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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

SESSÃO N.º 94

EM 2 DE JUNHO DE 1924

Presidência do Exmo. Sr. Alberto Ferreira Vidal

Secretários os Exmos. Srs.

Baltasar de Almeida Teixeira
José Marques Loureiro

Sumário.— Abertura da sessão. Leitura da acta. Correspondência.

Antes da ordem do dia.— O Sr. Tavares de Carvalho ocupa-se da especulação cambial e do assambarcamento dos géneros e manda para a Mesa um requerimento.

Responde-lhe o Sr. Nuno Simões (Ministro do Comércio}.

O Sr. Carlos Pereira ocupa-se da noticia dada pelos jornais sôbre ter sido elevada a embaixada a nossa representação diplomática em Londres e lembra a necessidade de ouvir sôbre o caso o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros.

O Sr. Domingos Pereira (Ministro dos Negócios Estrangeiros) responde às considerações feitas pelo orador antecedente.

O Sr. António Maia protesta contra o decreto n.° 9:749 que reputa anticonstitucional e envia para a Mesa uma moção.

O Sr. Américo Olavo (Ministro da Guerra) responde ao Sr. António Maio.

Lida na Mesa a moção do Sr. António Maia, não é admitida. Procedendo-se à contraprova, requerida pelo Sr. António Maia com a invocação do § 2.° do artigo 116.° do Regimento, verifica-se ter sido rejeitada a admissão por 38 votos contra 22.

Usam da palavra para explicações os Srs. António Maia, Lopes Cardoso e Ministro da Guerra. Tendo o Sr. Presidente consultado a Câmara sôbre se o Sr. Lelo Portela poderia usar da palavra para explicações, usa da palavra sôbre o modo de votar o Sr. Lelo Portela.

A Câmara nega a palavra para explicações do Sr. Lelo Portela.

O Sr. Álvaro de Castro (Presidente do Ministério e Ministro das Finanças) envia para a Mesa uma proposta de lei, para a qual pede a urgência e a dispensa do Regimento, que lhe são concedidas. Entrando em discussão na generalidade, usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva e Marques Loureiro que manda para a Mesa uma proposta adiando alguns artigos novos.

O Sr. Ministro das Finanças responde ao orador antecedente, e em seguida é aprovada na generalidade a proposta em discussão.

Entrando em discussão na especialidade, e lido o artigo 1.°, o Sr. Marques Loureiro requere que seja discutido o corpo do artigo 1.º, isoladamente do seu parágrafo.

É aprovado.

É aprovado o corpo do artigo 1.º

Lida na Mesa a substituição enviada para a Mesa pelo Sr. Marques Loureiro, é admitida.

Usam da palavra os Srs. Carvalho da Silva e Constando de Oliveira.

O Sr. Marques Loureiro requere a prioridade para a votação do seu artigo de substituição.

É aprovado.

A Câmara rejeita em seguida o artigo de substituição do Sr. Marque» Loureiro e aprova o § único do artigo 1.° da proposta.

Lido na Mesa o artigo 2.º, usa da palavra o Sr. Almeida Ribeiro que manda para a Mesa uma proposta.

É admitida.

Seguem-se no uso da palavra os Srs. Marques Loureiro, Velhinho Correia, Almeida Ribeiro, Carvalho da Silva, Francisco Cruz e novamente o Sr. Marques Loureiro.

É aprovada a proposta do Sr. Almeida Ribeiro.

É lido na Mesa e aprovado um artigo novo do Sr. Marques Loureiro.

É dispensada a leitura da última redacção a requerimento do Sr. Velhinho Correia.

É aprovada a acta.

O Sr. Agatão Lança requere autorização para que a comissão de marinha reúna amanhã durante a sessão.

É autorizada.

São admitidas à discussão algumas proposições de lei.

Ordem do dia. —É lida na Mesa a moção enviada para Mesa, na última sessão, pelo Sr. António Correia.

É admitida.

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2 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Pedro Pita envia parada Mesa uma moção, defendendo-a com largas considerações.

Seguem-se no uso da palavra os Srs. António Maia, Carvalho da Silva e Hermano de Medeiros (sobre a ordem), ficando com a palavra reservada.

Usa da palavra para interrogar a Mesa o Sr. Carvalho da Silva.

O Sr. Presidente interrompe a sessão para continuar às 21 horas e meia.

Reaberta a sessão, o Sr. Carvalho da Silva re-quere que seja discutido, antes de qualquer parecer, o Orçamento Geral do Estado.

O Sr. Presidente declara que o objecto do requerimento é matéria duma proposta e não dum requerimento.

O Sr. Carvalho da Silva insiste no seu requerimento.

O Sr. Presidente declara que está em discussão o parecer n.° 465-(c),

O Sr. Carvalho da Silva continua protestando com apoio dalguns Deputados da oposição.

Tendo o Sr. Presidente concedido a palavra ao Sr. Álvaro de Castro (Presidente do Ministério) continuam os protestos.

O Sr. Pedro Pita usa da palavra para interrogar a Mesa.

O Sr. António Maia requere a dispensa da leitura do parecer n.º 465-(c).

É aprovado êste requerimento.

Efectuada a contraprova requerida pelo Sr. António Maia, que invoca o § 2.º do artigo 116.° do Regimento, verifica-se ter sido aprovado o requerimento por 29 votos contra 9, número, insuficiente para a continuação dos trabalhos.

Tendo respondido à chamada 39 Srs. Deputados, o Sr. Presidente encerra a sessão, marcando a seguinte com a respectiva ordem do dia.

Abertura da Sessão às 15 horas e 20 minutos.

Presentes 39 Srs. Deputados.

São os seguintes:

Adolfo Augusto de Oliveira Coutinho.

Alberto Ferreira Vidal.

Albino Pinto da Fonseca.

Amaro Garcia Loureiro.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Correia.

António Pais da Silva Marques.

António Pinto Meireles Barriga.

António Resende.

António de Sousa Maia.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Rodrigues de Almeida Ribeiro.

Augusto Pires do Vale.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Carlos Cândido Pereira.

Constâncio de Oliveira.

Custódio Martins de Paiva

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

João Cardoso Moniz Bacelar.

João José da Conceição Camoesas.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

José Carvalho dos Santos.

José Marques Loureiro.

José Mendes Nunes Loureiro.

José Novais de Carvalho Soares de Medeiros.

José Pedro Ferreira.

Júlio Gonçalves.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Manuel Alegre.

Manuel Ferreira da Rocha.

Manuel de Sousa da Câmara.

Pedro Góis Pita.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Sebastião de Herédia.

Tomás de Sousa Rosa.

Ventura Malheiro Reimão.

Viriato Gomes dá Fonseca.

Vitorino Henriques Godinho.

Vitorino Máximo de Carvalho Guimarães.

Entraram durante a sessão os Srs.:

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Afonso de Melo Pinto Veloso.

Albano Augusto de Portugal Durão.

Alberto Lelo Portela.

Alberto de Moura Pinto.

Alberto da Rocha Saraiva.

Alfredo Ernesto de Sá Cardoso.

Álvaro Xavier, de Castro.

Américo Olavo Correia, de Azevedo.

Aníbal Lúcio de Azevedo.

António Abranches Ferrão.

António Lino Neto.

António de Paiva Gomes.

Armando Pereira de Castro Agatão Lança.

Artur Alberto Camacho Lopes Cardoso.

Artur Brandão.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Bernardo Ferreira de Matos.

Carlos Olavo Correia de Azevedo.

Custódio Maldonado de Freitas.

Domingos Leite Pereira.

Ernesto Carneiro Franco.

Francisco Cruz.

Francisco Dinis de Carvalho.

Francisco Pinto da Cunha Leal.

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Sessão de 2 de Junho de 1924 3

Hermano José de Medeiros.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

Jaime Júlio de Sousa.

Jaime Pires Cansado.

João José Luís Damas.

João Luís Ricardo.

João de Ornelas dá Silva.

João Pereira Bastos.

João Pina de Morais Júnior.

Joaquim António de Melo e Castro Ribeiro.

Joaquim Brandão.

Joaquim, Dinis da Fonseca.

José Domingues dos Santos.

Lourenço Correia Gomes.

Lúcio de Campos Martins.

Luís da Costa Amorim.

Mariano Rocha Felgueiras.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Matias Boleto Ferreira de Mira.

Nuno Simões.

Paulo Cancela de Abreu.

Plínio Octávio de Sant'Ana e Silva.

Vergílio Saque.

Não compareceram à sessão os Srs.:

Abílio Correia da Silva Marçal.

Abílio Marques Mourão.

Afonso Augusto da Costa.

Aires de Ornelas e Vasconcelos.

Alberto Carneiro Alves da Cruz.

Alberto Jordão Marques da Costa.

Alberto Xavier.

Alfredo Pinto de Azevedo e Sousa.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

Amadeu Leite de Vasconcelos.

Américo da Silva Castro.

Angelo de Sá Couto da Cunha Sampaio Maia.

António Alberto Tôrres Garcia.

António Albino Marques de Azevedo.

António Dias.

António Ginestal Machado.

António Joaquim Ferreira da Fonseca.

António Maria da Silva.

António de Mendonça.

António Vicente Ferreira.

Augusto Pereira Nobre.

Bartolomeu dos Mártires de Sousa Severino.

Carlos Eugénio de Vasconcelos.

David Augusto Rodrigues.

Delfim de Araújo Moreira Lopes.

Delfim Costa.

Eugénio Rodrigues Aresta.

Fausto Cardoso de Figueiredo.

Feliz de Morais Barreira.

Fernando Augusto Freiria.

Francisco Coelho do Amaral Reis.

Francisco da Cunha Rêgo Chaves.

Francisco Manuel Homem Cristo.

Germano José de Amorim.

Jaime Duarte Silva.

João Baptista da Silva.

João Estêvão Águas.

João Salema.

João de Sousa Uva.

João Teixeira de Queiroz Vaz Guedes.

João Vitorino Mealha.

Joaquim José de Oliveira.

Joaquim Ribeiro do Carvalho.

Joaquim Serafim de Barros.

Jorge Barros Capinha.

Jorge de Vasconcelos Nunes.

José António de Magalhães.

José Cortês dos Santos.

José Joaquim Gomes de Vilhena.

José Mendes Ribeiro Norton, de Matos.

José Miguel Lamartine Prazeres da Costa.

José de Oliveira da Costa Gonçalves.

José de Oliveira Salvador.

José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.

Júlio Henrique de Abreu.

Juvenal Henrique de Araújo.

Leonardo José Coimbra.

Lúcio Alberto Pinheiro dos Santos.

Manuel de Brito Camacho.

Manuel Duarte.

Manuel Eduardo da Costa Fragoso.

Manuel de Sousa Coutinho.

Manuel de Sousa Dias Júnior.

Marcos Cirilo Lopes Leitão.

Mariano Martins.

Mário de Magalhães Infante.

Maximino de Matos.
Paulo da Costa Menano.

Paulo Limpo de Lacerda.

Pedro Augusto Pereira de Castro.

Rodrigo José Rodrigues.

Teófilo Maciel Pais Carneiro.

Tomé José de Barros Queiroz.

Valentim Guerra.

Vasco Borges.

Vergílio da Conceição Costa.

Às 15 horas principiou a fazer-se a chamada.

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4 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Presidente: — Estão presentes 39 Srs. Deputados. Está aberta a sessão. Vai ler-se a acta. Eram 15 horas e 20 minutos. Leu-se a acta. Deu-se conta do seguinte

Expediente

Ofícios

Do Ministério da Guerra, para que seja aumentada a importância respeitante ao artigo 57.° da proposta orçamental para 1924-1925, com mais 12.325&

Para a comissão do Orçamento.

Da Associação Comercial de Lisboa, para rejeição duma emenda do Sr. Senador Costa Júnior ao artigo 1.° do projecto de lei do inquilinato.

Para a Secretaria.

Da Associação de Comerciantes do Pôrto, para que o Parlamento prossiga na defesa do bom nome português.

Para a Secretaria.

Telegrama

Dos presos militares de S. Julião da Barra e Trafaria, lembrando a concessão da amnistia.

Para a Secretaria.

Requerimento

De Nuno Mário Marques da Cunha, para que seja modificada a lei do inquilinato no sentido de poder habitar nina casa de que é proprietário e que teve de arrendar por motivo de ter sido mobilizado.

Para as comissões de legislação civil e comercial.

O Sr. Presidente: — Vai entrar-se no período de «antes da ordem do dia».

O Sr. Tavares de Carvalho: — Sr. Presidente: desejava que estivessem presentes os Srs. Ministros das Finanças e da Agricultura, mas como vejo o Sr. Ministro do Comércio, peço a S. Exa. a fineza de me atender e comunicar aos seus colegas do Gabinete as considerações que vou fazer.

Referindo-me em primeiro lugar à situação cambial, de\Ao dizer que tive conhecimento de que nestes últimos dias se têm passado na Bolsa cousas edificantes. Não sabia que havia zangãos, e como não bastassem os banqueiros, que não são republicanos, e que tem contribuído para a desvalorização da nossa moeda, apareceu esta nova classe de vampiros, cuja obra adentro da Bolsa é prejudicial para o País, agravando ainda mais o custo da vida.

É preciso que o Govêrno expulse da Bolsa todos êsses indivíduos e os ponha até na fronteira, como indesejáveis, porque mão são portugueses.

Desejava também preguntar ao Sr. Ministro da Agricultura o que há sôbre assambarcamento de açúcar no Pôrto.

Consta-me que foram apreendidos naquela cidade cêrca de dois milhões de quilos de açúcar, que, tendo sido adquirido a 3$00, e a 3$50, estava para ser vendido a 8$00 e a 10$00.

Consta-me também que muitas pessoas altamente colocadas procuram abafar essa apreensão.

Contra isto protesto; o, se souber o nome dêsses indivíduos, amigos ou adversários, não tenho dúvida, som ser delator, em vir dizê-lo ao Parlamento, para que o País saiba quem são os homens que pretendem abafar questões desta natureza.

Em Lisboa não haverá êsses assambarcamentos, porque estou convencido do que o Sr. Comissário dos Abastecimentos tomará as devidas providências, indo buscá-lo onde estiver.

Como não está presente qualquer outro membro do Govêrno, limito por aqui as minhas considerações, aproveitando a ocasião para requerer a V. Exa. se digne consultar a Câmara sôbre se concente que os pareceres n.ºs 611—A e 633 sejam inscritos nos período de antes da ordem do dia, sem prejuízo dos oradores inscritos.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — Mais uma vez o Sr. Tavares de Carvalho, no louvável intuito de comentar os acontecimentos que mais reclamam a atenção da Câmara, referiu casos concretos, como sejam a especulação cambial e o assambarcamento

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de determinada quantidade de açúcar no Pôrto.

Pela minha parte, limito-me a declarar mais uma vez que transmitirei aos Srs. Ministros das Finanças e da Agricultura as considerações que S. Exa. fez.

Estou absolutamente certo de que êles toma-las-hão na devida conta, procedendo como é habitual e de justiça.

O Sr. Tavares de Carvalho referiu-se ao agravamento cambial nos últimos dias. S. Exa. ignora com certeza que o ambiente criado em oposição aos esfôrços do Oovêrno é o principal causador dêsse agravamento.

Referiu-se também S. Exa. à situação dos zangãos, que por vezes têm sido já perseguidos pelo Govêrno.

Sobre êste ponto, devo dizer que o Sr. Ministro das Finanças não deixará de providenciar com urgência.

Quanto ao caso passado na cidade do Pôrto, e a que V. Exa. aludiu, transmiti-lo hei ao Sr. Ministro da Agricultura, que providenciará sem hesitação, o quede-, resto costuma fazer sempre quando se trata de defender os interêsses do País é do consumidor.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Carlos Pereira: — Sr. Presidente: os jornais dizem que a nossa legação em Londres foi elevada a embaixada.

Representa êste facto, sem dúvida, um triunfo do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros; no emtanto, já por aí se diz e se escreve em letra redonda,que, tendo sido nomeado embaixador em Londres o Sr. general Norton de Matos, o Ministro português que ali estava irá ocupar a legação de Paris, pois que, dizem também, êsse senhor tem as melhores relações pessoaes com o Presidente do Conselho de Ministros da França, Sr. Herriot.

Desejava preguntar ao Sr. Ministro dos Estrangeiros se, do facto, êsse «diz-se» é verdadeiro; se a amizade de dois homens pode ser superior aos Interesses dum País, ou se, pelo contrário, a dar-se êsse movimento na nossa diplomacia, êle seria proveniente do Sr. António da Fonseca, nosso Ministro em Paris, ter-se manifestado por forma a que o Govêrno se veja na necessidade do o substituir.

Creio que êste facto não se dá, mercê das brilhantes qualidades do espírito que ornam aquele nosso Ministro.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Domingos Pereira): — Sr. Presidente: era minha intenção vir a esta Câmara, comunicar (o que faço com vivo prazer) que efectivamente o Govêrno Inglês elevou a sua legação em Lisboa à categoria de embaixada, e que o Govêrno Português elevou também a sua legação em Londres à mesma cotegoria.

O Sr. António Maia: — Compressão de despesas.

O Orador: — Êste facto, suponho que é para ser considerado por todos os portugueses como uma manifestação do que a Inglaterra, a poderosa Nação amiga e aliada de Portugal, tem pela terra, portuguesa, pela Pátria portuguesa e pela República Portuguesa - uma alta consideração.

As negociações que as duas chancelarias entabularam para êste resultado vêm desde muito tempo.

O actual Presidente da República, quando Ministro de Portugal em Londres, sob as instruções do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal, procedeu a negociações e travou conversação com o Foreign Office, que foram dirigidas pelo o alto patriotismo e a alta inteligência que caracterizam o Sr. Teixeira Gomes.

Isto prova quanto S. Exa. se empenhou junto do Foreign Office para que o compromisso da Inglaterra se efectivasse, e se efectivasse com toda a honra e prestigio para nós.

Apoiados.

É justo não esquecer que o actual Ministro de Portugal em Londres iniciou a sua carreira diplomática no pôsto difícil, como é o do representante do Portugal em Inglaterra, com todo o brilho, pondo em relevo nas suas negociações com o Foreign Office as suas altas faculdades de inteligência e patriotismo.

Evidentemente que tais triunfos não podem conseguir-se se as circunstâncias do país no estrangeiro não forem inteiramente favoráveis ao seu nome. Os esfor-

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cos dos homens valerão pouco se o país todo não souber conquistar o respeito das nações. Fez-se agora uma prova que lisonjeia o nosso orgulho. É uma prova que satisfaz inteiramente às nossas aspirações. É uma prova de que Portugal goza justamente prestígio na Inglaterra; é uma prova de que goza justamente prestígio no estrangeiro. De onde vem êsse prestigio? Vem de várias circunstâncias; mas vem sobretudo da circunstância de em Portugal, há tempo a esta parte, se ter estabelecido uma atmosfera de calma e tranqüilidade nas lutas políticas,

Sem embargo das divergências que possam caracterizar os diferentes grupos que aspiram a dirigir os destinos da nação, o que excerto é que há evidentemente um entendimento, mais tácito e expresso, que mais resulta das circunstâncias e do critério dos homens do que de quaisquer combinações feitas, e que as lutas que tanto infelicitaram a nação não devem reproduzir-se e repetir-se. Felizmente atravessamos uma era de paz o tranqüilidade — era de paz e tranqüilidade que não envolve de modo nenhum a pretensão de cada grupo político da nação se abster de continuar o seu caminho na defesa dos seus princípios. Mas a política externa tem demonstrado muitas vezes que é sempre um reflexo da política interna.

Se na política interna do país enveredássemos de novo por uma política de agitação, evidentemente que a política externa devia ressentir-se também.

Era esta comunicação que eu queria fazer à Câmara.

Ao Sr. Carlos Pereira, que se antecipou na sessão de hoje a tratar dêste assunto, desejo responder apenas o seguinte:

O Sr. Ministro de Portugal em França tem a confiança do Govêrno português Toda a Câmara conhece as suas altas qualidades de talento, as suas notáveis faculdades de trabalho e o seu patriotismo, tantas vezes revelado, e que não deixou de manifestar no pôsto que há pouco tempo ocupa de representante oficial de Portugal na capital francesa.

Não há acto nenhum praticado que de qualquer modo possa deminuir o reconhecimento das qualidades que eu aponto, e

que são conhecidas e reconhecidas por toda a gente em Portugal.

Não é meu intento deslocar o Sr. António Fonseca de representante de Portugal em França. Por mim, devo dizer que emquanto eu fôr Ministro dos Negócios Estrangeiros, desde que S. Exa. se conduza como se tem conduzido até agora, não pode haver da minha parte senão o desejo de que S. Exa. ocupe aquele lugar, que com tanta honra e brilho para o país tem ocupado.

Apoiados.

Vozes: — Muito bem.

O orador não reviu.

O Sr. António Maia: — As palavras pronunciadas pelo Sr. Ministro da Guerra não podiam vir mais a propósito.

S. Exa. disse que a Inglaterra nos tinha dado a honra de elevar a nossa legação em Londres a embaixada, graças ao apaziguamento das lutas políticas que tem havido entre nós — lutas que já não revestem um aspecto violento e de revolta

Tem o Govêrno provocado por todos os feitios e por todas as formas que essas revoluções venham para a rua.

Ainda no Diário do Govêrno de 30 de Maio de 1924 vem um decreto que é absolutamente anti-constitucional e ao qual ninguém deve obediência.

Por conseqüência tudo que se quiser fazer à sombra dêste decreto é absolutamente ilegal, e todas as revoltas são legítimas para obstar ao cumprimento dêste decreto.

Sr. Presidente: o decreto n.° 9:749 é um decreto que revoga um outro com fôrça de lei. Só esta Câmara podia fazê-lo, a não ser que nós, Deputados, sejamos um frangalho.

Sr. Presidente: êste decreto é ilegal, é uma provocação à 5.ª arma. Êsse decreto atira à 5.ª arma com um punhado de...

A palavra que remata a frase, por não ter representação taquigráfica, deixou de ser incluída nas notas dos Sr. Taquígrafos.

Vozes: — Isto não pode ser.

Diversos àpartes.

O Sr. Presidente: — Convido V. Exa. a retirar essa palavra.

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O Orador: — Apesar de estarem senhoras na galeria, não acho que empregasse indevidamente essa palavra. Ela foi pronunciada por Cambronne e considerada por Vítor Hugo como uma das mais belas.

Vozes: — Não pode ser.

O Sr. Presidente: — Eu já pedi a V. Exa. para retirar essa palavra.

O Orador: — Eu peço a V. Exa. que me diga se essa palavra não está nos dicionários, da língua portuguesa.

Vozes: — Não pode ser.

Àpartes.

O Sr. Presidente: — Não é própria de V. Exa. nem do lugar em que estamos. Apoiados. Muitos apoiados.

O Orador: — Bem, Sr. Presidente, eu substituo a palavra que pronuciei pela palavra «lama».

E faço-o única e exclusivamente pela consideração que tenho pela Câmara. Sr. Presidente: êste decreto é positivamente lama atirada à cara da 5.ª arma.

Esta arma é composta por soldados que todos os dias, a todos momentos, estão fazendo sacrifícios.

Sr. Presidente: o lugar do Ministro da Guerra Américo Olavo é a dirigir a sua fábrica.

Aí terá mais competência.

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Apoiado!

O Orador: — É bom que V. Exa. diga apoiado, pois reconhecendo isso revela o seu merecimento.

Êste decreto tem mais ainda o agravamento de ter sido feito às escondidas, jesuiticamente, sem ter nenhuma atenção pelo homem que dirigia essa arma.

Veja V. Exa. a atitude do Ministro da Guerra para com êste homem e para com outro que se chama Freitas Soares.

É uma verdadeira provocação à aviação.

Apoiados.

Veja V. Exa. qual é o procedimento do Ministro da Guerra e o dêsse cobarde
Freitas Soares, que continua na Escola de Guerra e não se quis bater comigo
quando outros o fizeram.

Não quero tomar mais tempo à Câmara e mando para a Mesa a minha

Moção

A Câmara dos Deputados, reconhecendo, que o decreto n.° 9:729, de 30 de Maio do corrente ano, ô inconstitucional, passa à ordem do dia.— O Deputado, António Maia.

O orador não reviu.

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Sr. Presidente: esta questão é de uma grande simplicidade.

Em 25 de Junho de 1918 o Govêrno de Sidónio Pais publicou um decreto que não teve ainda bill de indemnidade.

Apartes.

O Sr. António Maia: — Haja a coragem de derrogar todos os decretos dêsse tempo.

O Orador: — Foram os próprios aviadores que solicitaram.

O Sr. António Maia: — Ainda bom que V. Exa. diz «solicitaram»; mas diga também quem foi que solicitou.

O Orador: — Foram os Srs. Freitas Soares e Helder Ribeiro.

O Sr. António Maia (interrompendo): — Quem informou V. Exa. errou.

Foi apenas solicitado o Sr. Freitas Soares.

O Orador: — É possível, mas a informação que tenho é de que tendo o Sr. Dr. Carlos Lopes, módico militar, declarado que o Sr. Freitas Soares estava impossibilitado de fazer vôos por motivo de saúde, fora alvitrada a nomeação para comando da aeronáutica, do tenente-coronel Sr. Helder Ribeiro.

Não há dúvida de que foi por solicitação da aviação militar que se nomeou um tenente-coronel que nunca tinha voado, nem poderia voar.

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8 Diário da Câmara dos Deputados

Parece-me que toda a Câmara entenderá que a medida que tomei é justa e legal.

Não há nenhum propósito de atirar lama à aviação; há apenas a necessidade de exercer uma forte acção disciplinar.

O Sr. António Maia: — Espere pela pancada, com a acção disciplinar.

O Orador: — Eu espero por todas as pancadas.

O Sr. António Maia: — Já sabemos que V. Exa. é muito teso!

O Orador: — Emquanto cumprir com o meu dever não receio nada; e fique V. Exa. certo de que cumprirei até o fim ò meu dever de soldado e de Ministro da Guerra.

Não tenho para com a aviação outro propósito que não seja o de melhorar os seus serviços que andam mal, quer sob o ponto de vista disciplinar, quer sob o ponto de vista administrativo.

O Sr. António Maia: — Foi o que fez o tal Freitas do Amaral.

O Orador: — Não sei.

O que sei é que como estão os serviços não podem continuar.

O país não pode aceitar a situação de privilégio para a aviação, quando todas as outras armas estão votadas ao abandono, pois todas elas estão numa situação precária de material.

Não se compreende que seja necessário gastar só num ano 40:000 contos para a aviação, quando não há espingardas, nem peças de artilharia, nem metralhadoras.

Creio ter demonstrado pelos meus actos que os meus propósitos só têm sido no sentido de bem servir o exército.

A Câmara porém tomará a resolução que enteada acerca da medida que decretei, cabendo-me a mim, se não fôr constitucional o decreto, trazer aqui um projecto que repare essa situação.

Mas nunca deixarei de colocar à frente da aviação militar a pessoa que me dê garantia de que a administração daqueles serviços seja rigorosa, sob o ponto de vista de dinheiros e de disciplina.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Vou pôr à admissão a moção do Sr. António Maia.

Foi lida, na Mesa e seguidamente foi recusada a admissão.

O Sr. António Maia: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° Procede-se à contraprova e contagem.

O Sr. Presidente: — Estão de pé 38 Srs. Deputados e sentados 22. Está recusada a admissão.

O Sr. António Maia: - Peço a palavra para explicações.

O Sr. Presidente: — Tem V. Exa. a palavra para explicações.

O Sr. António Maia: — Os argumentos apresentados pelo Sr. Ministro da Guerra fundam-se no seguinte: os aviadores já pediram que para director da aeronáutica fôsse nomeado um oficial que não fôsse aviador.

Quere dizer que houve um Ministro da Guerra que não se importou com a lei e apenas pensou em satisfazer a vontade aos aviadores.

Então o Sr. Ministro da Guerra actual vai servir-se disso para impor um director à aeronáutica, quando os aviadores pedem o cumprimento da lei.

Mas, para cúmulo, S. Exa. ainda veio dizer-nos que um médico havia dado o oficial Freitas Soares como incapaz para os serviços de aviação.

Pois apesar disso, o tal Ministro da Guerra, que foi o Sr. Álvaro de Castro, achou isso bem.

É aqui está como ambos se juntam — o Sr. Américo Olavo e o Sr. Álvaro de Castro - para formarem uma panelinha.

Não há propósito de achincalhar a quinta arma, mas não houve ao menos a pequena consideração, para com o Sr. Cifka Duarte, de lhe comunicarem a razão por que o exoneravam. Apenas se lhe intimou a exoneração, acrescentando que êle continuaria ao serviço da aviação sob as ordens do novo director.

Só quem não tivesse dignidade aceitaria uma semelhante situação.

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E se às outras armas faltam cavalos e espingardas, à aviação falta-lhe absolutamente tudo, porque é uma arma inteiramente nova.

Sr. Presidente: não quero alongar muito as minhas considerações; o meu vaticínio é êste: rira bien qui rira le dernier!

Ò Sr. Lopes Cardoso: — Peço a palavra para explicações.

O Sr. Presidente: — Não posso dar a palavra a V. Exa. para explicações.

O Sr. António Maia: — Se V. Exa. me dá licença ainda digo mais umas palavras.

O Sr. Presidente: — Fale V. Exa.

O Orador: — Ainda para provar a V. Exa. e à Câmara que poucas bases tinha o Sr. Ministro da Guerra para publicar o seu decreto, basta ler os seus considerandos, que são os seguintes:

Leu.

Oficiais de patente superior são majores, tenentes-coronéis, coronéis, etc.

Êste princípio estava já estabelecido, porque existem três oficiais superiores na aviação.

Mas porque se restringe a escolha do Sr. Ministro da Guerra?

É porque S. Exa. escolheu o major Sr. Aragão e êle teve a dignidade de não aceitar o cargo!

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Não é verdade! Não convidei S. Exa., nem troquei com êle nenhumas palavras a êsse respeito!

O Orador: — O major Sr. Agatão foi convidado; e eu convido S. Exa. que venha aqui desmentir-me.

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Faz V. Exa. muito bem. A única solicitação que recebi, e não de S. Exa. foi para êle comandar um grupo de esquadrões do cavalaria.

O Orador: — Foi êle próprio quem mo disse!

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Isso é com V. Exa. e com êle!

O Orador: — Não, isso é com V. Exa. e com êle!

Mas ainda há mais. A aviação, que é uma parte do exército, precisa de ser comandada por um oficial superior; mas para se ser Ministro da Guerra qualquer major serve.

O Sr. Vitorino Godinho: — V. Exa. esquece-se de que a função do Ministro da Guerra é uma função civil.

Trocam-se àpartes.

O Orador: — Mas diz o Sr. Ministro da Guerra que a razão da sua última nomeação é porque a aviação tem muitos efectivos. Pois S. Exa. mento nesta afirmação...

Vozes: — Não pode ser, não pode ser!

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — V. Exa. tem a intenção de me provocar?

O Orador: — Tenho a intenção de dizer a verdade!

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Se não fôsse Ministro da Guerra, V. Exa. é que não ficaria com êsse ar depois de empregar a palavra «mente».

O Orador: - Pois então, saia V. Exa. daí!

Vozes: — Não pode ser, não pode ser!

Protestos.

O Orador: — As verdades amargam...

O Sr. Carlos Pereira (interrompendo): — Sr. Presidente: o orador já não tinha terminado as suas considerações?

O Sr. Presidente: — Convido o Sr. António Maia a dar por findas as suas considerações.

O Orador: — Vou já terminar, dizendo que há unidades em grandes efectivos que podem ser comandadas por capitães; mas só a aviação que tem tam pequenos efectivos é que precisa de ser comandada superiormente por um coronel.

Tenho dito.

O orador não reviu.

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10 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Lopes Cardoso (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: sôbre uma questão grave apresentou o Sr. António Maia uma moção que não foi admitida. Ora entende a minoria nacionalista fazer declarações severas e sinceras...

O Sr. Carlos Pereira (interrompendo): — A palavra é para fazer declarações ou interrogar a Mesa?

Protestos da minoria nacionalista.

A Presidência chama repetidas vezes a atenção da Câmara.

O Orador: — Sr. Presidente: não desejo falar por uma imposição da nossa parte; mas também não deixarei de falar por uma imposição da maioria, bata ela com quantas mãos quiser nas carteiras.

Apoiados das direitas.

Estou exactamente falando para pedir calma e não para irritar questões.

Apoiados.

Não podia o Partido Nacionalista, repito, ficar silencioso sôbre o que se passou nesta Câmara.

O Sr. Ministro da Guerra é um militar que nós respeitamos é um bravo militar e grande patriota, e quanto a mim é um amigo do exército. Por estas condições e que julgo que se devo falar com clareza.

O Sr. Presidente: — V. Exa. tinha pedido a palavra para explicações, e eu não podia dá-la por minha única deliberação.

Vou porém consultar a Câmara a êsse respeito; é o único caminho que tenho a seguir; porque de contrário era abrir um mau precedente.

O Sr. João Bacelar: — Que V. Exa. tem aberto muitas vezes!

Consultada a Câmara é autorizado 8. Exa. a usar da palavra para explicações,

O Sr. Lopes Cardoso (para explicações): — Sr. Presidente: agradeço muito à Câmara ter-me concedido a palavra neste momento. Preferia devê-la exclusivamente a V. Ex:a, não porque não tenha por toda a Câmara a maior consideração, mas porque, vendo V. Exa. todos os dias dar a palavra a tanta gente nas mesmas circunstâncias em que eu solicitei, entendia que era preferível V. Exa. dar-ma sem consultar a Câmara.

Portanto agradeço à Câmara o ter-me concedido a palavra.

Serei breve, mesmo muito breve, podendo assegurar ao ilustre Deputado que há pouco me interrompeu que as considerações que vou fazer não demorarão a discussão do orçamento pela qual S. Exa. tanto parece interessar-se.

Sr. Presidente: tem êste lado da Câmara dado ao Sr. Ministro da Guerra todo o apoio compatível com a sua situação de oposição.

Dele tem usado S. Exa. como entende.

É preciso porém que nos entendamos, precisando com clareza os termos em que êle é dado e até que ponto S. Exa. pode contar com êle.

Entre a aviação e as outras armas do exército esteve eminente, segundo o significou o Sr. Ministro do Guerra, um conflito de certa gravidade.

S. Exa. teve então ocasião de ver que a minoria nacionalista, longe de tirar do facto efeitos de natureza política, lhe deu todo o concurso para que êsse conflito fôsse solucionado ràpidamente, sem gravame para a disciplina militar e sem desprestígio de poder.

Pois no momento em que todos nós julgávamos que S. Exa. iria proceder com ponderação, removendo com serenidade e prudência alguns obstáculos que porventura surgissem, aparece S. Exa. com um decreto entregando a outra pessoa o comando da aviação, que estava a cargo do major Sr. Cifka Duarte, comando que êste oficial estava exercendo com aplauso não só dos seus camaradas, mas de todo o país, que tem acompanhado com entusiasmo a sua acção no raid dos gloriosos aviadores que vão a caminho de Macau.

Substituir nesta altura o nome de um republicano sincero e de um patriota ilustre sem um fundamento palpável, nem sequer uma simples satisfação, é...

O Sr. Lelo Portela: — Uma verdadeira provocação.

O Orador: — Se o não é, dá pelo menos essa impressão.

Em que situação fica o Sr. Ministro da Guerra depois dêste seu gesto e em que situação fica a Câmara que o apoia?

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Sessão de 2 de Junho de 1924 11

A minoria nacionalista lamenta que se não tenha aborto um largo debate sôbre êste assunto, esclarecendo-o como a sua importância exige.

Tenho dito.

O orador não revia.

O Sr. Ministro da Guerra (Américo Olavo): — Sr. Presidente: ouvi com toda a atenção as palavras que acaba da proferir o Sr. Lopes Cardoso.

S. Exa., que é um velho amigo meu, há-de fazer-me a justiça de me supor incapaz duma provocação seja a quem fôr, e muito menos a uma parte das mais importantes do exército a que me orgulho de pertencer.

Precisamos não confundir a aviação, duma maneira geral, e em especial, os gloriosos aviadores que estão realizando o raid Lisboa-Macau, com outros aviadores, cujo procedimento não tem estado por vezes absolutamente dentro dos regulamentos disciplinares.

Eu esperava que o Sr. Lopes Cardoso viesse impugnar a constitucionalidade do decreto que mandei publicar.

S. Exa. porém nada disse a tal respeito.

Não se trata, pois, de uma questão de legalismo, mas sim de um caso que se refere apenas à orgânica das instituições militares.

Ora nesse campo só eu sou juiz, só eu sei a distribuição que devo fazer dos oficiais, para maior eficiência dos serviços.

Eu tenho no meu Ministério os elementos necessários para fazer aqui, se fôr preciso, a clara demonstração de que a medida por mim tomada se impunha absolutamente.

Eu aponto ao acaso uma das razões que me levaram á êsse procedimento.

O director da aeronáutica, a propósito de determinada medida tomada pelo Ministério da Guerra, respondeu numa nota dirigida a êsse Ministério: «que não contava que a paternidade de tal absurdo coubesse a Portugal».

Trocam-se àpartes.

Sussurro.

O Sr. Almeida Ribeiro: - Apregoem a revolta!

Façam, façam política!

O Orador: — Pelo que acabo de expor, creio estar justificado o procedimento do Sr. Ministro da Guerra.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Consulto a Câmara sôbre se devo dar a palavra ao Sr. Lelo Portela,- que a pediu para explicações.

O Sr. Lelo Portela: — Peço a palavra sôbre o modo de votar.

O Sr. Presidente: — Tem V. Exa. a palavra sôbre o modo de votar.

O Sr. Lelo Portela: — Cabe à maioria á responsabilidade inteira neste assunto que se deve única e exclusivamente à falta de tática e à provocação constante do Sr. Ministro da Guerra.

Apoiados e não apoiados.

Sr. Presidente: digo e repito que o assunto se deve única e exclusivamente à falta de tática do Sr. Ministro da Guerra. As conseqüências hão-de ser bem mais graves do que aquelas que resultariam se a Câmara desejasse liquidar esta questão, mostrando a constitucionalidade ou a in-constitucionalidade do decreto promulgado pelo Govêrno.

Sr. Presidente: havia uma lei que determinava que os directores da Aeronáutica Militar fossem oficiais especializados, como aliás se acha estabelecido para as outras armas, como, por exemplo, a infantaria, a cavalaria o a engenharia;

O Sr. Ministro da Guerra, porém, pretende agora, estabelecer absolutamente o contrário.

Isto, Sr. Presidente, representa nem mais nem menos do que uma provocação e uma ofensa feita a uma corporação, inteira.

O Sr. António Maia (interrompendo): — Só quem não tem dignidade é que se não sente.

O Orador: — Isto, Sr. Presidente, representa, repito, uma provocação feita a uma corporação inteira, que tam nobre e dignamente tem sabido arriscar a sua vida para bem da Pátria.

Tenho dito.

Consultada a Câmara, é indeferido o pedido do Sr. Lelo Portela.

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12 Diário da Câmara dos Deputados

O Sr. Presidente: — Vai passar-se à ordem do dia.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa a seguinte proposta de lei concebida nos seguintes termos:

Artigo 1.° São isentos do imposto sôbre o valor das transacções os proventos do exercício das profissões liberais.

§ único. Ficam anulados os lançamentos e multas já aplicadas por motivo do imposto e exercício referidos, arquivando-se exofficio os respectivos processos.

Art. 2.° As taxas de contribuição industrial, parte complementar, sôbre os contribuintes indicados no artigo 1.° são aumentadas de 20 por cento.— Álvaro de Castro.

Peço a V. Exa. o obséquio de consultar a Câmara sôbre se dispensa a urgência e a dispensa do Regimento para a minha proposta.

O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados que aprovam a urgência e a dispensa do Regimento para a proposta enviada para a Mesa pelo Sr. Presidente do Ministério, queiram levantar-se.

Está aprovada.

Foi lida na Mesa.

O Sr. Presidente: — Está em discussão na generalidade.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: nós somos, como V. Exa. muito bem sabe, contra a votação, da urgência e dispensa do Regimento para propostas da natureza desta que se discute. No emtanto, reconhecemos a necessidade inadiável que há de sé regular a situação em que se encontram os, profissionais liberais, no caso das multas verdadeiramente inacreditáveis que têm sido lançadas sôbre alguns médicos, em conseqüência de não terem cumprido com uma disposição que se diz existir na lei n.° 1:368 sôbre o valor de transacções.

Quando nesta casa do Parlamento se discutiu a lei n.º 1:368 ficou assente que o imposto sObre o valor de transacções não se aplica às profissões liberais.

A lei foi para o Senado; e por proposta creio eu do Sr. Júlio Ribeiro foi-lhe alterada a redacção.

O que é certo é que a lei voltou a esta Câmara; e, se bem que nós não aceitássemos semelhante disposição, o que é facto é o que se está vendo: lançaram-se as multas mais extraordinárias.

Dir-se-ia vivermos numa República da caça às multas.

Aprovamos, Sr. Presidente, absolutamente o § único que manda anular as multas que têm sido lançadas; mas lembramos ao Sr. Ministro das Finanças a conveniência que há em não anular só essas multas, mas sim todas as outras lançadas ao abrigo da lei n.° 1:368.

Relativamente ao artigo 2.°, não o podemos nós aceitar; pois a verdade é que entendemos que tal se não deve fazer, visto estar a discutir-se nesta Câmara o parecer n.° 717, que para mal do País talvez seja aprovado.

Nestas condições, rejeitamos, repito, o artigo 2.°, lembrando ao Sr. Presidente do Ministério que seria de toda a justiça A. anulação de todas as outras multas que foram aplicadas segundo a lei n.° 1:368.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro) (interrompendo): — Não posso estar de acordo com V. Exa.; e tanto assim que os industriais da Covilhã que a princípio protestaram, estão de acordo em pagar essas multas desde que elas fiquem sujeitas ao regime de licenças, as quais deverão passar de 400 contos para 1:200 contos.

O Orador: — Veio depois um decreto mandando que cada comerciante tenha um livro, não só para o montante das transacções diárias, mas até para escrever os nomes de cada um dos compradores que vão a êsse estabelecimento adquirir qualquer artigo. Quem fôr comprar uma caixa de fósforos, por exemplo, tem de dizer o sou nome e a sua morada...

Interrupção do Sr. Velhinho Correia.

O Orador: — É isto.

O Sr. Presidente, do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — V. Exa. está completamente enganado.

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O Orador: — Quanto às taxas de cobrança, sucedeu que a médicos e a advogados que falaram comigo disse-lhes que não faria sustar o sistema de cobrança até que o Parlamento aprovasse a proposta do Sr. Vitorino Guimarães.

Chegando-se a esta altura a máquina foi continuando a sua marcha. Não fizeram as declarações, foram multados.

O Sr. Morais de Carvalho (interrompendo): — É muito diferente isso.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças Álvaro de Castro): — Não é. Não há um único decreto.

O Orador: — V. Exa. afirma que o comerciante têm tudo escrito. Não tem. Há um grande número que o não tem.

Apoiados.

O Sr. Velhinho Correia: — Têm a conta das vendas. Todos têm essa conta. Trata-se duma alteração ao decreto, para a qual V. Exa. tem de chamar a atenção do Poder Executivo.

O Orador: — Há ainda outra razão: Quando há um imposto complicado como êste é, o contribuinte vê-se por vezes em embaraços paca obedecer à lei. E justo, pelo menos, que se altero a parte das multas. Não lhes negamos o voto, mas achamos isto justo.

O orador não reviu.

O Sr. Marques Loureiro: — Trata-se de uma nova alteração, no propósito do remediar os factos que têm dado lugar a reclamações feitas em todo o País.

Esta proposta tem dois artigos; e é tal a precipitação com que se fazem estas cousas, que lhe falta o artigo em que deve ser revogada a legislação em contrário.

Interrupção do Sr. Ministro das Finanças.

O Orador: — V. Exa. não torna a assinar outra proposta em que não esteja consignado êsse preceito.

Na proposta que estamos a discutir não se alude sequer a que a isenção de que trata começa a vigorar desde hoje em diante, embora no parágrafo único se procure salientar que esta isenção tem

efeito retroativo para os lançamentos feitos e processos.

Assim não se chega a averiguar se há ou não isenção. Era preciso que abertamente se dissesse.

Os chamados profissionais liberais não são apenas os médicos e os advogados.

Corno advogado, tenho os meus impostos todos pagos em dia, pôsto que me repugna pagar o imposto de transacção simplesmente por ter esta designação, que não correspondo à nossa profissão, embora tivesse combatido a incidência dum imposto sôbre as profissões liberais.

A lei n.° 1:368, apesar de publicada há muito tempo, ainda hoje não está regulamentada. Ainda hoje é provisória; mas várias vezes tem sido alterada, havendo diversas disposições legislativas que têm dado margem a abusos a que é preciso pôr termo. Muitos contribuintes houve que tendo ido às repartições respectivas, e encontrando a melhor boa vontade da parte delas de defender os interêsses do Estado, seguiram as indicações que ali lhes deram. Êsses contribuintes encontram-se hoje a braços com processos, em que se lhes exige uma multa enormíssima.

Não preciso repetir algumas das considerações já aqui feitas; mas há casos de multas injustificados.

Se estas multas pudessem proceder, os funcionários de finanças que processaram os conhecimentos deviam todos ser demitidos.

Havia conhecimento das declarações feitas; e não sei realmente como isso se fez.

Foram feitas as declarações em várias terras; e realmente não sei como houve a coragem para impor essas multas.

Àpartes.

O que é certo é que as reclamações são constantes, e as questões que têm ido para os tribunais também são muitas.

Ora isto também representa um encargo para os contribuintes.

Àpartes.

Tem havido muitas desigualdades na aplicação desta lei. Eu e muitos outros da minha comarca temos cumprido a lei, emquanto que outros não a tem cumprido. E nós não desejamos ser vexados.

Àpartes.

Por tudo isto que tenho dito, vou man-

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dar para a Mesa uma proposta com um artigo novo, em que digo o seguinte:

Artigo... Aos contribuintes que ainda não hajam dado cumprimento aos preceitos da lei n.° 1-368 e respectivos decretos e instruções regulamentares, embora contra êles por tal motivo hajam sido levantados autos de transgressão, é permitido pagar as texas e impostos que forem devidos, sem qualquer multa, e apenas com os juros de mora correspondentes.

§ 1.° São anulados de ofício os autos pendentes, logo que seja efectuado o pagamento das taxas e impostos devidos, suspendendo-se, entretanto, seus termos, e os que respeitam a transgressão de disposições revogadas pela presente lei.
§ 2.° Para o efeito dêste artigo os contribuintes apresentarão as respectivas declarações nas repartições e Direcção de Finanças competentes, dentro dss quinze dias seguintes à publicação da lei, a fim de oportunamente serem processados os conhecimentos e efectuado o pagamento do que se liquidar ser devido.
Art. ... Fica revogada a legislação em contrário.

Câmara dos Deputados, 2 de Junho de 1924.— Francisco Cruz — José Marques Loureiro — Adolfo Coutinho.

Muitos contribuintes têm pago taxas que não deviam pagar; mas é preferível isso a terem um processo. Com a minha proposta o Estado não perde de receber, é, entretanto, o Parlamento apreciará se há ou não objecto para tributação nesses que reclamaram.

Com respeito à declaração a fazer em quinze dias, fui informado de que êsse prazo não é bastante.

Àpartes.

Entendo que o Parlamento se prestigia estudando esta lei de modo a estabelecer a moralidade para, que a todos abranja igualmente.

Foi posta em execução, a proposta que todos conhecem, mas não houve a coragem de a regulamentar.

Àpartes.

Aprovada a minha proposta, o Estado não fica prejudicado e os advogados ficam satisfeitos.

Termino mandando para, a Mesa a minha proposta.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente, do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: ouvi nas considerações, do Sr. Marques Loureiro que muitos contribuintes foram multados.

Àpartes.

Muitos contribuintes foram multados por falsas declarações.

Tem havido reclamações, é certo; mas é necessário que elas sejam feitas a respeito de factos concretos, para poderem ser apreciadas.

Àpartes.

As reclamações do 1.° bairro não o foram por êsse motivo.

Àpartes e diálogos.

O Orador: — Os médicos e advogados-acharam ilegal o imposto de transacções, mas não se importam pagar qualquer imposto que dê ao Estado o mesmo quantitativo.

Não vem para aqui apreciar se é justo ou não êsse pagamento.

O Sr. Marques Loureiro: — Os contribuintes estão prontos a pagar 25$ de multa. Em Viseu já há 240.

O Orador: — Tenho muito receio em aceitar êsse artigo de V. Exa. porque não sei qual é a situação verdadeira. Do 1.° bairro reclamaram para eu anular todos os lançamentos. Eu disse que não.

O Sr. Marques Loureiro: — A Associação Comercial de Viseu responsabiliza-se por tudo.

O Orador: — O telegrama da Associação Comercial de Viseu não resolve nada. Evidentemente, se a Associação Comercial apresentasse casos individuais, eu resolveria. Mas sôbre casos genéricos, não; a não ser que haja reclamações sôbre disposições regulamentares.

Assim, sim; mas só em casos concretos.

Apartes.

A lei está em vigor. E a respeito de cumprimento da lei por parte d uns contribuintes e não cumprimento por parte doutros, eu, como Ministro das Finanças, não quero começar a seguir o critério de aplicar uma disposição a êste ou àquele.

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porque tenho a certeza de que então todos reclamariam.

A última contribuição a pagar teve muitas reclamações.

Trocam-se àpartes repetidos.

Com relação às profissões liberais, aceito essa proposta.

Referiu-se o Sr. Marques Loureiro ao facto de não se ter feito um regulamento.

Àpartes.

O Orador: — Nós só temos que louvar o Sr. Portugal Durão por ter dado lugar a que se fizesse uma lei que é duma produtividade considerável.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Presidente: — Não há mais ninguém inscrito. Vai votar-se na generalidade a proposta de lei.

É aprovada.

Lê-se o artigo 1.° e entra em discussão.

O Sr. Marques Loureiro (para um requerimento): — Requeiro que seja discutido o corpo do artigo independentemente do seu parágrafo,

Consultada a Câmara é aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o corpo do artigo.

Pausa.

O Sr. Presidente: — Como ninguém pede a palavra, vai votar-se.

É aprovado.

Lê-se e é admitida a substituição apresentada pelo Sr. Marques Loureiro, entrando em discussão juntamente com o § 1.° da proposta de lei.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: a reclamação apresentada a esta casa do Parlamento pelas classes dos médicos e advogados baseia-se no facto, que elas reputam irregular, de lhes ser lançado um imposto sôbre o valor das transacções, quando elas não consideram transacção o serviço que prestam no exercício das suas funções.

A proposta de lei do Sr. Presidente do Ministério é que satisfaz essa reclamação.

A do Sr. Marques Loureiro parece-me que vem estabelecer êsse imposto simplesmente anulando as multas já aplicadas e os seus efeitos.

Estabelece-se diálogo entre o Sr. Marques Loureiro e o orador.

O Orador: — Em virtude da explicação que acaba do dar-me o Sr. Marques Loureiro, dou-me por satisfeito; mas parece-me que a redacção proposta pelo Sr. Presidente do Ministério é mais clara.

Termino; pois, declarando que damos o nosso voto a esta disposição.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Constâncio de Oliveira: — Sr. Presidente: como pode haver hesitações a respeito da proposta do Sr. Marques Loureiro, eu quero dar conhecimento à Câmara de uma reclamação feita pelos vendedores dos mercados de Lisboa.

Êsses vendedores suposeram que não eram abrangidos pelo imposto de transacção, visto já pagarem à câmara municipal todos os impostos por ela exigidos.

Assim não fizeram as declarações em devido tempo.

Por virtude dessa sua falta foram procurados pelos fiscais do imposto de transacção que lhes aplicaram multas exorbitantes e lhes fixaram um valor fabuloso para o efeito da aplicação da avença. Tam exorbitantes eram essas multas que, posteriormente, os próprios fiscais as deminuiram, começando a negociar com os contribuintes sôbre o quantitativo das multas a pagar.

Isto prova a forma irregular como correm os serviços do lançamento do imposto de transacção, dando-se a agravante de uma grande parte dos dinheiros, que deveriam entrar nos cofres do Estado, se desviar para os bolsos dos fiscais.

Não posso deixar, portanto, de dar à minha aprovação à proposta de substituição apresentada pelo Sr. Marques Loureiro e que se torna extensiva a todos os contribuintes que porventura não fizeram as suas declarações.

Tenho dito:

O orador não reviu.

Foi concedida a prioridade para a votacão da proposta do Sr. Marques Loureiro, e, rejeitada em prova e contraprova esta proposta. Entrou em discussão o artigo 2.°

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O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: o artigo 2.° não tem cabimento nesta proposta de lei o parece-me, portanto, que seria preferível retirá-lo da discussão.

Neste sentido mando para a Mesa uma proposta.

È a seguinte:

Proposta

Proponho que o artigo 2.° seja discutido na ordem do dia juntamente com o parecer n.° 717, seguindo o projecto os ulteriores tramites regimentais sem êsse artigo. — Almeida Ribeiro.

Foi admitida.

O Sr. Marques Loureiro: — Sr. Presidente: eu vejo que a Câmara tem sabido afirmar fraqueza diante dos fortes e fôrça diante dos fracos.

Não se sabe em relação a que período e a que tempo a proposta aumenta a colecta com mais êstes 20 por cento.

Não o sabe ou não o quis dizer o Sr. Ministro das Finanças; o contudo é indispensável que o saibamos, porque é preciso que ninguém ignore que os contribuintes, que não cumpriram a lei, ficam em igualdade do circunstâncias com aqueles que, como eu, humildes o fracos, cumpriram os seus deveres para com o Estado.

Pretende-se agora que êsse assunto fique para ser discutido oportunamente; mas essa resolução não honra o Parlamento, e dá ensejo a que lá fora se afirme — o serei o primeiro a declará-lo — que houve um favoritismo inadmissível.

Não é assim que se fazem as leis, nem é assim que se dignifica a instituição parlamentar.

O Sr. Abranches Ferrão (interrompendo): — V. Exa. pode dizer-me quais são as transacções dos médicos e advogados?

O Orador: — Eu não discuti a lei do imposto sôbre transacções.

Quando se discutiram as propostas de finanças, que deram origem à lei n.° 1:368, ficou resolvido que os advogados e os médicos pagariam os impostos sôbre transacções.

E é tão expressa esta disposição na lei n.° 1:368, que os advogados que não pagaram êsse imposto não querem dis-

cutir essa questão nos tribunais, e procuram encontrar portas falsas.

Entendo que é absolutamente necessário que a disposição do artigo 2.° seja modificada por forma a estabelecer a situação dos contribuintes que pagaram e a dos que não pagaram.

Sr. Presidente: insurjo-me e insurjir-me-hei contra aqueles que de qualquer forma pretendem iludir as leis.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Velhinho Correia: — Sr. Presidente: entro muito à vontade neste debate para fazer ligeiras considerações em resposta ao Sr. Marques Loureiro.

É entro tanto mais à vontade nesta discussão, quanto é certo que o assunto me é absolutamente indiferente. Não sou advogado; e, se é certo que pretendo sê-lo, nunca exercerei a advocacia.

Sr. Presidente: o imposto sôbre o valor das transacções é uma legislação copiada da lei francesa, nas suas minúcias, nos seus detalhes, na sua oportunidade e na sua razão de ser.

É um imposto de ocasião que os países empobrecidos lançaram para criar alguma receita.

Não mo repugna aprovar, como aprovei, o princípio de isenção das classes dos médicos e dos advogados e o princípio da amnistia para as multas aplicadas a essas classes de contribuintes, que não deviam ser incluídas no imposto de transacção.

Disse ainda o Sr. Marques Loureiro que essas classes ficam agora isentas. Não é exacto, porque ficam sujeitas ao imposto pessoal de rendimento, onde deve entrar-se em linha de conta com todos os proventos da sua profissão.

Eram estas, Sr. Presidente, as considerações que tinha a fazer e que fundamentam o modo como votei.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Almeida Ribeiro: — Sr. Presidente: pedi a palavra quando o Sr. Marques Loureiro disse que se tinha praticado uma imoralidade, pois que a minha proposta não fazia senão isentar as classe dos médicos e advogados.

Não posso estar do acordo com S. Exa., porque a Câmara não estranhará que eu

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não possa reconhecer ter dado o meu voto a uma imoralidade.

Não tenho que considerar se as classes dos módicos e dos advogados, pela sua mentalidade, estariam em melhores condições que outras classes para irem aos tribunais protestar contra a aplicação dês-se imposto. Não tenho que considerar essa circunstância, pela razão simples de que a sua ida aos tribunais seria perfeitamente inútil. Podiam, só assim o entendessem, dirigir-se ao Parlamento, representando contra a aplicação dêsse imposto.

Dei o meu voto à aprovação do artigo 1.°, assim como á aprovação do § único, porque sei que essas classes, tanto a do médicos como a dos advogados, fiadas na promessa feita pelo Ministro das Finanças de que a lei séria alterada, não cumpriram as disposições regulamentares. Foi esta promessa feita pelo membro competente do Poder Executivo que me levou a dar o meu voto à proposta inicial, entendendo, que com isso não praticava nenhuma imoralidade. Pratiquei apenas um acto de justiça e de equidade, que a estas classes era devido, e não considero de maneira nenhuma absurdo que a maneira de tributar essas classes seja discutida conjuntamente com os dois pareceres que estão na ordem do dia.

Então, se verá se há ou não há razão para tributar essas classes com 20 ou 25 por cento. Parece-me que então é que essa discussão tem inteiro cabimento.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: dei o meu voto à proposta do Sr. Almeida Ribeiro porque, em primeiro lugar, entendo que não podemos votar 20 por cento sôbre uma cousa, quando não sabemos o que é essa cousa. Como é que podemos estabelecer, exactamente como se pretendia com os adicionais às contribuições do Estado, quais sejam êsses adicionais em função a uma cousa que serve de base o ainda não está determinada?

Nessas condições não podíamos rejeitar a proposta do Sr. Almeida Ribeiro, e a minoria nacionalista se assim votou, aliás perfeitamente de acordo connosco no que se refere aos adicionais, parece-me que é coerente votando Ida mesma forma com

relação aos 20 por cento propostos pelo Sr. Presidente do Ministério.

Mas há mais. Se eu votei essa proposta, é porque acho que a contribuição industrial sôbre as propostas liberais está sendo lançada com a maior, com a mais funda das injustiças. Se há classes prejudicadas, as profissões liberais estão nessas condições.

Há médicos, por exemplo, em Lisboa, que fazem muitas dezenas de contos e há muitos médicos que fazem apenas três, quatro ou cinco contos.

Não posso admitir, portanto, que haja apenas duas taxas fixas para essas classes.

É cometer a maior injustiça tributá-los a todos igualmente.

Não voto qualquer cousa que só baseie nesta injustiça.

Há uma cousa, no entanto, em que o Sr. Marques Loureiro tem razão às carradas, permita-se-me o termo: — é a sua estranheza por ter sido rejeitada a proposta do S. Exa. que só referia à aplicação das multas a quem faltasse ao cumprimento da lei n.° 1:388.

Reputo essa medida absolutamente indispensável.

Nisso tem carradas de razão o Sr. Marques Loureiro, não tendo a Câmara procedido com justiça ao rejeitar a anulação das outras multas.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Francisco Cruz: — Sr. Presidente: quero também juntar o meu protesto ao do meu ilustre colega Sr. Marques Loureiro, e quero dirigi-lo de preferência ao eminente jurisconsulto que é o Sr. Almeida Ribeiro.

Sabe S. Exa. que a lei, não sendo justa, não pode ser respeitada o, desde que estabelece excepções para certas classes, essa lei não é justa.

Num concelho do meu círculo, por exemplo, deu-se o facto espantoso de indivíduos que estavam dispensados de pagar contribuição pela legislação anterior terem êste ano sido multados, porque o novo sistema tributário os fez novamente contribuintes sem que de tal tivessem tido conhecimento.

O Sr. Almeida Ribeiro, que é um distinto-jurisconsulto, devia ser o primeiro a

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defender a boa doutrina, porque só ela é própria de uma Câmara que se diz republicana e que diz servir a democracia.

O que aqui se fez, só pode ser levado à conta de distracção, porque de outra forma seria a maior das injustiças e seria a maior das desonestidades.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Marques Loureiro: — Sr. Presidente: não vou repetir as minhas considerações de há pouco, porque não pode discutir-se com quem não quer entender aquilo que é suficientemente claro.

E não posso, pela minha parte, consentir que se desvirtue a questão, deslocando-a do ponto onde a coloquei.

Começo por dizer que não tinha que discutir a doutrina da proposta quanto a excepções por parte de médicos o advogados, pois que já antes havia feito a declaração de que, como advogado, me repugnava pagar o imposto sôbre o valor das transacções e que o pagava porque a lei expressamente me impunha, como também, me repugnava pagar a contribuição industriai pela profissão de advogado e, no emtanto, desde longo tempo que a vinha pagando, tendo declarado ao mesmo tempo que não me repugnava pagar imposto ao Estado em relação aos proventos da minha profissão de advogado:

Isto conjugado com aqueles princípios de moral comesinha que são do conhecimento de toda a gente é que me levou a declarar que a atitude da Câmara se não coadunava, ao menos, com a conhecida moralidade do sapateiro de Braga.

Não disse que se tivesse feito uma moralidade, porque não empreguei o termo, mas a responsabilidade, no emtanto, estava nas minhas afirmações.

Desde que eu tinha afirmado que se não fizera aquilo que o Sr. Almeida Ribeiro disse ser um acto de equidade, a injustiça, que é o avesso da equidade, manifestou-se desde logo.

Das afirmações do Sr. Almeida Ribeiro conveniente é salientar algumas para mostrar a diferença entre os grandes que estão perto do Ministério das Finanças e os pequenos que têm de se contentar apenas com as repartições de finanças do seu concelho.

Os - grandes dirigiram-se ao Sr. Ministro das Finanças e S. Exa. abusando do seu lugar, indo mais além do que a lei lhe consente, prometeu que a lei se não, cumpriria quanto às profissões liberais. Foi o Sr. Almeida Ribeiro que o disse-há pouco.

O Sr. Almeida Ribeiro (interrompendo): - V. Exa. dá-me licença?

Eu não disse que o Sr. Ministro das Finanças tinha prometido que a lei se não cumpriria, mas sim que S. Exa. tinha prometido apresentar ao Parlamento uma proposta para que a lei fôsse modificada.

O Orador: — Nas repartições de finanças concelhias procedeu-se de igual maneira.

Os contribuintes foram fazer as suas declarações e, não obstante, vêm-se agora multados.

Emquanto os contribuintes de Lisboa, esperançados numa modificação da lei, se julgaram dispensados de a cumprir, os contribuintes das províncias apressaram-se a dar-lhe cumprimento.

É esta a diferença.

No entanto a câmara não a quer ver.

Seja assim.

Mas, Sr. Presidente, o artigo 2.° bem como a proposta para que êle baixe à respectiva comissão sugerem-me outra ordem de considerações.

O que se procura fazer com a proposta em discussão?

Isentar do imposto de transacção as profissões liberais.

Está certo.

Mas acaso ficam elas isentas de todo-e qualquer imposto?

Diz o Sr. Ministro das Finanças que não.

Que passam a pagar á contribuição industrial, agravada em 20 por cento.

Estabelecido êste princípio em que situação de desigualdade não digo já de injustiça ou imoralidade, para não ferir os ouvidos do Sr. Almeida Ribeiro ficam os contribuintes que pagaram em relação aos que não pagaram?

Naturalmente os que já pagaram tem de pagar novamente.

Porque foram tolos?

Não.

Porque foram honrados: porque não

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Sessão de 2 de Junho de 1924 19

quiseram negar ao Estado a parto do sacrifício que para êles representa o pagamento duma contribuição.

E porque não foram relapsos sofrem agora o castigo.

Eu pago todos os impostos, mas não quero que aqui se diga que falo pro domo mea.

Tenho uma moral serrana, uma moral de aldeia.

O Sr. Almeida Ribeiro: — Embora não conheça V. Exa. muito bem, faço-lhe justiça.

O Orador: — O que é para lastimar é que êsses contribuintes escolhessem a minha voz tam fraca para os defender aqui.

Nada mais direi e fico por aqui.

O orador não reviu.

Leu-se e foi aprovada a proposta do Sr. Almeida Ribeiro.

O Sr. Velhinho Correia: — Requeiro a dispensa da leitura da última redacção. Aprovado. É aprovada a acta.

Ofícios

Do oficial de polícia judiciária militar, preguntando quando pode ser ouvido o Sr. Malheiro Reimão.

Responda-se que já foi comunicado que esta Câmara concedeu a autorização pedida.

Do juízo da 3.a vara de Lisboa, pedindo a comparência dos Sr s. Amadeu de Vasconcelos, Alberto Cruz, Delfim de Araújo e António Resende, para deporem como testemunhas.

Comunique-se que a Mesa da Câmara apenas pode submeter à votação da Câmara o pedido de autorização a que se refere o artigo 16.° da Constituição.

Foram admitidas as seguintes proposições de lei:

Proposta de lei

Dos Srs. Ministros das Finanças e das Colónias abrindo um crédito de 44.126$73 a favor do Ministério das Colónias, para

reforço da verba destinada a «Melhorias de vencimentos».

Para a comissão de colónias.

Projecto de lei

Do Sr. José Cortês dos Santos, autorizando o Govêrno a ceder à Associação Protectora da Infância Santo António de Lisboa um terreno denominado Terra da Vinha, em Caxias.

Para a comissão de administração pública.

O Sr. Agatão Lança: — Peço a V. Exa. o favor de consultar a Câmara sôbre se permite que a comissão de marinha reúna amanhã durante a sessão.

Autorizado.

O Sr. Presidente: — Vai entrar-se na ordem do dia: negócio urgente do Sr. João Camoesas.

Vai ler-se uma moção mandada para a Mesa pelo Sr. António Correia.

É lida, admitida e entra em discussão.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Pedro Pita.

O Sr. Pedro Pita: — Sr. Presidente: em harmonia com a imposição regimental mando para a Mesa a seguinte moção:

Moção

A Câmara, reconhecendo que a normalização dos serviços telégrafo-postais é função do Poder Executivo que ao realizá-la não poderá deixar de ter em vista o prestígio do Poder, os interêsses do Estado e as normas da justiça, passa à ordem do dia.— Pedro Pita.

Estão neste momento sôbre a Mesa mais duas moções: uma do Sr. António Maia de desconfiança ao Sr. Ministro da Guerra, e outra do Sr. António Correia elogiando os actos praticados pelo Sr. Ministro da Guerra.

Não posso votar nem uma nem outra.

Era lógico porém que apresentem uma moção que pudesse votar o essa dizendo que ao Poder Executivo compete a normalização dos serviços telégrafo-postais, e atende também ao prestígio do Poder, mas dentro das normas de justiça que é necessário respeitar.

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Tenho dedicado o meu espírito à obediência completa a todos os princípios de ordem o disciplina.

Confesso que a primeira impressão que tive ao ver o modo como decorreu o conflito, e como estava posta a questão quando êsse conflito só agravou, foi ditada pelo desejo do ver os serviços telégrafo-postais normalizados, mas com inteiro prestígio para o Estado.

Era, de facto, preciso acabar com essa situação de os correios e telégrafos imporem a greve de três em três meses.

Não era possível que dentro do Estado houvesse um outro Estado. Por isso, senti o desejo de ver normalizados êsses ser-viços-por forma a prestigiar-se o Estado, e que os empregados telégrafo-postais não mais tornassem a fazer greve.

Não há dúvida nenhuma que os empregados telégrafo-postais estavam a abusar da circunstância de querer impor a sua vontade e os seus pontos de vista.

Mas quem lhes deu asas para voarem tam alto?

Os Governos que se têm sucedido naquelas cadeiras, na transigência que têm tido para com êles.

Apoiados.

Mas não é justo que, tendo havido para com essa classe uma transigência completa, se passo num determinado momento a uma intransigência completa. E passar dum extremo ao outro.

Sr. Presidente: há que estabelecer, portanto, e oxalá desta vez se estabelecesse, uma espécie de transição, uma espécie de ponte de passagem entre a transigência que foi completa e que, porventura, rebaixou o prestígio do Poder, e a intransigência que se quere impor, com uma crueza que dói.

Sf. Presidente: não tenho com o Sr. Ministro da Guerra, com quem eu e o meu partido estamos em oposição, qualquer espécie de relações. Tenho-as com o major Sr. Américo Olavo, amigo que muito preso, e sei que não apelo em vão para os seus sentimentos de justiça e para os sentimentos afectivos do seu coração.

Não quis, na moção que apresentei, fazer outra cousa que não fôsse dar ao Poder Executivo a resolução do incidente; mas permita-me, usando da palavra, apelar para os sentimentos nobres do major Sr. Américo Olavo.

Sei que êle é um valente, e os valentes são generosos.

Sr. Presidente: não há só que atender à circunstância que resulta de se pretender passar de um sistema de transigência absoluta para o da intransigência completa; há que atender a mais alguma cousa: há que atender a que entre os grevistas dos correios e telégrafos eu distingo três espécies:

Há aqueles que estão na greve, coma estão em todas as greves, sempre com o desejo de perturbar. Êste é o menor número.

Há aqueles que entendem dever solidariedade absoluta aos seus colegas. Êsses respeito-os inteiramente.

E há aqueles que estão por fôrça, que estão coactos, por recearem as transigências passadas.

Sr. Presidente: todos nós sabemos como se têm resolvido as greves anteriores; todos nós sabemos que o pessoal já foi uma vez demitido e seguidamente readmitido; e nestas condições se alguns se apresentarem, serão depois considerados como traidores à classe.

Eu fui procurado por duas senhoras que são funcionárias dos correios e telégrafos, que me preguntaram se se deveriam apresentar, pois a situação em que se encontravam era esta: se se fossem apresentar, seriam vaiadas e enxovalhadas, e se amanhã fôsse admitido o pessoal em massa, seriam consideradas como traidoras ao resto da classe. Aí comecei a compreender a situação da maior parte do pessoal, e não assumi a responsabilidade de dar qualquer conselho.

Sr. Presidente: são justamente as várias situações em que se encontram os funcionários que me fazem lamentar que não se tivesse procurado, de início, separar o trigo do joio.

Sr. Presidente: não se mantém uma situação destas, tanto mais tratando-se de uma classe tam numerosa como esta é, sem se poder saber quem é que faz parte das comissões de resistência.

Sr. Presidente: o caminho que se deveria ter seguido era pôr fora os desordeiros, e colocar ao serviço os outros.

Isto, Sr. Presidente, é que era justo, pois o contrário não se compreende.

Mas há mais ainda, Sr. Presidente: num determinado momento constituiu-se

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a Associação do Pessoal Maior dos Correios e Telégrafos, e constituiu-se a Associação do Pessoal Menor dos Correios e Telégrafos.

Sr. Presidente: eu não compreendo bem a necessidade destas associações, e, sobretudo, Sr. Presidente, não compreendo que o pessoal do Estado se permita associar-se em classe.

A verdade é que essas associações se não destinam a recreio, visto que muitas sociedades de recreio há em Lisboa, sem serem necessárias associações de classe.

Todos nós sabemos, Sr. Presidente, o fim que essas associações têm em vista, qual seja o de reivindicarem os seus direitos, segundo êles dizem.

Foi, Sr. Presidente, uma arma que se lhes deu e assim de admirar não é que êles se sirvam dela.

Todos nós sabemos o fim único e exclusivo a que se destinam essas associações; e, assim, de admirar não é que êles se sirvam dessa arma para fomentar greves.

Isto, Sr. Presidente, é nem mais nem menos do que a conseqüência dos erros passados.

A verdade é que o que se teve em vista foi mostrar que havia um grande espírito liberal, um grande espírito republicano, cousas que na verdade não existem, a não ser no papel.

Sr. Presidente: o meu ponto de vista é muito simples: desejaria apenas, visto desejar o prestígio do Estado, que o Govêrno procure, relativamente a êste conflito, separar o trigo do joio.

Eu sei, Sr. Presidente, que é muito difícil fazer esta obra.

Sei isso muito bem, mas, Sr. Presidente, sei que é possível fazer-se.

Eu confio inteiramente em que o oficial valente que esta à frente da pasta, por onde correm agora êsses serviços, não hesitará em ir até onde fôr preciso e possível, naquele caminho que os fortes sabem percorrer e que conduza à justiça. Devo, porém, dizer também que a justiça não exclui a tolerância.

Apoiados.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. António Maia: — Sr. Presidente, vou ser muito breve.

Chegou-me também às mãos uma circular que o Sr. Ministro da Guerra leu à Câmara, e da qual leu porém só isto:

«A comissão de resistência que, com toda a altivez e lealdade, tem defendido os interêsses colectivos, não pode por princípio algum admitir imposições de quem quer que seja».

S. Exa. leu isto; mas não leu o que estava escrito antes disto e que eu vou ler:

«É do conhecimento de todos que elementos perniciosos, isolados ou formando comissões, alheados da justiça, reclamam sôbre assuntos meramente pessoais, protelando assim por mais tempo as nossas reclamações».

O que está escrito nesta circular tem pois um sentido diferente daquele que lhe dá o Sr. Ministro da Guerra. Mas a circular diz ainda:

«Deixaremos aos que contrariam, para servir os seus fins, o prazer da normalização dos serviços».

Por tudo isto se vê quais são os elementos perniciosos dentro daquela corporação.

Sr. Presidente: a maneira como o Sr. Ministro da Guerra vem aqui apresentar as questões, e como alguns Srs. Deputados encaram essas questões, dá lugar a que se cometam muitos graves erros.

Apoiados.

As palavras dêste documento, trazidas aqui de modo diferente do que são, dSo lugar a formarem-se opiniões erradas sôbre o que aconteceu.

Neste documento não há nada contrário ao Govêrno.

Há também um facto curioso neste conflito; e é que, dizendo um artigo do Regulamento dos Correios e Telégrafos que a intervenção da fôrça armada num serviço só se faz a requerimento do respectivo administrador, o facto é que os Srs. Ministros da Guerra e do Comércio saltaram por cima dêsse administrador, e invadiram as estações, sem qualquer reclamação feita. E isto fez-se para dar a

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22 Diário da Câmara dos Deputados

impressão de que o pessoal maior dessa corporação estava em greve.

Mas é também deveras curiosa a situação dêsse administrador dos correios e telégrafos, que continua sendo administrador dêsses serviços mas obedece ao director dos transportes p que não deve ser.

Ao princípio da questão também os Srs. Ministros intervieram sem lhe darem conhecimento.

Apartes.

O Orador: — Depois emendaram a mão; e hoje o Sr. Ministro da Guerra não dá uma ordem nos correios e telégrafos senão por intermédio do Sr. Ministro do do Comércio que por sua vez a comunica à Administração Geral, que a manda cumprir. isto tudo para a todo o custo a maioria conservar um Govêrno que nada tem feito.

Tenho dito.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: — Sr. Presidente: não quero alongar o debate nem deixar de manter a serenidade que é necessária num assunto desta ordem.

Quando na última sessão tive a honra de falar sôbre êste assunto, não esperava ter de voltar ao debate.

É que eu nunca julguei que o Govêrno, posta a questão nos termos em que lhe foi posta, sem a mais leve nota política, estragasse mais uma vez a solução que estava marcada para o conflito telégrafo-postal.

Mais uma vez o Sr. Presidente do Ministério quis ser infelicíssimo na resposta que deu aos Deputados que usaram da palavra; mais uma vez quis contrariar uma saída honrosa para todas as partes, colocando-se numa intransigência que ainda mesmo a nós, que não nos esquecemos nunca da parte disciplinar, nos obriga a tratar novamente do assunto.

Há na Mesa três moções: uma do Sr. António Maia que é de desconfiança ao Govêrno; outra do Sr. António Correia que é abertamente de confiança, e outra do Sr. Pedro Pita que na verdade é também uma moção de confiança. Se o Sr. Presidente do Ministério tivesse querido aproveitar-se da plataforma que lhe foi apresentada, digo à Câmara com a maior sa-

tisfação que, concordando com a moção do Sr. António Maia, nós sairíamos da Sala para não a votarmos; mas S. Exa. não quis compreender os melindres da situação e levou-nos assim até um ponto em que temos de votar essa moção, rejeitando as outras.

Ninguém defendeu aqui, e lá fora mesmo, outro critério que não fôsse, o de que devia sar castigado quem o merecesse.

Além da reclamação apresentada a esta casa do Parlamento pelo pessoal maior dos correios e telégrafos, chegou-me também às mãos uma circular enviada pelo mesmo pessoal ao administrador geral, cuja situação neste conflito é verdadeiramente inexplicável.

Não se compreende como o Sr. Ministro da Guerra e o Sr. Ministro do Comércio se esqueceram de que existe o administrador geral dos correios e telégrafos e que sem o ouvirem, tenham feito intervir a fôrça pública.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — V. Exa. está, mal informado a êsse respeito.

O Sr. António Maria da Silva não quis aqui dentro invocar a sua qualidade de administrador geral dos correios e telégrafos; mas se o quisesse ter feito poderia informar V. Exa. de que assim não sucedeu.

Após a reunião do Conselho de Ministros, em que se tomou conhecimento dos actos de indisciplina que se estavam praticando nos correios e telégrafos, o Sr. António Maria da Silva teve uma conferência comigo e procurou junto do pessoal transmitidas resoluções do Governo, que eram as de impedir que as cousas continuassem como até ali.

O Orador: - Mas V. Exa. pode dizer qual a opinião do administrador geral dos correios e telégrafos, acerca da intervenção da fôrça pública?

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — O Sr. António Maria da Silva limitou-se a fazer as démarches que lhe competiam, comunicando ao pessoal que o Govêrno tinha resolvido sobrestar, na satisfação das suas reclamações e que não permitiria que se continuassem a praticar actos de indisciplina.

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O Sr. António Maia: — Era bom que o Sr. Ministro do Comércio nos dissesse se o administrador geral ordenou aos seus empregados que acatassem as instruções emanadas do Ministério da Guerra.

O Orador: — Era êsse efectivamente um ponto que muito nos interessaria conhecer.

Eu tenho a informação de que o administrador geral dos correios e telégrafos declarou, quando foi procurado por uma comissão de chefes de secção de Lisboa e da província, que vieram conferenciar com S. Exa. para receberem instruções, que êsses seus subordinados fizessem um relatório dos factos passados, nada lhes dizendo sôbre se deviam ou não acatar as ordens militares.

Aqui tem a Câmara a demonstração de que nas mesmas condições em que se encontra o pessoal maior, está também o administrador geral dos correios e telégrafos, que não quis dar nenhuma instrução acerca do acatamento das ordens militares.

Como é que o Govêrno pode portanto, excluir desta questão o administrador geral, que não respondeu àquilo que os seus subordinados lhe preguntaram em relação ao cumprimento das ordens militares?

Nestas condições o administrador geral dos correios e telégrafos está sujeito às mesmas disposições que respeitam a todo o pessoa] maior.

Há mais: o administrador geral não tem a mesma opinião que o Govêrno; e já disse que êsse movimento não era uma greve, mas sim um movimento de protesto.

Não compreendo como é que o administrador geral tem uma opinião diversa da do Govêrno, e o Govêrno não toma providência alguma a êste respeito.

Eu tenho em meu poder a circular que o Sr. António Maia leu.

Vê-se que o Sr. Ministro da Guerra não leu a circular toda: leu apenas uma parte. E para que a Câmara possa avaliar dos intuitos de quem escreveu essa circular, eu vou lê-la à Câmara, toda, e não parte como fez o Sr. Ministro da Guerra.

Leu.

Como V. Exas. vêem, não há quais quer referências ao Estado, mas sim ao pessoal menor.

Não compreendo por isso a razão por que o Sr. Ministro da Guerra, em toda a sua infeliz atitude nesta questão, procurou dar à Câmara a impressão de que era o Estado a entidade visada na circular á que aludo, em vez de procurar uma solução que fôsse para todos honrosa, sem represálias para os funcionários em greve e sem desprestígio para o Poder Executivo.

Este meu critério é tanto mais insuspeito,, quanto é certo que em casos anteriores eu tenho sido dos primeiros, nesta casa do Parlamento, a condenar as greves do funcionalismo.

Esta circunstância me dá autoridade para aconselhar ao Govêrno espírito dê transigência e de conciliação, que não lhe fica mal e apenas lhe dá fôrça.

Por outro lado, o Sr. Ministro do Comércio não tem sido mais feliz nas suas decisões que o seu colega da pasta da Guerra.

S. Exa. por sua iniciativa ou por iniciativa do seu secretário...

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — Isso é uma especulação indigna das pessoas que a fazem.

V. Exa. está, possivelmente sem êsse intuito, a colaborar numa infame campanha contra mim.

O Orador: — Sou absolutamente cuidadoso nesse ponto; mas, Sr. Ministro do Comércio, porque é que V. Exa. quando se manifeste, como, aliás, eu entendo que se devem manifestar os membros do Poder Executivo, tam zeloso pela disciplina, não se manifesta da mesma maneira quando se refere ao pessoal menor, que faltou ao respeito ao pessoal superior?

Àparte do Sr. Ministro do Comércio que se não ouviu.

O Orador: — Nesse caso, V. Exa. vai fazer o favor de demonstrar com uma resposta simples quanto V. Exa. tem razão. Nesse caso V.Exa. quer que, assim como devam ser castigados os elementos do pessoal superior que faltaram ao cumprimento dos seus deveres, quer que também sejam castigados aqueles elementos do pessoal menor que faltaram ao respeito aos seus superiores?

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O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — O Govêrno não quere outra cousa, nem nunca fez outra afirmação. Essa foi a sua confissão desde a primeira hora.

O Orador: — Nesse caso V. Exa. declara que p Govêrno está na disposição de proceder em harmonia com a letra da representação que foi entregue a esta Câmara.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — O Govêrno não atende a reclamações de ninguém. Quem está fora da disciplina não tem autoridade para fazer reclamações.

O Orador: — Eu condeno todas as pessoas que estão fora da disciplina; mas o que não tenho é dois critérios diversos.

(Àparte do Sr. Ministro do Comércio que se não ouviu}.

O Orador: — Nesse caso V. Exa. concorda em que o Govêrno tem tenção de castigar da mesma forma os elementos do pessoal maior e menor que faltaram ao cumprimento dos seus devores.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): - Como já disse, o Govêrno nunca pensou doutra forma.

O Orador: — Ora alguma cousa adiantámos com as declarações de V. Exa.

Se o Sr. Presidente do Ministério tivesse já feito essa declaração em nome do Govêrno, se o Sr. Ministro da Guerra a tivesse feito igualmente, talvez se tivessem facilitado as negociações tendentes à resolução do assunto.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — Não queira V. Exa. tirar efeitos políticos que não têm fundamento algum.

O Orador: — Lamento que V. Exa. seja tam injusto quando se refere a efeitos políticos que queremos tirar.

V. Exa. sabe o cuidado com que na última sessão tratámos dêste assunto — cuidado que, aliás, pomos sempre em questões desta ordem.

V. Exa. sabe também que eu me referi

ao facto de ter havido actos de indisciplina por parte do pessoal menor e que o Sr. Presidente do Ministério, usando da palavra, limitou-se a dizer que não tinha conhecimento de actos de indisciplina, que o pessoal menor é que estava na ordem e o pessoal superior fora da ordem.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — O Govêrno não tinha conhecimento oficial dêsses factos.

O Orador: — Então tem já o Govêrno conhecimento oficial dêsses factos?

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nuno Simões): — Logo que foram entregues os autos, mandou-se proceder contra todas as queixas apresentadas.

O Orador: — Nesse caso, hoje já V. Exa. tem conhecimento oficial de que por parte do pessoal menor se cometeram actos de indisciplina?

Não tenho nenhuma má vontade contra pessoa alguma; mas o que tenho é muito amor ao princípio da hierarquia. E só, êsse sentimento me tem guiado nesta discussão.

O Sr. Ministro do Comércio vai dar-me a honra de responder. E nestas condições registo já êste facto: é que na verdade me parece, pelo que o Sr. Ministro do Comércio afirmou no seu àparte, que as cousas só modificaram um pouco, e talvez mais fácil seja resolver a questão sem quebra do prestígio, do poder, pois nós, adversários políticos, não nos servimos dos mesmos processos do que os republicanos se serviam na oposição.

O Sr. Ministro do Comércio e Comunicações (Nono Simões) (em àparte): — As provas estão à vista.

O Orador: — As provas de indisciplina são aquelas que resultam da intervenção do pessoal menor no conflito cousa que o Govêrno nunca devia ter consentido.

O Sr. Ministro do Comércio (interrompendo): — V. Exa. pode provar que o Govêrno fez intervir o pessoal menor?

O Orador: — E V. Exa. pode provar, que o pessoal menor não interveio?

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Porque é que V. Exa. não disse que o Govêrno estava na disposição de castigar o pessoal menor que abusou?

O Sr. Ministro do Comércio : — O Govêrno não precisa das indicações de V. Exa. para isso.

Apoiados.

O Orador: — O que o Govêrno precisa é de manter-se dentro dos princípios. O que V. Exa. devia ter dito é que ninguém do pessoal menor faltou ao respeito ao pessoal maior. Muitos dos funcionários superiores não estão ao serviço porque foram expulsos dos seus lugares.

O Sr. Ministro do Comércio: — Não tire efeitos políticos!

O Orador: — Eu já disse a V. Exa. que não me sirvo dos mesmos processos que os republicanos se serviram contra a monarquia.

Não apoiados.

Eu falo com toda a sinceridade; e de todas as frases que profiro na véspera não preciso no dia imediato do retirar nenhuma.

Nestas condições vou dar por terminadas as minhas palavras, declarando que, em face do procedimento do Govêrno, êste lado da Câmara votará a moção do Sr. António Maia — o que não teria feito ontem.

Tenho dito

O orador não reviu.

O Sr. Hermano de Medeiros: — Sr. Presidente: eu mandarei na altura devida para a Mesa a minha moção de ordem, visto que regimentalmente pedi a palavra sôbre a ordem.

Sr. Presidente: afigura-se-me a mim que o caso na verdade não é para moções de confiança, nem de desconfiança, nem moções de ordem, pois a verdade é que, a meu ver, neste momento o que se deve tratar é de remediar o conflito existente.

Só eu pudesse, Sr. Presidente, dêste meu lugar fazer um pedido ao Sr. António Maia, que mandou para a Mesa uma moção de desconfiança, e ao Sr. António Correia, que mandou uma moção de confiança para a Mesa, pediria a S. Exas. que retirassem essas moções, por isso

que entendo que a Câmara está devidamente esclarecida sôbre o assunto aqui ventilado pelo ilustre Deputado, o Sr. João Camoesas.

Eu pensei, Sr. Presidente, que depois das declarações aqui feitas pelo leader do meu Partido se tivesse encerrado o doba-te. Êle está tornando-se inútil, pois a verdade é que não compreendo o Govêrno, nem o nervosismo do Sr. Ministro do Comércio.

Entendo que o caso é para ponderar, e não para irritar.

O Parlamento, Sr. Presidente, deseja e entende, ou, para melhor dizer, nós todos desejamos que a ordem seja mantida, para o que o Govêrno deverá procurar os delinqüentes a fim de os castigar.

Trate, Sr. Presidente, o Govêrno do assunto, como êle devo ser tratado, serenamente e sem nervosismos, resolvendo o conflito, sem o que não é fácil regularizar os serviços, pois a verdade é que não se improvisa nem substitui um pessoal técnico de um momento para o outro.

Sr. Presidente: é preciso ponderar com calma e serenamente a questão, mantendo-se a ordem e a disciplina.

Estou certo de que o Govêrno por êste caminho chegará a resultados mais práticos, revogando, se fôr possível, o decreto que publicou, demitindo o pessoal, e mandando fazer uma sindicância a fim de serem castigados os delinqüentes, quer êles pertençam ao pessoal maior, quer ao pessoal menor.

Estou certo, Sr. Presidente, de que o assunto desta forma se resolverá mais fàcilmente do que com moções de confiança, ou de desconfiança.

O Sr. Presidente: — Devo prevenir V. Exa. de que são horas de se encerrar a sessão. E assim, se V. Exa. quere, poderá ficar com a palavra reservada para amanhã.

O Orador: — Como ainda desejo dizer mais alguma cousa, peço então a V. Exa. o obséquio de me reservar a palavra para a sessão de amanhã.

O orador não reviu.

O Sr. Carvalho da Silva: — Eu desejava que V. Exa. Sr. Presidente, me explicasse qual a razão por que está posta na

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26 Diário da Câmara dos Deputados

ordem a proposta relativa ao Ministério da Instrução, quando me parece que primeiramente se deve discutir o Orçamento Geral do Estado.

O Sr. Presidente: — Não conheço nenhuma disposição regimental que a isso obrigue.

Vou, pois, interromper a sessão para, recomeçar logo às 21 e meia horas.

Está interrompida à sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Às 22 horas é reaberta a sessão.

O Sr. Presidente: — Está em discussão, o parecer sôbre o orçamento do Ministério de Instrução Pública.

O Sr. Carvalho da Silva: — Requeiro que seja retirado da discussão êsse parecer, para se discutir em primeiro lugar, como é costume, o Orçamento Geral do Estado.

Vozes: — Isso é uma, proposta!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Presidente do Ministério.

O Sr. Carvalho da Silva: - Não, senhor é um requerimento.

O Sr. Presidente: — É uma proposta.

O Sr. Carvalho da Silva: — Todos os dias se fazem aqui requerimentos desta ordem.

V. Exa. sabe quanto nós costumamos respeitar a presidência; mas por isso mesmo temos o direito de exigir que V. Exa. seja Presidente da Câmara e não apenas presidente duma facção da mesma Câmara.

O Sr. Presidente: — Eu adotei, quanto à discussão dos orçamentos, a praxe seguida no ano passado.

O Sr. Carvalho da Silva: — Eu apelo para a consciência de V. Exa. para que me diga se eu tenho ou não razão.

V. Exa. pretende saltar por cima dos nossos direitos, faltando ao respeito que deve ao Regimento desta Câmara.

Recuso-me a fazer qualquer proposta e insisto no meu requerimento.

Vozes da maioria: — Não é um requerimento; é uma proposta.

O Sr. Presidente do Ministério é Ministro das Finanças (Álvaro, de Castro): — Sr. Presidente...

O Sr. Carvalho da Silva: — Não pode ser! Não pode ser!

Vários Srs. Deputados batem comas tampas das carteiras.

O Sr. Cancela de Abreu: — Faz muita falta nesse lugar o Sr. Dr. Domingos Pereira. Era incapaz de fazer o que V. Exa. está fazendo.

Sussurro. Vários Srs. Deputados continuam batendo com os tampos das carteiras, não consentindo, assim, que o Sr. Presidente do Ministério use da palavra.

O Sr. Presidente do Ministério e Ministro das Finanças (Álvaro de Castro): — Sr. Presidente: nos termos do artigo 12.° da lei de contabilidade pública...

Sussurro.

Àpartes.

Vários Srs. Deputados batem com os tampos das carteiras, impossibilitando o ouvir-se o orador.

O Sr. Pedro Pita (para interrogar a Mesa): — Sr. Presidente: desejo que V. Exa. me informe se já foi lido o parecer que vai entrar em discussão. Parece-me que riem foi lido, nem foi votada a dispensa da leitura.

O Sr. Tavares de Carvalho: — O que é preciso é que não haja número!

O Sr. Carvalho da Silva: — O que é preciso é que a maioria compareça às sessões nocturnas!

O Sr. António Maia: — Requeiro a dispensa da leitura do parecer.

O Sr. Tavares de Carvalho: — Todos os pretextos servem!

Consultada a Câmara, foi rejeitado o requerimento.

O Sr. António Maia: — Requeiro a contraprova e invoco o § 2.° do artigo 116.° do Regimento.

Procedeu-se à contraprova, tendo rejei-

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Sessão de 2 de Junho de 1924 27

taão o requerimento 9 Srs. Deputados e aprovado 30.

Disseram «aprovo» os Srs.:

Adriano António Crispiniano da Fonseca.

Albano Augusto de Portugal Durão.

Alberto Ferreira Vidal.

Albino Pinto da Fonseca.

Álvaro Xavier de Castro.

António Augusto Tavares Ferreira.

António Pais da Silva Marques.

António Resende.

António de Sousa Maia.

Baltasar de Almeida Teixeira.

Constâncio de Oliveira.

Custódio Martins de Paiva.

Ernesto Carneiro Franco.

Francisco Gonçalves Velhinho Correia.

João José da Conceição Camoesas.

João de Ornelas da Silva.

Joaquim Narciso da Silva Matos.

José Domingues dos Santos.

José Mendes Nunes Loureiro.

José Pedro Ferreira.

José de Vasconcelos de Sousa e Nápoles.

Luís António da Silva Tavares de Carvalho.

Luís da Costa Amorim.

Mário Moniz Pamplona Ramos.

Nuno Simões.

Pedro Januário do Vale Sá Pereira.

Plínio Octávio de Sant’Ana e Silva.

Sebastião de Herédia.

Vergílio Saque.

Disseram «rejeito» os Srs.:

Afonso de Melo Pinto Veloso.

António Pinto de Meireles Barriga.

Artur de Morais Carvalho.

Artur Virgínio de Brito Carvalho da Silva.

Carlos Cândido Pereira.

Hermano José de Medeiros.

Henrique Sátiro Lopes Pires Monteiro.

José Marques Loureiro.

Paulo Cancela de Abreu.

Pedro Góis Pita.

O Sr. Presidente: — Não há número. Vai proceder-se à chamada. Procedeu-se à chamada.

O Sr. Presidente: — Responderam à chamada 39 Srs. Deputados. Não há número.

A próxima sessão é amanhã, à hora regimental, com a mesma ordem do dia.

Está encerrada a sessão.

Eram 22 horas e 25 minutos.

Documentos mandados para a Mesa durante a sessão

Requerimentos

Requeiro que pelo Ministério das Finanças (Direcção Geral das Alfândegas) me seja fornecida uma nota indicando o número de caixas de conserva de peixe, por qualidades e por tipos, exportado pelos portos do continente, discriminando êstes e os portos de destino, em cada ano desde 1920.

2 de Junho de 1924.— Henrique Pires Monteiro.

Expeça-se.

Requeiro que pelo Ministério da Agricultura me seja enviada cópia autêntica de todo o processo de demissão do professor das antigas escolas agrícolas, Sr. Guilherme Joaquim Felgueiras.

2 de Junho de 1924.— Henrique Pires Monteiro.

Expeça-se.

Parecer

N.° 598, que altera a lei n.° 1:368, de 21 de Setembro de 1922, sôbre taxa da contribuição industrial.

Retirado da discussão por ter sido aprovada nesta data uma proposta de lei sôbre o mesmo objecto.

O REDACTOR—João Saraiva.

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