de Abreu, visto já dele ter conhecimento pela leitura feita por S. Exa.

É aprovado.

É admitida a proposta do Sr. Paulo Cancela de Abreu.

Proposta

Artigo novo. Ficam revogados os decretos n.ºs 5:556,- 5:557, 5:564, 5:572, 5:574, 5:596, 5:605, 5:611, 5:617, 5:618, 5:619, 5:624, 5:628, 5:640, 5:665, 5:666, 5:677, 5:680, 5:699, 5:703, 5:709, 5:711, 5:712, 5:715, 5:718, 5:720, 5:724, 5:725, 5:726, 5:727, 5:730, 5:733, 5:741. 5:742, 5:751, 5:780, 5:786, 5:787. 5:787-A, 5:787-B, 5:787-E, 5:787-0, 5:787-H, 5-787-M, 5-787-N, 5:787-P, 5:787-2-0-, 5:787-2-0, 5:787-2-T, 5:787-2-V, 5:787-2-X, 5:787-3-H, 5:787-3-J, 5:787-3-Z, 5:787-3-N, 5:787-3-0, 5:787-3-V, 5:787-4-0, 5:787-4-H, 5:767-4-P, 5:787-4-8, 5:787-4-T, - 5:787-4-U, 5:787-4-2, 5:787-5-D, 5:787-5-J, 5:787-5-N, 5:787-5-0, 5:787-5-P, 5:787-5-K, 5:787-5-U, 5:787-5-X, 5:787-5-2, 5:787-6-A, 5:787-6-E, 5:787-6-0; e 5:787-6-L, todos publicados no Diário do Govêrno de 10 de Maio de 1919 e nos seus trinta suplementos.

§ único. Quanto aos serviços dos funcionários, a que se referem os decretos revogados por esta lei, o Govêrno providenciará nos termos estabelecidos na lei n.° 134, de 22 de Agosto de 1922, ficando porém os funcionários novos, nomeados ao abrigo dos mencionados decretos, apenas com um têrço dos vencimentos que actualmente lhes competem

emquanto se mantiverem na situação indicada na mesma lei.

24 de Fevereiro de 1924.— Paulo Cancela de Abreu.

É admitida.

O Sr. Joaquim Ribeiro (para explicações): — Sr. Presidente: pedi a palavra para, respondendo ao Sr. Paulo Cancela de Abreu que me emprazou, como pessoa de bem, a provar a minha afirmação de que, durante o seu governo no Norte, os monárquicos tinham levantado mais de 1:000 contos das agências do Banco de Portugal, pedir a V. Exa. que leia o acórdão do Conselho Superior de Finanças, de 14 de Fevereiro de 1922.

O orador não reviu.

Trocam-se vários àpartes.

Agitação.

O Sr. Carvalho da Silva (para explicações): — Sr. Presidente: muito pouco tempo me demorarei no uso da palavra, porque mais não é preciso para desfazer por completo a afirmação do Sr. Joaquim Ribeiro.

Houve no Norte um levantamento monárquico que, para mal e desgraça do País, não vingou.

Durante êsse levantamento, que durou vinte e tantos dias, evidente é que os monárquicos, como não costumam viver no regime do calote em que a República vive, tinham de pagar ao funcionalismo e à fôrça pública.

Daí resultou o levantamento das verbas a que se referiu o Sr. Joaquim Ribeiro; mas, Sr. Presidente, a República instituiu como lei — a lei n.° 968 — pela qual os monárquicos, ao contrário do que sucede aos republicanos que fazem revoluções, estão pagando quantias muito superiores a essas.

Mas em que são empregadas — e aqui é que está o confronto—essas verbas pagas pelos monárquicos?

Para que serviu essa lei das chamadas indemnizações?

Essa lei serviu para dar ao Sr. Dr. Artur Leitão 330 contos de indemnização pelo assalto a um jornal cujo material não valia mais de 10 contos; serviu para pagar à Maçonaria, mãe desta República, mais de 400 contos; serviu para dar ao jornal O Mundo mais de 100 contos.

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26 Diário da Câmara dos Deputados

Depois de lembrar êstes casos, sem empregar termos que nada valem, mas apenas relatando factos, devo ainda dizer que houve um tribunal militar organizado ad odium contra os monárquicos, e que, sendo julgados nesse tribunal os honradíssimos homens que constituíam a Junta do Norte, por unanimidade foi reconhecido que êsses homens não tinham cometido a mais leve violência nem o mais insignificante acto de desonestidade.

Isto é que os senhores não querem ouvir.

Trocam-se vários àpartes.

Sussurro.

O Orador: — Sem querer de forma alguma empregar palavras impróprias do Parlamento, sem querer de maneira nenhuma dizer qualquer cousa que seja ofensiva para alguém, tendo-me limitado a citar factos, vou terminar declarando que nós dêste lado da Câmara cada vez nos orgulhamos mais de representar aqui um regime que deixou o País em 1910 numa próspera situação e que a República levou êsse mesmo País à bancarrota como ontem aqui se provou.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ferreira da Rocha: — Sr. PResidente: sabe V. Exa. que eu sou um Deputado respeitador do Regimento, porque estou absolutamente convencido de que a impraticabilidade que todos os oradoras têm apontado nas instituições parlamentares reside nos Homens que não sabem respeitar às próprias instituições, reside principalmente nos homens que não sabendo cumprir o próprio Regimento têm transformado uma assemblea de legisladores numa assemblea simplesmente politica para fazer discursos de comício.

Mas porque sou assim, Sr. Presidente, quero dizer também que se não aproveito a discussão na especialidade dêste artigo para discutir os decretos que o Govêrno publicou há três dias é porque estou na convicção de que a maioria desta câmara os fará discutir logo que a sua discussão seja requerida.

O Sr: Presidente do Ministério disse ali ontem que era preciso definir situações; que assim como o Poder Executivo tomava a responsabilidade dos seus actos,

era indispensável que o Parlamento definisse os seus intuitos para saber se aprovava ou não a sua orientação.

Em todo o tempo, estas declarações do Sr. Presidente do Ministério deviam ter dado lugar a um debate especial, devia-o, V. Exa., Sr. Presidente, ter marcado imediatamente, podia mesmo qualquer dos Srs. Deputados requerer que urgentemente se tratasse do assunto para sôbre as declarações do Sr. Presidente do Ministério se determinar desde logo o apoio da Câmara ou o seu combate.

Para mais o Sr. Presidente do Ministério declarou ali, quando pedia as autorizações, que elas não lhe eram concedidas senão pelo espaço de 48 horas, sábado e domingo, dias em que não há sessão, e que a todo o tempo à Câmara lhe podia pedir contas.

Se eu amanha interpretar como verdadeira esta afirmação, se a Câmara estiver disposta a que se discutam os actos praticados pelo Govêrno e a maioria resolver, de combinação com o Govêrno, impedir a discussão dos decretos publicados, significa isso simplesmente que a maioria dá à última enxadada nas instituições parlamentares, impedindo que o Parlamento exerça livremente a sua acção fiscalizadora.

Assim, ao mesmo tempo que declaro que a propósito dêste artigo não vou discutir os decretos ultimamente publicados, querendo respeitar o Regimento, passarei a deixar de seguir êste procedimento se amanhã, quando fôr requerida a discussão dêsses decretos, ela não seja permitida; então farei o mesmo que os outros, não por um direito que me atribua, mas como um acto resultante do espírito de revolta.

Assim, Sr. Presidente, discuto agora sòmente o artigo.

Eu desejo perceber o que pretende o Sr. Almeida Ribeiro com a sua proposta.

Declarar que o aumento da circulação fiduciária é proibido?

Evidentemente que é, porque nenhum aumento pode ser feito senão pôr lei. No emtanto, o Sr. Almeida Ribeiro propõe á discussão de um artigo, afirmando que o aumento é proibido depois de decorridos 30 dias.

A análise simples dêste artigo novo leva-nos à seguinte conclusão: o aumento fica proibido para além de 30 dias, e fica permitido dentro do prazo de 30 dias.

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Sessão de 14 de Fevereiro de 1924 27

Ora, eu creio que esta não é a intenção de S. Exa.

O Sr. Almeida Ribeiro (interrompendo): — Eu disse que as actuais autorizações subsistem até 30 dias.

O Orador: -Essa é a intenção de V. Exa., mas não é a conclusão que se pode tirar do artigo depois de inscrito na lei.

Não me serve a mim que o Sr. Almeida Ribeiro tenha essa intenção, quando o que tenho diante de mim: é o texto que não traduz essa intenção.

É o Sr. Almeida Ribeiro também o autor de uma outra proposta, em que o Govêrno é autorizado a tomar as medidas que directamente disserem respeito à situação cambial.

Sr. Presidente: nós não devemos votar cousas que não correspondam inteiramente à intenção do legislador, e o artigo proposto não corresponde a essa forma de pensar;

Assim, se S. Exa. concordar, eu mandarei para a Mesa uma proposta de substituição, que, estou convencido, traduz integralmente o pensamento do Sr. Almeida Ribeiro.

A emenda é concebida nos seguintes termos:

Proposta

O aumento de circulação fiduciária para além dos limites determinados nas leis que regulam especialmente os contratos do Estado com o Banco de Portugal constitui crime público, incorrendo todos os que por qualquer motivo ou pretexto forem seus agentes na pena do artigo 231.° do Código Penal, sem prejuízo do disposto nos artigos 100.° a 106.° do mesmo Código.

§ único. O aumento que possa ainda ser realizado dentro dêsses limites só pode ser feito no período de 30 dias contados da data da publicação desta lei. - Ferreira da Rocha.

Creio que ela traduz claramente o pensamento de S. Exa. e estou convencido de que a Câmara a aprovará.

Tenho dito.

O orador não reviu.

Foi lida na Mesa e seguidamente admitida a proposta de emenda do Sr. Ferreira da Rocha,

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.°

Fez-se a contraprova, fazendo-se a chamada.

Disseram «aprovo» os Srs:

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Aires de Ornelas e Vasconcelos.

Alberto Ferreira Vidal.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

Amaro Garcia Loureiro.

Américo Olavo Correia de Azevedo.

Aníbal Lúcio de Azevedo.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Correia.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António Lino Neto.

António Pais da Silva Marques.

António Resende.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino

Bernardo Ferreira de Matos.

Carlos Eugénio de Vasconcelos.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

Constâncio de Oliveira.

Delfim de Araújo Moreira Lopes.

Francisco Dinis de Carvalho.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

Hermano José de Medeiros.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

João José da Conceição Camoesas.

João José Luís Damas.

João de Ornelas da Silva.

Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

José Carvalho dos Santos.

José Mendes Nunes Loureiro.

José Mendes Ribeiro Norton de Matos.

José Pedro Ferreira.

Lourenço Correia Gomes.

Luís da Costa Amorim.

Manuel Alegre.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel Ferreira da Rocha.

Página 28

28 Diário da Câmara dos Deputados

Paulo da Costa Menano.

Pedro Góis Pita.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Plínio Octávio de Sant’Ana e Silva.

Sebastião de Herédia.

Tomé José de Barros Queiroz.

Vergílio Saque.

Viriato Gomes da Fonseca.

Disse «rejeito» o Sr.:

Paulo Cancela de Abreu.

Feita a votação nominal, verificou-se terem dito «aprovo» 52 Srs. Deputados e «rejeito» 1.

O Sr. Presidente: — Não há número. A próxima sessão é amanhã, à hora regimental, com a mesma ordem de trabalhos.

Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 10 minutos.

Documentos enviados para a Mesa durante a sessão

Parecer

Das comissões de legislação, civil e comercial e de finanças, sôbre o n.° 645-A, que manda aplicar o disposto no decreto n.° 4:076 e portarias n.ºs 1:295 e 1:635

aos contratos de empreitadas, de valor superior a 10.000$.

Imprima-se.

Propostas de lei

Do Sr. Ministro da Instrução, criando um solo especial sôbre instalações eléctricas de uso privado, denominado «Fundo Especial dos Estudos».

Para o «Diário do Governo».

Do mesmo, revogando o artigo 30.° e § único do Regulamento do Ministério da Instrução.

Para o «Diário do Governo».

Do mesmo, confiando à Junta de Orientação dos Estudos o seu próprio governo económico.

Para o «Diário do Governo».

Nota de interpelação

Desejo interpelar, em negócio urgente, sôbre o pêso e qualidade do pão que vem sendo vendido ao consumidor.— A. Carvalho da Silva.

Rejeitado.

Comissão do Orçamento

Substituir o Sr. António Fonseca pelo Sr. Carlos de Vasconcelos.

Para a Secretaria.

O REDACTOR.—Herculano Nunes.

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