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REPÚBLICA PORTUGUESA
DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO N.º 43
EM 25 DE FEVEREIRO DE 1924
Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal
Secretários os Exmos. Srs.
Baltasar de Almeida Teixeira
João de Ornelas da Silva
Sumário.— Responderam à chamada 40 Srs. Deputados, declarando-se aberta a sessão. É lida a acta e dá-se conta do expediente.
Antes da ordem do dia.— O Sr. Sá Pereira refere-se à prisão, em Sevilha, de alguns operários portugueses, dando esclarecimentos o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Domingos Pereira).
Em negócio urgente, autorizado pela Câmara, o Sr. António Correia trata da reintegração de funcionários do porto de Lisboa. Sôbre o mesmo assunto, e para explicações, fala o Sr. Pedro Pita, seguindo-se os Srs. Ministros do Comércio Comunicações (António Fonseca} e Jorge Nunes.
Dá conta da marcha do movimento grevista de alguns funcionários públicos o Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro), apresentando a êste respeito uma moção de confiança o Sr. Américo Olavo, moção que em seguida se discute, e é aprovada, usando da palavra os Srs. António Maria da Silva, Morais Carvalho, Jorge Nunes e Lino Neto.
É aprovada a acta, e são admitidas proposições de lei já publicadas no «Diário do Governo».
Ordem do dia.— Interpelação do Sr. Cunha Leal ao Sr. Ministro das Colónias (Mariano Martins) acerca dos actos do Alto Comissário da província de Angola.
O Sr. Norton de Matos, que ficara com a palavra reservada, continua e conclui o seu discurso.
É dada a palavra ao Sr. Cunha Leal, que reserva o uso dela para 0, sessão seguinte, por ser hora de se encerrar a sessão.
Antes de se encerrar a sessão.— O Sr. Carlos Pereira ocupa-se de factos referentes ao Hospital de D. Leonor, das Caldas da Rainha, respondendo o Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (José Domingues dos Santos}.
Encerra-se a sessão, marcando-se a imediata para o dia seguinte.
Documentos mandados para a Mesa durante a sessão. — Um projecto de lei do Sr. Dinis de Carvalho.
Abertura da sessão às 15 horas e 37 minutos.
Presentes 40 Srs. Deputados.
Entraram durante a sessão 48 Srs. Deputados.
Srs. Deputados presentes à abertura da sessão:
Abílio Correia da Silva Marçal.
Alberto Ferreira Vidal.
Alberto Lelo Portela.
Amadeu Leite de Vasconcelos.
Américo Olavo Correia de Azevedo.
Aníbal Lúcio de Azevedo.
António Alberto Tôrres Garcia.
António Augusto Tavares Ferreira.
António Correia.
António Joaquim Ferreira da Fonseca.
António Maria da Silva.
António Mendonça.
António Pais da Silva Marques.
António de Paiva Gomes.
António Resende.
Armando Pereira de Castro Agatão Lança.
Artur Brandão.
Baltasar de Almeida Teixeira.
Domingos Leite Pereira.
Francisco Coelho do Amaral Reis.
Francisco Pinto da Cunha Leal.
Hermano José de Medeiros.
Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.
Jaime Júlio de Sousa.
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João Estêvão Águas.
João de Ornelas da Silva.
José Carvalho dos Santos.
José Mendes Nunes Loureiro.
José Pedro Ferreira.
Luís António da Silva Tavares de Carvalho.
Luís da Costa Amorim.
Manuel Ferreira da Rocha.
Manuel de Sousa da Câmara.
Nuno Simões.
Paulo Cancela de Abreu.
Pedro Góis Pita.
Pedro Januário do Vale Sá Pereira.
Plínio Octávio de Sant’Ana e Silva.
Tomás de Sousa Rosa.
Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.
Srs. Deputados que entraram, durante a sessão:
Adriano António Crispiniano da Fonseca.
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Albano Augusto de Portugal Durão.
Alberto de Moura Pinto.
Álvaro Xavier de Castro.
Amaro Garcia Loureiro
Angelo de Sá Conto da Cunha Sampaio Maia.
António Abranches Ferrão.
António Lino Neto.
António Pinto de Meireles Barriga.
Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.
Artur de Morais Carvalho.
Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.
Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.
Carlos Cândido Pereira.
Constâncio de Oliveira.
Custódio Martins de Paiva.
Delfim de Araújo Moreira Lopes.
Francisco Dinis de Carvalho.
João José da Conceição Camoesas.
João José Luís Damas.
João Pereira Bastos.
João Pina de Morais Júnior.
Joaquim António de Melo Castro Ribeiro.
Joaquim Brandão.
Joaquim Dinis da Fonseca.
Jorge de Vasconcelos Nunes.
José Cortês dos Santos.
José Domingues dos Santos.
José Mendes Ribeiro Norton de Matos.
José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.
José de Oliveira da Costa Gonçalves.
Júlio Henrique de Abreu.
Lourenço Correia Gomes.
Lúcio de Campos Martins.
Manuel Alegre.
Manuel de Brito Camacho.
Manuel de Sousa Coutinho.
Marcos Cirilo Lopes Leitão.
Mariano Martins.
Mário Moniz Pamplona Ramos.
Matias Boleto Ferreira de Mira.
Tomé José de Barros Queiroz.
Vasco Borges.
Vergílio da Conceição Costa.
Vergílio Saque.
Viriato Gomes da Fonseca.
Vitorino Henriques Godinho.
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Abílio Marques Mourão.
Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.
Afonso Augusto da Costa.
Aires de Ornelas e Vasconcelos.
Alberto Carneiro Alves da Cruz.
Alberto Jordão Marques da Costa.
Albergo da Rocha Saraiva.
Alberto Xavier.
Albino Pinto da Fonseca.
Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.
Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.
Alfredo Rodrigues Gaspar.
Américo da Silva Castro.
António Albino Marques de Azevedo.
António Dias.
António Ginestal Machado.
António de Sousa Maia.
António Vicente Ferreira.
Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.
Augusto Pereira Nobre.
Augusto Pires do Vale.
Bernardo Ferreira de Matos.
Carlos Eugénio de Vasconcelos.
Carlos Olavo Correia de Azevedo.
Custódio Maldonado de Freitas.
David Augusto Rodrigues.
Delfim Costa.
Eugénio Rodrigues Aresta.
Fausto Cardoso de Figueiredo.
Feliz de Morais Barreira.
Fernando Augusto Freiria.
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Francisco Cruz.
Francisco da Cunha Rêgo Chaves.
Francisco Gonçalves Velhinho Correia.
Francisco Manuel Homem Cristo.
Germano José de Amorim.
Jaime Duarte da Silva.
Jaime Pires Cansado.
João Baptista da Silva.
João Cardoso Moniz Bacelar.
João Luís Ricardo.
João Salema.
João de Sousa Uva.
João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.
João Vitorino Mealha.
Joaquim José de Oliveira.
Joaquim Narciso da Silva Matos.
Joaquim Ribeiro de Carvalho.
Joaquim Serafim de Barros.
Jorge Barros Capinha.
José António de Magalhães.
José Joaquim Gomes de Vilhena.
José Marques Loureiro.
José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.
José de Oliveira Salvador.
Júlio Gonçalves.
Juvenal Henrique de Araújo.
Leonardo José Coimbra.
Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.
Manuel Duarte.
Manuel Eduardo da Costa Fragoso.
Manuel de Sonsa Dias Júnior.
Mariano Rocha Felgueiras.
Mário de Magalhães infante.
Maxímino de Matos.
Paulo da Costa Menano.
Paulo Limpo de Lacerda.
Pedro Augusto Pereira de Castro.
Rodrigo José Rodrigues.
Sebastião de Herédia.
Teófilo Maciel Pais Carneiro.
Valentim Guerra.
Ventura Malheiro Reimão.
O Sr. Presidente (às 10 horas e 38 minutos): — Estão presentes 40 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Leu-se a acta e o seguinte
Expediente
Representações
Da Federação de Sindicatos Agrícolas do Douro, enviando tini memorial solici-
tando que sejam distribuídos aos lavradores de Peso da Régua os benefícios do Crédito Agrícola. Para a Secretaria.
Das Justas de Freguesia de Lisboa, reclamando medidas a entravar o custo da vida.
Publique-se no «Diário do Governo».
Da Federação Nacional das Cooperativas, reclamando medidas contra a especulação e carestia da vida.
Para a Secretaria.
Ofícios
Do Ministério da Agricultura, enviando a nota da importação de trigo pela moagem matriculada, solicitada pelo Sr. Lelo Portela.
Para a Secretaria.
Do Ministério dos Negócios Estrangeiros, comunicando ter o Sr. Ministro da França agradecido o voto de sentimento pela perda do dirigível Dixemude.
Para a Secretaria.
Telegramas
Do Partido Republicano Nacionalista de Mirandela, pedindo a conservação das escolas primárias superiores.
Para a secretaria.
Do delegado do Govêrno em Oliveira do Bairro, comunicando que a Câmara Municipal, juntas de freguesia e muito povo solicitam a abolição do imposto sôbre bicicletas e carros de lavoura.
Para a Secretaria.
São admitidas as seguintes proposições de lei, já publicadas no «Diário do Governo».
Propostas de lei
Do Sr. Ministro das Finanças, abrindo no Ministério das Finanças a seu favor, um crédito para a aquisição do material necessário para instalação da Direcção de Finanças no distrito da Guarda.
Para a comissão de finanças.
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Do mesmo, alterando o modo da cobrança dos impostos que incidem sôbre as especialidades farmacêuticas e águas minero-medicinais estrangeiras.
Para a comissão de saúde e assistência pública.
Do mesmo, modificando o artigo 340.° (transitório) do decreto n.° 4:060, de 8 de Julho de 1918.
Para a comissão de finanças.
Projecto de lei
Do Sr. João Camoesas, concedendo uma época de exames na segunda quinzena de Março de cada ano aos alunos da Faculdade de Direito, que se matricularam no regime da reforma universitária de 1911.
Para a comissão de instrução superior.
Antes da ordem do dia
O Sr. Sá Pereira: — Sr. Presidente: pedi a, palavra estando presente o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, para chamar a atenção de S. Exa. para um facto que reputo bastante grave.
Sabe-se que em tempos partiram para Sevilha dois representantes da Confederação Geral do Trabalho, que foram, segundo me consta, tratar naquela cidade de interêsses comuns, entre operários portugueses e operários espanhóis. Aconteceu, porém, que tornando-se êles suspeitos às autoridades espanholas, foram presos, tratando as autoridades espanholas de saber do Govêrno Português se êles tinham cadastro.
Se bem que o Govêrno Português tivesse respondido dizendo que êles não eram criminosos, o que é facto é que êles no emtanto continuam presos e às ordens do Govêrno Espanhol.
Dizem-me que o Sr. Ministro tem tratado do assunto, tendo por mais de uma vez reclamado a sua liberdade; porém, êles até êste momento, continuam presos, razão por que eu entendi chamar a sua atenção para o assunto, a fim de que me diga se efectivamente o Govêrno Português e Espanhol têm tratado do mesmo, esperando que V. Exa., Sr. Ministro dos Estrangeiros, com a sua inteligência consiga a libertação dêstes dois portugueses
por parte do Govêrno Espanhol, que, como V. Exa. sabe, não está seguindo as normas constitucionais.
Tenho dito.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Domingos Pereira): — Sr. Presidente: pedi a palavra para responderão ilustre Deputado o Sr. Sá Pereira.
Devo dizer a S. Exa. que efectivamente me foi apresentada uma reclamação, pedindo a libertação de dois operários portugueses presos em Espanha como comunistas.
Os dois operários a que S. Exa. se referiu não são na verdade comunistas, segundo as informações que tenho, dando-se até a circunstância de serem contra o movimento comunista, tendo ido a Espanha por parte da Confederação Geral do Trabalho unicamente com o principal objectivo de tratarem de reclamações operárias.
O que é um facto é que foram presos em Espanha como agentes comunistas; porém, o Govêrno Português já fez saber ao Govêrno Espanhol que efectivamente êsses dois operários não eram agentes comunistas, mas sim apenas dois representantes da Confederação Geral do Trabalho, tendo desta forma o Govêrno Espanhol prometido pô-los na fronteira.
Fui procurado de novo por operários portugueses um dêstes dias, que vieram tratar do assunto, julgando eu que êles já estivessem em liberdade. Nestas condições não tenho dúvida em solicitar mais uma vez do Govêrno Espanhol o cumprimento da sua promessa, tanto mais que se trata de um acto de justiça.
Assim, eu espero que êles sejam postos em liberdade, podendo V. Exa. estar tranqüilo que hei-de fazer tudo quanto estiver ao meu alcance no sentido de êles serem restituídos à liberdade.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — O Sr. António Correia deseja tratar em negócio urgente da reintegração de uns funcionários da Exploração do Pôrto de Lisboa.
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Os Srs. Deputados que estão de acordo em que S. Exa. trate do assunto em negócio urgente, queiram levantar-se.
É aprovado.
O Sr. António Correia: — Sr. Presidente: agradeço à Câmara a consideração que me dispensou, permitindo que eu trato em negócio urgente do um assunto que diz respeito à reintegração de quatro funcionários do Pôrto de Lisboa.
Sr. Presidente: vejo-me obrigado a tratar do assunto no Parlamento em virtude de uma entrevista publicada no jornal o Diário de Lisboa de 22 do corrente, entrevista que foi dada pelo Inspector dos Serviços da Exploração.
Essa entrevista dada pelo Sr. Afonso de Macedo representa uma série de falsidades, que é necessário desmascarar no Parlamento, muito principalmente porque nessas infâmias se encontra o meu nome; e assim eu vejo-me na necessidade de levantar aqui esta questão, e pôr as cousas nos seus termos, para que a Câmara veja o que tem sido o pseudo Conselho de Administração do Pôrto de Lisboa, que tem exercido uma série de violências e de perseguições a funcionários, havendo um juiz, que desonra a magistratura, que facciosamente colaborou nessas infâmias.
Refiro-me ao juiz Lopes Vieira, que fez a sindicância, onde há um relatório cheio de falsidades.
Demetia-se o tesoureiro Cunha e nada se apurava contra o aspirante Brasil.
Foi o tesoureiro Cunha colocado no gabinete do Sr. Vaz Guedes, então Ministro do Comércio, que ouviu a Procuradoria da República, que mandou admitir êsse funcionário no seu lugar.
O conselho do porto mandou-lhe pagar, estando êsse funcionário a prestar serviço no gabinete do Sr. Vaz Guedes.
Depois foi Ministro do Comércio o Sr. Pedro Pita, que pouco tempo esteve no Ministério, mas conservando o funcionário aludido.
Em seguida veio o Sr. António da Fonseca e quis, e muito bem, escolher pessoas da sua confiança para o seu gabinete, e mandou prestar serviço no porto de Lisboa ao funcionário que para ali foi vexatòriamente, não para êle, mas para o conselho.
O Ministro do Comércio Sr. Pedro Pita homologou o decreto e procedeu muito bem, porque fez justiça.
Parece que a homologação dêsse acórdão causou graves perturbações ao conselho de administração do porto de Lisboa, visto que verificámos, a partir de então, que se lançou mão de uma verdadeira chantage política feita à volta dêste caso, recorrendo-se às maiores calúnias e infâmias contra os funcionários alvejados.
Sr. Presidente: - por que razão é que o Supremo Tribunal Administrativo concedeu provimento ao recurso interposto pelos funcionários em questão?
Quando outra não houvesse, bastaria a que se constitui pelos termos dê um atestado que foi passado ao funcionário que o requereu, pelo juiz sindicante, o Sr. Dr. Charters de Azevedo Lopes Vieira, já depois de ter entregue o resultado da sua sindicância.
Êste atestado foi passado, como já disse, pelo juiz sindicante, o mesmo que tempo depois apresentou um relatório em que propunha a demissão dêsse funcionário, como tendo incorrido em faltas graves.
Impunha-se a pena de demissão a um funcionário que em 28 anos de serviço não tem o mais leve castigo, nem sequer o de uma simples admoestação.
Não foi por favor que se passou aquele atestado.
Estão nesta Câmara alguns Deputados que conhecem o carácter desse funcionário, que se lhe ofereceram nas horas em que êle era perseguido atrozmente, para declararem que se tratava de uma pessoa incapaz de praticar qualquer acto lesivo da sua honra.
O Sr. Ministro do Comércio, que está a par do processo, dirá certamente à Câmara o que é do seu conhecimento, e que tanto bastará para que a imprensa veja que não é justo dar abrigo a informações que não passam de calúnias, urdidas à volta dos funcionários em questão.
Autoridade para acusar alguém de burlão têm-na aqueles que sabem que o conselho de administração do porto de Lisboa funciona ilegalmente.
São seis os seus membros; todavia têm reunido e tomado resoluções apenas com dois deles.
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Para se dar foros de legalidade a essas resoluções, até se inventou a presença de um vogal que já estava exonerado!
Esqueciam-se de que essa exoneração já estava anotada no Conselho Superior de Finanças.
Para que a Câmara veja a razão que assiste a êsses funcionários, basta ler o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, subscrito por juizes dos mais distintos que tem aquele tribunal.
O Supremo Tribunal, sem favor de qualquer espécie, sem coacção de quem quer que fôsse, concedeu provimento ao recurso.
Mas por que motivo o administrador geral da Exploração do Pôrto de Lisboa se tem negado a cumprir a sentença, já homologada pelo Sr. Ministro do Comércio? Por que motivo é que esse funcionário superior da República se nega obstinadamente a não acatar os pareceres da Procuradoria Geral da República, que, por unanimidade, confirmou tudo quanto tenho dito, reconhecendo definida a situação dos funcionários em questão?
A administração da Exploração do Pôrto, para mais cevar as suas vinganças, contra êsses funcionários, tem andado a propalar que êles se encontravam na situação de provisórios, e que a nomeação definitiva só se poderia fazer desde que tivessem prestado um ano de bom e efectivo serviço.
É tal a ânsia de fazer mal a êsse homem, que se pretende por todos os meios criar uma atmosfera de suspeição, lançando-o na miséria e à sua família, dizendo-se que êle vive uma vida de príncipe ou uma vida desafogada.
Êsse funcionário viu-se na necessidade de se dirigir ao Sr. Ministro do Comércio, pedindo que se lhe fizesse justiça e que não consentisse, apesar das infames cabalas que se levantaram, que o deixassem na miséria ao cabo de 28 anos de vida honesta.
Era necessário, porém, fazer mais alguma cousa a êsse funcionário e, assim, mandaram-no para o tribunal, para a Boa-Hora, acusado de falsificador, julgando-se talvez que a justiça do nosso País se deixasse corromper.
É o próprio agente do Ministério Público no tribunal da Boa-Hora que entendeu que o arguido devia ser despronun-
ciado, em face do despacho do meritíssimo juiz.
Pois apesar do atestado de honradez passado por um integérrimo magistrado, pretende-se ainda resolver a imprensa do País — a quem nós, homens de bem não podemos andar a mostrar os processos — a fim de se criar uma atmosfera de suspeições contra o Govêrno da República, dizendo-se que êste favorece criminosos, quando, repito, as pessoas encarregadas de averiguar da culpabilidade dos funcionários declararam unanimemente, sem coacção de qualquer natureza, que não havia provas que pudessem por qualquer forma manchar á dignidade dêsses funcionários.
Lidas estas peças do processo que foram fornecidas por um dos acusados, pregunto: e por que motivo é que o pseudo conselho de administração da Exploração do Pôrto de Lisboa mantém a pertinácia de não dar posse a êsses funcionários, que se viram obrigados, nos termos do artigo 4.° da Constituição, a recorrer para os Tribunais Superiores, clamando por justiça?
Há volta da individualidade do Sr. Ministro do Comércio tem-se pretendido também criar uma corrente de antipatia, como se S. Exa. ocupasse a pasta para servir de capa a quem quer que seja e não, apenas, para fazer justiça e ordenar o mero cumprimento das leis como membro do Poder. Executivo. Sei, porém, que S. Exa. tem mantido uma atitude cheia de nobreza no caso em questão.
E do domínio, público que o Conselho de Administração ou, antes, o pseudo Conselho de Administração, da Exploração do Pôrto de Lisboa, já pediu a exoneração. Há mais tempo que o devia ter feito. E a S. Exa. o Sr. Ministro do Comércio peço que não demore a publicação do respectivo decreto. O que lastimo é que a exoneração seja concedida a pedido dos funcionários e não por espontânea deliberação do Sr. Ministro.
O que não pode continuar é esta situação de desprestígio das leis do País, o desrespeito pelos tribunais da República. De contrário, toda a gente que tivesse questões pendentes nos tribunais contra o Conselho de Administração da Exploração do Pôrto de Lisboa, desde que êste tivesse artes de mostrar sempre a sua
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inocência, só restava um meio: era abandonar essas questões aos acasos da sorte para satisfação máxima do mesmo Conselho, deixando que desacatasse sistematicamente as decisões dos tribunais.
Veio a propósito ocupar-me dêste caso, em negócio urgente, o facto, como disse, de o Sr. Afonso de Macedo ter declarado num jornal que eu era advogado dos quatro funcionários. É falso, como falsas são todas as afirmações que se têm feito. Dei a um dos arguidos toda a minha solidariedade de homem de bem, toda a solidariedade de homem que deseja prestigiar a justiça e honrar os tribunais e que sejam cumpridas as decisões dêstes.
Fiz, como advogado que sou, a minuta do recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, do que não me arrependa, porque a fiz no exercício das minhas funções.
Repilo, pois, energicamente as insinuações malévolas e infamantes que transparecem em volta do nome do Deputado António Correia. E desde que se falou com intuitos reservados, com intuitos de baixa política, do Deputado António Correia, ficaria mal com a minha consciência se não viesse à Câmara protestar contra a maneira como se lança mão, para o triunfo de determinados fins, do nome de pessoas cujo carácter está acima da baba peçonhenta, que certos indivíduos pretendem lançar sôbre êsses homens.
Desde que a questão veio ao Parlamento, eu não ficaria satisfeito em quanto o Sr. Ministro do Comércio não dissesse o que tenciona fazer como membro do Poder Executivo, cujo poder necessita prestigiar cada vez mais nesta hora, nos princípios de uma sociedade organizada.
Tenho dito.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes formos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Pedro Pita (para explicações): — Desejo agradecer ao Sr. Ministro do «Comércio os termos em que S. Exa. pôs esta questão no Senado, onde ela foi levantada e onde eu não tenho voz; e serei justo dizendo que o que S. Exa. me fez faria a outra pessoa, pois conheço o seu carácter.
O caso da administração do Pôrto de Lisboa liga-se com a necessidade da homologação de um acórdão.
Porque eu sempre tenho defendido que aos Ministros não ficava o direito de deixar de homologar qualquer acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, nunca deixei nem deixaria de homologar qualquer acórdão dêsse tribunal, pois entendo que êsse tribunal deixaria de servir para qualquer cousa quando os Ministros não se conformassem com os seus acórdãos.
Assim, eu homologuei, como hoje homologaria todas as decisões dêsse tribunal.
De resto, foi já publicado depois disso: um decreto impondo a promulgação dos acórdãos que são proferidos por êsse tribunal.
Sr. Presidente: se depois de eu ter feito o que fiz, alguma entidade subordinada ao Ministério de que eu era chefe não se conformasse, eu iria até onde fôsse possível ir para prestígio de um Ministro, mas estou certo que tal facto não se daria.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (António da Fonseca): — Sr. Presidente: chamo a atenção da Câmara para o que vou expor.
A Câmara ouviu as explicações do Sr. António Correia e do Sr. Pedro Pita e delas temos a concluir o que vou expor.
Houve uma sindicância e um recurso para o Supremo Tribunal.
O respectivo acórdão fez as suas considerações unicamente sôbre dois pontos.
Num deles diz que o modo como foi feito o decreto, seria o bastante para anular o processo.
Mas o Supremo Tribunal foi mais longe.
Analisou a sindicância, ponto por ponto, chegando a afirmar que só um dos três arguidos teria a possibilidade de estar incriminado de negligência.
Houve toda a cautela, como a Câmara pode ver, na elaboração dêste acórdão.
O Sr. Pedro Pita, como Ministro do Comércio, homologou, como era seu dever, respeitando o tribunal que dera a decisão.
Tal era a situação em que me encontrei quando entrei para a minha pasta, encontrando um decreto sôbre uma consulta e a sentença de um tribunal fazen-
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do anular um decreto de suspensão de uns funcionários e mandando-os regressar à sua categoria.
Eu devo chamar a atenção da Câmara para a maneira como se fazem certas perseguições.
O meu procedimento e o do Sr. Pedro Pita foram, como deviam ser, de inteira justiça.
O que fez depois a Administração do Pôrto de Lisboa?
A Administração do Pôrto de Lisboa propôs que, não obstante estarem reintegrados êsses funcionários, eu, Ministro do Comércio, usando das atribuições conferidas pelo artigo 17.° da organização do Pôrto de Lisboa, anulasse a nomeação dêsses funcionários.
Nessa altura em que o Sr. Jacinto Simões me propôs essa anulação, logo disse que não queria lançar um despacho sem ouvir a Procuradoria Geral d a República.
Assim fiz, e essa instância disse-me que não tinha direito de usar dêsse artigo 17.°, porque êsses funcionários são de nomeação vitalícia e anterior à reorganização do Pôrto de Lisboa, e que se eu tal fizesse, procederia ilegalmente.
Em face dêsse parecer, lancei o meu despacho.
Sr. Presidente: discuto com toda a gente, se poderia um Ministro, tendo-se encontrado perante um funcionário em manifesta rebeldia, como êste, não o demitir inevitavelmente.
Apoiados.
Era o meu dever, mas não fica aqui.
Ouvi novamente a Procuradoria da República, lavrando um despacho que termina por pedir à Procuradoria que dissesse claramente qual a situação em que deverá colocar se cada um dos funcionários incriminados.
A Procuradoria da República fez um parecer fundamentado e eu lancei o meu despacho.
O funcionário novamente voltou com um novo ofício.
Era uma terceira insistência absolutamente extravagante, como a anterior, a que não tive de responder cousa alguma, mantendo o meu despacho.
Até agora não há mais acto nenhum meu.
Há todavia um ofício da Administração do Pôrto de Lisboa, para pedir a sua de-
missão, asssinado por três pessoas: o Sr. Dr. Jacinto Simões, o Sr. Afonso de Macedo, e o engenheiro, Sr. Oliveira Malheiro.
Êste facto de pedir novamente a demissão era para aparentar de ser todo o Conselho que pedia a demissão.
Julgo dever trazer esta questão à Câmara.
Desejo que a Câmara me diga se se devem respeitar os direitos adquiridos cumprindo as sentenças do tribunal.
Isto é tanto mais necessário quanto é certo que o Tribunal Administrativo demonstrou a impossibilidade de se proceder, como, de rosto, a afirmação dum juiz da Boa Hora, acerca de investigação.
Na realidade, pode parecer, à primeira vista, que esta questão é pequena. Não é pequena; é uma questão de onde resulta o seguinte: ou a demissão dos membros do conselho de administração do porto de Lisboa, e não se pode dizer que sejam quaisquer funcionários, são funcionários duma alia categoria, ou outra cousa, que repugna aos mais elementares preceitos da justiça e da legalidade, a de, apesar das sentenças, não colocar aqueles homens nos lugares a que têm direito, reconhecido em dois pareceres fundamentados da Procuradoria Geral da República.
Preciso de o saber, porque é a segunda vez que no Parlamento se suscita êste assunto sem ter sido devidamente apreciado.
Estou realmente cansado de ser acusado vilmente em jornais que não têm nenhuma categoria; nada valem e só servem para êstes caso B.
Estou farto de me ver enxovalhado malèvolamente.
Não conheço senão um dos funcionários demitidos, porque, sendo um desgraçado que precisa de dinheiro, se agarra, por assim dizer, aos meus braços todas as vezes que entro e saio do Ministério.
Ninguém me falou neles; apenas preciso saber da maneira de cumprir o meu dever.
O artigo 17.° é uma faculdade, e não é uma obrigação.
Assim mesmo tive o cuidado de procurar saber a opinião do corpo consulti-
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vo, a Procuradoria da República. Limitei-me a confirmar-me com ela.
Tenho procedido bem ou mal?
Mas acabe-se com isto, porque é vexatório para o Ministro da República.
Nesta questão sinto que a lei e a moral estão inteiramente a meu lado.
Peço, pois, a V. Exa. que consulte a Câmara sôbre êste caso, para que se possa estar isento de todas as calúnias e insinuações.
O discurso seja publicado na integra quando o orador haja revisto as notas taquigráficas.
O Sr. Jorge Nunes: — Sr. Presidente: eu prestei toda a atenção aos discursos proferidos acerca do conflito entre o Sr. Ministro do Comércio e a Administração do porto de Lisboa. E, se não interpretei mal as palavras do Sr. Ministro do Comércio, julgo poder chegar à conclusão de que S. Exa. deseja que o Parlamento dalguma maneira lhe dê a fôrça suficiente para resolver, e de pronto, êsse conflito.
Eu entendo que é realmente necessário que nós concorramos, quanto em nós caiba, para o prestígio de todos os poderes. O Poder Legislativo tem andado pelas ruas da amargura. E porquê? Porque, sendo nós principalmente uma fôrça moral, por vezes nos esquecemos de manter na devida altura o prestígio dessa força.
Pela minha parte tudo farei para que êsse prestígio se mantenha è fortaleça através de todos os obstáculos.
Mas se eu assim reivindico êsse prestígio, não menos o desejo para a Poder Executivo.
Estamos neste momento em presença dum conflito entre a Administração ao porto de Lisboa e o Ministro do Comércio, e dum Ministro que, não querendo determinar o seu procedimento pela sua opinião, embora ela esteja robustecida com uma sentença do Supremo Tribunal Administrativo e com o parecer da Procuradoria Geral da República, vem perante o Parlamento expor toda a questão e pedir-lhe que o oriente na sua atitude.
Eu não vejo, ao encarar êste assunto, pessoas; vejo apenas o Poder Executivo, dispondo de todos os meios de que carece para fazer cumprir as suas determina-
ções, hesitar. Depois das declarações feitas pelo Sr., António Correia, e as dos Srs. Pedro Pita e Ministro do Comércio, eu creio que S. Exa. não tinha de hesitar em seguir o único caminho que a rebeldia dos membros da Direcção do porto de Lisboa aconselhava: o caminho da sua demissão.
Apoiados.
Em todo o caso, eu como membro do Poder Legislativo, e sem preocupações de qualquer espécie, não tenho senão de me honrar com a atitude do Sr. Ministro do Comércio.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Na última sessão fiquei de trazer ao Parlamento novos informes em relação ao que se resolveu chamar a greve do funcionalismo.
Creio que não foi ainda explicada a razão fundamental, do início dessa greve.
Por* deliberação do director da Contabilidade mandou-se proceder a serões extraordinários para o efeito de terminar certos trabalhos relativos Às contas do Estado. A certa altura, porém, verificou-se que o resultado prático que se esperava obter dêsses serões estava muito longe de corresponder ao que deles se exigia. Conseqüência lógica e inevitável: a suspensão dos serões. Dessa suspensão nasceu a atitude dos funcionários de contabilidade.
Contrariamente ao que noticiaram os jornais de sábado, essa atitude não se generalizou.
É certo que alguns funcionários da Contabilidade se dirigiram hoje tumultuàriamente às diferentes repartições do Estado, procurando arrastar para um movimento de insubordinação o.restante funcionalismo. Em face de tal procedimento o Govêrno mandou proceder à prisão dêsses funcionários.
Muitos apoiados.
O Govêrno está na disposição de obrigar os funcionários insubmissos ao cumprimento dos seus deveres oficiais. A Primeira medida que tenciona pôr em execução para o conseguir é a de encerrar a,s repartições onde se manifeste qualquer espécie de desobediência, substituindo es-
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sés funcionários por militares, quer do exército, quer da marinha.
Apoiados.
O Govêrno deu ordens especiais ao governador do Banco de Portugal para que só efectuem os pagamentos. Os vencimentos da fôrça pública estão completamente assegurados. Por pagar poderão ficar apenas os dos funcionários que hajam tomado essa atitude, o que, do resto, não preocupa o Govêrno.
Eis, Sr. Presidente, o que sôbre o assunto tenho a dizer à Câmara.
O Sr. Américo Olavo: — Sr. Presidente: toda a Câmara ouviu as declarações sôbre o movimento dos funcionários feitas pelo Sr. Presidente do Ministério, o eu entendo que a Câmara deve prestar todo o apoio ao Govêrno, pois ninguém é obrigado a prestar serviços ao Estado e, se não estão bem, vão procurar em outro sítio serviços que lhes dêem melhores remunerações.
O que se está passando só em sociedades em pleno estado de demolição, pois dentro das repartições públicas existem comissões de resistência que querem impor a vontade ao Govêrno, esquecendo-se de quem governa é o Govêrno.
Eu entendo que a Câmara deve dar o seu apoio ao Govêrno, e neste sentido mando uma moção para a Mesa, para a qual peço urgência o dispensa do Regimento.
Moção
A Câmara dos Deputados, embora entendendo que só algumas reclamações dos funcionários são de atender, tal só pode ser feito depois de terem sido criadas as receitas compensadoras indispensáveis, e considerando ainda que é imprescindível normalizar urgentemente todos os serviços públicos, dá todo o apoio ao Govêrno para que exerça a forte acção disciplinar necessária a êste fim. — Américo Olavo.
Leu-se na Mesa a moção.
Foi aprovada a urgência e dispensa do Regimento.
O Sr. António Maria da Silva: — Dêste lado da Câmara damos todo o apoio à moção apresentada.
É preciso que se respeite o Poder Executivo e que os funcionários cumpram a lei.
Falá-se nos Correios e Telégrafos, mas
Não é a mesma cousa, porque êstes tem uma receita própria, e no caso presente é preciso que o Govêrno esteja habilitado com verbas para essas despesas.
Êste lado da Câmara vota a moção, nem podia proceder por outra forma.
Como estou no uso da palavra, devo dizer que o Govêrno tem as faculdades necessárias, e não precisa das autorizações do Parlamento para poder agir.
O Parlamento nada tem com as pessoas que não querem cumprir com os seus deveres; isso compete ao Poder Executivo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Morais Carvalho: — Sr. Presidente: êste lado da Câmara representa no Parlamento uma causa que, ao contrário dos partidos republicanos na oposição, tem por fim defender os princípios da disciplina o da ordem.
Quanto às reclamações dos funcionários públicos, algumas merecem ser atendidas, como frisou o ilustre leader da Acção Republicana que apoia o Govêrno, mas não pudemos dar o nosso voto a essa moçãO; porque ela representai uma confiança no Govêrno que nós não temos, tanto mais que o Chefe do Govêrno tem dado ocasião ou incitado a êsses movimentos.
Pelos motivos expostos, a minoria monárquica não dá o seu voto a essa moção.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Jorge Nunes: — Continuo a supor que o Govêrno não merece aquela confiança que seria indispensável, para a administração do Estado, e muito menos no momento que atravessamos, mas êste lado da Câmara já declarou que em questões que dissessem respeito à nossa situação internacional e à questão, da ordem pública, dava apoio ao Govêrno, qualquer que êle fôsse.
E assim, como a greve dos funcionários públicos só prende com a ordem pública, o meu partido dá o seu voto à moção do Sr. Américo Olavo.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Lino Neto: — A minoria católica entende que passa horas amargas um Govêrno
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sem fôrça, e esta moção é necessária para a manutenção da ordem pública; por isso a minoria católica acompanha essa moção, tanto mais que a presente greve é contra as leis vigentes.
O Parlamento não pode ficar indiferente perante estas cousas.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — Não está mais nenhum Sr. Deputado inscrito; vai ler-se para se votar.
Foi lida na Mesa e depois aprovada.
O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Necessito de fazer uma declaração à Câmara que por lapso não fiz quando há pouco falei. Ainda outro motivo havia para que os funcionários não fizessem greve, e êsse foi o facto do o Govêrno ter-lhes dito que julgava que algumas das reclamações deviam ser atendidas, mas que nada podia fazer-se sem que o Parlamento se pronunciasse sôbre o aumento de receitas de forma a fazer-se um equilíbrio entre a receita e despesa.
Se me fôsse lícito, eu aplaudiria a atitude da Câmara na presente moção que mostra que o Parlamento está pronto a fazer cumprir as leis e a disciplina.
Tenho dito.
O orador não reviu.
É aprovada a acta e admitidas as proposições de lei que já ficam referidas.
ORDEM DO DIA
Continuação da interpelação do Sr. Cunha Leal sôbre a administração do Alto Comissário de Angola.
O Sr. Norton de Matos: — Sr. Presidente: continuarei a tarefa que me impus de esclarecer a Câmara sôbre os diversos pontos relativos à administração de Angola.
Referiu-se o Sr. Cunha Leal à Agência Geral de Angola, criticando a sua formação.
Devo dizer à Câmara que as agências são uma conseqüência forçada da autonomia financeira das colónias, porque ou as colónias mantêm agências ou o Ministério
das Colónias se transforma em agência das colónias, o que não pode ser.
Disse ainda o Sr. Cunha Leal que o Ministério das Colónias não tinha reconhecido essa agência. Não me parece apropriada a palavra reconhecer, porque não há nada a reconhecer. A agência foi criada ao abrigo das leis do Alto Comissário, não tirando nada ao Ministério das Colónias.
Disse-se aqui que o Alto Comissário tem feito enormes despesas com a sua instalação no Palácio de Loanda.
Creio que aos funcionários públicos que têm determinada representação deve ser dado aquele conjunto de conforto-necessário ao decoro da sua situação.
Tenho sido sempre modesto no meu viver particular, quer nas colónias, quer na Metrópole. Há mesmo cousas extraordinárias a êsse respeito, que talvez aqui pudesse citar, mas não vale a pena cansar a Câmara com a sua descrição.
O palácio de Loanda é um edifício muito grande, sem estilo, nem aspecto particular exterior, o até há muito poucos anos sem nenhum conforto interior. As primeiras obras que ali se fizeram foram as da recepção do Príncipe Luís Filipe. Depois começaram a fazer-se obras para arranjar uma sala de jantar decente, no tempo do governador Manuel Maria Coelho, e arranjaram-se os seus quartos, porque era cousa que ali não havia digna dêsse nome.
Fui eu quem mandou arranjar os primeiros quartos do palácio, olhando apenas à higiene mais do que a qualquer outra cousa. Mas nada do que ali existe se pode considerar luxuoso; há apenas aquilo que é absolutamente indispensável à categoria do funcionário que estiver naquele lugar e à categoria das pessoas que ali devem ser recebidas na ocasião das suas visitas à colónia.
Nem de longe se compara o que existe no palácio de Loanda, pomposo nome que se dá àquela casa, com aquilo que tenho visto nos palácios de governadores em colónias estrangeiras. De resto, o que lá está vai para a carga do palácio e lá fica.
Uma das cousas que têm feito aqui impressão, e a ela se referiu também o Sr. Cunha Leal, é o facto de o Alto Comissário ou o Governador Geral de Angola ter
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muitas residências: tem a de Loanda, a que já me referi, tem um palácio também no Lobito, outro na Humpata, passa agora a ter outro em Mossâmedes e naturalmente há-de ter mais.
Relativamente ao que se chama d palácio do Lobito, trata-se dum chalé, emfim grande e cómodo, que ali foi construído quási por completo antes de eu ter ido para Angola em 1912, e que depois eu entendi que devia ser considerado como residência do governador, principalmente porque julgo que naquele ponto, com características nacionais de todos conhecidas, havia toda a conveniência de que o governador geral se pudesse lá demorar grandes temporadas, para marcar bem a soberania portuguesa; e como êle, para ali viver, não pode estar hospedado no hotel ou em casa do Intendente, teve que escolher casa, e assim escolheu essa.
Quanto ao palácio da Humpata, outro ponto onde é conveniente que se pratiquem actos de permanência das grandes autoridades, e actos de soberania, por efeito de razões de todos conhecidas, êsse palácio por emquanto limita-se a uma casa desmontável de madeira com 7 divisões e com mobília tam modesta como a casa.
É preciso notar que eu principiei a tomar medidas para que qualquer cousa de melhor e mais próprio, de mais permanente, o que marque bem ali num conjunto de obras à nossa posse, se comece a fazer; mas não serei eu quem com certeza gozará essas instalações, porque elas levarão tempo, e eu não me demorarei todo êsse tempo em Angola.
Em Mossâmedes há uma casa chamada é velho palácio de Mossâmedes, e na qual se estão a fazer reparações há muitos anos, depois do incêndio que a destruiu.
Êsse palácio foi construído ainda no tempo da monarquia. Como êsse palácio tem dois andares, e como eu me tinha imposto a necessidade de me demorar em determinadas localidades para bem conhecer das suas necessidades e destruir muitas vezes determinados defeitos administrativos, políticos ou de qualquer ordem, entendi que era dêsses andares podia ser destinado ao governador geral e o outro ao governador do distrito; e como foi preciso mobilá-los, para a hipótese da viagem do Sr. Presidente da República,
assim se fez, começando essa mobília a ser utilizada pelo governador geral quando foi a Mossâmedes.
Em nada disto houve gastos excessivos ou luxos desnecessários. É claro que tudo é relativo, pois eu posso considerar modesto aquilo que outros julguem luxuoso.
Relativamente a automóveis e camionnettes, já disse o que tinha a dizer; simplesmente me esqueci de acrescentar que os automóveis e camionnettes do palácio se empregam sempre em serviço do Estado e muitas vezes em serviços que nem sequer são privativos do governador.
Ainda agora, para um reconhecimento importantíssimo que se fez na Baía dos Tigres, a fim de se estudar a instalação dum caminho de ferro, reconhecimento que foi brilhantemente levado a cabo pelo engenheiro Sr. Teixeira e que mostrou que êsse caminho de erro era fácil e altamente vantajoso para a nossa soberania naquelas paragens, as camionnettes do palácio serviram para êsse serviço, inutilizando-se uma e ficando outra em mau estado; mas, emfim, morreram em serviço.
Repito, a minha orientação não foi de luxos nem de gastos desnecessários, mas de higiene e de conforto e principalmente daquela decência que deve cercar sempre os altos funcionários, que naquelas paragens representam a soberania da Nação.
Também, relativamente ao Congresso de Medicina Tropical, se fizeram, referências quanto a gastos excessivos.
Sr. Presidente: o Conselho Legislativo aprovou que se realizasse o Congresso, e para êsse efeito votou creio que 490 contos.
O que há a discutir é se o Congresso era ou não conveniente e se traria ou não vantagens, mas desde que se assentou em que êle se devia realizar, tínhamos de gastar com os hóspedes que convidávamos o dinheiro necessário.
No meu modo de ver, julgo que o Congresso teve uma altíssima importância não só para a província de Angola, como para a administração colonial e para o prestígio da Nação, desfazendo atoardas malévolas sôbre o tratamento que dávamos aos indígenas. Angola foi a primeira colónia onde o Congresso se reuniu e a
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segunda terá lugar em Dakar dentro de dois anos o meio.
Sr. Presidente: outras vantagens ainda advieram do Congresso, quer sob o ponto de vista humanitário, quer atraindo àquela província altas capacidades scientíficas, que puderam observar o modo como ali se trabalha, principalmente no que respeita à protecção ao indígena.
Esta observação deu margem à publicação de artigos em jornais estrangeiros, como a Presse Médicale, e outros jornais da África do Sul e revistas inglesas. Não estou, portanto, arrependido de ter perfilhado a idea do Congresso, que foi sugerida pelo Sr. Dr. Damas Mora, ilustre chefe do serviço de saúde de Angola.
Neste Congresso houve também um aspecto interessante.
Tive idea de particularmente, me entender com o Sr. governador de S. Tomé, para que os congressistas pudessem visitar as roças e plantações ali existentes, a fim de que êles pudessem verificar o modo como ali eram tratados os indígenas. Essas visitas fizeram-se e o seu resultado foi concludente, porque já tive ensejo de ler à Câmara referências elogiosas, de varias sumidades mundiais, tanto para Angola como para S. Tomé, que desfazem por completo essas malévolas atoardas que se têm feito espalhar.
Referiu-se também o Sr. Cunha Leal ao facto de eu ter mandado abonar uma gratificação de 1.500$ a uns indígenas que tinham desatolado o meu automóvel numa estrada qualquer.
Procurei recordar-me de como o caso se havia passado, e como se tratava de dinheiro que tinha sido mandado pôr à disposição de um dos meus ajudantes, preguntei-lhe se tinha quaisquer dados arquivados, e como, felizmente, trouxe o livro dos meus despachos, posso explicar o caso à Câmara.
O aspecto da questão é inteiramente diverso.
Eu tinha resolvido ir visitar os poços de petróleo existentes no Alto Dande, e para isso tinham sido prevenidas as autoridades da circunscrição respectiva.
Como, porém, na noite anterior tivesse chovido torrencialmente, foram mandadas reparar as estradas para que pudessem transitar os automóveis, serviço em que foram empregados cêrca de 200 a 250 indígenas, que trabalharam afincadamente durante um dia e uma noite.
Ora, a verba mandada abonar foi de 500$, porque se calculou 2$ para cada um, mas como para receber a gratificação apareceram menos, entraram ainda na Fazenda cêrca de 135$.
Devo dizer que muitas vezes quando vou para o interior, principalmente para regiões pouco ocupadas, levo comigo dinheiro do Estado, que é abonado como recompensa aos indígenas que fazem determinados serviços durante a viagem, e que é dado também como recompensa aos sobas que trazem os chamados «presentes».
São cousas que não se podem recusar naquelas terras, e que nós as mandamos outra vez: se são bois mandamos em carne para comerem, e assim mandamos outras cousas, além de outras remunerações que é costume dar nessas terras, e que todos que por lá passaram conhecem.
Apoiados.
É possível que os 1.500$ se refiram a cousas como estas.
Eu fui acusado por ter transferido os serviços da aviação de Humpata para o Humbe.
Se o fiz, foi por julgar necessário por diversas circunstâncias; e se eu não tinha critério para resolver êstes casos, mal andou o Senado e o Govêrno mandando-me para Angola.
As razões principais foram as condições de Humpata não terem os requisitos necessários sob o ponto de vista militar, o que mo levava a escolher o Humbe para centro da aviação, além de que eu desejava essa aviação de forma a torná-la comercial, sem lhe tirar a característica militar.
O que existia em Humpata era pouco: uma casa de adoube e um telheiro.
Houve despesa, mas aquela que era indispensável; poupou-se muito, pois até oficiais serviram de chauffeurs. Houve despesa com gasolina, com camiões e com reparações de estradas.
Falou-se depois, também, na Agência Geral.
A Agência Geral estava instalada numa casa que não chegava para os serviços de emigração e colonização; a colonização que tem sido sempre o meu sonho,
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e para que essa Agência não podia continuar onde estava.
Várias campanhas só têm feito a propósito da compra dessa casa: tive mesmo de mandar levantar um inquérito, porque algumas cousas só disseram, que não me parecia conveniente deixar passar sem as averiguações necessárias, e nada se apurou dêsse inquérito que ferisse a honra o a honestidade dos empregados da Agência.
Essa casa, situada na Rua da Prata, com três andares e águas-furtadas, sem responsabilidade alguma, despejada de todos os seus inquilinos, custou, entrando tudo, escritura, registo, etc., a quantia de 932.273^50. Depois de ser comprada, houve quem oferecesse 1:200 contos por essa casa.
Quanto à despesa com a transferência dos degredados de Angola para Cabo Verde, a que S. Exa. fez referência, não se efectuou, porque os degredados infelizmente ainda continuam em Angola, mas o Conselho Legislativo autorizou essa despesa de transferência por conta da colónia, querendo assim manifestar ao Govêrno da Metrópole quanto tomava a peito que essa transferência se fizesse, quanto lhe custa, como representante que é da opinião pública, que ainda continue a considerar-sé Angola como colónia penal.
Foi isso que se teve em vista, sobretudo com a autorização dessa desposa.
Sr. Presidente: estas cousas que se estão dizendo continuamente a respeito de despesas excessivas de Angola, falando-se só de Angola, não se falando da metrópole, nem de outra qualquer colónia, revestem, sem dúvida alguma, um carácter pessoal, ferindo extraordinariamente, pelo que em tudo isso há de injustiça.
Críticas de administração que se baseiam quási exclusivamente em 'casos desta natureza, têm principalmente êste altíssimo inconveniente de ferirem propositadamente os homens a quem elas se dirigem.
Se é isso que se quere, atingiram o seu fim.
Evidentemente, porque, apesar de toda a serenidade que devo ter diante de ataques desta natureza, apesar de toda a tranqüilidade que esta casa do Parlamento me deve incutir, eu não posso deixar de me sentir profundamente ferido com ataques desta natureza.
De resto, êles são uns e outros da mesma espécie.
Quando eu estava em Londres exilado, obrigado a fugir do meu País para nele não ser assassinado depois de ter única e exclusivamente cumprido o meu dever, fui chamado a um tribunal inglês para responder a uma parte dirigida -a José Mendes Ribeiro Norton de Matos, desertor do exército português era o que lá vinha para se me preguntar a razão por que é que tinha mandado abonar, sem autorização, na minha qualidade de Ministro da Guerra, a gratificação de 15$ mensais a um chauffeur do meu Ministério.
São casos da mesma natureza, mas que aqui se vêm dizer.
Eu sei que se anda a rebuscar em torno de mim tudo quanto me possa ferir:
Não digo que seja V. Exa., Sr. Cunha Leal, mas V. Exa. está a servir inconscientemente de instrumento a qualquer cousa que não quero classificar.
O Sr. Cunha Leal (interrompendo): - Eu fiz de mim para comigo o propósito de não interromper V. Exa. para não alterar a serenidade da sua resposta; se o interrompo agora é porque V. Exa. se me dirige nos termos em que se está dirigindo.
Peço a V. Exa. que não faça considerações sôbre eu ser ou não instrumento de alguém, porque não permito que se faça tal suposição. Se V. Exa. quere manter a serenidade que é necessário, o melhor é fazer a justiça de me supor capaz de todas as cousas, menos a de ter a vilania de ser instrumento dos outros.
O Orador: — V. Exa. não deixou concluir as minhas palavras.
Continuo nas considerações que estava fazendo. Dizia eu que tudo se rebusca para me ferir, para me vexar, para me diminuir. Eu tenho a restrita obrigação de levantar aqui como em toda a parte essas cousas que me ferem. Chegam aos meus ouvidos as cousas mais espantosas. Diz-se, por exemplo, que eu transferi para Inglaterra, durante a minha estada em
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Angola, uma quantia que andei por 60:000 libras.
O que significa isto?
Como é que um funcionário, com o que tinha de ordenado, com ajudas de custo, com aquilo que conseguiu em ouro quando fui às colónias estrangeiras, quantias que não atingiram uma dezena de contos por mês, com despesas grandes como aquelas que era obrigado a fazer comigo e com a minha família, como é que, repito, poderia, sem proceder da maneira a mais infame e a mais deshonesta, arranjar 60:000 libras para transferir para Londres? E em todo o caso isto diz-se, e chega aos meus ouvidos por diversas formas. Não se disse aqui, mas já perto daqui se pronunciou.
É por isso, Sr. Presidente, que tem explicação, perante toda a gente que se preza, e todos os que aqui estão se prezam, a minha maneira de falar, com mais veemência do que aquela que impus a mim mesmo, quando faço referência a casos desta natureza.
Sr. Presidente: vou agora entrar noutro assunto, que se refere mais a actos administrativos, no sentido mais lato da palavra, do que aqueles que até aqui foram tratados.
Vou referir-me em primeiro lugar ao serviço do Orçamento.
Quando cheguei a Angola, em meados de Abril de 1921 eu fui encontrar em vigor o orçamento de 1917-1918.
Desta forma, a vida financeira da colónia baseada num orçamento, de uns poucos de anos atrás, não podia ser regular, e só podia dizer-se que existia graças às dívidas a fornecedores e a suprimentos constantes da metrópole.
Era grande o desleixo em todos os serviços fazendários, enorme mesmo. A arrecadação das receitas fazia-se de uma maneira absolutamente irregular e manifestando altíssima corrupção por parto de muitos funcionários encarregados de a fazer. Não havia escrita, nem contabilidade digna dêste nome. Tudo estava no maior caos e no maior descalabro em matéria de serviços financeiros. Os funcionários públicos, principalmente os do interior, estavam em grande parte com os vencimentos em atraso. Às praças de pré deviam-se grandes quantias, e as dívidas a fornecedores, a que já me referi, orça-
vam por muitos milhares de contos. Meteu-se ombros à tarefa de tirar alguma cousa dêste estado caótico, e a Câmara pode bem compreender que não era em trinta meses de trabalho que se podia pôr tudo perfeito, tudo num estado completo de organização. Todavia, o que se conseguiu fazer em matéria financeira é digno do louvor e alguma cousa vale. Os orçamentos, que se conservavam atrasados, como quando eu cheguei a Angola, ou se publicavam a meio do ano económico e, muitas vezes, já no segundo semestre do ano económico, passaram-se a publicar, os três que dizem respeito ao meu tempo de Alto Comissário, meses antes de se iniciar, o ano económico a que diziam respeito. Êsses orçamentos eram apresentados equilibrados nas suas receitas ordinárias. Conseguiu-se pôr em dia os pagamentos a fornecedores, tendo-se até tomado medidas, como foi a da emissão de bilhetes, de tesouro para êsse fim, mas da qual não foi preciso ainda lançar mão, como já disse na sessão de sexta-feira.
Desta forma, fortaleceu-se o crédito comercial da Província, que era cousa que não existia, porque os fornecedores estrangeiros, e mesmo nacionais, só satisfaziam as encomendas com o dinheiro à vista.
Devo frisar que desde que cheguei a Angola esta Colónia não tornou a receber um único subsídio da Metrópole o, pelo contrário, todas as despesas na Metrópole, que antecipadamente, foram feitas ou por suprimentos ou por operações da tesouraria ou do crédito no Ministério das Colónias, passaram a ser feitas a dinheiro, que era entregue mensalmente no Ministério pela Província.
Desta forma até hoje a Província do Angola tem pago todas as despesas na Metrópole, no Ministério das Colónias, como tem pago também todos os seus fornecimentos feitos em Angola, o como está pagando regularmente as prestações daqueles que fez no estrangeiro.
De maneira nenhuma serei eu quem afirme que o orçamento do Angola, como qualquer outro orçamento colonial, corresponde exactamente durante o ano económico à situação financeira dêsse ano.
Mudam as cousas em regiões em formação, como são as colónias, muito mais
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fàcilmente, muito mais ràpidamente, por circunstâncias muito mais ténues, do que mudam em países já feitos como são as metrópoles. Basta qualquer movimento indígena de rebeldia, basta qualquer modificação no estado climatérico, principalmente chuvas inesperadas e com carácter torrencial, bastam por outro lado pequenas melhorias num serviço de ocupação, para modificar ràpidamente as receitas ou as despesas, conforme os casos.
Os orçamentos duma colónia são de previsão, tanto nas receitas como nas despesas. Não há nada seguro e certo nesses orçamentos.
Não se trata, porém, de diplomas perfeitamente fixos, infalíveis na sua estrutura; que não sofram no decorrer do ano á que digam respeito as modificações necessárias.
Não quero dizer também que o serviço orçamental da província de Angola esteja dotado, principalmente no que diz respeito à confecção dos orçamentos, a êsse trabalho complicado em toda a parte, esteja dotado, repito, de todos aquelas organismos, de todo aquele pessoal que é preciso e muito necessário.
Todos os funcionários que têm estado nas colónias e principalmente aqueles que têm lidado com serviços da Fazenda sabem quam difícil é êsse serviço em regiões a grande distância umas das outras, com falta de pessoal com tudo aquilo que faz a perturbação nos serviços.
Os orçamentos dos dois primeiros anos da gerência do Alto Comissariado foram os de 1921-1922 e 1922-1923 que se fizeram em globo.- Entendeu o governo da colónia mandar fazer a discriminação do orçamento global para o ano de 1923-1924, ano corrente.
Era de facto impossível com as dificuldades que se tinham encontrado e a que já me referi, com o orçamento base que datava de 1917-1918, com todo o emaranhado das contas de Fazenda que fui encontrar na província, com as grandes modificações que se introduziram na organização dos serviços, era impossível, repito, fazer desde logo um orçamento discriminado no ano de 1923-1924;
Publicou-se o orçamento global que foi aprovado por um decreto e que é o orçamento real da província.
A conveniência, porém, de elaborar um
orçamento discriminado, obedecendo assim às práticas e regras dos serviços de fazenda, levaram a fazer a primeira tentativa de um orçamento dessa natureza mas é preciso não perder de vista que o orçamento da província que está em vigor é
o seu orçamento global.
De resto, evidentemente, as verbas totais do orçamento discriminado não são superiores nem inferiores às do orçamento global, mas defeitos notei ou me fizeram notar, relativamente ao orçamento discriminado, e uma dessas faltas, dessas irregularidades graves é de que havia algumas secções em que as verbas eram superiores às secções correspondentes do orçamento global. Isso foi imediatamente remediado por um decreto, em que se determina que os limites máximos das autorizações orçamentais, dentro de cada orçamento, sejam os constantes do orçamento global.
Houve além disso já outra alteração no orçamento e que confirma; o que acabo de dizer, relativamente ao carácter de excessiva previsão que devem ter os orçamentos de despesa das colónias, e foi assim que pouco tempo depois de começar a vigorar o orçamento actual um diploma do Alto Comissariado determinou que se considerassem reduzidas de 10 por cento todas as verbas destinadas à aquisição de material, e mais tarde outro diploma mandou suspender quási todos os contratos e nomeações de pessoal, com excepção de médicos e engenheiros.
Reduzi consideràvelmente os efectivos militares da província, suprimi determinados serviços, suspendi temporariamente outros serviços e tudo isso para fazer com que as despesas-permitidas pelo orçamento fossem muito menores.
E porquê? Porque o orçamento em vigor foi calculado para a libra a 100$ e desde que ela começou a subir, como tem subido, nos últimos tempos, e para que êsse orçamento fecho sem déficit, fizeram-se todas essas reduções de despesa, que se afirmam em muitos milhares de contos.
Referiu-se também o Sr. Cunha Leal ao orçamento da província no ano corrente, è disseque êsse orçamento era urna burla.
Estas palavras continuam a ferir. Pode porém, haver faltas, e temos a
considerar ao que há nos serviços da Fazenda da província e principalmente nesse
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serviço de elaboração de contas e orçamentos.
Ora isso é devido à falta de pessoal, insuficiência de pessoal. Sempre se encontram erros.
E eu procurei remediá-los; e em geral tratei sempre com a maior das benevolências êsse pessoal.
Desonestidades, sempre que as encontrei, tenho as punido rigorosamente.
Em geral os funcionários são incapazes delas. Cometendo-as, são afastados da província e muitos foram afastados por essa razão. Mas não o foram por desonestos, e apenas quero guiar-se pela minha orientação e modo de ver.
Na apreciação do orçamento referiu-se o Sr. Cunha Leal em primeiro logar à previsão das receitas, e disse que, em grande parte, elas lhe pareciam exageradas.
O primeiro orçamento do Alto Comissário foi o de 1921-1922. Fechou com uma cobrança de receitas, comparada com o previsto, com um excesso.
Quere dizer que a previsão foi perfeitamente cautelosa, visto que se cobraram receitas no valor superior às previstas.
Não se seguiu esta regra, e aumentaram muito além da média das receitas previstas.
Quanto à gerência de 1922-192S ainda não tinha fechado as contas do exercício que termina em 31 de Setembro de 1923. Quando saí de Angola o director da Fazenda, Sr. Ferreira Martins, que estava desempenhando as, funções de secretário de finanças, informou-me, com os elementos tirado, que á cobrança tinha excedido a receita prevista em 30:000 contos.
Não posso dizer os números exactos.
Quanto ao ano corrente, nós não devemos contar com tam grande excesso de receita realizada sôbre a prevista, porque o ano correu mal; mas algum haverá.
Houve as chuvas que prejudicaram muito as culturas indígenas, que são os principais factores de directa exportação, e houve ainda há poucas semanas outras chovas que fizeram parar os caminhos de ferro.
Prejudicaram determinadas colheitas, e houve ainda a greve marítima que dura a alguns meses produziu altíssimos inconvenientes na economia da província.
Mas eu tenho telegrama do encarregado do Govêrno, que diz que até agora as receitas determinam uma diferença.
Faltam 5:000 contos, que tudo leva a crer que sejam cobrados para igualar o ano económico.
Quanto ao imposto indígena, informa o mesmo funcionário que tudo leva a crer que a receita seja atingida como se esperava e ultrapasse a verba prevista.
Quanto a caminhos de ferro, as receitas têm aumentado.
A razão do aumento no caminho de ferro é sem dúvida nenhuma o seu' prolongamento até o Lubango, que fez aumentar o tráfego.
Quanto ao caminho de ferro de Loanda, onde as cousas têm corrido mal quanto ao tráfego, ou o aumento de tarifas que se fez aumentou as receitas.
No tocante à contribuição predial, entende o Sr. Canha Leal que é exagerada a previsão que se fez.
Talvez seja, mas não me parece, porque foi publicada uma lei de inquilinato para Angola que permite o senhorio, aumentar cinco vezes as rendas das casas, e como êsse aumento influi nas matrizes, a contribuição aumentará.
Relativamente ao imposto de sêlo, também o Sr. Cunha Leal considerou exagerada a receita prevista.
Não me parece que seja exagerada, pois julgo até que ela há-de ser superior, porque um dos cuidados que houve foi actualizar os impostos.
Para o ano económico futuro suponho que a receita seja de 130:000 contos, mais 4:000 do que êste ano.
Êstes números estão de acordo com o que acusam as estatísticas, quando se verifica que o aumento da receita corre paralelo ao aumento da produção.
Daqui se conclui que não há razão para se dizer que estamos em face de um orçamento viciado.
Vamos agora às despesas!
Eu não posso acompanhar o Sr. Cunha Leal nos detalhes das suas considerações, mas há um ponto em que estamos de acordo: é que, se êsse orçamento não satisfaz S. Exa., também não me satisfaz a mim; mas daí a concluir que se trata de um orçamento viciado, de um orçamento de 70:000 contos, que tem uma diferença de 50, vai uma grande distância.
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Há muitos funcionários que não estão na província e vencem um têrço dos seus vencimentos, que anda por uns 500 contos por mês, o que representa no orçamento global uma economia.
Posso afirmar que mais de 60 por cento dos funcionários não estão ainda nomeados, como por exemplo os lugares de aspirantes e dactilógrafos que foram criados muito recentemente; mas ainda não houve tempo para fazer o seu recrutamento.
Da mesma maneira, quanto a subsídios coloniais, uma grande parte não é abonada, pelo facto de serem naturais idas colónias, os que os recebem. É certo que têm 50 por cento do subsídio, mas isso não chega ao subsídio colonial.
Também as fôrças indígenas e europeias nunca estão completas, quer em quadros, quer em graças.
E assim sucessivamente, de modo que fàcilmente se verifica que carece de fundamento a afirmação de que o orçamento está errado em 60:000 contos.
Também não há exeguídade de verbas, poderá havê-la, se as cousas se modificarem sensivelmente pelo agravamento de preços, mas para tal hipótese se tomaram as providências a que me referi há pouco, umas em Angola- e outras já daqui, fazendo-se reduções importantíssimas que devem atingir 20:OOQ contos de economias.
Quanto à verba de 54 contos para solípedes, ela é perfeitamente suficiente, visto que os solípedes são poucos e encontram-se numa região onde as forragens se vendem muito baratas.
Também a verba de prémios do alistamento nada tem com as despesas de alimentação e fardamentos, para as quais há as verbas de, respectivamente, 800 e 1:000 contos.
Referiu-se depois o Sr. Cunha Leal à conta de gerência, e disse que estava falseada, afirmando, para o dizer, que as contas de um determinado número de distritos não tinham chegado. Não são essas as informações que me deu o Sr. director de Fazenda Pública que firmou essas contas.
Um àparte do Sr. Cunha Leal.
O Orador: — Já mandei preguntar. Insisti com o director de Fazenda para que
apresentasse o mais depressa possível a conta de gerência, antes de ir para Hum-pata. Dali lhe escrevi e, quando regressei á Loanda, disse-me que estava preso por alguns distritos. Por fim informou-me de que as contas tinham chegado todas, tinham ido para a imprensa e que dentro de poucos dias estariam publicadas.
V. Exa. dá-me outra informação: mas então terei que desconfiar de todos os funcionários, por mais elevada que seja a sua categoria?
Devo declarar que não sou técnico contabilista.
A um contabilista de valor, que reside em Loanda, e que não é funcionário público, pedi que examinasse a conta de gerência e, em conjunto, a opinião que me deu foi perfeitamente concorde. Dessa opinião me servi para parte do discurso que proferi no Conselho Legislativo antes de sair de Angola.
Mandei, também, que o Sr. secretário 4e finanças informasse sôbre a conta de gerência, e a sua informação consta do relatório que apresentei ao Sr. Ministro das Colónias sendo de igual modo concorde.
Faltaram algumas contas dos distritos?
É facto que a pág. 11 o Sr. director de Fazenda diz que alguns elementos faltam, que, como aconteceu com todas as gerências anteriores, não foram liquidatadas, ficando para a conta do ano seguinte.
Será isso, mas o que importa é que se prove irrefutavelmente que, pelo menos, um ano da gerência do Alto Comissário se fez com um orçamento com superavit.
£$m alguma cousa, poderá influir, por exemplo, a falta das contas do Lubango, onde quási se não fazem despesas e as receitas são insignificantes?
Poderá porventura alterar os resultados que estão aqui resumidos e que são os seguintes?
São estas disponibilidades que, evidentemente, marcam qualquer cousa de esfôrço, digna de ser apreciada.
Quanto à situação financeira da província de Angola, sou obrigado a fazer tombem algumas considerações.
Bastante tempo antes de sair de Angola comuniquei por telegrama ao Sr. Mi-
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nistro das Colónias que julgava desafogada a situação financeira da província.
Julgo, porém, que se confundem situações económicas e financeiras do Estado com crises comerciais e más situações bancárias.
Pode dar-se uma crise comerciai ou uma má situação bancária, quer referida a um banco, quer referida a um conjunto de bancos, e a situação do Estado ser desafogada sob o ponto de vista financeiro e sob o ponto de vista económico.
As dívidas de Angola em que tanto se fala não são absolutamente nada, relativamente aos recursos actuais da província e ainda menos em relação aos seus recursos futuros.
As dívidas poderão, ser pagas com um ano de exportação de café da província.
Deve ainda à Metrópole 16:500 contos, provenientes de um empréstimo feito pela Caixa Geral de Depósitos.
Devo dizer à Câmara, que esta dívida é paga com meio ano de exportação de milho.
Por fornecimentos feitos a Angola por conta dos três milhões de libras, está a província pagando, e apenas deve qualquer cousa como 860 contos.
Do empréstimo em francos belgas, feito pela Companhia dos Diamantes, basta apenas dois anos de exportação de diamantes para que a dívida esteja paga.
Nestas condições, eu pregunto se uma província que paga todas as suas dívidas com uma pequena parte da sua exportação, não se pode considerar uma província em boa situação.
Sr. Presidente: a produção da província está aumentando de uma maneira extraordinária e há-de aumentar cada vez mais, e daqui a cinco anos, quem fôr vivo verá a confirmação das minhas palavras, e talvez então não se fale de mim, pela mesma forma como se fala agora.
Apoiados.
Relativamente aos encargos, são apenas de 14 por cento sôbre o orçamento da província. Julgo que não há perigo absolutamente nenhum, pois as maiores dívidas são ao Banco Ultramarino e à Caixa Geral de Depósitos.
Quanto às outras dívidas, elas podem ser saldadas pela forma que há pouco
expus à Câmara, e com certeza nenhum perigo podia advir para a sua soberania.
Disse-se ainda que a nota de Angola não vale nada.
Eu tenho a dizer à Câmara que tenho comprado muita cousa com notas de Angola, que dizem nada valerem, e desde que saí da província monta a perto de 100:000 libras a importância das aquisições feitas com as referidas notas, e muitos comerciantes têm com elas adquirido bastantes cambiais.
A desvalorização que se dá às notas, é precisamente artificial e obedece a outros propósitos que não vale a pena estar neste momento a enumerar.
Sôbre o empréstimo da Companhia dos Diamantes, devo ainda dizer à Câmara mais alguma cousa para completa elucidação;
A importância primitiva do empréstimo foi de 389:000 libras, sendo depois aumentado numa pequena, quantia em francos belgas, gastando-se desta verba apenas cêrca de 3:000 contos em diversos pagamentos no estrangeiro.
Devo informar que desta importância 40:000 libras foram destinadas ao «fundo de reserva», e ao restante foi dada a aplicação que passo a ler.
Sr. Presidente: ainda muito material ferroviário fixo e volante foi adquirido.
Interrupção do Sr. Cunha Leal, que não se ouviu.
O Orador: — O que eu quis dizer foi que as trezentas e tantas mil libras foram gastas na aquisição de material comprado directamente no estrangeiro, como também em Lisboa e em Angola.
Ainda sobre a situação financeira, o Sr. Cunha Leal fez várias referências, à posição do Banco Nacional Ultramarino; pretendendo-se concluir que as dificuldades em fazer transferências de fundos de Angola provêm da política financeira do Alto Comissário e principalmente de se ter realizado um empréstimo de 10:000 contos, ao par.
Êsse empréstimo foi feito em virtude de um contrato realizado com o referido Banco, em que o Estado se obrigou a permitir um aumento de circulação fiduciária até 50:000 contos, mediante o pagamento de uma renda; anual que foi
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fixada proporcionalmente ao valor do empréstimo.
Diz-se que tal empréstimo devia ser exclusivamente aplicado na satisfação de despesas internas.
Não concordo com semelhante modo de ver. Se amanhã o Govêrno da Metrópole efectuar um empréstimo interno para construção de estradas e de caminhos de ferro, está no direito de empregar parte dêsse empréstimo na compra de rails e locomotivas lá fora.
Êste empréstimo começa a ser amortizado só em 1925 e só tem de ser pago em notas de Angola, portanto, em emissões de Angola, que o Govêrno fará nas condições que entender. Eu julgo que tudo está acautelado, e que nós conseguimos com êste empréstimo arranjar as quantias necessárias para o desenvolvimento da província e fazer os trabalhos que lá se têm feito em grande parte, e que se não teriam feito se o empréstimo não se tivesse realizado. Julgo também que êste empréstimo não traz encargos demasiados para a província, nem perigos de espécie alguma.
Isto é o que me quere parecer, mas talvez outros, mais financeiros do que eu vejam melhor.
Estou convencido, de resto, que a situação, mesmo a comercial, se resolve com mais facilidade do que se imagina, porque evidentemente não há região nenhuma que esteja crescendo em produção como Angola está crescendo que possa estar parada» unicamente por uma situação bancária isolada que se apresenta.
Desde que amanhã o Banco Nacional Ultramarino entre noutra feição, e se acomode mais às condições económicas da província, outros bancos se fortaleçam ou apareçam, ou o Govêrno tome medidas a êsse respeito ràpidamente, essa situação transformar-se-há; e mesmo sem isso ela transformar-se-há pelo aumento constante da produção da província.
Digo mais: se não fôsse a greve marítima e as condições do caminho de ferro do Lobito, a situação não tinha chegado à acuidade que chegou, e já estava hoje resolvida.
Apoiados.
É uma questão de exportação, de riqueza e de trabalho, e não uma questão bancária ou financeira.
Talvez não seja êste o modo mais intelectual de ver as cousas, mas é o mais prático. Os números muitas vezes mostram-nos as cousas diferentes do que elas são na realidade. As riquezas de Angola saltam por cima de todas estas pequenas cousas.
Apoiados.
Não há dúvida nenhuma de que a situação chegou a revestir aspectos de certo cuidado, e revestiu-os porque o falso convencimento em que estão determinados organismos ou entidades de que são Estados dentro do Estado, e que o Estado tem continuadamente de se curvar às suas vontades, os levou a fazer isso; mas hoje êsses aspectos estão quási postos de lado. Entretanto, veja mal ou bem, o que vejo é que o Estado é só um, e que todos os interêsses se devem subordinar aos seus. Isto é o que vejo.
Apoiados.
De resto, não quis prosseguir em negociações, que cheguei ainda a iniciar, e que talvez me levassem a um fim de resultados idênticos aos do empréstimo externo, que tanto se apregoou e que ainda se está apregoando junto de mim.
Eram cinco milhões de libras que representariam hoje um encargo anual no Orçamento de 75 mil contos.
Não fiz êsse empréstimo; tenho aliás feito o que se está fazendo em todo o mundo, isto é, procurar no mercado a obtenção de cambiais.
Foi assim, Sr. Presidente, que depois disso anunciado, e não se podendo fazer qualquer compra que não fôsse por intermédio de qualquer banco, se compraram nos anos de 1921-1923 quarenta a cinqüenta mil libras.
Havendo necessidade, como havia, de comprar cambiais, não se podendo realizar o empréstimo, necessário foi fazer essa operação bancária, tendo ela sido feita da seguinte forma, conforme vou expor à Câmara em poucas palavras.
Tendo havido, como já disse, necessidade de adquirir na praça cambiais necessárias para fazer face à situação, fez-se expedir uma circular para a compra dessas cambiais por parte do Estado às seguintes casas bancárias:
Banco Nacional Ultramarino, Banco Colonial Português e as casas Galileu,
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Correia & C.a e Sousa Machado & C.a, dizendo-lhes que o Govêrno de Angola carecia de determinada quantia em cambiais sôbre Londres e Lisboa, e pregun-tando-lhes se as podiam satisfazer, na certeza do que o mesmo Govêrno estaria autorizado por nota do Conselho Executivo a fazer depósitos a prazo e a juro a combinar nas casas fornecedoras de cambiais, obtendo-se as respostas que vou referir.
O Banco Nacional Ultramarino respondeu dizendo que não lhe interessava a operação.
O Banco Colonial Português tratou o fornecimento de um determinado número de cambiais, não recebendo, porém, depósito algum, visto ter lá o Estado a 5 1/2 por cento um depósito de 3:500 contos de fundos de reserva.
A casa bancária Sousa Machado & C.ª comprometeu-se a fornecer grande número de cambiais (300:000 libras e 12:000 contos, se não estou em erro), recebendo um depósito a prazo e ao juro de 8 4/2 por cento.
Isto foi levado ao Conselho Executivo que autorizou a publicação do respectivo diploma para dispor do dinheiro para êsse fim. Lavrou-se, pois, o contrato nos livros da Repartição Superior de Fazenda da Província. Fizeram-se os contratos com várias casas, entre elas Galileu Correia e Angola & Congo, que, a breve trecho, desistiram deles, com o fundamento de que não tinham interêsses, sendo-lhes aceita a desistência.
A casa Sousa Machado & C.ª e o Banco Colonial Português, porém, continuaram cumprindo os seus contratos.
Há semanas, vendo que já tinha as cambiais suficientes para fazer face aos encargos de Angola no estrangeiro e que devia e podia contar com outras origens de cambiais, mandei notificar que os contratos seriam denunciados a partir de 1 de Março próximo, e deixei assim de fazer concorrência ao comércio e ao Banco Nacional Ultramarino na compra do cambiais.
Fui, é certo, um comerciante na compra de cambiais, mas entre o não poder o Estado pagar os seus compromissos no estrangeiro e fazer a operação da maneira por que a fiz, optei pela compra das cam-
biais, e tudo se fez após as consultas às entidades competentes.
Referiu-se também o Sr. Cunha Leal ao pouco que se fez em Angola. Por minha parte só tenho que pedir desculpa ao País de não ter podido fazer mais. Fiz, porém, o que pude e o que devia fazer.
Como homem de acção, acostumado a trabalhar e a ver o que se faz por todo o mundo, julgo que alguma cousa fiz e que proveitosos resultados não de advir num futuro próximo, e alguns já produziu sob o ponto de vista internacional.
A minha acção na província de Angola foi-me indicada não só no acto da minha nomeação, mas na Conferência da Paz, e consegui afastar os perigos que sôbre aquela nossa colónia pairavam, perigos que eu palpei, que eu senti com o coração a sangrar, no acto da realização dessa Conferência.
Daqui a alguns anos, quando eu já não existir, acabado o tumultuar de paixões, Justiça merecida se há-de fazer à minha acção. Estou absolutamente certo disso, digo-o em minha consciência. Então, se avaliará bem o meu esfôrço, as minhas canseiras, os tormentos grandes que passei para o engrandecimento da minha Pátria.
Disse, também, que nós tínhamos de olhar de mais alto para podermos desempenhar, naquela região tam nos sã, idêntica missão à que desempenhámos no Brasil, hoje uma das mais poderosas e ricas nações do mundo perante o qual a sua prosperidade não pode deixar de ser encarada como o produto 4a grande civilização latina, ou, melhor, da grande civilização portuguesa.
Muitos apoiados.
Sr. Presidente: é possível que eu tenha praticado erros; é possível que eu tenha praticado actos violentos e, porventura, escusados; é possível que outros, com mais génio, com mais iniciativa e com maior espírito de organização, tivessem conseguido ir além do que eu fui em matéria de práticas e úteis realizações. É possível. O que, porém, é certo é que tudo quanto fiz, pouco ou muito, a história o há-de dizer, e fiz sempre com a consciência de que fazia bem.
Nesta hora solene para mim posso levantar a minha voz com orgulho e afir-
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mar que procedi sempre como um português.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem.
O orador foi muito cumprimentado.
O discurso será publicado na integra, revisto pelo orador, quando, nestes termos, restituir as notas taquigráficas que lhe foram enviadas.
O Sr. Cunha Leal: — Sr. Presidente faltam apenas 10 minutos para se entrar no período dê antes dê se encerrar à sessão. Acho que não vale a pena iniciar hoje as minhas considerações. Se V. Exa. mo permite, fico com a palavra reservada para amanha.
O Sr. Presidente: — Fica V. Exa, com a palavra reservada.
Vai entrar-se no período de antes de se encerrar a
O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente:, muito gostaria que o Sr. Ministro do trabalho estivesse presente, mas o facto de assim não suceder não não leva a desistir da palavra e a deixar de fazer algumas considerações, que eu peço a algum dos Srs. Ministros presentes o fator de transmitir a êsse seu colega.
O decreto n.º 9:4$5 aprova certo regulamento do Hospital, D. Leonor, das Caldas da Rainha. Seria interessante sabor a génesis dêsse regulamento para bem nos convencermos de que o Sr. Ministro ao Trabalho, êsse esplêndido Ministro para o qual não há dificuldades, atendeu apenas a um dos membros da comissão administrativa dêsse hospital.
O Sr. Ministro do Trabalho por si só, sem a Câmara õ autorizar, permitiu-se a audácia dê afirmar que uma parte do Hospital de D. Leonor seria adjudicada a uma empresa nos termos de um concurso.
Isto não pode ser e não há-de ser.
O Sr. Ministro do Trabalho não pode dispor dos bens da Nação, quer seja por concurso ou não, sem que o Parlamento o autorize.
É bom que os Ministros, e de mais a mais sendo de Trabalho, se habituem a trabalhar direito.
Mas o Sr. Ministro do Trabalho, êsse esplêndida Ministro da República para
quem não há dificuldades, foi mais longe e sancionou um verdadeiro abuso que é aquele que vou apontar.
Havendo um inspector clínico no Hospital de D. Leonor, nas Caldas da Rainha, a que me venho referindo, sendo encarregado de fazer um relatório sôbre águas termais, êsse inspector veio dia a dia adiando a elaboração dêsse relatório, pedindo sucessivas autorizações para não estar no seu lugar.
Pois o Sr. Ministro do Trabalho autoriza que terminada a época balnear o dito inspector clínico se possa ausentar das Caldas da Rainha, dando-lhe licença de seis meses, até Abril!
Isto não pode ser! Têm de se modificar e há-de modificar-se!
O Sr. Ministro dó Trabalho não pode ter estas generosidades, e, quando as queira fazer, faça-as db seu bolso.
Sr. Presidente: vê V. Exa. e vê a Câmara que é tempo de fazer administração em regime normal, e quem quer que seja, Ministro ou não.
E os dois casos que expus à Câmara são bastantes para que o Sr. Ministro do Trabalho se apresse a modificar êste estado de cousas.
Apartes.
O Sr. Vitorino Guimarães (interrompendo): — Espere por essa.
O Orador: — Espere por essa, não, porque êste proceder, tem de se modificar.
Tenho dito.
O orador não reviu, nem o Sr: Vitorino Guimarães fez a revisão do seu aparte.
O Sr. Ministro da Justiça e dos Cultos (José Domingues dos Santos): — Sr. Presidente: pedi a palavra para dizer ao Sr. Carlos Pereira que comunicarei ao Sr. Ministro do Trabalho as considerações que S. Exa. acaba de fazer.
Tenho dito.
O orador não reviu.
O Sr. Presidente: — A próxima sessão é amanhã, 26, às 14 horas, com a mesma ordem db dia.
Está encerrada a sessão.
Eram 19 horas e 30 minutos.
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Documentos mandados para a Mesa durante a sessão
Projecto de lei
Do Sr. Dinis de Carvalho, desanexando da freguesia de Manique do Intendente,
do concelho de Azambuja, diversos lugare e casais e com êles criar a freguesia
de Vila Nova de S. Pedro.
Publicado no «Diário do Governo», volte para ser admitido.
O REDACTOR—Sérgio de Castro.